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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE BIOCIÊNCIAS
CURSO DE BIOMEDICINA
NATHALIA CAROLINE LOPES FERREIRA SANTANDER
PRINCIPAIS ANTICORPOS IRREGULARES EM POLITRANSFUNDIDOS: UMA REVISÃO DE LITERATURA
Natal -RN
Junho/2019
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PRINCIPAIS ANTICORPOS IRREGULARES EM POLITRANSFUNDIDOS: UMA REVISÃO DE LITERATURA
por
Nathalia Caroline Lopes Ferreira Santander
Orientador: Prof° Msc Christiane Medeiros Bezerra
Natal
Junho/2019
Monografia Apresentada à Coordenação do Curso de Biomedicina da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como Requisito Parcial à Obtenção do Título de Bacharel em Biomedicina.
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE BIOCIÊNCIAS
CURSO DE BIOMEDICINA
A Monografia “Principais Anticorpos Irregulares em Politransfundidos: Uma revisão de literatura”
elaborada por Nathalia Caroline Lopes Ferreira Santander
e aprovada por todos os membros da Banca examinadora foi aceita pelo Curso de Biomedicina e homologada pelos membros da banca, como requisito parcial à obtenção do título de
BACHAREL EM BIOMEDICINA
Natal, 03 de Junho de 2019
BANCA EXAMINADORA
_________________________________________
Prof. Msc. Christiane Medeiros Bezerra (Orientador)
Departamento de Microbiologia e Parasitologia - UFRN
_________________________________________
Msc. Maria Cecília Farias dos Santos
Bióloga do Núcleo de Hematologia e Hemoterapia
_________________________________________
Prof. Dr. Thales Allyrio Araújo de Medeiros Fernandes
Departamento de Ciências Biomédicas - UERN
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AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar agradeço à minha mãe que me apoia em absolutamente
todos os meus sonhos e que não mede esforços para me ajudar a concretizá-los.
Agradeço aos meus avós, Severino (in memorian) e Isabel por terem me
proporcionado uma educação de qualidade e acesso ilimitado ao saber. Agradeço
também ao meu irmão, companheiro de vida, que não tem ideia do quanto me ensina
no dia-a-dia.
Ao meu noivo Diogo, por estar ao meu lado em absolutamente todos os
momentos, ouvindo e apoiando meus anseios e acalmando pacientemente minhas
ansiedades. Obrigada por sonhar junto comigo.
Agradeço aos meus melhores amigos da vida: Leticia, Paula, Jamille, Raul e
Ingrid que estiveram comigo desde sempre. Obrigada por esses mais de 15 anos de
amizade, obrigada serem meu porto seguro.
Agradeço também às minhas amigas de graduação: Alexa, Graziele e Nadine,
juntas desde (quase) o começo compartilhando tantos momentos de estudos para
provas, seminários, trabalhos, projetos de extensão, apresentações, monitorias,
estágios. Eu definitivamente não teria conseguido chegar até aqui sem a ajuda e apoio
de vocês, obrigada pelo companheirismo e sororidade.
Agradeço também à minha orientadora Christiane pelos conselhos e paciência
não somente durante a elaboração deste trabalho mas desde as disciplinas de
Hemato e Imuno-hemato, passando pela monitoria e projetos de extensão. Obrigada
por me abrir as portas da hematologia.
Obrigada também a todos os docentes que fizeram parte da minha formação
acadêmica. E por fim, agradeço à Universidade Federal do Rio Grande do Norte e aos
que fazem parte dessa instituição e lutam para que o ensino superior continue sendo
gratuito e de qualidade, resistimos.
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RESUMO
Os anticorpos anti-eritrocitários são produzidos contra epítopos presentes nas superfícies das hemácias e são classificados como irregulares, quando aparecem no plasma após sensibilização por gestação ou transfusão incompatíveis, também ditos
aloanticorpos, e como regulares, quando a sua presença não requer exposição prévia ao antígeno eritrocitário, como acontece com os anticorpos naturais do sistema ABO. A transfusão de sangue é uma medida terapêutica bastante utilizada na prática clínica, em especial nos pacientes com doença falciforme, talassemias, leucemias, dentre outras doenças hematológicas e visa melhorar a qualidade de vida dos indivíduos que dela necessitam, reduzindo a morbidade e mortalidade dessas doenças. Entretanto, assim como outras intervenções terapêuticas, pode levar a complicações como reações hemolíticas, aloimunização, risco de transmissão de agentes infecciosos, dentre outras. Nesse contexto, os pacientes que recebem hemocomponentes com frequência, também chamados politransfundidos, estão mais susceptíveis a desenvolverem reações transfusionais hemolíticas, agudas ou tardias, advindas da presença de aloanticorpos. Para a medicina transfusional os sistemas de grupos sanguíneos mais relevantes são: ABO, Rh, Kell, Duffy, Kidd, Lewis, MNS e Diego e a pesquisa e identificação de anticorpos irregulares visa garantir a segurança dos procedimentos hemoterápicos e reduzir o percentual das aloimunizações, além da possibilidade de identificar fenótipos raros. Todavia, a dificuldade nos estudos da área se baseia na quantidade de antígenos eritrocitários, que atualmente ultrapassam 300, na sua diversidade estrutural e principalmente pelo fato da aloimunização ser de caráter multifatorial, influenciada por fatores genéticos e ambientais.
PALAVRAS CHAVE: transfusão de sangue, aloanticorpos, reação transfusional
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ABSTRACT
Anti-erythrocyte antibodies are produced against epitopes present on the surfaces of red blood cells and are classified as unexpected when they appear after when they appear in plasma after incompatible gestation or transfusion, also known as alloantibodies. They are classified as regular, when their presence does not require previous exposure to the erythrocyte antigen, as with the natural antibodies of the ABO system. Blood transfusion is used as a therapeutic measure in clinical practice, especially in patients with sickle cell disease, thalassemias, leukemias and others hematological illness with the purpose of improving the quality of life of the individuals who need it, reducing the morbidity and mortality of these diseases. However, as with other therapeutic interventions, it can lead to complications such as hemolytic reactions, alloimmunization, risk of transmission of infectious agents, among others. In this context, patients receiving frequent blood transfusions, also called polytransfused, are more likely to develop acute or late hemolytic transfusion reactions from the presence of alloantibodies. For transfusion medicine the most relevant blood group systems are ABO, Rh, Kell, Duffy, Kidd, Lewis, MNS and Diego and the search for and identification of irregular antibodies is aimed at ensuring the safety of hemotherapy procedures and reducing the percentage of alloimmunizations, besides the possibility of identifying rare phenotypes. However, the difficulty studies in the area is based on the number of erythrocyte antigens, which currently exceed 300, in their structural diversity and mainly because the alloimmunization is multifactorial., influenced by genetic and environmental factors.
KEY WORDS: blood transfusion, alloantibodies, transfusion reaction.
