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    REDES PESSOAIS E POBREZA EM SO PAULO

    Eduardo Marques, Renata Bichir, Thais Pavez, Miranda Zoppi,

    Maria Encarnacin Moya e Igor Pantoja

    Introduo

    As redes sociais so consideradas centrais na sociabilidade dos indivduos e no seuacesso aos mais diferenciados elementos materiais e imateriais. No que diz respeitoespecificamente aos debates sobre pobreza, as redes so citadas muito freqentemente com

    fatores chaves na obteno de empregos, na organizao comunitria e poltica, nocomportamento religioso e na sociabilidade em geral. Apesar disso, a descrio e a anlisedetalhadas das redes pessoais e sociais esto completamente ausentes dos debates, inclusivquando essas so citadas fartamente de maneira metafrica.

    Procurando preencher em parte essa lacuna, este artigo apresenta resultadospreliminares de uma pesquisa em andamento sobre redes pessoais de indivduos em situaode pobreza em So Paulo. Ao longo dessa investigao, levantaremos 150 redes pessoais dindivduos pobres em diferentes situaes urbanas, momentos do ciclo de vida, estruturafamiliar, insero no mundo do trabalho, entre outras caractersticas, visando obter descriede redes pessoais de indivduos em situao de pobreza com perfis os mais diversos possveis.

    O presente artigo apresenta os resultados de 89 redes, correspondentes a trs localizaesurbanas distintas cortios localizados na rea central do municpio, uma favela segregad(Vila Nova Esperana em Taboo da Serra) e uma favela integrada em termos urbanos (VilaNova Jaguar, em So Paulo). Como ser visto, a seleo desses trs contextos urbanosdiferenciados procurou testar o impacto da dimenso espacial na estrutura e organizao daredes pessoais de indivduos de baixa renda. O conhecimento de como se estruturam as redede indivduos pobres representa um passo importante para o entendimento de suas trajetriasde seu cotidiano e das suas estratgias de sobrevivncia, assim como para a melhorcompreenso dos processos sociais que contribuem para a reproduo da pobreza em umsentido mais amplo. Como veremos, os resultados sugerem a existncia de umaheterogeneidade muito maior do que se considera usualmente a respeito das redes.

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    A pesquisa tem vrios objetivos associados. Em primeiro lugar, a investigao pretendedescrever e analisar as principais caractersticas das redes pessoais pela primeira vez noBrasil1, destacando aspectos como seu tamanho, coeso, diversidade, entre outros aspectos.Alm disso, a pesquisa pretende investigar tambm os principais condicionantes dessas redese em especial as suas relaes com a segregao social no espao urbano e com formasespecficas de sociabilidade como a freqncia a templos religiosos e associaes. Asegregao entendida aqui como isolamento dos grupos sociais no espao e homogeneidadinterna a cada regio. Ao contrrio da maior parte da literatura sobre o tema que leva emconta apenas a segregao de atributos no espao urbano (raa, etnia, nvel scio-econmicoetc.), essa investigao testa a importncia da integrao relacional, para alm da segregados atributos, ou seja, procura avaliar a importncia das redes de relaes como elemento

    que podem contribuir para a superao da condio de isolamento espacial dos indivduos. O artigo se divide em quatro partes, alm dessa introduo. Na prxima seo,

    realizamos uma breve reviso da literatura relativa s redes pessoais, levantando as principaidimenses e hipteses sobre a estruturao das redes pessoais e a sua relao com asegregao e a sociabilidade. Na segunda, apresentamos os procedimentos metodolgicoadotados e descrevemos as reas pesquisadas. Na terceira parte do texto apresentamos aprincipais caractersticas das redes analisadas e discutimos os seus principais condicionantesA quarta seo elabora uma classificao das redes segundo suas caractersticas, sugerindo o

    tipos existentes e a sua variabilidade entre as reas pesquisadas, e exemplificando com operfis de indivduos tpicos. Ao final do artigo, resumimos as evidncias apresentadas.

    1. A sociabilidade e as redes pessoais na literatura

    Essa seo de reviso da literatura dividida em duas partes. A primeira apresenta aliteratura que se debruou sobre redes pessoais e padres de sociabilidade. A segunda partepor sua vez, apresenta de forma breve os principais condicionantes identificados na literatur

    como responsveis pelos padres de estruturao das redes pessoais.

    1.1. Redes sociais, estrutura social e sociabilidade

    1 Um estudo anterior realizado no Recife tratou somente de redes egocentradas (FONTES EEICHNER, 2004).

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    O estudo das redes pessoais de indivduos em situao de pobreza insere-se nos debatesmais gerais sobre estrutura social e sobre a sociabilidade dos mais pobres, aspectos centraipara os objetivos da presente investigao. Um terceiro elemento tambm se faz presenteassociado localizao geogrfica dos indivduos no territrio, e ao efeito dessa sobre asredes. Embora essas dimenses se apresentem associadas na realidade, remetem a dimensedistintas que discutiremos a seguir separadamente.

    Nos trabalhos sobre estratificao social desde os inspirados no marxismo at os maiscontemporneos baseados em classificaes ocupacionais a estrutura social analisada partir dos atributos dos indivduos, levando delimitao de grupos sociais (Santos, 2005) ougrupos sociais no espao (Preteceille e Ribeiro, 1999). Para autores como Bian et al (2005)uma forma alternativa e mais completa de tratar o problema estaria na integrao dos atributos

    s relaes sociais dos indivduos. Essa integrao seria ainda mais necessria para os campotericos que buscam interpretar conjuntamente estrutura e ao social.2

    A tarefa, nesse sentido, parece estar em trazer de volta as relaes sociais aos estudos de

    estratificao. A anlise de redes sociais pode contribuir bastante nessa direo, permitindo estudo ao mesmo tempo das relaes entre os indivduos e dos processos sociais gerados partir delas (BIAN et al, 2005). A nfase nas relaes no envolve o abandono do estudo datributos, uma vez que esses muitas vezes circunscrevem padres de interao, limitando-asde diversos modos. O exemplo mais comum nessa direo o efeito de homofilia observadoem algumas situaes sociais, quando ocorre uma maior probabilidade de existncia devnculos entre indivduos com caractersticas semelhantes (KADUSHIN, 2004; LIN, 2001).

    Por outro lado, as redes de relaes remetem sociabilidade presente em um dadocontexto social. Esta dimenso foi destacada pela primeira vez nos clssicos trabalhos deSimmel (1972). Para ele, os grupos na sociedade deveriam ser compreendidos a partir de seupadres de interao. Na verdade, para o autor esses padres constituam um dos principaitraos diferenciadores da sociabilidade moderna baseada em uma grande quantidade de

    vnculos secundrios bastante heterogneos em contedo, fracos em intensidade e no mainecessariamente organizados territorialmente. O epteto desses padres de vnculo estaria nvida da metrpole moderna, que propiciaria aos indivduos uma significativa liberdade de

    2 Para o marxismo, por exemplo, este problema est resolvido quase pordefinio, visto quetanto as posies na estrutura quanto a ao social e poltica se originam da compreenso de relaessociais singulares delimitadas teoricamente as relaes de classe.

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    circulao e escolha social, ao contrrio dos padres caractersticos do mundo rural e dascidades pequenas.

