Narrativa_I

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  Ensina: Letícia Santanna Tutora: Marilucia Tema da Aula: Elementos da Narrativa I  O valor por trás dessa aula “Conhecedores dos diferentes gêneros textuais, meus alunos buscarão nos mais diversos autores, respostas para  perguntas rotineiras e terão livros como aliados do conhecimento sabendo da contribuição de cada um para o seu repertório” (Trecho da minha visão) Através desta aula pretendo fazer com que meus alunos comecem a perceber que há textos e textos. Histórias narradas, textos informativos e aqueles que mais do que informar, buscam convencer. Ao longo do ano pretendo ajuda-los a entender toda a diferença entre um gênero e outro. Portanto, vamos começar pelo gênero mais próximo deles. O que veem desde a infância o que praticam sem percebem. Será uma série de 3 aulas, incluindo produção de texto onde o aluno vai entender os principais elementos que constituem a narrativa e saberá aplica-los para que sua história tenha um desfecho. Ele também vai saber perceber características explícitas em determinados textos narrativos, como a participação ou não do narrador da história. Verá o que é uma crônica e quem são os principais cronistas do Brasil. E será convidado a iniciar carreira através de um blog. Acredito que estas aulas tendem a desenvolver o hábito de leitura como uma ação de prazer e o de escrever como uma exposição ampla de seus pensamentos criativos para que vejam como há histórias não reais que o poderiam ser. Basta que comecem a ter vida no papel. Objetivo da Aula Pontos-Chave  O aluno sairá desta primeira aula apto a definir o que é um texto narrativo, entendendo quais são suas principais diferenças em relação aos outros textos e exemplificando que elementos nos evidenciam tais diferenças.  Um texto narrativo é uma história contada que pode ser fictícia ou não;  Diferente de outros textos, os narrativos não procuram nos convencer de uma ideia, nem nos informar algo extremamente relevante. Sua finalidade é simplesmente compartilhar uma história;  Todo texto narrativo possui etapas. Cada uma delas é parte importantíssima para que a história tenha sentido e se mantenha interessante;  O principal elemento do texto narrativo é o próprio narrador. Seja participante ou observador, é ele quem nos conta a história; 1º Abertura 7 minutos  Após alegremente cumprimentar os alunos e dar as boas vindas vou contar o tema da aula;  Vou relembrá-los da aula de Manejo e dizer como os procedimentos que aprendemos serã o úteis para que não percamos tempo com bobeiras. Nada pode nos atrapalhar a alcançar o objetivo da aula de hoje!  Feito tudo isso vou mostrar um vídeo do Forrest Gump na etapa da corrida que dá em torno do mundo:  Vou perguntar ao Igor o que ele acha que a história tem a ver com o tema da aula;  Se a Ana Paula acha que a história do surgimento dos Smiles é verídica;  Ao David quem é que está narrando a história pra gente;  E a Carina se faz sentido ver só essa parte do filme sem saber quem é Forrest Gump;  A ideia é fazer com que eles percebam que o filme também se trata de uma narrativa; mas que só vendo o filme completo entenderemos toda a história. Por que é que Forrest conta tantas histórias?

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Ensina: Letícia Santanna 

Tutora: Marilucia 

Tema da Aula: Elementos da Narrativa I

 O valor por trás dessa aula

“Conhecedores dos diferentes gêneros textuais, meus alunos buscarão nos mais diversos autores, respostas para perguntas rotineiras e terão livros como aliados do conhecimento sabendo da contribuição de cada um para o seurepertório” (Trecho da minha visão)

Através desta aula pretendo fazer com que meus alunos comecem a perceber que há textos e textos. Histórias

narradas, textos informativos e aqueles que mais do que informar, buscam convencer. Ao longo do ano pretendoajuda-los a entender toda a diferença entre um gênero e outro. Portanto, vamos começar pelo gênero mais próximodeles. O que veem desde a infância o que praticam sem percebem. Será uma série de 3 aulas, incluindo produção detexto onde o aluno vai entender os principais elementos que constituem a narrativa e saberá aplica-los para que suahistória tenha um desfecho. Ele também vai saber perceber características explícitas em determinados textosnarrativos, como a participação ou não do narrador da história. Verá o que é uma crônica e quem são os principaiscronistas do Brasil. E será convidado a iniciar carreira através de um blog.Acredito que estas aulas tendem a desenvolver o hábito de leitura como uma ação de prazer e o de escrever comouma exposição ampla de seus pensamentos criativos para que vejam como há histórias não reais que o poderiam ser.Basta que comecem a ter vida no papel. 

