O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito...

21
Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 1 1 O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do Empreendedor e da Administração perante o Consumidor Maria Bernadete Miranda Mestre em Direito das Relações Sociais, sub-área Direito Empresarial, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Coordenadora e Professora do Curso de Pós- Graduação da Faculdade de Direito de Itu e Professora de Direito Empresarial, Direito do Consumidor e Mediação e Arbitragem da Faculdade de Administração e Ciências Contábeis de São Roque. Advogada. Resumo: O presente estudo tem por objetivo elaborar uma pesquisa sobre os Shopping Centers, abordando as pessoas que deles participam, sua forma contratual e jurídica e a responsabilidade do empreendedor e dos administradores perante o consumidor. Os Shopping Centers são centros empresariais que obedecem a um planejamento prévio e a uma administração única e centralizada. São compostos de lojas que exercem a atividade econômica em ramos diversificados, onde os locatários estão sujeitos a normas contratuais padronizadas. Palavras-chave: Shopping Center, Centro Empresarial, Empreendedor, Administrador, Lojista, Responsabilidade. 1. Introdução O presente trabalho tem como finalidade expor o perfil dos shopping centers sob a ótica jurídica e a responsabilidade do empreendedor e da administração perante o consumidor que freqüenta o centro empresarial. Após apresentarmos uma breve noção, inclusive histórica, a respeito desses centros empresariais, passaremos a um estudo mais objetivo de suas estruturas formal e jurídica. A pesquisa realizada abrange as pessoas que dele participam notadamente o empreendedor, o lojista, o administrador e também a associação que congrega os shopping centers brasileiros. Os shopping centers são compostos por um grupo de lojas que obedecem, a um planejamento prévio e são unificadas não só pela

Transcript of O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito...

Page 1: O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 4 4 etc, que integravam em um só estabelecimento

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009

1

1

O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do Empreendedor e da

Administração perante o Consumidor

Maria Bernadete Miranda

Mestre em Direito das Relações Sociais, sub-área Direito Empresarial, pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Coordenadora e Professora do Curso de Pós-Graduação da Faculdade de Direito de Itu e Professora de Direito Empresarial, Direito do Consumidor e Mediação e Arbitragem da Faculdade de Administração e Ciências Contábeis de São Roque. Advogada.

Resumo: O presente estudo tem por objetivo elaborar uma pesquisa

sobre os Shopping Centers, abordando as pessoas que deles participam,

sua forma contratual e jurídica e a responsabilidade do empreendedor e

dos administradores perante o consumidor.

Os Shopping Centers são centros empresariais que obedecem a um

planejamento prévio e a uma administração única e centralizada. São

compostos de lojas que exercem a atividade econômica em ramos

diversificados, onde os locatários estão sujeitos a normas contratuais

padronizadas.

Palavras-chave: Shopping Center, Centro Empresarial,

Empreendedor, Administrador, Lojista, Responsabilidade.

1. Introdução

O presente trabalho tem como finalidade expor o perfil dos shopping

centers sob a ótica jurídica e a responsabilidade do empreendedor e da

administração perante o consumidor que freqüenta o centro empresarial.

Após apresentarmos uma breve noção, inclusive histórica, a respeito

desses centros empresariais, passaremos a um estudo mais objetivo de

suas estruturas formal e jurídica.

A pesquisa realizada abrange as pessoas que dele participam

notadamente o empreendedor, o lojista, o administrador e também a

associação que congrega os shopping centers brasileiros.

Os shopping centers são compostos por um grupo de lojas que

obedecem, a um planejamento prévio e são unificadas não só pela

Page 2: O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 4 4 etc, que integravam em um só estabelecimento

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009

2

2

arquitetura mas também por uma administração única, sujeita a normas

contratuais padronizadas. As lojas obedecem a uma distribuição no

estabelecimento global, de acordo não só com o seu tamanho e tipo, mas

também com a exploração de ramos diversificados.

A estrutura procura oferecer aos consumidores facilidades

suficientes para que eles freqüentem o shopping centers. Há vantagens,

principalmente com relação a estacionamento, horário de funcionamento e

segurança, além da reunião em um mesmo espaço de uma pluralidade de

opções comerciais, tudo aliado a um ambiente normalmente agradável.

Porém não são somente as vantagens apontadas que explicam o

sucesso do shopping center, mas também, e principalmente, sua estrutura

negocial. O empreendedor escolhe os lojistas que dele participarão e cria

uma estrutura especial para a administração deste, que poderá ser feita

pelo próprio empreendedor ou por um administrador contratado.

O empreendedor é o empresário, que estabelece as premissas

básicas do shopping center e que as dominará e manterá durante sua

existência.

É aquele que desenvolve a idéia de criação do shopping center,

incluindo o estudo de localização deste, e escolhe os lojistas que dele

participarão. Será o empreendedor que irá definir a forma organizacional

do shopping center, visando manter um nível satisfatório de resultados

econômicos.

O administrador é aquele que pode vir a ser contratado pelo

empreendedor para a conservação e administração da totalidade ou de

parte do shopping center.

Trata-se de figura de extrema importância, pois o sucesso de um

shopping center está amparado também na conservação de seus múltiplos

aspectos, ou seja, de limpeza, vigilância ou atendimento de clientela.

O empresário que participa da estrutura de um shopping center,

denominado de lojista, é aquele que terá contato direto com os

consumidores, mas que, a despeito de manter suas características

próprias, estará sujeito a regulamentos tendentes a uniformizar as práticas

do shopping center do qual participa. É esta característica que faz do

lojista de shopping center uma figura totalmente diferenciada do lojista de

Page 3: O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 4 4 etc, que integravam em um só estabelecimento

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009

3

3

rua. O lojista de shopping center deverá conviver com determinados

preceitos da estrutura desses centros, visando a que a estrutura do

shopping center, que foi minuciosamente planejada, não seja maculada.

