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    XIV CONGRESSO BRASILEIRO DE SOCIOLOGIA

    28 a 31 de julho de 2009, Rio de Janeiro (RJ)

    GT 22 - SOCIEDADE DA INFORMAÇÃO E SOCIEDADE DO CONHECIMENTO

    Jogos Eletrônicos (JEs) on-line:

    por uma hermenêutica da vivência de criatividade no ciberespaço

    Jonatas Ferreira (UFPE)

    Micheline Dayse Gomes Batista (UFPE)

    Josimar Jorge Ventura de Morais (UFPE)

    Adriana Tenório da Silva (UFPE)

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    Jogos Eletrônicos (JEs) on-line:

    por uma hermenêutica da vivência de criatividade no ciberespaço1

     Jonatas Ferreira, Micheline Dayse Gomes Batista, Josimar Jorge Ventura de Morais,

     Adriana Tenório da Silva

    A indústria de jogos eletrônicos (JEs) já fatura mais do que o cinema. Em 2008, a

    venda total de hardware, software e perif éricos de videogame chegou a US$ 22 bilhões,

    segundo dados da Entertainment Software Association (ESA). São jogos de aventuras, de

    lutas, de conquistas por territórios, como World of Warcraft ,  Ragnar ök , Tomb Raider ,Counter-Strike  e  EverQuest , só   para citar alguns. Há, ainda, os jogos que simulam a

    sociedade em que vivemos, como The Sims  e Second Life. No Brasil, de acordo com a

    Associação Brasileira das Desenvolvedoras de Jogos Eletrônicos (ABRAGAMES), o

    faturamento do setor (hardware  e software  para jogos eletrônicos) alcançou R$ 87,5

    milhões em 2008. Do outro lado do tabuleiro estão os usuários. Somente o World of

    Warcraft , da Blizzard Entertainment, possui uma base de mais de 11,5 milhões de

     jogadores. O Second Life, do Linden Lab, tem 16,7 milhões de “residentes”, sendo cerca de10% destes brasileiros.

    São números como esses que têm atraí do cada vez mais o interesse de

    pesquisadores. Apesar de existirem comercialmente desde os anos 1970 (AARSETH,

    2001), foi somente nos anos 2000 que os JEs começaram a despertar a atenção de

    estudiosos das mais diversas áreas – sociologia, antropologia, psicologia, comunicação,

    educação. “Jogos de computador são já um fenômeno de grande importância cultural, mais

    que filmes, ou talvez até mais do que esportes”, observa Aarseth (ibidem). Segundo o autor,os games, especialmente os multijogadores, combinam a estética e o social de uma maneira

    que a “velha mí dia”, como teatro, filmes, TV, shows e romances, nunca conseguiu. Para

    ele, as novas tecnologias – incluindo os jogos de computador – instigam novas maneiras de

    1 Nosso agradecimento a Jair Rocha (PIBIC) por ter participado ativamente das discussões que resultaramnesse artigo.

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    pensar e se comunicar. Poderí amos acrescentar: instigam novas vivências, no sentido

    hermenêutico deste termo.

    A literatura sociológica existente sobre jogos eletrônicos nos remete a temas como

    regras, aprendizagem, sociabilidade, interatividade  e imersã o, como podemos constatar

    numa apreciação rápida de artigos publicados em jornais como Game Studies (a partir de

    2001) ou na revista Games and Culture (a partir de 2006). Falemos um pouco acerca desses

    temas. No ocidente, os registros que atestam o significado do jogo na vida cultural das

    sociedades são inúmeros, basta que nos lembremos dos versos da  Ilí ada, ou da

    representação dessa atividade em diversas formas de manifestação artí stica ao longo da

    história. No canto XXIII da Ilí ada, jogo e ritual estão associados: é após sepultar o amigo

    Pátroclo que Aquiles propõe aos gregos uma série de jogos, de disputas em sua

    homenagem. E é nesse contexto de ações que deuses e mortais, destino e valor pessoal se

    misturam (estrofes 280 e seguintes). Desde a Grécia de Homero, o jogo é uma brincadeira,

    uma disputa com regras – sem cuja obediência não seria possí vel consagrar o valor pessoal.

    Para jogar, portanto, é  preciso aceitar as regras de forma voluntária. São as regras que

    determinam a qualidade da atuação do jogador em relação a si mesmo, ao jogo, aos demais

     jogadores, e a sua devida recompensa (Cf. MORTENSEN, 2002).

    Se o jogo, nesse contexto, é a vivência na qual se envolvem deuses e mortais, e

    nesse sentido ele apresenta um caráter religioso, ritualí stico, é de se esperar que, mudando o

    contexto cultural, variaria o tipo de encontro que a atividade lúdica propicia. Assim, para

    vários estudiosos, parece não haver dúvidas que na sociedade do conhecimento os JEs

    sejam ambientes de aprendizagem – essa ênfase cultural no aprendizado permanente e

    flexí vel os tornaria significativos em tal contexto. Sua utilização em salas de aula, ou de

    forma paradidática, seria uma manifestação clara dessa evidência. Nos Estados Unidos,

    desde 2005, é   realizada a conferência “Games Learning & Society”. Diversos autores

    defendem que os JEs, de forma lúdica, ajudam na fixação de conteúdos de história

    (SCHUT, 2007), lí ngua e literatura (HAYES e GAMES, 2008), e de disciplinas ligadas à 

    ciência, tecnologia, engenharia e matemática (DISALVO, CROWLEY e NORWOOD,

    2008). Steinkuehler (2008) trata os JEs como um “novo fenômeno” que pode ser utilizado

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    de forma transdisciplinar, sendo algo mais que uma TV com maior interatividade ou uma

    sala de aula “mais divertida”. Que elemento distintivo seria esse?

    A vivência do jogo estimula o desenvolvimento de habilidades e competências que

    podem ser úteis no dia a dia, como o raciocí nio rápido e a tomada de decisões em situações

    crí ticas. Nesse sentido, o jogo é  simulação da vida. Não apenas o jogador interfere na

    realidade do jogo – e o torna real, pois apenas quando é jogado o jogo passa a existir –, mas

    o jogo propicia ao praticante a oportunidade de repensar suas escolhas e estratégias de vida

    em um ambiente simulado. A todo momento, os jogadores são convidados a pensar em

    saí das criativas para problemas que vão aparecendo no decurso do jogo; frequentemente, no

    entanto, essas saí das interferem na própria vida do jogador. No caso dos JEs on-line, essa

    relação lúdica sugere a constituição de novos espaços e formas de sociabilidade.

