Origem Da Balistica

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Origem da balística comparativa: primeiros passos Celso Nenevê (texto adaptado Para fins didáticos) 1 Antes de Hans Gross usar pela primeira vez o termo Criminalística, os conhecimentos de balística já eram utilizados em tribunais. Certamente, o primeiro fato noticiado com sucesso, na solução de um crime de homicídio, cujo princípio foi a análise de uma arma de fogo e seus projéteis, aconteceu em 1835, na cidade de Londres. Nessa época não havia um corpo regular de policiais; em seu lugar havia um pequeno grupo de ajudantes de Henry Fielding, juiz de paz de Westminster, responsáveis pela investigação de crimes. Henry Goddard, um desses investigadores, ao observar um projétil extraído do corpo de uma vítima de homicídio, notou nele uma protuberância que acreditava ser um defeito do molde. As armas da época eram de antecargas e, normalmente, os seus proprietários produziam seus projéteis em moldes. Goddard acreditava que achando o molde encontraria o assassino. A partir dessa ideia, Goddard passou a examinar os moldes nos quais os suspeitos fabricavam seus projéteis de chumbo, encontrando em um deles uma deformação que se repetia em todos os projéteis produzidos por este molde e idêntico ao extraído do corpo da vítima. O que levou o suspeito a confessar o seu crime. Com Goddard nasceu um novo método para investigar os crimes com armas de fogo. O Químico Forense Paul Jeserich na cidade de Neuruppin na Alemanha em 1898, atuando como Perito em um caso de homicídio, demonstrou por meio de comparações fotográficas que um projétil extraído do corpo de uma vítima havia sido expelido através do cano da arma do acusado. Ele acreditava que o raiamento imprimia deformações que se repetiam no aspecto morfológico em todos os projéteis. Sua metodologia foi fotografar o projétil questionado e os padrões, ampliar essas fotografias e compará-las. Balthazard, em 1911/1912, publicou dois artigos que demonstravam as bases científicas do tema, intitulados “Identificação de projéteis de armas 1 Celso Nenevê é Perito Criminal da Polícia Civil do Distrito Federal

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Origem da balística comparativa: primeiros passos

Celso Nenevê (texto adaptado

Para fins didáticos)1

Antes de Hans Gross usar pela primeira vez o termo Criminalística, os

conhecimentos de balística já eram utilizados em tribunais. Certamente, o

primeiro fato noticiado com sucesso, na solução de um crime de homicídio,

cujo princípio foi a análise de uma arma de fogo e seus projéteis, aconteceu

em 1835, na cidade de Londres.

Nessa época não havia um corpo regular de policiais; em seu lugar havia

um pequeno grupo de ajudantes de Henry Fielding, juiz de paz de

Westminster, responsáveis pela investigação de crimes.

Henry Goddard, um desses investigadores, ao observar um projétil extraído

do corpo de uma vítima de homicídio, notou nele uma protuberância que

acreditava ser um defeito do molde. As armas da época eram de antecargas

e, normalmente, os seus proprietários produziam seus projéteis em moldes.

Goddard acreditava que achando o molde encontraria o assassino.

A partir dessa ideia, Goddard passou a examinar os moldes nos quais os

suspeitos fabricavam seus projéteis de chumbo, encontrando em um deles

uma deformação que se repetia em todos os projéteis produzidos por este

molde e idêntico ao extraído do corpo da vítima. O que levou o suspeito a

confessar o seu crime. Com Goddard nasceu um novo método para

investigar os crimes com armas de fogo.

O Químico Forense Paul Jeserich na cidade de Neuruppin na Alemanha em

1898, atuando como Perito em um caso de homicídio, demonstrou por meio

de comparações fotográficas que um projétil extraído do corpo de uma

vítima havia sido expelido através do cano da arma do acusado. Ele

acreditava que o raiamento imprimia deformações que se repetiam no

aspecto morfológico em todos os projéteis. Sua metodologia foi fotografar o

projétil questionado e os padrões, ampliar essas fotografias e compará-las.