    Wellman (2001) retoma a idia de delimitao social e no necessariamente espacial

    dos vnculos em seus estudos sobre comunidades contemporneas, apontando que as relaeiriam para alm das fronteiras fsicas. Embora concorde com Simmel que esse um trao dasociedades modernas, o autor destaca como as novas tcnicas de comunicao e transporteintensificaram o processo, ajudando a superar as barreiras fsicas da vizinhana e dascomunidades. Para ele, o recente declnio da comunidade espacialmente circunscrita levouerroneamente certos pesquisadores a considerarem o fim da comunidade em geral e daderivarem os seus efeitos sobre a solidariedade, a democracia ou mesmo a sociedade comoum todo. Para Wellman, diferentemente, as comunidades no desapareceram em perodo

    recente, mas apenas se transformaram, levando a interao social doporta-a-porta para alugar-a-lugar. Esse fenmeno teria se intensificado no perodo mais recente em funo desurgi mento de novas tecnologias como a internet e o telefone celular. Dessa forma, ascomunidades contemporneas estariam escassamente reduzidas vizinhana e a maioria dapessoas obteria informao, apoio, e sentimentos de pertencimento em outros bairros dacidade (WELLMAN, 2001).

    O trabalho de Blokland (2003) vai ainda mais longe, afirmando que talvez a prpriaidentidade entre comunidade e vizinhana nunca tenha existido de fato. Para a autora acontigidade fsica entre indivduos e grupos pouco nos auxilia no entendimento das relaeque se estabelecem entre eles. Para alm da existncia ou no de vizinhana, o que marcaria comunidade estaria em identidades construdas a partir dos vnculos sociais. Da a proposta de

    anlise de comunidades individuais no sentido de Blokland (2003), ou seja, estudar asociabilidade e integrao social dos indivduos a partir de seus vnculos pessoais, em especial

    aqueles com certos contedos que levam formao da comunidade em sentido cultural social, e no apenasgeogrfico.

    Entretanto, os trabalhos de diversos outros autores nos sugerem que, ao menos emcontextos de pobreza urbana, a geografia ainda seja um elemento chave na sociabilidade. Aquesto relativamente complexa, pois a relao entre redes e segregao espacial deve seanalisada a partir de dois ngulos distintos. Em primeiro lugar e em um sentido mais simples necessrio analisar em que medida as redes de indivduos pobres esto contidasespacialmente. Essa dimenso, que poderamos chamar de localismo (para diferenciar o efeito

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    das redes sobre a integrao social dos efeitos da segregao urbana), testa a hipteseformulada por Wellman. Por outro lado, uma segunda dimenso diz respeito ao quanto asredes de indivduos diferem entre si segundo o grau de segregao social a que esses estosubmetidos na cidade. Trata-se nesse caso efetivamente dos efeitos da segregao sobre aredes. Embora a primeira dimenso seja objeto de diversos estudos, a segunda se encontraescassamente abordada e por vezes confundida com a primeira. Como veremos nasprximas sees, nossos resultados preliminares sugerem que embora as redes tendam a selocais (primeiro sentido), o segundo efeito praticamente nulo. A finalizao da pesquisacom um nmero de casos mais elevado e diversificado em termos de contextos urbanospermitir testar esses resultados preliminares.

    No que diz respeito dimenso do localismo, estudos como Briggs (2001), Espinoza

    (1999) e Fontes e Eichner (2004) vm ressaltando a proeminncia dos vnculos entre os maipobres com indivduos que moram no bairro, seja parentes, amigos, vizinhos. Nesse sentidocomo apontado por Pavez (2006), o localismo afasta espacialmente os grupos mais pobresreduzindo o contato com outros grupos sociais e aumentando a homogeneidade dascaractersticas desses indivduos conectados socialmente. Na mesma direo vo Araya eJariego (2005) ao destacar que o espao fsico pode facilitar e limitar ao mesmo tempo aformao e manuteno das relaes pessoais. Entretanto, os autores destacam que h fatoreque atenuam o impacto da geografia, visto que cada relao pode abrir porta para outras em

    outros contextos no sentido de pontes sociais e territoriais. Por outro lado, quandoconsideramos o acesso a recursos materiais e imateriais, essas interaes tornam-se, naspalavras de Briggs (2001), verdadeiros recursos sociais que ajudam os indivduos a se virar(get by ) em condies de escassez, utilizando intensamente as redes em suas estratgias desobrevivncia.

    Assim, como aponta Espinoza (1999), em que pesem os argumentos de Wellman, ageografia ainda define limites para as interaes sociais, em especial em contextos de pobrez

    onde a interao parece ser principalmente porta-a-porta. Essa linha de interpretao tambm defendida por Ferrand (2002), que afirma que o estudo da composio tpica damicroestruturas de relaes no interior de comunidades nos ensina sobre as estruturas mesoque conectam as comunidades a seus contextos sociais mais amplos. Comunidades distintateriam padres especficos de vinculao com contextos urbanos e sociais mais amplos

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    tornando a relao entre segregao e redes sociais contingente e acessvel apenasempiricamente.

    1.2. Os principais condicionantes das redes pessoais

    Nos estudos sobre as redes pessoais, distintas dimenses vm sendo analisadas comodeterminantes das caractersticas das redes. Vrios desses elementos aparecem de maneirimportante em nossos resultados, razo pela qual so discutidos a seguir.

    O primeiro estudo a destacar o de Blockland (2003) sobre um bairro operrio naHolanda, j citado anteriormente. A autora utiliza a classificao de redes de Ulf Hannerpara destacar os diferentes tipos de redes pessoais presentes. Para ela, embora esses tipossejam construdos nas trajetrias individuais, pelo que chama de experincia social, dadpelo tempo, freqncia dos contatos e eventos na vida do indivduo (migrao, perda doemprego, e encontros de sociabilidade, dentre outros), tambm so influenciados por atributos como gnero e fase no ciclo da vida. Sobre essa ltima dimenso, Bidart e Lavenu (2005realizaram uma pesquisa de tipo painel na Frana entre 1995 e 2001 para analisar o impacto

    da passagem da juventude para a vida adulta sobre as redes, considerando o efeito de eventocomo concluir a vida escolar, comear a trabalhar, imigrar, casar-se etc. Os autores afirmamque as redes de indivduos de renda mais baixa se reduziriam mais cedo pela ocorrncia maiprecoce de elementos redutores das redes no ciclo de vida. Moore (1990), por outro ladoexplora as diferenas entre as redes pessoais de homens e mulheres utilizando dados do Social

    General Survey de 1985. Os resultados sugerem que no caso dos EUA, as redes de mulhereso em geral mais fortemente baseadas em pessoas da famlia e as dos homens em colegas dtrabalho.

    Por outro lado, Grossetti (2004) analisou as redes egocentradas de quase 400 indivduoem Toulouse, Frana, para avaliar a importncia da origem dos vnculos que constituem aredes pessoais na sociabilidade dos indivduos. Um dos resultados interessantes desse trabalho

    que a proeminncia dos contextos de origem dos vnculos (famlia, estudos, trabalho, redevaria socialmente, sendo a presena dos vnculos de sociabilidade ou originados viarede(atravs de outros) decrescente com a escolaridade, enquanto os educacionais, de trabalho

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    associativos tendem a crescer. Levando em considerao a associao entre os contextos deorigem e o ciclo de vida, o autor aponta que haveria uma ampla predominncia dos vnculofamiliares na infncia, uma exploso dos laos originados atravs de rede social e estudo nadolescncia e, mais adiante, uma elevao relativa da importncia do contexto do trabalhoem especial para os indivduos com escolaridade mais alta. Os tamanhos das redes tambmseriam influenciados pelo ciclo de vida, embora isso varie segundo a posio social dosindivduos.

