OEssencialDoMuseuDoLouvre.pdf

63
O essencial do Museu do Louvre por patricia camargo

Transcript of OEssencialDoMuseuDoLouvre.pdf

  • O essencial do Museu do

    Louvrepor patricia camargo

  • O essencial do Museu do

    Louvrepor patricia camargo

  • Como usar este guia

    ___ Para escrever minha tese sobre museus, por dez anos fiz visitas tcnicas a essas instituies. Ao longo deste tempo, observei visitantes exaustos, que no pareciam nada felizes. Para mim, isso era muito estranho, porque eu simplesmente entro em xtase quando visito um museu.

    ___ Eu gostaria muito que as pessoas se divertissem tanto quanto eu quando visitassem um museu. Resolvi ento que escreveria guias sobre os meus museus favoritos ao redor do mundo. A lista enorme, e o Louvre, que abriga uma de minhas obras prediletas, A Vitria de Samotrcia, tinha que fazer parte dessa srie.

    ___ Para comear, pensei em regras bsicas, coisas fceis de fazer e que pudessem aumentar os nveis de satisfao em uma visita. Elas funcionam para todo tipo de museu, e esto enumeradas em uma lista que denominei Mandamentos para voc se divertir em um museu.

    ___ Todo grande museu tem certas obras ou objetos que voc no vai ver em nenhum outro lugar. Costumam ser obras consideradas peas-chave para entender uma poca ou um estilo. Na seo Circuito pelo essencial do Louvre, voc far um passeio por essas obras, que so a alma desse museu.

    ___ Fiz um recorte que tenta sobretudo respeitar o tempo mximo que algum consegue assimilar de informao em uma visita a um museu. Tambm tive a inteno de que o visitante sasse com uma base que o ajudasse a desfrutar outras obras em outras galerias pelo mundo.

  • ___ Portanto, decidi que o melhor era me concentrar em alguns movimentos e em alguns artistas. Porque em museus, como em tudo na vida, menos mais. Numa aposta arriscada, decidi pelo Renascimento, pelo Neoclassicismo e pelo Romantismo. As obras selecionadas para compor este guia so consideradas obras-primas e as mais representativas de cada estilo.

    ___ Alm desses trs movimentos, inclu duas obras da Grcia Antiga que so consideradas, com a Mona Lisa, as estrelas do Louvre: a Vitria de Samotrcia e a Vnus de Milo. E, para aqueles que ainda tiverem flego, uma obra-prima da arte egpcia: O Escriba Sentado.

    ___ As informaes imprescindveis de como chegar, quando ir, quanto custa, os servios oferecidos pelo museu e os atrativos/lugares que combinam perfeitamente com uma visita esto na seo Louvre na hora H.

    ___ Na seo Voc sabia? o leitor encontra dados e fatos interessantes sobre o museu.

    ___ Agora, voc decide: pode comear a ler este guia antes ou durante sua visita ao museu. Ou, quem sabe, pode ler antes e reler diante de cada obra*, saboreando cada detalhe.

    * Nota do editor: Todos os comentrios relativos aos detalhes dos quadros e esculturas tm como base as obras dispostas no museu e no as ilustraes realizadas especialmente para este Guia.

  • Mandamentos para se divertir em um museu 7O Louvre na hora H 10Servios 12Voc sabia? 13Mapa do Louvre 15

    circuito pelo louvre 17

    Vitria de Samotrcia 17Estigmatizao de So Francisco 21 giotto di bondone

    Vnus e as Trs Graas 24 sandro botticelli

    A Bela Ferronire 27 leonardo da vinci

    A Virgem dos Rochedos 29 leonardo da vinci

    A Virgem e o Menino com Santa Ana 32 leonardo da vinci

    Mona Lisa 34 leonardo da vinci

    As Bodas de Cana 37 paolo de vronse

    Sumrio

  • O Juramento dos Horcios 39 jacques-louis david

    A Coroao de Napoleo 41 jacques-louis david

    As Sabinas 43 jacques-louis david

    Retrato de Juliette Rcamier 44 jacques-louis david

    A Balsa da Medusa 46 thodore gricault

    A Liberdade Guiando o Povo 48 eugne delacroix

    O Escravo Moribundo e O Escravo Rebelde 51 michelangelo

    Amor e Psiqu ou Eros e Psiqu 53 antonio canova

    Vnus de Milo 55O Escriba Sentado 58

    Sobre o Conexo Paris 61Sobre a autora 62

  • Mandamentos para se divertir em um museu

    Durante uma viagem, visitar um museu pode ser algo muito agradvel se soubermos aproveitar esse momento de forma objetiva, sem nos levar pelo desejo desenfreado muito comum de ver tudo, correr todas as galerias, admirar inmeras obras. Isso provoca estresse, tenso e a impresso de que, no fundo, apenas andamos em crculos pelos corredores, exauridos, e samos dali com uma sensao muito distante do sentimento de satisfao que deveria ter sido apreciar as obras de arte.

    Com as dicas a seguir, voc fugir dessa tendncia de querer agarrar o mundo com as mos. Aproveite as dicas e boa visita!

    Um museu por diaPor mais que voc queira ver tudo, evite cair em tentao. Nada de overdose. Caso contrrio, acabar sendo obrigao e no diverso.

    Estude antecipadamente o mapa do museuFaa isso antes de entrar no museu, ou quando estiver tomando um caf, depois de ter passado pela bilheteria.

    Esse ato simples ser um super-remdio para um dos primeiros elementos estressantes de um grande museu: a sensao de estar perdido e de no se ter a mnima ideia de por onde comear. Pegue o mapa, sente-se e dedique trs minutos para estud-lo. Voc vai se sentir menos perdido e economizar caminhadas sem sentido.

    Escolha antecipadamente o que pretende verApenas passar os olhos pelo museu para dizer eu fui no tem sentido. Pode estar certo de que suas lembranas sero confusas. Nesse caso, tambm vale a mxima menos mais. Numa primeira visita, veja o que imprescindvel do museu aquilo que essa instituio tem de melhor e que voc no poder ver em nenhum outro museu do mundo.

    7

  • Determine um tempo para sua visitaIsso diminui a ansiedade. Voc ir diretamente ao ponto e aproveitar cada minuto de sua visita. Afinal, sua permanncia no local no ser eterna. Leve em conta que a maioria dos adultos apenas assimila o que v nos primeiros 45 minutos da visita.

    Faa um lanche no meio da visitaMuitos museus oferecem timas cafeterias e restaurantes, e alguns deles tm chefs premiados. Aps a primeira hora de visita, tome um caf ou almoce. Se estiver acompanhado, esse o melhor momento para trocar ideias e impresses sobre as obras. Se estiver sozinho, aproveite para (re)ler o mapa/guia do museu.

    Reserve um tempo para conhecer a livraria-loja do museu ao final da visita muito gratificante olhar os produtos venda na lojinha e reconhecer neles as obras que voc apreciou em algum museu do mundo. Sem contar que tudo muito estiloso. Quando estiver em casa, os souvenirs comprados ali funcionaro como catalisador da sua memria.

    No rejeite nada de caraTipo: No entendo nada de arte contempornea, ento no vou a um museu desse. Ou museu de arte decorativa coisa de mulher. Seja um explorador e deixe-se surpreender. Muitas vezes o que julga nosso medo de no entender, mas lembre-se: ningum nasce sabendo!

    Museu no lugar s de coisas bonitasH obras que no foram criadas para estar na sala da sua casa. Nem todas as obras produzem sensaes boas em ns. A arte tambm pode provocar sentimentos desagradveis, como nojo, vontade de chorar, como quando assistimos a um filme.

    8

  • Ao vivo e em cores, o museu sempre melhorDeixe de lado seu trauma das aulas de arte, enfadonhas e repletas de slides, datas e nomes. Um museu algo repleto de vida. E, ao entender um pouco sobre o porqu da importncia das obras o que pretendo com este guia , voc comear a v-las com outros olhos.

    Em uma pesquisa realizada na Noruega, descobriu-se que frequentar galerias de arte faz bem para a sade, pois diminui a ansiedade e o estresse.*

    Voc no obrigado a fazer nada, sobretudo nas friasSe voc vai entrar em um museu apenas para tirar uma foto diante de determinada obra, economize seu tempo e dinheiro. Faa algo de que realmente gosta. Ningum obrigado a gostar de ir a museus.

    * Estudo feito pela Universidade de Cincia e Tecnologia da Noruega, publicado no peridico cientfico Journal of Epidemiology & Community Health.

