OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO ... · ... que enfatizam o processo...
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Versão On-line ISBN 978-85-8015-076-6Cadernos PDE
OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE
Artigos
OS GÊNEROS JORNALÍSTICOS NAS SÉRIES FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL: A ELABORAÇÃO DE JORNAL COMO FERRAMENTA
DIDÁTICO-PEDAGÓGICA PARA LEITURA E PRODUÇÃO ESCRITA
MENDONÇA, Kesia Fernandes1
FRANCO DE OLIVEIRA, Neil Armstrong2
RESUMO
Este artigo apresenta os resultados e discussões da prática pedagógica sobre leitura e produção escrita por meio dos gêneros discursivos da esfera jornalística. O trabalho está fundamentado na noção bakhtiniana de linguagem e de gêneros do discurso, nas Diretrizes Curriculares de Língua Portuguesa para o Estado do Paraná e nas proposições de Vygotsky, que enfatizam o processo histórico-social e o papel da linguagem no desenvolvimento humano. A prática pedagógica teve como objetivo a elaboração de um jornal visando à melhoria da produção escrita dos alunos. Para alcançar nossos objetivos foram realizadas atividades de observação e análise dos conhecimentos prévios dos alunos, revisão das características dos gêneros textuais, análise e leitura de diferentes tipos de jornais e dos gêneros discursivos presentes nos mesmos, produção e distribuição de um jornal da classe. Participaram do projeto alunos do 9º ano, período vespertino, do Colégio Estadual Corumbataí do Sul, no decorrer do primeiro semestre de 2014. Pudemos observar que em algumas aulas, especialmente as iniciais, os alunos sentiram dificuldades para refletir sobre o tema abordado e, sobretudo, em identificar as características dos gêneros textuais. Porém, no decorrer dos trabalhos houve melhoria dos conhecimentos dos gêneros o que ficou evidenciado nas produções de textos realizadas pelos alunos para a produção do jornal. Consideramos que a execução do projeto pode contribuir para a melhoria do pensamento crítico e reflexivo e para a formação e desenvolvimento de alunos leitores/escritores.PALAVRAS – CHAVE: Língua Portuguesa; Produção Escrita; Gêneros jornalísticos; elaboração de jornal.
1 INTRODUÇÃO
Com as observações feitas no decorrer de nossa prática pedagógica,
constatamos que os alunos não demonstravam muito interesse no trabalho com a
leitura e escrita em sala de aula. Nos momentos em que lhe eram oferecidos textos
para serem lidos havia um aumento da indisciplina, pois os alunos não se
1 Professora de Língua Portuguesa da Rede Pública do Estado do Paraná. Integrante do Programa de Desenvolvimento Educacional, turma 2013.2 Professor Doutor do Departamento de Teorias Linguísticas e Literárias, da Universidade Estadual de Maringá (UEM).
concentravam, deixando transparecer que esta tarefa era monótona e sem
significado. Quando solicitávamos a produção de um texto, havia muito desinteresse
e, quando realizavam a tarefa da escrita, expunham ideias vagas, muitas vezes, sem
coesão e coerência. Consideramos pelas observações realizadas que os alunos não
apreciavam a escrita por considerá-la uma prática, muitas vezes, desestimulante.
A partir destas constatações, consideramos a possibilidade de proporcionar a
uma turma de 9º ano do Colégio Estadual Corumbataí do Sul uma prática
pedagógica que propiciasse aos alunos um incentivo para suas produções escritas.
Propusemos, então, a elaboração de um jornal por parte dos estudantes com o
intuito de que esse viria a contribuir para a melhoria do pensamento crítico e
reflexivo e para a formação e desenvolvimento de alunos leitores/escritores.
