Livro Otites Na Pratica Clinica

164
JOÃO PAÇO ILUSTRAÇÕES: F. VILHENA DE MENDONÇA OTITES NA PRÁTICA CLÍNICA GUIA DE DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO

description

ORL - Otites

Transcript of Livro Otites Na Pratica Clinica

  • JOO PAOILUSTRAES:

    F. VILHENA DE MENDONA

    OTITESNA PRTICA

    CLNICA

    NA PRTICA CLNICA

    GUIA DE DIAGNSTICO E TRA

    TAMEN

    TOOTITESNA PR

    TICA CLNICA

    GUIA DE DIAGNSTICO E TRATAMENTO

    GUIA DE DIAGNSTICO E TRATAMENTO

    JOO PAO

    2P10LVPC

    V03 C

    V/FEV 10/040

  • OTITESNA PRTICA CLNICA

    GUIA DE DIAGNSTICO E TRATAMENTO

  • FICHA TCNICA

    [ AUTOR ] Prof. Doutor Joo Pao

    [ ILUSTRAO CIENTFICA ] Dr. Fernando Vilhena de MendonaCrculo Mdico - Comunicao e Design

    [ EDITOR ] Crculo Mdico - Comunicao e Design, Lda

    [ DIRECO DE ARTE ] Rui Lis Romo

    [ DIRECO DE PROJECTO ] Vanessa Silva

    [ DESIGN GRFICO ] Filipa Mendes

    [ PAGINAO ] Jos ArturPaulo Mendes

    [ REVISO ] Dra. Maria Teresa Egdio de SousaMaria do Cu Lopes

    [ IMPRESSO E ACABAMENTOS ] Selenova, Lda.

    [ EXEMPLARES ] 3.000 exemplares

    [ 1 EDIO ] 2010

    [ DEPSITO LEGAL ] 306970/10

    2010, Crculo Mdico todos os direitos reservados.

    Nenhuma ilustrao cientfica pode ser utilizada ou reproduzida sem autorizao

    expressa do autor.

    O contedo desta obra da responsabilidade dos seus autores.

    Nenhuma parte desta publicao pode ser reproduzida sem a sua autorizao.

    Esta publicao foi possvel pelo apoio:

    Av. Prof. Dr. Fernando da Conceio Fonseca, n 41-AMassam 2745-767 QUELUZ PORTUGALTel.:+351 214 307 830 a 8 Fax: 214 307 [email protected] www.circulomedico.com

  • JOO PAOILUSTRAO CIENTFICA

    F. VILHENA DE MENDONA

    OTITESNA PRTICA

    CLNICA

    GUIA DE DIAGNSTICO E TRATAMENTO

  • OTITESNA PRTICA CLN

    ICA

    GUIA DE DIAGNSTICO E TRATAMEN

    TO

    AUTORES

    Prof. Doutor Joo PaoOtorrinolaringologista Coordenador do Centro de Otorrinolaringologia do Hospital CUF Infante Santo; Director Clnico do Hospital CUF Infante Santo, Lisboa.

    Dra. Carla BrancoOtorrinolaringologista Hospital Pulido Valente e Hospital CUF Infante Santo, Lisboa

    Dra. Cristina CaroaOtorrinolaringologista Hospital CUF Infante Santo, Lisboa

    Dr. Joo Vieira de AlmeidaOtorrinolaringologista Hospital Egas Moniz e Hospital CUF Infante Santo, Lisboa

    Dra. Maria CaadorOtorrinolaringologista Hospital CUF Infante Santo, Lisboa

    Ilustrao Cientfica Dr. Fernando Vilhena de MendonaOtorrinolaringologista Director do Crculo Mdico

  • I Introduo 9

    II Atlas de Anatomia Aplicada 13

    III Ouvido Externo 25

    Anatomia do Ouvido Externo 26

    Fisiologia do Canal Auditivo Externo (CAE) 27

    Patologia do Canal Auditivo Externo 28

    Patologia Infecciosa 29

    Patologia Intrnseca da Pele 30

    Patologia ssea Benigna 31

    Patologia Traumtica 31

    Corpos Estranhos 32

    Patologia Neoplsica 33

    IV Tmpano Normal 35

    Tcnicas de Observao 37

    Espculos Auriculares 37

    Iluminao da Membrana 39

    Otoscpio 42

    Teleotoscpio 43

    Microscpio Binocular 46

    Tcnicas de Observao Qual a Melhor? 47

    Observao do Tmpano Normal 48

    Cor 50

    Superfcie e Orientao 52

    Brilho 53

    Transparncia 54

    Mobilidade 55

    Pontos a Salientar 56

    PG.

    NDICE

  • V Tmpanos Patolgicos 59

    Otite Mdia Aguda 60

    Fase Congestiva 62

    Fase Supurativa 64

    Fase Resolutiva 65

    Miringite Bolhosa 65

    Otite Mdia Aguda - Sinopse 67

    Otite Serosa 69

    Otite Serosa - Sinopse 75

    Bolsas de Retraco 77

    Localizao 77

    Fixao 80

    Controlo 82

    Morbilidade 83

    Progresso das Bolsas de Retraco 84

    Classificao das Bolsas de Retraco 90

    Bolsas de Retraco - Sinopse 93

    Otite Fibroadesiva 94

    Otite Fibroadesiva - Sinopse 97

    Otite Mdia Crnica Purulenta Simples 98

    Otite Mdia Crnica Purulenta Simples - - Sinopse 102

    Otite Mdia Crnica Colesteatomatosa 103

    Desenvolvimento do Colesteatoma de acordo com o local da perfurao 112

    Otite Mdia Crnica Colesteatomatosa - - Sinopse 119

    Timpanosclerose 121

    Timpanosclerose - Sinopse 127

    NDICE

    PG.

  • Otite Traumtica 128

    Otite Traumtica - Sinopse 129

    Otite Barotraumtica 129

    Perfurao Traumtica 131

    Complicaes da Otite Mdia 132

    Complicaes Extracranianas 133

    Complicaes Intracranianas 136

    Tmpanos Patolgicos Pontos a Salientar 137

    VI Microbiologia e Guia de Antibioterapia em Otites 145

    Quadro Sinptico Principais Patologias Infecciosas do Ouvido Externo, Microbiologia e Antibioterapia 147

    Quadro Sinptico Principais Patologias Infecciosas do Ouvido Mdio, Microbiologia e Antibioterapia 148

    Quadro Posolgico de Antibioterapia 149

    VII Breves Noes da Abordagem Cirrgica do Tmpano 151

    Fundamentos Antomo-clnicos na Abordagem Cirrgica do Tmpano 152

    Miringocentese 152

    Colocao de Tubos Transtimpnicos 154

    | 7

    PG.

  • OTITESNA PRTICA CLN

    ICA

    GUIA DE DIAGNSTICO E TRATAMEN

    TO

  • I . INTRODUO

  • I . INTRODUO

    As doenas inflamatrias do ouvido so sem dvida das situaes

    mais frequentes que surgem tanto nos atendimentos permanen-

    tes como nas consultas do nosso dia-a-dia.

    Cedo nos podem apoquentar, sobretudo nos primeiros anos de

    vida, provocando otites muitas vezes recorrentes que, para alm

    da otalgia, podem levar otorreia e nalguns raros casos perfu-

    rao timpnica que se pode, desde logo, instalar limitando a qua-

    lidade de vida da criana e mais tarde do adulto.

    tambm nestes primeiros tempos que surge aquela que ainda

    hoje a primeira causa de surdez infantil, a otite serosa, com a

    instalao de um exsudado seroso ou seromucoso na caixa do

    tmpano que vai limitar os movimentos da membrana timpnica e

    cadeia ossicular, retardando a progresso das zonas sonoras em

    direco ao ouvido interno.

    Muitos so os casos de otite serosa que evoluem e curam espon-

    taneamente, porm, outros apenas se resolvem com teraputica

    mdica ou cirrgica com a aplicao de tubos transtimpnicos.

    Nalguns casos nenhuma teraputica eficaz para a disfuno tu-

    bria que se pode tornar persistente dando origem ao apareci-

    mento de bolsas de retraco do tmpano, que com o passar do

    tempo podem evoluir para um estdio fixo e definitivo.

    Nesta altura entra em campo o novo agente, a migrao epidr-

    mica na superfcie timpnica que naturalmente expulsa pelas

    paredes do conduto auditivo externo, mas nos casos das bolsas

    Joo Pao

  • | 11

    de retraco pode acumular-se em sacos que surgem e se de-

    senvolvem a partir do fundo das bolsas, crescendo para o interior

    do ouvido mdio provocando os clebres, mas cada vez mais

    raros, colesteatomas que podem chegar a provocar largas des-

    truies e no raras complicaes.

    Otalgia, otorreia, hipoacsia, otorragia, acufenos, vertigens e alte-

    raes do equilbrio, autofonia, plenitude auricular, hiperacsia so

    muitas das queixas que podem surgir associadas a todos estes

    problemas.

    O tmpano vai espelhando entretanto todos os processos que atin-

    gem o ouvido mdio, deixando de ser transparente ou translcido,

    sofrendo uma ingurgitao e hiperemia de todos os seus vasos,

    espessando-se com inflamao, abaulando-se sobre a presso

    dos exsudados intratimpnicos que, por aumento de volume e fra-

    queza da membrana, podem provocar a sua ruptura e o apare-

    cimento da otorreia.

    Simultaneamente passada esta fase, a sua armadura colagnia

    pode ficar enfraquecida e passar a ceder com mais facilidade s

    presses positivas, mas sobretudo negativas intratimpnicas, es-

    tando na gnese das bolsas de retraco e do colesteatoma.

    Este Guia Ilustrado de Otites dirige-se a mdicos de Medicina Geral

    e Familiar, Pediatras e Otorrinos, pretendendo ser um auxiliar de

    diagnstico e teraputica.

    A abordagem fisiopatolgica detalhada, a riqueza iconogrfica de

    fotografias e ilustraes cientficas, os quadros sinpticos de diag-

    nstico e teraputica, fazem deste manual um utilitrio de grande

    interesse para a prtica clnica.

    Por ltimo, um agradecimento a todos os que colaboraram nesta

    obra, muito obrigado ao Fernando Vilhena de Mendona por todas

    as suas ilustraes e pela forma como dirigiu a edio deste ma-

    nual, e finalmente BIAL que tornou possvel a sua publicao.

    A todos bem hajam.

  • OTITESNA PRTICA CLN

    ICA

    GUIA DE DIAGNSTICO E TRATAMEN

    TO

  • II. ATLAS DE ANATOMIA APLICADA

  • II .ATLAS DE ANATOMIAAPLICADA

    Fig. 2.1 - Diviso anatmica do ouvido

    Fig. 2.2 - Anatomia do ouvido

    Fig. 2.3 - Anatomia do pavilho auricular

    Fig. 2.4 - Aspecto macroscpico da membrana timpnica

    normal (ouvido direito)

    Fig. 2.5 - Estruturas situadas no interior da caixa

    do tmpano, observveis transparncia

    (ouvido direito)

    Fig. 2.6 - Estruturas situadas no interior da caixa

    do tmpano (ouvido direito - corte sagital)

    Fig. 2.7 - Cadeia ossicular do ouvido mdio

    Fig. 2.8 - Estruturas situadas no interior da caixa

    do tmpano (ouvido direito - corte coronal)

    Fig. 2.9 - Estruturas anatmicas vizinhas do ouvido

    Fernando Vilhena de Mendona, Joo Pao

  • | 15

    Diviso anatmica do ouvido.FIG. 2.1

  • Anatomia do ouvido: Pav Pavilho auricular; CAE Conduto auditivo externo; MT Membranatimpnica; Ep Epitmpano; M Martelo; Bi Bigorna; E Estribo; CSC Canais semi-circulares; Cc Cclea; TE Trompa de Eustquio.

