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Nutrição Mineral – Lázaro E. P. Peres 1 NUTRIÇÃO MINERAL DE PLANTAS Lázaro E. P. Peres – Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz - [email protected] I- INTRODUÇÃO II- ABSORÇÃO DOS NUTRIENTES MINERAIS III- FUNÇÃO DOS NUTRIENTES MINERAIS IV- DEFICIÊNCIA DE NUTRIENTES MINERAIS V- APLICAÇÃO DA NUTRIÇÃO MINERAL : ADUBAÇÃO DOS SOLOS VI - BIBLIOGRAFIA I- INTRODUÇÃO Dezessete elementos químicos são considerados essenciais para as plantas Sabemos que as plantas são organismos autotróficos, ou seja, que fabricam seu próprio alimento. No entanto, qual é o alimento das plantas? Ou melhor, de que são feitas as plantas? É evidente que as plantas e os demais seres vivos são constituídos por alguns dos 89 elementos químicos existentes na natureza (lembrar que dezesseis dos 105 elementos que constam na Tabela Periódica são sintéticos). Apesar de mais de 60 desses elementos químicos já terem sido encontrados nos vegetais, somente pouco mais de uma dezena é realmente essencial para os mesmos. Contudo, faz se necessário saber o que torna um elemento químico essencial para os vegetais. Podemos dizer que um elemento é essencial quando perfaz dois critérios: 1) Faz parte de uma molécula que por si mesma já é essencial; 2) O vegetal não consegue completar seu ciclo de vida (que é formar semente viável) na ausência desse elemento.

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NUTRIÇÃO MINERAL DE PLANTAS Lázaro E. P. Peres – Escola Superior de Agricultura “Luiz de Queiroz - [email protected] I- INTRODUÇÃO

II- ABSORÇÃO DOS NUTRIENTES MINERAIS

III- FUNÇÃO DOS NUTRIENTES MINERAIS

IV- DEFICIÊNCIA DE NUTRIENTES MINERAIS

V- APLICAÇÃO DA NUTRIÇÃO MINERAL: ADUBAÇÃO DOS SOLOS

VI - BIBLIOGRAFIA

I- INTRODUÇÃO Dezessete elementos químicos são considerados essenciais para as plantas

Sabemos que as plantas são organismos autotróficos, ou seja, que fabricam seu próprio alimento. No entanto, qual é o alimento das plantas? Ou melhor, de que são feitas as plantas? É evidente que as plantas e os demais seres vivos são constituídos por alguns dos 89 elementos químicos existentes na natureza (lembrar que dezesseis dos 105 elementos que constam na Tabela Periódica são sintéticos). Apesar de mais de 60 desses elementos químicos já terem sido encontrados nos vegetais, somente pouco mais de uma dezena é realmente essencial para os mesmos. Contudo, faz se necessário saber o que torna um elemento químico essencial para os vegetais. Podemos dizer que um elemento é essencial quando perfaz dois critérios:

1) Faz parte de uma molécula que por si mesma já é essencial; 2) O vegetal não consegue completar seu ciclo de vida (que é formar semente viável) na ausência desse elemento.

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Os elementos químicos considerados essenciais podem ser denominados

nutrientes. Atualmente conhecemos 17 nutrientes para as plantas (Tabela 1).

TABELA 1. Elementos químicos considerados essenciais para as plantas.

Elemento Símbolo % em matéria seca Classificação Carbono C 45 Macronutriente Oxigênio O 45 - Hidrogênio H 6 - Nitrogênio N 1,5 - Potássio K 1,0 - Cálcio Ca 0,5 - Magnésio Mg 0,2 - Fósforo P 0,2 - Enxofre S 0,1 - Cloro Cl 0,01 Micronutriente Ferro Fe 0,01 - Manganês Mn 0,005 - Boro B 0,002 - Zinco Zn 0,002 - Cobre Cu 0,0006 - Molibdênio Mo 0,00001 - Níquel Ni - -

Modificada de Salisbury & Ross (1991).

A demonstração da essencialidade desses 17 elementos foi gradual. Por volta de 1900, fisiologistas vegetais como Knop e Sachs estabeleceram que as plantas não requerem necessariamente partículas do solo, matéria orgânica ou microrganismos para completarem seu ciclo de vida. Esses pesquisadores já sabiam que as plantas podiam crescer em água com saís dissolvidos contendo N, P, K, S, Ca, Mg e Fe. Em 1923 já se sabia que além dos macronutrientes e do Fe, quatro nutrientes a mais (Cu, Mn, Zn e B) aumentavam o crescimento das plantas quando adicionados em pequenas quantidades. Em 1939, Arnon & Stout demonstraram que o Mo é essencial para plantas. Em 1954, com o avanço das técnicas de purificação de sais e de cultivo hidropônico, descobriu-se a essencialidade do Cl.

Para se demonstrar a essencialidade do níquel, primeiro descobriu-se que ele fazia parte da enzima urease (que transforma uréia em amônia). Mais tarde, foi preciso provar que as plantas não completavam seu ciclo produtivo na ausência desse nutriente. No entanto, o níquel é requerido em concentrações tão baixas que o conteúdo presente nas sementes já é suficiente para que as novas plantas completem seu ciclo produtivo. Somente em 1987 conseguiu-se demonstrar que o níquel é essencial para as plantas cultivando-se cevada por três gerações em sua ausência. Nesse experimento, as sementes produzidas pelas plantas da terceira geração não foram mais viáveis (Brown et al., 1987). Como o Ni faz parte da urease, sua deficiência em algumas espécies provoca morte (necrose) nos ápices caulinares, devido ao acúmulo de uréia.

Sódio, silício e cobalto são considerados nutrientes benéficos

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Alguns elementos não são considerados essenciais, mas apenas benéficos para algumas plantas. Esse é o caso do sódio (Na), do silício (Si) e do cobalto (Co). O sódio é normalmente muito tóxico para os vegetais. No entanto ele é importante para as espécies que possuem fotossíntese do tipo C4

1. É interessante notar que boa parte das plantas halófitas (resistentes ao sódio) são de fotossíntese C4. Sabe-se que nessas plantas, o sódio seja necessário para a entrada de piruvato na célula do mesofilo onde ele regenera o fosfoenolpiruvato (PEP), que é substrato da enzima PEPCase.

Em plantas que acumulam silício, este é depositado como sílica (SiO2) amorfa na parede celular. O Si contribui para as propriedades da parede celular, incluindo rigidez e elasticidade. Além disso, o Si previne a herbivoria já que prejudica o aparelho bucal de insetos mastigadores. Plantas de arroz deficientes em Si são mais susceptíveis ao acamamento (tombamento das plantas, o que impede sua colheita mecanizada) e ao ataque de fungos.

O cobalto é necessário para as bactérias que fixam nitrogênio e, por conseguinte, é imprescindível para as leguminosas que estão fazendo simbiose com esses organismos. Contudo, plantas supridas com nitrogênio não necessitam mais de cobalto. Embora não seja essencial para plantas, o cobalto faz parte da vitamina B12, a qual é essencial para os animais. Nesse caso, é interessante que as plantas acumulem elemento, principalmente aquelas empregadas em pastagens (espécies forrageiras). Os elementos essenciais podem ser orgânicos ou minerais, além de serem divididos em macro e micronutrientes

Uma questão que se faz relevante é saber como as plantas adquirem os nutrientes essenciais ou benéficos. O carbono, oxigênio e hidrogênio são adquiridos a partir do CO2 atmosférico e da água presente no solo. Depois de adquiridos, eles são incorporados às plantas pelo processo de fotossíntese. Como conseqüência da fotossíntese, esses três nutrientes fazem parte de praticamente todas as moléculas orgânicas dos vegetais e são responsáveis por cerca de 94-97% do peso seco de uma planta. Os demais nutrientes (6-3 % restantes) fazem parte dos minerais presentes no solo. Por derivarem dos minerais, esses elementos são denominados nutrientes minerais e o processo pelo qual as plantas os adquirem é denominado nutrição mineral.

