Laudo Técnico -...
Transcript of Laudo Técnico -...
-
1
Laudo Tcnico
Belo Horizonte, 22 de outubro de 2014
Retificao ao Laudo Tcnico emitido no dia 18 de setembro de 2014.
Considerar o presente laudo.
1) Solicitante: Associao Brasileira de Frigorficos (ABRAFRIGO)
Contato: Pricles Pessoa Salazar
2) Responsvel Tcnico: Prof. Dr.-Ing. Augusta Cerceau Isaac Neta
Qualificaes:
Professora do Departamento de Engenharia Metalrgica e de Materiais da
Escola de Engenharia (EE-DEMET) da Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG)
Doutora em Engenharia de Materiais pelo Max-Planck Institute fuer
Eisenforschung GmbH (Duesseldorf, Alemanha) / Ruhr-Universitt-Bochum
(Bochum, Alemanha)
Mestre em Engenharia Mecnica e Aeronutica pelo Instituto Tecnolgico da
Aeronutica (ITA) (So Jos dos Campos, SP)
Graduao em Engenharia Mecnica pela Pontifcia Universidade Catlica de
Minas Gerais (PUC Minas)
Pesquisadora na rea de caracterizao de materiais
Currculo Lattes - http://lattes.cnpq.br/2746383155366023
3) Objetivo da Avaliao Tcnica:
O objetivo principal desta avaliao tcnica esclarecer s entidades filiadas ABRAFRIGO quais so as principais causas que tem levado aos autos de infrao por excesso de
Peso no Eixo. Para isto, foi conduzido um estudo sistemtico do processo de carregamento e
transporte de cargas por caminhes frigorficos. Ao final, algumas possibilidades que
minimizem ou eliminem o excesso de Peso no Eixo so propostas.
4) Consideraes Iniciais e Metodologias:
As entidades filiadas ABRAFRIGO solicitaram esta avaliao tcnica pelo fato de
estarem recebendo um grande nmero de multas por excesso de Peso no Eixo, apesar de
-
2
verificarem o Peso Bruto Total (PBT) antes de permitirem sada de seus caminhes
para o transporte de cargas. Diante deste cenrio, o presente trabalho teve como
finalidade identificar as principais causas dos autos de infrao por excesso de Peso
no Eixo. Para isso, foram monitorados os processos de carregamento/descarregamento de
caminhes em uma das empresas filiadas, PLENA ALIMENTOS DO BRASIL LTDA, em Contagem,
Minas Gerais.
No dia 3 de setembro deste ano, foi realizada uma visita PLENA ALIMENTOS.
Primeiramente, o descarregamento de um caminho contendo carcaas de boi penduradas
pode ser monitorado. A Figura 1-a mostra o interior do ba do caminho frigorfico, com parte
de sua carga retirada. Em seguida, acompanhou-se o carregamento de um veculo com caixas
de papelo de mesmo tamanho e tipo contendo carne processada. A Figura 1-b apresenta a
forma como esta carga foi disposta no ba. Como pode ser observado, a distribuio de ambas
as cargas praticamente uniforme.
(a) Carcaas de boi penduradas (b) Pacotes de papelo com carne processada
Figura 1. Imagens no interior de bas de caminhes frigorficos, no momento de descarregamento (a)
e carregamento (b) de cargas perecveis, na empresa Plena Alimentos Brasil Ltda.
Apesar da preocupao em respeitar o limite de Peso Bruto Total, dependendo da
forma como a carga acomodada no interior do veculo, pode-se provocar no
intencionalmente excesso de peso em algum dos eixos do caminho. Para demonstrar isso,
duas situaes distintas foram simuladas: i. entregas parciais e ii. deslocamento da carga
durante o transporte; e o resultado de cada uma destas situaes sob o peso nos eixos
dianteiro e traseiro pode ser verificado. O mtodo de soluo baseou-se em Diagramas de
Foras, que consiste em uma ferramenta bastante usada por engenheiros e fsicos para anlise
de foras e momentos atuantes em corpos rgidos.
