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Organização Curricular e as Práticas Inclusivas
Curricular Organization And Inclusive Practices
Giovana Rodrigues Oliveira
Universidade de Lisboa, Portugal.
Resumo
Este estudo teve como objetivo descrever o currículo em ação desenvolvido em escolas públicas
da rede estadual de ensino de Fortaleza- Ceará- Brasil que incluíam alunos com deficiência
intelectual. Foram sujeitos quatro professores e oito alunos do Ciclo I de quatro escolas. Utilizamos
como instrumento de coleta a observação direta e a entrevista visando conhecer as ações didático-
metodológicas utilizadas pelos professores para flexibilizar o currículo às necessidades
educacionais dos seus alunos. O estudo é de natureza qualitativa, sendo subsidiado pela concepção
sócio-histórico-cultural de L. S. Vygotsky. O currículo em ação, manifesto nas salas de aula
observadas e na fala dos professores, evidenciou a falta de uma intervenção teórico-prática que
facilitasse a construção do aprendizado dos alunos com deficiência intelectual, não havendo uma
compreensão sobre o processo de organização curricular e das práticas inclusivas que deve ser posto
em circulação para facilitar o aprendizado destes alunos. Este trabalho sugere, a partir da realidade
encontrada, a premência da reorganização das propostas curriculares e das ações pedagógicas
desenvolvidas na escola básica para atender as demandas dos alunos com deficiência intelectual
incluídos em contextos regulares.
Palavras chaves: Currículo, Inclusão, Ensino; Deficiência Intelectual.
Abstract
The study aims at describing a practical schedule which has been developed in public schools of the
state network of education of Fortaleza Ceará in Brazil for pupils with intellectual deficiency. Four
teachers and eight pupils of Cycle I of four schools had been participating. Our research instruments
are the direct comment and the interview for the elaboration of the didactic and methodological
actions used by the teachers in order to adjust the schedule to the educational needs of their pupils.
The research is a quality study, being founded on the social; historical-cultural conception of L. S.
Vygotsky. The schedule in action, having been manifested in the observed classrooms and in the
talks with the teachers, showed that there is a lack of a theoretical and practical intervention that
would facilitate the learning success of the pupils with intellectual deficiency, who do not
understand the practical process of the schedule organization nor the practical steps that must be
taken in order to further their learning capacity. With these facts given there must be a strong focus
on the reorganization of the proposed schedules and the pedagogical actions developed in the
elementary schools in order to meet the educational needs of the pupils with intellectual deficiency
who are attending in a regular context.
Keys words : Schedule; Inclusion; Education; Intellectual Deficiency.
Introdução
A partir do advento do Paradigma da Educação Inclusiva a convicção dos profissionais
da educação preocupados com a real democratização da escola é que os indivíduos com
deficiência tenham as mesmas oportunidades sociais e educacionais daqueles considerados
“sem dificuldades”, pois a tendência mundial é inegavelmente a defesa da construção de
uma escola que atendendo as demandas de sua clientela possa alcançar as aspirações dos
grupos minoritários pela democratização do ensino.
Nesta perspectiva, delinearemos os caminhos viáveis para a inclusão das pessoas com
necessidades educacionais especiais no âmbito educativo, notadamente as formas de
participação do aluno com deficiência intelectual na escola regular.
Vale frisar, inicialmente, que conforme estimativas do Censo Escolar 2002, no estado
do Ceará, somente 8.733 alunos com necessidades educacionais especiais recebiam algum
tipo de atendimento especializado. Isto configura a segregação e a edificação do déficit
impeditivo do acesso desses alunos nas instituições escolares e, conseqüentemente, a um
programa pedagógico adaptado às suas reais necessidades (Magalhães, 2003)
Além deste aspecto é oportuno esclarecer que numa perspectiva tradicional os
indivíduos com necessidades educacionais especiais – principalmente àqueles com
deficiência intelectual – são estigmatizados por procedimentos de ensino de natureza
preconceituosa que não levam em consideração suas potencialidades.
Segundo Fonseca (2000), a escola e seus agentes têm sido responsáveis por medidas
seletivas que não se justificam no plano humano, nem se fundamentam em dados
investigativos e comprovados. A escola tradicional, assim, vem impondo o disciplinamento,
a linearidade, a homogeneização sem respeitar as diferenças e necessidades individuais dos
alunos a partir da sua vivência social.