Quando analisamos a quantidade dos nutrientes minerais nos tecidos vegetais (Tabela 1), observamos que alguns deles estão presentes em maiores proporções que os outros. Essas proporções dividem os nutrientes minerais em duas categorias:

• macronutrientes ou nutrientes necessários em grandes quantidades e • micronutrientes ou aqueles necessários em pequenas quantidades.

A divisão entre micro e macronutrientes não tem correlação com uma maior ou menor essencialidade. Todos são igualmente essenciais, só que em quantidades

1 As plantas C4 são aquelas que fixam o CO2 através da enzima PEPCase, a qual catalisa a junção do fosfoenolpiruvato (PEP) com o CO2 formando o ácido oxalacético, uma molécula de quatro carbonos (C4 ). Essa reação se dá nas células do mesofilo e o malato formado migra para as células da bainha do feixe vascular onde se converte em piruvato + CO2. O CO2 formado é novamente fixado pela enzima RUBISCO, a qual junta o CO2 a uma molécula de 5 carbonos (ribulose 1,5 bifostato) formando duas moléculas de 3 carbonos (C3).

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diferentes. Uma conseqüência da essencialidade por igual dos nutrientes é a chamada "Lei do mínimo" de Liebig (Fig 1).

FIGURA 1. Representação da "Lei do mínimo de Liebig".

Essa lei estabelece que a produtividade de uma cultura é limitada pelo elemento que está presente em menor quantidade. Nesse caso, mesmo se aumentarmos a concentração dos demais nutrientes, não haverá um aumento da produtividade. Além de se levar em conta a Lei do mínimo, é necessário considerar que também há um máximo para a utilização de um nutriente (Fig 2). Enquanto a planta possui deficiência de um certo nutriente (Fig 2, zona deficiente), há um crescimento exponencial proporcional à quantidade do nutriente presente nos tecidos (nutriente absorvido). Contudo, depois de um certo tempo o crescimento tende a desacelerar (zona de transição) e pode ficar estagnado (zona adequada). No caso de macronutrientes, a zona adequada corresponde a uma sobra de nutriente absorvido, o qual pode se acumular no vacúolo sem provocar resposta no crescimento. No caso de micronutrientes, essa sobra pode provocar toxidez nos tecidos e reduzir o crescimento da planta. Considera-se concentração crítica de um nutriente no tecido aquela concentração em que abaixo dela a planta está crescendo menos do que seu potencial e acima dela o incremento deixa de ser exponencial. Em termos práticos, considera-se a concentração crítica como sendo aquela que corresponde a 90% do máximo de crescimento (Fig. 2).

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FIGURA 2. Crescimento das plantas em função da concentração do nutriente nos tecidos. Notar que uma acumulação de micronutrientes nos tecidos além da zona adequada pode levar à toxidez. II- ABSORÇÃO DOS NUTRIENTES MINERAIS

O encontro dos nutrientes com as raízes pode envolver três processos diferentes

(Figura 3):

• Difusão: o nutriente entra em contato com a raiz ao passar de uma região de maior concentração para uma de menor concentração próxima da raiz.

• Fluxo de massa: o contato se dá quando o elemento é carregado de um local de maior potencial de água para um de menor potencial de água próximo da raiz.

• Interceptação radicular: o contato se dá quando a raiz cresce e encontra o elemento.

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FIGURA 3. Transporte de nutrientes via simplasto e apoplasto. O nutriente chega até raiz (pêlo radicular) por difusão, interceptação radicular ou fluxo de massa.

Nutrientes muito móveis na solução de solo tendem a chegar até as raízes por fluxo de massa. Um exemplo é NO3

-, o qual é repelido pelas cargas negativas do solo e por isso tende a se manter solúvel. Por outro lado, o PO4

3- tende a se ligar a cátions como Fe2+, Fe3+ e Al3+, os quais possuem OH- que é deslocado pelo PO4

3-. Em conseqüência, o fosfato tende a ser imobilizado pelo solo e tem dificuldade de ser arrastado pelo fluxo de massa. O fosfato chega até as raízes predominantemente por difusão.

A transpiração é importante para os nutrientes que entram em contato com a raiz principalmente por fluxo de massa (nitrogênio, enxofre, magnésio e cálcio). Por outro lado, o tamanho do sistema radicular é muito importante para a absorção de elementos que entram em contato com a raiz por difusão (fósforo e potássio) e interceptação radicular (cálcio). O crescimento contínuo das raízes é importante para a absorção dos nutrientes

Nem todas as partes das raízes são eficientes na absorção de nutrientes. A zona de maior absorção de íons é a zona pilífera (Figura 4), a qual só está presente em raízes novas como a radícula e as raízes secundárias das dicotiledôneas ou as raízes seminais e nodais das monocotiledôneas. Células dessa zona já se expandiram, mas ainda não possuem crescimento secundário, tendo, portanto uma maior absorção de solutos. Outra questão relevante é que a velocidade de difusão tende a diminuir exponencialmente com o aumento da distância. Desse modo, os elementos próximos das raízes se difundem até elas, mas não são repostos pelos que estão longe, entrando em depleção. Portanto, para uma boa absorção de nutrientes é necessário que o vegetal tenha um crescimento radicular contínuo. A contínua formação de raízes garante raízes novas (absorventes) que alcançam áreas do solo onde o nutriente difundido ainda não entrou em depleção.

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FIGURA 4. Zonas da raiz e efunções.

O crescimento radicular é controlado geneticamente e depende de uma série de

fatores como o estímulo hormonal, a disponibilidade de fotoassimilados e condições do solo como textura, estrutura, umidade, pH e nutrientes (Peres & Kerbauy, 2000). Quanto ao pH, é interessante notar que o crescimento radicular geralmente é favorecido em solos um pouco ácidos, com pH variando entre 5,5 e 6,5. Na década de 70, Drew e colaboradores demonstraram que as raízes tendem a crescer mais na direção onde se encontram os nutrientes (Figura 5). Esse mesmo fenômeno também ocorre com relação à disponibilidade de água. Embora o mecanismo que explique o crescimento preferencial das raízes em direção à água seja relativamente simples, ainda não temos uma explicação fisiológica para o caso dos nutrientes. Com relação à disponibilidade de água, sabemos que a turgescência é necessária para a expansão celular e como os ápices radiculares perdem turgescência nas porções secas do solo, as raízes crescem preferencialmente nas zonas do solo que permanecem úmidas. Essa é a razão pela qual ao observarmos a direção do crescimento radicular temos a falsa impressão de que a raiz “procura” a água. Uma aplicação prática dos trabalhos de Drew é que, ao fazermos uma adubação superficial ou muito localizada, estaremos estimulando o crescimento das raízes de um modo também concentrado. Esse tipo de crescimento é prejudicial para a planta já que, em condições onde a água ou outros nutrientes possam ser escassos, um sistema radicular profundo e diversificado seria mais vantajoso.

Uma alternativa para facilitar a absorção de nutrientes são as micorrizas. As micorrizas são associações das raízes com fungos que estendem o sistema radicular dos vegetais, sendo muito importante para aumentar o contato com o fósforo.