Objetivo da Aula Pontos-Chave  O aluno sairá desta primeira aula apto a definir o

que é um texto narrativo, entendendo quais sãosuas principais diferenças em relação aos outrostextos e exemplificando que elementos nosevidenciam tais diferenças.

  Um texto narrativo é uma história contada quepode ser fictícia ou não;

  Diferente de outros textos, os narrativos nãoprocuram nos convencer de uma ideia, nem nosinformar algo extremamente relevante. Suafinalidade é simplesmente compartilhar umahistória;

  Todo texto narrativo possui etapas. Cada umadelas é parte importantíssima para que a históriatenha sentido e se mantenha interessante;

  O principal elemento do texto narrativo é opróprio narrador. Seja participante ou observador,é ele quem nos conta a história;

1º Abertura – 7 minutos

  Após alegremente cumprimentar os alunos e dar as boas vindas vou contar o tema da aula;

  Vou relembrá-los da aula de Manejo e dizer como os procedimentos que aprendemos serão úteispara que não percamos tempo com bobeiras. Nada pode nos atrapalhar a alcançar o objetivo da aulade hoje!

  Feito tudo isso vou mostrar um vídeo do Forrest Gump na etapa da corrida que dá em torno domundo:

  Vou perguntar ao Igor o que ele acha que a história tem a ver com o tema da aula;  Se a Ana Paula acha que a história do surgimento dos Smiles é verídica;  Ao David quem é que está narrando a história pra gente;  E a Carina se faz sentido ver só essa parte do filme sem saber quem é Forrest Gump;

  A ideia é fazer com que eles percebam que o filme também se trata de uma narrativa; mas que sóvendo o filme completo entenderemos toda a história. Por que é que Forrest conta tantas histórias?

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Isso deve ser explicado no final, com um belo DESFECHO. A história também deve ter um CLÍMAX, eé claro, conta com outros PERSONAGENS além de Forrest, o PROTAGONISTA. (As palavras em CapsLock serão escritas no quadro enquanto falo).

2º Introdução ao Conteúdo  – 15 minutos

  Percebam que toda boa história contada precisa de tais elementos. Hoje vamos estudar emprimeiro lugar:

1.  O que é uma narrativa

  Um texto narrativo é um texto no qual nos é narrado um fato.Na história de Forrest Gump ele mesmo a conta e ele participa da história, mas se lembrarmos doscontos de fada que lemos quando crianças perceberemos que a maioria se inicia com um “Era umavez” de uma voz do além. Não sabemos quem conta a história, apenas que nos é contada. Este ser sem nome que fala conosco é o narrador observador. É como Galvão narrando um jogo de futebol.Ele só observa, não participa.Vamos começar a pensar em histórias que nos são contadas quando somos crianças. Vamos usá-las como exemplo pra entender bem isso aqui.

2.  Qual é a finalidade de um texto narrativo  Um texto narrativo tem a finalidade de nos entreter contando uma boa história ou permitir que

tenhamos algum aprendizado a partir do fato narrado.Uma novela, por exemplo, é feita com o objetivo de nos manter ligados a uma trama legal. Se for chata, não assistimos. O texto narrativo não tenta convencer ninguém de nada, mas sempre tenta

 passar uma moral com a sua história. Qual é a moral da história de Chapeuzinho Vermelho? 

3.  Quais são os principais elementos que a constituem o texto narrativo

  Um texto narrativo contém:  Personagens. Sendo eles divididos em Protagonistas, antagonistas e coadjuvantes.

Pense na história de João e Maria. Quem são os protagonistas? Os coadjuvantes? E a anta? Cada um desses personagens recebe características físicas e psicológicas que geralmente já sãoapresentadas no início da história. Assim, com tantos adjetivos já vamos imaginando a

 personagem e vendo se nos identificamos ou não com ele.  Tempo. Quando aconteceu a história.

Todo texto narrativo é fortemente marcado pelo tempo em que a história aconteceu. Isso éimportante para que o leitor possa se situar ao ler a história, imaginando melhor como eram/ são/serão as coisas na época da escrita do texto. O “era uma vez” mostra que aconteceu temposatrás, não sabemos ex atamente quanto tempo. “viveram felizes para sempre” também nos dáideia de que a história aconteceu a muito tempo. Até mesmo o Galvão narrando jogo cita o tempo

da narrativa: “Bem, amigos. Faltando 15 minutos para o fim do segundo tempo” ou “estamos aqui ao vivo”    Espaço. Onde aconteceu a história?