Valorizando as interações como ponto de apoio nos saltos qualitativos que as pessoas
com deficiência podem alcançar, vislumbramos um suporte teórico baseado na Escola
Sócio-Histórica Cultural de Vygotsky (1991, 1994, 1998) que prima o despertar dos
processos internos de desenvolvimento do sujeito, a partir do contato com o ambiente
cultural, impulsionando e proporcionando o crescimento das funções psicológicas
superiores². Tais funções são de origem sócio-cultural e emergem de processos
psicológicos elementares, de origem biológica. Mas a complexidade da estrutura da
cognição humana deriva do processo de desenvolvimento profundamente enraizado nas
relações entre história individual e social.
As funções elementares têm como característica fundamental o fato de serem total e
diretamente determinadas pela estimulação ambiental. No caso das funções superiores, a
característica essencial é a estimulação auto-gerada, isto é, a criação e o uso de estímulos
artificiais que se tornam a causa imediata do comportamento (Vygotsky, 1994).
Este caminhar é sedimentado nas relações de coletividade e será efetivado, no caso da
inclusão dos indivíduos com necessidades educativas especiais, no contexto escolar,
primando pelo princípio da heterogeneidade que se faz presente em qualquer situação
educacional.
Para Castorina et al (1996, p.59), em Vygotsky, o desenvolvimento psicológico deve ser
olhado de maneira prospectiva, isto é, para além do momento atual, com referência ao que
está por acontecer na trajetória do indivíduo. Ressalta, ainda, a importância dos processos
de aprendizado que movimentam os processos de desenvolvimento; e, por último,
especifica a importância da atuação dos outros membros do grupo social na mediação entre
a cultura e o indivíduo e na promoção dos processos interpsicológicos que serão
posteriormente internalizados.
Isto é especialmente importante se pensarmos na pessoa com deficiência intelectual. Em
Vygotsky (1991) a deficiência intelectual é considerada a partir da forma como ocorre a
inserção cultural de cada indivíduo com esta deficiência em seu contexto. Para Fernandes e
Magalhães (2002, pp. 109 e 110) trata-se de considerar que
O desenvolvimento da criança deficiente intelectual é
semelhante ao da criança “normal”, muitas das funções
intelectuais/psicológicas da criança com deficiência
intelectual podem não ter sido atingidas pela
incapacidade. A diferença seria que estas crianças não
sabem utilizar recursos culturais, configurando-se numa
limitação ou incompletude do desenvolvimento cultural,
num comprometimento de suas funções psicológicas
superiores.
A função da intervenção pedagógica como mediadora na aprendizagem e
desenvolvimento da criança com deficiência intelectual é fundamental. A evolução dos
conceitos vivenciados por esta criança é generalizada em outras situações do seu cotidiano,
como aprendizado sistemático que é permitido pelas contínuas mediações que
potencializam o pensamento socializado.
Os argumentos supracitados possibilitam um olhar reflexivo acerca da inclusão dos
indivíduos com deficiência em processos educacionais regulares, que instiguem sua
caminhada evolutiva, ficando atentos às conquistas e, mais ainda, às trocas estabelecidas no
dia a dia da escola através das mediações que corroboram para o despertar de suas
competências.
Neste estudo compreendemos currículo como as relações que regem a instituição escola
como facilitadora da cultura, que estrutura sua ação educativa a partir dos princípios
políticos, éticos e psicopedagógicos que delineiam sua filosofia e práticas pedagógicas.
Acreditamos que a partir das contribuições de Vygotsky, os docentes poderão
flexibilizar o projeto pedagógico da instituição criando vias de acesso ao currículo para
àqueles que não conseguem acompanhar a dinamicidade da proposta escolar delineada na
organização curricular. Partimos, assim, do princípio da modificabilidade dos pressupostos
curriculares instituídos no cotidiano das escolas, levando-se em conta as necessidades e
capacidades dos seus alunos e os valores que orientam a intervenção pedagógica.
A ampliação das propostas educacionais favorece, ainda, a entrada e permanência dos
alunos com alguma limitação nos corredores escolares, privilegiando mudanças didático-
metodológicas que refletiriam o enriquecimento das estratégias do educador e a
aprendizagem do educando.