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FIGURA 5. Experimento de Drew et al. (1975). Notar que com exceção do potássio, a região da raiz tratada com maiores concentrações de nutriente cresceu mais que na região com baixa disponibilidade de nutrientes. Cada raiz foi colocada em três compartimentos diferentes separados por um filme de parafina que impede a passagem de solução, mas não oferece resistência à penetração das raízes. A = alta concentração de nutriente e B = baixa concentração de nutriente. Os nutrientes podem chegar até o xilema das raízes via simplasto ou apoplasto

Uma vez entrando em contato com as raízes, os nutrientes precisam chegar até o xilema. A seguir iremos considerar como isso acontece nos vegetais. Após entrar em contato com a raiz, o nutriente pode chegar até o xilema via apoplasto (parede celular e espaços intercelulares) ou simplasto (conjunto de citoplasmas interligados pelos plasmodesmatas). Mesmo para aqueles elementos absorvido inicialmente via apoplasto, para que cheguem até o xilema precisam entrar dentro da célula quando atingem a endoderme. Isto ocorre porque a endoderme apresenta uma barreira ao apoplasto denominada faixa caspariana. No xilema os solutos voltam a cair no apoplasto, já que os elementos de vaso são células mortas. O processo pelo qual o íon deixa o simplasto e entra no xilema é chamado “carregamento do xilema”. Tratamentos com citocininas (BAP) inibem o carregamento de solutos no xilema sem afetar sua entrada na córtex. Há

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evidências de que o carregamento do xilema está sob o controle de H+-ATPases e canais de efluxo de íons (ver adiante).

Nos parágrafos anteriores, consideramos a importância da formação de novas raízes para facilitar o contato dos nutrientes pouco móveis com os pêlos absorventes. Aqui vale ressaltar que a contínua formação de raízes secundárias também é importante para que o cálcio entre em contato com o xilema. A formação de raízes secundárias rompe a endoderme permitindo a entrada de cálcio via apoplasto, já que esse elemento praticamente não se move no simplasto. A força motriz para a ascensão dos elementos pode ser a transpiração ou a gutação

No xilema os elementos são transportados por fluxo de massa sendo que a força motriz é a tensão gerada pela transpiração ou, alternativamente, a pressão de raiz durante o processo de gutação. Como a força motriz normalmente é a transpiração, os nutrientes tendem a se acumular nos órgãos que transpiram mais, como as folhas maduras, em detrimento dos brotos novos e frutos. Para corrigir isso, os vegetais redistribuem os nutrientes de um órgão para outro através do floema no sentido da fonte (órgãos maduros) para os drenos (órgãos em crescimento). Alguns nutrientes são móveis no floema (nitrogênio, fósforo, potássio e magnésio) e outros são pouco móveis (cálcio, enxofre, boro e ferro). Como os frutos são drenos que recebem nutrientes primordialmente através da redistribuição via floema, eles têm dificuldade de acumular nutrientes pouco móveis. Em condições em que a transpiração é desfavorecida (ambiente úmido e frio) e predomina a pressão positiva no xilema (gutação), há mais chances dos nutrientes chegarem até os órgãos que transpiram pouco, sendo mais relevante ainda no caso de nutrientes pouco móveis no floema. A exemplo disso, um distúrbio fisiológico comum em fruto de tomateiro é a chamada podridão estilar, devido à deficiência de cálcio. É notável que em períodos chuvosos (baixa transpiração) há menos ocorrência de podridão estilar em tomateiro. Os nutrientes atravessam a membrana celular com a ajuda de proteínas transportadoras

Para que um elemento chegue até o xilema ele precisa entrar dentro da célula, seja ainda no pêlo radicular ou posteriormente quando ele precisa vencer a barreira da endoderme. Para entendermos esse processo é necessário compreendermos um pouco sobre a estrutura das membranas celulares.

Costuma-se dizer que a capacidade de replicação (tirar cópia de si mesmo) é essencial à vida, daí a importância do DNA como unidade fundamental desse processo. Contudo, não haveria vida se não houvesse um mecanismo para compartimentar e organizar as várias reações químicas necessárias à vida, inclusive aquelas envolvidas na replicação do DNA. As membranas são justamente o componente biológico responsável pela compartimentação, e, portanto, a garantia da vida. As membranas celulares são compostas por uma bicamada lipídica na qual estão imersas proteínas. A camada lipídica confere às membranas um caráter polar (devido às cargas dos fosfolipídeos) e apolar (devido aos ácidos graxos). As proteínas presentes nas membranas podem ser estruturais ou podem possuir função de transdução de sinal (receptores) ou transporte de substâncias (ver adiante).

O transporte de uma substância através da membrana depende do seu tamanho e polaridade. Substância apolares (O2, CO2) ou muito pequenas (H2O) costumam passar livremente pela membrana. Contudo, a maior parte das moléculas que a célula vegetal

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necessita para seu funcionamento são polares (açúcares, aminoácidos e íons). O transporte de moléculas polares é feito com auxílio de proteínas transportadoras presentes nas membranas, denominadas canais, carreadores e bombas (Tanner & Caspari, 1996).

Os canais transportam íons pela simples abertura de um poro. Um canal aberto pode permitir a passagem de 108 íons/s. O que determina a especificidade de um canal é o tamanho de seu poro e a densidade da superfície carregada em seu interior. Os canais são limitados a íons ou água. No caso da água, apesar dela poder atravessar a membrana livremente, recentemente foi descoberto um canal especial envolvido em seu transporte, o qual foi denominado aquaporina (Chrispeels et al., 1999). Aquaporinas existem em membranas animais e vegetais e sua atividade é regulada em resposta à disponibilidade de água.

A região do canal que determina a especificidade é denominada filtro de seletividade. O mecanismo do filtro de seletividade dos canais parece ser regulado pela presença de aminoácidos básicos (lisina, arginina e histidina, os quais possuem carga positiva conferida por um NH3 extra). De acordo com a voltagem da membrana, os aminoácidos básicos podem estar carregados ou não. A presença de cargas nos resíduos de aminoácidos confere repulsão, abrindo o canal (Figura 6).

FIGURA 6. Representação hipotética do mecanismo do portão de seletividade do canal de potássio. O portão é regulado por voltagem e parece ser o resultado da presença de aminoácidos básicos. De acordo com a voltagem da membrana, os aminoácidos básicos podem estar carregados ou não. A presença de cargas nos resíduos de aminoácidos confere repulsão, abrindo o canal. Como o potássio é transportado a favor de um gradiente eletroquímico (representado pelo triângulo), o transporte é passivo (ver adiante). Modificado de Taiz & Zeiger (1998).

No transporte por carreadores a ligação com o soluto causa uma mudança conformacional na proteína, a qual expõe a substância à solução no outro lado da membrana. O transporte se completa quando a substância se dissocia do sítio de ligação com o carreador (Figura 7). O transporte por carreadores pode ser tanto ativo quanto

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passivo. Como uma mudança conformacional na proteína é necessária para transportar moléculas ou íons individuais, a taxa de transporte por um carreador é muitas vezes mais lenta que um canal, sendo da ordem de 102 - 106 íons/s.

As bombas são proteínas que gastam ATP diretamente para transportar solutos e por isso também são denominadas ATPases. Nas plantas existem dois tipos de bombas, as de cálcio e as de prótons. As bombas de prótons gastam ATP para jogar prótons fora da célula (bomba da plasmalema) ou dentro do vacúolo (bomba do tonoplasto). Devido à atividade das ATPases da plasmalema e do vacúolo, o pH do vacúolo é tipicamente 5,5 e do citoplasma é 7,0 a 7,5. Algumas espécies possuem vacúolos excessivamente ácidos (hiperacidificação), sendo a causa do sabor azedo de muitos frutos (ex. limão). O baixo pH dos vacúolos das células de suco do limão é devido à baixa permeabilidade do tonoplasto aos prótons e à presença de uma ATPase vacuolar mais eficiente. Outro fator que produz frutos azedos é a acumulação de ácidos orgânicos tais como os ácidos cítrico, málico e oxálico.

