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Michel Zózimo da Rocha ESTRATÉGIAS EXPANSIVAS: PUBLICAÇÕES DE ARTISTAS E SEUS ESPAÇOS MOVENTES 1ª edição Porto Alegre Edição do Autor 2011

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Michel Zózimo da Rocha

ESTRATÉGIAS EXPANSIVAS: PUBLICAÇÕES DE ARTISTAS E SEUS ESPAÇOS MOVENTES

1ª edição

Porto AlegreEdição do Autor

2011

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Permite-se a reprodução parcial ou total desde que seja citada a fonteDISTRIBUIÇÃO GRATUITA, PROIBIDA A VENDA1ª edição: 2011

Capa [Michel Zózimo da Rocha - interferência gráfica sobre ilustração do livro AS MARAVILHAS DO FUNDO DO MAR]Projeto Gráfico [Marina Bortoluz Polidoro e Michel Zózimo da Rocha] Fotografia de Originais [Denise Helfenstein] Tratamento de Imagens [Denise Helfenstein e Juliano Lopes]Revisão [Fernanda Bulegon Gassen]

R672e Rocha, Michel Zózimo da Estratégias expansivas: publicações de artistas e seus espaços moventes / Michel Zózimo da Rocha. --- Porto Alegre : M. Z. da Rocha, 2011. 180 p. : il.

ISBN 978-85-911696-0-3 1. Arte contemporânea. 2. Publicação de artista. 3. Espaços moventes. 4. Publicação : Circulação. I. Título. CDU 7.039 Catalogação na fonte – Mara R. B. Machado – Bibliotecária, CRB 10/1885

Este projeto foi contemplado pelaFundação Nacional de Artes – Funarte

No edital Bolsa de Estímulo à Produção Crítica em Artes VisuaisPorto Alegre. RS. Brasil. 2011

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Grupo PERDIDOS NO ESPAÇO, conjunto das três edições do JORNAL PERDIDOS NO ESPAÇO, [2003, 2005 e 2006].

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MARIA IVO

NE DO

S SANTOS

[TRÂNSITO]

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Artista plástica e pesquisadora. Seu trabalho se articula com contextos urbanos e expositivos, desenvolvendo peças gráficas, objetos, fotografia, vídeo, instalacões, ações urbanas e publicações. Doutora em Artes pela Universidade de Paris I Panthéon - Sorbonne. Professora no Departamento de Artes Visuais e no Programa de Pós-Graduação em Artes Visuais do Instituto de Artes da UFRGS. Coordena o Grupo Veiculos da

Arte, juntamente com Hélio Fervenza. Desenvolve a pesquisa As Extensões da Memória: a experiência artística e outros espaços e coordena o Programa de Extensão Formas de pensar a Escultura – FPES / Perdidos no espaço – DAV-IA/UFRGS. Mantém o site www.ufrgs.br/artes/escultura. Organizou em

2004, juntamente com Alexandre Santos, o livro A Fotografia nos processos Artísticos Contemporâneos, editado pela SMC de Porto Alegre e a Editora da UFRGS. Organizou em 2009, juntamente com Joerg Bader (Centro de fotografia de Genebra/HEART de Perpignan, França), as Jornadas Preparatórias do Seminário Internacional Ponto de Vista: Lugares, Práticas e

políticas das publicações em Arte. Ensaios críticos e Publicações de artistas, no Museu da UFRGS em Porto Alegre.

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Olá Ivone Gostaria de estabelecer uma interlocução contigo, a partir de alguns questionamentos... Atento para o que segue, ressalto que as questões são amplas. E desta forma, podem ser refi-nadas pelas direções que tu escolher. Nosso assunto é sobre publicação e sobre o que está além dele - reflexões, ações, posições e pesquisa em arte.Isto não é uma pergunta.

Vejo uma estreita relação entre os grupos PERDIDOS NO ESPAÇO e VEÍCULOS DA ARTE - a caminhada, a circulação, o trajeto que uma proposição artística desenha ao ser lançada em circunstâncias de espaços [públicos e privados]. Enquanto que o PERDIDOS [projeto originário do GRUPO DE EXTENSÃO - FORMAS DE PENSAR A ESCULTURA da UFRGS] acolhe participantes eventuais e público externo à Universidade, o VEÍCULOS é um Grupo de Pesquisa formado por professores e pesquisadores, todos vinculados, de alguma forma à instituição.Poderia falar um pouco sobre estas duas experiências coletivas?