Advogamos ser de suma importância no processo de inclusão as questões
especificamente curriculares, pois são as modificações neste âmbito que transformarão os
conceitos enraizados nas posturas dos profissionais − médicos, psicólogos, fonoaudiólogos,
terapêutas e professores −, que acabam intervindo junto a estes alunos com uma visão
estritamente assistencialista e curativa, não acreditando no desabrochar de suas
potencialidades mediante a interação social.
As Práticas Curriculares Como Possibilidade no Processo de Educação Inclusiva
Um dos grandes problemas enfrentados nas instituições educacionais hoje é a
compreensão da real possibilidade curricular que guia as diretrizes pedagógicas,
ideológicas, éticas, políticas e sociais das escolas. O currículo subjaz a proposta educativa
fortalecendo o enfoque relacional e estrutural que põe em prática as ações e relações
organizadas nos corredores escolares.
As modalidades curriculares fortalecem e edificam os pressupostos teóricos-práticos,
contemplando as reais necessidades dos seus alunos e da comunidade escolar. No contexto
mais amplo, os guias curriculares nascentes ainda na lei no 5.692/71 fortaleceram uma
ideologia tecnicista que é marcada por orientações genéricas sobre conteúdos e atividades
que se mostraram insuficientes para orientar e dinamizar sua utilização no fazer pedagógico
almejado. São estes pressupostos tecnicistas (racionalistas) que colocamos em discussão
quando nos referimos à construção de um currículo inclusivo.
Quando definimos o currículo, afirma Sacristán (2000, p. 15), “estamos descrevendo a
concretização das funções da própria escola e a forma particular de enfocá-los num
momento histórico e social determinado, para um nível ou modalidade de educação, numa
trama institucional etc.”
O currículo abre espaço para olharmos refletidamente para as modalidades de ensino e
aprendizagem que permeiam em sua práxis educacional (relação professor x aluno,
metodologia, conteúdos relevantes, planejamento, pensamento sócio-político) que
categoricamente são percebidos nas entrelinhas dos âmbitos práticos que a condicionam.
Esta apreciação envolve os profissionais que praticam as regras que sedimentam o
projeto curricular da escola partindo da formação docente do profissional, das suas
experiências e vivências com propostas educativas inclusivas e, conseqüentemente, a
aceitação de “alunos heterogêneos” independentes que estes sejam ou não alunos com
necessidades educacionais especiais. Para Ainscow (2001 : 31). “ la presencia de niños que
no se adaptan bien al “menú” de la escuela constituye un estimulo para explorar una cultura
más colegiada en la que los maestros tengan el apoyo de la experimentación de nuevas
respuestas docentes.”
De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais – Adaptações Curriculares (PCN
– AC) o projeto pedagógico da escola, é um ponto de referência para definir a prática
escolar, pois orienta a operacionalização do currículo, como um recurso para promover o
desenvolvimento e a aprendizagem de quaisquer alunos, considerando-se os seguintes
aspectos:
a) a atitude favorável da escola para diversificar e flexibilizar o processo de ensino-
aprendizagem, de modo a atender às diferenças individuais dos alunos;
b) a identificação das necessidades educacionais especiais para justificar a priorização
de recursos e meios favoráveis à sua educação;
c) a adoção de currículos abertos e propostas curriculares diversificadas, em lugar de
uma concepção uniforme e homogeneizadora de currículo;
d) a flexibilidade quanto à organização e ao funcionamento da escola, para atender à
demanda diversificada dos alunos;
e) a possibilidade de incluir professores especializados, serviços de apoio e outros, não
convencionais, para favorecer o processo educacional. (Brasil, 1999).
Estas mudanças favoreceriam a toda clientela da instituição escolar beneficiando-a com
uma nova forma de planejar, preocupada com as diferenças, procurando agrupar os alunos
ao convívio do grupo escolar, instigando a cooperação e solidariedade, criando momentos
de trocas e parcerias que enriquecem a descoberta de todos os alunos no ambiente de sala
de aula.
Partimos dessas adequações curriculares para abrir espaço para alunos com
necessidades educacionais especiais viabilizando flexibilizar a prática educacional,
valorando o potencial do indivíduo com algum handicap³, modificando o projeto educativo
a partir de um desenho curricular base, que segue o projeto curricular da escola, seguindo
os objetivos e conteúdos; metodologia e atividades de ensino-aprendizagem; materiais e
organização de grupos, espaços e tempos; avaliando e primando pela comunicação com as
famílias.