Acreditamos que na escola a produção de texto deve ser uma atividade
significativa, ou seja, o texto deve fazer sentido para o aluno. Assim, no
desenvolvimento do projeto não apenas apresentamos aos alunos os diversos
gêneros textuais, mas também procuramos fazê-los entender o porquê de cada
gênero, e os incentivamos a lê-los e a escrevê-los nestes formatos. Para tanto,
procuramos oferecer subsídios para que o aluno se torne capaz de realizar uma
produção textual significativa.
Apresentamos e trabalhamos com os alunos os gêneros presentes nos jornais
porque geralmente veiculam conteúdos bastante significativos, que levam em conta
o contexto sociopolítico-cultural e proporcionam a análise sobre as diversas formas
de perceber a realidade, bem como a observação do processo de transformação
social, as diferenças culturais, os preconceitos, a influência para o consumismo,
para a formação de opinião. E quanto à dinâmica da linguagem jornalística,
podemos destacar a partir dos gêneros os aspectos fonológicos, sintáticos e
semânticos, bem como características textuais como foco narrativo, argumentação,
coesão, coerência, entre outras.
2 O ENSINO DE LÍNGUA PORTUGUESA
O Ensino de Língua Portuguesa na Escola Pública do Estado do Paraná tem
se norteado pelas Diretrizes Curriculares de Língua Portuguesa para a Escola
Pública, cuja proposta constitui-se de um auxílio essencial para o professor do
Ensino Fundamental, pois além de apresentar fundamentos históricos e teóricos,
também oferecem uma proposta metodológica baseada na concepção de linguagem
como forma de interação social e que se realiza por meio do discurso materializado
no texto (oral ou escrito) e visto como um produto sócio-histórico e discursivo.
A proposta das Diretrizes leva em consideração que a linguagem é histórica e
social por se efetivar em um processo de interlocução e jamais poderá ser tomada
apenas como um código linguístico a ser decifrado, pois só tem significado na
medida em que há o processo de interlocução.
Ensinar Língua Portuguesa nesta dimensão é,
Aprimorar os conhecimentos linguísticos e discursivos dos alunos, para que eles possam compreender os discursos que os cercam e terem condições de interagir com esses discursos. Para isso, é relevante que a língua seja percebida como uma arena em que diversas vozes sociais se defrontam, manifestando diferentes opiniões.(PARANÁ, p.50,2008).
Assim, o trabalho pedagógico com a Língua Portuguesa exige que se
considere “os aspectos sociais e históricos em que o sujeito está inserido, bem como
o contexto de produção do enunciado, uma vez que os seus significados são sociais
e historicamente construídos” (PARANÁ, 2008, p. 16).
A proposta das DCEs (Paraná, 2008), pautada nos usos sociais da
linguagem, propõe um trabalho a partir da linguagem em uso, que é a dimensão
dada pelo Conteúdo Estruturante Discurso como prática social.
Entende-se por Conteúdo Estruturante, em todas as disciplinas, o conjunto de saberes e conhecimentos de grande dimensão, os quais identificam e organizam uma disciplina escolar. A partir dele, advêm os conteúdos a serem trabalhados no dia a dia da sala de aula. (PARANÀ, 2008, p.62).
Assim, o trabalho com a disciplina considerará os gêneros discursivos que
circulam socialmente, contemplando nestes textos as práticas de leitura, oralidade,
escrita e a análise linguística.
3. O PROCESSO DE PRODUÇÃO TEXTUAL NA PRÁTICA ESCOLAR
Para o desenvolvimento de uma prática pedagógica que tenha como objetivo
formar o aluno escritor é preciso propiciar a ele o acesso aos gêneros textuais que,
sendo formas já existentes, permitem ao estudante a produção de novos textos a
partir de textos modelares.
Consideramos fundamental um projeto de produção escrita que priorize a
realidade do aluno a partir de textos que circulam socialmente. Isso poderá auxiliá-lo
a compreender como ocorre, efetivamente, o funcionamento de um texto escrito, que
se faz a partir de elementos como organização textual, unidade temática, coerência,
coesão, intenção do autor, interlocutores, dentre outros elementos.
