Gastroenterologia Terapêutica em

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Temas de Atualização do Curso Pré-Congresso XI Semana Brasileira do Aparelho Digestivo Fortaleza - CE • 2012 Terapêutica em Gastroenterologia Terapêutica em Gastroenterologia Federação Brasileira de Gastroenterologia

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Temas de Atualização do Curso Pré-CongressoXI Semana Brasileira do Aparelho Digestivo

Fortaleza - CE • 2012

Terapêutica em

GastroenterologiaTerapêutica em

Gastroenterologia

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Federação Brasileira de Gastroenterologia

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Uma Dose Diária1-3

Eficácia da mesalazina com a comodidade da tecnologia MMX*1-3

Contraindicação: Mesacol® MMX* não é recomendado em casos de hipersensibilidade a salicilatos. Interação Medicamentosa: A administração da mesalazina pode potencializar a toxicidade do metotrexato.Mesacol® MMX* - mesalazina - Uso adulto - Acima de 18 anos - Apresentações e composição: Comprimidos revestidos de liberação prolongada, com 1,2 g de mesalazina cada. Embalagens com 10 e 30 unidades. Indicações: antiinflamatório de ação local no tratamento da colite ulcerativa ativa leve a moderada, na fase aguda (indução da remissão) e na manutenção da remissão. Contra-indicações: Este medicamento não deve ser usado por pacientes com história de hipersensibilidade aos salicilatos (que inclui o ácido acetilsalicílico), à mesalazina, à sulfassalazina ou a qualquer dos componentes da fórmula; pacientes com insuficiência hepática e/ou renal graves; pacientes com úlcera gástrica e duodenal ativa; pacientes com tendência elevada a sangramento. Este medicamento é contra-indicado para menores de 18 anos. Precauções e advertências: As mesmas precauções e advertências relacionadas com o uso de preparações contendo mesalazina ou pró-drogas de mesalazina devem ser consideradas para Mesacol® MMX*. Assim como todos os salicilatos, a mesalazina deve ser utilizada com cautela em pacientes com história de úlcera gástrica ou duodenal, por pacientes asmáticos (em função das reações de hipersensibilidade), com disfunção renal ou hepática (leve a moderada), ou com história de miocardite ou pericardite. Mesalazina não é recomendada para pacientes com disfunção renal grave e deve-se ter cautela com pacientes com níveis sangüíneos aumentados de uréia ou com proteinúria. A mesalazina é rapidamente excretada pelos rins, principalmente o seu metabólito ácido N-acetil-5-aminossalicílico. Em ratos, altas doses da mesalazina, administradas por via intravenosa, causaram toxicidade tubular e glomerular. Em caso de aparecimento de disfunção renal durante o tratamento deve-se suspeitar de nefrotoxicidade induzida pela mesalazina. Nestes casos é recomendado monitorar a função renal, especialmente no início do tratamento. Durante tratamento prolongado, é também necessário monitorar regularmente a função renal (creatinina sérica). Ainda não está estabelecida a segurança do produto em crianças. Gravidez e lactação: Mesacol® MMX* está classificado na Categoria B de risco de fármacos destinados ao uso em grávidas. O produto, a princípio, não deve ser empregado em gestantes e lactantes, exceto quando absolutamente necessário. A segurança de Mesacol® MMX* para uso durante a gravidez ou a amamentação ainda não foi estabelecida, mas sabe-se que a mesalazina atravessa a placenta e é excretada pelo leite materno em pequenas quantidades. Estudos pré-clínicos não revelaram evidência de efeitos teratogênicos ou de toxicidade fetal oriundos da mesalazina, nem na evolução da gestação ou no desenvolvimento perinatal e pós-natal. A pequena experiência de uso da mesalazina em outras formulações durante a gravidez não mostrou efeito prejudicial ao feto; entretanto, a mesalazina deve ser usada com cautela durante a gravidez e somente quando os benefícios para a mãe forem superiores aos riscos potenciais ao feto. Baixas concentrações de mesalazina e de seu metabólito N-acetilado foram detectadas no leite materno, mas o significado clínico desta evidência ainda não foi determinado. Portanto, deve-se ter cautela na administração da mesalazina a lactantes. Categoria B de risco na gravidez – Este medicamento não deve ser utilizado por mulheres grávidas sem orientação médica ou do cirurgião-dentista. Pacientes pediátricos: Devido à falta de dados sobre a administração da mesalazina em altas doses na população pediátrica, Mesacol® MMX* não é recomendado para pacientes menores de 18 anos. Pacientes idosos: Não existe experiência suficiente sobre o uso de Mesacol® MMX* em pacientes com idade acima de 65 anos. No entanto, não foram identificadas diferenças entre o uso em pacientes mais jovens e em idosos com outras formulações de mesalazina. Pacientes com insuficiência renal: não são disponíveis informações sobre o uso em pacientes com insuficiência renal leve ou moderada. O medico deverá avaliar a relação risco/benefício para o seu uso. Pacientes com insuficiência hepática: não são disponíveis informações sobre o uso em pacientes com insuficiência hepática leve ou moderada. O medico deverá avaliar a relação risco/benefício para o seu uso. Dirigir e operar máquinas: É improvável que o uso deste medicamento tenha qualquer efeito na capacidade de dirigir veículos ou de usar máquinas. Interações medicamentosas: Nenhum estudo formal de interação foi conduzido. Não são disponíveis informações sobre interações entre Mesacol® MMX* e outros fármacos. Entretanto, existem relatos de interação entre a mesalazina (outras formulações) e outros medicamentos. O uso concomitante da mesalazina com agentes sabidamente nefrotóxicos, inclusive com os anti-inflamatórios não-hormonais (AINHs – como aspirina, ibuprofeno, diclofenaco, etc.) e azatioprina, pode aumentar o risco de reações renais; o potencial para discrasias sangüíneas da azatioprina e da 6-mercaptopurina pode ser aumentado; a ação hipoglicemiante das sulfoniluréias pode ser intensificada; a atividade anticoagulante dos derivados cumarínicos (varfarina) pode ser reduzida; a toxicidade do metotrexato pode ser potencializada; o efeito uricosúrico da probenecida e da sulfimpirazona pode ser diminuído, assim como a ação diurética da furosemida e da espironolactona e a ação tuberculostática da rifampicina. Em tese, a administração concomitante de anticoagulantes orais deve ser feita com cautela. Substâncias como a lactulose, que diminuem o pH do cólon, podem reduzir a liberação da mesalazina dos comprimidos revestidos de Mesacol® MMX*. Reações adversas: A maioria das reações adversas relatadas com Mesacol® MMX* foi transitória, e de intensidade leve a moderada. Foram descritas as seguintes reações adversas, distribuídas em grupos de freqüências: Reação comum (> 1/100 e < 1/10): Gastrintestinal: Flatulência e Náusea. Sistema Nervoso: Cefaléia. Estas reações ocorreram em menos de 3% dos pacientes, independente da dose administrada. Reação incomum (> 1/1.000 e < 1/100): Gastrintestinal: vômito, dor abdominal, distensão abdominal, diarréia, dispepsia, pancreatite, colite e pólipo retal. Hepatobiliar: aumento das transaminases, anormalidades no teste da função hepática. Sistema nervoso: tontura, sonolência, tremores. Cardiovascular: taquicardia, hipertensão e hipotensão arterial. Respiratório: dor faringolaríngea. Ouvido e labirinto: otalgia. Pele e tecido subcutâneo: acne, alopécia, prurigo, urticária, exantema, prurido. Sangue e linfa: Redução do número de plaquetas. Musculosqueléticas: artralgia, lombalgia. Gerais: Astenia, fadiga, pirexia, edema da face. Posologia e modo de usar: Mesacol® MMX* é para uso exclusivo por via oral. Para o tratamentoda colite ulcerativa leve a moderada, a dose usual para adultos acima de 18 anos é de 2.400 mg a 4.800 mg (2 a 4 comprimidos) ao dia, administrada em dose única, de preferência sempre à mesma hora de cada dia, acompanhada de uma refeição. Caso o paciente esteja tomando a dose mais elevada (4.800 mg/dia), deve ser reavaliado após 8 (oito) semanas de tratamento. Não apresentando mais sintomas, pode-se prescrever uma dose diária de 2.400 mg (2 comprimidos) para prevenir a recorrência de novas crises da doença (manutenção da remissão). A duração recomendada é de 8 semanas consecutivas, salvo critério médico diferente. Este medicamento não deve ser partido, mastigado ou dissolvido. A PERSISTIREM OS SINTOMAS, O MÉDICO DEVERÁ SER CONSULTADO. MEDICAMENTO SOB PRESCRIÇÃO. Registro MS - 1.0639. 0248 MEMX_0109_1210_VP.

Referências bibliográficas: 1) Mesacol® MMX* [Bula]. São Paulo: Nycomed Pharma. 2) Lakatos PL. Use of new once-daily 5-aminosalicylic acid preparations in the treatment of ulcerative colitis: Is there anything new under the sun? World J Gastroenterol 2009; 15(15):1799-1804. 3) D’Haens GD, et al. Once daily MMX mesalazine for the treatment of mild-to-moderate ulcerative colitis: a phase II, dose-ranging study. Aliment Pharmacol Ther. 2006;24:1087-97. 4) Hu MY, Peppercorn MA. MMX mesalamine: a novel high-dose, oncedaily 5-aminosalicylate formulation for the treatment of ulcerative colitis. Expert Opin Pharmacother. 2008;9(6):1049-58. 5) Lista de genéricos. Guia da Farmácia. 2011;18(220 Supl):2-32. 6) Prantera C, et al. A new oral delivery system for 5-ASA: preliminary clinical findings for MMx. Inflamm Bowel Dis 2005;11:421–7. 7) Kane S, et al. Medication nonadherence and the outcomes of patients with quiescent ulcerative colitis. Am J Med. 2003;114(1):39-43. 8) Osterman MT, Lichtenstein GR. Reformulation of an aminosalicylate: an exampleof the importance of pill burden on medical compliance rates. Methods Find Exp Clin Pharmacol. 2009;31(1):41-6. 9) Kamm MA, et al. Randomised trial of once- or twice-daily MMX mesalazine for maintenance of remission in ulcerative colitis. Gut. 2008;57(7):893-902.Material destinado exclusivamente a profissionais habilitados a prescrever e/ou dispensar medicamentos. Setembro/2012

O que é a TECNOLOGIA MMX*4?

Manutenção 6,7

MESACOL® MMX* 2400mg/dia

1x ao dia

Indução à remissão 2,8,9

MESACOL® MMX* 4800mg/dia

1x ao dia

Não existe genérico

com a tecnologia MMX*5

Comprimidosgastrorresistentes(Eudragit-S®)

Componentes lipofílicos

1

3

Componenteshidrofílicos

2

MESACOL® é Marca Registrada da Nycomed Pharma Ltda., MMX* é Marca Depositada de Giuliani S.p.A.Nycomed Pharma Ltda. Rua do Estilo Barroco, 721 - 04709-011 - São Paulo - SP. Mais informações poderão ser obtidas diretamente com o nosso

Departamento Médico ou por meio de nossos representantes. *Marca depositada.

Linha Gastro

3490-ME-Adap. Anuncio Manual3.indd 1 20/09/12 13:49

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Editores

Dr. José Galvão-Alves

Dra. Maria do Carmo Friche Passos

Dra. Eponina M. O. Lemme

Dr. Laércio Tenório Ribeiro

São Paulo • 2012

Terapêutica em Gastroenterologia

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Material destinado exclusivamente à classe médica.

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EditorEs

dr. José Galvão-AlvesPresidente da FBG

dra. Maria do Carmo Friche PassosCoordenadora do FAPEGE

dra. Eponina M. o. LemmeComissão do FAPEGE

dr. Laércio tenório ribeiroComissão do FAPEGE

Temas de Atualização do Curso Pré-CongressoXI Semana Brasileira do Aparelho Digestivo

Fortaleza - CE • 2012

Federação Brasileira de Gastroenterologia

Terapêutica em Gastroenterologia

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Copyright © 2012 Federação Brasileira de Gastroenterologia - FBGISBN 978-85-87181-25-1

Todos os direitos reservados à FBGAv. Brig. Faria Lima, 2.391 - 10º andar

CEP 01452-000 - São Paulo - SPTel.: (11) 3813-1610 - Fax: (11) 3032-1460

Site: www.fbg.org.br • e-mail: [email protected]

Edição e ProduçãoOffice Editora e Publicidade Ltda.

Rua General Eloy Alfaro, 239CEP 04139-060 - São Paulo - SPTels: (11) 5594-5455/5594-5300

São Paulo - SP - Brasilwww.officeeditora.com.br

Proibida a reprodução total ou parcial deste livro, por qualquer meio ou sistema, sem prévia autorização da FBG.

Impresso no Brasil

Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)(Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)

Terapêutica em gastroenterologia / editores JoséGalvão-Alves.. . [et . al ] . -- São Paulo : OfficeEditora, 2012.

Outros editores: Maria do Carmo Friche Passos,Eponina M. O. Lemme, Laércio T. RibeiroBibliografia

1. Clínica médica 2. GastroenterologiaI. Galvão-Alves, José. II . Passos, Maria do CarmoFriche. III . Lemme, Eponina M. O. IV. Ribeiro,Laércio T..

Índices para catálogo sistemático:1. Gastroenterologia : Medicina 616.33

12-12015CDD-616.33NLM-WI 300

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Dr. José Galvão-Alves (RJ)Presidente

Dr. José Roberto de Almeida (PE)Vice-Presidente

Dr. Sender Jankiel Mizsputen (SP)Secretário Geral

Dr. Adávio de Oliveira e Silva (SP)1º Secretário

Dr. Rubens Basile (RJ)Diretor Financeiro

Dra. Maria do Carmo Friche Passos (MG)Coordenadora do FAPEGE

Dr. José Roberto de Almeida (PE)Presidente Eleito (2012-2014)

dirEtoriA dA FBGGEstão 2010-2012

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• Federação Brasileira de Gastroenterologia6

CoMissÕEs PErMANENtEs

Título de Especialista• Dra. Luciana Dias Moretzsohn (MG) – Presidente• Dr. Mauro Bafutto (GO)• Dr. Celso Mirra de Paula e Silva (MG)• Dr. James Ramalho Marinho (AL)• Dr. José Miguel Luz Parente (AL)• Dr. Odery Ramos Junior (PR)

FAPEGE• Dra. Maria do Carmo Friche Passos (MG) – Coordenadora• Dra. Eponina M. O. Lemme (RJ)• Dr. Laércio Tenório Ribeiro (AL)

Departamento de Eventos FBG• Dr. Renato Dani (MG) – Diretor

Ética Médica• Dr. Carlos Fernando de Magalhães Franciscone (RS) – Presidente• Dr. Joffre Rezende Filho (GO)• Dr. Carlos Sandoval Gonçalves (ES)

Defesa Profissional• Dr. Gaspar de Jesus Lopes Filho (SP)• Dr. Jece Freitas Brandão (BA)• Dr. Julio M. Fonseca Chebli (MG)

Conselho Fiscal• Dr. José Augusto da Silva Messias (RJ)• Dr. Pedro Ferreira de Souza Filho (PB)• Dr. Octavio Augusto B. Gomes de Souza Junior (PA) Suplentes• Dr. Sergio Pessoa (CE)• Dr. José Nonato Fernandes Spinelli (PB)• Dr. Fábio Gomes Teixeira (MA)

Conferencista Nacional• Dr. Jaime Natan Eisig (SP)

Presidente Eleito Gestão 2012-2014• Dr. José Roberto de Almeida (PE)

DIRETORIA DA FBG

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CoMissÕEs tEMPorÁriAs E rEPrEsENtANtEs

Relações Governamentais• Dr. Isac Jorge Filho (SP)• Dr. Pedro Braz Macedo Filho (PE)

Relações Internacionais• Dr. Glaciomar Machado Olive (RJ)• Dr. Flavio Steinwurz (SP)• Dr. Ângelo Alves de Mattos (RS)• Dr. Igelmar Barreto Paes (BA)

Comissão de Ensino• Dr. Eduardo Lopes Pontes (RJ)• Dr. Farid Butros Iunan Nader (RS)• Dr. Flair J. Carrilho (SP)• Dr. Julio M. Fonseca Chebli (MG)• Dr. Paulo Pimentel de Assumpção (PA)• Dr. Luiz João Abrahão (RJ)

Comissão de Credenciamento dos Cursos de Especialização

• Dr. Adávio de Oliveira e Silva (SP)• Dr. Raul Wahle (SP)• Dr. José Galvão Alves (RJ)

Comissão Científica do Site• Dra. Maria do Carmo Friche Passos (MG)• Dr. Marco Antonio Zerôncio (RN)• Dr. Mário Reis Álvares-da-Silva (RS)• Dr. Laércio Tenório Ribeiro (AL)

Comissão Acervo Histórico• Dr. Ulysses G. Meneghelli (SP)

Representante na AMB• Dr. Rogério Toledo Junior (SP)

Representante na CNA – Comissão Nacional de Acreditação

• Dra. Dulce Reis Guarita (SP)

DIRETORIA DA FBG

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• Federação Brasileira de Gastroenterologia8

Representante na Área Técnica Saúde do Homem no Ministério da Saúde• Dr. Ulysses G. Meneghelli (SP)• Dr. Rogério Toledo Junior (SP)

Representante na ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária• Dr. Sender Jankiel Miszputen (SP)

Representante da AMB para Convênios e Seguros Médicos • Dr. Rogério Toledo Junior (SP)

Revista GED• Dr. José Murilo Robilotta Zeitune (SP) – Editor de Gastroenterologia

Revista Arquivos de Gastroenterologia• Dr. Flavio Antonio Quilici (SP) – Editor de Gastroenterologia

Jornal da FBG • Dr. Heitor Rosa

Comissão Jovem Gastroenterologista• Dr. Odery Ramos Junior (PR)• Dr. Silvando Barbalho Rodrigues (RJ)• Dr. Sergio Pessoa (CE)• Dr. Raul Carlos Wahle (SP)• Daniela A. Cavalcanti (RJ) - Residente

Comissão do Selo de Certificação da FBG• Dr. Edson Braga Lameu (RJ)• Dr. Rubens Basile (RJ)• Dr. Sender Jankiel Mizsputen (SP)

Comissão de PesquisaBásica• Dra. Raquel Canzi Almada de Souza (PR)• Dr. André C. Lyra (BA)

Clínica• Dr. Luiz Gonzaga Vaz Coelho (MG)• Dr. José Alves de Freitas (SP)

Comissão Reforma Estatuto e Regimento • Dr. Laércio Tenório Ribeiro (AL)• Dr. Celso Mirra de Paula e Silva (MG)

DIRETORIA DA FBG

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soCiEdAdEs FEdErAdAs(2010-2012)

PrEsidENtEs

Sociedade Alagoana de Gastroenterologia• Dr. Edgar Valente de Lima Neto

Sociedade de Gastroenterologia do Amazonas• Dr. Agostinho Massulo

Sociedade de Gastroenterologia da Bahia• Dra. Nelma Pereira de Santana

Sociedade Cearense de Gastroenterologia• Dr. Cícero Robério Motta

Sociedade de Gastroenterologia do Espírito Santo• Dra. Maria da Penha Zago Gomes

Sociedade Goiana de Gastroenterologia• Dr. Américo de Oliveira Silvério

Sociedade de Gastroenterologia de Brasília• Dra. Adélia Carmen Silva de Jesus

Sociedade Maranhense de Gastroenterologia• Dra. Licia Maria Rodrigues Fonseca

Sociedade Mato-Grossense de Gastroenterologia e Nutrição• Dr. Elton Hugo Maia Teixeira

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Sociedade Sul-Mato-Grossense de Gastroenterologia• Dr. Jesus da Cunha Garcia

Sociedade de Gastroenterologia e Nutrição de Minas Gerais• Dr. Áureo de Almeida Delgado

Sociedade Paraense de Gastroenterologia• Dra. Betânia Cavalcante Pinheiro

Sociedade de Gastroenterologia e Nutrição da Paraíba• Dr. José Eymard M. de Medeiros Filho

Sociedade Paranaense de Gastroenterologia e Nutrição• Dr. Julio Cesar Pisani

Sociedade Pernambucana de Gastroenterologia• Dra. Ana Botler Wilheim

Sociedade de Gastroenterologia do Piauí• Dra. Simone Barbosa da Silva Leal

Sociedade de Gastroenterologia do Rio de Janeiro• Dr. Edson Jurado da Silva

Sociedade de Gastroenterologia do Rio Grande do Norte• Dra. Auzelívia Pastora Rego Medeiros

Sociedade Gaúcha de Gastroenterologia• Dr. Carlos Kupski

Sociedade Catarinense de Gastroenterologia• Dr. Eduardo Nobuyuki Usuy Jr.

Sociedade de Gastroenterologia de São Paulo• Dr. Joaquim Prado P. de Moraes Filho

Sociedade de Gastroenterologia de Sergipe• Dr. Gilvan Pinto Monteiro

Sociedade de Gastroenterologia do Tocantins• Dr. Jonio Arruda Luz

SOCIEDADES FEDERADAS

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Dr. Adérson Omar Mourão Cintra DamiãoAssistente Doutor do Departamento de Gastroenterologia da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP). Membro do Grupo deDoenças Intestinais e do Laboratório de Pesquisa em Gastroenterologia (LIM-07) do Serviço de Gastroenterologia Clínica do Hospital das Clínicas daFMUSP. CRM-SP 39.270.

Dra. Ana Flávia Passos RamosMédica Assistente da Clínica Gastroenterológica da Santa Casa de Belo Horizonte e da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais. Mestre em Gastroenterologia pela Faculdade de Medicina da UFMG. CRM-MG 39.458.

Dra. Andrea Benevide Leite Lima VerdeMestre em Hepatologia pela UFCSPA (Universidade Federal de Ciências daSaúde de Porto Alegre). Preceptora da Residência de Gastroenterologia do Hospital Geral de Fortaleza. CRM-CE 7.919.

Dr. Angelo Alves de MattosProfessor Titular da Disciplina de Gastroenterologia e do Curso de Pós-Graduação em Hepatologia da Universidade Federal de Ciências da Saúde de Porto Alegre (UFCSPA). CRM-RS 7.089.

Dr. Antônio Carlos MoraesGastroenterologista, Chefe do Serviço de Clínica Médica - Hospital Copa D’Or. Gastroenterologista. Membro Efetivo da FBG. CRM-RJ 52.43606-9.

Dr. Carlos de Barros MottProfessor Livre-Docente em Gastroenterologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. CRM-SP 13.398.

AutorEs

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Dr. Carlos Alexandre Antunes de BritoProfessor Adjunto do Departamento de Medicina Clínica da UFPE. Mestre em Medicina Interna pela UFPE, Doutor em Ciências pelo CPqAm/Fiocruz, Pós-Doutorado em Imunologia pelo CPqAm/Fiocruz. CRM-PE 10.107.

Dr. Carlos Fernando FrancesconiProfessor Associado do Departamento de Medicina Interna da Universidade Federal do Rio Grande do Sul; Professor Titular da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul; Chefe do Serviço de Gastroenterologia do Hospital de Clínicas de Porto Alegre. CRM-SC 4.579.

Dra. Dulce Reis GuaritaProfessora Livre-Docente em Gastroenterologia pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Membro da American Gastroenterological Association. CRM-SP 21.137.

Dr. Enio Chaves de OliveiraMestrado em Medicina Tropical pela Universidade Federal de Goiás (1998) e Doutorado em Medicina (Clínica Cirúrgica) pela Universidade de São Paulo (2004). Professor Adjunto da Universidade Federal de Goiás. Pequisador da Universidade Federal de Minas Gerais e Médico do Hospital de Urgências de Goiânia. CRM-GO 5.808.

Dra. Eponina Maria de Oliveira LemmeProfessora Associada do Depto. de Clínica Médica da Faculdade de Medicina – UFRJ. Chefe da Unidade de Esôfago do Serviço de Gastroenterologia - Hospital Universitário Clementino Fraga Filho – UFRJ. Ex-Presidente da Sociedade Brasileira de Motilidade Digestiva (biênio 2010-11). Membro do FAPEGE, da FBG, biênio 2011-2012. CRM-RJ 52.12884-6.

Dr. Francisco Sérgio Rangel de Paula PessoaTítulo de Especialista em Hepatologia pela Sociedade Brasileira de Hepatologia. Chefe do Serviço de Gastroenterologia do Hospital Geral de Fortaleza. CRM-CE 4.848.

Dr. Guilherme Eduardo Gonçalves FelgaGastroenterologista. Médico Pesquisador do Grupo de Pâncreas do Serviço de Gastroenterologia Clínica do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo. Hepatologista Clínico da Equipe de Transplante Hepático do Hospital Israelita Albert Einstein. CRM-SP 122.055.

AuTORES

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Dr. José Galvão-AlvesChefe da 18ª Enfermaria do Hospital Geral da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro. Professor Titular de Clínica Médica da Universidade Gama Filho e da Faculdade de Medicina da Fundação Técnico-Educacional Souza Marques. Professor de Pós-Graduação em Gastroenterologia da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Membro Titular da Academia Nacional de Medicina. Presidente da Federação Brasileira de Gastroenterologia. Doutor em Medicina pela Faculdade de Medicina da UFMG. CRM-RJ 52.26254-8.

Dr. Joaquim Prado P. de Moraes-FilhoDepartamento de Gastroenterologia – Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – Grupos de Esôfago e Estômago. CRM-SP 13.432.

Dr. Joffre Rezende FilhoProfessor Adjunto Doutor do Serviço de Gastroenterologia e Hepatologia do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Goiás. CRM-GO 3478-5.

Dr. Laércio Tenório RibeiroGastroenterologista. Sócio Titular da FBG. Sócio Titular da SOBED. CRM-AL 1.418.

Dra. Lorete Maria da Silva KotzeDoutora em Medicina, Área de Gastroenterologia Clínica, pela UNIFESP – Escola Paulista de Medicina. Professora Adjunta (aposentada) da Disciplina de Gastroenterologia do Departamento de Clínica Médica do Setor de Ciências da Saúde da UFPR. Professora Titular do Curso de Medicina da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Professora do Curso de Pós-Graduação em Ciências da Saúde da PUCPR. Fellow of the American College of Gastroenterology. Títulos de Especialista em Gastroenterologia, Gastroenterologia Pediátrica e Clínica Médica. Membro Titular da Academia Paranaense de Medicina. Fundadora e Coordenadora Científica da ACELPAR (Associação dos Celíacos do Paraná) filiada à FENACELBRA. CRM-PR 2.219.

Dra. Luciana Dias MoretzsohnProfessora Adjunta Doutora do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da UFMG. CRM-MG 18.575.

Dr. Luiz Gonzaga Vaz CoelhoProfessor Titular do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da UFMG. Subchefe do Instituto Alfa de Gastroenterologia do Hospital das Clínicas da UFMG, Belo Horizonte. CRM-MG 6.666.

AuTORES

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Dr. Marco Antônio ZerôncioTítulo de Especialista pela Federação Brasileira de Gastroenterologia. Títulode Especialista pela Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva. Coordenador do Ambulatório de Doenças Inflamatórias Intestinais da Universidade Potiguar. CRM-RN 3.754.

Dra. Maria do Carmo Friche PassosProfessora Adjunta da Faculdade de Medicina da UFMG e da Faculdade de Ciências Médicas/MG. Pós-Doutora em Gastroenterologia pela Universidade de Harvard/EUA. Coordenadora Científica do FAPEGE. CRM-MG 18.599.

Dra. Maria Helena Itaqui LopesProfessora Titular da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul. CRM-RS 8.668.

Dr. Mauro BafuttoDiretor Clínico e Pesquisador do Instituto Goiano de Gastroenterologia.Diretor Regional Goiás da Associação Brasileira de Colite Ulcerativa e Doença de Crohn. Membro Titular e da Comissão de Título de Especialista da Federação Brasileira de Gastroenterologia. CRM-GO 4.705.

Dr. Milton M. Barbosa da CostaProfessor Titular de Anatomia, Doutor em Medicina pela UFRJ (Cirurgia) e Responsável pelo Laboratório de Motilidade Digestiva/Imagem do ICB/UFRJ. CRM-RJ 170.920.

Dra. Norma Lucena SilvaPesquisadora-Docente do CPqAm/Fiocruz, Doutora em Biologia Molecular pela University of St Andrews (1994), Pós-Doutorado na University of Alberta/Canadá. CRM-PE 8.951.

Dra. Raquel Canzi Almada de SouzaProfessora Adjunta do Departamento de Clínica Médica da UFPR. Mestre e Doutora em Medicina Interna pela UFPR. Médica do Serviçode Endoscopia do HC da UFPR. CRM-PR 11.228.

Dr. Ricardo Correa BarbutiDepartamento de Gastroenterologia – Faculdade de Medicina daUniversidade de São Paulo – Grupos de Esôfago e Estômago. CRM-SP 66.103.

AuTORES

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Dr. Rubens BasileProfessor Assistente de Clínica Médica da Escola de Medicina da Fundação Técnico Educacional Souza Marques e do Centro Universitário de VoltaRedonda UNIFOA. Titular da Federação Brasileira de Gastroenterologia. Titular da Sociedade Brasileira de Hepatologia. CRM-RJ 401.645.

Dr. Sender Jankiel MiszputenProfessor Associado da Disciplina de Gastroenterologia do Departamento de Medicina da Escola Paulista de Medicina – UNIFESP. Presidente do Grupo de Estudos da Doença Inflamatória Intestinal do Brasil – GEDIIB. Secretário Geral da Federação Brasileira de Gastroenterologia. Honorário Nacional da Academia Nacional de Medicina.

Dra. Valéria Ferreira MartinelliMédica do Serviço de Gastroenterologia do Hospital das Clínicas (HC)-UFPE, Responsável pelo Ambulatório de Doenças Inflamatórias Intestinais do HC-UFPE, Mestranda do PPG em Medicina Interna da UFPE. CRM-PE 8.555.

AuTORES

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PrEFÁCio

O FAPEGE (Fundo de Aperfeiçoamento e Pesquisa em Gastroenterologia) é o Departamento da FBG que se dedica à promoção do ensino e aperfeiçoa-mento constante dos seus associados, não apenas possibilitando a reciclagem

dos conhecimentos para a prática médica diária, mas também divulgando novos enfoques e pesquisas emergentes da gastroenterologia. O Curso Pré-Congresso da FBG, que tradicionalmente abre a Semana Brasileira do Aparelho Digestivo (SBAD), é uma das principais atividades do FAPEGE, que procura a cada ano abordar de forma objetiva, prática e atualizada os temas mais palpitantes da nossa especialidade.

Neste ano, o Curso de Terapêutica em Gastroenterologia (“Como eu Trato”) foi mais uma vez cuidadosamente planejado e os temas escolhidos de forma muito criteriosa. Optamos por abordar as doenças de maior prevalência no dia a dia do gastroenterologista, mas que apresentam constantes modificações na sua condução terapêutica e para isso convidamos professores de reconhecida experiência. Dessa maneira, esperamos proporcionar a todos os participantes um real aprofundamento científico e prático.

A FBG, em nome de seu Presidente, Dr. José Galvão-Alves e a equipe do FAPE-GE, composta pelos doutores Maria do Carmo Friche Passos, Eponina M. O. Lem-me e Laércio Tenório Ribeiro agradecem e parabenizam aos queridos professores convidados por mais essa excelente contribuição à gastroenterologia brasileira.

Agradecemos a parceria do Laboratório Takeda (Nycomed), que mais uma vez patrocina o livro com os temas do Pré-Congresso, apoiando sempre a FBG/FAPEGE na sua missão de promover a educação médica continuada no nosso país.

Desejamos a todos um ótimo Congresso. Sejam bem-vindos e desfrutem muito da XI Semana Brasileira do Aparelho Digestivo.

José Galvão-Alves Maria do Carmo Friche PassosPresidente da FBG Coordenadora do FAPEGE

Fortaleza, novembro de 2012

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Terapêutica em Gastroenterologia • 19

suMÁrio

Como eu Trato as Manifestações Extraesofágicas da DRGE _______ 21Dr. Laércio Tenório Ribeiro

Doença do Refluxo não Erosiva __________________________________ 29Dra. Luciana Dias Moretzsohn

Como Eu Trato: Disfagia no Idoso ________________________________ 37Dra. Eponina Maria de Oliveira Lemme • Dr. Milton M. Barbosa da Costa

Dispepsia Funcional _____________________________________________ 49Dr. Ricardo Correa Barbuti • Dr. Joaquim Prado P. de Moraes-Filho

Tratamento da Gastroparesia ____________________________________ 61Dr. Joffre Rezende Filho

Como Tratar: Helicobacter pylori Resistente aoPrimeiro Tratamento? ___________________________________________ 75Dr. Luiz Gonzaga Vaz Coelho

Fase Aguda da Doença de Crohn _________________________________ 83Dr. Marco Antônio Zerôncio

Como Tratar: Fase Aguda da Retocolite Ulcerativa ________________ 87Dr. Carlos Brito • Dra. Valéria Ferreira Martinelli • Dra. Norma Lucena Silva

Tratamento de Manutenção da Doença Inflamatória Intestinal __109Dr. Adérson Omar Mourão Cintra Damião

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Doença de Crohn Estenosante e Fistulizante ____________________119Dr. Sender Jankiel Miszputen

Como Eu Trato: Constipação Intestinal __________________________139Dr. Antônio Carlos Moraes

Como eu Trato: Síndrome do Intestino Irritável com Diarreia ___151Dr. Carlos Fernando Francesconi • Dra. Maria Helena Itaqui Lopes

Tratamento Clínico da Doença Diverticular dos Cólons __________159 Dr. Mauro Bafutto • Dr. Enio Chaves de Oliveira • Dr. Joffre Rezende Filho

Como Eu Trato: Síndrome do Supercrescimento Bacteriano do Intestino Delgado ___________________________________________181Dra. Maria do Carmo Friche Passos • Dra. Ana Flávia Passos Ramos

Medicamento para Celíacos: Qual, Quando, Por Que e Por Quanto Tempo? _____________________________________________193Dra. Lorete Maria da Silva Kotze

Como Tratar a Esteato-Hepatite Não Alcoólica ___________________207Dra. Andrea Benevides Leite Lima Verde • Dr. Francisco Sérgio Rangel de Paula Pessoa

Como eu Trato a Ascite no Cirrótico _____________________________215Dr. Angelo Alves de Mattos

Colelitíase Assintomática – Conduta Conservadora ou Cirúrgica? __ 221Dr. Rubens Basile

Pancreatite Aguda – Terapêutica Clínica _________________________227Dr. José Galvão-Alves

Como Tratar Pancreatopatias – Reposição Enzimática ___________245Dra. Raquel Canzi Almada de Souza

Tratamento da Dor na Pancreatite Crônica ______________________251Dra. Dulce Reis Guarita • Dr. Guilherme Eduardo Gonçalves Felga • Dr. Carlos de Barros Mott

SuMáRIO

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Dr. Laércio T. Ribeiro

Capítulo 1

COMO Eu TRATO AS MAnIFESTAçõES

EXTRAESOFáGICAS DA DRGE

Dr. Laércio Tenório Ribeiro

A POSSIBILIDADE DE TRATAMENTO de uma doença específica de-pende, sempre, do conhecimento de sua fisiopatologia, que servirá de norte à identificação dos medicamentos e medidas que poderão corrigir ou controlar os eventos envolvidos nas suas manifestações. Desta forma, iniciaremos por uma rápida discussão sobre o que se conhece dos me-canismos patogênicos das manifestações extraesofágicas da DRGE para, logo em seguida, discutir as modalidades terapêuticas recomendadas.

Sabemos que há uma lógica anatômica para uma possível relação causal entre sintomas e sinais de irritação da faringolaringe e o refluxo do conteúdo do estômago, devido à continuidade e proximidade do esôfago com estas estruturas. Este material pode, quando em contato direto com a mucosa da faringolaringe, produzir lesão química da mu-cosa e consequente inflamação. Nem sempre, no entanto, este contato é necessário, uma vez que os sintomas podem ser causados por refluxo apenas para o esôfago distal, através da ativação de reflexos nas vias aéreas, como tosse e broncoespasmo.

Parece haver algumas diferenças entre os mecanismos fisiopatoló-gicos envolvidos na doença do refluxo gastroesofagiano (DRGE) e no refluxo laringofaríngeo (RLF). Neste último, as alterações da motilidade esofagiana e a disfunção do esfíncter inferior do esôfago parecem ter menor importância do que na DRGE.(1) Há suspeita do envolvimento

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COMO Eu TRATO AS MAnIFESTAçõES EXTRAESOFáGICAS DA DRGE

do esfíncter superior do esôfago no RLF, porém não há dados que o confirmem inequivocamente.

Os agentes agressores mais conhecidos e estudados, devido à dis-ponibilidade de recursos semiológicos para identificá-los, são o ácido e a pepsina. Esta última é a principal enzima envolvida na digestão das proteínas no trato gastrointestinal, rompendo os complexos juncionais e aumentando os espaços intercelulares, além de favorecer o influxo de íons hidrogênio (H+), levando à lesão celular.(2) Franchi et al.(3) demons-traram a presença de dilatação dos espaços intercelulares na mucosa da laringe nos pacientes portadores de refluxo laringofaríngeo, de forma semelhante ao que acontece no epitélio escamoso do esôfago distal, onde é considerado um marcador morfológico de lesão por ácido. Questionam, assim, se esta alteração no epitélio da laringe não pode ser considerada, da mesma maneira, um marcador de lesão por ácido. Já Johnston et al,(4) em estudo experimental, demonstraram mudanças na resposta normal das proteínas de estresse ácido-mediadas provoca-das pelo contato das células da laringe com a pepsina, levando à lesão celular. Habesoglu et al.(5) demonstraram, experimentalmente, que o contato da mucosa da laringe com o conteúdo gástrico refluído provoca inflamação, congestão vascular, edema subepitelial e queratinização.

Como fator adicional, a mucosa da faringolaringe é muito mais sensível ao ácido/pepsina que a mucosa esofagiana(2) devido a carac-terísticas moleculares específicas. Johnston et al.(6) demonstraram que a E-caderina, que tem função-chave na adesão celular, estava ausente em 37% dos portadores de RLF. Da mesma maneira, há uma deficiência de Anidrase Carbônica III no epitélio da laringe, o que pode torná-lo menos resistente ao ácido.

Outro fator que apresenta potencial de lesar a mucosa da faringo-laringe é a bile. Observações em pacientes submetidos a gastrectomia revelaram correlação significativa entre processo inflamatório crônico e lesões neoplásicas da laringe e o tipo de cirurgia (gastrectomia BII e gastrectomia total), quando comparados com outros tipos de ressecção gástrica.(7) Sasaki et al. realizaram estudo experimental para avaliar o papel de ácidos biliares como fator irritativo para a mucosa da laringe, demonstrando, através de exame histológico, a presença de processo inflamatório semelhante ou maior que o produzido pelo ácido clorí-drico após exposição da mucosa da laringe aos ácidos taurocólico e desoxicólico.(8)

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Dr. Laércio T. Ribeiro

Tabela 1. Componentes do refluxo misto responsável por dano da mucosa em relação ao pH

Para dificultar um pouco mais a caracterização das manifestações extraesofágicas da DRGE (ME-DRGE), publicação de Altmann et al.(9) descreve a presença da bomba de prótons H+/K+-ATPase em células mucosas e dos ductos submucosos da laringe e sugere que os inibidores da bomba de prótons (IBP) podem ter um local de ação nas glândulas seromucinosas da laringe, com possível relevância para os pacientes tratados para laringite crônica, com ou sem doença do refluxo laringo-faríngeo. Um resumo das substâncias presentes no material refluído e sua relação com lesão da mucosa da laringe é apresentado na tabela 1.

Fonte: versão de tabela publicada em Galli J et al. Biliary laryngopharyngeak reflux a new entity. Curr Opin Otoloryngol Head Neck Surgery 2006;14:128-132.

Ambiente ácido Ambiente alcalino

pH 1-2 pH 2-3 pH 7

Lesão da mucosa

Apenas H+

Pepsina Lisolecitina TripsinaSais biliaresnão conjugados

Sais biliaresconjugados

Baseados, então, no que foi descrito acima, teríamos basicamen-te três condutas possíveis para tratar os processos inflamatórios da faringolaringe relacionados a refluxo: inibição ou bloqueio do

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COMO Eu TRATO AS MAnIFESTAçõES EXTRAESOFáGICAS DA DRGE

ácido clorídrico e pepsina, inibição ou bloqueio dos ácidos biliares e, finalmente, a correção dos distúrbios que facilitam o refluxo ou seu bloqueio.

QuEM DEvE SER TRATADO

Antes da discussão sobre a utilização de qualquer das modalidades terapêuticas é necessário definir quais pacientes têm indicação para tratamento. O consenso da American Gastroenterological Associa-tion(11) sugere tratamento ou manutenção para pacientes com suspeita de síndrome extraesofagiana da DRGE (laringite, asma) associada à síndrome esofagiana concomitante da DRGE (recomendação grau B), não recomendando tratamento quando a síndrome esofagiana con-comitante da DRGE está ausente (recomendação grau D) ou para os pacientes com suspeita de síndrome de tosse por refluxo (evidências insuficientes, contra ou a favor). O III Consenso Brasileiro(12) sugere tratamento nos pacientes com asma, hiperatividade brônquica e la-ringite suspeitos de estar relacionados a refluxo. O Consenso Ásia-Pacífico(13) inclui laringite e tosse crônica “relacionadas a refluxo” para tratamento. Poderíamos, portanto, definir como indicações do tratamento os pacientes com laringite, asma, hiperatividade brônquica e tosse crônica, quando houver suspeita de algum papel do refluxo na sua patogênese.

COMO TRATAR

O tratamento das ME-DRGE tem como base o tratamento da DRGE como um todo. Portanto, as orientações higienodietéticas recomendadas para a síndrome esofagiana da DRGE devem, também, fazer parte do tratamento das ME-DRGE, apesar do baixo grau de evidência do seu papel no alívio dos sintomas extraesofágicos.(12) Elevação da cabeceira da cama, cuidados dietéticos que incluem evitar uso de bebidas alcoólicas, de refrigerantes, de líquidos nas refeições e de alimentos gordurosos. Manter o peso dentro dos limites adequados e evitar o tabagismo são outras medidas que devem ser implementadas.

Baseados no conhecimento dos fatores desencadeantes dos distúr-bios extraesofágicos da DRGE, os medicamentos disponíveis para seu tratamento seriam, teoricamente, os procinéticos, como forma de

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Dr. Laércio T. Ribeiro

reduzir os episódios de refluxo através do estímulo ao esvaziamento gástrico e do aumento da pressão do esfíncter inferior do esôfago, e os inibidores da secreção ácida gástrica, isto é, os bloqueadores H2 e os IBP.

Os procinéticos não apresentam evidências científicas que recomen-dem seu uso no tratamento da DRGE, com ou sem sintomas atípicos. Portanto, não dispomos, até o momento, de tratamento medicamentoso eficaz no controle ou diminuição do refluxo. A única opção terapêutica clínica é, então, o bloqueio da secreção ácida gástrica, possível com os bloqueadores H2 e com os IBP. Estes últimos são a escolha para o tratamento em todos os consensos e diretrizes.

A ausência de método de investigação com alta sensibilidade e especificidade para o diagnóstico das ME-DRGE tem dificultado seu diagnóstico de certeza, interferindo, desta forma, nos resultados dos estudos relacionados ao seu tratamento. Não seria produtivo discutir-mos aqui a imensa quantidade de trabalhos científicos realizados com a proposta de avaliar o papel dos IBP nas ME-DRGE. Utilizaremos pesquisas que já se dedicaram à análise crítica da literatura disponível, como meta-análises e revisões sistemáticas, e trabalhos mais recentes que apresentem metodologia adequada. Gatta et al.(14) publicaram meta-análise com a finalidade de avaliar a eficácia dos IBP nos sinto-mas laríngeos relacionados a refluxo, utilizando apenas publicações com o padrão definido pelas diretrizes da Quality of Reporting of Meta-Analysis (QUOROM).(15) Apesar de terem sido encontradas 165 publicações relativas aos termos pesquisados, apenas 5 preencheram os critérios de qualidade exigidos. Após análise desse material, os autores concluíram que o tratamento com altas doses de IBP não é mais efetivo que o placebo no alívio ou resolução dos sintomas larin-gofaríngeos. Estas conclusões foram semelhantes às de revisão siste-mática de Sen et al.(16) Em publicação mais recente, Hanania et al.,(17) em estudo duplo-cego, paralelo, controlado com placebo, avaliaram a eficácia do esomeprazol em pacientes com asma de difícil controle, incluindo 412 pacientes. Concluíram que o tratamento com IBP não melhora o controle da asma.

Estas publicações nos dão uma ideia da dificuldade que é tratar as ME-DRGE. Poderemos utilizar, então, como norte para nossa con-duta, as recomendações contidas das diversas diretrizes, resumidas no quadro 1.

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COMO Eu TRATO AS MAnIFESTAçõES EXTRAESOFáGICAS DA DRGE

Quadro 1. Tratamento das manifestações extraesofágicas da DRGE de acordo com as Diretrizes Brasileira e internacionais

A outra opção terapêutica para as ME-DRGE é o tratamento ci-rúrgico. Devemos ter em mente, entretanto, que se já há restrições à abordagem cirúrgica para a síndrome esofagiana da DRGE em de-corrência dos novos sintomas que podem surgir como consequência desta abordagem, como disfagia, flatulência, incapacidade para eruc-tar e sintomas intestinais pós-cirurgia,(11) os cuidados devem ser muito maiores quando da indicação desta modalidade de tratamento para as ME-DRGE, uma vez que, mesmo quando seguramente associadas ao refluxo, raramente este evento é a única causa de tosse crônica, laringite ou asma.(13) O III Consenso Brasileiro(12) e o Consenso Ásia-Pacífico(13) não citam a indicação cirúrgica para as ME-DRGE, enquan-to o consenso da AGA(11) considera que pacientes com ME-DRGE que apresentam persistência de sintomas apesar do tratamento com IBP devem ser considerados para tratamento cirúrgico, devendo-se avaliar os potenciais benefícios vs. o surgimento de novos sintomas consequentes à cirurgia antirrefluxo.