    O jogo é um espaço de sociabilidade e, nesse sentido, ninguém joga sozinho. Para

    McLuhan (1990), os jogos nada mais são do que meios de comunicação interpessoal, pois

    pressupõem um diálogo, uma interação. Jogar significa “interjogar” – consigo mesmo, com

    o jogo e com os demais jogadores. Tanto os videogames quanto os computer games têm se

    destacado como um ponto de convergência e convivência. Aqueles que passam a conviver

    deste modo podem ser amigos, vizinhos, familiares ou podem estar distantes, um em cada

    canto do planeta, conectados pelos fios invisí veis das redes teleinformáticas. Essa interação

    extrapola o virtual e acaba movimentando, também, a vida off-line  dos jogadores, que

    passam a compartilhar uma linguagem própria, objetivos, hábitos de consumo e

    informações sobre assuntos convergentes, desde estratégias de “sobrevivência” até dicas de

    atualização tecnológica, como os melhores  joysticks ou as mais avançadas placas de

    aceleração gráfica.

    Segundo Santaella (2004), o que distinguiria o jogo eletrônico dos tradicionais

    seriam, antes de tudo, a interatividade e a imersão, ambos elementos intrí nsecos à 

    comunicação digital. “A interatividade não apenas como experiência ou agenciamento do

    interator, mas como possibilidade de co-criação de uma obra aberta e dinâmica, em que o

     jogo se reconstrói diferentemente a cada ato de jogar”. E se interatividade e imersão são

    obviamente elementos cruciais da vivência do jogo em qualquer época , podemos, por outro

    lado, seguir Santaella e afirmar que esses elementos ganham um sentido particular na

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    sociedade da informação. É   através da interatividade que o jogo, embora claramente

    definido, se torna imprevisí vel. Afirmar, portanto, que as regras são elementos de

    determinação das possibilidades do jogar não significa dizer que essas possibilidades sejam

    de nenhum modo fechadas. Afinal, a inteligência artificial vem sendo utilizada “para dar

    respostas diferenciadas a quem joga” (MENDES, 2006, p. 107), ou seja, com a inteligência

    artificial, o “roteiro” do jogo pode sofrer pequenas mudanças, no intuito de surpreender o

     jogador. Mesmo sem esse recurso, o jogo só  funciona enquanto permanecer aberto. E é 

    precisamente essa constatação que tem sido a base de formulação de jogos como os Role-

    Playing Games (RPGs)  on-line ou o Second Life. Quanto à   imersão, dirí amos que a

    indústria de jogos tem investido fortemente na produção de uma ambientação que

    compreende desde cenários tridimensionais com boa resolução gráfica até o uso de música

    incidental. As imagens gráficas muito bem detalhadas, sons potentes, cenários e

    personagens cada vez mais crí veis ajudam a manter o clima de envolvimento.

    Nos RPGs o convite à imersão total é  constante. Neles, os jogadores assumem o

    papel de personagens fictí cios, como se fossem heróis de filmes de aventuras. Eles aceitam

    missões e enfrentam desafios em um universo paralelo, mágico, repleto de referências

    mitológicas, interagindo com outros jogadores. Com o advento da Internet comercial, em

    meados da década de 1990, muitos RPGs, antes jogados apenas em tabuleiros, ganharam

    interface gráfica e passaram a ser jogados on-line. Nesse espaço, cada jogador ganha a

    forma de um avatar, sua representação gráfica em três dimensões (3D), de modo a poder

    agir, conversar, flertar e conduzir romances com outros personagens, constituir clãs com

    sua rede de relacionamentos on  ou off-line. “(No jogo) usuários podem concordar,

    discordar, trocar insultos, jogar com rivalidades do mundo real e explorar diversos tipos de

    diferenças pessoais, culturais ou nacionais. É   o real dentro do virtual”, observam

    Krzywinska e Lowood (2006), sobre o World of Warcraft .

    Muitos jogadores já   gastam mais tempo nesses “mundos sintéticos”

    (CASTRONOVA, 2003) do que em hobbies tradicionais e alguns pagam por esse direito,

    como é   o caso do  EverQuest . “Se esse modelo (de imersão em fantasia) persistir, os

    avanços da Era da Informação podem fazer com que o jogar seja um aspecto significante da

    vida de milhões de pessoas”. Em sua experiência lúdica os jogadores se desdobram entre

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    sua corporeidade concreta, histórica e sua projeção, na forma de um avatar, no mundo

    virtual. Estamos “aqui” e “lá” ao mesmo tempo, entidades materiais e virtuais, conectadas

    pelas tecnologias de informação e comunicação. “Envolvemo-nos tanto com as narrativas e

    os personagens que chegamos a suar, a ter taquicardia, ou simplesmente ficamos contentes

    ou frustrados”, observa Mendes (2006, p. 17).

    Essa imersão pode ser tão intensa que se torne dif í cil estabelecer uma diferenciação

    clara entre jogo e realidade. Se um dos prazeres centrais do jogo é oscilar entre ficção e

    realidade, há sempre o risco de que o jogador se perca no jogo. E aqui surge a voz dos

    crí ticos dos JEs, para quem esses artefatos podem isolar os jogadores em um mundo que se

    imagina descolado da realidade. A mí dia tem explorado essa possibilidade. Alguns estudos,

    no entanto, mostram o contrário. Jogar é sempre uma experiência social (ver WRIGHT, T.;

    E. BORIA e P. BREIDENBACH, 2002), mesmo quando o jogador ignora uma regra

    fundamental do jogo, ou seja, esquece de reestabelecer a linha que separa ficção e

    realidade. Publicações, como o levantamento realizado pelo Pew Internet & American Life

    Project, apontam ainda uma relação entre jogo e comprometimento cí vico. Essa relação é 

    mais intensa entre aqueles jogadores que costumam participar de f óruns de discussão e de

    comunidades virtuais sobre jogos. De acordo com a pesquisa, 97% dos adolescentes norte-

    americanos, com idade entre 12 e 17 anos, jogam em computadores, portáteis, consoles ou

    pela Web. No Brasil esses números não são conhecidos, mas imagina-se que também sejam

    bastante significativos. Simkins e Steinkuehler (2008) afirmam que os jogos, especialmente

    os RPGs, podem gerar sentimentos de empatia, tolerância e compreensão. “Games são um

    ambiente promissor para o desenvolvimento da crí tica e de habilidades éticas, componente

    fundamental no desenvolvimento de uma cidadania capaz de garantir uma participação

    plena em uma sociedade cosmopolita e democrática”.

    Retomemos alguns pontos: i. jogar é  uma experiência social; ii. essa experiência

    brinca com as fronteiras entre o fictí cio e o real; iii. uma regra fundamental do jogo é que o

     jogador, em algum momento, deve retornar ao real, reestabelecendo a fronteira entre ficção

    e realidade. Nem sempre, todavia, isso ocorre. Ficou famoso no Brasil o caso do estudante

    de medicina que em 1999 matou três pessoas e feriu outras quatro durante uma sessão do

    filme “Clube da Luta” em um cinema de São Paulo. Em depoimento, ele teria citado o jogo

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     Duke Nukem 3D, em cuja primeira fase o jogador precisa matar aliení genas em um cinema,

    como justificativa de seu ato2. Em um jogo em que nos envolvamos com um grupo de

    contrabandistas poderí amos tanto nos motivar com a possibilidade de assaltar um banco

    real, como com a experiência de trabalho coletivo. É possí vel que o jogador se perca no

     jogo, já o dissemos, mas quando isso acontece também o jogo está perdido.