    Explorando os condicionantes sociais das redes pessoais em situao de pobreza, seinclui ainda o trabalho de Fontes e Eichner (2004), nico estudo brasileiro publicado sobre tema. Os autores analisam as redes egocentradas em uma comunidade de baixa renda doRecife de forma a avaliar a contribuio das redes para a construo de capital social

    encontrando elevada homofilia nas redes egocentradas, tanto de sexo, quanto de idade eescolaridade. No contexto dos vnculos, a pesquisa indica que a maior parte com pessoas dprpria comunidade, estando mais presentes os vizinhos e os parentes. A partir de taisresultados, os autores destacam o localismo nas redes estudadas.

    Na mesma linha de anlise e ressaltando a dimenso do apoio social incluem-se ostrabalhos de Campbell e Lee (1992) e Espinoza (1999). Os primeiros estudaram ascaractersticas das redes de vizinhana segundo caractersticas dos indivduos, sexo, idadenvel de instruo socioeconmico, dentre outros. Os autores sustentam que os indivduocom nvel scio-econmico menor voltam-se para a vizinhana, pois essa constitui uma fontde suporte emocional e instrumental, sendo muito importante a intensidade dos vnculosObservao semelhante faz Espinoza (1999) em seu estudo sobre acesso e redes individuaide uma comunidade de baixa renda em Santiago do Chile. O autor mostra que a fora dosvnculos a caracterstica mais saliente dos laos de vizinhana, influenciando aprobabilidade de estabelecimento de relaes, inclusive mediante casamento. Assim, comapontam Campbell e Lee (1992), as pessoas no escolhem dentre infinitas possibilidades, o

    constrangime ntos sociais e econmicos limitam as alternativas disponveis.Outra dimenso para entender a sociabilidade dos indivduos em situao de pobreza,

    destacada por Campbell e Lee (1992), diz respeito aos custos de manuteno dos vnculospara os diferentes grupos scio-econmicos. Isso se deve ao fato de que manter vnculosativos envolve custos de comunicao, transporte, entre outras despesas. Assim, esses custotendem a ser relativamente mais elevados para indivduos com renda mais baixa. Nesse

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    sentido, ainda que a comunicao e a participao em eventos de sociabilidade (como, poexemplo, em atividades de lazer) possa ser freqente na vida dos indivduos de baixa rendaesse tipo de interao tende a ocorrer entre indivduos que moram prximos e apresentamcaractersticas semelhantes (vizinhos e familiares), pois o custo para a manuteno dessevnculos desta forma minimizado. Dessa forma, as caractersticas das redes dos indivduoparecem no estar associadas apenas produo de contatos ou redes em suas trajetrias, matambm manuteno dos contatos.

    Por ltimo, destacam-se os trabalhos focados na questo da integrao social.Dominguez (2004) realiza um estudo sobre os contextos relacionais de mulheres de baixrenda imigradas em Boston, avaliando a relevncia de suas redes pessoais para a construode trajetrias de mobilidade social. Os resultados sugerem a grande importncia da existnci

    de redes heterogneas socialmente que incluam pontes para indivduos localizados em outrolocais na estrutura social, no apenas para veicular oportunidades, mas tambm acesso arepertrios e informao. Por outro lado, Ferrand (2002) defende a importncia do estudodaquilo que chama de dualidade dos sistemas locais de relao a presena de relaesinternas e externas (locais e no locais). H, portanto, a preocupao de analisar como e deque forma as redes de no locais transformam-se com a maior ou menor integrao socialretratando o processo migratrio como um processo de adaptao a um novo ambientecultural, social e relacional. Nesse processo, o autor destaca a dificuldade dos indivduos emmanter os vnculos de suas redes de origem, e uma heterogeneidade na composio e estrutura

    das redes de imigrantes de distintas origens. De modo geral, entretanto, o tempo parece tender

    a relaxar essas caractersticas, levando ao aumento da rede, assim como a uma maior presenrelativa de no compatriotas.

    2. Algumas definies conceituais e procedimentos de pesquisa

    Essa seo procura estabelecer alguns elementos de definio conceitual e explicar os

    procedimentos de pesquisa. importante frisar em primeiro lugar que no entendemos redepessoais como um sinnimo de redes egocentradas. A maior parte dos estudos que trabalhamcom redes individuais aborda redes centradas em um dado ego, incluindo apenas indivduolocalizados a um passo de distncia dele e os vnculos existentes entre eles. Esse tipo de redpode ser analisado utilizando dados de survey, o que talvez explique a sua maiordisseminao. Consideramos que uma parte importante da sociabilidade dos indivduos ocorre

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    em crculos mais amplos do que esses, razo pela qual no limitamos a abrangncia da rede ser pesquisada3. Nesse sentido, redes pessoais incluem relaes e indivduos listados por umdado ego como participantes de suas esferas de sociabilidade. Assim, elas so maiores e maiabrangentes do que as redes egocentradas por inclurem indivduos que distam mais do quedois passos do ego. Como veremos, procedendo dessa forma, temos acesso a redes detamanhos muito variados, mas que chegam a incluir mais de 110 indivduos e dimetrossuperiores a 10 passos.

    Entendemos por esfera de sociabilidade a uma regio da sociabilidade em geralorganizada a partir de algum processo de especializao (funcional, de prticas, cultural e didias, etc). A esfera produto da especializao das atividades sociais e humanas em sentidamplo, incluindo crculos de interesse (crculos de discusso e de prticas especficas)

    crculos de sociabilidade e convivncia (grupos de amigos) e instituies especficas (como famlia). Em termos concretos a esfera inclui certo conjunto de indivduos e organizaes, arelaes que se estabelecem entre eles (de vrios tipos e em constante transformao), assimcomo determinadas identidades, conjuntos de signos e padres discursivos no sentido deMische e White (1998) e White (1995). Nesse sentido, as esferas guardam semelhana com os

    network domains daqueles autores, embora busquem descrever contextos mais especficos,estruturados e duradouros. Talvez seja possvel dizer que as esferas da vida, conformedefinido aqui, incluam as verses mais estveis dosnetdoms de Mische. As esferas podem em

    alguns casos ser superpostas pela existncia de indivduos que participam de mais deumcontexto de sociabilidade ao mesmo tempo. Esses indivduos so chamados por ns demultiplexos e podem realizar atividades de mediao entre os diferentes contextos em queatuam.

    Nossa anlise das redes parte de material emprico primrio gerado a partir deentrevistas com um questionrio semi-aberto referente s caractersticas gerais doentrevistado, tais como composio familiar, vnculos associativos e trajetria ocupacional

    que funcionam posteriormente como atributos que auxiliam no entendimento dos padres drelaes e ferramentas de coleta de dados relacionais, incluindo um gerador de nomes eatributos dos indivduos das redes. Posteriormente, utilizando tcnicas de anlise de redessociais, reproduzimos cada rede individualmente, construindo para cada rede uma matriz d

    3 Na verdade, h um limite operacional de quatro rodadas de perguntas por meio do mtodobola de neve, mas na maioria das entrevistas a rede foi fechada isto , no apareceram novosvnculos antes mesmo que esse limite fosse alcanado.

