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Minerva, 6(1): 73-83 OBJETIVOS COMPETITIVOS E O PLANEJAMENTO E CONTROLE DA PRODUÇÃO: ESTUDO DE CASO NA CONSTRUÇÃO CIVIL Larissa Marinho Coelho de Medeiros Bezerra Arquiteta e Urbanista, Mestranda em Arquitetura e Urbanismo na Escola de Engenharia de São Carlos, USP, e-mail: [email protected] Márcio Minto Fabrício Professor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Escola de Engenharia de São Carlos, USP, e-mail: [email protected] João Adriano Rossignolo Professor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Escola de Engenharia de São Carlos, USP, e-mail: [email protected] Resumo As empresas formulam seus objetivos de desempenho visando atingir o mercado consumidor de forma competitiva. Nesse âmbito estratégico, estabelecem diretrizes para a função produção como “implementadora” da estratégia empresarial a fim de colocar em prática e operacionalizar a estratégia sendo alicerçada pelo planejamento e controle da produção, que define a melhor forma de empregar recursos e garantir a execução dos planos previstos. Assim, a função produção estabelece uma relação entre a definição dos objetivos de desempenho e o planejamento e controle da produção à medida que os objetivos direcionam o planejamento a organizar as atividades de produção de acordo com as expectativas estabelecidas pela empresa. A síntese deste trabalho está na abordagem de um estudo de caso em uma empresa construtora que tem por objetivo caracterizar os critérios competitivos estabelecidos pela empresa e determinar como isso se reflete nas decisões atribuídas ao planejamento e controle da produção. Palavras-chave: planejamento e controle da produção, objetivos de desempenho, construção civil. Introdução Na construção civil, assim como nos demais setores industriais, o mercado consumidor seleciona as melhores práticas e os melhores produtos, e a produção deve ser orientada para as necessidades dos usuários. De acordo com Corrêa & Corrêa (2007), empresas que conseguem colocar no mercado produtos melhores e de forma mais rápida do que a concorrência, atendendo ou superando as expectativas dos clientes, conseguem alavancar sua condição de competitividade. Sendo assim, a competitividade das empresas demanda um planejamento estratégico orientado às necessidades dos clientes e condições do mercado consumidor, contemplando critérios competitivos quanto a custo, desempenho na entrega, qualidade, prazos de entrega, flexibilidade e inovação como elemento funda- mental à permanência das empresas no mercado (Wheelwright, 1984; 1989 apud Barros Neto et al. , 2002). Entretanto, a maioria das empresas de construção apresenta uma administração voltada ao curto prazo e ao empreendimento, relegando o planejamento estratégico de longo prazo orientado por objetivos competitivos. Este trabalho investiga a utilização de estratégias empregadas na indústria de manufatura no setor da construção de edifícios, tendo por objetivo estabelecer uma relação entre os objetivos de desempenho propostos pela organização e as tomadas de decisão na elaboração do planejamento e controle da produção nas empresas de construção. Para tanto, utilizou-se como estratégia de pesquisa a condução de um estudo de caso descritivo junto a uma empresa de construção que desenvolve, de forma parcialmente industrializada, a produção em série de vedações e estruturas de residências unifamiliares. Esse estudo de caso investiga e descreve o processo de planejamento e controle da empresa, determinando os objetivos de desempenho estratégico utilizados na

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OBJETIVOS COMPETITIVOS E OPLANEJAMENTO E CONTROLE DA PRODUÇÃO:

ESTUDO DE CASO NA CONSTRUÇÃO CIVIL

Larissa Marinho Coelho de Medeiros BezerraArquiteta e Urbanista, Mestranda em Arquitetura e Urbanismo na

Escola de Engenharia de São Carlos, USP, e-mail: [email protected]

Márcio Minto FabrícioProfessor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Escola de

Engenharia de São Carlos, USP, e-mail: [email protected]

João Adriano RossignoloProfessor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da

Escola de Engenharia de São Carlos, USP, e-mail: [email protected]