O consumidor é toda pessoa física ou jurídica que numa relação de

consumo, adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final, ou

seja, para satisfazer suas próprias necessidades.

O consumidor é aquele que freqüenta habitualmente o shopping

center com o objetivo de adquirir produtos ou serviços oferecidos pelo

centro comercial.

Normalmente o empreendedor de shopping center contrata uma

administradora para administrar todo o empreendimento.

Esta administradora é responsável além de outros encargos pela

segurança interna e pelo estacionamento do shopping center.

No que tange a segurança interna, o lojista no contrato de shopping

center se compromete a pagar as despesas de condomínio para a

administradora que irá prestar serviços referentes, a toda administração,

cuidando ainda da limpeza e se responsabilizando pela segurança não só

do lojista, mas também dos consumidores que freqüentam o shopping.

2. Histórico do Shopping Center

No passado só existiam as chamadas “lojas de rua”, e o empresário

tinha como maior preocupação para o crescimento de sua empresa a sua

vizinhança. Tal preocupação facilitou a criação de comunidades de

empresários em áreas específicas, por exemplo, em São Paulo, onde se

tornou comum em algumas ruas o comércio específico de móveis, tecidos,

confecções etc.

Mais tarde, por criação das administrações municipais, surgiram os

chamados mercados municipais, que reuniam o comércio alimentício e o

de utilidades domésticas.

Com o tempo foi se desenvolvendo uma modalidade de comércio

mais sofisticado, com o aparecimento das galerias, ou centros de compra

elitizados, reunindo em um mesmo local, lojas de comércio de vestuário e

prestação de serviços, tais como cabeleireiros, agências etc. Logo após

surgiram também as lojas de departamento, como Mappin, Mesbla, Sears

Page 4: O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 4 4 etc, que integravam em um só estabelecimento

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009

4

4

etc, que integravam em um só estabelecimento os mais diversos objetos

de comércio, da perfumaria até cama e mesa, do vestuário aos móveis,

etc.

Nas galerias encontramos uma aglomeração de lojas em um mesmo

espaço, onde os lojistas são responsáveis por suas lojas, como se fossem

isoladas. Já nas lojas de departamento existe um grau de organização

interno acentuado, e, com muita publicidade, onde o sucesso depende

única e exclusivamente do proprietário.

Porém, os modelos acima mencionados foram ultrapassados por

uma estrutura inovadora, que será demonstrada adiante e que tem por

base diversos fatores para o sucesso empresarial, que é o chamado

shopping center.

Conforme tradução literal da língua inglesa, shopping center significa

“centro de compra” e reúne características especiais.

Os shopping centers surgiram nos Estados Unidos da América, após

a Segunda Guerra Mundial, e desenvolveram-se em três diferentes

categorias, segundo suas finalidades:

a) Shopping Center de Vizinhança - visava principalmente à venda

de bens e serviços pessoais, para as necessidades corriqueiras da

vizinhança, tais como: comida, remédio, lavanderia, banco, cabeleireiro,

restaurantes, e, em segundo plano, vestuário e outros artigos;

b) Shopping Center de Comunidade - maior em área, vendendo,

além das mercadorias acima mencionadas, uma maior diversidade de

produtos, introduzindo áreas de lazer e os pequenos restaurantes de

comida ligeira e rápida (fast-food);

c) Shopping Center Regional - encerra lojas de mercadorias diversas

e tem como sustentáculo as lojas e os departamentos completos, que

constituem no seu conjunto, a variedade de comércio que o comprador

encontra espalhada nos centros da cidade, mas com as facilidades que o

shopping center oferece.

No Brasil, os shopping centers vêm se desenvolvendo nas principais

cidades desde a década de 60. Eles surgiram da reunião de diversos

fatores que incrementaram as atrações e as formas de atividades

comerciais, com um resultado que vem cada vez mais se consolidando.

Page 5: O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 4 4 etc, que integravam em um só estabelecimento

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009

5

5

Em nosso país, os fatores que concorreram para a criação desse

novo organismo empresarial foram: a) a descentralização para a periferia,

em conseqüência do aumento e concentração da população nas áreas

urbanas; b) o desafogamento do trânsito em virtude dessa

descentralização; c) a facilidade de estacionamento de automóveis, pois os

shopping centers, obrigatoriamente, deverão ter, estacionamentos (deck

parking); d) a segurança que oferece contra a onda de violência existente,

pois, sem dúvida, é muito mais difícil um assalto em um shopping center do

que em um estabelecimento empresarial isolado ou mesmo em um

magazine.

No Brasil temos somente os shopping centers regionais, onde

encontramos além da venda de bens e serviços pessoais, áreas de lazer e

restaurantes. Esses proporcionam ainda aos seus clientes estacionamento

de automóveis.

Um shopping center somente irá se estabelecer definitivamente após

um planejamento mercadológico prévio, ou seja, uma fase preparatória que

antecipa as fases de construção e comercialização. Esse planejamento

inclui a escolha do terreno, a viabilidade econômica e financeira, arquiteto,

paisagista, construtor, e, finalmente, os primeiros contatos com os futuros

usuários das lojas.

3. Conceito e Classificação do Contrato de Shopping Center

A instituição de shopping centers representou verdadeira revolução

no comércio varejista, modificando os métodos de atuação empresarial, de

captação e de conversão de clientela, bem como a realização de

resultados em investimento imobiliário.