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LISTA DE ABREVIATURAS
Ac Anticorpo
Ag Antígeno
AGH Anti-globulina humana
AHAI Anemia hemolítica autoimune
DHFRN Doença hemolítica do feto e do recém-nascido
GPA Glicoforina A
IgG Imunoglobulina G
IgM Imunoglobulina M
ISBT Sociedade Internacional de Transfusão de Sangue (International Society of Blood Transfusion)
LISS Solução de baixa força iônica
MNSGP MN-sialoglicoproteina
PAI Pesquisa de Anticorpos Irregulares
SNP Polimorfismos de Nucleotídeo Único
SUS Sistema Único de Saúde
TAI Teste da Antiglobulina Indireta
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LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Principais sistemas de grupos sanguíneos ................................................21
Tabela 2 Principais aloanticorpos encontrados em indivíduos politransfundidos ....................................................................................................................................33
10
LISTA DE FIGURAS
Figura 1: Natureza constitutiva de alguns antígenos eritrocitários ...........................16
Figura 2: Ano de descoberta dos antígenos dos primeiros 30 sistemas de grupos sanguíneos e natureza constitutiva dos mesmos .....................................................17
Figura 3: Representação de alguns antígenos eritrocitários de acordo com suas funções ......................................................................................................................18
Figura 4: Cariótipo masculino humano, mostrando a localização cromossômica do
grupo sanguíneo e genes associados........................................................................19
Figura 5: Fenotipagem ABO provas direta e reversa.................................................23
Figura 6: Modelo esquemático de potenciais gatilhos para aloimunização eritrocitária..................................................................................................................35
11
ÍNDICE
LISTA DE ABREVIATURAS.......................................................................................vii
LISTA DE TABELAS...................................................................................................viii
LISTA DE FIGURAS...................................................................................................ix
1 INTRODUÇÃO ....................................................................................................... 12
2 OBJETIVOS ........................................................................................................... 15
2.1 GERAL ............................................................................................................ 15
2.2 ESPECÍFICOS ................................................................................................. 15
3 MATERIAIS E MÉTODOS ..................................................................................... 16
3.1 TIPO DE ESTUDO .......................................................................................... 16
3.2 OBTENÇÃO DOS DADOS .............................................................................. 16
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO ............................................................................. 17
4.1 ANTÍGENOS ERITROCITÁRIOS X BREVE HISTÓRICO ............................... 17
4.1.1 Antígenos de alta e baixa frequência. ....................................................... 19
4.2 SISTEMAS DE GRUPOS SANGUÍNEOS ....................................................... 20
4.2.1 Sistema ABO (ISBT 001) ........................................................................... 22
4.2.2 Sistema MNS (ISBT 002) .......................................................................... 24
4.2.3 Sistema Rh (ISBT 004) .............................................................................. 25
4.2.4 Sistema Kell (ISBT006) ............................................................................. 26
4.2.5 Sistema Lewis (ISBT 007) ......................................................................... 27
4.2.6 Sistema Duffy (ISBT 008) .......................................................................... 28
4.2.7 Sistema Kidd (ISBT 009) ........................................................................... 29
4.2.8 Sistema Diego (ISBT 010) ......................................................................... 31
4.3 IMPORTÂNCIA DA TRANSFUSÃO SANGUÍNEA PARA PACIENTES HEMATOLÓGICOS
............................................................................................................................... 31
12
4.4 SEGURANÇA TRANSFUSIONAL E A IDENTIFICAÇÃO DE ANTICORPOS
IRREGULARES ..................................................................................................... 32
4.4.1 Identificação de Anticorpos Irregulares ..................................................... 37
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 39
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .......................................................................... 41
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1 INTRODUÇÃO
Anticorpos (Ac) são proteínas plasmáticas que estimulam a imunidade humoral
após se ligarem aos antígenos (ABBAS et al., 2015). Os anticorpos anti-eritrocitários
são produzidos contra epítopos presentes nas superfícies das hemácias (CASTILHO,
2015) e podem ser classificados como regulares e irregulares. Os Ac regulares, são
também chamados de naturais, por não precisarem de uma exposição prévia ao
antígeno para serem formados e, por essa razão, já são esperados que estejam
presentes no plasma do indivíduo, como é o caso dos anticorpos do sistema ABO
(GIRELLO, KHUN, 2016). Os irregulares, são assim chamados por aparecerem após
uma prévia exposição do indivíduo a antígenos não-próprios normalmente
introduzidos através de transfusão sanguínea ou gestação (DANIELS, 2013).
No início do século XX, os grupos sanguíneos A, B e O foram descritos pelo
cientista austríaco Karl Landsteiner e em 1902, Decastello e Sturli descreveram o
grupo AB. Tal descoberta foi considerada um dos avanços mais importantes nas
pesquisas da área médica e desde então, foram descritos mais de 250 antígenos
eritrocitários, organizados em sistemas, séries e coleções (MARTINS et al., 2008).
Os antígenos eritrocitários são determinados ou por estruturas de carboidratos
ou por estruturas protéicas as quais exercem funções variadas de adesão, transporte
e de estrutura. No entanto, somente alguns desses antígenos são específicos das
hemácias (Rh, LandsteinerWiener, Kell e MNSs), a grande maioria está também
presente em células de outros tecidos do corpo humano (BAIN et al., 2017).
A importância clínica principal de um antígeno eritrocitário - e por consequência,
de um sistema de grupo sanguíneo - depende de sua imunogenicidade, ou seja,
capacidade de estimular a produção de anticorpos e esses causarem a destruição de
hemácias transfundidas ou de conseguirem atravessar a barreira placentária e originar
a doença hemolítica peri-natal (DHFRN) (BAIN et al., 2017).
Com origem no artigo 227 da Portaria 158/2016 que redefine o regulamento
técnico de procedimentos hemoterápicos no país, a Portaria de Consolidação das
normas sobre as ações e os serviços de saúde do Sistema Único de Saúde Nº 5,
publicada em 28 de setembro de 2017, determina a realização da pesquisa de
14
anticorpos anti-eritrocitárioss irregulares em doadores e receptores de sangue, bem
como recomenda a utilização de métodos que confirmem a presença de anticorpos
clinicamente significativos (BRASIL, 2017). Com objetivo de auxiliar na identificação
de possíveis anticorpos irregulares, é recomendada a fenotipagem de antígenos
eritrocitários no sangue do receptor dos sistemas Rh (E, e, C, c), Kell (K), Duffy (Fya,
Fyb), Kidd (Jka, Jkb) e MNS (S, s), para pacientes aloimunizados ou aqueles que
estão ou poderão ingressar em esquema de múltiplas transfusões (BRASIL, 2017).
Durante o estágio supervisionado no Hemocentro Dalton Cunha – Hemonorte,
foi possível perceber a importância da realização de testes que garantam que o
processo de transfusão sanguínea seja seguro. Dentre esses testes estão a prova de
compatibilidade, o teste da antiglobulina humana (AGH), a pesquisa de anticorpos
irregulares (PAI) e a identificação de antígenos (fenotipagem eritrocitária), que
diminuem as chances de incompatibilidade entre os componentes sanguíneos que
irão ser transfundidos e o receptor. A quantidade de pacientes politransfundidos
dentro do estado do Rio Grande do Norte que utilizam os serviços do Hemonorte e
que necessitam de hemocomponentes fenotipados, bem como a experiência dentro
do setor de imunohematologia deste hemocentro motivaram a revisão bibliográfica
que será abordada neste Trabalho de Conclusão de Curso.
15
2 OBJETIVOS
2.1 GERAL
Este trabalho teve como objetivo realizar uma revisão da literatura através de
bases de dados científicas sobre os principais anticorpos irregulares encontrados em
pacientes politransfundidos.
