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  • Instituto de Economia da UFRJInstituto de Economia da UNICAMP

    Mecnica

    07Sistema ProdutivoPerspectivas do Investimento em

    EdmarCaixa de textoVerso Final para Editorao - Documento No Editorado

  • Aps longo perodo de imobilismo, a economia brasileira vinha apresentando firmes

    sinais de que o mais intenso ciclo de investimentos desde a dcada de 1970 estava

    em curso. Caso esse ciclo se confirmasse, o pas estaria diante de um quadro efeti-

    vamente novo, no qual finalmente poderiam ter lugar as transformaes estruturais

    requeridas para viabilizar um processo sustentado de desenvolvimento econmico.

    Com a ecloso da crise financeira mundial em fins de 2008, esse quadro altamente

    favorvel no se confirmou, e novas perspectivas para o investimento na economia

    nacional se desenham no horizonte.

    Coordenado pelos Institutos de Eco nomia da UFRJ e da UNICAMP e realizado com o

    apoio financeiro do BNDES, o Projeto PIB - Perspectiva do Investimento no Brasil tem

    como objetivos:

    Analisar as perspectivas do investimento na economia brasileira em um

    horizonte de mdio e longo prazo;

    Avaliar as oportunidades e ameaas expanso das atividades produtivas

    no pas; e

    Sugerir estratgias, diretrizes e instrumentos de poltica industrial que

    possam auxiliar na construo dos caminhos para o desenvolvimento

    produtivo nacional.

    Em seu escopo, a pesquisa abrange trs grandes blocos de investimento, desdobrados

    em 12 sistemas produtivos, e incorpora reflexes sobre oito temas transversais, con-

    forme detalhado no quadro abaixo.

    ESTUDOS TRANSVERSAIS

    Estrutura de Proteo Efetiva

    Matriz de Capital

    Emprego e Renda

    Qualificao do Trabalho

    Produtividade, Competitividade e Inovao

    Dimenso Regional

    Poltica Industrial nos BRICs

    Mercosul e Amrica Latina

    ECONOMIA BRASILEIRA

    BLOCO SISTEMAS PRODUTIVOS

    INFRAESTRUTURA EnergiaComplexo UrbanoTransporte

    PRODUO AgronegcioInsumos BsicosBens SalrioMecnicaEletrnica

    ECONOMIA DO CONHECIMENTO

    TICsCulturaSadeCincia

    EdmarCaixa de textoVerso Final para Editorao - Documento No Editorado

  • COORDENAO GERAL

    Coordenao Geral - David Kupfer (IE-UFRJ)

    Coordenao Geral Adjunta - Mariano Laplane (IE-UNICAMP)

    Coordenao Executiva - Edmar de Almeida (IE-UFRJ)

    Coordenao Executiva Adjunta - Clio Hiratuka (IE-UNICAMP)

    Gerncia Administrativa - Carolina Dias (PUC-Rio)

    Coordenao de Bloco

    Infra-Estrutura - Helder Queiroz (IE-UFRJ)

    Produo - Fernando Sarti (IE-UNICAMP)

    Economia do Conhecimento - Jos Eduardo Cassiolato (IE-UFRJ)

    Coordenao dos Estudos de Sistemas Produtivos

    Energia Ronaldo Bicalho (IE-UFRJ)

    Transporte Saul Quadros (CENTRAN)

    Complexo Urbano Cludio Schller Maciel (IE-UNICAMP)

    Agronegcio - John Wilkinson (CPDA-UFFRJ)

    Insumos Bsicos - Frederico Rocha (IE-UFRJ)

    Bens Salrio - Renato Garcia (POLI-USP)

    Mecnica - Rodrigo Sabbatini (IE-UNICAMP)

    Eletrnica Srgio Bampi (INF-UFRGS)

    TICs- Paulo Tigre (IE-UFRJ)

    Cultura - Paulo F. Cavalcanti (UFPB)

    Sade - Carlos Gadelha (ENSP-FIOCRUZ)

    Cincia - Eduardo Motta Albuquerque (CEDEPLAR-UFMG)

    Coordenao dos Estudos Transversais

    Estrutura de Proteo Marta Castilho (PPGE-UFF)

    Matriz de Capital Fabio Freitas (IE-UFRJ)

    Estrutura do Emprego e Renda Paul Baltar (IE-UNICAMP)

    Qualificao do Trabalho Joo Sabia (IE-UFRJ)

    Produtividade e Inovao Jorge Britto (PPGE-UFF)

    Dimenso Regional Mauro Borges (CEDEPLAR-UFMG)

    Poltica Industrial nos BRICs Gustavo Brito (CEDEPLAR-UFMG)

    Mercosul e Amrica Latina Simone de Deos (IE-UNICAMP)

    Coordenao TcnicaInstituto de Economia da UFRJInstituto de Economia da UNICAMP

    APOIO FINANCEIROREALIZAO

    PIB_IE_UFRJ_programa_GERAL.indd 4 02.06.09 19:20:13

    diascarolinaText BoxEste trabalho realizado com recursos do Fundo de Estruturao de Projetos do BNDES (FEP). O contedo dos estudos e pesquisas de exclusiva responsabilidade dos autores, no refletindo, necessariamente, a opinio do BNDES. Informaes sobre o FEP esto disponveis em http://www.bndes.gov.br

    EdmarCaixa de textoVerso Final para Editorao - Documento No Editorado

  • Este trabalho foi realizado com recursos do Fundo de Estruturao de Projetos do BNDES (FEP). O contedo dos estudos e pesquisas de exclusiva responsabilidade dos autores, no refletindo, necessariamente, a opinio do BNDES. Informaes sobre o FEP esto disponveis em .

    Este relatrio est em fase de editorao no formato de livro. Para fazer citao ou referncia a este material: SABBATINI, R. (Coord.) Perspectivas do investimento em mecnica. Rio de Janeiro: UFRJ, Instituto de Economia, 2008/2009. 252 p. Relatrio integrante da pesquisa Perspectivas do Investimento no Brasil, em parceria com o Instituto de Economia da UNICAMP, financiada pelo BNDES. Disponvel em: http://www.projetopib.org/?p=documentos . Acesso em 10 out. 2009.

    FICHA CATALOGRFICA

    CDD 338.43531

    P467 Perspectivas do investimento em mecnica / coordenador Rodrigo Sabbatini; equipe Beatriz Bertasso... [et al.]. Rio de Janeiro: UFRJ, 2008/2009.

    252 p.; 30 cm. Bibliografia: p. 240-246.

    Relatrio final do estudo do sistema produtivo Mecnica, integrante da pesquisa Perspectivas do Investimento no Brasil, realizada pelo Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro em convnio com o Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas, em 2008/2009, financiada pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econmico e Social.

    1. Indstria mecnica Investimentos. 2. Economia industrial. 4. Relatrio de Pesquisa (IE/UFRJ/UNICAMP/BNDES). I. Sabbatini, Rodrigo. II. Bertasso, Beatriz. III. Universidade Federal do Rio de Janeiro. Instituto de Economia. IV. Universidade Estadual de Campinas. Instituto de Economia. V. Perspectivas do investimento no Brasil: relatrio de pesquisa.

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  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

    PROJETO PERSPECTIVAS DO INVESTIMENTO NO BRASIL

    BLOCO: PRODUO

    SISTEMA PRODUTIVO:

    MECNICA

    Coordenador:Rodrigo Sabbatini (NEIT-UNICAMP)

    Equipe:Beatriz Bertasso (NEIT-IE-UNICAMP)

    Carlos E. de Freitas Vian (GEPHAC-ESALQ-USP)Enas Gonalves de Carvalho (NEIT-IE-UNICAMP)

    Fernando Henrique Lemos (NEIT-IE-UNICAMP)Jos Augusto Ruas (NEIT-IE-UNICAMP)

    Marcelo Pinho(DEP/UFSCar)

    Campinas, agosto de 2009

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

    2

    ndice

    1. Introduo....................................................................................................................................... 3 2. Dinmica dos investimentos no Brasil e no mundo .................................................................. 7

    2.1 Introduo................................................................................................................................. 7 2.2 Desafios e oportunidades associadas s mudanas nos padres de demanda mundial e nacional ...................................................................................................................... 16 2.3 Desafios e oportunidades associadas s mudanas nos padres de concorrncia e regulao...................................................................................................................................... 19 2.4 Desafios e oportunidades associadas s mudanas tecnolgicas .............................. 24 Concluso: respostas crise de 2008-2009.............................................................................. 26

    3. Dinmica dos investimentos no setor de Bens de Capital Seriados.................................... 29 3.1 Introduo............................................................................................................................... 29 3.2 Dinmica Global do Investimento ...................................................................................... 33 3.3 Tendncias do investimento no Brasil ................................................................................. 38 3.4 Perspectivas de mdio e longo prazo para os investimentos........................................ 56 3.5 Propostas de polticas setoriais............................................................................................. 67 3.6 Concluses .............................................................................................................................. 70

    4. Dinmica dos investimentos no Complexo Automotivo ....................................................... 72 4.1 Introduo............................................................................................................................... 72 4.2 Dinmica Global do Investimento ...................................................................................... 74 4.3 Tendncias do investimento no Brasil ................................................................................. 95 4.4 Perspectivas de mdio e longo prazo para os investimentos...................................... 111 4.5 Propostas de polticas setoriais........................................................................................... 124

    5. Dinmica dos investimentos na Indstria Naval e Offshore................................................ 131 5.1 Introduo............................................................................................................................. 131 5.2 Dinmica Global do Investimento .................................................................................... 134 5.3 Tendncias do investimento no Brasil ............................................................................... 142 5.4 Perspectivas de mdio e longo prazo para os investimentos...................................... 147 5.5 Propostas de polticas setoriais........................................................................................... 165

    6. Dinmica dos investimentos no sub-setor de Mquinas Agrcolas.................................... 171 6.1 Introduo............................................................................................................................. 171 6.2 Dinmica Global do Investimento .................................................................................... 173 6.3 Tendncias do investimento no Brasil ............................................................................... 188 6.4 Perspectivas de mdio e longo prazo para os investimentos...................................... 201 6.5 Propostas de polticas setoriais........................................................................................... 207

    7. Sntese analtica: perspectivas de mdio e longo prazo .................................................... 210 7.1 Introduo............................................................................................................................. 210 7.2 Perspectivas para 2012 ....................................................................................................... 212 7.3 Perspectivas para 2022 ....................................................................................................... 221

    8. Sntese propositiva: polticas para o desenvolvimento produtivo ..................................... 229 8.1 Introduo............................................................................................................................. 229 8.2 Bens de capital seriados ..................................................................................................... 233 8.3 Complexo automotivo ........................................................................................................ 234 8.4 Construo naval e offshore.............................................................................................. 235 8.5 Mquinas agrcolas.............................................................................................................. 237

    9. Concluses .................................................................................................................................. 240 Referncias Bibliogrficas ............................................................................................................. 242

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    1. Introduo

    Este estudo apresenta parte dos resultados de um amplo projeto de pesquisa

    intitulado Perspectiva do Investimento no Brasil. O objeto da anlise que se segue o

    sistema produtivo de equipamentos mecnicos. O objetivo central identificar desafios e

    oportunidades para o desenvolvimento deste sistema no Brasil, numa perspectiva de mdio

    e longo prazo.