    9

  • 10

    O Louvre na hora H

    que tipo de entrada comprar Se quiser ver as obras que pertencem ao acervo do Louvre, compre a entrada para a Collections permanentes. Esse o acervo permanente do museu. Mas se j conhece o acervo e est interessado em algumas das exposies temporrias que, na maioria das vezes, mostram obras emprestadas de outras instituies, e at mesmo de colees particulares, compre a entrada para o Hall Napolon. Se quiser ver tanto o acervo como as exposies temporrias especiais, compre a Entrada combinada, o Billet Jumel.

    Se voc no tem interesse especial por alguma das exposies temporrias, ou se sua primeira vez no Louvre, recomendo que apenas compre a entrada para o acervo permanente.

    compra antecipada da entrada pela internet Voc poder adquirir as entradas antecipadamente pela internet nos sites: www.ticketnet.fr | www.louvre.fnacspectacles.com | www.ticketweb.com

    A retirada das entradas, no entanto, no feita no museu e sim nos respectivos pontos de compra indicados nos sites. H tambm a opo de envio por correio, tquete no celular ou voc pode imprimir seus ingressos.

    tarifas* Acervo (Collections permanentes) 12 | Exposies temporrias (Hall Napolon) 13 | Entrada combinada (Billet Jumel) 16.

    A entrada do museu permite a visita gratuita ao Museu Delacroix. Mas ateno: apenas no mesmo dia da emisso do bilhete. Ou seja, ambos os museus devem ser visitados no mesmo dia, e, na entrada do Museu Delacroix, deve-se apresentar a entrada do Museu do Louvre.

    * Preos em janeiro de 2014.

  • 11

    paris museum pass Antes de comprar sua entrada, analise se no vale a pena adquirir o bilhete Paris Museum Pass, que d acesso livre a mais de 60 monumentos e museus de Paris (apenas aos acervos permanentes) e da regio parisiense.

    Voc ter acesso ao Louvre quantas vezes quiser no perodo de validade do bilhete; h entradas exclusivas para quem adquiriu o Paris Museum Pass e, claro, nesse caso as filas so menores. Voc pode compr-lo no Shopping do Carrousel e entrar sem filas pela Passagem Richelieu e pelas entradas laterais que se encontram junto ao Arco do Carrousel.

    Para saber mais, acesse: www.parismuseumpass.com

    quem tem direito entrada gratuita no louvre? Menores de 18 anos e jovens de 18 a 25 anos residentes na Unio Europeia. A entrada tambm gratuita para jovens com menos de 26 anos s sextas-feiras, das 18h00 s 21h45, independentemente da nacionalidade. Tambm gratuita para pessoas com dificuldade de locomoo e seu acompanhante.

    quando o museu grtis para todos? No primeiro domingo de cada ms, entre outubro e maro, e no dia 14 de julho. Em ambos os casos, a gratuidade no inclui as exposies temporrias do Hall Napolon.

    horrios do museu s segundas, s quintas, aos sbados e aos domingos, das 9h00 s 18h00. s quartas e s sextas, das 9h00 s 21h45. Fechado s teras-feiras e nos dias 1o maio e 25 dez. Abre com horrio reduzido das 9h00 s 17h30 em 31 jan., 1o abr., 8 maio, 19 maio, 20 maio, 14 jul., 15 ago., 1o nov. e 11 nov.

    como chegar ao museu por transporte pblico? nibus 21, 24, 27, 39, 48, 68, 69, 72, 81 e 95 (param em frente da pirmide).

    Metr Linhas 1 e 7 (parada: Palais Royal/Muse du Louvre). Batobus parada Franois Mitterrand.

    curiosidade Se voc tiver curiosidade e quiser conhecer mais sobre o Louvre antes de visit-lo, acesse o site do museu: www.louvre.fr

  • 12

    guarda-volumes Servio gratuito, mas no aceita bagagem de grande volume. Este servio encontra-se embaixo da pirmide, no Hall Napolon e na entrada da Porta dos Lees.

    correio Para compra e envio de cartas e cartes-postais. Encontra-se embaixo da pirmide, junto ao Hall Napolon.

    visitantes com dificuldade de locomoo Emprstimo gratuito de cadeiras de roda, carrinhos de crianas e porta-bebs.

    lojas e livraria No Hall Napolon, embaixo da pirmide, h livraria, loja de souvenirs, loja especializada em artigos para jovens e calcografia.

    cafs/restaurantes Ao iniciar sua visita, voc encontrar ao lado das pinturas francesas de grande formato (Delacroix, David etc.) o Caf Mollien. No lado oposto, no mesmo andar, h o Caf Richelieu.

    Mas no se preocupe, pois no hall de entrada haver diversas opes e uma grande praa de alimentao do Shopping do Carrousel. Nessa praa voc ter sua disposio desde McDonalds a Starbucks, e os Restaurants du Monde, com comida asitica, oriental, espanhola, marroquina, italiana e, claro, francesa.

    audioguia Pode-se alugar nas bilheterias e custa 5. Para menores de 18 anos, o preo de 3. Servio oferecido em francs, espanhol, ingls, italiano, alemo, japons e coreano.

    banheiros Em todos os andares h banheiros e salas para troca de fraldas (fraldrio).

    visitas guiadas A visita guiada Obras-primas do Louvre oferecida diariamente em ingls e tem 90 minutos. So duas sadas dirias: uma s 11h15 e outra s 14h00.

    H outras visitas guiadas, mas apenas em francs. Para consultar preos e horrios, acesse: www.louvre.fr/visites-guidees

    Servios

  • 13

    O Louvre foi a residncia dos reis da Frana, tendo sido o palcio real at 1678, quando Lus XIV escolheu se mudar para o palcio de Versalhes.

    Aps a Revoluo Francesa, as colees reais passaram ao domnio do Estado e, ento, criou-se um museu que foi aberto em 1793 o Louvre.

    Boa parte do acervo que daria origem ao Louvre veio do Museu de Luxemburgo, o primeiro museu da Frana, que foi inaugurado em 1750.

    No incio, o museu recebia o pblico apenas trs vezes por semana, o que pode parecer

    estranho para ns, mas esse era o funcionamento padro de quase todos os museus e instituies acadmicas da poca.

    Na poca de Napoleo, o Louvre passou a se chamar Museu Napoleo. Esse detalhe mostra como o museu j era

    importante naquele tempo, pois foi usado como propaganda para o Imperador.

    Em 1938, quando Adolf Hitler invadiu a ustria e parte da Tchecoslovquia, as autoridades francesas iniciaram uma operao de evacuao das obras do Louvre para castelos situados longe das linhas frreas, alvo das bombas inimigas. Assim, 3.691 pinturas (incluindo a Mona Lisa) foram desmontadas de suas molduras e encaixotadas para realizar uma viagem perigosa, sem escoltas ou seguranas.

    Hoje, a coleo permanente do Louvre tem 35 mil obras, distribudas em trs alas, que levam o nome de importantes funcionrios de Estado da histria da Frana: Sully (ministro da Fazenda do Rei Henry IV), Richelieu (cardeal e ministro do Rei Lus XIII) e Denon (ministro das Artes e depois diretor do Museu Central de Arte no governo de Napoleo I).

    Voc sabia?

  • 14

    O Louvre o museu mais visitado do mundo. Para se ter uma ideia, em 2012, recebeu 9,7 milhes de visitantes. O MET (Metropolitan Museum of Art, de Nova York), o segundo mais visitado, recebeu apenas 6,1 milhes no mesmo perodo.*

    Agora, um fato curioso: em 21 de agosto de 1911, Vicenzo Peruggia (1881-1947) colocava vidros no museu e roubou a Mona Lisa. Pablo Picasso e o escritor Guillaume Apollinaire foram detidos como suspeitos do roubo. Apenas dois anos depois descobriu-se o verdadeiro responsvel pelo crime, quando Peruggia tentava vender a tela na Itlia. Vicenzo foi condenado a dezoito meses de priso, mas acabou sendo liberado sem cumprir toda a pena.

    Fora esse momento tenso, a Mona Lisa deixou apenas duas vezes o Louvre. Uma em 1962, para uma exposio nos Estados Unidos, e outra em 1974, quando foi exposta em Tquio. Em Nova

    York foi vista por 16 milhes de pessoas; e em Tquio cada visitante podia permanecer apenas dez segundos diante da tela!

    A pirmide, que funciona como principal acesso ao museu, foi construda pelo arquiteto norte-americano de origem chinesa Ieoh Ming Pei em 1988. uma grande estrutura de metal e vidro e tem cerca de 20 metros de altura, sua base tem 35 metros de lado. Est conformada por 673 painis de vidro, 603 losangos e 70 em formato de tringulo.

    No Museu do Louvre foram gravadas vrias cenas do filme O Cdigo Da Vinci. As tomadas aconteciam entre as 22h00 e as 4h30 da manh.