2.2 ESPECÍFICOS
Fazer um breve histórico dos sistemas de grupos sanguíneos e correlacionar
com o histórico da transfusão de sangue;
Comentar sobre os antígenos de baixa frequência;
Conceituar anticorpos irregulares;
Comentar a importância clínica da presença dos anticorpos anti-eritrocitários;
Abordar a transfusão de sangue como medida terapêutica para pacientes com
doenças hemolíticas
Correlacionar a importância da identificação dos anticorpos e segurança
transfusional;
16
3 MATERIAIS E MÉTODOS
3.1 TIPO DE ESTUDO
Este trabalho baseou-se em revisão de literatura científica acerca dos principais
anticorpos irregulares encontrados em pacientes politransfundidos.
3.2 OBTENÇÃO DOS DADOS
Foram realizadas pesquisas nas bases de dados científicas: Pubmed, Google
acadêmico e Scientific Electronic Library Online (Scielo), entre os meses de fevereiro
e maio de 2019, fazendo a utilização de palavras-chave em português e em inglês.
Na busca em português foram utilizados termos como: determinação de
anticorpos irregulares, politransfundidos, reação transfusional. As palavras-chave
mais utilizadas para a pesquisa em inglês foram: Unexpected AND antibodies,
erythrocyte AND alloimmunization, red AND blood AND cell AND alloimmunization,
hemolytic AND transfusion AND reactions.
Para o levantamento bibliográfico foram selecionadas as publicações
realizadas entre 2008 e 2019 priorizando as mais recentes com intuito de manter as
informações mais atualizadas. Além disso, foram utilizados livros de referência na
área de imunologia, hematologia e imunohematologia cujos conteúdos foram
correlacionados com as informações mais relevantes dos artigos, além de consultas
ao site do International Society of Blood Transfusion (ISBT) e às Portarias de
Consolidação que regulamentam os procedimentos hematológicos e as ações e
serviços de saúde do Sistema Único de Saúde (SUS).
Foram excluídos os artigos cujo foco principal era a identificação de anticorpos
irregulares em casos de Doença Hemolítica do Feto e do Recém-Nascido.
17
4 RESULTADOS E DISCUSSÃO
No total foram filtrados 31 artigos em português, inglês e francês que possuíam
como abordagem principal a identificação dos anticorpos irregulares em pacientes
politransfundidos para fundamentar a revisão bibliográfica deste trabalho.
4.1 ANTÍGENOS ERITROCITÁRIOS X BREVE HISTÓRICO
Qualquer substância que o organismo reconhece como “não própria” e que
pode ser ligada a um anticorpo ou receptor de célula T é definida como antígeno
(GIRELLO, KHUN, 2016). Os antígenos eritrocitários são estruturas
macromoleculares localizados na superfície da membrana das hemácias e se dividem,
quanto a sua natureza constitutiva, em dois tipos principais: de natureza carboidrato
(glicoproteínas ou glicolipídeos) ou de natureza proteica (Figura 1) (BONIFÁCIO,
NOVARETTI, 2009).
Figura 1. Natureza constitutiva de alguns antígenos eritrocitários
(FONTE: HARMENING, 2015. Adaptado)
A descoberta dos primeiros antígenos de grupos sanguíneos no início do século
XX se deu através de experimentação, quando Landsteiner notou que as hemácias
de alguns indivíduos aglutinavam ao entrarem em contato com o plasma de outras
pessoas. Os próximos antígenos encontrados (MN, P1, LW) foram achados após
pesquisas direcionadas e a grande maioria dos demais foram descritos através da
presença de aloanticorpos em consequência de situações clínicas. Por exemplo,
18
anticorpos anti-c, anti-e e anti-Fya foram achados após reações transfusionais;
enquanto anti-D, anti-K e anti-Jka foram encontrados por causarem a DHFRN (Figura
2) (DANIELS, REID, 2010).
A maioria dos grupos sanguíneos foi encontrada após a introdução do teste
indireto de antiglobulina (TAI) na prática laboratorial., descrito por Coombs e
colaboradores em 1945. Esse teste é também conhecido como pesquisa de
anticorpos irregulares (PAI) ou coombs indireto e até os dias de hoje exerce papel
fundamental na detecção da maioria dos anticorpos eritrocitários da classe IgG (Figura
2) (DANIELS, REID, 2010).
Figura 2. Ano de descoberta dos antígenos dos primeiros 30 sistemas de grupos sanguíneos e natureza constitutiva dos mesmos.
(Fonte: adaptado de DANIELS, REID, 2010).
Atualmente, já é possível determinar as funções desempenhadas pelos
antígenos eritrocitários, que podem exercer mais de uma, e que são essencialmente:
proteínas estruturais (grupo Gerbich), de transporte (Diego, Kidd e Colton),
19
receptores/moléculas de adesão (Duffy e MNS), função enzimática (Kell e Dombrock),
de complemento (sistemas Chido/Rodgers e Knops), proteínas regulatórias dentre
outras (Figura 3) (ANSTEE, 2011; BAPTISTA et al., 2011).
Todavia, o grande número e a diversidade estrutural dos antígenos de grupos
sanguíneos dificultam os estudos de aloimunização eritrocitária (HENDRICKSON,
TORMEY, 2016).
Figura 3. Representação de alguns antígenos eritrocitários de acordo com suas funções.
(Fonte: BONIFÁCIO, NOVARETTI, 2009).
4.1.1 Antígenos de baixa frequência.
Antígenos de baixa frequência são aqueles que estão expressos em poucos
indivíduos, isso quer dizer que é mais facilitado o desenvolvimento de anticorpos
contra esses os antígenos. O exemplo mais comum para ilustrar essa particularidade
é através dos antígenos do sistema Kell, no qual o antígeno k é de alta frequência e o
antígeno K é de baixa frequência, dessa forma o desenvolvimento de anticorpos anti-
K é mais comum (GIRELLO, KHUN, 2011). Anticorpos para os antígenos de Kell de
baixa frequência são raros porque são poucas pessoas que são expostas a esses
antígenos. Como os eritrócitos de detecção de anticorpos de rotina não carregam
antígenos de baixa frequência, os anticorpos são detectados com mais frequência
20
através de incompatibilidades inesperadas ou casos de DHFRN (HARMENING,
2015).
4.2 SISTEMAS DE GRUPOS SANGUÍNEOS
Com o avanço dos estudos moleculares nos últimos anos, a Sociedade
Internacional de Transfusão Sanguínea (ISBT) reconhece atualmente 36 sistemas de
grupos sanguíneos. Segundo a ISBT, para um antígeno formar um novo sistema de
grupo sanguíneo ele precisa seguir alguns critérios que são: ser definido por um
aloanticorpo humano; ser de natureza hereditária; o gene que codifica deve ter sido
identificado e sequenciado; a localização no cromossomo precisa ser conhecida; o
gene deve ser diferente, e não homólogo, de todos os outros genes já existentes que
codificam antígenos de sistemas de grupos sanguíneos (ISBT, 2019).
Figura 4. Cariótipo masculino humano, mostrando a localização cromossômica do grupo sanguíneo e genes associados
(FONTE: DANIELS, 2013)
21
Os sistemas de grupos sanguíneos, em sua maioria, contêm fenótipos nulos
nos quais nenhum dos antígenos do sistema é expresso nas hemácias. Estes
fenótipos surgem frequentemente em decorrência de homozigose de mutações
inativadoras que impedem a produção de qualquer transcrição viável ou do produto
proteico. Essas mutações em genes que afetam outras proteínas são raras e
geralmente não são detectadas, a menos que sejam patogênicas. Todavia, a ausência
da proteína de superfície nas hemácias pode levar à produção de anticorpos que
podem ser identificados e a partir de então fornecerem informações sobre as funções
do grupo sanguíneo e de proteínas relacionadas (DANIELS, 2010).