    Para alcanar este objetivo, o estudo se debruou por quatro dos mais importantes

    subsistemas desta indstria, a saber, as mquinas e equipamentos identificadas como bens

    de capital seriados, o conjunto do complexo automotivo (includo veculos leves,

    comerciais e autopeas), a indstria de construo naval (incluindo a instalao de

    plataformas e outras instalaes offshore) e as mquinas e implementos agrcolas.

    Em cada um deles, uma equipe de pesquisadores se lanou ao exerccio de traar

    inicialmente um panorama dos movimentos competitivos e da recente dinmica dos

    investimentos, no Brasil e no mundo. Em seguida, cada equipe analisou as perspectivas do

    investimento em dois momentos. No primeiro, esperava-se identificar as decises de

    investimento no mdio prazo, isto , analisar os projetos anunciados, sua configurao e

    seus efeitos sobre a estrutura de cada subsistema no Brasil. Num segundo momento,

    procurou-se uma anlise mais ousada, em que cada especialista apontou qual seria a

    configurao desejvel para o subsistema num prazo mais longo, convenientemente

    estipulado em 2022. Por fim, foi discutido o estado-da-arte das polticas estratgicas de

    apoio ao subsistema no Brasil, procurando apontar os gargalos, os acertos e as

    modificaes necessrias para que este conjunto de aes pblicas pudesse maximizar as

    oportunidades e, desta forma, tornar real o cenrio desejvel.

    Este estudo procura sintetizar a discusso de cada um dos subsistemas, alm de

    apontar estratgias, oportunidades e desafios comuns ao conjunto do sistema produtivo

    mecnico, ainda que pese a forte heterogeneidade entre os segmentos analisados.

    Dentre os resultados comuns importante observar que este sistema produtivo

    vital para o futuro da indstria e da economia brasileira. um sistema estratgico e

    relativamente competitivo e, portanto, seu desenvolvimento deve continuar a ser objeto de

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

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    ao do Estado, de forma conjunta, ou atravs de polticas especficas para cada

    subsistema.

    Este sistema estratgico por trs razes principais. Em primeiro lugar, tem uma

    forte presena histrica na estrutura industrial brasileira, que resistiu s muitas presses

    competitivas dos ltimos anos de maneira relativamente articulada e integrada como

    cadeia, ao contrrio de outros sistemas. Por exemplo, desde os anos 90, o sistema se

    manteve responsvel, em mdia, por cerca de 9% do valor adicionado da indstria

    brasileira, criando efeitos de encadeamento que abrangem de forma significativa

    praticamente todos os segmentos econmicos brasileiros, da siderurgia ao comrcio

    varejista.

    Em segundo lugar, este um sistema que, justamente pela sua densidade estrutural

    no pas, tem grande capacidade de gerar empregos diretos e indiretos. Por exemplo, o

    sistema emprega, apenas na produo, mais de 500 mil trabalhadores diretos, ou quase 8%

    do total da indstria nacional. Alm disto, so empregos cujo rendimento mdio cerca de

    1,5 vezes maior que para o total da indstria. De fato, em moeda de 2006 (deflacionada

    pelo IPCA), o rendimento mdio no sistema produtivo mecnico foi de R$ 2260/ms, na

    mdia 1996-2006. No mesmo perodo, com o mesmo deflator, a mdia para o total da

    indstria nacional foi de R$ 1430/ms1. De acordo com Modelo de Gerao de Emprego

    do BNDES2, cada um dos segmentos da indstria gerava mais de trezentos empregos para

    cada R$ 10 milhes de variao na produo (ver Tabela 1.1)

    Tabela 1.1 Sistema Produtivo Mecnico: empregos gerados para cada aumento de R$

    10 milhes na produo (preos mdios de 2003)

    Mquinas e Equipamentos Automveis, caminhes e nibus Peas e outros veculos

    Empregos Diretos 62 16 37Empregos Indiretos 80 108 117Efeito Renda 278 203 234

    Total 420 327 388

    Fonte: MGE-BNDES apud Najberg e Pereira (2004)

    Em terceiro lugar, o sistema estratgico para o Brasil porque vigora, de maneira

    geral, uma estrutura patrimonial diversificada, que inclui empresas de capital nacional de

    1 PIA-IBGE, diversas pesquisas. 2 Najber e Pereira (2004)

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    diversos portes, e filiais de grandes empresas transnacionais. Ou seja, um espao que

    expe as empresas brasileiras a riscos competitivos significativos, mas, ao mesmo tempo,

    permite oportunidades para as firmas que enfrentam esta adversidade. Oportunidades que

    podem encadear ganhos competitivos, inclusive em capacidade autnoma de inovao

    tecnolgica, no apenas para as empresas do sistema, mas para os demais segmentos

    fornecedores ou consumidores da estrutura econmica nacional. um sistema estratgico,

    pois exige defesa e desenvolvimento competitivo das empresas, com resultados, positivos

    ou negativos, com grande potencial de transbordamento para outros segmentos.

    Por fim, este segmento relativamente competitivo pela convergncia das

    seguintes caractersticas:

    Presena de custos competitivos, seja de insumos (siderrgicos, energticos, por exemplo), seja pelo custo da mo de obra, tanto no cho de fbrica,

    quanto nos departamentos administrativos e de desenvolvimento

    tecnolgico3;

    Presena de ativos intangveis, tais como o conhecimento acumulado pela mo de obra em vrios nveis, com destaque para engenharia a custo baixo;

    Pela retomada de aes de poltica pblica, tais como a PDP e o PAC, que identificam a importncia econmica deste sistema, e garantem, ao menos

    no mdio prazo, apoio significativo para seu desenvolvimento competitivo;

    Pela relativamente elevada escala do mercado, sobretudo associada demanda interna, que o principal vetor dinmico dos investimentos,

    ainda que a cadeia tenha capacidade exportadora.

    Tomando estas caractersticas estratgicas e competitivas, o estudo discutir a

    seguinte perspectiva para o futuro do sistema no Brasil. A dinmica dos investimentos no

    passado recente e no futuro motivada, em grande medida, por condies prprias da

    economia brasileira. As motivaes do investimento neste sistema recaem, sobretudo, na

    necessidade de atender um mercado domstico em expanso, e com potencial de

    sustentao deste crescimento por vrios anos. Por esta razo, os efeitos negativos da crise

    econmica que eclodiu em 2008 poderiam ser minimizados, fortalecendo a indstria

    3 Segundo BLS (2009), os gastos totais com empregados na indstria por hora 76% menor no Brasil do que nos EUA. Dentre os principais parceiros comerciais dos EUA, este custo s supera os de Mxico e China.

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    nacional num momento de uma inevitvel reconfigurao da estrutura industrial mundial.

    Ou seja, esta reconfigurao poder implicar em grandes oportunidades para o sistema no

    Brasil, que, fortalecido pelo mercado domstico em expanso, poder ocupar espaos

    tambm na rede internacional de produo, em condies mais favorveis do que

    vivenciou at agora. Poucos so os sistemas produtivos brasileiros que podem ocupar

    espaos dinmicos na produo internacional. Este livro procurar mostrar que o sistema

    produtivo de equipamentos mecnicos pode lograr tal objetivo, liderando assim uma

    indstria brasileira com aspiraes de competitividade e liderana mundial.

    Para discutir tais aspectos, o presente livro conta, alm desta introduo, com

    outros seis captulos. No captulo 2 sero discutidos, em resumo, as principais tendncias

    do investimento no Brasil e no mundo, elencando as principais oportunidades e desafios

    atuais. Nos captulos 3 a 6 sero apresentados os estudos sintetizados de cada um dos

    subsistemas, a saber, bens de capital seriados, complexo automotivo, construo naval e

    mquinas agrcolas. Na seqncia, o captulo 6 far a sntese analtica das perspectivas do

    investimento de mdio e longo prazo. J o captulo 8 sintetizar as polticas pblicas

    necessrias para lograr os objetivos e metas para o sistema produtivo, definidos a partir das

    reflexes do captulo 7.

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    2. Dinmica dos investimentos no Brasil e no mundo

    2.1 Introduo

    O sistema produtivo de equipamentos mecnicos o corao da indstria mundial.

    Representa entre e 1/5 do valor adicionado total da indstria. Representa mais de 1/3 do

    comrcio exterior mundial e mais da metade do comrcio de bens manufaturados, com

    mais de US$ 4,4 trilhes em exportaes (ver Tabela 2.1). Produz as mquinas, produz os

    equipamentos de transporte que servem ao restante do tecido produtivo de uma economia.

    Atendem a prpria indstria, facilitam a expanso da infra-estrutura, determinam a

    competitividade da agricultura. So bens de capital, mas so tambm os bens de consumo

    durveis mais globais do mundo.

    Tabela 2.1 Mundo e pases selecionados: exportaes do sistema de equipamentos

    mecnicos, 1996 e 2006

    Exportaes (US$ bilhes correntes) Crescimento Mdio anual

    Participao no total mundial (%)

    Participao na pauta de exportaes totais (%)

    1996 2006 (% ao ano) 1996 2006 1996 2006

    BRIC 53,8 516,2 25,4 2,6 11,6 16,8 33,6 Brasil 9,5 33,4 13,4 0,5 0,8 19,9 24,2 Rssia 6,2 12,4 7,1 0,3 0,3 7,0 4,1 ndia 2,7 14,1 17,8 0,1 0,3 8,2 11,1 China 35,3 456,3 29,2 1,7 10,3 23,4 47,1

    Mxico 51,2 135,2 10,2 2,5 3,0 53,5 54,1 Coria do Sul 67,6 192,4 11,0 3,3 4,3 52,1 59,1 EUA 306,2 494,5 4,9 14,9 11,1 49,2 47,7 Alemanha 251,0 550,9 8,2 12,2 12,4 47,9 49,1 Japo 285,8 412,0 3,7 13,9 9,3 69,5 63,7

    Mundo 2.049,4 4.450,4 8,1 100,0 100,0 38,9 37,3

    Fonte: elaborao NEIT-IE-UNICAMP a partir de COMTRADE

    um sistema composto por segmentos maduros tecnologicamente4. Maduros, mas

    onde a inovao se faz presente como importante ferramenta competitiva. Inovao em

    produtos, por exemplo, atravs da introduo de componentes eletrnicos, seja para

    melhorar desempenho (tratores com instrumentos eletrnicos permitindo uma agricultura

    de preciso, mais produtiva; mquinas-ferramenta com controle numrico

    4 De acordo com UNCTAD (2005: 108) os setores mecnicos aqui estudados seriam considerados de mdia-alta intensidade tecnolgica (entre 1,5% e 5% de gastos em P&D sobre o valor bruto da produo) ou de mdia-baixa intensidade tecnolgica (0,7% a 1,5%, caso da indstria de construo naval).