    FIG. 2.2

    II . ATLAS DE ANATOMIA APLICADA

  • Anatomia do pavilho auricular: H Hlix; FN Fosseta navicular; RH Raiz do hlix; AH Antihlix; Tr Tragus; MAE Meato auditivo externo; II Incisura intertrgica; Lb Lobo; AT Antitragus; C Concha; GH Goteira do hlix.

    FIG. 2.3

    | 17

  • Aspecto macroscpico da membrana timpnica normal (ouvido direito): LAM Ligamento anterior do martelo; C. Ap Curta apfise do martelo; U Umbo; TL Tringuloluminoso; PT pars tensa; AT annulus timpnico; ST Sulco timpnico; TME Tendo do msculo do estribo;CM Cabo do martelo; IR Incisura de Rivinus; PF pars flaccida; Quadrantes timpnicos: a ntero-superior, b ntero-inferior, c pstero-inferior,d pstero-superior.

    FIG. 2.4

    II . ATLAS DE ANATOMIA APLICADA

  • Estruturas situadas no interior da caixa do tmpano,observveis transparncia (ouvido direito). C. Ap Curta apfise; TE Trompa de Eustquio; Pr Promontrio; JR Janela redonda; AlE Articulaoincudo-estapdica; TME Tendo do msculo do estribo;NCT Nervo da corda do tmpano; LT Lmina timpnica;Bi Bigorna.

    FIG. 2.5

    | 19

  • Estruturas situadas no interior da caixa do tmpano (ouvido direito - corte sagital). Tmpano removido: IR Incisura de Rivinus; LAM Ligamento anterior do martelo; C. Ap Curtaapfise; M Martelo; TE Trompa de Eustquio;Pr Promontrio; JR Janela redonda; AlE Articulaoincudo-estapdica; TME Tendo do msculo do estribo; E Estribo; NCT Nervo da corda do tmpano; Bi Bigorna.

    FIG. 2.6

    II . ATLAS DE ANATOMIA APLICADA

  • Cadeia ossicular do ouvido mdio: Ca. M Cabea do martelo; Cl Colo; C. Ap Curta apfise ou apfiselateral; CM Cabo do martelo ou Manbrio; Es Esptula;C. Bi Corpo da Bigorna; Ap. C Apfise curta ou lateralda Bigorna; Ap. L Apfise longa ou vertical da Bigorna;Ap. Lent Apfise lenticular da Bigorna; AE Arco do estribo ou crura; PE Platina do estribo; AlE Articulao incudo-estapdica.

    FIG. 2.7

    | 21

  • Estruturas situadas no interior da caixa do tmpano (ouvido direito - corte coronal).LLE Ligamento lateral externo do martelo; Ep Epitmpano; M Martelo; LS Ligamento superior do martelo; Bi Bigorna; TME Tendo do msculo do estribo; AE Arco do estribo ou crura; AlE Articulao incudo-estapdica; Pr Promontrio; TE Trompa de Eustquio; C. Ap Curta apfise.

    FIG. 2.8

    II . ATLAS DE ANATOMIA APLICADA

  • Estruturas anatmicas vizinhas do ouvido: ATM Articulao temporo-mandibular; M Mastide

    FIG. 2.9

    | 23

  • OTITESNA PRTICA CLN

    ICA

    GUIA DE DIAGNSTICO E TRATAMEN

    TO

  • III. OUVIDO EXTERN

    O

  • III .OUVIDO EXTERNO

    Este captulo destinado ao estudo da patologia do ouvido ex-

    terno. Ser feita uma primeira abordagem superficial anato-

    mia e depois descreveremos a patologia. Iremos dar mais

    ateno patologia infecciosa, mas iremos abordar superficial-

    mente as restantes patologias do ouvido externo.

    ANATOMIA DO OUVIDO EXTERNOO ouvido dividido anatomicamente em trs partes: externo,

    mdio e interno.

    O ouvido externo constitudo pelo pavilho auricular e canal au-

    ditivo externo (CAE). O pavilho auricular composto por uma fina

    lmina de cartilagem, coberta de pele que se prolonga at ao

    CAE (1/3 externo), tambm denominada poro membranosa. O

    restante CAE (2/3 internos) ou poro ssea, apresenta-se deri-

    vado do osso temporal (poro timpanal, mastoideia e esca-

    mosa do osso temporal) igualmente revestido por pele. Este

    epitlio, histologicamente classifica-se como pavimentoso-es-

    tratificado e est em continuidade com a camada epitelial da

    membrana timpnica. A espessura da pele do CAE vai dimi-

    nuindo de fora para dentro e apenas na sua poro mais ex-

    terna possui glndulas ceruminosas e folculos pilosos. Tem a

    capacidade de migrar externamente em direco ao meato, o

    que funciona como um mecanismo de auto-limpeza. O CAE tem

    aproximadamente 22 a 25 mm de comprimento e um volume

    de 1 a 2 ml. Relaciona-se posteriormente com as clulas mastoi-

    Cristina Caroa, Joo Vieira de Almeida, Joo Pao

  • | 27

    deias e nervo facial medida que este desce na sua 3 poro

    em direco ao buraco estilomastoideu, e anteriormente com a

    articulao temporo-mandibular, que pela inervao comum,

    responsvel por muitas situaes de otalgia reflexa em casos de

    patologia articular. Tem tambm estreita relao com a glndula

    partida na sua poro mais externa e ntero-inferior.

    A configurao anatmica do ouvido externo muito varivel

    entre os indivduos, favorecendo, em alguns casos, e associado

    a factores predisponentes, situaes inflamatrias e infecciosas.

    O ouvido externo encontra-se separado do ouvido mdio pela

    membrana timpnica que desempenha um papel essencial na

    conduo do som.

    FISIOLOGIA DO CANAL AUDITIVO EXTERNO (CAE)A sua funo a de canalizar as ondas sonoras para o ouvido

    mdio, ajudando ao reconhecimento da origem do som. Por

    outro lado, ao funcionar como caixa de ressonncia permite am-

    plificar o som, sobretudo nas frequncias conversacionais.

    O som produzido por ondas mecnicas longitudinais de com-

    presso e rarefaco no ar em frequncias que podem ir dos 20

    Hz a 20000 Hz nos humanos.

    As ondas sonoras possuem caractersticas que permitem uma

    melhor propagao: reflexo, refraco, interferncia e resso-

    nncia.

    Assim, a forma como a onda sonora progride atravs do meio

    depende da sua natureza, suas irregularidades e ligaes com

    o mesmo. Quando uma onda sonora atinge um local de maior

    impedncia, a presso sonora desenvolvida no lado do ar ser

    inadequada para promover a mesma amplitude de vibrao

    local.

    Em resultado, o som ser reflectido e apenas uma pequena pro-

    poro transmitida.

  • Anatomicamente podemos dividir o ouvido em 4 seces com

    importantes papis na fisiologia da audio:

    O pavilho auricular permite a captao do sinal, identifica-o da localizao de fonte sonora bem como proteco do

    ouvido.

    A zona de transio localizada na poro final do pavilho eincio do CAE, com 2 a 3 mm de comprimento, serve de ponte

    entre o pavilho auricular e o CAE, e aqui a onda adquire a sua

    forma natural.

    O CAE conduz o som membrana timpnica. A presso so-nora varia ao longo do CAE mas constante em qualquer sec-

    o transversal. Possui uma ressonncia prxima dos 3500 Hz,

    o que provoca nesta frequncia uma amplificao de cerca de

    10 dB.

    A zona de transio junto ao osso timpnico permite a trans-misso da onda sonora a este.

    De estudos efectuados verificou-se que o pavilho auricular e

    CAE permitem uma amplificao de cerca de 20 dB.

    PATOLOGIA DO CANAL AUDITIVO EXTERNO Podemos dividi-la em congnita e adquirida. A ttulo de curiosi-

    dade, a patologia congnita compreende as malformaes do

    ouvido externo, que vo desde a atrsia completa (ausncia de

    CAE e pavilho), at malformaes isoladas do pavilho, este-

    nose do meato ou do CAE. Todas as malformaes do ouvido ex-

    terno podem surgir isoladamente ou associadas a malformaes

    do ouvido mdio ou interno, ou ainda, no contexto de sndromes

    mais complexas, a malformaes craniofaciais associadas, ou

    mesmo de outros rgos e sistemas.

    A patologia adquirida do ouvido externo pode ser infecciosa, in-

    trnseca da pele, ssea benigna, traumtica, corpos estranhos e

    neoplsica.

    III . OUVIDO EXTERNO

  • Patologia Infecciosa

    Otite Externa (OE)

    um processo infeccioso do ouvido externo. Pode envolver uni-

    camente a poro cartilaginosa do pavilho auricular (pericon-

    drite) que tem a particularidade de poupar o lbulo, ou afectar a

    pele do CAE. A clnica inclui otalgia mais ou menos intensa, pru-

    rido, sensao de plenitude auricular com hipoacsia. No cap-

    tulo VI poder consultar um quadro que resume as principais

    caractersticas dos diferentes processos infecciosos do ouvido,

    pelo que no texto apenas referiremos algumas particularidades

    importantes das vrias patologias.

    Na Otite Externa Difusa, quando h um grande edema do CAE,

    pode ser til colocar um tampo de Merocel durante 24 a 48h

    para permitir a entrada do antibitico tpico.

    No caso da Furunculose, habitualmente necessrio associar a

    drenagm da coleco purulenta ao tratamento antibitico.

    Otite Externa Maligna/Necrosante

    um tipo de otite habitualmente crnica e que afecta indivduos

    imunocomprometidos, nomeadamente diabticos, e caracte-

    riza-se pela presena de osteomielite dos ossos da base do cr-

    nio. A suspeita clnica deve ser colocada quando estamos

    perante uma otite externa resistente ao tratamento, sendo o

    diagnstico efectuado aps realizao de cintigrafia ssea com

    Glio. O tratamento realizado em regime de internamento com

    antibioterapia e.v., no esquecendo o tratamento da doena debase, durante pelo menos 4 a 6 semanas, sendo til a repetio

    da cintigrafia para monitorizao do tratamento. Trata-se de uma

    situao grave com uma taxa de mortalidade elevada.

    Otomicose

    uma otite externa fngica, que ao exame pode ter dois aspec-

    tos principais: ou se visualizam hifas do fungo a que vulgarmente

    nos referimos como bolor, ou tem um aspecto de exsudado

    | 29

  • branco/acinzentado de consistncia um pouco mais espessa do

    que o exsudado bacteriano. Deve-se ter um cuidado especial de

    limpeza do CAE, e por um perodo ligeiramente mais prolongado,

    visto que os esporos so muito resistentes e podem assim so-

    breviver ao tratamento e originar novamente fungos que perpe-

    tuam a infeco.

    Zona

    uma infeco provocada pelo vrus Herpes Zooster. Caracte-riza-se por uma erupo na concha, tragus, zona de Ramsay--Hunt (regio sensitiva do intermedirio de Wrisberg), associadaa paralisia do facial e a surdez por envolvimento do nervo co-

    clear. A sintomatologia inicia-se por prurido, sensao de pa-

    restesias da concha e otalgia, instalando-se progressivamente

    o quadro completo.

    Patologia Intrnseca da Pele

    Rolho Epidrmico

    Caracteriza-se pela acumulao de descamaes epiteliais no

    CAE, aderentes parede ou membrana timpnica. Esta pato-

    logia pode ser um sinal de outras que a predisponham, no-

    meadamente eczema atpico e eczema de contacto, dermite

    seborreica ou psorase. O tratamento reside na extraco do ro-

    lho e eventualmente corticides tpicos ou antibiticos, se hou-

    ver infeco.