ResumoAs empresas formulam seus objetivos de desempenho visando atingir o mercado consumidor de forma competitiva.Nesse âmbito estratégico, estabelecem diretrizes para a função produção como “implementadora” da estratégia empresariala fim de colocar em prática e operacionalizar a estratégia sendo alicerçada pelo planejamento e controle da produção,que define a melhor forma de empregar recursos e garantir a execução dos planos previstos. Assim, a função produçãoestabelece uma relação entre a definição dos objetivos de desempenho e o planejamento e controle da produção àmedida que os objetivos direcionam o planejamento a organizar as atividades de produção de acordo com as expectativasestabelecidas pela empresa. A síntese deste trabalho está na abordagem de um estudo de caso em uma empresaconstrutora que tem por objetivo caracterizar os critérios competitivos estabelecidos pela empresa e determinar comoisso se reflete nas decisões atribuídas ao planejamento e controle da produção.Palavras-chave: planejamento e controle da produção, objetivos de desempenho, construção civil.

IntroduçãoNa construção civil, assim como nos demais setores

industriais, o mercado consumidor seleciona as melhorespráticas e os melhores produtos, e a produção deve serorientada para as necessidades dos usuários. De acordocom Corrêa & Corrêa (2007), empresas que conseguemcolocar no mercado produtos melhores e de forma maisrápida do que a concorrência, atendendo ou superandoas expectativas dos clientes, conseguem alavancar suacondição de competitividade.

Sendo assim, a competitividade das empresasdemanda um planejamento estratégico orientado àsnecessidades dos clientes e condições do mercadoconsumidor, contemplando critérios competitivos quantoa custo, desempenho na entrega, qualidade, prazos deentrega, flexibilidade e inovação como elemento funda-mental à permanência das empresas no mercado(Wheelwright, 1984; 1989 apud Barros Neto et al.,2002).

Entretanto, a maioria das empresas de construçãoapresenta uma administração voltada ao curto prazo eao empreendimento, relegando o planejamento estratégicode longo prazo orientado por objetivos competitivos.

Este trabalho investiga a utilização de estratégiasempregadas na indústria de manufatura no setor daconstrução de edifícios, tendo por objetivo estabeleceruma relação entre os objetivos de desempenho propostospela organização e as tomadas de decisão na elaboraçãodo planejamento e controle da produção nas empresasde construção.

Para tanto, utilizou-se como estratégia de pesquisaa condução de um estudo de caso descritivo junto a umaempresa de construção que desenvolve, de formaparcialmente industrializada, a produção em série devedações e estruturas de residências unifamiliares. Esseestudo de caso investiga e descreve o processo deplanejamento e controle da empresa, determinando osobjetivos de desempenho estratégico utilizados na

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elaboração desses planos, caracterizando uma relaçãoentre esses aspectos na organização do processo produtivo.Mediante a análise desse processo, pretende-se demonstrara importância da análise de objetivos de desempenhopara as empresas de construção, na fase de planejamentoestratégico de empreendimentos, a fim de determinarum direcionamento aos requisitos que a empresa pretendeatingir por meio do planejamento e controle da produção,apresentando como o planejamento estratégico pode serutilizado no setor de construção de edifícios como ferramentade tomada de decisões e norteador para a busca de objetivoscompetitivos.

Referencial TeóricoOs objetivos de desempenho são determinados para

satisfazer as necessidades dos seus usuários (stakeholders).Segundo Slack et al. (2002), stakeholders podem serassim classificados: stakeholders internos são os empregadosda operação produtiva; stakeholders externos são os clientes,fornecedores ou acionistas da empresa. Sendo assim, osobjetivos de desempenho de uma empresa são estabelecidosde acordo com as necessidades do grupo de stakeholdersa que a organização pretende atender.

Segundo Martins & Laugeni (2005), o planejamentoestratégico das empresas tem por principal objetivodeterminar diretrizes de atuação nos diversos setores daempresa visando a vantagens competitivas. As empresasexistem para produzir um produto ou serviço que tenhavalor para o consumidor, assim, ao estabelecer uma estratégiade manufatura para a empresa, devem ser analisados eformulados os objetivos e as diretrizes quanto a: custo,qualidade, prazos de entrega, flexibilidade, inovação,produtividade e tecnologia (Martins & Laugeni, 2005).

