O plágio por quem entende do assunto

4
DÁ CADEIA O plágio aos olhos da lei: pena de três meses a um ano de prisão ou pagamento de multa 1 | 23 DE NOVEMBRO, 2015 | veja Especial BEATRIZ OLIVEIRA

Transcript of O plágio por quem entende do assunto

Page 1: O plágio por quem entende do assunto

DÁ CADEIAO plágio aos olhos da

lei: pena de três meses a um ano de prisão ou

pagamento de multa

1 | 23 DE NOVEMBRO, 2015 | veja

Especial

BEA

TRIZ

OLI

VEI

RA

Page 2: O plágio por quem entende do assunto

O PLÁGIO POR QUEM ENTENDE DO ASSUNTOA recente polêmica em que esteve envolvida a Renner, uma das maiores redes varejistas de moda do país, traz à tona o plágio, crime que, além de recorrente, está, de forma equivocada, associado à falta de punição.

A cultura de que, no Brasil, tudo acaba em pizza poderia ter ga-nhado mais um capí-

tulo neste mês de novembro, não fosse a sensatez – embora tardia – da Renner, décima sex-ta maior rede de varejo do país: acusada de estampar em peças de roupa um desenho da publi-citária e ilustradora Júlia Lima, a marca anunciou, na terça-fei-ra (16), que retirou de linha os produtos com a estampa. Po-lêmica parecida viveu a C&A, que, em outubro, recolheu das prateleiras uma camisa estam-pada com o desenho do desig-

ner gráfico Phellipe Wanderley.Apesar de comuns, esses são

apenas dois casos de um crime que se repete cada vez mais Brasil afora. E, se no mercado varejista o crime é frequente, em outros âmbitos, como nos meios musical e acadêmico, ele é ainda maior: não raro, a mídia se vê noticiando casos de plágio entre cantores, rotei-ristas de TV e cinema, além de escritores e estudantes.

Equivocada, a crença de que não vai haver punição, aliada à falta de esforço e à comodida-de, é uma das principais razões que tornam o plágio tão difun-dido. Na opinião do advogado e professor de Direito Proces-

sual Penal Lucas Carapiá, é preciso ter cautela para não cair no plágio por descuido, já que há casos em que o contato frequente com ideias ou obras de outros autores pode dar, de maneira inconsciente, a falsa impressão de que o conteúdo é original – quando, na verdade, já existe. Episódios assim são comuns, por exemplo, no meio musical, como aconteceu com o cantor Rod Stewart na déca-da de 1970. (vide box da pági-na quatro).

Embora seja difícil distin-guir o que é original do que é reprodução, o advogado afirma que a melhor saída é sempre pesquisar, buscando saber se a

MARCUS VINÍCIUS ANJOS

BEA

TRIZ

OLI

VEI

RA

veja | 23 DE NOVEMBRO, 2015 | 2

PLAGIAR, NEM PENSARO advogado Lucas Carapiá fala sobre violação dos direitos do autor

Page 3: O plágio por quem entende do assunto

ideia já pertence a outra pessoa. “Dê sua contribuição, mas sempre fazen-do a referência”, afirma Carapiá. “Isso já faz com que você crie um arcabouço de cui-dado pra que aquela inspiração não seja algo que possa ser interpretado equivocadamente como plágio”, completa.

Comum nas universidades, o crime parece não ser temido pelos estudantes, que não se intimidam com a possibilida-de de responder judicialmente pelo plágio. “A nossa legisla-ção [...] diz que, de maneira ampla, violar direito do autor é considerado crime”, explica o advogado. Na Bahia, os crimes contra a propriedade intelectu-al, incluindo o plágio, são in-vestigados por uma divisão da Polícia Civil. A pena varia de três meses a um ano de prisão ou o pagamento de multa, se-gundo a Lei 9.610/1998.

Apesar de raros, os casos de prisão por plágio existem. Em março de 2011, um enge-nheiro, ex-funcionário de uma fabricante de elevadores, foi condenado a dois anos de pri-são porque, depois de criar um curso de manutenção de eleva-dores, resolveu usar nas aulas as apostilas da empresa em que havia trabalhado.

