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DIRECTOR Pe. José Mario O. Mandía | ANO 71 | 26 | 9 de NOVEMBRO de 2018 | SEXTA-FEIRA EDIÇÃO TRILINGUE | TRILINGUAL EDITION | SEMANÁRIO CATÓLICO DE MACAU | PREÇO 12.00 Mop PT EN CH EN www.oclarim.com.mo | www.facebook.com/oclarimweekly SOCIEDADE PÁGs. 8 E 9 DESTAQUE PÁG. 2 REFLEXÃO Europa, terra de missão, de volta aos primórdios do Cristianismo? LOCAL PÁG. 4 Geringonça cultural Esteja um “Minuto com Deus” Sabe o que é uma Caspiada? DESTAQUE PÁG. 3 DESTAQUE PÁG. 3 SOCIEDADE PÁG. 5 No Bem prepara-se a Vida Eterna BISPO DE MACAU HONROU OS AGENTES DAS FORÇAS DE SEGURANÇA JÁ FALECIDOS PADRE JAMES CHANG WOO HO, MEMBRO DA CONGREGAÇÃO CLERICAL DOS BEATOS MÁRTIRES COREANOS «A Igreja coreana está pronta para estender a mão à Coreia do Norte»

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DIRECTOR Pe. José Mario O. Mandía | ANO 71 | Nº 26 | 9 de NOVEMBRO de 2018 | SEXTA-FEIRA

EDIÇÃO TRILINGUE | TRILINGUAL EDITION | SEMANÁRIO CATÓLICO DE MACAU | PREÇO 12.00 Mop

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SOCIEDADE PÁGs. 8 E 9

DESTAQUE PÁG. 2

REFLEXÃO

Europa, terra de missão, de volta aos primórdios do Cristianismo?

LOCAL PÁG. 4

Geringonça cultural

Esteja um “Minuto com Deus”

Sabe o que é uma Caspiada?

DESTAQUE PÁG. 3

DESTAQUE PÁG. 3

SOCIEDADE PÁG. 5

No Bem prepara-se a Vida Eterna

BISPO DE MACAU HONROU OS AGENTES DAS FORÇAS

DE SEGURANÇA JÁ FALECIDOS

PADRE JAMES CHANG WOO HO, MEMBRO DA CONGREGAÇÃO CLERICAL DOS BEATOS MÁRTIRES COREANOS

«A Igreja coreana está pronta para estender a mão à Coreia do Norte»

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D E S T A Q U E O CLARIM | Semanário Católico de Macau | SEXTA-FEIRA | 9 de Novembro de 2018

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DIRECTOR: Pe. José Mario O. Mandía I ADMINISTRADOR: Alberto Santos | ASSISTENTE DA ADMINISTRAÇÃO: Wong Sao Ieng I EDITOR: José Miguel Encarnação I EDITORA-ADJUNTA: Jasmin Yiu | REDACÇÃO: Joaquim Magalhães de Castro (Grande Repórter) I SECRETARIADO DA REDACÇÃO E FOTOGRAFIA: Ana Marques I TRADUÇÃO: May Shiu-Ling Ho | COLABORAÇÃO: Marco Carvalho, Benedict Keith Ip, João Santos Gomes, Carlos Frota, Luís Barreira, Vítor Teixeira, Manuel dos Santos, Aurelio Porfiri, Padre Rodrigo Lynce de Faria, Tej Francis, Padres Claretianos, Susana Mexia I DIRECÇÃO GRÁFICA: Miguel Augusto I DESIGN E PAGINAÇÃO: Lei Sui Kiang, Oswald Vas I PROPRIEDADE: Diocese de Macau MORADA: Rua do Campo, Edf. Ngan Fai, Nº 151, 1º G, Macau I TELEFONE: 28573860 - FAX: 28307867 I URL: www.oclarim.com.mo I E-MAIL: [email protected] I IMPRESSÃO: Tipografia Welfare Ltd.S E M A N Á R I O C C A T Ó L I C O D D E D M A C A U

MARCO CARVALHO

O CLARIM – Foi ordenado sacerdote há pouco mais de um mês. Quando recebeu a “chamada” de Deus e decidiu que que-ria dedicar a sua vida à Igreja?

PE. JAMES HO – Foi aos 17 anos. Es-tava a viver no Vietname com a minha família. A minha família foi viver para o Vietname porque o meu pai tinha lá um negócio. No Vietname não tinha grandes amigos e não conseguia sequer falar com as pessoas por causa da barreira da lín-gua. A determinada altura comecei a ficar preocupado com o meu futuro. Eu não conseguia fazer quase nada e estava a ficar deprimido. O que seria do meu futuro? Por mero acaso, entrei numa igreja e as pessoas que lá conheci fizeram-me sentir que talvez devesse ser cristão: sempre que ia à igreja sentia uma enorme alegria. Isto aconteceu mais ou menos na mesma altu-ra em que um padre coreano se instalou no Vietname para zelar pela comunida-de sul-coreana radicada no País. Conheci esse sacerdote coreano e, quando dei por ela, estava a rezar pela primeira vez...

PADRE JAMES CHANG WOO HO, MEMBRO DA CONGREGAÇÃO CLERICAL DOS BEATOS MÁRTIRES COREANOS

«A Igreja coreana está pronta para estender a mão à Coreia do Norte»

Foi ordenado sacerdote a 29 de Setembro, em cerimónia presidida pelo bispo D. Stephen Lee, que fez culminar um percurso de mais de uma década de total entrega à disseminação da Palavra de Deus. O sul-coreano James Chang Woo Ho rezou pela primeira vez no Vietname, aos 17 anos, e o conforto que encontrou no seio da Igreja Católica nunca mais o abandonou. A fé colocou-o no encalço de Santo André Kim e trouxe-o até Macau, onde se propõe retribuir a ajuda dada pelo território à evangelização da Península Coreana.

CL – Nunca tinha rezado até então?P.J.H. – Rezei o Rosário e fi-lo durante

cem dias. Não conseguia parar. Pedi a Deus que me desse força e capacidade para de-cidir sobre o meu futuro. Depois de ter rezado durante esses cem dias, o padre co-reano perguntou-me se queria entrar para o Seminário. Respondi: «Não, eu não quero ir para o Seminário. Porque razão havia eu de querer ir para o Seminário? Não quero». Ainda assim, fiquei a matutar na sugestão que ele me fez. Ficou-me na cabeça e eu dei por mim a pensar: “Porque razão é que ele me pediu para entrar no Seminário?”. Disse a esse sacerdote que, afinal, queria entrar no Seminário e depois de ter dito “sim” tudo aconteceu muito naturalmente. Depois de ter dito “sim” ao padre coreano, dois outros padres coreanos da Congregação Clerical dos Beatos Mártires Coreanos visitaram o Vietname. Os três sacerdotes estiveram reunidos e discutiram a minha situação. Depois encontraram-se comigo e falaram--me na Congregação pela primeira vez. Su-geriram que visitasse a Congregação quan-do regressasse à Coreia. Essa visita ocorreu quando eu tinha 18 anos. Fiquei alojado na Casa de Formação da Congregação e de-pois disso decidi que afinal já não queria ir para o Seminário (risos)... A vida que eu lá encontrei era muito difícil...

CL – O que o fez mudar de ideias? O que o levou a pensar que o sacerdócio se-ria o caminho mais indicado para si?

P.J.H. – Apesar de viver sozinho me parecer algo extremamente difícil, não consegui fugir dos meus próprios pensa-mento. As duas semanas que passei com a Congregação deixaram-me uma impres-são muito grande. Não consegui deixar de pensar no que tinha vivido. De certa forma fiquei viciado naquele tipo de vida. Quan-do regressei ao Vietname só conseguia pensar: “O que posso fazer? O que devo fazer com o meu futuro?”. Decidi assumir--me como católico a cem por cento e ao assumir essa posição aceitei plenamente a ideia de que, enquanto católico, devia es-tar disponível para acatar os desafios que Deus colocou no meu caminho. Aconte-ceu tudo de forma muito natural.

CL – Está em Macau há menos de um ano. Por que razão escolheu Macau para ser ordenado?

P.J.H. – De facto, não fui eu que esco-lhi. Foi a Congregação dos Beatos Márti-res Coreanos. A Congregação e o bispo Stephen [Lee] fizeram essa escolha. Não tive opção, mas concordei com a escolha que me foi imposta. Macau é um local muito significativo para a Congregação à qual eu pertenço. Como sabe, o Santo André Kim estudou em Macau. Os pri-meiros seminaristas coreanos estudaram em Macau e essa é a razão pela qual Ma-cau tem tamanho significado, tanto para mim como para a Igreja coreana. Quando me disseram que eu me iria mudar para

Macau fiquei muito entusiasmado com a possibilidade. Senti que estava a ser esco-lhido para ajudar a Igreja em Macau e que tinha a possibilidade de retribuir a ajuda que Macau concedeu ao povo coreano.

CL – André Kim foi martirizado na flor da juventude. Seria capaz de dar a sua vida por Deus a exemplo do que fez este santo?

P.J.H. – Diria que sim, mas não é fácil. Estou a tentar. Estou a esforçar-me para ser como André Kim Taegon, mas não lhe sei dizer ao certo se consigo. O fundador da minha Congregação está sempre a di-zer: “Sejam santos! Almejem à santidade!”. O que digo é: “Sim, vou tentar ser como o Santo André Kim”. Mas não é fácil!

CL – Pela primeira vez em muitos anos, a paz parece possível entre as Coreias, com Seul e Pyongyang a manifestarem abertura para níveis inéditos de diálogo. Para além de rezar, o que mais pode a Igreja coreana fazer para contribuir para a paz?

P.J.H. – Há dias o Papa aceitou um convite para visitar a Coreia do Norte, e a Igreja coreana, a meu ver, está pronta para estender a mão à Coreia do Norte. É disso que os católicos coreanos estão à espera há mais de cinquenta anos. Eles estão bem preparados. Se tiverem a possibilidade de contribuir para o processo de abertura da Coreia do Norte é isso que farão. Aceita-rão de bom grado o desafio de espalhar a Palavra de Deus na Coreia do Norte, de procurar fazê-la chegar ao coração e à alma do povo norte-coreano. Não vai ser um processo fácil porque a Coreia do Nor-te é um país muito particular.

CL – É o mais recente sacerdote a ser ordenado em Macau, mas a verdade é que são cada vez menos os jovens que se entregam a cem por cento aos labores da fé. É possível para a Igreja continuar a crescer quando o número de vocações é cada vez menor?

P.J.H. – São muitos os sacerdotes que têm as mesmas interrogações. Os sacerdo-tes e os religiosos devem mostrar aos fiéis o quão felizes nós somos. Quando me foi dada a oportunidade de tomar o pulso à vida no seio da Congregação, percebi que aquelas pessoas eram felizes. Ao ver como eram felizes, quis tomar parte. Devemos evidenciar o quão significativa é a nossa vida. Mas antes disso devemos mostrar o quão felizes nós somos e o quão feliz esta vida pode ser.

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A Igreja Católica celebra o Dia de To-dos os Fiéis Defuntos (Dia de Finados) a 2 de Novembro.

Seguindo a tradição, D. Stephen Lee, bispo de Macau, presidiu à missa em me-mória de todos os agentes das forças de segurança já falecidos. A cerimónia teve lugar na capela do Cemitério de São Mi-guel Arcanjo.

Na homilia, D. Stephen Lee explicou o significado da morte e da vida eterna a todos os participantes (na sua maioria, não católicos).

«Sempre que visitamos um cemitério, lem-

bramo-nos do significado da vida. E conse-quentemente lembramo-nos de que estamos a caminhar para a morte», referiu o prelado, acrescentando: «Há um objectivo muito im-portante nas nossas vidas: temos de fazer o bem e evitar o mal. É realizando o bem que nos preparamos para a outra vida – a vida da felicidade eterna».