Poderíamos tentar resumir o que abordamos acima nos itens a seguir:a. Pode ser difícil reconhecer o refluxo como causa de sintomas/

sinais extraesofagianos, uma vez que a maioria dos pacientes não tem sintomas esofagianos típicos (p. ex.: pirose) e os achados clínicos e laringoscópicos são muito inespecíficos;(18)

Diretrizes Indicações para tratamento Forma de tratamento

Consenso da AGA Síndrome extraesofagiana da DRGE (laringe ou asma) com síndrome esofagiana concomitante da DRGE

Tratamento ou manutenção com IBP, 1 ou 2 vezes ao dia

III ConsensoBrasileiro da DRGE

Asma, hiperatividadebrônquica e laringite

Tratamento com IBP,2 vezes ao dia por2 a 6 meses

ConsensoÁsia-Pacífico

Tosse crônica e laringite associados a sintomastípicos de DRGE

Tratamento com IBP,2 vezes ao dia por pelomenos 4 meses

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Dr. Laércio T. Ribeiro

b. Ácido, pepsina e bile são considerados os principais fatores res-ponsáveis pelas síndromes extraesofágicas da DRGE;

c. São consideradas indicações para tratamento laringite, tosse crô-nica, hiperatividade brônquica e asma;

d. O tratamento deve ser realizado com dose plena de IBP duas vezes ao dia durante 2 a 6 meses;

e. O tratamento cirúrgico é uma medida de exceção e dispõe de escassas evidências que o apoiem.

REFERênCIAS

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2. Vardouniotis AS, Karatzanis AD, Tzortzaki E, Athanasakis E, Samara KD, Chalkiadakis G et al. Molecular pathways and genetic factors in the pathogenesis of laryngopha-ryngeal reflux. Eur Arch Otorhinolaryngol 2009;266:795–801.

3. Franchi A, Brogelli B, Massi D, Santuci M, De Campora E, Gallo O. Dilation of intercellular spaces is associated with laryngopharyngeal reflux: an ultras-tructural morphometric analysis of laryngeal epithelium. Eur Arch Otolaringol 2007;264:907-911.

4. Johnston N, Dettmar PW, Lively MO, Postma GN, Belafsky PC, Birchall M et al. Effect of pepsin on laryngeal stress protein (Sep70, Sep53, and Hsp70) response: role in laryngopharyngeal reflux disease. Ann Otol Rhinol Laryngol 2006;115:47-58.

5. Habesoglu M, Habesoglu TE, Gunes P, Kinis V, Toros SZ, Eriman M et al. How does reflux affect laryngeal tissue quality? An experimental and histopathologic animal study. Otolaryngology-Head and Neck Surgery 2010;143:760-764.

6. Johnston N, Bulmer D, Gill GA, Panetti M, Ross PE, Pearson JP et al. Cell biology of laryngeal epithelial defenses in health and disease: further studies. Ann Otol Rhinol Laryngol 2003;112:481-491.

7. Galli J, Caló L, Agostino S, Cadoni G, Sergi B, Cianci R et al. Bile reflux as possible risk factor in laryngopharyngeal inflammatory and neoplastic lesions. Acta Otorhi-nolaryngol Ital 2003;23:377-382.

8. Sasaki CT, Marotta J, Hundal J, Chow J, Wisen RN. Bile-induced laryngitis: is there a basis in evidence? Ann Otol Rhinol Laryngol 2005;114:192-197.

9. Altman KW, Haines III GK, Hammer ND, Radosevich JA. The H+/K+-ATPase (pro-ton) pump is expressed in human laryngeal submucosal glands. Laryngoscope 2003;113:1927-1930.

10. Galli J, Cammarota G, De Corso E, Agostino S, Cianci R, Almadori G et al. Biliary laryngopharyngeal reflux: a new pathological entity. Curr Opin Otolaryngol Head Neck Surg 2006;14:128-132.

11. The American Gastroenterological Association Institute Medical Position Panel. American Gastroenterological Association Medical Position Statement on the Ma-nagement of Gastroesophageal Reflux Disease. Gastroenterol 2008;136:1383-1391.

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COMO Eu TRATO AS MAnIFESTAçõES EXTRAESOFáGICAS DA DRGE

12. Moraes-Filho JPP, Navarro-Rodriguez T, Barbuti R, Eisig J, Chinzon D, Bernardo W and the Brazilian GERD Consensus Group. Guidelines for the diagnosis and management of gastroesophageal reflux disease: an evidence-based consensus. Arq Gastroenterol 2010;47:99-115.

13. Fock KM, Talley NJ, Fass R, Goh KL, Katelaris P, Hunt R et al. Asia-Pacific consensus on the management of gastroesophageal reflux disease: Update. J Gastroenterol Hepatol 2008;23:08-22.

14. Gatta L, Vaira D, Sorrenti G, Zucchini S, Sama C, Vakil N. Meta-analysis: the efficacy of proton pump inhibitors for laryngeal symptoms attributed to gastro-oesophageal reflux disease. Aliment Pharmacol Ther 2007;25:385-392.

15. Moher D, Cook DJ, Eastwood S, Olkin I, Rennie D, Stroup DF, for the QUOROM group. Improving the quality of reports of meta-analyses of randomized controlled trials: the QUOROM statement. Lancet 1999;354:1896-1900.

16. Sen P, Georgalas C, Bhattacharyya AK. A systematic review of the role of proton pump inhibitors for symptoms of laryngopharyngeal reflux. Clin Otolaryngol 2006;31:20-24.

17. Hanania NA et al. Efficacy of esomeprazole for treatment of poorly controlled asthma. New England J Med 2009;360:1487-1499.

18. Postma GN, Halum SL. Laryngeal and pharyngeal complications of gastroesophageal reflux disease. Gastrointest Motility Online 2006;doi:10.1038/gimo46;Published 16 May 2006.

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A Gastroenterologia na Prática Clínica • 29

Dra. Luciana Dias Moretzsohn

Capítulo 2

DOEnçA DO REFLuXO nãO EROSIvA

Dra. Luciana Dias Moretzsohn

A DOENÇA DO REFLUXO GASTROESOFÁGICO (DRGE) é definida quando o refluxo do conteúdo gástrico atinge o esôfago, causando sintomas e/ou lesões na mucosa do órgão, associadas ou não a com-plicações. Essa afecção tem alta prevalência (10% a 20% da população ocidental e 5% entre asiáticos), sendo definida pela presença de sintomas típicos (pirose ou regurgitação) pelo menos uma vez por semana.(1,2)

DEFinição DE DoEnça Do rEFluxo não Erosiva (DrnE)

A maioria dos indivíduos (≈ 60%) com sintomas típicos de DRGE não apresenta, ao exame endoscópico convencional, alterações da mucosa esofágica, como presença de erosões ou epitélio metaplásico. Esses pacientes de um modo geral são considerados portadores de doença do refluxo gastroesofágico não erosiva (DRNE).(3,4) Entretanto, para o diagnóstico de DRNE são necessárias evidências de que os sintomas referidos pelo paciente sejam desencadeados pelo refluxo gastroesofá-gico ácido. Essas evidências podem ser obtidas através de boa resposta ao tratamento empírico com inibidores de bomba protônica (IBP) ou, preferencialmente, com emprego da pHmetria esofágica prolongada.

A pHmetria esofágica prolongada pode apresentar três resultados:- refluxo ácido gastroesofágico anormal que define o diagnóstico

de DRGE;- refluxo ácido gastroesofágico normal, porém com associação posi-

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DOEnçA DO REFLuXO nãO EROSIvA

tiva entre episódios de refluxo ácido e sintomas referidos pelo paciente, o que define o diagnóstico de esôfago hipersensível;

- refluxo ácido gastroesofágico normal e ausência de associação entre sintomas e episódios de refluxo ácido, caracterizando a pirose funcional. A pirose funcional não é parte do espectro da DRNE de acordo com os critérios de Roma III.(5)

A tabela 1 ilustra os possíveis achados da pHmetria prolongada e a classificação dos pacientes.

Tabela 1. Diagnóstico de pacientes com sintomas típicos de DRGE e mucosa esofágica endoscopicamente normal através de pHmetria prolongada

pHmetria Diagnóstico Classificação

RGE anormal DRGE DRNE

RGE normal e IS positivo Esôfago hipersensível

RGE normal e IS negativo Pirose funcional Distúrbio funcional TGI

RGE: refluxo ácido gastroesofágico, IS: índice de sintomas, DRNE: doença do refluxo gastroesofágico não erosiva, DRGE: doença do refluxo gastroesofágico, TGI: trato gastrointestinal.

ASPECTOS DEMOGRáFICOS, CLínICOS E PSICOLóGICOS

Existem divergências sobre aspectos epidemiológicos e clínicos na DRNE. Grande parte dos estudos publicados não utilizou critérios de Roma III(5) para seleção de participantes, sendo, dessa forma, contami-nados com pacientes com pirose funcional.

Estudo de Lee et al.,(6) que selecionou participantes de acordo com critérios de Roma III, observou que pacientes com DRNE apresentam características muito semelhantes às dos portadores de esofagite erosiva. Esses indivíduos são pouco ansiosos, apresentam menos sintomas rela-cionados aos distúrbios funcionais gastrointestinais e têm distribuição de sexo semelhante. Pacientes com pirose funcional são em sua maioria do sexo feminino, apresentam maiores níveis de ansiedade, além de sintomas funcionais principalmente relacionados à síndrome do intestino irritável.

Portadores de DRNE e esofagite erosiva apresentam características do refluxo ácido e resposta ao tratamento com IBP semelhantes. A intensi-dade ou especificidade de sintomas não nos permite distinguir pacien-tes desses dois grupos, bem como predizer o achado endoscópico.(4)

Não sabemos se os sintomas noturnos da DRGE são mais prevalentes

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Dra. Luciana Dias Moretzsohn

entre pacientes com esofagite erosiva em relação à DRNE. No entanto, o comprometimento da qualidade de vida dessas duas populações parece ser similar.(7)

EnDOSCOPIA DIGESTIvA ALTA nA DRnE

O tratamento empírico com IBP em pacientes com queixas típicas de DRGE é frequente na prática clínica, sendo a endoscopia digestiva reservada para indivíduos que não responderam de forma adequada a essa terapia. O uso de IBP precedendo o exame endoscópico nesses casos pode sugerir o diagnóstico de DRNE em pacientes com esofagite erosiva cicatrizada. Essa conduta pode comprometer a condução clínica desses indivíduos.(8)

Por definição, a DRNE pressupõe a presença de mucosa esofágica normal à endoscopia convencional. Na tentativa de identificar alterações mínimas da mucosa esofágica secundárias ao refluxo gastroesofágico, técnicas endoscópicas avançadas têm sido utilizadas. Nakamura et al.,(9) utilizando endoscópios de alta resolução, identificaram alterações míni-mas da mucosa esofágica como áreas hiperemiadas ou pálidas na junção esofagogástrica, além de perda do padrão vascular, que poderiam ser secundárias a DRGE. Sharma et al.,(10) utilizando técnica de magnificação e cromoscopia digital (“narrow band imaging”) observaram, em porta-dores de DRNE, alças capilares intrapapilares mais numerosas, tortuosas e dilatadas, além de microerosões. Chu et al.,(11) utilizando técnica de endomicroscopia confocal, identificaram essas mesmas alterações em alças capilares intrapapilares em pacientes com DRGE.

Entretanto, essas recentes técnicas, além de indisponíveis na maioria dos centros, precisam ser validadas principalmente com relação à concordância interobservador.

ESTuDOS hISTOPATOLóGICOS DA MuCOSA ESOFáGICA

Achados histopatológicos relacionados à DRGE descritos na litera-tura incluem espessamento da camada basal, alongamento de papilas, infiltrado de células intraepiteliais, dilatação dos espaços intercelulares e ectasia de capilares intrapapilares. A maioria desses achados é uma expressão do aumento da regeneração epitelial e eles apresentam, em comum, normalização do epitélio após uso de antissecretores. De acor-

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DOEnçA DO REFLuXO nãO EROSIvA

do com meta-análise apresentada por Dent et al.,(12) essas alterações que traduzem processo inflamatório intraepitelial são um marcador inadequado na DRNE, visto não ser frequente a presença de células inflamatórias nessa afecção.

A dilatação de espaços intercelulares, apesar de ser achado universal na DRGE e regredir após tratamento com IBP, também é observada em diversas outras condições, como monilíase esofágica, esofagite eosino-fílica, neoplasia do esôfago e mesmo em controles assintomáticos.(13)

Em síntese, alterações histopatológicas da mucosa esofágica não são específicas para diagnóstico da DRGE.

MéTODOS DE MOnITORIzAçãO DO REFLuXO GASTROESOFáGICO

Estudo de Smith et al.,(14) utilizando teste de Bernstein, reforça o papel do refluxo ácido na geração dos sintomas na DRNE. Nesse estudo, todos os participantes experimentaram dor com infusão de soluções com pH entre 1,0 e 1,5 no esôfago distal e 80% deles relataram o sintoma com infusão de solução com pH 2,0. O tempo de início dos sintomas foi estatisticamente maior em soluções com pH mais alto.

Diretrizes do American College of Gastroenterology sobre testes de função esofágica definem o papel da pHmetria, pH-impedanciometria e monitorização de refluxo biliar.(15) A pHmetria esofágica é um exame útil no diagnóstico diferencial entre DRNE e pirose funcional. Portalle et al.(16) estudaram a exposição ácida esofágica e geração de sintomas e observaram que 50% dos episódios de refluxo sintomático ocorrem no período pós-prandial. Apenas 6% dos episódios de refluxo ácido associaram-se com sintomas típicos de DRGE e essa associação parece ter sido influenciada pela acidez do refluxato.

A monitorização com pH-impedanciometria pode ser útil, distinguin-do melhor portadores de DRNE e pirose funcional.(17) Sifrim et al.(18) observaram que refluxos fracamente ácidos (pH entre 4,0 e 7,0) medidos por meio de pH-impedanciometria associam-se com regurgitação e sin-tomas extraesofágicos da DRGE. Mecanismos de sintomas desencadea-dos pelo refluxo fracamente ácido ainda são mal esclarecidos. Alguns estudos sugerem que o alcance proximal do refluxo fracamente ácido seria responsável pela geração de sintomas. Esse fenômeno poderia ser explicado por hipersensibilidade em esôfago proximal em relação ao segmento distal, ou a um aumento de receptores sensíveis à dor

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Dra. Luciana Dias Moretzsohn

na mucosa do órgão. Características dos refluxos que desencadeiam o sintoma de pirose incluem refluxo fracamente ácido com pH mais pró-ximo de quatro, refluxos puramente líquidos ou precedidos por refluxo ácido.(19-21) Em pacientes refratários ao tratamento com antissecretores, a pH-impedanciometria realizada em vigência de uso de IBP comparada à pHmetria isolada aumenta o rendimento diagnóstico em 15% a 20%, por oferecer melhor análise de correlação de sintomas.(22)

Exposição esofágica a secreções biliares associadas a ambiente ácido ou fracamente ácido é capaz de lesar a integridade da mucosa em mo-delos experimentais, e pode gerar sintomas dolorosos em humanos.(23,24)

Entretanto, estudo que comparou pacientes com sintomas de DRGE responsivos ao uso de IBP com aqueles refratários a essa terapia mos-trou que exposição esofágica biliar é semelhante nos dois grupos. Esse achado sugere papel secundário de sais biliares na gênese de sintomas na DRGE.(25) A monitorização do refluxo biliar não é indicada na pes-quisa de sintomas em portadores de DRNE na prática clínica.

ABORDAGEM CLínICA DE PACIEnTES COM DRnE

Pacientes com sintomas típicos de DRGE e mucosa esofágica normal devem ser submetidos a tratamento com IBP em dose padrão por, no mínimo, quatro semanas. Em caso de falência desse tratamento, o aumen-to da dose do IBP (duas vezes ao dia) é uma prática comum, apesar da falta de evidências objetivas de que essa abordagem promova melhora sintomática. Em caso de resposta, essa medicação (uma ou duas vezes ao dia) deve ser mantida por 12 semanas. Após esse período devemos diminuir a dose do IBP para aquela menor que mantenha o paciente assintomático, considerando inclusive o tratamento intermitente ou em demanda.(26) Caso não haja resposta satisfatória ao uso de IBP duas vezes ao dia, é provável que esse indivíduo seja portador de pirose funcional. Entretanto, existe a possibilidade de que a resistência ao tratamento deva-se ao controle inadequado da secreção ácida gástrica (escape ácido noturno) ou a sensibilidade do paciente ao refluxo fracamente ácido. Dessa forma, a realização da pH-impedanciometria em vigência do uso de IBP duas vezes ao dia permite-nos avaliar a associação entre sintomas e refluxo fracamente ácido ou ácido residual. Caso não haja associação entre sintomas e refluxo gastroesofágico (ácido ou fracamente ácido), esse paciente é portador de pirose funcional.(27)

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DOEnçA DO REFLuXO nãO EROSIvA

ABORDAGEM CIRúRGICA nA DRnE

Apesar de a cirurgia ser uma opção de tratamento na DRNE, essa decisão deve ser bem avaliada. A DRNE é uma entidade benigna, com mínimo risco de evolução para formas complicadas da DRGE como esôfago de Barrett.(28) Pacientes que não responderam de for-ma completa ao uso de IBP não são bons candidatos a essa terapia, visto a possibilidade de serem portadores de pirose funcional. Sendo assim, potenciais candidatos ao tratamento cirúrgico (fundoplicatura) são aqueles que responderam de forma satisfatória ao uso de IBP e apresentam evidências objetivas da associação de seus sintomas com refluxo ácido. Até o momento não está definido o papel da ci-rurgia antirrefluxo em pacientes com sintomas associados ao refluxo fracamente ácido.

COnCLuSõES

- DRNE é definida pela presença de sintomas típicos da DRGE (pirose e regurgitação) em pacientes com mucosa esofágica normal à endoscopia convencional, e evidências de associação dos sintomas com refluxo gastroesofágico ácido.

- A pHmetria esofágica pode identificar portadores de DRNE ao diagnosticar refluxo ácido gastroesofágico anormal (DRGE) ou esôfago hipersensível.

- Há expectativa de que técnicas avançadas de endoscopia como magnificação, cromoscopia digital e endomicroscopia confocal possam contribuir no diagnóstico da DRNE ao identificar alterações discretas da mucosa esofágica provocadas pela DRGE.

- Estudo histopatológico da mucosa esofágica não identifica altera-ções específicas associadas a DRGE.

- pH-impedanciometria pode aumentar o rendimento diagnóstico da DRNE.

- O tratamento clínico da DRNE baseia-se no uso de IBP.- Indicação de tratamento cirúrgico na DRNE deve ser avaliado de

forma cuidadosa e restringe-se aos pacientes que responderam bem ao uso de IBP e apresentam evidências objetivas da associação de seus sintomas com refluxo ácido.

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A Gastroenterologia na Prática Clínica • 35

Dra. Luciana Dias Moretzsohn

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Dra. Eponina Maria de oliveira lemme • Dr. Milton M. Barbosa da Costa

Capítulo 3

COMO Eu TRATO: DISFAGIA nO IDOSO

Dra. Eponina Maria de Oliveira LemmeDr. Milton M. Barbosa da Costa

A DEGLUTIÇÃO pode ser dividida em quatro fases: 1. Preparatória oral, que é responsável pela mastigação e insalivação; 2. Fase oral, que é voluntária, na qual ocorre, além da qualificação,

o posicionamento e transporte do bolo alimentar até a faringe; 3. Fase faríngea, que, associada à proteção das vias aéreas, é a res-

ponsável pelo transporte do bolo da faringe para o esôfago; 4. Fase esofágica, na qual o bolo é transportado pelo esôfago até o

estômago. Disfagia sensu latu significa dificuldade de deglutição, mas o termo

é utilizado para designar qualquer dificuldade anormal entre o ato da deglutição até sua chegada ao estômago.

Disfagia é um achado frequente na população geriátrica. Estima-se que 60-87% da população de residentes em casas de apoio tenham dificuldades na alimentação.(1) A disfagia nos idosos, ou seja, nos indi-víduos que apresentam 60 anos ou mais, pode se tornar mais grave por problemas cognitivos, físicos e psiquiátricos, comuns nesta faixa etária e piora o prognóstico de qualquer doença associada.

Alterações da fisiologia têm sido demonstradas em idosos, tais como anormalidades no esfíncter superior e faringe, aumento da frequência de falhas na peristalse esofagiana, maior prevalência de hérnias hiatais e consequentemente baixa pressão do esfíncter esofagiano inferior, além de alterações da percepção sensorial.(2) Entretanto, nem todos os idosos

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COMO Eu TRATO: DISFAGIA nO IDOSO

apresentam disfagia, fazendo crer que, embora existam alterações na idade avançada, elas nem sempre são sintomáticas.

Existem dois tipos básicos de disfagia em relação à sua localização e mecanismos fisiopatológicos, as disfagias orofaringeias e as disfagias esofagianas. O idoso pode apresentar ambos os tipos de disfagia.

DISFAGIA OROFARInGEIA

As disfagias orais e faríngeas, designadas como orofaringeias (DOF), são causadas por alterações que afetam a cavidade oral, a faringe e em especial o esfíncter esofagiano superior. Na fase oral, disfunções dos músculos da mastigação podem afetar o preparo, qualificação, a organi-zação e ejeção do bolo que será deglutido. Na área da faringe, alterações da condução e abertura inadequada da transição faringoesofágica (TFE), em tempo e dimensão, são as principais causas de comprometimento. A abertura da TFE, dependente da dinâmica hiolaríngea, também atua como importante elemento na mecânica de proteção das vias aéreas.(3)

As causas mais frequentes de DOF são as neuromusculares e a maioria dos pacientes é idosa (quadro 1).

Características clínicas A DOF é de localização na região cervical, com frequência acompanha-

da de engasgos e algumas vezes de regurgitação de líquidos pelas fossas nasais. As refeições são longas, o que frequentemente afasta os idosos do convívio familiar. Com o prolongamento do quadro, podem ocorrer perda de peso e desnutrição. A possibilidade de aspiração que muitas vezes acompanha o quadro leva ao desenvolvimento de pneumonias e óbitos. É frequente o paciente “se alimentar tossindo”, sugerindo pelo menos tentativa de proteção das vias aéreas. A retenção de saliva ou re-síduos na faringe gera a alteração vocal conhecida como “voz molhada”.

diagnósticoO diagnóstico da DOF nos idosos se inicia pela suspeição, por meio

de uma história cuidadosa.(2) As circunstâncias do início, duração e pro-gressão da disfagia, na maioria das vezes, dão importantes subsídios para o diagnóstico. O início súbito, frequentemente associado a outros sinais ou sintomas neurológicos, usualmente sugere um evento cerebrovascular, sendo que os acidentes vasculares encefálicos (AVEs) são a causa mais

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Dra. Eponina Maria de oliveira lemme • Dr. Milton M. Barbosa da Costa

Quadro 1. Causas de disfagia orofaringeia(1)

Sistema Nervoso Central

Acidente vascular encefálico Síndrome extrapiramidal (Parkinson, coreia de Huntington, doença de Wilson) Tumores do tronco cerebral Doença de Alzheimer Esclerose lateral amiotrófica Drogas (ver quadro 2)

Sistema Nervoso Periférico

Atrofia muscular espinhal Síndrome de Guillan-Barré Síndrome pós-polimielite Drogas (toxina botulínica, procainamida, citotóxicos)

Miogênica

Miastenia gravis Dermatomiosite, polimiosite Miopatia tireotóxica Síndrome paraneoplásica Drogas (amiodarona, álcool, drogas redutoras de colesterol)

Alterações estruturais

Divertículo de Zencker Barra ou estenose do cricofaríngeo Anel cervical Tumores de orofaringe Cirurgia de cabeça e pescoço Radioterapia

frequente de DOF no idoso.(1) Vertigens, náuseas, vômitos, soluços, rou-quidão, diplopia, ajudam a localizar a lesão quando no tronco cerebral. Sintomas neuromusculares mais amplos, tais como disartria, diplopia, fraqueza de membros ou fadiga, podem sugerir etiologia muscular ou comprometimento do neurônio motor. O paciente idoso com DOF ne-cessita de uma cuidadosa investigação, que deve ter como objetivo:

1. identificar achados de doença sistêmica ou metabólica; 2. localizar quando possível, o nível neuroanatômico e a gravidade

da lesão neurológica causadora, se presente; 3. detectar alterações tais como possibilidade de aspiração, sepse

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COMO Eu TRATO: DISFAGIA nO IDOSO

pulmonar ou deficiência nutricional, que são importantes indicadores da gravidade da disfagia.

Na maioria das vezes, entretanto, o paciente se apresenta cronicamen-te doente, com graus mais ou menos intensos de disfagia e dependendo da duração e intensidade do quadro, comprometimento mais ou menos importante do estado geral.

Métodos complementaresVideofluoroscopia da deglutiçãoÉ método radiológico não invasivo, que registra em tempo real a

dinâmica das fases da deglutição, sendo considerado o método que mais subsídios oferece ao estudo das fases oral e faríngea da deglutição.(3) Deve iniciar a investigação no idoso, a menos que haja uma forte suspeição de lesão tumoral. Além da análise qualitativa dos fenômenos registrados, permite a quantificação em dimensão e tempo, das estruturas e eventos, a baixas doses de radiação, considerando-se o custo-benefício do método.(4) Permite observar a eficiência do preparo, da organização e da ejeção do bolo no ato da deglutição, a presença de escapes do conteúdo da oro para a rinofaringe, o trânsito faríngeo, a efetividade da abertura da transição faringoesofágica e eficiência dos mecanismos de proteção das vias aéreas, que quando ineficientes se caracterizam por penetração e/ou aspiração.(4)

Estudo endoscópico funcional da deglutiçãoFESS (functional endoscopic swallow study) permite a visão direta

das estruturas e da dinâmica faríngea com emprego do fibroscópio, sendo portanto limitada a este segmento.(5) De introdução nasal, além de poder avaliar a existência ou não de doenças orgânicas, a estrutura faríngea, a morfologia do adito laríngeo e a dinâmica das pregas vocais podem ser diretamente observadas, assim como a abertura e fechamento da transição faringoesofágica. Com o uso de corantes pode-se analisar a eficácia da proteção das vias aéreas. Um de seus maiores ganhos é a possibilidade de definir a maior ou menor capacidade reflexa de pro-teção das vias aéreas com o emprego de pulso de ar, ou leve toque em nível das paredes que delimitam o espaço interaritenoide.

Estudo manométrico da faringe e esfíncter superiorUsualmente realizado em associação ao do esôfago, pode informar

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Dra. Eponina Maria de oliveira lemme • Dr. Milton M. Barbosa da Costa

os valores pressóricos da faringe, a eficácia da abertura do esfíncter inferior e sua coordenação com o pico de contração faringeia. Sua associação com a videofluoroscopia (videomanometria), método ainda não plenamente difundido, prenuncia ganho para os dois métodos.(6)

tratamento Como referido, a causa mais frequente de DOF no idoso são as se-

quelas dos AVEs, estimando-se que 50% dos mesmos se acompanhem de disfagia.(2)

Há duas formas principais de apresentação da DOF no idoso: 1. disfagia aguda total, com doença neurológica evidente ou mesmo sem qualquer sequela neurológica, devendo o paciente ser hospitalizado. 2. O paciente se apresenta com disfagia crônica, com evidências de doen-ças neurológicas/musculares ou sem qualquer outra sintomatologia, podendo ser investigado em nível ambulatorial.

Os princípios da abordagem envolvem a identificação de doença tratável, a localização do nível neuroanatômico e sua gravidade, uma vez que a maioria das DOFs no idoso tem envolvimento neuromuscular e, por fim, detectar complicações e sequelas, tais como evidências de aspiração e desnutrição.

A investigação diagnóstica pode chegar a causas passíveis de trata-mento clínico, tais como as miopatias inflamatórias, a miastenia gravis, a doença de Parkinson e o hipertireoidismo, com melhora acentuada da disfagia.(1,2)

Das lesões estruturais, os carcinomas de esôfago e os tumores da cabeça e pescoço devem ter tratamento específico de acordo com sua etiologia.(2)

O tratamento do divertículo de Zenker é cirúrgico. Pode ser reali-zado por procedimentos externos como a miotomia do cricofaríngeo associada a diverticulectomia, porém abordagem endoscópica tem sido frequentemente utilizada. Esta envolve divisão do septo comum que separa o esôfago da bolsa diverticular, permitindo a passagem dos ali-mentos. A terapêutica endoscópica envolve vantagens de curto período de hospitalização (1-2 dias) e baixa taxa de complicações.(2)

Na maioria dos idosos, como a DOF é consequência de uma doença neurológica, ou neuromuscular, associada ou não a outras comorbida-des, frequentes nesta faixa etária, o paciente pode estar acamado, com alterações do sensório, havendo possibilidade de aspiração pulmonar.

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COMO Eu TRATO: DISFAGIA nO IDOSO

Frequentemente há necessidade de uma equipe multidisciplinar com-posta pelo médico, fisioterapeuta, fonoaudióloga e nutricionista no manejo destes pacientes.

É importante a avaliação do estado dos dentes e próteses mal ajus-tadas, que podem contribuir sobremaneira para disfagia, uma vez que dificultam a mastigação. Xerostomia é um fenômeno natural nos idosos e em muitos deles agravada pelo uso de medicação com propriedades anticolinérgicas, o que dificulta a insalivação adequada dos alimentos, que é fundamental para uma deglutição satisfatória.

A conduta se baseia em:(1) 1. Cuidados gerais e dietéticos - Atenção para o estado nutricional do

paciente, pois haverá necessidade de modificação da consistência da dieta, que deve preservar o valor calórico e o aporte adequado de nutrientes.

2. Uso de sondas/gastrostomia – as sondas nasogástrica/nasoenteral são empregadas em pacientes acamados, com sensório reduzido ou com disfagia importante, sendo necessárias para a alimentação, visando manter o estado nutricional e prevenir ou minimizar os riscos de aspiração. Se a disfagia persiste por 3-4 semanas deve-se considerar a realização de gastrostomia endoscópica para alimentação por longos períodos.

3. Reabilitação da deglutição - a reabilitação da deglutição por meio de exercícios de fortalecimento dos músculos e estruturas envolvidos na deglutição é bastante utilizada, ressaltando-se o papel dos fonoaudió-logos neste particular. Podem ser realizadas manobras de estimulação térmica e gustativa, técnicas facilitatórias e ajustes posturais para melhor deglutição. É importante assinalar que a aplicação destas técnicas é fun-ção direta do sensório do paciente e de sua compreensão às ordens que lhe estão sendo dadas. Há baixo nível de evidência da eficácia destas técnicas, porém o seu baixo custo, a ausência de risco e principalmente na falta de melhor alternativa, o seu uso é justificado.

4. Miotomia do cricofaríngeo – este procedimento cirúrgico tem como objetivo resgatar a deglutição pela via natural e reduzir ou eliminar o risco de aspiração. A miotomia deve ser considerada se há demora na recuperação ou melhora da DOF com os tratamentos citados. Preditores do sucesso do procedimento seriam ato de deglutição intacto, força propulsiva da língua e faringe adequados, evidência radiológica ou manométrica de resistência a nível do esfíncter superior e bom prog-nóstico da doença de base.(1) A meta-análise envolvendo 15 estudos não controlados e 230 pacientes portadores de doenças neuromuscu-

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Dra. Eponina Maria de oliveira lemme • Dr. Milton M. Barbosa da Costa

lares submetidos a este procedimento demonstrou bons resultados em 20-100% dos pacientes, em média 60%.(7) Os autores fazem ressalvas para a ausência de estudos prospectivos e para as diferentes formas de avaliação dos resultados.(7)

5. Toxina botulínica – é um potente inibidor da liberação de acetilcolina e quando aplicada no músculo cricofaríngeo por via endoscópica ou trans-cutânea pode reduzir a sua pressão. Experiências limitadas sugerem que a terapia com a toxina botulínica possa ter alguma utilidade na DOF.(1)

DISFAGIA ESOFAGIAnA Na disfagia esofagiana ou de transporte, a dificuldade de passagem

do alimento ocorre após o ato da deglutição. As causas de disfagia eso-fagiana no idoso podem ser de natureza orgânica, quando existe um distúrbio obstrutivo, seja de natureza intrínseca ou extrínseca, benigna ou maligna ou de origem neuromuscular, quando a alteração responsável pelo sintoma é um distúrbio da motilidade esofágica. Estes distúrbios podem ser primários, quando a alteração motora esofagiana é a própria manifestação da doença ou secundários, se a doença de base é sistêmica e o comprometimento esofagiano apenas uma de suas manifestações.(8)

As causas mais frequentes de disfagia no idoso estão listadas no quadro 2.

Quadro 2. Causas mais frequentes de disfagia esofagiana no idoso(2)

Alterações motoras Alterações estruturais

Acalasia Carcinomas

Espasmo difuso Estenose péptica

Esclerodermia e outras associações reumatológicas Anéis

Dismotilidade ligada a refluxo Compressão vascular

Motilidade ineficaz e outros distúrbios inespecíficos Estenose por medicamentos

Características clínicasA anamnese é fundamental para o diagnóstico da disfagia esofagiana,

uma vez que na maioria dos casos o exame físico é pobre. Por ocorrer

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COMO Eu TRATO: DISFAGIA nO IDOSO

após o ato da deglutição, a disfagia esofagiana não se acompanha de engasgos e é descrita na região retroesternal ou próximo ao apêndice xifoide. A disfagia quando de natureza orgânica é progressiva em rela-ção à consistência alimentar, se iniciando para sólidos, evoluindo para alimentos pastosos e finalmente líquidos.

Nas doenças neuromusculares, a disfagia também é de localização baixa, algumas vezes referida na região cervical (alta referida), mas sem engasgos. Ocorre tanto para alimentos sólidos como para alimentos líquidos e na dependência da doença em questão ela é intermitente ou lentamente progressiva. Fatores psíquicos tais como ansiedade e emoções podem agravar a disfagia.

diagnósticoO diagnóstico da disfagia esofagiana no idoso, tal como na DOF,

se inicia pela suspeição, por meio de uma história cuidadosa.(2) As circunstâncias do início, duração e progressão da disfagia também fornecem importantes subsídios para o diagnóstico. O início súbito de disfagia para sólidos acompanhada de sensação de desconforto torácico e sialorreia sugere impactação de corpo estranho em áreas estenosadas benignas, de natureza péptica ou por esofagite medica-mentosa e ainda por anéis, sendo o mais frequente o anel de Shatzki, situado na junção esofagogástrica. A estenose péptica no idoso pode ser a primeira manifestação da DRGE neste grupo, uma vez que os sintomas típicos podem ser ocasionais ou passar despercebidos. A estenose por esofagite medicamentosa ocorre devido ao uso de vários medicamentos simultaneamente, inclusive os que são relacionados à esofagite química, tais como alendronato, quinidina, cloreto de potássio e antibióticos. A ingestão destes medicamentos em posição supina e com pouco líquido, associada aos estreitamentos naturais do esôfago que se fazem mais presentes no idoso, são os responsáveis por esta complicação.

Na maioria das vezes, entretanto, o paciente se apresenta cronica-mente doente. Disfagia progressiva com importante emagrecimento em curto espaço de tempo, antecedentes de tabagismo e etilismo, sugerem lesão maligna. Disfagia exclusiva para sólidos de longa duração ou lentamente progressiva é característica das estenoses benignas. O paciente muitas vezes se adapta a outras consistências alimentares e mantém o estado geral. Antecedentes de pirose e re-

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Dra. Eponina Maria de oliveira lemme • Dr. Milton M. Barbosa da Costa

gurgitação ácida apontam para estenose péptica, histórico associa-do de alterações cutâneas, articulares e/ou fenômeno de Raynaud sugerem colagenoses.

Disfagia intermitente para sólidos e líquidos, entremeada de episó-dios de dor torácica, sugere alteração de caráter neuromuscular, como por exemplo espasmo esofagiano difuso, que pode acometer a faixa etária acima dos 60 anos.(9) Disfagia para sólidos e líquidos de longa duração, com estado geral relativamente conservado, acompanhada de regurgitações de material salivar ou alimentar, surgindo até horas após as refeições, sugere acalasia. As regurgitações não raramente surgem à noite, provocando tosse, engasgos, sensação de sufocação e eventualmente infecção respiratória. Idosos com acalasia podem se desnutrir com o passar do tempo, não sendo incomum que se apre-sentem até com grau de caquexia crônica, permanecendo restritos ao leito, com possibilidade de aspiração devido às regurgitações. Nas fases iniciais da doença pode haver dor torácica espontânea, que melhora com ingestão de líquidos, podendo preceder o surgimento da disfagia.(9) Um estudo comparativo demonstrou que idosos com acalasia têm tempo de doença maior e menos pirose e dor torácica do que os não idosos.(10)

O exame físico de idosos com disfagia esofagiana pode mostrar evidências de doenças sistêmicas associadas, possíveis sinais metastá-ticos, em casos de lesão maligna e até desnutrição, na dependência da intensidade e duração do quadro. Os pacientes com disfagia de origem neuromuscular mantêm o estado geral, em sua maioria.

Métodos complementaresA investigação complementar da disfagia esofagiana deve se iniciar

com a endoscopia digestiva alta (EDA), em casos de suspeita de disfagia orgânica. As neoplasias são observadas e biopsiadas, sendo fundamental o diagnóstico histopatológico na condução da terapêutica. Os anéis e as estenoses podem ser percebidos e como se verá adiante, a endoscopia tem também importante papel na terapêutica. Os dife-rentes graus de esofagite podem ser avaliados, assim como a presença e tamanho de uma hérnia hiatal.

O estudo radiológico (esofagografia ou videoesofagografia) é fundamental nas disfagias crônicas, principalmente nas de origem neuromuscular, pois permite demonstrar alterações anatômicas e

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COMO Eu TRATO: DISFAGIA nO IDOSO

estruturais, avaliar o tempo de trânsito, presença de contrações anor-mais e calibre do esôfago. Na acalasia, é possível avaliar os diferentes graus de megaesôfago, sendo classificados de I a IV, na dependência do diâmetro do esôfago. Diâmetro de anéis e extensão de estenoses são mais bem avaliados com o estudo radiológico.

A esofagomanometria (EMN) é o método de escolha para o diag-nóstico definitivo das alterações da motilidade esofágica.(8,9) Sua maior aplicação é na confirmação do diagnóstico de acalasia. Os outros DME apresentam padrão característico já consagrados na literatura interna-cional.(8) A maior parte dos DME pode ter associação com doença do refluxo gastroesofágico (DRGE), devendo ser avaliada a necessidade de prosseguir a investigação com o emprego de pHmetria esofagiana prolongada.

tratamentodisfagia orgânicaAs causas mais frequentes de disfagia orgânica nos idosos são o car-

cinoma epidermoide do esôfago e a estenose péptica, complicação da DRGE.(2) No primeiro caso, após estagiamento adequado, o tratamento envolve radioterapia, cirurgia e possivelmente quimioterapia coadjuvan-te. A estenose de natureza péptica é manejada com dilatações instru-mentais, notadamente com as velas de Savary, de calibres progressivos. O número de dilatações é variável e depende do calibre e da extensão da estenose, sendo o objetivo do procedimento a melhora da disfagia.(11)

É importante o tratamento antirrefluxo intensivo, concomitante ao procedimento de dilatação. Estenoses por pílulas ou de outras causas também são manejadas com dilatações.

disfagia por alteração motoraEm torno de 20% dos portadores de acalasia têm mais de 60

anos.(2,10) Na avaliação de um idoso com acalasia é fundamental a exclusão de doença orgânica, como a evidência de um carcinoma de fundo gástrico invadindo o esôfago. A dilatação pneumática da cárdia (DPC) é o procedimento de escolha para tratamento defi-nitivo da acalasia no idoso. É um procedimento ambulatorial, que emprega de modo geral um balão de baixa complacência (Rigiflex), posicionado por via endoscópica após sedação consciente e as técnicas de DPC são variáveis na dependência da instituição. Em

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A Gastroenterologia na Prática Clínica • 47

Dra. Eponina Maria de oliveira lemme • Dr. Milton M. Barbosa da Costa

nosso Serviço, empregamos os balões de 3, 3,5 e 4 cm, que podem ser utilizados em uma mesma sessão ou em sessões diferentes, na dependência da laceração produzida pela insuflação e da melhora da disfagia.(12) Bons resultados da DPC são encontrados em 60-80% no curto e médio prazo e são melhores em indivíduos acima de 40 anos, do que nos mais jovens.(12,13) O tratamento cirúrgico por mio-tomia laparoscópica com fundoplicatura parcial é outra alternativa de tratamento, menos comumente empregada em idosos em caso de falha da DPC. Pacientes com comorbidades, elevado risco cirúr-gico, ou muito desnutridos, podem ser submetidos ao tratamento com aplicação de toxina botulínica (BoTox) no esfíncter inferior do esôfago.(14) Esta droga bloqueia a liberação de acetilcolina na junção neuromuscular, reduzindo a pressão do esfíncter esofagiano inferior e melhorando a disfagia. Tem sido empregada como ponte para o tratamento definitivo, pois muitas vezes o grau de desnutrição do paciente torna real o risco de vida em caso de complicação de um procedimento terapêutico. O inconveniente da BoTox é o seu curto prazo de ação, devendo ser repetida a curtos intervalos.(14)

Drogas que reduzem a pressão do esfíncter inferior, tais como a nifedipina e os nitratos, podem também ser usadas com cuidado em idosos com acalasia, por via SL, 15-30 minutos antes das refei-ções, enquanto não se programa o tratamento definitivo. Os efeitos colaterais, tais como cefaleia e hipotensão, frequentemente limitam seu emprego.(2)

Entre os DME não acalasia, o espasmo esofagiano difuso, intitulado de espasmo esofagiano distal nos dias atuais(15) é também manejado com nitratos, antagonistas de canal de cálcio ou sildenafila para alívio da disfagia e/ou da dor torácica.(15) Como os sintomas são intermitentes, o uso de medicação contínua não isenta de efeitos colaterais pode não ser desejável. Cuidados gerais para manuseio de disfagia – comer devagar, mastigar bem, pequenas porções, devem ser enfatizados e muitos obtêm melhora com esta conduta. Injeção endoscópica de BoTox no músculo esofagiano é também um opção interessante em casos selecionados de espasmo distal que não melhoram com tratamento clínico.(15) Finalmen-te é importante assinalar que pacientes com espasmo distal e também os que apresentam achados manométricos de motilidade ineficaz e esfíncter hipotenso(8) podem ter DRGE associada, não raramente com grandes hérnias hiatais e o tratamento específico pode se acompanhar

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COMO Eu TRATO: DISFAGIA nO IDOSO

de melhora da disfagia. Exclusão de refluxo ou o seu tratamento, caso presente, são muito importantes na condução terapêutica de idosos com disfagia esofagiana.

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Dr. ricardo C. Barbuti • Dr. Joaquim Prado P. de Moraes-Filho

Capítulo 4

DISPEPSIA FunCIOnAL

Dr. Ricardo Correa Barbuti

Dr. Joaquim Prado P. de Moraes-Filho

AS DOENÇAS GASTROINTESTINAIS têm indubitavelmente grande importância no contexto de saúde pública em todo o mundo. Dentre os distúrbios mais comuns, recebe destaque a dispepsia funcional. “Pep-sis”, do grego, significa digestão; associada ao prefixo “dis”, teríamos o termo digestão alterada.

Os sintomas gastrointestinais relacionados a esta afecção são muito variáveis, sendo os mais comuns: epigastralgia, desconforto, saciedade precoce, empachamento, náuseas, ânsia e sensação de distensão ab-dominal superior. (1)

Este espectro de sintomas pode ser orgânico, quando existe alteração anatômica, química ou bioquímica que expliquem os sintomas referidos pelo paciente, ou chamado funcional, na ausência de quadro orgânico. Entre as causas orgânicas mais comuns, podemos citar a doença do refluxo gastroesofágico, gastrites, úlcera duodenal, úlcera gástrica e o câncer gástrico, entre outras.