Dentro desta perspectiva, os estudos sobre adaptações curriculares enfatizam diversas
formas de modificações pedagógicas que podem auxiliar no processo de inclusão para
alunos com deficiência na perspectiva de uma vivência acadêmica positiva.
Manjón (1995), Ministério da Educação da Espanha (1992) e o documento PCN -
Adaptações Curriculares (Brasil, 1999) enfatizam mudanças estruturais que devem
acontecer no contexto escolar, programação da aula, possibilidades de adaptação do
currículo que incidem diretamente no crescimento do aluno com necessidades educacionais
especiais.
O PCN – Adaptações Curriculares selecionam formas de adaptar o currículo, com o
interesse de suscitar discussões entre os professores, para a partir desse momento ocorrer
reestruturações no mesmo edificando mudanças na sua estrutura. Porém, este parâmetro
não suscita uma compreensão sobre a relação teórico-prática às necessidades emergenciais
dos professores nas escolas. Muitos, ficam a espera de “receitas” para atender aos alunos
com deficiência.
Com isso, as adaptações curriculares – quando conhecidas e discutidas – são
fundamentais para enriquecer as estratégias de sala de aula em resposta às necessidades dos
professores e dos alunos. Estas adaptações foram organizadas por Manjón (1995) e Brasil
(1999) em:
Adaptações no Centro – são mudanças ocorridas na escola de acordo com as
necessidades contextuais e dos alunos, procedendo a obrigação de adequar o currículo
oficial às características do grupo, consistindo em modificações que se realizam nos
diferentes elementos da proposta educativa para responder aos alunos com necessidades
educativas especiais.
Adaptações na Aula – procedem da necessidade de adequar e concretizar a oferta
educativa às necessidades do grupo de aula, através de um processo de tomada de decisões
sobre as programações do ciclo. Concedem ajustes ou modificações nos elementos da
proposta educativa planejada para o grupo-aula, facilitando o acesso dos alunos com
necessidades educativas para atingir os objetivos.
Adaptações Individuais – é um conjunto de decisões que são tomadas desde a
programação da aula para um determinado aluno, valorizando o aluno e seu contexto, com
o fim de responder suas necessidades educativas que não podem ser repartidas com o resto
da classe. Realizados pelo professor da aula, professores, especialistas e equipe de
orientação educativa e psicopedagógica.
As adaptações individualizadas do currículo focalizam a atenção do educador às
necessidades reais do aluno definindo seu nível de competência curricular, seu estilo de
aprendizagem e os intervenientes que impedem seu processo de ensino-aprendizagem.
Manjón (1995 :82) afirma ainda:
la adaptacion curricular puede definirse por tanto, como
una secuencia de acciones sobre el curriculum escolar
diseñado para una población dada, que conducen a la
modificación de uno o más de sus elementos basicos
(qué, cómo y cuando enseñar e evaluar) cuya finalidad
es la de posibilitar el máximo de individualización
didáctica en el contexto más normalizado posible para
aquellos alumnos que presentan cualquier tipo de
necesidad educativa especial.
Os critérios para as adaptações curriculares devem partir das características e
necessidades individuais dos alunos (diminuir as desvantagens produzidas, bem como
excluir elementos do ensino que sejam menos relevantes para o seu aprendizado). É
primordial lembrarmos que o material e as atividades propostas devem priorizar tópicos
curriculares que têm um caráter básico (leitura, escrita e cálculo) que sejam chaves para
outros posteriores.
As considerações pedagógicas, assim, devem potencializar em maior grau a integração
educativa e social do aluno no contexto escolar, equilibrando diferentes capacidades
(cognoscitivas, de integração social e de equilíbrio pessoal). O currículo, nessa visão é
alterado para beneficiar o desenvolvimento pessoal e social dos alunos, resultando em
modificações que podem ser de maior ou menor expressividade.
As adaptações curriculares podem ser classificadas, ainda, em não significativas e
significativas (Manjón, 1995:84). As Adaptações Curriculares Não Significativas
“Constituyen el tipo de adaptación menos específica, en la medida en que no supone sino
una leve alteración de la planificación ordinaria, aquellas acciones esperables de todo el
profesorado en el ejercicio responsable de su acción tutorial y orientadora”.