    * Fonte: The Art Newspaper.

  • 15

    Mapa do Louvre

  • 16

  • 17

    Circuito pelo Louvre

    Caminhar pelo Louvre ser como folhear um livro de Histria em 3D, passando pelo Egito Antigo e chegando ao sculo XIX. E at mesmo ao nosso sculo, quando visitamos as exposies temporrias.

    para comear em grande estilo Entre pela ala Denon. Quando chegar ao trreo, na parte das esculturas italianas, v em direo sala 4, onde esto as antiguidades etruscas e romanas. Suba a escada que o levar at uma das obras mais visitadas do museu, a Vitria de Samotrcia, uma das estrelas do Louvre.

    curiosidade Voc assistiu ao filme Cinderela em Paris (Funny Face, 1957), estrelado por Audrey Hepburn e Fred Astaire? Audrey faz o papel de uma vendedora de livros que passa a ser modelo. Durante uma das sesses de fotos (Fred Astaire o fotgrafo), a atriz desce de vestido vermelho a escadaria que conduz Vitria de Samotrcia.

    Vitria de Samotrcia [190 a.C.]La Victoire de Samothraceala denon | 1 andar | escadaria daru

    Quem ?Esta uma representao de Nik, a deusa da Vitria dos gregos. Todas as divindades gregas tinham determinados atributos que os artistas destacavam ao represent-las, assim o pblico da poca podia identificar, nas esculturas ou nas pinturas, as divindades

  • 19

    retratadas. Esta deusa, desde o sculo 6 a.C., era representada como uma mulher alada.

    A Nik que est exposta no Louvre foi encontrada em 1863 por Charles Champoiseau, um arquelogo amador francs. O sobrenome dessa escultura uma referncia ao local em que ela foi encontrada, a ilha de Samotrcia, localizada no norte do mar Egeu. A esttua representa um ex-voto, isto , uma oferenda a uma divindade feita por algum que pediu interveno divina e teve seus pedidos concedidos. A obra atribuda ao escultor grego Pitcritos, e acredita-se que tenha sido oferecida como agradecimento a um feito militar: a vitria naval de Antoco III, em 190 a.C.

    Observe a Nik da Samotrcia com ateno. Como sua postura corporal? O que voc acha que ela est fazendo? Onde ela est?

    O artista escolheu representar o exato momento em que Nik pousa sobre a proa de uma embarcao em movimento, pois o vento forma pregas em suas vestes. Isso pode estar relacionado ao fato de a esttua celebrar uma vitria naval: a deusa chega embarcao para impulsion-la vitria. O vento to forte que o tecido parece aderir a seu abdmen, e pode-se ver at mesmo seu umbigo.

    As asas abertas mostram o esforo para se equilibrar no momento em que a deusa pousa na embarcao. As pernas separadas tambm reforam a ideia de um movimento ainda em execuo.

    A tcnica utilizada para transmitir a sensao de que a roupa adere pele foi criada pelo escultor Fdias, e chama-se tcnica do pano molhado. como se a pedra fosse translcida e pudssemos ver o corpo do personagem atravs dela.

    As asas e os braos foram esculpidos separadamente e depois encaixados na escultura. Uma das asas fruto de restaurao. Os arquelogos tambm encontraram uma das mos da esttua e,

  • 20

    pela posio, deduziram que ela acenava ao espectador. Essa mo pode ser vista na vitrine, ao lado da escultura.

    A Vitria de Samotrcia uma das mais importantes esculturas helensticas. O helenismo o perodo artstico grego posterior ao da morte de Alexandre Magno, em que todo o Imprio grego passava por profundas transformaes. Acabou dividido em trs partes, e toda essa agitao se transmitiu arte.

    Uma das grandes caractersticas desse perodo so os efeitos de fora dramtica que, no caso da Vitria de Samotrcia, era potencializada pelo espao criado a seu redor. Essa proa do barco onde pousa a deusa se encontrava sobre uma piscina com uma fonte e devia ser ainda maior do que se v atualmente no museu. Se a escultura j tem 2,45 metros de altura, com a proa alcanava 3,28 metros. Imagine como devia ser sua viso com toda a teatralizao do espao.

    dica Para entender a obra necessrio dar a volta ao redor de toda a escultura. A oportunidade de observar todos os lados da pea uma caracterstica que voc no poder explorar quando se detiver para apreciar as pinturas, quase sempre pregadas nas paredes. E lembre-se: esse tipo de obra tem trs dimenses, portanto, aproveite!

    De frente para a Vitria, pegue direita para entrar na galeria das pinturas italianas. Nesta parte da visita, as obras mostraro por que o Renascimento foi uma verdadeira revoluo artstica. V at a sala 3 e encontre o quadro Estigmatizao de So Francisco.

  • 21

    Estigmatizao de So Francisco [1259-1300]Saint Franois dAssise recevant les stigmatesGiotto di Bondone [1265-1337]ala denon | 1 andar | salo carr | sala 3

    Giotto di Bondonenasceu numa vila perto de Florena, na atual Itlia. Quando era pequeno, cuidava das ovelhas, e, nos momentos mais tranquilos, desenhava nas pedras. Dizem que numa dessas sesses de desenho passava por l o artista Pietro (Giovanni) Cimabue, que ficou encantado com o trao do menino e o levou para trabalhar com ele. Giotto esteve por dez anos com o mestre, at que decidiu montar seu prprio ateli.

    Este artista considerado um pr-renascentista. Por qu? Explico:

    Hoje, ao observar este quadro, voc pode pensar: No muito real, parece at bem inferior s obras realistas de outros grandes pintores do Renascimento. Mas lembre-se de que Giotto viveu numa poca em que os conhecimentos de perspectiva (que do a sensao de volume) haviam sido abandonados. Como no eram utilizados, foram pouco a pouco esquecidos. Giotto comeou a desenhar as figuras com volume, uma grande novidade poca.

    Outra inovao de Giotto foi a representao dos santos com aparncia mais humana do que ocorria na arte medieval: os corpos agora tinham peso, solidez. Essa era uma aproximao da arte com o pensamento humanista, que ganhava corpo na poca: os seres humanos passavam a ser o centro dos estudos cientficos e artsticos.

    Neste quadro, So Francisco recebe, dois anos antes de sua morte, os estigmas de Cristo as marcas deixadas pela crucificao e pela flagelao no corpo de Jesus. As marcas das feridas esto nos ps, nos punhos e no trax. Bem, esta a histria que o quadro conta.

  • 23

    Agora, observe mais de perto. Observe Jesus, no cu, do lado esquerdo de So Francisco. Giotto esfora-se para dar aparncia mais humana s figuras divinas. Antes, na arte religiosa medieval, os personagens mais importantes eram representados em tamanho maior. Nesta tela, isso no funciona desse modo. Jesus, mesmo sendo a figura religiosa mais importante hierarquicamente no quadro, aparece representado menor que So Francisco. Por qu? Porque a esttica comea a se sobrepor viso de mundo teocntrica. Giotto se preocupa mais com as tcnicas artsticas do que com o respeito s divindades, como previa a Igreja Catlica. Assim, como Jesus est posicionado mais distante do espectador, Giotto o pintou menor, para transmitir a ideia de distncia.

    Nas capelinhas que h na cena principal, o pintor tambm teve essa preocupao de representar o volume e aproximar-se da realidade. O que tambm se v nas trs cenas no rodap do quadro, que contam outras fases da vida do santo.

    Ideia-chave do Renascimento: importncia da figura humana e da ideia de perspectiva.

    curiosidadeNesta mesma sala est exposta uma obra do mestre de Giotto. O quadro A Virgem e o Menino em Majestade, de Cimabue (1240-1302).

    Retrocedemos um pouco, para ver a obra de um artista posterior a Giotto. Ela se encontra na sala 1, ao lado da Vitria de Samotrcia. Voc vai conhecer agora um dos principais artistas renascentistas: Sandro Botticelli.

  • 24

    Vnus e as Trs Graas [1480-1490]Vnus et les Trois Grces offrant des prsents une jeune filleSandro Botticelli [1445-1510]ala denon | 1 andar | sala percier et fontaine | sala 1

    Nosso artista foi batizado como Alessandro di Mariano Filipepi. Mas, para facilitar, sua famlia o chamava de Sandro. E o Botticelli? Pegou emprestado do irmo, que era conhecido como Botticello, que significa barrilete. Agora no se sabe se o irmo era conhecido assim porque era gordo ou se porque gostava de comer. O que certo que Botticelli era bom de garfo. At seu mecenas (o seu patrocinador), Lorenzo di Medici, escreveu uns versos em que narra como o pintor era insacivel!