Após a Eucaristia, D. Stephen Lee abençoou os túmulos dos mortos. No Cemitério de São Miguel Arcanjo en-contram-se também sepultados padres e irmãs de várias nacionalidades que fale-cerem ao serviço da diocese de Macau.

PELOS QUE JÁ PARTIRAM – Fiéis participam na Missa do Dia de Finados, realizada no passado dia 3 de Novembro, na capela do Cemitério de São Miguel Arcanjo. A cerimónia eucarística foi presidida pelo padre Kornelius Bardata SVD.

Um minuto com Deus e para Deus. É quanto sugere há cerca de um mês o padre Daniel Ribei-ro, numa nova rúbrica semanal produzida propositadamente para a plataforma de partilha de vídeos YouTube, com um único objectivo em mente: utilizar as po-tencialidades das novas tecnolo-gias para disseminar o Evangelho.

«Há mais ou menos um mês, aqui em Macau, iniciei este “Minuto com Deus”, que são vídeos de aproxima-damente um ou dois minutos», disse o sacerdote a’O CLARIM. «Falam sobre o Evangelho de Domingo e consti-tuem uma reflexão muito prática com alguns pontos concretos sobre a forma como os fiéis podem viver os ensina-mentos do Evangelho na vida diária ao longo da semana», acrescentou o vigário-paroquial da Sé Catedral.

Com esta iniciativa o padre Daniel Ribeiro propõe-se con-substanciar uma mensagem co-mum ao Papa Francisco e aos seus dois antecessores no trono de Pedro, a de que a evangeli-zação através dos Meios de Co-

BISPO DE MACAU HONROU OS AGENTES DAS FORÇAS DE SEGURANÇA JÁ FALECIDOS

No Bem prepara-se a Vida Eterna

VIGÁRIO-PAROQUIAL DA SÉ CATEDRAL LANÇA RÚBRICA SEMANAL NO YOUTUBE

Esteja um “Minuto com Deus”

municação Social é um desígnio muito importante. A rúbrica “Minuto com Deus” é, de resto, como que a encarnação de um projecto antigo que o sacerdo-

te impulsionou durante algum tempo no Brasil. «Em 2010, quando eu ainda morava no Brasil, comecei a produzir um texto diário chamado “Minuto com Deus”, que

não era mais do que uma pequena reflexão sobre o Evangelho do dia. Com a minha mudança para outras regiões, nomeadamente aqui para Macau, comecei a sentir algumas di-ficuldades com tempo e encerrei o pro-jecto», explicou o também cape-lão da Universidade de São José. «Sempre tive, ainda assim, o desejo de continuar o “Minuto com Deus” e cheguei à conclusão que através do texto não ia conseguir alcançar tan-tas pessoas como através da mensa-gem falada», reconheceu.

A aposta no YouTube surgiu de uma forma natural, dada a versatilidade e o alcance da pla-taforma da partilha de vídeos. Desde que a versão audiovi-sual de “Minuto com Deus” foi lançada há pouco mais de um mês, os vídeos produzidos pelo padre Daniel Ribeiro já foram vistos por cerca de meio milhar de pessoas e o responsável pelo projecto não afasta a possibili-dade de, no futuro, poder vir a lançar vídeos tanto em língua inglesa, como em Cantonense.

A expansão do projecto de-pende, sobretudo, da disponi-bilidade temporal do sacerdote. Vigário-paroquial na Sé Cate-dral, aluno de mestrado na Uni-versidade de São José (da qual é capelão) e responsável pelo acompanhamento dos escutei-ros de Macau, o padre Daniel Ribeiro assumiu que o “Minuto com Deus” não tem para si um estatuto prioritário, mas acre-dita que a iniciativa pode fazer escola no seio da Igreja Católica do território. «O risco das novas tecnologias é que as pessoas querem o sucesso e querem aparecer a qualquer preço, mas isto é algo que tem que ser feito com ética», avisou, concluin-do de seguida: «A Igreja tem os seus princípios e não se pode vender por causa do sucesso. Agora, fazendo da maneira correcta, eu pessoalmen-te penso que a Igreja deve avançar cada vez mais, sendo que a Igreja em si, através das lideranças, também pensa da mesma forma».

Marco Carvalho

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O P I N I Ã O

C A R T A A O S L E I T O R E S

No passado dia 4 de Novembro, a comu-nidade de língua portuguesa da Sé Cate-dral de Macau despediu-se da Irmã Ma-ria da Conceição Vaz, com um fraterno, afectivo e agradável almoço-convívio. Participaram no almoço o Senhor Padre Daniel Ribeiro SCJ, o Senhor Padre Pe-ter Stilwell, vários membros da comuni-dade, nomeadamente colaboradores da catequese e da liturgia, e algumas irmãs Franciscanas Missionárias de Nossa Se-nhora, de cuja congregação religiosa faz parte a Irmã Conceição.

Os participantes, em representação da comunidade, exprimiram gratidão e reconhecimento pela sua dedicação e serviço na Paróquia da Sé, especialmen-te como catequista e ministra extraor-

dinária da Comunhão, bem como pela sua actividade pastoral e caritativa em Macau, nomeadamente as suas visitas hospitalares aos doentes.

A Irmã Conceição, comovida, agra-deceu o carinhoso gesto feito pela co-munidade, oferecendo a cada uma das pessoas presentes afectuosas palavras de gratidão e encorajamento, que certa-mente iremos guardar com amizade nas nossas memórias.

Desejamos as maiores felicidades e su-cesso na sua nova missão em França!

Que Deus nos abençoe!

Comunidade de língua portuguesa da Sé Catedral de Macau

JOSÉ MIGUEL ENCARNAÇÃ[email protected]

Um negociador em fundos de pensões – sueco – dizia-me no passado fim-de-semana que a

democracia no seu país está «refém do politicamente correcto».

O tema veio a propósito de lhe ter perguntado como a Suécia tem lidado com a chegada e permanência de refugiados e imigrantes em massa nos últimos anos. Automaticamente, quase inconscientemente, baixou o tom de voz e respondeu que «é um problema real», tendo a situação chegado «ao ponto de não retorno». No seu entender, a principal causa do problema é a actual política sueca de imigração.

Dado que os nossos pontos de vista foram coincidindo ao longo da conversa, confessou-me sentir-se surpreendido por poder dizer o que pensa, a alguém vinte anos mais novo, sem receio de ser acusado de racismo, como é hoje hábito na Suécia e um pouco por toda a Europa.

Depois de nos despedirmos, fiquei a pensar como a ditadura do politicamente

Na coluna da semana passada, apre-sentámos as disposições sobre a as-sembleia geral do condomínio pre-vistas no Regime de administração simples, nomeadamente os procedi-mentos de convocação da assembleia geral do condomínio e as formas da tomada das deliberações pela assem-bleia geral do condomínio, entre ou-tros.

7. Quais são as novas regras esta-belecidas pela Lei n.º 14/2017 relati-vamente às condições da tomada de deliberações?

Com vista à adaptação à realidade de Macau, de modo a que a convo-cação da reunião da assembleia geral do condomínio e a tomada de deli-berações sejam feitas de forma bem sucedida, a Lei n.º 14/2017 estipula que em regra, as deliberações da as-sembleia geral do condomínio são to-madas por mais de metade dos votos dos condóminos presentes e que re-presente pelo menos 15% do valor to-tal do condomínio, ou seja, de entre os condóminos presentes, o número dos votos a favor deve ser superior ao dos votos contra, devendo o quórum representar pelo menos 15% do valor total do condomínio.

Note-se que quanto à questão aci-ma referida relativamente à tomada de deliberações por mais de metade dos votos dos condóminos presentes na reunião, o número dos votos dos condóminos não é calculado com base na forma de um voto por cada fracção, mas sim tantos votos quanta a percentagem atribuída à sua frac-ção no valor total do condomínio, ou seja, o número de votos de con-dómino das diferentes fracções não é igual. Por exemplo, se um deter-minado edifício só tem dois tipos de fracção, um de grande e outro de pe-quena dimensão, a percentagem atri-buída à fracção grande no valor total do condomínio é o dobro da fracção pequena. Então, a fracção pequena tem um voto, enquanto que a frac-ção grande tem dois. Neste contexto, caso na reunião da assembleia geral do condomínio, estando apenas pre-sentes um proprietário do tipo “frac-ção grande” e dois do tipo “fracção pequena”, quando o proprietário do tipo “fracção grande” vote contra e os

dois proprietários do tipo “fracção pe-quena” votem a favor, existem assim dois votos a favor e dois votos contra. E esta situação não satisfaz a primeira condição da tomada de deliberações, isto é, a tomada de deliberações por mais de metade dos votos dos condó-minos presentes na reunião.

Para além das disposições gerais acima referidas, a lei estabelece tam-bém as disposições especiais quanto ao quórum necessário para a tomada das deliberações relativamente aos seguintes assuntos: 1) Exoneração de membros da administração, apro-vação das despesas a suportar pelo fundo comum de reserva, autoriza-ção e revogação da autorização da afi-xação de tabuletas, reclamos ou dos respectivos suportes e componentes nas colunas que estão em frente à fa-chada do rés-do-chão e denúncia de contrato de prestação de serviços de administração de condomínios pela assembleia geral do condomínio. As deliberações são tomadas por mais de metade dos votos dos condómi-nos presentes e que represente pelo menos 25% do valor total do condo-mínio; 2) Autorização e revogação da autorização da afixação de tabuletas, reclamos ou dos respectivos suportes e componentes na fachada do edifício e alterações ao regulamento do con-domínio. As deliberações são toma-das por votos que representem pelo menos mais de metade do valor total do condomínio; 3) Obras nas partes comuns que constituam inovações. As deliberações são tomadas por vo-tos que representem pelo menos dois terços do valor total do condomínio.

Quanto às questões sobre a ela-boração das actas das reuniões da assembleia geral do condomínio e a necessidade de depósito, junto do Instituto de Habitação, da cópia da acta da reunião após a realização da reunião da assembleia geral do con-domínio, prestem atenção à próxima apresentação.

Obs.: Na elaboração do presente artigo, tive-ram-se como referência principal as disposições

da Lei n.º 14/2017 (Regime jurídico da adminis-tração das partes comuns do condomínio).

Texto fornecido pela Direcção dos Serviços de Assuntos de Justiça

CONHECER AS LEIS DE MACAU

Regime jurídico da administração das partes comuns do condomínio (III)

Despedida à Irmã Conceição Vaz

Geringonça cultural

correcto está a inverter o princípio básico da democracia que impõe a vontade da maioria sobre a minoria.

O mundo ocidental – a Europa em particular – sempre esteve na vanguarda dos direitos, liberdades e garantias, muito pelo facto de ser a área do globo com mais tradição democrática. Infelizmente, é de lamentar que pela primeira vez esteja a retroceder em termos civilizacionais, ao ceder à vontade de minorias cujos valores atentam contra a liberdade do Homem e a igualdade e fraternidade entre os povos.

É caso para dizer que a geringonça político-portuguesa não só chegou à política europeia como à cultura (tradição) do Velho Continente, pois no quadro actual a soma das minorias condiciona a vontade da maioria.

Que Deus proteja os nossos filhos!

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JOÃO SANTOS GOMES

No passado dia 31 de Outubro cele-brou-se em Portugal a Solenidade de To-dos os Santos, festividade do calendário católico em honra de todos os mártires e santos que muitos crentes veneram em todo o mundo. Embora a data seja assi-nalada durante o dia, é na noite de 30 para 31 que a solenidade assume maior simbolismo. A ida ao cemitério para prestar homenagem aos antepassados e o acender das velas nas campas é, por si só, um acontecimento social, que faz com que as famílias, os amigos e os vi-zinhos se juntem em torno do mesmo sentimento.