O modo como são propostas as atividades com a escrita interfere de forma
significativa nos resultados alcançados. “É desejável que as atividades com a escrita
se realizem de modo interlocutivo, que elas possam relacionar o dizer escrito ás
circunstâncias de sua produção. Isso implica o produtor do texto assumir-se como
locutor” (DCEs, 2008, p. 69). O querer dizer do locutor se realiza acima de tudo na
escolha de um gênero do discurso (BAKHTIN, 2006, p. 301).
A produção de texto do aluno deve corresponder ao que se escreve fora da
escola para que tenha uma função social determinada. Há vários gêneros que
podem ser trabalhados visando aprimorar a prática da escrita, entre eles os
jornalísticos, que, além de serem instrumentos que propiciam condições concretas
de uso da linguagem, favorecem ao aluno expressar suas ideias no texto que
produz. Nos textos jornalísticos podemos observar também a presença da
intertextualidade (Koch; Bentes; Cavalcante, 2007), relação entre dois textos, ou
mais, “que tenham discursos parecidos e/ ou próximos, denominado dialogismo”
(Bakhtin, 2006, p. 321).
BAKHTIN (2010, p. 72) afirma que, para se observar o fenômeno da
língua/linguagem, faz-se necessário situar os sujeitos (locutor e receptor) e também
o próprio som dessa língua em determinado meio social organizado, ou seja, numa
mesma comunidade linguística.
Os escritos de Bakhtin sobre o diálogo e os gêneros discursivos nos campos
da linguagem humana têm exercido influência em autores que tratam sobre a
questão da linguagem. Entre estes se situa Garcez, que afirma: “Em toda a obra de
Bakhtin, o caráter interativo da linguagem é enfatizado e tem, atualmente, sido
incorporado às reflexões sobre a linguagem e sua aprendizagem” (GARCEZ, 1998,
p.56).
Para a referida autora
A abordagem de Bakhtin permite uma releitura das concepções de Vygotsky e uma ampliação das articulações entre os processos intermentais e intramentais de um lado, e os processos culturais, históricos e institucionais de outro”(GARCEZ, 1998, p. 56).
Assim compreendemos que para Vygotsky(1998) a aprendizagem ocorre
inicialmente no relacionamento entre pessoas como uma categoria intermental e, em
seguida, dentro da pessoa como uma categoria intramental, e Bakhtin, além de
considerar o processo de internalização na fase inicial de apropriação da linguagem,
concebe o uso sociocultural da linguagem.
4. OS GÊNEROS DISCURSIVOS PARA BAKHTIN
Os gêneros discursivos para BAKHTIN (2006) são tipos relativamente
estáveis de enunciados elaborados pelas diferentes esferas de utilização da língua.
O pensador russo esclarece que
é de acordo com nosso domínio dos gêneros que usamos com desembaraço, que descobrimos mais depressa e melhor nossa individualidade neles (quando isso nos é possível e útil), que refletimos, com maior agilidade, a situação irreproduzível da comunicação verbal, que realizamos, com o máximo de perfeição, o intuito discursivo que livremente concebemos (BAKHTIN, 2006, p.304).
No qu e s e ref er e a o s g ê n e r o s textu ai s , p o d e m o s p er c e b e r qu e n o s jorn ai s
e n c o n t r a m o s v ári o s e x e m p l o s e c o n h e c ê - lo s p o d e r á aju d a r o s alu n o s a ter e m
m e l h o ri a s n a pr o d u ç ã o e s c rit a e e n ri q u e c i m e n t o d o s e u c o n h e c i m e n t o d e m u n d o , d e
for m a refl exi v a e crític a . Co m p r e e n d e r a s c ar a c t e r í s ti c a s d o s g ê n e r o s facilita par a o
e d u c a n d o apr e n d e r qu ai s el e m e n t o s d e v e m s e r utiliza d o s n a c o m p o s i ç ã o d o text o , o
qu e é e s s e n c i a l par a a finalid a d e d o text o pr o d u zi d o .