As Adaptações Curriculares Significativas
Suponen una modificación bastante mayor del diseño
curricular efectuado para la población de referencia del
alumno, ya que pueden llegar a consistir en la
eliminación de contenidos esenciales o nucleares y/u
objetivos generales que se consideran básicos en las
diferentes áreas curriculares, y la consiguiente
modificación de los respectivos criterios de evaluación.
(Manjón, 1995: 84)
É imprescindível que o processo de ensino-aprendizagem relativo aos objetivos,
conteúdos e avaliações deva seguir etapas de menor expressividade para os de maior,
enfatizando a temporalização dos procedimentos didáticos que levam em consideração: a
alteração no tempo previsto para a realização das atividades ou conteúdos; ao período para
alcançar determinados objetivos – medidas mais acentuadas fazem parte de modificações
realmente significativas que podem eliminar objetivos básicos ou introduzir objetivos
específicos alternativos não previstos para os demais alunos, mas que podem ser incluídos
em substituição a outros que não podem ser alcançados, temporária ou permanentemente.
Os níveis de adaptações curriculares almejam o âmbito do projeto pedagógico (currículo
escolar), o currículo desenvolvido em sala de aula e o próprio indivíduo, concretizando a
inter-relação da proposta filosófica da escola que delineia as trocas no campo educacional.
Com base nas argumentações acima este estudo teve como interrogação principal: “O
que caracteriza o currículo em ação em salas de aula do Ciclo I do ensino fundamental para
os alunos com deficiência intelectual ?” O objetivo principal deste estudo foi, portanto, “
Descrever e analisar o currículo em ação desenvolvido em escolas públicas da rede estadual
de ensino no município de Fortaleza/Ceará/Brasil que incluíam alunos com deficiência
intelectual no Ciclo I”.
Trajeto Metodológico
A referida pesquisa é de natureza qualitativa, partindo da análise do processo curricular
das instituições de ensino público do Estado do Ceará que incluem alunos com deficiência
intelectual. A escolha destas instituições se deu pelo fato de serem escolas que possuíam
parcerias com os núcleos de atendimento que acompanhavam os educandos com
deficiência e assim, realizavam o encaminhamento para as escolas regulares.
A Secretaria de Educação do Estado do Ceará (SEDUC) tinha, na época da realização
da coleta de dados, 19 (dezenove) escolas regulares que incluíam alunos com deficiência
intelectual. Foram escolhidas quatro escolas, por indicação da SEDUC, reconhecidas como
instituições que vinham realizando significativo trabalho de inclusão de alunos com
deficiência intelectual. O número reduzido de escolas se justifica em virtude da natureza
qualitativa presente na pesquisa; a intenção não é realizar generalizações de conclusões
obtidas, assim “...os dados são em forma de palavras ou imagens e não de números”
(Bogdan e Biklin, 1994 : 48)
A amostra da pesquisa constou de quatro professores e oito alunos com deficiência
intelectual incluídos na classe regular no ciclo I, sendo selecionados pelos seguintes
critérios: a) professores com mais de dez anos de magistério; b) alunos com deficiência
intelectual incluídos na escola regular há pelo menos um ano e c) alunos acompanhados
pelos núcleos de atendimento do Estado do Ceará.
Utilizamos métodos, técnicas e procedimentos que facilitaram a organização do estudo
para conhecermos a importância das adaptações curriculares no caminhar do aluno com
deficiência intelectual na escola regular. Estudamos as principais propostas curriculares,
que objetivam propor adaptações curriculares no currículo para inclusão do aluno com
deficiência intelectual nas escolas regulares. Utilizamos como técnica de coleta de dados a
observação nas quatro escolas com vistas a conhecer o espaço escolar e o material utilizado
para adaptar as atividades sócio-educativas e analisar a prática em sala de aula (intervenção
pedagógica) exercida pelo educador na inclusão do aluno com deficiência intelectual.
Entrevistamos quatro professores que atuavam no Ciclo I destas escolas visando captar a
concepção de currículo e suas implicações na inclusão do aluno com deficiência intelectual
(adaptações curriculares e seu processo de planejamento e avaliação).