FIGURA 7. Representação hipotética do mecanismo de co-transporte de um carreador. A entrada conjunta do soluto e do próton (A), provoca uma modificação na conformação da proteína que coloca o soluto e o próton para dentro da célula (B). Esse mecanismo permite que um soluto seja transportado contra seu gradiente eletroquímico (representado pelo triângulo) sendo ajudado pelo transporte do próton, o qual ocorre a favor de seu gradiente eletroquímico. O gradiente eletroquímico de prótons foi criado previamente por uma bomba de prótons (H+-ATPase), a qual gasta energia (ATP). Portanto, a bomba de prótons gasta energia diretamente e o co-transporte indiretamente, sendo ambos considerados transporte ativo. Modificado de Taiz & Zeiger (1998).

Até o momento sabemos que os canais estão envolvidos no transporte de K+, Cl-, Ca2+, e água. Existem carreadores para NO3

-, PO43-, K+, Na+, Ca2+, Mg2+ e metais

pesados. Os carreadores de Na+ e metais pesados são utilizados não para a entrada desses elementos, mas para isola-los do citoplasma jogando-os no vacúolo ou fora da

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célula (apoplasto). Como dito anteriormente, os únicos tipos de bombas encontrados nas plantas são as de Ca2+ e prótons. As plantas não possuem as chamadas bombas de Na+ e K+, tão comuns nos animais. O cálcio, apesar de ser um nutriente importante para as plantas, precisa ser mantido em baixas concentrações no citoplasma, pois é um sinalizador celular. Desse modo, a bomba de Ca2+ é utilizada para retirar Ca2+ do citoplasma jogando-o no apoplasto e o carreador de cálcio joga esse elemento no vacúolo. Contudo, existem canais de cálcio responsáveis pela entrada desse elemento no citoplasma vindo do meio externo ou do vacúolo.

Os mecanismos envolvidos na absorção de alguns micronutrientes são um pouco mais específicos do que até agora foi exposto. Em solos com pH elevado, nutrientes como Fe, Zn, Mn e Cu costumam ficar imobilizados na forma de hidróxidos. Muitas dicotiledôneas exudam compostos fenólicos em suas raízes para quelatar e solubilizar o ferro presente na solução de solo. Normalmente as plantas absorvem ferro na forma reduzida e por isso o Fe3+ é reduzido a Fe2+ quando ele é liberado pelo quelato na superfície da raiz. Dentro da planta o Fe pode ser quelado novamente pelo citrato quando ele é transportado a longas distâncias no xilema. Nas dicotiledôneas, tanto a exudação de compostos fenólicos (quelatos) quanto à atividade das redutases, que reduzem o Fe3+, são induzidas pela atividade da H+-ATPase (Figura 8). Mutantes de soja defectivos para produção da redutase de Fe3+ exibem sintomas de deficiência de ferro mesmo com suprimento adequado desse nutriente. Existe um outro tipo de transportador de solutos denominado sideróforo. Os sideróforos são comuns em gramíneas e constituem uma segunda estratégia para absorver o Fe, bem como Zn, Mn e Cu. Os sideróforos também funcionam como quelatos e parecem entrar na célula vegetal junto com o metal sem que ele precise ser reduzido (Figura 8). Por fim, a exudação de substâncias orgânicas também pode ser um mecanismo para impedir a entrada de íons tóxicos. Algumas plantas resistentes ao alumínio exudam ácidos orgânicos que complexam esse elemento impedindo sua absorção.

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FIGURA 8. Mecanismo para absorção de ferro presente em dicotiledôneas (estratégia I) e gramíneas (estratégia II). Nas dicotiledôneas, a H+-ATPase induz a exudação de compostos fenólicos (quelatos) e a atividade das redutases (R). Os quelatos tornam o Fe3+ solúvel, facilitando sua chegada até as raízes onde ele é reduzido a Fe2+, sendo então absorvido. Nas gramíneas os sideróforos exudados funcionam como quelatos que complexam o Fe3+, transportando-o para dentro da célula, dispensando a presença de redutases. Não se conhece a proteína responsável pela exudação (X) ou entrada (P) dos sideróforos.

Uma questão que pode ser levantada até esse ponto seria o que determina se um nutriente será transportado por um canal, um carreador ou uma bomba, ou em outras palavras, quais os tipos de transporte e suas características. A entrada de um elemento na célula é regulada por dois potenciais: um químico e um elétrico

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O transporte de íons para dentro ou fora da célula é regulado por dois potenciais:

1) o potencial gerado pela concentração do íon (potencial químico) e o potencial gerado pela carga que esse íon carrega (potencial elétrico). Todas células vivas exibem um potencial de membrana que é devido à distribuição desigual de íons dentro e fora da célula. As células nos caules e raízes de plântulas jovens geralmente possuem potencial transmembrana de –130 a –110 mV. Esses valores negativos significam que o citossol é carregado negativamente em relação ao meio extracelular. Qualquer desequilíbrio de cargas entre o citossol e o meio externo é prontamente corrigido pelo metabolismo celular. A manutenção do potencial de membrana é extremamente importante para a viabilidade e funcionamento das células.

Grande parte do potencial eletroquímico é conferido pela H+-ATPase. A H+-ATPase, ou bomba de prótons, da membrana plasmática cria um gradiente de potencial eletroquímico de H+ na plasmalema enquanto a H+-ATPase vacuolar (V-ATPase) e a H+-pirofosfatase (H+-Ppase) bombeiam prótons dentro do lúmen do vacúolo. O gradiente de potencial eletroquímico para H+ é chamado de força motriz de prótons ou ∆p e representa uma energia livre estocada na forma de gradiente de H+.

No transporte das substâncias carregadas eletricamente, o equilíbrio só será atingido quando a força que promove o fluxo dessas substâncias a favor do gradiente de potencial químico se equipara à força que favorece o fluxo dessas mesmas substâncias a favor do gradiente elétrico, visando a manutenção do potencial de membrana constante. Se quisermos equacionar o movimento de um íon para dentro ou fora da célula termos que levar em conta tanto seu potencial químico quanto elétrico. A equação de Nernst tem essas características:

∆En = - 2,3 x R x T x log Ci/Ce z x F Onde: ∆En : potencial transmembrana R : constante dos gases T : temperatura (K) z : valência do íon F : constante de Faraday Ci / Ce : concentração interna do íon / concentração externa do íon Para um transporte ocorrendo a 25oC, teremos: -z x ∆En = 59 x log Ci/Ce Isolando se a concentração interna (Ci) na equação de Nerst, temos: -z x ∆En = 59 x log Ci/Ce -z x ∆En = 59 x (logCi – logCe) logCi = (-z x ∆En + 59logCe)/59 logCi = (-z x ∆En)/59 +logCe Ci = 10 (-z x ∆En)/59 +logCe

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Considerando-se esta equação, tem-se três variáveis que são mensuráveis pela utilização de metodologias próprias. Desse modo, o potencial da membrana pode ser determinado com auxílio de microeletrodos e as concentrações dos íons nas células e na solução externa podem ser medidas através de métodos químicos analíticos. Pela equação de Nernst, tendo-se o potencial de membrana e a concentração externa do íon poderemos calcular a concentração interna esperada (concentração calculada - Cical) deste íon quando o sistema estiver em equilíbrio. Ao compararmos a concentração interna observada (Ciobs) de um íon (medida através de análise química das células) com o valor da concentração interna calculada pela equação de Nernst (Cical) poderemos saber se o transporte daquele íon foi ativo ou passivo:

Ciobs = Cical indica transporte passivo Ciobs > Cical indica transporte ativo do tipo influxo (entrada na célula) Ciobs < Cical indica transporte ativo do tipo efluxo (saída da célula)

Exemplo: em uma célula com potencial –110 mV cuja concentração externa (Ce) do potássio é 1 mM temos,

Ci = 10 [-1 x (-110)]/59 +log1

Ci = 10 [-1 x (-110)]/59 + 0

Ci = 10 1,86

Ci = 72 mM O transporte de nutrientes pode ser ativo ou passivo

A tabela 2 apresenta valores de Cical e Ciobs para uma série de íons em raízes de ervilha. Por ela podemos verificar que os ânions tendem a entrar no citossol por transporte ativo, já que a célula já é carregada negativamente. De modo inverso, há uma facilidade para entrada de cátions na célula. No caso do K+, essa facilidade faz com que a célula economize energia para seu transporte, mas necessita gastar energia para retirar o excesso de Ca2+ e Mg2+, além de também ter que excluir o Na+, o qual é tóxico para a maioria dos vegetais. Nos vegetais o transporte ativo é realizado por carreadores e bombas e o transporte passivo é realizado por canais. Contudo, mesmo o transporte por canais é conduzido pela H+-ATPase, pois a difusão de K+ necessita de um potencial de membrana negativo o qual é mantido pela H+-ATPase. Um transportador de K+ pode transportar Rb+ e Na+, além do K+, mas há uma preferência por K+.