Neste estudo, foi adotado o caminho Truck Modelo 24-250 6x2 Constellation
modificado, do fabricante Volkswagen, por ser um veculo bastante utilizado pela empresa
-
3
PLENA ALIMENTOS e pelo fato de possuir uma grande incidncia de autos de
infrao por excesso de Peso no Eixo. A modificao do caminho Truck Modelo 24-
250 6x2 Constellation consistiu em encurtar o entre - eixos com a finalidade de se
utilizar um ba de menor de comprimento (6,5 m). O ba do caminho vindo de fbrica possui
um comprimento de 7,5 m. As principais dimenses deste veculo (distncia entre eixos e
comprimento do ba) esto indicadas na Figura 2. J a Tabela 1 apresenta os valores de PBT,
tara e lotao mxima do caminho. Foram ainda medidos o peso do caminho, sem carga e
com dois tanques de combustveis cheios, no eixo dianteiro e no conjunto traseiro de eixos em
tandem duplo (ou eixos traseiros). Os valores de peso no eixo dianteiro e nos eixos traseiros so
3910 e 6380 kg, respectivamente.
Tabela 1. Especificaes tcnicas do caminho Truck da empresa Plena Alimentos.
Placa Classificao Ano Marca/Modelo PBT
[kg]
Tara
[kg]
Lotao
[kg]
MWY689
2
Caminho
Truck 2010
Volkswagen
24-250 23000 10,270 12,730
5) Resultados e Comentrios:
Uma acomodao inadequada da carga no interior do ba do veculo pode provocar
excesso de peso em algum dos eixos do caminho, apesar do seu Peso Bruto Total estar abaixo
dos limites impostos pela legislao. Algumas situaes comuns PLENA ALIMENTOS - e
tambm corriqueiras vrias outras entidades filiadas ABRAFRIGO - que podem levar ao
excesso de Peso no Eixo sero avaliadas. Basicamente, as situaes em que ocorre entregas
parciais de carga sem uma nova acomodao da mesma no interior do veculo, bem como o seu
deslocamento durante o transporte, sero analisados. Para cada uma das configuraes da
carga a serem analisadas, os pesos nos eixos dianteiro e traseiros sero calculados.
A primeira situao do caminho Truck carregado com sua lotao mxima (12730 kg),
respeitando o limite de PBT mximo permitido. A carga uniformemente distribuda no interior
do ba (rea em azul claro, Figura 2-a). Esta situao - identificada como Caso 1 na Figura 2 -
levar uma distribuio de peso no eixo dianteiro (FD) e no conjunto traseiro de eixos em
tandem duplo (FT) de 5359 kg e 17661 kg, respectivamente. De acordo com a legislao (Lei
7.408/85), para o caminho Truck em estudo, o limite mximo de peso no eixo dianteiro de
6000 kg; enquanto que nos eixos traseiros, 17000 kg. Com base nesses valores, pode-se afirmar
ento que o caminho apresentaria 661 kg de excesso de peso nos eixos traseiros.
As situaes a seguir - identificadas como Casos 2 e 3, na Figura 2 - correspondem ao
problema inerente s entregas parciais sem uma posterior acomodao da carga restante no
-
4
interior do veculo. Considere que o mesmo caminho do Caso 1 realize uma srie
de entregas diferentes clientes, retirando, portanto, um determinado nmero de
fraes da carga ao longo de seu trajeto. Por exemplo, se 20% da carga fosse
retirada pela traseira do veculo pelo seu 1o cliente (Caso 2, Figura 2), o peso da carga no
interior do ba passaria a ser de 10184 kg. Com esta configurao, os pesos nos eixos dianteiro
e traseiros seriam de 6569 kg e 13905 kg. Isto significa que o veculo seria multado por excesso
de peso no eixo dianteiro em uma prxima balana, com 569 kg a mais que o permitido para
este eixo.