Aos menos conhecedores desta festi-vidade basta pesquisarem na Wikipedia para ficarem a saber que a “Igreja Cató-lica celebra a Festum Omnium Sancto-rum (Festa de Todos-os-Santos) a 1 de Novembro, que é seguido pelo Dia dos Fiéis Defuntos a 2 de Novembro”. Isto apenas se aplica à Igreja Católica que é regida a partir do Vaticano, pois a “Igreja Ortodoxa celebra esta festividade no pri-meiro Domingo depois do Pentecostes, fechando a época litúrgica da Páscoa, tal como a Igreja Católica Oriental”. Por seu lado, “a Igreja Anglicana também celebra o Dia de Todos os Santos com o mesmo significado que nas Igrejas Cató-lica e Ortodoxa”. Já “na Igreja Luterana o dia é celebrado principalmente para lembrar que todas as pessoas baptizadas são santas e também aquelas pessoas que faleceram no ano transacto, pelo que o significado da celebração também é qua-se idêntico ao de outras igrejas cristãs”.

Acontece que nos últimos anos esta celebração, tipicamente cristã, tem sido adulterada por uma outra que muitos pensam ter sido importada dos Estados Unidos: o Halloween!

O Halloween ficou conhecido por meio das impecáveis campanhas de “ma-rketing” dos filmes de Hollywood, sendo de destacar a forma utilizada para passar a mensagens ao grande público. A par do Pai Natal vermelho da Coca-Cola, que é hoje um símbolo do Natal, a abóbora é o símbolo da festa pagã do Halloween.

Se o leitor investigar mais aprofunda-damente sobre as raízes do Halloween,

TODOS OS SANTOS, FIÉIS DEFUNTOS E MUITO COMÉRCIO

Sabe o que é uma Caspiada?

www.oclarim.com.moLeia O CLARIM na net

que se celebra na noite anterior à Sole-nidade de Todos os Santos, rapidamente descobre que tem origem celta e que afi-nal não é um festejo norte-americano. Na realidade, foram as mega-produções de Hollywood que fizeram com que todos os miúdos e graúdos se vestissem de bruxas e decorassem as suas casas com abóboras.

Também em Macau, como em Por-tugal, o Halloween passou a ser uma constante nesta época do ano em quase todas as escolas, sem que haja qualquer justificação para tal. Os alunos são bom-bardeados com adereços e símbolos que nada têm a ver com o simbolismo inicial desta festividade.

Segundo reza a história, o Halloween surgiu na Europa há mais de dois mil anos por iniciativa do povo celta. Diz a lenda que entre o dia 30 de Outubro e 2 de Novembro os mortos voltavam a po-voar a terra, tornando-se fantasmas. As pessoas só saiam à rua mascaradas, para poderem passar despercebidas. Daí a ex-plicação porque hoje se vendem artigos relacionados com tudo o que é assusta-dor e fantasmagórico.

Depois da tradição ter chegado à Amé-rica passou-se a acreditar, um pouco por todo o mundo, que na noite de 30 para 31 de Novembro as casas ficam assombra-das, fantasmas ganham vida, bruxas pe-gam em vassouras e vampiros deixam os

caixões, para se juntarem na noite mais assustadora do ano. Pelo menos é o que se vê em filmes e desenhos animados – basta ligar a televisão em qualquer canal.

Em Portugal o Halloween tem ganho adeptos de ano para ano. Antigamente celebrava-se o “Pão por Deus”. Agora os mais pequenos já perguntam “doçura ou travessura?” no “Dia das Bruxas”. A apropriação do Halloween em Portugal é outras das consequências da globali-zação e enquadra-se no que tem vindo a acontecer com outras festividades, como o Carnaval e o Natal. Apesar de nós, católicos, sabermos e sentirmos o seu verdadeiro significado, é difícil re-sistimos à força do “marketing”.

Contudo, há localidades que ainda tentam manter as tradições de raiz cel-ta. Vilar de Perdizes, em Montalegre, comemora a noite dos fachos – os ra-pazes roubam palha e vão para o alto dos montes gritar, a fim de espantar os espíritos, as bruxas e os demónios. Em Bragança realiza-se a Festa da Cabra e do Canhoto, um evento com forte in-fluência celta em que é acesa uma fo-gueira, em torno da qual as pessoas se reúnem. A aldeia de Cidões recria um ritual de Noite das Bruxas, inspirado em antigas festas. Mais para Sul, em Lisboa, no Jardim Botânico da Ajuda, é organizado um evento para conhecer o

jardim à noite, sendo organizadas brin-cadeiras. Há concursos de abóboras e de máscaras, e os mais “corajosos” po-dem fazer o passeio do terror. Na ci-dade dos estudantes, Coimbra, é feito um peditório por grupos de crianças. Levam abóboras vazias com uma cara desenhada e dentro uma vela acesa. De porta e porta, cantam a música tradicio-nal “Bolinhos e Bolinhós”, em troca de dinheiro, bolos ou doces. Nos Açores ainda se comem as Caspiadas. É tradi-ção as crianças fazerem um peditório e em troca os adultos oferecerem-lhes bolos com o formato do topo de uma caveira – as Caspiadas –, um pouco à semelhança do antigo “Pão por Deus”. Este tinha lugar no dia 1 de Novem-bro. As crianças saíam à rua para pedir o “Pão por Deus” de porta em porta, recitando versos de uma canção. Em troca recebiam pão, broas, frutos secos e, mais recentemente, por influência americana, guloseimas.

As Caspiadas, tradição que remonta à Flandres, será porventura das tradi-ções mais genuínas desta época do ano. Acredita-se que poderá ter origem num ritual tibetano, no qual o topo da caveira, considerada como a parte que contém o espírito, é utilizada como taça na execu-ção de ritos tântricos, no culto dos mor-tos. Esta prática terá sido adoptada mais tarde por algumas tribos celtas, criando profundas raízes na Europa. As Caspia-das não parecem ter perdido o devido enquadramento, pois quem as cozinha diz que as melhores são as que ficam com uma racha, o que faz lembrar o topo de uma caveira. Para quem tiver curiosidade em provar, aqui tem a receita:

Oito quilos de farinha de milho ama-rela passada em peneira fina; dois quilos de farinha de trigo; duas dúzias de ovos; dois quilos de açúcar; dois litros de leite; quinhentas gramas de manteiga; pau de canela; erva doce; folhas de laranjeira azeda; erva de Nossa Senhora.

Fervem-se os ingredientes no leite e escalda-se a mistura das duas farinhas, à noite, ficando de um dia para o outro em repouso. Na manhã seguinte amassa-se a mistura com os ovos, açúcar e manteiga. Deixa-se levedar. Fazem-se bolinhos do tamanho de uma mão fechada, que vão ao forno. São mais apreciados os que fi-cam com a superfície rugosa. Na Bélgica diz-se que assim deixam ver as costuras dos ossos da caveira.

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MANUEL DOS SANTOS

A envangelização do Brasil começou com a chegada dos navegadores portu-gueses a 26 de Abril de 1500. Os mari-nheiros, pouco depois de porem pé em terra firme, celebraram a primeira mis-sa no novo território. Alguns homens e mulheres locais assistiram à Eucaristia. A devoção foi aceite pelos índios, que participaram na celebração, imitando os gestos dos marinheiros.

Os primeiros missionários chegaram ao Brasil em 1549, sendo membros da recém-fundada Companhia de Jesus, por Santo Inácio de Loyola. Os padres José de Anchieta, Manuel da Nóbrega e Azpi-lcueta Navarro, com o apoio de António Rodrigues, que falava as línguas locais, e Pero Correia, um homem abastado, colo-caram mãos-à-obra na hora de evangeli-zar a nova posse do Rei de Portugal.

Ao longo dos séculos a Igreja Católica no Brasil ampliou exponencialmente o seu campo de acção. Hoje é o maior país cató-lico do mundo, com mais de 123 milhões de fiéis registados, num universo de 190 milhões de habitantes. O Brasil conta com três santos padroeiros: Nossa Senhora Apa-recida, São Pedro de Alcântara e São José de Anchieta. Actualmente, a Igreja Católica no Brasil debate-se com a saída de fiéis para outras denominações cristãs, havendo uma grande franja da população ateia.

Este fim-de-semana disputa-se o Gran-de Prémio do Brasil, uma vez mais no Autódromo de Interlagos, ou Autódro-mo José Carlos Pace, no coração da gi-gantesca cidade de São Paulo, a sétima cidade mais populosa do mundo, com mais de doze milhões de habitantes. É também uma das mais perigosas em termos de segurança. Todos os anos há relatos de assaltos à mão armada dentro e fora do circuito. Segundo Matteo Bon-ciani, porta-voz da FIA, no ano passado alguns membros da FIA foram atacados por homens armados quando regressa-vam ao hotel. Felizmente o assalto não teve consequências, pois os visados des-

FÓRMULA 1 – ÉPOCA DE 2018

Depois do cinco vem... o sete

ESCOLHA SARDINHAS PORTUGUESAS

ESCOLHAPORTHOS

locavam-se num carro blindado, como acontece com quase todos os interve-nientes neste Grande Prémio. Apesar da violência que afecta o País ser reco-nhecida por todos, o Grande Prémio do Brasil continua a ser realizado ano após ano. Aparentemente, a FIA não se deixa influenciar pela falta de segurança. Há até rumores de que poderá vir a ser reac-tivado o Grande Prémio da África do Sul, onde o quadro actual é ainda pior.

A capital do Estado de São Paulo tem outro grande “se”. É uma das cidades mais poluídas do mundo, com todos os problemas ambientais inerentes.

O Autódromo de Interlagos tem um traçado bastante técnico e muito rápido. Alguns pilotos não gostam da pista, espe-cialmente quando chove, o que é sempre possível de acontecer nesta época do ano. Foi neste asfalto, debaixo de chuva in-tensa, que Max Verstappen mostrou pela primeira vez que é na verdade um gran-

de piloto. Também foi em São Paulo que Lewis Hamilton – “rookie” do ano em 2007 – conquistou em 2008 o Campeo-nato do Mundo de Pilotos (talvez de for-ma algo controversa), em detrimento de Felipe Massa, tornando-se no mais jovem campeão do mundo aos 23 anos. Passou depois da McLaren para a Mercedes, para tomar o lugar deixado vago por Michael Schumacher. Uma decisão mais do que acertada, dado que em seis anos arreba-tou – sempre com a marca de Estugarda – mais quatro títulos mundiais em 2014, 2015, 2017 e 2018, apenas perdendo o tí-tulo em 2016 para o seu ex-companheiro de equipa, o alemão Nico Rosberg.

Com a vitória nesta época, Hamilton passou a fazer parte do círculo dos “imor-tais”. O primeiro foi o argentino Juan Manuel Fangio, “o maestro”, que venceu cinco Campeonatos do Mundo de Pilotos (naquele tempo era o único campeonato existente. O de construtores, ou de equi-

pas, só foi estabelecido em 1957), ao vo-lante de quatro marcas: Alfa Romeo, Fer-rari, Mercedes e Maserati, em 1951, 1954, 1955, 1956 e 1957. Fangio ainda averbou sucessos nas Mil Milhas (Mille Miglia), nas 500 Milhas de Sebring e na Carrera Panamericana. O seu total de vitórias em corridas de automóveis foi superior a oi-tenta, algo que até hoje nenhum outro piloto conseguiu alcançar. Na Fórmula 1, o recorde de Fangio só foi quebrado por Michael Schumacher, com sete vitórias: 1994, 1995, 2000, 2001, 2002, 2003 e 2004, ao volante da Benetton e da Ferrari.