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TABELA 2. Comparação entre as concentrações iônicas observadas e calculadas em raízes de ervilha. Íon Conc. Externa Conc. Interna Conc. Observada Tipo de Transporte K+ 1 74 75 Difusão Na+ 1 74 8 Efluxo Mg2+ 0,25 1.340 3 Efluxo Ca2+ 1 5.360 2 Efluxo NO3

- 2 0,0272 28 Influxo Cl- 1 0,0136 7 Influxo H2PO4

- 1 0,0136 21 Influxo SO4

2- 0,25 0,00005 19 Influxo (Modificado de Higinbotham et al., 1967)

Quando um íon é transportado por uma bomba, esse transporte gasta ATP

diretamente e por isso chamamos o processo de transporte ativo primário. Por outro lado, o transporte de um íon em um carreador normalmente é feito em conjunto com prótons, e por isso é denominado co-transporte. Como esse próton foi transportado inicialmente pela H+-ATPase, a qual gasta ATP para isso, dizemos que o co-transporte nos carreadores é um transporte ativo secundário. Com relação à direção do fluxo, o co-transporte pode ser simporte, quando o íon e próton caminham no mesmo sentido, ou antiporte, quando o íon e próton caminham em sentido inverso. A Figura 9 trás um resumo dos tipos de transporte e da atividade dos carreadores, canais e bombas.

FIGURA 9. Resumo dos tipos de transporte e da atividade dos carreadores, canais e bombas. Substâncias apolares (CO2) permeiam a membrana livremente. Como a célula vegetal possui um potencial transmembrana negativo, cátions (K+) podem ser transportados por canais, mas os ânions (NO3

-) precisam ser transportados por carreadores. O transporte com carreadores utiliza a energia que foi gasta anteriormente pela bomba para criar um gradiente de prótons. Do mesmo modo, a saída de cátions

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pela bomba para criar um gradiente de prótons. Do mesmo modo, a saída de cátions (Na+) da célula também precisa ser realizada com gasto de energia pelos carreadores. Modificado de Taiz & Zeiger (1998).

Há evidências de que o Na+ é isolado no vacúolo por um antiporte com H+ (Apse et

al., 1999) e que Cl-, NO3- e H2PO4

-, sacarose, aminoácidos entram na célula pelo simporte com H+. Uma conseqüência prática do simporte entre NO3

- e H+ é que a grande absorção de NO3

- pelas raízes tende a aumentar o pH do apoplasto. Isso é comum no cultivo em solução nutritiva (hidroponia), onde há uma tendência à alcalinização da solução e conseqüente precipitação de micronutrientes. Uma maneira de se evitar esse efeito é fazer formulações de soluções nutritivas contendo tanto NO3

- quanto NH4

+. A capacidade de absorção de nutrientes varia de acordo com o ambiente e o estágio de desenvolvimento do vegetal

A disponibilidade de cada íon no solo costuma ser um fator regulador das taxas de absorção e atividade de carreadores. Atualmente são conhecidos três sistemas de absorção de íons, cada um constituído por grupos de carreadores diferentes.

a) sistema de carreadores constitutivos de baixa afinidade b) sistema de carreadores constitutivos de alta afinidade c) sistema de carreadores indutivos de alta afinidade

De muito tempo se sabe que a cinética de absorção de certos íons segue duas

fases, uma característica das baixas concentrações e outra mais relacionada às altas concentrações. (Epstein, 1972). A cinética de absorção em baixas concentrações possui um Km muito baixo (o que indica alta afinidade do transportador) e a de altas concentrações possui Km alto e parece não mostrar saturação. Hoje, sabe-se que no transporte de K+, o sistema de alta afinidade (Km = 0,02 e 0,03 nM) é atribuído ao transporte ativo por simporte; e o sistema de baixa afinidade é atribuído aos canais. O transporte ativo de K+ ocorre quando ele está em concentrações externas muito pequenas e o passivo (de baixa afinidade) ocorre quando há altas concentrações desse elemento. É possível que as diferenças na taxa de absorção de um nutriente ao longo do ciclo de vida da planta também seja regulada por um controle no tipo ou da atividade do transportador. Através da Figura 10 podemos observar a taxa de absorção de N e K ao longo do ciclo de vida de uma cultivar de tomateiro. É interessante notar que o máximo da capacidade de absorção ocorre no período de florescimento e início de frutificação (Figura 10A). Fica evidente que as plantas conseguem regular a taxa de absorção de seus nutrientes ajustando tanto com relação à disponibilidade no solo, quanto ao seu ciclo de vida. Uma aplicação prática desse controle é que não compensa adubar uma cultura quando ela já está em final de ciclo, pois sua capacidade de absorção é muito reduzida (Figura 10B).

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FIGURA 10. Absorção de N e K ao longo do ciclo de vida do tomateiro (Lycopersicon esculentum cv Santa Clara). Notar que o máximo de nutrientes absorvidos ocorre por volta de 48 e 60 dias após plantio, ou seja, na época de floração e frutificação (A). Esse pico de absorção em períodos específicos do ciclo de vida fornece evidências de que as plantas têm um controle das taxas de absorção de nutrientes, provavelmente devido à atividade de canais e carreadores. Uma conseqüência prática disso é que a adubação precisa ser feita no começo do ciclo e intensificada no início do período reprodutivo, pois a somatória dessas fases representa mais de 70% do total de nutrientes absorvidos (B). Dados extraídos a partir de Fayad et al. (2002).

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Genes que codificam proteínas transportadoras já foram isolados

Uma das maneiras da planta controlar a taxa de absorção dos nutrientes seria a através do controle da expressão dos genes que codificam para seus carreadores, canais e bombas. O isolamento dos genes que codificam proteínas transportadoras vem sendo conseguido em diversos modelos vegetais e abrem perspectivas para o entendimento e manipulação da absorção de nutrientes em culturas de interesse comercial. Desse modo, genes que codificam transportadores de alta afinidade para K (Schachtmann & Schroeder, 1994), P (Smith et al., 1997) e S (Smith et al., 1995) já foram isolados. Para muitos deles, a expressão está sujeita à regulação por “feedback” sendo aumentada em plantas sob deficiência e reprimida em plantas com um suprimento adequado. A exemplo disso, os genes que codificam transportadores de alta afinidade para absorção de H2PO4

- e SO42- são desreprimidos pela deficiência de fósforo e enxofre,

respectivamente. Além disso, a expressão dos genes que codificam transportadores de NO3

- é induzida pela presença de nitrato. Pode se dizer, portanto que as plantas utilizam apenas uma pequena fração de sua capacidade de adquirir nutrientes, já que para os nutrientes que não chegam até as raízes por fluxo de massa, é mais importante que as plantas invistam em crescimento radicular do que na produção de transportadores. Essa constatação sugere importantes estratégias para o melhoramento e manejo de plantas visando uma maior eficiência na utilização de nutrientes minerais.