Para a Associação Brasileira de Shopping Centers - ABRASCE

“Shopping Center é um centro empresarial planejado, sob administração

única e centralizada, composto de lojas destinadas à exploração de ramos

diversificados de comércio, e que permaneçam, na sua maior parte, objeto

de locação, ficando os locatários sujeitos a normas contratuais

padronizadas que visam à conservação do equilíbrio da oferta e da

funcionalidade, para assegurar, como objetivo básico, a convivência

integrada e que varie o preço da locação, ao menos em parte, de acordo

Page 6: O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 4 4 etc, que integravam em um só estabelecimento

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009

6

6

com o faturamento dos locatários - centro que ofereça aos usuários

estacionamento permanente e tecnicamente bastante”.

Simplificando e dividindo em tópicos, diremos que a ABRASCE

define shopping center como um centro empresarial, planejado, sob

administração única e centralizada, e que: a) seja composto de lojas

destinadas à exploração de ramos diversificados de comércio e prestação

de serviços, e que permaneçam em sua maior parte, objeto de locação; b)

que os locatários estejam sujeitos a normas contratuais padronizadas,

visando à manutenção do equilíbrio de oferta e da funcionalidade, para

assegurar, como objetivo básico, a convivência integrada; c) varie o preço

da locação, ao menos em parte, de acordo com o faturamento permanente.

Para o ICSC - International Council of Shopping Center, o “shopping

center seria um grupo de estabelecimentos empresariais unificados

arquitetonicamente e construído em terreno planejado e desenvolvido, que

deverá ser administrado como uma unidade operacional, sendo o tamanho

e tipo de lojas existentes relacionados diretamente com a área de

influência empresarial a que essa unidade serve. Deverá também oferecer

estacionamento compatível com todas as lojas existentes no projeto”.

Analisando as definições acima, diremos que shopping center trata-

se de um grupo de lojas que deverá obedecer a um planejamento prévio e

serão unificadas não só pela arquitetura, mas também, por uma

administração única, sujeita, a normas contratuais padronizadas. As lojas

deverão também ter uma distribuição no estabelecimento global, de acordo

não só com o tamanho e tipo, mas também com a exploração de ramos

diversificados.

4. Aspectos Jurídicos do Shopping Center

O shopping center esconde uma estrutura fértil à formação de

peculiares relações jurídicas, tais como: a natureza da ocupação, pelas

circunstâncias de sua fixação, a base de ajuste e atualização do preço

mensal do uso dos compartimentos, além das inúmeras e inusitadas

normas complementares para a utilização dos espaços e funcionamento do

conjunto.

Page 7: O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 4 4 etc, que integravam em um só estabelecimento

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009

7

7

No Brasil, os empresários que ocupam unidades em shopping

centers não são, em geral, proprietários dos espaços, mas sim locatários

das lojas, de titularidade do organizador de cada centro empresarial.

Embora lançadas, sob a aparente forma de venda pelo regime da

incorporação imobiliária, até mesmo com financiamento disponível, a

propriedade dos espaços não costuma ser atribuída aos interessados.

Poucos shoppings, no país, divergem desse modelo. O Shopping Center

Lapa e o Shooping Center Iguatemi, ambos em São Paulo, e o Shopping

Center La Plage, na cidade de Guarujá, são exceções aos modelos

vigentes, pois foram lançados sob a forma de venda pelo regime de

incorporação imobiliária, transformados em cotas ideais e cada fração tem

um voto nas deliberações, conforme estipulado em convenção de

condomínio.

O interessado em ingressar em um shopping center deve analisar as

condições que lhe estão sendo impostas, pois o seu ingresso no

empreendimento irá submetê-lo a um contrato atípico de locação, em que o

único direito que lhe é assegurado é o de locar e pagar.

O shopping center surgiu para criar um direito novo, ou um espaço, a

ser preenchido por um complexo novo e especial de normas jurídicas e,

sem dúvida, no campo jurídico é que as divergências são maiores,

principalmente quando procuram classificar o tipo de contrato que rege o

centro empresarial.

Não há ainda no Brasil, lei que regule esse centro empresarial,

devido às divergências de opiniões entre os doutrinadores e as

jurisprudências de nossos Tribunais.

O ponto forte dessas divergências é justamente a caracterização do

tipo de contrato celebrado entre os investidores do centro empresarial, os

usuários das lojas e a administradora.

O universo legal que compreenderá o empreendimento, constituir-se-

á, de três documentos autônomos, cujos conteúdos irão impor obrigações

distintas aos lojistas, são eles: a) o contrato de locação, que definirá as

relações entre o empreendedor e o locatário, no tocante ao espaço locado,

definindo em especial a remuneração ou aluguel a ser pago ao proprietário

ou proprietários do espaço locado; b) a escritura declaratória de normas

Page 8: O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 4 4 etc, que integravam em um só estabelecimento

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009

8

8

complementares ao contrato de locação, ou, a convenção condominial

acompanhada do regimento interno, como o próprio nome diz, é um

complemento ao contrato de locação a ser firmado também pelo

empreendedor e lojista na qual estarão definidas as regras das atividades

a serem exercidas dentro do empreendimento e; c) o estatuto da

associação dos lojistas, que é um elo entre os lojistas de um mesmo

empreendimento como um todo, que administrará o fundo promocional,

arrecadado para esse fim e ainda fará defesa, de forma demérita aos

interesses dos lojistas.

5. Finalidade do Shopping Center

Há uma relação contratual entre o proprietário ou empreendedor do

shopping center e os lojistas. Essa relação permitirá que entre o

empreendedor do imóvel e o lojista haja uma participação nos lucros e um

planejamento para a exploração e análise do mecanismo no mercado.