    Quistos Epidrmicos e Colesteatomas do Conduto

    Podem ser primrios e surgir espontaneamente, ou secundrios

    a uma cirurgia prvia. O seu tratamento cirrgico, uma vez que,

    tal como o colesteatoma do ouvido mdio, trata-se de uma pa-

    tologia com potencial destrutivo da parede do CAE e, posterior-

    mente, do ouvido mdio.

    III . OUVIDO EXTERNO

  • Patologia ssea Benigna

    Exostoses

    a patologia ssea benigna mais frequente.

    As exostoses caracterizam-se por uma proliferao ssea ex-

    terna que deforma a morfologia do canal auditivo externo, con-

    dicionando uma diminuio do calibre e volume do CAE.

    classicamente definida como a doena do surfista, e pensa-se

    que a exposio do CAE gua fria e ao vento favorece o cres-

    cimento das exostoses. Trata-se de uma doena silenciosa at

    tarde, e pode originar uma hipoacsia de conduo e otites ex-

    ternas de repetio. O tratamento cirrgico.

    Osteomas do CAE

    So proliferaes sseas nicas, frequentemente pediculadas e

    arredondadas. O tratamento cirrgico.

    Displasia Fibrosa

    uma patologia ssea pouco frequente. Trata-se de uma fibrose

    do osso com alterao da arquitectura ssea. Pode ser uma

    doena monosttica ou poliosttica atingindo frequentemente os

    ossos do crnio, podendo tambm afectar outros ossos e em

    quadros mais graves cursar com alteraes endocrinolgicas.

    Trata-se de uma mutao ps-zigtica que causa uma doena

    tanto mais grave quanto mais cedo ocorrer.

    Patologia TraumticaEm relao patologia traumtica do ouvido externo, podemos ter

    traumatismos do Canal Auditivo Externo ou do pavilho auricular.

    Traumatismo do CAE

    frequentemente originado pelo prprio com cotonete, arames, cha-

    ves, ganchos de cabelo, etc., habitualmente sem gravidade, mas po-

    dendo atingir a membrana timpnica e a cadeia ossicular.

    | 31

  • III . OUVIDO EXTERNO

    Traumatismo do Pavilho

    Do traumatismo do pavilho auricular pode resultar hematoma,

    lacerao ou amputao. A amputao do pavilho uma si-

    tuao que deve ser tratada sob anestesia geral em ambiente

    hospitalar, se possvel recuperar o fragmento amputado at 6

    horas. A lacerao pode ser tratada sob anestesia local com su-

    tura dos topos lacerados e antibioterapia. O hematoma, que

    bastante mais frequente, deve ser drenado e efectuado penso

    compressivo e antibioterapia, caso contrrio pode suceder uma

    necrose da cartilagem ou deformao da mesma.

    Corpos EstranhosOs corpos estranhos do CAE so sobretudo frequentes em crian-

    as e devem ser removidos rapidamente. Podem ser animados

    (organismos vivos) ou inanimados (material inerte ou organismos

    mortos). Acima de tudo importante ter a noo que no se deve

    tentar remover um organismo vivo do CAE sem o imobilizar pri-

    meiro. Pode-se optar por utilizar um material viscoso, como leo

    de amndoas doces ou vaselina lquida, e no uma substncia

    alcolica agressiva, uma vez que provoca agitao do orga-

    nismo com consequente aumento dos danos no CAE. A remoo

    pode ser depois tentada com uma micropina. No caso de um

    corpo estranho inanimado deve-se tentar a remoo com um

    gancho e nunca com uma micropina porque pode provocar o

    deslizamento do mesmo para o fundo do CAE. Em algumas si-

    tuaes pode ser necessria anestesia geral para remoo do

    corpo estranho.

  • | 33

    Patologia NeoplsicaOs tumores do ouvido externo so raros, sendo que os malig-

    nos so os mais frequentes. Podem ser de origem epitelial, glan-

    dular, nervosa, vascular, ssea ou cartilaginosa.

    Os mais frequentes so os carcinomas pavimento-celulares do

    pavilho, sendo que os basaliomas so bastante mais raros. O

    tratamento predominantemente cirrgico complementado com

    radioterapia ou quimioterapia nos casos em que se justifica.

  • OTITESNA PRTICA CLN

    ICA

    GUIA DE DIAGNSTICO E TRATAMEN

    TO

  • IV. TMPANO NORM

    AL

  • IV . TMPANO NORMAL

    A observao da membrana do tmpano, situada na extremi-

    dade interna do conduto auditivo externo, depende em grande

    parte da morfologia deste canal.

    Se analisarmos a poro cartilagnea do conduto, constatamos

    existirem duas partes de direces distintas, que fazem entre si

    ngulos de 100 a 110 aberto para trs (Testut, 1949).

    No plano vertical, o conduto fibrocartilagneo tem uma direco

    transversal, cncava para baixo. J a poro ssea, descrita no

    captulo anterior, tem sempre um istmo mediano e um eixo que

    se dirige para baixo, para diante e para dentro.

    Pelo facto da cartilagem do pavilho auricular constituir simulta-

    neamente a parede interior da poro cartilagnea do conduto,

    a sua traco modifica a curvatura ou angulao que esta por-

    o apresenta e, uma vez alterada, poder ser mantida atravs

    da colocao de um espculo auricular.

    O mesmo no sucede na poro ssea, qual o observador se

    deve adaptar, quer pela mudana da sua posio, quer pela co-

    locao da cabea do doente em distintas posies.

    Para alm de se corrigirem os diferentes segmentos do con-

    duto fibrocartilagneo de forma a modificar os seus eixos colo-

    cando-os em linha recta, necessrio iluminar este canal a fim

    de podermos observar a membrana do tmpano.

    Joo Pao, Carla Branco

  • | 37

    TCNICAS DE OBSERVAO

    Espculos AuricularesAs observaes do conduto auditivo destinavam-se inicialmente

    extraco de corpos estranhos.

    Em 1363, Guy de Chauliac, no seu tratado Collectorium Artis Chi-rurgicalis Medicinae, descreveu a extraco de corpos estranhosdo canal auditivo, para o que utilizava a luz solar e um espculo

    (Hawke e col., 1984).

    Para este autor, a primeira ilustrao de um espculo auricular

    deve-se a um cirurgio alemo, Fabricius Hildanus, que no s-

    culo XVI empregava um espculo bivalve para a extraco de

    corpos estranhos. Este tipo de espculo vai continuar a ser utili-

    zado nos sculos seguintes.

    Segundo Garcia-Ballester e col. (1978), Itard, 1821, apresenta umespculo de valvas com o qual observa a membrana do tm-

    pano, servindo-se da luz solar que deve passar acima do ombro

    do observador em direco ao ouvido do doente. As duas valvas,

    que eram apenas introduzidas no conduto membranoso, ao

    afastarem-se corrigiam as respectivas curvaturas, opunham-se

    presso do tragus e possibilitavam que os raios luminosos atin-gissem a face externa do tmpano.

    Newberg (1827), utilizava um espculo cilndrico, que para alm

    de ser introduzido na poro membranosa do conduto, pene-

    trava ligeiramente na poro ssea.

    Bonnafont (1860), comenta este tipo de espculos, afirmando que

    o seu calibre limita o campo de viso, e que as suas paredes ci-

    lndricas contactavam de uma forma dolorosa com as paredes

    do conduto. Defende a utilizao dos espculos de valvas, uma

    vez que estas se adaptam a qualquer conduto e a presso exer-

    cida pelas valvas nunca chega a ser dolorosa, pois regulvel e

    possvel de controlar.

  • O espculo de valvas tinha contudo como limitao o facto de

    requerer uma das mos do observador, motivo pelo qual Bon-

    nafont prope ento um espculo deste tipo, mas com os movi-

    mentos comandados por uma cremalheira. Este, uma vez

    colocado e ajustado, mantm-se no canal libertando as mos

    do observador.

    Politzer (1865) punha como obstculo utilizao destes esp-

    culos o facto de ser impossvel dilatar grandemente a poro fi-

    brocartilagnea do canal sem provocar dor. Refere igualmente

    que os plos do conduto se insinuavam entre as valvas, dificul-

    tando a iluminao e a observao do tmpano.

    Gruber (citado por Politzer) cria em Viena os espculos auriculares

    em forma de cone, com uma das extremidades de calibre mais re-

    duzido que dever ser introduzido no conduto auditivo. Estes es-

    pculos apresentavam trs calibres distintos, de forma a se

    adaptarem aos condutos sem provocarem presses dolorosas.

    Wilde modifica os espculos de Gruber tornando-os inteiramente

    cnicos, igualmente com calibres variveis, mas com superfcies

    extremamente polidas e brilhantes de modo a reflectirem o m-

    ximo de luz.

    Toynbee , para Hawke e col. (1984), o primeiro a conceber umespculo de lmen oval, que para este autor se adaptaria melhor

    ao conduto sseo, possibilitando uma viso mais correcta da

    membrana do tmpano.

    Politzer, em finais do sculo XIX, advoga a utilizao de espcu-

    los auriculares em forma de cone mas feitos em borracha,

    menos traumatizantes e que evitam a sensao de frio provo-

    cada pelos espculos metlicos. A superfcie de borracha no

    reflecte a luz e possibilita um melhor contraste com a superfcie

    brilhante do tmpano.

    Em 1864, Siegle introduz o espculo pneumtico. Este no mais do

    que um espculo em forma de cone, encerrado na extremidade do

    observador por um vidro que contm lateralmente uma adaptao

    a um sistema pneumtico, que pode fazer presso ou suco.

    IV . TMPANO NORMAL

  • Todos estes espculos, com mais ou menos modificaes, con-

    tinuam a ser utilizados hoje em dia.

    Os espculos em forma de cone, segundo Alonso (1961), so mui-

    tas vezes conhecidos pelos nomes dos seus autores. Os cones

    truncados, que terminam em forma de crculo, so chamados

    espculos de Hartman. Os que tm a sua terminao ovalada,

    so denominados espculos de Alexander. Dentro de cada tipo

    existem 3 a 4 dimetros que vo de 3 a 8 mm.

    Durante a cirurgia so ainda utilizados espculos de metal, ene-

    grecidos e baos, pois evitam a reflexo da luz no perturbando

    o observador, e criam melhores condies para a iluminao

    das paredes do conduto e do tmpano. Alguns destes espculos

    tm a sua extremidade em bisel, de modo a melhor se adapta-

    rem morfologia do conduto (espculos de Plester).

    Iluminao da Membrana do Tmpano A iluminao do conduto auditivo externo e do tmpano sofreu

    uma grande evoluo, desde a utilizao dos raios solares at

    luz fria transportada por cabos de fibras pticas.

    Politzer (1865) afirmava que a dificuldade principal numa otos-

    copia consistia em iluminar suficientemente bem uma mem-

    brana colocada no fundo de um tubo escuro (Garcia-Ballester

    e col., 1978).

    De incio, a iluminao utilizada era a luz do dia. Wilde, um otolo-

    gista irlands, citado por Hawke e col. (1984), fazia as suas ob-servaes entre as 11:00 e as 15.00 horas, dizendo ter dificuldades

    durante o inverno, pois no tinha luz suficiente.

    Fabricius Ab Aquabendente, no sculo XVI, parece ter sido o

    primeiro a utilizar a luz de uma vela para iluminar o conduto

    auditivo. Cleland, um cirurgio ingls do sculo XVIII, prope

    o uso de um vidro convexo, que concentrava a luz da vela

    para a observao do canal. Bozzini, serve-se para este fim

    de um espelho, que colocava por trs de uma vela (Hawke ecol., 1984).

    | 39

  • Mais tarde, com o aparecimento da luz produzida por leos mi-

    nerais, so criadas por Buchanan, em Inglaterra, e por Kramer,

    na Alemanha, caixas que no seu interior contm uma fonte de

    luz, um espelho reflector e uma lente convexa, possibilitando ilu-

    minar de uma forma mais adequada o conduto e o tmpano.