A maioria dos polimorfismos do grupo sanguíneo resulta de polimorfismos de
nucleotídeo único (SNPs) que codificam as substituições de aminoácidos em um
domínio glicosiltransferase ou extracelular de uma proteína da membrana de células
vermelhas (DANIELS, 2010).
Por causa da frequência de seus antígenos na população e por sua alta
imunogenicidade, além da probabilidade de seus respectivos anticorpos ocasionarem
hemólise, para a medicina transfusional os sistemas de grupos sanguíneos mais
relevantes são: ABO, Rh, Kell, Duffy, Kidd, Lewis, MNS e Diego (MATTOS, 2005;
KOURY;TRAINA, 2018).
Tendo origem na Portaria 158/2016, a Portaria de Consolidação das normas
sobre as ações e os serviços de saúde do Sistema Único de Saúde Nº 5/2017 em seu
artigo 177 § 18 determina a realização da fenotipagem para os antígenos eritrocitários
no sangue do receptor para os sistemas Rh (E, e, C e c), Kell (K), Duffy (Fya e Fyb),
Kidd (Jka e Jkb) e MNS (S e s), para pacientes aloimunizados contra antígenos
eritrocitários, que poderão entrar em esquema de transfusão crônica, com o objetivo
de auxiliar a identificação de possíveis anticorpos anti-eritrocitárioss irregulares, assim
como de realizar transfusão fenótipo compatível, quando possível (BRASIL, 2017).
A seguir serão apresentados alguns sistemas mais importantes na medicina
transfusional, dentre os 36 atualmente existentes.
22
Tabela 1 Principais sistemas de grupos sanguíneos
Numero Nome Símbolo Nome do Gene ISBT
(HGNC)
Localização no
cromossomo
Número de
antígenos
001 ABO ABO ABO (ABO) 9q34.2 4
002 MNS MNS MNS
(GYPA,GYPB,GYPE)
4q31.21 46
004 Rh RH RH (RHD, RHCE) 1p36.11 52
006 Kell KEL KEL (KEL) 7q33 32
007 Lewis LE LE (FUT3) 19p13,3 6
008 Duffy FY FY (DARC) 1q 21-q22 6
009 Kidd JK JK (SLC14A1) 18q 11-q12 3
010 Diego DI DI (SLC4A1) 17q 21.31 22
(FONTE: HARMENING, 2015 adaptado)
4.2.1 Sistema ABO (ISBT 001)
Os antígenos do sistema ABO (A, B, AB e A1) estão presentes não somente
nas membranas das hemácias como também em tecidos e fluidos orgânicos e em
outros tipos celulares como linfócitos, plaquetas e células da mucosa gástrica, por
exemplo. Por essa razão o sistema é considerado o mais importante na prática
transfusional e seus antígenos também são antígenos de histocompatibilidade
(GIRELLO, KHUN, 2011).
A estrutura bioquímica destes antígenos é composta de carboidratos que fazem
parte do glicocálice celular e possuem a função de proteção da célula. Os genes ABO
não codificam diretamente os antígenos do sistema, e sim, enzimas que adicionam
carboidratos à uma substância precursora presente nos eritrócitos. A expressão dos
antígenos é controlada por três locus gênicos separados: o ABO localizado no
cromossomo 9 e FUT1 (H) e FUT2 (Se), ambos localizados no cromossomo 19, os
quais são herdados em codominância (HARMENING, 2015).
23
4.2.1.1 Anticorpos ABO
Os anticorpos ABO são ditos como naturais por estarem presentes no plasma
sem a necessidade de uma prévia sensibilização por transfusão ou gestação
incompatíveis. A teoria mais aceita e descrita na literatura é a de que os mesmos são
formados através de estímulos passivos, principalmente através da microbiota
intestinal., mas também de outros estímulos externos como poeira e alimentos, pois
os açucares presentes nas membranas destas células se assemelham aos açucares
dominantes dos antígenos A e/ou B e por essa razão, os anticorpos anti-A e/ou Anti-
B são também classificados de “regulares” já que são esperados que estejam
presentes no plasma dos indivíduos que não apresentam o antígeno correspondente
(GIRELLO, KHUN, 2011).
Pelo fato dos anticorpos do sistema ABO não serem considerados irregulares,
sempre que houver a necessidade de uma transfusão sanguínea ou um transplante
de órgão, é de extrema importância levar em consideração a prévia existência desses
anticorpos no plasma. Se feita de modo incompatível, as hemácias do doador serão
destruídas quase que imediatamente, em uma velocidade de aproximadamente 1 ml
de hemácias por minuto (SILVA, 2016; HARMENING, 2015). Dessa maneira, a reação
transfusional é muito grave ou até mesmo fatal ao paciente. A rejeição imediata do
órgão transplantado é uma possibilidade considerável quando há incompatibilidade
ABO (HARMENING, 2015).
Segundo o Artigo 176 da Portaria de Consolidação Nº 5/2017 (Com origem na
Portaria 158/2016, Artigo 177) são obrigatórios os testes pré-transfusionais que
incluem entre outros a tipagem ABO (direta e reversa) (Figura 5). A determinação
correta da tipagem ABO é fundamental para a prática transfusional (GIRELLO, KHUN,
2011).
24
Figura 5 Fenotipagem ABO provas direta e reversa (FONTE: HARMENING, 2015. Adaptado.)
4.2.2 Sistema MNS (ISBT 002)
Os antígenos M e N foram descobertos em 1927 por Landesteiner e o antígeno
S só foi descrito 20 anos depois. Tem uma diversidade antigênica vasta (GIRELLO,
KHUN, 2011).
Os antígenos M e N estão associados à uma glicoproteína chamada MN-
sialoglicoproteina (MNSGP) ou glicoforina A (GPA) (VIZZONI, 2013). Se diferenciam
entre si em apenas dois aminoácidos (GIRELLO, KHUN, 2011). São detectados na 9a
semana de gestação e estão bem desenvolvidos ao nascimento (SILVA,2016). Os
antígenos U, S e s estão localizados na glicoforina; os Ags S e s se diferem numa
substituição de aminoácidos (S – metionina e s – treonina. (GIRELLO, KHUN, 2011).
Segundo Bonifácio e colaboradores, células que não expressam GPA são mais
resistentes à invasão pelo Plasmodium falciparum do que células normais
(BONIFÁCIO et al., 2009).
4.2.2.1 Anticorpos do sistema MNS
O anti-M é um anticorpo relativamente comum e em grande maioria é do tipo
IgM. São raros os exemplos reativos a 37° C e são os que podem ocasionar reações
hemolíticas transfusionais (BAIN et al.,2017). Geralmente não fixa complemento e são
raros os casos de DHFRN ocasionados pelo anti-M (GIRELLO, KHUN, 2011).
25
O anti-N é incomum e não tem significado clínico. Anti-S e anti-s são geralmente
IgG; ambos têm, raramente, sido implicados em reações transfusionais hemolíticas e
DHFRN (BAIN et al., 2017).