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    computadorizado), seja para diferenciao mercadolgica (apelo de veculos equipados

    com GPS), seja para atender necessidades ambientais (motores menos poluentes).

    E inovaes em processo, principal espao para a atividade inovativa das empresas

    do sistema mecnico. Toda a revoluo na gesto da produo e da cadeia de suprimentos

    que se difundiu nas ltimas dcadas, com destaque para a chamada produo enxuta,

    flexvel e verdadeiramente internacionalizada, foi gestada, desenvolvida e levada ao

    extremo da eficincia produtiva nos diversos subsistemas de equipamentos mecnicos, em

    especial no caso do complexo automotivo.

    um sistema cuja oferta de seus produtos cresce de maneira consistente nos pases

    desenvolvidos e de maneira exponencial nos pases em desenvolvimento. Por exemplo, o

    valor adicionado na indstria de mquinas equipamentos nos pases em desenvolvimento

    cresceu 2,1% ao ano entre 1995-2000 e pulou para 8,9% ao ano entre 2000-2006. Nestes

    mesmos perodos, o valor adicionado neste segmento cresceu nos pases desenvolvidos

    0,9% e 2,1% ao ano (ver tabela 2.2). Este crescimento diferenciado provocou um forte

    aumento da participao dos pases em desenvolvimento na produo mundial (ver Tabela

    2.3).

    Tabela 2.2 - Pases selecionados: taxa de crescimento mdio anual do sistema de

    equipamentos mecnicos, 1995-2006 (em % ao ano)

    Mquinas e Equipamentos 1995-2000 2000-2006

    Pases desenvolvidos 0,9 2,1

    Pases em desenvolvimento 2,1 8,9

    Mundo 1,1 3,5

    Veculos automotores 1995-2000 2000-2006

    Pases desenvolvidos 4,5 2,6

    Pases em desenvolvimento 2,9 8,6

    Mundo 4,3 3,6

    Outros equipamentos de transporte 1995-2000 2000-2006

    Pases desenvolvidos 3,9 1,9

    Pases em desenvolvimento 9,1 16,0

    Mundo 5,4 7,7

    Fonte: elaborao NEIT-IE-UNICAMP a partir de UNIDO

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

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    Tabela 2.3 - Pases selecionados: distribuio do valor agregado industrial no sistema de

    equipamentos mecnicos, 1995-2006

    Mquinas e Equipamentos 1995 2006

    Pases desenvolvidos 82,2 74,8

    Pases em desenvolvimento 16,3 23,7

    Veculos automotores 1995 2006

    Pases desenvolvidos 85.0 80.7

    Pases em desenvolvimento 14,3 18,5

    Outros equipamentos de transporte 1995 2006

    Pases desenvolvidos 71,0 48,4

    Pases em desenvolvimento 27,0 50,2

    Fonte: elaborao NEIT-IE-UNICAMP a partir de UNIDO

    E mais, um sistema em que a oferta se deslocou de forma intensa para os pases

    em desenvolvimento, em princpio apenas como receptores de etapas finais de montagem,

    em funo de custos menores de mo de obra, mas que crescentemente assumiram

    posies mais sofisticadas na rede internacional de produo, inclusive no que tange ao

    desenvolvimento tecnolgico e, recentemente, no que se refere estrutura patrimonial. De

    fato, de forma crescente empresas do sistema originadas nos pases em desenvolvimento

    assumiram estratgias ativas de internacionalizao, inclusive adquirindo ativos (tangveis

    e intangveis) em pases centrais. Por exemplo, de acordo com os dados de WIR-

    UNCTAD, capitais originrios do bloco BRIC participaram como adquirentes de cerca de

    2,3% de todas as aquisies transfronteirias realizadas no perodo 2000-2006, totalizando

    quase U$$ 100 bilhes em compras. No perodo 1990-96, os quatro pases que formam o

    bloco adquiriam US$ 760 milhes em ativos no exterior, ou 0,6% do total. Alm disto, em

    2007, 7 das 100 maiores empresas transnacionais no-financeiras do mundo eram

    originrias de pases em desenvolvimento, num total de US$ 214 bilhes em ativos

    externos (UNCTAD, 2008).

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

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    Tabela 2.4 Pases em desenvolvimento: participao nos fluxos e estoques mundiais de

    IDE, 1990-2006 (em % do total mundial)

    Estoque recebido Estoque Enviado

    1990 2006 1990 2006

    Total 18,5 22,5 1,1 11,0

    Indstria total 19,4 20,4 0,9 3,9

    Mquinas e equipamentos 14,4 13,4 0,0 0,4

    Veculos e outros equipamentos de transporte 14,9 12,3 0,0 0,2

    Fluxos recebidos Fluxos enviados

    1989-1991 2004-2006 1989-1991 2004-2006

    Total 18,6 29,2 2,7 8,8

    Indstria total 25,3 43,3 4,2 4,8

    Mquinas e equipamentos 38,0 36,2 0,3 0,3

    Veculos e outros equipamentos de transporte 8,5 28,0 - 0,5

    Fonte: elaborao NEIT-IE-UNICAMP a partir de UNCTAD

    Enfim um sistema em que a internacionalizao da produo, seja em seu matiz

    comercial (ver Tabela 2.1), seja em seus aspectos de exportao de capitais (ver Tabela

    2.4), se faz cada vez mais presente.

    Tal internacionalizao difundiu-se para os pases em desenvolvimento por fatores

    associados a custos de produo (no caso dos pases que operam como plataformas de

    exportao) e/ou por causa das perspectivas de crescimento de seus mercados domsticos

    ou regionais. A descentralizao da produo foi comandada pelas empresas de capitais

    originrios dos pases desenvolvidos que, desta forma, foram ampliando uma rede

    internacional de produo que inclua suas filiais descentralizadas, mas tambm um

    conjunto de fornecedores com atuao local ou global que, crescentemente, assumiram

    maiores responsabilidades na cadeia de produo (UNCTAD, 2002).

    Este processo redistribuiu as competncias corporativas na cadeia (agora global) de

    valor. As grandes corporaes dos pases centrais, lderes do oligoplio mundial,

    concentraram-se na fronteira do desenvolvimento de inovaes, no design e no projeto de

    produtos, alm de outros ativos estratgicos (e.g. marketing, finanas), enquanto seus

    fornecedores mundiais, muitas vezes localizados nos pases em desenvolvimento, passaram

    a comandar a produo bsica, agregando menos valor do que no passado5.

    5 Para uma discusso terica deste processo, ver, por exemplo, Oman (1994), Chesnais (1996), Feenstra (1998) ou Sturgeon (2002). De qualquer forma, vale destacar que estes processos no ocorreram do forma exclusiva no sistema de equipamentos mecnicos, mas para grande parte das atividades industriais.

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

    11

    Este processo de desverticalizao foi observado para o conjunto da indstria, mas

    foi na de equipamentos mecnicos que se difundiu de maneira mais explcita. O atributo

    tecnolgico de competitividade, antes disponvel apenas para os produtores lderes nos

    pases centrais, foi flexibilizado pela desverticalizao da produo associada ao uso

    crescente de contedo importado, em especial de controles/processo eletrnicos. A difuso

    de kits de eletrnica embarcada, cada vez mais commoditizados, permitiu a difuso

    espacial das operaes de montagem e produo bsica dos equipamentos mecnicos, com

    manuteno dos padres de qualidade tcnica dos produtos finais, independentemente do

    local de produo.

    Esta reestruturao da indstria em nvel global confere, a um s tempo,

    oportunidades e riscos para a indstria mecnica de pases em desenvolvimento. Por um

    lado, permite a manuteno da estrutura industrial (nos pases j industrializados, como o

    Brasil) e a insero (no caso de pases asiticos, do Mxico e do Leste da Europa) numa

    rede internacional de produo descentralizada e intensiva em comrcio intra-industrial e

    intra-firma. Isto amplia as possibilidades de industrializao rpida e, em alguns casos

    (pases e setores), de posterior adensamento da estrutura industrial, incluindo o

    desenvolvimento autnomo de capacitaes tecnolgicas.

    Por outro lado, a reestruturao via desverticalizao com contedo importado,

    dissociada de polticas ativas de desenvolvimento industrial, impe aos pases em

    desenvolvimento riscos relacionados a uma nova forma de deteriorao dos termos de

    troca. Na verdade, esta industrializao rpida voltada s exportaes, com produo

    concentrada apenas na montagem ou na produo bsica com insumos importados e

    comandada pelas corporaes globais desverticalizadas, implicaria numa estrutura

    produtiva rarefeita, com baixa capacidade de promover encadeamentos setoriais e gerar

    emprego e renda nos pases em desenvolvimento6. Alm disto, as empresas locais teriam

    baixa capacidade de inovao (ficam restritas montagem, com baixos nveis de

    aprendizado e adaptao), de expanso de suas escalas econmicas e de sua rentabilidade.

    A indstria perderia sua capacidade de agregar valor, tanto nas exportaes, quanto na

    gerao de riqueza nos pases em questo.

    6 Ver Aykyz, 2005, para uma discusso abrangente deste tema.

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

    12

    Mas e o sistema no Brasil? O sistema produtivo mecnico crucial para a indstria

    nacional. Representa, desde 1996, cerca de 9% do valor adicionado, 8% do pessoal

    ocupado e 12% das vendas lquidas (ver Grfico 2.1 e Tabela 2.5, para os dados absolutos).