    Para Politzer (1865) a luz artificial tinha, contudo, o inconveniente

    de alterar as sombras naturais do tmpano, perturbando a sua

    imagem de conjunto.

    Este autor descreve que sempre prefervel a luz natural, reflec-

    tida num espelho ou numa parede branca e dirigida para o in-

    terior do canal (Garcia-Ballester e col., 1978).

    Tillaux (1897), escreve que a luz natural superior artificial, e a

    melhor ser aquela que provm de um cu carregado de nuvens

    brancas, ou a que reflectida de um muro branco, pois v-se mal

    com um cu azul.

    O exame com luz viva em pleno sol, oferecia contudo a vanta-

    gem de mostrar melhor certos detalhes do interior da caixa. Este

    autor indica porm que usa a luz artificial na prtica corrente.

    O uso de espelhos especiais com um orifcio central atribudo

    a Troltsch, que os divulga em 1855 num Congresso em Paris.

    Politzer (1865) preconiza o seu uso na prtica corrente, afirmando

    que estes devem ser utilizados nos quartos dos doentes ou em dias

    de muitas nuvens, servindo-se quer da luz natural quer da artificial.

    Os espelhos de Troltsch podiam ser utilizados de vrias formas,

    desde colocados na fronte, os espelhos frontais, nos culos, na

    mo do otologista e mesmo nos seus dentes (Hawke e col., 1984).

    Politzer aconselhava o uso destes espelhos na mo direita, en-

    quanto a esquerda segurava o espculo auricular. O espelho

    devia ser colocado de forma a fazer concentrar a maior intensi-

    dade de luz na membrana do tmpano.

    A desvantagem deste mtodo resultava do facto de o observa-

    dor ter de se colocar a uma distncia tal, que a sua cabea no

    interrompesse completamente a iluminao do tmpano, ao

    IV . TMPANO NORMAL

  • mesmo tempo que lhe possibilitasse distinguir os pormenores e

    as caractersticas desta membrana.

    O espelho frontal de Troltsch no tinha este inconveniente e, por

    libertar as mos do observador, teve grande divulgao nos fi-

    nais do sculo XIX e incio do XX.

    As fontes de luz reflectidas no espelho frontal iam desde a luz

    natural, luz de leos minerais, de gases, at luz de carburetos.

    Posteriormente verificou-se a introduo gradual da luz elctrica.

    Surge ento o espelho frontal de Clar, de grandes dimenses,

    com uma superfcie espelhada cncava no sentido do doente,

    contendo no seu centro uma lmpada cuja luz reflectida era di-

    rigida para o canal auditivo e membrana do tmpano. A ilumi-

    nao, feita inicialmente com base numa pilha elctrica, era de

    intensidade constante, no regulvel. Este espelho continha dois

    orifcios, atravs dos quais o observador podia controlar a con-

    centrao dos raios luminosos e proceder observao do con-

    duto auditivo externo e do tmpano (Alonso, 1961).

    Os espelhos que hoje so utilizados, resultam da evoluo do

    espelho de Clar, tm uma menor superfcie espelhada na qual

    existem dois entalhes simtricos que permitem a observao, e

    possuem uma lmpada mais potente, cuja intensidade luminosa

    regulvel por um transformador. Um parafuso de cremalheira

    possibilita ainda a focagem dos raios luminosos.

    Na prtica corrente tambm utilizada a luz frontal, na qual no

    existe um espelho reflector e a luz produzida junto fronte e

    orientada na direco do conduto e do tmpano.

    Todos estes sistemas tm vindo a beneficiar das inovaes sur-

    gidas no campo da iluminao, pois para alm da lmpada de

    filamento possvel hoje utilizar a lmpada de halognio, ou a

    luz fria transportada por um cabo de fibras pticas.

    A luz obtida por uma lmpada de halognio trs vezes su-

    perior do filamento incandescente, o que possibilita uma

    melhor iluminao do interior do canal e de toda a membrana

    do tmpano.

    | 41

  • As cores do tmpano e da epiderme do conduto variam com a in-

    tensidade da luz, sendo diferentes consoante a forma de ilumi-

    nao. Uma grande intensidade luminosa no significa uma

    melhor observao do tmpano, pois esta membrana perde a

    sua colorao natural tornando-se esbranquiada devido re-

    flexo dos raios luminosos.

    Otoscpio Os primeiros otoscpios surgem no final do sculo XIX, propos-

    tos por Bonnafont, Bruntons, Hawke e col. (1984). Eram constitu-dos por um espculo auricular que dispunha de um espelho

    perfurado, colocado a 45 na extremidade de um cilindro oco,

    encontrando-se na outra extremidade a fonte de luz. O espculo

    e o espelho faziam um ngulo de 90.

    O otoscpio de Bruntons possua j uma lente de aumento e era

    usado sobretudo pelos mdicos generalistas, pois os otologis-

    tas preferiam o espelho frontal e o espculo auricular, de forma

    a terem as mos livres.

    Este otoscpio acabou por dispor de uma lmpada, e ser deste

    modo o primeiro a usar iluminao elctrica.

    Segundo Hawke e col. (1984), Schall, em 1890, produz o primeirootoscpio da Alemanha e Verdor em Barcelona, em 1895, cria

    igualmente um aparelho deste tipo.

    Todos estes otoscpios possuam um cabo, um corpo e um es-

    pculo. A lmpada contida no corpo ocupava parcialmente a ca-

    vidade do espculo, o que limitava a viso.

    Os espculos auriculares podiam ter calibres diferentes, que se

    mudavam conforme as dimenses do conduto.

    No espculo de Bruntons existia uma adaptao lateral para um

    tubo de borracha atravs do qual o observador soprava ou fazia

    suco, de forma a modificar a posio do tmpano.

    A grande evoluo nestes otoscpios d-se no sistema de ilu-

    minao. At muito recentemente, a iluminao era produzida

    IV . TMPANO NORMAL

  • por uma lmpada de filamento colocada na extremida inferior

    do espculo, o que limitava o espao disponvel e no criava as

    condies ideais para a distribuio da luz.

    Actualmente, utilizam-se otoscpios que tm incorporados uma

    fonte de luz de halognio, que transmitida por fibras pticas

    dispostas em redor de toda a circunferncia do espculo. Esta

    disposio, para alm de iluminar de uma forma homognea

    a superfcie do tmpano, no levanta obstculos no interior do

    espculo.

    A observao do tmpano com o otoscpio possibilita utilizar os

    eixos de viso do conduto, percorrendo-se deste modo a totali-

    dade da superfcie da membrana. A lente de aumento, que faz

    parte hoje em dia de qualquer destes aparelhos, permite simul-

    taneamente um detalhe e um rigor indispensveis para a sua

    caracterizao. Contudo, as procidncias das paredes do canal

    auditivo podem manter parte dos quadrantes anteriores e do an-nulus inacessveis observao.

    O otoscpio ocupa sempre uma das mos do observador, motivo

    pelo qual j os otologistas do final do sculo XIX afirmavam ser

    prefervel a observao com o espculo auricular e a luz frontal.

    Teleotoscpio O teleotoscpio veio introduzir uma nova dimenso na observa-

    o, assim como no registo fotogrfico e em vdeo, da mem-

    brana do tmpano.

    As verses mais recentes destas pticas utilizam um sistema in-

    ventado pelo Professor Hopkins da Universidade de Reading Inglaterra.

    Os teleotoscpios tradicionais que eram uma evoluo do ci-

    toscpio de Nitze (1879), utilizavam pequenas lentes colocadas

    a intervalos regulares no interior do endoscpio. O sistema de

    Hopkins emprega uma srie de lentes em forma de varetas,

    separadas por intervalos que contm ar e que funcionam

    como lentes.

    | 43

  • Este sistema, relativamente ao convencional, ocupa menos es-

    pao, o que se traduziu por uma reduo do calibre externo dos

    endoscpios. Os teleotoscpios mais recentes apresentam di-

    menses entre 2,7 e 4 mm, facto que possibilita a sua utilizao

    mesmo em crianas ou adultos com grande procidncia das pa-

    redes do conduto auditivo.

    Se tivermos em conta que o calibre do conduto tem 5,3 mm no

    istmo, e que entre este e o tmpano distavam cerca de 3 mm na

    parede posterior e 5 mm na parede anterior, compreendemos

    que possvel ultrapassar esta barreira ficando o teleotoscpio

    a escassos milmetros da membrana timpnica.

    As lentes de Hopkins proporcionam igualmente um largo ngulo

    de viso e, apesar da curta distncia do teleotoscpio ao tm-

    pano, permitem observar a totalidade desta membrana (Fig. 4.1).

    Os obstculos anatmicos levantados pela procidncia das pa-

    redes do conduto, numa otoscopia normal efectuada com um

    espculo auricular, impedem muitas vezes a observao da to-

    talidade dos quadrantes anteriores e do respectivo segmento do

    annulus, e podem ser ultrapassados se utilizarmos um teleotos-cpio (Figs. 4.1-A e B).

    Para alm destes aspectos, os teleotoscpios de Hopkins trans-

    mitem mais luz que os sistemas convencionais e tm melhor

    poder de resoluo e contraste.

    A iluminao obtida atravs de fontes de luz fria de diferentes in-

    tensidades, possibilita a documentao fotogrfica da imagem,

    assim como o seu registo em vdeo, com uma qualidade e um

    pormenor que nenhum dos outros mtodos consegue atingir.

    O teleotoscpio , contudo, apesar das inmeras vantagens,

    apenas um aparelho de observao que possibilita, desde que

    acoplado a uma mquina fotogrfica ou a um sistema de vdeo,

    o registo das imagens, no permitindo todavia qualquer mani-

    pulao.

    A sua utilizao exige que tenham sido removidos do conduto

    auditivo externo o cermen e os restos epidrmicos que a se

    IV . TMPANO NORMAL

  • Observao da membrana timpnica. A) Mtodos convencionais. B) Com teleotoscpio.

    FIG. 4.1

    | 45

  • costumam encontrar. No , pois, uma manobra isolada, antes

    complementa a observao clssica, que a deve preceder.

    No se trata igualmente de um acto passivo, pois, na aproxima-

    o do tmpano h que ter presente as dificuldades levantadas

    pelo istmo do conduto, devendo-se procurar no contactar com

    as paredes deste canal, facto que, para alm de despertar um

    reflexo de tosse, pode provocar a dor e ainda desencadear uma

    reaco vasomotora e a hiperemia desta membrana.

    Junto ao tmpano o teleotoscpio pode nalguns casos e desde

    que se utilizem aparelhos de reduzido calibre, penetrar atravs

    de uma perfurao e inspeccionar o interior da caixa de uma

    forma sistemtica, verificando o estado da cadeia ossicular e a

    integridade dos mesmos. Hoje em dia encontram-se igualmente

    fibroscpios de reduzido calibre que, para alm de penetrarem

    na caixa explorando o seu interior, podem ser introduzidos na

    Trompa de Eustquio.

    Microscpio BinocularO microscpio binocular igualmente um aparelho indispens-

    vel na observao da membrana do tmpano.

    Os modelos mais recentes utilizam todos luz fria, transmitida por

    cabos de fibras pticas, o que possibilita uma iluminao difusa,

    sem pontos de penumbra, aumentando-se deste modo a pro-

    fundidade do campo visual. As pticas so todas estereoscpi-

    cas e do uma viso tridimensional da membrana do tmpano.