Conforme afirma BALTAR
Gêneros textuais são unidades triádicas relativamente estáveis passíveis de serem divididas para fins de análise em unidade composicional, unidade temática e estilo, disponíveis num inventário de textos (arquitexto ou intertexto), criado historicamente pela prática social, com ocorrências nos mais variados ambientes discursivos, que os usuários de uma língua natural atualizam quando participam de uma atividade de linguagem, de acordo com o efeito de sentido que querem provocar nos seus interlocutores (BALTAR, 2006, p. 46).
Não podemos esquecer que o trabalho com gêneros jornalísticos na escola
deve ocorrer dentro de uma postura crítica, “uma vez que se trata de discursos
produzidos em diferentes momentos sócio-historicamente situados determinados
justamente pelo campo de onde emergem” (FRANCO DE OLIVEIRA, 2012, p. 158).
Para que o aluno tenha esta postura crítica, a mediação do professor é
fundamental, uma vez que, como afirma VIGOSTKY (2003, p. 79) “o professor
desempenha um papel ativo no processo de educação: modelar, cortar, dividir e
entalhar os elementos do meio para que estes realizem o objetivo buscado”. Estes
objetivos, efetivamente, tornam-se concretos passando pelos seguintes momentos,
de acordo com o mesmo autor: a) nível de desenvolvimento potencial, ou seja,
caracteriza aquilo que o sujeito é capaz de fazer a partir de seu instrumental
biológico; b) zona de desenvolvimento proximal, o que o sujeito é capaz de realizar
com a ajuda alheia, para posteriormente fazer sozinho; c) nível de desenvolvimento
real, caracterizada por aquilo que o sujeito passa a fazer com autonomia em sua
vida cotidiana.
Como vimos é essencial a mediação do professor sendo este uma ponte
entre os alunos e o conhecimento, criando meios para oportunizar aos alunos a
possibilidade de questionar, analisar e produzir novos conhecimentos.
Ainda com relação ao trabalho com o jornal é pertinente salientar o que afirma
Soares:
Concentro-me em investigar meios de explorar o jornal a serviço da língua portuguesa, viso a formação de leitores e para o alcance desta meta viabilizo o manejo do jornal como um suporte textual importante no contínuo processo de letramento. Entenda-se aqui letramento como o conjunto de práticas sociais ligadas à leitura e à escrita em que os indivíduos se envolvem em seu contexto social (SOARES, 1998, p. 72).
Porém, é necessário que o professor, além de oportunizar ao aluno o contato
com os gêneros jornalísticos, também seja uma ponte para auxiliá-lo na
compreensão crítica desses gêneros textuais. Fundamentando-nos no conceito de
internalização de Vygotsky, no conceito dialógico de Bakhtin, e partilhando das
proposições de outros estudiosos que trazem contribuições significativas para o
estudo da linguagem, acreditamos que o desenvolvimento do projeto deu sua
contribuição para que os alunos da escola pública pudessem transitar por diferentes
formações discursivas e construíssem o seu próprio discurso.
5. O JORNAL COMO FERRAMENTA DIDÁTICO-PEDAGÓGICA
Uma questão relevante para o ensino de Língua Portuguesa, que contribui
para o aluno conhecer melhor o funcionamento da língua na sociedade, é o trabalho
com gêneros textuais diversos. Dessa forma, o aluno não é, simplesmente,
preparado nas práticas de produção de texto, também seu conhecimento amplia-se
para atuar nas situações concretas de participação social como cidadão ativo.