Os distúrbios funcionais do aparelho digestório constituem grupo bas-tante heterogêneo e de estudo complexo, tendo motivado especialistas nesta área a se reunir na cidade de Roma em 1998, o que deu origem a uma série de conceitos e diretrizes para o estudo e tratamento destas doenças, conhecidos como “critérios de Roma”. Dois anos mais tarde novo encontro aconteceu, chegando-se a novas diretrizes e conceitos, os critérios de Roma II e posteriormente Roma III.(2)

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DISPEPSIA FunCIOnAL

Pela nova classificação, os distúrbios funcionais são divididos em sete grupos (quadro 1).(2)

O grupo b se divide em dispepsia funcional, eructação, vômitos funcionais e ruminação.(2)

Os critérios de Roma III definiram como dispepsia funcional a presença de sintomas sabidamente originados da região gastroduodenal, sem evidências de alteração orgânica, sistêmica ou metabólica que ex-plique tais sintomas.(3) Estes, por sua vez, são: dor epigástrica (sensação desprazerosa e subjetiva no epigástrio), queimação epigástrica (sensa-ção desprazerosa de calor no epigástrio), empachamento pós-prandial (sensação desprazerosa de permanência do alimento no estômago por longo tempo) e saciedade precoce (sensação de estômago cheio pre-cocemente ao se alimentar, desproporcional à quantidade de alimento ingerido, que impede o término da refeição).(3) Os sintomas devem ter se iniciado há no mínimo seis meses do diagnóstico, devendo estar presentes e ativos nos últimos três meses.(3) Estes pacientes podem ser agrupados de acordo com a sintomatologia predominante em:

a. Síndrome da dor epigástrica: aqui são fundamentais a presença dos seguintes critérios:

- Dor ou queimação localizada no epigástrio pelo menos moderada e que ocorre, no mínimo, uma vez por semana;

- Dor intermitente; - Dor não generalizada ou localizada em outras regiões abdominais

ou torácica;

Quadro 1. Distúrbios funcionais digestivos

a. Desordens esofágicas

b. Desordens gastroduodenais

c. Desordens intestinais

d. Dor abdominal funcional

e. Desordens da vesícula biliar e esfíncter de Oddi

f. Desordens anorretais

g. Desordens funcionais de neonatos e bebês

h. Desordens de crianças e adolescentes

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Dr. ricardo C. Barbuti • Dr. Joaquim Prado P. de Moraes-Filho

- Dor não aliviada pela defecação ou eliminação de flatos.A síndrome do desconforto pós-prandial pode coexistir.b. Síndrome do desconforto pós-prandial: aqui é fundamental pelo

menos um dos critérios abaixo: - Empachamento pós-prandial que ocorre, no mínimo, várias

vezes por semana; - Saciedade precoce que impossibilita o término normal das

refeições, que ocorre, no mínimo, várias vezes por semana;Critérios corroborativos também podem existir. - Distensão do abdome superior, náusea pós-prandial ou eructação; Síndrome da dor epigástrica pode coexistir.(1,4)

EPIDEMIOLOGIA

A prevalência da dispepsia passou a ser bastante estudada nos últimos anos. Dados americanos apontam que cerca de 25% da população descreve dor epigástrica crônica ou recidivante no andar superior do abdome, sendo a dispepsia funcional o diag-nóstico mais prevalente encontrado.(5) A incidência parece girar em torno de 1% ao ano.(6-8)

A maioria dos dispépticos mantém-se sintomática por um período bastante longo, apesar de apresentarem alguns períodos de remis-são espontânea. O risco de desenvolver doença ulcerosa péptica, contudo, não parece ser diferente da população assintomática.(9) A prevalência é menor em idosos e parece ser discretamente maior no sexo masculino.(2,3)

É comum a associação de outras doenças funcionais, como a sín-drome do intestino irritável, constipação e diarreia funcionais, etc., indicando um possível mecanismo fisiopatológico em comum.(10,11) Sendo também frequente a migração do paciente de uma doença funcional para outra.(11,12)

FisioPatoloGia (FiG. 1)

A fisiopatologia parece ainda não estar definitivamente estabelecida. As pesquisas se baseiam nos seguintes fatores envolvidos:

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DISPEPSIA FunCIOnAL

Função motora gástricaAnormalidades na função motora gástrica podem levar a retardo no

esvaziamento deste órgão, o que pode explicar sintomas de dismotilidade. Esta alteração parece ser encontrada em cerca 30 a 80% dos pacientes estudados.(13,14) Hipomotilidade antral foi achada em número similar de pacientes, embora com pouca correlação com a sintomatologia. Acomo-dação gástrica alterada foi caracterizada em cerca de 40% dos casos.(15)

sensibilidade visceralSensibilidade visceral aumentada refere-se a um limite baixo para

indução da dor. Tal fenômeno tem sido cada vez mais associado às alterações funcionais, particularmente a dispepsia funcional.(16)

Helicobacter pyloriO micro-organismo pode desempenhar algum papel na fisiopa-

tologia da dispepsia funcional, mas a participação definitiva não foi ainda estabelecida. O assunto é, pois, controverso. O H. pylori po-deria participar promovendo gastrite crônica, causando disfunção da musculatura lisa do estômago e, deste modo, promover alterações da motilidade e tornar o órgão mais sensível a estímulos álgicos e

Figura 1. Fisiopatologia dos Distúrbios Funcionais

Hipersensibilidadegástrica

H. pyloriNeuropatia vagal

DiSPePSiAFuNcioNAL

Fatorespsicossociais

Disrritmiasgástricas

Dismotilidadegástrica

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distensão gástrica. Em média, podemos dizer que há necessidade de que tratemos 12 pacientes para que um melhore dos sintomas. Esta relação pode variar de uma região para outra. Entretanto, quando há resposta esta parece ser bastante contundente.(17,18)

disfunção autonômicaDisfunção de nervos eferentes e aferentes vagais pode levar a exa-

cerbação de sensações viscerais e assim a sintomatologia.(17)

Atividade gástrica mioelétricaDisritmias gástricas podem se originar no antro ou corpo. Tais alterações

poderiam ser responsáveis por sintomas tipo dismotilidade, mas a exata prevalência neste grupo de pacientes e a falta de correlação sintoma – al-teração motora levantam dúvidas quanto a importância destas alterações.(19)

Alterações hormonaisVários hormônios têm sido estudados tentando-se estabelecer al-

guma relação entre suas alterações e a dispepsia funcional. Entre os provavelmente implicados podemos citar: motilina, gastrina, CCK, prolactina, opiáceos endógenos e outros. Até o momento, contudo, anormalidades hormonais não parecem ter importância na fisiopato-logia da dispepsia funcional.(17)

Fatores psicossociaisNenhuma personalidade específica tem sido relacionada à dispepsia

funcional, embora ansiedade, neuroticismo e depressão possam estar au-mentados nestes pacientes, quando comparados a doentes saudáveis.(14)

Provavelmente a dispepsia funcional é resultado de interação com-plexa de fatores psicossociais e fisiológicos.(17,20,21)

DIAGnóSTICO

O diagnóstico é inicialmente clínico e depende da exclusão de causas orgânicas que possam explicar a sintomatologia referida pelos pacientes. Aqui é importante que diferenciemos a dispepsia não investigada da dispepsia funcional. O diagnóstico desta última necessita da exclusão de causas orgânicas. Os exames subsidiários mais importantes são:

a) Endoscopia digestiva alta: Deve revelar resultado normal ou

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DISPEPSIA FunCIOnAL

apresentar alterações mínimas que não são capazes de explicar a sin-tomatologia. Visa afastar causas orgânicas como úlceras, tumores, etc.

b) Ultrassonografia abdominal: Visa afastar causas biliares, inflama-tórias e tumorais.

c) Hemograma: Pode alertar ao médico para doenças orgânicas como a presença de anemia, leucocitose, plaquetose, eosinofilia, etc.

d) Protoparasitológico: Em nosso meio é essencial devido às más condições de saneamento básico, que acarretam grande incidência de parasitoses intestinais.

TRATAMEnTO

O tratamento das enfermidades funcionais é controverso e muitas vezes desapontador. O objetivo principal é a melhora dos sintomas pelo maior tempo possível, com ganho de qualidade de vida pelos pacientes. De fato, em geral, o único parâmetro de avaliação do sucesso terapêutico é a melhora efetiva dos sintomas.

É absolutamente fundamental a solidez e consistência do relaciona-mento médico-paciente. Neste sentido, convém lembrar a importância da ação transcendente desempenhada pelo médico no ato curativo. Na consulta médica, a relação ali estabelecida se resume, apenas aparen-temente, na instituição do tratamento por meio da prescrição de uma droga e na recomendação de algumas instruções por parte do médico. Esta análise simplista não considera, no entanto, o complexo relaciona-mento que é estabelecido entre o paciente e o médico, onde a própria relação, de per se, já é curativa. O ato médico, além disso, envolve jargões e posturas próprias, podendo ser considerado um verdadeiro ritual. Sem consagração ritual, o médico é, muitas vezes, inoperante.(22)

A eficácia clínica do medicamento pode ser considerada, deste modo, como consequência de uma ação puramente farmacológica e de uma ação transcendente, que é imponderável e depende do médico, dos seus gestos, da sua postura e do afeto envolvido na relação com o paciente.(22)

É possível que esse aspecto subjetivo do tratamento médico exerça papel preponderante nas assim chamadas “terapias alternativas”.

Convém lembrar que, somadas a ação transcendente desempenhada pelo médico a que nos referimos acima, existem numerosas técnicas de relaxamento e redução das tensões, além das conhecidas formas de psico-terapia, que podem ajudar o paciente. Cabe ao médico orientar o doente

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na tomada de decisão de qual “psicotecnologia” (psicoterapia, ioga, tai-chi-chuan, técnicas de meditação, hipnose, etc.) que este deve adotar, quando isso for julgado conveniente e apropriado a cada caso em particular.

O tratamento pode ser esquematicamente dividido em dietético, comportamental e medicamentoso.

Plano dietéticoRecomenda-se ao paciente que coma devagar, lembrando que o

próprio ato da ingestão de alimentos é importante, como a conotação social o demonstra. O ambiente onde se realiza a alimentação deve ser tranquilo, evitando-se discussões ou assuntos que gerem tensão, com a mastigação realizando-se satisfatoriamente.

As refeições muito vultosas devem ser evitadas, bem como alimentos que o paciente julgue que não lhe faça bem. Líquidos, sobretudo os gasosos, devem ter seu excesso evitado às refeições.

A inclusão ou exclusão de determinados alimentos vai depender da queixa referida pelo paciente, o que quer dizer, do tipo de alteração fun-cional que apresenta. Assim, por exemplo, na presença de síndrome do desconforto pós-prandial, devem ser evitados os alimentos com maior teor gorduroso, os quais, por retardar o esvaziamento gástrico, podem acentuar a queixa de desconforto epigástrico e a sensação de empachamento.(23,24) O clínico deve ainda estar atento para a associação com outras afecções funcionais ou não, como é o caso da síndrome do intestino irritável, into-lerância à lactose, supercrescimento bacteriano e a doença celíaca.

Plano comportamentalOs pacientes devem ser informados sobre a íntima relação entre as

emoções e os sintomas. A autopercepção para este tipo de inter-relação e a conscientização de sua própria somatização variam muito de pessoa para pessoa, mas cabe ao clínico com sensibilidade avaliar e auxiliar o paciente nesse sentido.

Devem ser sugeridas ao paciente algumas medidas práticas de com-portamento, como a melhoria das condições de higiene mental através do lazer e remoção das fontes de tensão quando factível.

As recomendações sobre hábitos de vida são fundamentais: horas adequa-das de sono, prática regular de exercícios físicos e suspensão do tabagismo.

Merece destaque o efeito que certos medicamentos têm sobre a mu-cosa gastroduodenal, podendo causar inflamação e portanto sintomas.

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DISPEPSIA FunCIOnAL

Dentre as drogas, o grupo mais importante é o dos anti-inflamatórios não esteroides, independentemente da via de administração. Num se-gundo plano, também podendo causar sintomas dispépticos, podemos citar: anti-inflamatórios esteroides, tetraciclinas, eritromicinas, cálcio, ferro, ácido ascórbico, sulfas, esteroides femininos, etc. Nos pacientes já sintomáticos, tais medicamentos devem ser evitados e quando indis-pensáveis aconselhar o uso conjunto de protetor gástrico.

Plano medicamentosoCompreende a terapêutica mais específica possível diante da alteração

funcional apresentada pelo paciente, ainda que isso se limite ao tratamento sintomático. Os principais fármacos utilizados são os seguintes:(17,25)

Antieméticos e estimuladores da motilidade gastrointestinal (procinéticos)Têm sua melhor indicação nos casos de síndrome do desconforto

pós-prandial: metoclopramida, domperidona, bromoprida, eritromi-cinas, antagonistas 5HT

3 (ondansetron, alosentron), meclizina. Esses

fármacos usualmente devem ser administrados 15 a 30 minutos antes das refeições.(17,25)

A metoclopramida é um antagonista dopaminérgico a nível central e periférico, parecendo também possuir efeitos tipo colinérgicos. Efeitos adversos, contudo, como ansiedade, fraqueza, sonolência, inquietação, sintomas extrapiramidais, galactorreia e ginecomastia muitas vezes limi-tam, contudo, o uso crônico. Dose habitual: 30 mg/dia.

A bromoprida possui eficácia semelhante à metoclopramida. Seus efei-tos colaterais, embora raros, são: sonolência, cefaleia, calafrios, astenia e inquietação. Posologia semelhante à metoclopramida. Dose 30 mg/dia.

A domperidona apresenta eficácia semelhante à metoclopramida. Seus efeitos adversos são menores que os medicamentos acima, levando a menor sonolência e em raríssimos casos, distúrbios extrapiramidais. Dose 30 mg/dia.(26)

A meclizina é outra opção como antiemético. Dose 25 a 100 mg/dia.Dos macrolídeos, o principal representante é a eritromicina, cujo

efeito procinético se deve à estimulação dos receptores de motilina e também a efeitos colinérgicos. Seu efeito a longo prazo tem sido discu-tido, havendo evidências de que seu efeito terapêutico tende a decair à medida que o tempo passa. Sua dose deve ser individualizada para cada caso, 500 mg a 2 g/dia.

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Entre os antagonistas dos receptores 5HT3 , ondansetron é o mais estuda-

do. Estas drogas aceleram discretamente o esvaziamento gástrico e inibem os vômitos induzidos por quimioterápicos. Dose: 4 a 8 mg, 3 a 4x ao dia. Agonistas 5HT4 específicos, como a prucaloprida, ainda não foram estudados suficientemente para que sua ação na dispepsia funcional seja avaliada.(24)

Os análogos da somatostatina estão ainda em investigação quanto ao seu uso na dispepsia funcional.(27)

redutores da acidez gástricaTêm indicação nos casos de dispepsia funcional tipo úlcera. Incluem

antiácidos, bloqueadores dos receptores H2 da histamina e os inibidores

da bomba de prótons (IBP).(17,25,28)

Os antiácidos são medicamentos muito antigos utilizados para tratar este grupo de pacientes. Os mais usados no dia de hoje incluem a as-sociação de hidróxidos de magnésio e de alumínio. A posologia varia de acordo com o antiácido utilizado. Deve ser ministrado cerca de uma ou duas horas após as refeições ou quando o paciente se queixa de queimação epigástrica ou retroesternal.

Os bloqueadores dos receptores H2 da histamina são eficientes redu-

tores da acidez gástrica. Cimetidina, ranitidina, famotidina e nizatidina são as drogas disponíveis no mercado brasileiro, tendo eficácia seme-lhante quando utilizadas em doses equivalentes. Devem ser ministradas através de dose única noturna, ou divididas em duas tomadas. A dose terapêutica é: cimetidina 800 mg/dia, ranitidina 300 mg/dia, famotidina 40 mg/dia, nizatidina 300 mg/dia. A manutenção com estes medica-mentos é usualmente metade da dose terapêutica. Contra eles temos a tolerância medicamentosa que se desenvolve com seu uso crônico.(24)

Os IBP são as drogas mais potentes e também as mais onerosas atual-mente disponíveis para a redução da acidez gástrica. Deve-se ministrá-los inicialmente utilizando metade da dose terapêutica preconizada para doenças orgânicas do trato digestivo alto; aumentando a dose se necessário. Disponíveis no nosso meio temos: omeprazol 10-20 mg/dia, lansoprazol 15-30 mg/dia, pantoprazol e pantoprazol magnésico 20-40 mg/dia, rabeprazol 10-20 mg/dia e esomeprazol 20 a 40 mg/dia. Como qualquer tratamento para dispepsia funcional, o ganho terapêutico com IBP é modesto. Na falta de resposta após 6-8 semanas, os IBP devem ser suspensos se não houver outra patologia em conjunto que necessite destes fármacos, é o caso de doença do refluxo gastroesofágico associado.(24,28)

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DISPEPSIA FunCIOnAL

Protetores da mucosa gástricaOs protetores de mucosa gástrica mais eficientes são os análogos das

prostaglandinas representados pelo misoprostol, o qual, devido aos seus efeitos colaterais (diarreia e abortamento) tem sua aquisição dificultada. A dose terapêutica é 400 mg/dia divididos em 4 doses.

Mais facilmente disponível, embora deva ser manipulado, o sucralfato tem sido também utilizado, embora com resultados menos evidentes. A posologia é de 1 g antes das refeições e antes de dormir.

Erradicação do Helicobacter pyloriComo se referiu, a associação do Helicobacter pylori com a dispepsia

funcional é ainda controversa: os trabalhos têm apresentado resultados pouco esclarecedores. Para que obtenhamos melhora com a erradicação deste micro-organismo devemos tratar de 12 a 17 pacientes; recente revisão Cochrane fala em 14 pacientes.(29) Em nosso meio, Mazzoleni et al mostraram melhora em 50% dos pacientes erradicados.(30)

Além disso, essa melhora tende a acontecer vários meses após o uso de esquema de erradicação eficaz.(31) Os medicamentos utilizados para esse fim englobam a associação de vários fármacos, como: IBP, antibióticos, quimioterápicos, sais de bismuto.

AntidepressivosEste grupo de medicamentos pode ter importância no tratamento dos qua-

dros funcionais do aparelho digestivo (amitriptilina, nortriptilina, fluoxetina, buspirona, etc.), sobretudo quando se observam quadros de depressão leve associados. Embora pareça lógico o uso de antidepressivos na dispepsia fun-cional, existe pouca comprovação científica de sua eficácia.(32,33)

AcotiamidaConsiste em antagonista muscarínico e inibidor da colinesterase, melho-

rando a motilidade gástrica e seu esvaziamento pelo menos experimental-mente. Embora seja droga promissora, mais estudos são necessários para que sua ação seja comprovada.(24)

Agentes antinociceptivosHavendo falha dos fármacos mais frequentemente usados, os agentes

antinociceptivos constituem opção também válida. Estes medicamentos parecem interferir diretamente nos mecanismos centrais de controle da

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dor. Medicamentos como gabapentina, pregabalina e topiramato são os mais estudados.(24)

outros tratamentosSão vários os protocolos estudando diferentes drogas para o tratamento

da dispepsia funcional que estão em curso. É o caso da dexglumide (an-tagonista da colecistocinina), antagonista de receptores da neuroquinina, agonistas opioides (asimadolina), agonistas da grelina fedotozina. Proci-néticos como a itoprida e a mosaprida, embora já disponíveis no exterior, ainda não podem ser comercializados em nosso meio.(34)

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Dr. Joffre Rezende Filho

Capítulo 5

TRATAMEnTO DA GASTROPARESIA

Dr. Joffre Rezende Filho

DEFINE-SE GASTROPARESIA como uma síndrome associada a retar-do patológico do esvaziamento gástrico, sem obstrução mecânica do tubo digestivo.(1)

As gastroparesias decorrem de anormalidades da função motora gástrica secundárias a distúrbios neurais, musculares, da rede de células intersticiais de Cajal, eletrolíticos e hormonais.

Este capítulo fará uma revisão sobre o tratamento das gastroparesias.

CAuSAS DE GASTROPARESIA

Qualquer processo que leve a uma perda da força contrátil da mus-culatura gástrica ou interfira na sua coordenação pode levar a uma gastroparesia. Assim sendo, diversas condições clínicas em que haja comprometimento da musculatura gástrica ou da integridade da rede de células intersticiais de Cajal, bem como da inervação intrínseca ou da autonômica, podem estar associadas ao desenvolvimento de gas-troparesia.(2)

O quadro 1 apresenta as várias condições clínicas associadas à gas-troparesia, destacando-se as etiologias mais frequentes: gastroparesia diabética, idiopática e pós-cirúrgica.(3,4)

Pacientes diabéticos apresentam um espectro de anormalidades da função motora gástrica, caracterizando a gastropatia diabética, sendo que a gastroparesia diabética, com estase gástrica expressiva, representa

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• Federação Brasileira de Gastroenterologia62

TRATAMEnTO DA GASTROPARESIA

Quadro 1. Condições clínicas associadas a gastroparesia

1. Comprometimento muscular- Esclerose sistêmica progressiva- Miopatias viscerais- Dermatopolimiosite- Distrofias musculares- Amiloidose

2. Comprometimento neural- Diabetes melitus*- Pós-vagotomia*- Doença de Chagas- Neuropatias viscerais intrínsecas- Doenças degenerativas do sistema nervoso autônomo

3. Outras causas- Pós-infecção viral- Isquemia mesentérica crônica- Anorexia nervosa- Gastroparesia idiopática*

apenas a extremidade deste espectro. Estima-se que cerca de 25% dos casos com diabetes mellitus tipo 1, após longo período de duração, apresentam retardo de esvaziamento gástrico. Os casos de gastroparesia diabética representam em torno de 30% dos casos de gastroparesia.(4)

Em cerca de 30% dos casos de gastroparesia, não há nenhuma afecção sistêmica associada. A esta condição clínica, denominou-se gastroparesia idiopática. Possíveis alterações histopatológicas em casos com gastroparesia idiopática têm sido demonstradas, havendo relatos de hipoganglionose e alterações das células de Cajal.

A possibilidade de gastroparesia pós-infecção viral tem sido aventada como etiologia possível em alguns dos casos de gastroparesia idiopática. Nestes casos, sintomas como náuseas, vômitos e plenitude pós-prandial se iniciam subitamente após uma infecção viral, e, por vezes, perma-necem por vários meses após.

Destaca-se que lesões inadvertidas do nervo vago em operações de fundoplicatura podem ser responsáveis por casos de gastroparesia.

As demais etiologias são variadas, ocorrendo em menor frequência: algumas afecções neurológicas como Parkinson e esclerose múltipla; a doença de Chagas; endocrinopatias; miopatias; associada a pseudo-

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Dr. Joffre Rezende Filho

obstrução intestinal; associadas a uso de medicamentos; e como mani-festação paraneoplásica.

As alterações fisiopatológicas que resultam em gastroparesia podem variar conforme a etiologia. Estas alterações incluem: distúrbio do ritmo elétrico gástrico, alterações na acomodação à distensão, diminuição da contratilidade antral, descordenação antropiloroduodenal, espasmos pilóricos, e alterações da motilidade intestinal (quadro 2).

Quadro 2. Alterações fisiopatológicas na gastroparesia

- Distúrbios do ritmo elétrico gástrico (disritmias gástricas)- Hipomotilidade antral- Alterações do tônus gástrico e da acomodação à distensão do fundo gástrico- Espasmos pilóricos- Dismotilidade do intestino delgado

MAnIFESTAçõES CLínICAS

A gastroparesia pode apresentar um largo espectro de manifestações clínicas. Em alguns casos em que se detecta estase gástrica, pode cursar totalmente assintomática. Nos casos sintomáticos, ocorrem náuseas, vômitos pós-prandiais, saciedade precoce, sensação de plenitude na região epigástrica e, mais raramente, dor epigástrica. Estes sintomas ocorrem preferencialmente no período pós-prandial, mas podem estar presentes de modo contínuo, com frequência e intensidade variáveis. Por vezes, os episódios repetidos e incessantes de vômitos levam à ne-cessidade de internação hospitalar. O quadro clínico nas formas graves pode ser incapacitante, com queda expressiva da qualidade de vida, com dificuldade de manter as atividades diárias.

A gravidade do quadro clínico de gastroparesia pode ser avaliada por uma classificação proposta, visando adequar medidas terapêuticas à intensidade e repercussão do quadro clínico.(5) Assim, considera-se que a gastroparesia seja: 1. leve ou incipiente - os sintomas são facilmente controlados, o paciente consegue manter o peso e o estado nutricional com uso de dieta regular; 2. compensada - sintomas moderados, com controle parcial com medicamentos, consegue manter estado nutricional com modificações dietéticas; 3. descompensada ou refratária - os sinto-

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TRATAMEnTO DA GASTROPARESIA

mas não são controlados com medicamentos orais, há necessidade de internações frequentes, não se conseguindo manter estado nutricional com ingestão por via oral (falência gástrica) (quadro 3).

Quadro 3. Classificação da gravidade da gastroparesia

• Grau I: “gastroparesia leve”– Sintomas facilmente controlados– Capaz de manter peso e estado nutricional com dieta regular ou com pequenas modificações

dietéticas.

• Grau 2: gastroparesia compensada– Sintomas moderados com controle parcial com agentes farmacológicos– Capaz de manter o estado nutricional com ajustes de estilo de vida e modificações dietéticas– Raras internações hospitalares

• Grau 3: gastroparesia refratária (insuficiência gástrica propulsora)– Sintomas refratários apesar de tratamento clínico– Incapacidade de manter estado nutricional com dieta oral– Internações hospitalares frequentes

Fonte: baseado em Abel et al. Neurogastroenterol Motil 2006.(5)

DIAGnóSTICO

A avaliação diagnóstica de um caso suspeito de gastroparesia deve se iniciar pela avaliação clínica e laboratorial visando o diagnóstico e remoção de causas removíveis, como a hiperglicemia, uremia e distúr-bios eletrolíticos.(1,2)

A seguir, deve-se procurar afastar causas obstrutivas de estase gás-trica. Assim, os primeiros exames complementares devem ser o estudo radiológico e a avaliação endoscópica.

Estudo radiológicoO estudo radiológico convencional ou habitual do estômago utili-

zando suspensão de bário não permite a quantificação do esvaziamento gástrico. No entanto, o tempo em que o bário é totalmente esvaziado pode ser determinado. Uma retenção intragástrica de bário além de seis horas caracteriza um retardo acentuado do esvaziamento gástrico. Nesses casos, pode-se demonstrar, também, dilatação, estase e presença

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Dr. Joffre Rezende Filho

de restos alimentares no interior do estômago. Em alguns casos avan-çados apenas o aspecto radiográfico é suficiente para se estabelecer o diagnóstico de gastroparesia.

Endoscopia digestiva altaA avaliação endoscópica permite afastar, com mais precisão, a au-

sência de lesões obstrutivas da região pilórica e duodenal. É comum nestes casos encontrar-se conteúdo alimentar de estase, mesmo após período prolongado de jejum, indicando o diagnóstico da gastroparesia.

MéTODOS DE AvALIAçãO DO ESvAzIAMEnTO GáSTRICO

Nos casos com menor comprometimento da função motora gástrica, a quantificação do esvaziamento gástrico por meio de estudo cintilo-gráfico ou outro método quantitativo é necessária para estabelecer o diagnóstico da gastroparesia.(6,7)

Estudo cintilográfico do esvaziamento gástricoAs técnicas cintilográficas permitem avaliar o esvaziamento de vários

componentes da dieta – líquidos, sólidos digeríveis e não digeríveis, com obtenção de dados quantitativos confiáveis, de forma não invasiva, sendo hoje consideradas o padrão ouro na avaliação do esvaziamento gástrico.(1,2,6,7)

O método baseia-se na incorporação de um radiotraçador a um ele-mento da dieta. O marcador mais comumente empregado no estudo do esvaziamento de partículas sólidas é o tecnécio99m incorporado a ovo cozido. Após a ingestão da refeição marcada, são obtidas imagens cintilográficas, a intervalos de tempo conhecidos, empregando-se uma gamacâmera acoplada a um microprocessador de imagens. É possível determinar não só o ritmo de esvaziamento total, mas também avaliar a distribuição intragástrica do conteúdo ingerido, construindo-se cur-vas de atividade x tempo em regiões proximal (fundo-corpo) e distal (antro) do estômago.

Os parâmetros das curvas de esvaziamento gástrico a serem avalia-dos dependem do objetivo do estudo. No cenário clínico, a simples observação e comparação da curva obtida do paciente com a faixa de curvas em grupo controle são suficientes para indicar a presença de um distúrbio motor. Alternativamente, pode-se incluir apenas a medida da

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TRATAMEnTO DA GASTROPARESIA

retenção da radioatividade inicial e em 1 h, 2 h e 4 h após a ingestão de uma refeição padrão (EGG Beater).(7) Estes dados são suficientes para determinar a ocorrência de estase gástrica clinicamente significativa. Considera-se o diagnóstico de gastroparesia quando há 10% de reten-ção desta refeição ao final de 4 h, e que uma retenção de 60% ao final de duas horas reforça este diagnóstico.(7) Pode-se, também, determinar parâmetros como a duração da fase de retenção de sólidos e o T½, definido como o intervalo de tempo em que a radioatividade gástrica alcança a metade do seu valor logo após a ingestão da refeição.(6)

outros métodos de avaliação do esvaziamento gástricoO esvaziamento gástrico pode ser avaliado por outros métodos não

cintilográficos, muito embora pouco empregados no diagnóstico clínico da gastroparesia, tais como: o estudo ultrassonográfico, a ressonância nuclear magnética, o teste respiratório e, mais recentemente, o uso de cápsula com sinais de pressão e de pH enviados por telemetria.(6)

TRATAMEnTO

O tratamento das disfunções motoras gástricas associadas à gastro-paresia permanece como um desafio terapêutico ao gastroenterologis-ta. Trata-se de afecção com grande impacto na qualidade de vida dos pacientes, com morbidade elevada.

O tratamento da gastroparesia visa corrigir a anormalidade funcio-nal do esvaziamento gástrico, aliviar os sintomas, melhorar o estado nutricional e prevenir complicações. As complicações da gastroparesia compreendem: o desenvolvimento de esofagite de refluxo acentuada, a desnutrição, os distúrbios eletrolíticos, distúrbios na absorção de medi-camentos, dificuldade no controle glicêmico em casos de gastroparesia diabética, e a formação de bezoares.(1,8-10)

As medidas terapêuticas a serem empregadas incluem: tratamento etiológico específico dirigido à causa da gastroparesia; orientação die-tética; uso de medicamentos gastrocinéticos e antieméticos; instalação de suporte nutricional por jejunostomia; injeção de toxina botulínica no piloro; e, mais recentemente, estimulação elétrica gástrica(8-10) (quadro 4).

Em pacientes diabéticos, o controle adequado da glicemia é funda-mental. A hiperglicemia per si altera o esvaziamento gástrico, e muitas vezes é responsável pelo desencadeamento de sintomas intensos.(9,10)

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Dr. Joffre Rezende Filho

Quadro 4. Medidas terapêuticas na gastroparesia

Tratamento da doença primáriaOrientação dietéticaSuporte nutricional - jejunostomiaUso de drogas procinéticasUso de antieméticosInjeção de toxina botulinica intrapilóricaEstimulação elétrica gástricaCirurgia

orientação dietética e suporte nutricionalA orientação dietética e a necessidade do emprego de medidas de

suporte nutricional dependem da intensidade dos sintomas e da gravi-dade do quadro clínico.

Nos casos com sintomas agudos, deve-se proceder à correção de possíveis anormalidades hidroeletrolíticas; a sondagem nasogástrica e aspiração do conteúdo intragástrico pode ser útil.

Nos casos com sintomatologia crônica, de menor gravidade, a re-comendação dietética deve incluir a ingestão de refeição de pequenos volumes, a intervalos menores, de consistência líquido-pastosa, com baixo teor de lipídeos e fibras, sem vegetais indigeríveis. Pode-se acres-centar suplementos nutricionais líquidos por via oral.

Nos casos com maior gravidade, deve-se suspender a alimentação por via oral, realizar aspiração contínua do conteúdo gástrico, realizar hidratação adequada, corrigir distúrbios eletrolíticos e do equilíbrio ácido-básico. Nestes casos, faz-se necessária a introdução de suporte nutricional enteral ou parenteral. A nutrição enteral é preferível, e deve ser considerada quando as medidas dietéticas e o tratamento medica-mentoso são incapazes de melhorar os sintomas e/ou manter o peso do paciente. A perda de cerca de 10% do peso corporal nos últimos seis meses pode ser considerada como indicação de suporte nutricional enteral. Em alguns casos de gastroparesia refratária, com intolerância à ingestão oral, a instalação de uma jejunostomia é uma opção para suporte nutricional. A jejunostomia propicia uma via adequada para infusão de nutrientes e de medicamentos antieméticos, além de haver benefício clínico da descompressão gástrica.(8,9)

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TRATAMEnTO DA GASTROPARESIA

tratamento medicamentosoO tratamento medicamentoso da gastroparesia baseia-se no em-

prego de drogas com atuação na motilidade gastroduodenal, ou nos seus mecanismos de controle, alterando o tônus do estômago proximal, aumentando a amplitude e a frequência das contrações antrais, melhorando a coordenação antroduodenal e, em consequên-cia, acelerando o esvaziamento gástrico.(10) O termo “gastrocinético” refere-se a estes medicamentos com capacidade de acelerar o esva-ziamento gástrico e, portanto, úteis no tratamento das gastroparesias. Os medicamentos procinéticos atualmente empregados no tratamento da gastroparesia são: neostigmina, metoclopramida, bromoprida, domperidona e eritromicina. A cisaprida e o tegaserode, agentes procinéticos, agonistas do receptor serotoninérgico (5-HT

4), não es-

tão atualmente disponíveis. Os diversos medicamentos procinéticos estão listados no quadro 5.(11)

Quadro 5. Drogas procinéticas empregadas no tratamento da gastroparesia

Neostigmina MetoclopramidaBromopridaDomperidonaCisapridaTegaserodeEritromicina

Além de procinéticos, pode-se fazer uso de outros antieméticos, como o ondansetron, quando necessários. O emprego de antide-pressivos tricíclicos em baixas doses tem sido preconizado nos ca-sos em que predomine a dor abdominal, apesar do efeito sobre o esvaziamento gástrico.(11)

Outros medicamentos já foram empregados em poucos casos rela-tados na literatura, tais como: clonidina (agonista alfa-adrenérgico), mirtazapina (antidepressivo com atividade serotoninérgica e adre-nérgica), aprepitant (antagonista do receptor de neurocinina 1), e agonistas da grelina.(10)

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NeostigminaO uso clínico de inibidores da colinesterase, neostigmina e seus

análogos, restringe-se, talvez, ao tratamento do íleo pós-operatório. A necessidade de administração parenteral e seus efeitos colaterais, já que não age seletivamente na musculatura gastrointestinal, causando tam-bém bradicardia, broncoconstrição, sialorreia e efeito estimulador sobre a bexiga, torna impraticável seu emprego em pacientes ambulatoriais.

Encontra-se em avaliação clínica uma droga - actiomida - com pro-priedades anticolinesterase que apresenta propriedades procinéticas, mesmo por via oral.

Metoclopramida e bromopridaA metoclopramida (metóxi-2-5-cloro-procainamida) é uma benzami-

da substituída derivada da procainamida. Apresenta ação antiemética e efeito gastrocinético. Foi a primeira benzamida com propriedades procinéticas a ser sintetizada, dando origem à classe de medicamen-tos conhecida como benzamidas procinéticas. Atua como antagonista dopaminérgico e apresenta, também, ação colinomimética indireta. Dentre deste grupo, inclui-se também a bromoprida. Atuam como an-tagonista dopaminérgico (DA

2) central e periférico, elevando o limiar

de estimulação da zona quimiorreceptora do gatilho e do centro do vômito no bulbo. A ação procinética da metoclopramida e da bromo-prida não pode ser explicada somente pelo bloqueio de receptores dopaminérgicos. Este efeito procinético está mais relacionado à sua atuação como agonista de receptores serotoninérgicos – 5-HT

4. Tal

ação permite uma facilitação de liberação de Ach em neurônios mo-tores excitatórios entéricos.

A dose usual é de 10 mg, por via oral, 15 a 30 minutos antes das refeições. Nos pacientes que não toleram a via oral, pode ser aplicada por via endovenosa ou, em pacientes ambulatoriais, por via subcutânea. Nessa dose, os efeitos colaterais devidos à sua ação antidopaminérgica ocorrem em uma incidência de 10 a 20%. Entre os efeitos colaterais podem ser citados: sonolência, ansiedade, inquietude e sensação de agi-tação. Discinesia e outras manifestações extrapiramidais podem ocorrer.

domperidonaA domperidona é um derivado da butirofenona – um derivado

benzimidazólico – que apresenta propriedades procinéticas e efeito

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TRATAMEnTO DA GASTROPARESIA

antiemético. Atua como antagonista dopaminérgico periférico, não penetrando a barreira hematoencefálica e, portanto, com efeito central desprezível. A domperidona interage com receptores dopaminérgicos (DA2) em neurônios dos plexos mioentéricos, resultando em bloqueio da ação inibidora da dopamina sobre a liberação de acetilcolina. Disto resulta a facilitação da liberação de Ach pelo neurônio motor excitatório quando este é estimulado.

Estudos clínicos controlados indicam que o emprego da domperidona em pacientes com gastroparesia resulta em aceleração do esvaziamen-to gástrico, na diminuição dos sintomas, e, sobretudo, na melhora na qualidade de vida destes pacientes. A dose habitualmente empregada é de 10 a 30 mg, três vezes ao dia, 30 minutos antes das refeições. Nessa dose, os efeitos colaterais mais observados são elevação dos níveis de prolactina e, em raros casos, galactorreia.

A domperidona é a droga procinética mais empregada atualmente no tratamento da gastroparesia.

CisapridaA cisaprida é uma benzamida substituída que apresenta grande

atividade procinética. É a primeira benzamida procinética disponível que não apresenta propriedades antidopaminérgicas. Atua exclusi-vamente como agonista de receptores serotoninérgicos (5-HT

4), daí

facilitando a liberação de Ach em plexos mioentéricos. Dentre todas as benzamidas procinéticas, a cisaprida se constitui no mais potente agonista serotoninérgico, explicando assim a sua maior atividade procinética. Estudos controlados demonstram que a cisaprida pro-move aceleração do esvaziamento gástrico e melhora sintomática em pacientes com gastroparesia.

A dose habitualmente empregada nestes pacientes varia de 15 a 60 mg/dia. Os efeitos colaterais mais comuns são diarreia e cólicas abdominais. Relatos eventuais de arritmia cardíaca, com prolonga-mento de intervalo QT em pacientes em uso de cisaprida, com relato de óbitos, resultaram em grande restrição ao emprego desta droga no tratamento da gastroparesia. O efeito facilitador de arritmias car-díacas da cisaprida se dá por alteração em correntes de potássio, independentemente da sua ação em receptores serotoninérgicos, e, portanto, de sua ação procinética.

Atualmente, a cisaprida não se encontra comercialmente disponí-

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Dr. Joffre Rezende Filho

vel em nosso meio. Há estudos em andamento com novos agentes procinéticos que agem como agonistas serotoninérgicos 5HT-

4.

tegaserodeO tegaserode é um derivado aminoguanidino indol, com atividade

procinética no trato gastrointestinal. Diferentemente dos anteriores, não pertence ao grupo de benzamidas substituídas, se constituindo em nova classe de medicamentos procinéticos. Atua como agonista parcial de receptores serotoninérgicos (5HT-

4), daí facilitando a liberação de Ach

em neurônios motores excitatórios. Dados preliminares sugerem que seu emprego em pacientes com gastroparesia resulta em aceleração do esvaziamento gástrico e melhora da sintomatologia. O emprego clínico do tegaserode no tratamento da gastroparesia, no entanto, é ainda pouco conhecido. A dose empregada nos primeiros ensaios clínicos foi de 6 mg, 2 vezes ao dia, de 12/12 h.

EritromicinaA eritromicina é um antibiótico macrolídeo, que apresenta, também,

grande atividade gastrocinética. Esta atividade procinética se deve a sua interação com receptores de motilina na parede do estômago e duodeno. Deste efeito motilinomimético, resulta uma grande atividade procinética. O reconhecimento da ação motilinomimética da eritro-micina fez surgir uma nova classe de medicamentos gastrocinéticos: os motilídeos.

A injeção endovenosa de 200 mg de eritromicina em pacientes com gastroparesia diabética, em dose única, resulta em expressiva aceleração do esvaziamento gástrico. O seu emprego por via oral (125 mg, 3 vezes ao dia, em forma líquida), de forma crônica, apresentou efeito benéfico, porém associado a cólicas abdominais e diarreia. Tem sido relatado efeito de taquifilaxia, com diminuição da ação procinética com uso prolongado.

Novos agentes motilídeos vêm sendo desenvolvidos, porém não estão comercialmente disponíveis.

injeção intrapilórica de toxina botulínicaA toxina botulínica age em terminais colinérgicos pré-sinápticos, pro-

duzindo bloqueio na transmissão colinérgica, resultando em relaxamento muscular. Estudos pilotos iniciais sugeriram que a injeção intramural de toxina botulínica, na dose de 100 unidades em canal pilórico, em pacientes

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• Federação Brasileira de Gastroenterologia72

TRATAMEnTO DA GASTROPARESIA

com gastroparesia diabética, resulta em melhora sintomática e aceleração do esvaziamento gástrico. A resposta terapêutica em várias etiologias de gastroparesia foi semelhante, com melhora sintomática observada em cerca de 50% dos pacientes. A resposta sintomática foi observada em média por 5 meses. No entanto, alguns estudos controlados não demonstraram efeito benéfico deste tratamento. Possivelmente, aqueles pacientes com gastroparesia que apresentem maior tônus pilórico apresentam maior possibilidade de melhora clínica com este procedimento.(12)

Estimulação elétrica gástricaEm pacientes com gastroparesia refratária, que não respondem satis-

fatoriamente ao tratamento farmacológico anteriormente descrito, tem sido proposto o emprego de estimulação elétrica gástrica.(13,14)

Tal procedimento consiste na implantação de um estimulador elétrico na parede gástrica. Os primeiros estudos clínicos demonstraram que a aplicação de pulsos elétricos na musculatura gástrica promovia uma melhora expressiva de sintomas, notadamente náuseas e vômitos, em pacientes com gastroparesia diabética. Inicialmente o estímulo elétrico foi aplicado por meio de um estimulador externo.

Posteriormente desenvolveu-se um estimulador interno, cujos ele-trodos são implantados na parede antral, através de laparotomia ou por videolaparoscopia e conectados a um estimulador elétrico, que é fixamente implantado na região subcutânea da parede abdominal.(14)

Há dois tipos de estimulação elétrica gástrica sendo aplicados no tratamento da gastroparesia. Estes métodos se diferenciam quanto aos parâmetros de aplicação da corrente elétrica. No primeiro método, de-nominado estimulação com baixa frequência e alta energia empregam-se pulsos com frequência elétrica próxima à gástrica (3 cpm), comprimento do pulso de 300 msec e amplitude de 4 mA. Este método visa restabe-lecer a frequência habitual da onda lenta, e por isso tem sido chamado de “estimulação gástrica de marcapasso”.

O segundo método, denominado de estimulação com alta frequência e baixa energia, aplica pulsos com frequência de 12 cpm (4x maior que a frequência gástrica), comprimento do pulso de 300 msec e amplitude de 20 mA. Este método é, também, conhecido como neuroestimulação elétrica gástrica. O primeiro estudo clínico controlado com a estimulação gástrica com os parâmetros acima demonstrou melhora expressiva de sintomas associados à gastroparesia, como náuseas e vômitos.

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Dr. Joffre Rezende Filho

Um estimulador elétrico gástrico, com os parâmetros de estimulação aci-ma referidos, se encontra comercialmente disponível - o sistema ENTERRA® de tratamento da gastroparesia. Este sistema já foi aplicado em um grande número de pacientes, com melhora clínica em cerca de 80% dos casos. Os fatores preditores de falha de resposta incluem: gastroparesia idiopática; disritmia gástrica frequente (taquigastria), sugerindo perda expressiva de células de Cajal; predominância de dor abdominal no quadro clínico inicial.

O mecanismo de melhora sintomática, notadamente náuseas e vômi-tos, após a implantação do ENTERRA® não está totalmente esclarecido. O ritmo de esvaziamento gástrico se altera pouco, não se correlacionando com os sintomas. Deste modo, foi proposto que os mecanismos de ação da neuroestimulação elétrica gástrica seriam: 1. ativação de mecanis-mos centrais controladores de náusea e vômitos; 2. maior relaxamento do fundo gástrico que aumentaria a acomodação gástrica e diminuir a sensibilidade à distensão; 3. aumento da amplitude da onda lenta no período pós-prandial; 4. aumento da atividade eferente vagal.

A estimulação elétrica gástrica ainda não se encontra disponível em nosso meio.

CirurgiaA colocação de uma gastrostomia descompressiva visando à melhora

dos sintomas, sobretudo a dor abdominal, já foi relatada. A realização de piloroplastia por laparoscopia foi realizada em alguns casos, com melhora dos sintomas.(15) Alguns casos de gastroparesia grave, com gra-ves repercussões clínicas e nutricionais, não responsivas a tratamento clínico, foram submetidos à gastrectomia total. Esta opção terapêutica deve ser considerada como de exceção.(1,13)

COnSIDERAçõES FInAIS

A gastroparesia é uma síndrome associada a retardo do esvazia-mento gástrico devido a distúrbios motores gastroduodenais. Constitui condição clínica crônica e, por vezes, debilitante. Os recursos farma-cológicos disponíveis atualmente muitas vezes não são eficazes. Novas medidas terapêuticas vêm sendo desenvolvidas, sendo promissora a estimulação gástrica elétrica, reservada para casos refratários a trata-mento clínico. A gastroparesia continua representando um desafio ao gastroenterologista.

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TRATAMEnTO DA GASTROPARESIA

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Dr. Luiz Gonzaga vaz Coelho

Capítulo 6

COMO TRATAR: hELICOBACTER PyLORI RESISTEnTE AO PRIMEIRO

TRATAMEnTO?

Dr. Luiz Gonzaga vaz Coelho

FALhA TERAPêuTICA

CONSIDERA-SE HOJE que um regime terapêutico é clinicamente relevante e aceitável se a taxa de erradicação for superior a 80% ou, preferencialmente, maior que 90%. A taxa de erradicação de uma pri-meira linha de tratamento baseado em terapia tríplice com inibidor de bomba protônica e dois antimicrobianos varia de 80 a 90%. Quando uma segunda linha de tratamento é empregada nesses 10 a 20% de pacientes que apresentaram falha terapêutica na primeira tentativa de erradicação, sua eficácia varia entre 70 a 80%. Assim, aproximadamente 5 a 20% dos pacientes permanecerão infectados após dois cursos de tratamento. Embora diferentes fatores possam contribuir para a falha terapêutica (tabela 1), o principal fator é a resistência bacteriana, especialmente à claritromicina e ao metronidazol (tabela 2).

OPçõES TERAPêuTICAS APóS FALhA DO REGIME COnTEnDO CLARITROMICInA

iBP em dose padrão, duas vezes ao dia + amoxicilina 1,0 g, duas vezes ao dia + levofloxacina 500 mg, uma vez ao dia, durante 10 dias

Representa um dos regimes anti-H. pylori mais utilizado, em todo o mundo, no retratamento da infecção por H. pylori, com dois estudos

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COMO TRATAR: hELICOBACTER PyLORI RESISTEnTE AO PRIMEIRO TRATAMEnTO?

Tabela 1. Fatores de risco para falha do tratamento anti-H. pylori

• Aderência(1)

• Cepas cag-negativas(2)

• Polimorfismos genéticos CYP2C19(3)

• Tabagismo(4)

• Imunidade alterada• Carga bacteriana elevada• Hiperacidez• Doença associada(5)

• Presença de bactérias intracelulares(6)

• Resistência antimicrobiana (metronidazol e claritromicina)

Tabela 2. H. pylori: resistência antimicrobiana no Brasil

Local(ano)

Amostras(n)

Metonidazol Furazolidona Claritromicina Levofloxacina Tetraciclina Amoxicilina

Belo Horizonte(2002)(7)

202 53% 9%

Bragança Paulista(2003)(8)

155 55% 13% 16% 13% 13%

São Paulo(2009)(9)

53 54% 8% 15% 0

Recife(2010)(10)

114 - - 16,5% - - -

recentes de meta-análise mostrando índices de erradicação próximos a 80%.(11,12) É bem tolerado, os efeitos adversos, quando presentes, são de leve intensidade e, na maioria das vezes, gastrointestinais. Seu custo é acessível e, recentemente, em alguns países da América do Sul, tem sido disponibilizado em kits, otimizando aderência ao tratamento. Como limitação, estudos recentes chamam atenção para ocorrência de resistência crescente do H. pylori às quinolonas, es-pecialmente em regiões onde seu emprego é mais disseminado na população.(13,14)

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Dr. Luiz Gonzaga vaz Coelho

terapia quádrupla: iBP em dose padrão + subcitrato de bismuto co-loidal 120 mg, quatro vezes ao dia + cloridrato de tetraciclina 500 mg, quatro vezes ao dia + metronidazol 250 mg quatro vezes ao dia, durante 10-14 dias

Três meta-análises europeias mostram que esta alternativa é capaz de promover a erradicação após a falha do regime tríplice clássico em torno de 80%.(15-17) Devido aos elevados índices de resistência primária ao metronidazol no Brasil e no continente latino-americano, são poucos os estudos existentes.(18) Alguns estudos, entretanto, sugerem que resistência primária aos imidazólicos talvez possa ser superada aumentando-se a dose e/ou a duração do tratamento.(19-21)

Deve-se também considerar que a resistência ao metronidazol, quando avaliada pelo E-teste, tende a superestimar a prevalência da resistência à droga.(22) Na América do Sul constitui opção frequente o emprego do esquema quádruplo, substituindo-se o metronidazol pela furazolidona.