Os objetivos de desempenho mais comumentemencionados são: custo, prazo, qualidade e flexibilidade(Barros Neto et al., 2002). Adicionalmente, Slack et al.(2002) consideram a confiabilidade como um quintoobjetivo de desempenho, seguido de custo, qualidade,rapidez e flexibilidade. De forma análoga, Wheelwright(1984; 1989) classifica custo, desempenho na entrega,flexibilidade, qualidade e inovação como critérioscompetitivos.

As empresas de construção de edifícios definemos objetivos de desempenho de acordo com suas estratégiasgerenciais. O custo é um dos principais objetivos utilizadospor esse segmento para atingir vantagens competitivasrelacionadas à formação de preço para o mercado. Adistribuição dos custos na produção influencia diretamenteo preço final do produto e os custos incorridos comfuncionários, instalações, tecnologia e equipamentos. Oscustos com materiais, quando gerenciados com o objetivode redução, permitem às empresas diminuírem seus preçosde modo a ganhar com volumes mais altos e aumentarsua lucratividade (Slack et al., 2002). De acordo comBarros Neto et al. (2002), na construção, o custo é de

grande importância na tomada de decisão do cliente pelofato de o produto edificação ser de valor elevado. Aprodução, na construção civil, tem por objetivo principala redução dos custos, que assume papel fundamental nacompetição pelo menor preço.

Para empresas que procuram um diferencial demercado, o desempenho na entrega é considerado umcritério competitivo primordial. Em alguns casos, osprodutos custam mais caro por vincularem esse critérioe serem pouco customizados, uma vez que o objetivo daprodução é entregar o produto especificado no tempoestabelecido (Wheelwright, 1984). Além disso, esse aspectoexige um planejamento da produção mais rigoroso esuscetível às mudanças. O desempenho na entrega podeser relacionado com o objetivo rapidez, proposto porSlack et al. (2002), que o descreve como o tempo queos consumidores precisam esperar para receber seusprodutos ou serviços. O principal benefício da rapidezde entrega dos bens e serviços para os consumidores(externos) é que ela enriquece a oferta, pois, quanto maisrápido o produto estiver disponível para o consumidor,maior a probabilidade de que ele venha a comprá-lo (Slacket al., 2002).

Na construção civil, a rapidez de produção édiretamente associada à rapidez de entrega do produto(desempenho na entrega), sendo o prazo uma variávelimportante no processo de escolha dos clientes. De acordocom Barros Neto et al. (2002), os empreendimentos levamum tempo considerável para serem construídos enquantoos clientes desembolsam recursos sem usufruir o bem.O desempenho na entrega é bastante valorizado porempreendimentos que precisam de retorno rápido deinvestimento, como, por exemplo, obras comerciais(hospitais, shopping centers, hotéis, etc.). Enquanto isso,em obras residenciais a velocidade de execução não étão valorizada, pois os clientes não disponibilizam montantesfinanceiros elevados para suportar a aceleração do ritmode produção (Barros Neto et al., 2002). Entretanto,atualmente, pode-se analisar que esse cenário vem semodificando em virtude da concessão de créditosimobiliários ao mercado da construção civil.

A entrega do produto no prazo estabelecido éassociada ao objetivo confiabilidade, definido por Slacket al. (2002) como a finalização de bens e serviços paraos consumidores no tempo prometido. A confiabilidadeinterna refere-se à entrega pontual de materiais pelosfornecedores, garantindo a confiabilidade operacionaldos processos e economizando tempo e dinheiro. Já aconfiabilidade externa é atribuída ao aspecto de prestaçãode serviço ao consumidor, que pode ser vinculada àqualidade do produto

A flexibilidade pode ser definida como a capacidadecom que determinado sistema produtivo responde àsmudanças circunstanciais internas e externas à empresa(Gerwin, 1993 apud Barros Neto et al., 2002). Na construção

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civil, a flexibilidade pode ser caracterizada pela facilidadede adaptar seus produtos às necessidades do nicho demercado vislumbrado.