    Tabela 2.5 Brasil: fatos estilizados do sistema de equipamentos mecnicos, 1996-2006

    Ano Nmero de Empresas Pessoal Ocupado

    Salrio Mdio

    Receita Lquida de Vendas

    Valor Bruto da Produo Industrial

    Valor da Transformao Industrial

    Unidades Unidades R$/ano* R$ milhes** R$ milhes** R$ milhes**

    1996 3.550 393.709 27.871 101.807 95.496 39.3541997 3.469 400.310 27.764 108.185 101.243 41.0541998 3.616 362.089 29.902 98.726 91.149 37.7271999 3.833 360.288 27.369 90.694 85.892 31.9772000 3.821 380.468 27.241 104.180 98.046 37.6802001 3.961 397.186 27.420 115.142 107.359 39.7422002 4.667 421.999 25.219 123.503 115.830 44.3762003 4.831 489.020 26.036 138.190 129.746 47.2932004 4.770 526.843 25.208 155.696 147.784 51.5732005 5.138 518.508 26.262 163.211 153.609 50.4512006 4.852 520.825 27.566 162.308 149.008 52.178CM (% ao ano) 3,2 2,8 -0,1 4,8 4,5 2,9

    *A valores de dez/2006, corrigidos pelo IPCA. **A valores de dez/2006, corrigidos pelo Deflator Contas Nacionais (indstria)

    Fonte: elaborao NEIT-IE-UNICAMP a partir de PIA-IBGE

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    13

    Grfico 2.1 Brasil: participao do sistema de equipamentos mecnicos no conjunto da

    indstria de transformao, mdias anuais 1996-98 e 2004-2006 (em %)

    3,3

    8,0

    12,5

    12,1

    11,9

    9,4

    0,0 2,0 4,0 6,0 8,0 10,0 12,0 14,0

    Nmero de Empresas

    Pessoal Ocupado

    Gastos de Pessoal

    Receita Lquida de Vendas

    Valor Bruto da Produo Industrial

    Valor da Transformao Industrial

    1996-1998 2004-2006

    Fonte: elaborao NEIT-IE-UNICAMP a partir de PIA-IBGE

    Alm disto, cerca de 1/3 das empresas do sistema podem ser consideradas

    inovadoras, o que acompanha a mdia da indstria nacional. No entanto, mais da metade

    das empresas inovadoras no sistema promoveu inovaes de produto no perodo 2000-

    20057. E mais, as empresas do sistema representaram, em 2008, 18% das vendas externas

    totais do Brasil e 40% das exportaes de manufaturados, inclusive com exportaes para

    mercados maiores e mais dinmicos (36% das exportaes do sistema vo para o NAFTA

    ou para a UE:). Ainda assim, so os pases da Amrica Latina que concentram os

    supervits comerciais do sistema, configurando-se com os mais importantes destinos destas

    exportaes (ver tabela 2.6)

    7 Alm disto, o conjunto de empresas do sistema produtivo mecnico gastam 0,9% da receita lquida de vendas com P&D interno s empresas. Todos os dados extrados da PINTEC-IBGE, vrios anos.

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    14

    Tabela 2.6 Brasil: comrcio exterior do sistema de equipamentos mecnicos, por

    captulos NCM e regies, 2008 (em US$ milhes)

    EXPORTAES NCM Descrio Mercosul Nafta Aladi UE sia Resto do Mundo Total

    84 Reatores nucleares, caldeiras, mquinas, aparelhos e instrumentos mecnicos

    3.048 3.259 1.429 2.373 538 1.901 12.549

    85 Mquinas, aparelhos e materiais eltricos 2.546 1.512 1.053 758 214 809 6.892

    87 Veculos automotores, tratores 6.669 2.194 1.584 1.904 180 2.141 14.672

    89 Embarcaes e estruturas semelhantes 26 867 0,2 3,4 628 16 1.541

    Total Sistema 12.289 7.832 4.067 5.039 1.560 4.868 35.654 Total Brasil 26.934 33.604 11.414 46.409 35.220 44.622 198.203

    IMPORTAES NCM Descrio Mercosul Nafta Aladi UE sia Resto do Mundo Total

    84 Reatores nucleares, caldeiras, mquinas, aparelhos e instrumentos mecnicos

    553 6.457 22 8.814 8.526 1.274 25.645

    85 Mquinas, aparelhos e materiais eltricos 177 2.603 4 3.233 13.157 787 19.962

    87 Veculos automotores, tratores 4.297 1.778 40 3.528 3.012 218 12.873

    89 Embarcaes e estruturas semelhantes 2,0 47,3 0,2 15,1 4,8 2,1 72

    Total Sistema 5.030 10.885 66 15.591 24.700 2.281 58.553 Total Brasil 15.445 31.953 8.816 36.181 43.003 37.729 173.127

    SALDO NCM Descrio Mercosul Nafta Aladi UE sia Resto do Mundo Total

    84 Reatores nucleares, caldeiras, mquinas, aparelhos e instrumentos mecnicos

    2.495 -3.198 1.407 -6.441 -7.988 628 -13.096

    85 Mquinas, aparelhos e materiais eltricos 2.368 -1.091 1.049 -2.475 -12.944 22 -13.070

    87 Veculos automotores, tratores 2.372 417 1.544 -1.624 -2.832 1.923 1.799

    89 Embarcaes e estruturas semelhantes 24 819 0 -12 624 14 1.469

    Total Sistema 7.260 -3.053 4.000 -10.552 -23.140 2.587 -22.898 Total Brasil 11.490 1.651 2.599 10.228 -7.783 6.893 25.077

    Fonte: elaborao NEIT-IE-UNICAMP a partir de SECEX

    O sistema de equipamentos mecnicos no Brasil logrou atingir, ao longo dos

    ltimos 20 anos, um padro de qualidade global no que tange montagem destes produtos.

    A modernizao das plantas, a adoo de novos processos produtivos, incluindo a

    desverticalizao e outras formas de integrao com a cadeia de fornecedores, e o

    crescente uso de insumos tecnolgicos importados, permitiu que as empresas brasileiras

    remanescentes do duro processo de liberalizao comercial dos anos 90, sobretudo as

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

    15

    filiais de empresas transnacionais, se aproximassem do estado-da-arte nos processos de

    montagem industrial no sistema mecnico8.

    Esta reestruturao defensiva preservou uma estrutura produtiva menos densa do

    que nos anos 80, mas relativamente competitiva nas etapas finais das cadeias de produo.

    Isto foi particularmente explcito no caso do complexo automotivo e no caso de mquinas

    agrcolas. A indstria de bens de capital seriados tambm se beneficiou deste processo,

    mas com resultados heterogneos em seus diversos subsegmentos. J o subsistema de

    construo naval, que iniciou uma ainda incipiente re-industrializao apenas no incio

    desta dcada, ainda no logrou atingir tal estado-da-arte.

    importante ressaltar que o desadensamento da indstria pode ter ocorrido de

    forma seletiva. Pode-se formular a hiptese de tenha ocorrido um desadensamento

    horizontal no sentido em que foram preservadas todas as etapas da produo industrial no

    Brasil, mas que, em cada uma delas h uma reduo de linhas de produtos produzidas

    localmente. Ou seja, os elos fornecedores atendem aos elos a jusante atravs de um mix de

    produtos com maior e menor contedo importado. Produzem algumas linhas, importam e

    estocam outras linhas (em geral, mais sofisticadas) de produtos finais e/ou de

    componentes. E fornecem estes conjuntos ou peas isoladas de origem diversas aos seus

    clientes montadores sempre a partir de operaes localizadas no Brasil. Este processo no

    facilmente captado pelas estatsticas industriais, mas pode ser observado pela pesquisa

    qualitativa que, em parte, este estudo realizou.

    De qualquer forma, possvel observar qualitativa e quantitativamente que houve,

    de maneira geral, um ganho de competitividade nas etapas de montagem final. Ganho que

    se revelou no apenas no atendimento da crescente demanda interna num contexto de

    maior liberalizao comercial com cmbio quase sempre valorizado (1993-99 e 2005-

    2008), mas tambm na ampliao das exportaes de manufaturados, ocupando, sobretudo,

    mercados na Amrica Latina9, mesmo sem se configurar como uma plataforma de

    exportao (como o caso do Leste europeu, pases do sudeste da sia e mesmo o

    Mxico).

    8 H ainda espao para catch-up no que se refere automao eletrnica de alguns processos. Outra exceo marcante, no caso dos subsistemas aqui estudados, a indstria de construo naval, que iniciou seu processo de reestruturao em direo montagem com contedo importado e novos processos produtivos pelo menos uma dcada aps os outros segmentos. Ver captulo 5 para uma discusso mais completa deste tema. 9 Entre 1998 e 2008 as exportaes do sistema mecnico cresceram 12% ao ano para Mercosul e Aladi (excluindo Mxico). Estas regies responderam, em 2008, por 46% das exportaes do sistema (ver Tabela 2.6).

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

    16

    Ou seja, a demanda interna e a externa localizada permitiram que a indstria

    mecnica brasileira, reestruturada, focada na montagem e relativamente menos densa,

    resistisse s adversidades da liberalizao com valorizao comercial. Cabe perguntar se

    esta competitividade limitada a uma etapa da cadeia de valor suficiente para capturar as

    oportunidades de crescimento da demanda na prxima dcada. Vale discutir se esta

    configurao suficiente para afastar os principais riscos da advindos, a saber, a baixa

    capacitao tecnolgica, o posicionamento em segmentos de menor valor agregado,

    enfraquecimento das empresas de capital nacional, a ameaa crescente da concorrncia

    internacional, e o risco de desnacionalizao.

    Respostas a estas perguntas comearo a ser discutidas no restante deste captulo e,

    em especial, no captulo 8, onde ser debatido um balano das oportunidades e riscos que

    esta estrutura da indstria mecnica brasileira enfrentar na dinmica do investimento dos

    prximos anos.

    2.2 Desafios e oportunidades associadas s mudanas nos padres de

    demanda mundial e nacional

    O sistema de equipamentos mecnicos relativamente maduro em termos

    tecnolgicos e parece ter esgotado sua capacidade autnoma de dinamizar seus

    investimentos. De maneira geral, os investimentos deste sistema so demand pull. a

    demanda que se configura como o principal driver dos investimentos.

    A demanda por bens de consumo durveis, associados ao crescimento da renda e

    expanso e acessibilidade ao crdito, crucial para a dinmica dos investimentos no

    complexo automotivo. O crescimento da renda e o aumento da formao bruta de capital

    fixo tm efeito sobre os investimentos em bens de capital seriados. Neste mesmo sentido, a

    demanda por alimentos tem significativos efeitos sobre o subsetor de mquinas agrcolas.

    Por fim, a demanda por meios de transporte de mercadorias, associada ao crescimento da

    demanda mundial, descentralizao da produo e ao aumento do comrcio exterior,

    interferem ativamente na configurao da oferta de equipamentos de transporte, tanto os

    martimos como os rodovirios.