    Ora, essas observações parciais nos levam a inferir acerca da necessidade de pensar

    os JEs de forma mais sistemática. É evidente que delinear e discutir alguns de seus traços

    mais destacados, tais como interatividade, imersão, aprendizagem, e trabalhar

    empiricamente esses elementos é algo de grande importância. Acreditamos, entretanto, que

    a tentativa de entender o caráter social dos JEs, a afinidade eletiva que haveria entre a

    forma de conhecimento a que eles dão acesso e o próprio caráter móvel, transitório, da

    sociedade da informação e do conhecimento, por exemplo, demandam um esforço teórico

    preliminar. O que é o jogo e como a essência do jogo se relaciona com o conhecimento?

    Lancemos uma primeira hipótese: se a objetividade e a clara delimitação do conhecimento

    cientí fico constituí ram um paradigma da sociedade industrial (sua ênfase no controle,

    contabilização e mensuração precisa da realidade foram parte da cultura industrial), essa

    forma de conhecimento já   não pode mais ser eleita como paradigma de nossos

    envolvimentos técnicos com a vida cotidiana. Nossos envolvimentos econômicos,

    ambientais, culturais etc. colocam já em perspectiva uma demarcação objetiva, precisa de

    um mundo inflexí vel em sua mutabilidade. O jogo, ou seja, a atuação aberta, sem limites

    claros em um contexto claramente delimitado por regras parece falar mais dessa realidade –

    e talvez por isso mesmo experienciemos esse interesse crescente por atividades lúdicas.

    Nossa hipótese de partida, entretanto, ainda dissimula algo que merece atenção e

    investimento teórico, nomeadamente, uma resposta à questão: o que é o jogo? O ensaio que

    se segue pretende contribuir para uma reflexão acerca dos JEs na contemporaneidade a

    partir dessa pergunta primeira. Para isso, oferecemos uma interpretação hermenêutica do

     jogar.

    As vantagens teóricas desse tipo de abordagem parecem claras. A hermenêutica

    cientí fica constituiu-se historicamente como terreno alternativo à   idéia de uma ciência

    2 Após a ampla divulgação desse episódio pela mí dia, o jogo foi retirado de circulação.

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    legitimada pelos valores “objetividade”, “cálculo”, “fixação do conhecimento em leis

    gerais” etc. Em contraposição ao uso desse tipo de concepção para o estudo de realidades

    históricas, sociais, humanas, a hermenêutica propunha uma forma de conhecimento baseada

    na vivência, na busca por uma compreensão endopática dos sentimentos, valores,

    experiência de vida de determinados personagens e obras históricos. E se a própria idéia de

    hermenêutica variou muito ao longo dos últimos cento e cinquenta anos, o desejo de

    oferecer um campo de conhecimento sistemático e não positivista às ciências sociais não

    mudou. Interessa-nos aqui particuarmente o fato de ter sido possí vel a Hans-Georg

    Gadamer identificar o  jogo como a essência do conhecimento hermenêutico.

    Aproveitaremos esse insight   de uma forma especí fica, qual seja, percebendo na

    hermenêutica gadameriana a oportunidade de pensar o jogo e seu significado na sociedade

    contemporânea.

    O texto que se segue está organizado da seguinte forma: num primeiro momento

    discutiremos as concepções teóricas do jogo nas obras de Norbert Elias, Harold Garfinkel e

    Gadamer – privilegiando, como já afirmamos, a interpretação hermenêutica do jogo; num

    segundo momento, procuraremos avaliar a aplicabilidade do modelo de exegese

    gadameriana para analisar dois JEs, nomeadamente, o Second Lif e e o  Ragnar ök . E

    finalmente, reservaremos um espaço para as conclusões.

    Reflexões teóricas sobre o jogo

     Elias e Garfinkel jogando no mesmo time

    Para entendermos a contribuição de Elias no que concerne ao jogo, partimos da

    seguinte pergunta: o que é  a sociedade para este autor? Para ele, na verdade, pode-se

    compreender os indiví duos em sociedade como enredados em uma teia infinita, móvel e

    dinâmica (Cf. ELIAS, 1994, p. 22), cuja figuração muda a todo instante, pois que resulta da

    interdependência entre esses mesmos indiví duos. Essa interdependência não se refere

    somente a uma relação entre dois indiví duos, mas também à mirí ade de múltiplas relações

    em que dois indiví duos estão envolvidos. Essas relações são dinâmicas. As interações entre

    os indiví duos A e B são perpassadas por outros (C, D, E etc), que por sua vez se relacionam

    com ainda outros indiví duos (F, G, H etc). Donde se depreende que ninguém consegue

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    controlar e planejar este fluxo contí nuo e dinâmico que afeta a todos nós. Porém, há de se

    ficar atento para o fato de que Elias não concede autonomia a estas redes, à   moda

    estruturalista.

    Para os propósitos desse trabalho, cabe enfatizar um outro ponto na concepção de

    sociedade de Elias. Ela é   caracterizada por duas qualidades:  firmeza e elasticidade. As

    pessoas têm poder de decisão e constantemente tomam decisões, que terminam por afetar o

    grau de tensão dos fios que os ligam a outros, e vice-versa (a parte elástica). Por outro lado,

    essas decisões não são em si mesmas fruto de decisões absolutamente livres e individuais

    em sentido restrito, mas são decisões que dependem do grau de tensão dos fios que unem os

    diversos indiví duos (a parte firme) (Cf. ELIAS, 1994, p. 48-49).

    Consideremos agora um segundo eixo teórico. Norbert Elias propõe que, quando

    vemos um jogo, estamos observando “pequenos grupos de seres humanos que mudam suas

    relações em constante interdependência uns com os outros” (ELIAS & DUNNING, 1995,

    p. 233). Esta constante interdependência – o fato de que a localização dinâmica de cada

     jogador durante uma partida é uma espécie de reação à movimentação não somente de um

    ou outro jogador adversário, mas de toda a equipe adversária – é o que caracteriza, para

    Elias, a  figuraçã o de cada jogo. Em outras palavras, não é apenas a disposição de uma

    equipe em campo, mas o arranjo, mais ou menos estável, gerado pelas sucessivas e mútuas

    ações e reações de ambos os lados, que define o que ele chama de figuração (Cf. ELIAS in

    ELIAS & DUNNING, 1995).

    A dinâmica do agrupamento e reagrupamento dos jogadores durante o jogo é, em

    consonância com sua concepção de sociedade, fixa em alguns aspectos e elástica e variável

    em outros. A dimensão fixa e comum permite que o jogo seja jogado como tal e não como

    uma disputa generalizada, sem objetivos e desregulada. E ela é variável porque cada jogo é 

    diferente do outro, o que é da natureza da própria definição do jogo. Em um jogo, deve

    estabelecer-se um equilí brio situado em um intervalo de graus ótimos de rigidez e de

    elasticidade das regras. Deste equilí brio resultaria a dinâmica do jogo. Regras muito

    rí gidas, ou muito flexí veis, afetarão diretamente os padrões do jogo. Adicione-se a isso o

    fato de que Elias entende que, sem regras, todos os jogos esportivos não teriam se

    constituí do ou mesmo mantido sua identidade (Cf. ELIAS in ELIAS & DUNNING, 1995,

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    p. 232). Vale também ressaltar que, para Elias, a elasticidade das regras tem um significado

    bastante importante para este trabalho: nenhuma regra, por mais precisa e formalizada, é 

    fechada. Isto significa dizer que a contingência é  parte da própria definição do jogo.