O proprietário do shopping center sempre terá interesse no êxito das

lojas, pois participará de seu faturamento, permitindo então uma

competição equilibrada entre os lojistas. A finalidade do empreendedor não

será certamente a locação das lojas, mas a relação direta entre a

rentabilidade do empreendimento e a das atividades empresariais

exercidas no prédio. Para tanto, o proprietário do shopping center

escolherá produtos e serviços, selecionará os lojistas fazendo dos grandes

magazines ou lojas de departamentos (lojas âncoras) o ponto de atração

do público que impelirá clientela às lojas satélites, promovendo campanhas

publicitárias e criando condições bastante favoráveis à exploração do

comércio pelos lojistas.

Os grandes departamentos que constituem as “lojas âncoras”

procurarão favorecer as lojas menores, designadas de “satélites”, que

usufruirão, dos benefícios de seu aviamento e dos excessos de sua

expansão. Assim enquanto as lojas-âncoras trazem para o shopping a

clientela que constituíram, as lojas satélites passarão a atrair para si tal

clientela. Com isso todas auferirão lucros e vantagens. Portanto, os

locatários deverão se beneficiar de uma série de serviços prestados pela

entidade empreendedora do shopping, que os protegerá contra excessiva

Page 9: O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 4 4 etc, que integravam em um só estabelecimento

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009

9

9

concorrência, por haver no centro empresarial limitação de números de

estabelecimentos de um determinado ramo negocial; daí a logicidade da

participação do empresário-proprietário do shopping nos lucros obtidos

pelas lojas. Até mesmo o planejamento, feito pelo empreendedor, das

áreas de uso comum, como sistema de condicionamento de ar, condutores

de águas pluviais, calçadas, áreas de circulação interna para o público,

áreas de serviço, escritório de administração, sanitários públicos, saídas

usuais de emergência, e estacionamento externo, será elaborado tendo em

vista melhorar o atendimento e suprir as necessidades operacionais do

shopping.

A grande finalidade das partes que participam no contrato de

shopping não será, portanto, a cessão e uso de uma unidade em troca de

uma remuneração pecuniária, mas sim, a de tirar proveito da organização

do empreendimento, participando dos lucros obtidos por cada loja. Assim

concede-se o uso ao lojista para que esse pratique sua atividade

econômica distribuindo o lucro com seu sucesso empresarial, pagando

percentual correspondente ao faturamento bruto.

O shopping center, ao estabelecer uma relação direta entre sua

rentabilidade e a de suas atividades que ali se desenvolvem, criará

condições para a otimização do marketing.

O consumidor, por sua vez, também aufere vantagens desse centro

empresarial, pois, além da facilidade de estacionamento e tempo, irá

encontrar, em um único lugar os mais variados ramos de atividades, tendo

opção de escolha, o que lhe permite a verificação de preços de uma loja

para outra, podendo ainda utilizar as áreas de lazer como cinemas,

restaurantes, divertimentos infantis, num clima de segurança.

6. Desenvolvimento Social dos Shopping Centers

Analisaremos a seguir nove aspectos sociais apresentados pelos

shopping centers, que muito contribuíram para o seu desenvolvimento. São

eles:

1. O prazer da compra - O momento da compra é efetivamente um

momento de prazer. É um momento em que realizamos um desejo, uma

necessidade.

Page 10: O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 4 4 etc, que integravam em um só estabelecimento

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009

10

10

Os tradicionais centros de compras das cidades com suas ruas

congestionadas, com poluição, física, química, sonora e visual, com

problemas de tráfico e mesmo de segurança, deixaram de oferecer a

atmosfera, a moldura adequada para o ato da compra.

O shopping center restabeleceu a dignidade do ambiente de compra

que não pode ser reduzida a uma mera transação material. Tornar mais

rico e bonito o momento da compra é certamente uma contribuição para

melhor qualidade de vida.

2. Importância do shopping center para a família - Esse aspecto de

contribuição para unir a família, fazendo compras em conjunto é sem

dúvida o aspecto mais simpático trazido por esse novo e moderno centro

empresarial.

3. A segurança do consumidor e das lojas contra assaltos -

Certamente em razão do fator segurança, os lojistas de shopping centers

não se mostram receosos de manter (obrigatoriamente), em

funcionamento, seus estabelecimentos em horários noturnos. Por sinal,

esse horário excepcional é ditado pelo regime jurídico próprio, previsto em

seus regimentos estatutários, chamados de “normas gerais”, que integram

os contratos de locação. As normas gerais são, geralmente,

consubstanciadas em escritura pública, até para demonstrar que se trata

de regras permanentes e inalteráveis, a justificar a adesão por parte dos

lojistas, que a elas se submetem como complemento das condições

pactuadas no contrato principal (de locação).

Esse aspecto faz aflorar condição especialíssima de uso, a qual não

é seguida pelas locações de lojas de rua. Mesmo porque, faltando a essas

a condição de segurança, nem sempre sobra, a esses empresários,

interesses ou conveniências em estender o horário até as 22 (vinte e duas)

horas.

4. A salutar competição que existe dentro de um shopping center - O

consumidor tem muitas opções de escolha. Um shopping center bem

planejado atende a essa tendência através de um mix de lojas

tecnicamente dosado em uma distribuição balanceada dos espaços de

venda, onde são encontradas as implantações estratégicas das chamadas

Page 11: O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 4 4 etc, que integravam em um só estabelecimento

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009

11

11

“lojas âncoras” e das “lojas satélites”, até os vastos parques de

estacionamento, as áreas e equipamentos de lazer etc.

5. A estabilidade dos pontos comerciais - Um ponto em uma

determinada rua comercial pode deixar de ser bom de uma hora para

outra, por motivos de planejamento urbano, obras, vizinhança etc. Em um

shopping center existe maior segurança para os investimentos e vida de

uma loja.