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    conectividade, estatsticas e sociogramas. No conjunto da pesquisa, sero construdasaproximadamente 30 redes para cada contexto urbano escolhido, incluindo uma favela poucsegregada, uma favela muito segregada, cortios na rea central, uma favela contgua a umbairro de elite e um conjunto habitacional de periferia, totalizando 150 redes. Para construiparmetros gerais de controle, levantaremos tambm aproximadamente 30 redes deindivduos de classe mdia. O presente artigo apresenta as informaes relativas a 89entrevistas situadas nos trs primeiros contextos urbanos pobres, variando principalmente doponto de vista da segregao espacial: uma favela integrada (ou no-segregada), a Vila NovJaguar, situada no bairro do Jaguar, zona oeste da cidade; uma favela isolada - a Vila NovEsperana, no limite dos municpios de Taboo da Serra e So Paulo, na regio sudoeste daRMSP; e cortios localizados nos bairros do Pari e Luz, regio central da cidade de So

    Paulo. As informaes relacionais foram geradas a partir de entrevistas em duas fases

    realizadas com o prprio indivduo cuja rede se pretendia levantar. Na primeira, para compoa semente das entrevistas com o gerador de nomes, os entrevistados foram instados a fornecerum conjunto de nomes para cada esfera de sociabilidade delimitada ao longo da entrevistcomo relevante: familiar, vizinhana, amizade, associativa, diverso/lazer, estudos eprofissional/trabalho. Esses nomes foram includos em uma lista que foi apresentada aosentrevistados, solicitando-os que indicassem at trs nomes associados a cada nome da lista

    sendo aceitas repeties livremente, assim como a indicao de si prprio. Os nomes queapareceram na entrevista e no faziam parte da semente inicial foram includos e submetidos a

    uma nova rodada de entrevista com a mesma pessoa. O procedimento foi repetido at trvezes. Desse modo, obtivemos somente a presena ou ausncia de vnculos no interior de uma

    determinada rede pessoal, e no a fora ou intensidade dos mesmos. Em seguida, solicitamoaos entrevistados para classificar os ns gerados acima segundo trs atributos: contexto deentrada na rede pessoal, se o indivduo de fora ou de dentro da rea estudada e a esfera dsociabilidade a que pertence. Em todos os casos, os atributos podiam ser alterados no contextoda prpria entrevista, considerando a sua alta especificidade com relao s trajetrias e redes especficas.

    Todo esse material coletado foi organizado de modo a constituir um banco de dados doqual constam as caractersticas gerais do entrevistado e dados referentes sua rede pessoal nmero de vnculos, diversidade de esferas e contextos, entre outras caractersticas. A parti

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    desse banco, foram geradas estatsticas bsicas de anlise de redes sociais por meio dosoftware Ucinet. As anlises apresentadas nas prximas sees baseiam-se nessasinformaes.

    2.1.Descrio dos campos

    Essa seo apresenta de modo breve as principais caractersticas de cada um doscampos escolhidos para acoleta de redes pessoais.

    Com cerca de 12.000 habitantes, a favela Vila Nova Jaguar pode ser considerada umadas maiores favelas do municpio de So Paulo, e tambm uma das mais antigas. Situada nbairro do Jaguar, vizinho ao municpio de Osasco e aos bairros do Butant e de Pinheiros,

    favela apresenta uma grande heterogeneidade scio-econmica, caracterstica presente emdiversos contextos de pobreza urbana, em especial favelas4. Apesar de apresentar diversasprecariedades locais, o entorno da favela predominantemente de classe mdia, e dista poucda regio mais rica da cidade o centro expandido. Essas caractersticas lhe conferem umaposio relativamente favorvel do ponto de vista da segregao espacial no conjunto dacidade. A favela surgiu na rea de 150.000 m2 doada prefeitura para o estabelecimento deuma rea de lazer, no contexto da industrializao do bairro ainda em meados dos anos 1940O terreno, devoluto, comeou a ser invadido ainda na dcada de 1950, e at meados da dcada

    de 1980 a favela cresceu baseada no aumento do emprego em indstrias da regio. Pormcom a crise do comeo dos anos 1990, a rea se adensou e, de um modo geral, empobreceu.

    A cristalizao de todos esses processos no espao derivou a principal regionalizao da

    favela: na parte mais alta, que tem como centro a Praa Onze e em reas circunvizinhasencontram-se os moradores mais antigos e com melhores condies habitacionais, em umespao mais urbanizado graas ao dos prprios moradores e do Estado, com razovelacesso infra-estrutura e aos servios urbanos (gua, esgoto, iluminao pblica, coleta delixo, asfalto) e comrcio variado. Nas reas mais baixas, sobretudo margem dos trilhos dotrem (que no passa mais), e nas encostas, concentram-se os moradores mais recentes e maipobres, em moradias mais precrias e ameaadas pelo risco de enchentes e desabamentosEsta diviso, entretanto, no absoluta, de maneira que mesmo nos arredores da Praa Onzh interstcios ocupados por moradias bastante precrias (em alguns casos ainda de materia

    4 Ver Saraiva e Marques (2005).

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    precrio), e, por outro lado, na parte inferior tambm possvel encontrar casas de alvenaricom garagens. A favela foi objeto de alguns projetos habitacionais pontuais durante a gestCelso Pitta (1997-2000) e terminados por Marta Suplicy (2001-2004), com a construo d260 unidades habitacionais pelo projeto Cingapura. Alm destas unidades novas, nestesegundo governo a favela foi includa no programa de urbanizao de favelas, que deu incia um processo de remoo de algumas famlias em reas de risco. A organizao comunitrino particularmente ativa e no plano da ao comunitria destaca-se a ao da Congregade Santa Cruz, ligada ao Colgio Santa Cruz (colgio particular de classe alta localizadoprximo). A igreja conta com importante liderana no local desde a dcada de 70, que atua nfavela e est frente de trs creches e um centro profissionalizante que oferece cursos decorte e costura e informtica.

    O segundo campo, a favela Vila Nova Esperana, localiza-se no limite dos municpiosde Taboo da Serra e de So Paulo, em meio a uma rea de mata atlntica. O acesso se d apartir do quilmetro 23 da Rodovia Raposo Tavares, passando por um bairro de classe mdiabaixa e por uma estrada de terra de cerda de 4 quilmetros entre glebas ocupadas poratividades rurais. Atualmente cerca de 400 famlias moram na favela e a maior parte chegoao local nos ltimos 10 anos, quando comeou a ocupao. A Vila Nova Esperana apresentuma situao interna tambm heterognea e seu entorno caracteriza-se pela presena debairros de classe mdia baixa, como o Jd. Joo XXIII, com escassa oferta de trabalho. O fat

    de se encontrar no limite de dois municpios acabou colocando a rea em um vazioinstitucional. A infra -estrutura urbana bastante precria: no h iluminao pblica e mesmoo acesso via 'gatos' no comporta a demanda local, sendo constantes as quedas de energiaNo h ruas asfaltadas e a populao tem um srio problema de transporte pblico, dado oisolamento do terreno em relao s vias de acesso a outros bairros, o que acarretacaminhadas dirias de adultos e crianas em uma estrada de terra e sem iluminao.

    O resultado dessas caractersticas o relativo isolamento e a segregao espacial que

    aumentam a situao de precariedade e vulnerabilidade de seus moradores. A Associao doMoradores de Vila Nova Esperana tem negociado com a prefeitura de Taboo melhorias nolocal, e possvel que a favela seja contemplada com projeto de urbanizao. Uma parte drea foi decretada Parque Ecolgico pela prefeitura, a fim de conter a expanso da favela promover futuramente melhorias na rea. A principal rea de expanso ocupada pelapopulao mais pobre se situa exatamente junto a essa rea.