  • 25

    A arte do Renascimento deve muito a mecenas como Loureno de Mdici. Eles possibilitaram que os artistas vivessem de sua arte.

    Esta obra de Boticelli um afresco, uma tcnica de pintura que leva esse nome porque se pinta sobre o reboco da parede ou do teto ainda frescos, ou seja, midos. No se usa uma tela ou outro suporte. Nessa tcnica, o pintor prepara a superfcie a ser pintada normalmente com cal ou gesso e aplica os pigmentos de tinta base de gua, diretamente na rea a ser pintada. Assim, a tinta se mistura ao reboco medida que ele seca.

    Mas, se essa obra foi pintada na parede, como est ali no museu? A camada da pintura foi retirada de seu local original e removida para um suporte, facilitando assim sua transferncia para o museu.

    Este afresco foi pintado em uma espcie de fazenda dos amigos de Lorenzo. Provavelmente tenha sido oferecido aos amigos como um presente de casamento pelo rico mecenas. Naquela poca era comum se realizarem retratos dos noivos (juntos ou separados); normalmente eram um presente de um parente ou de um amigo ntimo. Esses retratos eram feitos para invocar proteo religiosa aos futuros esposos.

    Nesse afresco vemos a noiva (a mulher em primeiro plano no centro, vestida de rosa) representada como Vnus, a deusa romana da beleza e da fertilidade. Apesar de ser uma deusa da cultura greco-romana, a jovem est vestida moda florentina do sculo XV.

    Parece estranho que a noiva se represente como uma deusa da Antiguidade? Naquela poca, a cultura e os valores humanistas da Grcia e da Roma antigas estavam em moda. Assim, temas da mitologia, redescobertos principalmente por meio da arte e da literatura greco-romana, entraram no repertorio de vrios artistas.

  • 26

    As trs mulheres que acompanham a jovem so as Trs Graas, tambm divindades da cultura greco-romana, que representam as Trs Aes que o amor engloba: dar, receber e devolver.

    Observe como a representao das figuras humanas j bem diferente da do quadro de Giotto. So mulheres com um corpo real, totalmente afastadas do Gtico (movimento anterior ao Renascimento), quando todas as figuras eram mais planas e parecidas com Maria. As mulheres pintadas por Botticelli so sensuais, mostram o corpo atravs de transparncias. O rosto perfeito, e as linhas que o artista utiliza so delicadas e refinadas.

    Ideias-chave do Renascimento: a importncia da figura do mecenas ou patrocinador; redescoberta da arte e da literatura da Grcia e da Roma antigas.

    Nosso prximo artista chegou a pintar uma tela com Botticelli, quando os dois ainda aprendiam o ofcio no estdio de Andrea del Verocchio, em Florena, e ajudavam o mestre na tela O Batismo (atualmente em exposio na Galeria Uffizi, em Florena, Itlia). Florena, na regio da Toscana, foi a capital do Renascimento. A cidade foi to importante que exportou arte e artistas para o restante da Europa. Chegou a abrigar cerca de quarenta atelis de pintores, quarenta e quatro atelis de ourives, cinquenta de talhadores de relevos e mais de oitenta de entalhadores!

    O colega de trabalho de Botticelli foi ningum menos que Leonardo da Vinci.

  • 27

    Voltamos a entrar na imensa galeria italiana, passamos por Giotto e iremos at os quadros de Leonardo da Vinci, que estaro a seu lado esquerdo.

    incrvel ver tantas telas desse artista juntas. Leonardo da Vinci pintou aproximadamente vinte quadros, e o Louvre expe seis deles. Procure um retrato de uma bela dama que no parece estar muito feliz. Ela A Bela Ferronire.

    A Bela Ferronire [1490-1496]Portrait de femme, dit La Belle FerronnireLeonardo da Vinci [1452-1519]ala denon | 1 andar | grande galeria | sala 5

    Em minha opinio, este um retrato do estado de esprito de Lucrezia Crivelli, a mulher retratada no quadro. E voc, o que acha?

    Estamos diante de um retrato, temtica que aparecia com toda a fora no Renascimento. As pessoas retratadas eram, em sua maioria, membros das camadas mais ricas da sociedade. E quem contratava os servios dos artistas?

    De maneira geral, eram nobres, cujos privilgios lhes garantiam verdadeiras fortunas. Mas indivduos de outros grupos sociais tambm comeavam a se destacar no cenrio social florentino: burgueses que enriqueciam com atividades comerciais e buscavam, por meio do acesso arte, aproximar-se do status da nobreza.

    O retrato era a fotografia da poca. No perodo anterior, no eram feitos muitos retratos, pois os temas das artes eram dedicados, majoritariamente, a motivos religiosos. Isso caracterizava o teocentrismo. Mas, no Renascimento, o homem volta a ter importncia. Os sculos XV e XVI marcaram a era dos grandes

  • 29

    descobrimentos. Os seres humanos desafiam os limites impostos pelos dogmas religiosos e voltam a ganhar confiana em seu protagonismo no mundo: o antropocentrismo na ordem do dia.

    Observe o fundo do quadro. Ele ser bem diferente na Mona Lisa. Percebe a transformao na construo da figura humana, da pintura de Giotto para c? Lembra do rosto do So Francisco de Giotto; ou mesmo da Vnus, de Botticelli?

    Os artistas tm cada vez mais cuidado para representar a fisionomia das pessoas, bem como seus corpos e seus trejeitos. Os estudos de anatomia passam a fazer parte da formao de muitos pintores. Leonardo da Vinci, por exemplo, chegou a dissecar mais de trinta cadveres para estudar as formas e o funcionamento do corpo humano.

    Outras ideias-chave do Renascimento: grande poca dos retratos, em parte impulsionados pelo antropocentrismo e pelo enriquecimento da burguesia e a disputa de poder entre burgueses e nobres.

    Agora procure a tela

    A Virgem dos Rochedos ou A Virgem das Rochas [1483-1486]La Vierge aux rochersLeonardo da Vinci [1452-1519]ala denon | 1 andar | grande galeria | sala 5

    Esta obra faz referncia a um texto cristo no includo nos textos sagrados da Igreja Catlica. Os textos dos primeiros sculos do cristianismo que, por diferentes motivos, no foram reconhecidos pelas autoridades catlicas, recebem o nome de apcrifos. Este quadro trata do encontro da famlia de Jesus com a de Joo

  • 31

    Batista, durante a fuga para o Egito. No entendimento da Igreja Catlica, esse encontro talvez nunca tenha ocorrido, por isso ficou fora dos textos oficiais.

    Observe o quadro. Vamos identificar os personagens: Maria est no centro e apresenta Jesus a Joo, que est ajoelhado numa posio que revela respeito, com as mos unidas como em orao. Maria repousa sua mo no menino.

    Jesus olha para Joo e levanta sua mo direita para abeno-lo. Ao lado de Jesus, vemos o anjo Uriel. Para dar mais dramaticidade cena, Uriel aponta com o indicador para Joo e olha de lado. Para quem voc acha que Uriel est olhando? Para voc, o espectador da cena.

    Veja como os personagens esto agrupados. A disposio dos elementos no quadro o que chamamos de composio, que, nesta obra, tem a forma de pirmide. Essa estratgia foi muito utilizada no Renascimento porque aumenta a sensao de volume, e tambm por sua simbologia religiosa, j que faria aluso Santssima Trindade: Deus, Jesus e o Esprito Santo.

    Complicado?No. Vamos observar juntos o quadro. O vrtice do tringulo seria a cabea de Maria. Os dois lados sairiam desse ponto. Um deles passaria por Joo Batista e o outro, pelo anjo Uriel. A base seria uma linha que une Uriel a Joo, passando por Jesus. Voil! Temos nosso tringulo-

    -pirmide. Antes de comear a pintar, em seus esboos, o artista define essa composio, ou seja, a disposio dos personagens na tela.

    curiosidadeLeonardo da Vinci pintou duas telas quase iguais sobre este mesmo tema: esta que fica no Museu do Louvre, e outra que se encontra em Londres, na National Gallery.

    Outras ideias-chave do Renascimento: composio piramidal, que aumenta a sensao de profundidade e tambm se relaciona com a Divina Trindade e com a filosofia de Plato, para quem o tringulo era uma das figuras geomtricas mais perfeitas e, portanto, mais belas.

  • 32

    Vamos nos deter em outra obra com a virgem. Mas, agora, alm de Jesus, Santa Ana, a me de Maria, a acompanha.