6. O convívio harmonioso entre pequenas e grandes lojas - Como já

foi dito, a harmonia existente entre as grandes (âncoras) e pequenas

(satélites) lojas, sob uma sadia competição, é um dos elementos mais

importantes que existe no sucesso empresarial dos shopping centers.

7. O Brasil precisa que as empresas cresçam - Sem dúvida o grau de

otimização apresentado pela organização dos shopping centers

engendrará esse crescimento das empresas componentes do centro.

8. A educação dos empresários para a vida associativa - Mais do que

nunca o empresário moderno não pode viver contando consigo mesmo. Ele

depende do crédito bancário, associa-se com pequenas ou microempresas,

formando uma classe cada vez mais importante na economia e na política

do país. Para o bom desempenho desse convívio com seus pares, ele

precisa de um tato fino e bem educado.

Os shopping centers, que estão reunidos em uma associação de

lojistas e submetidos a um mesmo regulamento interno, a necessidade da

boa educação torna-se indispensável para o bom convívio com seus

vizinhos.

9. A elevada carga tributária que pesa sobre o empresário brasileiro -

Toda carga tributária elevada, resulta automaticamente em sonegação,

porém, nos shopping centers, devido à fiscalização dos investidores, a

sonegação torna-se mais difícil.

7. O Empreendedor, o Administrador e o Lojista

Page 12: O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 4 4 etc, que integravam em um só estabelecimento

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009

12

12

O empreendedor é o empresário que estabelece as premissas

básicas do shopping center e que as dominará e manterá durante sua

existência.

É aquele que desenvolve a idéia de criação do shopping center,

incluindo o estudo de localização e a escolha dos lojistas que dele

participarão. Será o empreendedor quem irá definir a forma organizacional

do shopping, visando manter um nível satisfatório de resultados

econômicos.

O papel do empreendedor não termina com a criação e constituição

do shopping center, pois deverá estar sempre em sintonia com novas

tendências mercadológicas e novas estruturas. Enfim, cabe ao

empreendedor manter a excelência do empreendimento como coletividade.

O administrador é aquele que pode vir a ser contratado pelo

empreendedor para a conservação e administração da totalidade ou de

parte do shopping center.

Trata-se de figura de extrema importância, pois o sucesso de um

shopping center está amparado também na conservação de seus múltiplos

aspectos, ou seja, de limpeza, vigilância ou atendimento de clientela.

São ainda consideradas funções do administrador: definir o horário

de funcionamento do shopping center, regular o fornecimento de água, luz

e gás, o serviço de carga e descarga, e também o de recolhimento de lixo;

manter a estrutura pessoal para serviços comuns, tais como limpeza,

manutenção e segurança; fiscalizar os empresários; representar o

empreendedor extrajudicialmente e judicialmente etc.

Normalmente, para a prática da maioria dos atos, é conferido, ao

administrador a liberdade para a contratação de terceiros e a sua

remuneração será calculada com base em percentual sobre as despesas

para manutenção do shopping center, arcadas pelos lojistas e também um

percentual sobre a remuneração paga pelos lojistas ao empreendedor.

O empresário que participa da estrutura de um shopping center,

denominado de lojista, é aquele que terá contato direto com os

consumidores, mas que, a despeito de manter suas características

próprias, estará sujeito a regulamentos tendentes a uniformizar as práticas

do shopping center do qual participa. É essa característica que faz do

Page 13: O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 4 4 etc, que integravam em um só estabelecimento

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009

13

13

lojista de shopping center uma figura totalmente diferenciada do lojista de

rua. O lojista de shopping center deverá conviver com determinados

preceitos da estrutura desses centros, visando a que a estrutura do

shopping center, que foi minuciosamente planejada, não seja maculada.

8. Responsabilidade Civil nos Shopping Centers

A responsabilidade civil no shopping center se respalda no artigo

927 do Código Civil que dispõe, “Aquele que, por ato ilícito (arts.186 e 187)

causar dano a outrem, fica obrigado a repara-lo. Haverá obrigação de

reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em

lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano

implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem”.

Presume-se a culpa, com base no dever de vigilância do estabelecimento,

pois o cliente escolheu freqüentar o centro empresarial pela comodidade que este

lhe oferece.

Com relação aos furtos em estacionamentos de veículos, para apuração da

responsabilidade, parte-se do pressuposto, caso gratuito o estacionamento, de

que indiretamente o cliente está remunerando a empresa mantenedora do

estacionamento através do lucro auferido com a venda das mercadorias ali

transacionadas.

Nesse sentido, a Súmula 130 do STJ, "a empresa responde, perante o

cliente, pela reparação do dano ou furto de veículo em seu estabelecimento ".

Por sua vez, ocorrendo o ato lesivo, dentro da loja, a responsabilidade

presumidamente será do lojista, via de regra, que poderá ser solidária do

empreendedor, analisado o caso concreto.

No que tange a responsabilidade civil do shopping certers inexiste

legislação específica para disciplinar suas relações jurídicas. Para cada

caso concreto deve-se analisar a sua situação fática, observando os

diretos e deveres das partes, aliada ao entendimento jurisprudencial

dominante.

Segundo De Plácido e Silva, segurança “é derivado de segurar,

exprime gramaticalmente, a ação e efeito de tornar seguro, ou de

assegurar e garantir alguma coisa. Assim, segurança tem sentido

Page 14: O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 4 4 etc, que integravam em um só estabelecimento

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009

14

14

equivalente a estabilidade, pois o que é estável é seguro: a garantia”

(SILVA 2004, p.1266).

Esta idéia é um atrativo utilizado pelo shopping center para obter a

sua clientela. Apesar de não ser feita uma seleção prévia e nem restrição

na entrada das pessoas que freqüentam o local, pode-se afirmar que

realmente o shopping center oferece muito mais segurança aos clientes do

que as vias públicas, principalmente porque dispõe de serviço de

segurança privada nas suas dependências e também em geral no seu

estacionamento.