De acordo com Wheelwright (1984), a flexibilidadepode ser dividida em dois segmentos: flexibilidade doproduto e flexibilidade de volume. Empresas que sebaseiam na flexibilidade do produto enfatizam suashabilidades para lidar com as dificuldades de variabilidadede pedidos e introdução de novos produtos no mercado.No tocante à flexibilidade de volume, as habilidadesda empresa são focadas na capacidade de aumentar oudiminuir a velocidade de produção rapidamente(Wheelwright, 1984).

A qualidade, outro aspecto do critério competitivo,está diretamente relacionada ao fornecimento de produtosque atendam às necessidades explícitas e implícitas deutilização requeridas pelo cliente (Barros Neto et al.,2002). Segundo Wheelwright (1984), as empresas podemprover produtos de alta qualidade produzindo produtossuperiores aos de mercado, como também oferecer umproduto cujas características e desempenho não estejamdisponíveis por outros produtos no mercado.

Segundo Barros Neto et al. (2002), o critériocompetitivo qualidade pode ser dividido em três dimensõescompetitivas: conformidade com os contratos, conformidadecom os projetos e conformidade com o processo construtivo,no entanto, o detalhamento dessas características fogeao escopo deste trabalho.

Por fim, dentre os aspectos do critério competitivo,tem-se a inovação, que está diretamente ligada a umaperspectiva de lançamento de novos produtos, ao usode equipamentos mais modernos e de processos construtivosinovadores que tragam maior racionalização para a obra(Barros Neto et al., 2002). Contudo, essa inovação estávinculada à necessidade de mão-de-obra preparada paraabsorver novos conhecimentos na utilização de novastecnologias. Diante disso, a inovação é um objetivo dedesempenho importante para o cenário atual de mudançase inovação do novo, do moderno e da customização deprodutos para atender a um público-alvo diferenciado.

Barros Neto et al. (2002) considera que, na construçãocivil, o critério competitivo relacionado à prestação deserviço no atendimento ao cliente destaca-se como umaestratégia de diferenciação entre as empresas, agregandoao setor nova categoria de objetivos de desempenho aser analisada: serviços.

Em resumo, os diversos objetivos competitivostêm sua importância na definição da estratégia das empresasem geral. Entretanto, a ênfase atribuída a cada critériocompetitivo é estabelecida de forma variada, determinandodiferentes níveis de prioridade para cada objetivocompetitivo selecionado, de acordo com a posição daempresa perante a concorrência e aos seus stakeholders,definindo, assim, diretrizes para a elaboração do plane-jamento e controle da produção.

O planejamento e o controle caracterizam aelaboração de planos compreendidos como construçãoformal do que se pretende fazer no futuro. O controlepode ser definido como um conjunto de atividades quevisam ajustar as atividades do plano, se necessário, paraque os objetivos sejam alcançados. O plano seria umconjunto de intenções para o que deveria ocorrer, e ocontrole um conjunto de ações para direcionar esse plano,ainda que sejam necessárias modificações (Slack et al.,2002).

Outra definição apresentada por Ballard & Howell(1996) caracteriza o planejamento pela produção de metasque sustentam o gerenciamento dos processos produtivos,enquanto o controle garante o cumprimento dessas metas,bem como avalia sua conformidade com o planejado,fornecendo, assim, informações para preparação de planosfuturos.

Além disso, Laufer & Tucker (1987) sustentamque o planejamento estabelece as metas e o caminhopara que estas sejam alcançadas, enquanto o controle éo processo que garante que esse curso seja mantido.Entretanto, Formoso et al. (1999) definem como umprocesso gerencial que envolve o estabelecimento deobjetivos e a determinação dos procedimentos necessáriospara atingi-los, sendo eficaz somente quando realizadoem conjunto com o controle. Neste trabalho foi adotadaa definição proposta por esses autores.