Até há dias, a grande curiosidade era saber se Hamilton tencionava bater o re-corde de Schumi. Pois a dúvida foi rapi-damente esclarecida. O piloto britânico, que aos 33 anos parece ter atingido o pico de forma, já veio afirmar que o seu objectivo é igualar, senão mesmo ultra-passar, o recorde de sete campeonatos do mítico piloto alemão. Veremos….

Catedral Metropolitana de São Paulo

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GUILHERME D’OLIVEIRA MARTINS (*)

Quando falamos de património cultural, há a tentação de pensar que falamos de antigualhas, de coisas do passado, irremediavel-mente perdidas num canto re-côndito da nossa memória. Puro engano! Referimo-nos à memó-ria viva, seja ela referida a mo-numentos, sítios, tradições, seja constituída por acervos de mu-seus, bibliotecas e arquivos. Mas fundamentalmente tratamos de conhecimentos ou de expressões da criatividade humana... Ter memória é, assim, respeitarmo--nos. Cuidar do que recebemos é dar atenção, é não deixar ao abandono. Por isso, o património cultural que devemos proteger é sinal para que o que tem valor hoje e sempre não seja deixado ao desbarato. Como poderemos preservar o que é novo se não cui-darmos do que é de sempre?

O objectivo do Ano Europeu do Património Cultural (2018) tem sido sensibilizar para a histó-ria e os valores europeus e refor-çar o sentimento da identidade europeia. Mas, mais do que isso, é considerar esses valores e essa

identidade como realidades aber-tas ao encontro de outras realida-des, sabendo-se os desafios que o património cultural enfrenta e que têm impacto, desde a transi-ção para a era digital até a pressão ambiental e física, sem esquecer a prevenção e o combate do tráfi-co ilícito de bens culturais. Daí a necessidade de promover a diver-sidade cultural, o diálogo entre culturas e a coesão social, de real-çar o contributo económico do património cultural para os secto-res criativos e para o desenvolvi-mento e de salientar o papel do património cultural nas relações internacionais, desde a preven-ção de conflitos à reconciliação pós-conflito e à recuperação de património destruído.

Quando Portugal coordenou a Convenção-Quadro do Conse-lho da Europa sobre o valor do Património Cultural na socieda-de contemporânea, assinada em Faro a 27 de Outubro de 2005, a preocupação fundamental foi a de pensar na noção de patrimó-nio cultural comum e de cons-truir um conceito de responsa-bilidade partilhada – envolvendo o património construído e mate-rial, o património imaterial e a criação contemporânea. As polí-ticas públicas de cultura devem, assim, começar pelo cuidado da

herança e da memória. E, de fac-to, o património cultural não se refere apenas ao passado, mas à permanência de valores comuns, à salvaguarda das diferenças e ao respeito do que é próprio, do que se refere aos outros e do que é herança comum. Como compreenderemos a Europa sem o diálogo entre a tradição e o progresso, sem a compreensão das raízes e sem a complemen-taridade entre judeus, cristãos e muçulmanos? Urge compreen-der, afinal, que o que tem mais valor é o que não tem preço. E isso é difícil de entender quando há quem pense que tudo se pode comprar ou vender. Não pode. E é a compreensão do património cultural que nos permite assumir uma cidadania civilizada. Desde o convento de Tibães ou da cha-rola do Convento de Cristo à cus-tódia de Belém, passando pelos vestígios da escrita do Sudoeste, pela pintura atribuída a Nuno Gonçalves, pela poesia trovado-resca, pela lírica e épica de Ca-mões, pela música de Carlos Sei-xas e Domingos Bontempo ou pelo Romanceiro recolhido por Garrett, estamos perante símbo-los do caminho singularíssimo de um povo, que se afirmou e engrandeceu em contacto e no respeito dos outros.

Estão em causa a cidadania livre e responsável; a soberania partilhada; a união de Estados livres e soberanos; a democra-cia supranacional; a subsidia-riedade; e o desenvolvimento orientado para a dignidade humana. Eis porque este Ano Europeu pôde constituir-se num desafio às Universidades, às instituições, à sociedade ci-vil e a todos os europeus para que o património cultural seja considerado como factor de mobilização em torno da defe-sa do que é próprio e do que é comum. Longe das boas in-tenções que enchem o inferno, precisamos de cuidado e aten-ção para o que somos, de onde vimos e para onde vamos. A decisão da União Europeia de considerar o ano de 2018 como consagrado ao Património Cul-tural constituiu um marco em-blemático no momento em que há tantas incertezas e ameaças para um projecto europeu de paz, de hospitalidade, de en-treajuda, de desenvolvimento sustentável e de defesa da diver-sidade cultural.

(*) Coordenador Nacional do Ano Europeu do Património Cultural

In Clube do Colecionador

SUSANA MEXIA (*)

Num Portugal perpassado pelos valores do Cristianismo, que in-dubitavelmente integra a nossa matriz cultural, a manifestação e a devoção pública ao sagrado é, não só um acto de devoção, como também de oração.

As tradicionais romarias e procissões reflectem a profun-da religiosidade popular, espe-cialmente querida ao coração de todos portugueses que a têm vivido através dos séculos, não obstante alguns tempos de tor-menta ou menos tolerância.

Não são apenas paradas ou mais um desfile, mas sim a oportunidade de se ter presen-te a mensagem que o Senhor nos trouxe ou seja: “o gran-de amor que Deus tinha pelo Mundo e que O levou a enviar

ROMARIAS E PROCISSÕES

Acto de liberdade

PRESERVAR O QUE É NOVO, CUIDANDO DO QUE É DE SEMPRE

O Tecido Cultural da Europa

ARTUR DE MATOS (*)

Um estudo do Pew Research Center (**), com sede nos Estados Unidos, de-monstra que, na Europa, Deus está cada vez mais longe da crença e da vida dos europeus, apesar de a identidade cristã permanecer importante para a maioria.

Seguindo, à letra, um texto da Rádio Renascença, dos inquiridos no estudo, 91% são baptizados e 81% foram educa-dos na fé cristã, mas apenas 71% se afir-mam cristãos. Desses, só 22% mantêm uma prática religiosa regular. Alguns di-zem que se “distanciaram gradualmente da religião”, outros que “deixaram de acreditar nos ensinamentos religiosos”, e houve quem se tenha afastado devido a “escândalos ou posições adoptadas pela Igreja em relação a temas sociais”. Por países, a percentagem dos que se dizem cristãos é elevada e o primeiro lugar do

REFLEXÃO

Europa, terra de missão, de volta aos primórdios do Cristianismo?

Sem título, acrílico sobre madeira, João Vieira, 1972 (pormenor)

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Estamos numa Europa, a fugir

cada vez mais de um Cristianismo

querigmático onde o primeiro anúncio de Cristo morto e ressuscitado se

dilui numa prática individualista, sem referência ao Cristo

total e à comunidade

ROMARIAS E PROCISSÕES

Acto de liberdadeo Seu filho para o salvar”.

Misteriosa loucura de amor que só a magnanimidade da fé nos permite aceder à grandeza da redenção.

Numa procissão vivem-se mo-mentos de profunda e serena in-terioridade, em que somos con-vidados a rumar ao encontro das nossas dores, em busca da força e da alegria que matizam os dias do cristão, o qual concebe a vida como uma peregrinação, um êxodo a caminho da terra pro-metida, na qual todos ansiamos por habitar em definitivo.

O homem procura amar a Deus e demonstrar-Lhe esse afecto, pelo que estas manifes-tações são um momento de dar largas ao coração e de repousar na meditativa contemplação do Seu Amor por nós.

A presença de pessoas paga-doras de promessas, numa co-movente atitude de fé, é uma forte componente da cultura

portuguesa, que sabe pedir e não se esquece de agradecer as graças, as bençãos pedidas e re-

cebidas, pois em cada milagre houve um drama que, por in-tervenção divina, teve um final feliz. Seja como for, só temos que respeitar...

Participar, acompanhar ou, simplesmente, ignorar, serão atitudes consonantes com a

nossa fé ou com a sua ausência, mas sempre será um acto da li-berdade que a todos nos assiste.

Todavia, quer acreditemos ou não, o Senhor caminha entre nós. Ele vem ao nosso encontro, entra santamente na nossa vida, dá-lhe sentido

sobrenatural e tudo faz sob o olhar atento e protector de Sua Santíssima Mãe, Nossa Senho-ra, que serena e meigamente nos acolhe no Seu enorme e doce coração.

(*) Professora

ARTUR DE MATOS (*)

Um estudo do Pew Research Center (**), com sede nos Estados Unidos, de-monstra que, na Europa, Deus está cada vez mais longe da crença e da vida dos europeus, apesar de a identidade cristã permanecer importante para a maioria.

Seguindo, à letra, um texto da Rádio Renascença, dos inquiridos no estudo, 91% são baptizados e 81% foram educa-dos na fé cristã, mas apenas 71% se afir-mam cristãos. Desses, só 22% mantêm uma prática religiosa regular. Alguns di-zem que se “distanciaram gradualmente da religião”, outros que “deixaram de acreditar nos ensinamentos religiosos”, e houve quem se tenha afastado devido a “escândalos ou posições adoptadas pela Igreja em relação a temas sociais”. Por países, a percentagem dos que se dizem cristãos é elevada e o primeiro lugar do

REFLEXÃO

Europa, terra de missão, de volta aos primórdios do Cristianismo?

pódio vai para Portugal, com 83%, segui-do de Itália, Irlanda e Áustria, com 80% cada, 77% na Finlândia, 75% na Suíça, 73% no Reino Unido e 71% na Alema-nha. Em Espanha desce para os 66%,

65% na Dinamarca e 64% em Franca, 55% na Bélgica, 52% na Suécia, 51% na Noruega, e 41% na Holanda. Em todos houve um aumento dos que se dizem “não praticantes” e “sem religião”. Em

Portugal, onde a Igreja Católica é maiori-tária, há 35% de “cristãos que vão à Igre-ja”, 48% “não praticantes” e 15% “sem religião”. A Holanda é o país com menos cristãos praticantes (apenas 15% vão à Igreja) e com mais pessoas “sem religião” (48%). Na Finlândia, apesar da percen-tagem elevada dos que se dizem cristãos, apenas 9% vão com regularidade à Igre-ja, havendo 68% “não praticantes”.

De uma forma geral, a identidade cris-tã da Europa continua a ser considerada importante na maioria dos países, onde muitos inquiridos continuam a educar os filhos como cristãos (70% da população geral, 97% dos “cristãos praticantes” e até 87% dos “não praticantes” garantem que sim). Mas há diferenças que se vão acen-tuando entre os que, tendo fé, a vivem de maneira diferente: 64% dos cristãos que vão com frequência à Igreja acreditam na descrição bíblica de Deus, mas os “não praticantes” tendem a acreditar num “po-der superior ou força espiritual” (51%)...

Estamos numa Europa, a fugir cada vez mais de um Cristianismo querigmá-

tico onde o primeiro anúncio de Cristo morto e ressuscitado se dilui numa práti-ca individualista, sem referência ao Cris-to total e à comunidade. Urge, pois, acti-var uma pastoral missionária de iniciação cristã dos que ainda se dizem “cristãos”, e ousar uma evangelização de primeiro anúncio ao estilo apostólico dos primei-ros tempos, seguida de uma caminhada catecumenal que leve os europeus a op-tar livre e conscientemente por Cristo e pela sua Igreja. Para serem muitos ou mesmo maioria? Não necessariamente. Para serem luz e sal nesta Europa que necessita de uma recarga de sentido para a vida e de maior abertura ao outro.