Segurança pública é dever constitucional da União e dos Estados, o

que isenta o shopping center de responsabilidade nesse sentido, mesmo

que ofereça segurança particular. Não só os clientes, mas também os

lojistas, a administração e o próprio empreendedor estão sujeitos a serem

vítimas de delitos. Apesar do serviço de segurança privada oferecido pelo

shopping center, trata-se de um local público e de livre acesso, não sendo

responsável por furto ou roubo ocorrido em seu interior. Pode, entretanto,

recair a responsabilidade no empreendedor caso tenha concorrido com

culpa ou dolo de qualquer funcionário seu.

Um aspecto polêmico refere-se à questão da responsabilidade civil

do shopping center quanto a furtos de veículos em seu estacionamento.

Temos uma corrente majoritária com entendimento de que se o

estacionamento for totalmente gratuito, onde não houve qualquer espécie

de controle de entrada e saída de veículos (comprovante, cartão ou ticket),

nem vigilantes no local, não há como responsabilizar o shopping center por

eventuais sinistros. Nesse caso inexiste qualquer relação jurídica que

vincule o usuário do estacionamento ao empreendedor. Acrescente-se que,

nessa situação, inclusive a produção de provas fica mais difícil.

Porém se o estacionamento do shopping center for controlado por

meio de ticket, comprovante ou cartão, cobrando-se pela permanência do

veículo no pátio, sem dúvida, existe uma relação contratual em que o

shopping assume um dever de vigilância. Sendo remunerado o

estacionamento, sempre haverá responsabilidade na medida em que o

dever de vigilância do veículo significa uma contraprestação devida em

razão do pagamento recebido.

Page 15: O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 4 4 etc, que integravam em um só estabelecimento

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009

15

15

No entanto, existem diversos tipos de estacionamento, com

características distintas e em razão disso, há consideráveis controvérsias

quanto à responsabilidade ou não do shopping center, devendo ser

analisadas as circunstâncias de cada caso concreto.

Há uma corrente que considera o estacionamento de shopping como

uma espécie de contrato de depósito tácito e sustenta que o fato de não

ser cobrada a permanência do veículo, o preço já está embutido no custo

das mercadorias vendidas nas lojas. Logo, não sendo o estacionamento

gratuito, há a obrigação de indenizar eventuais danos.

Corrente divergente entende que caso não seja cobrado pelo

estacionamento do veículo, sendo uma cortesia ou liberalidade que o

shopping proporciona aos seus clientes, não irá gerar dever de vigilância.

Outros comparam o shopping ao supermercado e afirmam que não

oferecem estacionamento por mera cortesia, pois tal comodidade funciona

como forma de atrair clientela e conquistar a preferência dos

consumidores. Sustentam que o sucesso do shopping center está

relacionado à existência de amplos espaços destinados ao estacionamento

de veículos, já que grande parte da clientela possui meio próprio de

locomoção.

Contrariando boa parte da doutrina, outros afirmam que o fato do condutor

não entregar o automóvel a nenhum manobrista e levar as chaves consigo o

shopping não chega a ter a guarda do veículo não ocorrendo a tradição da coisa e

conseqüentemente não se configurando o depósito. Assim, não é possível

afirmar-se que seja um contrato de depósito, por lhe faltar um elemento essencial

e indispensável que é o efetivo recebimento do objeto a ser guardado. Sustentam

que se trata de um contrato inominado de natureza consensual, no qual emerge a

obrigação de vigiar o veículo contra roubos, furtos e danos provocados por

terceiros.

Ao prejudicado pelo sinistro cabe o ônus da prova. Para se provar

que o veículo estava efetivamente no estacionamento sob o dever de

vigilância do shopping, admite-se não apenas prova documental, por

exemplo, ticket, comprovante ou cartão do estacionamento, mas também

prova testemunhal e confissão do condutor. O simples fato do shopping

Page 16: O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 4 4 etc, que integravam em um só estabelecimento

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009

16

16

não entregar nenhum comprovante de estacionamento não descaracteriza,

a priori, o dever de vigilância.

Porém cada caso concreto deve ser avaliado separadamente, pois o

simples fato do shopping possuir estacionamento não gera de imediato,

responsabilidade de indenizar possíveis sinistros. Se assim o fosse, estar-

se-ia admitindo uma responsabilidade objetiva que só poderia ser criada

por lei expressa. Inexiste lei no sentido de determinar a responsabilidade

civil do shopping center, portanto, inadmissível a aplicação indiscriminada

da teoria da responsabilidade objetiva. Será preciso analisar o tipo de

estacionamento oferecido pelo Shopping, se pago ou gratuito, com controle

da entrada e saída de veículos, entre outros fatores.

Em caso de incêndio nas áreas comuns, por exemplo, nas escadas,

hall, corredores, praças de alimentação e desabamento total ou parcial do

teto, devem ser apuradas possíveis causas e responsabilidades pelo fato,

sendo, em princípio, a responsabilidade presumida da administração do

shopping center. Se tais fatos ocorrerem no interior de alguma loja,

presume-se o lojista como responsável.

Quanto a eventuais furtos no interior das lojas, considera-se cada

lojista como responsável pelos fatos ocorridos em seu estabelecimento

bem como pelo zelo de suas mercadorias, inclusive, estoques, o que exclui

a responsabilidade do empreendedor do shopping.

O shopping center é um complexo empresarial organizado de

maneira a propiciar aos seus freqüentadores o máximo de comodidade,

sendo essa comodidade a definidora básica do seu sucesso como

instituição voltada ao mercado de consumo.