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    Por fim, as entrevistas realizadas em cortios de reas centrais da cidade de So Paulocontemplam uma terceira situao de moradia marcada por uma situao especfica quecombina grande acessibilidade com alta precariedade habitacional, mas que tem comocontraponto maiores possibilidades de integrao socioeconmica e de acesso a serviourbanos. Apesar de no haver homogeneidade entre os cortios, mesmo nas melhoressituaes trata-se de uma condio de moradia precria por vrios motivos: uso comum deequipamentos(banheiro, tanque ou mesmo cozinha) por diversas famlias, excessivadensidade habitacional, vrias funes exercidas em um mesmo espao (quarto, sala e cozinha

    no mesmo espao), precariedade nas instalaes hidrulicas e eltricas, ausncia deprivacidade e alta rotatividade locacional. Entretanto, para alguns a situao ainda pior, emespecial para os habitantes dos pores, onde a umidade e a total falta de iluminao natural

    ventilao e insolao tornam essa situao dramaticamente precria.Os bairros do Pari e da Luz esto ente as localidades do Centro que mais concentram

    cortios, ao lado de outros bairros como Bom Retiro e Bela Vista. A populao encortiada em sua expressiva maioria de origem migrante, mas os cortios no representam uma situaoprovisria no momento de chegada cidade, embora a migrao entre cortios seja muitofreqente (KOWARICK, 2005). A opo pelo cortio e a permanncia em uma condio dmoradia marcada por tanta precariedade baseia-se no grande valor que essas pessoas do suas vantagens locacionais, afinal viver no centro implica reduo dos gastos de transporte tempo, maiores oportunidades de trabalho, inclusive noite, acesso a equipamentos e servios

    pblicos, alm de maiores opes de lazer. No entanto, paga-se caro por essas vantagens: umavez que a legislao relativa s normas de habitabilidade coloca na ilegalidade a maioria docortios, os moradores costumam realizar contratos verbais com sub-locatrios e pagamvalores extorsivos, em mdia mais altosque os do mercado formal. Viver em cortios tambmimplica uma sociabilidade especfica, por ser um espao residencial marcado pelaprecariedade, transitoriedade e quebra freqente da intimidade e privacidade dos moradoresresultando em conflitos com vizinhos.

    4. Caractersticas bsicas das redes

    De uma forma geral, a escolha dos entrevistados em cada um dos campos tentouabranger a variabilidade observada em termos de sexo, idade, estrutura familiar, insero nomercado de trabalho, etc. Em cada campo, iniciamos as entrevistas com indivduos

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    previamente contatados por pesquisas anteriores ou por meio de abordagem direta nas ruas prosseguimos com tcnicas de bola de neve, tendo em mente os perfis desejados para amanuteno da variabilidade nas situaes sociais, mas sem empregar tcnicas formais damostragem.

    O resultado foi uma amostra com uma maior proporo de mulheres 57% contra 43%de homens , a maioria casada ou com companheiros 60,7%, sendo que essa proporochega a 70% no Jaguar, mas apenas a 55,2% nos cortios. A idade dos entrevistados variouentre 12 e 72 anos, com mdia de cerca de 36 anos, mas os entrevistados dos cortiosapresentam a menor idade mdia 32 anos contra 38 anos no Jaguar e 37 em Taboo. Comseria de se esperar, a escolaridade dos indivduos da amostra bastante baixa 5,4 anos destudo, e varia pouco entre as trs localidades de 4,7 nos cortios a 6,5 anos no Jaguar. O

    rendimentos familiares per capita so igualmente muito baixos e variam ainda menos R$255,6 no Jaguar a R$ 228,7 em Taboo.

    Sob o ponto de vista do mercado de trabalho, predominam de maneira geral osempregados sem carteira (22,5%) em especial no centro (31,0%) e aqueles que no tmvnculo com o mercado de trabalho (donas de casa, estudantes e aposentados), com 23,6%. Aeles seguem os autnomos, com 21,3% e os empregados com carteira, com 16,9%. Osdesempregados somam 6,7%, mas h menos desempregados em Taboo (3,3%). A elevadaproporo de autnomos indica na verdade desemprego oculto pela realizao de pequenatarefas com baixa remunerao, nenhuma proteo e carter espordico. A grande maioria dos

    empregados obteve seu emprego atravs de contatos de redes (73,5%), sendo essa proporainda mais elevada no centro da cidade (93,9%). A grande maioria das pessoas trabalha nprpria rea (61,8%). Apenas no caso de Taboo, o caso mais segregado espacialmente,predominam as pessoas que trabalhamfora da rea (56,7%). A renda familiar per capitamdia maior no caso dos empregados com carteira (R$ 401,5), seguida pela dos pequenoproprietrios (R$ 277,9).

    Com relao cor da pele, 53,9% dos entrevistados so no pretos, mas na rea centrah maior concentrao de pessoas da pele de cor preta 55,2%. No Jaguar h a maiorconcentrao d e no pretos 66,7%.

    Em termos de religio, a maior parte dos entrevistados se auto-declarou catlica(63,6%), embora os catlicos predominem mais fortemente no Jaguar (86,7%); osevanglicos no predominam em nenhum dos campos, variando de 13,3 no Jaguar a 35,7%

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    no centro. Como veremos mais adiante, entretanto, a freqncia a templos variasubstancialmente. A participao em associaes civis baixa (7,9%), variando entre 3,3 noJaguar e 13,8% no centro.

    Alm das caractersticas gerais dos entrevistados, analisamos agora as caractersticas desuas redes pessoais. As redes levantadas tm em mdia 54 ns (variando de 15 a 119 pessoase 205 vnculos5 (variando de 42 a 578). O dimetro mdio6 6,6 (variando de 3 a 12). Adensidade mdia7 das redes de 0,083, o grau mdio8 3,7 (variando de 1,9 a 5,7). Emmdia, as redes tm 3,9 esferas de sociabilidade (variando de 2 a 7) e 4,4 contextos de incide entrada dos ns (variando de 2 a 7). Essas informaes j sugerem a existncia de umagrande variabilidade nas redes pessoais. Embora essas tambm sejam influenciadas pocaractersticas individuais, sofrem forte impacto de dimenses sociais como o sexo, a idad

    do indivduo, as suas esferas de sociabilidade e o grau de segregao residencial a que estsubmetidos. Testamos a seguir a importncia de tais dimenses.

    Considerando as propores mdias de pessoas nas diversas esferas das redes, avizinhana aparece como a esfera mais importante com 35,3%, seguida pela famlia com34,0%. Em patamar mais baixo aparece a esfera trabalho (8,0%), sendo que as demais esferaconcentram muito menos pessoas. Em geral, a importncia das esferas da vizinhana e dafamlia pode ser considerada como indicador de uma certa endogamia das redes, o que nesscaso significa isolamento social. Ou seja, esses resultados destacam o carter local dessaredes e parecem confirmar os achados de outros estudos que se debruaram sobre redespessoais em contextos de pobreza (BRIGGS, 2001; ESPINOZA, 1999 E FONTES EEICHNER, 2004)

    Em termos de contextos de aquisio de vnculos e entrada de pessoas nas redes,destacam-se os contatos que levam a contatos (redes, com 28,9%), seguido pela vizinhana(26,1%) e pela famlia (24,5%), sendo que os demais contextos aparecem em patamares muito

    inferiores. Esses resultados so similares queles obtidos por Fontes e Eichner (2004), que

    destacaram a importncia de vizinhos e parentes na aquisio de novos vnculos no caso doRecife.