    A Virgem e o Menino com Santa Ana [1508]Sainte Anne, la Vierge et lEnfant jouant avec un agneau, dite La Sainte AnneLeonardo da Vinci [1452-1519]ala denon | 1 andar | grande galeria | sala 5

    Observe como as figuras do primeiro plano so mais escuras e delineadas, enquanto o fundo claro e menos ntido, como se fosse se desvanecendo pouco a pouco. Leonardo utiliza esta tcnica para transmitir a ideia de profundidade e criar um cenrio mais prximo da realidade, em que os personagens que esto a pouca distncia do espectador aparecem mais ntidos; e a paisagem que se encontra mais longe vai perdendo pouco a pouco essa nitidez.

    Nessa composio, para dar mais movimento e para que o observador tenha a sensao de que est diante de uma cena na qual a Virgem estende o brao em direo ao menino, Leonardo criou linhas diagonais invisveis. Uma delas sai dos olhos de Santa Ana, passa pelos olhos da Virgem e chega aos olhos do Menino Jesus e da ovelha.

    outro ponto alto O impressionante trabalho nos tecidos da roupa da Virgem. Essa transparncia s possvel pela inveno da tinta a leo no Renascimento, o que possibilitou que se utilizassem muitas camadas de tinta superpostas, alm de aumentar exponencialmente o nmero de cores. A tinta a leo leva mais tempo para secar, assim o artista tem mais tempo para trabalhar detalhes.

    Observe as demais telas de Leonardo da Vinci. Antes de ver outra das estrelas do museu, ande um pouco mais pela Galeria Italiana. Quase no final, olhe por uma das janelas da direita. Que belo panorama, no ? A pirmide do Louvre, parte da fachada do museu e o Arco do Carrousel.

  • 34

    Agora chegou o momento de seu encontro com a Mona Lisa. Retorne e entre na sala 6. No se irrite com a quantidade de gente! Respire fundo. Tente se aproximar ao mximo desta senhora. Aqui vamos entender a tcnica criada por Da Vinci, o sfumato.

    Mona Lisa [1503-1517]Portrait de Lisa Gherardini, pouse de Francesco del Giocondo, dite Monna Lisa, la Gioconda ou la JocondeLeonardo da Vinci [1452-1519]ala denon | 1 andar | sala da gioconda | sala 6

    Apesar de todo o mistrio da retratada alguns chegaram a dizer que era um autorretrato! , escritos confirmam que se trata de Lisa Gherardini, a esposa de Giocondo, e que o retrato teria sido realizado em comemorao a sua recente maternidade. O vu transparente que utiliza j dava pistas desse fato naquela poca, o vu era utilizado pelas mulheres que acabavam de dar luz.

    E por que essa tela to famosa e importante? Porque neste quadro Da Vinci atingiu a perfeio da perspectiva area ou atmosfrica, uma tcnica usada para simular a distncia dos objetos, recriando o efeito do ar, do espao e da umidade na pintura. Os objetos que esto mais distantes vo empalidecendo ou se tornando mais esbranquiados.

    Partindo do conceito da perspectiva area ou atmosfrica, Leonardo da Vinci criou a tcnica do sfumato, na qual envolve toda a pintura em um ar de mistrio mediante a utilizao de capas sucessivas de pintura translcida. Essas capas de pintura do um aspecto mais elegante obra, quase no se percebendo a pincelada do artista.

    Na Mona Lisa, estas capas so to milimtricas que chegam a ser assombrosas. Os pesquisadores acreditam que o artista chegou a utilizar o prprio dedo como pincel, para poder controlar de modo perfeito a espessura das capas. Na Mona Lisa, Da Vinci alcana a perfeio do sfumato.

  • 36

    Como era feito o sfumato? Possivelmente a tcnica criada por Da Vinci envolveria diversas etapas*:

    1 Sobre uma madeira de lamo, aplica-se uma mistura de branco de carbonato de clcio, branco de zinco e cola de coelho (ossos modos). Essa mistura conhecida como creta ou imprimatura.

    2 Realiza-se um primeiro esboo com pincel.

    3 Aplicao de uma velatura (fina camada de cor) a leo sobre todo o quadro.

    4 Acrescentam-se as sombras e os tons intermedirios. No caso do olho esquerdo da Mona Lisa, esta operao se realizou com terra de Siena (tom de marrom) bastante diluda.

    5 Com a ponta do pincel se reforam suavemente as sombras e os tons intermedirios (degrad), sem marcar muito.

    6 Aplica-se sobre toda a tela uma fina camada translcida de cor adaptada a cada zona.

    7 Repassar as zonas antes pintadas com a ponta do pincel, pintando entre os pequenos espaos para homogeneizar.

    8 Toque final: aplicar graduados de tom at obter o efeito de degradado (degrad) suave entre as zonas de sombra e luz.

    Parece um rolo?No, apenas uma tcnica que d um enorme trabalho. Transcrevi suas etapas para que se entenda a complexidade da tela mais famosa de Da Vinci, Mona Lisa, na qual ele utilizou este recurso. E esta apenas uma das razes para que esta tela relativamente pequena seja to importante para a histria da arte!

    * Tcnica descrita pelo pesquisador e engenheiro ptico Pascal Cotte.

  • 37

    Depois da mulher de sorriso enigmtico, vire-se e encontrar a maior tela do museu, que tem 9,94 metros de comprimento por 6,77 metros de altura.

    As Bodas de Cana [1563]Les Noces de CanaPaolo Caliari, conhecido como Vronse [1528-1588]ala denon | 1 andar | sala da gioconda | sala 6

    Esta tela representa um episdio bblico bastante conhecido: o milagre da converso da gua em vinho durante um casamento, uma metfora da eucaristia na missa. Observe no centro a figura de Jesus Cristo.

  • 38

    Agora observe bem o entorno de Cristo. Como o cenrio? Ser que as construes se parecem com as moradias da regio da Galileia no sculo I? Exceto pela roupa de Jesus e de seus discpulos, os demais personagens se vestem como na poca do milagre? Observe os instrumentos musicais que aparecem na cena.

    No, definitivamente o cenrio no corresponde Galileia ocupada pelos romanos no sculo I. O artista traslada a cena para um palcio veneziano do sculo XV, a sociedade em que vivia. Essa

    licena potica foi bem comum no Renascimento e no movimento artstico posterior, o Barroco.

    Este quadro foi uma encomenda do Convento de San Giorgio Maggiore de Veneza. Nessa poca, era frequente que nos refeitrios dos conventos se colocasse alguma pintura relacionada a um episdio bblico. Melhor ainda se tivesse relao com uma mesa e com comida! Lembra-se da ltima Ceia, de Leonardo da Vinci? Tambm estava no refeitrio de um convento.

    Passamos por detrs da Mona Lisa e entramos no espao das Pinturas Francesas.

    dica Talvez este seja um bom momento para tomar um caf. Do lado esquerdo, voc ver uma cafeteria, junto a enormes janelas. Um local perfeito para descansar, ver o tempo passar e apreciar o movimento.

    Aps ter tomado seu caf, retornamos s Pinturas Francesas, e vamos at a sala 75. Encontre a obra intitulada O Juramento dos Horcios.

  • 39

    O Juramento dos Horcios [1784]Le Serment des HoracesJacques-Louis David [1748-1825]ala denon | 1 andar | daru | sala 75

    Este quadro de Jacques-Louis David fez muito sucesso. O primeiro impacto foi seu tamanho, que em arte se costuma chamar de formato. Nesse caso, a tela tem um grande formato. Observe o tamanho dos personagens. So do nosso tamanho. Isso mesmo, a escala real.

    Agora preste ateno no tema. O quadro de 1784, mas ser que a cena pintada narra um acontecimento desse perodo? Uma pista: observe as sandlias e os elmos. Sim, so personagens da Roma Antiga. Mas por que um artista do final do sculo XVIII pintaria temas

  • 40

    da Antiguidade Clssica? Assim como no Renascimento dos sculos XV e XVI, esses temas foram retomados?

    Sim. Sabe por qu? Ao longo do sculo XVIII, ocorreu uma srie de descobertas arqueolgicas que colocaram as sociedades (e a arte) da Grcia e da Roma Antiga novamente em destaque entre os intelectuais europeus. Essas descobertas aumentaram em progresso geomtrica aquilo que se sabia sobre essas civilizaes, gerando centenas de publicaes cientficas.

    Provavelmente, a mais chocante delas foram as runas das cidades romanas de Pompeia e de Herculano, soterradas pelas cinzas da erupo do vulco Vesvio desde o ano de 79. Imaginem o impacto de descobrir cidades praticamente intocadas, que ainda conservavam aspectos do modo de vida de sociedades to antigas e consideradas smbolos de cultura e civilizao!

    Como a arte reflete a sociedade da qual emerge, novamente e agora ainda com mais fora, os temas greco-romanos e sua filosofia vo emergir nas obras de arte, ao que se chamou de Neoclassicismo. E David ser o maior representante desse novo movimento artstico.