    Este tipo de viso evita sobreposies ou efeitos pticos, que mui-

    tas vezes esto na origem de erros de observao.

    Os microscpios actuais tm grande mobilidade, o que asso-

    ciado a um espculo correctamente colocado, e modificando a

    posio da cabea do doente, possibilita o controlo e a inspec-

    o da quase totalidade da membrana do tmpano.

    Ao contrrio do teleotoscpio, na otoscopia efectuada com o mi-

    croscpio, devemos contar com as dificuldades anatmicas co-

    locadas pela morfologia das paredes do conduto.

    IV . TMPANO NORMAL

  • O microscpio de observao apresenta vantagens relativa-

    mente ao teleotoscpio, possibilitando efectuar manobras como

    aspirao de exsudados, remoo de corpos estranhos, e pe-

    quenos actos cirrgicos, que se tornam muito mais seguros se

    efectuados desta maneira.

    Uma vez focado um determinado ponto do tmpano, podem

    aumentar-se as ampliaes at se ter um detalhe suficiente,

    transformando a observao microscpica do tmpano numa

    manobra dinmica.

    Tal como no teleotoscpio, o microscpio possibilita o registo das

    imagens em fotografia e em vdeo, permitindo a documentao

    dos actos cirrgicos. A observao das imagens associada ao

    controlo de resultados, traduz-se numa melhoria dos cuidados

    assistnciais para alm de desempenhar um papel fundamen-

    tal no ensino.

    Tcnicas de Observao - Qual a Melhor?

    Apesar da grande evoluo sofrida nos ltimos anos no

    campo da iluminao e das pticas, nenhuma das tcnicas

    veio substituir as anteriores. Todas se complementam, e

    devem fazer parte dos mtodos de observao da mem-

    brana do tmpano.

    O espelho frontal possibilita a inspeco do pavilho auricu-

    lar, da mastide e da poro fibrocartilagnea do conduto,

    uma vez efectuada a traco do pavilho.

    A utilizao do espculo indispensvel para manter corri-

    gidas as curvaturas da poro fibrocartilagnea e canalizar

    os raios luminosos para o interior do conduto sseo, diri-

    gindo-os para a membrana timpnica.

    Os gestos a efectuar no interior do conduto e sobre a mem-

    brana do tmpano devero ser realizados com o auxlio do

    microscpio binocular. Este possibilita-nos igualmente ins-

    peccionar em detalhe o tmpano e a caixa, no caso de existir

    uma perfurao.

    | 47

  • O teleotoscpio ultrapassa as barreiras anatmicas levantadas

    pela morfologia do conduto, inspeccionando a globalidade da

    membrana, nomeadamente os quadrantes anteriores e o seg-

    mento anterior do annulus. Pode ser ainda introduzido no inte-rior da caixa, possibilitando uma panormica das vrias

    paredes e do seu contedo.

    O otoscpio dever ser utilizado sempre que tenhamos que

    observar doentes fora do local da consulta, em enfermarias

    ou cabeceira do doente.

    OBSERVAO DO TMPANO NORMAL O tmpano apresenta um conjunto de caractersticas que o defi-

    nem no seu estado normal: a cor, a superfcie e orientao, bri-

    lho, transparncia e mobilidade. Analisaremos cada uma delas,

    pondo em destaque os pontos mais importantes.

    Para efectuar a otoscopia, o observador colocar-se- diante do

    doente, que se encontra sentado, e que rodar a cabea de

    forma a expor o ouvido a examinar.

    Deve-se sempre procurar, atravs da utilizao de cadeiras de

    altura regulvel, que o ouvido do doente esteja mesma altura

    do eixo de viso do observador. No caso das crianas, estas

    devem estar sentadas de lado, ao colo dos pais, com a cabea

    apoiada, e caso necessrio, imobilizada.

    A introduo do espculo deve ser sempre precedida, no adulto,

    pela traco do pavilho para trs e para cima, de forma a cor-

    rigir as angulaes da poro fibrocartilagnea do conduto, ao

    mesmo tempo que se desloca o tragus ligeiramente para diante.No caso de lactentes ou crianas at aos dois anos, esta traco

    dever ser efectuada para trs, mas agora dirigida para baixo.

    A observao do tmpano pode ser tambm realizada com o doente

    deitado em decbito dorsal e com a cabea rodada, de forma a

    expor o ouvido a inspeccionar. Esta posio utilizada habitual-

    mente quando a observao efectuada com o microscpio.

    IV . TMPANO NORMAL

  • | 49

    Nesta imagem de um tmpano normal, obtida com umteleotoscpio, possvel observar transparncia damembrana timpnica estruturas situadas no interior da caixa.

    AlE Articulao incudo-estapdica; Bi Bigorna; C. Ap Curta apfise; JR Janela redonda; LT Lminatimpnica; NCT Nervo da corda do tmpano; Pr Promontrio; TE Trompa de Eustquio; TME Tendo do msculo do estribo.

    FIG. 4.2

  • Cor A cor do tmpano varia habitualmente entre cinzento prola e o

    cinzento azulado, clssica cor de fumo.

    Ao analisarmos esta caracterstica do tmpano, temos que refe-

    rir que a membrana tmpnica semitransparente, translcida,

    existindo, portanto, raios luminosos que a atravessam e se vo

    reflectir no promontrio, influenciando a sua cor.

    O tipo de iluminao utilizado tem igualmente importncia nesta

    colorao, pois ela varia consoante se utllize uma lmpada de fi-

    lamento de halognio ou luz fria. Uma luz demasiado fraca d

    ao tmpano uma colorao sombreada, ao passo que uma luz

    muito potente lhe confere uma cor plida, para alm de alterar

    igualmente a colorao das paredes do conduto.

    A limpeza deste canal influencia igualmente a cor do tmpano,

    pois a presena de cermen, atravs do qual passam os raios lu-

    minosos, pode-lhe atribuir diferentes tonalidades.

    A colorao do tmpano resulta pois de uma combinao de

    cores, que influenciada pela transparncia desta membrana,

    tipo de luz utilizada e grau de limpeza do conduto.

    Politzer (1865) referia-se j ao facto de a cor do tmpano ser dife-

    rente consoante fosse observado com luz natural ou artificial.

    Para este autor, o tmpano era cinzento neutro com tons de vio-

    leta e de amarelo (Garcia-Ballester e col., 1978).

    Considera-se hoje como normal a cor cinzento prola, que apre-

    senta variaes de acordo com a poro do tmpano conside-

    rada.

    Estas alteraes de cambiante esto em regra relacionadas com

    a morfologia do conduto auditivo, surgindo normalmente a me-

    tade anterior do tmpano mais sombreada que a posterior.

    So as procidncias das paredes anterior e inferior do conduto

    que se interpem entre raios luminosos e o tmpano, e que tor-

    nam os quadrantes anteriores mais escuros e os posteriores

    mais claros. Contudo, estas alteraes no se verificam caso as

    IV . TMPANO NORMAL

  • paredes do conduto sejam rectilneas, ou a observao feita com

    um teleotoscpio.

    A cor do tmpano varia igualmente com o grupo etrio. Assim, o

    tmpano do recm-nascido apresenta-se sempre com um cin-

    zento mais carregado, o que poder ser atribudo obliquidade

    da membrana e sua falta de transparncia.

    Quanto mais oblqua for a membrana, mais espessa se torna re-

    lativamente direco dos raios luminosos, impedindo ou difi-

    cultando a sua reflexo no interior da caixa e provocando esta

    alterao da colorao.

    No adulto idoso podem igualmente verificar-se modificaes, e

    o tmpano adquire um tom branco acinzentado, provavelmente

    devido a processos de miringosclerose.

    A pars flaccida apresenta muitas vezes uma colorao rosada,diferente do cinzento prola da pars tensa. Pensamos que estacolorao se deve ao facto da pele da parede superior do con-

    duto descer sobre esta poro da membrana, como assinal-

    mos quando nos referimos estrutura do tmpano. A parsflaccida tem, ento, uma colorao semelhante da epidermedo conduto.

    A observao do tmpano pode desencadear um reflexo na sua

    vascularizao, que se traduz por uma vasodilatao. Este re-

    flexo pode ser iniciado pela simples introduo do espculo,

    pela aproximao de um teleotoscpio, ou por simples mano-

    bras instrumentais como a remoo do cermen ou de restos

    epidrmicos. Como consequncia, o tmpano surge hipere-

    miado, podendo assemelhar-se fase inicial de um processo

    inflamatrio.

    Nestes casos, as outras caractersticas da membrana man-

    tm-se inalteradas e passado algum tempo este reflexo de-

    saparece, o que no sucede nas otites mdias agudas.

    A introduo do espculo auricular pode tambm provocar um

    reflexo de tosse, facto que resulta da enervao das paredes do

    conduto por um dos ramos do nervo glossofarngeo.

    | 51

  • Superfcie e Orientao O tmpano no se apresenta plano e tem inclinaes e orienta-

    es distintas consoante a rea considerada.

    Para este facto muito contribui a disposio do martelo, e a forma

    como estabelece relaes com esta membrana, s quais j nos

    referimos em pormenor.

    A curta apfise do martelo o ponto mais saliente da superfcie

    do tmpano, pelo que chama de imediato a ateno numa otos-

    copia. Tem cor branca, e Tillaux (1897), comparou-a mesmo a

    uma prola. Esta apfise tem a sua localizao mais prxima do

    bordo anterior que do posterior, facto que traduzido pela dife-

    rena de dimenses das pregas timpanomaleolares, para a qual

    chammos a ateno no Captulo 3.

    Apesar da sua localizao, a curta apfise sempre visvel, o

    que se compreende se tivermos em conta a morfologia da pa-

    rede superior, sempre cncava, e o valor do ngulo tmpano-

    -meatal superior.

    Num tmpano normal, esta apfise pode parecer nuns casos mais

    procidente que noutros, e ter mesmo uma colorao diferente.

    Este facto deve-se ao prolongamento da epiderme da parede

    superior do conduto, que depois da pars flaccida pode conti-nuar-se para baixo sobre a curta apfise e o cabo do martelo.

    Esta apfise pode, ento, ficar envolvida pela epiderme e no ter

    a tpica colorao esbranquiada.

    O cabo do martelo e a esptula destacam-se pela sua forma e

    cor, diferente da cor cinzento prola do resto da membrana.

    A obliquidade normal da membrana do tmpano, analisada no

    captulo anterior, pode modificar-se devido, geralmente, a pres-

    ses negativas intratimpnicas. Nesta situao, a observao do

    martelo constitui um importante indicador, pois enquanto a curta

    apfise se torna mais saliente, o cabo acompanha a depresso

    timpnica ocupando uma posio prxima da horizontal.

    IV . TMPANO NORMAL

  • Brilho A membrana do tmpano no seu estado normal apresenta uma

    poro que se destaca pela sua maior luminosidade.

    Esta superfcie mais brilhante localiza-se por baixo da esptula

    do martelo, entre esta e o aro timpnico.

    Wild chamou-lhe cone luminoso e Politzer tringulo luminoso

    (ambos citados por Testut, 1949).

    Efectivamente, esta rea tem uma forma tringular de vrtice su-

    perior, situado na extremidade inferior do martelo, alargando-se a

    partir deste ponto at atingir o aro tmpnico.

    Enquanto o cabo do martelo se dirige obliquamente para baixo

    e para trs, o tringulo luminoso dirige-se para baixo e para a

    frente.

    O cabo deste ossculo faz com o tringulo luminoso de Politzer

    um ngulo obtuso, aberto para diante. Testut (1949) indica como

    valor para este ngulo 100 a 110.

    As dimenses deste tringulo luminoso variam de caso para

    caso e de acordo com o estado da membrana, mais ou menos

    deprimida.