Foi também em 2011 que,

graças à divulgação massiva da mídia, a discussão sobre o plágio nas universidades au-mentou. Um dos episódios, o de maior repercussão, envol-veu o então professor da USP Andreimar Soares: com mais de quinze anos de profissão, o docente foi demitido depois de ficar comprovado que as ima-gens da pesquisa liderada por ele haviam sido copiadas de um trabalho anterior, de auto-ria da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Emblemático, o caso de An-dreimar é raro por dois moti-vos: primeiro por envolver um professor – condição que, pelo menos em tese, torna o plágio inconcebível; e segundo porque o acusado trabalhava na instituição de ensino su-perior mais tradicional e prestigiada do país.

O que não se pode chamar de raro, toda-via, são as cópias de trabalhos feitas pelos alunos. Velhas conheci-das de qualquer um que

PLÁGIO ACADÊMICOComum nas universidades, o plágio entre estudantes passou a ser motivo de preocupação em 2011, quando vários casos foram parar na mídia.

Especial

já tenha frequentado uma sala de aula, as cópias agora estão com os dias contados. Pelo menos, é o que prometem tec-nologias como as anunciadas por duas universidades brasi-leiras, a Universidade Federal Fluminense (UFF) e a Escola Superior de Propaganda e Ma-rketing (ESPM): a novidade da vez são softwares capazes de flagrar, nos trabalhos dos estu-dantes, trechos copiados de ou-tras obras. De modo semelhan-te – mas acessível a qualquer pessoa com acesso à internet –, o Farejador de Plágio também é capaz de apontar cópias, in-tegrais ou não, existentes em textos. “A utilização da tecno-logia no âmbito de investiga-

BEA

TRIZ

OLI

VEI

RA

3 | 23 DE NOVEMBRO, 2015 | veja

BEA

TRIZ

OLI

VEI

RA

Page 4: O plágio por quem entende do assunto

Casos de plágio no Brasil e seus desfechosJoice Hasselman: Um dos casos de plágio mais reper-curtidos recentemente foi o da jornalista Joice Hassel-man, acusada de plagiar 65 reportagens de 42 profissio-nais em menos de um mês. O Conselho de Ética do Pa-raná comprovou o plágio, banindo Joice do sindicato estadual dos jornalistas. Rod Stewart: Em 1978, Rod Stewart lançou a músi-ca “Do Ya Think I’m Sexy” que, na época, se tornou uma das músicas mais ou-vidas. No entanto, foi acu-sado de ter copiado o refrão da música “Taj Mahal”, de Jorge Ben Jor, lançada seis anos antes. Eles resolveram o caso extrajudicial-mente. Mais tarde, Rod disse que come-teu um plágio incons-ciente.

Andreimar Soares: Ex-professor da USP, foi o lí-der de uma pesquisa que, em 2011, copiou imagens de um trabalho da UFRJ sem creditá-las. O docente alegou que uma ex-aluna havia trocado as figuras. A reitoria da USP exonerou o professor, que tinha dedica-ção exclusiva.

SBT: Depois de anos en-frentando um processo da Rede Globo – que acusou a emissora de plagiar o for-mato do Big Brother Brasil em um de seus programas –, o SBT foi condenado a indenizar a concorrente em R$ 18 milhões.

ção [...] tem sido a melhor sa-ída”, diz Carapiá em relação às novas ferramentas de combate ao plágio. O advogado lembra que há, no Brasil, um acordo com o CODIS (Sistema Com-binado de Índices de DNA, em tradução livre), banco de dados do FBI que armazena o perfil genético de pessoas com ante-cedentes criminais. Na opinião dele, uma tecnologia como essa poderia ser, a grosso modo, usada para driblar o plágio. “Se o sistema acusar que existe um confronto, um conflito, isso é o primeiro passo para uma inves-tigação”, afirma.

Para quem não quer sofrer com as implicações penais de um crime como este, vale a pena seguir à risca os conselhos do advogado, que cita o episó-dio envolvendo Annette Scha-van, ex-ministra da Educação da Alemanha – acusada de plá-gio em um trabalho de doutora-do e que, anos mais tarde, já à frente do Ministério, perdeu o diploma e se viu obrigada a re-nunciar. “Se a gente, hoje, en-quanto estudante [...], não tiver uma preocupação com a nossa formação adequada, isso pode nos afetar muito gravemente amanhã.”

veja | 23 DE NOVEMBRO, 2015 | 4

COM DIAGRAMAÇÃO DE BEATRIZ OLIVEIRA E MARCUS VINÍCIUS ANJOS

BEA

TRIZ

OLI

VEI

RA