Maria IvonePosso falar dos PERDIDOS NO ESPAÇO que define a condição na qual nos encontrávamos em Porto Alegre em meados de 2002.

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Este nome surgiu como um apelido carinhoso ao Programa de Extensão denominado FORMAS DE PENSAR A ESCULTURA - FPES, coordenado por mim no Departamento de Artes Visuais da UFRGS. Desde o inicio nosso objetivo foi criar um ambiente para praticar e discutir as expansões da arte, partindo de es-paços pré-definidos no âmbito de cada ação e da articulação de diversas posições e pontos de vista dos participantes. Em 2002-2 inscrevemos uma ação de extensão visando explorar o Campus central da Universidade. A partir de uma primeira incursão iniciamos um laboratório para pensar e produzir inter-venções, ações para aquele local. O objetivo inicial era propor algumas ideias na forma de projetos, exercitando um pouco este formato para as ideias e as argumentações.

De natureza efêmera, muitas dessas práticas implicaram a necessidade de observar, mapear, registrar o processo de algum modo, o que gerou uma infinidade de documentos e uma ação reflexiva potente, decorrentes de caminhadas, propostas, imagens e das aproximações sensíveis com aquele local tão estranho. No campus as diferentes unidades e seus prédios, e os equi-pamentos urbanos foram sendo construídos paulatinamente, acolhendo o processo de expansão da própria universidade, sem um real planejamento. Usamos inicialmente a web para guardar o material que vínhamos produzindo. No site começamos a publicar os processos e os resultados destas ações. Em

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2002, Andrei Thomaz, à época nosso aluno na escultura, criou e programou o site que segue sendo muito ativo, tornado-se desde então um lugar de compartilhamento e de trânsito das questões levantadas pelas práticas e ações que propomos. [...]

O programa FPES - PERDIDOS NO ESPAÇO agregou pessoas de horizontes diferentes, alunos de graduação das artes, alunos do mestrado, artistas e comunidade externa. Esta mistura foi se mostrando profícua, elevando o nível das propostas e também das reflexões delas decorrentes. Com a realização do III FÓRUM SOCIAL MUNDIAL para Porto Alegre em janeiro de 2003, decidimos propor a realização de um projeto dentro do módulo temático MÍDIA, CULTURA E CONTRA-HEGEMONIA, apoiados financeiramente com uma pequena verba destinada pela ADUFRGS e contando com a parceria da PROREXT e do Museu da UFRGS. Realizamos as intervenções no campus e publicamos 1000 exemplares do primeiro jornal dos PERDIDOS, o número zero. O jornal teve ampla distribuição durante o Fórum e também depois. Ali já havia um trabalho de teorização que se iniciava visto que recebemos diversas contribuições. Nós mesmos havíamos nos encarregado de gerar um canal de difusão para nossas propostas e inquietações, criando nosso próprio jornal. [...] Propusemos também no Museu da UFRGS um seminário inscrito como atividade do PPGAV, no qual participaram Geraldo Orthof da UnB - Brasília, Julio Castro do projeto Prêmio Interferências

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Urbanas / Santa Teresa – Rio de Janeiro, o professor José Dallo Frota da Faculdade de Arquitetura da UFRGS, entre outros. Nossa ideia foi olhar para as experiências da arte na sua relação com os lugares e contextos e as experiências coletivas que surgiam. Isto possibilitou uma conexão importante entre aspectos da arte e os temas sociais do Fórum, e surpreendentemente atraiu um público muito significativo, que veio ao Fórum inicialmente mais por seu enfoque social. A sala esteve lotada. O programa deste seminário evidencia nosso interesse por pensar dinâmicas coletivas.

Uma intensa agenda de trabalho animou as atividades do FPES em 2003 e 2004, tais como encontros, o projeto ESPAÇO DE MONTAGEM, os cursos de extensão que resultaram no desenho de outras ações. Os PERDIDOS não pararam de pensar e de produzir o que tornou possível encaminhar outra proposta para o Fórum de 2005 (e desta vez bem mais organizados), que intitulamos EFEITOS DE BORDA: SUBJETIVIDADE E ESPAÇO PÚBLICO. A proposta envolveu um processo de discussão coletivo am-pliado, oportunizando que os integrantes se colocassem de uma forma mais propositiva e menos dependente de nossa coordenação. Claudia Zanatta e Andrei Thomaz organizaram a Mostra de vídeos. Luciana Mannoli trabalhou de forma muito competente no site, criando interfaces visuais que permitiram a maior internacionalização dos conteúdos e de nossa agenda. A