As descobertas recentes no que concerne o isolamento e caracterização de canais e transportadores de nutrientes também podem abrir perspectivas para o melhoramento de plantas específicas para o cultivo hidropônico. Em solução hidropônica, a princípio há pouca depleção dos nutrientes que estão em contato com as raízes. Nesse caso, genótipos mutantes ou plantas transgênicas com alta expressão de transportadores para N, P, K e S poderiam ser mais adequados para esse tipo de cultivo. Tais genótipos também teriam que possuir altas taxas de crescimento, caso contrário, os nutrientes absorvidos em grandes quantidades ficariam em concentrações tóxicas tanto para as plantas quanto para o consumo como alimento. III- FUNÇÃO DOS NUTRIENTES MINERAIS

Os nutrientes minerais podem ter uma função estrutural ou regulatória

Uma explicação para os macronutrientes serem requeridos em quantidades elevadas é o fato deles fazem parte de moléculas essenciais para o vegetal, ou seja, possuem um papel estrutural. Por outro lado, os micronutrientes estão mais relacionados à ativação de certas enzimas, sendo esse um papel regulatório.

O nitrogênio e o fósforo possuem forte papel estrutural fazendo parte dos nucleotídeos, os quais formam os ácidos nucléicos (DNA e RNA). Além disso, o nitrogênio está presente nos aminoácidos que formam as proteínas e na própria molécula de clorofila. Dois dos aminoácidos considerados essenciais (metionina e cisteína) são formados por enxofre (Fig. 11). O potássio apesar de ser um macronutriente não é um componente estrutural. Contudo ele está presente em altas concentrações no suco celular regulando o potencial osmótico e o balanço iônico. Esse nutriente também está envolvido no controle do movimento estomático. O cálcio possui um papel estrutural (está presente nos pectatos de cálcio que compõem a lamela média) e um grande papel na regulação do metabolismo da planta. Ele normalmente atua como mensageiro secundário ativando uma proteína chamada calmodulina, a qual, por sua

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vez, ativa uma série de enzimas. O magnésio está presente na molécula da clorofila, juntamente com o nitrogênio. O magnésio também faz parte de muitas metaloenzimas, ou seja, as enzimas que possuem um metal em sua estrutura.

Como foi dito anteriormente, os micronutrientes possuem um papel mais regulatório que estrutural. Desse modo, o ferro faz parte de enzimas relacionadas com os processos de oxidação e redução e das enzimas responsáveis pela síntese da clorofila. O molibdênio é cofator da enzima nitrato redutase. O zinco também faz parte de várias enzimas e inclusive daquelas relacionadas com a síntese do aminoácido triptofano. O boro é importante para os processos de divisão e alongamento celular. Acredita-se que ele influencie esses processos alterando o nível de um hormônio vegetal, a auxina, através da ativação de enzimas que oxidam esse hormônio. Por fim, os outros micronutrientes como o manganês, o cobre, o cloro e o níquel também estão envolvidos na regulação da atividade de várias enzimas.

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FIGURA 11: Representação de algumas moléculas essenciais para os vegetais e que contém nutrientes minerais com papel estrutural.

IV- DEFICIÊNCIA DE NUTRIENTES MINERAIS

Os sintomas de deficiência de um nutriente dependem de sua função e mobilidade no vegetal

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Como os nutrientes inorgânicos possuem funções específicas nos vegetais, os sintomas correspondentes à sua falta podem ser deduzidos levando-se em conta o não cumprimento de tais funções. A exemplo disso, tanto o nitrogênio quanto o ferro e o magnésio estão envolvidos na formação da molécula de clorofila. Em conseqüência, a falta de qualquer um desses nutrientes pode levar a um sintoma de clorose (amarelecimento), ou seja, falta de clorofila.

Como o ferro é pouco móvel no floema2 e o nitrogênio é bastante móvel, a clorose provocada por esses dois nutrientes difere do seguinte modo: na deficiência de nitrogênio as folhas maduras ficam cloróticas, pois o nitrogênio é mobilizado para as folhas jovens. De modo inverso, na deficiência de ferro as folhas jovens é que se tornam cloróticas, pois esse nutriente não possui mobilidade suficiente para ser suprido a partir das folhas maduras. Na deficiência de nitrogênio, os carboidratos não usados no metabolismo de N podem ser utilizado para a biossíntese de antocianinas e acumulação desse pigmento também é um dos sintomas de deficiência. Assim como a deficiência de N, folhas deficientes em P acumulam antocianinas. A diferença é que esse arroxeamento não está associado com clorose, como ocorre em deficiência de N.

A deficiência de Mg também provoca clorose, porém esta ocorre entre as nervuras das folhas. Esse padrão de clorose se dá porque a clorofila nas nervuras permanece inalterada por longos períodos quando comparada à clorofila das células ao redor das nervuras. Além da clorose, outros sintomas bastante comuns são o subdesenvolvimento (enfezamento) e as lesões necróticas (morte dos tecidos).

Como as reações metabólicas são bastante integradas, uma perturbação específica causada por um determinado nutriente pode desencadear uma série de reações que levam a uma sintomatologia geral como o enfezamento, a clorose ou a necrose. Desse modo, é muito difícil diagnosticar qual nutriente está em falta a partir da observação de sintomas de deficiência. A análise de solos é uma das maneiras de se determinar se uma cultura está bem nutrida ou se algum nutriente está em carência. Contudo esta apenas fornece a quantidade de nutrientes que pode ser absorvido pelas raízes, mas não fornece informações se isso realmente irá ocorrer já que a absorção depende de outros fatores. A alternativa mais correta para se descobrir qual nutriente está em carência é a chamada análise foliar. Através da quantificação dos nutrientes presentes nos tecidos vegetais podemos saber qual deles está presente em quantidades consideradas subótimas e assim corrigir sua deficiência no solo (Malavolta et al., 1989).

Por fim, é importante ressaltar que os micronutrientes em excesso também podem causar necroses e enfezamentos. Além disso, o excesso de certos macronutrientes pode provocar a deficiência de alguns micronutrientes. Um exemplo clássico é a interação negativa entre o fósforo e o zinco.

V- APLICAÇÃO DA NUTRIÇÃO MINERAL: ADUBAÇÃO DOS SOLOS

Os solos possuem três propriedades químicas importantes: pH, CTC e quantidade de matéria orgânica

2 A pouca mobilidade do Fe pode ser devido à sua precipitação nas folhas velhas sob a forma de fosfatos ou óxidos insolúveis ou pela complexação com a fitoferritina, uma proteína que se liga a Fe presente nas folhas.

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A prática da adubação visa corrigir deficiências dos solos e, portanto, é necessário se conhecer o estado inicial dos mesmos, ou seja, suas características físicas e propriedades químicas. Não se pode deixar de considerar também que os solos são ecossistemas complexos formados por microrganismos e outros organismos além das próprias plantas. As principais propriedades químicas dos solos são o pH, a CTC e a quantidade de matéria orgânica. O pH do solo influencia a solubilidade dos nutrientes e conseqüentemente a disponibilidade dos mesmos para as plantas. Em pH igual a 7,0 todos os macronutrientes estão disponíveis para as plantas, mas o zinco, o cobre, o manganês e o ferro são insolúveis em pH alto (Figura 12). O ideal é chegar-se a um valor intermediário de pH onde todos os nutrientes estejam disponíveis.

FIGURA 12: Relação

entre o pH do solo e a

disponibilidade de

diversos nutrientes.