REGIMES TERAPêuTICOS COnTEnDO FuRAzOLIDOnA

Regimes terapêuticos quádruplos onde o metronidazol é subs-tituído pela furazolidona têm sido utilizados na América do Sul, especialmente no Peru, Colômbia e Brasil para o tratamento de pacientes refratários ao esquema tríplice clássico.(18,23-25) No Brasil, o esquema quádruplo para retratamento recomendado pelo Consenso Brasileiro sobre H. pylori(26) consiste na administração de inibidor de bomba protônica em dose padrão + amoxicilina 1,0 g (ou do-xiciclina 100 mg) + furazolidona 200 mg + subcitrato de bismuto coloidal 240 mg (2 comp.), administrados duas vezes ao dia (após o almoço e jantar), durante 10 dias. Estudo empregando este regime terapêutico (usando doxiciclina 100 mg bid no lugar da amoxicilina) alcançou 80% de erradicação.(24) Dois estudos semelhantes entre nós, um deles utilizando IBP, amoxicilina, furazolidona e bismuto e outro IBP, cloridrato de tetraciclina, furazolidona e bismuto, po-rém ambos com apenas sete dias de duração, encontraram índices de erradicação de 68,8% e 67%, sugerindo que um maior tempo (10 dias) deva ser recomendado.(27,28) O emprego de duas tomadas diárias, conforme sugerido previamente por Graham et al.(29) parece aumentar a aderência e reduzir os efeitos adversos a este regime.

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COMO TRATAR: hELICOBACTER PyLORI RESISTEnTE AO PRIMEIRO TRATAMEnTO?

Regimes terapêuticos tríplices empregando furazolidona, uma ou duas vezes ao dia, associada a levofloxacina e inibidor de bomba protônica, durante sete a dez dias, também têm sido utilizados e recomendados pelo Consenso Brasileiro. Assim, a utilização de inibidor de bomba protônica em dose padrão + levofloxacina 500 mg + furazolidona 200 mg (2 comp.), com todos os medicamentos administrados em dose única diária, durante 10 dias, com taxas de erradicação superiores a 80%.(24,30) Tais achados têm sido confirma-dos com o emprego de IBP, furazolidona 200 mg e levofloxacina 250 mg, administrados duas vezes ao dia, durante sete dias.(27)

A furazolidona é um derivado sintético dos nitrofuranos ativa contra um amplo espectro de bactérias e parasitas. A atividade bactericida da furazolidona é resultante da sua capacidade de ini-bir várias enzimas bacterianas, especialmente aquelas envolvidas no ciclo de Krebs. Estudos em adultos sadios demonstram que a furazolidona aparece no plasma 1 hora após sua ingestão, com um pico máximo de absorção nas primeiras 4 horas. Tem o menor custo entre todas as drogas anti-H. pylori. Uma limitação a seu uso decorre de expressivo índice de efeitos adversos, sobretudo gastrointestinais. À semelhança do metronidazol, possui também efeito disulfiram-like, recomendando-se abstinência alcoólica du-rante seu emprego. São raros os registros de cepas resistentes à furazolidona. Apesar de recomendada como alternativa terapêutica pelos Consensos Latino-Americano, em 2000, Brasileiro, em 2005, Chinês, em 2008 e Organização Mundial de Gastroenterologia, em 2011, não está disponível no mercado europeu e norte-americano, por efeitos genotóxico e carcinogenético em animais.(31-33) Em revi-são recente, Zullo et al. apresentam sérias restrições a seu uso.(34) A International Agency for Research on Cancer (IARC), em 1997, classificou a furazolidona como carcinógeno tipo 3, ou seja, não classificável como carcinogênica em humanos,(35) e tanto a Europe-an Agency for the Evaluation of Medical Products em 1999 como o US Food and Drug Administration baniram, em 2002, seu uso em animais, como forma de prevenir a presença de seus resíduos em alimentos contendo carne. Na European Medicines Agency (EMA), o emprego de furazolidona não é aprovado para uso em animais e humanos.(35-38) Entretanto, a furazolidona é ainda comercializada em muitos países da América Latina, China e Irã. Em editorial re-

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Dr. Luiz Gonzaga vaz Coelho

cente sobre a revisão de Zullo,(24) Graham & Lu(39) consideraram a furazolidona como droga injustamente malignizada e subutilizada, considerando-a particularmente útil em áreas onde a resistência antimicrobiana é disseminada e múltipla.

OPçãO TERAPêuTICA DE TERCEIRA Ou QuARTA LInhA

IBP em dose padrão, duas vezes ao dia + amoxicilina 1,0g, duas vezes ao dia + rifabutina 150 mg, uma vez ao dia, durante 10 dias

Constitui opção de retratamento ainda não disponível no Brasil. A rifabutina, embora altamente eficaz contra H. pylori, apresenta custo elevado e pode ocasionar leucopenia e trombocitopenia re-versíveis com a suspensão da medicação. Derivada da rifampicina, é empregada para tratamento de infecções por Mycobacterium em pacientes com imunodeficiência, e com recomendação de ser reservada para tratamento de micobactérias multirresistentes.(40) Uma revisão recente mostrou taxas de resistência ao H. pylori de apenas 1,3% (95% IC = 0,9-1,7%). A taxa de erradicação média dos regimes contendo rifabutina como segunda linha foi de 79% (67-92%), terceira linha 66% (55-77%) e, como quarta ou quinta linha de tratamento 70% (60-79%).(41)

Testes de sensibilidade aos antimicrobianos, obtidos por cultura ou testes moleculares, deverão ser empregados para orientar os casos refratários e definir novas alternativas terapêuticas.

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A Gastroenterologia na Prática Clínica • 83

Dr. Marco Antônio zerôncio

Capítulo 7

FASE AGuDA DA DOEnçA DE CROhn

Dr. Marco Antônio zerôncio

O tratamento clínico da doença inflamatória intestinal (DII), seja para a retocolite ulcerativa (RCUI) ou para a doença de Crohn (DC), tem como metas principais o rápido controle inicial do processo inflama-tório (indução da remissão) e a conservação deste controle no longo prazo (manutenção da remissão). O objetivo desta revisão é abordar as recomendações da literatura atual sobre o tratamento inicial ideal, ou seja, como induzir remissão no paciente com DC.

É importante salientar que a escolha racional da medicação para a fase aguda da DC pode ser influenciada por diversos parâmetros do contexto clínico, quais sejam:(1-3)

a. Fenótipo da DC ou formas principais de apresentação (inflama-tória, penetrante ou estenosante).

b. Atividade da doença definida como grau de atividade do pro-cesso inflamatório (leve, moderada, grave/fulminante).

c. Localização da doença no tubo digestivo (ileal, ileocecal, co-lônica e outras).

d. Presença de complicações (fístulas, abscessos e estenoses).e. Contraindicações dos medicamentos para alguns grupos de

pacientes (crianças, idosos e gestantes).f. Fatores prognósticos adversos (idade jovem, doença fistuli-

zante perianal, tabagismo, desnutrição, etc.).g. Eficácia e tempo para início de ação das medicações dis-

poníveis: aminossalicilatos (sulfassalazina e messalazina), corticoides

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FASE AGuDA DA DOEnçA DE CROhn

(prednisona e hidrocortisona), antibióticos (metronidazol e ciprofloxacina), imunossupressores (azatioprina, metotrexato, tacrolimus e ciclosporina) e terapias biológicas (infliximabe, adalimumabe e certolizumabe).

Existe ampla concordância na literatura médica de que corticoides e drogas biológicas são os principais grupos de medicamentos que devem ser utilizados para indução da remissão da DC.(3) Há três décadas, alguns trabalhos haviam demonstrado eficácia da sulfassalazina em torno de 50% para indução da remissão da colite por DC com atividade leve a moderada.(4)

Entretanto, trabalhos posteriores, incluindo importante revisão sistemática,(5) revelaram que os aminossalicilatos têm em geral eficácia nula ou muito li-mitada para esta finalidade, não sendo mais indicado seu uso rotineiro para a DC pela maioria dos autores.(1-3,5)

Quanto aos imunossupressores, a azatioprina apresenta retardo no início de ação que pode durar meses, reservando-se habitualmente essa droga para manutenção da remissão da DC.(1-3) O metotrexato, na dose de 25 mg IM/se-mana, mostrou-se eficaz para indução da remissão da DC com atividade leve ou moderada refratária a corticoide em apenas um grande estudo controlado e randomizado,(6) onde um maior percentual de pacientes atingiu remissão com relação ao grupo placebo (39% x 19%, respectivamente). Sua eficácia para ma-nutenção da remissão, entretanto, não é sustentável ao longo do tempo.(7) Não há grandes estudos controlados e randomizados que possam respaldar o uso de inibidores da calcineurina (tacrolimus e ciclosporina) na fase aguda da DC.(2)

Existem evidências crescentes na literatura de que bactérias luminais de-sempenham efeitos imunogênicos na mucosa intestinal de pacientes com DC, contribuindo para perpetuar o processo inflamatório. Com base neste conceito, diversos antibióticos têm sido testados para indução da remissão da DC. O metronidazol e a ciprofloxacina são apropriados para complicações sépticas da DC ou para doença fistulizante perianal. Entretanto, não há fundamento científico claro para uso dessas medicações na indução da remissão da doença luminal com base em estudos controlados.(1,2,8) A rifaximina, entretanto, um antibiótico não disponível no Brasil, se mostrou eficaz para esta finalidade em pacientes com PCR elevada em um grande estudo multicêntrico duplo-cego e randomizado.(9) Nenhuma formulação probiótica teve eficácia comprovada até o presente para o tratamento da DC.(10)

Para o tratamento da DC leve restrita à região ileocecal, a budesonida na dose de 9 mg ao dia é o tratamento de eleição.(1,2,8) Para a DC de mesma localização com atividade moderada, a budesonida pode ainda ser uma opção, assim como corticoides de ação sistêmica (prednisona) quando o quadro clínico demandar

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A Gastroenterologia na Prática Clínica • 85

Dr. Marco Antônio zerôncio

uma resposta mais rápida. A prednisona é em geral utilizada na dose de 40-60 mg/dia em uma única tomada pela manhã por um período de 7-28 dias. Doses maiores que 60 mg/dia para o adulto não são recomendadas. Além disso, doses maiores que 40 mg/dia estão relacionadas a discreto benefício clínico, contras-tando com aumento significativo de efeitos adversos. No período citado de 7-28 dias, tão logo ocorra resposta clínica evidente, deve ser iniciado o desmame. Não há consenso para o desmame do corticoide na fase aguda da DC. Entretanto, recomenda-se geralmente a redução de 5-10 mg/semana até a suspensão.(1)

Para a DC moderada a grave de outras localizações, a prednisona pode ser utilizada nas mesmas doses citadas quando a via oral for tolerada.(1,2,11) A associação com azatioprina está indicada em muitos pacientes com in-tuito de manter a remissão.(1,2) Para aqueles pacientes hospitalizados com atividade grave, a corticoterapia parenteral (hidrocortisona) representa uma opção, apesar da escassez no detalhamento do manejo nos trabalhos.(1-3)

Todas as terapias anti-TNF (infliximabe, adalimumabe e certolizumabe) têm ampla aprovação na literatura médica para indução da remissão da DC com bom perfil de segurança.(12) Os anti-TNF devem ser considerados principalmente na DC com atividade moderada ou grave de qualquer lo-calização que seja resistente ou dependente da corticoterapia. Da mesma forma, devem ser aventados em pacientes que apresentem contraindicação ou intolerância aos corticoides.(2) Crescente experiência ao longo dos anos tem demonstrado que a terapia anti-TNF iniciada precocemente (< 2 anos de diagnóstico), principalmente quando combinada com azatioprina, apresenta claramente melhores resultados que as terapias convencionais. Muito embora essas observações não venham indicar tais condutas indiscriminadamente, há grande interesse no meio científico para comprovar que tratamentos mais potentes são necessários em pacientes que apresentam fatores prognósticos adversos (doença extensa, comprometimento retal importante, idade jovem, doença fistulizante perianal, úlceras profundas, etc.).(8)

Em geral, durante a terapia de indução de remissão na DC, esperam-se 2-4 semanas para uma melhora clínica evidente e 12-16 semanas para uma má-xima resposta clínica.(1) Nos casos em que há suspeita clínica de reativação, é fundamental que o processo inflamatório seja bem documentado e que outras causas de sintomas semelhantes sejam afastadas, como infecções, estenoses, abscessos, má absorção de sais biliares em pacientes submetidos a ressecções ileais extensas, associação com síndrome do intestino irritável, entre outras.(11) Importante lembrar que, em pacientes assintomáticos ou oligossintomáticos com doença luminal de grau leve, a observação clínica continuada sem tratamento

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FASE AGuDA DA DOEnçA DE CROhn

pode ser uma opção.(2) Anti-inflamatórios não hormonais são contraindicados para alívio dos sintomas agudos pelo risco de agravar a inflamação tecidual. Deficiências nutricionais precisam ser corrigidas quando necessário. A nutrição enteral exclusiva pode ser uma opção na população adulta a fim de evitar o uso de corticoides, muito embora tenha resultados inferiores quando com-parados aos da população pediátrica. Deve-se também encorajar fortemente a cessação do tabagismo a fim de melhorar os resultados da terapia.(11) A cirurgia deve ser considerada um importante tratamento coadjuvante na fase aguda da DC nos casos de complicações (estenoses, fístulas e abscessos), de lesões neoplásicas ou pré-neoplásicas, ou de doença intratável clinicamente.(1,2)

Neste último caso, a cirurgia pode estar bem indicada, principalmente para doença ileal ou ileocecal localizada de segmento curto.(2)

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A Gastroenterologia na Prática Clínica • 87

Dr. Carlos Brito • Dra. valéria Ferreira Martinelli • Dra. norma lucena silva

Capítulo 8

COMO TRATAR: FASE AGuDA DA RETOCOLITE uLCERATIvA

Dr. Carlos Brito Dra. valéria Ferreira Martinelli

Dra. norma Lucena Silva

A DOENçA INFLAMATóRIA INTESTINAL (DII) é uma denominação geral para um grupo de distúrbios inflamatórios do trato gastrointestinal de causa ainda não plenamente conhecida, que incluem a retocolite ulcerativa inespecífica (RCUI) e a doença de Crohn (DC).

A incidência de RCUI é maior que a de doença de Crohn na maioria das regiões do mundo, com exceção do Canadá e algumas regiões da Europa. A prevalência de RCUI varia de 37,5 a 238/100 mil habitantes e de DC de 44 a 201/100 mil na América do Norte e varia de 21 a 294/100 mil para RCUI e de 8 a 214/100 mil habitantes na Europa. Estima-se cerca de 1,4 milhão de habitantes portadores de RCUI na Europa e 1,3 milhão de portadores de DII nos EUA. Em regiões consideradas de baixa prevalência, como Ásia e América Latina, vem aumentando o número de casos, com publicações recentes relatando prevalências de RCUI que variam de 6 a 136/100 mil habitantes e em regiões hispânicas com taxas de 62,2/100 mil. No Brasil, há poucos estudos de prevalência, porém publicações de base hospitalar demonstram um crescente aumento do número de casos, com inúmeras unidades ambulatoriais sendo criadas para atendimento específico destas patologias.

A doença apresenta dois picos de incidência: dos 15 aos 30 anos e dos 60 a 80 anos.

O diagnóstico das DII baseia-se em um conjunto de achados clínicos, endoscópicos, radiológicos e histopatológicos, não havendo nenhuma

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COMO TRATAR: FASE AGuDA DA RETOCOLITE uLCERATIvA

característica patognomônica. Testes não invasivos (especialmente mar-cadores séricos) auxiliam em situações particularizadas.

Os achados clínicos na RCUI geralmente são relacionados à extensão da doença, embora nem sempre exista proporcionalidade entre a extensão da doença e a gravidade dos sintomas. Quando a doença é restrita ao reto, é denominada proctite ulcerativa (20% dos casos) e apresenta-se como diarreia sanguinolenta, urgência retal e tenesmo. A colite distal (proctos-sigmoidite) representa 30% dos casos e corresponde ao acometimento dos 30 a 40 cm distais do cólon e reto, enquanto a colite esquerda representa 30 a 40% dos casos e apresenta acometimento até a flexura esplênica. O termo pancolite ulcerativa é reservado para os casos em que o proces-so inflamatório ultrapassa a flexura esplênica, corresponde a 20% do total de casos e tem pior prognóstico pelo maior risco de desenvolvimento de câncer. Em cerca de 15% dos casos da doença intensa pode ocorrer um ataque grave, também chamado de colite fulminante, sendo que em um terço desses é a primeira manifestação da doença.

Vários escores e classificações foram propostos para determinar a gravidade das DII. Para RCUI utiliza-se uma classificação quanto à gra-vidade (classificação de Truelove e Witts – quadro 1) e um índice de atividade de doença, este último mais complexo, comumente utilizado em pesquisa para avaliar a resposta a drogas (quadro 2). A pontuação máxima no escore é 21. Um escore menor que 10, em dois dias conse-cutivos, é considerado um indicador de resposta clínica.

Quadro 1. Classificação de Truelove e Witts para determinação da gravidade da RCUI

Grau Definição

Leve Menos de quatro evacuações ao dia, com ou sem sangue, sem sinais deenvolvimento sistêmico, VHS normal.

Moderada Mais de quatro evacuações ao dia, mas com sintomas sistêmicos mínimos.

Grave Mais de seis evacuações ao dia, com sangue e sinais de envolvimento sistêmi-co, com temperatura > 37,5ºC, taquicardia (> 90 bpm), anemia (Hb < 10,5 g/dl) e VHS > 30 mm.

Fulminante(adaptado aclassificação)

Mais de dez evacuações ao dia, com sangue (enterorragia) e sinais de envolvimento sistêmico, com temperatura > 37,5ºC, taquicardia (> 90 bpm), necessidade de hemotransfusão, marcadas alterações em testes de atividade (VHS > 30 mm), com ou sem megacólon tóxico (cólon transverso dilatado> 6 cm) ou perfuração intestinal.

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Dr. Carlos Brito • Dra. valéria Ferreira Martinelli • Dra. norma lucena silva

Quadro 2. Índice de atividade clínica na avaliação de pacientes com colite ulcerativa

Sintomas Escore

Diarreia (Número de evacuações diárias):0–23–45–67–910

01234

Diarreia noturna: NãoSim

01

Sangue visível nas fezes (% das evacuações): 0< 50> 50100

0123

Incontinência fecal:NãoSim

01

Dor abdominal ou cãibra:AusenteBrandaModeradaSevera

0123

Bem-estar geral:PerfeitoMuito bomBomRegularRuimPéssimo

012345

Abdome dolorido:NãoDor branda e localizadaDor branda a moderada e difusaDor severa

0123

Necessidade de drogas antidiarreicas:NãoSim

01

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COMO TRATAR: FASE AGuDA DA RETOCOLITE uLCERATIvA

Não é infrequente pacientes apresentarem remissão clínica e per-sistirem com atividade inflamatória vista à endoscopia, levando ao surgimento do índice de atividade de Mayo, que envolve aspectos clínicos e endoscópicos, com pontuação máxima de 12 (quadro 3).

A RCUI está associada a importante morbidade, caracterizada pela sua cronicidade, com frequentes recidivas, necessidade de uso prolongado de medicamentos, frequentemente associados a efeitos adversos, que vão desde sintomas gástricos até imunossupressão; portanto, o trata-mento adequado baseado em protocolos possibilita manter a doença em remissão, reduzindo complicações, recidivas e melhorando a qualidade de vida destes pacientes.

Quadro 3. Índice de atividade de Mayo

Mayo Score - RCUI

Frequência de evacuações1. Número normal para o paciente2. 1 a 2 evac. a mais do que o normal3. 3 a 4 evac. a mais do que o normal4. 5 ou mais evac. a mais do que o normal

Sangramento retal1. Sem sangramento2. Raios de sangue com fezes em menos da metade das vezes3. Evidente sangue com fezes na maioria das vezes4. Sangue sem fezes

Achados da endoscopia1. Normal ou doença inativa2. Doença leve (eritema, padrão vascular diminuído, friabilidade leve)3. Doença moderada (intenso eritema, padrão vascular ausente, friabilidade, erosões)4. Doença intensa (sangramento espontâneo, ulceração)

Avaliação clínica global 1. Normal2. Doença leve3. Doença moderada4. Doença intensa

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TRATAMEnTO

São inúmeras as drogas disponíveis no arsenal terapêutico, sendo as mais utilizadas os corticosteroides, aminossalicilatos, azatioprina, ciclosporina e mais recentemente a terapia biológica, todos com diferentes níveis de respostas e com efeitos adversos que requerem monitorização.(1-3)

O tratamento tem por objetivos induzir a remissão da doença, reti-rando o paciente da atividade de doença, e manter a remissão, evitando recidivas. Classicamente, os critérios utilizados para avaliar atividade da doença eram baseados nos aspectos clínicos, porém a presença de atividade inflamatória histológica e endoscópica em alguns pacientes tem levado alguns autores a propor, além da remissão clínica, promover a cicatrização da mucosa, postura inicialmente defendida para doença de Crohn e agora voltada para a RCUI, visto que complicações graves como desenvolvimento de câncer estão associadas a inflamação per-sistente da mucosa.

As escolhas destas drogas dependem entre outros fatores da intensidade de doença, padrão clínico de acometimento e locali-zação. As diferentes variáveis envolvidas nesta escolha, aliadas a doses e prescrições de formulações inadequadas, bem como o não seguimento de protocolos médicos, estão entre as justificativas para erros de condução dos pacientes e, consequentemente, aumento de morbidade e complicações.

Antes de abordarmos as particularidades sobre as propostas te-rapêuticas das diversas formas clínicas, relacionaremos informações importantes acerca das drogas que fazem parte do arsenal terapêutico disponível no mercado.

DErivaDos Do áCiDo 5-aMinossaliCíliCo (5-asa)

A sulfassalazina, droga mais utilizada no tratamento das RCUI, é composta por uma molécula de sulfapiridina ligada ao ácido 5-aminossalicílico (5-ASA) por uma ligação diazo. A messalamina (ou messalazina) refere-se aos novos compostos de 5-ASA sem a presença da sulfa, como apresentações comerciais com diferen-tes mecanismos de liberação, com utilidades clínicas diferentes (quadro 4).

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COMO TRATAR: FASE AGuDA DA RETOCOLITE uLCERATIvA

EfetividadeA sulfassalazina é a droga de escolha no tratamento de indução e

manutenção da RCUI. Ford A et al.,(4) em recente meta-análise confir-mando revisões anteriores mostraram efetividade superior ao placebo na indução de remissão (NNT: 6), sem diferença de respostas significativas de efetividade entre as diferentes formulações de 5-ASA, o mesmo para manutenção para sulfassalazina (NNT: 3) e para messalazina (NNT: 4).

Baixas x altas doses: Os consensos diferem em relação às doses utilizadas variando entre 2 a 4 g, sugerindo o da Associação Americana de Gastroenterologia (AGA) que doses mais altas são mais efetivas, recomendando para indução doses de 4-6 g e manutenção entre 2-4 g para sulfassalazina e doses semelhantes para outras formulações, bem como o brasileiro (2010), que sugere para manutenção doses superiores a 2,4 g.(2,5) O consenso britânico (2011) usa doses altas na indução de remissão de 2,4 a 4,8 g e doses baixas de messalazina de 1,2 a 2,4 g na manutenção.(6) O consenso da China (2007) utiliza doses mais baixas de 3-4 g para fase aguda e entre 2 e 3 g para a manutenção.(7) Apesar do conceito de que doses mais altas conseguem melhores respostas na indução de remissão, o estudo de Ford A et al. mostrou não haver superioridade significativa em doses padrão de 2-2,5 g quando compa-radas com doses maiores, tanto para indução de remissão, quanto para manutenção, reforçando porém a inferioridade de respostas com doses

Quadro 4. Apresentações comerciais de aminossalicilatos disponíveis no Brasil

Droga Apresentação Local de liberação

Sulfassalazina (Azulfin®) Comp. 500 mg Cólon

Messalazina:

Asalit®, Mesacol®,Crohn-ASA 5®

Asalit® (comp.400) Mesacol® (comp. 400/800 mg)

Ceco (íleo terminal)

Pentasa® Comp. 500 mgSupositório 1 g

Duodeno (age em todoo intestino)

MMX® Comp. 1.200 mg Íleo e cólon

Enema (Asalit®) 3 g Cólon esquerdo

Supositórios(Asalit® e Mesacol®)

Asalit® 250 mgMesacol® 250 e 500 mg

Reto (proctite)

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menores de 2 g. O tempo de resposta pode ocorrer em 2 a 4 semanas.(4)

Liberação prolongada: Para a nova formulação MMX, estudo de meta-análise comparando com messalazinas de múltiplas doses ao dia evidenciou eficácia semelhante na manutenção e um leve mas significativo benefício da dose única quando comparada com múltiplas doses na indução de remissão.(8)

5-ASA oral, tópico ou combinado: Os consensos são unânimes em afirmar que associação de 5-ASA tópico com oral é superior a oral isolado em doença ativa esquerda e doença extensa. Recente meta-análise(9) envolvendo estudos de alta qualidade encontrou benefício estatisticamente significativo favorável à terapia combinada com um NNT de 5 e com tempo de resposta mais rápido e resultado também favorável na manutenção. Para a prevenção de recidiva o agrupamento de três estudos mostrou que intermitente 5-ASA tópico era superior à terapia oral, com NNT de 4.

Efeitos adversosOs efeitos colaterais são, na sua maioria, determinados pela sulfapiridi-

na, com náuseas, tonturas, mialgias, oligospermia, urticária, macrocitose, neutropenia e plaquetopenia, dentre outros. Intensificação da diarreia como efeito adverso pode surgir com a introdução da droga em 3%, de-vendo ser diferenciado de falha terapêutica, podendo ser reintroduzida em doses mais baixas e aumento progressivo. Nefrotoxicidade relacionada a aminossalicilatos (nefrite intersticial e síndrome nefrótica) é rara e do tipo idiossincrática. Estas drogas podem ser usadas com segurança na gravidez; alguns autores recomendam a substituição da sulfassalazina por messalazina durante a lactação pelo risco potencial de induzir kernicterus.

MonitorizaçãoNefrotoxicidade é um evento raro e não requer frequente monitori-

zação, podendo no início do tratamento realizar-se um sumário de urina e dosagem sérica de creatinina, após seis meses e então anualmente,(10) podendo na ocasião solicitar um hemograma. O consenso europeu baseado em evidências científicas existentes recomenda apenas moni-torização de função renal para pacientes com lesão renal preexistente, uso concomitante de nefrotoxicidade ou comorbidades quando em uso de salicilatos, porém cita que na prática os clínicos utilizam monitori-zação de função renal e hematológica a cada 3 a 6 meses. O consenso britânico publicado em 2011 considera testar função renal anualmente.

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COMO TRATAR: FASE AGuDA DA RETOCOLITE uLCERATIvA

CORTICOIDES

Utilizados em casos de DII ativa quando não há resposta aos ami-nossalicilatos. A indução de remissão geralmente é rápida (7 a 14 dias), após o que se inicia desmame da droga (5 mg/semana até 20 mg/dia de prednisona e posteriormente 2,5 mg/semana). O uso de preparações de corticoide como a budesonida não é indicado para RCUI, usado apenas na doença de Crohn.

EfetividadeMeta-análise de cinco estudos randomizados e controlados envol-

vendo 445 pacientes mostrou superioridade do corticoide para indução de remissão quando comparado a placebo, com NNT de 3 e os efeitos adversos ocorreram em 14% dos pacientes.(11)

Efeitos adversosOcasionam efeitos colaterais importantes quando usados por longos

períodos, além de não alterar o curso da doença. Dentre os efeitos colaterais dos corticoides, os mais importantes são: osteoporose, hiper-tensão arterial, diabetes, catarata, ganho de peso, fácies cushingoide, propensão a infecções e miopatia.

AzATIOPRInA

Tem como metabólito a 6-mercaptopurina, usada na dose de 2 a 3 mg/kg/dia e 0,75 a 1,5 mg/kg/dia, respectivamente. Deve-se iniciar com 50 mg/dia e aumentar a dose de 25 mg a cada 1 semana até atingir a dose desejada com monitorização da leucopenia e outros possíveis efeitos colaterais. Apresenta início de ação retardado, de 3 a 6 meses, período durante o qual se deve manter outra terapia indutora de remis-são. É droga para uso em longo prazo, pois estudos mostraram que a taxa de recidiva da doença após sua suspensão diminui à medida que o tempo passa. Pode ser usada por tempo indeterminado, se o paciente apresentar boa resposta e não houver complicações.

EfetividadeHá poucos estudos com teste randomizado controlado na avaliação

de eficácia de AZA na fase aguda. A mais recente revisão sistemática(12)

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agrupou dois TRC com um total de 130 pacientes, mostrando uma ten-dência de benefício da AZA comparada ao placebo (RR = 0,85; 95% IC = 0,71-1,01; P = 0,07), porém um dos estudos acompanhou o paciente por apenas 1 mês, tempo insuficiente para ação da droga. Um TRC publicado por Ardizzone S em 2006 e não incluído nesta meta-analise, comparando AZA com sulfassalazina na indução de remissão, mostrou superioridade da AZA com controle de doença em 53% dos pacientes (OR 4,78, P = 0,006). Para manutenção, a meta-análise de Khan K mostrou superioridade sobre o placebo na manutenção na redução de recidiva (RR = 0,60; 95% IC = 0,37-0,95; P = 0,03).

Apesar do pequeno número de estudos, a droga tem sido indicada na maioria dos consensos. Está indicada em pacientes com corticorre-sistência ou corticodependência ou com frequentes recorrências que não responderam a doses plenas de aminossalicilatos.

Efeitos adversosÉ necessário o controle periódico da contagem de células sanguíneas

devido à mielotoxicidade da droga, que ocorre em 2 a 5% dos pacientes, especialmente se associada a sulfassalazina ou antibióticos. Pode apresen-tar também um espectro de injúria hepática que varia desde alteração dos níveis de aminotransferases (hepatite) a colestase, doença venoclusiva e peliose hepática; por tal motivo deve-se também monitorar trimestralmente a bioquímica hepática. As alterações são reversíveis após a suspensão da droga em questão. Outro possível efeito colateral é o desenvolvimento de pancreatite, que ocorre em 3 a 15% dos casos, geralmente nas primeiras semanas de uso, é dose independente e reversível após a sua suspensão.

Há estudos que sugerem um aumento de quatro vezes na incidência de linfoma em pacientes portadores de DII e tratados com tiopurinas em relação à população geral. Isso não significa que a medicação seja a causadora da neoplasia, mas chama atenção para o fato de que a necessidade do imunossupressor pode ser o marcador para DII mais agressiva, o que estaria associado a risco de linfoma. Desta forma, não existe consenso acerca do potencial neoplásico da azatioprina, devendo o seu uso ser pautado na relação de risco-benefício para o paciente.

A AZA é convertida a MP, que sofre ação de enzimas, que irá formar inúmeros metabólitos, entre eles a tioguanina, que representa o metabólito ativo que será responsável pela inibição competitiva das purinas e tam-bém promove a apoptose de células T, mas é também responsável pelos

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COMO TRATAR: FASE AGuDA DA RETOCOLITE uLCERATIvA

efeitos adversos, principalmente mielossupressão. A tiopurina metiltran-ferase (TPMT) gera metabólitos inativos, e na presença de polimorfismo pode levar a maior toxicidade. A frequência de homozigotos recessivos (baixa ou nenhuma síntese da enzima) tem aumentado o risco de efeitos adversos de forma que a droga não deve ser utilizada nesta situação, porém a prevalência é inferior a 1%. Os indivíduos com síntese intermediária da enzima (heterozigotos) atingem 11% da população e podem necessitar de redução da dose da droga, porém a grande maioria (89%) dos indivíduos possui o gene selvagem com síntese normal de enzimas.

MonitorizaçãoRecomenda-se realizar hemograma e função hepática a cada duas

semanas no primeiro mês e depois a cada três meses.Quanto ao uso durante a gravidez, se enquadra na categoria D. Apesar dos

estudos mostrarem, com pequeno número de pacientes, que é provavelmente segura, o risco deve ser pesado contra a importância de sua manutenção. Durante a amamentação também é considerada provavelmente segura.

METOTREXATO

Inibe a di-hidrofolato redutase, afetando a síntese de purinas. Não há estudos que mostrem efetividade da droga. Duas revisões sistemáticas publicadas no Cochrane para indução de remissão (2007) e manutenção identificaram apenas um TRC de alta qualidade, envolvendo 76 pacientes sem diferenças de efetividade quando comparado com o placebo.(13)

CICLOSPORInA

Utilizada na dose de 2 a 4 mg/kg/dia por via endovenosa para RCUI na forma grave e refratária após sete a dez dias de uso de corticoide parenteral, com o objetivo de evitar uma cirurgia de urgência num pa-ciente gravemente doente. Apresenta um início de ação mais rápido em relação à azatioprina. Efeitos adversos incluem hipertricose, hiperplasia gengival, hipertensão, nefrotoxicidade, parestesias, tremores, distúrbios eletrolíticos e infecção por P. carinii.

EfetividadeA efetividade da droga foi claramente demonstrada em TRC

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publicado por Lichtiger S (1994), que obteve remissão de doença grave em 82% dos pacientes em três a sete dias, utilizando doses de 4 mg/kg/dia por 14 dias intravenoso, seguido por droga por via oral.(14) Posteriormente, em 2003, Van Assche G et al. utilizaram doses menores, 2 mg/kg, e obtiveram remissão em 86% dos casos, com menor incidência de efeitos adversos.(15) Para a manutenção a droga é pouca efetiva, apresentando recidiva frequente ao final de um ano, fazendo necessária a introdução de outra droga como aza-tioprina depois de conseguida a remissão, visto que após seis meses há perda significativa de efetividade.(16) É necessário monitorizar periodicamente os níveis séricos da droga, que devem ser mantidos entre 150 e 250 ng/ml.

AnTIBIóTICOS

Os mais utilizados são metronidazol (10-20 mg/kg/dia) e ciprofloxa-cina (1 g/dia), aos quais são atribuídas propriedades imunossupressivas.

EfetividadeHá um conceito de que o uso de antibiótico tem limitados benefícios

no tratamento da RCUI, porém em meta-análise publicada por Khan KJ (2011), a análise estatística de nove estudos agrupados mostrou um benefício na indução de remissão com antibióticos quando comparados com o placebo (RR: 0,64, P = 0,03), apesar da existência de TRCs que isoladamente não mostraram benefícios.(17) O uso de antibióticos de largo espectro tem sido proposto no tratamento intensivo de pacientes com colite fulminante ou megacólon tóxico.

Efeitos adversosO metronidazol apresenta como principais efeitos colaterais náu-

seas, gosto metálico e reação tipo dissulfiram. O uso prolongado por mais de seis meses e de doses altas pode provocar neurotoxi-cidade com parestesias. Metronidazol tem ação carcinogênica em ratos após uso prolongado, mas não tem sido relatado em humanos, porém só deve ser utilizado após o primeiro trimestre. Evidências recentes indicam a possibilidade de prematuridade, devendo ser utilizado com cautela. A ciprofloxacina é uma droga segura e não tem sido associada a malformação, aborto, prematuridade ou baixo peso ao nascer.

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COMO TRATAR: FASE AGuDA DA RETOCOLITE uLCERATIvA

TERAPIA BIOLóGICA

Infliximabe (Remicade®): dentre os avanços da tecnologia genética recombinante, esta representa uma alternativa efetiva, que veio modificar a terapia da DII; são anticorpos monoclonais quiméricos dirigidos contra o fator de necrose tumoral a (TNF), citocina envolvida na patogênese da DII e produzida pelos macrófagos. Sua administração é parenteral na dose de 5 mg/kg e o início de ação é rápido. As infusões são reco-mendadas nas semanas 0, 2 e 6 e a cada 8 semanas, num regime de manutenção. Triagem para presença de infecções como tuberculose, HIV, vírus das hepatites B e C deve ser realizada antes do início da terapia. Insuficiência cardíaca grau IV é contraindicação. Na presença de quadro infeccioso agudo, a droga não deve ser administrada. O tra-tamento deve ser administrado sob supervisão e controle de equipe de saúde especializada com equipamento de emergência para atendimento de eventuais reações infusionais graves.

EfetividadeSua eficácia foi demonstrada no tratamento da RCUI, baseado nos

resultados do Active Ulcerative Colitis Trials (ACT 1 e ACT 2), que mos-trou melhora clínica significativa para os pacientes recebendo infliximabe quando comparados com o placebo (64% x 29% do placebo, respec-tivamente, P < 0,002). Remissão ocorreu em 39% e 34% na semana 8 para ACT1 e ACT2, respectivamente, superior ao placebo (P < 0,001).(18) Benefícios estes confirmados em uma meta-análise envolvendo outros sete TRC, publicada no Cochrane em 2006 e também para a manuten-ção após indução.(19)

Adalimumabe (Humira): É um anticorpo monoclonal IgG1 recom-binante completamente humano que se liga ao TNF.

EfetividadeA droga ainda não faz parte das recomendações de consenso, que

antecede as recentes publicações de TRC avaliando a sua efetividade. Dois estudos ULTRA 1 (2011) e ULTRA 2 (2012) avaliaram a efetividade.(20-22) O estudo de Sandborn W et al., envolvendo 494 pacientes, com doença moderada a intensa, não responsiva a corticoide e imunossupres-sor, obteve remissão da doença, resposta clínica e cicatrização da mu-cosa em 16%, 50,4% e 41,1%, respectivamente, no grupo adalimumabe,

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estatisticamente superior ao grupo placebo. Na semana 52 obteve 17,5%, 30,2 e 25% de remissão da doença, resposta clínica e cicatrização da mucosa, respectivamente.(22) As melhores respostas ocorreram nos pa-cientes virgens de anti-TNF.

A dose recomendada é de 160 mg subcutânea, com segunda dose de 80 mg na segunda semana, depois 40 mg na quarta semana e pos-teriormente a cada duas semanas na manutenção.

Efeitos adversosOs principais efeitos colaterais estiveram relacionados ao momento

da infusão (rash, dor torácica e dispneia), tendo sido controlados com diminuição da velocidade de infusão, administração de anti-histamínicos e corticoides. Outro efeito colateral é a síndrome lúpus-like, que é rara e reversível após a suspensão do tratamento. Foram também descritos vários casos de reativação de tuberculose, inclusive com formas atípi-cas e questiona-se o potencial de induzir surgimento de linfomas. Nos pacientes que responderam inicialmente e perderam a resposta, a litera-tura recomenda aumentar a dose para 10 mg/kg a cada duas semanas, reduzir o intervalo para cada 4 semanas.

tacrolimusÉ um imunossupressor que inibe a transcrição do gene de interleucina

2, necessário para ativação das células T, suprimindo a inflamação asso-ciada à colite. Dose recomendada: 0,1 a 0,2 mg/kg/dia, mantendo níveis séricos de 10-15 ng/ml, podendo chegar a 5-10 ng/ml na manutenção.

EfetividadeApesar do número limitado de estudos, a maioria não controlado,

tem sido considerada a utilização em pacientes que falham às terapias anteriores. Em revisão do Cochrane (2008) a droga é considerada efe-tiva, apesar da analise de um único TRC, que analisando 63 pacientes obteve no grupo tacrolimus com níveis séricos elevados (10 a 15 ng/ml) uma remissão de 19% e resposta clínica em 62%, superior ao placebo (OR: 8,6, NNT: 3).

Efeitos adversosTremor (30%), parestesia (26%), nefrotoxicidade (16%), náuseas,

diarreia, insônia, hipercalemia, astenia, irritabilidade.

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COMO TRATAR: FASE AGuDA DA RETOCOLITE uLCERATIvA

MonitorizaçãoTacrolimus, eletrólitos, função renal a cada 7 dias no primeiro mês,

a cada 15 dias no segundo mês e depois a cada 30 dias.

OuTRAS TERAPIAS

ProbióticosEm recente revisão sistemática (2012) e estudo de meta-análise

concluiu-se que estudos com os diferentes probióticos são não con-trolados, com pequeno número de casos e erros metodológicos, sem evidências significativas de efetividade. Apesar de estudos com probióticos contendo E. coli Nissle 1917 mostrarem benefício em reduzir recidiva e de VSL#3 (associação de cepas de Lactobacillus e Bifidobacterium) em induzir remissão em doença leve a moderada e em prevenir recidiva de bolsite, as diferenças não são estatisticamente significativas, mas mostram-se promissoras, sendo necessários estudos mais bem controlados.(23)

Ciclosporina ou infliximabe na doença aguda grave?Cerca de 30% dos pacientes com doença aguda grave podem

não responder ao corticoide intravenoso; o uso de ciclosporina e infliximabe mostra boa eficácia no resgate destes casos, porém discute-se qual das duas é mais efetiva. Moccioro F et al. (2012) randomizaram 65 pacientes com doença intensa para receberem uma das duas drogas e após 3 meses 28,5% do grupo ciclosporina e 17% do grupo infliximabe necessitaram de colectomia, sem di-ferença estatística significativa (P = 0,25), porém com 12 meses a colectomia ocorreu em 48% e 17%, respectivamente. Para a indução as drogas mostram efetividade, porém como é de conhecimento a ciclosporina perde sua efetividade após 6 meses. Portanto, para retirar o paciente da fase aguda grave, evitando uma colectomia, estariam indicadas uma das duas drogas, devendo ser utilizada a que estiver disponível no serviço, porém lembrando que em virtude da gravidade do quadro deve-se planejar a terapia de manuten-ção, que no caso da ciclosporina poderá ser azatioprina. No caso do paciente cuja agudização ocorreu após falha de azatioprina, a opção preferencial será pelo infliximabe, que após indução será continuado.

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MAnEJO DA RCuI – FASE AGuDA

Classificar a doença de acordo com o grau de atividade (utilizando ferramentas como a escala de Truelove & Witts), bem como de acordo com a extensão do acometimento colônico é de fundamental impor-tância no sucesso terapêutico. Os pacientes com quadro clínico intenso devem ser hospitalizados, enquanto os demais podem ser acompanhados ambulatorialmente.

Os consensos (Ásia, 2007; China, 2010; AGA, 2010, Brasil, 2010; WHO, 2011) apresentam algumas poucas diferenças na condução de casos, relativas principalmente à dose das drogas. De forma resumida apresentamos as principais considerações da terapia (quadro 5).(2,5,7,23)

Quadro 5. Tratamento da RCUI (Doença Aguda)

Doença ativaColite distalLeve-moderada

Doença ativaColite extensaLeve-moderada

Doença grave

1. AminossalicilatosProctite: supositório 500 mg 2x/dia ou 1g/diaColite esquerda: enema 1-4 g/diaOral + tópico = resposta superiorOral: sulfassalazina 4-6 g; messalazina 2-4,8 g; MMX 2,4-4,8 g

2. Corticoide oral (40-60 mg) se falha após 2 semanas de 5-ASA

1. Oral: sulfassalazina 4-6 g; messalazina 4,8 g; MMX 4,8 g

2. Sem resposta a 5-ASA oral, associar tópico

3. Sem resposta a associação oral + tópico, iniciar corticoide oral (40-60 mg)

4. AZA 1,5-2,5 mg/kg/dia para não responsiva ao corticoide

5. Infliximabe para corticorresistente, corticodependente não responsivo ou intolerantes a AZA

1. Se paciente não requer internação de imediato, mas persiste com quadro grave apesar de corticoide, messalazina oral e tópica: iniciar infliximabe ou ciclosporina

2. Paciente requer internamento ou doença fulminante:a) hidrocortisona IV 300-400 mg/diab) antibiótico se evidência de toxemiac) ciclosporina ou infliximabe após 3-5 dias de corticoide sem melhorad) colectomia se não houver respostaPesquisar infecção por CMV e C. difficile

AZA: azatioprina, CMV: citomegalovírus

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COMO TRATAR: FASE AGuDA DA RETOCOLITE uLCERATIvA

Colite distal de leve a moderada intensidadePacientes com doença leve a moderada podem ser tratados com

messalazina tópica ou salicilatos orais.Supositórios de messalazina são úteis tanto para indução e como

para remissão em pacientes com proctite. A dose inicial deve ser de 1 a 2 g/dia. Os enemas dessa mesma droga têm a vantagem de agir em maior extensão, chegando a atuar até a flexura esplênica. Uma dose inicial de 1 a 4 g/dia é útil para indução e remissão de boa parte dos casos com colite distal.

Terapia oral com sulfassalazina ou messalazina oral pode ser utilizada (sulfassalazina 4-6 g; messalazina 2-4,8 g; MMX 2,4-4,8 g), podendo-se tentar doses de 2-2,5 g na indução.

Em não respondedores, a associação de 5-ASA tópico com oral é superior a oral isolado em doença ativa esquerda (Ford A, 2012).

Terapia semelhante com hidrocortisona pode ser administrada na forma de enemas; no entanto, os estudos demonstram que além de ser inferior na indução da remissão, essa droga não é útil na manutenção.

Para pacientes não respondedores após duas semanas de uso da droga tópica e oral, utilizar corticoide oral (40-60 mg).

Colite extensa de leve a moderada intensidadeEsses pacientes devem receber aminossalicilatos por via oral na

tentativa de induzir a remissão do quadro nas doses de 2 a 2,5 de 5-ASA, podendo aumentar as doses (sulfassalazina 4-6 g; messalazina 4,8 g; MMX 4,8 g). Sem resposta adequada à terapia oral, associar medicação tópica.

A terapia com corticoide oral é reservada para pacientes que não apresentem resposta à terapia de primeira linha ou que se mostraram intolerantes aos aminossalicilatos.

Para os pacientes que são não responsivos ao corticoide ou são corticodependentes pode ser iniciada azatioprina (1-2,5 mg/kg/dia), devendo considerar que a ação da droga é esperada com 2 a 3 meses.

Em casos de pacientes corticorresistentes, corticodependentes não responsivos ou intolerantes a AZA, deve ser utilizado anti-TNF.

Colite grave/fulminantePacientes com importantes repercussões da doença, bem como sinais

de toxemia, devem ser internados para tratamento com terapia endo-

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venosa. Pacientes com sintomas graves a despeito da terapia otimizada com prednisona (40-60 mg/dia), salicilatos (4 a 6 g/dia de sulfassalazina, ou 3,2 a 4,8 g/dia de messalazina) e medicamentos tópicos devem ser internados para mudança da conduta terapêutica.

O paciente deve ter seus sinais vitais monitorizados no mínimo quatro vezes por dia. Avaliação laboratorial a cada 24-48 horas deve incluir hemograma, função renal, eletrólitos e provas de função hepática. Hidratação parenteral deve ser estabelecida para evitar desidratação e distúrbios hidroeletrolíticos.