    Podemos, então, assumir que o que caracterizaria a elaboração de Elias sobre o jogo é a

    observância de uma tensão e interação produtivas entre estrutura e agência.

    De uma perspectiva mais microssociológica, temos a contribuição de Garfinkel.

    Antes de publicar os famosos Studies in Ethnomethodology  (2008), em 1967, Garfinkel

    escreveu um artigo seminal (1963) onde descreve uma série de experimentos em que alguns

    de seus estudantes “quebram” certas regras do jogo-da-velha e avaliam as reações dos seus

    adversários. Destes experimentos, ele inferiu uma série de formulações teóricas que ajudam

    a entender o comportamento de atores sociais não somente em situação de jogo, mas

    também em situações mais prosaicas da vida cotidiana. De acordo com Garfinkel (2008

    [1967]), que, por sua vez, se baseia na contribuição teórica de Alfred Schutz, a vida social

    só  é  possí vel por que os atores sociais compartilham, em certa medida, um conjunto de

    expectativas comuns. Quando estas expectativas são ‘quebradas’ (Cf. GARFINKEL, 2008

    [1967], p. 37), os atores tendem a reagir com indignação, o que subentende uma visão

    moral que apoia o comportamento cotidiano dos indiví duos, já   que, de acordo com

    Garfinkel (1963, p. 188), eles vêem os eventos cotidianos como necessários “de acordo

    com uma ordem natural ou moral” (grifo nosso).

    Porém, a contribuição da etnometodologia garfinkeliana é  melhor explicitada na

    contribuição de Francis Kew, que, em uma série de artigos seminais sobre jogos (1986,

    1987, 1990 e 1992), estabeleceu uma ligação entre a sociologia figuracional e a

    etnometodologia que ajuda a tratar das questões colocadas mais acima. Para Kew, um fato

    mais interessante do que a mera quebra ou perturbação da ordem social é o “trabalho de

    reparação” ou “gestão da incongruência” pelos sujeitos. Isto é, as pessoas “tentam

    interpretar as súbitas” mudanças “através da tentativa de compatibilizá-las com sua própria

    visão dos ‘fatos naturais da vida diária’ e, a partir daí , re-impor ordem na interação” (1986,

    p. 306). O que significa dizer que a ordem social não é   dada, mas, sim, alcançada

    (construí da).

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    Este é  um ponto muito interessante, pois tanto em Elias, como já  vimos acima,

    quanto na etnometodologia, todas as regras, mesmo as mais formalizadas, como as regras

    do futebol, carregam uma margem de incompletude (Cf. KEW, 1990, p. 253;

    GARFINKEL, 2008 [1967], p. 21). Em outras palavras, nenhuma regra ou lei é bastante

    “fechada” ou completa de forma a cobrir todas as possibilidades da ação humana. No que

    se refere ao futebol, por exemplo, podemos tomar emprestadas suas palavras e afirmar que

    “suas situações de jogo são situações de informação imperfeita; um presente estado de jogo

    pode ser alterado por uma jogada qualquer” (GARFINKEL, 1963, p. 193). Neste mesmo

    sentido, Garfinkel ainda afirma que:

    As regras básicas de um jogo servem a cada jogador como um esquema parareconhecimento e interpretação do comportamento dos outros jogadores,

    assim como do seu próprio, como eventos de um jogo. As regras básicas deum jogo definem as situações e as formas normais de jogar para as pessoasque procuram agir de acordo com elas (1963, p.190).

    O futebol, assim como o basquetebol, é  um tipo de jogo de invasão, ou seja, é 

    disputado em todos os espaços pelos competidores dos dois times, diferentemente, por

    exemplo, do vôlei e do tênis. Assim, justamente “por causa da elasticidade das regras, os

    legisladores não podem antecipar de forma precisa as consequências de sua ação legislativa

    porque muitas regras permitem múltiplas interpretações em termos de possibilidades de

    ação” (KEW, 1990, p. 253). E é precisamente esta flexibilidade das regras que caracteriza a

    imprevisibilidade do resultado dos jogos. Se fosse de outra maneira, o jogo se tornaria

    muito previsí vel e, provavelmente, perderia em termos de interesse (Cf. KEW, 1990, p.

    259). Podemos dizer que já   a partir dos dois referenciais teóricos acima, o jogo busca

    simular a vida no que ela apresenta de rigidez e elasticidade, regra e contingência.

    Gadamer: o jogo como verdade

    Em um famoso argumento, Hans-Georg Gadamer afirma que a arte ofereceria à 

    hermenêutica um paradigma de acesso e de vivência da verdade que pouca relação teria

    com as preocupações metodológicas mediante as quais a ciência moderna propunha o

    controle técnico do mundo – o método cientí fico reduziria a verdade ao poder, ao controle

    sobre as coisas. Mas dizer arte é dizer algo demasiadamente vago. A primeira tarefa que o

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    Verdade e M é todo apresenta ao seu leitor, portanto, é livrar a hermenêutica de uma idéia

    particular de arte, idéia que influenciou a própria emergência da hermenêutica moderna –

    tal como ela é elaborada na obra de Schleiermacher e Dilthey, por exemplo. Essa idéia é a

    de que o “fenômeno estético”, isto é, a vivência artí stica, seria algo que se desenvolve na

    consciência dos sujeitos.

    Ora, sabemos que, seguindo Heidegger, Gadamer suspeita dos conceitos polares

    “sujeito e objeto”, os quais constituiriam í ndices da forma técnica mediante a qual a ciência

    propôs um controle metódico, racional do mundo. Dizer “sujeito” ou “objeto” é  aceitar

    tacitamente o projeto positivista de dominação técnica sobre o mundo – é assumir que a

    objetividade do mundo seja í ndice de sua controlabilidade, mas também que o próprio

    sujeito deveria se conhecer objetiva e positivamente para garantir para si tal controle. O

    “subjetivismo kantiano” e sua implicação na apreciação da arte são considerados, por isso

    mesmo, os inimigos a serem superados e a Cr í tica do Julgamento – como condensação

    desses problemas – seria um sortilégio perigoso. A argumentação kantiana sobre o belo, tal

    como a encontramos na famosa terceira Cr í tica, obscureceria aquilo que a arte ofereceria de

    mais verdadeiro: um acesso à verdade em que a busca de certificação técnica do sujeito não

    seria fundamental. Gadamer precisava então de uma categoria que não fizesse concessões a

    nenhum dos polos do projeto moderno de dominação técnica – algo que nã o pudesse ser

    compreendido nem como subjetivo nem como objetivo – e que ainda afirmasse a arte como

    verdade mais profunda do ser humano.