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programação e as sinopses dos vídeos, workshops e debates que propusemos aparecem no site em três línguas, português, inglês e francês. Silvia Livi traduziu grande parte dos conteúdos do site para o inglês. No Jornal eletrônico reunimos contribuições excelentes e geramos um fórum de discussão muito profícua, sendo o site uma publicação, entendida no seu enfoque amplo. Em maio de 2005, reunimos os participantes das diversas propostas criando a plataforma PERDIDOS NO ESPAÇO, na qual trazíamos para consulta pública uma vasta documentação bem como tínhamos uma mesa com um representativo acervo de publicações que havíamos reunido ao longo do tempo. [...]

É importante salientar que o programa de extensão FORMAS DE PENSAR A ESCULTURA nasceu também com a vocação de dialogar com outras disciplinas, visto que, como artistas, nos interes-sava compreender, por exemplo, os enfoques do urbanismo, da arquitetura, da geografia e da psicologia social contemporânea, mas também, de qualquer outro saber que pudesse trazer alguma contribuição às situações e questões confrontadas. Roçávamos questões comuns e produzíamos desdobramentos diferenciados. Segue sendo prioritário para os FPES atuar no campo da arte e entender como agimos e que contribuições, por sua vez, nosso modo de inserção poderia trazer para as questões da cidade. Através da arte passamos a produzir um conhecimento pela vivência e prática de um determinado lugar.

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Penso que a dimensão complexa que o programa foi tomando nunca reduziu sua potência criativa. As ações artísticas que foram propostas tiveram como consequência uma crescente problematização das práticas do campo da arte. A atividade crítica é de fato muito mais trabalhosa e segue nos exigindo até hoje um esforço suplementar.

O programa se nutre de uma metodologia recorrente, reunir pessoas em torno de um contexto dado, estabelecer um pólo de discussão que permita as expressões individuais e as coletivas se manifestar e produzirem um pensamento, ação, etc. Sempre houve um espaço privilegiado para a leitura e para discussões de questões da arte. Tivemos que estudar muito, indo atrás de referenciais teóricos para circunstanciar a complexidade do que fazíamos. Desde 2002 observamos detidamente os enfoques referenciais na história da arte, revisitando desde as caminhadas surrealistas até as teorias Situacionistas, os projetos contem-porâneos envolvendo arte e espaço político. Estudamos o que vinha ocorrendo ao longo do século XX, no plano internacional e na realidade brasileira e latino-americana (Oiticica, Barrio, o espaço NO) para citar apenas alguns exemplos. Observamos de que forma os artistas vinham se relacionando com os con-textos urbanos, explorando certa forma de agir e inventando uma política que investia em sistemas da circulação, nos fluxos da cidade e na comunicação (Paulo Bruscky, Cildo Meireles,

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Muntadas, Hans Haacke, Barbara Kruger, Jenny Holzer). Desta forma passamos a definir na universidade um campo disciplinar que atentava as questões advindas da experiência cotidiana e da subjetividade, explorando formas de ocupação do espaço. Passamos a observar mais atentamente as práticas do espaço urbano como conteúdo curricular da escultura, tanto na gradu-ação em Artes Visuais (Disciplina de Laboratório da Linguagem tridimensional) quanto no PPGAV-UFRGS, com a criação da disciplina AÇÕES PÚBLICAS: ARTE E CONTEXTO, ambas por mim ministradas. Passamos a escrever e a publicar mais, sempre atentos a fragilidade de nosso assunto e vendo de que forma a arte se relaciona com os eventos efêmeros, com os lugares e contextos nos quais se insere. Isto tudo tem agregado uma dimensão política às nossas reflexões. […]

Podemos hoje ter uma distância crítica e ver que rumos tomaram as coisas e como tudo isto foi crescendo. Para mim, a questão da autonomia e da heterogeneidade de pontos de vista segue sendo crucial. Eu vejo esta questão como projeto de arte, pois sabemos que os processos de normalização social e de apaziguamento, alguns produzidos pela indústria cultural ou por políticas públicas, por vezes neutralizam iniciativas em sua potência transformadora. Os pontos de vista hegemônicos (e não me cabe julgar) têm vindo na esteira das grandes produções artísticas que aterrisam e se formam em Porto Alegre: abertura

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de centros culturais, criação do museu Iberê e consolidação do projeto político da Bienal do MERCOSUL. Um sistema com um formato mais vertical difere do processo de investigação ao qual nos propomos que é de fato mais horizontal e aberto.