    Observe novamente o quadro. Veja as mulheres do canto direito. Elas parecem felizes? No. Nem poderiam estar. Este quadro narra um episdio muito triste. O momento exato em que trs irmos (os Horcios), diante de seu pai, juram por suas vidas que garantiro a vitria de Roma em uma guerra.

    Todo o cenrio explorado nesta tela assim como as roupas e os objetos que compem a cena so baseados nas descries apresentadas pelos artigos cientficos sobre as sociedades (e a arte) da Grcia e Roma Antiga. Ou seja, o artista quis ser o mais fiel realidade que retratava.

    Agora, chegue bem perto do quadro, ou o mximo que puder. Voc consegue ver na tela algo que mostre em que sentido o pintor realizou a pincelada? Nada, no ? Esta uma das caractersticas do Neoclassicismo. O acabamento no deixa o observador perceber o gesto do pintor, como se tudo fosse milimetricamente estudado.

  • 41

    Ideias-chave do Neoclassicismo: retorno aos temas greco-romanos, mas com ainda mais fidelidade reconstruo da poca, graas descoberta de cidades como Pompeia e Herculano; tcnica rigorosa (na qual no cabe improvisao), com predomnio da linha e do desenho.

    Nesta mesma sala encontra-se uma obra ainda maior do artista:A Coroao de Napoleo.

    A Coroao de Napoleo [1805-1807]Sacre de lempereur Napolon Ier et couronnement de limpratrice Josphine dans la cathdrale Notre-Dame de Paris, le 2 dcembre 1804Jacques-Louis David [1748-1825]ala denon | 1 andar | daru | sala 75

    David esteve presente na coroao de Napoleo Bonaparte como imperador da Frana, em 1804. Voc pode pensar que, como um observador em primeira mo, ele retratou tudo como realmente aconteceu. Assim, o quadro seria praticamente uma foto do momento.

    Mas isso no totalmente verdade. Como pintor oficial do novo imprio, David tinha que tomar algumas decises pictricas que ajudassem a exaltar a figura de Napoleo. Por exemplo, a luz do quadro toda dirigida ao imperador, portanto, ningum tem dvida de que ele o personagem principal da cena, apesar de estar coroando Josefina, sua esposa.

    O artista at pensou em retratar um outro momento desse grandioso evento: a autocoroao de Napoleo. Mas com a obra j em andamento, David mudou de ideia. Esse arrependimento deixou marcas: para encobrir a primeira verso, ele pintou atrs de Napoleo um sacerdote italiano com as feies de Jlio Csar.

  • 42

    Outro detalhe que no corresponde aos fatos a presena de Letcia, a me de Napoleo, na tribuna, vestida de branco. Mas essa senhora no esteve presente na coroao. Primeiro, porque era contra a cerimnia. Para ela, a figura de um imperador era muito parecida com a de um rei. E, afinal, os franceses haviam feito uma revoluo contra essa forma de poder. E, segundo, porque no gostava de Josefina, a mulher de Napoleo.

    Se voc for a Versalhes ver uma rplica deste quadro Napoleo gostou tanto do resultado que encomendou uma cpia ao pintor.

    Ao lado de A Coroao de Napoleo, observe mais uma obra de David.

  • 43

    As Sabinas [1799]Les SabinesJacques-Louis David [1748-1825]ala denon | 1 andar | daru | sala 75

    Aqui temos outra referncia histria romana, o que curioso, porque David sequer gostava da Antiguidade Clssica, at que uma viagem acendeu sua paixo por esse perodo.

    O quadro mostra a triste lenda do rapto das sabinas. Logo aps a fundao de Roma, por volta de 750 a.C., faltavam mulheres que possibilitassem o crescimento da populao. Os romanos tentaram negociar com o vilarejo vizinho, Sabine, para que enviassem algumas de suas mulheres a Roma. Como no conseguiram chegar a um acordo, no tiveram dvida: foram at Sabine e raptaram as mulheres jovens, deixando um rastro de mortes em seu caminho.

  • 44

    Procure agora um retrato menor, Madame Rcamier ou

    Retrato de Juliette Rcamier [1800]Madame Rcamier, ne Julie (dite Juliette) BernardJacques-Louis David [1748-1825]ala denon | 1 andar | daru | sala 75

    Jacques-Louis David foi um pintor reconhecido em vida. Toda a burguesia, que havia ganhado ainda mais destaque na sociedade com a chegada de Napoleo ao poder, queria um retrato pintado por ele. Um de seus mais famosos retratos este de Juliette Rcamier, esposa de um banqueiro da poca.

  • 45

    Apesar de retratar uma mulher de seu tempo, Juliette est vestida maneira romana, e num div que lembra e muito os mveis de Pompeia. Os elementos secundrios do quadro foram pintados por Jean-Auguste Dominique Ingres, discpulo de David, que foi outro grande pintor do Neoclassicismo. Se tiver interesse, depois de concluir esse percurso, poder observar alguns quadros de Ingres no 2 andar, na Galeria de Pinturas Francesas do sculo XIX.

    Voc gostou do quadro? Vou lhe contar um segredo: ele est inacabado. No se sabe ao certo por qu, mas o autor no finalizou o acabamento translcido que dava a todas as suas obras, e que nos impede de ver as pinceladas do artista, dando a sensao de extrema perfeio. Compare com os quadros anteriores, aqui podemos intuir os movimentos do pincel do artista. Nos demais, a olho nu isso imperceptvel.

    curiosidadesNormalmente os retratos costumavam ser verticais, aqui David preferiu a horizontalidade, que normalmente se utilizava para contar histrias.

    Os artistas inspiram-se uns aos outros. Certas obras causam tanto impacto que chegam a gerar o que chamamos de

    releituras, ou trabalhos inspirados em outras obras. O retrato de Juliette inspirou Ren Magritte (1898-1967) a criar uma pintura e uma escultura. A escultura se encontra no Museu de Belas Artes da Blgica (Bruxelas). Magritte era belga, e David se autoexilou em Bruxelas quando Napoleo foi derrotado e os Bourbons restabeleceram a monarquia.

    Vamos ao encontro do homem que marcar o incio de outro movimento na pintura: Thodore Gricault. Dirija-se sala 77.

  • 46

    A Balsa da Medusa [1818-1819]Le Radeau de la MduseThodore Gricault [1791-1824]ala denon | 1 andar | sala mollien | sala 77

    Observe as cores utilizadas, os efeitos, a expresso das pessoas. Percebe a diferena entre esta tela e as telas anteriores de David? Da gua para o vinho, no mesmo?

    Thodore Gricault tinha 27 anos quando pintou este quadro polmico. Apesar da intensa dramaticidade, a obra narra um fato real, o naufrgio do navio Medusa, de propriedade do governo francs, prximo da costa africana, por incompetncia do comandante. Ele abandonou o navio assim que o naufrgio teve incio, e com sua tripulao pegaram o barco salva-vidas,

  • 47

    no incio, puxavam numa jangada improvisada os 150 colonos franceses que iam para o Senegal. At que resolveram cortar a corda e abandon-los prpria sorte. Eles ficaram deriva por doze dias, com um pouco de vinho e biscoitos. Depois de situaes de canibalismo e muito sofrimento, apenas quinze deles sobreviveram e foram resgatados.

    Normalmente, quando algum pintava uma tela to grande, tratava-se de uma encomenda. Mas Gricault realizou esta obra por sua conta e risco, na esperana de que fosse adquirida pelo Museu de Luxemburgo (Paris). O que no aconteceu, por ser uma narrao contempornea, por seu contedo poltico e porque a pele dos tripulantes era de uma cor assustadora, mrbida (segundo a maioria dos crticos).

    No bastasse tudo isso, outra polmica era a incluso de uma pessoa negra na obra em uma poca de muito racismo.

    Enquanto estava pintando, Gricault entrevistou alguns dos sobreviventes, construiu uma jangada como modelo e colocou em seu estdio. Alm disso, ia a um hospital e visitava o necrotrio para aprender a pintar os cadveres de uma forma mais verossmil.Para obter todo este movimento que voc v na tela, ele adotou uma composio em forma de duas pirmides. Uma delas tem seu pice nas mos do sobrevivente que acena para um navio ao longe. A outra pirmide mais fcil de ser percebida, seu pice o mastro da jangada e suas linhas laterais so formadas pelas cordas que mantm o mastro.

    Esta tela inaugura o Romantismo na pintura. Era uma forma de ver a vida que j estava presente na literatura e na msica. Os romnticos pregavam a vida louca, como se no houvesse amanh. Queriam viver a vida ao mximo, eram bomios e corriam riscos em prol de sua filosofia de vida. Isso levou morte prematura muitos artistas, como Frdric Chopin, aos 39 anos, e o prprio Gricault, aos 32 anos de idade.