    Portanto, o aumento da demanda agregada o principal vetor dinmico dos

    investimentos no sistema de equipamentos mecnicos. Investimentos que se concentram,

    sobretudo, no aumento da capacidade produtiva. Tal expanso da oferta pode vir

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

    17

    acompanhada do investimento em modernizao e internacionalizao da produo, assim

    como de investimentos em desenvolvimento de inovaes (especialmente em processo),

    que continuaro a cumprir papel crucial na reduo dos custos de produo.

    Diante deste quadro espera-se que, na prxima dcada, a demanda pelos produtos

    mecnicos cresa de maneira elstica nos pases em desenvolvimento e de maneira

    marginal nos pases centrais. Os principais vetores deste crescimento da demanda, que por

    sua vez comandaria a dinmica dos investimentos no setor mecnico, poderiam residir nos

    seguintes processos:

    1. Crescimento da renda e da renda per capita em pases em

    desenvolvimento: o crescimento sistemtico da renda nos pases perifricos

    ampliar o consumo agregado de bens de consumo durveis e no-durveis

    (e/ou de bens-salrio), inclusive de alimentos, criando oportunidades para a

    expanso (e relocalizao na periferia) da capacidade produtiva de bens

    mecnicos, seja de forma direta (como no caso de automveis), seja

    indiretamente, como no caso das mquinas agrcolas (via expanso da

    agricultura), bens de capital (via investimentos de outros setores) e

    construo naval (via aumento das necessidades de transporte martimo).

    2. Expanso da oferta de infra-estrutura: o crescimento sustentvel nos

    pases perifricos passa pela ampliao dos investimentos em infra-

    estrutura. O mesmo vale para nos pases centrais que, imersos em profunda

    recesso, podero encontrar nos gastos com a renovao e a modernizao

    da infra-estrutura um importante espao para as polticas anti-cclicas que

    devero conduzir nos prximos anos. Em ambos os casos, surgem

    oportunidades para um crescimento significativo da demanda por

    equipamentos mecnicos (sobretudo bens de capital sob encomenda) e,

    desta forma, por ampliao dos investimentos neste sistema.

    3. Ampliao do consumo ecologicamente sustentvel: um novo padro de

    demanda que criar ou expandir novos mercados de bens de consumo

    durveis (e.g. carros com nova motorizao) e no-durveis (e.g. alimentos

    orgnicos, embalagens reciclveis); em ambos os casos, haver necessidade

    de reconverter parte da oferta de equipamentos mecnicos, o que dever,

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

    18

    por sua vez, provocar rodadas de investimento neste sistema, tanto nos

    pases centrais, quanto nos emergentes.

    4. Busca por segurana energtica: a expanso de demanda por energia

    tradicional com novos mtodos de gerao e extrao (e.g. hidrocarbonetos

    em guas ultra-profundas) e por novas fontes de energia renovveis,

    provocar efeitos na indstria de mquinas e equipamentos, inclusive

    mquinas agrcolas (destinadas, por exemplo, expanso da produo de

    bioenergia) e construo naval.

    Todos estes casos apontam para oportunidades significativas para investimentos no

    sistema de equipamentos mecnicos nos pases desenvolvidos e, especialmente, nos pases

    em desenvolvimento. No caso do Brasil, todos os vetores da demanda se fazem presentes,

    tanto no que respeita ao mercado domstico (crescimento da renda e da demanda por bens

    de consumo, investimentos em infra-estrutura e energia, com destaque para o pr-sal),

    quanto no que se refere s oportunidades com drivers de demanda externa (por alimentos,

    bioenergia, e equipamentos de transportes, neste caso, destinados para pases em

    desenvolvimento).

    Como ser melhor discutido nos captulos 7 e 8, o desenvolvimento competitivo do

    sistema brasileiro de equipamentos mecnicos seria crucial para que as empresas do pas

    possam capturar estas oportunidades associadas expanso da demanda, interna e

    externa. Na viso deste estudo, investimentos em aumento da capacidade, modernizao e

    ampliao da capacidade de inovao da indstria mecnica brasileira seriam cruciais para

    que o pas transformasse estas oportunidades em crescimento concreto e desenvolvimento

    scio-econmico sustentvel na prxima dcada.

    Em outras palavras, um sistema de equipamentos mecnicos fortalecido por

    investimentos estratgicos seria o eixo fundamental para que a expanso inexorvel da

    demanda por bens de consumo, o crescimento do setor agrcola e a exploso do setor de

    energia no Brasil possam, de fato, alavancar a gerao de emprego e renda no pas e

    transformar sua estrutura scio-econmica. Ou seja, investimentos neste sistema poderiam

    evitar tanto o crescimento da oferta atravs de importaes e/ou de produo local com

    elevado contedo importado de bens de consumo, quanto a especializao regressiva em

    direo produo de bens primrios agrcolas e energticos, incapazes, per se, de

    ampliarem a agregao de valor no pas.

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

    19

    Por outro lado, os riscos associados a esta configurao da demanda residem no

    forte aumento da concorrncia tanto de pases centrais, quanto de pases em

    desenvolvimento, em especial para os potenciais rivais da produo de bens de consumo e

    bens de capital destinados produo dos ltimos. Um mercado domstico em expanso e

    uma ampliao dos investimentos agrcolas e em energia certamente ampliaro a

    concorrncia externa, consubstanciada pelo aumento das importaes e/ou pela massiva

    desnacionalizao e desadensamento da indstria nacional. A inexistncia de

    conglomerados e/ou de empresas de capital nacional detentoras de vantagens de

    propriedade e com capacidade de competir globalmente fragiliza as empresas nacionais, do

    ponto de vista produtivo, mercadolgico e financeiro. Sem os investimentos adequados no

    sistema nacional de equipamento mecnicos, inclusive fortalecendo empresas de capital

    nacional, tais riscos seriam potencializados.

    2.3 Desafios e oportunidades associadas s mudanas nos padres de

    concorrncia e regulao

    Mudanas nos padres de concorrncia e de regulao tero nos prximos anos um

    papel menos importante do que a demanda como vetor do investimento no sistema de

    equipamentos mecnicos. No entanto, preciso reconhecer que pode haver influncia

    significativa em alguns dos subsistemas. Se no, vejamos.

    Em primeiro lugar, a crise financeira de 2008-2009, seguida por forte recesso nos

    pases desenvolvidos e nos pases que atuam como plataformas produtivas para a

    exportao para estes mercados centrais, provocaro efeitos na dinmica concorrencial

    do sistema como um todo. Haver excesso de capacidade em relao demanda em queda,

    o que implicar nos efeitos abaixo, isoladamente ou em conjunto:

    a) reconfigurao patrimonial, em direo concentrao do capital. No caso

    de oligoplios globais (como o complexo automotivo) este processo de

    ajuste ser mais rpido e abrangente10;

    b) reestruturao da rede internacional de produo, com fechamento ou

    relocalizao de plantas, de modo a reduzir a capacidade instalada e/ou 10 Por exemplo, a dbcle da GM e da Chrysler foi rapidamente equacionada no primeiro semestre de 2009 com a venda de ativos para outras empresas automobilsticas lderes (FIAT adquirindo Chrysler ), para produtores independentes (Saab-GM para Koenigsegg da Sucia) ou para produtores de autopeas (Opel-GM para Magna do Canad e Hummer-GM para Sichuan Tengzhong Heavy Industrial Machinery Company da China). Ver New York Times (2009a, b, c, d).

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

    20

    racionaliz-la em termos globais. Pode haver, inclusive, redirecionamento

    da produo para os pases centrais, nos quais as polticas de gerao de

    emprego no podero prescindir de alguma forma de re-adensamento

    industrial, caso especial dos EUA;

    c) arrefecimento da liberalizao comercial, to importante para a

    descentralizao da produo, que poder promover tambm alguma forma

    de redistribuio da produo mundial de equipamentos mecnicos. Notar

    que construo naval e indstria automobilstica so dois dos segmentos

    industriais mais comercialmente protegidos, inclusive em pases

    desenvolvidos (especialmente na UE), e, portanto, os coloca como

    protagonistas neste processo de interrupo da liberalizao ou mesmo de

    recrudescimento de protecionismo.

    Em segundo lugar, com a ascenso do governo Obama parece haver um maior

    consenso para a implementao de maior regulao econmica no mundo, seja dos fluxos

    financeiros internacionais, seja dos padres de emisses de poluentes, por exemplo. Tais

    regulaes tero efeitos sobre a dinmica de todos os investimentos transfronteirios, por

    exemplo, se isto implicar em limitao de parasos fiscais, sede contbil de muitas das

    maiores empresas transnacionais11, e sobre a oferta de equipamentos mecnicos, em

    especial aqueles ligados ao complexo automotivo e construo naval.

    A regulao sobre os fluxos financeiros e sobre a alavancagem pode ainda

    promover mudanas significativas na dimenso financeira das decises de investimento e

    produo. Por um lado, pode diminuir a presso que os blocos de capitais financeiros

    exerceram nos ltimos anos sobre a gesto das empresas produtivas, direcionando-as para

    processos que maximizassem a valorizao das aes em detrimento da expanso

    sustentada da competitividade. Esta financeirizao da atividade produtiva teve grande

    influncia na desverticalizao e descentralizao da produo. Um recuo neste processo

    pode, tal como no item b) acima, promover uma nova reconfigurao da indstria mundial,

    uma vez que a presso sobre reduo de custos (que havia sido facilitada pela

    desverticalizao internacionalizada) poder ser um pouco menor. A construo de

    capacitaes competitivas de longo prazo poderia se tornar novamente o objetivo central

    da gesto das empresas produtivas, inclusive naquelas de equipamentos mecnicos. Neste

    11 Ver Zeleny (2009).

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

    21

    caso, a propriedade de ativos produtivos pode voltar a cumprir papel central na cadeia de

    valor, o que, por sua vez, poderia promover esta reconfigurao na estrutura industrial

    mundial.

    J regulao ambiental, em direo a maiores controles sobre a emisso de

    poluentes, por exemplo, ter efeitos sobre os mercados de veculos como um todo e sobre

    bens de capital. Haver presso para a acelerao de pesquisas e introduo nos mercados

    de solues de motorizao menos intensivas em combustveis fsseis. A busca por novas

    fontes de energia renovveis ter efeitos importantes sobre a demanda por mquinas e

    equipamentos, inclusive mquinas agrcolas. Na verdade, uma mais intensa regulao

    ambiental poder catalisar os efeitos discutidos anteriormente no item 2.2, em que a

    demanda crescente por produtos e solues de gerao de energia ecologicamente

    sustentveis acelerar os investimentos em P&D. A introduo macia de novos produtos

    poder gerar reflexos na produo (e nos investimentos) do complexo automotivo

    (investimento em P&D e expanso de capacidade para renovao de frota), da construo

    naval (motores mais eficientes, reciclagem de navios sucateados, cascos duplos) e, em

    menor grau, dos bens de capital seriados.