Pacientes que possuem fenótipo S-s-U- ou S-s-U+var, quando expostos a
eritrócitos que possuem Ags U (U+), podem produzir aloanticorpo anti-U, o qual pode
ocasionar reações transfusionais graves (FARIA et al., 2012).
4.2.3 Sistema Rh (ISBT 004)
Composto por mais de 50 diferentes antígenos, o sistema Rh é o mais
polimórfico dentre todos os demais sistemas. O locus RH é composto por 2 genes
homólogos, RHD e RHCE, que codificam, respectivamente, o antígeno D e os
antígenos CE em diversas combinações (ce, cE, Ce, ou CE). Herdados como
haplótipos, o RHD e RHCE são expressos exclusivamente nos eritrócitos. A
diversidade genética do locus RH foi revelada na última década, com o RHCE tendo
80 alelos e o RHD possuindo mais de 200, os quais codificam potencialmente
antígenos variantes ou alterados devido a alterações de aminoácidos nas proteínas
Rh (CHOU et al., 2013).
Três categorias variantes de D foram distinguidas em estudos sorológicos: D
fraco, D parcial e DEL1 do tipo selvagem ou convencional. Os alelos RHD são
categorizados por mutações que levam a mudanças qualitativas e/ou quantitativas em
expressão do antígeno D (SANDLER et al., 2015). O fenótipo D fraco antigamente era
designado como Dᵘ e definiam as hemácias que aglutinavam somente em fase da
antiglobulina humana. Atualmente, é definido quando há uma reação de aglutinação
fraca ou até mesmo negativa com o soro anti-D (≤ 2+), mas aglutinando moderada ou
fortemente com a técnica de Coombs Indireto (também conhecida como pesquisa de D
fraco) (SANDLER et al., 2015; GIRELLO, KHUN, 2011). Fenótipos D parciais estão
associados a substituições de aminoácidos na proteína RhD na superfície de eritrócitos
e não possuem todos os epítopos D (SANDLER et al., 2015).
1 O fenótipo DEL é uma variação do fenótipo RhD fraco, possui baixa expressão quantitativa do antígeno.
26
4.2.3.1 Anticorpos anti-Rh (anti-D)
O sistema Rh é considerado o segundo mais importante depois do ABO, em
decorrência da imunogenicidade de seus principais antígenos (D, C, c, E, e) que são
capazes de estimular a produção de anticorpos de classe IgG, que podem ultrapassar
a barreira placentária e ocasionar a DHFRN, além da ocorrência de seus anticorpos
poder ocasionar reações hemolíticas imediatas devido à destruição extravascular dos
glóbulos vermelhos, em indivíduos politransfundidos que tenham se sensibilizado
previamente (NARDOZZA et al., 2010).
4.2.4 Sistema Kell (ISBT006)
O sistema de grupo sanguíneo Kell foi o primeiro descoberto após a introdução
do teste da antiglobulina. O gene KEL está localizado no cromossomo 7q e os
polimorfismos existentes nesse sistema estão associados a mutações de ponto que
substituem aminoácidos na proteína (GIRELLO, KHUN, 2011).
É considerado o 3º sistema mais potente após ABO e Rh, pela imunogenicidade
e por seus antígenos já serem bem desenvolvidos em recém-nascidos. O antígeno K,
por exemplo, pode ser detectado em hemácias fetais em até 10 semanas e já é bem
desenvolvido ao nascimento (HARMENING, 2015).
Descrito em 1949, o antígeno k (também chamado de cellano), é o antitético de
alta prevalência para K, já tendo sido detectado em hemácias de fetos com 7 semanas
(HARMENING, 2015). Juntos, K e k eram conhecidos como antígenos Kell/Cellano,
que agora são denominados K / k ou KEL1 / KEL2. Até hoje, a referência ao antígeno
K frequentemente é confundida pelo uso do termo “Kell”, porque é também o nome do
sistema de grupo sanguíneo (DENOMME, 2015).
Um total de 36 antígenos já foram identificados (K1-K36) (ISBT, 2019), mas três
conjuntos de alelos intimamente ligados são os mais clinicamente importantes: K
(KEL1) k (KEL2); Kpa (KEL3), Kpb (KEL4) e Kpc (KEL21); e Jsa (KEL6) e Jsb (KEL7).
Esses antígenos são codificados por alelos no loci KEL no cromossomo 7, mas sua
produção também depende de genes no locus XK no cromossomo X (BAIN, 2017).
27
4.2.4.1 Anticorpos do sistema Kell
O anti-K foi identificado após a ocorrência de DHFRN em 1946, na qual
constatou-se que o anticorpo presente no soro da mãe reagia com os eritrócitos de
seu recém-nascido. Após outros testes viu-se que ele também reagia em contato com
hemácias de sua filha mais velha, de seu marido e com 7% de uma população
aleatória (HARMENING, 2015). Os anticorpos do sistema Kell reagem em fase AGH
e podem ocasionar, além da DHFRN, reações hemolíticas graves agudas ou tardias
(GIRELLO, KHUN, 2011).
Assim como os demais anticorpos do sistema Kell, o anti-K é comumente IgG
e estatisticamente, é o mais frequentemente encontrado excetuando-se aqueles
pertencentes aos sistemas ABO e Rh (DANIELS, 2013). Outros anticorpos imunes
dirigidos contra antígenos de Kell são menos comuns e a presença de alguns desses
anticorpos, como anti-k, anti-Kpᵇ e anti-Jsᵇ, pode aumentar consideravelmente a
seleção de bolsas que sejam unidades antígeno-negativas para transfusão (BAIN et
al., 2017; DANIELS, 2013).
O anti-K frequentemente reage mal em soluções de baixa força iônica (LISS) e
menos moléculas de anti-K se ligam aos eritrócitos na LISS do que na solução salina
de força normal. Problemas na detecção de anti-K também foram encontrados em
sistemas automatizados (DANIELS, 2013).
4.2.5 Sistema Lewis (ISBT 007)
O sistema de grupo sanguíneo Lewis é único porque seus antígenos não são
intrínsecos aos eritrócitos, mas estão nos glicoesfingolipídeos do tipo 1 que são
adsorvidos passivamente na membrana das hemácias a partir do plasma
(HARMENING, 2015).
Para que haja a expressão fenotípica de antígenos Le, o gene Lewis (FUT3),
localizado no cromossomo 19p-13.3 e o gene homólogo secretor (FUT2) produzem
duas enzimas que agem sob a mesma substância e produzem os antígenos Leª e H;
a interação desses últimos produz a especificidade do antígeno Leᵇ. Por essa razão,
os sistemas ABO, H e LE são considerados associados (GIRELLO, KHUN, 2011).
28
4.2.5.1 Anticorpos Lewis
Os anticorpos Lewis anti-Leª e anti-Leᵇ raramente podem vir a causar hemólise
in vivo. Por serem de classe IgM e em hemácias fetais e neonatais a expressão dos
antígenos ser mínima, os anticorpos também não são causadores de DHFRN (IRANI
et al., 2015).
4.2.6 Sistema Duffy (ISBT 008)
O sistema Duffy é composto por 5 antígenos: Fyᵃ, Fyᵇ, Fy3, Fy5, Fy6, estando
o gene FY localizado no cromossomo 1q (ISBT, 2019). Os antígenos Fyᵃ e Fyᵇ estão
presentes em células fetais de 6 a 7 semanas e não são exclusivos dos eritrócitos,
estando presentes também em células epiteliais, endoteliais, células de órgãos como
rins, cérebro, fígado, pâncreas e coração (GIRELLO, KHUN,2011).