    Esse algo é   a idéia de jogo, a quintessência da noção gadameriana da vivência

    artí stica. É claro que sempre podemos realizar uma apreciação subjetiva do ato de jogar.

    Podemos, por exemplo, perguntar: ora, qual o prazer que Fulano tem em passar suas noites

     jogando World of Warcraft , ou SimCity, ou  RPG  na Internet, ou Second Life? O que o

    mobiliza, que valores ele atribui a essa atividade etc. etc.? Muitas interpretações do jogo em

    geral, e dos JEs, em particular, privilegiam essa abordagem. É possí vel também analisar os

    aspectos "objetivos" que cada um desses jogos materializaria: interesses econômicos

    subjacentes ao conteúdo dos jogos, regras etc. Mas a “essência” do jogo não se encontra em

    nenhum desses lugares. O jogo nã o é  objetivo nem subjetivo; o jogo nã o é  determinado,

    nem indeterminado. Aceitemos por enquanto essa circunscrição negativa do sentido do

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     jogo, mas avancemos em direção a algo positivo: a compreensã o do jogo só é  possí vel

    mediante a vivência do pr ó prio ato de jogar . O tipo de conhecimento que o jogo propicia,

    por isso mesmo, apresenta uma relevância hermenêutica evidente.  Ele nã o impõe a

    dist ância, mas procura e privilegia a proximidade; nã o busca oferecer a generalidade das

    abstrações, mas est á umbilicalmente relacionado à vivência; ele nã o se busca se afirmar

    como transcendente, mas como corporificado, hist órico.

    O lúdico no jogo é algo que mobiliza o ser humano, antes de ser mobilizado por

    qualquer sujeito ou se tornar algo objetivo: “O modo de ser do jogo não permite que quem

     joga se comporte em relação ao jogo como em relação a um objeto” (GADAMER, 2002, p.

    175). Só existe jogo onde existe envolvimento, e esse envolvimento, evidentemente, não

    pode ser entendido a partir de uma perspectiva distanciada, como algo objetivo. O jogo,

    como essência da arte, pressuporia uma forma de conhecimento em que estamos envolvidos

    de um modo duplo: emocionalmente envolvidos, envolvidos porque o jogo falaria da

    verdade profunda dos seres humanos. Esse conhecimento que se estrutura a partir dessa

    dupla imersão é na verdade uma das primeiras contribuições da hermenêutica moderna às

    ciências humanas – a marca de sua estratégia não positivista para lidar com o conhecimento

    e a verdade. “A estrutura de ordenação do jogo faz com que o jogador desabroche em si

    mesmo e, ao mesmo tempo, tira-lhe, com isso, a tarefa da iniciativa, que perfaz o

    verdadeiro esforço da existência” (GADAMER, 2002, p. 179). O jogo anuncia uma

    existência “sem finalidade” ou “intenção”. E essa existência sem finalidade ou intenção

    seria próprio do ser humano, mas também da natureza, segundo argumenta Gadamer –

    seguindo nesse ponto a idéia kantiana de natureza.

    Diferentemente do mundo em que vivemos, todavia, o jogo implica uma

    “configuração” fechada e ilimitada de possibilidades. Como entender esse aparente

    paradoxo? Só existe a possibilidade de jogo, já o disse Simmel, no limite entre a liberdade

    do jogador – que as possibilidades de jogar estejam indeterminadas – e, ao mesmo tempo,

    as restrições fechadas de uma configuração. “Só se pode jogar com sérias possibilidades.

    Isso significa, evidentemente, que somente confiamos nelas na medida em que elas podem

    dominar alguém e se impor. O atrativo que o jogo exerce sobre o jogador reside exatamente

    nesse risco” (p. 181). Se o jogador evita esse risco, ou seja, o risco de enfrentar o

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    indeterminado nos limites de um certo conjunto de restrições, ele estará “perdido” como tal.

    Por mais eficiente que seja o jogador, o jogo deixa de existir se a indeterminação do jogar

    não implicar na possibilidade de risco – e, portanto, na impossibilidade de um controle

    técnico total sobre a configuração do jogo. “Todo jogar é  um ser-jogado. O atrativo do

     jogo, a fascinação que ele exerce, reside justamente no fato de que o jogo se assenhora do

     jogador” (Ibid., p.181).

    De certo modo, é possí vel dizer que, para Gadamer, no fundo de todo jogo existe a

    possibilidade última de que o jogador se converta no personagem Alexei Ivanovich, do

    romance de Dostoievski, no Mattia Pascal, de Pirandelo, ou no Narumov de Puchkin, e

    tantos outros. Ou seja, para ele está sempre aberta a possibilidade de que o jogo seja maior

    que o jogador: “o entregar-se à tarefa do jogo é, na verdade, um colocar-se em jogo”. Ao

    racionarmos dessa forma, porém, não podemos esquecer que apenas quando é   jogado o

     jogo se realiza, pois ele é essência em meio às contingências da vivência do jogar. Nesse

    ponto, começam a ficar mais claras as implicações existenciais da relação jogo-arte-verdade

    de que nos fala Gadamer.

    Da mesma maneira, quem consegue ver o conjunto da realidade como um

    cí rculo de sentido fechado, no qual tudo se plenifica, falará propriamente dacomédia e da tragédia da vida. Nesses casos em que a realidade é entendidacomo jogo, sobressai o que é a realidade do jogo, que caracterizamos como

     jogo da arte. O ser de todo jogo é sempre resgate, pura realização, energeia,que traz seu telos em si mesmo. (p. 190)

    O prazer psicológico do jogo, e Gadamer está longe de se interessar por esse aspecto

    mais psicológico, radicaria precisamente em fugir da possibilidade de pensar o real, como

    algo desprovido de sentido, algo inacessí vel ao conhecimento, ou, mais precisamente, algo

    angustiante em sua abertura infinita. O jogo abre a possibilidade de que o mundo seja

    compreensí vel. Procurar sentido no mundo que nos cerca é  um impulso existencial e

    primordial mediante o qual procuramos escapar da absoluta contingência das coisas. Ao

    oferecer um “cí rculo de sentido fechado”, o jogo nos retira do risco absoluto e nos abre a

    possibilidade de conhecimento. O jogo e o culto, não fortuitamente, aparecem na

    argumentação de Gadamer como fenômenos próximos. Ambos respondem a essa

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    inquietação fundamental, como talvez as referências feitas à   Ilí ada no começo deste texto

    ajudem a perceber.

    Com relação à busca pelo cí rculo de sentido do real, poderí amos dizer que o que nos

    impele é o desejo de afirmar: “é assim mesmo” (GADAMER, 2002, p. 190). O prazer do

     jogo é  de certo modo a possibilidade ontológica do conhecimento. Diria que o jogo é 

    prazeroso porque nele a contingência pode sempre ser remetida a algo essencial e

    reconhecí vel: “é  assim mesmo”. Não há em tal remissão algum tipo de subsunção do que é 

    contingente ao que é essencial, mas a identificação do prazer de encontrar no “vai-e-vem”

    que o jogo proporciona: brincando entre esses extremos, ou seja, contingência e essência,

    criatividade e regra, com a possibilidade do sentido. Esse sentido, é preciso ser dito, não é 

    algo que se coloque fora desse “movimento de vai-e-vem”. Ele não transcende de forma

    alguma o próprio jogar, mas lhe é imanente. “O ser de todo jogo é sempre resgate, pura

    realização, energeia, que traz seu telos em si mesmo”.