    Em suma, mudanas no padro de concorrncia (associadas reconfigurao

    patrimonial ps-crise) e nos marcos regulatrios (das finanas globalizadas e do meio

    ambiente) podem ter efeitos sobre a estrutura produtiva do sistema mecnico. As

    oportunidades para os pases em desenvolvimento neste ambiente de reestruturao

    derivada de mudanas nos padres de concorrncia e regulao podem ser associadas a:

    a) Aproveitar a reestruturao patrimonial global e possibilitar que empresas

    de capital nacional adquiram ativos produtivos, mercadolgicos e

    tecnolgicos de empresas desvalorizadas nos pases centrais e mesmo em

    outros em desenvolvimento. Neste contexto de reestruturao, empresas

    capitalizadas de pases em desenvolvimento encontrariam espaos propcios

    para uma internacionalizao estratgica, que v alm da aquisio de

    capacidade produtiva no exterior;

    b) Aproveitar a reconfigurao produtiva global para que tais pases se

    reposicionem ativamente nas redes globais de produo, seja atravs de

    ganhos de importncia das filiais locais de empresas transnacionais, seja

    atravs do adensamento da cadeia produtiva;

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

    22

    c) Aproveitar a mudana em direo a uma matriz energtica menos

    dependente de combustveis fsseis e dinamizar os investimentos

    associados gerao de bioenergia, em especial alguns bens de capitais

    mecnicos e mquinas agrcolas.

    No entanto, estes mesmo processos impem riscos aos pases em desenvolvimento.

    Empresas de muitos destes pases no podero adquirir ativos tangveis e intangveis,

    ampliando sua competitividade. Antes, devem se tornar alvos de aquisies,

    desnacionalizando-se ainda mais o tecido produtivo local. Alm disto, as filiais locais das

    empresas transnacionais podem perder relevncia na corporao global, esvaziando a

    produo domstica e as exportaes.

    O recrudescimento do protecionismo comercial tambm pode frear exportaes e

    ampliar conflitos comerciais. Num contexto de deflao dos preos e possvel aumento

    das importaes industriais, este efeito de penetrao no mercado domstico e na estrutura

    patrimonial da empresas de capital nacional ser ainda maior, oferecendo riscos aos

    investimentos e incipiente oportunidade de internacionalizao destas empresas.

    Alm disto, uma nova finana internacional mais regulada poderia promover o

    encolhimento dos mercados de capitais, com menores espaos para emisses primrias de

    aes e com relativa contrao crdito (intermediado por bancos, ou atravs de captao

    direta), fato que alteraria as condies de financiamento ao investimento produtivo, o que,

    por sua vez, pode adiar projetos de expanso de capacidade, de internacionalizao ou de

    modernizao, inclusive na indstria mecnica dos pases em desenvolvimento, mais

    dependente de capital de terceiros.

    Por fim, uma regulao que consolide e amplie o uso de novas fontes de energia

    pode ampliar a importncia da periferia como exportadora de bens primrios energticos

    (no caso do Brasil, associados ao etanol), sem que se crie uma estrutura produtiva

    associada ao crescimento desta fonte de divisas. O mesmo vale para o petrleo leve a ser

    extrado de guas ultra-profundas e cujo marco regulatrio se encontra em discusso em

    2009: h risco concreto de o Brasil tornar-se um exportador de petrleo bruto, criando

    baixos encadeamentos para a indstria domstica, na qual o sistema de equipamentos

    mecnicos claramente se beneficiaria.

    Ser discutido, sobretudo nos captulo 7 e 8 que este risco poderia ser minimizado

    pela adoo de polticas de apoio que, a um s tempo, explorem esta riqueza energtica e

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

    23

    criem condies de internalizao de equipamentos mecnicos a serem utilizados pela

    indstria de energia e seus elos a jusante.

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    24

    2.4 Desafios e oportunidades associadas s mudanas tecnolgicas

    Como j foi discutido, o sistema de equipamentos mecnicos relativamente

    maduro em termos tecnolgicos. O esforo inovativo concentra-se majoritariamente em

    processos produtivos, conferindo menor importncia relativa mas no desprezvel - para

    a inovao em produtos. H esforo de adaptao e modernizao de produtos, mas a

    dinmica do investimento neste sistema no ser afetada de forma significativa por

    mudanas tecnolgicas nos prximos anos.

    Por exemplo, o crescente uso de novos materiais sintticos em substituio ao

    ao, em todo tipo de equipamento. Nos veculos comerciais, esta uma tendncia

    consolidada. Mas h pouca evidncia que este uso alterar as perspectivas de investimento

    no setor, justamente porque no promoveu, at o momento, nenhuma mudana

    significativa na forma de produzir os equipamentos12.

    O mesmo vale para o uso de eletrnica embarcada, que foi includa em todos os

    equipamentos de forma crescente. Mquinas-ferramenta com controle numrico

    computadorizado, veculos com telemetria, sofisticados controles de navegao ou ainda

    equipamentos que aumentem a preciso das mquinas agrcolas. Todos os subsistemas

    incluram, nos ltimos anos, componentes eletrnicos que aumentaram a preciso, a

    produtividade e a eficincia dos produtos para seus usurios. Mas pouco destas inovaes

    alteraram a dinmica do investimento no sistema de equipamentos mecnicos. As empresas

    do sistema so usurias desta tecnologia, seu desenvolvimento no endgeno mecnica.

    A possvel exceo a esta baixa influncia da tecnologia sobre a dinmica dos

    investimentos ocorreria apenas em um dos subsistemas estudados, a saber, o de

    autoveculos. Em funo de mudanas nos padres de demanda e por fora da regulao

    ambiental, h uma premente necessidade de substituir as formas tradicionais de propulso

    nos equipamentos de transporte, usurios de combustveis fsseis. Por esta razo,

    praticamente todas as empresas lderes, e mesmo produtores independentes (e.g. Tesla

    Motors13), tm empenhado grandes esforos de P&D em busca de novas solues que,

    12 Uma exceo possvel a crescente exigncia de montagem em salas limpas, sobretudo para equipamentos de preciso, o que pode motivar investimento.

    13 Em maio de 2009, a Daimler-Benz adquiriu 10% de participao nesta empresa antes completamente independente da Califrnia que, at 2009 havia vendido mais de 500 veculos esportivos movidos inteiramente motores eltricos, na faixa de US$ 50 mil a US$ 100 mil cada.

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    25

    muitas vezes, so excludentes entre si. O captulo 4 lista trs cenrios provveis para as

    prximas dcadas:

    a) Transio para novas tecnologias com a difuso de uma motorizao mais

    eficiente com combustveis fsseis e motorizao flexvel com uso puro ou com

    possveis combinaes de combustveis e motores (baterias, clulas de

    combustvel e combustveis renovveis como o etanol), mas sem a

    predominncia de um tipo sobre o outro;

    b) predominncia dos veculos hbridos eltricos um motor eltrico e um motor

    de combusto interna de combustvel fssil;

    c) difuso de tecnologia de clulas de combustvel, a partir de reaes

    eletroqumicas de hidrognio.

    No estaria claro qual dos cenrios seria predominante, mas possvel perceber

    estas novas tecnologias alteraro o produto e a forma de produzi-lo, o que certamente

    implicar em mudanas na dinmica dos investimentos e na estrutura da concorrncia no

    segmento. Neste contexto de indefinio tecnolgica, ainda que haja espao e

    oportunidades para empresas independentes (inclusive de pases emergentes) romperem

    as barreiras entrada tradicionalmente elevadas do complexo automotivo, pouco

    provvel que a dinmica do processo no seja comandada pelas lderes do oligoplio

    mundial, que tm participado ativamente do esforo inovativo (com pouca disperso de

    projetos, isto , todas estariam com presena na tecnologia dominante) e, portanto, estaro

    em melhores condies para se aproveitar da consolidao da nova tecnologia.

    Os riscos para os pases em desenvolvimento que tm estrutura produtiva no

    complexo automotivo (como o Brasil) estariam associados perda de importncia das

    filiais locais das montadoras, uma vez que a produo poderia se relocalizar neste novo

    contexto tecnolgico (que exigiriam plantas com escalas menores, por exemplo). Tambm

    os fornecedores de autopeas tradicionais poderiam ser prejudicados, sobretudo porque os

    novos carros empregariam menores quantidades de peas e teriam menor complexidade

    mecnica de seus componentes (insumos eltricos, eletrnicos e de software seriam mais

    relevantes que os controles mecnicos e hidrulicos, por exemplo).

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    26

    Concluso: respostas crise de 2008-2009

    Como foi observado, este um sistema que, tanto no Brasil, como no resto do

    mundo, estar no centro das transformaes econmicas que se seguiro ecloso da crise

    econmica mundial de 2008. Dentre as dvidas e efeitos podem ser destacados:

    a) Haver recrudescimento do protecionismo?

    b) Haver nova relocalizao da produo nos pases centrais, em detrimento dos

    pases em desenvolvimento?

    c) A consolidao de um novo padro de consumo, mais tico e responsvel,

    inclusive em termos ambientais, implicar em inovaes tecnolgicas de

    processos e produtos (e.g. em direo a produtos ecologicamente corretos)?

    d) Haver uma crise de super-oferta que levar a uma intensa rodada de

    concentrao de capital?

    e) Neste sentido, que papel tero as empresas de capital originado na periferia,

    mas supostamente mais capitalizadas do que as lderes mundiais?

    Estas e muitas outras perguntas sobre os efeitos da crise surgiro nos prximos

    anos. Suas respostas ajudaro a compreender quais as reais oportunidades e desafios que

    empresas brasileiras do sistema mecnico enfrentaro no mdio e no longo prazo.