    5 So as relaes existentes entre os ns, ou entre as pessoas da rede. Nos sociogramas eles soas linhas que ligam os ns. 6 a maior dentre as menores distncias existente entre todos os pares de ns. 7 Indica a proporo de relaes efetivamente existentes com relao ao nmero de relaespossveis. 8 Corresponde ao nmero de ns diretamente relacionados a um dado ego.

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    Uma parte no desprezvel das redes, 7,4%, diz respeito a contatos com conterrneos.Esse resultado parece seguir a mesma direo dos argumentos de Ferrand (2002), uma vezque, apesar do grande nmero de migrantes em nossa amostra, a proporo de pessoas dolocal de origem que ainda permanece nas redes pessoais relativamente baixa, o queprovavelmente resultado do processo de adaptao desses migrantes a maioria h mais d10 anos em So Paulo ao novo local.

    Considerando a dualidade interno/externo apontada por Ferrand (2002), destaca-se queas redes pessoais coletadas tm em mdia 58,2% de pessoas internas rea, embora apresena dessas varie muito entre os entrevistados entre 8,9% a 100%. O localismo tambmest presente em termos de diverso: a maioria dos entrevistados que realiza atividades dlazer o faz dentro da prpria rea (61,4%). Essas informaes sugerem que uma parcela

    expressiva das redes principalmente local (primeiro sentido da relao entre redes e espadescrita em seo anterior) e socialmente homognea, confirmando hipteses levantadas nltima seo e contrariando as descries de Wellman. praticamente inexistente a presenade indivduos de outros estratos sociais nas redes.

    Uma das principais dimenses que separa as redes o sexo dos entrevistados. Ahomofilia de gnero muito elevada nas redes (62,3%) e no h diferenas marcantes entre astrs reas pesquisadas. Mulheres tendem a ter redes maiores (com mais ns e vnculos), maidensas e mais centralizadas em torno de si.9 A diversidade de esferas e contextos similarpara mulheres e homens. Com relao s esferas de sociabilidade, as mulheres tendem a temais esferas de vizinhana, de amizade, e um pouco mais de igreja do que para os homens. As

    mulheres tambm tm mais indivduos que entraram na rede por outros contatos existentesassim como um pouco mais de indivduos externos rea. Os homens, diferentemente, tmmais indivduos nas esferas da famlia, do lazer (em especial incluindo freqncia a bares futebol). Em termos de contexto de incio do vnculo, as redes dos homens tm mais famlia lazer e incluem muito mais conterrneos. Vrias dessas caractersticas sugerem que as

    mulheres mantm sociabilidade mais intensa e redes mais diversificadas, quando comparadacom as dos homens.

    Uma outra dimenso que aparentemente estrutura as informaes se relaciona com ocampo da religio. No que diz respeito freqncia a templos, 35,6% afirmam ir pelo meno

    9 As redes so to mais clusterizadas quanto mais agrupamentos internos tiverem, relativamente. Somais centralizadas quando a forma da rede se assemelha mais a uma rede em forma de estrela de igualtamanho, com todos os vnculos convergindo diretamente para o ego.

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    quinzenalmente. A freqncia maior entre evanglicos - 62,5% - contra apenas 29,1%catlicos. Vale destacar, entretanto, que essa mesma informao indica que 37,5% dosevanglicosvo com freqncia menor ou simplesmente no vo a templos. As redes de auto -declarados catlicos e evanglicos tm o mesmo nmero mdio de ns, mas as redes decatlicos possuem maiores quantidades de vnculos. Todos os demais parmetros relacionai densidade, clusterizao, centralizao, dimetro so muito prximos. Sob o ponto devista da sociabilidade, evanglicos tm mais indivduos nas esferas igreja e associao, assimcomo mais pessoas externas rea em suas redes. As redes de evanglicos tendem ainda adquirir novos contatos mais intensamente via rede e muito mais via igreja, em concordncicom o senso comum. Catlicos, diferentemente, tm mais indivduos nas esferas famlia lazer e tendem a adquirir vnculos mais intensamente atravs da famlia. Suas redes tendem

    tambm a ser muito mais locais do que as de auto-declarados evanglicos.Alm de descrever as caractersticas gerais das redes pessoais, procuramos construir

    indicadores que pudessem apontar para os condicionantes desses padres observados. Nesssentido, para analisar a incidncia de precariedade social e a sua possvel relao com aredes, construmos indicadores a partir de informaes da situao dos indivduos. importante considerar que, de acordo com o grupo populacional objeto dessa pesquisa, osnveis de precariedade considerados so bastante baixos e tentam diferenciar quem est emsituao muito ruim de quem no est.

    Em primeiro lugar, para destacar a presena de fragilidade nos arranjos familiares,criamos um indicador de precariedade familiar quando o ncleo familiar era composto por um

    nico adulto com filhos ainda crianas. De nossa amostra, 11,2% dos entrevistados tmprecariedade familiar, sendo que ela afeta mais fortemente as mulheres e est ausente noJaguar. Em termos habitacionais, definimos como precria a situao de habitar em barracde madeira ou em quarto sem banheiro. Este tipo de precariedade se mostrou presente em36,0% da amostra, e evidentemente mais incidente no centro da cidade, pela prpria

    definio do indicador (66% dos entrevistados esto nessa condio) sendo que novamentas mulheres esto mais sujeitas a esse tipo de precariedade. A condio de precariedade maicomum est relacionada com a insero no mercado de trabalho. Estabelecemos comocondio precria o desemprego, viver de bicos ou ter emprego sem carteira assinada. Esscondio incidiu sobre 67,1% daqueles com vnculos com o mercado de trabalho, mas maipresente no centro (82,6%). Alm disso, quando o rendimento mdio familiar per capita er

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    igual ou inferior a meio salrio mnimo (R$ 175), consideramos a situao dos indivduosprecrios sob o ponto de vista dos rendimentos. Quase metade dos entrevistados (46,1%)apresentava precariedade de rendimento, sendo que no Jaguar essa proporo era de 50,0%e, mais uma vez, as mulheres estavam mais sujeitas a essa precariedade. Por fim, quando oindivduosapresentavam duas ou mais dentre as quatro condies de precariedade anteriores,considerou-se a sua situao social como precria. Essa condio incidiu sobre 48,3% daamostra, embora tenha alcanado 58,6% no centro. A relao entre a presena de precariedade

    social e o tamanho das redes foi confirmada por testes de mdias, que sugeriram queindivduos em situao precria tm redes com menor quantidade de ns do que indivduosem precariedade geral (69 contra 56 ns, diferena significativa a 95% de confiabilidade).

    Cabe destacar que muitos desses resultados sero complementados nos campos futuros

    bem como sua anlise ser melhor desenvolvida.

    5. Tipologia das redes

    De forma a considerar todas essas dimenses de maneira combinada e identificar ostipos de redes existentes, foi realizada uma anlise de cluster a partir das caractersticas daredes pessoais levantadas. Tecnicamente, foi utilizada anlise de agrupamentos submetendovariveis escolhidas das redes rotina do software Spss para K-means. Para a criao da

    tipologia de redes foram utilizadas as variveis:nmerode ns da rede; nmero de vnculosda rede; grau mdio da rede; coeficiente de clusterizao; ndice de centralizao da redindividual; nmero total de esferas; nmero total de contextos; proporo de pessoas externa rea; proporo de conterrneos; homofilia de gnero (%) com homens se o ego fossehomem e com mulheres se o ego fosse mulher. No foram includas variveis de atributo doegos na construo dos grupos, mas essas foram acrescentadas na anlise para caracteriz-lossocialmente.