    Quanto s causas deste cone de luz, vrias tm sido as explica-

    es. Wild afirma que a este nvel a parede do tmpano era con-

    vexa, argumentos mais tarde rebatidos por Politzer, que atribui a

    sua existncia forma cncava da pars tensa, descrevendo quenenhuma luz seria reflectida se a membrana fosse plana. Troltsch

    da mesma opinio, quando diz que este cone luminoso tem o

    seu incio precisamente no ponto de maior concavidade.

    As razes sero, portanto, a obliquidade do tmpano relativa-

    mente ao eixo do canal, associada depresso provocada pelo

    cabo do martelo. A comprovar esta explicao est o facto de

    este tringulo se modificar durante uma manobra de Valsalva,

    quando o tmpano altera a sua posio. Por outro lado, e sem-

    pre que o tmpano se torna mais espesso devido a fenmenos

    | 53

  • inflamatrios, a sua superfcie deixa de reflectir os raios lumino-

    sos e este tringulo desaparece.

    A localizao do tringulo luminoso no quadrante ntero-infe-

    rior faz com que nalguns casos, dada a procidncia da parede

    anterior do conduto, nem todo o tringulo seja visvel.

    Este tringulo , portanto, uma caracterstica do tmpano normal,

    constitui o reflexo da luz projectada sobre a sua superfcie cncava,

    no um acidente anatmico, apenas resulta do acto da otoscopia.

    Transparncia A membrana do tmpano apresenta-se transparente ou transl-

    cida, possibilitando observar o interior da caixa (Fig. 4.2).

    Nem toda a membrana tem esta caracterstica. A pars flaccida sempre opaca, tal como algumas zonas da pars tensa. Mui-tos tmpanos apresentam normalmente uma opacidade junto

    ao annulus, que se estende dos quadrantes anteriores, onde mais evidente, at aos posteriores. De todos os quadrantes, o

    mais transparente o pstero-superior.

    Relacionamos estes factos com a espessura da membrana.

    Assim, a pars flaccida a poro mais espessa do tmpano custa da sua camada epidrmica, enquanto que na pars tensaesta membrana mais espessa periferia, resultado da dispo-

    sio da camada de fibras circulares.

    Com efeito, o quadrante pstero-superior que praticamente s

    possui fibras radirias, ser o menos espesso e, portanto, o

    mais transparente. Neste quadrante possvel observar trans-

    parncia, de trs para diante: a lmina timpnica, o nervo da

    corda do tmpano, o ramo vertical da bigorna, a articulao in-

    cudo-estapdica e, por vezes, o ramo posterior do estribo.

    A lmina timpnica surge imediatamente para dentro e para

    diante do annulus tmpnico, com uma cor esbranquiada, re-lacionando-se com o nervo da corda do tmpano. Este nervo

    cruza obliquamente, de baixo para cima, este quadrante.

    IV . TMPANO NORMAL

  • | 55

    Por cima do nervo, a membrana torna-se menos transparente

    e translcida, o que atribumos presena da prega malear

    posterior, com cujo bordo inferior o nervo se relaciona.

    O ramo vertical da bigorna visvel em grande nmero de casos,

    tal como a articulao, sobretudo se a observao for feita com

    o teleotoscpio ou com o microscpio. J o ramo posterior do es-

    tribo s visvel em tmpanos de reduzida espessura.

    O promontrio possvel de observar em muitos tmpanos, re-

    flectindo os raios luminosos. Alguns autores descrevem na sua

    superfcie e, em casos de otosclerose em actividade, uma man-

    cha avermelhada, a mancha de Schwartz, que corresponde ao

    foco da otosclerose em actividade.

    No quadrante pstero-inferior pode-se, nalguns casos, observar

    a sombra correspondente janela redonda, e nos quadrantes

    anteriores, junto ao bordo anterior adivinha-se, por vezes, o ori-

    fcio da Trompa de Eustquio.

    Mobilidade A membrana do tmpano tem uma mobilidade natural, que pode

    ser analisada sempre que se efectuem numa otoscopia, as ma-

    nobras de Valsalva e Toynhee, ou atravs da utilizao do esp-

    culo de Siegle.

    A manobra de Valsalva provoca uma hiperpresso positiva no

    cavum, que transmitida pela Trompa de Eustquio ao ouvidomdio, faz aumentar a presso intratimpnica e movimenta o

    tmpano em direco ao observador.

    Por sua vez, a manobra de Toynbee provoca uma presso ne-

    gativa que transmitida ao ouvido mdio implica uma depresso

    do tmpano, em sentido contrrio ao da manobra de Valsalva.

    Pudemos comprovar atravs da manobra de Valsalva, efectuada

    em 30 doentes isentos de patologia otolgica e com timpano-

    gramas normais, que o tmpano no se distende da mesma ma-

    neira ao longo de toda a sua superfcie.

  • IV . TMPANO NORMAL

    Em todos constatmos que o quadrante pstero-superior se dis-

    tendia mais do que qualquer outro quadrante da pars tensa. Si-multaneamente verificmos sempre a disteno da pars flaccida.

    A prega timpanomaleolar posterior, que separa estas duas por-

    es do tmpano, desaparecia como resultado desta distenso.

    A observao da mobilidade do tmpano pode ser igualmente

    efectuada com o otoscpio pneumtico, assim como com o es-

    pculo de Siegle.

    Podemos, pois, afirmar que o tmpano mvel na sua totalidade,

    mas que existem pores desta membrana mais distensveis

    que outras. Estas localizam-se no quadrante pstero-superior da

    pars tensa e na pars flaccida.

    PONTOS A SALlENTAR

    1. A existncia e a disposio das vrias camadas de fibras dotmpano condicionam o seu grau de transparncia aos raios

    luminosos, o que clinicamente valorizado na interpretao

    das otoscopias.

    O quadrante pstero-superior, onde existe apenas uma ca-

    mada de fibras (radirias), tem em regra um grau de trans-

    parncia superior da restante pars tensa. Atravs dele visvel a lmina tmpnica, para alm das estruturas habi-

    tualmente descritas na regio correspondente da caixa do

    tmpano.

    A pars flaccida a poro mais espessa do tmpano, o quesucede custa da camada epidrmica, razo da sua falta de

    transparncia.

    No recm-nascido a obliquidade do tmpano torna-o mais es-

    pesso aos raios luminosos, e impede ou dificulta a reflexo

    destes no interior da caixa, pelo que se acentua a colorao

    da membrana timpnica.

  • | 57

    2. A mobilidade da membrana do tmpano, atravs da ma-nobra de Valsalva, possibilitou verificar que perante uma hi-

    perpresso positiva no ouvido mdio, esta membrana reage

    de forma diferente, consoante a rea considerada.

    Conclumos ento que o tmpano mvel na sua totalidade,

    mas que existem pores desta membrana mais distens-

    veis que outras, localizadas no quadrante pstero-superior

    da pars tensa e da pars flaccida. Estas zonas possuem ca-ractersticas anatmicas comuns, tendo menos fibras colag-

    nias, e sendo igualmente distinto o modo como se inserem

    no tmpano.

    O quadrante pstero-superior que apresenta maiores di-

    menses, est por este motivo mais sujeito s diferenas de

    presso. A inexistncia do ligamento timpanomaleolar pos-

    terior possibilita que o quadrante pstero-superior e a parsflaccida se distendam simultaneamente.

  • OTITESNA PRTICA CLN

    ICA

    GUIA DE DIAGNSTICO E TRATAMEN

    TO

  • V. TMPANOS PATOLGICOS

  • V . TMPANOS PATOLGICOS

    Neste captulo, tendo como base as imagens otoscpicas de tm-

    panos patolgicos, comentaremos as principais alteraes que

    ocorrem na estrutura desta membrana, no martelo e no aro timp-

    nico, de acordo com os resultados do estudo morfolgico efectuado.

    Procuraremos assim contribuir para a compreenso da fisiopa-

    tologia das mais frequentes entidades nosolgicas que afectam

    esta membrana.

    OTITE MDIA AGUDAA otite mdia aguda uma inflamao aguda da mucosa do

    ouvido mdio. extremamente comum em crianas, mas pode

    ocorrer em qualquer idade, havendo quase sempre uma infec-

    o respiratria que a precede. O mesmo tipo de mucosa re-

    veste as fossas nasais, a nasofaringe, a Trompa de Eustquio e

    a caixa do tmpano.

    A velocidade com que a doena se instala varivel, algumas

    vezes lenta e insidiosa, outras em poucas horas, podendo che-

    gar perfurao e otorreia. Nos dias de hoje, com o fcil

    acesso s urgncias ou ao mdico assistente, e com o incio r-

    pido da teraputica, as perfuraes so menores.

    Podem-se encontrar todos os degraus ou passos da infeco

    desde a simples inflamao at formao franca de pus com

    todas estas transformaes a poderem ser acompanhadas na

    otoscopia reflectindo o tmpano o que se passa no interior da

    caixa e do ouvido mdio.

    Joo Pao

  • Contudo, bom termos presente que o ouvido mdio comea

    na Trompa de Eustquio e termina nas clulas mastoideias, e

    que ao tratarmos uma otite devemos ter presente que a infec-

    o pode no estar limitada caixa, mas progredir pelo aditusad antrum para o antro, e depois para as clulas mastoideias.

    As mastoidites no so to menos frequentes, pelo que o acto da

    otoscopia deve ser sempre acompanhado pela observao da

    pele que recobre a mastide na procura duma hiperemia que

    revele uma antrite ou mesmo uma mastoidite antes da desloca-

    o do pavilho auricular.

    Pensamos nesta altura ser importante relembrar os termos mais

    comummente utilizados e as terminologias mais frequentes re-

    lativamente a estas situaes inflamatrias:

    OTITE MDIA a inflamao do ouvido mdio sem referncia

    etiologia ou patogenia;

    OTITE MDIA AGUDA o rpido incio de sinais e sintomas,

    como a otalgia e a febre, que acompanham a infeco aguda do

    territrio do ouvido mdio;

    OTITE SEROSA ou otite mdia com derrame, dos autores ame-

    ricanos; a inflamao do ouvido mdio com uma coleco de

    lquido no interior do espao da caixa do tmpano. No existem

    sinais ou sintomas da otite mdia aguda e no h perfurao

    da membrana timpnica;

    EXSUDADOS TIMPNICOS designam a qualidade do lquido

    contido no interior do ouvido mdio sem ter que ver com a etio-

    logia, patognese, patologia ou durao. Estes exsudados

    podem ser:

    Serosos um lquido fino e aquoso;

    Mucosos se contm um lquido espesso, viscoso, mucide,

    tipo cola;

    Purulentos quando nos referimos a pus;

    Mucopurulentos uma combinao destes.

    Um exsudado pode ser recente agudo, ou j persistir

    meses subjugado ou crnico.

    | 61

  • Aps um episdio de otite aguda, e j depois da aco dos an-

    tibiticos, o exsudado resultante pode levar at um ms para ser

    completamente reabsorvido. A audio volta ento ao normal, e

    a sensao de plenitude desaparece.

    O carcter evolutivo da otite mdia aguda possibilita distinguir 3

    fases congestiva, supurativa e resolutiva.

    Fase CongestivaEsta fase habitualmente precedida dum curto perodo de obs-

    truo da Trompa de Eustquio, no qual o tmpano se encontra

    deprimido, a curta apfise saliente e o cabo horizontalizado. A

    membrana perde o seu brilho natural e podem mesmo obser-

    var-se transparncia nveis lquidos.

    A fase congestiva propriamente dita caracteriza-se pela hipere-

    mia. Esta, inicialmente localizada pars flaccida e ao cabo domartelo, surge depois junto ao annulus timpnico (Fig. 5.1).