Adaptado de Malavolta

et al. (1989).

Outro importante efeito do aumento do pH do solo é a insolubilização e precipitação do alumínio. O alumínio é muito tóxico para as plantas e ao ser precipitado sua absorção pelos vegetais é evitada. O aumento do pH dos solos é conseguido através da utilização de calcário (CaCO3 + MgCO3):

CaCO3+ H2O ----> Ca2+ + H2CO3 + OH-

3OH- + Al3+ ----> Al(OH)3 (insolúvel)

Pelas equações vistas acima, observamos que o calcário aumenta o pH e o número de cargas negativas do solo. Um exemplo interessante da conjugação do efeito do calcário no aumento do pH e o efeito deste na disponibilidade de nutrientes ocorre na Austrália. Até a década de 50 eram utilizadas toneladas de calcário por ha para corrigir a acidez do solo. No entanto, descobriu-se que o principal efeito do calcário na

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produtividade das pastagens era tornar o Mo mais disponível (Fig. 12). Após essa descoberta, ao invés da aplicação de toneladas de calcário por ha, passou-se a aplicar 30 g de MoO3 por ha.

A CTC ou capacidade de trocas catiônicas é um parâmetro que mede o nível de cargas negativas do solo, ou seja, as cargas que irão trocar cátions (Ca2+, Mg2+, K+, Al3+, H+) com a solução de solo, a qual é absorvida pelas raízes.

Solos com pequenas partículas (argila) tendem a ter alta CTC, pois terão uma alta relação superfície/volume (S/V). Lembrar que para uma esfera: S = 4πr2 e V = 4/3πr3. Logo, S/V = 3/r e quanto menor o raio maior a relação S/V. Solos com alta S/V expõem maior superfície de cargas por volume de solo e por isso geram maior CTC.

Um solo com alta CTC geralmente tem uma grande reserva de nutrientes minerais. Matematicamente, a CTC equivale à expressão:

CTC = S + Al3++ H+, onde S (soma de bases) = Ca2+ + Mg2+ + K+

Quanto maior for o valor de S e menores forem os níveis de Al3++ H+, mais fértil será o solo. Por isso, a fertilidade de um solo é avaliada por sua saturação de bases (V%):

V% = S/CTC * 100 (solo considerado fértil: V>50%)

Como a CTC é função das cargas negativas do solo, quanto mais fontes de cargas negativas, maior será sua CTC. As fontes de cargas negativas de um solo são as soluções coloidais de argila e de matéria orgânica. Quanto à presença de argilas, é importante considerar que alguns tipos de argila possuem maior CTC que outros (Tab. 3).

TABELA 3 - Capacidades de troca catiônica (CTC) de alguns minerais de argila e do húmus.

Fonte de CTC CTC (meq/100g) Caolinita 3-15 Ilita 10-40 Clorita 10-40 Haloisita 5-50 Montmorilonita 80-150 Vermiculita 100-150 Húmus até 400

Através da tabela 3 observamos que a caolinita possui CTC muito baixa. Nos solos dos cerrados a argila predominante é a caolinita o que explica a baixa capacidade desses solos de reter suas bases solúveis e sua alta concentração de ferro e alumínio. O processo de formação de solos onde as bases solúveis são lixiviadas para áreas baixas (matas de galeria) permanecendo apenas os metais insolúveis como o ferro e o alumínio é denominado latossolização. Por outro lado, a argila predominante nos solos mais férteis do mundo (planícies da Ucrânia) é a montmorilonita. A tabela 3 também evidencia a importância da matéria orgânica (MO) na CTC dos solos. Além de aumentar a CTC dos solos, a MO proporciona uma maior retenção de água e aeração dos mesmos.

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Outro efeito benéfico da MO é o fato dela ser fonte de microrganismos pedogênicos (que promovem formação de solo) e de predadores de patógenos que causam doenças às plantas.

A utilização de matéria orgânica na agricultura deve obedecer a certos critérios

Apesar de todos os efeitos benéficos da MO, nem sempre seu emprego na agricultura é viável. Em culturas anuais, como o milho, a soja e o arroz, a utilização de MO na maioria dos casos é impossibilitada pelos altos custos de sua distribuição nas grandes extensões das lavouras. Nessas culturas, é preferível a utilização de adubo mineral concentrado, o qual, por ser requerido em menores quantidades, reduz consideravelmente a quantidade de óleo combustível para sua distribuição. Além disso, o adubo mineral pode ser distribuído juntamente com a semeadura, economizando o número de operações com máquinas e portanto, reduzindo a compactação dos solos. No caso do cultivo de hortaliças e de culturas perenes (fruticultura, cafeicultura, heveicultura) o emprego de MO é relativamente comum, mas precisa seguir certos critérios. O primeiro deles é que a MO só deve ser fornecida às plantas após sua completa mineralização (decomposição), pois durante esse processo há liberação de calor e NH3 tóxico que podem prejudicar as plantas.

Outro critério importante na utilização de MO é a relação C/N (carbono/nitrogênio) do solo. MO com alta relação C/N (restos vegetais pobres em nitrogênio) faz com que os microrganismos utilizem o nitrogênio presente no solo para degradar o excesso de carbono. Nesse caso, o nitrogênio ficará temporariamente imobilizado nos microrganismos e os vegetais cultivados apresentarão sintomas de deficiência desse elemento.

Os solos também possuem características físicas importantes para os vegetais

As principais características físicas do solo são a textura, estrutura e consistência. A textura de um solo diz respeito à proporção entre as quantidades de três partículas: areia, silte e argila. Os solos arenosos retêm pouca água e possuem baixa CTC. Por outro lado, os solos argilosos possuem tendência à compactação. Nesse caso, a textura desejável seria a textura média, ou seja, uma proporção intermediária entre essas três partículas. A estrutura é a forma como as partículas de areia, silte e argila se organizam no solo, ou seja, ela pode ser granular, em blocos, laminar, prismática, etc. A porosidade e densidade dos solos dependem da estrutura. Assim, solos bem estruturados são porosos e a água infiltra-se facilmente em seu perfil, evitando o escoamento superficial causador de erosão. Sabe-se que a erosão compreende três etapas: degradação, transporte e deposição. O transporte de grandes volumes de solo de um local e deposição em outros locais são os efeitos visíveis da erosão (formação de voçorocas). Os chamados terraços e plantios em curvas de nível são recursos para evitar essas duas etapas da erosão. No entanto, a causa da erosão é a degradação, ou seja, a quebra da estrutura do solo devido à falta de cobertura vegetal e à utilização excessiva de máquinas (trator, arado). A consistência de um solo é função da quantidade de água que ele possui. Desse modo, um solo pode ser pastoso, friável ou quebradiço. As arações e outras práticas que alteram a estrutura dos solos devem ser evitas, mas se forem imprescindíveis, as mesmas devem ser realizadas quando o solo se encontra com consistência friável.

Metodologias específicas são empregadas para correção e adubação dos solos

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As práticas agrícolas visam a preservação das características físicas dos solos e a modificação de suas propriedades químicas somente deve ser realizada quando necessário. Como vimos anteriormente, o pH, uma das propriedades químicas dos solos, deve ser corrigido para se evitar que o alumínio se torne tóxico para as plantas. O pH pode ser corrigido adicionando-se calcário (CaCO3) ou a cal virgem (CaO2) aos solos. Existem vários métodos para se calcular a quantidade de calcário que deve ser adicionado no solo. Um deles é através da saturação de bases. Pode se corrigir o pH baseando-se na saturação de bases inicial (determinada pela análise de solo) e na saturação que se quer chegar (característica de cada cultura).