Seguindo a regra do Galvão: “Estamos aqui no estádio do Engenhão”. É sempre importante falar onde a história se passou. Foi num reino tão-tão distante ou “numa cidade longínqua”, “pelaestrada à fora”, “no bosque”?    Enredo/Ação. Os fatos que acontecem na história.

Por trás de uma boa história temos várias coisas se desenrolando. Já pensou se a novela das 21h sótivesse a Griselda e a Tereza Cristina? Há várias micro histórias acontecendo dentro da novela. E num texto narrativo também. Temos vários fatos sendo narrados até que cheguemos ao momento

especial da resolução dos problemas.

4.  Em quais etapas podemos dividir um texto narrativo?

  Toda boa narrativa conta com pelo menos 4 momentos essenciais:

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ANEXOS:

  Situação InicialÉ onde nos são apresentados os personagens bem como os adjetivos (características) atribuídos acada um deles. Também se explica o Onde e Quando a narrativa acontece.  Conflito

É onde surgem os problemas que vão dar sentido a história; Onde se começa a desenrolar oenredo.  Clímax

É o momento de maior tensão da história.  Desfecho/Epílogo

Conclusão da história com resolução do conflito.

  Se liga aí que é hora da revisão! Depois de explicar tudo isso, vou distribuir um resumo disso aosalunos e demandar os conceitos apresentados individualmente. Vou começar pelo aluno queprestou menos atenção. Só vou seguir para a prática quando filtrar que todos estão cientes. 

3º Prática Guiada - 15 minutos

  Vamos assistir ao vídeo da Turma da Mônica e analisar em conjuntos todas as características de umanarrativa.

  Em seguida ler ao texto e fazer os exercícios com a turma.

Em anexo4º Prática Independente – 15 minutos

  Análise do Conto Uma Galinha de Clarice Lispector. Com perguntas similares as feitas na PG.Momento completamente individual. O exercício vale nota e precisamos bater a meta.Em anexo.http://educacao.uol.com.br/biografias/ult1789u592.jhtm 

 

5º Fechamento – 5 minutos

  Retomar os ponto chaves e ler o trecho do texto “A suprema felicidade” em que se fala do porque

gostamos de contos de fadas.

  Se der tempo vamos ouvir e ler a música Nina de Chico Buarque, interpretando-a de acordo com o

conteúdo visto hoje.  Falar que a vida é feita de clímax, resoluções de conflitos e muitos conflitos. Para cada dia basta suas

micro histórias. Cada dia é um capítulo da nossa novela que não tem final feliz. Precisa ser felizconstantemente. E isso depende de cada um deles.

Tarefa para casa

Exercícios das páginas 25 e 26 da apostila.

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PRÁTICA GUIADA

Nome: _____________________________________________________ Turma: _____________

O primeiro beijo

Os dois mais murmuravam que conversavam: havia pouco iniciara-seo namoro e ambos andavam tontos, era o amor. Amor com o que vem

 junto: ciúme.- Está bem, acredito que sou a sua primeira namorada, fico feliz com

isso. Mas me diga a verdade, só a verdade: você nunca beijou uma mulherantes de me beijar? Ele foi simples:

- Sim, já beijei antes uma mulher.- Quem era ela? Perguntou com dor.Ele tentou contar toscamente, não sabia como dizer.O ônibus da excursão subia lentamente a serra. Ele, um dos garotos

no meio da garotada em algazarra, deixava a brisa fresca bater-lhe norosto e entrar-lhe pelos cabelos com dedos longos, finos e sem peso comoos de uma mãe. Ficar às vezes quieto, sem quase pensar, e apenas sentir -

era tão bom. A concentração no sentir era difícil no meio da balbúrdia doscompanheiros.

E mesmo a sede começara: brincar com a turma, falar bem alto, mais alto que o barulho do motor, rir, gritar,pensar, sentir, puxa vida! Como deixava a garganta seca.

E nem sombra de água. O jeito era juntar saliva, e foi o que fez. Era morna, porém, a saliva, e não tirava asede. Uma sede enorme maior do que ele próprio, que lhe tomava agora o corpo todo.

A brisa fina, antes tão boa, agora ao sol do meio dia tornara-se quente e árida e ao penetrar pelo nariz secavaainda mais a pouca saliva que pacientemente juntava.