    A relação entre jogar e conhecer, para Gadamer, leva necessariamente à idéia de

    representação. Mas representar aqui não significa re-apresentar o real mediante um

    conceito, mas o ato pelo qual o jogador, a criança, o ator submergem no seu “papel”.

    Representar significa imitar, mas o próprio ato de imitar, reproduzir, deve ser aqui

    precisado, delimitado. Platão acreditava que toda imitação significaria um afastamento da

    essência das coisas, de seu conceito ideal. Para Gadamer, por outro lado, “O sentido do

    conhecimento da mimesis é   reconhecimento”. Mediante a imitação, a representação, o

     jogador, o ator, a criança já realizam o ato fundamental de atribuir um circuito de sentido ao

    real. Não há imitação que já não seja um processo de interpretação: ao distinguir o que é 

    importante do que é acessório, por exemplo. No ato de representar, nesse ato fundamental

    ao jogo, o humano se reconhece. “A imitação e a representação não são apenas uma

    repetição figurativa, mas conhecimento da natureza” (p. 193). Anterior a uma distinção

    entre subjetividade e objetividade, atividade e passividade, realiza-se para Gadamer o jogo.

    Assim, parece claro que a apropriação dos conceitos de representação, de mimesis

    tem um sentido claro: oferecer uma idéia de conhecimento e de verdade que se diferencie

    do caminho oferecido pela razão cientí fica, instrumental. Trata-se de resgatar como

    contribuição fundamental da hermenêutica uma dimensão artí stica, lúdica, do conhecer e do

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    postar-se na verdade do mundo. Diria que o que importa aqui é encontrar um caminho para

    a interpretação do mundo que não seja transcendente, que não busque uma verdade acima

    da contingência; e que, por outro lado, não venha a sucumbir de relativismo. O jogo, para

    Gadamer, já o dissemos, é a possibilidade de brincar entre a continência, a transitoriedade

    do mundo, e a busca de um sentido essencial.

    Afirmamos que para Gadamer a essência da arte seria o jogo. Gostaí amos agora de

    explorar o inverso dessa proposição, ou seja, gostarí amos de perguntar em que medida

    poderí amos encontrar no jogo essa possibilidade de conhecimento e de verdade que

    encontramos na arte. Dito de outra forma: em que medida o jogo diz respeito a uma forma

    alternativa de conhecer o mundo, ou seja, uma forma distinta da razão instrumental, de sua

    busca de controle e transcendência. Não acreditamos ser fortuito o fato de o jogo

    desempenhar um papel tão importante nas sociedades contemporâneas, precisamente agora

    em que uma sensibilidade mais “estética”, diante de um mundo mais fluido e mais

    descrente das promessas da razão técnica e cientí fica, parece envolver nossa vida. No jogo,

    a contingência não nos esmaga, pois ele abre-se sempre como promessa de que possamos

    encontrar o sentido das coisas. É claro que esse raciocí nio é de certo modo uma traição à 

    intenção inicial de Gadamer. A arte era ali uma alternativa ao pensar instrumental e técnico.

    Segundo a hipótese que agora oferecemos, arte e jogo podem ser capturados pela dinâmica

    técnica. Assim é   que podemos falar da bilionária indústria de jogos eletrônicos. Mas

    certamente poderemos voltar aos jogos ali produzidos e tentar entender seu sentido cultural

    particular – que não se submete completamente à   lógica econômica daquela indústria.

    Passemos agora a ilustrar empiricamente o que viemos construindo do ponto de vista

    teórico.

    Second Life: a experiência de viver uma segunda vida na Internet 

    Dentre os JEs on-line mais populares está o Second Life (SL)3. Trata-se de um jogo

    diferente, sem objetivos pré-definidos, etapas ou missões a cumprir. O “objetivo”, se é que

    existe um no sentido estrito do termo, vai sendo construí do ao longo do jogar. Enquanto

    que na maioria dos JEs o objetivo é conquistar determinado território ou derrotar inimigos,

    3 Jogo de simulação em 3D criado pelo norte-americano Philip Rosedale e lançado em 2003 pela Linden Lab.

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    o “desafio” do SL é  simular uma segunda vida no ciberespaço – e a vida é  aberta com

    relação a 'objetivos'. Para jogar, basta fazer um cadastro no site  oficial do jogo

    (www.secondlife.com), baixar e instalar o software. Para rodá-lo, é   necessário um

    computador potente conectado à Internet em banda larga e equipado com uma boa placa de

    aceleração gráfica. O passo seguinte é criar um avatar –  a representação gráfica em 3D do

     jogador – e começar a “viver”.

    Costuma-se “entrar” no SL por “curiosidade”, porque “se ouviu falar”. Uns buscam

    “apenas diversão”; outros querem “conhecer pessoas”. Como nos comunicadores

    instantâneos ( MSN , GTalk  etc), a interação entre os jogadores acontece por mensagens de

    texto ou voz. Mas o SL não é somente isso. Na verdade, lá estão simulados praticamente

    todos os ingredientes da vida real e é isso que estimula a brincadeira. Viver uma “segunda

    vida” na Internet exige criatividade e a condução do jogo, por ser aberto, depende apenas

    da vontade do jogador. E o avatar, seu duplo no jogo, transforma-se em um vetor de novas

    vivências. Não apenas pela condição de poder “ver”, “se ver” e “ser visto” por outros

     jogadores, mas, sobretudo, pela possibilidade de obter conhecimentos de um modo não-

    cartesiano, ou seja, pela possibilidade de acesso a novos conteúdos mediante a imersã o, a

    compartilha de um pathos, e não pelo distanciamento , pelo supressão da emoção.