Acredito que a arte é um processo de pensamento original, uma localização do discurso que traz consigo uma posição do sujeito artista. Pois o nosso projeto guarda esta preocupação investigativa e formativa, visto que aposta no afloramento de processos singulares. Produziu-se de fato, ao longo destes anos, uma intensa circulação de ideias. Sonhamos e trabalhamos muito, protagonizando situações importantes para a cidade. Trabalhamos o compartilhamento de energias, com altos e baixos, num formato um pouco distinto do viés produtivista da indústria cultural. Passamos a agir de forma mais organizada para criar num ambiente cultural que vem se tornando mais complexo. Soubemos nos beneficiar dos ares transformadores do FÓRUM SOCIAL MUNDIAL de 2003 e de 2005. Os jornais, e como veremos, nosso site surgem como um lugar de acesso público para estes gestos e ideias tão esparsas. A difusão, e isto é muito importante frisar, abriu um caminho para ações mais consequentes que foram sendo praticadas no ensino da arte. Houve uma escuta e uma abertura para problematizações teóricas mais consequentes. Basta ver a produção do grupo de Pesquisa para constatar o quanto tem sido feito e os esforços

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individuais e coletivos. Fazemos muito em meio as demandas do ensino na graduação e na pós-graduação na UFRGS, o que por si só denota nosso ritmo e nosso fôlego. Esbarramos em questões logísticas, na lentidão da própria universidade, mas temos dedicado muito tempo para melhorar nossa estrutura de trabalho, para que o que fazemos não seja uma questão individual, mas sim uma construção institucional de melhores condições para os projetos editorias e outros que queremos empreender. Recentemente apoiei iniciativas editorias de nos-sos ex-alunos. Vi nascer e crescer a REVISTA PANORAMA CRÍTICO (2009), a INVESTIGAÇÃO 11 (2010) e tornar-se livro o que começou como um zine, o MEIO (2010) organizado por Sari e Daniele Marx, entre outros tantos projetos. Isto tudo se encontra num mesmo movimento que busca potencializar iniciativas de artistas valorizando a arte como um saber.

O Grupo de pesquisa VEÍCULOS DA ARTE nasceu pela reunião de um grupo de mestrandos e doutorandos (Hélio, Paulo, Paula, Solana, Mariana e eu) em 2006. O Hélio me convidou para partilhar a coordenação do grupo com ele em 2007. O Paulo Silveira, doutorando orientado pelo Hélio, organizou o CIRANDA, uma publicação que reunia artistas convidados a produzirem um capítulo visual. Destaco que o livro foi um projeto pioneiro visto que aliava a prática da publicação no interior de um projeto de tese em HTC, produzindo uma experiência curiosa, visto que o

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Paulo de certa forma testava seu assunto, as narrativas visuais, propondo aos artistas pensar os encadeamentos de imagens formando um capítulo. Ao lado de análises de narrativas visuais canônicas (O livro de Ruscha, por exemplo), havia este projeto que propunha observar distintos processos narrativos, como laboratório. Foi à primeira publicação aprovada pelo conselho editorial da UFRGS que privilegiou um livro exclusivamente feito de conteúdos visuais, tendo sido impresso pela editora da UFRGS, na coleção VISUALIDADE do PPGAV.

O grupo se dispõe a por em prática modos de compartilhamento da arte pensando nos processos criativos, mas também na mobilidade e no trânsito destes veículos (livro, jornal, cartaz, DVD ou outro meio de difusão). O trânsito tem sido nosso ponto nevrálgico. Há um movimento que os veículos, como experiência artística, trouxeram para a pesquisa em arte que passa a pensar estas iniciativas geradas por práticas nômades, portáteis, transportáveis. Os VEÍCULOS enquanto grupo se estrutura a partir do processo do livro CIRANDA. Um seminário da pesquisa do PPGAV reuniu todos os participantes. Na sequência houve outras iniciativas dos seus membros. Solana Guangiroli propôs à Pinacoteca, por mim coordenada em 2006-2007, uma mostra de livros de artista. A proposta trazida reunia parte da importante coleção de livros de Carlos Romero e de livros da editora INSTANTES GRÁFICOS de Buenos Aires. Estes eventos foram