E se fechasse as narinas e respirasse um pouco menos daquele vento de deserto? Tentou por instantes, maslogo sufocava. O jeito era mesmo esperar, esperar. Talvez minutos apenas, enquanto sua sede era de anos.

Não sabia como e por que, mas agora se sentia mais perto da água, pressentia-a mais próxima, e seus olhos

saltavam para fora da janela procurando a estrada, penetrando entre os arbustos, espreitando, farejando.O instinto animal dentro dele não errara: na curva inesperada da estrada, entre arbustos estava... o chafariz

de onde brotava num filete a água sonhada. O ônibus parou, todos estavam com sede, mas ele conseguiu ser oprimeiro a chegar ao chafariz de pedra, antes de todos.

De olhos fechados entreabriu os lábios e colou-os ferozmente ao orifício de onde jorrava a água. O primeirogole fresco desceu, escorrendo pelo peito até a barriga. Era a vida voltando, e com esta encharcou todo o seuinterior arenoso até se saciar. Agora podia abrir os olhos.

Abriu-os e viu bem junto de sua cara dois olhos de estátua fitando-o e viu que era a estátua de uma mulher eque era da boca da mulher que saía a água. Lembrou-se de que realmente ao primeiro gole sentira nos lábios umcontato gélido, mais frio do que a água.

E soube então que havia colado sua boca na boca da estátua da mulher de pedra. A vida havia jorrado dessa

boca, de uma boca para outra.Intuitivamente, confuso na sua inocência, sentia intrigado: mas não é de uma mulher que sai o líquido

vivificador, o líquido germinador da vida... Olhou a estátua nua.Ele a havia beijado.Sofreu um tremor que não se via por fora e que se iniciou bem dentro dele e tomou-lhe o corpo todo

estourando pelo rosto em brasa viva. Deu um passo para trás ou para frente, nem sabia mais o que fazia.Perturbado, atônito, percebeu que uma parte de seu corpo, sempre antes relaxada, estava agora com uma tensãoagressiva, e isso nunca lhe tinha acontecido.

Estava de pé, docemente agressivo, sozinho no meio dos outros, de coração batendo fundo, espaçado,sentindo o mundo se transformar. A vida era inteiramente nova, era outra, descoberta com sobressalto. Perplexo,num equilíbrio frágil.

Até que, vinda da profundeza de seu ser, jorrou de uma fonte oculta nele a verdade. Que logo o encheu desusto e logo também de um orgulho antes jamais sentido: ele...

Ele se tornara homem.

Clarice Lispector 

 Ada tado da tirinha de LoKáz

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Exercícios

1.  Nenhum título de Clarice é gratuito. O conto em questão apresenta um título que ao longo da narrativa, amplia aprimeira ideia que vem à cabeça do leitor. Após a leitura, “O primeiro beijo” deve ser entendido como: 

a)  A primeira experiência sexual de um adolescente

b)  A sensação de que a vida é sempre feita de novidadesc)  O momento em que p protagonista se reconhece no outrod)  A iniciação da vida com direitos e não apenas deverese)  O momento da descoberta de sensações até agora não conhecidas

2.  A dúvida é o sentimento mais presente em toda a construção da narrativa. Talvez a necessidade que o meninoestava de beber água o tenha feito sonhar um pouco mais. O encontro dos lábios do menino com os lábios daestátua da mulher nua, despertou sensações que até então não havia conhecido. O fazendo vivenciar experiênciasmarcantes para sua vida como homem. Complete o esquema a seguir de acordo com as etapas da narrativa lida:

3.  Sobre o narrador, analise as seguintes afirmativas:

I - O texto se encontra na terceira pessoa, o autor narra a história do pequeno rapaz que havia tido sua primeiraexperiência com o sexo oposto, mesmo que de uma forma surreal.II - Podemos dizer que a realidade do conto consiste na paixão do rapaz por sua primeira namorada, e no ciúme dela.E que, portanto, ele é quem começa a narrar a sua experiência de beijo com a estátua;III - O autor não se introduz na história, a narra analisando todos os acontecimentos como se estivesse ao lado doprotagonista.IV – A autora se torna narradora quando ela se passa pela namorada que narra a história surreal do namorado

Agora assinale a alternativa correta:

a)  As alternativas I e II são corretasb)  Todas as alternativas são corretasc)  As alternativas III e IV são incorretasd)  As alternativas I III são as válidas