A análise qualitativa dos dados colhidos foi realizada com o uso da técnica da análise de
conteúdo a partir das falas dos professores entrevistados e das situações percebidas em sala
de aula.
A técnica de análise do conteúdo foi desenvolvida por Bardin (1977), possibilitando a
transcrição e leitura das falas dos professores. Tal análise tenta apreender seu significado
caracterizando uma realidade de forma representativa. Nesta técnica as “falas” dos
pesquisadores possibilitam analisar os conteúdos manifestos e chegar a inferências acerca
da realidade pesquisada.
Revelando o currículo em ação
As entrevistas e observações realizadas nos permitem apresentar as seguintes
conclusões:
a) As atividades pedagógicas desenvolvidas pelas professoras são comuns para todos os
alunos, não se estruturando objetivos pré-estabelecidos quanto a adaptações de acesso
(material pedagógico e espaço físico) e metodológicas (conteúdos, procedimentos e
avaliação).
b) As mediações que vislumbram aprendizagens cooperativas entre os alunos eram
impossibilitadas pela didática tradicional utilizada pelas professoras que revelavam a
distância entre professora-alunos e alunos entre si.
c) O hiato entre o grupo deficiente e o não deficiente assume a distância de igualdade
educacional, não proporcionando saltos qualitativos e conquistas quanto aos desafios e
níveis de ajuda que impulsionam o aprendizado.
d) A prática da língua portuguesa nas salas observadas delineou um processo
metodológico tradicional, não privilegiando a construção da leitura significativa e da escrita
espontânea a partir da interação do grupo-classe.
e) Os educadores não compreendem o processo de adaptação curricular, uma vez que
não consideram em seus planejamentos a permanência da clientela com deficiência
intelectual na escola.
Portanto, o currículo em ação revela a fragilidade de uma prática pedagógica que, ainda,
não considera as singularidades dos alunos com e sem deficiência.
Algumas Considerações Finais
É fundamental salientarmos, que a proposta de adaptação curricular fomenta uma
concepção mais abrangente do processo educacional inclusivo, pensando a estruturação do
currículo a partir da filosofia pedagógica da escola e das metas educativas sedimentadas
para a comunidade escolar. Com isso, advogamos uma visão de inclusão na qual os
sistemas educacionais transformem suas estratégias de planejamento e elaboração
curricular visando o atendimento às necessidades educacionais de todas e quaisquer
crianças, independente de suas diferenças.
O currículo em ação manifesto na sala de aula e mediado pela prática pedagógica dos
professores indica a ausência de flexibilizações tanto do planejamento das atividades,
quanto da sua execução. Neste sentido as necessidades específicas dos alunos com
deficiência intelectutal não são, ainda, contempladas pelas estratégias didático-
metodológicas que compõem o currículo. Esta realidade aponta para a premência da
reorganização das propostas e práticas curriculares desenvolvidas na escola inclusiva.
As adaptações curriculares poderiam ser um caminho viável na construção de uma
escola que respeitando as diferenças atenda as demandas de sua clientela. Esta idéia
favorece a participação de todos os segmentos da escola no sentido da transformação de
uma visão clínica da deficiência, em prol de um olhar pedagógico.
O atendimento as diversidades no contexto escolar implica, também, no reconhecimento
de que as adaptações curriculares são uma alternativa de ação-reflexão possível que somada
a outras intervenções no processo de ensino-aprendizagem e gestão participativa na
instituição escola pode resignificar a práxis que permita a construção de uma escola
democrática.
Referencias Bibliográficas
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Notas
1. Funções Psicológicas Superiores – são originadas nas relações sociais entre o
indivíduo e os outros homens: aquelas que envolvem consciência, intenção, planejamento,
ações voluntárias e deliberadas, dependem de processos de aprendizagem.
2. Handicaps – as limitações experimentadas pelo indivíduo, em virtude da deficiência
e da incapacidade.
Notas Sobre a Autora:
Giovana Rodrigues Oliveira. Universidade de Lisboa, Portugal. Pedagoga e Psicopedagoga
pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Mestre em Educação Especial pela
Universidade Estadual do Ceará(UECE). Professora de Cursos de Pós-Graduação nas áreas
de Inclusão e Psicopedagogia. Professora da Prefeitura Municipal de Fortaleza/ Ceará/
Brasil. E-mail: [email protected]