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sucedidos pela viagem que o Hélio fez a Mar del Plata em 2007, levando na maleta toda uma exposição (intitulada VEHÍCULOS DEL ARTE: CONEXIONES AL SUR) que ocupou a Villa Victória, antiga casa da Victoria Ocampo, numa ação igualmente agenciada por Solana Guangiroli. Desta exposição participaram os membros do Grupo até então (Hélio, Paula, Mariana, Solana, Mario e Carlos Romero). A Exposição da Villa Victoria apresentava propostas envolvendo diversas linguagens. Eu fui a Mar del Plata em novembro daquele ano para ministrar um workshop na Universidade e discutir a prática da caminhada. Reunimos naquela ocasião um grupo de 12 arquitetos artistas. Este foi um bom laboratório, que infelizmente não resultou em publicações por motivos econômicos e burocráticos, mas do qual guardo agradáveis lembranças.

O Grupo de pesquisa foi se alterando pela saída de alguns membros e entrada de outros. Para mim algumas questões foram se precisando quando comecei a chamar convidados para os Seminários da pesquisa do PPGAV, Mabe Bethônico que publicou os jornais no projeto MUSEUMUSEU, Joerg Bader que se dedica a organização de publicações de artistas que trabalham com a fotografia. Convidamos também a Leila Danziger para falar sobre suas intervenções em jornais e mais recentemente mostramos a LOJA que reuniu Regina Melim e seus bolsistas em Porto Alegre (2009). Alguns destes contatos frutificaram

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em interlocuções muito ricas, que prosseguem hoje em outras frentes. Nos VEÍCULOS optamos por um modo de agir autônomo, centrado nos modos de circulação da prática artística, dando especial ênfase às publicações e ações.

Em 2009 eu propus as jornadas PONTOS DE VISTA, junto com Joerg Bader (Perpignan). Algumas questões gerais se apresentaram então. Que formas e que lugares surgem hoje para a prática artística contemporânea e para a crítica na França e no Brasil? Uma publicação de artista pode encontrar seu lugar político? Como formatar os modos de relação com seu público e com os sistemas artísticos, tendo como ideia original, a circulação da obra? Que bases são necessárias a fim de constituir um exercício crítico, tomando em conta a aproximação de duas culturas e a exploração recíproca de meios de comunicação que dizem respeito às ideias da prática e da crítica em arte? Outras questões foram sendo trazidas à medida que íamos observando o que ocorria quando o artista passava a ser o editor de conteúdos que ele dispunha e agenciava, sem aspirar à aura da “obra de arte”. O objetivo das JORNADAS PREPARATÓRIAS foi de trabalhar no levantamento de um elenco de temas e de agentes, artistas e pesquisadores teóricos que vem buscando criar condições de constituir visibilidade e problematização a proposições da arte que dão especial atenção a exploração de outras iniciativas e da difusão. Com a publicação a arte se

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abre a outros sistemas. Que olhar crítico se produz com este tipo de prática e como se discutem e se agenciam as questões implícitas ao sistema de artes no Brasil, ao sistema de arte vigente? Como a prática crítica discute, expõe, amplia, enfim, faz existir de fato ações da arte? Deixo claro que compartilho esta dúvida enquanto leitora e público, inquieta em ver como se indexam estas iniciativas na história da arte. Depois dos anos 60, mais especialmente nos 70 já vemos emergir um olhar mais consequente sobre o leque amplo de ações não inicialmente reconhecidas como arte. No plano teórico o livro de Osborne, CONCEPTUAL ART, reposiciona estas ações e dá uma amostragem de experiências conceituais mostrando que este movimento abriu um leque novo de ações para a arte que passa a se inserir em outros sistemas, no político, nos temas sociais e nos sistemas da comunicação. Lippard havia aberto o caminho para pensar na desmaterialização da obra de arte. Nos anos 70 proliferam os escritos de artista o que evidencia uma tomada de posição do artista que tem por impacto tencionar a função crítica e os lugares da crítica. (Oiticica entre outros tantos artistas elencados na publicação organizada pela Glória Ferreira e Cecília Cotrin e em revistas de arte americanas e européias).