    A vasodilatao da arterola do martelo, que da parede superior

    do conduto desce sobre a pars flaccida e sobre o cabo, a res-ponsvel pela hiperemia. Simultaneamente surge a vasodilata-

    o dos crculos vasculares peri-anulares, que acompanhada

    por alteraes nos vasos das paredes adjacentes do conduto.

    Com a hiperemia difusa passam a estar envolvidos, para alm

    das arterolas j mencionadas, os vasos radirios que as

    anastomosam e que se distribuem sobre toda a superfcie do

    tmpano.

    Para alm das modificaes da colorao, o tmpano torna-se

    progressivamente espesso e edemaciado, esbatendo-se pro-

    gressivamente os pontos de referncia, como a curta apfise e o

    cabo do martelo.

    Como consequncia o brilho desaparece, no se encontra o

    tringulo luminoso, enquanto o aumento de espessura implica a

    perda de transparncia.

    V . TMPANOS PATOLGICOS

  • | 63

    Nesta imagem de uma otite mdia aguda obtida com um teleotoscpio, verifica-se uma hiperemialocalizada pars flaccida (PF), cabo do martelo e annulus timpnico. Nota-se ainda um abaulamento (Abl) mais acentuado nos quadrantes posteriores.

    FIG. 5.1

  • Nesta altura, a acumulao de exsudados purulentos intratim-

    pnicos vai provocar um abaulamento que se inicia no qua-

    drante pstero-superior, o que est perfeitamente justificado

    pelas suas caractersticas anatmicas.

    De facto, o quadrante pstero-superior o que tem maior rea,

    estando, portanto, mais sujeito s variaes de presso. A sua

    constituio favorece ainda a distensibilidade, uma vez que esta

    a zona do tmpano com menor nmero de fibras.

    Com efeito, em 60% dos tmpanos estudados as fibras circulares

    terminavam no incio deste quadrante, junto emergncia do

    nervo da corda do tmpano. Nos restantes casos identificava-se

    apenas uma estreita faixa de fibras junto ao annulus.

    A acompanhar o abaulamento, que se pode estender posterior-

    mente a outras reas, nomeadamente pars flaccida, obser-vam-se, muitas vezes, zonas de colorao branca amarelada

    sobre um fundo hipermico.

    Hawke e Jahn (1988), relacionam esta mudana de colorao com

    fenmenos locais de necrose, premonitrios da fase supurativa.

    Fase SupurativaSurge na sequncia da fase congestiva e a perfurao ocorre em

    geral no ponto de maior distenso. Esta, provoca um dfice de ir-

    rigao seguido de necrose.

    A existncia de perfuraes vai determinar que este local, aps

    a cicatrizao, constitua um ponto de menor resistncia na es-

    trutura timpnica. o que sucede com as otites de repetio

    da criana.

    S aps a aspirao dos exsudados possvel observar o orif-

    cio da perfurao num tmpano que mantm uma colorao

    branca amarelada, e no qual dificilmente se identificam os pon-

    tos de referncia.

    V . TMPANOS PATOLGICOS

  • | 65

    Fase ResolutivaO tmpano recupera gradualmente a sua cor, brilho, aspecto e

    posio anatmica, e a perfurao, se existe, acaba na maioria

    dos casos por se encerrar espontaneamente.

    No interior da caixa processam-se igualmente uma srie de al-

    teraes ao nvel das bolsas timpnicas. Estas, que na fase su-

    purativa da otite mdia aguda podem estar envolvidas pelo

    contedo purulento da caixa, retomam a sua morfologia, o que

    permite restabelecer a comunicao entre elas e os andares su-

    perior e mdio da caixa. Deste modo, volta a processar-se o are-

    jamento e a normalizao da mucosa.

    A permanncia no seu interior dos exsudados inflamatrios pode

    originar a formao de bridas cicatriciais e implicar o encerra-

    mento do istmo timpnico externo, que consideramos como

    sendo fundamental para o arejamento do tico externo. Nesta

    eventualidade, a comunicao do tico com o mesotmpano fi-

    car limitada aos istmos timpnicos anterior e posterior, ambos

    localizados no tico interno.

    A recuperao dura em regra 4 a 6 semanas, sendo possvel

    durante este intervalo surgir uma descamao anormal sobre a

    superfcie timpnica.

    A normalizao da mobilidade timpnica sinal de evoluo fa-

    vorvel de um otscopio pneumtico e registada pelo timpano-

    grama.

    A recuperao da audio verifica-se, habitualmente, apenas

    cerca de um ms aps o incio do tratamento.

    Miringite BolhosaCaracteriza-se pela presena de flictenas na superfcie da mem-

    brana timpnica.

    Nalguns casos, estas bolhas que tm um contedo seroso ou

    hemorrgico, podem confluir e ocupar a quase totalidade da

  • V . TMPANOS PATOLGICOS

    Fase pr-supurativa de uma otite mdia aguda. O tmpanoencontra-se espessado, com uma diminuio dos caracteres,para alm de existir um marcado abaulamento localizadono quadrante pstero-superior e na pars flaccida.Ca. M Curta apfise do martelo; Nc Necrose.

    FIG.5.2

  • | 67

    face externa do tmpano, prolongando-se mesmo para as pare-

    des do conduto.

    Para Ballantyne e Groves (1978), Portmann (1982) e Hawke e col.(1984), a sua origem viral. Contudo, Roberts (1980), citado por

    Browning (Scott-Brown, 1987), refere que na maioria dos casos o

    vrus no isolado.

    Coffey (1966), citado pelo mesmo autor, afirma por outro lado ter

    encontrado bactrias no interior dos exsudados, o que transfor-

    maria as bolhas numa manifestao da otite mdia aguda.

    Em qualquer dos casos, o aparecimento destas bolhas na mem-

    brana do tmpano resulta da separao da camada epidrmica

    da lamina propria.

    O tecido conjuntivo sub-epidrmico possibilita esta dissociao,

    e os vasos a existentes, estaro na base das infiltraes he-

    morrgicas.

    OTITE MDIA AGUDA - SINOPSE

    QUADRO CLNICO

    A dor o sintoma dominante, associado hipoacsia por acu-

    mulao dos exsudados no interior do ouvido mdio, acufenos

    (muitas vezes pulsteis), autofonia e febre.

    A criana que no se sabe queixar est irritada, prostrada,

    com febre, chora e grita sobretudo durante a noite, leva a mo

    ao ouvido ou encosta a cabea.

    A otite mdia afecta 80% das crianas abaixo dos 2 anos, e

    responsvel por cerca de 1/3 das visitas ao mdico, abaixo

    dos 5 anos. A razo uma Trompa de Eustquio horizontal,

    de lmen estreito que conduz as bactrias da nasofaringe

    para o interior do ouvido mdio, e que com facilidade fica

    ocluda.

    A alimentao do beb por bibero, sobretudo se este esti-

    ver na vertical, pode levar ao refluxo do leite para o interior do

  • V . TMPANOS PATOLGICOS

    ouvido mdio. A presena, muito cedo, em infantrios, e os

    hbitos tabgicos dos pais so factores que podem incre-

    mentar a frequncia de otites.

    MICROBIOLOGIA

    Streptococcus pneumoniae, Haemofilus influenzae e Moraxellacatarrhalis so os microrganismos que, com maior frequn-cia, encontramos. Em cerca de 2% das crianas podem-se

    encontrar bacilos Gram-negativos. Os vrus podem ser en-

    contrados em aproximadamente 4% dos exsudados com

    os vrus respiratrio sincicial e o influenza a serem os mais

    comuns.

    TERAPUTICA

    A amoxicilina continua a ser o frmaco de eleio, com doses

    de 10mg/kg/dia. Tendo em conta a resistncia do Streptococcuspneumoniae, logo seguida da associao amoxicilina-cidoclavulnico, cefuroxime axetil e, nos casos mais graves, da cef-

    triaxone. Nos doentes sensveis penicilina dever ser usada

    a eritrocina ou seus derivados ou cefixime.

    Devem igualmente ser administrados analgsicos e, com o

    fim de restabelecer o normal funcionamento da Trompa de

    Eustquio, gotas nasais vasoconstritoras, descongestionan-

    tes nasais ou mucolticos.

    Os exsudados no interior do ouvido mdio podem persistir

    em crianas entre os 2 e os 6 anos, at dois meses aps o

    episdio agudo, ficando s nessa altura completamente res-

    tabelecida a audio.

    Timpanocentese

    realizada atravs de um fino catter, que possibilita aspirar

    o contedo do ouvido mdio, permitindo identificar o/os mi-

    crorganismo(s) envolvidos.

  • Miringocentese

    a inciso da membrana timpnica que facilita a imediata dre-

    nagem dos exsudados do ouvido mdio. habitualmente pre-

    cedida da timpanocentese e est indicada em casos de otalgia

    severa, otites de repetio que no cedem teraputica m-

    dica, ou complicaes como a paralisia facial ou a meningite.

    OTITE SEROSAA otite serosa, uma das principais causas da surdez de trans-

    misso na criana, surge como consequncia de uma disfuno

    tubria, de que resulta a produo pela mucosa de um exsudado

    que se acumula no interior do ouvido mdio (Figs. 5.3 e 5.4).

    Na otoscopia, o tmpano apresenta-se deprimido, com o cabo

    do martelo horizontalizado, curta apfise procidente e ligamen-

    tos timpanomaleolares bem evidentes. Para alm destes aspec-

    tos possvel observar alteraes da cor, aspecto, brilho,

    transparncia e mobilidade.

    Mas na otite serosa, e como resultado da depresso timpnica,

    no so apenas a curta apfise e o cabo que modificam a sua

    posio:

    a cabea do martelo desloca-se do segmento atical da paredeexterna da caixa. Como consequncia, o corredor interno do

    tico alarga-se em toda a sua extenso, enquanto o corredor

    externo se torna praticamente inexistente. O limite deste movi-

    mento vai ser a prpria parede externa do tico, uma vez que

    o ligamento superior do martelo, com poucas ou nenhumas fi-

    bras colagnicas, quase no oferece resistncia;

    o colo, tal como a cabea do martelo, movimenta-se para forae aproxima-se, ou entra em contacto com a pars flaccida, tor-nando a bolsa timpnica superior, um espao virtual. Esta dis-

    posio, reversvel na maioria dos casos, pode, sempre que o

    processo se arraste e evolua para a cronicidade, implicar a epi-

    dermizao desta rea.

    | 69

  • Na pars tensa, os quadrantes acompanham o movimento docabo do martelo em direco ao promontrio, mais os posterio-

    res que os anteriores. A pars flaccida, por seu lado, encontra-secomo que aspirada para o interior da caixa, esboando mesmo

    uma pequena cavidade. Ao nvel da bolsa superior, a depresso

    ou invaginao da pars flaccida torna este espao virtual. O liga-mento lateral externo do martelo desempenha, ento, um papel

    fundamental, pois pode limitar a progresso desta invaginao

    em direco ao corredor externo do tico.

    J ao nvel da pars tensa, e perante uma presso negativa in-tratimpnica, ser o quadrante pstero-superior o que se de-

    prime mais facilmente, pois possui um reduzido contedo em

    fibras, ficando nestes casos a bolsa posterior como um espao

    virtual.

    Neste quadrante, o conjunto formado pelo tmpano e pela prega

    malear posterior da face interna, acaba muitas vezes por esta-

    belecer contacto com o ramo vertical da bigorna, aspecto, alis,

    visvel na otoscopia. Desta conexo, podem, nalguns casos, re-

    sultar bridas de tecido fibroso que bloqueiam o componente

    posterior do istmo timpnico externo e impedem o normal are-

    jamento e drenagem da bolsa superior.