A colocação de estacionamentos nesse tipo de empreendimento

corresponde a uma forma de tornar essa comodidade mais concreta e

eficiente. O estacionamento de shopping center é elemento do aviamento

do estabelecimento, voltado não ao fornecimento daquele serviço

específico de guarda de veículos, muito embora possa vir a ser utilizado

dessa forma, mas a um implemento da atividade do shopping.

Exclui-se, de pleno, a relação de consumo. Não se pode afirmar que

ao se colocar um carro no estacionamento de um shopping center o cliente

está consumindo um serviço do shopping, até porque a atividade deste não

Page 17: O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 4 4 etc, que integravam em um só estabelecimento

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009

17

17

é de fornecimento de bens ou serviços ao mercado de consumo, mas de

gerenciamento, de organização, de fornecimento de uma infra-estrutura

sobre a qual os lojistas exploram o mercado de consumo. O shopping

monta a base, porém as relações de consumo dar-se-ão entre os seus

freqüentadores e os lojistas.

Para o shopping não interessa explorar o ramo de estacionamento,

mas sim atrair os clientes para o centro empresarial onde abriga toda a sua

estrutura.

Nesse sentido, segue julgados do Tribunal de Justiça de São Paulo:

"INDENIZAÇÃO - Responsabilidade Civil - Furto de veículo deixado em

shopping center - Admissibilidade - Fato do estacionamento, ser gratuito

tenha ou não o controle de veículos e vigilância, seja de livre acesso e

contenha placas informativas, que não isenta o proprietário de responder

pelo furto - Correção monetária no entanto, que deve ser contada do

ajuizamento da ação como foi feito no pedido - Artigos 128 e 460 do

Código de Processo Civil - Recurso parcialmente provido." (Relator: Álvaro

Lazzarini - Apelação Cível nº 201.235-1 - Barueri - 09.02.94).

"INDENIZAÇÃO - Responsabilidade civil - Ato ilícito - Furto de

veículo em estacionamento de shopping center - Existência de vigilância

que gera indenização - Irrelevância, ademais de inexistência de contrato

de estacionamento, ou que o mesmo se faça de forma gratuita - Ação

procedente - Recurso não provido - O dever de vigilância é imanente ao

proprietário do estabelecimento nessas condições, cujo intuito de lucro

bem caracteriza referida atividade, sendo inegável a conclusão no sentido

de que, quem tira proveito das dependências de que dispõe, para oferecer

estacionamento aos veículos de sua clientela, há de responder pelos riscos

de quem nela deixa seu veículo." (Relator: Silveira Netto - Apelação Cível

nº 211.188-1 - São Paulo - 16.06.94)

Se fosse atribuída à manutenção de estacionamento de shopping

center como um serviço oferecido ao público sob a égide de uma relação

de consumo, caberia o princípio da inversão do ônus da prova vigorante às

relações de consumo. Nestas condições o proprietário do shopping deveria

provar que os danos, ou o furto/roubo, dos veículos, não ocorreu nas suas

dependências.

Page 18: O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 4 4 etc, que integravam em um só estabelecimento

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009

18

18

Isso seria inviável na prática, pois o empreendedor do shopping

deveria provar que o veículo não estava nas suas dependências quando foi

avariado ou furtado/roubado. Seria necessária uma perícia em cada carro

que fosse estacionar, quando da entrada e da saída, para que se

comprovasse o seu real estado de conservação. A inversão do ônus da

prova nesse caso poderia até mesmo gerar um caos; afinal, nem todos têm

a devida consciência da licitude que deve ser norteadora das ações

individuais. Prevendo a incerteza que geraria a inversão, correntes

jurisprudenciais já consolidaram as suas inclinações, por exemplo:

"INDENIZAÇÃO - Responsabilidade Civil - Furto de veículo em

estacionamento de supermercado - Alegada falta de prova -

Admissibilidade - Hipótese de expressa negativa dos fatos pelo réu,

cabendo à demandante o ônus da prova do fato constitutivo de seu direito -

Artigo 333, I, do Código de Processo Civil - Boletim de ocorrência que

serve apenas como início de prova, a exigir melhor respaldo em outros

elementos de informação - Ação improcedente - Recurso não provido. O

Boletim de Ocorrência não é suficiente como prova do furto, pois

representa simples registro de queixa do particular à autoridade policial."

(Relator: Euclides de Oliveira - Apelação Cível nº 188.529-1 - São Paulo -

11.05.93)

Assim, a questão do ônus da prova se regula pelo Código de

Processo Civil, e não pelo Código de Defesa do Consumidor. No mesmo

sentido, julgado proferido pela Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça

do Paraná, na Apelação Cível de nº 51294, Rel. Des. Troiano Neto, verbis:

"RESPONSABILIDADE CIVIL - Alegação de furto em estacionamento de

supermercado - prova inconvincente quanto ao furto naquele local - ônus

que cabia ao autor da ação - artigo 333 - I do Código de Processo Civil -

Recurso provido para julgar improcedente a ação de indenização.

Incumbindo ao autor a prova acerca do fato constitutivo do seu direito, a

ele cabe demonstrar que seu veículo fora furtado no estacionamento de

supermercado, para deste exigir a respectiva indenização."

Diante das jurisprudências, nota-se que faltam elementos essenciais à

caracterização de uma relação de consumo propriamente dita.

Page 19: O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 4 4 etc, que integravam em um só estabelecimento

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009

19

19

O fato, do cliente, deixar o seu carro em estacionamento de shopping

center, não transfere a sua posse ao estabelecimento, apenas deixa-o sob sua

guarda, aproveitando-se de um serviço que lhe é oferecido. Trata-se de serviço

prestado no interesse do próprio incremento do comércio, daí surgindo o dever de

vigilância e guarda.

