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Paulo Rogerio Machado PradoUm breve resumo de como os Farroupilhas sulistas recrutaram e depois descartaram seus soldados negros.Durante a chamada Guerra dos Farrapos no Rio Grande do Sul (1835-45), quando um homem livre era chamado a servir tanto nas foras rebeldes quanto nas imperiais, podia enviar em seu lugar (ou no lugar de um filho seu) um de seus trabalhadores escravizados. Em alguns casos, o alforriavam e alistavam. Tambm foi prtica comum buscar atrair ou tomar cativos das tropas inimigas, trazendo-os para seu lado. O primeiro exrcito a utilizar negros escravizados como soldados foram os imperiais. Precisando tambm formar uma infantaria e sobretudo preferindo envi-los como bucha-de-canho, morrendo na frente em seu lugar, farrapos tambm os alistaram: eram os famosos Lanceiros Negros. Ambos, farrapos ou imperiais, prometiam tambm liberdade aqueles que desertassem das tropas rivais, mudando de lado.A maioria dos cativos que combateu nesta guerra foi obrigada a faz-lo diante das condies impostas. Por outro lado, apesar da guerra ser horrvel e violenta, era at prefervel a vida militar, com seus espordicos combates, do que as agruras dirias da escravido. A promessa de liberdade aps o fim da luta certamente pode ter influenciado em muito o recrutamento daqueles homens. Uma promessa, alis e como veremos, jamais cumprida.No havia igualdade nas tropas farroupilhas, muito menos democracia racial. Negros e brancos marchavam, comiam, dormiam, lutavam e morriam separadamente. Os oficiais dos combatentes negros eram brancos, e jamais um negro chegou a um posto significante, mesmo que intermedirio, de comando. Aos Lanceiros Negros era vedado o uso de espadas e armas de fogo de grande porte. No lutavam a cavalo, como costumam mostrar nos filmes e mini-sries de TV, mas sim a p, pois havia o risco de se rebelar ou fugir. Sua arma principal era a grande lana de madeira que lhes deu nome e fama, algumas facas, faces, pequenas garruchas, os ps descalos, a bravura e o anseio pela liberdade prometida.Seria anacronismo se quisssemos que lderes farroupilhas tivessem um comportamento ou posies polticas avanadas e assim diferentes das existentes em seu tempo, mas defesa da Abolio da escravido era bem conhecida e nada aliengena na poca. Uma Abolio comeou a ser decretada em Portugal em 1767, proibindo que fossem enviados para o reino mais cativos vindos da frica, e em 1773 foi decretada uma Lei do Ventre Livre naquele pas. Na Dinamarca, isso se deu em 1792. Na Frana, em 1794 (ainda que Napoleo tenha tentado restabelecer a escravido no Haiti em 1802). No Mxico, uma primeira tentativa de Abolio foi feita em 1810, mas foi finalmente vitoriosa em 1829. Bolvar libertou cativos em 1816-7, durante suas lutas por independncia, e finalmente aboliu a escravatura em 1821. A Inglaterra, que havia findado a escravido pouco antes da Revolta dos Farrapos, pressionava o Brasil pelo fim do trfico negreiro desde 1808. Willian Wilbeforce, um dos maiores abolicionistas da histria, morreu em 1833, ou seja, dois anos antes da guerra no Sul do Brasil. Farrapos, portanto, conheciam, sim, e muito bem o abolicionismo.Entretanto,os principais chefes farrapos, Bento Gonalves, Canabarro, Gomes Jardim e at Netto, dentre outros, eram todos ferrenhos escravistas. Quando aprisionado e enviado para a Corte no Rio de Janeiro, Bento Gonalves teve o direito de levar consigo um de seus cativos para lhe servir. Ao morrer, o mais conhecido lder farroupilha deixou terras, gado e quase cinqenta trabalhadores escravizados de herana aos seus familiares. Bem diferente do que fizera Artigas no Uruguai anos antes, os farrapos jamais propuseram uma reforma agrria ou mesmo uma distribuio de terras entre seus soldados, mesmo os brancos pobres, que dir os negros. A defesa da escravido era to clara entre os chefes farrapos a ponto deles jamais sequer terem mencionado o fim do trfico negreiro.Ao fim da guerra e j quase totalmente derrotados, os farrapos incluram entre suas exigncias para o Imprio o cumprimento da promessa de liberdade que haviam feitos aos Lanceiros (principalmente porque temiam que eles formassem uma guerrilha negra na provncia j que a quebra da promessa os faria se rebelar ou fugir para o Uruguai, destino comum de diversos cativos fugitivos na