Tendo por referência os trabalhos de Laufer & Tucker(1987), Formoso et al. (1999) e Bernardes (2001), o processode planejamento da produção pode ser caracterizado pormeio de duas dimensões básicas: horizontal e vertical.A primeira dimensão define as etapas pelas quais o processode planejamento e controle é realizado, enquanto a segundarefere-se ao vínculo dessas etapas com os diferentes níveisgerenciais de uma organização.

Laufer & Tucker (1987) propõem um modelo parao processo de planejamento que subdivide a dimensãohorizontal em cinco etapas: preparação do processo deplanejamento; coleta de informações; preparação de planos;difusão das informações; e avaliação do processo deplanejamento.

O processo de planejamento inicia-se na preparaçãodos planos, gerando informações que são difundidas paraos segmentos da organização que delas necessitam. Apartir dessas informações são geradas ações que possibilitamo cumprimento das metas fixadas (Bernardes, 2001). Como auxílio da função controle, que deve ser efetuada emtempo real, orientando a realização de ações corretivasao longo do processo e assumindo uma postura pró-ativa,o conceito de controle expande-se para além da idéia deinspeção ou verificação, para efetivamente assumir a posturade correção das causas estruturais dos problemas decorrentesdo planejamento (Formoso et al., 1999). Com isso, oprocesso é alimentado por um ciclo de replanejamentoatuando na correção de possíveis desvios nas metas dos

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planos e suas causas, onde os planos são reformulados edifundidos.

Entretanto, uma característica marcante do setorda construção civil é a ineficácia das empresas construtorasem planejar a produção. Esse fato é constatado por Laufer& Tucker (1987), que apontam fatores como a separaçãoentre concepção e produção, a falta de domínio técnicopor parte da gerência de produção, a ausência de dadosreais sobre a produção e a ênfase na programação(cronogramas de Gantt) e no controle autoritário comoas principais causas.

A dimensão vertical é caracterizada pela divisão doplanejamento e controle da produção em três níveishierárquicos: estratégico, tático e operacional. SegundoFormoso et al. (1999), o nível estratégico refere-se à definiçãodos objetivos do empreendimento a partir do perfil docliente. Nessa fase, estabelecem-se algumas estratégiaspara atingir os objetivos do empreendimento, como a definiçãode prazos, fontes de financiamento, parcerias, etc.

O nível tático envolve principalmente a seleção eaquisição de recursos como tecnologia, materiais, mão-de-obra, dentre outros itens necessários para atingir osobjetivos do empreendimento, e determina como essesrecursos serão utilizados durante a obra (Formoso et al.,1999). No que se refere ao nível operacional, o detalhamentodas atividades a serem realizadas difere dos demais, sendomais minucioso, determinando o uso dos recursos e omomento de execução das atividades e etapas da obra.

A Figura 1 apresenta o modelo de processo de planejamentohierarquizado.

Segundo Bernardes (2001), uma maneira de vincularde forma hierarquizada as metas dos vários planos, adotadospara o planejamento da obra, é através da utilização daWork Breakdown Strusture (WBS), denominada, também,de acordo com Limmer (1997), “Estrutura Analítica deProjeto – EAP” (Bernardes, 2001).

Assumpção (1996) apud Bernardes (2001) defineque a WBS caracteriza a decomposição da obra emsubsistemas, estabelecendo hierarquias entre as atividadesque são decompostas. Pode-se assim estabelecer padrõespara determinadas tipologias de obras, definindo os serviçose atividades por meio de fluxogramas que estabeleceminter-relações entre as atividades.

Assim como os subsistemas das obras, os níveisde planejamento são dependentes entre si, diferindo apenasquanto ao nível de detalhamento exposto por cada um.Portanto, o planejamento de longo prazo (estratégico)tem por foco definir os ritmos e processos de produção,sempre vinculados ao orçamento do empreendimento,definindo o fluxo de caixa do projeto e compatibilizandoinformações com o estudo de viabilidade. A realizaçãodesse nível de planejamento está diretamente relacionadaà fase de planejamento estratégico do empreendimento,em que os objetivos de desempenho são determinadoscomo base fundamental para o desenvolvimento doplanejamento da produção.