(*) Director da revista Boa Nova – actualidade missionária

(**) Estudo conduzido em quinze países euro-peus (Áustria, Bélgica, Dinamarca, Finlândia, Fran-

ça, Alemanha, Irlanda, Itália, Holanda, Noruega, Portugal, Espanha, Suécia, Suíça e Reino Unido), com base em 24 mil entrevistas telefónicas a adul-

tos, realizadas entre Abril e Agosto de 2017.

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CARLOS FROTA (*)

A Guerra para acabar com todas as guerras. Foi há cem anos (11 de

Novembro de 1918). E isso deve fazer-nos pensar... num mundo como o de hoje, em que não poucos crêem na inevitabilidade, a prazo, duma nova guerra.

O que se vai comemorar, pois? A PAZ, por certo. O fim de um tremendo pesadelo.

A Primeira Guerra Mundial tirou a vida de mais de nove milhões de soldados; 21 milhões a mais ficaram feridos; mortes civis causadas indirectamente pela guerra numeradas perto de dez milhões.

A Primeira Guerra Mundial também foi mencionada como “a primeira guerra moderna”. Muitas das tecnologias que agora associamos a conflitos militares – metralhadoras, tanques, combate aéreo e comunicações de rádio – foram introduzidas em grande escala durante a Primeira Guerra Mundial.

Os severos efeitos que as armas químicas, como gás mostarda e fosgênio, tiveram sobre soldados e civis durante a Primeira Guerra Mundial galvanizaram atitudes públicas e militares contra o seu uso continuado. Os acordos da Convenção de Genebra, assinados em 1925, restringiram o uso de agentes químicos e biológicos na guerra, e permanecem em vigor até hoje.

A guerra, como se sabe, é o mal absoluto. Mas há outras faces do mal.

1– A recente tragédia de Pittsburgh, em que onze pessoas foram assassinadas e várias outras feridas, numa sinagoga, enquanto rezavam num sábado, o dia santo da religião judaica, é isso mesmo – uma tragédia. E um crime hediondo. Sem escusa.

Tragédia – porque ceifa do convívio dos familiares e amigos vidas que são em si mesmas preciosas. Hediondo o crime – porque não tem qualquer justificação. E indesculpável – pelos dois motivos anteriores combinados.

O modo, aliás, como o

O NOSSO TEMPO

As muitas faces do mal

assassino se introduziu no recinto do templo, clamando “morte a todos os judeus!”, revela o grau de extrema perturbação, de demência mesmo (não sou psiquiatra e por isso não garanto a exactidão científica do diagnóstico...) do autor dos crimes.

Sem querer fingir inocência ou ignorância sobre contextos históricos e os preconceitos neles enraizados, que atravessam a nossa existência como comunidade humana, nunca compreendi o anti-semitismo, e por isso sempre o interpretei como um daqueles enigmas que só o irracional (doentiamente) “explica”, se o irracional consegue explicar alguma coisa.

E mesmo aquela “razão” ligada à morte de Jesus, segundo a qual foram os judeus que mataram o Messias, e por isso são merecedores do castigo eterno – tal pseudo-razão sempre me pareceu pueril, ignorante, e ancorada numa das características da nossa natureza humana: julgar os outros. Definir-lhes um destino. Nós, do alto da nossa “superioridade” moral.

Não foram obviamente todos os judeus que traíram Jesus, mas apenas Judas Iscariotes. Não foram todos os judeus, mas apenas a hierarquia religiosa daquele preciso momento e lugar, que considerou que a morte de um inocente valia bem a salvação de todo um povo. Tal como entendiam a questão, naquele exacto contexto político, isto é, a ocupação

romana da Palestina.Mas nós cristãos temos

uma resposta pronta para estas questões de ódio incompreensível para com os nossos semelhantes, como são o anti-semitismo e todas as outras formas de discriminação: é o mal. É a persistência do mal, na já longa caminhada do homem.

Claro que esta categoria mental (o “mal”) é rejeitada pelos que encontram no vocabulário das ciências uma segurança e um conforto maiores para explicar o homem. A esses, a Bíblia (que não é senão, além de muitas outras coisas, uma profunda reflexão sobre o Mal, e sobre o Bem, a categoria que se lhe opõe) parece desactualizada, leitura cada vez mais reservada a gente inculta, temerosa da vida, ou as duas coisas.

Mas não há volta a dar. O mal existe! É como o vento. Não o vemos, mas sentimo-lo. E negar-lhe a existência é um absurdo.

2– E é esta chave de leitura baseada no mal que, do meu ponto de vista, explica o mais profundo, o mais essencial da vida internacional. Daí o ter dado o título que dei a esta crónica.

Não abandono de súbito os princípios da razão com que tenho tentado compreender o mundo. Mas muito ultrapassa a razão. É preciso admiti-lo. E, como cristão, tenho uma leitura mais profunda do que vai acontecendo, entendendo no essencial que todos os encontros

e sobretudo os desencontros do Homem com a História se inscrevem numa linha de continuidade multimilenar, explicada pelo dilema da revolta e do (des)encontro com Deus.

A reacção epidémica, hoje, contra refugiados e imigrantes, na Europa e nos Estados Unidos, inscreve-se totalmente, do meu ponto de vista, nesta linha de opções éticas fundamentais que têm a ver com o modo como o ser humano entende a sua presença no planeta.

Dando exemplos, tem a ver com opções éticas, mormente dos decisores políticos, fomentar conflitos ou preveni-los, como é o caso gritante das escolhas de um só homem, o ainda Presidente sírio, quando os seus concidadãos lhe pediram maior participação política. Muitos milhares de mortos e de refugiados depois, o referido líder continua no mesmo lugar, liderando todavia uma nação em ruínas. Enlutada e destruída. Valeu a pena? Ele, e quase só ele, dirá que sim...

3– O drama de Pittsburgh, com que comecei esta reflexão, insere-se num contexto emocional e político americano que quem segue diariamente os media internacionais conhece bem. E esse contexto está intimamente ligado a opções políticas e ÉTICAS da actual presidência americana.

Comecemos pelo “patriotismo” inserto em tais políticas. E no sentido da soberania nacional que é aí tão

propagado pelo seu principal actor. Onde existe não apenas o apelo tácito a formas mais ou menos veladas de xenofobia (nós e os outros, os outros contra nós), como se pretende construir uma identidade nacional em perigo...

... e isto, exactamente no país onde a identidade incorpora elementos de diversidade quase únicos no mundo, onde ser o mesmo é, todos os dias, ser diferente!

O discurso do egoísmo nacional é igualmente uma opção ideológica E UMA ESCOLHA ÉTICA. Que, porque assim é, corrói valores mais básicos, de solidariedade em geral e de compaixão para com os mais pobres.

4– E é nesse contexto deletério que se inscrevem outros males que, não sendo exclusivamente americanos, nos Estados Unidos se agravam pelos desafios adicionais do mosaico racial e étnico, cultural e religioso, que se identifica com os fundamentos daquela sociedade.

Assim, os sonhos da supremacia branca, filhos da preeminência histórica dos primeiros colonos, esbarram com a realidade multissecular da escravatura e de tudo o que ela deixou como vestígios tardios. E encontram expressão concreta nos episódios de racismo, tão dispersos no seio da população, como habitando instituições tão emblemáticas como as forças policiais.

A discriminação e a violência religiosas é também uma das características mais marcantes e deploráveis do tempo presente.

E o tristemente irónico é que o preconceito religioso tem muito mais de extra-religioso do que teológico propriamente dito. Pois tal preconceito é frequentemente o ponto de convergência ou de encontro de muitos “ismos”, desde o racismo ao tribalismo, e de muitas “ias”, desde logo a xenofobia que, em clima de incerteza colectiva, é explorada pela demagogia de políticos sequiosos de poder.

Em política, quase tudo deriva de opções éticas. Quer se queira, quer não.

(*) Universidade de São José

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L I T U R G I AO CLARIM | Semanário Católico de Macau | SEXTA-FEIRA | 9 de Novembro de 2018

PT 11

HORÁRIO DAS MISSAS(DOMINGOS E DIAS SANTOS)

7:00 horas — Fátima (C)7:30 horas — S. Lourenço e St.º António (C)7:30 horas — S. Lázaro (C)7:45 horas — Sé (C)8:15 horas — S. Francisco Xavier — Mong-Há (C)8:30 horas — N.ª Sr.ª do Carmo Taipa (C) 9:00 horas — S. Lourenço; Fátima (C); St.º António (C)9:15 horas — Penha 9:30 horas — S. Lázaro; S. Francisco Xavier (Mong-Há); S. José Operário (C); S. Agostinho (I); Sé(C)10:00 horas — S. Francisco Xa vier — Co loa ne (I, C); N.ª Srª do Carmo — Taipa (I)11:00 horas — Seminário S. José (Tagalog); St.º António (P)11:00 horas — Sé (P); Hospital de S. Januário (P);11:00 horas — S. Lázaro (I); S. Agostinho (Tagalog)11:15 horas — Instituto Salesiano (I); N.ª Sr.ª do Carmo Taipa (P) 12:00 horas — Fátima (I)16:30 horas — Seminário S. José (I); Fátima (Vietnamita); S. Agostinho (I)17:00 horas — Sé (I)17:00 horas — S. Lourenço (Bahasa Indonésio) 17:30 horas — S. José Operário (I); St.º António (P) (Terça)18:00 horas — S. Fr. Xavier Mong-Há (C); S. Lázaro (P)18:30 horas — Sé (I); S. Agostinho (I)20:00 horas — S. Lourenço (I)20:30 horas — S. José Operário (M)

MISSAS ANTECIPADAS

16:00 horas — St.º António (K) 17:00 horas — S. Domingos (P)17:30 horas — S. Fr. Xavier Mong-Há (I)18:00 horas — Sé (P) 18:30 horas — N.ª S.ª do Carmo — Taipa (I)19:00 horas — S. Lázaro (C)20:00 horas — Fátima (C)20:00 horas — S. Lourenço (I)

ABREVIATURAS

C - Em Cantonense I - Em Inglês M - Em Mandarim P - Em Português K - Em Coreano

INTRODUÇÃO ÀS LEITURAS

Jesus põe em relevo a modesta oferta que uma viúva deposita na caixa do templo, comparando essa oferta com a ostentação das pessoas ricas (EVANGELHO: Mc., 12, 38-44). O gesto daquela mulher é igual ao daquela outra viúva que, apesar da sua miséria, acolheu em casa

o profeta Elias (PRIMEIRA LEITURA: I Rs., 17, 10-16). Na Carta aos Hebreus é feita a comparação do culto prestado no templo do Antigo Testamento, onde o sacerdote entrava com o sangue das vítimas do sacrifício, com a nova liturgia em que vemos a Cristo entrar no céu, coberto com o Seu próprio sangue (SEGUNDA LEITURA: Hb., 9, 24-28).

NO texto de hoje Jesus está no templo e reafirma a Sua desaprovação aos es-cribas. Na posição de letra-dos (e dirigentes), em vez de prestar serviço à comu-nidade judaica, eram arro-gantes e convencidos.

Diversamente do Evan-gelho (Mt., 20, 8. 16; Mc., 9, 35; Lc., 14, 9-10) que-riam ser considerados os mais importantes devido à sua condição. Pior ainda, aproveitavam da sua profis-são, nas questões jurídicas dos testamentos, para ex-torquir dinheiro às viúvas, ou alongando demasiada-mente as causas ou fazen-do-se pagar regiamente.