Balthazard, em 1911/1912, publicou dois artigos que demonstravam as

bases científicas do tema, intitulados “Identificação de projéteis de armas

1 Celso Nenevê é Perito Criminal da Polícia Civil do Distrito Federal

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de fogo” e “Identificação de estojos de pistolas automáticas”. O professor

Balthazard aprimorou o processo de comparação por meio de fotografias

ampliadas definindo os melhores ângulos e trabalhava comparando

inclinação de raiamento, número de estrias, entre outros fatores. O método

de Balthazard consistia em fazer girar sobre uma fina lâmina metálica, de

liga de estanho, totalmente ladeada por réguas milimetradas, os projéteis

incriminados e padrão e posteriormente fotografar, ampliar e comparar as

marcas deixadas por ambos os projéteis. Esse método apresentava os

inconvenientes de ser dependente daquele que promovia o giro do projétil

para pressioná-lo o suficiente e não arrastá-lo e, de não apresentar bons

resultados com projéteis deformados. Mas, principalmente, demonstrou que

na base dos estojos poderiam ser verificadas uma série de marcas que

eram produzidas pelo percutor no momento do disparo, pela culatra da

arma imprimindo suas características na base do estojo, além do extrator e

do ejetor, que também produziam marcas características.

Um crime ocorrido em março de 1915, em uma pequena propriedade rural

em West Shelby, no condado de Orleans, no estado de Nova York, terminou

com a morte de Charles B. Phelps, o proprietário, e da sua governanta

Margarett Walcott, mortos a tiros provenientes de uma arma de calibre .22.

Dois trabalhadores da chácara, Charles E. Stillow, um agricultor analfabeto,

e o seu cunhado Neldon Green, foram acusados e condenados à morte, em

cujo o processo a principal prova residia no depoimento de Albert Hamilton,

um especialista em armas de fogo que afirmou que os projéteis coletados

dos corpos das vítimas combinavam com os projéteis padrões da arma

encontrada na casa de Stillow.

O governador de Nova York solicitou uma nova avaliação do caso, e Charles

E. Waite foi designado para a tarefa. Ele trabalhou em parceria com Max

Poser, um especialista em microscopia, nos exames dos projéteis

incriminados e os obtidos da arma de Stielow, estudando-os em

microscópios. Finalmente determinaram que arma de Stielow não poderia

ter sido usada nos assassinatos. O que resultou no perdão dos acusados.

Essa experiência levou Waite ao desenvolvimento de um sistema científico

de catalogar informações de balística, a fim de evitar erros futuros. Charles

E. Waite esteve envolvido em uma série de avanços na balística ao longo de

sua vida. Ele foi a primeira pessoa a compilar um catálogo de informações

sobre armas de fogo, capaz de distinguir classes e espécies, mas não

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identificá-las. Fazia parte do grupo de cientistas que adaptou o microscópio

de comparação para usar em comparação balística. Waite também foi co-

fundador do Bureau de Balística Forense, juntamente com Calvin Goddard,

Phillip O. Gravelle e John H. Fisher.

Entretanto, a identificação entre armas de mesmo tipo, marca, modelo e

calibre só foi possível pelas características individuais - deixadas pelo

processo de fabricação dos canos de armas nas diversas etapas de

produção, tais como a perfuração da barra maciça de aço, o raiamento;

polimento, confecção da crista, cone de forçamento e câmara -, com a

utilização do microscópio comparador balístico (desenvolvido por Philipp O.

Gravelle em 1925), pois as deformações oriundas dessas etapas acabam

por imprimir nas superfícies dos projéteis estrias microscópicas que

permitem a individualização do cano da arma que os disparou.

O microscópio comparador balístico foi utilizado pela primeira vez no

polêmico caso Sacco e Vanzetti, confirmando que um dos quatro projéteis

de calibre “.32 ACP”, responsável pela morte de um segurança, foi expelido

através da pistola Colt de Sacco, conforme o exame balístico refeito em

1961, como também confronto de estojos. Muitas das dúvidas deste caso

tratam de provas adulteradas, como transformações na arma de Sacco

(troca de cano e ferrolho), troca de projétil e de cadeia de custódia.

Mas há outra versão do desenvolvimento do microscópio comparador

balístico. Essa versão relata que no mesmo ano (1925), Otto Mezquer do

Instituto de Investigação Química, encomendou a empresa Leitz (Ernest

Leitz Witzlar) um instrumento ótico no qual fosse possível observar,

simultaneamente, dois projéteis em idênticas condições de aumento e

iluminação. A solução empregada pela empresa foi a utilização de dois

microscópios biológicos idênticos, interligados por uma ponte de

comparação já existentes no mercado que com a utilização de prisma e

espelhos eram capazes de justapor as imagens recebidas. Como resultado

dessas experiências, a Empresa Leitz passou as comercializar no ano de

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1931 o “Grande Microscópio de comparação para fins forenses”.

Muitas inovações foram introduzidas desde então, como sistemas

informatizados de catalogação de características das armas de fogo até os

modernos sistemas automatizados de comparação balística.