As publicações, e especialmente as experiências ligadas às primeiras redes, a arte postal e as publicações, zines, livros, edições de quintal abriram possibilidades de difusão do

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pensamento anti-hegemônico, sendo aquele período no Brasil, lembremos, marcado pelo controle da ditadura política. Cristina Freire pontua estas questões com pertinência, no seu livro POÉTICAS DO PROCESSO - ARTE CONCEITUAL NO MUSEU, e continua o trabalho nos textos e curadorias que vem realizando (Bruscky, Padín) e no livro CONCEITUALISMO DO SUL-SUR. As publicações de artistas funcionam como uma rede que permite o intercâmbio de ideias. De Bruscky no Brasil a Ditborn no Chile. De Ana Bella a Ferrari, um intenso intercâmbio de ideias permitiu a arte de transitar por continentes e trafegar emprestando tanto imagens das mídias quanto do mundo. Para Ditborn, por exemplo, agenciar suas “pinturas aeropostales” era a forma encontrada de burlar com a censura imposta pela ditadura no Chile. Ao emprestar as vias de transporte dos correios ele utilizava um modo de circulação fora da arte. Hoje, em tempos de naturalização de todos os gestos, os fatos vistos pela lógica do evento, haveria que reposicionar estes gestos num contexto histórico visto que contribuíram para expandir os lugares da arte. E também penso que os processos midiáticos que vemos no formato evento contribuem para uma política de indistinção, (por não dedicar o tempo a estas reflexões) mastigando o trabalho do público e o anestesiando de alguma forma.

As publicações históricas as quais me referi acima parecem estar longe, mas ao abrir um computador nos deparamos novamente

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com sua lógica, visto que está circulando nas redes, está fora do trânsito hegemônico da informação. Explico esta expressão emprestada dos temas do III FÓRUM SOCIAL MUNDIAL para dizer que as regras do circuito de validação de uma obra, suas qualidades e sobrevivência passa pela natureza do gesto que visa à exaltação do autor, mas tem por consequência produzir invisibilidades (por ofuscamento) sobre outras manifestações. Como é possível ocupar um lugar diante do processo de indistinção ao qual é submetida à prática da arte? O que produz o artista?

Assim, pensando, percebi que por mais que as publicações e suas redes venham sendo assumidas por um mercado editorial ou por sistemas indexadores, há no ato de difusão uma potência subversiva intrínseca e incontrolável dada pela transitorialidade do veículo, pela capacidade de chegar a distintos pontos, e que pela leitura e interpretação que prescinde a um leitor, outro sujeito que cria lugar para o objeto pela leitura. Assim, quando o artista se investe em editor de um mundo que ele deseja dar a ler, ele pode selecionar o mundo em filtro vermelho (Rennó), extrair o texto de um jornal (Danziger) deixando as imagens soltas pela folha, ou apor outros escritos a esse suporte. Ele pode alterar a percepção aplicando filtros sobre as imagens (Waltercio), ou se ocupar de ver o mundo sob uma ótica outra, como nos documentos e devaneios de Bernardes no livro VAGA

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EM CAMPO DE REJEITO, ou nas ruminações de escritos volumosos, visíveis blocos duros a digerir de Severo, ou na criação de dicionários para as sensações de Coutinho. Basbaum produz relatos performáticos de seus sistemas relacionais, quando faz transitar seu NBP. Hélio faz uma dupla tomada de posição no seu livro O + É DESERTO, onde relata e retoma numa prosa rara e necessária, este olhar lúcido do artista. Eu citei apenas um grupo de experiências que me ocorrem dentre inúmeras outras que estão atuando pela difusão.

Quais diálogos estabelecidos entre estes grupos? Quanto às questões relacionadas à ideia de coletivo penso ser muito importante enfatizar que nos PERDIDOS os processos individuais são estimulados da mesma forma que os coletivos. Nos VEÍCULOS a questão passa por um viés problemático, de afinidades intelec-tuais. Em ambos os casos unimo-nos para agregar forças e dialogar, criando um ambiente, acreditando na potência das iniciativas que cada qual vai empreender como agente de uma transformação, como artista-pesquisador, questão que deveremos avaliar caso a caso.

MichelMuitas vezes, espaços de ações e reflexões se ampliam, na medida em que escapam dos domínios do restrito, daquilo que não é público. Assim, como uma publicação pode ser

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considerada uma forma política de intervenção no mundo?