Nem mesmo as suas orações escapam às crí-ticas de Jesus. Elas servi-ram, em Mt., 6, 5-6, como

termo de confronto para a oração cristã: «Quando orardes, não sejais como os hipócritas porque eles gostam de fazer oração, pondo-se de pé nas sinagogas e nas esquinas, a fim de serem vistos pelos ho-mens. Em verdade vos digo: já receberam a sua recompensa. Mas tu, quando orares, entra no teu quarto…»

Sem querer apresentar, em contrapartida, uma imagem simplesmente conceitual do homem bom, Jesus dirige, como um bom semita, a nossa atenção para um gesto concreto bem diverso do dos escribas, acontecido no mesmo lugar (no tem-

plo): enquanto os ricos depositavam muito di-nheiro no cofre do tem-plo, uma viúva depositou somente algumas moe-das, mas que eram tudo o que possuía. Ela ofereceu mais que todos, diz Jesus. Com isso mostra que os critérios de valor de Deus são diversos dos escribas. Deus tem predilecção por aqueles que empe-nham a sua vida e não simplesmente o seu di-nheiro; por aqueles que acreditam na generosida-de pela generosidade, na sinceridade pela sinceri-dade e não se preocupam com retribuições.

32º DOMINGO COMUM – Ano B – 11 de Novembro

Os critérios de Deus não são os dos homens

Deus aprecia a generosidade e abomina a arrogância

O Papa recebeu, na passada segunda-feira, no Vaticano, uma delegação da comunidade judai-ca do Cáucaso, para um encontro que teve como tema central a questão da liberdade religiosa.

De acordo com o portal Vatican News, Fran-cisco salientou que «a liberdade religiosa é um bem supremo a ser salvaguardado, um direito huma-no fundamental e um baluarte contra a afirmação dos totalitarismos».

Esta foi a primeira vez, refere a mesma fon-te, que representantes do Congresso Mundial dos Judeus do Cáucaso se deslocaram a Roma para uma audiência com o Papa.

O diálogo entre as duas partes aconteceu no contexto da memória do holocausto nazi, que custou a morte a muitos membros da comuni-dade judaica.

A história dos judeus do Cáucaso vem desde o século V depois de Cristo, com origem na antiga Pérsia, hoje conhecida como Irão.

Durante muitos séculos esta comunidade esteve presente sobretudo na região monta-nhosa junto ao Mar Cáspio, mas com a queda

da antiga União Soviética a maior parte está agora radicada em países como a Rússia e o Azerbaijão.

Durante a audiência, Francisco começou por recordar o encontro que teve em Setem-bro último com a comunidade judaica na Li-tuânia, no âmbito da viagem apostólica que promoveu à região leste da Europa, e neste caso também à Letónia e à Estónia.

Uma visita que serviu para assinalar também o 75.º aniversário da destruição do gueto ju-deu que havia sido criado em Vilnius, na capi-tal lituana.

Sobre as relações entre cristãos e judeus, o Papa argentino frisou que «um cristão não pode ser anti-semita».

«Nós partilhamos as mesmas raízes, seria uma contradição de fé e de vida. Pelo contrário, somos chamados a trabalhar de modo a que o anti-semitis-mo seja banido da comunidade humana», comple-tou Francisco.

In ECCLESIA

FRANCISCO ACOLHEU DELEGAÇÃO DE JUDEUS DO CÁUCASO

Papa defende salvaguarda da liberdade religiosa

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PT12

PE. JOSÉ MARIO MANDÍA

Depois de termos estudado o que as outras obras (“evidên-cia externa”) dizem a respeito dos autores dos quatro Evange-lhos, vamos agora comparar o que elas dizem com o que en-contramos em cada um desses Evangelhos. Se encontrarmos coincidências com a “evidência externa”, então teremos mais provas da autoria desses textos.

MATEUS – A evidência for-necida por autores como Santo Ireneu, Clemente de Alexan-dria, Orígenes e Eusébio pro-clamam que (1) Mateus é o autor do primeiro Evangelho; (2) dedicou o seu trabalho aos judeus; (3) foi escrito original-mente em Aramaico; e (4) era destinado a fortalecer a fé dos judeus convertidos e para atrair possíveis novas conversões.

Quando examinamos o Evan-gelho atribuído a Mateus, des-cobrimos que (1) ele usava e referia muitas vezes o Antigo

PE. RODRIGO LYNCE DE FARIA (*)

O título deste texto é de um livro que esteve na berra há uns anos. Segundo ouvi dizer, conta a história de uns ratinhos que viviam num labirinto e que dependiam do queijo como alimento para sobreviverem. Tinham descoberto um lugar onde havia abundância de queijo e, apoiados nessa se-gurança, viviam felizes e contentes.

Certo dia, porém, deram-se conta de que o queijo tinha acabado. A reacção de cada um deles foi diferente. Uns con-tinuaram a procurar o queijo no lugar habitual com o argumento de que sem-pre tivemos alimento aqui e isso agora, evidentemente, não vai mudar. Outros,

pelo contrário, já se tinham dado conta de que o queijo estava a terminar. Por isso, prudentemente, tiveram a preocu-pação de procurar esse alimento noutros lugares. Como o tinham encontrado, já não dependiam somente do queijo da-quele local para sobreviverem.

Esta história faz-nos pensar que a nos-sa vida muda com muita frequência. Por isso, o modo como realizamos o traba-lho e os meios com que contamos para o fazer podem vir a tornar-se obsoletos.

Cada um de nós acumula, com o pas-sar do tempo, uma série de costumes e experiências que determinam o nosso estilo de trabalhar e também o nosso es-tilo de viver. Um belo dia, porém, damo--nos conta de que essas rotinas já não funcionam: necessitam de ser adaptadas às novas circunstâncias. Por esse motivo, entre outros, somos seres inteligentes,

com capacidade de adaptar-nos às novas situações. Dizer isto, no entanto, não é o mesmo que dizer que tudo na vida é mutável, passageiro e efémero. Se tudo fosse mutável, uma pessoa com princí-pios éticos seria obsoleta por definição.

Se os princípios mudam com as cir-cunstâncias, das duas uma: ou não sabe-mos o que são princípios ou não os te-mos. Como dizia uma personagem sem princípios enquanto negociava: «– Que fique claro que estes são os meus princípios. Se não gosta deles, eu arranjo outros. O único importante é fecharmos hoje o negócio».

Os princípios, se o são de verdade, não só não nos impedem de adaptar-nos às novas circunstâncias, como são a base firme que nos permite um apoio nessas mudanças. Talvez por isso – entre outros motivos – o Papa Bento XVI convocou o Ano da Fé (2012-2013), para que conhe-

cêssemos bem os princípios da fé cristã e que redescobríssemos a alegria de acre-ditar e o entusiasmo de comunicar a fé como aquilo que é: o maior tesouro que Deus nos deu. Uma fé que, como dizia Bento XVI, tem de ser professada, cele-brada, vivida e rezada. Uma fé que não é uma teoria – é o encontro com uma Pessoa que vive na Igreja.

Os tempos mudam – as circunstân-cias também – mas a nossa fé permane-ce e permanecerá sempre a mesma. E é a partir dela que podemos adaptar-nos à conjuntura actual e empenhar-nos numa nova evangelização. Uma evangelização que é nova mas que procede da fé de sem-pre: aquela que nos deixou Jesus Cristo e que a Igreja tem a missão de guardar e transmitir com fidelidade.

(*) Doutor em Teologia

FAMÍLIA E FÉ

“Quem roubou o meu queijo?”

TEOLOGIA, UMA DENTADA DE CADA VEZ (7)

Está a evidência interna nos Evangelhos segundo a evidência externa?

Testamento, o qual era familiar aos judeus; (2) citava profe-cias do Antigo Testamento que apontavam para o Messias; e (3) fazia referência a costumes e tra-dições, mas – ao contrário dos outros Evangelhos – não os ex-plicava, porque assumia que os leitores conheciam os costumes a que o seu Evangelho reporta.

MARCOS – Autores como Papias, Santo Ireneu, Clemente de Alexandria, Orígenes e Ter-

tuliano associaram São Marcos a São Pedro, e confirmaram que Marcos foi solicitado, pelos primeiros cristãos de Roma, a escrever o que Pedro pregara. Isto é o que a “evidência exter-na” nos diz.

Quando olhamos para este Evangelho, o que nele encontra-mos? Pedro é mencionado 24 ve-zes (em Mateus, 26 vezes; em Lu-cas, 29; em João, 41; e no mínimo o dobro das vezes em todos os

outros apóstolos). O que tal nos revela é que Marcos simplesmen-te escreveu sobre as pregações de Pedro, que falou humildemente de si próprio. Em contraste com Mateus, este Evangelho não faz nenhuma referência a profecias do Antigo Testamento, nem aos costumes judaicos. Muitos dos acontecimentos que narra são os que São Pedro testemunhou pes-soalmente e que por isso usou na sua pregação.

LUCAS – Podemos encontrar “evidências externas” forneci-das por São Jerónimo, Eusébio, Orígenes, Tertuliano, Santo Ireneu, São Policarpo e São Jus-tino, o Mártir, que asseguram que o terceiro Evangelho fora escrito por Lucas, um gentio, médico e companheiro próxi-mo de São Paulo. Este escreveu para os não judeus convertidos ao Cristianismo. Ao lermos o terceiro Evangelho, pudemos verificar o seguinte: (1) A cons-trução gramatical mostra-nos que o autor não era judeu. (2) Paulo refere-se três vezes à sua ligação a “Lucas, o amado mé-dico”. Aliás, Lucas, que também é visto como o autor dos Actos

dos Apóstolos, fala da sua re-lação com Paulo no livro dos Actos. (3) Usa uma termino-logia médica para descrever as doenças, quando fala das curas realizadas por Jesus Cristo. E (4) dirige-se aos convertidos e encoraja-os; fala sobre a alegria (felicidade) da conversão.

JOÃO – Santo Ireneu, um discípulo de São Policarpo, que por seu turno foi discípulo de São João, é ele próprio uma valiosa testemunha de que São João escreveu o quarto Evange-lho. Eusébio, Justino e muitos outros também atestam a sua autoria. Neste caso, há mais “evidência interna” directa dos que nos outros três Evangelhos. São João diz, em 19:26: «Quan-do Jesus viu a Sua Mãe, e o discí-pulo que ele amava de pé, perto, disse a Sua Mãe, “Mulher, olha, o teu Filho”» e então, no verso 35 do mesmo capítulo, São João acrescenta: «Ele que viu isto tor-nou-se uma testemunha – o seu tes-temunho é verdadeiro e ele sabe que diz a verdade – na qual tu também poderás acreditar». Para além de que Ele se identifica no capítu-lo 21:20-24.

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PT 13

VITOR TEIXEIRA (*)

A pressão diplomática ociden-tal crescia para que o Japão se abrisse. Apenas chineses e ho-landeses frequentavam o País, e às vezes também os ingleses. A política de isolamento do Império era cada vez mais pos-ta em causa. Além de atrasar o País. O principal objectivo era, como se sabe, fechar o Japão aos missionários estrangeiros, de forma a conservar as tra-dições nipónicas. Ainda que, encapotadamente, existisse outro objectivo, urdido por holandeses, que era o de man-terem o exclusivo do comércio e negócio com os japoneses (com excepção dos chineses), enfraquecendo os interesses ibéricos instalados em Macau, Índia (Portugal) e Filipinas (Espanha).

Em 1853, o comodoro ame-ricano Matthew Perry (1794-1858), comandante-chefe da Esquadra do Índico Oriental, dos Estados Unidos, à fren-te de uma frota de navios de guerra, postou-se defronte do porto de Uraga, na baía de Tóquio. Dispondo de elevado poderio militar, Perry impôs aos japoneses a abertura dos seus portos aos americanos. No ano seguinte, em 1854, o

A SECRETA TRANSMISSÃO DA FÉ

Os “Cristãos Escondidos” no Japão – III

A vida estava difícil para os cristãos no Império do Sol Nascente. E demoraria muito a ficar menos áspera. Atravessariam o século XVIII todo e esperariam por meados de Oitocentos. Mais de duzentos anos de sofrimento e escondimento. Uma clandestinidade que teve os seus frutos, uns melhores, outros nem tanto. O longo período de dominação dos Tokugawa, em meados do século XIX, começava a desenhar o seu fim. Parecia haver tempo para esperança, mas era cedo para a ter...