    Aps vrios testes, a melhor soluo foi encontrada com quatro agrupamentos10, queso apresentados a seguir. Para cada um dos grupos, apresentamos a rede e a trajetria de umindivduo pertencente ao grupo e que o caracteriza de maneira tpica (ou seja, que apresentacaractersticas prximas mdia do grupo).

    10 A realizao de vrias anlises indicou a existncia de um caso discrepante, com grande quantidade dens, que foi inicialmente retirado da anlise para no enviesar a anlise e que posteriormente foireintegrado no grupo de redes maiores.

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    Redes tipo 1 Isolamento social, elevada precariedade e pobreza extrema

    Esse grupo, que rene 16 casos, se caracteriza por redes muito pequenas (somente 27

    ns, a menor mdia entre todos os grupos), pouco conectadas (menor nmero de vnculoentre todos os grupos), altamente centralizadas em torno do prprio ego e que apresentam omenores nmeros de esferas de sociabilidade e de contextos de incio dos vnculos, alm delevada presena de conterrneos nas redes.

    A idade mdia dos entrevistados tende a ser um pouco mais alta e a escolaridade umpouco mais baixa, sendo que a renda familiar per capita mdia a menor observada entretodos os grupos. Em termos de vnculo com o mercado de trabalho, h muitos autnomos muitos vendedores ambulantes e uma presena de desempregados acima da mdia. Oindivduos desse grupo tendem a estar submetidos a todas as formas de precariedade familiar, habitacional, de trabalho, de renda e, evidentemente, social.

    Observando-se a distribuio das pessoas da rede segundo as diferentes esferas,verifica-se predominncia das esferas da famlia e de amizade e pouca vizinhana e igreja. Emtermos de contextos de incio dos vnculos, novamente h maior predominncia de famlia pouca rede e trabalho. Esse o grupo em que h menor proporo de vnculos oriundos deoutras pessoas (rede), o que condizente com a situao de isolamento social. As atividade

    de lazer tendem a ocorrer no interior das reas e de maneira solitria.

    Esse grupo, que est mais presente no Centro (7 casos), mas tambm no Jaguar (5casos) e no Taboo (4 casos), pode ser ilustrado pelo caso do entrevistado 58. Trata-se de umhomem de 45 anos, nascido em So Joo do Meriti, Rio de Janeiro, mas criado em Natal-RNpara onde foi com 2 anos. Veio para So Paulo h 20 anos, morando h 12 no atual cortio. casado, tem um filho e uma filha adolescentes da atual companheira e um outro filho de 2anos de outro relacionamento com o qual no tem contato. Tem 5 irmos e 2 irms em NatalEstudou at a 4 srie e pintor autnomo h 15 anos. Trabalhou anteriormente comoajudante de metalrgico na zona sul. Estava sem trabalho quando entrevistado.

    A sua rede no contm nenhuma mulher, nem mesmo sua companheira. Inclui 24 ns e100 vnculos, clusterizao de 0,376 e centralizao de 32%. As esferas mais importantes sfamlia (54%) e trabalho (29%), e estes tambm so os contextos mais relevantes de incio dseus vnculos (com 54 e 33% respectivamente) . A grande maioria dos ns (70%) no mora no

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    cortio. O sociograma a seguir apresenta a sua rede, sendo os homens representados poquadrados e as mulheres pelo sinal de mais.

    Figura 1. Rede do ego 38

    Redes tipo 2 Redes extensas e locais com pobreza

    Esse grupo, que rene 9 casos, caracterizado pelas maiores redes em termos de ns(mdia de 85) e vnculos (mdia de 402 vnculos) e por graus mdios elevados. Apresentam

    os maiores dimetros, a menor centralizao mdia em torno do ego e baixa clusterizaoSo redes de tipo local, uma vez que contam com a menor presena de pessoas externas rea

    do ego. tambm relativamente pequena a presena de conterrneos nessas redes.

    Considerando as diferentes esferas de sociabilidade, destacam-se nesse tipo as esferasda igreja e da vizinhana e a baixa presena de pessoas na esfera amizade. Em termos dcontexto do incio do vnculo, destacam-se as originrias de rede (maior presena de pessoa

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    Em termos scio-econmicos, esse grupo apresenta os melhores indicadores de renda eescolaridade. Apresenta a menor idade mdia e a menor presena de pessoas de cor pretaentre todos. H ainda a maior concentrao de evanglicos, embora a freqncia ao culto nseja muito elevada. Considerando a vinculao com o mercado de trabalho, esse grupoconcentra a maior proporo de pessoas com carteira assinada, a maior proporodesempregados e tambm concentrao acima da mdia de estudantes. Apresenta rarassituaes de precariedade, com exceo de alguma precariedade habitacional.

    Este grupo est mais presente do Jaguar (16), embora tambm aparea bastante noTaboo (12) e no Centro (10). O grupo pode ser ilustrado pelo caso 22.

    O entrevistado tem 47 anos, casado h 22 anos e tem dois filhos. Est no Jaguar h30 anos, para onde imigrou da Paraba seguindo seu pai, instalado no bairro desde a dcada de

    1950. Tambm tem uma filha do primeiro casamento que mora na Paraba e que visita de veem quando, para ver os netos. Em sua casa moram ele, a mulher, os filhos e sua sogra. Oentrevistado estudou somente at a 3 srie e trabalha numa firma de construo civil deOsasco, com carteira assinada. Nessa firma trabalham tambm primos e amigos, que oindicaram para o trabalho. Sempre trabalhou como ajudante de pedreiro com carteira assinadem diferentes firmas. Sua esposa comeou a trabalhar h 5 meses como costureira na VilaOlmpia. A filha trabalha como cozinheira e o filho apenas estuda. Seu principal ponto deencontro no bairro o bar de seu pai e s vezes visita um irmo em Osasco. O entrevistadoorganiza simbolicamente a sua rede segundo aqueles que so da Paraba e aqueles que noso.

    Sua rede tem 50 ns, 180 vnculos, clusterizao de 0,329 e centralizao de 34,86. Osindivduos esto distribudos em vrias esferas, embora predomine a da famlia (56%), qutambm aparece como a mais importante forma de aquisio de vnculos. A maioria dos nda rede (76%) mora na prpria favela do Jaguar e 72% dos ns homem. O sociograma aseguir apresenta a sua rede sendo os homens representados por quadrados e as mulheres pel

    sinal de mais.

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    Figura 3. Rede do ego 22

    Redes tipo 4 Redes mdias com integrao, com precariedade familiar e

    predominantemente femininas.

    Esse grupo, com 26 casos, caracteriza-se por redes de mdias para grandes (68 ns e271 vnculos em mdia) com grau elevado e muitos vnculos. Destacam-se ainda pela maioclusterizao e por grande centralizao. Alm disso, esse grupo caracterizado por redecom maior presena feminina, apesar da baixa homofilia de gnero. A presena deconterrneos a menor observada e a presena de pessoas externas rea elevada.

    Em termos scio-econmicos, os entrevistados apresentam nveis de renda eescolaridade relativamente altos segunda maior renda e maior escolaridade entre os grupoanalisados. A idade mdia alta e a presena de pessoas de cor preta elevada. No mercadde trabalho, predominam os empregados sem carteira e os proprietrios de pequenosnegcios, sendo que muitos conseguiram o emprego atravs de redes.