O tratamento de escolha para estes pacientes é o corticoide por via parenteral (ex.: hidrocortisona 100 mg, 3 a 4 vezes/dia IV). A avaliação da resposta ao corticoide deverá ser feita entre 3 e 7 dias e o tratamento de resgate ou cirúrgico indicado na falha terapêutica.

O uso de heparina por via subcutânea deve ser realizado para pre-venção de eventos tromboembólicos. Nutrição enteral ou parenteral deve ser realizada, principalmente naqueles com déficit nutricional. Agentes antidiarreicos, opioides, AINEs e anticolinérgicos devem ser evitados por conta do risco de induzirem megacólon tóxico. O uso de antibióticos deve ser individualizado, por não haver evidência de sucesso terapêutico, exceto nos casos em que haja suspeita de infec-ção associada.

A superinfecção por CMV deve ser suspeitada quando o quadro clí-nico não evolui com melhora em detrimento da terapia com corticoides venosos. Retossigmoidoscopia e biópsia para pesquisa do vírus devem ser realizadas, e caso se confirme, a administração de ganciclovir produz importante melhora nos pacientes. Pesquisa de toxina para C. difficile também deve ser investigada e tratada se positiva.

Caso não haja evidência de infecção, e passados os primeiros dias da terapia sem que se observe melhora, a terapia de resgate pode ser feita com ciclosporina IV (2 mg/kg/dia) ou infliximabe.

Torna-se importante a avaliação de um cirurgião experiente, visto que alguns pacientes podem ser candidatos a proctocolectomia, caso ocorra falha do tratamento de resgate com uma dessas medicações.

Em pacientes com colite fulminante ou megacólon tóxico, a tera-pia cirúrgica clássica pode ser postergada com o uso de ciclosporina; no entanto, os casos devem ser individualizados. Nutrição parenteral total e o uso empírico de antibióticos de largo espectro são medidas coadjuvantes utilizadas. A duração do tratamento clínico do mega-

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COMO TRATAR: FASE AGuDA DA RETOCOLITE uLCERATIvA

cólon tóxico é questionável, não devendo se estender por mais de 72 horas de acordo com algumas séries. Na ausência de melhora, ou com o aparecimento de piora clínica, laboratorial ou radiológica, a proctocolectomia deve ser realizada.

PAPEL DO CITOMEGALOvíRuS nA TERAPIA DA RCuI

Pacientes com DII apresentam um risco aumentado de infecção por CMV, podendo ser causa de recidiva da doença e refratariedade ao tratamento, porém a prevalência e incidência diferem na literatu-ra, bem como não há uma clara relação entre infecção e atividade de doença.

O CMV é uma frequente infecção em humanos, atingindo 40 a 100% dos adultos. A primoinfecção é habitualmente assintomática em imu-nocompetentes, evoluindo para a cronicidade, ficando o vírus latente, podendo reativar nos pacientes com imunossupressão. Pacientes com DII são considerados de risco para reativação do vírus não só pelo uso frequente de drogas imunossupressoras, como pela própria fisiopato-logia da doença.

A relação entre CMV e DII está para ser determinada, podendo o vírus desencadear a doença em indivíduo geneticamente predis-posto, estar envolvido apenas nas recidivas da doença, ser causa de refratariedade ao tratamento ou pode ser um mero achado, isto é, uma colonização não patogênica. Há um consenso entre especia-listas de que em pacientes com doença intensa e/ou refratários ao tratamento com imunomoduladores, a infecção pelo CMV deve ser investigada.(5,23)

A colite pelo CMV mimetiza o quadro clínico da atividade da DII e o diagnóstico diferencial deve ser feito devido a diferentes abordagens de tratamento, implicando o uso de drogas imunossupressoras potentes, cirurgia mutiladora ou tratamento antiviral, que, além de apresentarem graves efeitos colaterais, são medicamentos de alto custo. Por sua vez, como o significado do CMV na mucosa colônica inflamada permanece incerto, os clínicos se deparam com um dilema terapêutico: deve a te-rapia antiviral ser iniciada e a terapia imunossupressora reduzida com o risco de piorar a DII ou deve-se considerar a presença do CMV apenas colonização e neste caso aumentar a imunossupressão para combater a atividade da DII?

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diagnósticoO diagnóstico envolve múltiplas técnicas que podem ser usadas

para diagnóstico da infecção pelo CMV: sorologia, histologia, anti-genemia, pesquisa do DNA viral e colonoscopia. CMV infecção deve ser distinguida da CMV doença. Na infecção pelo CMV detectamos o antígeno ou o anticorpo no sangue, podendo o vírus estar em estado de latência ou replicando e na doença pelo CMV o paciente apresenta a infecção associada a manifestações clínicas de um ou mais órgãos.

O CMV gera uma resposta imune com produção de anticorpos inicialmente da classe IgM e posteriormente da classe IgG; são os soropositivos. Sorologia positiva não diferencia infecção de doença, pois 40 a 100% da população mundial tem infecção latente pelo CMV e não tem a doença. A sorologia é útil se o paciente é soronegativo, pois se não tem infecção, provavelmente não terá a doença, a não ser que o exame tenha sido realizado na primeira semana da infecção. Situações de reativação do vírus geralmente não alteram os níveis de IgG, podendo haver ou não leve elevação da imunoglobulina IgM.

A pesquisa do antígeno viral nos leucócitos circulantes possui ele-vada sensibilidade e especificidade para diagnóstico da infecção pelo CMV; contudo, não ajuda no diagnóstico da colite pelo CMV e vem sendo suplantada pela Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) na qual se pesquisa o DNA do vírus no sangue, tecido ou fezes. O exame de PCR pode ser qualitativo ou quantitativo, este último pode quantificar a carga viral. Carga viral elevada correlaciona-se com doença e pode ser útil para monitorar resposta ao tratamento.

Histologia com coloração pelo HE, cujo achado mais característico são as células com núcleos largos com inclusões intranucleares baso-fílicas, apresenta elevada especificidade, porém baixa sensibilidade para o diagnóstico da colite pelo CMV. A imuno-histoquímica (IHC), que consiste num método que localiza antígenos específicos em te-cidos baseado na reação antígeno-anticorpo, melhora a sensibilidade histológica e é considerada padrão ouro para diagnóstico da doença intestinal pelo CMV.

CMv: PATóGEnO Ou SuBPRODuTO DA InFLAMAçãO? QuAnDO TRATAR?

Martinelli V et al. (2012) realizaram revisão sistemática da literatura

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COMO TRATAR: FASE AGuDA DA RETOCOLITE uLCERATIvA

e concluíram que o papel do CMV nos pacientes com DII permanece controvertido, com estudos que consideram o vírus patógeno respon-sável pela refratariedade ao tratamento, pelas complicações e maior mortalidade e outros trabalhos que acreditam que o vírus não altera o curso natural da doença e não é responsável pelas recaídas e falta de resposta ao tratamento.(24) Criscuoli et al., em 2004, sugerem estudos de genótipos dos vírus para explicar os diferentes comportamentos em cada paciente, enquanto Dimitroulia et al. consideram que nem todos os CMV são patogênicos.(4)

Há uma mudança na interpretação da história natural do CMV nos pacientes com DII. Trabalhos mais antigos, como o de Cottone et al. em 2001, Wada et al. em 2003 e Criscuoli et al. em 2004 utilizaram antiviral de forma sistemática, atribuindo ao vírus um importante papel patogênico. Trabalhos mais recentes, a partir de Matsuoka et al. (2007), sugerem que a terapia com antivirais deixou de ser obrigatória, podendo o vírus ser um colonizador, produto da inflamação colônica e a decisão de tratar depende da resposta ao tratamento da doença inflamatória intestinal e da regressão da carga viral. Criscuoli et al., em 2011, estudando a história natural do CMV nos pacientes com RCU, consideraram indicação de terapia antiviral não só para os pacientes com histologia e antigenemia positiva, mas para doença em atividade sem melhora significativa com o tratamento da DII.(4)

Matsuoka et al. (2007) encontraram 52% de reativação do CMV nos pacientes soropositivos com recaída da RCU através da técnica do PCR em tempo real sérica, porém com evolução para remissão e colectomia semelhante quando comparável aos doentes sem CMV, concluindo que o CMV é frequentemente reativado, porém entra em remissão sem terapia antiviral na maioria dos casos. Este trabalho enfatiza que a terapia antiviral não se faz necessária para a maioria dos pacientes com reativação do vírus caso a antigenemia e a carga viral pelo PCR sérico apresentem níveis baixos, pois não refletem reativação do vírus na mucosa inflamada.(4)

Ensaios clínicos controlados com tratamentos antivirais com maior número de pacientes são necessários para elucidar os benefícios desta terapêutica e possivelmente identificar fatores de risco que diferenciam os pacientes que vão necessitar do antiviral e os que responderão apenas ao tratamento com corticoides e imunossu-pressores.

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Dr. Adérson Omar Mourão Cintra Damião

Capítulo 9

TRATAMEnTO DE MAnuTEnçãO DA DOEnçA InFLAMATóRIA

InTESTInAL

Dr. Adérson Omar Mourão Cintra Damião

A DOENçA INFLAMATóRIA INTESTINAL (DII, retocolite ulcerativa - RCU e doença de Crohn - DC) configura uma enfermidade crônica e, tal qual qualquer outra doença crônica, requer tratamento de manuten-ção. O tratamento clínico da DII tem, entre várias finalidades, induzir a remissão na doença em atividade e manter a doença em remissão, uma vez que, deixados à mercê da própria sorte, os pacientes com DII, após a indução da remissão, inexoravelmente terão recaídas.(1-3) Fica claro, portanto, que a chance do paciente com DII manter-se livre de recaídas está intimamente ligada à aderência do paciente ao tratamento de manutenção.(4,5) Infelizmente, a taxa de aderência ao tratamento de manutenção na DII na fase de remissão costuma ser baixa (pode ser de apenas 30%), o que deve chamar a atenção do médico que acom-panha este tipo de paciente.(4-6) No presente capítulo, abordaremos o tratamento de manutenção na RCU e na DC, levando em consideração a extensão e a gravidade da doença.

rEtoColitE ulCErativa (rCu)

rCu distalDo ponto de vista terapêutico, a RCU distal abrange os casos em

que o processo inflamatório estende-se até a flexura esplênica.(6) Os

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casos aqui incluídos geralmente constituem formas leves/moderadas de RCU. São pacientes que se queixam de presença de sangue, muco, pus nas fezes, além de tenesmo e puxo. Alguns podem apresentar constipação em vez de diarreia, por lentificação do trânsito colônico proximal.(2,6)

Nesse grupo de pacientes com doença distal, o tratamento tópi-co (supositório, enema) com messalazina é o mais recomendado. Supositórios de messalazina (1 g/dia) liberam o princípio ativo até 15-20 cm da borda anal. Enemas de messalazina (1-4 g/dia), por sua vez, liberam a messalazina até a flexura esplênica.(6) Supositórios de messalazina, portanto, estão indicados no caso da proctite e os enemas nas formas de RCU que comprometem além do reto até a flexura esplênica. Em outros países, messalazina pode ser encontrada também na forma de espuma (“foam”) ou gel, apresentações estas que parecem ser mais bem toleradas do que a forma de enema.(6,7) O tratamento exclusivo com messalazina tópica nas formas distais é eficaz e superior ao tratamento com messalazina oral ou com cor-ticoide tópico. As taxas de remissão com supositórios e enemas de messalazina variam de 50-75%. Os resultados favoráveis costumam aparecer já nos primeiros dias de tratamento.(8)

A combinação de tratamento tópico com messalazina enema (2 g/dia) e corticoide enema (dipropionato de beclometasona, 3 mg/dia) pode ser útil em casos refratários de proctite e é superior ao resultado obtido com cada um isoladamente.(6) Da mesma forma, a eficácia do tratamento combinado de messalazina oral (2-4 g/dia) com messalazina tópica (enema 1-4 g/dia) é superior à observada com cada modalidade isoladamente, independentemente da extensão da RCU.(1,6,8)

A terapêutica com messalazina tópica de manutenção é tão eficaz quanto a oral. Uma vez alcançada a remissão, a messalazina tópica pode ser mantida na dose de 1 g/dia (supositórios) ou 2-4 g/dia (enemas).(6,8,9) Esta posologia pode, a depender da evolução, ser espaçada para 2-3 vezes por semana. Os resultados são positivos com manutenção da remissão em 65-90% dos casos em um ano.(6-8)

Da mesma forma que na indução da remissão, a manutenção da remissão com a combinação de messalazina oral (cerca de 2 g/dia) e tópica (enema de messalazina 2 g duas vezes/semana) é superior à messalazina oral isoladamente, particularmente em pacientes com

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alto risco de recaídas (ex.: ≥ 2 recaídas no último ano, remissão re-cente – últimos três meses).(1,6,8)

Em virtude da dificuldade em se manter um tratamento tópico isolado, frequentemente optamos por derivados salicílicos orais (ex.: sulfassalazina-SSZ, messalazina) no tratamento de manutenção (SSZ, 2-3 g/dia, messalazina, 2-3 g/dia).(10,11) No caso da SSZ, os efeitos colaterais por conta principalmente da porção de sulfapiridina podem ocorrer em cerca de 30% dos pacientes (ex.: náuseas, vômitos, dispepsia, anorexia, cefaleia).(1,6) Suplementação com ácido fólico (1-2 mg/dia) deve tam-bém ser feita nos pacientes em uso de SSZ para que se evite a anemia macrocítica por deficiência de ácido fólico (SSZ interfere na absorção intestinal do ácido fólico). Nos pacientes que tolerarem, messalazina enema, duas vezes por semana, pode incrementar a eficácia do trata-mento de manutenção.(6)

Corticoide oral ou tópico não está indicado na manutenção da RCU distal por causa de seus efeitos colaterais e falta de eficácia.(6,7)

Em pacientes com RCU distal que não podem ser controlados de-vidamente com derivados salicílicos (tópico + oral), que apresentam recaídas frequentes ou são dependentes de corticoide recomenda-se a introdução dos imunossupressores (azatioprina – AZA, 2-2,5 mg/kg/dia, 6-mercaptopurina – 6-MP, 1-1,5 mg/kg/dia).(6,7,12,13) Porém, antes de qualificarmos um paciente como refratário ao tratamento habitual, convém afastar outras possibilidades como infecções (ex.: citomegalovírus, Clostridium difficile) e associação com síndrome do intestino irritável.(13) As taxas de manutenção da remissão com AZA/6-MP na RCU variam de 50-65% e a sua suspensão relaciona-se com altos índices de recaída (>80%).(8) Uma recente revisão Cochrane revelou redução de risco relativo (RRR) de 41% e um NNT (número de pacientes que precisam ser tratados para que se obtenha um bom resultado na manutenção em um paciente) igual a 5.(14) Metotrexato (MTX, 15 mg, intramuscular/semana) pode ser uma opção à AZA/6-MP, mas os resultados na RCU não são tão convincentes quanto no caso da doença de Crohn.(15) Os poucos casos refratários à terapia com imunossupressores orais podem ser tratados e mantidos com biológicos (infliximabe, 5 mg/kg, i. v., semanas 0, 2 e 6 e, a seguir, a cada 8 semanas; adalimumabe, via subcutânea, 160 mg na semana 0, 80 mg na semana 2, 40 mg a cada duas semanas) (quadro 1).(13,16-18)

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Quadro 1. Tratamento de manutenção na retocolite ulcerativa (RCU) distal(até flexura esplênica)

1. Tratamento tópico com messalazina supositórios (proctite) ou enema (proctossigmoidite e RCU esquerda até flexura esplênica) – uma vez/dia, dias alternados ou a cada 2-3 dias (o suficiente para manter o paciente em remissão. Recomendável associar derivado salicílico oral (sulfassalazina – SSZ, 2-3 g/dia + ácido fólico (1-2 mg/dia) ou messalazina (2-3 g/dia).

2. Em pacientes não responsivos, dependentes de corticoide, acrescentar azatioprina (AZA, 2-2,5 mg/kg/dia) ou 6-mercaptopurina (6-MP, 1-1,5 mg/kg/dia) por tempo indeterminado; metotrexato (MTX, 15 mg, IM/semana) pode ser uma opção de 2ª linha para imunossupressão.

3. Biológicos, se necessário, nos casos com recaídas, apesar dos imunossupressores (AZA, 6-MP) – infliximabe (IFX), 5 mg/kg, i.v., semanas 0, 2 e 6 e, a seguir a cada 8 semanas; adalimumabe (ADA) via subcutânea, 160 mg na semana 0, 80 mg na semana 2 e 40 mg a cada duas semanas).

rCu extensa Em geral, os pacientes com RCU extensa (processo inflamatório se

estende até próximo do ângulo hepático ou vai além) configuram casos moderados e graves de RCU.(1-3,13) O tratamento da fase aguda da doença geralmente é feito com derivados salicílicos (tópico e oral) e corticoides (prednisona por via oral, 40-60 mg/dia, seguida de suspensão paulatina ou hidrocortisona por via i.v., 100 mg a cada 8 h em casos mais graves, internados).(6,13,19,20) Alcançada a remissão, o corticoide deve ser retirado. Os esquemas de retirada da prednisona (usada desde o início ou após hidrocortisona em doses equivalentes), alcançada a remissão da doença, variam, mas uma sugestão é reduzir 10 mg/semana até a dose de 20-30 mg/dia e, a seguir, 5 mg/semana até a retirada total.(6) Os corticoides, por via tópica ou oral, são típicos medicamentos de fase aguda e não devem ser utilizados na manutenção da DII.(6,13) Os pacientes devem ser mantidos com derivados salicílicos, preferencialmente com o esquema associado de derivado salicílico tópico (enema duas vezes/semana) e oral (2-3 g/dia de SSZ ou messalazina).(6,21,22) Doses mais elevadas de derivados salicílicos orais (ex.: messalazina > 4 g/dia) podem ser ne-cessárias em pacientes selecionados, como por exemplo naqueles com história prévia de falta de resposta com doses mais baixas de messalazina (< 2 g/dia).(8,13) Alguns autores ainda defendem que a dose de derivado salicílico de manutenção na RCU seja semelhante à dose que induziu

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Quadro 2. Tratamento de manutenção na retocolite ulcerativa (RCU) extensa

1. Após remissão com derivados salicílicos (tópico e oral) ± corticoide (prednisona), manter os derivados salicílicos (preferencialmente com combinação tópica + oral) por tempo indeterminado.

2. Pacientes não responsivos aos derivados salicílicos ou corticoide-dependentes – iniciar imunossupressores (azatioprina - AZA, 6-mercaptopurina- 6MP).

3. Nos pacientes não responsivos aos imunossupressores (AZA, 6-MP) – a) em casos com recaídas graves, internar para corticoide intravenoso (hidrocortisona); b) se não houver resposta ao corticoide, medicações de resgate podem ser usadas como ciclosporina (2-4 mg/kg, i.v., infusão contínua) ou biológicos [infliximabe (IFX), 5 mg/kg, i.v., semanas 0, 2 e 6 e, a seguir a cada 8 semanas; adalimumabe (ADA) via subcutânea, 160 mg na semana 0, 80 mg na semana 2 e 40 mg a cada duas semanas]; manter os imunossupressores orais; c) em casos não responsivos ambulatoriais, os biológicos podem ser utilizados e os pacientes mantidos com a terapia combinada (biológico + imunossupressor oral, AZA ou 6-MP).

remissão, porém este aspecto carece de comprovação científica.(6) Doses únicas de messalazina com novas formulações(3) são equivalentes às doses fracionadas e têm o potencial de aumentar a aderência ao trata-mento, particularmente na manutenção da remissão.(4,5,6,8,23)

Nos pacientes que apresentam recaídas, mesmo com a manutenção adequada com os derivados salicílicos, e nos corticoide-dependentes recomenda-se o uso de imunossupressores orais como destacado acima (AZA, 6-MP).(11,15,24)

Pacientes com doença grave ou fulminante que melhoram após cur-so de corticoide, ciclosporina ou biológico (IFX, ADA) devem também manter os imunossupressores (AZA, 6-MP) por tempo indeterminado.(6)

Ciclosporina pode servir de droga “ponte” até que o efeito dos imu-nossupressores ocorra (após 3-4 meses).(6,13,15)

Nos pacientes em uso de biológico (IFX ou ADA), o uso concomitante de imunossupressor parece ser benéfico (quadro 2).(13,15) Discute-se hoje se há necessidade de manutenção com derivados salicílicos no caso dos imunossupressores serem mantidos também, pois o efeito anticarcinogêni-co do 5-aminossalicílico (5-ASA) tem sido questionado.(25) Aparentemente, o mais importante é manter a mucosa sem inflamação, não importa com que tipo de medicação.(26) Por outro lado, o 5-ASA aumenta a ação da AZA/6-MP, ao inibir a enzima TPMT (tiopurina metiltransferase) e elevar os níveis de 6-TG (6-tioguanina), metabólito ativo da AZA e 6-MP.(6)

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DOEnçA DE CROhn

doença de Crohn ileal, ileocecal, íleo terminal + cólon direito, cólon direito e doença de Crohn de cólon – formas leves

Pacientes com formas leves de doença de Crohn comprometendo o íleo terminal, região ileocecal, íleo terminal e cólon ascendente ou somente o cólon ascendente, após indução da remissão com budesonida [dose de 9 mg/dia seguida de “desmame” (budesonida atualmente não tem sido encontrada no mercado brasileiro e esses casos, no momento e proviso-riamente até que a droga retorne, têm sido tratados na fase aguda com messalazina ou antibióticos](8,27,28) podem ser deixados sem medicação ou, a critério médico, mantidos com imunossupressores orais nas doses acima descritas por tempo indeterminado (ex.: AZA, 6-MP).(28)

Nos casos com doença de Crohn leve comprometendo o cólon (formas ileocolônicas e colônicas), após indução da remissão com SSZ (3-4 g/dia),(28) os pacientes podem ser mantidos com imunossupressores orais, a critério médico.(8,28) Messalazina, apesar de alguns estudos iniciais sugerirem seu valor em casos de doença de Crohn ativa(8) e em casos selecionados de doença de Crohn em remissão (ex.: remissão alcançada por cirurgia),(29) não tem sido recomendada nos recentes consensos e revisões sistemáticas no tratamento da doença de Crohn.(3,30-34)

doença de Crohn moderada/graveNas formas moderadas e graves de doença de Crohn, em geral a indução

da remissão na fase aguda é feita com os corticoides se a opção do médico for pela estratégia “step-up” (ver doses acima).(30,35) Após indução da remissão, os pacientes devem ser mantidos com imunossupressores orais nos esquemas acima descritos.(15,31) O uso repetitivo de corticoides deve ser evitado e tão logo o paciente caracterize corticoide-dependência, os imunossupressores devem ser iniciados.(19) Os imunossupressores estão indicados também nas formas refratárias ao corticoide.(15) Os pacientes que não responderem adequadamente com o tratamento imunossupressor devem ser tratados com biológicos (ex.: IFX, ADA).(16) Preferencialmente os imunossupressores orais devem ser man-tidos após introdução dos biológicos (terapia combinada).(16,17,36)

AZA e 6-MP são, de fato, muito úteis no tratamento de manutenção da do-ença de Crohn com eficácia (melhora ou remissão) em 42-91% dos pacientes (os números mais elevados são observados na população pediátrica e com uso precoce do imunossupressor) com doença luminal, com refratariedade ou dependência do corticoide.(15) Também são úteis na doença fistulizante (30% de

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melhora ou remissão), particularmente quando associados aos biológicos.(17,31,36)

O NNT (número de pacientes em remissão que precisam ser tratados para que se consiga benefício em pelo menos um paciente) para manutenção da remissão com os imunossupressores AZA/6-MP é 7.(15,37) A droga deve ser mantida indefinidamente, uma vez que a sua suspensão relaciona-se com taxa de recaída de 21-38% em 12-18 meses e 75% em 5 anos.(15)

Metotrexato (MTX), um antagonista do folato, pode ser uma alternativa aos imunossupressores tradicionais.(15,38) A dose recomendada é de 25 mg/semana, preferencialmente por via intramuscular ou subcutânea por 12-16 semanas, seguida de 12,5-15 mg de manutenção.(15,39) Sua eficácia na doença de Crohn na indução de remissão e na doença refratária ou dependente de corticoide é da ordem de 39-90% dos pacientes (valores mais elevados referentes ao sucesso da terapia de manutenção em 1-2 anos).(15,39) Como no caso da AZA/6-MP, a suspensão do MTX relaciona-se com recaída (>80% em 4 anos). Os efeitos colaterais do MTX incluem estomatite, náuseas, vômitos e mal-estar geral.(15) O uso de ácido fólico concomitante (1-2 mg/dia) é recomendado.(15,39) Efeitos colaterais mais graves costumam ser raros nas doses habitualmente utilizadas no tratamento da DII e abrangem fibrose pulmonar, nefropatia por depósitos de cristais de MTX, toxicidade medular e hepatotoxicidade.(15,39) Monitoramento periódico (a cada 2-4 meses) das transaminases deve ser feito e elevação acima de três vezes o limite superior implica suspensão da medicação.(15) A prática tradicional de biopsiar o fígado após 1,5 g de dose acumulada de MTX não é uma prática recomendada de rotina no caso da DII.(14) MTX é teratogênico e em mulheres em idade fértil sob uso de MTX recomenda-se a utilização de dois métodos de anticoncepção durante o tratamento com MTX.(15) MTX, por-tanto, pode ser uma opção para pacientes que não toleram AZA ou 6-MP.(15,39)

Casos não responsivos aos imunossupressores (AZA, 6-MP, MTX) beneficiam-se com a introdução de biológicos (IFX, ADA). Os imunossu-pressores devem ser mantidos.(17,31,40)

Em casos selecionados de doença de Crohn grave ou “incapacitante” - tradução do inglês para “disabling” – (ex.: pacientes jovens, doença de delgado extensa, necessidade de corticoide em altas doses no primeiro surto da doença, doença perianal, ulcerações profundas), a estratégia “top-down” pode ser instituída, a saber, biológico (IFX, ADA) associado ao imunossupressor (AZA, 6-MP, MTX).(17,31) Embora alguns autores sugiram a retirada do imunossupressor oral ou do biológico em alguns pacientes selecionados (ex.: naqueles com remissão completa ou profunda mantida), a maior parte dos pacientes (≈ 90%) necessita de manutenção com terapia combinada (biológico + imunossupressor).(17,31)

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Quadro 3. Tratamento de manutenção na doença de Crohn (DC) – ver doses no texto

Formas leves de DC – Pacientes com DC leve comprometendo o íleo terminal e/ou ceco/cólon ascendente, após indução da remissão com budesonida (ver comentários no texto), podem ser mantidos sem medicação ou, a critério médico, com imunossupressores (ex.: azatioprina – AZA, 6-mercaptopurina – 6-MP).

Formas moderadas/graves de DC – após indução da remissão com corticoides (ex.: prednisona, hidrocortisona), manter imunossupressores orais (AZA, 6-MP); metotrexato (MTX) pode ser uma opção em casos não responsivos ou intolerantes a AZA/6-MP. Os corticoides não devem ser usados repetidamente e tão logo o paciente caracterize refratariedade ou depen-dência, os imunossupressores (AZA/6-MP, MTX) devem ser introduzidos. Biológicos (ex.: IFX, ADA), associados aos imunossupressores (AZA, 6-MP, MTX), estão indicados nos casos não responsivos. Estratégia “top-down” [biológicos (IFX, ADA) + imunossupressores (AZA, 6-MP, MTX)] ad initio está indicada em casos selecionados de DC (ex.: jovens, doença perianal, doença de delgado extensa, ulcerações profundas, necessidade de corticoide no primeiro surto da doença); a combinação deve ser mantida após remissão.

Doença de Crohn perianal (em especial nas fístulas complexas) – Colocação de sedenhos ou setons, antibióticos (ciprofloxacina + metronidazol), biológico + imunossupressor; manutenção com terapia combinada (biológico + imunossupressor).

doença de Crohn perianalPacientes com doença de Crohn perianal, especialmente aqueles

com fístulas complexas, recomenda-se que sejam acompanhados por clínico e cirurgião experientes. Após adequada caracterização das fístulas por exame de imagem (ex.: ressonância nuclear magnética – RNM) e exame sob anestesia, são colocados os sedenhos ou setons, é instituída a terapêutica antibiótica (ex.: associação de ciprofloxa-cina, 500 mg, 12/12 h, via oral + metronidazol, 400-500 mg, cada 8 ou 12 h, via oral) e iniciada a terapia combinada com biológico + imunossupressor. Após 3-6 meses, suspender os antibióticos e manter a terapia combinada.(31) Vale lembrar que doença perianal é um fator de gravidade altamente relevante na doença de Crohn, tanto que a nova classificação da doença de Crohn (classificação de Montreal) incluiu doença perianal como uma variável importante de gravidade no contexto da doença de Crohn.(2)

No quadro 3 estão resumidas as condutas referentes à manutenção na doença de Crohn.

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Dr. Sender J. Miszputen

Capítulo 10

DOEnçA DE CROhn ESTEnOSAnTE E FISTuLIzAnTE

Dr. Sender Jankiel Miszputen

POR SUA CARACTERÍSTICA transmural, a doença de Crohn (DC), no curso natural de sua evolução, alternando fases de recidiva e de remissão clínica, tem grande tendência em modificar seu comportamento inicial, com o aparecimento de complicações, desde ampliação da inflamação para áreas previamente sadias, até estenoses, fístulas, perfuração vis-ceral e cirurgias com ressecção de alças intestinais, trazendo, nessas situações, importante impacto na qualidade de vida dos doentes, com sérias consequências físicas e psicológicas.(1)

As várias classificações relacionadas à DC e publicadas por diferentes grupos tiveram por intenção uniformizar os termos para caracterizar a doença, considerando a localização anatômica das lesões, bem como seu modelo fenotípico.(2,3) Porém, esses parâmetros mostram significativa tendência para se modificar com o tempo, conclusão já referida por Cosnes et al.,(4) que identificaram mudança da forma inflamatória para a estenótica ou fistulizante em cerca de 60% dos casos num grande grupo de doentes, analisado retrospectivamente.

DOEnçA DE CROhn FISTuLOSA Ou PERFuRAnTE

As fístulas representam, em geral, um problema e um desafio ao médico, em razão das limitadas opções do seu tratamento e resultados imprevisíveis. Originam-se, frequentemente, de úlceras profundas, com formação de um abscesso e sua penetração em órgãos ou tecidos

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adjacentes. Mesmo após drenagem espontânea do material infectado, persistirá o trajeto fistuloso, se não ocorrer qualquer manipulação para seu tratamento. A significativa morbidade dessas lesões responde pela dificuldade de sua abordagem.(5,6)

Têm evolução clínica variável, dependente de sua localização e complexidade. São classificadas de internas quando se comunicam com órgãos vizinhos, alças intestinais, bexiga, vagina, as mais difíceis de fe-chamento com tratamento medicamentoso e externas, que representam a maioria, se seu trajeto se abre na pele como as enterocutâneas ou periostomais, ou ainda na região perianal.(7)

A incidência cumulativa de formato penetrante (fistulizante) na DC varia de 33% até 50% após 10 e 20 anos do seu diagnóstico, respec-tivamente.(5,8,9) No trabalho de Schwartz et al.,(9) a ocorrência total de fístulas foi de 35%, com predomínio das perianais (54%) e enteroenté-ricas (24%). Já na casuística de Bell et al.,(8) as perianais somaram 65% dos casos, seguidas das retovaginais (16%).

Fístula perianalEm aproximadamente 10% dos doentes, fístula perianal é a primei-

ra manifestação da doença de Crohn, podendo preceder em anos o início dos sintomas intestinais.(10) Nesta localização, são consideradas fístulas simples aquelas de pequena extensão inter ou transesfincteria-nas baixas, sem abscesso, e complexas, na presença de trajetos altos, inter, trans ou supraesfincterianos ou associados com estenose.(11)

Essa diferenciação tem importância prognóstica, ainda que publica-ção recente concluísse não haver uma relação entre a complexidade da lesão e a probabilidade de sua cicatrização, quando tratada com agentes biológicos.(12)

Risco maior para o desenvolvimento da complicação nesta loca-lização é observado nos doentes com DC do cólon,(8) em particular naqueles com envolvimento do reto, quando comparados com os sem inflamação colorretal. Em outras casuísticas, o risco é citado para a localização ileal.(13) São citados outros fatores predisponentes para o aparecimento de fístulas perianais, além da localização anatômica do processo inflamatório: início em idades mais jovens, indivíduos não caucasianos, judeus de descendência oriental(14) e da participação de componentes individualizados, genéticos,(13) microbiológicos e imuno-lógicos, sugerindo que o comportamento etiológico desse modelo de

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fístula é efetivamente diferente do observado nas que ocorrem entre estruturas intra-abdominais.(15)

Num passado relativamente recente, a prática clínica mostrava que o surgimento de fístulas era, na maioria dos casos, acompanhado de múltiplas recidivas, até que se alcançasse seu fechamento completo, um processo, em geral, de longa duração. Novos métodos diagnósticos e terapêuticos modificaram, de forma significativa, na última década, essa expectativa, pela descoberta de drogas com maior poder anti-inflama-tório, assim como de abordagens cirúrgicas mais eficazes, apoiadas por procedimentos de imagem de maior precisão, o que coloca o clínico, o radiologista e o cirurgião em um esforço conjunto no tratamento dessa complicação.

tratamentoDe acordo com o Segundo Consenso Europeu baseado em evidên-

cias,(16) ao se planejar a estratégia a ser utilizada no tratamento das fístulas na DC deve-se levar em consideração:

- o local de origem da fistula e sua anatomia- avaliação do segmento intestinal que a origina (inflamação ou

estenose)- identificar a existência ou não de abscesso- determinar as vísceras envolvidas e sua contribuição para os sin-

tomas sistêmicos e na qualidade de vida- avaliação do estado nutricional do paciente.Os resultados desse Consenso sobre a medicação empregada na tera-

pia das fístulas perianais revelaram que para a maioria dos especialistas a primeira abordagem é representada pelos antibióticos, azatioprina/6-mercaptopurina como segunda opção e finalmente biológicos. Já o Guia do Colégio Americano de Gastroenterologia avalia essas drogas como grau C para os antibióticos e tiopurínicos e A para os anti-TNFs.(17)

Fístulas perianaisAntimicrobianosTeoricamente, bactérias podem ter participação no aparecimento e

persistência na doença fistulosa perianal. Antibióticos são eficazes, em curto prazo, na abordagem das fístulas e infecções associadas, mas o índice de sua recorrência com a suspensão do tratamento é muito ele-vado, além da cura completa não ser frequentemente alcançada com

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seu uso exclusivo. Apesar dessas constatações, continuam sendo lar-gamente utilizados como primeira opção terapêutica nas complicações perianais da DC.

A maioria das publicações referentes ao tratamento de fístulas pe-rianais com antimicrobianos compõe-se de trabalhos não controlados, incluindo populações numericamente pequenas. Responderiam aos imidazólicos, mais comumente empregados, combinados ou não à ciprofloxacina, de acordo com estudos antigos, não controlados.(18-21)

Recentemente, Thia et al.,(22) em um grupo randomizado, não en-contraram benefícios significantes na utilização de metronidazol ou ciprofloxacina em comparação com placebo, tanto na drenagem quanto na melhora do trajeto fistuloso. Quando combinados (1 g/dia de cada droga) mostraram efetividade na melhora dos sintomas, mas, raramente, seu completo fechamento, além de a descontinuidade desse esquema medicamentoso ter sido acompanhada da exacerba-ção das lesões.

Outros antibióticos também já foram usados no tratamento da doença perianal: amoxicilina/clavulanato, trimetoprima/sulfameto-xazol, levofloxacina, minociclina e tetraciclina,(23) sem sucesso na cura das lesões.

Em nossa experiência, a utilização exclusiva de antimicrobianos não é recomendada como terapêutica das fístulas da região perianal em si, mas como drogas adjuvantes ao controle das infecções subjacentes, praticamente presentes em todos os casos. Sua associação com imu-nossupressores aumenta a possibilidade de se alcançar o fechamento dos trajetos, ainda que o tempo de tratamento tenha que ser muito prolongado. Mesmo assim sem garantia de sucesso pleno.

Somos favoráveis à combinação ciprofloxacina (1 g/dia) com me-tronidazol ou similar (1 g/dia), no mínimo por 8 semanas, se efeitos adversos não requererem sua interrupção. Concomitantemente, o doente será medicado com azatioprina na dose convencional de 2,5 mg/kg de peso. Evidentemente, o acompanhamento clínico, labo-ratorial e de imagem deverá servir de balizamento para avaliação dos resultados.

A escolha de tiopurínicos como etapa do tratamento de fístulas peria-nais teve por base a experiência que foi sendo acumulada há décadas pelo nosso grupo com esses medicamentos, ainda em época anterior ao lançamento dos biológicos.

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imunossupressoresAzatioprina (AZA) e 6-mercaptopurina (6-MP) também não foram

avaliadas através de estudos controlados, como objetivo primário de fechamento de fístulas perianais na DC. Dados que favorecem o emprego dessas drogas resultam de meta-análise de cinco trabalhos randomizados e controlados, em que seu benefício para aquela complicação fez parte do objetivo secundário desses ensaios (resposta de 54% comparada com 21% para o placebo).(24) As conclusões desta pesquisa permitem inferir que essa classe de imunossupressores é eficaz tanto no fechamento das fístulas perianais na doença de Crohn quanto na sua manutenção. Ainda que essa resolução ocorra em pequeno número de pacientes, a supuração e o desconforto das lesões são marcadamente reduzidos.

Referências posteriores concluem pela melhora da doença perianal com emprego prolongado dos derivados purínicos.(11,25)

Citam-se a seguir alguns trabalhos sobre o emprego de outros imu-nomoduladores no tratamento de fístulas perianais com a opinião dos seus autores.

O metotrexato também não foi avaliado prospectivamente nessa complicação, mas alguns relatos sugerem uma possível ação positiva, em estudos não controlados,(26,27) o que poderia induzir ao seu uso, eventualmente, quando da falha da AZA ou 6-MP.

Em relação aos inibidores da calcineurina, a literatura descreve índices significativos de resposta à ciclosporina endovenosa: parcial em 77% dos casos num período de até 22 semanas,(28) resolução completa em 83% dos doentes, em até 18 meses,(29) ambos estudos retrospectivos, e 88% como resposta inicial e 44% de fechamento das lesões em até 37 meses,(30) em estudo aberto; quanto ao tacrolimus oral, 40% de resposta clínica completa e 50% parcial, em até 24 meses, em estudo aberto,(31) redução superior a 50% do material de drenagem, em 43% contra 8% do grupo placebo e cura de 10% contra 8% do placebo, num estudo controlado por 10 semanas.(32)

A melhora ou oclusão de fístulas perianais observadas no curto prazo não se sustentam quando da suspensão da medicação e tendem a recidivar. Em relação à ciclosporina, o benefício descrito naqueles trabalhos já havia sido observado na primeira semana de tratamento, mas a transposição da droga para via oral ou sua descontinuidade esti-veram associadas com elevado índice do seu reaparecimento. Com base nesses estudos, a sugestão é que a ciclosporina pode ser utilizada no

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tratamento de fístulas na doença de Crohn somente como ponte para a terapia com azatioprina/6-mercaptopurina ou metotrexato.

Quanto ao tacrolimus, no trabalho de Gonzalez-Lama et al.(31) os bons resultados de resposta clínica completa ou parcial foram alcan-çados com tratamento de longa duração, o que levaria à necessidade de manter essa droga por muito tempo para obter sucesso terapêutico, não esquecendo, obviamente, dos efeitos adversos, inerentes a esse medicamento Tratamento tópico com tacrolimus foi tentado em um protocolo randomizado, controlado com placebo.(33) Mostrou-se eficaz na cicatrização de lesões ulceradas anais e perianais, porém sem resul-tado na melhora das fístulas.

Essas limitações dos inibidores da calcineurina nos impediram de tentar seu emprego para tratamento da doença fistulosa perianal.

Agentes biológicosA chegada dos biológicos, inicialmente representados por drogas

que inibem a ação do fator de necrose tumoral (anti-TNFs), trouxe um grande impacto na terapia das doenças inflamatórias intestinais e de suas complicações. Sua rápida ação no sentido não só da melhora da qualidade de vida do doente, mas também sobre a cura das fístulas, com fechamento dos seus trajetos, modificou o tempo desta evolução, de meses para semanas.(34) A eficácia dos anticorpos anti-TNF na doença perianal, refratária a tratamentos convencionais, vem sendo demonstrada em vários estudos.

infliximabeO primeiro ensaio envolveu um grupo de 94 doentes com fístulas

perianais por DC, num estudo controlado com placebo, submetidos ao esquema clássico das 3 doses de indução com infliximabe durante 6 semanas:(35) 55% deles tiveram suas fístulas fechadas e 68% responde-ram com melhora, num tempo médio de 2 semanas. Na sequência, um protocolo de manutenção deste biológico foi desenvolvido (ACCENT II),(36) para avaliação de sua eficácia no longo prazo – 54 semanas. Fo-ram tratados, previamente, 282 indivíduos com o mesmo esquema de indução do infliximabe e, os que mantinham resposta na semana 14, randomizados para continuidade do biológico ou placebo. O objetivo primário, perda de resposta ao longo do tempo, naqueles mantidos com a medicação, se mostrou bem mais demorado (40 semanas) do que o

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placebo (14 semanas) (p < 0,001); 36% do grupo infliximabe apresen-tavam suas fístulas fechadas e 46% ainda com resposta na semana 54, contra 19% e 23%, respectivamente, dos que receberam placebo. Resul-tados semelhantes foram constatados posteriormente, por observação clínica, em série grande de doentes.(37)

É preciso considerar que o fechamento externo da fístula, qualquer que seja sua localização, nem sempre reflete sua plena resolução. No trabalho pioneiro de Present et al.,(35) a cura aparente foi seguida da formação de abscessos em 11% dos doentes tratados com o biológico, um risco sempre presente com a oclusão precoce do orifício fistuloso no plano cutâneo, mas mantida sua abertura no trato gastrointestinal. Lesões com supuração aguda ou com dor, consequência provável da presença de abscesso subjacente, têm indicação de drenagem cirúrgi-ca,(11) com ou sem colocação de sedenhos.

Paralelamente, a manutenção desses anti-TNFs reduziu em mais de 50%, comparada com a do placebo, a necessidade de hospitalização para tratamento das fístulas perianais da doença de Crohn, bem como, em igual percentagem, de cirurgias ou outras intervenções.(38)

Ao lado dos benefícios clínicos, a terapia com infliximabe promove um importante ganho na qualidade de vida dos doentes com doença perianal.(39) Sua suspensão é acompanhada de recorrência, com apenas 34% dos pacientes mantendo remissão após 1 ano sem o biológico, um índice bem menor que o observado na doença luminal, de 83%, nas mesmas circunstâncias.(40)

Uma questão ainda não totalmente respondida diz respeito ao valor da associação do infliximabe com imunossupressores para alcançar maior eficácia na resolução da doença perianal da DC. Em alguns trabalhos, incluindo o ACCENT II, parte dos doentes, tanto no braço infliximabe quanto no placebo, estava em tratamento com azatioprina, no início do protocolo. Na análise dos dados, pareceu não ter havido benefício para esta combinação de drogas.(41) Entretanto, num estudo recente para avaliação se a associação de imunomoduladores com anti-TNF tem utilidade em pacientes com doença de Crohn, observou-se menor frequência de complicações perianais entre os que estavam em dupla medicação.(42)

O estudo SONIC, que avaliou a eficácia de três esquemas terapêuticos nas formas moderada a grave da DC, azatioprina ou infliximabe como monoterapia e um grupo com tratamento combinado dos dois medica-

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mentos, incluindo mais de 500 doentes virgens para ambas as drogas, entre os quais 12% com fístulas perianais, não analisou separadamente esse grupo quanto a evolução de sua complicação, no período de 26 semanas, de acordo com o tratamento recebido,(43) embora como um todo a terapia dupla tenha se mostrado superior do que as drogas iso-ladamente, em relação à remissão da inflamação, não necessidade de corticosteroides e taxas de cicatrização da mucosa.

É reconhecido que o tratamento com o anti-TNFa tem maior proba-bilidade de curar fístulas perianais, em comparação com as internas.(44)

Cada vez mais frequentemente temos adotado o emprego de bio-lógicos na doença de Crohn fistulosa. Como os anti-TNFs já eram pro-posições terapêuticas nas falhas dos tratamentos com antimicrobianos e imunossupressores, sua associação com azatioprina passou a ser rotineira em nosso serviço, incluindo os casos que vinham em uso do tiopurínico, antes mesmo dos resultados do estudo SONIC. O esquema medicamentoso, combinado com drenagem prolongada da(s) fístula(s) através de sedenhos, é, a nosso ver, a melhor conduta terapêutica nesta complicação.

A associação do uso deste biológico com cirurgia é descrita em poucas publicações, com questionamentos ainda indefinidos sobre a melhor das estratégias a ser empregada: cirurgia antecedendo a aplicação da medicação, iniciando a droga para posterior manipulação cirúrgica ou, ainda, estabelecendo um esquema de manutenção com infliximabe e revisões periódicas locais sob anestesia, para decisão de inserção ou não de sedenho ou outros procedimentos.

Segundo Regueiro e Mardini,(45) o exame sob anestesia e drenagem prévia com colocação de sedenhos promove uma resposta clínica inicial favorável, menor índice de recidiva e tempo mais longo para seu reapa-recimento. Segue-se o tratamento medicamentoso. Em outro estudo,(46) envolvendo 79 casos, foram incluídos doentes que utilizaram o esquema com o biológico no pré-operatório e um grupo com tratamento concomi-tante. Ainda que a população estudada fosse muito heterogênea, ambos atingiram índices de cura (60%) e tempos de cicatrização semelhantes, embora dois subgrupos, um com fístulas transesfincterianas e aqueles com colocação apenas de sedenhos como única intervenção cirúrgica, tenham alcançado a cicatrização das lesões mais frequentemente, quan-do tratados com infliximabe, dispensando outros tipos de operações.

Dois estudos piloto mostraram resultados da injeção local de inflixi-

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mabe para fístulas perianais da doença de Crohn. Referem-se a situações de doença limitada ao ânus ou contraindicações para uso do biológico por via sistêmica. Poggioli et al.(47) trabalharam com infusão direta de 15-20 mg no tecido vizinho aos orifícios interno e externo e na parede do trajeto fistuloso com resolução de 10 em 15 casos tentados. Asteria et al.,(48) acompanhando por 10 meses 11 doentes que se submeteram ao tratamento injetável localizado, descreveram 6 casos de resposta e 4 de cicatrização.