Os polimorfismos do sistema Duffy são utilizados para avaliação do impacto da
seleção natural em diferentes regiões geográficas, uma vez que a mutação no gene
FY confere proteção contra infecção por Plasmodium vivax (HӦHER et al., 2018). Em
1975, Miller e seus colaboradores mostraram que a proteína do grupo sanguíneo Duffy
desempenhava um papel importante na invasão das hemácias pelo parasita da
malária P. vivax (DANIELS, REID, 2010).
Enquanto o Plasmodium falciparum usa uma série de receptores da superfície
eritrocitária para efetivar sua invasão, sabe-se que Plasmodium vivax e Plasmodium
knowlesi dependem de uma interação com o antígeno Duffy, o que significa que
hemácias que não possuem o antígeno não são invadidas por esses merozoítas, por
serem inacessíveis a eles (HӦHER et al., 2018). Dessa maneira, indivíduos com o
fenótipo conhecido como Fy (a-b-), comum na África, mas raro em outras populações,
são naturalmente resistentes à malária por P. vivax (DANIELS, REID, 2010).
O fenótipo Fy (a-b-) é resultado da homozigose que gera um SNP em um fator
de transcrição específico do eritrócito, que se liga à região promotora do gene Duffy.
O efeito dessa mutação é específico das hemácias, assim esses indivíduos com
29
hemácias Fy (a-b-), possuem a glicoproteína Duffy normalmente nos demais tecidos
(HӦHER et al., 2018).
4.2.6.1 Anticorpos Duffy
Os anticorpos do sistema Duffy são geralmente IgG e são clinicamente
significantes, podendo fixar complemento (GIRELLO, KHUN, 2011). Os anticorpos
para os antígenos do sistema são bem documentados em vários estudos e relatos de
casos, sendo responsáveis por reações transfusionais imediatas e tardias bem como
DHFRN. Embora os casos de DHFRN causados por anticorpos Duffy serem
relativamente leves, as reações transfusionais causadas por esses anticorpos são
frequentemente graves (HӦHER et al., 2018).
O anticorpo anti-Fyᵃ é encontrado principalmente após transfusão e, menos
frequentemente, como resultado de gravidez incompatível; quase nunca ocorre
naturalmente. O anti-Fyᵇ é cerca de 20 vezes menos comum que o anti-Fyᵃ e
geralmente está presente no soro em combinação com outros anticorpos (HӦHER et
al., 2018).
4.2.7 Sistema Kidd (ISBT 009)
Os três antígenos do sistema (Jka, Jkb e Jk3) foram descritos entre os anos de
1951 e 1953, possuem sua expressão controlada pelo gene SLC14A1 (GIRELLO,
KHUN, 2011) o qual é herdado como característica autossômica codominante e esses
Ags são comumente encontrados nos glóbulos vermelhos da maioria dos grupos
populacionais, apresentando, contudo, frequências variadas entre as diferentes
populações (HAMILTON, 2015).
Os antígenos Jkᵃ (JK1) e Jkᵇ (JK2) são produtos de alelos e são polimórficos
em todas as populações testadas (DANIELS, 2013). A glicoproteína codificada pelo
gene possui função de transporte de ureia, que preserva a estabilidade osmótica e
deformabilidade das hemácias (GIRELLO, KHUN, 2011). O transporte de ureia
através da glicoproteína Kidd nas hemácias é feito de maneira rápida intra e extra-
30
celular para prevenção da desidratação quando os eritrócitos atravessam altas
concentrações de uréia na medula renal (BONIFÁCIO, NOVARETTI, 2009).
Os antígenos do sistema Kidd não são exclusivamente eritrocitários, podem ser
encontrados em células endoteliais renais (GIRELLO, KHUN, 2011), além de já terem
sido encontrados em outros tecidos de órgãos como: cólon, , cérebro, próstata, fígado,
pâncreas, bexiga e outros. O propósito exato do transportador de ureia em células
não-eritróides e não-renais ainda continua desconhecido (HAMILTON, 2015).
4.2.7.1 Anticorpos Kidd
Anti-Jkᵃ e -Jkᵇ são bem conhecidos por sua queda rápida e significativa na
titulação para níveis tão baixos que são difíceis de serem detectados pelos métodos
sorológicos de rotina (HAMILTON, 2015). Isso ocorre devido ao que se chama de
efeito de dose que acontece principalmente nos sistemas Rh,MNS, Kidd e Duffy. A
maioria dos antígenos eritrocitários são herdados de maneira codominante (GIRELLO,
KHUN, 2011). Um indivíduo que é heterozigoto para determinado sistema, no caso do
sistema Kidd (Jka + e Jkb +), dessa maneira, ele possui dose única para ambos os
antígenos; um indivíduo homozigoto para Jkb (Jka- Jkb+) possui dose dupla de Jkb.
O efeito de dose acontece quando um anticorpo reage mais fracamente ou então não
reage com eritrócitos que apresentam dose única de um determinado antígeno. Dessa
maneira, o indivíduo com anti-Jk, por exemplo, pode apresentar PAI negativo e provas
de compatibilidade compatíveis se as hemácias testadas tiverem apenas expressão
de Jkb (hemácias Jka- Jkb+) ou tiverem dose única de Jka (Jk a+b+). Nesses casos,
a genotipagem garante a segurança transfusional e evita uma possível reação
hemolítica tardia. (CHAFFIN, 2019).
Portanto, é importante fazer um histórico prévio de anticorpos, para evitar uma
reação hemolítica pós-transfusional que pode acontecer devido a um anticorpo que
estava abaixo do nível de detecção antes da transfusão (BAIN et al., 2017).
Silva (2016) chama atenção para a associação de casos de AHAI e o
aparecimento de autoanticorpos com especificidade para Kidd (Jka, Jkb e Jk3)
relacionados ao uso de medicamentos, como a alfametildopa e a clorpropamida. Esse
anticorpo faz reação cruzada com outros três medicamentos, todos contendo um
grupo ureia: acetoexamida, tolbutamida e tolazamida (SILVA, 2016).
31
4.2.8 Sistema Diego (ISBT 010)
O sistema Diego é composto por 22 antígenos, sendo antígenos de baixa ou
alta frequência. Os mais conhecidos são Diᵃ/Diᵇ e Wrᵃ/Wrᵇ. O gene SLC4A1 controla
a expressão dos antígenos (GIRELLO, KHUN, 2011) é composto por 20 exons e está
localizado no cromossomo 17q21-q22 (HARMENING, 2015).
O antígeno Di (b +) é altamente prevalente em diferentes populações, dessa
maneira o anti-Diᵃ é mais frequentemente encontrado do que o anti-Diᵇ entre gestantes
e pacientes politransfundidos (NATHLANG et al., 2016).
4.2.8.1 Anticorpos do sistema Diego
Os anticorpos do sistema Diego são geralmente IgG, e reagem no teste da
antiglobulina indireta. Tanto anticorpos anti-Diᵃ quanto o anti-Diᵇ podem causar
reações hemolíticas transfusionais quanto DHFRN (HARMENING, 2015). O anti-Diᵃ
pode ocorrer sem que haja uma prévia sensibilização, porém há relatos de sua
produção após gestação (GIRELLO,KHUN, 2011). O Anti-Wrᵃ é um anticorpo
relativamente comum em doadores e pacientes, a maioria precisa do TAI para que
seja detectado, embora sejam relatados casos de aglutinação na fase salina. O Anti-
Wrᵃ já causou reações transfusionais graves (HARMENING, 2015).