poca). Queriam entregar-se ao Imprio, acabar a guerra, voltar normalidade, mas tinham os Lanceiros e a promessa que lhes haviam feito, e o Imprio, escravista at a medula, no queria cumprir essa parte do acordo.Que fazer ento? A questo foi resolvida na madrugada de 14 de novembro de 1844, quando o general farrapo David Canabarro entregou seus Lanceiros desarmados ao inimigo, tudo previamente combinado com Caxias. E no serro de Porongos, hoje regio de Pinheiro Machado (interior do Rio Grande do Sul), foi dizimada quase toda a infantaria negra, enterrando de vez a preocupao dos farrapos e acelerando assim a paz com o Imprio. A instruo de Caxias a um de seus comandados foi clara e objetiva: a batalha teria que ser conduzida de forma tal que poupar apenas e dentro do possvel o sangue de brasileiros (e o negro era ento tratado como africano, mesmo que j nascido no Brasil).Alguns historiadores apologistas ou folcloristas de CTGs consideraram aquela traio como Surpresa, j que pela primeira vez que o ento vigilante Davi Canabarro teria sido surpreendido pelo inimigo. Conversa fiada! Enquanto disps suas tropas negras de tal maneira que ficassem desarmadas e descobertas, algo que at ento nunca havia feito, Canabarro se encontrava bem longe e seguro do local, nos braos de Papagaia, alcunha de uma amante sua.Aps o combate, um relato oficial avisou a Caxias que pelo menos 80% dos corpos cados no campo de Porongos eram de homens negros. Calcula-se que, nos ltimos anos daquela conflito, os farrapos ao todo somavam uns cinco mil homens, sendo que algo em torno de mim eram Lanceiros Negros. Aps o Massacre de Porongos, porm, restaram apenas uns 120 deles, feridos, alguns mutilados, e que foram primeiramente enviados para uma priso no centro do pas e depois dispersados para outras provncias, ainda mantidos como cativos.Feito isso, deu-se a chamada rendio e paz do Poncho Verde, onde senhores escravistas dos dois lados trocaram abraos e promessas de lealdade e, logo depois, marcharam juntos e sob a mesma bandeira imperial contra o Uruguai, Argentina e Paraguai.20/set/2013, 9h57minRevoluo Farroupilha, 1844, Batalha de PorongosDepois de lutarem, durante dez anos, no por dinheiro ou impostos, mas pela liberdade, no dia 14 de novembro de 1844 foram miseravelmente trados no mais vergonhoso episdio dessa guerra, conhecido como O Massacre de Porongos. Desarmados, por seu comandante Canabarro, esses homens foram traioeiramente entregues a sanha historicamente genocida de Caxias.Lanceiro Negro | Quadro de Juan Manuel BlanesBatalha de Porongos: covardia, traio, falsidadeA Revoluo Farroupilha foi a mais longa revolta republicana contra o Imprio escravocrata e centralizador brasileiro. Os grandes e poderosos proprietrios de terras gachos, sentindo-se desfavorecidos pelas leis federais, principalmente pelos impostos considerados excessivos, entram em negociaes com o governo regencial. Tais negociaes, consideradas insatisfatrias, criam um crescente estado de tenso at o rompimento definitivo e a declarao de guerra, em 20 de setembro de 1835.Depois do combate travado em Bag, conhecido como a Batalha do Seival, em que as foras imperiais foram surpreendente e rotundamente derrotadas, surge um movimento poltico dissidente e separatista. Com sua radicalizao proclamada a independncia e criada a Repblica Rio-Grandense frente ao Imprio do Brasil, propondo uma Repblica Federativa s demais provncias que viessem a separar-se do Imprio e assumissem a forma republicana.Para lutar por um pas independente foi necessrio juntar as tropas dos generais que aderiram causa e assim foi formado o exrcito farroupilha liderado pelo Gen. Bento Gonalves. Na verdade, os verdadeiros protagonistas dessa luta foram os negros, os ndios, os mestios e os brancos pobres que lutaram de forma abnegada pela recm criada Repblica e por espaos de liberdade, buscando um futuro melhor para si e para os seus. Entre os generais est um abolicionista convicto, Antnio de Souza Netto, que no s coloca a libertao dos escravos como um dos ideais farroupilha como prope a participao dos negros na luta dos farrapos. Num primeiro momento a idia rejeitada. Porm, em 4 de outubro de 1836, depois da Derrota de Fanfa, em que Bento Gonalves foi preso e o exrcito farroupilha teve excessivas baixas, eles no vacilaram em libertar os escravos que, em troca, se