Preparaçãodo processo

Avaliaçãodo processo

Nível 1

Nível 2

Nível 3

Difusão deinformações

Elaboraçãode plano

Coleta deinformações

Ação

Difusão deinformações

Elaboraçãode plano

Coleta deinformações

Ação

Difusão deinformações

Elaboraçãode plano

Coleta deinformações

Ação

Figura 1 Processo de planejamento e controle da produção hierarquizado. Fonte: Formoso et al. (1999).

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Os demais níveis de planejamento da produção,tático e operacional, servem de alicerce para o planejamentoestratégico (plano mestre), em que o primeiro vincula oplano mestre ao plano operacional, que por sua vez assumeo papel de orientar diretamente a execução da obra. Contudo,a realização dos planos apenas se concretiza por meiodo controle inserido em todos os níveis de planejamentopara garantir os objetivos estabelecidos pela empresa.

Sintetizando o exposto, pode-se afirmar que osobjetivos de desempenho definem o planejamentoestratégico da organização como um todo, e este, porsua vez, determina o planejamento estratégico da produção.

Assim, neste trabalho serão abordados os objetivosde desempenho estabelecidos por uma empresa construtorae sua relação com as definições do planejamento estratégicoda produção para atender aos objetivos previamenteestabelecidos, por meio de um estudo de caso realizadoem uma empresa que denominaremos de Empresa X eque será detalhado a seguir.

Estudo de CasoO presente estudo de caso foi realizado em uma

empresa construtora do Estado de São Paulo que atuana construção de habitações. A escolha da Empresa Xfoi motivada por esta se destacar como produtora dehabitações em série de forma parcialmente industrializadae possuir um nível de organização gerencial satisfatório,uma vez que atua no desenvolvimento de processos deplanejamento e controle da produção com um grau deconscientização para a melhoria dos processos por parteda alta gerência, além de seu interesse em implementarconceitos e técnicas de planejamento que possam reduziras incertezas com relação ao setor produtivo da empresa.

Decorrente de um cenário de crescimento da demandapor habitações e abertura de crédito imobiliário, a empresautiliza em seu processo construtivo o sistema de vedaçõesverticais de concreto armado moldadas in loco como umaalternativa de racionalização do processo construtivo,garantindo maior rapidez na execução de unidadeshabitacionais.

A Empresa X administra a construção de empreen-dimentos de habitações cujo público-alvo é a classe C,que compra o imóvel financiado e que precisa dele prontoo mais rápido possível para que possa usufruir do seuinvestimento. Sendo assim, a Empresa X tem por prioridadeatender às necessidades desse cliente que exige rapidezna entrega dos empreendimentos, sem deixar de lado aqualidade da construção.

Para tanto, a empresa adota um sistema de plane-jamento e controle da produção utilizando a ferramentaMicrosoft Excel para programar suas atividades por meioda elaboração de planilhas que detalham a sequênciadas atividades e estabelecem ciclos de tempo dos serviçosespecificados por medições feitas nas obras, consideradoscomo planejamento operacional.

As planilhas são alimentadas com informaçõesadvindas de medições diárias para determinar o andamentoda execução das atividades conforme planejado, tornandopossível o controle dos planos e o replanejamento, casonecessário, para não comprometer os prazos de entregapreviamente estabelecidos.

O processo de montagem das edificações comvedações verticais de concreto moldadas in loco podeser caracterizado como um processo de produção emmassa pela formação de uma linha de montagem de produtospadronizados para atender à necessidade de produçãoem larga escala. Além disso, tem se mostrado uma alternativainteressante para o planejamento e acompanhamento deobras habitacionais, decorrente da alta produtividade emrelação às construções convencionais.