AdalimumabeEste outro anticorpo anti-TNFa, humanizado, também tem mostrado

eficácia no tratamento da doença perianal. No estudo CHARM(49) con-trolado por placebo, foram analisados os resultados de 117 doentes com fístulas por DC, 2/3 deles com lesão única e 1/3 apresentando mais de um trajeto. Na primeira abordagem, todos receberam 80 mg do biológico e 40 mg após 2 semanas, seguindo-se sua divisão em três grupos: um grupo medicado com 40 mg a cada semana, outro a cada 2 semanas e um terceiro com placebo. Na semana 26, 30% dos doentes em manutenção com a droga tiveram fechamento completo das fístulas, número que se ampliou para 33% na semana 56, contra 13% do grupo mantido com placebo.

Já no estudo GAIN(50) utilizou-se o adalimumabe em doentes que ha-viam se mostrado intolerantes ou com perda de resposta ao infliximabe. Nos 325 indivíduos incluídos, 45 apresentando fístulas perianais, não se identificaram diferenças para resposta ou remissão das lesões, com regime de indução de 160/80 mg e placebo. O mesmo planejamento posológico e de controle em 4 semanas constou do trabalho multicên-trico de Hinojosa et al.,(51) trabalhando igualmente com doentes que já haviam utilizado e dispensado o infliximabe, pelas mesmas razões: dos 22 casos com doença perianal, a remissão completa ocorreu em 23% deles e melhora em 41%, caracterizada por diminuição igual ou superior a 50% no número de fístulas com drenagem no início do tratamento.

A extensão do estudo CHARM, avaliando resultados no longo prazo, com seguimento por 2 anos, demonstrou que 60% dos doentes tratados com adalimumabe mantinham a cicatrização das suas fístulas, ainda que os não respondedores, por retirada - perda de eficácia, efeitos adversos, violação do protocolo - tenham atingido a marca significante de 31%.(52)

Nosso grupo também tem utilizado o adalimumabe como opção de

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tratamento das fístulas perianais, quando da falha ou perda da resposta com infliximabe. A mesma proposta da troca do biológico que ocorre na condução geral da doença é válida nestas circunstâncias e seus re-sultados igualmente promissores.

outras terapiasAlguns estudos em décadas passadas descreveram a ação, em peque-

nas séries, do oxigênio hiperbárico no tratamento de fístulas perianais graves na doença de Crohn, com boa resolução das lesões.(53) Esse tratamento poderá ser adotado como terapia adjuvante em situações es-peciais, particularmente na presença de extensos processos infecciosos.

Fator de estimulação de colônias de granulócitos (GM-CSF), octreo-tida, dieta elementar, carbono com poder adsortivo são alternativas cita-das, porém sem evidências para sua utilização, por resultados próximos aos do placebo ou número baixo de indivíduos tratados.

Colas cirúrgicas de fibrina ou colágeno e rolhas de colágeno criaram grande expectativa, com excelentes resultados nas experiências iniciais. Num estudo randomizado e controlado,(54) cola de fibrina foi utilizada em 34 doentes com fístulas perianais: 38% de sucesso, contra 16% do grupo observacional. Posteriormente, 20 doentes desse grupo foram rea-locados para receber esse produto. Assim, do total de 54 casos tratados, em algum ponto da evolução, apenas 20% deles estavam em remissão no longo prazo (3 anos). A experiência com rolhas de colágeno tem relatado resultados variáveis de resolução, de 25% a 100%.(55,56)

Fístulas não perianaisEnterocutâneasO tratamento medicamentoso nesse modelo de fístulas não encontra

sustentação na literatura, em trabalhos randomizados e controlados. Apenas a referência dos subgrupos detalhados no estudo ACCENT II, em que menos que 10% dos doentes, que receberam infliximabe, apre-sentavam complicação enterocutânea. Em 1 ano a melhora ocorreu em 32% dos casos. Verdadeiramente essas fístulas são um desafio para o gastroenterologista e requerem cuidadosa análise para indicação cirúr-gica por causa da sua frequente recidiva. Calibre do trajeto fistuloso, frequência da formação de abscessos e o comprometimento nutricional, que dependerá de sua localização anatômica, poderão nortear a decisão da melhor conduta. Ressecções do segmento portador da fístula é a

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regra, quase sempre associada com lesão estenótica, fator importante para mantê-la ativa. Também áreas de sutura intestinal, resultantes de cirurgias prévias, constituem um terreno predisponente para sua origem. Utilizar algum dos anti-TNFs deverá ser a primeira tentativa terapêutica.

EnteroginecológicasEmbora possam, num primeiro momento, ser tratadas clinicamen-

te, de preferência com biológicos, as fístulas para a área genital, em geral, requerem intervenção cirúrgica, eventualmente com execução de ostomias. A decisão desta conduta, assim como a estratégia a ser adotada, deve obedecer a características de cada caso e, portanto, individualizadas.

COnCLuSõES

Fístulas na doença de Crohn continuam sendo um desafio para os médicos e um grande transtorno para os doentes, com graves implicações na sua qualidade de vida, física e emocional. Aquelas de localização perianal e perineal acompanham-se de longos períodos sintomáticos, dor, drenagem imprevisível, incontinência, abscessos, além da possi-bilidade da desfiguração genital, sem garantia de resolução, ainda que tratadas clínica e/ou cirurgicamente.

Antibióticos estão indicados, com preferência ao metronidazol e à ciprofloxacina. Azatioprina/6-mercaptopurina devem ser utilizadas precocemente nesta doença inflamatória, o que pode interferir na sua evolução e no aparecimento de suas complicações. Com as fístulas insta-ladas, desde que possam aguardar o pico de ação dos tiopurínicos, eles podem ser tentados e sua eficácia acompanhada com exame clínico e de imagem. No caso de resistência ou intolerância, a prescrição de biológi-cos é a alternativa recomendada. De acordo com os dados da literatura, esta classe de medicamentos é a que melhores resultados apresenta no controle e fechamento de fístulas, especialmente perianais, as mais frequentes. Essa condição permite que sua utilização possa ser precoce, até mesmo inicial, ultrapassando as tentativas referidas anteriormente.

Mas é preciso reconhecer que atuação sinérgica, envolvendo clínico e cirurgião é absolutamente indispensável. Tratamentos combinados parecem representar a grande chance para o sucesso terapêutico desta complicação.

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As estenoses representam também uma das mais graves complicações da doença de Crohn, por pressuporem futura indicação de ressecção cirúrgica de segmentos intestinais e, como consequência, um novo de-senho anatômico do canal alimentar, na maioria das vezes com perda do seu estado fisiológico, objetivo insistentemente perseguido pelo tratamento medicamentoso nessa doença. Surgem tanto no intestino previamente operado quanto em anastomoses de cirurgias previas do delgado e do cólon.

Essa manifestação tende a incidir, preferencialmente, em fases mais tardias da doença, como se observa, igualmente, em relação às fístulas. No momento do diagnóstico, de 19% a 38% dos doentes já apresentam alguma das duas complicações, número que se amplia para 56% a 65% após 10 anos de evolução, atingindo o índice de 88% aos 20 anos de inflamação.(57) Sugere-se que defeitos da imunidade inata, representa-dos por mutações do gene NOD-2 e da imunidade adquirida, através dos anticorpos contra antígenos microbianos luminais, atuem de forma sinérgica aumentando a probabilidade para o desenvolvimento de lesões fibroestenóticas na DC.(58) Cerca de 20%-30% dos doentes com estenose desenvolverão, secundariamente, fístulas internas(59) e a ex-periência demonstra, na prática, que o tratamento da inflamação nem sempre previne sua evolução para uma cicatriz fibrosa, complicação que acaba se tornando a mais frequente das indicações de cirurgias de ressecção na DC.

Um dos grandes desafios clínicos nos quadros suboclusivos é a diferenciação entre atividade inflamatória, acompanhada de edema da fase aguda e consequente diminuição da passagem da área estenóti-ca, portanto reversível, pelo menos temporariamente, com tratamento medicamentoso, desde que na ausência de outras complicações, e a fibrose estabelecida, com retração cicatricial, de solução em geral operatória, através de procedimentos de dilatação, também de efeito transitório ou, definitivamente, pela ressecção do segmento obstruído. Ambas as situações se superpõem quanto aos sintomas, mas alguns aspectos podem ajudar na sua distinção, em bom número de casos: queixas recentes de descompensação (febre, diarreia), alterações nas provas de atividade inflamatória (PCR, calprotectina), resposta imedia-ta ao tratamento com corticosteroides ou imunomoduladores de ação

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rápida, são parâmetros para se aceitar a presença da inflamação como componente da suboclusão. Quando esta complicação se apresenta sem outras manifestações clínicas ou sinais laboratoriais sugestivos de processo ativo e sem melhora com o tratamento mais agressivo há for-te indício para considerar apenas a fibroestenose como justificativa da obstrução. Na prática, efetivamente, as duas condições coexistem, ou seja, a inflamação aguda só dificulta o trânsito do segmento doente se seu lúmen já tiver algum grau de redução do diâmetro, originado em retrações cicatriciais das suas paredes.

Novas técnicas de imagem, envolvendo o estudo detalhado do intes-tino delgado, trouxeram grande contribuição para distinguir as compli-cações que acompanham a evolução do processo inflamatório da DC, especialmente as que decorrem das lesões penetrantes e das estenoses.

As enterografias, por ressonância nuclear magnética (ERM) e por tomografia computadorizada (ETC), representaram importante avanço na avaliação morfológica dessa doença de qualquer localização, espe-cialmente a relacionada ao intestino delgado,(60) com resultados supe-riores quando comparadas com a radiologia convencional do trânsito intestinal, que identifica o estreitamento, porém sem diferenciar se por edema inflamatório ou fibrose. Obviamente é um procedimento que se recomenda para os casos em que os trechos doentes não estejam ao alcance da endoscopia ou ela está contraindicada, como por exemplo, a cápsula endoscópica nas estenoses. Ressalte-se ainda que a endoscopia somente avalia a mucosa superficialmente e não a inflamação transmu-ral. A mesma eficácia das imagens é obtida nas lesões penetrantes da região pelviperineal.

Nos casos de estenoses, vários sinais radiográficos observados na enterotomografia auxiliam a definir seu caráter inflamatório ou fibrótico, criando maior facilidade para a decisão da conduta terapêutica. Na pre-sença de inflamação são identificados: realce da mucosa, reconhecido pela densidade do seu brilho, aumento da vascularização mesentérica, através do engurgitamento dos vasos do segmento doente, espessamento da parede intestinal, presença de fluido extraluminal, espessamento me-senterial, gás extraluminal, aumento linfonodal, proliferação da gordura mesentérica, e presença de fezes no intestino delgado.(61) Este trabalho encontrou também uma correlação dos achados de imagem com mar-cadores da inflamação, PCR e hemossedimentação, como ocorre em outras doenças com anormalidades vasculares. Igualmente comprovou-

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se uma correlação entre a medida quantitativa da atenuação da parede intestinal pela ETC com a análise histológica da inflamação.(62)

A enterorressonância tem a vantagem sobre a enterotomografia por não envolver radiação ionizante, oferecer imagens em múltiplos planos, assim como recursos para sua alta resolução, através da distensão das alças por algum contraste ministrado pela via oral.(63) A acurácia diag-nóstica de ambos os métodos é comparável,(64) ainda que a qualidade da imagem da ERM não seja tão boa quanto a observada na tomografia e apresentar maior variabilidade de interpretação interobservadores.(65,66) Mas, sem a agressão de radiações, seu emprego nos doentes que serão submetidos provavelmente a repetidos procedimentos de imagem, desde jovens, quando habitualmente o processo inflamatório se inicia,(67) é opção segura para o acompanhamento da evolução da doença, até mesmo por permitir analisar os resultados sobre a eficácia dos tratamentos medicamentosos.(68)

tratamentoO tratamento da doença de Crohn na forma estenótica requer uma

análise sob duas ópticas, de acordo com o momento clínico em que se apresenta, ou seja, a abordagem terapêutica da fase aguda da suboclusão e quando da sua cronicidade.

suboclusão agudaNa dependência da localização anatômica da estenose, quadros de

vômitos podem criar estados de desidratação, exigindo reposição de volume e eletrólitos. Sondagem nasogástrica é conduta recomendada, não só para proteção contra aspiração traqueal de material refluído, como também de descompressão da área estenosada, por vezes a medida mais importante para sua reversão. A manutenção do estado volêmico e das funções vitais confere tempo para identificação da causa obstrutiva, inflamatória ou mecânica (sinais clínicos de doença ativa, laboratório e imagem). Complicação perfurativa, secundária à provável dilatação do segmento pré-estenótico, deve ser monitorada, por radiografias simples, seriadas do abdome.

Com o paciente hospitalizado, concomitantemente aos procedimentos diagnósticos referidos, sugere-se iniciar corticoterapia parenteral, hidro-cortisona na dose entre 300 mg a 400 mg/dia ou metilprednisolona 80 mg/dia, por via venosa e fracionada, ainda esteja em uso dessa classe

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de medicamento. A melhora é esperada num período de 36 a 48 horas. Nessa hipótese, a terapia deverá ser mantida até plena recuperação do trânsito, com a passagem do anti-inflamatório para a via oral, assim como o reinício da alimentação, em consistências progressivas. Nós utilizamos essa conduta.

Se esse esquema não produzir a desobstrução aguda, devem ser tentados imunomoduladores de ação rápida e de utilização parenteral, como ciclosporina (4 mg/kg/dia/EV) ou, preferencialmente, anti-TNF (EV ou IM)(69) segundo as doses recomendadas para indução de seu efeito sobre o processo imunoinflamatório. Não há evidências na literatura de que a rápida cicatrização das lesões provocadas pelos biológicos seja associada com o desenvolvimento de estenoses. Também tem sido nossa orientação.

Em estudo retrospectivo, Sanimi et al.(70) avaliaram a evolução de 53 doentes com fístulas, estenoses ou ambas as complicações. Ainda que mais da metade de todo o grupo tenha se beneficiado com o tratamento medicamentoso por curto tempo, 50% dos casos de fibro-estenose acabaram em cirurgia num intervalo de 1 ano, concluindo os autores pela pequena durabilidade da resposta inicial, e que, por esse motivo, a indicação da cirurgia deva ser a intervenção de primeira linha. Os diferentes percentuais alcançados talvez se relacionem com subgrupos fenotípicos respondedores iniciais ao tratamento medica-mentoso, como ocorre em outras situações da doença. Neste estudo, a recorrência da complicação ocorreu, preferencialmente, nos casos de localização ileicólica.

Talvez a única expectativa na condução desses casos com a tenta-tiva clínica seja a de evitar, pelo menos em parte deles, a cirurgia de ressecção numa fase mais aguda da inflamação, além do que é preciso reconhecer, na prática, que um número não desprezível deles consegue manter-se sem os sintomas da obstrução por longo tempo, com seu intestino anatomicamente íntegro.

suboclusão crônicaNos doentes com lesões estenóticas pode-se optar pela dilatação,

por balão hidrostático, da área estreitada, desde que ela seja abor-dável pela endoscopia. O benefício clínico que promove e a relativa segurança do procedimento conferem à dilatação uma alternativa válida para o tratamento conservador destes casos.(71) Ainda assim

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deve-se dar preferência para as estenoses de mais fácil acessibilidade, no sentido de que o operador tenha melhor visão das manobras que irá executar. Não há dúvida de que com boa experiência o endos-copista será capaz de realizar a dilatação, mesmo em áreas distantes da borda anal.

Mesmo que decorrido longo tempo sem os sintomas a ela relacio-nados, a estenose irá se refazer, indicando-se novas dilatações, com a mesma segurança.(72) A injeção intramural de corticosteroide (trianci-nolona), nos quatro quadrantes da área recém-dilatada poderá retardar seu reaparecimento.

A cirurgia tem também diferentes formas de abordar as estenoses da DC. Na estratégia conservadora irá se utilizar das plásticas enterais, sem ressecção da área estreitada, mesmo se existirem múltiplas este-noses, eventualmente insuspeitas. Um impedimento para execução das estenoplastias cirúrgicas vem a ser o comprimento (extensão da lesão), o encontro de fístulas internas e dilatação do segmento pré-estenótico. As ressecções devem ser as mais econômicas possíveis, mesmo em se tratando da primeira intervenção, no sentido de man-ter a função intestinal, a mais próxima do normal, pois são doentes com risco aumentado para futuras ou novas ressecções. Caberá ao cirurgião decidir durante o intraoperatório pela anastomose primária das alças envolvidas ou em cirurgia posterior, precedida de estomia temporária.

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Dr. Antonio Carlos Moraes

Capítulo 11

COMO Eu TRATO:COnSTIPAçãO InTESTInAL

Dr. Antônio Carlos Moraes

A CONSTIPAÇÃO INTESTINAL é uma doença do homem moderno. Os estudos sobre a evolução humana mostram que o homem primitivo não sofria desse mal. Era nômade, ingeria grande quantidade de fibras e não tinha os efeitos dos medicamentos, do sedentarismo e do estresse urbano, males que afetam o homem moderno.

O ser humano passou a apresentar, com o passar dos anos, uma rela-ção cada vez mais difícil com o ato de evacuar. Criou-se o mito social de que a evacuação é quase um “pecado” e, consequentemente, as pessoas tentam inibir seus reflexos, o que gera cada vez mais a dificuldade de evacuar. A falta de tempo, a pressa e as dificuldades em relação aos banheiros públicos contribuem para o agravamento dessa entidade.

A constipação intestinal é patologia de grande prevalência, que incide sobre uma parcela significativa da população ocidental. Acomete crianças e adultos, homens e mulheres, como expressão da dificuldade de evacuação do conteúdo do cólon, resultando em número considerável de consultas aos clínicos e especialistas. Em nosso dia a dia no consultório ou nos ambulatórios de gastroenterologia, a constipação é uma das queixas mais frequentes. Geralmente tem início no período da adolescência e tende a agravar-se progressivamente, com o passar dos anos.

Deve-se, a princípio, considerar a constipação intestinal como um sintoma, uma manifestação clínica, nem sempre isolada, que pode acompanhar vários distúrbios funcionais ou doenças orgânicas, intesti-nais ou extraintestinais.(1)

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COMO Eu TRATO: COnSTIPAçãO InTESTInAL

O desconforto que causa chega a interferir na qualidade de vida de muitos dos indivíduos que a apresentam,(2) levando-os, inicialmente, a tentarem soluções através de acertos dietéticos e/ou medicamentosos por decisão própria ou sugestão leiga.(3) Essa postura, difundida no mundo todo, infelizmente pode encobrir a verdadeira causa ou causas da constipação, retardando um diagnóstico etiológico mais preciso da disfunção e a melhor conduta a ser adotada.

O primeiro passo, para uma abordagem diagnóstica e terapêutica adequada, passa pela conscientização do clínico ou especialista de que não basta dizer que se trata de uma queixa com pouca importância, e que um simples laxativo resolverá o problema. Cada vez mais em nos-so meio as consultas são muito curtas e com anamnese e exame físico de baixa qualidade. É fundamental, no caso da constipação intestinal, que a relação médico-paciente seja muito bem estabelecida, para que o paciente entenda de forma clara e objetiva que seu problema não é simples, necessita de uma abordagem terapêutica, em alguns casos polimedicamentosa, mas que não terá impacto maior do ponto de vista prognóstico, caso tenha tratamento adequado. Outro ponto importante é que o médico entenda e respeite o impacto que a constipação intestinal provoca na qualidade de vida do seu paciente e procure motivá-lo em cada consulta, no sentido de uma reeducação do trânsito intestinal, com a parceria do paciente, para principalmente no que tange às medidas higiênico-dietéticas estas sejam seguidas.

É bem verdade que o paciente constipado também tem, como princi-pal expectativa, quando busca o atendimento médico, receber apenas a sugestão de um medicamento “SOS”, que solucione sua dificuldade de evacuar. Esse comportamento, bilateralmente cômodo, apresenta, para um grupo desses pacientes, razoável chance de insucesso, mantendo-se dependentes de medicação ou necessitando de sua troca frequente ou ainda do aumento de doses, quando não atrasando o diagnóstico da causa, por vezes de maior gravidade.

Devemos também esclarecer o que vem a ser uma evacuação ou ritmo intestinal normal, para desfazer dúvidas tão frequentes em relação a este tema. A evacuação normal varia entre três vezes ao dia até de dois em dois dias, desde que com fezes de forma, volume e consistên-cia normais e que o paciente não permaneça, após a evacuação, com o desconforto retal, que precede a evacuação normal.(4)

Para que possamos fazer a escolha terapêutica adequada, devemos

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Dr. Antonio Carlos Moraes

entender os mecanismos fisiopatológicos da constipação intestinal. O tempo de trânsito fisiológico pelo cólon pode atingir de 36 a 48 ho-ras, muito acima do observado no intestino delgado. Segundo alguns trabalhos, a desorganização das contrações colônicas, reconhecida em animais, justificaria a lentidão com a qual se movimenta o intestino grosso do ser humano.(5) O resultado final dessa propulsão, qual seja, a transferência dos resíduos para seu trecho distal, depende da fre-quência, da amplitude, do direcionamento das ondas de propagação e da distância que percorrem em cada movimento, em geral de poucos centímetros, características provavelmente influenciadas por múltiplos fatores, que determinam no homem, quase certamente, seu comporta-mento individualizado quanto ao padrão evacuatório.

A evacuação inicia-se com a chegada das fezes ao reto e o relaxamento do esfíncter anal interno, o que causa sensação local de necessidade da defecação. Esse relaxamento, associado a contrações reflexas do reto, permite o deslocamento das fezes para o canal anal, onde ocorre a decisão pessoal de continuar o mecanismo da defecação ou reprimi-lo, pela ação voluntária de contração do esfíncter externo. Caso venha a ser inibido, o material retorna para o cólon sigmoide. Se prosseguir, com o esforço para evacuar, auxiliado pela participação da musculatura pelve-perineal, abre-se o ângulo reto-anal, criando quase uma linha reta entre ambos os segmentos e, à custa do relaxamento voluntário do esfíncter anal externo e dos músculos pubo retal e pubo coccígeo, completam-se os movimentos sequenciais que terminam com a expulsão do conteúdo fecal.(6)

Os movimentos de massa são considerados essenciais para a função motora do cólon e provocados pelas contrações migratórias gigantes. Estas ocorrem no cólon ascendente e transverso, poucas vezes por dia, em especial após refeições e no momento da evacuação. A ausência dos movimentos de massa, por um decréscimo na frequência das contrações gigantes, está claramente associada aos casos de constipação intestinal.

A motilidade colônica é dependente de estímulos nervosos que partem dos múltiplos plexos intramurais, localizados nas diferentes camadas de sua parede: subserosos, mioentéricos, submucosos e mucosos. O controle motor está mais relacionado com os plexos mioentéricos. Algumas funções do cólon decorrem de estímulos relacionados à sua inervação extrínseca, simpática e parassimpática, ramificações do sistema nervoso central e da complexa integração neuro-hormonal que executa com o sistema nervoso autônomo entérico. Os neurônios motores, que expressam a atividade

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neurogênica desses sistemas, são classificados como excitatórios - colinér-gicos e não colinérgicos, e inibitórios - adrenérgicos e não adrenérgicos, cuja participação decorre da liberação dos seus neurotransmissores. Além dos estímulos neurócrinos, a motilidade colônica é também controlada por substâncias de efeito endócrino e parácrino.

Há uma regulação adicional, chamada não neurogênica, produzida na própria musculatura colônica, semelhante ao que ocorre com o músculo cardíaco, através de marcapassos, originando movimentos conhecidos como “ondas elétricas lentas”, e gerada por estruturas especializadas, as células intersticiais de Cajal, através dos neurotransmissores, peptídeo intestinal vasoativo (VIP) e óxido nítrico.

O ato da evacuação é caracterizado como resposta neurogênica às informações de receptores localizados na mucosa retal, estimulados por sua distensão e resulta da atividade de nervos ligados ao sistema nervoso central.

Toda esta fisiologia explica os três reflexos evacuatórios do ser hu-mano:

Reflexo ortocólicoReflexo gastrocólicoReflexo condicionadoNa abordagem terapêutica da constipação intestinal é muito impor-

tante estimular a presença de um reflexo condicionado, uma vez que estes pacientes geralmente não apresentam nem reflexo ortocólico, nem tampouco gastrocólico. Este reflexo pode ser criado através da definição de um determinado horário para defecação, que seja mais tranquilo para o paciente. Depois de um período, que é absolutamente variável para cada indivíduo, o reflexo condicionado pode estar presente.

Outro aspecto fundamental no momento da melhor abordagem te-rapêutica é classificar a constipação intestinal em:

Funcional ou primária, relacionada às alterações da motilidade do cólon, não associada com alterações das outras vísceras do sistema digestório, nem com a presença de sinais de alarme, como febre, perda de peso, anemia ou sangramento visível, portanto sem etiologia definida.(7) Incide preferencialmente na população jovem, tem início geralmente na adoles-cência ou na fase de adulto jovem, evolução insidiosa, longa duração, não comprometendo o paciente no seu estado geral. Nesse grupo encontram-se as disfunções oriundas de erros dietéticos e comportamentais ou por uso de medicamentos com efeitos potencialmente constipantes (quadro 1).

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Quadro 1. Classificação e mecanismos da constipação intestinal

Constipação intestinal funcional/primária

Erros dietéticos (pouca quantidade de fibras, baixa ingesta de líquidos).Erros comportamentais Horário inadequado para evacuar Não resposta ao reflexo evacuatório Postura para defecar inadequada Falta de concentração durante o ato de evacuarMedicamentos (drogas constipantes ou que apresentem como efeito

colateral a constipação intestinal)

Constipação intestinal orgânica/secundária

Inércia colônica Constipação por lentificação de trânsito Disfunção do assoalho pélvico Anismo Hipertonia do esfíncter anal interno Síndrome da úlcera retal solitária Intussuscepção Prolapso retal Obstruções intestinais, colônicas e anorretais Inflamatórias Tumorais Aderências intraperitoneais Doenças anorretais Fissuras Estenoses inflamatórias ou tumorais Doenças endócrino-metabólicas Diabetes Hipotireoidismo Hipocalcemia Hipocalemia Porfiria Uremia Doenças neuromusculares AVC Trauma medular Esclerose múltipla Doença de Parkinson Neuropatia autonômica Hirschsprung Doença de Chagas Pseudo-obstrução intestinal

Orgânica ou secundária, em que o ritmo intestinal depende de mu-danças estruturais do intestino grosso, anorretais ou perineais ou de seus elementos neuromotores, como manifestação digestiva de doenças sistêmicas ou metabólicas. Habitualmente, aparece em idosos, com rá-pida progressão e vem acompanhada de outras queixas digestivas ou da doença básica que a originou (quadro 1).

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Ao conhecer os dois mecanismos, podemos optar por esquemas tera-pêuticos adequados.

TRATAMEnTO

Boa relação médico-pacienteExplicar de forma mais didática possível o mecanismo da constipação

intestinal, com a intenção de desfazer os medos do paciente, principalmente em relação às doenças graves, especialmente o câncer de cólon.

Esclarecer que o paciente terá uma participação importante no sucesso da tera-pia, principalmente no que diz respeito às medidas higiênico-dietéticas. Aumentar a ingesta de fibras e líquidos na dieta. Praticar exercícios físicos, principalmente caminhadas e exercícios para reforço da musculatura da parede abdominal.(8)

reflexo evacuatório condicionadoEstimular a criação de um horário, que seja mais calmo para o paciente, de

acordo com conveniências individuais, para que este tente evacuar, mesmo que esteja sem vontade, com o intuito de desenvolver o reflexo condicionado.

Estimular a evacuação sempre que houver reflexo evacuatórioA repressão repetitiva do reflexo da evacuação é acompanhada da perda

progressiva da sensibilidade retal à sua distensão pelo bolo fecal, chegando a desaparecer por completo, uma circunstância que distancia cada vez mais o paciente da evacuação intestinal normal. Nos atendimentos de doentes constipados é relativamente comum a queixa da inexistência total da sensação da necessidade de evacuar, que, antes presente, foi ficando de aparecimento irregular, em intervalos cada vez maiores, graças à negação repetida às evacua-ções que lhe deveriam seguir. Este é um aspecto que deverá merecer especial atenção médica nas orientações gerais que serão recomendadas aos pacientes.(9)

Postura adequada no momento da evacuaçãoA utilização das pernas como ponto de apoio no chão e a função que

lhes cabe como alavanca na flexão do tronco sobre o abdome, permite que se obtenha o máximo do rendimento das forças musculares empenha-das no esvaziamento retal. A modernização dos assentos sanitários trouxe comodidade, mas perdeu em funcionalidade, uma vez que, ao sentar-se recostado, reduz-se a eficácia daqueles grupos musculares envolvidos no esvaziamento colorretal. Uma condição que também merece considerar,

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quanto a erros posturais, refere-se ao momento em que a criança passa a ter controle voluntário dos seus esfincteres, quando seus pais ou responsáveis esperam que ela aprenda a utilizar o vaso sanitário. A desproporção entre o comprimento de suas pernas e o nível do chão para um apoio adequado dificulta o pleno exercício das forças necessárias que favoreceriam uma evacuação completa, um mau princípio para tentar ensinar a manter essa regularidade funcional.

suspender medicamentos constipantesSempre que for possível, devemos suspender os medicamentos que

causem constipação intestinal. Muitas vezes este dado não é valorizado pelo paciente e deve ser motivo de questionamento específico durante a anamnese. Muitos casos de constipação iniciam-se ou pioram com o uso contínuo ou frequente de algum medicamento, potencialmente constipante, especialmente nos idosos.

Devem ser referidos os anti-inflamatórios não hormonais, analgésicos opiáceos, anticolinérgicos, anti-histamínicos, antidepressivos tricíclicos, antiparkinsonianos, anticonvulsivantes, bloqueadores de canais de cálcio, diuréticos, sais de ferro, bloqueadores de receptores de histamina, beta e alfabloqueadores, inibidores da monoamina-oxidase, antipsicóticos deriva-dos da fenotiazina, antiácidos contendo alumínio e cálcio e suplementos à base de cálcio (quadro 2).

Quadro 2. Medicamentos de efeito constipante

Anti-inflamatórios não hormonaisAnalgésicos opiáceosAnticolinérgicosAnti-histamínicosAntidepressivosAntiparkinsonianosBloqueadores de canais de cálcioDiuréticosSais de ferroBloqueadores de receptores de histaminaAlfa e betabloqueadoresInibidores da monoamina-oxidaseAntipsicóticos (fenotiazínicos)Antiácidos (Mg, Ca)

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suspender os laxativos de ação irritanteO abuso de certos laxativos de ação irritante também é uma das

causas iatrogênicas da constipação intestinal. O resultado inicial satis-fatório encobre um aumento progressivo da espasticidade do cólon, exigindo doses crescentes do medicamento, terminando no retorno da dificuldade de evacuar, na mesma gravidade que originou sua utili-zação. Quando os laxantes forem utilizados, devem ser administrados pelo menor tempo possível, para evitar abuso, pois além de perpetuar a dependência dos medicamentos, o hábito do uso de laxantes pode levar à perda excessiva de água e eletrólitos.(10)

Coloides hidrofílicos e agentes formadores de bolo fecalSão representados pelas fibras e farelo de cereais. A American Asso-

ciation of Cereal Chemists (AACC) define fibra alimentar como a parte comestível das plantas ou análogos aos carboidratos que são resistentes à digestão e absorção pelo intestino, com fermentação parcial ou total no cólon, incluindo polissacarídeos, oligossacarídeos, lignina e subs-tâncias associadas às plantas, as quais promovem efeitos fisiológicos.(11)

Com base na solubilidade em água, as fibras alimentares são dividi-das em dois tipos:

SolúveisInsolúveisAs fibras solúveis envolvem as pectinas encontradas nas frutas, ve-

getais, folículos de cascas, cevada, gomas (arábica e guar), mucilagens (psyllium e Plantago ovata).

Os suplementos alimentares com fibras costumam ser baratos, fáceis de usar, bem tolerados e seguros.

A casca de Plantago ovata contém um muciloide hidrofílico que sofre fermentação no cólon e aumenta a massa bacteriana deste. Estas têm a capacidade de incorporar água no seu interior, aumentando de volume, ocasionando assim o aumento do bolo fecal e facilitando o deslizamento das fezes.(12)

Por atuar como regulador intestinal, as fibras solúveis podem demo-rar de 2 a 5 dias para ter seus efeitos percebidos. É sempre importante recomendar que sejam ingeridas com, no mínimo, meio copo de água ou suco, para impedir a impactação.

As fibras insolúveis são as celuloses, hemiceluloses e lignina (farelo de

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trigo, leguminosas, vegetais folhosos). Apresentam efeito mecânico no trato gastrointestinal, sendo fibras de baixo grau de fermentação. Através da in-corporação da água aumentam o bolo fecal, facilitando a excreção das fezes.

As diretrizes americanas mostram que há uma significativa melhora com a ingestão de 20 a 30 g de fibra por dia.(13) No entanto, existem algumas contraindicações, tais como sintomas obstrutivos e megacólon. A flatulência é o efeito colateral mais comum, principalmente após a ingestão de produtos contendo fibras solúveis, embora esta manifestação diminua com o passar do tempo.

Cinco estudos clínicos compararam farelo com placebo ou com dieta pobre em fibras num total de 221 pacientes.(14) Sessenta e dois de 114 pacientes (54%) encaminhados para o farelo tiveram sintomas persis-tentes depois do tratamento. O farelo não teve efeito significativo sobre a Síndrome do Intestino Irritável.

Recomendamos a utilização de fibras solúveis em tomada, inicialmen-te matinal com aumento progressivo, conforme a necessidade.

Agentes osmóticosA lactulona é o principal exemplo e o mais prescrito. É um dissacarí-

deo formado por galactose e frutose, que é fermentado pelas bactérias do cólon, levando à produção de ácido lático, os quais acarretam uma diminuição do pH intraluminal e aumento dos movimentos peristálti-cos. Aumentam a pressão osmótica e diminuem a reabsorção de água devido à produção de dióxido de carbono proveniente da fermentação, podendo ocorrer flatulência, distensão abdominal, diarreia, distúrbios eletrolíticos e gerar tolerância.(15) Apesar de serem eficazes, os agentes osmóticos não devem ser usados como tratamento de rotina. A dose inicial da lactulona é de 30 ml por dia em uma ou duas tomadas.

As soluções eletrolíticas de polietilenoglicol (PEG) foram usadas, inicialmente, em doses elevadas para efeito laxativo no preparo de exames do trato gastrointestinal, especialmente a colonoscopia. Quando administradas por via oral não são absorvidas em virtude de sua na-tureza osmótica, como também não são metabolizadas pelas bactérias intestinais, levando à hidratação de fezes endurecidas, diminuição do período de trânsito e dilatando as paredes do intestino, acarretando o reflexo de defecação. O efeito geralmente é linear à dose. A maioria dos estudos mostrou bom perfil de segurança e tolerabilidade. Não costu-mam melhorar a dor abdominal. Alguns estudos mostram maior eficácia

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COMO Eu TRATO: COnSTIPAçãO InTESTInAL

com PEG do que lactulona no tratamento da constipação crônica.(16)

Os efeitos colaterais mais comuns são distensão abdominal e cólica.Candy e Belsey(17) realizaram revisão sistemática de estudos randomi-

zados e controlados, comparando o PEG e placebo ou outros laxativos em pacientes menores de 18 anos. Concluíram que este fármaco é de melhor aceitação.

Agentes umectantes ou emolientes fecaisO principal representante dessa classe é o óleo mineral, uma mistura

de hidrocarbonetos alifáticos retirados da vaselina. Sendo uma subs-tância oleosa, não digerida pelas enzimas humanas, lubrifica as fezes, facilitando o seu deslizamento. No entanto, o óleo mineral pode levar ao desenvolvimento de reações de corpo estranho na mucosa intestinal, dificultando a absorção de substâncias lipossolúveis, como as vitaminas. Vale ressaltar o risco de refluxo do óleo para a árvore respiratória em idosos, podendo ocasionar pneumonite.(18)

Devemos utilizar o óleo mineral com parcimônia, dando preferência para pequenas quantidades, como 5 a 15 ml por dia.

Laxantes estimulantesOs laxantes estimulantes exercem efeitos diretos nos enterócitos,

nos neurônios intestinais e na musculatura lisa do trato gastrointestinal. Provavelmente induzem inflamação branda e limitada dos intestinos del-gado e grosso, que promove acúmulo de água e eletrólitos, estimulando a motilidade intestinal, sendo que os mecanismos de ação incluem a ativação das vias das prostaglandinas-AMP cíclico e do NO-GMP cíclico e, talvez, a inibição da Na+, K+ ATPase.

Os laxativos irritantes compõem um grupo de substâncias, derivados antaquinônicos, cuja ação se faz sobre o plexo mioentérico, aumen-tando a motilidade colônica. Aloé, cáscara-sagrada e sena são os mais utilizados. Embora tenham efeito imediato satisfatório, não devem ser utilizados por tempo prolongado.(19) A melhor indicação para sua utiliza-ção é a inércia colônica. Eventualmente podem provocar dor abdominal.

ProcinéticosO termo procinético é reservado para medicamentos que aumentam

a motilidade do trato gastrointestinal, de forma coordenada por meio da interação com receptores específicos envolvidos na regulação do trânsito

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do bolo alimentar no intestino. Entre estes agentes, o que apresenta melhores resultados nos ensaios clínicos é o tegaserode, porém este se encontra fora do mercado.(20)

Bromoprida e metoclopramida eventualmente são utilizados, mas os resultados práticos têm resultados contraditórios.

supositórios e enemasDevem ser utilizados em casos graves de constipação intestinal.

Pacientes com fecaloma podem beneficiar-se de enemas de glicerina. Os enemas favorecem a umidificação do bolo fecal, facilitando a sua extração ou eliminação.

O uso de enemas de fosfato de sódio em idosos deve ser feito com cuidado e parcimônia. Podem ocorrer hipotensão, hiperfosfatemia, hipo ou hipercalemia, além de acidose metabólica.(21,22)

tratamento psicológico – psiquiátricoAlguns gastroenterologistas consideram que o tratamento dos dis-

túrbios psiquiátricos é tão importante quanto o uso de fibras laxantes ou procinéticos.

Abusos físicos, violência sexual, perdas de entes amados, insatisfa-ções pessoais, fobias, repulsa pelo ato de evacuar, podem ser pontos de apoio para uma terapêutica mais abrangente, com melhores chances de resultados favoráveis que os observados apenas pela prescrição de um medicamento.(23)

Indicamos a terapia psicológica ou psiquiátrica de apoio quando consideramos fatos graves ou não resposta terapêutica a despeito dos esforços terapêuticos medicamentosos.

BiofeedbackPode ser utilizado para corrigir contrações inadequadas da mus-

culatura do assoalho pélvico e do esfíncter anal externo durante a defecação em pacientes com alterações funcionais. Estudos mostram bons resultados nos pacientes com estas alterações funcionais. Alguns estudos mostram inclusive que o biofeedback foi mais eficaz que o laxante nestes casos.

Não abordaremos neste capítulo o tratamento cirúrgico da consti-pação intestinal, nem tampouco o uso de novas drogas recentemente liberadas pelas agências internacionais.(24)

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COMO Eu TRATO: COnSTIPAçãO InTESTInAL

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Dr. Carlos Fernando Francesconi • Dra. Maria Helena itaqui lopes

Capítulo 12

COMO Eu TRATO: SínDROME DO InTESTInO IRRITávEL COM

DIARREIA

Dr. Carlos Fernando Francesconi Dra. Maria Helena itaqui lopes

UM DESAFIO CLÍNICO RELEVANTE para os médicos que tratam os pacientes com síndrome do intestino irritável com diarreia (SII-D) é definir previamente o nível de severidade da doença para, então, poder adaptar a intervenção terapêutica à sua realidade sintomática.

Recentemente, a Fundação Roma criou um grupo de trabalho para estudar esta questão. Como resultado foi publicado um artigo que apresenta as recomendações deste grupo. Seguindo o modelo anterior de Drossman e Thompson, a severidade dos quadros clínicos de SII foi hierarquizada em leve, moderada ou grave. Os elementos utilizados para fins desta definição operacional foram de ordem de-mográfica, clínica e por informações advindas da aplicação de ques-tionários. Dois escores ainda não validados para o português foram utilizados, o que limita o emprego deste instrumento no nosso meio. Estas escalas são chamadas de Índice de Severidade do Distúrbio Funcional Intestinal (ISDFI) [Functional Bowel Disorder Severity Index (FBDSI)] e a SII - Sistema de Pontuação de Severidade [IBS Sistema de Pontuação de Severidade (IBS-SSS)]. Estes dois instrumentos se diferenciam em alguns aspectos e funcionam de forma comple-

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COMO Eu TRATO: SínDROME DO InTESTInO IRRITávEL COM DIARREIA

mentar no modelo proposto por Drossman. Ambas as medidas são relativamente fáceis de ser utilizadas, apresentam razoável validade e reprodutibilidade psicométricas, e podem, portanto, ser utilizadas para avaliar a gravidade da doença tanto em cenário clínico como no de pesquisa clínica (quadro 1).

Quadro 1. Proposta de perfil clínico de severidade da SII centrada no paciente

Característica clínica leve moderada grave

prevalência estimada 40% 35% 25%

fatores fisiológicos primariamente: disfunção disfunção intestinal e desregulação da dor pelo SNC

desregulação da dor pelo SNC

correlações psicométricas FBDSI: < 36 IBS-SSS: 75 – 175

FBDSI: 36 – 109 IBS-SSS: 175 – 300

FBDSI: > 110 IBS-SSS: > 300

dificuldades psicossociais angústia psicológica: nenhuma ou leve

angústia psicológica moderada história de abuso

angústia psicológica severa, catastrofismo;

sexo homens = mulheres mulheres > homens mulheres > homens

idade mais velho > mais jovem mais velho = mais jovem mais jovem > mais velho

# outros sintomas baixo (1 – 3) médio (4 – 6) alto (≥ 7)

qualidade de vida relacionada com a saúde

Boa Regular Má

utilização do sistema de atenção à saúde

0 – 1 / ano 2 – 4 / ano ≥ 5 / ano

restrição atividades ocasional (0 – 15 dias) mais seguidas(15 – 50 dias)

frequente / constante( > 50)

incapacidade laboral < 5% 6 – 10% ≥ 11%

Drossman DA, Chang L, Bellamy N, Gallo-Torres HE, Lembo A, Mearin F, Norton NJ, Whorwell P. Na J Gastroenterol 2011

TRATAMEnTO

Princípios geraisPaciente com sintomas levesOs pacientes com SII com sintomas leves são mais frequentemen-

te tratados pelos médicos. Geralmente são atendidos em serviços de atendimento primário, mantêm suas atividades diárias normais, têm

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Dr. Carlos Fernando Francesconi • Dra. Maria Helena itaqui lopes

pouca ou nenhuma dificuldade psicossocial e não são grandes usuários de serviços de saúde. Comumente respondem a uma abor-dagem geral de tratamento que envolve educação, tranquilização, mudanças dietéticas e de estilo de vida. Os seguintes itens devem ser contemplados:

- abordá-los de maneira positiva com relação ao diagnóstico;- encorajá-los a discutir sobre o seu cotidiano, sua qualidade de

vida e seus sintomas digestivos;- compreender qual é o seu conhecimento sobre sua doença,

quais seus medos e expectativas;- prescrever fármacos dirigidos aos sintomas específicos; usar a

loperamida e antiespasmódicos para facilitar o controle das evacuações; - educar o paciente: explicar o que é a SII;- orientar com relação a variáveis dietéticas e hábitos de vida;

deficiência de lactase e ingestão excessiva de sorbitol presente como adoçante artificial em produtos dietéticos e medicamentos, como também em quantidade considerável em alimentos como ameixa, pêssego, pera, maçã, chocolate e doces em pasta, e fruto-se são variáveis clínicas que devem ser levadas em consideração. Medidas simples de orientação podem muito ajudar os pacientes com maior sensibilidade intestinal;

- não acenar com cura da doença;- usar uma terminologia que seja compreensível pelo paciente.

Paciente com sintomas moderadosÉ menor a proporção de enfermos que apresentam sintomas mo-

derados, em geral intermitentes, mas às vezes incapacitantes. Seus sintomas, frequentemente correlacionados à fisiologia alterada do intestino, como, por exemplo, piora com a alimentação, alívio com a defecação, podem estar associados a distúrbios psicológicos. Nestes casos, os tratamentos compreendem:

- aplicar os mesmos princípios acima. Buscar e discutir possíveis desencadeantes psicossociais. Encaminhar para atendimento psico-lógico especializado somente aqueles pacientes motivados para este tipo de atendimento ou naquela situação em que o clínico não queira ou não saiba como atender globalmente o seu paciente. Usar com cautela medicação ansiolítica e/ou antidepressivos.

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COMO Eu TRATO: SínDROME DO InTESTInO IRRITávEL COM DIARREIA

Paciente com sintomas gravesUma menor proporção de pacientes com SII apresenta sintomas

graves e refratários. Esses enfermos deverão ser avaliados em cen-tros de referência e apresentam, frequentemente, dor abdominal mais intensa, muitas vezes constante, e dificuldades psicossociais em associação com altos graus de utilização de serviços de saúde. Nestes casos, é necessário:

- não aceitar a frequente solicitação do paciente de assumir todas as decisões por ele;

- estabelecer uma relação médico-paciente produtiva tentan-do evitar a realização de exames desnecessários e que o paciente continue a buscar outros profissionais à procura da cura mágica;

- definir quais os exames subsidiários que são necessários, e não o paciente;

- estabelecer metas realísticas de melhora;- discutir com o paciente alternativas terapêuticas e forçar com

que ele participe das decisões. Justificar o uso das medicações sinto-máticas que serão utilizadas ou reutilizadas explicando o mecanismo de ação das mesmas. Evitar o uso deliberado de placebos;

- conduzir as entrevistas valorizando os aspectos gerais do seu bem-estar. Algumas vezes é mais produtivo modificar o eixo do atendimento, valorizando aquilo que houve de melhora como resultado da prescrição da consulta anterior e colocando os sintomas remanescentes numa outra perspectiva, como, por exemplo, mostrar para ele que a melhora vem aos poucos, que ele deve continuar “lutando” junto; como eventuais eventos psicossociais podem ter participado na limitação da melhora. Estimular o paciente a desfocar sua atenção do funcionamento de seu intestino e de suas dores explicando-lhe de como a anteci-pação de sintomas desagradáveis pode participar negativamente em seu quadro clínico;

- reconhecer que estes pacientes via de regra têm dificuldade de insight e, mesmo algumas vezes, têm resistência a diagnós-ticos psiquiátricos. Uma série de exames negativos pode ter o efeito iatrogênico potencial de exacerbar o medo de câncer do paciente. No momento da consulta pode ser este o seu grande

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fator de descompensação psicológica e, consequentemente, justi-ficando a exacerbação dos sintomas;

- usar antidepressivos ou ansiolíticos quando necessário;- encaminhar o paciente para tratamento psicoterápico ou para

centros de tratamento de dor, quando necessário. Reconhecer os seus limites: buscar consultoria com outros colegas na eventualidade de se criar algum impasse no tratamento do paciente;

- tornar-se disponível ao paciente. Agendar consultas frequen-tes ou facilitar a marcação de consultas no momento em que os sintomas reaparecerem. Lembrar que muitas vezes por telefone podemos tranquilizar nossos pacientes poupando consultas des-necessárias.