O jornal escrito é um instrumento que pode dar contribuição para o trabalho
com os gêneros textuais, pois a linguagem que faz parte do discursivo jornalístico
escrito possui uma função social e possibilita a formação de uma visão de mundo,
uma reflexão e um ponto de vista sobre a sociedade e seu funcionamento. “O jornal
é um instrumento de transformação da realidade e colabora para que a comunidade
possa, pelo domínio da informação, garantir pleno exercício de sua cidadania”.
(PAVANI, 2007, p.15).
Conforme Faria e Zanchetta (2007, p.142), na produção de um jornal na
escola, “os alunos terão no jornal escolar um espaço para a comunicação e a
expressão dos assuntos que os interessam”, despertando assim suas curiosidades,
senso de opinião e a liberação de sua palavra.
6 RESULTADOS E DISCUSSÕES
Os dados que serão analisados a seguir foram obtidos no decorrer da
implementação pedagógica no Colégio Estadual Corumbataí do Sul E.F.M,
Corumbataí do Sul, Paraná, com alunos do 9º ano do Ensino Fundamental, no
primeiro semestre de 2014 tendo como base o trabalho com os pressupostos
teórico-metodológicos a partir de postulados bakhtinianos, das Diretrizes
Curriculares de Língua Portuguesa do Estado do Paraná, das proposições de
Vygotsky, além de outros estudos relativos ao tema, dentro da mesma perspectiva
teórica.
Iniciamos a implementação apresentando o projeto aos alunos a fim de
conscientizá-los de que iríamos trabalhar com eles a elaboração de um jornal, de
forma a contemplar a leitura e produção de gêneros do campo jornalístico.
Na primeira ação desenvolvida realizamos uma avaliação diagnóstica para
análise do conhecimento prévio dos alunos sobre gêneros jornalísticos. Os alunos
escolheram o gênero que seria desenvolvido a partir de algumas sugestões que
apresentamos. O gênero escolhido pela turma foi a notícia. Cada aluno produziu
uma notícia conforme a estrutura que conheciam.
Na produção inicial observamos que os alunos possuíam pouca compreensão
sobre a estrutura do referido gênero. A maioria iniciou seu texto apenas com uma
palavra ou expressão. Eis alguns exemplos: “Chuva”, “Jogo de Futebol” “ Briga”
“Acidente” “Drogas”. Outros escreveram pequenos relatos em primeira pessoa.
Apenas dois alunos apresentaram textos com características próximas ao gênero
discursivo notícia. Uma aluna produziu um texto sobre um leilão que a prefeitura do
município iria realizar. Ela centralizou o título do mesmo modo como é feita as
notícias nos jornais e o destacou com lápis de cor. Também utilizou o tempo verbal
no presente, característico de notícias publicadas em jornais: “Prefeitura leiloa
carros”. Escreveu frases curtas o que facilitou a organização das ideias e escreveu
de forma coerente e coesa, deixando claro o que queria noticiar.
Prosseguindo trabalhamos com uma revisão das características dos gêneros
discursivos. Consideramos que esta revisão foi essencial para o desenvolvimento
do projeto, pois verificamos que os alunos desconheciam a maioria dos gêneros. Já
haviam visto, mas não identificavam o gênero. Acreditamos diante desta
constatação a importância de se trabalhar com os gêneros discursivos para que os
alunos possam conhecê-los e para saber utilizá-lo em seu contexto social. Para
Bakthin
É preciso dominar bem os gêneros para empregá-los livremente [...] Quanto melhor dominamos os gêneros tanto mais livremente os empregamos, tanto mais plena e nitidamente descobrimos neles a nossa individualidade (onde isso é possível e necessário), refletimos de modo mais flexível e sutil a situação singular da comunicação; em suma, realizamos de modo mais acabado o nosso livre projeto de discurso (BAKHTIN, 2006, p.285).
Também consideramos que trabalhar os gêneros discursivos com os alunos
foi essencial, pois são textos reais que produzem significado, propiciando práticas de
leitura, interpretação e produção de texto nas quais os alunos conseguem
posicionar-se e refletir sobre a linguagem utilizada pelo autor.