4.  De acordo com a sua leitura da narrativa, que adjetivos melhor caracterizariam o menino e sua namorada? Por quê? _______________________________________________________________________________________________ ____________________________________________________________________________________________

5.  O conto “O primeiro beijo” de Clarice Lispector, tem como protagonista umapersonagem que se depara com a descoberta da masculinidade. A tomada deconsciência de que “se tornara homem” foi provocada por algo que se evidencia noseguinte trecho: a)  Não sabia como e por que. Mas agora se sentia mais perto d’água. b)  Uma sede enorme, que lhe tomara agora o corpo todo.c)  E soube então que havia colocado sua boca na boca da mulher de estátuad)  Até que, vinda do seu ser, jorrou de uma fonte oculta nele a verdadee)  De olhos fechados entreabriu os lábios e colocou-os ferozmente ao orifício de

onde jorrava água

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PRÁTICA INDEPENDENTENome: _____________________________________________________ Turma: _____________

Uma Galinha

Era uma galinha de domingo. Ainda viva porque não passava de nove horas da manhã.Parecia calma. Desde sábado encolhera-se num canto da cozinha. Não olhava para ninguém, ninguém olhava paraela. Mesmo quando a escolheram, apalpando sua intimidade com indiferença, não souberam dizer se era gorda oumagra.

Foi pois uma surpresa quando a viram abrir as asas de curto voo, inchar o peito e, em dois ou três lances,alcançar a murada do terraço. Um instante ainda vacilou — o tempo da cozinheira dar um grito — e em breve estavano terraço do vizinho, de onde, em outro voo desajeitado, alcançou um telhado. A família foi chamada com urgênciae consternada viu o almoço junto de uma chaminé. O dono da casa, lembrando-se da dupla necessidade de fazeresporadicamente algum esporte e de almoçar, vestiu radiante um calção de banho e resolveu seguir o itinerário dagalinha: em pulos cautelosos alcançou o telhado onde esta, hesitante e trêmula, escolhia com urgência outro rumo.

A perseguição tornou-se mais intensa. De telhado a telhado foi percorrido mais de um quarteirão da rua.Pouco afeita a uma luta mais selvagem pela vida, a galinha tinha que decidir por si mesma os caminhos a tomar, semnenhum auxílio de sua raça. O rapaz, porém, era um caçador adormecido. E por mais ínfima que fosse a presa o gritode conquista havia soado.

Estúpida, tímida e livre. Não vitoriosa como seria um galo em fuga. Que é que havia nas suas vísceras que faziadela um ser? A galinha é um ser. É verdade que não se poderia contar com ela para nada. Nem ela própria contavaconsigo, como o galo crê na sua crista. Sua única vantagem é que havia tantas galinhas que morrendo uma, surgiriano mesmo instante outra tão igual como se fora a mesma.

Afinal, numa das vezes em que parou para gozar sua fuga, o rapaz alcançou-a. Entre gritos e penas, ela foipresa. Em seguida carregada em triunfo por uma asa através das telhas e pousada no chão da cozinha com certaviolência. Ainda tonta, sacudiu-se um pouco, em cacarejos roucos e indecisos. Foi então que aconteceu. De puraafobação a galinha pôs um ovo.

Surpreendida, exausta. Talvez fosse prematuro. Mas logo depois, nascida que fora para a maternidade, pare-cia uma velha mãe habituada. Sentou-se sobre o ovo e assim ficou, respirando, abotoando e desabotoando os olhos.Seu coração, tão pequeno num prato, solevava e abaixava as penas, enchendo de tepidez aquilo que nunca passariade um ovo. Só a menina estava perto e assistiu a tudo estarrecida. Mal porém conseguiu desvencilhar-se doacontecimento, despregou-se do chão e saiu aos gritos:

— Mamãe, mamãe, não mate mais a galinha, ela pôs um ovo! ela quer o nosso bem!Todos correram de novo à cozinha e rodearam mudos a jovem parturiente.

Esquentando seu filho, esta não era nem suave nem arisca, nem alegre, nem triste, não eranada, era uma galinha. O que não sugeria nenhum sentimento especial. O pai, a mãe e afilha olhavam já há algum tempo, sem propriamente um pensamento qualquer. Nuncaninguém acariciou uma cabeça de galinha. O pai afinal decidiu-se com certa brusquidão:— Se você mandar matar esta galinha nunca mais comerei galinha na minha vida!— Eu também! jurou a menina com ardor. A mãe, cansada, deu de ombros.