Maria IvoneMichel, eu teria vontade de esmiuçar tua dúvida. Tua questão me coloca diante de duas frentes amplas. O político e o comum. Do que pode ser visto para além da política entendida como consenso, mas como exercício do espaço público e democrático. Cabe a arte revelar a singularidade da posição de quem fala? Vermeer era político assim como Hans Haacke? Cada qual enunciava seus conteúdos sob certas formas. Considero que as publicações são de fato práticas políticas assim como outras formas. Para os artistas contemporâneos a difusão representa a possibilidade de exercer autonomia conquistada à duras penas. Publicar é uma forma de ser e de estar no mundo que se endereça diretamente a um leitor. Isto não é pouca coisa desde Gutenberg.

Hoje vejo outras questões surgindo numa paisagem marcada pelas infindáveis possibilidades geradas pela técnica de edição. Qualquer um pode ser um editor, inclusive o artista? O que define a potência política de uma publicação? Como medir a potência política de uma publicação? De forma geral toda publicação contribui para a difusão, mas um artista como Oiticica, por exemplo, nos dá um sentido do exercício de autonomia e conhecimento que se pode ter. O artista exerce sua posição

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de fato e temos que sempre levar em conta os contextos de inserção destes gestos. Percebo então uma ligação direta entre a prática enunciativa, teórica ou performativa, e seu veículo, como uma alternativa concreta para o artista ou grupo, de criação de um espaço político, que encontra um veículo de difusão democrático. Olhar portativo, o texto do artista pode produzir ressonâncias na medida em que contagia outros agentes enunciativos a ocuparem suas posições no espaço público. [...]

[Esta entrevista encontra-se disponível na íntegra no site: www.ufrgs.br/artes/escultura]

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ENTREVISTAS

Jornal Perdidos no Espaço no III Fórum Social Mundial - 2003[Número 0, janeiro, Porto Alegre, Brasil, 2003]Equipe editorial: Maria Ivone dos Santos, Fernando Falcão, Hélio Fervenza, Glaucis de Morais e Mariana Silva da Silva e Fabiana Wielewicki. Colaboraram: Departamento de difusão Cultural da UFRGS, Elida Tessler, Muriel Caron, Julio Castro, Cristina Ribas, Paulo Reis, Monica Hoff, Andrea da Costa Braga, Stéphane Huchet, Maria Helena Bernades, Fernando Lindote, Cláudia Zanatta, Alexandre Moreira, Raquel Stolf.

Jornal Perdidos no Espaço no V Fórum Social Mundial[Número 1, janeiro, Porto Alegre, Brasil, 2005]Equipe editorial: Maria Ivone dos Santos, Hélio Fervenza, Gláucis de Morais e Mariana Silva da Silva. Colaboraram: Maria Helena Bernardes, Daniele Marx, Monica Narula, Cláudia Zanatta, PORO, GIA, Stéphane Huchet, Cristina Ribas, Daniela Cidade, Gláucis de Morais, Grupo URBOMAQUIA, Muriel Caron, Mari Linnman, Fabiúla Tasca, Hélio Fervenza, POIS, Mabe Bethônico, Raquel Stolf, Elaine Tedesco.

Jornal Perdidos no Espaço no Centro de Porto Alegre[Número 2, maio / junho, Porto Alegre, Brasil, 2006]Equipe editorial: Maria Ivone dos Santos, Hélio Fervenza, Glaucis de Morais e Mariana Silva da Silva. Colaboraram: Melissa Flores, Sandro Bustamante, Larissa Madsen, André Venzon, Rosana Bones, Katlin Jeske, Cecília Fonseca Dutra, Márcia Sousa da Rosa, Lilian Minsky, Ana Becher, Janaina Czolpinski, Marcio Lima, Bitta Marin, Fabrizio Rodrigues, Jaqueline Peixoto, Eduarda Gonçalves, Fernanda Gassen, Michel Zózimo, Pablo Paniagua.

Nota: Todos os textos publicados nos jornais impressos encontram-se também nos jornais eletrônicos do site: www.ufrgs.br/artes/escultura/. Nos jornais eletrônicos se agregam outros colaboradores: (2003) Orlando da Rosa Farya, Mariana Silva da Silva, Patrícia Franca, Arteconnexion (FR), Geraldo Ortoff, Arte Construtora. (2005): Pablo Paniagua, Lilian Minsky, Georg Schöllhammer (Áustria), Janaina Bechler, Maria Ivone dos Santos. (2006) Alfonso Santos.