    Como seria, por exemplo, poder deslocar-se de um canto a outro do globo em

    questão de segundos? No SL, isso é possí vel através do teleporte. Um mecanismo de busca,

    baseado em palavras-chaves, ajuda o usuário a decidir onde ir. Os pedaços de terra são as

    “ilhas”, espaços geográficos onde são construí dos os cenários desse mundo virtual, fiéis ou

    não aos existentes no mundo real. São avenidas, shoppings, monumentos, paisagens. Cada

    local visitado pode significar uma experiência diferente. Uma das “ilhas” brasileiras, com

    grande tráfego de avatares, é uma reprodução da praia de Copacabana (RJ). Quem nunca

    foi ao Rio, ou nunca frequentou uma praia, pode experimentar passear pelo famoso

    calçadão, vestir um biquí ni ou sunga e ficar tomando sol na areia. Ou dar um mergulho. Na

    Ilha Recife Digital, pode-se apreciar a reprodução em 3D da Torre de Cristal, escultura do

    artista plástico Francisco Brennand criada sobre um arrecife. Visitar o Taj Mahal ou, ainda,

    meditar em uma mesquita, dançar em uma boate na Holanda. São todas vivências possí veis

    dentro do jogo.

    http://www.secondlife.com/http://www.secondlife.com/

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    Nesse ambiente simulado, cada jogador pode brincar de ser quem quiser, “viver” da

    forma que imaginar, contanto que observe as regras do jogo. A esse respeito, ressaltemos

    que cada ilha costuma ter suas próprias regras, não havendo restrições amplas nesse sentido

    por parte dos criadores do SL. Em algumas é proibido circular sem roupas – para tanto

    existem as “ilhas” de nudismo -; noutras, é proibido o porte de armas e assim por diante. As

    experimentações identitárias que o SL propicia, através da construção e edição do avatar,

    passam por nuanças de gênero, raça, cor. O jogo oferece inúmeras opções de formas

    corporais, peles e controles deslizantes para que o usuário possa customizar infinitamente

    elementos como nariz, boca, queixo, olhos. Os itens armazenados no “inventário” dão ao

     jogador a opção de fazer sucessivos upgrades, simulando uma aparência diferente sempre

    que desejar. Um brasileiro pode, por exemplo, adotar uma identidade oriental em

    determinado momento do jogo. Essa será a sua verdade, mesmo que transitória, posto que

    estará emocionalmente envolvido com aquele personagem.

    As experimentações identitárias propiciadas pelo SL e a possibilidade de circular

    por ambientes simulados funcionam como um convite à imersão no ciberespaço. Tema que

    vem sendo abordado por vários autores, seja de forma consensual ou controversa, como um

    dos fenômenos da sociedade da informação em que vivemos (ver CASTELLS, 1999 e

    2003; LEMOS, 2004; LEVY, 1999). Assim, é possí vel afirmar com Le Breton (2003, p.

    146): “O espaço cibernético é uma ferramenta de multiplicação de si” (p. 146), através da

    qual o indiví duo pode penetrar em mundos imaginários, viver aventuras, construir e

    dialogar, de formas “não mais sujeitas ao princí pio de realidade, mas inteiramente sob a

    égide do prazer e do imaginário”.

    Nesse sentido, podemos inferir que a vivência nos JEs on-line é inteiramente guiada

    pela imaginação e pelo prazer de brincar. Uma jogadora portuguesa de 31 anos, cujo avatar

    responde pelo nome de Misshotchilli Karu, ou simplesmente Miss, nos relatou que encara o

     jogo como uma brincadeira de bonecas, na medida em que pode modificar seu avatar

    sempre que deseja.

    No SL eu mudo sempre que me apetece. É como se f ôssemos crianças epudéssemos mudar a nossa boneca! Por outro lado, podemos conheceroutras pessoas diferentes, outras culturas, fazer amigos.

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    A experiência dessa jogadora sugere que o SL é, de fato, um campo aberto a

    experiências que acabam retornando para o jogador na forma de aprendizado. Como

    dissemos, não apenas o jogador interfere na realidade do jogo, mas o jogo propicia ao

    praticante a oportunidade de repensar suas escolhas e estratégias de vida em um ambiente

    simulado. Miss não esconde que planeja fazer, nas costas, a mesma tatuagem com pegadas

    de um felino que seu avatar exibe nos seios. “A tatuagem que ela tem no peito, estou

    desejosa de fazer uma igual”. Significa que para ela, de uma forma ou de outra, o transporte

    de uma caracterí stica do avatar para seu mundo off-line poderá fazer alguma diferença.

    De acordo com Santaella (2003), quando da incorporação de um avatar por um

     jogador, “produz-se uma duplicação na sua identidade, uma hesitação entre presença e

    ausência, estar e não estar, ser e não ser, certeza e fingimento, aqui e lá” (p. 203). Não há 

    como não dizer que um jogador que se apaixona, casa e tem filhos em um JE acaba

    trazendo algum elemento, positivo ou negativo, dessa experiência para o seu dia a dia. Uma

    coisa é certa: nem todos conseguem emergir intactos. “Casais virtuais”, inclusive, chegam a

    se relacionar na vida real e alguns decidem também trocar alianças fora da brincadeira.

    Alguns jogadores, percebendo a abertura existente no SL, optam por explorar o lado

    utilitário do jogo, “encarnando” empresários, vendedores, corretores de imóveis,

    seguranças e até DJs. O dinheiro virtual obtido com essas atividades pode ser convertido

    em dinheiro real e vice-versa, uma vez que há  a possibilidade da compra de lindens  (a

    moeda do SL) através de cartões de crédito. Empresas também têm utilizado o jogo como

    espaço para reuniões virtuais, no lugar da tradicional videoconferência. Explorando ainda o

    aspecto instrumental do SL, há  instituições educacionais, a exemplo da Universidade de

    Oxford, realizando experiências de ensino à  distância. Mais uma vez, a fronteira entre

    ficção e realidade parece tênue, quase apagada. Entretanto, é nesse vai-e-vem, nesse aqui e

    lá, que o jogador vai construindo sua vivência, não só na “segunda vida”, mas, sobretudo,

    em sua vida real.

     Dando vida a personagens: da criaçã o à experiência em um jogo de RPG on-line

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    O  RPG é um jogo no qual o jogador deve criar um avatar e com ele vivenciar as

    diversas possibilidades de ação existentes no ambiente do jogo. Comprar e vender bens,

    conhecer outros e com eles interagir, vivenciar aventuras ou cumprir objetivos a ele

    estabelecidos, são ações às quais se dedica o jogador por meio do seu avatar. Com a

    Internet comercial, muitos jogos do tipo RPG se tornaram populares e ganharam milhares

    de adeptos, transportando para o universo on-line o envolvimento e o comprometimento do

     jogador.

    Em um MMORPG ( Massive Multiplayer Online Role-Playing Game), o jogador

    começa por criar seu personagem e posteriormente “entra” com este no ambiente gráfico

    que funciona como o “mundo” virtual onde este vai viver. Desse mundo o jogador vai

    conhecer a história, os habitantes, as tramas em torno desses, as normas e sanções etc;

    conhecimento que funciona tanto para cativar o jogador a querer entrar no jogo, quanto

    para torná-lo apto a desenvolver suas ações. Tendo iniciado o jogo, deve-se conduzir o

    personagem e com ele interagir com outros para que seja possí vel se desenvolver e fazer

    parte da “vida social” daquele mundo.

    Desde que toma conhecimento do enredo do jogo e decide fazer parte do mesmo, o

     jogador envolve-se com o jogo. Um envolvimento emocional e racional. Racional porque

    ele conhece as regras e suas ações são por elas norteadas; antes de realizar ações deve

    refletir sobre elas por causa do risco do Game Master (o mestre do jogo – que funciona

    tanto como um auxliar para novos jogadores quanto um censor para aqueles que

    descumprem as regras) puni-lo com perda de artefatos, status  ou experiência. E,

    emocionalmente, o jogador está ligado ao personagem que criou enquanto experimenta com

    ele as aventuras do jogo, quando tem de relacionar-se com outros personagens, passar por

    aventuras, enfrentar inimigos etc. A ação do avatar é a ação do jogador. Sem o mí nimo de

    envolvimento com todo o mundo virtual do jogo, o mesmo não se desenvolve.