engajaram no exrcito farroupilha. Assim foi criada a unidade militar que ficou conhecida como os Lanceiros Negros.Nesse corpo de Lanceiros Negros s havia brancos entre os oficiais superiores. Os negros eram os melhores domadores de cavalos da provncia. Suas lanas eram maiores do que as ordinrias, os rostos pretos como azeviche. Seus corpos robustos e a sua perfeita disciplina os tornavam o terror dos imperiais. A participao decisiva dos Lanceiros Negros foi ressaltada pelo republicano Giuseppe Garibaldi heri dos dois mundos em sua biografia escrita por Alexandre Dumas: soldados de uma disciplina espartana, que com seus rostos de azeviche e coragem inquebrantvel, punham verdadeiro terror ao inimigo ou ainda mas nunca vi, em nenhuma parte, homens mais valentes, em cujas fileiras aprendi a desprezar o perigo e combater dignamente pela causa sagrada das naes (GARIBALDI,Giuseppe, em FAGUNDES, M. Calvet, Histria da Revoluo Farroupilha. EDUCS.1989.p. 9).Depois de lutarem, durante dez anos, no por dinheiro ou impostos, mas pela liberdade, no dia 14 de novembro de 1844 foram miseravelmente trados no mais vergonhoso episdio dessa guerra, conhecido como O Massacre de Porongos. Desarmados, por seu comandante Canabarro, esses homens foram traioeiramente entregues a sanha historicamente genocida de Caxias.Duque de Caxias: resolvendo a questo dos negros em armasA Traio de Porongos e o Massacre dos Lanceiros NegrosComo explicar aos brasileiros tamanha covardia e a baixeza moral perpetradas por dois homens, David Canabarro e Duque de Caxias, ambos idolatrados como heris pela historiografia oficial um deles at considerado patrono do Exrcito durante a chamada Revoluo Farroupilha? Os historiadores oficiais criaram deliberadamente imagens falsas de Porongos procurando no macular seus heris. Entretanto, a hediondez dos acontecimentos s nos permite uma coisa: no a explicao, mas a revelao da verdade, baseada em documentos oficiais que ficaram escondidos por dcadas e s agora revelados.As crescentes dificuldades enfrentadas pela nova Repblica e as disputas polticas na regio do Prata, preocupantes para as autoridades do Imprio, impuseram s duas partes negociaes de paz. Uma vitria militar decisiva dos farrapos sobre o exrcito imperial, comandado pelo ento Baro de Caxias, tornara-se cada vez mais invivel. Por parte do Imprio era importante terminar logo a luta e buscar uma paz negociada, pois tudo indicava a inevitabilidade da luta com os vizinhos platinos. Mas para as duas partes era importante resolver a questo dos negros em armas. Os revoltosos haviam prometido liberdade aos negros que lutavam no exrcito farroupilha e com isso a Corte Imperial no concordava. Era um perigo para os escravocratas brasileiros um grande nmero de negros armados. E se eles, agora bastante coesos, procurassem asilo no Uruguai e a partir da continuassem a guerra com tticas de guerrilhas, fazendo do territrio uruguaio seu santurio? Isso levaria guerra e poderia provocar graves problemas com a Argentina de Juan Rosas (LEITMAN Spencer, Negros Farrapos: hipocrisia racial no sul do Brasil no sc. XIX e DACANAL Jos, A Revoluo Farroupilha: histria e interpretao. Porto Alegre: Mercado Aberto.1985. p. 72)Pelo lado dos farrapos, Bento Gonalves foi afastado da liderana, e os novos lderes, David Canabarro e Antnio Vicente da Fontoura, ambos escravocratas, negociavam a paz com Caxias. A promessa de liberdade para os combatentes negros depois de 10 anos de abnegadas e vitoriosas lutas deles nas batalhas pesava muito nas negociaes.Foi neste contexto que aconteceu, na madrugada de 14 de novembro de 1844, o Massacre de Porongos em que os Lanceiros Negros previamente desarmados por Canabarro e separados do resto das tropas foram atacados de surpresa e dizimados pelas tropas imperiais comandadas pelo Cel. Francisco Pedro de Abreu (o Moringue), atravs de um conluio entre o baro (mais tarde duque) de Caxias e o gen. Canabarro para se livrarem dos negros em armas e poderem finalmente assinar a Paz de Ponche Verde. Traio de Porongos, que mais foi a matana de um s lado do que peleja, dispersou a principal fora republicana e manifestou morta a rebelio. () Em Porongos pois, a revoluo expirou. Foi da que seguiu-se o entabulamento das negociaes, que deram tranqilidade ao Rio Grande do Sul (ARARIPE, Tristo de Alencar. Guerra