Governo do xogunato assina-ria um tratado de paz entre o Japão e os Estados Unidos, es-tes representados pelo como-doro Perry, que voltara nesse mesmo ano uma segunda vez ao Japão para abrir mais por-tos, como Shimoda e Hakoda-te. O maior efeito prático des-tas missões de Perry foi o fim do isolamento nipónico face ao exterior. Uma vez mais, os desígnios económicos impu-nham-se, ateando os fins mili-tares a usar, só assim se poden-do vir a impor a abertura para outros efeitos, como o missio-nário e o cultural. Assim se fez e o Japão abriu-se. Em 1858, o xogunato, moribundo e inca-paz, assinou mais tratados de amizade e comércio com os Estados Unidos, Rússia, Ho-landa, Inglaterra e França, as grandes nações da época, que já espreitavam e dominavam na China.

«NÓS TEMOS O MESMO

CORAÇÃO QUE TU»

A fraqueza dos governantes japoneses, que antes fecharam o País, mas que agora eram for-çados a abri-lo, permitiu que na sequência de todos estes acordos se criasse a oportuni-dade de regresso para os mis-sionários católicos. E também o tempo de revelação de algo

desconhecido, encriptado e diluído na noite dos tempos, como a névoa que cobre os ar-rozais do Japão no Inverno...

De repente, emergiram se-gredos e histórias de fé incrí-veis naqueles dias de abertura. Ficou-se a conhecer, então, que na aldeia de Urakami, perto de Nagasaki, a fé cristã, banida durante cerca de 250 anos, tinha sido preservada e sistematicamente passada de geração em geração. Urakami havia sido uma área de missio-nação jesuítica antes de 1634, entregue à Companhia de Je-sus por um daimyo cristão, Arima Harunobu. Depois, ali permaneceria uma comunida-de criptocristã.

Os Tokugawa, ainda defen-sores da sua política isolacio-nista, declinavam, e o poder regressava gradualmente às mãos do imperador Meiji (1852-1812; imperador entre 1867 e 1912). O País rumava em direcção ao Ocidente, à modernização pela abertura e assimilação de culturas da Eu-ropa e América. Mas mesmo assim, apesar da abertura cul-tural, científica, tecnológica e política, subsistiam dificul-dades no que toca à religião, mesmo que o Cristianismo estivesse intimamente conec-tado com aqueles ventos cul-turais ocidentais. Ainda sub-

sistiam trevas no Japão. Mas os missionários lá iam regres-sando ao Japão, no caso as missões estrangeiras de Paris (MEP), consagradas à missão na Ásia. Em 1865, o padre Ber-nard-Thadée Petitjean (1829-1884) estava já na cidade de Nagasaki (vivia no Japão desde 1859), onde erigiu uma igreja, Oura, que mais tarde se con-verteria na catedral da diocese (Nagasaki). Era no início uma igreja para a nação francesa, mas aberta a todos.

Por aqueles dias, a 17 de Março de 1865, um mês de-pois da conclusão das obras da igreja (19 de Fevereiro), um grupo de japoneses, que ouvira falar da chegada de missionários e da fundação de igrejas, acercara-se da igreja de Oura e procurara, em abso-luta discrição, o sacerdote que ali estava a capelanear. Eram quinze os japoneses, liderados por Sugimoto Yuri, e o sacer-dote era o padre Petitjean. Este estava ajoelhado a orar na igreja, quando de repente sentiu, atrás de si, alguém se ajoelhar e sussurrar-lhe, sere-namente, ao ouvido, uma fra-se que nunca mais esqueceria e que era quase como “santo e senha” de descoberta e reacti-vação da cristandade nipónica escondida. «Nós temos o mesmo coração que tu», fora o sussur-

ro de uma mulher ajoelhada atrás de si. Era, pois, o primei-ro momento de (re)descober-ta e confirmação de suposições e relatos não confirmados de grupos escondidos de japone-ses que tinham secretamente transmitido a sua fé. Era algo fantástico e realizado da for-ma mais plácida e até poética. Duzentos anos depois da cruel supressão do Cristianismo no Japão, eis os cristãos escondi-dos, os Kakure Kirishitan. Sem padres, a fé não se perdera, es-tava então confirmado.

«ONDE ESTÁ A IMAGEM DE SANTA MARIA?»

A alegria do missionário fora imensa, da parte dos japo-neses, mais contida claro, mas retumbante no seu âmago, era a alegria do fim de uma tra-vessia do deserto expiatório e desafiante, mas a caminhada multissecular valera a pena. O padre Petitjean, recorde-se, foi nomeado vigário apostóli-co do Japão em 11 de Maio de 1866 e bispo titular de Myrio-phiytos na mesma altura. Foi depois nomeado vigário apos-tólico do Sul do Japão em 1876, até à sua morte. Depois do sussurro e do missionário olhar para trás para atestar a realidade, vira que eram uns pobres pescadores e lavrado-res que ali estavam, temerosos de represálias, a medo, mas querendo apenas um sinal de que a Igreja voltara ao Japão. «Onde está a imagem de Santa Maria?», perguntou um deles, usando ainda a antiga desig-nação ibérica dada à Virgem Maria, assim mantida ao longo de séculos, secretamente. Era uma forma de confirmarem que era um padre verdadei-ro e que não havia perigo ou encenação das autoridades para os descobrir, como tan-tas vezes sucedera. Petitjean logo correu para um altar la-teral da igreja e mostrou-lhes a imagem de Nossa Senhora que procuravam. «Sim, é mesmo Santa Maria! Ela tem o Menino Jesus nos braços!», exclamaram de alegria e emoção os japo-neses, que logo se ajoelharam em reverência e emoção do reencontro. A alegria, para ambos, terá sido algo incrível, como se pode imaginar.

(*) Universidade Católica Portuguesa

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ቂ Ӗ ؐ 儽 ֈ ء ؐ 儽 ۯ ӟ ʉ ء ጒ ۄ ʩ ੬ ˄ ؐ 儽 ᇷ ˗ENTREGUE ESTE CUPÃO NAS BILHETEIRAS DO CINETEATRO DE MACAUؐ 儽 ̆ ಮ í � ̈ � � ̆

DATA DO SORTEIO: 29 DE MARÇO DE 2018

Segunda 5

ቂ Ӗ ؐ 儽 ֈ ء ؐ 儽 ۯ ӟ ʉ ء ጒ ۄ ʩ ੬ ˄ ؐ 儽 ᇷ ˗ENTREGUE ESTE CUPÃO NAS BILHETEIRAS DO CINETEATRO DE MACAUؐ 儽 ̆ ಮ í � � ̈ � � ̆

DATA DO SORTEIO: 15 DE NOVEMBRO DE 2018

Quarta 7

Quinta 8

A conferência que Vítor Serrão apre-senta no “Colecções em Exílio” (V Co-lóquio Colecções de Arte em Portugal e Brasil nos séculos XIX e XX), na Fundação Calouste Gulbenkian, a 12 de Novembro, intitula-se “Um grande pintor português do século XVII face à desmemória: a obra de Diogo Pereira em exílio, entre Portugal, a Europa e o Brasil”. A partir da “Tróia abrasada” de Diogo Pereira, tela (1550-1560), que se encontra no Palazzo Reale de Nápoles, estudam-se algumas obras deste pintor que correm mundo em colecções de Paris, Milão, Nápoles e também no Brasil. A verdade é que a sua condição de “peças em exílio” conduziu à gradual perda de memó-ria das suas origens portuguesas, le-vando a que várias telas suas fossem atribuídas a outros autores, como o celebérrimo Monsù Desiderio, entre outros nomes italianos, flamengos ou

Pintor 2

Acaba de sair um novo livro de Raoul Va-neigem intitulado “Contribuição para a emergência de territórios livres da empre-sa estatal e mercantil”. À desumanização que o capitalismo propaga ao desertificar o planeta, a experiência das sociedades autogestionárias impõe o surgimento de terras livres, livres do jugo do Estado e do sistema económico que determina os seus decretos. Dos impérios às repúblicas, os modos de governo do passado apenas modernizaram a barbárie universal em detrimento da felicidade individual e co-lectiva a que milhões de pessoas aspiram. A sociedade autogestionária é a única sociedade capaz de restaurar o futuro humano de homens e mulheres que, re-duzidos diariamente ao estado da merca-doria, tiveram até agora que se contentar apenas em sonhar com ela.

Decorre até ao final de Janeiro de 2019, na Torre do Tombo, uma exposi-ção que assinala os 600 anos da nomea-ção de Fernão Lopes como “Guarda-dor das Escrituras do Tombo”. Sabe-se que exerceu o cargo entre 1418 e 1454, data da carta pela qual, por ser já “tam velho e fraco”, foi, “a seu prazimento”, substituído das escrituras do Tombo por Gomes Eanes de Zurara. O serviço de maior importância nos primórdios da existência do Real Arquivo da Tor-re do Tombo, então situado no castelo de São Jorge, e até ao século XVIII, era o da passagem de certidões de auten-ticação de documentos. Após requeri-mento das partes dirigido ao rei, este mandava ao guarda-mor que reunis-se as escrituras pedidas e as mandas-se passar em certidão. O traslado em pública-forma, que vinha inserto em carta régia e com menção do requeri-mento, era assinado pelo guarda-mor e selado. São várias as designações que surgem nas certidões relativamente ao cargo que desempenhava: “Vassalo d’El Rey” e “Guardador das Escrituras do Tombo”, “Guarda das Escrituras do Registo d’El Rey” ou “Guardador das Escrituras que estom na Torre do Cas-tello de Lisboa”. Em 1419, Fernão Lo-

Diogo Pereira, documentado em Lisboa entre 1630 e 1658, foi uma celebridade no seu tempo. As colecções da época da Restauração (reinados de D. João IV e D. Afonso VI) possuíam obras suas avaliadas em alto preço, e especialistas da estirpe de Félix da Costa Meesen e Pietro Guarienti deixaram registo da estima que recebiam as suas Tróias e So-doma em chamas, Infernos, Purgatórios

e outros temas “de género”. Estas repre-sentações eram o que ao tempo se podia considerar quadros políticos, de oculto discurso parenético anti-castelhano e, por isso, muito populares. Todavia, com o tratado de paz com Madrid (1668), estes temas perderam actualidade, dei-xaram de interessar e muitas das obras de Pereira dispersaram-se pela Europa e até mesmo pelo Brasil.

Pintor 1

franceses. Só a reavaliação do estilo do artista em anos recentes permitiu o acerto identitário que se impunha e a devolução de peças mal atribuídas, de que se perdera o rasto, ao “corpus” deste pintor português.

Livro

Guardador

pes exerceu funções como escrivão dos livros de D. João I e, em 1422, surgiu como escrivão da puridade do Infan-te D. Fernando. Por este tempo, teria sido nomeado tabelião geral do reino, cargo para o qual estava especialmente habilitado por ser guarda-mor das es-crituras. Foi igualmente cavaleiro da Casa do Infante D. Henrique e secre-tário de D. Duarte quando infante, o qual, depois de rei, o nomearia “Chro-nista Mór do Reino”. Para além do va-lor historiográfico, a narrativa de Fer-não Lopes ganha um lugar cimeiro na literatura portuguesa pelo movimento e riqueza que imprime à sua escrita, numa linguagem quase cinematográfi-ca, nomeadamente nos capítulos onde situa as personagens e os acontecimen-tos entre 1383 e 1385.