Inconsciente da vida que lhe fora entregue, a galinha passou a morar com a família. A menina, de volta docolégio, jogava a pasta longe sem interromper a corrida para a cozinha. O pai de vez em quando ainda se lembrava:"E dizer que a obriguei a correr naquele estado!" A galinha tornara-se a rainha da casa. Todos, menos ela, o sabiam.

Uma vez ou outra, sempre mais raramente, lembrava de novo a galinha que se recortara contra o ar à beira dotelhado, prestes a anunciar. Nesses momentos enchia os pulmões com o ar impuro da cozinha e, se fosse dado àsfêmeas cantar, ela não cantaria mas ficaria muito mais contente.

Embora nem nesses instantes a expressão de sua vazia cabeça se alterasse. Na fuga, no descanso, quando deuà luz ou bicando milho — era uma cabeça de galinha, a mesma que fora desenhada no começo dos séculos.

Até que um dia mataram-na, comeram-na e passaram-se anos.

Clarice Lispector 

O Ovo – Tarsila do Amaral 

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Exercícios

1.  Nada em Clarice Lispector é por acaso. O título de um conto, muito menos. Ela poderia ter utilizado um artigo definidotornando o título “A galinha” ou até ter dado um nome próprio ao animal. Como muitos animais não domesticáveis

possuem. No entanto, não o fez. O que faz com que Clarice batize seu conto com este título? ______________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________2.  Às vezes ela é uma galinha de domingo, às vezes tem seus anseios; ora ela é estúpida, ora tímida e livre; é mais uma

galinha entre todas as galinhas, mas também é uma jovem parturiente; é um nada, mas é também um ser.A galinha de Clarice é sem dúvidas, o personagem protagonista desta narrativa. No entanto, outros também aparecem nahistória. Cite cada um deles determinando um adjetivo central e sua função na história.  Exemplo: Galinha –  um “ser humano” – protagonista ______________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________ ______________________________________________________________________________________________________3.  O tipo de narrador, a caracterização de algum personagem, o tempo, o espaço e o tipo de discurso são alguns doselementos formais que podem ser fundamentais ao desvendar o mistério de uma narrativa. Complete o esquema abaixo eentenda o conto com mais facilidade.

4.  Na projeção do narrador (narradora?), a galinha/mãe/mulher gostaria muito de não ter o sentido de sua vida reduzido àmaternidade. Não quer (ou não ousa) cantar como o galo (ou cantar de galo), mas ficaria feliz em saber que pode.Finalmente, os membros da família, alheios à personificação da galinha promovida pelo narrador, e longe de qualquer

reflexão igualitária sobre a condição feminina, "mataram-na, comeram-na e passaram-se anos." a)  O que faz com que a família desista de comer a galinha? ______________________________________________________________________________________________________

 ______________________________________________________________________________________________________

b)  O que faz com que a família desista de NÃO comer a galinha?

 ______________________________________________________________________________________________________ _____________________________________________________________________________________________________

5.  Se observarmos bem o conto, podemos notar que, desde o início, há uma diferença entre o olhar donarrador e o olhar da família sobre a galinha. Enquanto a última vê o animal apenas como almoço, onarrador sonda a intimidade da galinha tentando descobrir se há algo nela que lhe confira o estatuto deser. Enquanto o narrador percebe nela "um anseio", o pai vê "o almoço" subir no telhado. Para a família, agalinha é menos que um bicho, ela é coisa: almoço. Já o narrador procura saber se ela pode ser mais doque bicho ou coisa, se ela deseja a vida ou a liberdade.

Em relação ao narrador da história, pode-se afirmar que:I)  A narradora é Clarice Lispector porque foi ela quem escreveu a história;II)  O narrador é observador porque simplesmente nos conta como a história que escreveu, sem participar dela;III) O narrador é o pai da família, dono da galinha;IV) Não podemos dizer que a autora é narradora só porque a escreveu. Não há relação direta entre narrar e escrever umahistória.Agora responda:a)  Alternativas I e IV estão corretasb)  Nenhuma das alternativas é válidac)  Alternativas II e IV são verídicas;d)  Alternativas I e II são incorretas

“Ai palavras, ai palavras, que estranha potência a vossa”  Esta e outras frases inteligentes são de autoria de Clarice Lispector. Uma mulher a frente de seu tempo que marcou história ao

escrever livros enigmáticos e cheios de palavras complexas. Até hoje tem gente que diz que é difícil de ler suas histórias.Você também achou? Ela iria adorar saber disso. Palavras são desafiantes, não?!