Ao explorar a diversidade textual, o professor aproxima o aluno das situações originais de produção dos textos não escolares. Essa aproximação proporciona condições para que o aprendiz compreenda o funcionamento dos gêneros textuais, apropriando-se, a partir disso, de suas peculiaridades, o que facilita o domínio que deverá ter sobre eles. Além disso, o trabalho com gêneros contribui para o aprendizado de prática de leitura, de produção textual e de compreensão (CALDAS, p.4).
Prosseguindo, formamos grupos e distribuímos jornais (um jornal por grupo)
para que folheassem, explorassem e lessem o material e em seguida propusemos
que resolvessem algumas questões sobre para que lemos jornal, nome do jornal
lido, como os textos estavam distribuídos, que informações apareciam nele e o que
mais chamou a atenção.
Ao realizar uma leitura, acreditamos ser essencial que os alunos percebam
qual a finalidade do texto, seus recursos linguísticos e os efeitos de sentido criados
pelo autor. Para isto o aluno também necessita identificar para quem o texto está
sendo direcionado e qual seu objetivo. Dessa forma, quando for produzir seu próprio
texto também, levará em consideração todos estes elementos.
É muito importante que todo educador conceba a linguagem como um significado amplo e dinâmico que se relaciona plenamente com a participação social. Trabalhar a linguagem em situação de ensino não é ensinar as palavras, mas seus significados culturais e sociais. (CAlDAS, p.2).
Continuando com a implementação pedagógica na escola, explicamos aos
alunos que iríamos desenvolver um trabalho com o gênero discursivo notícia
Apresentamos aos alunos um exemplar do gênero que tratava de um tema do
contexto social próximo a eles: “Justiça proíbe maus tratos a animais nos rodeios em Corumbataí do Sul”. A notícia trazia relato sobre a proibição do Juízo da Comarca de
Barbosa Ferraz da utilização de instrumentos que provocassem maus tratos a
animais (esporas, cordas, aparelhos de choque elétrico, peiteiras e outros) nos
rodeios programados para os dias 25, 26 e 27 de maio, em Corumbataí do Sul.
Em seguida fizemos um debate sobre a notícia observando as características
do gênero, título; nome do autor; espaço do jornal em que foi publicado (seção,
caderno); público a que se destinava; Assunto abordado. Houve boa participação
dos alunos que comentaram sobre casos de maus tratos a animais por pessoas
conhecidas e até da própria família.
Nas aulas seguintes trabalhamos com os alunos os gêneros reportagem,
artigo de opinião, crônica, editorial e entrevista. A partir de cada gênero jornalístico
trabalhado os alunos produziram um texto. A seguir transcrevemos uma crônica
produzida por um grupo de quatro alunos:
Cabrito Apressado
Visitante da festa da cidade em Corumbataí do Sul não pode deixar de apreciar o prato típico
“Cabrito Apressado”. O nome parece nos lembrar de um cabrito correndo tentando chegar a algum
lugar ou alcançar alguma coisa. Talvez seja isto mesmo, pois a festa da cidade é tão especial que a
pessoa saboreia o “Cabrito Apressado” rapidamente para poder aproveitar os outros eventos.
Neste ano, percorrendo a festa e conversando com as pessoas, foi possível observar o
comportamento dos participantes. Homens e belas mulheres vestidos à moda “Cowboy” desfilavam
entre barracas e exposição, voltavam a atenção mais especial para o rodeio, encontravam antigos
conhecidos, entusiasmavam-se com os eventos artísticos, jovens namoravam, dançavam. Muitos
sorrisos e demonstração de prazer tornavam o ambiente alegre e descontraído.
Realmente, para festa tão especial não poderia haver um prato com nome diferente. “Cabrito
Apressado” para quem tem pressa de ser feliz.