Em todos os níveis de atendimento é importante orientar o paciente com relação à sua dieta. Ele deverá observar se deter-minados alimentos exacerbam seus sintomas: lactose, sorbitol, frutose e as gorduras podem piorar os sintomas dos pacientes com predominância de diarreia. A intolerância alimentar é frequente-mente relatada por pacientes com SII. Recentemente, Malagelada e colaboradores demonstraram experimentalmente que alguns pacientes com SII têm maior dificuldade em movimentar os gases ao longo do intestino delgado e cólon. Este poderia ser um fator patogênico para a percepção de dor abdominal, das queixas de borborigmos e de distensão abdominal. Nesta situação deve o médico ser prudente na orientação dietética a seus pacientes, uma vez que, do ponto de vista fisiopatológico, a hiper-responsividade do cólon a qualquer tipo de alimento é frequentemente detectada nesta população e poderia ser este o fator relacionado com os sintomas pós-prandiais.

terapêutica farmacológicaNenhum estudo controlado com placebo publicado antes de 1988

comprovou a eficácia de uma terapêutica específica no tratamento da SII. Atualmente, estudos bem estruturados, com poder estatístico adequado e com desfechos clínicos bem definidos, seguindo preferencialmente os Critérios de Roma, sugerem que novas drogas têm enorme potencial no tratamento desta doença.

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COMO Eu TRATO: SínDROME DO InTESTInO IRRITávEL COM DIARREIA

recomendações terapêuticasAntiespasmódicosNo Brasil, as drogas mais frequentemente usadas têm sido os

antiespasmódicos, com base na evidência de reduzirem a motili-dade do cólon sigmoide em resposta a uma refeição gordurosa, bem como o reflexo gastrocólico hiper-reativo. Recentemente, um estudo meta-analítico sobre relaxantes da musculatura lisa identificou 26 estudos randomizados controlados com parâme-tros semelhantes: avaliação global, dor, obstipação, distensão e ausência de reações adversas. Essa meta-análise concluiu que os relaxantes da musculatura lisa ou antiespasmódicos, com classe terapêutica, foram significativamente melhores que o placebo na avaliação global do tratamento (62% vs. 35%) e na melhora específica da dor abdominal (64% vs. 45%), sendo significativa estatisticamente com um p<0,01 para ambas. Os cinco fármacos seguintes mostraram eficácia superior ao placebo na SII: brometo de cimetrópio (composto antimuscarínico); brometo de pinavério e brometo de otilônico ou otilítico (derivados de amônio quater-nário com propriedades de antagonistas do cálcio); trimebutina (antagonista periférico dos opiáceos); e mebeverina, derivado da beta-feniletilamina (com atividade anticolinérgica). Os fármacos com ação antiespasmódica provavelmente funcionam bem em alguns pacientes, mas a interpretação atual é a de que os ensaios terapêuticos com eles realizados não tiveram o poder de afirmar com segurança se eram eficazes, e tampouco puderam afirmar que eles são ineficazes. Novos estudos com metodologia atualizada deveriam ser realizados para que esta hipótese fosse mais bem avaliada.

A loperamida é o agente antidiarreico de escolha, uma vez que não atravessa a barreira hematoencefálica, como o defenoxilato. Deve ser usado com cautela e nunca em doses fixas, pelo risco de o paciente tornar-se constipado.

Drogas com ação no Sistema nervoso CentralO uso atual, mais frequente, são os antidepressivos, quer

tricíclicos (por exemplo, amitriptilina, imipramina, doxepina), quer inibidores da recaptação da serotonina (por exemplo,

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A Gastroenterologia na Prática Clínica • 157

Dr. Carlos Fernando Francesconi • Dra. Maria Helena itaqui lopes

fluoxetina, sertralina, paroxetina), para tratar pacientes com SII, especialmente aqueles que apresentam sintomas mais graves ou refratários, comprometimento da função diária e associação com depressão ou crises de pânico. Seu uso, inicialmente, baseou-se no fato de uma elevada proporção de pacientes com SII referir depressão significativa. Hoje, no entanto, reconhece-se que os antidepressivos têm propriedades neuromoduladoras e analgé-sicas independentes de seu efeito psicotrópico. Além disso, tais efeitos podem ocorrer mais cedo e com doses mais baixas do que com as usadas no tratamento da depressão. Como os antide-pressivos têm de ser usados de forma mais contínua, a decisão de seu emprego vai depender também do paciente apresentar sintomas crônicos ou frequentemente recidivantes.

Para melhorar a adesão ao tratamento, deve-se informar ao paciente que essas medicações antidepressivas atuam como analgésicos centrais e que controlam a dor reduzindo a função aferente visceral ou facilitando as vias inibidoras descendentes de controle da dor, podendo ajudar também nos sintomas depressi-vos induzidos pela doença. Deve-se prosseguir o tratamento no mínimo por 3 a 4 semanas, até doses terapêuticas plenas e, se eficaz, continuá-lo por 3 a 12 meses antes de iniciar a redução posológica. Pode haver resposta clínica insuficiente em virtude de não aderência ou doses mais baixas que as adequadas. Os anti-depressivos tricíclicos, por sua ação anticolinérgica, apresentam como efeito colateral a constipação. Este efeito agrega uma ação positiva no paciente com SII-D.

Os ansiolíticos têm sido, às vezes, prescritos em casos de SII, pela frequência de sintomas de ansiedade, com muitos pacientes referindo que as tensões psicológicas pioram seus sintomas intes-tinais. Dois estudos corroboram a eficácia dos benzodiazepínicos na SII, mas a diferença entre droga e placebo foi relativamente pequena. Em virtude do potencial de dependência e de interação com outros medicamentos, deve-se ter cuidado ao prescrever an-siolíticos benzodiazepínicos.

Psicoterapia e hipnoseSão opções interessantes para alguns pacientes, principalmente

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• Federação Brasileira de Gastroenterologia158

COMO Eu TRATO: SínDROME DO InTESTInO IRRITávEL COM DIARREIA

aqueles com grave comprometimento de sua qualidade de vida pelos sintomas psiquiátricos associados. Infelizmente, no nosso contexto so-cial são de difícil aplicação prática pela pouca disponibilidade destas alternativas terapêuticas à nossa população.

BIBLIOGRAFIA RECOMEnDADA

1. Camilleri M, Heading RC, Thompson WG. Consensus report: clinical perspectives, mechanisms, diagnosis and management of irritable bowel syndrome. Aliment Pharmacol Ther 2002;16:1407-30.

2. Drossman DA, Chang L, Bellamy N, Gallo-Torres HE, Lembo A, Mearin F et al. Severity in Irritable Bowel Syndrome: A Rome Foundation Working Team Report Am J Gastroenterol 2011.

3. Francesconi CF, Quilici FA, Passos MCF, Miszputen S et al. Consenso brasileiro da AbeSII para a síndrome do intestino irritável: diagnóstico e tratamento. Gastroenterol Endosc Dig 2008;27(2):31-37.

4. Creed F, Levy R, Olden K, Bradley L, Drossman D, Francisconi C et al. Psychosocial aspects of the functional gastrointestinal disorders. In: Drossman D, Corazziari E, Delvaux M et al. Rome III: The Functional Gastrointestinal Disorders and the Rome III Committees. EUA: Degnon editors, 2006, p.295-368.

5. Longstreth GF, Thompson GW, Chey WD, Houghton LA, Mearin F, Spiller RC. Functional Bowel Disorders Gastro;2006;130:1480.

6. Spiller R, Aziz Q, Creed F et al. Guidelines on the irritable bowel syndrome: me-chanisms and practical management Gut 2007;56:1770-1798.

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A Gastroenterologia na Prática Clínica • 159

Dr. Mauro Bafutto • Dr. Enio Chaves de oliveira • Dr. Joffre rezende Filho

Capítulo 13

TRATAMEnTO CLínICO DA DOEnçA DIvERTICuLAR

DOS CóLOnS

Dr. Mauro Bafutto Dr. Enio Chaves de Oliveira

Dr. Joffre Rezende Filho

O TRATAMENTO DA DOENÇA DIVERTICULAR DOS CÓLONS (DDC) visa aliviar ou eliminar os sintomas ou complicações da doença, nas suas diversas formas de apresentação. Estudos recentes, que demonstraram novas descobertas na sua fisiopatologia, deram origem a novas opções de tratamento da DDC. As causas da doença diverticular, e de sua complicação mais frequente, a diverticulite, ainda não estão totalmente esclarecidas, mas novas constatações demonstram que, além das alterações da resistência da parede do cólon, dos transtornos da motilidade colônica e de deficiências dietéticas, especialmente de fibras, a inflamação é o principal mecanis-mo patogenético tanto na diverticulite como na colite crônica associada à doença diverticular e também na doença diverticular sintomática não complicada. As evidências indicam que a inflamação é causada por uma produção exagerada de citocinas pró-inflamatórias, redução das citocinas anti-inflamatórias e aumento da síntese intramucosa de óxido nítrico.(1,2)

CLASSIFICAçãO CLínICA DA DDC

Atualmente não há uma classificação consensual e definitiva para a DDC. No entanto, é um entendimento comum de que os pacientes com

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• Federação Brasileira de Gastroenterologia160

TRATAMEnTO CLínICO DA DOEnçA DIvERTICuLAR DOS CóLOnS

diverticulose quando tornam-se sintomáticos são denominados como portadores de DDC. Por sua vez, a DDC pode ser dividida clinicamente em: Doença sintomática não complicada, doença sintomática recorrente e doença complicada (tabela 1).

Tabela 1. Classificação clínica da DDC(3)

Classificação Descrição

Diverticulose Pacientes com divertículos e ausência de qualquer sinal ou sintoma

Doença diverticular sintomática não complicada

Pacientes com divertículos que apresentam sintomas, mas sem inflamação diverticular

Doença diverticular sintomática recorrente

Pacientes com divertículos que apresentam sintomas recorrentes (mais de 1 por ano), mas sem sinais de inflamação diverticular

Doença diverticular complicadaPacientes com divertículos que apresentam sintomas que demonstram sinais de inflamação diverticular ou com complicações subsequentes (hemorragia, abscesso, fleimão, perfuração, peritonite purulenta e fecal, estenoses, fístulas)

Fonte: Tursi A. World J Gastrointest Pharmacol Ther 2010;6;1(1):27-35.

TRATAMEnTO DOS PACIEnTES COM DIvERTICuLOSE Intervenção terapêutica não é geralmente necessária em pacientes

com diverticulose, uma vez que são assintomáticos. Pode ser aconse-lhado a pacientes com diverticulose adotar uma alta ingestão de fibras, dieta pobre em gordura e aumentar sua atividade física, embora os en-saios clínicos controlados sejam no momento escassos e as provas de que esta conduta realmente pode ajudar a prevenir o desenvolvimento da doença diverticular não são conclusivas.(4-6)

TRATAMEnTO DA DOEnçA DIvERTICuLAR nãO COMPLICADA

Os principais objetivos do tratamento incluem a melhora dos sintomas, a resolução da infecção ou inflamação, a prevenção da recorrência da doença e impedir ou limitar o desenvolvimento de complicações graves.(7)

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Dr. Mauro Bafutto • Dr. Enio Chaves de oliveira • Dr. Joffre rezende Filho

A conduta terapêutica inicial envolve a modificação da dieta ou suplementação de fibras, junto com a terapia antibiótica.(8) O uso de um antibiótico deve ser adequado para resolver uma possível infecção por bactérias patogênicas e/ou supercrescimento bacte-riano.(9,10) As bactérias mais comumente isoladas são os coliformes (por exemplo, E. coli), Bacteroides spp, (por exemplo, B. fragilis) e Clostridium sp.(10-12) Dado o envolvimento potencial destes mi-cro-organismos, é aconselhável o uso de um antibiótico de amplo espectro, com atividade tanto contra bactérias Gram-negativas e anaeróbias.(13) Dentre os antibióticos absorvíveis, uma boa associa-ção é o uso das cefalosporinas e metronidazol. Vários estudos têm mostrado que a rifaximina (tabela 2), um antibiótico não absorvível, pode efetivamente melhorar os sintomas e manter períodos de re-missão em pacientes com doença diverticular não complicada.(14-18)

A rifaximina pode, portanto, ser considerada uma terapêutica adequada e eficaz para a doença diverticular não complicada, es-pecialmente quando usada em conjunto com a suplementação de fibras dietéticas.(19)

Tabela 2. Uso da rifaximina no tratamento da DDC não complicada

Rifaximina no tratamento da doença diverticular sintomáticanão complicada

N Dose Duração Sintomas

Papi et al. Open 107 Rifaximin 800 mg + glucomannan 2 g 1 week/month 64%*

110 Glucomannan 2 g x 12 months 48%

Papi et al. RCT 84 Rifaximin 800 mg + glucomannan 2 g 1week/month 69%*

84 placebo + glucomannan 2 g x 12 months 39%

Latella et al. RCT 595 Rifaximin 800 mg + glucomannan 4 g 1 week/month 57%*

Papi C, Ciaco A, Koch M, Capurso L. Efficacy of rifaximin symptoms of uncomplicated disease of the colon. A pilot multicentre open trial. Diverticular Disease Study Group. Ital J Gastroenterol 1992;24:452-6. Papi C, Ciaco A, Koch M, Capurso L. Efficacy of rifaximin in the treatment of symptomatic diverticular disease of the colon. A multicentre double-blind placebo-controlled trial. Aliment Pharmacol Ther 1995;9:33-9. Latella G, Pimpo MT, Sotilli S et al. Rifaximin improves symptoms of acquired uncomplicated diverticular disease of the colon. Int J Colorectal Dis 2003;18:55-62.

Brandimarte & Tursi(20) investigaram a eficácia da combinação mes-salazina + rifaximina seguida de messalazina isolada na remissão dos

*P<0.05

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TRATAMEnTO CLínICO DA DOEnçA DIvERTICuLAR DOS CóLOnS

Figura 1. Escores globais dos sintomas antes (basal) e após tratamento com messalazina.(20)

sintomas e a tolerabilidade no tratamento da doença diverticular não complicada. A prevalência de constipação estava presente em cerca de 68% dos pacientes (61 casos) e diarreia em 22% (29 casos) da doença diverticular. Noventa pacientes foram tratados com 2,4 g/dia de messala-zina associados a 800 mg/dia de rifaximina por 10 dias, seguidos de 1,6 g/dia de messalazina por 8 semanas. Dos pacientes que completaram o estudo (86), 81,4% (70 pacientes) estavam completamente assintomáticos após as 8 semanas de terapia (escore sintomático total = 0), enquanto 18,6% (16 casos) mostraram somente sintomas leves. O escore total dos pacientes diminuiu de 1.439 à admissão ao estudo para 44 ao final da oitava semana de terapia (p<0,001) (fig. 1).

Fonte: Brandimarte G, Tursi A. Med Sci Monit 2004.

Constipação Dor abdominal Muco Sangramentoretal

Diarreia

700

600

500

400

300

200

100

0

Basal Pós-Tratamento

Os resultados obtidos nestes estudos confirmam o efeito sinérgico dos dois fármacos: a rifaximina deve provavelmente eliminar a microflora (que parece ter um papel importante na determinação dos sintomas e da inflamação relacionada à doença diverticular) e a messalazina reduz o efeito da cascata inflamatória. O racional para o uso da messalazina na DDC é representado no quadro a seguir (fig. 2).

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A Gastroenterologia na Prática Clínica • 163

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A eficácia do uso isolado da messalazina na doença diverticular sintomática foi avaliada por Di Mario e cols.(21) em um estudo pros-pectivo, randomizado, aberto, por um período de dois anos. Os 170 pacientes foram tratados tanto com messalazina como com rifaximina por 10 dias/mês: um grupo (R1; 39 pacientes) recebeu rifaximina 200 mg b.i.d., outro grupo (R2; 43 pacientes) recebeu rifaximina 400 mg b.i.d., um terceiro grupo (M1; 40 pacientes) foi tratado com messalazina 400 mg b.i.d. e um quarto grupo (M2; 48 pacientes) com messalazina 800 mg b.i.d. À basal e após 3 meses de tratamen-to, foram registrados os dados referentes a 11 diferentes variáveis (dor/desconforto abdominal alta/baixa, distensão, tenesmo, diarréia, flacidez abdominal, febre, mal-estar geral, náusea, emese, disúria) avaliadas através de um escala qualitativa de 4 pontos. Os pacientes tratados com messalazina tiveram os menores escores globais aos 3 meses (p<0,001) (tabela 3, fig. 3).

Comparando a média dos escores globais dos sintomas de todos os pacientes tratados com a messalazina (grupos M1 e M2) e com os tratados com a rifaximina (grupos R1+R2), verifica-se que ambos os grupos tiveram redução altamente significante dos seus escores

Figura 2. Racional para o uso da messalazina na DDC.(48)

A. Tursi and S. Papagrigoriadis. The current and envolving treatment of colonic diverticular disease. Alimentary Pharmacology & Therapeutics 2009;30(6):532-546.

Racional para o uso da messalazina

Alteração da microfloraAtivação da cascata inflamatória

Aumento TNF alfaInterferon GamaRadicais livres

Inflamação diverticular

Inflamação diverticular

MESSALAzINA

Inibição de:Síntese de IL-1Atividade da COX, TBX, FAP,Atividade fagocitária e linfocíticaSíntese de óxido nítrico

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TRATAMEnTO CLínICO DA DOEnçA DIvERTICuLAR DOS CóLOnS

Figura 3. Evolução dos escores globais dos sintomas à basal e após 3 meses de tratamento.(21)

Tabela 3. Escores globais dos sintomas à basal e após 3 meses de tratamento(21)

Grupo de tratamento Escore basal Escore 3 meses Valor de “p”

R 1 (média ± DP) 8,4 ± 4,1 7,6 ± 5,5 NSR 2 (média ± DP) 9,8 ± 5,0 5,9 ± 3,6 <0,0001M 1 (média ± DP) 11,0 ± 5,0 6,7 ± 4,0 <0,0001M 2 (média ± DP) 8,8 ± 4,0 4,9 ± 3,4 0,0001

Fonte: Di Mario F, Aragona G, Leandro G et al. Dig Dis Sci 2005.

(p<0,0001 vs basal), embora o tratamento com a messalazina tenha demonstrado uma diminuição melhor após o terceiro mês de terapia (p<0,001) (fig. 4).

Os autores concluíram que a messalazina é tão eficaz quanto a rifa-ximina na diminuição de alguns sintomas, mas parece ser melhor que esta na melhora do escore global desses pacientes.

Aragona e cols.(22) também avaliaram a eficácia da messalazina em comparação com a rifaximina na melhora sintomatológica da doença diverticular não complicada. Quatro esquemas terapêuticos

Escore Basal Escore 3 meses

Esco

re g

loba

l dos

sin

tom

as

14

12

10

8

6

4

2

0

R1

R2

M1

M2

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Dr. Mauro Bafutto • Dr. Enio Chaves de oliveira • Dr. Joffre rezende Filho

distintos foram utilizados em 248 pacientes com diagnóstico com-provado por colonoscopia e enema baritado: grupo M1 (60 pacien-tes) messalazina 400 mg, grupo M2 (62 pacientes) 800 mg, grupo R1 (57 pacientes) rifaximina 200 mg e grupo R2 (69 pacientes) 400 mg, todos com administração duas vezes ao dia. A avaliação clíni-ca foi efetuada a cada 3 meses, durante 12 meses. O escore global dos sintomas (EGS) foi calculado pela soma total dos escores de cada sintoma. O EGS do grupo M2 (messalazina 800 mg b.i.d.) foi o mais baixo após 3 (p<0,0001), 6 (p<0,0001) e 12 (p<0,02) meses de tratamento. Após 12 meses de seguimento, o grupo M2 mostrou as menores taxas com relação a empastamento (p<0,006), tenesmo (p<0,001), diarreia (p<0,02) e febre (p<0,02). Comparando-se todos os pacientes tratados com a messalazina (grupos M1 e M2) e os tra-tados com a rifaximina (grupos R1 e R2), verificou-se um EGS menor com a messalazina após 3 (p<0,0001), 6 (p<0,0001) e 12 (p<0,005) meses de tratamento. Os resultados permitiram aos investigadores concluírem que a administração de messalazina é efetiva na remissão sintomatológica da doença diverticular não complicada dos cólons

Figura 4. Evolução dos escores globais dos sintomas à basal e após 3 meses de tratamento dos grupos tratados com a rifaximina e com a messalazina.(21)

Escore Basal Escore 3 meses

Esco

re g

loba

l dos

sin

tom

as

12

11

10

9

8

7

6

5

4

RifamixinaMessalazina

P=NS

P<0,001

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TRATAMEnTO CLínICO DA DOEnçA DIvERTICuLAR DOS CóLOnS

Figura 5. Pontuação total dos sintomas pré e pós-tratamento com messalazina 800 mg t.i.d.

aos 6 e 12 meses de seguimento. Os estudos demonstraram ainda que alguns sintomas apresentam melhora mais acentuada com a posologia de 800 mg de messalazina duas vezes ao dia do que com os demais esquemas terapêuticos.

Em estudo realizado em nosso serviço comparamos, em pacien-tes com DDC não complicada, o uso da messalazina 800 mg t.i.d. com a suplementação de Plantago ovata 3,5 mg b.i.d. Os pacien-tes foram submetidos a um questionário com uma escala Likert de 4 pontos para os seguintes sintomas – Dor abdominal, distensão abdominal, frequência das evacuações e consistência das fezes de acordo com a escala de Bristol. Após 30 dias respondiam novamente ao questionário de sintomas. Os resultados demonstraram que no grupo de pacientes que usaram messalazina 800 mg t.i.d. houve melhora estatisticamente significativa (p=0,0001) na pontuação total e de todos os sintomas avaliados, enquanto no grupo que utilizou Plantago ovata houve melhora estatisticamente significativa apenas da consistência das fezes e a pontuação total não alcançou signi-ficância estatística (figs. 5 e 6).

0 50 100 150 200

103

182

Pontuação

P = 0,0001 N = 20

Pós M

Pré M

G pré M = 9.10G pós M = 5.15G pré M = 1.21G pós M = 1.42

Média -

SD -

Pontuação total dos pacientes pré epós-tratamento com messalazina 800 mg t.i.d.

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A Gastroenterologia na Prática Clínica • 167

Dr. Mauro Bafutto • Dr. Enio Chaves de oliveira • Dr. Joffre rezende Filho

Figura 6. Pontuação total dos sintomas pré e pós-tratamento com Plantago ovata 3,5 g b.i.d.

TRATAMEnTO DA DDC RECORREnTE nãO COMPLICADA

Um estudo conduzido por Ierfone e cols.(23) evidenciou que a terapia combinada messalazina e rifaximina é mais eficaz que o tratamento com a rifaximina isolada tanto na resolução da sintomatologia como na preven-ção dos episódios recidivantes da DDC. Devido às características farma-cêuticas das duas formulações, o tratamento foi considerado bem tolerado sem ocorrência de eventos adversos importantes. O efeito terapêutico da messalazina na doença diverticular sintomática foi demonstrado no estudo, segundo os investigadores, uma vez que a adição deste agente à terapia com rifaximina permitiu aos pacientes uma maior probabilidade de permanecerem livres de recidivas sintomáticas (p=0,0005) e de fenômenos micro-hemorrágicos (p=0,001). Nos transtornos da evacuação, os pacien-tes tratados com messalazina + rifaximina foram significativamente mais satisfatórios. Os parâmetros laboratoriais se normalizaram com ambos os tratamentos, embora em níveis mais baixos com a associação terapêutica.

Comparato e cols.(24) utilizaram em um estudo clínico com 268 pa-cientes um esquema terapêutico cíclico – 10 dias de terapia a cada mês por 12 meses – comparando messalazina 400 mg e 800 mg b.i.d. com

0 20 40 60 80

76

92

Pontuação

P = 0,095 N = 10

Pós - PO

Pré - PO

G pré P = 9.20G pós P = 7.60G pré P = 1.81G pós P = 1.96

Média -

SD -

Pontuação total pré e pós-tratamento com Plantago Ovata 3,5 g b.i.d.

100

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• Federação Brasileira de Gastroenterologia168

TRATAMEnTO CLínICO DA DOEnçA DIvERTICuLAR DOS CóLOnS

rifaximina 200 mg e 400 mg b.id. e concluíram que a administração cíclica de messalazina, principalmente na dose de 800 mg b.i.d., é efi-caz na melhora da sintomatologia da doença diverticular dos cólons. Os resultados por grupo de tratamento são apresentados na tabela 4.

Tabela 4. Escores globais dos sintomas à basal e após cada período de tratamento(24)

Grupo de tratamento Basal 3 meses 6 meses 9 meses 12 meses “P” (vs. Basal)

R 1 (média ± DP) 8,67 ± 4,20 7,78 ± 4,49 7,07 ± 4,17 6,89 ± 3,49 8,18 ± 4,43 NS

R 2 (média ± DP) 9,46 ± 4,69 6,49 ± 4,16 6,72 ± 6,32 5,86 ± 4,55 5,64 ± 3,31 <0,0001

M 1 (média ± DP) 10,18 ± 5,05 6,40 ± 4,12 4,87 ± 3,41 3,77 ± 2,89 3,67 ± 1,91 <0,0001

M 2 (média ± DP) 9,48 ± 4,58 5,17 ± 3,75 3,15 ± 2,92 3,31 ± 2,70 2,44 ± 1,63 <0,0001

R1 = rifaximina 200 mg bid; R2 = rifaximina 400 mg bid; M1 = messalazina 400 mg bid; M2 = messalazina 800 mg bidFonte: Comparato G, Fanigliulo L, Cavallaro LG et al. Dig Dis Sci 2007.

Comparando-se os resultados dos pacientes tratados com a messa-lazina (grupos M1 e M2) com os dos tratados com a rifaximina (grupos R1 e R2), verificou-se que aos seis meses de tratamento os pacientes de ambos os grupos combinados mostraram redução altamente significante das médias dos escores globais dos sintomas (p<0,0001) (fig. 7).

Estes mesmos investigadores(25) avaliaram o impacto da terapia da doença diverticular na qualidade de vida dos pacientes e reportaram que, embora a doença tenha uma influência negativa, o tratamento cí-clico com agentes anti-inflamatórios locais como a messalazina ou com antibióticos fracamente absorvidos melhora o quadro sintomatológico e, consequentemente, a qualidade de vida dos pacientes. Neste estudo, 58 pacientes foram randomizados a dois tipos diferentes de terapia, consis-tindo de rifaximina ou messalazina por dez dias consecutivos a cada mês por um período de seis meses. A qualidade de vida foi avaliada através do questionário QoL-SF-36 e a evolução clínica pelo escore global de sintomas (EGS). À basal, foram confirmados valores mais baixos em todos os quesitos do SF-36 nos pacientes com doença diverticular. Ambos os grupos de tratamento - messalazina e rifaximina - mostraram reduções significantes das suas EGS médias (p<0,001 e p<0,01, respectivamente) e melhoras nos escores médios do SF-36 após o tratamento. O tratamento com a messalazina mostrou melhores resultados do que a rifaximina em aumentar os escores principalmente de dois domínios que são correlacio-

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A Gastroenterologia na Prática Clínica • 169

Dr. Mauro Bafutto • Dr. Enio Chaves de oliveira • Dr. Joffre rezende Filho

nados com a performance física: função física (87,58 ± 16,22 vs. 81,67 ± 15,06, p<0,05) e saúde global (76,64 ± 22,91 vs. 62,48 ± 24,31, p=0,01).(25)

Por outro lado, Tursi e cols.(26) compararam o tratamento de forma contínua com o tratamento cíclico com messalazina e concluíram que o uso diário deste agente parece ser mais eficaz do que a administração cíclica na remissão dos sintomas da doença diverticular não complicada recorrente. Foram avaliados 40 pacientes afetados por ataques recor-rentes de doença diverticular do cólon não complicada, os quais foram randomizados para tratamento com messalazina 1,6 g/dia (grupo A) ou messalazina 1,6 g/dia por dez dias por mês (grupo B). Ao final de 24 meses de tratamento, 67,65% dos pacientes estavam livres de sintomas (escore global de sintomas = 0): 70% (IC 95%, 61,5+-91,8) no grupo A e 56,25% (IC 95%, 61,5-91,8) no grupo B (p<0,05; intenção de tratamento). Quatro pacientes melhoraram, mas não estavam completamente livres de sintomas. Seis pacientes (15%) mostraram recorrência de sintomas: 1 no grupo A (5,56%) e 5 no grupo B (31,25%; p<0,005). Estes dados sugerem que a administração contínua parece ser mais efetiva do que o uso cíclico na manutenção da remissão (fig. 8).

Figura 7. Evolução dos escores globais dos sintomas à basal e após 6 e 12 meses de tratamento dos grupos tratados com a rifaximina e com a messalazina (p<0,0001 em ambos os pontos).(24)

Fonte: Comparato G et al. Dig Dis Sci 2007.

Basal

Esco

re g

loba

l dos

sin

tom

as

12

10

8

6

4

2

06 meses 12 meses

RifamixinaMessalazina

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TRATAMEnTO CLínICO DA DOEnçA DIvERTICuLAR DOS CóLOnS

Figura 8. Estudo comparativo do acompanhamento da remissão dos sintomas de pacientes com administração contínua e intermitente de messalazina.(26)

Um grupo de investigadores utilizou a messalazina e o Lacto-bacillus casei na prevenção da recorrência de sintomas da doença diverticular do cólon não complicada em um estudo multicêntrico, prospectivo, randomizado, aberto com 90 pacientes. Os sintomas constipação, diarreia, dor abdominal, sangramento retal e fezes com muco foram avaliados através de uma escala quantitativa e os pacien-tes distribuídos em três grupos de tratamento: messalazina 1,6 g/dia (grupo M), L. casei DG 16 bilhões/dia durante 15 dias por mês (grupo L) e messalazina 1,6 g/dia + L. casei DG 16 bilhões/dia durante 15 dias por mês (grupo LM). Ao final de 12 meses de tratamento, 88,2% dos pacientes estavam assintomáticos (EGS=0): 76,7% do grupo L (IC 95%, 61,5-91,8), 76,7% do grupo M (IC 95%, 61,5-91,8) e 96% do grupo LM (IC 95%, 94,2-100) (intenção de tratamento) estavam totalmente assintomáticos (p<0,05). Somente 11,1% dos pacientes apresentaram recorrência dos sintomas. Os autores concluíram que ambos os medicamentos podem ser efetivos, mas que a associação de probióticos e messalazina parece ser mais promissora no trata-mento da DDC.(27)

Fonte: Tursi A, Brandimarte G, Giorgetti GM, Elisei W. Dig Dis Sci 2007.

Paci

ente

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mas

0 mês 6 meses 12 meses 18 meses 24 meses

201816141210

86420

AdministraçãodiáriaMessalazina

AdministraçãointermitenteMessalazina

Pacientes sem sintomas durante o período de acompanhamento

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Na colite segmentar associada à DDC, Imperiali e cols.(28) obtiveram remissão clínica e endoscópica seis semanas após o uso de 2,4 g de messalazina pela via oral e 2 g por via tópica, com apenas um caso de recidiva endoscópica (em 14 pacientes) durante o primeiro ano de seguimento. Estes resultados juntados a outros, em revisão da litera-tura, comprovam que, assim como a doença inflamatória intestinal, a colite segmentar associada à doença diverticular pode ser tratada com messalazina.(3,7,29-30)

TRATAMEnTO CLínICO DA DIvERTICuLITE AGuDA

A diverticulite aguda é uma complicação que está presente em cerca de 5% dos pacientes que apresentam divertículos colônicos. Geralmente é manifesta pela seguinte tríade: dor na fossa ilíaca esquerda, febre e leucocitose. A diverticulite pode apresentar desde formas leves e isoladas até formas graves e recorrentes.

Nos pacientes com as formas leves (sem febre alta, peritonite im-portante ou vômitos), formas não recorrentes, sem complicações, ge-ralmente em estágio Hinchey I, o tratamento pode ser feito de forma ambulatorial.(8) Nesses pacientes, usualmente recomenda-se uma dieta líquida e antibióticos orais de largo espectro; normalmente são pres-critos por 7-10 dias.

A antibioticoterapia deve ser direcionada à cobertura contra bacté-rias anaeróbicas, em especial Bacteroides fragilis, Peptostreptococcus eClostridium, como também para bactérias aeróbicas, principalmente Es-cherichia coli, Klebsiella, Proteus, Streptococcus e Enterobacter. Os regimes de antibioticoterapia podem ser em forma de monoterapia ou associação de antibióticos (quadro 1). Uma combinação típica e bastante comum é a associação de fluoroquinolona ou trimetoprima-sulfametoxazol e me-tronidazol. A melhora clínica geralmente ocorre dentro de 2-3 dias.(25,30)

Com relação ao tratamento da dor, recomenda-se cautela quanto ao uso de anti-infamatórios não esteroides e corticosteroides, uma vez que têm sido associados a um maior risco de perfuração de cólon. Quando os analgésicos opioides são necessários, a meperidina é a opção pre-ferida, visto que a morfina causa espasmo do cólon e pode acentuar a hipersegmentação.(12)

Atualmente a tomografia computadorizada (TC) parece ser o exame de escolha nos pacientes com diverticulite aguda. A TC não só confir-

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TRATAMEnTO CLínICO DA DOEnçA DIvERTICuLAR DOS CóLOnS

ma o diagnóstico, mas também ajuda a avaliar o risco iminente de complicações através da medição da espessura da parede do cólon, pequenos abscessos pericolônicos ou retrocolônicos, coleções e perfurações localizadas. A tomografia computadorizada também tem potencial terapêutico. Nos casos de abscesso pericolônico localizado ou coleção contida, a drenagem guiada por TC pode ser realizada. Desta forma, pode ser alcançado um melhor efeito dos antibióticos e cirurgias de emergência podem ser evitadas.(34)

Geralmente, a internação hospitalar é normalmente recomendada, para os casos de maior gravidade: pacientes que não melhoram com o tratamento instituído, pacientes imunocomprometidos, pacientes com múltiplas e/ou com comorbidades graves ou incapazes de to-lerar a hidratação oral e/ou antibióticos por via oral.(8) Normalmente é recomendado que os pacientes internados tenham inicialmente restrição de dieta oral, recebam hidratação venosa, uso de opioides ou antiespasmódicos e que após coleta de amostra para hemocultura sejam iniciados antibióticos intravenosos de largo espectro, durante 7-10 dias.

Para pacientes com doença grave ou complicada, várias opções terapêuticas podem ser utilizadas. Dentre estas as mais utilizadas consistem na associação de metronidazol e uma cefalosporina de terceira geração (ceftriaxona, cefotaxima) ou com fluoroquinolonas (ciprofloxacina ou levofloxacina) ou com aminoglicosídeos (genta-micina e amicacina). O uso destes antibióticos assegura a cobertura contra bactérias aeróbicas, anaeróbias e Gram-negativas, especial-mente Escherichia coli e Bacterioides spp.(35-37)

Em pacientes imunocomprometidos pode estar indicado o uso de carbapenêmicos (imipenem ou meropenem) para melhor cobertura contra Enterococcus e Pseudomonas. De acordo com a hemocultura, antibióticos específicos como ampicilina/ácido clavulânico, gentamici-na, metronidazol, piperacilina, clindamicina, cefalosporinas de terceira geração ou tazobactam,(35-37) entre outros, podem ser utilizados. Um estudo norte-americano demonstrou que cefalosporinas de segunda geração (27%) e ampicilina-sulbactam (16%) foram os antibióticos mais utilizados em pacientes com diverticulite complicada entre os 373 membros da Sociedade Americana de Cirurgiões de Cólon e Reto.(38)

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Quadro 1. Antibioticoterapia em pacientes com diverticulite(39)

Não hospitalizadosSulfametoxazol-trimetoprima e metronidazol

Fluorquinolona e metronidazolAmoxicilina-Clavulanato

HospitalizadosMetronidazol ou Clindamicina

+Aminoglicosídeo (Gentamicina ou Tobramicina)

OuFluoroquinolonas (Ciprofloxacina ou Levofloxacina)

OuCefalosporina de terceira geração (Ceftriaxona, Ceftazidima, Ceftaxima)

OuMonobactam (Aztreonam)

Fonte: Stollman NH, Raskin JB. Am J Gastroenterol 1999.

Do ponto de vista prático, as seguintes drogas e posologias são uti-lizadas e estão disponíveis no Brasil para o tratamento da diverticulite:

1. Para uso ambulatorial (7 a 10 dias, uso VO): a) metronidazol (400 mg, 8/8h) + ciprofloxacina (500 mg, 12/12h); b) amoxicilina-clavulanato 875/125 mg, 12/12h.

2. Para uso em paciente internado (7 a 10 dias ou mais, dependendo da gravidade do caso, uso via EV): a) metronidazol (500 mg, 8/8h) + ciprofloxacina (400 mg, 12/12h); b) levofloxacina (500-1.000 mg/dia); c) ceftriaxona (1-2 g/dia); d) cefotaxima (1-2 g, 6/6h); e) ampicilina-sulbactam (3 g, 6/6h); f) piperacilina-tazobactam (3,75 ou 4,5 g, 6/6h); g) ticarcilina-clavulanato (3,1 g, 8/8h); h) imipenem (500 mg, 6/6h); i) meropenem (1 g, 8/8h).

A melhora clínica pode ser observada dentro de 2-4 dias.(39,40) Após o episódio agudo resolvido, os doentes devem ser aconselhados a manter uma dieta rica em fibras como forma de otimizar as evacuações.(41-43) É recomendado o uso por 7-10-curso dias de antibióticos orais após a alta.(40) O prognóstico para a terapia de pacientes, após o tratamento medicamentoso, de um episódio agudo de diverticulite, é geralmente bom, e foi demonstrado que pode resolver o primeiro ataque agudo em 70-100% dos pacientes.(8)

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TRATAMEnTO CLínICO DA DOEnçA DIvERTICuLAR DOS CóLOnS

TRATAMEnTO CLínICO DAS RECIDIvAS DA DIvERTICuLITE

Os pacientes que apresentaram diverticulite aguda podem apresentar recidiva. Aproximadamente um terço dos pacientes experimentará episódios recorrentes de diverticulite, muitas vezes dentro de 1 ano após o primeiro episódio(8,11,39) e entre 19-54% de recorrência em 5 anos.(40,44) Esta discrepância de taxas de recorrência publicadas na literatura deu origem a estudos que definiram alguns fatores preditivos de recidiva: História familiar de diverticulite, en-volvimento do cólon maior do que 5 cm e presença de abscesso retroperitoneal.(45)

O tratamento de episódios de diverticulite de repetição pode seguir o mesmo curso; no entanto, uma abordagem cirúrgica era até pouco tempo tradicionalmente recomendada depois de dois ou mais episódios anteriores.(46) Isto sugeriu que a terapia clínica ainda poderia ser melhorada e despertou o interesse em novos estudos. Um maior entendimento da fisiopatologia da doença diverticular, em particular a implicação da microflora intestinal e inflamação crônica em sua patogênese, resultou na investigação de novas es-tratégias de tratamento clínico medicamentoso. Neste sentido foi estudado o uso combinado de messalazina, que tem atividades anti-inflamatórias nos intestinos e a rifaximina, um antibiótico de ação seletiva nos cólons, no tratamento da diverticulite. Após a resolução da diverticulite aguda, a rifaximina pode reduzir sua recorrência.(47)

Em um estudo conduzido por Tursi e cols.,(48) um grupo de pacientes tratados com messalazina (800 mg duas vezes ao dia) associada à rifaximina′# apresentou resultados significantemente su-periores na melhora da intensidade dos sintomas, hábitos intestinais e na prevenção da recorrência sintomática da diverticulite (p<0,0005, <0,0001 e <0,005, respectivamente) em comparação com o grupo tratado com rifaximina isolada durante um período de seguimento de 12 meses. Este estudo se destaca porque foi conduzido em 218 pacientes afetados por ataques recorrentes (pelo menos dois) de diverticulite aguda no ano anterior ao estudo, alguns deles apre-sentando subestenose colônica. Do total de pacientes, 109 foram tratados com rifaximina 400 mg duas vezes ao dia (b.i.d.) mais 800 mg de messalazina duas vezes ao dia por 7 dias, seguidos de rifaxi-mina 400 mg b.i.d. + messalazina 800 mg b.i.d. por 7 dias em cada

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mês (grupo A); 109 pacientes receberam rifaximina 400 mg b.i.d. por 7 dias, seguidos de rifaximina 400 mg por 7 dias em cada mês (grupo B). O período de seguimento foi de 12 meses. Os únicos eventos adversos registrados foram um caso de urticária no grupo B e nove casos de dor epigástrica no grupo A.

Os resultados desse estudo demonstraram claramente que mes-salazina + rifaximina é mais eficaz que rifaximina isolada na resolu-ção de sintomas e na prevenção da recorrência da diverticulite. Os pacientes com ausência de sintomas foram 40,36% (44) no grupo A e 17,43% (19) no grupo B ao final do terceiro mês de terapia (p<0,005), 62,96% (68) vs. 29,80 (31) ao final do sexto mês (p<0,001), 73,83% (79) vs. 39,27% (38) ao final do nono mês (p<0,0001) e 85,57% (89) vs. 49,43% (44) ao final dos 12 meses de tratamento (p<0,0005). Três pacientes no grupo A (2,73%) apresentaram re-corrência de diverticulite aguda durante o período de seguimento, enquanto no grupo B foram 16 pacientes (17,98%) (grupo A vs. grupo B, p<0,01). Três pacientes no grupo B tiveram persistência de sintomas graves, alterações intensas dos hábitos intestinais e moderada estenose do cólon ao final do estudo, achados estes que já estavam presentes quando da admissão. Todos os parâmetros laboratoriais (leucometria, hemossedimentação, proteína C-reativa e glicoproteína a-1 ácida) melhoraram após os tratamentos, mos-trando níveis mais baixos com a associação messalazina/rifaximina do que com o antibiótico isolado.

Trespi e cols.(49) demonstraram em um estudo clínico que um grupo de pacientes (187) portadores de doença diverticular (con-firmada clínica, radiológica e endoscopicamente) tratados com sulbactam/ampicilina e rifaximina associados a dieta líquida por 7 dias, seguidos por 8 semanas de messalazina – 400 mg b.i.d. - com liberação gradual da dieta, apresentou uma probabilidade de per-manecer livre de sintomas considerando vários parâmetros - como recidiva de sintomas ou fenômenos micro-hemorrágicos, p=0,00005 e 0,001, respectivamente - em comparação com um grupo controle tratado com dieta com fibras sem a suplementação com messala-zina, durante 4 anos de acompanhamento. Os dados referentes às recidivas estão dispostos na tabela 5. Com relação às recidivas micro-hemorrágicas, elas foram verificadas em 20% dos pacientes tratados com messalazina e em 29% dos pacientes do grupo controle.

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Tabela 5. Número de recidivas (cumulativo) em pacientes tratados com messalazina e em um grupo controle(49)

Período do tratamento

Recidivas Valor de “p” Messalazina Controle

6 meses 1 8 0,0212 meses 4 16 0,00618 meses 5 19 0,00324 meses 8 25 0,00230 meses 9 26 0,00336 meses 10 27 0,00342 meses 11 30 0,00148 meses 12 31 0,001

Fonte: Trespi E et al. Minerva Gastroenterol Dietol 1999.

Petruzziello e cols.,(1) em artigo de revisão, reportam que a messa-lazina isolada é extremamente eficaz na manutenção da remissão dos sintomas e na prevenção da recorrência da diverticulite.

InDICAçãO DO TRATAMEnTO CIRúRGICO

As publicações recentes apontam para uma indicação cirúrgica muito seletiva em pacientes com diverticulite. As recomendações

Tabela 6. Sugestão de tratamento para diverticulite aguda

Diverticulite aguda não complicada Diverticulite aguda complicada

Apresentação Gestão Apresentação Gestão

Dor QIE Antibióticos orais Admissão de antibióticos IV em pacientes idosos com comorbidades / sinais de sepse / imunodeprimidos

Diverticulite com abscesso

Admissão, antibióticos IVSe abscesso < 5 cm, se não houver resposta, ou abscesso > 5 cm, drenagem percutânea

Peritonite purulenta Lavagem laparoscópica ou por laparotomia, colectomia sigmoide com ou sem desvio proximal

Peritonite fecal Procedimento de Hartman

Abreviaturas: QIE – Quadrante inferior esquerdo, IV - IntravenosoFonte: Martin TS and Stocchi L.Clin Exp Gastroenterol 2011

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atuais indicam que o risco de complicações não aumenta ao se retardar a indicação cirúrgica eletiva. Da mesma forma que o número de episódios de diverticulite não complicada não é um fator decisivo para indicação do tratamento cirúrgico. As indica-ções cirúrgicas formais para diverticulite aguda são: 1 – Peritonite generalizada ou perfuração livre; 2 – Obstrução intestinal não aliviada com tratamento clínico; 3 – Evolução com piora clínica; 4 – Presença de fístula(s); 5 – Presença de abscesso não resolvido por tratamento clínico e drenagem radiológica.(50) (tabela 6)

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Dra. Maria do Carmo Friche Passos • Dra. ana Flávia Passos ramos

Capítulo 14

COMO Eu TRATO: SínDROME DO SuPERCRESCIMEnTO

BACTERIAnO DO InTESTInO DELGADO

Dra. Maria do Carmo Friche Passos Dra. Ana Flávia Passos Ramos

A MICROFLORA GASTROINTESTINAL HUMANA é um complexo ecossistema com mais de mil espécies e subespécies de bactérias que colonizam o trato digestório logo após o nascimento.(1) Estudos recentes demonstraram que as bactérias residentes superam em 10 vezes as células humanas e já se sabe também que o genoma mi-crobiano é maior que o genoma humano (100 trilhões de células bacterianas que fornecem uma média de 600.000 genes a cada ser humano).(2,3)

Existe uma grande diversidade microbiana de espécies e de cepas e cada indivíduo abriga seu próprio padrão de composição bacteriana, determinado em parte pelo genótipo do hospedeiro e pela colonização inicial no nascimento via transmissão vertical.(2,3) As espécies e concentra-ção das bactérias no tubo digestivo, em geral, seguem um padrão bem conhecido, mantendo-se estável ao longo da vida com predomínio de bactérias Gram-positivas no trato digestivo proximal e Gram-negativas e anaeróbias no restante do intestino delgado (ID) e cólon.(1,4) No indiví-duo sadio, o estômago humano é praticamente estéril e o ID proximal contém um número relativamente pequeno de bactérias.(4) Culturas de

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COMO Eu TRATO: SínDROME DO SuPERCRESCIMEnTO BACTERIAnO DO InTESTInO DELGADO

material colhido no jejuno podem não detectar bactérias em até 33% dos indivíduos saudáveis e, quando presentes, raramente excedem 104 unidades formadoras de colônias/mL (ufc/ml).(1) A microbiologia do íleo terminal representa uma área de transição entre a escassez de bactérias no jejuno, sobretudo espécies aeróbicas, e a densa população de bactérias anaeróbias encontradas no cólon. A válvula ileocecal fun-ciona como barreira, a partir da qual o perfil da população bacteriana se modifica significativamente. Na região proximal à válvula observa-se predomínio de organismos Gram-negativos e aeróbios (em média 109 ufc/mL).(1,4) O cólon contém enorme quantidade de bactérias, podendo ser encontradas concentrações tão elevadas como 1012 ufc/mL. A maior concentração de bactérias nas porções distais do trato gastrointestinal evita a competição com o hospedeiro pelos nutrientes que são absorvi-dos e digeridos no ID. No ecossistema intestinal humano predominam três tipos de bactérias: Bacteroidetes, Firmicutes e, em menor número, Actinobacteria.(2-4)

A interação normal entre as bactérias intestinais e seu hospedeiro é uma relação simbiótica. A presença de um grande número de estru-turas linfoides organizadas na mucosa do intestino delgado (placas de Peyer) sugere que as bactérias intestinais têm uma importante influência sobre a função imune. Seu epitélio está especializado em capturar e fazer amostragem de antígenos, e contém centros germinais linfoides para a indução de respostas imunes adaptativas. No cólon, os micro-organismos proliferam fermentando os substratos disponíveis da dieta ou as secreções endógenas.(5)

A flora entérica habitual tem participação direta na função intestinal.(2)

Alguns açúcares da dieta não absorvidos podem ser metabolizados pelas dissacaridases bacterianas formando ácidos graxos de cadeia curta, que eventualmente são absorvidos e utilizados como fonte de energia pela mucosa colônica.(1) Além disso, vários nutrientes e vitaminas, como o ácido fólico e a vitamina K, são produzidos por bactérias colônicas e inúmeros medicamentos precisam ser metaboli-zados pelos micro-organismos entéricos para que ocorra a liberação de metabólitos ativos.(2)

Dessa forma, o equilíbrio entre o sistema imune do hospedeiro e a flora intestinal não patogênica (eubiose) é fundamental para a proteção contra a colonização de micro-organismos patogênicos. Quando ocorre um desequilíbrio nessa homeostase (disbiose) pode sobrevir um exces-

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so de bactérias no ID, configurando a Síndrome do Supercrescimento Bacteriano do ID (SCBID).(1,4-6)

Faremos, a seguir, uma breve exposição acerca do conceito, pre-valência, fisiopatologia e diagnóstico da SCBID para, posteriormente, abordarmos especificamente o seu tratamento.