4.3 IMPORTÂNCIA DA TRANSFUSÃO SANGUÍNEA PARA PACIENTES HEMATOLÓGICOS
As transfusões de concentrados de hemácias são essenciais para o tratamento
de indivíduos portadores de doenças hematológicas como talassemia, doença
falciforme e outras doenças sanguíneas graves (CHOU, LIEM, THOMPSON, 2012) e
objetivam melhorar a capacidade de transporte de oxigênio e o fluxo de sangue na
microcirculação de modo a contribuir para a prevenção de eventos vaso-oclusivos
(como por exemplo acidente vascular encefálico) bem como também prevenindo o
desenvolvimento de anemia hemolítica crônica desses pacientes (VIZZONI,
MOREIRA, 2017).
32
Pacientes com esses distúrbios hematológicos, normalmente estão em
protocolo de transfusões crônicas prolongadas, fato que aumenta o risco de reações
transfusionais hemolíticas tardias, aloimunização, reações transfusionais agudas,
doenças infecciosas transmitidas por transfusão, além da possibilidade de haver a
sobrecarga de ferro induzida pela transfusão (CHOU, LIEM, THOMPSON, 2012).
4.4 SEGURANÇA TRANSFUSIONAL E A IDENTIFICAÇÃO DE ANTICORPOS IRREGULARES
Os anticorpos dos grupos sanguíneos que possuem a capacidade de iniciar a
hemólise dos glóbulos vermelhos podem causar reações transfusionais hemolíticas.
Esses eventos podem ser imediatos e intravasculares, imediatos e extravasculares,
ou tardios e extravasculares (DANIELS, REID, 2010).
Os anticorpos ABO são de classe IgM e são extremamente importantes nas
provas de compatibilidade realizadas nos hemocentros. Por possuírem estrutura
pentamérica são capazes de aglutinar as hemácias em meio salino e por essa razão
também são chamados de completos. São chamados de naturais ou regulares por já
serem esperados que estejam presentes no plasma dos indivíduos sem a
necessidade de uma prévia sensibilização (GIRELLO, KHUN, 2011). Apesar da
incompatibilidade ABO ser extremamente perigosa por causar reações hemolíticas
agudas, os anticorpos desse sistema não são o foco desse estudo justamente por não
se tratarem de anticorpos irregulares.
Os anticorpos irregulares são assim chamados porque não se espera que eles
estejam presentes no plasma do indivíduo. Eles aparecem normalmente após
transfusão sanguínea ou gestação cujos antígenos eritrocitários não-próprios são
expostos ao sistema imune (DANIELS, 2013). Por não estarem presentes nas
hemácias do paciente, os antígenos presentes nas hemácias do doador são
considerados estranhos ao organismo e essa sensibilização estimula a produção de
anticorpos direcionados contra esses antígenos (VIZZONI, MOREIRA, 2017). A
presença de anticorpos irregulares em pacientes politransfundidos dificulta a obtenção
de concentrado de hemácias compatíveis e pode acarretar em reações transfusionais
imediatas (agudas) ou tardias. Para prevenção da ocorrência de reações
33
transfusionais, a fenotipagem eritrocitária em pacientes politransfundidos é de suma
importância (PINTO, BRAGA, SANTOS, 2011).
Os anticorpos irregulares encontrados com maior frequência nos estudos
direcionados são aqueles pertencentes aos sistemas Rh e Kell justamente por se
tratarem dos dois sistemas mais imunogênicos (Tabela 2). Outros anticorpos que
também aparecem nesses estudos são os dos sistemas Duffy, MNS, Lewis e Kidd
(MARTINS et al.,2008; BAPTISTA et al., 2011; ALVES et al., 2012; CHOU et al., 2013;
CAMPBELL-LEE et al., 2014). Baptista et al. (2011) chamam a atenção para a
frequência do sistema Diego possuir grandes variações no Brasil devido à
miscigenação e por isso depende da população estudada.
Segundo Hendrickson e Tormey (2016), o fato da expressão de alguns
antígenos eritrocitários não se restringir às hemácias, mas também serem expressos
em outros órgãos torna a identificação de anticorpos irregulares relevante não
somente em casos de transfusão sanguínea ou gestação, como também em casos de
transplante de órgãos. Por exemplo, já foi descrito que a presença de aloanticorpos
anti-Jk interferiram nos resultados de rins transplantados de doadores Jk-positivos.
Tabela 2 Principais aloanticorpos encontrados em indivíduos politransfundidos
Autor (es)/Ano Público Alvo
aloimunizado
Acs mais frequentes
Martins et al. (2008) 173 Politransfundidos
Uberaba/MG - BR
Anti-D (24,28%)
Anti-E (18,5%)
Anti-K (13,87%)
Baptista et al. (2011) 21 pacientes de um
Hospital Infantil
Curitiba/PR - BR
Anti-K (14,3%)
Anti-Diᵃ (9,5%)
Anti-M (9,5%)
34
Cruz et al. (2011) 227 politransfundidos em
São Paulo/SP - BR
Anti-E (20%)
Anti-D (12%)
Anti-K (11%)
Helman et al. (2011) 57 pacientes com doença
falciforme em um centro
de São Paulo/SP
Anti-K (26,6%)
Anti-C (20%)
Anti-Diego (20%)
Fasano et al. (2014) 52 pacientes com anemia
falciforme de um Hospital
Infantil Washington/DC -
EUA
Anti-E (30,4%)
Anti-C (25,3%)
Anti-K (16,5%)
Datta et al. (2015) 28 pacientes talassemicos
de um Hospital em
Kolkata-Índia
Anti-c (28,57%)
Anti-E (21,42%)
Anti-Jkᵇ (7,14%)
Pessoni et al. (2018) 28 pacientes em um
hospital de Goiânia/GO-
BR
Anti-E (29,4%)
Anti-K (29,4%)
Anti-D (17,6%)
Valle-Neto et al. (2018) 24 pacientes
politransfundidos no
Hemocentro de
Uberaba/MG-BR
Anti-E (21,87%)
Anti-K (21,87%)
Anti-C (12,50%)
BR: Brasil; MG: Minas Gerais; PR: Paraná; GO: Goiás; SP: São Paulo; EUA: Estados Unidos
Dessa forma, a aloimunização acarreta implicações negativas aos receptores
politransfundidos além do aumento do risco de reação transfusional hemolítica, há
também a possibilidade de ocorrência do aparecimento de anemia hemolítica
autoimune, DHFRN e danos a tecidos transplantados (SILVA, 2016). Indivíduos que
já fizeram mais de uma transfusão sanguínea têm alta probabilidade de formar
aloanticorpos eritrocitários isolados ou em combinação, autoanticorpos, e anticorpos
contra antígenos de baixa frequência (CRUZ et al. 2011). Além desse fato, sabe-se
que o surgimento de anticorpos irregulares está relacionado também à idade do
paciente, ao número de transfusões recebidas e às diferenças antigênicas entre
pacientes e doadores (HELMAN, CANÇATO, OLIVATTO, 2011).