Podemos observar que os alunos produziram uma crônica dentro das
características que foram trabalhadas, ou seja, a crônica é um texto narrativo, em
geral, curto e que trata de problemas do cotidiano. Traz pessoas comuns como
personagens, sem nome ou com nomes genéricos. As personagens não têm
aprofundamento psicológico e são apresentadas em traços rápidos. É organizado
em torno de um único núcleo, um único problema. Tem como objetivo envolver,
emocionar o leitor.
Iniciamos então a produção do jornal da classe. Os alunos escolheram o
nome do jornal por votação. Entre vários nomes foi escolhido “9º B News”. Na
seqüência separamos as equipes de trabalho para definição de logotipo, das seções
do jornal e assuntos, para distribuição de cargos no jornal: revisores, fotógrafos,
entrevistadores, responsáveis pela divulgação e impressão, sendo redatores todos
os alunos.
Procuramos incentivar os alunos para a produção e distribuição do jornal uma
vez que, conforme Faria e Zanchetta, o jornal só receberá prestígio dos alunos se
efetivamente for um espaço de produção e circulação de textos e interesse comum; (b) estiver garantindo o espaço na sala de aula para a discussão e opção dos grupos, transformando-se tais opções em subsídio para o trabalho pedagógico do professor; (c) tiver como avaliadores não apenas o professor, mas também os leitores para os quais foi produzido (FARIA; ZANCHETTA, 2007, p.154).
Realizamos uma visita ao jornal “Tribuna do Interior” de Campo Mourão para
que os alunos conhecesssem os modos de produção de um jornal e a função de
cada pessoa que nele trabalha. Havia um grupo de alunos, escolhidos pelos
colegas, responsável para fazer perguntas sobre o jornal.
Após a visita, fizemos uma reflexão sobre as seções presentes no jornal e
comparações das seções entre os dois jornais que circulam na região: Correio da
Cidade e Tribuna do Interior. Em seguida decidimos quais gêneros jornalísticos iriam
compor o jornal: NOTÍCIA, ENTREVISTA, EDITORIAL, CRÔNICA, ARTIGO DE
OPINIÃO.
Na sequência apresentamos alguns trechos dos textos produzidos pelos
alunos e que fizeram parte do jornal.
Editorial: “A Cooperativa Coapror vem dando exemplo sobre como é possível, por meio da
união de pequenos agricultores da agricultura familiar, ampliar a participação no mercado produtivo,
melhorando, dessa forma, o nível socioeconômico dos participantes” (...).
Artigo de Opinião “Há mais ou menos 13 anos passou a ser tradição no município de
Corumbataí do Sul o Rodeio. Não é de hoje que os rodeios vêm causando polêmica. Alguns
consideram uma atividade esportiva e cultural, outros recriminam como exploração que envolve
maus tratos aos animais”(...).
Reportagem: ADSON E ALANA REALIZARAM NO DIA 25/05/14 UM MEGA SHOW NO ANIVERSÁRIO DA CIDADE DE CORUMBATAÍ DO SUL Dupla no estilo Sertanejo Universitário anima a festa em Corumbataí do Sul.
Nos últimos anos, nas festas da cidade de Corumbataí do Sul, vem se destacando a apresentação de
cantores do Gênero Sertanejo Universitário. Esta preferência segue a tendência que pode ser
observada em vários estados do país. Inúmeras duplas surgem sempre apresentando o mesmo estilo
musical no intuito claro de atingir um público específico: jovens do interior que gostam de música
sertaneja” (...).
1. Entrevista: “Qual a origem do prato típico Cabrito Apressado?
R-Foi criado entre um grupo de pessoas há 9 anos atrás com intenção de incentivar caprinocultura ou seja a criação de cabritos.
2. As festas realizadas estão dando lucro ou prejuízo para o município?
R-Desta última festa ainda não temos um balanço final para divulgarmos” (...).