    Essa vida louca se percebe no turbilho de emoes que so os quadros. Bem diferentes dos neoclssicos, que contavam uma histria e pregavam valores, que eram pura razo.

  • 48

    No leito de morte do pintor esteve presente seu amigo Eugne Delacroix, que posou como modelo para o polmico A Balsa de Medusa. o personagem morto e de bruos quase no centro do quadro. Delacroix, tambm pintor, seguiu os passos de Gericult no Romantismo.

    Ideia-chave do Romantismo: predomnio da emoo.

    A Liberdade Guiando o Povo [1830]Le 28 Juillet. La Libert guidant le peuple (28 juillet 1830)Eugne Delacroix [1798-1863]ala denon | 1 andar | sala mollien | sala 77

  • 49

    Voc est diante de um dos grandes quadros da Histria. Em julho de 1830, os parisienses se rebelaram contra o regime autoritrio do rei Carlos X. Queriam com suas barricadas trocar um rei tirano por um rei mais liberal.

    Delacroix viveu a rebelio pessoalmente. O escritor e amigo do pintor, Alexandre Dumas, conta que ele observava de longe as manifestaes, em sua residncia em Paris. E que apenas uma vez o viu exaltado, quando alaram a bandeira francesa sobre a Catedral de Notre-Dame.

    Toda aquela movimentao inspirou de tal maneira o artista que, em trs meses, pintou esse quadro enorme. Ele afirmava que, se no havia lutado pela ptria, ao menos pintaria por ela.

    H muita informao nessa obra. Delacroix queria atordoar o espectador, causar certa confuso para perturbar a viso, e assim, quem sabe, fazer chegar o que para ele era o mais importante: a emoo.

    Tal qual Gricault, ele tambm utilizou a composio em pirmide. E no para por a a influncia do falecido artista sobre Delacroix. Observe a utilizao de zonas claras em contraste com outras mais escuras. Em ambas as telas, personagens que no costumavam ser protagonistas de aes to picas ocupam lugar de destaque e carregam bandeiras. Na barca, o homem negro com a bandeira; e aqui, a mulher. E claro, para chocar e levar emoo, os corpos mortos e nus jogados no cho.

    curiosidades

    O menino ao lado da Liberdade teria participado das barricadas e inspirado o personagem Gavroche dOs Miserveis, de Victor Hugo, livro que seria escrito trinta anos depois.

    Polmica da poca: os pelos pbicos do homem que est morto esquerda causaram grande furor.

    Perceba o predomnio das cores da bandeira francesa branco, vermelho e azul : na meia do homem praticamente nu e morto, na vestimenta do homem que est de quatro e observa fixamente a Liberdade.

  • 50

    Delacroix apresentou o quadro no Salo de 1831. O governo francs o comprou por 3 mil francos e, depois, o escondeu! Nenhum dos dois lados ficou feliz com a imagem. Os revolucionrios no gostaram porque mostrava a realidade dos saques durante as barricadas, j que vrios personagens levaram objetos pertencentes Guarda Real. Tampouco o governo, porque a Liberdade estava suja, e passava por cima de soldados mortos. Depois de algum tempo, o governo devolveu o quadro ao artista.

    Em 1855, Paris rendeu uma homenagem a Delacroix durante a Exposio Universal. Mas A Liberdade Guiando o Povo no se inclui na mostra, porque foi considerada subversiva.

    Apenas em 1874 o quadro foi exposto ao pblico no Museu do Louvre. Delacroix havia morrido fazia onze anos. A partir de ento foi fonte de inspirao de outros pintores, escultores, caricaturistas. Apareceu estampada em selos, em dinheiro e em rtulos de diferentes produtos.

    Mas seu papel mais importante, sem dvida, sua funo de estandarte popular. Foi utilizado diretamente no manifesto de Charles de Gaulle aps a Segunda Guerra Mundial, e ainda reapareceu em diversas manifestaes histricas ao longo do tempo, como a Revoluo Estudantil, de 1968.

    lembrete

    neoclassicismo romantismoLinha, desenho CorRazo EmooTcnica, despersonalizao do artista

    Nota-se a pincelada na tela, o gestual

    Tema principal: mitologia greco-romana

    Tema principal: herosmo, situaes-limite, natureza em estado selvagem

    Alguns nomes: Ingres (voc pode ver obras desse pintor aqui no Louvre), David, Antonio Canova, Mozart

    Alguns nomes: Gricault, Delacroix, Chopin, Constable, Turner, Beethoven, Verdi

  • 51

    Depois de tantas emoes e de ter conhecido o pintor oficial do Imprio francs, vamos descer para ver o escultor oficial de Napoleo. A forma mais fcil descer as escadas prximas do caf (onde sugeri uma pequena parada), que se encontra ao lado da sala 77, onde voc est agora. Vamos em direo s Esculturas Italianas dos sculos XVI-XIX. Ao descer as escadas e entrar na grande Galeria de Esculturas Italianas, voc encontrar duas esculturas inspiradas nos modelos clssicos, mas que so do sculo XVI. So os Escravos, de Michelangelo (1475-1564), representantes do Renascimento.

    O Escravo Moribundo e O Escravo RebeldeCaptifs (LEsclave rebelle et LEsclave mourant)Michelangelo Buonarotti, conhecido como apenas Michelangelo [1475 1564]ala denon | trreo | galeria michelangelo | sala 4

    Estas duas figuras (escravo rebelde e escravo moribundo) estavam destinadas a ser parte de um grande grupo escultrico para a tumba do papa Jlio II. O projeto se arrastou por quarenta anos e no pde ser concludo por falta de verba. Foi o prprio Michelangelo que presenteou Roberto Strozzi com estas duas esculturas, que as trouxe para a Frana.

    Ningum sabe ao certo por que Michelangelo esculpiu estes escravos para a tumba do papa. H duas teorias:

    1 eles representavam as raas submetidas pela f catlica;

    2 eles representariam as almas tentando se desprender do corpo, o que tem mais sentido, e por isso o artista teria deixado parte da pedra bruta para mostrar esse momento. Essa parte bruta se encontra junto aos ps das duas esculturas e sobe pela parte de trs do corpo. Perceba a diferena da parte mais trabalhada para esta, bem como a perfeio anatmica alcanada pelo artista.

  • 53

    De Michelangelo para um dos modelos que inspiraram a ele e a Canova, a Vnus de Milo. s seguir em frente, na direo oposta da obra de Canova. Vamos Galeria das Antiguidades Clssicas.

    Agora, caminhe em direo ao homem alado. Ele to lindo, que no h como no v-lo.

    Amor e Psiqu ou Eros e Psiqu [1793]Psych ranime par le baiser de lAmourAntonio Canova [1757-1822]ala denon | trreo | galeria michelangelo | sala 4

    O que voc v so Eros e Psiqu, iluminados pela luz natural dessa enorme janela. Obra de Antonio Canova, que tambm foi um artista neoclssico. Ele foi o escultor escolhido por Napoleo para representar a ele e sua famlia.

    Ele utilizava personagens mitolgicos, mas imprimia em seus rostos as feies de Napoleo ou de sua irm. Vendia ideias por meio de suas obras. Por exemplo, esculpindo Napoleo como um imperador romano, demonstrava a fora do poder do governante.

    curiosidadesAs asas foram talhadas parte, enquanto o restante do conjunto, em um bloco nico de mrmore de Carrara.

    Agora, fique de frente para a escultura. Voc v o grande X formado pelas asas de amor e pelas pernas dos dois personagens. No centro desse X, os braos dos dois personagens formam uma espcie de medalho que enquadra o rosto de ambos, com destaque para um vazio entre seus lbios que gera uma tenso dramtica para a escultura, j que entre o beijo se encontra a vida ou a morte. Por qu? Para entender, preciso entender o mito detrs da obra.

  • 54

    O mitoPsiqu era to bonita que Afrodite (deusa da beleza e do amor), num momento de dio, manda que seu filho Eros (deus do Amor) v atrs dela e faa, com suas flechas, que ela se apaixone por um ser monstruoso.

    Mas Eros quem se apaixona por Psiqu, com quem se casa, sem que ela conhea sua identidade. E a faz prometer que nunca tentar ver seu rosto.

  • 55

    Mas instigada por suas irms, Psiqu arma um plano para ver o rosto do marido enquanto ele dormia; Eros desperta furioso, gritando: O Amor no sobrevive sem confiana!

    Psiqu, deprimida, quer reconquistar Eros, mas sua sogra, a deusa Afrodite, lhe impe alguns trabalhos para provar que era digna de seu filho.