Caso o caminho parasse em um segundo cliente, retirando mais 20% da carga,
restariam 7638 kg no interior do ba (Caso 3, Figura 2). Mesmo com apenas 60% de sua lotao
mxima inicial, este veculo ainda assim apresentaria excesso de peso no eixo dianteiro. Mais
precisamente, seriam 7030 kg no eixo dianteiro e 10898 kg nos eixos traseiros. Ou seja, haveria
um excesso de peso equivalente a aproximadamente 1 tonelada no eixo dianteiro. A Figura 3
apresenta dois grficos de como o peso no eixo dianteiro (Figura 3-a) e nos eixos traseiros
(Figura 3-b) variam em funo da frao da carga no interior do veculo.
O Caso 4 da Figura 2 exemplifica o efeito do deslocamento da carga durante o
transporte sob o peso no eixo. Supondo que o veculo transporte a sua lotao mxima (12730
kg) e que freie bruscamente, certamente a carga se deslocar em direo cabine devido
inrcia do veculo. Para um deslocamento arbitrrio de 50 cm no interior de um ba cujo
comprimento de 6,5 m, os valores de peso no eixo dianteiro e traseiros sero de 6076 kg e
16944 kg, respectivamente. Ou seja, o veculo apresentar 76 kg em excesso no eixo dianteiro.
-
5
FD = 5359 kg
FT = 17661 kg
FD = 6569 kg
FT = 13905 kg
FD = 7030 kg
FT = 10898 kg
FD = 7676 kg
FT = 15344 kg
Figura 2. Avaliao de diferentes condies de carregamento e seus efeitos sobre o peso nos eixos do
caminho Truck. No lado esquerdo, esto ilustradas quatro situaes de acomodao da carga
no interior do ba. No lado direito, foram calculados os valores de peso nos eixos dianteiro e
traseiros. A figura apenas ilustrativa e est fora de escala. As dimenses fsicas do caminho
esto em milmetros.
-
6
(a)
(b)
Figura 3. Distribuio do peso nos eixos dianteiro (Figura 3-a) e traseiros (Figura 3-b) em funo da
frao da carga inicial no interior do veculo. Estes grficos ilustram o problema de entregas
parciais, quando no ocorre uma nova acomodao da carga no interior do veculo. Os limites
mximos de peso nos eixos dianteiro e traseiros esto indicados.
Os exemplos acima colocam em evidncia o fato de que um caminho carregado
perfeitamente pela empresa (i.e. respeitando o PBT mximo permitido) poderia ainda assim
Limite mximo
Limite mximo
-
7
sofrer autos de infrao por excesso de peso em alguns dos eixos do veculo. Com
relao Entregas Parciais de carga, isto ocorre devido uma distribuio de carga
inadequada no interior do ba, que levaria um excesso de peso em um dos eixos
do caminho. Toda vez que se retira carga pela traseira do ba, desloca-se o centro de
gravidade desta carga (Gcarga) em direo parte da frente do veculo, aumentando-se o peso
no eixo dianteiro. Para se evitar este problema, deve-se em geral coincidir o Gcarga com o centro
geomtrico do ba (Gbau). Isso possvel por meio de uma acomodao uniforme e balanceada
da carga.
Um alternativa reacomodao da carga no interior do veculo (aps entrega parcial)
seria limitar o carregamento do caminho 67% de sua lotao mxima, o que seria o
equivalente 8500 kg. Se for levada em considerao a tolerncia de 10% no peso por eixo -
regulamentada pela CONTRAN -, o veculo poderia ser carregado com 86% de sua lotao
mxima (10900 kg). A Figura 4 mostra a distribuio do peso no eixo dianteiro do caminho
como funo da frao da carga inicial de 8500 kg e 10900 kg.
Figura 4. Distribuio do peso nos eixo dianteiro em funo da frao da carga inicial no interior do
veculo de 8500 kg e 10900 kg.
Limite mximo
Tolerncia de 10%
-
8
6) Concluses e Comentrios Adicionais:
Os resultados apresentados por esta avaliao tcnica demonstram que o
problema de excesso de peso no eixo pode ocorrer em casos de entregas parciais (cargas
fracionadas) e devido movimentao de cargas no interior do veculo durante o transporte,
mesmo com o caminho abaixo de seu Peso Bruto Total mximo permitido. Para reduzir ou
eliminar os problemas de excesso de peso no eixo, algumas sugestes foram listadas abaixo.