Notícia: “O prato típico de Corumbataí do sul
A 8ª edição da festa do “Cabrito Apressado”, prato típico de Corumbataí do Sul, foi um
sucesso, foram vendidos 1030 pratos, Foram preparados 700 kilos de cabrito para ser servido. A
chuva atrapalhou um pouco , mas mesmo assim ainda houve grande participação”(...).
Percebemos que, em sua maioria, os textos atingiram o esperado, foram
criativos e coerentes, escritos conforme o que trabalhamos sobre o gênero, mas
alguns ficaram um pouco falhos devido à pressa de terminar, ou à falta de mais
ideias e argumentos ou de ficar logo livre da tarefa.
Notamos, também, que alguns desvios ortográficos são frequentes, como a
falta de acentuação, a troca de certas letras, a presença da linguagem coloquial no
corpo do texto, mas isso podemos atribuir à falta de prática de escrita e de leitura.
Enfim, acreditamos que essa prática dos alunos foi um trabalho interativo
entre eles e nós, isto é, entre nossos conhecimentos de mundo e os deles, pois foi
disponibilizado tempo para debate; produção textual; revisão, por parte dos alunos;
correção e discussão por parte da professora e, por fim, a reescrita dos alunos e a
produção final do jornal.
O Jornal “9º B News” está publicado no site da escola e foi distribuído na
escola. Acrescentamos que houve uma considerável receptividade por parte dos
alunos e professores que tiveram acesso ao jornal.
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Buscamos no decorrer do desenvolvimento do projeto de intervenção, por
meio de atividades práticas, proporcionar aos alunos a elaboração de jornal, de
forma a contemplar a leitura e a produção de gêneros do campo jornalístico.
Assim, organizamos as aulas priorizando a análise e a discussão dos gêneros
jornalísticos e suas condições de produção, procurando, dessa forma, desenvolver
nos alunos as capacidades linguísticas e discursivas por meio da leitura e escrita de
textos jornalísticos, a reflexão sobre os gêneros jornalísticos e suas condições de
produção, a análise da linguagem escrita e visual utilizada pelos jornais, a produção
de textos com base nos gêneros jornalísticos e elaboração de um jornal em sala de
aula visando à melhoria das produções escritas dos alunos.
Observamos que as aulas de Língua Portuguesa desenvolvidas com a
aplicação do projeto na escola funcionaram como um trabalho de interação verbal e
percebemos que houve melhorias na capacidade de ler, entender e debater os
gêneros jornalísticos que foram apresentados.
Constatamos, enfim, que no decorrer dos trabalhos, houve melhoria dos
conhecimentos dos gêneros discursivos o que ficou evidenciado nas produções de
textos realizadas pelos alunos para a produção do jornal. Consideramos que o
desenvolvimento do projeto pôde contribuir para a melhoria do pensamento crítico e
reflexivo e para a formação e desenvolvimento de alunos leitores/escritores.
8 REFERÊNCIAS
BAKHTIN, Mikhail M. Estética da Criação Verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2006.
BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. (Trad. Michel Lahud e Yara Frateschi Vieira). São Paulo: Hucitec, 2010.
BALTAR, Marcos. Competência discursiva e gêneros textuais: uma experiência com o jornal de sala de aula. Caxias do Sul: EDUCS, 2006.
CALDAS, Lilian Kelly. Trabalhando tipos/gêneros textuais em sala de aula: uma estratégia didática na perspectiva da mediação dialética. IBILCE/UNESP – São José do Rio Preto. Disponível em: http://alb.com.br/arquivo-morto/edicoes_anteriores/anais16/sem03pdf/sm03ss16_09.pdfAcesso em 13/06/2014.
FARIA, Maria Alice de Oliveira. Como usar o jornal na sala de aula. Sâo Paulo: Contexto, 2009.
FARIA, Maria Alice; ZANCHETTA, Juvenal. Para ler e fazer o jornal na sala de aula. São Paulo: Contexto, 2007.
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