    Acerca deste debate, este trabalho considera que:

    a) O mundo enfrentar, nos prximos anos, uma possvel interrupo da marcha

    liberalizante que se intensificou desde os anos 80, o que resultar em riscos e

    oportunidades para a indstria brasileira de equipamentos mecnicos. Por um

    lado, o protecionismo poder inibir as exportaes de manufaturados, em

    especial para a Amrica do Norte. Por outro lado, prolonga-se no tempo o

    espao relativamente protegido destas indstrias no Brasil (com exceo de

    autopeas e alguns bens de capital beneficiados com ex-tarifrios), o que pode

    estimular a consolidao competitiva de filiais locais de empresas

    transnacionais e mesmo de empresas de capital nacional.

    b) possvel que tambm seja interrompida o deslocamento da produo de

    equipamentos mecnicos para os pases em desenvolvimento especializados em

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

    27

    montagem e exportao para os mercados centrais. A necessidade de gerar

    empregos industriais nestes pases, em especial nos EUA, dever conter este

    amplo deslocamento, que parecia inexorvel at a ecloso da crise e do desenho

    preliminar das polticas de recuperao anunciadas. No entanto, pases que j

    consolidaram uma densa estrutura industrial e que tm amplos mercados

    domsticos/regionais podero permanecer como loci privilegiados da produo

    industrial mundial. So exemplos destas possibilidades os pases do chamado

    BRIC, com destaque para a China e o Brasil.

    c) bastante provvel que haja uma crescente mudana dos padres de consumo

    nos pases centrais, em direo ao consumo ambientalmente mais responsvel,

    o que pode retrair a demanda por equipamentos mecnicos, em especial

    equipamentos de transporte com motores de combusto interna. O mesmo deve

    ocorrer, em muito menor escala, nos pases em desenvolvimento. Tal mudana

    deve acelerar o desenvolvimento de novas tecnologias, o que deve alterar a

    dinmica dos investimentos, sobretudo no complexo automotivo.

    d) Certamente os efeitos da crise promovero rodadas de concentrao do capital

    em nvel mundial, devido ao encolhimento da demanda e s conseqentes

    dificuldades econmicas das corporaes. Por exemplo, um dos mais atingidos

    setores, o complexo automotivo, inaugurou em 2009, uma onda de

    consolidao de alcance global, com a dbcle de Chrysler e da GM, e o

    crescimento da FIAT, de empresas de autopeas (MAGNA) e de empresas de

    pases em desenvolvimento. O mesmo deve ocorrer na indstria naval,

    duramente atingida pela retrao do comrcio exterior e nos bens de capital

    seriados. As fuses e aquisies redesenharo os oligoplios mundiais, o que

    abre oportunidades para as corporaes que sarem vitoriosas deste processo.

    e) Neste sentido, as empresas de capital originrio de pases em desenvolvimento

    se depararo com oportunidades associadas a esta rodada de consolidao

    patrimonial. Corporaes capitalizadas (por exemplo, na ndia, China e Brasil)

    encontrariam excelentes oportunidades para consolidar e ampliar sua incipiente

    capacidade de internacionalizao, adquirindo ativos estratgicos em pases

    centrais. Ativos que permitiro aumento de competitividade, seja porque

    ganharo escala internacional, seja porque tero a acesso a ativos tangveis e

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

    28

    intangveis de cunho comercial (marcas, canais de distribuio) e/ou

    tecnolgico.

    Enfim, a viso deste trabalho o que sistema de equipamentos mecnicos crucial

    para que a indstria brasileira possa se aproveitar de maneira plena dos eixos do

    crescimento e do investimento nos prximos anos. O eixo crescimento da renda e expanso

    do consumo de bens durveis e no-durveis, o eixo agronegcio, que consolidar o Brasil

    como lder mundial; o eixo energia, motivado no apenas pelas descobertas no pr-sal, mas

    tambm no que respeita aos bicombustveis e outras fontes de energia, e o eixo infra-

    estrutura, cujos prementes investimentos podero sustentar a demanda por equipamentos

    mecnicos por muitos anos. Como isto poder ser realizado o objeto de discusso dos

    prximos captulos.

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    29

    3. Dinmica dos investimentos no setor de Bens de Capital Seriados14

    3.1 Introduo

    Reconhecendo a profunda heterogeneidade do subsetor em anlise neste captulo,

    optou-se aqui por restringir a denominao bens de capital ao setor produtor de

    mquinas e equipamentos, em que seus produtos so comumente classificados segundo as

    suas especificidades tcnicas. Os bens de capital seriados seriam aqueles produzidos em

    larga escala, com padronizao de projeto. Por outro lado, os bens de capital sob

    encomenda seriam aqueles produzidos segundo caractersticas tcnicas associadas a cada

    processo produtivo, projetados e fabricados sob medida. O objeto de anlise do presente

    estudo sero os primeiros.

    Ainda que a denominao seriados sugira certa homogeneidade dos bens em

    questo, na verdade trata-se de um segmento ainda bastante heterogneo em termos de

    produtos e de estrutura de oferta. Os equipamentos se prestam a diversos usos, utilizando

    diferentes paradigmas tecnolgicos, o que acaba acarretando na convivncia de empresas

    produtoras com os mais variados perfis grandes e pequenas, modernas e antiquadas.

    Por produzir especialmente bens de tecnologia madura, as barreiras entrada so

    relativamente baixas e a concorrncia entre produtores se d prioritariamente em preos,

    fazendo das economias de escala um importante fator competitivo. A heterogeneidade dos

    produtos, entretanto, confere maior ou menor grau de importncia tecnologia como fator

    competitivo dependendo do segmento de atuao das empresas (Santos e Piccinini, 2008).

    A fronteira tecnolgica estaria na mecatrnica - a incorporao da eletrnica aos

    bens mecnicos. A ampliao do contedo eletrnico e de software dedicado em todos os

    segmentos do setor teria elevado ainda mais a heterogeneidade entre os fabricantes e o

    espectro de oferta de produtos (Alm e Pessoa, 2005).

    Segundo Avelar (2008), este setor se destacaria pela importncia do aprendizado

    tecnolgico no ato de fazer (learning by doing) e pelo desenvolvimento com pesquisas

    internas firma, ou com parcerias, de novos produtos e processos (learning by searching),

    de forma que o esforo tecnolgico das empresas estaria, em grande parte, relacionado ao 14 Este captulo uma edio do trabalho realizado por Beatriz Bertasso (NEIT-IE-UNICAMP) no mbito da pesquisa Perspectivas do Investimento no Brasil.

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    30

    dinamismo mercado demandante de mquinas. Compradores que atuam em mercados em

    expanso e fortemente competitivos naturalmente questionariam a capacidade inovativa

    dos seus fornecedores.

    Outra fonte de aprendizado relevante no setor a engenharia reversa quando se

    adapta as mquinas e os equipamentos para a produo local (Avelar, 2008). Por esse

    comportamento de engenharia reversa, as firmas constituram em seu interior corpos

    tcnicos altamente qualificados que sustentariam o desenvolvimento tcnico dos produtos e

    processos, como por exemplo, a busca pela reduo de custos e a diversificao da linha de

    produtos. Ressalte-se, no entanto, que a engenharia reversa pode ser passiva ou ativa. No

    primeiro caso, em que h pequenas adaptaes e cpias, h pouco desenvolvimento de

    capacidade aprendizado. No caso de uma engenharia reversa ativa, o foco no a mera

    cpia em busca de barateamento para adaptao ou simplificao, mas a cpia em busca de

    aprendizado que, em muitos casos, est associado a polticas industriais e tecnolgicas,

    desde incentivos fiscais at a formao de mo de obra qualificada. Historicamente, a

    engenharia reversa no Brasil se aproximou mais do caso passivo, ao contrrio dos casos

    tpicos de Japo e Coria do sul, em que o processo de cpia levou efetivamente ao

    aprendizado tecnolgico.

    O esforo tecnolgico dos fornecedores de peas e componentes tambm seria

    fundamental para o ritmo de inovao das empresas de bem de capital (Avelar, 2008). A

    existncia de um setor fornecedor de insumos adequado considerada importante no

    apenas para que se suporte o processo inovativo, mas mesmo para que o induza. A

    proximidade geogrfica dos fornecedores, neste caso, seria muito importante no apenas

    pela rpida prestao de servios e manuteno, mas especialmente para a troca de

    conhecimento no codificado entre as firmas. No caso brasileiro, entretanto, h poucos

    indcios da ocorrncia desta integrao intangvel.

    Alm disto, h, em termos mundiais, um grande volume de comrcio intra-

    industrial de mquinas e equipamentos seriados, assim como uma dada diviso

    internacional de trabalho: a produo de bens de capital tecnologicamente densos se

    concentra nos pases desenvolvidos com destaque para Estados Unidos, Japo, Alemanha

    e Itlia - e, a de bens menos sofisticados em pases em desenvolvimento - em que se

    destacariam o Brasil, a Coria do Sul, Taiwan, China e Mxico (Alm e Pessoa, 2005). As

    barreiras entrada nos segmentos explorados pelo ltimo grupo de pases seriam

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

    31

    relativamente baixas e, devido relevncia macroeconmica do setor, os pases tenderiam

    a promover polticas para resguardar e ampliar a produo local.

    A especializao em equipamentos mais sofisticados dos pases centrais poderia ser

    associada exigncia do mercado consumidor, existncia de uma indstria de

    componentes amplamente desenvolvida e mesmo ao pioneirismo e s escalas timas de

    produo.

    As vantagens que os pases em desenvolvimento disporiam para manter parte da

    indstria nos mercados locais seriam, alm dos prprios mercados consumidores e da

    expanso de polticas de financiamento, a disponibilidade da matria prima tradicional

    (ao) e de mo-de-obra a baixo custo, tornando-os naturalmente especializados em

    produtos intensivos nesses fatores. A abertura das economias e o acirramento da

    concorrncia, entretanto, vm fazendo da capacitao tecnolgica e dos servios ps-venda

    estratgias de diferenciao cada vez mais importantes tambm nos pases em

    desenvolvimento, em especial na China.

    Segundo as caractersticas citadas, ento, poder-se-ia afirmar que os setores

    produtores dos pases em desenvolvimento, de economia aberta, que concentram sua

    produo em paradigmas tecnolgicos mais defasados, precisariam manter uma insero

    internacional positiva no apenas para ampliar os ganhos de escala, mas tambm para

    manter certa atualizao tecnolgica, seja pelo acesso indstria de componentes, seja

    pelo contato com clientes mais sofisticados. O grau de proteo do setor produtor de

    mquinas e equipamentos, desta feita, refletiria a relativa fragilidade dos produtores dos

    pases em desenvolvimento e uma das armas das autoridades locais para manter o setor em

    operao.

    Por fim, vale ressaltar de forma que, como discutem Vermulm e Erber (2002), o

    entorno sistmico tem grande influncia na competitividade dos produtores de bens de

    capital seriados, com destaque para trs variveis, a saber, o juro, a taxa de cmbio e a

    tributao do investimento.