Segue julgado do Superior Tribunal de Justiça: "RESPONSABILIDADE

CIVIL. FURTO DE VEÍCULO EM ESTACIONAMENTO DE CENTRO

COMERCIAL. .Embora não existente pagamento direto, a empresa mantenedora

de 'shopping center' ostenta manifesto interesse econômico em dispor de local

para estacionamento de veículos, pois atualmente este é fator o mais ponderável

para angariar e atrair clientela.Não se trata de contrato de depósito tal como

regulado no Código Civil, mas sim de assunção tácita do dever jurídico de guarda

e vigilância dos carros." ( Relator: Min. Athos Carneiro. Recurso Especial nº

0029198 - 4ª Turma - 19.04.93)

Segundo De Plácido e Silva serviço é "não somente o desempenho de

atividade ou de trabalho intelectual, como a execução de trabalho, ou de obra

material. Onde quer que haja um encargo a cumprir, obra a fazer, trabalho a

realizar, empreendimento a executar, ou cumprido, feito, realizado, ou executado,

há um serviço a fazer, ou que se fez. Serviço, porém, é aplicado para distinguir o

complexo de atividades exercidas por uma corporação ou por uma entidade

jurídica, exprimindo e designando assim a própria administração”. (SILVA, 2004,

p. 1287)

O shopping oferece um serviço e os seus clientes, dele se utiliza se achar

que lhe é conveniente. O fator remuneração pode se demonstrar de forma direta,

quando a estada do veículo é cobrada monetariamente ou indireta, quando

inserto na perspectiva de lucro que será advindo da clientela que freqüenta o

shopping pela comodidade ofertada.

Na medida em que o shopping center se dispõe a prestar um serviço de

guarda do veículo, patente se torna o dever jurídico de honrar essa prestação nos

termos em que se compromete a cumpri-la.

As pessoas que freqüentam o shopping center, ao deixar seu carro em

estacionamento mantido por este estabelecimento, não está a consumir qualquer

coisa que seja, mas sim a usufruir, de um serviço que lhe é oferecido e mediante

Page 20: O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 4 4 etc, que integravam em um só estabelecimento

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009

20

20

o qual o shopping se compromete a garantir, irretocavelmente, salvo as

estipulações legais atinentes à espécie, a guarda do bem.

9. Considerações Finais

O shopping center constitui um centro de compras planejado, que

reúne em seu corpo empresários dos mais variados ramos, estrutura para

alimentação, lazer e estacionamento, facilitando dessa forma a atração do

público consumidor.

Para que se alcance e mantenha o sucesso do shopping center, é

necessária uma organização espelhada não só na estrutura acima citada,

mas principalmente nas relações firmadas entre as partes que a integram

que são: o empreendedor, os lojistas e o eventual administrador.

Não existe até o momento uma regulamentação legal que determine

os caminhos a serem trilhados pelos integrantes dos shopping centers,

pelo que esses vêm se adaptando à realidade caso a caso.

O condomínio tradicional, o condomínio especial e a sociedade estão

entre as formas habitualmente adotadas pelos Shopping Centers para sua

estrutura jurídica, que costuma ser amparada pelos seguintes

instrumentos: Escritura Declaratória de Normas Gerais Complementares,

Regimento Interno, Estatuto da Associação dos Lojistas e eventual

contrato entre empreendedor e administrador, os quais costumam ser

anexados ao contrato firmado entre empreendedor e lojista, passando a

fazer parte integrante deste último.

A multiplicidade de instrumentos e a gama de direitos e obrigações

sui generis neles contidos fazem com que o contrato firmado entre

empreendedor e lojista configure uma contratação atípica mista, com

elementos dos contratos de locação e adesão e de outros elementos

atípicos.

Os shopping centers são sem dúvida, empreendimentos vitoriosos e

em expansão em várias cidades dos Estados brasileiros, tendo como

finalidade precípua e inovadora proporcionar, o máximo de conforto e

segurança aos seus clientes, à aquisição de bens essenciais.

Page 21: O Contrato de Shopping Center e a Responsabilidade do ... · PDF fileRevista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009 4 4 etc, que integravam em um só estabelecimento

Revista Virtual Direito Brasil – Volume 3 – nº 1 - 2009

21

21

Referências Bibliográfias BITTAR, Carlos Alberto. Novos contratos empresariais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990. BULGARELLI, Waldírio. Contratos mercantis. São Paulo: Atlas, 1993. BUSHATSKY, Jaques. Shopping center visto pelos tribunais. Bauru: Edipro, 1993. BUZAID, Alfredo. Da ação renovatória. São Paulo: Saraiva, 1988. COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. São Paulo: Saraiva, 2002. DINIZ, Maria Helena. Lei de locações de imóveis urbanos comentada. São Paulo: Saraiva, 1992. GOMES, Orlando. Contratos. Rio de Janeiro: Forense, 2000. KARPAT, Ladislau. Shopping centers – Manual jurídico. São Paulo: Hemus, 1993. MARTINS, Fran. Contratos e obrigações comerciais. Rio de Janeiro: Forense, 2000. OLIVEIRA, Juarez. Comentários à lei de locação de imóveis urbanos. São Paulo: Saraiva, 1992. PEREIRA,Caio Mário da Silva. Condomínio e incorporações. Rio de Janeiro: Forense, 1988. REQUIÃO, Rubens. Curso de direito comercial. São Paulo: Saraiva, 2000. SILVA, De Plácido e. Vocabulário jurídico. Rio de Janeiro:Forense, 2004. VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil. São Paulo: Atlas, 2001. VERRI, Maria Elisa Gualandi. Shopping centers – Aspectos jurídicos e suas origens. Belo Horizonte: Del Rey, 1996.