O sistema apresenta uma sequência de montagemdos componentes e serviços bem definida que determinaetapas de execução subsequentes e dependentes entresi, ou seja, a construção é feita de forma sequenciada,em que a finalização de uma fase da construção éfundamental para o início da próxima.

Atualmente, para esse sistema construtivo estãodisponíveis no mercado quatro sistemas de fôrmas quediferem quanto à sua composição de materiais, sendoeles: sistema de fôrmas de madeira tradicional e racio-nalizado; sistema de fôrmas metálicas; sistema de fôrmasmistas; e sistema de fôrmas de plástico. O presente estudode caso descreve a construção de vedações utilizandofôrmas de plástico.

A escolha por esse tipo de processo deve sersubsidiada por um grande volume de produção que justifiqueo investimento na compra das fôrmas e no treinamentoda mão-de-obra especializada na montagem dos painéis.

A organização da sequência de atividades deconstrução das unidades habitacionais pode ser exem-plificada pela EAP apresentada a seguir para fundamentara estrutura de execução das atividades construtivas daempresa, conforme ilustrado na Figura 2.

O sistema de montagem da habitação é decorrentedo processo de produção adotado pela empresa, quetem a racionalização das atividades como característicaprincipal. A construção de empreendimentos utilizandoesse processo construtivo pode ser caracterizada pelaorganização do sistema produtivo que auxilia nogerenciamento da obra. No planejamento dos em-preendimentos que adotam esse sistema construtivo sãorealizados serviços preliminares como demolições,construção do canteiro de obra, terraplanagem e limpezado terreno para posteriormente iniciar a construção dasunidades habitacionais.

Sendo assim, mediante visita técnica à obra, foipossível observar e acompanhar a construção dehabitações e o processo de montagem dos componentesconstrutivos utilizando fôrmas de plástico na execuçãodas vedações.

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No processo utiliza-se fôrma dupla para execuçãodas vedações, cuja finalidade é estrutural, na conformaçãodesejada dos painéis de acordo com o projeto, com partedos sistemas elétrico e hidráulico, como tubulações, quadros,registros e caixas de passagem, já posicionada no localde utilização no interior da fôrma (Figuras 3 e 4).

Após a montagem das fôrmas é realizada a concre-tagem, com concreto autoadensável, com tempo de curade 12 horas (Figura 5). O concreto autoadensável agilizao processo de concretagem, por dispensar o adensamento,e garante boa qualidade de acabamento superficial,eliminando a etapa de revestimento em argamassa dasvedações verticais. Após o tempo de cura do concreto, opróximo passo é a retirada das fôrmas, conforme ilustradona Figura 6.

Com a retirada das fôrmas, as vedações verticaisda habitação estão concluídas, com parte das instalaçõeselétricas e hidráulicas já embutida e pronta para recebero acabamento desejado e especificado em projeto. A estruturade cobertura metálica é inserida na edificação e toda amontagem das peças é feita rapidamente no local da obrapor equipes responsabilizadas pelo serviço.

As etapas seguintes são pintura interna com látex,pintura externa com textura acrílica, forro de gesso, pisoe revestimento cerâmico e esquadrias de alumínio, conformeilustrado nas Figuras 7 a 10.

ResultadosCom o intuito de atender às necessidades do mercado,

empresas construtoras buscam alternativas tecnológicaspara suprir a necessidade de produção em larga escala ea implantação de sistemas racionalizados no desenvol-vimento de projetos para a produção de edificações. A

utilização do sistema de vedações verticais de concretoarmado moldadas in loco confere uma alternativa difundidacomo uma estratégia competitiva no setor da construçãode habitações no Brasil.

A determinação do processo produtivo a ser utilizadopor uma empresa ou para um empreendimento específicodeve considerar aspectos individuais das organizações,como também identificar as necessidades de recursos,mão-de-obra e investimentos para a implantação de novasformas de produzir, além de definir que tipo de abordagemcompetitiva a empresa pretende adotar para inserir o produtono mercado.