    O juro, alm de ser uma referncia expectativa de valorizao do capital,

    condiciona o financiamento tanto da produo, como e principalmente da

    comercializao das mquinas e equipamentos, cumprindo papel decisivo nas condies de

    competitividade de uma empresa e de um inteiro subsetor nacional.

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

    32

    No toa, portanto, que as empresas que vendem bens de capital

    tecnologicamente mais sofisticados, caros, em geral nicho das empresas de capital

    estrangeiro radicadas no Brasil, reclamam especialmente das altas taxas de juros

    praticadas internamente. Essas empresas concorrem no apenas com a eficincia de

    fabricao (associada, inclusive, s economias de escala) e com o contedo tecnolgico

    incorporado aos produtos comercializados pela indstria do Centro, mas tambm com as

    condies de financiamento que vm junto com o equipamento. (...) Em maro de 2008,

    quando a taxa mdia de juros de financiamento de mquinas e equipamentos pelas linhas

    do BNDES era de 14% ao ano, a praticada no exterior seria de 3%, ou menos. (Gandra,

    2008).

    Como ser visto, estes diferenciais na estrutura de financiamento cumprem

    importante papel na determinao dos principais riscos ao pleno desenvolvimento da

    indstria de bens de capital seriados brasileira.

    O captulo que se segue est distribudo em mais 5 sees. A seo 3.2 trata das

    perspectivas da dinmica global do investimento, destacando o recente deslocamento da

    indstria para a sia, com destaque para a China. A seo 3.3 discute as perspectivas do

    subsetor de bens de capital seriados no Brasil, apontando que o principal driver dos

    investimentos , e ser nos prximos anos, a demanda interna do conjunto da economia

    brasileira que amplia seus prprios investimentos, demandando mquinas e equipamentos.

    A seo 3.4 debate as perspectivas de mdio e longo prazo para o subsetor no Brasil, luz

    de um cenrio em que a economia brasileira reagiria melhor aos desafios da crise

    financeira global contempornea, fazendo prevalecer as oportunidades sobre os riscos

    deste ambiente instvel. A seo 3.5 apresenta sucintamente algumas estratgias polticas

    setoriais necessrias para atingir os objetivos discutidos na seo anterior. Por fim, a ltima

    seo apresenta breves concluses sobre as perspectivas de investimento deste setor.

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

    33

    3.2 Dinmica Global do Investimento

    Neste item, sero apresentados os movimentos recentes da indstria de bens de

    capital mundial, com destaque para o macio deslocamento da produo para pases em

    desenvolvimento, em especial para a China.

    De fato, segundo dados da UNIDO, os pases em desenvolvimento absorveram a

    forte queda de participao dos pases desenvolvidos no valor adicionado mundial da

    indstria de mquinas e equipamentos (ISIC 29, Rev. 3) - que passou de 82,2% em 1995

    para 74,8% em 2006. Os pases em desenvolvimento, assim, j agregam quase um quarto

    do valor gerado nessa indstria (23,7%).

    Dados da mesma instituio, apresentados pelo Export-Import Bank of ndia

    (2008), para o ano de 2005, do como grandes produtores os EUA (19,4% da produo

    mundial), o Japo (15,6%) e a Alemanha (14,9%). Entre eles, as participaes do setor

    produtor de mquinas e equipamentos nas indstrias locais tiveram movimentos

    diferenciados.

    Na economia norte-americana, o setor perdeu a sua importncia relativa em grande

    proporo em 1995 era responsvel por 8% do valor agregado da indstria como um todo

    e em 2006, 4%. Na economia Alem, em que o setor produtor de mquinas e equipamentos

    tem um forte peso na produo industrial, a queda de participao foi muito tnue de

    14,7% em 1995 para 14,3% em 2006. No Japo, h uma ligeira elevao da participao

    das mquinas e equipamentos no valor agregado da indstria como um todo de 10,0% em

    1995 para 10,7% em 2006.

    Esses dados sugerem uma mudana na geografia dessa indstria com maior

    participao dos pases em desenvolvimento que pode decorrer do prprio deslocamento

    da produo manufatureira como um todo para a periferia capitalista. Assumida a diviso

    internacional do trabalho tradicionalmente associada ao setor possvel inferir que o

    deslocamento da indstria esteja se dando nos segmentos mais tradicionais - com grande

    peso para os bens de capital seriados.

    Pode-se tomar o exemplo da indstria norte-americana, na qual se deu a mudana

    mais significativa em termos de perda de gerao de valor. As duas possibilidades que se

    apresentam so a da simples desindustrializao ou a da transferncia da capacidade

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

    34

    produtiva do pas para outras partes do mundo, na forma de investimentos estrangeiros

    diretos (IEDs) para regies em que as vantagens locacionais tpicas como mercados com

    taxas relativamente aceleradas de crescimento, a disponibilidade da matria-prima bsica,

    o ao, e de mo-de-obra a baixo custo. A resposta mais provvel de que tenham ocorrido

    os dois movimentos.

    A tabela 3.1 a seguir traz dados de produo da indstria norte-americana de

    mquinas e equipamentos entre 2000 e 2006 - informaes de quantidade produzida e de

    preos de alguns sub-segmentos selecionados, tradicionalmente relacionados indstria de

    bens de capital seriados, indicando distintos padres de comportamento. Os nmeros

    indicam forte queda na quantidade produzida de mquinas e equipamentos e elevao dos

    preos.

    Tabela 3.1 EUA: variao da produo e dos preos da indstria de mquinas e

    equipamentos, 2000-2006 (em %)

    2000-2006 (%) Segmento Quantida

    de Preo

    s Vlvulas Metlicas -1,1 23,2 Mquinas para plsticos e borracha -14,4 8,2 Mquinas para a indstria de papel -28,4 10,5 Mquinas para a indstria txtil -39,7 5,0 Mquinas para a indstria de impresso -23,0 6,0 Mquinas para a indstria alimentcia -4,4 17,5 Mquinas para a indstria de moldagem 3,1 -3,8 Mquinas-ferramenta com remoo de cavaco 1,8 2,3 Mquinas-ferramenta por deformao -37,7 11,4 Ferramentas de corte e acessrios para mquinas-ferramenta -19,7 10,5

    Mquinas e equipamentos para a indstria de celulose 3,6 14,7

    Compressores a ar e gs 62,8 14,0 Fonte: Bureau of Economic Analysis (U.S. Department of Commerce). Elaborao: NEIT/UNICAMP

    A elevao de preos pode justifica-se, em parte, pela elevao do custo do

    principal insumo (o ao), em parte pelo crescimento da demanda, mas as diferentes

    trajetrias tambm podem estar associadas a diferentes mix de produtos comercializados.

    Variaes negativas de produo e fortemente positivas de preos, como

    observadas nos setores produtores de vlvulas e de mquinas produtoras de equipamentos

    para a indstria alimentcia, por exemplo, podem significar a especializao em produtos

    tecnologicamente mais sofisticados. A produo de mquinas para os setores txtil, de

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

    35

    papel e impresso, por outro lado, apresentam uma queda muito grande na quantidade

    produzida e uma elevao de preos relativamente baixa, eventualmente indicando a a

    desestruturao e a perda de competitividade da indstria local neste segmento.

    O setor produtor de compressores se destaca fortemente dos demais, com

    crescimento tanto de produo fsica, como de preos. Numa verso bem menos positiva,

    os que fabricam moldes industriais e mquinas-ferramenta com remoo de cavaco,

    tambm mantiveram um desempenho relativamente positivo.

    Dos dados de IEDs norte-americanos, num nvel de agregao bem maior, pode-se

    destacar a elevao do estoque de investimentos no exterior do setor produtor de

    equipamentos bem acima ao apresentado pelo setor manufatureiro como um todo no

    perodo recente. Entre 2004 e 2007 a indstria manufatureira norte-americana exportou

    capitas na forma de IEDs em volume suficiente para elevar o estoque existente de

    investimentos norte-americanos no resto do mundo em 28%, enquanto o segmento de

    maquinrio teve essa participao elevada em 71%. O ritmo de exportaes de capitais

    do setor de mquinas e equipamentos significativamente maior que o da indstria

    em geral.

    No grfico 3.1 abaixo apresentada a evoluo do estoque acumulado de capital

    norte-americano no segmento de mquinas e equipamentos, na forma de IED, no Brasil e

    em economias em desenvolvimento cujo crescimento do estoque desses capitais se

    destacou. Por exemplo, a China dispunha, em 2006 um estoque de capitais norte-

    americanos de US$ 1.067 milhes, Cingapura US$ 997 milhes (em 2005) e a ndia US$

    726 milhes. As taxas de crescimento desse estoque, entretanto, como sinalizado no

    grfico 3.1, revelam um fluxo fortemente direcionado a esses pases. Enquanto o estoque

    no Brasil caiu em 30%, na China se elevou em 400%, em Cingapura 205% e na ndia

    184%.

    Ainda que esses nmeros possam estar contaminados pela evoluo das taxas de

    cmbio dos respectivos pases, as discrepncias impedem que se credite valorizao da

    moeda brasileira essa perda relativa de recursos aplicados no setor.

    interessante notar que, ainda se tome a indstria de bens de capital mexicana

    como razoavelmente bem constituda (Alm e Pessoa, 2005), a despeito do acordo

    comercial existente entre aquela economia e os Estados Unidos (o NAFTA), pouco evoluiu

  • Verso Final para Editorao Documento No Editorado

    36

    o estoque de capitais norte-americanos no setor produtor de mquinas e equipamentos

    Mexicano dos US$ 988 milhes em 1999, passou-se a US$ 1.066 em 2006.

    Mais uma vez, forte a possibilidade do crescimento econmico dos asiticos ter

    sido o principal atrativo destes investimentos o que deixou a desejar tanto no caso

    mexicano como no brasileiro.

    Grfico 3.1 EUA: evoluo do estoque de Investimento Estrangeiro Direto em economias

    em desenvolvimento selecionadas, 1999-2007 (em ndices)

    0

    100

    200

    300

    400

    500

    600

    1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007

    1999:100

    Brasil China ndia Cingapura

    Fonte: Bureau of Economic Analysis (U.S. Department of Commerce). Elaborao: NEIT/UNICAMP

    Essa prevalncia dos fluxos de IED norte-americanos aos Asiticos pode ser

    qualificada, ainda, com o contexto relativamente diferenciado que a qualidade de

    investimentos tem sido realizada ali e na America Latina.

    A mesma tendncia pode ser observada a partir da anlise de dados de comrcio

    internacional (ver Tabela 3.2 abaixo), que ilustra a relativa queda de imp