    O que tudo isso tem a ver com esta escultura? Um desses trabalhos era levar um frasco do mundo subterrneo at Afrodite. Mas no devia abri-lo em hiptese nenhuma. No entanto, Psiqu cai em tentao e abre o frasco, que desprende uma fumaa que a faz dormir profundamente.

    A escultura de Canova mostra o exato momento em que Eros vem salvar sua amada, recolhendo o que continha no frasco e despertando-a com um doce beijo.

    curiosidadeSabe onde est a modelagem de gesso criada como esboo para esta obra? No Metropolitan Museum of Art, em Nova York. Com base nessa maquete, o artista criou duas obras feitas de mrmore; uma delas a que est diante de voc no Louvre, a outra se encontra no Hermitage, em So Petersburgo, na Rssia.

    Vnus de Milo [323-31 a.C.]Aphrodite, dite Vnus de Miloala sully | trreo | sala da vnus de milo | sala 16

    A escultura de mrmore reina absoluta e sozinha, afinal, uma das trs estrelas do Louvre.

  • 57

    interessante agora compararmos a Vnus de Milo com a Vitria de Samotrcia, duas obras gregas radicalmente diferentes e que vo ajudar a entender o complexo conceito de beleza dos gregos.

    Na Vitria de Samotrcia a beleza quase nasce do caos, no h equilbrio. A fora nasce das asas que se erguem, das pregas das roupas, do tecido que, em face ao vento, adere ao umbigo dessa mulher. Era o que os gregos chamavam de beleza dionisaca, a beleza em desordem, mas que ainda sim beleza, porque para eles o belo era aquilo que se amava. Voc se lembra de Dionsio, o deus do vinho, da festa?

    J a Vnus de Milo a beleza apolnica, relacionada com o deus Apolo, idealizada.

    No se sabe ao certo se a Vnus de Milo seria do sculo IV a.C. ou do perodo compreendido entre os sculos III e I a.C. Muitos estudiosos acreditam que possa ser obra do famoso escultor Praxiteles (395-330 a.C.) ou de seu ateli; outros ainda pensam que seria de alguns sculos depois.

    O que se sabe que foi descoberta por acaso em 1820 pelo campons Yorgos Kentrotas na Ilha de Melos (tambm conhecida como Milos ou Milo). Por coincidncia ele estava com um cadete francs, que gostava de arqueologia, e pediu que continuasse escavando porque no comeo apenas encontraram uma parte da escultura.

    Provavelmente a Vnus formasse parte de um grupo escultrico, ou seja, que no estivesse sozinha. Estaria com Cupido. Parece ter sido projetada para ser vista de lado e, se assim, a Vnus estaria estendendo seus braos para o Cupido.

    curiosidadeNaquela poca os gregos no tiveram a mesma viso que ns das esculturas gregas. Sabe por qu? Elas no eram assim branquinhas. Estavam totalmente pintadas de cores fortes e contrastantes.

    Para ir alm: obra-prima da arte egpcia Suba as escadas at o 1 andar e dirija-se at sala 22, na Galeria do Egito Faranico, circuito cronolgico.

  • 58

    O Escriba Sentado [2600-2350 a.C.]Le Scribe accroupiala sully | 1 andar | sala 22 | vitrine 10

    O Escriba Sentado uma das obras mais famosas da arte egpcia. considerada uma obra-prima, j que por suas caractersticas supera outras produzidas no mesmo perodo. As esculturas de escribas eram muito comuns na estaturia do antigo Egito. Muitas delas eram colocadas nas tumbas com os corpos mumificados, para acompanhar as personalidades na vida ps-morte.

  • 59

    Esta pea nunca foi restaurada; o que se observa a pigmentao original. Isso no inacreditvel? Aos homens se dava este tratamento na pele, certo ar mais bronzeado. J para as mulheres ricas, utilizavam um tom mais bege, j que estavam menos expostas ao sol.

    Como as esculturas egpcias eram planejadas para durar a eternidade, no deveriam ter pontos mais frgeis. Por isso, na maioria das vezes, eram esculpidas em um nico bloco de pedra. No caso desse escriba, utilizou-se um bloco de pedra calcria. Para que no se rompessem, os retratados costumam estar em posies rgidas. Aqui os membros superiores e inferiores esto o mais rente possvel ao corpo.

    Os volumes so tratados de forma esquemtica, e se eliminam os detalhes inteis. Aqui, o escriba segura com uma das mos o papiro e, com a outra, o clamo (pedao de cana com as extremidades cortadas em bico), que era o pincel com o qual escrevia. Mas o pincel desapareceu. Os escribas quando no estavam escrevendo, colocavam o clamo apoiado na orelha. Como sabemos disso? Pelos relevos que mostram esta cena e tambm em cenas pintadas em outros papiros.

    Preste ateno na fora dos olhos. Essa energia vem dos cones de cristal de rocha incrustados nas rbitas. Isso no era comum em todas as esculturas egpcias, e revela a importncia da figura do escriba naquela sociedade. Tanto que, muitas vezes, na falta de um funcionrio de confiana, a funo de escrever era desempenhada por um familiar do fara.

    Normalmente, as esculturas dos escribas esto apoiadas em um quadrado de calcrio com hierglifos em relevo, que revelam a identidade do retratado. Mas, neste caso, esta base no foi encontrada e existem apenas hipteses de quem seria, mas at agora sua comprovao no foi possvel. A escultura foi encontrada em 1850 em Sakkara, a necrpole do Antigo Imprio egpcio.

  • Se as pessoas soubessem quantas vezes fracassei em minhas obras, e quantas vezes voltei a tentar, no me chamariam gnio.

    Com esta frase de Michelangelo terminamos nosso circuito. Mas espero reencontrar voc aqui no Louvre, ou em outro museu de arte deste planeta!

  • Sobre o Conexo Paris

    O Conexo Paris (www.conexaoparis.com.br) a principal fonte de informao sobre Paris e a Frana para turistas brasileiros.

    Escrito pela historiadora brasileira Lina Hauteville, que mora h mais de 30 anos em Paris, e por sua filha Mariana Berutto, publicitria, que vive entre Paris e Belo Horizonte, o Conexo Paris traz dicas selecionadas, testadas e exclusivas sobre tudo que o turista precisa saber antes de embarcar: passeios, hotis, restaurantes, lojas, agenda cultural, meios de transporte etc.

    A partir da demanda dos leitores, nasceu a Editora Conexo Paris, que publica guias exclusivos sobre Paris e a Frana. Para conhecer os demais ttulos da editora, acesse a lojinha virtual do Conexo Paris: www.conexaoparis.com.br

    Siga tambm nossas dicas nas redes sociais do Conexo Paris:

    facebook.com/conexaoparis @conexaoparis youtube.com/conexaoparis

    61

  • Nasci em Apucarana, mas sou curitibana de corao. Atualmente, vivo numa das sete Ilhas Canrias. Fiz faculdade de artes plsticas, e dei aula de Histria da Arte desde a educao primria at o ensino superior. Fui arte-educadora em museus brasileiros e espanhis, e escrevi material didtico de artes e de turismo.

    Como estava na academia, resolvi cursar duas ps-graduaes. Sou mestre em Turismo e Educao nos Museus e doutora em Turismo Cultural com nfase em Museus. Na Espanha, trabalhei como assessora em projetos europeus educativos e culturais, alm de dar aulas para o mestrado em Turismo da Universidade de Las Palmas de Gran Canaria.

    Tenho diversas publicaes acadmicas no Brasil, na Espanha, na Argentina e nos Estados Unidos. Mas desde 2011 me dedico de corpo e alma a meu blog de viagens e arte, Turomaquia, que j tem quase oito anos.

    Entretanto, o que mais me comove e me move a arte. Ou melhor, esta misso que me autoimpus de tentar converter todos que cruzem minha vida em loquazes consumidores de arte, e de seus templos mximos, os museus.

    Patricia Camargo

    Sobre a autora

    62

  • Conexo Paris, 2014

    Todos os direitos reservados.

    www.conexaoparis.com.br

    [email protected]

    Editora: Mariana Berutto

    Editora assistente: Sandra Brazil

    Edio de contedo e de texto: Fernanda Brunieri Regis

    e Sandra Brazil

    Reviso: Lizete Mercadante Machado e Cles Editorial

    Design grfico: Elisa von Randow

    Assistncia de design: Gustavo Marchetti

    Ilustraes: Veridiana Scarpelli

    Produo grfica: Lilia Ges

    Os mapas foram elaborados especialmente para este guia,

    com o objetivo de ilustrar os roteiros.

    O essencial do Museu do Louvre foi composto no vero brasileiro

    (inverno em Paris) com a tipografia Whitney.