Portanto, para organizar a execução das atividadesde produção da Empresa X configura-se um processode planejamento e controle da produção baseado nasnecessidades determinadas pela empresa no lançamentode empreendimentos, estabelecidas, assim, pelo plane-jamento estratégico da empresa que tem por base os objetivosde desempenho.

O planejamento estratégico é desenvolvido pelaalta gerência e apresenta baixo grau de detalhes com ointuito de identificar os objetivos principais do empreen-dimento. De acordo com o estudo de caso apresentadoesses objetivos são o custo, o desempenho na entregae a inovação. O custo prioriza o investimento em tecnologiasque possibilitem produção em larga escala e, conse-quentemente, o baixo custo do produto, tornando-o acessívelao público-alvo do empreendimento. O desempenho naentrega dita um diferencial de mercado, permitindo maiorcompetitividade no setor, já o uso de processos racio-nalizados e a inserção de novas tecnologias e materiaispossibilitam melhorias na produção das unidadeshabitacionais.

Figura 2 Sequência de atividades executadas na construção de 1(uma) unidade habitacional.Fonte: Elaborada a partir de dados da Empresa X, 2008.

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Figura 3 Detalhe das instalações hidráulicas e elétricas antes da colocação das fôrmas.

Figura 4 Fechamento da fôrma e apoio por escoramento.

Figura 5 Preparação para concretagem.

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Figura 6 Retirada das fôrmas.

Figura 7 Vedações finalizadas prontas para receber esquadrias e acabamentos.

Figura 8 Vista interna da cobertura metálica.

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Diante do prazo estipulado pelo planejamentoestratégico para a obra, outros níveis de planejamentosão elaborados na tentativa de detalhar mais criteriosamenteos planos de execução das atividades através da utilizaçãode softwares computacionais com informações provenientesdo canteiro de obras como também de obras anteriores.

O planejamento de médio prazo é realizado peloescritório da obra para atender aos prazos estabelecidospelo plano mestre (planejamento estratégico), com aelaboração das planilhas de serviços realizados e a realizar,enquanto o planejamento de curto prazo fornece aos operáriosinformações sobre os serviços a serem executados e osprazos de finalização de cada serviço para que a obra transcorrano prazo determinado pelo plano estratégico e para que oempreendimento seja entregue no prazo estabelecido.

Dentro do contexto abordado na revisão bibliográficarealizada neste trabalho, serão apresentados os aspectos

relacionados aos objetivos competitivos estabelecidospela empresa e as tomadas de decisões referentes aoplanejamento e ao controle da produção, conforme ilustradona Tabela 1, em que os objetivos competitivos priorizadospela Empresa X estão evidenciados em negrito.

Considerações FinaisEm virtude das peculiaridades do setor da construção

de edifícios, considerando a diversidade de componentese atividades relacionadas à produção de empreendimentosimobiliários e a dificuldade de implementação de processoseficazes de planejamento e controle da produção, procurou-se neste trabalho caracterizar a atividade de planejamentorealizada por uma empresa construtora e demonstrar queos objetivos de desempenho estão inseridos na organizaçãodos planos da empresa, mesmo que não explícitosformalmente.

Figura 9 Colocação das esquadrias de alumínio.

Figura 10 Habitação concluída.

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Diante do exposto, foi possível considerar que osprocedimentos e tomadas de decisão decorrentes dosobjetivos competitivos adotados pela gerência doempreendimento interferem na definição das estratégiasde produção do produto. Sendo assim, pode-se relacionaros objetivos competitivos com as tomadas de decisõesgerenciais referentes ao planejamento e controle da produçãono tocante à escolha de processos construtivos, uso demateriais, tecnologias e mão-de-obra adotada pelas empresasde construção. Entretanto, identificar a forma de organizaçãodas informações decorrentes desse estudo de caso demonstraque a realidade do mercado da construção civil exploraa busca por novos modos de gerenciar empreendimentoscomo um fator essencial à permanência das empresas

no mercado, estando, porém, muito aquém dos demaissetores industriais.

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Tabela 1 Os objetivos competitivos e as decisões estratégicas de produção.

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