    Esses envolvimentos são notáveis nas suas apresentações quando falam de si e do

    seu personagem. Para compreender como acontece essa adesão ao jogo, conversei com um

     jogador de Ragnarök em um chat  disponí vel na página do jogo4. Aqui o identificarei como

    4 Ragnarök Online foi o primeiro RPG Online do Brasil totalmente traduzido para o portugu ês. Lançado em2004, conquistou ao longo desses anos mais de 2,7 milhões de jogadores, é gerenciado pela Level Up tem seuenredo ligado a mitologia nórdica.

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    Fábio. Inicialmente ele relutou em dizer seu nome próprio, preferindo sempre dirigir-se

    pelo nome do personagem: “Soterion”. Segundo ele,

    “Para falar de ragnarok eu procuro pensar como se estivesse em rune-

    midgard e sempre que alguém fala disso eu me transporto pra lá. Fica maisf ácil assim, em todos os sentidos. Mesmo quando a gente conversa. Sei queé meio estranho, mas eu jogo há dois anos e quase todos os dias. É meioautomático pra mim. Por isso, coloquei meu nick como soterion, meu nomeem rune-midgard.”

    Ao se remeter ao jogo, mesmo fora dele, Fábio traz para esse contexto suas

    referências, sendo o inverso também verdadeiro. De qualquer modo, Fábio se sente ligado à 

    sua experiência no Ragnarök, o que pode ser percebido no investimento que ele faz no

     jogo: criação do avatar, coisas que consegue realizar, interações com outros jogadores, tudo

    isso demanda tempo e investimento. As conquistas e as frustrações que vivencia no jogo

    são sentimentos que marcam suas experiências. Assim, se refere ao falar como o jogo já o

    entristeceu uma vez:

    “Fiquei jogando dias direto até de madrugada para realizar meu objetivo no jogo de virar knight e ter um peco peco. Daí  na hora de fazer a quest me

    deparei com uma injustiça: NÃO ERA POSSÍVEL UM CARA DO MEUNÍVEL TERMINAR! A parte da quest de lutas é extremamente dificil, nãoconsigo passar da terceira parte e ainda por cima meu dinheiro acabou. Mas

    eu acho isso frustrante no jogo que tem tantas coisas boas. Te gera uma

    expectativa e na hora de realizá-la torna-se impossí vel. Mas, entendi quetenho de passar pelas fases uma de cada vez. Não adianta tentar me afobar.”5

    Esse tipo de lição, segundo o jogador, lhe ensinou a esperar pelo momento para

    conseguir o que quer. E, que apesar de muita gente achar os jogos uma bobagem, ele disse

    que sofre e se alegra com eles. Essa disposição e esses sentimentos são amostras de como oenvolvimento é importante no jogo. Envolvimento que faz o jogador ligar todas as coisas

    que experimenta, no jogo ou fora dele. Quando está jogando Fábio diz que não se sente

    5 Em Ragnarok um Knight  é um cavaleiro que geralmente está na frente de batalha. Quest  são missões ondeum ou vários jogadores resolvem enigmas. Os propósitos dessas missões são variados, elas podem valerrecompensas ou serem usadas para a dinâmica do jogo. E, Peco Peco  são aves de força e vitalidade queservem de montaria.

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    “off”, ele está   ali como o personagem, apesar de o ter montado com caracterí sticas

    diferentes das suas.

    “É uma coisa engraçada, né? Eu não posso dizer que não sou eu jogando.Mas, o meu avatar tem coisas diferentes de mim. Coisas que eu coloquei. Eu

    não sou um cara de briga, mas meu personagem é  muito forte, sempre aprocura de quests, passando pelas de luta, inclusive. Não sei sei eu faria omesmo, acho que não mesmo.”

    Quando perguntado se a intrepidez do personagem que ele montou era algo que ele

    gostaria de ser, ele respondeu:

    “Sim. É um tipo de atitude que acho bonito, massa. Ir na frente de batalha,fazer coisas assim. Mas, acho legal isso de no jogo a gente poder exagerar as

    coisas, fazer coisas legais que não pode fazer geralmente, né?”

    As experiências de Fábio mostram como o jogo é uma esfera a qual é preciso aderir

    sem se subsumir nela. Quando se joga se está nessa dupla condição: objetiva e subjetiva. O

     jogo é  precisamente esse exercí cio de estar como o avatar, e de muitas vezes trazer a

    experiência para vida, seja a partir do que aprende no jogo e por meio dele, seja criando

    cí rculos de sociabilidade e amizades. Todas essas etapas são susceptí veis à atividade do

     jogo, atividade que só acontece na sua realização, na sua ação, na sua experiência.

    Algumas considerações finais

    Nesse artigo procuramos oferecer como possibilidade teórica uma leitura

    hermenêutica do jogo, que nos remete à  constituição de um novo espaço de vivência e

    aprendizado no qual simulação e realidade se contaminam mutuamente. Nosso esforço aqui

    é   claramente preliminar. Se apresentamos algumas incursões empí ricas a partir da

    pressuposição de ser a hermenêutica um instrumento teórico e metodológico fundamental

    para analisar os JEs, esse uso foi em grande medida ilustrativo. Tí nhamos em mente bem

    mais a viabilidade da adoção desse referencial em situação empí rica concreta do que a

    ambição de realizar uma análise sistemática dessa empiria. Dito isto, pudemos constatar a

    pertinência de nossa proposta ao concluir:

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    • No jogo o jogador joga as suas possibilidades, quer dizer, com a história que o

    determina e com a contingência a partir da qual ele reconstitui essas determinações e

    cria novas possibilidades de vida. Em nossos exemplos, percebemos que o jogador não

    apenas projeta essa história no jogo, mas que a experiência do jogo alimenta suas

    práticas cotidianas.

    • Por isso mesmo, aqueles que insistem em separar a simulação dos JEs, a ficção que ela

    configura, de um espaço de realidade, não entendem precisamente aquilo que está em

     jogo no jogo.

    • Apesar das regras, nenhum jogo é   fechado. A rigidez ou abertura dessas regras

    configuram possibilidades mais ou menos abertas de jogabilidade. Jogos como o

     Ragnar ök  e o Second Life potencializam uma certa flexibilidade que encontramos numa

    sociedade dinâmica e fluida. Por outro lado, os próprios pressupostos dessa sociedade

    constituem limites a partir dos quais os jogadores elaboram o prazer de jogar. Embora

    cada ilha do Second Life possa desenvolver suas próprias regras, valores culturais de

    nossa realidade, tais como a cultura do corpo, o consumismo, a imposição do mercado à 

    conduta dos indiví duos etc., são uma base importante daquilo que se joga nesse espaço.

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