Sabe-se, porm, que a exeqibilidade destas recomendaes pode no ser simples, envolvendo
diversos aspectos econmicos e questes trabalhistas.
1. A carga deve ser balanceada no interior do ba. Mesmo com o Peso Bruto Total
correto, geralmente se o centro de gravidade da carga (Gcarga) e o centro
geomtrico do ba (Gbau) no coincidirem, poder haver excesso de peso em
alguns dos eixos do veculo. Este balanceamento pode ser auxiliado por
softwares (a serem desenvolvidos ou disponveis comercialmente), dedicados
rea de logstica empresarial, que so capazes de prever a distribuio do peso
entre os eixos do veculo. Uma planilha capaz de prever peso em cada um dos
eixos do caminho Truck Modelo 24-250 6x2 Constellation modificado foi
desenvolvida e disponibilizada empresa PLENA ALIMENTOS BRASIL LTDA.
2. A possibilidade de transportar toda a carga para um Centro de Distribuio deve
ser avaliada, evitando-se o fracionamento da mesma. Se o fracionamento da
carga inevitvel, o motorista do caminho ou responsvel deve reacomod-la
no interior do ba, aps cada entrega parcial. Esta nova configurao da carga
tambm deve ser balanceada, ou seja, a carga deve ser geralmente distribuda
uniformemente em torno do centro geomtrico da ba (Gcarga Gbau).
3. Adicionalmente, deve-se impedir que a carga se movimente durante a viagem.
Para isto, uma soluo seria o uso de barras transversais e longitudinais (se for o
caso) no interior do ba.
Uma das constataes mais importantes deste trabalho - que deve ser ressaltada e
discutida juntamente com os fabricantes de caminhes de carga - a falta de informao
adicionais nas especificaes tcnicas do veculo em relao ao excesso de peso no eixo em
casos de acomodao no uniforme da carga. A grande maioria dos empresrios, responsveis
pelo setor de logstica das empresas e caminhoneiros no possuem conhecimentos tcnicos em
engenharia/fsica para entender esse problema. O fato de que um caminho com sua lotao
mxima no apresente excesso de peso no eixo, mas que ele possa vir a ser multado se parte
de sua carga for retirada no algo fcil de ser entendido e muito menos intuitivo.
-
9
Ainda com relao questo desta falta de informao nas especificaes
tcnicas dos veculos, vale mencionar que os fabricantes de caminhes informam
somente a capacidade mxima de carga (e de carroceria) a ser distribuda
uniformemente no ba, respeitando assim os limites de peso por eixo estabelecidos na
legislao. Diante deste problema, seria extremante importante informar ao empresrio sobre
o eventual problema de excesso de peso no eixo no caso de acomodao no uniforme da
carga, resultante principalmente de entregas parciais.
Por exemplo, apesar do caminho Truck Modelo 24-250 6x2 Constellation da empresa
PLENA ALIMENTOS BRASIL LTDA comportar 12730 kg de lotao mxima distribuda
uniformemente no ba, uma entrega parcial de apenas 10% da carga ocasiona um excesso de
peso no eixo dianteiro. Um modo de evitar este problema, sem reacomodao de carga
durante o transporte, o carregamento de apenas 67% do valor de carga especificado pelo
fabricante. Esta prtica, todavia, leva uma perda significativa no ganho da empresa, tornando-
a economicamente invivel.
Finalmente, solues de abrangncia nacional e internacional devem ser avaliadas
juntamente com os fabricantes de veculos de carga. Algumas iniciativas tm permitido o
desenvolvimento de sistemas para a reduo/eliminao do problema de excesso de peso no
eixo. Por exemplo, a empresa Schmitz Cargobull (http://www2.cargobull.com) desenvolveu um
opcional de carretas com suspenso pneumtica (nos trs eixos) que capaz de acomodar o
desequilbrio causado pela entrega parcial. Esse sistema conhecido por Load Spread
Program.
Belo Horizonte, 22 de Outubro de 2014.
AUGUSTA CERCEAU ISAAC NETA, Prof. Dr.-Ing.
Departamento de Engenharia Metalrgica e de Materiais
Escola de Engenharia/ UFMG