35
Além das discrepâncias entre doador e receptor, outros fatores de risco para a
ocorrência da aloimunização estão associados aos fatores genéticos de um subgrupo
de indivíduos caracterizados como “good responders”, dessa forma fica impossível
prever como os pacientes irão reagir antes de suas primeiras transfusões (THONIER,
2019).
Outro fato que afeta diretamente a aloimunização eritrocitária é o estado
patológico dos receptores. Fasano e colaboradores (2015) apresentaram evidências
clínicas em pacientes com anemia falciforme que estavam com quadros pré-
inflamatórios no momento da transfusão, principalmente a síndrome torácica aguda,
que estes possuíam maiores chances de desenvolverem anticorpos irregulares.
Somados a esses fatores ainda existem outras variáveis que podem servir
como gatilhos para a aloimunização (Figura 6). Fatores intrínsecos aos próprios
antígenos eritrocitários são pontos chaves no desenvolvimento de aloanticorpos. Os
antígenos RhD, por exemplo, por possuírem tamanho e exposição maiores na
membrana das hemácias que os antígenos do sistema Kell e Duffy, têm maior
capacidade de desencadear anticorpos irregulares, por exemplo (HENDRICKSON,
TORMEY, 2016).
36
Figura 6 Modelo esquemático de potenciais fatores como gatilhos para aloimunização eritrocitária.
(FONTE: HENDRICKSON,TORMEY, 2016. Adaptado)
O artigo 178 § 3º da Portaria de Consolidação das normas sobre as ações e os
serviços de saúde do Sistema Único de Saúde Nº 5, publicada em 28 de setembro de
2017 recomenda a identificação da especificidade do(s) anticorpo(s) quando forem
positivos os resultados da pesquisa de anticorpos anti-eritrocitários irregulares
(BRASIL, 2017).
O conhecimento das frequências fenotípicas dos antígenos de glóbulos
vermelhos em uma população é útil para criar um banco de dados de doadores e
ajudar na busca de sangue compatível com o antígeno-negativo com mais rapidez
além de prevenir a ocorrência da aloimunização (ROMPHRUK et al., 2019).
37
4.4.1 Identificação de Anticorpos Irregulares
Quando um anticorpo é detectado na triagem de anticorpos, sua especificidade
deve ser determinada, e sua provável significância clínica deve ser avaliada antes que
o sangue seja selecionado para transfusão (BAIN et al., 2017). O teste de antiglobulina
indireta (TAI/Coombs Indireto) é considerado um método confiável e eficaz para
detectar anticorpos irregulares clinicamente significativos (ENKO et al., 2014).
Embora a fenotipagem seja essencial para a confirmação da presença de
aloanticorpos e também para a detecção de antígenos do grupo sanguíneo, a
fenotipagem sofre de certas limitações técnicas porque é um teste subjetivo e muitos
antígenos não estão comercialmente disponíveis (HӦHER et al., 2018).
A fenotipagem de pacientes com AHAI que foram recentemente transfundidos,
que possuem glóbulos vermelhos revestidos com IgG, podem dificultar a diferenciação
de um aloanticorpo de um autoanticorpo em pessoas que apresentam algum antígeno
positivo. Nestas situações, a genotipagem do grupo sanguíneo provou ser uma
excelente alternativa à fenotipagem (HӦHER et al., 2018).
Martins et al. (2009) corroboram com esta afirmativa ao elucidarem dois casos
de discrepâncias apresentadas na fenotipagem para o sistema Rh, os quais
apresentavam anticorpos anti-e apesar de terem sido fenotipados como e+. Através
da genotipagem somada às positividades de ambos TAD e da especificidade anti-e
na eluição das hemácias, chegou-se à conclusão de que se tratavam de
autoanticorpos.
Embora os métodos moleculares sejam considerados mais sensíveis e
específicos, é importante levar em consideração que a presença de um determinado
gene não garante sua expressão na hemácia, ou seja, pacientes com fenótipos nulos
podem ser fenotipados como positivos para um determinado antígeno (QUIRINO et
al., 2018).
Balbuena-Merle e Hendrickson (2019) sugerem que se triagens de anticorpos
fossem realizadas em pacientes politransfundidos em intervalos definidos após a
transfusão, mais aloanticorpos eritrocitários seriam detectados do que o método que
38
é realizado atualmente de triagem aleatória (antes da próxima transfusão). Além disso,
Sloan (2016) evidencia a importância de se manter um histórico de anticorpos para
cada paciente, já que existe a possibilidade de anticorpos irregulares se tornarem
indetectáveis com o passar do tempo, como é o caso dos Acs do sistema Kidd. Com
esse histórico, pode-se evitar que sejam transfundidas hemácias que possuem
antígenos para os quais o paciente já tenha produzido anticorpos (SLOAN et al.,
2016).
39
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com a intenção de realizar uma revisão bibliográfica acerca dos principais
anticorpos irregulares em politransfundidos, demonstrando não somente a
importância da pesquisa da presença desses anticorpos como principalmente a
identificação dos mesmos na prática da transfusão sanguínea,os objetivos propostos
para esse trabalho foram, de maneira geral., alcançados, constatando-se que:
O breve histórico dos principais sistemas de grupos sanguíneos foi
apresentado evidenciando não somente seus antígenos como também os
anticorpos de maior importância para a medicina transfusional.
Os antígenos de baixa frequência foram abordados dando ênfase ao fato de
que por serem de baixa frequência é mais comum que sejam desenvolvidos
anticorpos contra eles.
O conceito de anticorpos irregulares foi introduzido evidenciando-se também
seu significado clínico.
A importância clínica da identificação da presença de aloanticorpos foi
abordada explicando-se que não há como prever quais pacientes irão de fato
produzir aloanticorpos e desenvolver reações hemolíticas. Desse modo, para
reduzir a ocorrência da aloimunização, preconiza-se a realização da pesquisa
de anticorpos irregulares tanto em doadores quanto em receptores de sangue.
A transfusão de sangue foi abordada evidenciando-se que pacientes com
doenças hematológicas utilizam-se dessa medida terapêutica para reduzir a
morbidade e mortalidade de suas enfermidades.
Demonstrou-se que a identificação da presença de anticorpos irregulares no
plasma de indivíduos politransfundidos é de extrema importância na prática
transfusional e o uso de hemocomponentes com fenotipagem dos sistemas Rh
(D, C, c, E, e), Kell (K), Duffy (Fya, Fyb), Kidd (Jka, Jkb) e MNS (S, s), reduz os
casos de aloimunização e de reações transfusionais hemolíticas nesses
pacientes.
Em conclusão, a aloimunização eritrocitária além de ser originada por uma série
de fatores intrínsecos tanto do doador quanto do receptor, também sofre influências
40
ambientais, como por exemplo algum processo inflamatório que corrobora para maior
susceptibilidade do aparecimento de anticorpos irregulares. Por essa razão é
imprescindível que sejam realizadas provas de compatibilidade a cada unidade de
concentrado de hemácias a ser doada mesmo que já exista a compatibilidade
fenotípica. A contínua investigação dos fatores que influenciam a formação desses
aloanticorpos, assim como os fatores associados às reações transfusionais
hemolíticas agudas e tardias são necessários para aumentar e garantir a segurança
das transfusões.
41
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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Hematologia e Hemoterapia. vol.34, n.3, p.206-2011, 2012.
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BAIN, Barbara J. et al. Dacie and Lewis: practical haematology. 12. ed. London:
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