NC = CTC*(V2 - V1)* f /100

• NC = necessidade de calcário em t/ha • CTC= capacidade de troca catiônica em meq/100 g de solo • V2 = saturação de bases requerida pela cultura • V1 = saturação de bases atual do solo • f = 100/PRNT, onde PRNT = poder relativo de neutralização total, o qual é

função da quantidade de Ca e Mg do calcário e de sua granulometria (fornecido pelo fabricante).

Outra propriedade química que mudamos no solo é sua fertilidade. Quando adicionamos calcário já estamos modificando a fertilidade dos solos aumentando sua soma de bases (S = Ca2+ + Mg2+ + K+) através do Ca e do Mg adicionados. Além do cálcio e magnésio também costumamos adicionar nitrogênio, fósforo, potássio, enxofre e micronutrientes ao solo. Esses nutrientes podem ser aplicados no solo para serem absorvidos pelas raízes (veja a seguir) ou podem ser aplicados nas próprias folhas através da adubação foliar. Na adubação foliar os nutrientes se difundem pela cutícula e isso pode ser beneficiado pelo uso de sulfactantes como Tween 80, para quebrar a tensão superficial. Além disso, os nutrientes tendem a se difundir mais facilmente através das paredes das células guarda estomáticas, já que elas não possuem cutícula. Contudo, a entrada dos nutrientes não se faz pela abertura estomática, já que a tensão superficial da solução onde estão contidos impossibilita esse processo.

As formulações NPK contém os três macronutrientes (nitrogênio, fósforo e potássio) mais importantes para as plantas. Os sais que contém esses macronutrientes também costumam ter enxofre na molécula e micronutrientes como contaminantes. Tanto na fabricação dos fertilizantes granulados do tipo NPK quanto para se adubar os solos com cada um desses macronutrientes em separado, utilizam-se sais contendo nitrogênio (Tab.4), fósforo (Tab. 5) e potássio (Tab. 6). Por razões históricas, nas formulações NPK, o P e o K são contabilizados como seus óxidos equivalentes, ou seja, P2O5 e K2O. Desse modo, em uma formulação NPK 4-14-8 temos 4% de N, 14% de P2O5 e 8% de K2O.

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TABELA 4 – Algumas fontes de nitrogênio utilizadas na agricultura.

Sal Fórmula N(%) Uréia CN2H4O 45 Sulfato de amônio (NH4)2SO4 20 Salitre NaNO3 16

A uréia é uma fonte orgânica de nitrogênio podendo ser utilizada na adubação foliar, ou seja, pulverização das folhas com uma solução de uréia. As outras fontes de nitrogênio são inorgânicas (amônia e nitrato). Quase todo o nitrogênio absorvido pelas raízes das plantas se dá na forma de nitrato, pois as bactérias dos solos costumam oxidar rapidamente a amônia formando nitrato3.

As perdas de nitrogênio nos solos são muito altas (processos de volatilização e lixiviação) e por isso é comum parcelar sua aplicação. A primeira parcela costuma ser colocada antes do plantio na chamada adubação de reposição dos gastos dos cultivos anteriores, e as demais parcelas são colocadas durante o ciclo da cultura. Esse último tipo é denominado adução de cobertura, pois a fonte de nitrogênio é colocada sobre o solo, próximo às plantas.

TABELA 5 – Algumas fontes de fósforo utilizadas na agricultura.

Sal Fórmula P2O5 (%)* Superfosfato simples Ca(H2PO4)2 + CaSO4 18 Superfostato triplo Ca(H2PO4)2 44 Fosfato natural Ca3(PO4)2 24-38

*Para converter os valores de P2O5 em P, basta multiplicar por 0,44

TABELA 6 – Algumas fontes de potássio utilizadas na agricultura.

Sal Fórmula K2O (%)* Cloreto de potássio KCl 60 Sulfato de potássio K2SO4 50 Nitrato de potássio KNO3 46

*Para converter os valores de K2O em K, basta multiplicar por 0,83 A associação entre leguminosas e bactérias constitui uma fonte alternativa de nitrogênio

3 A nitrificação, ou oxidação da amônia (ou íon amônio) formando nitrato, se dá através da ação de dois gêneros de bactérias. O primeiro deles, Nitrosomonas, forma nitrito a partir de amônia: 2NH3 + 3O2 --> 2NO2

- + 2 H+ + 2 H2O . O segundo gênero, Nitrobacter, forma nitrato à partir do nitrito pela reação: 2NO2

- + O2 --> 2NO3- . Como se vê, ambas as reações requerem oxigênio e por isso esse processo não

ocorre em solos enxarcados (com baixo potencial de oxigênio).

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Dos três macronutrientes primários (NPK), o nitrogênio é, sem dúvida, o mais caro. A fixação do N2 atmosférico em amônia por processos industriais, como o de Haber-Bosch, gasta muita energia e causa poluição. Uma alternativa interessante é a fixação biológica de N2 através da atividade de bactérias em associação com leguminosas (Tab. 7).

TABELA 7 - Estimativa da fixação de nitrogênio em algumas espécies leguminosas.

Espécie leguminosa Kg N/ha/ano Guandu (Cajanus cajan) 224 Soja (Glycine max) 119 Amendoin (Arachis hypogaea) 98 Ervilha (Pisum sativum) 64 Feijão (Phaseolus vulgaris) 56

Como uma quantidade de 50 Kg de nitrogênio é adequada para a maioria das culturas, através da tabela 7 chegamos à conclusão de que as leguminosas não necessitam de adubação nitrogenada.

O cálculo da adubação leva em conta a análise de solo e as necessidades de cada cultura

Uma questão relevante é saber o quanto de adubo mineral ou orgânico deve ser adicionado para que uma cultura esteja bem adubada. Esse cálculo é realizado levando-se em conta a análise do solo (as quantidades de nutrientes que o solo já possui) e as exigências nutricionais de cada cultura. A seguir iremos fazer esse cálculo para o plantio de uma cultura cuja análise de solo e as exigências nutricionais levaram a recomendação das seguintes quantidades de fertilizantes:

1. adubação de plantio: o 50 Kg/ha de N o 175 Kg/ha de P2O5 o 100 Kg/ha de K2O

2. adubação de cobertura: 40 kg/ha de N

Como a relação básica entre as necessidades de N, P2O5 e K2O na adubação de plantio é 1: 3,5 : 2, deve-se utilizar uma fórmula NPK que se aproxime dessa relação como é o caso da 4-14-8. Nesse caso, a quantidade de NPK é obtida pelo cálculo:

Qnec/Qfor*100 onde Qnec = Quantidade necessária de nutriente; Qfor = % do nutriente na formulação NPK.

No exemplo acima, a quantidade de NPK 4-14-8 que deve ser adicionado seria 1250 Kg/há, pois

• 50 Kg N/ 4 * 100 = 1250 ou • 175 Kg P2O5/14 = 1250 ou • 100 Kg K2O /8 = 1250 Kg de NPK/ha.

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Quanto à adubação de cobertura, pode se utilizar uréia, sulfato de amônio ou salitre.

• Para uréia (45% de N): 40 Kg N / 45 * 100 = 88,89 Kg de uréia/ha • Para sulfato de amônio (20% de N): 40 Kg N/ 20*100 = 200 Kg de (NH4)2SO4

/ha • Para o salitre (16% de N): 40 Kg N/16*100 = 250 kg de NaNO3/ha.

Por fim, é importante considerar que esses cálculos só se aplicam no caso da adubação de grandes culturas, onde o alto custo dos fertilizantes obriga a máxima racionalização de sua utilização. No caso da adubação de jardins caseiros ou plantas de vaso, não se costuma levar em conta a quantidade de nutrientes que o solo já possui, mas somente as necessidades de nutrientes de cada espécie vegetal. No entanto, os conhecimentos aqui adquiridos poderão ser úteis para uma nutrição mineral mais criteriosa de todas as plantas.

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