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E N T R E T E N I M E N T OO CLARIM | Semanário Católico de Macau | SEXTA-FEIRA | 9 de Novembro de 2018

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TDM Canal 1TDM Canal 1TDM Canal 1TDM Canal 1 EVENTOS www.icm.gov.mo/pt

Sexta-feira 13:00 TDM News (Repetição)13:30 Telejornal RTPi (Diferido)15:00 Mistura Fina15:50 Os Craques do Pingue-Pongue16:15 Nelo & Idália16:50 Quem Quer Ser Milionário17:55 A Ferreirinha18:50 TDM Talk Show (Repetição)19:25 Livros com João Guedes (Repetição)19:35 Telenovela: Os Nossos Dias20:30 Telejornal21:15 Portugueses Pelo Mundo22:00 Contentor 1322:30 Série: Filha da Lei23:15 TDM News23:50 Resumo Liga Europa 2018/201900:10 Cinema: O Costa do Castelo02:20 Telejornal (Repetição)03:05 RTPi (Directo)

Sábado10:30 Zig Zag11:00 Beo and Peno11:10 Os Ursos Boonie e o Fantástico Outono11:40 Chai Chai12:00 Endereço Desconhecido12:30 Gostos e Sabores13:00 TDM News (Repetição)13:30 Telejornal RTPi (Diferido)14:30 Telenovela: Os Nossos Dias (Compacto)

CARTOON

16:45 Janela Indiscreta com Mário Augusto17:20 Hora dos Portugueses18:20 Lusa Music Box18:55 Animais Anónimos19:40 198620:30 Telejornal21:15 Grande Entrevista: Raimundo do Rosário22:20 Ana Bacalhau: Nome Próprio23:15 TDM News23:50 Cinema: O Mensageiro dos Espíritos 2: Os Fantasmas de Georgia01:35 Telejornal (Repetição)02:20 RTPi (Directo)

Domingo10:30 Animaizinhos Selvagens Exploradores11:00 Missa Dominical12:00 Visita Guiada12:35 A Essência13:00 TDM News (Repetição)13:30 Telejornal RTPi (Diferido)14:30 Triângulo Jota15:20 Brainstorm16:05 Got Talent Portugal18:10 Bem-Vindos a Beirais19:00 A Cidade na Ponta dos Dedos19:10 Aqui Há História19:20 Grande Entrevista: Raimundo do Rosário (Repetição)20:30 Telejornal21:15 Contraponto22:20 A Verdadeira História de Weinstein23:15 TDM News23:50 Reportagem (Repetição)00:10 Mulheres Assim00:50 Telejornal (Repetição)01:35 RTPi (Directo)

SERENATA ENCANTADORA

09/11 | Sexta-feira | 20:00 horasTeatro Dom Pedro V

As pessoas imaginam uma “Serenata” com a cena comovente de um jovem que, sob o luar, toca viola e canta canções de amor em frente da casa da sua amante. Durante o Período Clássico, as serenatas não apenas mantiveram as persistentes expressões emocionais líricas, mas a forma da sua execução tornou-se mais flexível. Vão ser apresentadas quatro serenatas de Mozart, Beethoven, Reger e Milhaud, sendo possível escutar como compositores de diferentes gerações transmitem os seus sentimentos através da música.

ORQUESTRA DE MACAU CELEBRA O SEU 35º ANIVERSÁRIO – GALA E ENCONTRO ANUAL

10/11 | Sábado | 19:30 horasTeatro Dom Pedro V

Em comemoração do seu 35º aniversário, a Orquestra de Macau (OM), sob a égide do Instituto Cultural, irá apresentar o concerto “Confraternizando com a alegria musical – Gala e encontro anual”, sendo servido um coquetel após o concerto. Os bilhetes deste concerto foram distribuídos, sendo bem-vindos os amantes da música a assistir ao concerto para celebrar este aniversário com a OM. O concerto irá apresentar um programa especial seleccionado pelos músicos da Orquestra de Macau, incluindo o Quarteto em Sol Menor de Francois Devienne, Andante e Rondo de Franz Doppler, e Serenata em Dó Maior de Ernst von Dohnányi, entre outros.

Cinema: O Costa do Castelo. Sábado, às 00:10 horas.

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16 | ÚLTIMA | SEXTA - FEIRA | 09 - 11 - 2018Rua do Campo, Edf. Ngan Fai, Nº 151, 1º G, MACAU

TEL. 28573860 FAX. 28307867www.oclarim.com.mo | www.facebook.com/oclarimweekly

Céu muito nublado intervalado de períodos de pouco nublado.Bruma seca durante a manhã.

Vento: força 3 a 4 do Quadrante Norte, tornando-se do Quadrante Leste.Humidade relativa entre 55% e 90%.

O índice UV máximo previsto é de 6, classificado de Alto.

TEMPOCOM ABERTAS21º Min. - 28º Máx.

www.smg.gov.mo TAXAS DE CÂMBIO

http://www.bcm.com.mo TAXAS DE CÂMBIO

USD 1 8.0556EUR 1 9.193GBP 1 10.56JPY 1 0.07079AUD 1 5.8631NZD 1 5.4546RMB 1 1.1565HKD 1 1.1527

MOP

Joaquim Magalhães de Castro

JOAQUIM MAGALHÃES DE [email protected]

Os argumentos do renegado Martim de Melo surtiram efeito e o “poeta” Shaista Khan num instante se transmu-tou em feroz guerreiro. Tratou logo de colocar à frente do combate o seu filho Ibrahim Khan (nos textos portugueses Inaiatulá Cã), arregimentador de uma tropa de 150 mil homens, munidos de artilharia e embarcações fluviais. Atente-se ao farto número! Se é certo que, atendendo aos exageros líricos da época, devemos manter reservas em relação a números sempre que se trata de disparidade de forças num campo de batalha, o presente caso – ousamos dizê-lo – traduz bem do temor provoca-do pelos portugueses junto dos seus ini-migos, e quiçá, da própria fraqueza do exército mogol. A 26 de Junho o mes-mo encontrava-se apenas a três milhas da cidade, facto causador de enorme comoção junto da lusa comunidade, apanhada de surpresa.

Ao cair da noite estavam já barrica-das as ruas, distribuídos os mosquetes a quem os sabia e podia manejar, ten-do assumido o comando das operações um tal Manuel de Azevedo, que trata-ria de nomear uma série de capitães para o ajudarem nos preparativos da defesa. Mas antes do confronto, valia a pena a negociação. Nada estava garan-tido. Nada se perdia. Recairia sobre o nosso padre João Cabral a difícil tarefa. Ao encontrar-se com o general mogol queixou-se este do apoio que a cidade estaria a prestar aos caçadores de escra-vos de Dianga, e, sobretudo, relembrou o padre da crescente suspeita do envol-vimento das gentes de Hugli no caso da desaparecida nobre mogol. Cabral refutou as acusações, considerando-as infundadas, garantindo poder provar o que dizia. Se podia provar – retor-quia o mogol – então que o autorizas-se a fazer uma busca à cidade. Se ali fossem encontrados bengalas raptados demonstrado ficaria o ilícito. Ora, em Hugli, havia na verdade muita dessa gente. Antigos escravos comprados aos piratas locais, os denominados “mag”, e aos alevantados portugueses. Só que en-

BENGALA E O REINO DO DRAGÃO – 51

O ataque a Hugli

tretanto todas essas pessoas tinham sido convertidas à fé cristã e, de certa forma alforriadas, pois à sombra da Igreja se abrigavam. A lógica era: como cristãos não podiam ser abandonados. Convém não esquecer que os referidos bengalas, uma vez “libertados”, passariam a servir os ocupantes mogóis, que em termos culturais e étnicos nada tinham a ver com aquela região, pois ligavam-nos à Pérsia e à Mongólia as suas raízes.

Cabral apressou-se a transmitir o reca-do às autoridades de Hugli, que de novo o incumbiriam de ir falar com o genera-líssimo mogol, desta feita com o recado--recusa quanto à desejada busca mogol. O filho de Shaista Khan teria de confiar na palavra dada. Mas este, falhadas as negociações, procedeu à investida a 2 de Julho, logo ao amanhecer, que é quando por norma se iniciam as mortandades. Fê-lo em duas frentes: por terra e por via fluvial. Os arredores de Hugli cedo

cairiam em seu poder mas o núcleo ci-tadino, bem entrincheirado, resistiria. Informa Cabral na sua carta que do lado inimigo se perderam seiscentos homens e “do nosso apenas morreram seis portu-gueses e quinze indianos”. E, em jeito de conclusão desse primeiro dia de um cer-co que se iria estender ao longo de um mês, acrescentou: “Os mouros ficaram grandemente desanimados com as per-das. Alguns deles insistiram com Inaia-tulá para desistir da empresa”, pois se os portugueses levassem a melhor, “toda a Bengala, ou pelo menos todas as regiões adjacentes se juntariam a eles”.

Apesar desta primeira derrota, os mogóis insistiram na investida, agora com redobrada cautela. O plano entre-tanto urdido implicava novas negocia-ções. Estavam dispostos a oferecer aos sitiados uma honrosa capitulação. Acre-ditando na boa-fé dos muçulmanos, apresentar-se-ia como mediador o prior

do mosteiro dos agostinhos, que os mo-góis ignorariam exigindo a presença de “gente de maior estatura”. Assim se fez, e os negociadores seguintes foram qua-tro capitães. Mal entraram na tenda do inimigo, Babur Khan, capitão das tro-pas mogóis, repetiu o pedido que fizera a João Cabral: queria todos os escravos presentes na cidade. Sensatamente, os portugueses entregaram-lhes cerca de noventa, mas o mogóis não se deram por satisfeitos, e, de chacota, exclama-ram: “Mandem também as mulheres negras, os hábeis cozinheiros, as bailari-nas, os pasteleiros, as costureiras, etc...”. Bom, está de se ver o que na realidade pretendiam os proclamados libertado-res... Face à recusa dos portugueses, os mogóis, certamente numa tentativa de ganhar tempo, solicitaram pessoas de maior calibre para continuar a negocia-ção. E é aí que vemos de novo em ac-ção o nosso padre Cabral, integrado no lote dos seis religiosos (entre os quais o mencionado prior agostinho) encarre-gados da tarefa. Mas os mogóis tinham aumentado a parada. Exigiam agora aos habitantes de Hugli que lhes entre-gassem metade dos seus bens e todo o numerário. Ora, uma proposta dessas soava mais a rendição do que a justo en-tendimento. Por isso, pediram licença para se retirar, só que os não deixaram e, como explicita Cabral, “todos nós fo-mos postos e a ferros”. Para os assustar os mogóis trouxeram um elefante – um daqueles animais utilizados nas execu-ções de criminosos, treinados para pi-sotear os corpos das vítimas depois de as levantarem com a tromba e agitarem bem agitados. Não podia ser mais ater-rador o cenário.

De entre os prisioneiros, seria Cabral o feliz contemplado para “levar a carta à Garcia”, neste caso, a Manuel de Azeve-do. Ou incondicionalmente se rendiam os residentes de Hugli, entregando to-das as suas riquezas, ou então os elefan-tes tratavam dos cativos. Face a tal ulti-mato restava aos portugueses lutar até ao limite, muito embora do outro lado os aguardasse um contingente de milha-res de homens e 120 canhões. Foi mês e meio de esforço bélico mogol, em vão. No processo ficaria reduzido a cinzas o mosteiro dos agostinhos e saqueada a Casa do Jesuítas. O centro da cidade, embora sujeito aos constantes bombar-deamentos e explosão de minas, estoica-mente foi resistindo.