    De todas as bolsas timpnicas, a que menos se modifica com

    uma depresso timpnica a anterior, o que se compreende

    pois o tmpano a este nvel mais resistente, uma vez que pos-

    sui duas camadas de fibras, e na prega malear anterior esto

    includos o ligamento anterior do martelo e a espinha timpnica

    anterior.

    O tmpano perde a sua cor natural, acinzentada e brilhante,

    apresentando uma cor mate despolida. Por vezes, pode ser

    mesmo amarelo acastanhado, acobreado e mais raramente cin-

    zento azulado.

    Estas alteraes esto relacionadas com o contedo do derrame

    existente na caixa, seroso, mucoso ou seromucoso.

    V . TMPANOS PATOLGICOS

  • | 71

    Otite Serosa o tmpano apresenta-se deprimido, o cabodo martelo horizontalizado, a curta apfise procidente (Ct. Ap), observando-se ainda uma acentuao das pregastimpanomaleolares e a bolsa de retraco (Br) da parsflaccida. transparncia constata-se a existncia de umnvel lquido (nl) na transio dos quadrantes inferiores paraos superiores. Note-se tambm a vascularizao no cabo do martelo e junto ao annulus, assim como aexistncia de numerosos vasos radirios na pars tensa.B Bigorna; Lt Lmina timpnica; Jr Janela redonda.

    FIG. 5.3

  • Na otite serosa de evoluo prolongada, a membrana timpnica

    pode ainda surgir com uma cor azulada, o denominado tmpano

    azul idioptico (Fig. 5.4). Morgon e col. (1985) relacionam esta corcom a presena de granulomas de colesterol, no interior dos

    quais existem depsitos de ferro.

    Verificmos igualmente que o tmpano se encontra geralmente

    espessado, edemaciado e despolido, ficando apagados os ca-

    racteres anatmicos. O tringulo luminoso modifica-se, tor-

    nando-se mais fino e por vezes acaba mesmo por desaparecer.

    Noutros casos, este aspecto era inexistente e o tmpano apre-

    sentava-se transparente, permitindo observar o interior da caixa.

    Esta caracterstica, que nem sempre se constata, verifica-se, para

    Trassera e Abell (1982), em 10% dos casos, no constituindo

    para estes autores uma fase da evoluo da doena.

    Atravs do tmpano ento possvel visualizar o contedo lquido

    traduzido na otoscopia por um nvel, habitualmente curvo de

    concavidade superior (Fig. 5.3). Esta linha, que mvel, acom-

    panha os movimentos da cabea do doente e modifica-se com

    as manobras de Valsava.

    No interior do exsudado, em consequncia da sua viscosidade,

    constata-se nalguns casos a existncia de bolhas de ar de dife-

    rentes dimenses.

    Com menor frequncia possvel observar transparncia,

    manchas redondas de cor amarelada e reduzidas dimenses,

    localizadas na grande maioria dos casos nos quadrantes pos-

    teriores, que para Morgon e col. (1985) reflectem o contedo doderrame existente no interior da caixa.

    Na otite serosa, as alteraes da vascularizao da membrana

    do tmpano detectam-se com maior facilidade, caso a observa-

    o seja efectuada com o teleotoscpio ou com o microscpio.

    Assim, na otoscopia os vasos do annulus tornam-se mais evi-dentes, enquanto os radirios passam a ser visveis sobretudo

    na periferia da membrana.

    V . TMPANOS PATOLGICOS

  • | 73

    Imagem de uma otite serosa de adulto de evoluo arrastada. De registar a cor da pars tensa (PT), que traduz ocontedo do derrame intratimpnico no qual existehemossiderina. O tmpano apresenta-se deprimido com o martelo horizontalizado e a curta apfise procidente. Observa-se ainda uma bolsa de retraco (Br) da pars flaccida.Ct. Ap Curta apfise.

    FIG. 5.4

  • V . TMPANOS PATOLGICOS

    A utilizao do espculo pneumtico na otite serosa permite

    constatar que o tmpano est imvel ou hipomvel, com movi-

    mentos mais lentos que o habitual.

    Caso haja colaborao, este aspecto igualmente visvel com

    as manobras de Valsalva e Toynbee, que em tmpanos transpa-

    rentes provocam o aparecimento de bolhas de ar e a modifica-

    o da imagem do nvel.

    A mobilidade timpnica pode hoje em dia ser objectivada atra-

    vs da impedanciometria, exame que por este motivo constitui

    um complemento indispensvel, tanto no diagnstico como no

    controlo da evoluo desta doena.

    Queremos destacar dois tipos de traados relativos aos timpa-

    nogramas de doentes com otite serosa:

    os traados planos, que surgem em tmpanos deprimidos, comcurta apfise procidente, cabo do martelo horizontalizado, pre-

    gas timpanomaleolares bem evidentes e alterao caracters-

    tica da colorao, ou sempre que existam nveis lquidos no

    interior da caixa;

    os que esboam uma curva apex arredondado, deslocadopara as presses negativas e de amplitude reduzida. Nestes

    casos a otoscopia revela em geral um tmpano acinzentado,

    espesso, ademaciado, sem brilho, sem reas deprimidas ou

    contedos lquidos visveis transparncia.

    Este segundo traado surge apenas na otite serosa em fase ini-

    cial, ou de resoluo.

    A manobra de Valsalva mostra nestes casos um tmpano hipo-

    mvel, que os autores anglo-saxes classificam de preguioso.

    Verificmos, a exemplo do que foi descrito por Sultan e col. (1984),que no existe correlao entre o traado plano do timpano-

    grama e o grau de surdez de transmisso.

    Assim, a este tipo de traado tanto podia corresponder uma sur-

    dez de transmisso de 20 a 30 como de 40 a 50 decibis.

  • Procurmos estudar as alteraes antomo-patolgicas de tmpanos

    com otite serosa, atravs da anlise de fragmentos de descamao

    desta membrana, de doentes nos quais existia um derrame intra-

    timpnico. Nalguns casos, esta descamao constitua como que

    um molde da face externa do tmpano, que era removido em bloco.

    Pela anlise histolgica conclumos que estes fragmentos cor-

    respondiam camada crnea e camada granulosa da epi-

    derme timpnica.

    No seu interior, para alm dos elementos celulares que se en-

    contram nestas camadas, constatmos em todos os casos a

    existncia de numerosas clulas inflamatrias, infiltradas de po-

    limorfo nucleares, sobretudo na camada granulosa.

    Este facto demonstra que apesar de se tratar de um processo do

    tmpano, as fibras colagnicas sofrem alongamentos e ruptura

    dos entrecruzamentos dos feixes, para alm duma reduo da

    espessura.

    OTITE SEROSA - SINOPSE

    QUADRO CLNICO

    O sintoma dominante a hipoacsia, de incio insidioso e que

    muitas vezes passa despercebido otite silenciosa. A forma

    de apresentao depende da idade da criana: abaixo dos 3

    anos pode atrasar a fala e o desenvolvimento da linguagem.

    Em crianas mais velhas, estas podem ficar desatentas,

    pouco colaborantes, solitrias. O problema em regra cha-

    mado ateno pelos professores, ou por outros pais, ou

    despistado em testes de rotina.

    ETIOLOGIA

    Trata-se da acumulao de exsudados fluidos no ouvido

    mdio, na ausncia de inflamao ou infeco. Por o fluido

    ser muitas vezes extraordinariamente viscoso designado

    pelos autores anglo-saxes de glue ear.

    | 75

  • V . TMPANOS PATOLGICOS

    a causa mais frequente de surdez na criana, habitualmente

    bilateral, podendo apresentar-se unilateralmente ou ser in-

    termitente.

    Infeces de repetio, otites mal curadas, adenoidites e hi-

    pertrofia dos adenides, so as principais causas, para alm

    da alergia e hbitos tabgicos dos pais.

    TERAPUTICA MDICA

    Saber esperar. Uma otite serosa pode resultar da evoluo

    duma otite aguda, estando os exsudados do ouvido mdio a

    ser reabsorvidos, o que pode demorar 3-6 meses.

    Devem ser utilizados descongestionantes, mucolticos, anti-

    -histamnicos e por vezes antibiticos (infeco bacteriana

    associada).

    Auto-insuflaes so muitas vezes bem vindas e facilitam o

    retorno ao normal da funo tubria, porm, a idade da

    criana condiciona estas manobras.

    As alergias condicionam, muitas vezes, o bom xito da tera-

    putica e aceleram a indicao cirrgica.

    TERAPUTICA CIRRGICA

    Recorre-se teraputica cirrgica quando falha a teraputica

    mdica aps pelo menos 3-4 meses de tratamento, se a sur-

    dez ultrapassa os 30 decibis no melhor ouvido, ou se se for-

    mam bolsas de retraco e se esboam atelectasias.

    A colocao dos tubos transtimpnicos sob anestesia geral

    constitui um bypass a uma Trompa disfuncionante e servepara arejar o ouvido mdio e no para drenar, devendo ser

    associada remoo simultnea dos adenides, a fonte da

    infeco e inflamao da Trompa.

    Aps 8-10 meses, os tubos so expulsos espontaneamente,

    podendo verificar-se uma recidiva em 8 a 10%.

  • BOLSAS DE RETRACOAs bolsas de retraco so um processo dinmico, muitas vezes

    reversvel mesmo sem qualquer tratamento, traduzindo uma in-

    suficincia tubria associada a reas de menor resistncia do

    tmpano.

    Podem apresentar uma fase de actividade na qual existe uma in-

    flamao, por vezes com a presena de um exsudado intratim-

    pnico, e uma fase de sequela, de acalmia do processo

    inflamatrio e de cicatrizao.

    Contudo, na otoscopia a caracterizao das bolsas de retraco

    passa obrigatoriamente pela anlise de outros aspectos, como

    a localizao, fixao, controlo e mobilidade.

    LocalizaoAs bolsas de retraco podem ser localizadas, caso existam

    numa rea circunscrita do tmpano, ou difusas, se estiver envol-

    vida toda a pars tensa.

    A pars flaccida o local onde mais frequentemente se situam asbolsas de retraco, existindo factores anatmicos que podem

    explicar esta incidncia:

    as fibras colagnicas, em reduzido nmero, apresentam-sedesorganizadas, e ao contrrio das da pars tensa no pos-svel proceder sua sistematizao, pois encontram-se de

    uma forma anrquica, no se associando em feixes e dis-

    pondo-se apenas numa camada;

    o sulco e o annulus timpnico no existem ao nvel da incisurade Rivinus, pelo que as fibras da pars flaccida se continuamcom as do periosteo da incisura;

    os ligamentos timpanomaleolares que eventualmente pode-riam servir de apoio so igualmente inexistentes;

    a pars flaccida o local do tmpano que apresenta maior mo-bilidade.

    | 77

  • As bolsas de retraco da pars tensa localizam-se com maiorfrequncia no quadrante pstero-superior, e tm como principal

    caracterstica o facto de serem marginais (Fig. 5.5).

    Se analisarmos estas bolsas de retraco, baseados nos resul-

    tados obtidos sobre a anatomia macro e microscpica do tm-

    pano e do quadro timpnico, pensamos ser possvel, tal como

    para a pars flaccida, explicar a sua localizao:

    a distribuio do tecido fibroso do tmpano, pois, de acordocom os resultados obtidos, apenas existe a este nvel a camada

    das fibras radirias que do martelo se dirigem ao annulus tim-pnico. Em 40% dos casos, para alm desta camada, existe

    igualmente uma estreita banda de fibras circulares junto ao

    annulus, disposio que pouco contribui para fortalecer a la-mina propria. Conclumos deste modo que, qualquer que sejaa distribuio das fibras, o quadrante pstero-superior ser de

    todos o que se encontra menos capacitado de um ponto de

    v