civil no Rio Grande Do Sul: memria acompanhada de documentos lida no Instituto Histrico Geogrfico do Brasil. Porto Alegre, CORAG, 1986, p.211).Caxias confiava no poder do ouro. Com poderes ilimitados e verbas considerveis para sobrepor-se aos obstculos pecunirios que surgissem ao negociar com os lderes farrapos, ele tentou um acordo com David Canabarro, o principal general farrapo, para terminar a guerra. De comum acordo decidiram destruir parte do exrcito de Canabarro, exatamente seus contingentes negros, numa batalha pr-arranjada, conhecida como Surpresa de Porongos em 14 de Novembro de 1844 (LEITMAN, Spencer. Negros Farrapos Idem p. 75)Em suas instrues secretas a Moringue, o comandante da operao, Caxias, orientou-o no sentido de poupar brancos e ndios, que poderiam ser teis para futuras lutas.Cpia integral dessas instrues secretas encontra-se no Arquivo Histrico do Rio Grande do Sul e nela est afirmado: Reservado: Senhor Cel. Francisco Pedro de Abreu () Regule V.S. suas marchas de maneira que no dia 14, s duas horas da madrugada possa atacar as foras ao mando de Canabarro que estar neste dia no cerro dos Porongos () Suas marchas devem ser o mais ocultas que possvel seja, inclinando-se sempre sobre a sua direita, pois posso afianar-lhe que Canabarro e Lucas ajustaram ter as suas observaes sobre o lado oposto. No conflito, poupe o sangue brasileiro o quanto puder, particularmente da gente branca da Provncia ou ndios, pois bem sabe que essa pobre gente ainda nos pode ser til no futuro. A relao justa das pessoas a quem deve dar escapula, se por casualidade carem prisioneiros. No receie a infantaria inimiga, pois ela h de receber ordem de um ministro de seu general em chefe para entregar o cartuchame sob o pretexto de desconfiarem dele. Se Canabarro ou Lucas forem prisioneiros, deve dar-lhes escapula de maneira que ningum possa nem levemente desconfiar, nem mesmo os outros que eles pedem que no sejam presos () 9 de novembro de 1844.Baro de Caxias [AHRS. Anais do Arquivo Histrico do Rio Grande do Sul-Volume 7. Porto Alegre, 1963. P.30/31].Canabarro cumpriu sua parte no combinado, deu ordem ao quartel-mestre para recolher o cartuchame de infantaria e carreg-lo em cargueiros para serem distribudos quando aparecesse o inimigo e separou os negros farrapos do resto da tropa. Isolados e desconhecendo a traio de seu comandante, os Lanceiros Negros resistiram bravamente antes de serem liquidados. O Combate de Porongos no qual oitenta, de cada cem mortos, eram negros abriu caminho para a Paz de Ponche Verde alguns meses depois.A indignao de Bento Gonalves com Canabarro revelada logo aps o combate de Porongos quando diz que os caminhos indispensveis por onde Canabarro tinha de avanar eram to visveis que s poderiam ser ignorados por quem no quisesse ver nem ouvir ou por quem quisesse ouvir a traidores, talvez comprados pelo inimigo! () Perder batalhas dos capites e ningum pode estar livre disto; mas dirigir uma massa e prepar-la para sofrer uma surpresa semelhante () () covardia do homem que assim se conduz. [Arquivo Histrico do Rio Grande do Sul. Coletnea de Documentos de Bento Gonalves da Silva. 1835/1845]Poucos dias depois, Teixeira Nunes e os Lanceiros Negros remanescentes so enviados por Canabarro para uma ao altamente temerria na retaguarda inimiga (sobre a qual pairam tambm suspeitas). Atacados por Chico Preto, so aniquilados e seu comandante ferido e depois assassinado.Tal como nos dias de hoje em que as autoridades do pas escondem seus crimes hediondos, alguns contra a humanidade, amparadas por leis fraudulentamente arrancadas de um congresso corrupto at a alma, como o caso dos crimes praticados pelas autoridades civil e militar durante o perodo 64/85, a Traio de Porongos permaneceu como um segredo guardado a sete chaves por muitos anos.Texto no assinado, publicado originalmente pelo CEBRASPO Centro Brasileiro de Solidariedade aos PovosFaltou fazer Justia ao comandante dos Lanceiros Negros, o tenente Teixeira Nunes, o Gavio. Depois do massacre de Porongos, Teixeira Nunes morreu no combate de Rosrio, em circunstncias no muito bem esclarecidas. J que, alm de chefe dos lanceiros, era defensor do negros e isso deve ter sido decisivo para a sua morte. Coloco isto sem muitas informaes a respeito daquela batalha, que deve ser mais investigada com muita ateno.