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    Dentre as esferas de sociabilidade, destaca-se a grande presena de vizinhana,associaes e estudos e a baixa presena de pessoas da esfera famlia. Tambm se destaca aparticipao em associaes. Em termos de contextos de incio dos vnculos, destacam-sevizinhana e rede, alguma associao e lazer, alm da pequena participao de famlia etrabalho.

    Esse grupo apresenta precariedade familiar, alguma precariedade de renda, mas noprecariedade habitacional ou do trabalho.

    O grupo est bem mais presente no Taboo (13), mas tambm aparece no Jaguar (6) eno centro (7), e pode ser ilustrado pelo caso 75. Trata -se de uma jovem de 13 anos que nasceuno interior da Bahia e est h dois anos em So Paulo. Seus pais continuam na Bahia (emSalvador). Veio para a Vila Nova Esperana com uma irm para morarem com outra irmVive em uma casa de alvenaria em uma viela na parte mais consolidada da favela. Ela vivhoje com uma irm e o sobrinho, de quem cuida durante o dia. A renda mensal per capita dfamlia de R$ 170, sendo R$ 350 do salrio da irm, que trabalha como empregadadomstica e mais R$ 60,00 do programa Bolsa Famlia. Estuda na escola municipal maiprxima e est na 5 srie. Tem muitos amigos no bairro e tambm participa de um grupo d jovens de uma igreja, mas apesar disso afirma no ter religio. Seu principal lazer com ovizinhos no bairro mesmo, mas afirma ir esporadicamente a um shopping.

    Sua rede tem 69 ns e 264 vnculos, clusterizao de 0,486 e centralizao de 24,50. Aesfera amplamente predominante a vizinhos (55,1%), embora a dos estudos tambm sejaimportante (21,7%). Os contextos acompanham as esferas, sendo mais importantes avizinhana (53,5%) e os estudos (20,3%). Grande parte dos vnculos envolve pessoas daprpria Vila Nova Esperana 69,6%. O sociograma a seguir apresenta a sua rede com asmulheres representadas por sinais de mais e os homens por quadrados.

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    Figura 4. Rede do ego 75

    6. Resumindo as evidncias

    De maneira geral, as redes pessoais aqui analisadas revelaram-se bastanteheterogneas, tanto em termos de tamanho, nmero mdio de ns e de vnculos, quanto emtermos de diversidade de esferas e contextos de vnculos. Observou -se ainda alguns elementosque parecem organizar as redes dos entrevistados, como o sexo e a religio e, por vezes, acondio de migrao aspectos que devem ser aprofundados nas anlises futuras. Esseresultados indicam que, mesmo em contextos de pobreza, h uma significativa diversidade em

    termos de formas de estruturao das redes pessoais e dos padres de sociabilidade diversidade que permitiu, inclusive, a delimitao de quatro tipos distintos de redes pessoaicom caractersticas especficas.

    Uma das caractersticas comuns que a maioria das redes compartilha o localismo.Muitas das redes pessoais analisadas esto contidas no prprio local onde vive o ego, restrita

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    a esferas de sociabilidade que tendem a ser endogmicas, tais como vizinhana e famlia. Esse

    localismo vai contra as hipteses de Wellman e condizente com o observado em outraslocalidades no caso de redes pessoais de pessoas pobres (BRIGGS, 2001; ESPINOZA, 1999E FONTES E EICHNER, 2004).

    Por outro lado, a distribuio dos casos nas trs reas de pesquisa permite discutir,ainda que de forma preliminar, os efeitos da segregao sobre as redes, no segundo sentido da

    relao entre espao e redes destacado anteriormente.

    Na Vila Nova Jaguar, favela menos segregada, mais antiga e que inclui indivduosmigrados h mais tempo, predominam principalmente as redes mdias com integrao epredominantemente masculinas (grupo 3), mas tambm se fazem presentes as redes mdiacom integrao, predominantemente femininas (grupo 4) e em menor proporo isolamentosocial, elevada precariedade e pobreza extrema (grupo 1). De uma forma geral, portanto, a favela no Jaguar apresenta as redes maiores, com maior homofilia de gnero, maisestruturadas e diversificadas em termos de esferas e contextos, mas tambm inclui umconjunto de redes com piores condies (grupo 1 - Isolamento social, elevada precariedade pobreza extrema), especialmente em suas reas menos consolidadas, notadamente na linha dotrem e na rea de remoo.

    Os cortios do centro da cidade se caracterizam pela diversidade de tipos de redes.

    Entretanto, os grupos com as piores caractersticas so mais incidentes no centro,apresentando redes mais isoladas e expostas a maiores condies de pobreza.

    Na favela mais isolada e segregada, em Taboo da Serra, predominam as redes mdiascom integrao e predominantemente masculinas (grupo 3) e as redes mdias com integraopredominantemente femininas (grupo 4), sendo 83% dos casos classificados nesses grupos:redes mais extensas e consolidadas e com maior homofilia de gnero. Portanto, o lugar commenor tempo de ocupao e mais segregado espacialmente apresenta as redes maisconsolidadas, ao passo que na regio central que no uma rea de segregao espacial,

    encontram-se as redes com maiores ndices de precariedade.

    Desse modo, esses resultados colocam em xeque a hiptese de um efeito forte e diretoda segregao social na cidade sobre as redes sociais, sugerindo a existncia de uma elevadheterogeneidade de situaes em vrios locais. Para alm da macro-localizao na cidade, aprincipais clivagens presentes nas redes parecem ser sociais indivduos em piores condietm redes menores, mais locais e menos diversificadas. Os resultados do desenrolar nessa

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    investigao permitiro testar a validade dessas concluses preliminares, assim comointroduzir novas dimenses anlise.

    Assim, de maneira geral, podemos dizer que h forte localismo nessas redes analisadas

    uma vez que a maioria das redes pessoais encontra-se fortemente estruturada em torno dovnculos que ocorrem numa determinada rea mas no foi observado impacto da segregaoresidencial sobre as formas de estruturao das redes pessoais, uma vez que as caractersticagerais observadas esto presentes em contextos mais e menos segregados.

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    Autores Eduardo Cesar Leo Marques doutor em Cincia Poltica (IFCH-UNICAMP), professor doDepto. de Cincia Poltica da USP e p esquisador e diretor do Centro de Estudos da Metrpole(CEM-CEBRAP). autor de artigos e livros nas reas de polticas pblicas e [email protected] Pantoja Alves Torres graduando em Cincia Sociais (FFLCH-USP) e pesquisador doCentro de Estudos da Metrpole (CEM-CEBRAP). [email protected] Encarnacin Moya Recio mestre e doutoranda em Cincia Poltica (DCP-USP) e

    pesquisadora do Centro de Estudos da Metrpole (CEM-CEBRAP). [email protected] de Oliveira Zoppi graduada em Cincias Sociais (FFLCH-USP) e pesquisadora doCentro de Estudos da Metrpole (CEM-CEBRAP). [email protected] Mirandola Bichir mestre em Cincia Poltica (DCP-USP), doutoranda em CinciPoltica (IUPERJ) e pesquisadora do Centro de Estudos da Metrpole (CEM-CEBRAP). autora de artigos nas reas de polticas pblicas e sociologia [email protected]

    Thais Carpim Pavez mestre em Cincia Poltica (DCP-USP) e pesquisadora do Centro dEstudos da Metrpole (CEM-CEBRAP). autora de artigos nas reas de sociologia [email protected]

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