DEFInIçãO DA SCBID

A SCBID é geralmente definida pela presença de uma população bacteriana no ID que excede 105-106 ufc/Ml.(4-6) Este diagnóstico tam-bém é considerado nos casos em que o número de micro-organismos no ID está normal (≥ 103 ufc/mL), porém predominam bactérias do tipo colônicas e que não estão presentes na saliva e no suco gástrico.(5)

Quando existe supercrescimento, a flora bacteriana usual se altera, predominando estreptococo (71%), Escherichia coli (69%), estafilo-cocos (25%) e Klebsiella (20%). A presença de uma flora atípica pode comprometer a mucosa do ID, alterando a digestão e a absorção dos alimentos e ocasionando o aparecimento de sintomas.(5,6) Por exemplo, o predomínio de bactérias que metabolizam sais biliares a compostos não conjugados ou insolúveis pode acarretar má-absorção de gorduras e esteatorreia. Da mesma forma, a presença de coliformes Gram-negativos como Klebsiella pode produzir toxinas capazes de lesar a mucosa in-testinal, comprometendo diretamente a função absortiva.

PREvALênCIA

Estudos de prevalência recentemente realizados demonstram que a SCBID é uma condição clínica muito comum, que ocorre principalmente em pacientes que apresentam anormalidades anatômicas no trato di-gestivo proximal ou distúrbios da motilidade digestiva. Estudos atuais demonstram que a SCBID é muito prevalente em pacientes portadores de distúrbios funcionais gastrointestinais, doença celíaca, doença infla-matória intestinal, hepatopatias e pancreatopatias crônicas. Contudo, é preciso salientar que o supercrescimento bacteriano pode ocorrer tam-bém na população saudável, com taxas de prevalência que variam de 2 a 20%.(1,4-6) Indivíduos idosos são mais suscetíveis do que os mais jovens, possivelmente pela carência de ácido no estômago e pelo emprego frequente de medicamentos capazes de alterar a motilidade digestiva.(4,7)

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FISIOPATOLOGIA E FATORES DE RISCO

O supercrescimento bacteriano surge quando os mecanismos fisio-lógicos clássicos de controle da população bacteriana entérica estão alterados.(1,4-6) Esses mecanismos ou fatores de proteção do hospedeiro são capazes de manter estáveis o número e os subtipos de bactérias ao longo do tubo digestivo. A acidez gástrica e o peristaltismo gastrointes-tinal são fatores naturais que limitam a capacidade de colonização de bactérias no ID.(4,6) Outros mecanismos também considerados essenciais são a integridade da mucosa intestinal, a camada de muco, as secreções intestinais, pancreáticas e biliares, a válvula ileocecal e o efeito protetor da própria flora comensal.

O supercrescimento bacteriano é capaz de induzir uma resposta inflamatória na mucosa intestinal e alguns autores acreditam que possa resultar em colite microscópica.(3,4-6) Foi demonstrada redução das vilo-sidades intestinais, adelgaçamento da mucosa e das criptas e aumento no número de linfócitos intraepiteliais em biópsias do ID de pacientes com a SCBID.(1) Importante ressaltar que habitualmente essas alterações são reversíveis com o tratamento clínico, observando-se, com frequência, normalização da mucosa intestinal.(5)

Várias condições são capazes de alterar a motilidade do ID e predis-põem ao desenvolvimento da SCBID,(8-15) como mostra a tabela 1. Apesar das controvérsias, tem sido recomendado que o diagnóstico de SCBID seja sempre considerado em pacientes com distúrbios funcionais refra-tários ao tratamento convencional, especialmente aqueles portadores da Síndrome do Intestino Irritável (SII), Diarreia Funcional, Constipação, Síndrome da Dor Abdominal Funcional e síndromes relacionadas à presença de gás intestinal (distensão e flatulência).(14-18)

MAnIFESTAçõES CLínICAS E DIAGnóSTICO

Embora os sintomas associados a SCBID sejam usualmente inespecífi-cos, o quadro de diarreia, dor/distensão abdominal, flatulência, plenitude pós-prandial, timpanismo pode ser considerado sugestivo da síndrome. No entanto, a sintomatologia pode refletir simplesmente a causa subjacente ou a doença primária que ocasionou o supercrescimento (dismotilidade do ID, por exemplo).(1,4-6) Outras vezes, se relaciona às complicações da síndrome, que inclui má-absorção, esteatorreia, emagrecimento, deficiên-

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Tabela 1. Condições clínicas (predisponentes) à SCBID

Estrutural/AnatômicoDivertículos no intestino delgadoEstenoses (radiação, cirurgias, doença de Crohn)Cirúrgicas (ressecção gástrica Billroth II, anastomoses término-lateral; ressecção da válvula ileocecalFístulas gastrocólica ou jejunocólica

Distúrbios da MotilidadeGastroparesiaDoença celíacaPseudo-obstrução intestinalNeuropatia diabéticaEsclerodermiaAmiloidoseHipotireoidismoEnterite por radiaçãoDoença de Crohn

Distúrbios Funcionais DigestivosSíndrome de Intestino IrritávelConstipação IntestinalSíndrome da Distensão AbdominalDiarreia Crônica

Desordens MetabólicasDiabetes MellitusHipotireoidismoHipocloridria

MultifatorialCirrose hepática com hipertensão portalPancreatite crônicaEsteato-hepatite não alcoólica (NASH, NAFLD)ObesidadeDesnutriçãoImunodeficiênciaHipertensão portal

MedicaçõesAntibióticos (uso recorrente)Antissecretores

cias nutricionais, além de desordens metabólicas ósseas.(5) Assim, diante de pacientes que apresentam uma combinação dos sintomas descritos acima, a possibilidade de supercrescimento bacteriano deve ser sempre considerada no diagnóstico diferencial.

O diagnóstico de SCBID é bastante controverso na literatura e não existe um consenso de qual é o exame mais adequado para confirmar a presença de um número excessivo de bactérias no ID.(1,4-6) Dois testes são

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comumente utilizados na prática médica - a cultura do aspirado jejunal e os testes respiratórios.(5,19,20) A tabela 2 mostra a sensibilidade e especifici-dade dos diversos métodos diagnósticos empregados para o diagnóstico.(1)

Tabela 2. Métodos diagnósticos da SCBID

Teste Sensibilidade %

Especificidade %

Complexidade (invasivo)

Cultura do Aspirado Jejunal

Cultura de Biópsia do ID

Testes Respiratórios14C-d-xiloseGlicoseLactuloseÁcidos biliares

Cromatografia do líquido jejunal

100

90

14-956-936-9533-70

56

100

100

10078-10044-10060-76

100

Sim

Sim

Sim (radioatividade)NãoNãoNão

Sim

Fonte: Dados obtidos de Quera R e cols., 2005(1)

TRATAMEnTO

A abordagem terapêutica da SCBID requer não apenas a redução do excesso das bactérias no intestino, mas também, sempre que possível, o tratamento da doença primária ou condição associada (fator desencade-ante).(1,4-5) O suporte nutricional para os pacientes que apresentam perda de peso e deficiências vitamínicas é de fundamental importância.(5,6)

O tratamento da doença de base nem sempre é possível, uma vez que em sua maioria as doenças que predispõem ao supercrescimento (tabela 1) não são reversíveis ou curáveis e podem perpetuar a síndrome, exigindo ciclos repetidos de antibióticos.(4,19) Sempre que possível, medicamentos que alteram a motilidade e inibem a acidez gástrica devem ser suspensos.(1)

A utilização de antibióticos é fundamental não exatamente com o objetivo de erradicar a flora intestinal, mas de modificá-la para redu-zir o processo inflamatório e a má-absorção.(4,19) Idealmente, a terapia antibiótica deveria se basear na cultura e nos dados do antibiograma.

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Entretanto, este procedimento não é possível na prática diária e o tra-tamento é feito de forma empírica, com a utilização de antimicrobianos que atuam tanto na flora aeróbica como anaeróbica.(1,6) A tetraciclina (e seus derivados) foram os primeiros antibióticos a ser utilizados. Outros antibióticos rotineiramente empregados são as quinolonas (ciproflo-xacino, norfloxacino, levofloxacino), metronidazol, amoxicilina-ácido clavulânico, cloranfenicol e neomicina.(1,4-6,19) Poucos estudos compa-raram a eficácia desses antibióticos em pacientes com SCBID e os pri-meiros resultados mostraram similaridade na eficácia das quinolonas, amoxicilina-ácido clavulânico e metronidazol.(1,19)

A duração do tratamento com antibióticos não está bem estabelecida na literatura, mas a maioria dos autores recomenda cursos de antibióticos durante 7 a 10 dias.(1,5,19) Um estudo demonstrou que um tratamento único por 7 dias pode melhorar os sintomas em 46 a 90% dos pacientes com SCBID e normalizar o teste respiratório em 20 a 75% das vezes.(21) Nos casos em que a evolução clínica for satisfatória não é necessário repetir o teste respiratório para confirmar normalização da flora intestinal.(20)

Um aspecto muito importante a ser considerado no tratamento da SCBID é a alta taxa de recidiva, com recorrência dos sintomas algumas semanas ou meses após antibioticoterapia, especialmente quando a doença subjacente não pode ser curada.(19) Trabalhos recentes demos-traram que um percentual significativo de pacientes que obtiveram êxito no primeiro tratamento de erradicação, corroborado não apenas pela melhora clínica, mas também pela normalização do teste respiratório, apresentaram recorrência acumulativa do supercrescimento de 12,5%, 27,5% e 43,7% após 3, 6 e 9 meses, respectivamente.(22) Nos casos de recidivas frequentes sugere-se prescrever ciclos repetidos de antibiotico-terapia (por exemplo, os primeiros 5 a 10 dias de cada mês) ou mesmo realizar um tratamento contínuo com antibióticos em doses mais baixas. Nessa eventualidade, recomenda-se fazer uma rotatividade entre os di-versos antibióticos com o objetivo de melhorar a eficácia dos mesmos e, sobretudo, evitar o desenvolvimento de resistência.(4,6,19) Um estudo demonstrou que o uso prolongado de antibióticos (com mudança do antimicrobiano semanalmente) foi capaz de melhorar o distúrbio motor, erradicar o supercrescimento e melhorar a função hepática em pacien-tes cirróticos.(22) Nos casos de recidiva sintomatológica típica podemos reiniciar o tratamento sem a necessidade de confirmação diagnóstica.(19)

Nos últimos anos a rifaximina (droga não absorvível, derivada da

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rifampicina) vem sendo bastante utilizada, especialmente nos Estados Unidos, e tem se mostrado eficaz e superior aos antibióticos tradicio-nalmente empregados.(1,19, 23-26)

Este ano, durante o Congresso Americano de Gastroenterologia (DDW, 2012) Pimentel e colaboradores apresentaram um trabalho sobre a eficácia da rifaximina em pacientes, de ambos os sexos, portadores de SII na forma diarreica ou mista (excluindo apenas os pacientes com SII e constipação).(27) Os autores salientaram o papel essencial da microflora intestinal na fisiopatologia da síndrome, considerando que alterações na microbiota se correlacionam com um aumento da fermentação e maior produção de gás intestinal, supercrescimento bacteriano do ID, irritação da mucosa com possível microinflamação, além de alterações na composição das fezes. A utilização de antibióticos é, dessa forma, benéfica para uma grande parcela de pacientes com SII. De acordo com esses autores, várias são as justificativas para o uso da rifaximina nesses casos: a) trata-se de um antibiótico minimamente absorvido, com largo espectro de ação, bem tolerado, seguro e com baixo risco de resistência e de interação com outras drogas; b) estudos recentes demonstram nítida superioridade dessa droga em comparação ao placebo, não apenas no alívio da flatulência e da diarreia, mas também na melhora global dos sintomas de pacientes portadores de distúrbios funcionais digestivos. É importante salientar que esse grupo de investigadores da Universidade de Los Angeles, coordenado por Mark Pimentel, é o que tem maior número de publicações e maior experiência mundial na pesquisa de supercrescimento bacteriano e tratamento com rifaximina.(23-25)

Preconiza-se o emprego de rifaximina na dose de 400 mg três vezes ao dia durante 10 a 14 dias. Os efeitos colaterais são, em geral, leves e transitórios e não foram descritos casos de colite pseudo-membranosa por Clostridium difficile em pacientes tratados com rifaximina.(19,25) Este antibiótico ainda não está disponível no Brasil.

Alguns autores sugerem que associação de procinéticos (domperido-na, bromoprida ou eritromicina) aos antibióticos pode ser benéfica, espe-cialmente nos casos de distúrbios motores, miopatias e neuropatias, mas a real eficácia desse esquema permanece incerta.(6) A octreotida estimula a atividade da fase 3 do complexo motor migratório e pode ser usada em dose baixa (50 mg/dia) naqueles pacientes com comprometimento nutricional e que não respondem ou não toleram os antibióticos.(4,19)

Importante salientar que o tratamento da SCBID deve ser sempre

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individualizado, considerando os riscos do tratamento prolongado com antibióticos, de modo especial, o surgimento de diarreia, infecção por Clostridium difficile, intolerância e/ou resistência bacteriana, além do custo da medicação.(1,5,19) Por essa razão, recomenda-se, sempre que possível, a prescrição de antibióticos de baixa toxicidade e mínima absorção sistêmica.

Nos casos mais graves em que existe lesão da mucosa intestinal e consequente má-absorção intestinal, a recuperação do paciente é, em geral, mais arrastada, exigindo acompanhamento clínico mais prolon-gado.(6) Suplementação de vitaminas lipossolúveis e de B12, além da correção dos níveis de cálcio e magnésio, quando alterados, são pontos-chave no tratamento.(1,19)

Nos últimos anos, inúmeros pesquisadores sugerem que um efeito anti-inflamatório e de normalização da flora intestinal poderia ser efeti-vamente obtido com o emprego de probióticos, já que muitas vezes a inflamação do intestino aparece como uma reação à microflora comensal e a possibilidade de modificá-la com estes medicamentos tem sido uma opção bastante atrativa.(4,19) Atualmente, vários centros de investigação se dedicam a esse tema e inúmeros trabalhos comparando o efeito de probióticos e placebo na SCBID foram realizados com resultados iniciais bastante promissores (fig. 1).

Os probióticos afetam as bactérias intestinais aumentando o número de bactérias anaeróbias benéficas e diminuindo a população de micro-organismos potencialmente patogênicos. Além disso, eles são capazes de interferir no ecossistema intestinal estimulando os mecanismos imunes da mucosa e os não imunes através de um antagonismo e concorrência com os patogênicos potenciais.(28-30) Acredita-se que esses fenômenos condu-zem a efeitos benéficos, melhorando a sintomatologia, especialmente a diarreia e a flatulência. Os probióticos reduzem o risco de câncer de cólon em modelos animais, provavelmente por sua capacidade de suprimir a atividade de certas enzimas bacterianas que podem aumentar os níveis de pró-carcinógenos, mas isto não foi provado em humanos.(6) Estudos clínicos aleatorizados bem desenhados são necessários ainda para definir o papel dos probióticos como agentes terapêuticos na doença intestinal inflamatória.

Um estudo controlado com placebo demonstrou redução consistente nos níveis do H

2 expirado após 21 dias de tratamento no grupo que

recebeu Lactobacillus.(30) Outro estudo encontrou resultados semelhantes ao utilizar Lactobacillus plantarum 299 V e Lactobacillus GG em crian-ças com síndrome do intestino curto.(31) Outros trabalhos, no entanto,

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Fonte: adaptado de Quera R. e cols., 2005(1)

Figura 1. Algoritmo para o diagnóstico e tratamento da SCBID.

Pacientes com sintomas gastrointestinais inespecíficos ou de má-absorção, com ou sem condições clínicas associadas à SCBID

TESTE DO H2/METANO ExPIRADO: Lactulose ou Glicose

ALTERADO NORMAL

- Antibióticos- Tratamento da condição associada com SCBID- Suporte nutricional- Probióticos?

- Reavaliar o diagnóstico- Repetir teste respiratório com outro substrato- Realizar o aspirado jejunal e cultura

Melhora clínica

Acompanhamento

Sem resposta

- Reavaliar o diagnóstico- Trocar o antibiótico ou probiótico- Tratamento prolongado ou ciclos repetidos de antibióticos

não encontraram os mesmos resultados(32) e novos estudos com meto-dologia mais rigorosa se fazem necessários. Uma opção teoricamente interessante é o uso de probióticos após a antibioticoterapia, mas os resultados desse esquema são bastante controversos.(4,19)

De acordo com as últimas diretrizes da Organização Mundial de Gas-troenterologia publicado em outubro de 2011 (World Gastroenterology Organization Global Guidelines – Probiotics and prebiotics), algumas cepas de probióticos, como B. infantis 35624 e Lactobacillus reuteri podem aliviar a dor e a distensão abdominal e a diarreia.(33) De acordo com este recente consenso da WGO, existe respaldo na literatura para o emprego de determinadas cepas de probióticos com o objetivo de aliviar a dor e a distensão abdominal em algumas condições clínicas em que existe com frequência alteração da microflora intestinal como

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a SII, Doença Inflamatória Intestinal, diarreia crônica, dentre outras.(33)

Sabemos que esta é uma opção terapêutica ainda em investigação, sendo necessário realizar ensaios clínicos envolvendo um grande número de pacientes com diferentes patologias para elucidar o real valor dos probióticos nos casos de supercrescimento de bactérias no ID.

COnCLuSãO

O tratamento da SCBID implica solucionar, sempre que possível, a con-dição predisponente e empregar antibióticos de amplo espectro durante sete a dez dias. Quinolonas, metronidazol e rifaximina são os antimicro-bianos mais comumente utilizados. Devido às altas taxas de recorrência, alguns pacientes necessitam receber antibioticoterapia cíclica ou por um período mais prolongado. O uso de probióticos ainda encontra-se em avaliação, mas estudos iniciais se mostram bastante promissores.

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Dra. Lorete Maria da Silva Kotze

Capítulo 15

MEDICAMEnTO PARA CELíACOS: QuAL, QuAnDO, POR QuE E

POR QuAnTO TEMPO?

Dra. Lorete Maria da Silva Kotze

A DOENçA CELíACA (DC) é uma enfermidade sistêmica deflagrada e mantida pela ingestão de glúten do trigo, centeio, cevada (malte) e aveia, em indivíduos com predisposição genética. Apresenta ex-tenso espectro de manifestações clínicas, principalmente em adultos, daí seu diagnóstico ser muitas vezes demorado. A lesão intestinal causada pela DC leva a várias deficiências de nutrientes, vitaminas, minerais, com consequente ferropenia, deficiência de B12, ácido fólico e vitaminas lipossolúveis, baixa densidade mineral óssea (mais frequentes). Enfatiza-se ao paciente e sua família que o verdadeiro tratamento da DC é dietético, sem glúten, permanentemente. En-tretanto, certas deficiências requerem manejo específico. A seguir discutir-se-á algumas delas.(1-3)

DEFICIênCIAS DE vITAMInAS DO COMPLEXO B

Embora a DC seja uma enfermidade do intestino delgado proximal, a associação com deficiência de vitamina B12, relacionada com o fator intrínseco do estômago e absorvida no íleo terminal, tem sido relatada, nem sempre ligada à anemia perniciosa/gastrite autoimune. Não há correlação entre níveis baixos de B12 e características clínicas. Lembrar que as condições de B12 devem ser conhecidas antes da reposição de

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MEDICAMEnTO PARA CELíACOS: QuAL, QuAnDO, POR QuE E POR QuAnTO TEMPO?

ácido fólico, se deficiente. Conclui-se que se deva determinar os níveis de vitamina B12 ao se iniciar o tratamento da DC, repor se necessário e monitorar durante a dieta isenta de glúten (DIG), principalmente em pacientes com mais de 60 anos. Anemia megaloblástica pode ser veri-ficada no hemograma.

Pacientes celíacos que iniciam a DIG podem normalizar seu status de vitamina B, mas a retirada do glúten pode desencadear uma alimen-tação não balanceada, incluindo baixo teor de fibras e vitaminas B. Em consequência, cerca da metade dos adultos em DIG por diversos anos mostram níveis reduzidos de folato e B6, e aumentados de homocisteína que predispõem à doença cardiovascular.

O mecanismo básico para os efeitos positivos da sensação de bem-estar das vitaminas B pode envolver ações (coenzimas) nos vários de-graus na produção de monoaminas cerebrais que têm importante papel na regulação do humor. Assim, celíacos em DIG podem apresentar defi-ciência de vitamina B e ter reduzido estado de saúde subjetivo. O nível plasmático total de homocisteína, que é marcador do status de vitamina B, pode ser avaliado. Verificou-se que há correlação entre os níveis de homocisteína e a sensação de bem-estar, tanto que após suplementação de vitamina B há melhora na ansiedade e humor depressivo. Portanto, para celíacos em DIG por longo tempo, complexo B deve ser adminis-trado por, no mínimo, seis meses. Em conclusão, pacientes com DIG podem estar em desbalanço nutricional e necessitar de suplementação de vitaminas B para melhorar seu estado de saúde.

O tratamento da deficiência de cobalamina (B12) preconizado é a administração IM na forma de cianocobalamina, ou hidroxicoba-lamina, na dose de 1.000 µg/dia por 1 semana, seguida de 100 µg/semana por 1 mês e, se necessário, 1.000 µg/mês para o resto da vida. Alternativas de uso oral ou nasal necessitam de maiores es-tudos. Outros esquemas podem ser montados de acordo com cada caso em particular.(4-7)

áCIDO FóLICO

O folato tem funções heterogênicas e está envolvido em diversas atividades em organismos animais e humanos. Como constituinte im-portante do organismo, sua biodisponibilidade depende principalmente da função correta do trato gastrointestinal. A presença de deficiência

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de folato deve, portanto, sempre ser procurada em doenças gastroin-testinais, principalmente na doença celíaca e hepatopatias, quando sua suplementação deve ser considerada. Habitualmente 5 mg VO por dia é suficiente.(8)

vITAMInA K

A vitamina K é uma vitamina lipossolúvel crucial para a produção de muitas proteínas envolvidas no processo de coagulação. Celíacos não tratados podem apresentar deficiência de vitamina K que causa tempo de atividade da protrombina (TAP) prolongado, em cerca de 18,5%; nos com DC subclínica, apenas 0,9%. Deduz-se que esta deficiência está ligada a casos de má-absorção grave, incluindo baixa densidade mineral óssea. Nestes pacientes deve-se solicitar TAP antes das biopsias intes-tinais. A administração de vitamina K1 parenteral só se faz necessária em 5,6% dos casos. Deve-se estar atento para o uso concomitante de drogas que influenciem a absorção da vitamina K (inclusive antibióti-cos e anticonvulsivantes), pois há risco de sangramento em DC com hipoprotrombinemia.(9,10)

DEFICIênCIA DE FERRO

A anemia na doença celíaca é multifatorial em sua etiologia. A OMS define anemia quando a concentração de hemoglobina (Hb) está abaixo de 13 g/dl no homem acima de 15 anos de idade, e 12 g/dl para mulheres acima de 15 anos e 11 g/dl para as grávidas. Quando a hemoglobina está baixa, uma patologia de base deve ser investigada e aí se inclui a DC.

O ferro é absorvido no intestino delgado proximal e depende da superfície mucosa intacta e acidez intestinal. A anemia resultante da DC pode ser hipocrômica e microcítica. A determinação dos níveis séricos de ferritina é o melhor teste para detecção de deficiência de ferro (cut-off entre 12 e 15 µg). Os pacientes devem receber suple-mentação de ferro tanto para corrigir a anemia, como para repor os estoques do organismo. Ferro parenteral pode ser usado quando as preparações orais não são toleradas. Transfusões de sangue são reser-vadas aos pacientes com risco de instabilidade cardiovascular devido ao grau de anemia.

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Compostos preconizados: sulfato ferroso (se tolerado), fumarato ferroso, gluconato de ferro. Ferro oral deve ser continuado por mais três meses após correção. Ácido ascórbico 250-500 mg 2 vezes ao dia pode melhorar a absorção do ferro.

No seguimento da DC, a concentração da Hb deve ser monitorada a cada 3 meses. A DIG resulta em aumento da ferritina nos pacientes com deficiência de ferro.

Considera-se, pois, que a absorção intestinal de ferro está reduzida na DC. Anemia crônica refratária por deficiência de ferro é a que não responde à reposição oral das preparações. É vista em pacientes celía-cos pediátricos e em cerca de 20% dos adultos. Também é comum na dermatite herpetiforme. Lembrar que o aspecto macroscópico da mucosa duodenal pode ser normal. A DIG para a recuperação da mucosa pode levar 1 a 2 anos.(11-13)

DEFICIênCIAS DE CáLCIO E vITAMInA D

Há evidências bem estabelecidas da relação entre baixa densidade mineral óssea (DMO) e a doença celíaca, mas a patogênese do de-sarranjo ósseo permanece inconclusiva. Alterações do metabolismo ósseo e diminuição da massa óssea podem ser os únicos sinais de DC silenciosa. Nos celíacos sintomáticos, a baixa DMO parece estar diretamente relacionada à má-absorção intestinal. A estrita obediência à DIG pode reverter as alterações histológicas intestinais e melho-ra da absorção do cálcio e vitamina D, resultando em melhora na DMO. Entretanto, isto não acontece em todos os pacientes, mesmo após recuperação da mucosa intestinal. Por quê? Os mecanismos da osteopenia e/ou osteoporose na DC não estão claros, discutindo-se também influência genética. Conclui-se que outros fatores de injúria óssea estejam envolvidos. O risco de fratura é maior nos celíacos do que na população geral.

Alguns pacientes podem se queixar de fraqueza em músculos pro-ximais, dificuldade para andar ou dor óssea. Deve-se, por ocasião do diagnóstico de DC, independente da idade do paciente, solicitar a determinação de cálcio, fosfatase alcalina, paratormônio e vitamina D (corte em 30).

A determinação prática da densitometria óssea é feita pela dual-energy X-ray absorptiometry (DEXA), método rápido e fácil tanto para

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diagnóstico como para monitoramento, a cada 12 meses. Solicita-se fêmur e coluna lombar.

Como alguns celíacos têm intolerância à lactose, há restrição de pro-dutos lácteos, ricos em cálcio, piorando as condições ósseas. Deve-se complementar com outros alimentos ricos neste mineral.

As reposições de cálcio e vitamina D são feitas por via oral, doses adequadas para cada caso e por tempo indeterminado, pois se sabe que, mesmo que haja melhora da massa óssea nos celíacos tratados, não chega à normalidade. Cálcio por via EV nas crises de tetania. Em certas ocasiões há necessidade de bifosfonatos. Recomendam-se, além da DIG, alterações no estilo de vida, com exercícios, parada do uso de cigarros e álcool.(14-16)

DOEnçA CELíACA nãO RESPOnSIvA

A doença celíaca não responsiva (DCNR) é definida quando os sintomas continuam em pacientes em DIG, incluindo letargia, dor abdominal e diarreia. A maioria dos pacientes experimenta uma rápida recuperação sintomática; 30% têm evolução mais protraída (>12 meses) ou incompleta. Um período arbitrário de 6 a 12 meses é sugerido para reasseguramento da DIG. O termo DCNR não é termo diagnóstico, mas sim a descrição clínica de uma situação que deve ser bem analisada e investigada pelo profissional atendente. Na grande maioria dos casos, a conclusão é de que não esteja havendo obediência total à DIG, seja conscientemente ou por contaminação cruzada. Outras causas devem ser pesquisadas. As mais frequentes seguem.(17,18)

InSuFICIênCIA PAnCREáTICA EXóCRInA

Para digestão e absorção de nutrientes há necessidade de interação com as funções motoras e secretoras do trato gastrointestinal. Como as enzimas pancreáticas (lipase, amilase, tripsina e quimiotripsina) exercem papel fundamental no processo da digestão, quando ocorre insuficiência exócrina do pâncreas (IEP) haverá prejuízo no preparo dos nutrientes para sua absorção. Portanto, poderá surgir uma síndrome de má-absorção que acarretará principalmente emagrecimento e esteatorreia (quando a gordura fecal em 24 horas é >7 g).

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Cerca de 30-40% dos pacientes celíacos apresentam IEP de leve a moderada, geralmente ligada a alterações da mucosa que diminuem estímulos, com consequente redução da secreção enzi-mática e bicarbonato. Há assincronia entre as funções secretoras e motoras.

Na prática clínica, o diagnóstico pode ser sugerido e corroborado pela detecção aumentada da gordura fecal, pois os testes respirató-rios e dosagem da elastase fecal são disponíveis em poucos centros brasileiros.

Enzimas pancreáticas são utilizadas como coadjuvantes, nos primeiros meses, por facilitarem a digestão, prin cipalmente de gorduras e por que, nos celíacos, como em desnutridos primários, há falta de proteínas para geração e secreção de enzimas pancreáticas digestivas (a determinação de quimiotripsina fecal pode ser índice preditivo da recuperação do peso, principalmente em crianças).

A reposição enzimática deve ser iniciada com doses pequenas e aumentadas gradativamente (25.000UI até 50.000UI, em cada refeição), levando-se em consideração a melhora dos sintomas, o peso do paciente e diminuição da esteatorreia. Preparados modernos protegem as enzi-mas da acidez do estômago, misturam-se facilmente com os alimentos, atingem o duodeno intactas. Pode-se associar inibidor da secreção ácida (IBP), uma vez ao dia para evitar a inativação enzimática no es-tômago e duodeno pelo pH ácido. O tempo de uso destas medicações vai depender de cada caso em particular. Estudo longitudinal mostrou que a suplementação enzimática pode ser descontinuada na grande maioria dos pacientes assim que os sintomas melhoram. Lembrar que a medicação é distribuída gratuitamente pelas Secretarias de Saúde dos Estados. Basta justificar.(19-23)

SínDROME DO SuPERCRESCIMEnTO BACTERIAnO nO InTESTInO DELGADO

Devido à peristalse e aos efeitos antimicrobianos da acidez gástrica, o estômago e o intestino proximal contêm relativamente pequeno número de bactérias. Já as culturas jejunais podem não detectar nenhuma bactéria em até 33% dos indivíduos sadios. Se presentes, espécies bacterianas geralmente são lactobacilos, enterococos, es-treptococos orais; e outros Gram-negativos aeróbios ou anaeróbios facultativos (flora da orofaringe).

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Recentemente a síndrome do supercrescimento bacteriano no intestino delgado (SBID) tem sido associada a várias enfermidades, tais como doença celíaca, síndrome do intestino irritável, doença gor-durosa do fígado não alcoólica e peritonite bacteriana espontânea.

A SBID tem sido implicada como uma das causas da falta de res-posta à DIG em pacientes celíacos. A erradicação de SBID pode levar ao desaparecimento dos sintomas, que são borborigmos pós-prandiais, diarreia, esteatorreia e deficiência de vitaminas, todos semelhantes ao que ocorre na DC não tratada.

Anemia macrocítica por deficiência de vitamina B12 pode ser detectada consequente à incorporação desta vitamina dentro da bactéria.

O diagnóstico é problemático, mas pode ser feito por aspirado e cultura direta do conteúdo jejunal (diversas limitações). Testes respi-ratórios (com xilose, lactulose ou glicose) são realizados em alguns centros. Conclui-se que o diagnóstico é feito pela clínica apresentada pelo paciente que está cumprindo rigorosamente a DIG.

O tripé da terapêutica é o tratamento da doença básica (DC), erradicar o SBID e corrigir as deficiências nutricionais. O tratamento com antibió-ticos permanece empírico, cobrindo bactérias aeróbicas e anaeróbicas. Os esquemas em geral são de 7 a 10 dias com melhora dos sintomas por diversos meses em 46 a 90% dos casos. Entretanto, alguns pacientes necessitam de repetição por 5 a 10 dias no início do mês; ou até de cursos contínuos. Regimes rotatórios de antibióticos são recomendados para estes casos, para evitar resistência bacteriana. Boas opções incluem uso de ciprofloxacina, norfloxacina, amoxicilina ou metronidazol. Até o presente momento não há comprovação concreta de que os probióticos possam prevenir a recorrência.(24,25)

COLITE MICROSCóPICA

Colite microscópica (CM) é considerada como um “guarda-chuva” que inclui colite colagenosa (CC) e colite linfocítica (CL). Os sinto-mas gastrointestinais incluem diarreia, dor abdominal, urgência fecal, incontinência, náusea, sem associação com alterações endoscópicas ou radiológicas. Não se sabe se são duas doenças diferentes ou ma-nifestações distintas de uma mesma condição clínica. Dados de sua patofisiologia são conflitantes e diferentes hipóteses são aventadas:

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predisposição genética, desregulação imunológica, autoimunidade, má-absorção de ácidos biliares, infecções e efeitos de drogas. O papel central parece ser alteração do sistema imune, com diversas associa-ções com diferentes doenças autoimunes, tais como doença celíaca, artrite reumatoide, hipo e hipertireoidismo.

Existe forte associação entre colite microscópica e DC em cerca de 50 vezes mais do que na população geral. O diagnóstico concomitante ocorre mais em mulheres de meia-idade. Portanto, celíacas de meia-idade com diarreia ou sintomas persistentes devem ser encaminhadas à endoscopia baixa com biópsias para descartar CM, geralmente condição subdiagnosticada.

O diagnóstico da CM é baseado nos achados histopatológicos das biópsias colônicas. Colite colagenosa: Espessamento difuso da camada colágena subepitelial maior que 10 µm; inflamação da lâmina própria predominante com linfócitos e células plasmáticas; achatamento e destacamento da superfície epitelial. Colite linfocítica: aumento dos linfócitos intraepiteliais (> 20%); inflamação na lâmina própria domi-nada por linfócitos e plasmócitos; dano epitelial como achatamento ou destacamento da superfície epitelial; ausência da camada subepitelial de colágeno (<10 µm). O ideal é coleta de material na endoscopia digestiva alta e colonoscopia no mesmo dia, mesmo com aspecto colônico normal.

A associação entre DC e CM, embora evidente, não está bem clara, por que a etiologia da CC e da CL ainda é incerta.

Tratamento: embora ambos os tipos de CM possam se resolver espontaneamente, na maioria dos casos, terapias farmacológicas têm sido aventadas: messalazina oral (800 mg 2 vezes ao dia), corticoides preconizados para CC (20 mg/dia de prednisolona, diminuída gradativamente; alguns casos precisam de manutenção de 5-7,5 mg/dia) e a budesonida (9 mg/dia por tempo variável) referida como eficaz contra a CC e a CM. A DIG deve ser estrita-mente obedecida.(26-28)

InSuFICIênCIA SuPRARREnAL

A doença de Addison (DA) é causada pela destruição da córtex suprarrenal com consequente deficiência de cortisol, aldosterona e androgênios femininos. Considera-se que sua etiologia mais frequente

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seja uma reação autoimune contra a 21-hidroxilase. Os indivíduos por-tadores da DA têm aumento significativo em morbidade e mortalidade. Diversos estudos indicam risco aumentado de DA em pacientes celía-cos. O risco aumentado é relatado tanto em crianças como em adultos, independentemente de sequência temporal. Assim, pacientes com DA devem ser triados para DC, bem como profissionais que tratam celíacos devem estar alertados para DA.

A associação entre DC e DA pode ser detectada antes ou após diag-nóstico de DC, não se acreditando que uma cause a outra, sugerindo genes comuns a ambas: HLA DQ2 e DQ8.

O tratamento preconizado é uso de corticosteroides de acordo com a fase aguda, diminuindo gradativamente quando se controla o quadro clínico, como se faz nas doenças inflamatórias intestinais.

A crise celíaca é uma síndrome ameaçadora à vida na qual o paciente com DC apresenta diarreia profusa e graves distúrbios me-tabólicos e ácido-básicos. Pode se desenvolver antes do diagnóstico de DC. Os pacientes requerem hospitalização e fluidos EV, além de corticoterapia e até nutrição parenteral em casos extremos. Como a crise celíaca tem alta morbidade, nem sempre é diagnosticada como sendo relacionada à DC. Após a alta hospitalar, corticoides orais (incluindo budesonida) podem ser necessários. O suporte nutricio-nal é por pouco tempo e a DIG é recomendada desde os primeiros momentos.(29-31)

DoEnça CElíaCa rEFratária (DCr)

A DCR é uma condição rara, geralmente em pacientes acima de 47 anos de idade. Define-se DCR quando há atrofia vilositária com hiper-plasia de criptas e aumento dos linfócitos intraepiteliais (LIE) persistindo por mais de 12 meses, apesar da dieta rígida sem glúten. Atenção deve ser dada ao desenvolvimento de linfoma.

DCR tipo I – caracterizada pela expressão normal de antígenos para célula T e rearranjo policlonal do gene TCR: >LIE, hiperplasia de criptas, atrofia de vilosidades, infiltrado inflamatório na lâmina própria, enterócitos alterados; LIE policlonais: Maioria de LIE CD3+,CD7+, CD8+, TCR+. Podem surgir eventos tromboembólicos, infecções e doenças autoimunes. Drogas utilizadas no tratamento: Azatioprina, azatioprina e prednisona, budesonida, infliximabe.

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DCR tipo II – caracteriza-se por fenótipo anormal de LIE com ex-pressão intracitoplasmática CD3, CD103 de superfície: >LIE, hiperplasia de criptas, atrofia de vilosidades, infiltrado inflamatório na lâmina pró-pria, enterócitos alterados; LIE monoclonais (maioria CD103+, CD7+, CD3+, sCD3-, CD4-, CD8, TCR-). Geralmente ocorre em pacientes com idade avançada, < albumina, SMA grave, lesões de pele, infecções respiratórias e sinusoidais, febre, hipoesplenismo. Há associação com > risco de complicações e mortalidade: 40-58% sobrevida em 5 anos. Tratamentos já tentados: alentuzumabe, azatioprina e prednisona, bu-desonida, cladribina, ciclosporina, interleucina 10, infusão de células mesenquimais, pentostatina, bloqueio IL-15 (altera a homeostase dos LIE e linfomagênese), CHOP (ciclofosfamida, doxorrubicina, vincristina, prednisolona), CHOP e alentuzumabe, transplante de células-tronco alogênicas, transplante de células-tronco autólogas.(32-34)

InTOLERânCIA ADQuIRIDA DE LACTOSE

É concomitância bastante reconhecida. A exclusão de produtos lácteos é sempre recomendada nos primeiros três a seis meses após o diagnóstico da doença celíaca, junto com DIG, para dar tempo de se refazer a borda estriada onde há dissacaridases. Pode-se recomendar leites de mamíferos com lactose reduzida ou leite de soja. Se a intole-rância persiste, pode-se preconizar o uso de lactase em preparações cujos comprimidos devem ser ingeridos imediatamente antes do uso do produto lácteo (Lactaid Plus® ou Lactaid Fast®). Cuidar com as fórmulas manipuladas.(35,36)

SínDROME DO InTESTInO IRRITávEL

A doença celíaca se manifesta por diversos sintomas que consti-tuem alguns dos critérios de Roma III para o diagnóstico da síndrome do intestino irritável (SII), fazendo com que muitos pacientes com DC de base sejam erroneamente diagnosticados como portadores da SII, retardando o correto diagnóstico. A DIG resulta em grande melhora nos sintomas.

Entretanto, nos celíacos em DIG pode não haver ingestão suficiente de fibras, exacerbando a constipação. Nestes casos pode-se adicionar

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Quadro 1. Novas terapias para o tratamento da doença celíaca não complicada

Objetivos e abordagem Tratamento

Diminuição da exposição ao glúten Manipulação ou seleção de componentes dietéticosDegradação enzimática do glúten

Modificação de cereaisNeutralização e polimerização da gliadinaProlil-endopeptidases derivadas do Aspergillus nigerCoquetel de enzimas ALVOO3Probióticos (VSL#3) ?

Inibição da permeabilidade intestinalInibição da zonulina Acetato de larazotida

Modulação da resposta imuneDiminuição da atividade imune adaptativa Bloqueio dos anticorpos tTG

Bloqueio dos antígenos apresentados por HLA DQ2/DQ8Vacina para o peptídeo do glútenInfecção com Necator americanus

Redução da inflamação Interleucina 10

suplementação de fibras (ispaghula ou psyllium), até se corrigirem os defeitos alimentares. Para os que apresentam diarreia, os antidiar-reicos podem ser úteis. Compostos preconizados para a SII (brometo de pinavério, brometo de octilônio, mebeverina, etc.) podem ser usados nas doses habituais, até regressão dos sintomas, mas sempre mantendo a DIG.(37,38)

Pacientes com DC podem sofrer de uma variedade de condições como comorbidade, principalmente doenças autoimunes, e devem ser investigados e tratados de acordo com cada uma delas.

Pesquisas têm sido conduzidas para tentar um tratamento para DC além da DIG. O quadro 1 resume as principais.

Em alguns países já se pode adquirir produtos para serem usados à ingestão de glúten (Glutenaid® ou Gluten Relief®), mas a autora recomenda sua utilização apenas em situações em que não se saiba se realmente o alimento é isento de glúten, e não como rotina.

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COnCLuSõES

Enquanto se aguardam resultados de pesquisas, o tratamento da DC permanece a dieta isenta de glúten por toda a vida. Medicamentos são utilizados para repor deficiências e/ou para consequências da alteração intestinal da própria afecção celíaca, com doses e tempo de utilização pertinentes a cada caso em particular e em cada etapa do tratamento dietético.

ALERTA: na DC ativa ou parcialmente tratada, há absorção alterada da maioria dos medicamentos por via oral, o que exige ajustamento das doses de anticoncepcionais, anticonvulsivantes e antibióticos.

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Dra. andréa Benevides leite lima verde • Dr. Francisco sérgio rangel de Paula-Pessoa

Capítulo 16

COMO TRATAR A ESTEATO-hEPATITE nãO

ALCOóLICA

Dra. Andrea Benevides Leite Lima verde Dr. Francisco Sérgio Rangel de Paula Pessoa

DENTRE AS CAUSAS DE ESTEATOSE HEPÁTICA destaca-se a doença hepática gordurosa não alcoólica (DHGNA), que vem sendo considera-da como o componente hepático da síndrome metabólica (SM).(1) Por se tratar de uma doença caracterizada há relativamente pouco tempo, inicialmente descrita na década de 80,(2,3) a literatura ainda carece de dados a respeito de sua fisiopatologia e tratamento.

Essa doença coloca seus portadores sob risco 5 vezes maior de evo-luir para diabetes mellitus tipo 2 (DM), duas vezes maior de morbidade cardiovascular e 1,5 vez maior de mortalidade geral.(4,5) A principal causa de morte nestes pacientes é doença cardiovascular, mas também existe risco de desenvolvimento de carcinoma hepatocelular.

Esteato-hepatite não alcoólica (EHNA) é uma das apresentações da DHGNA, que envolve processo inflamatório hepático e pode cursar com fibrose até evoluir para cirrose,(6) desta forma acrescentando-se a morbimortalidade de causa hepática.

Para evitar os desfechos anunciados, pacientes com DHGNA, tanto aqueles com esteatose “simples” quanto aqueles com EHNA, necessitam de tratamento clínico direcionado aos fatores de risco para SM. O obje-tivo da intervenção é prevenir ou retardar o aparecimento de DM e de

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COMO TRATAR A ESTEATO-hEPATITE nãO ALCOóLICA

eventos cardiovasculares. Os portadores de EHNA necessitam também de tratamento direcionado à doença hepática.

A abordagem inicial inclui a pesquisa dos fatores de risco para SM e de outras causas de doença hepática (tabela 1).(7,8) Também é interessante solicitar sorologia para hepatite A, para que seja oferecida vacinação àqueles suscetíveis.

Tabela 1. Exames iniciais de abordagem de um paciente com DHGNA

TGO, TGP Anti-HCV

Ferritina, IST HBsAg, Anti-HBs

Ceruloplasmina TSH

FAN, AAML CT, HDL, TG

Eletroforese de proteínas Glicemia de jejum

TAP, bilirrubinas Insulina de jejum

Em posse da medida da insulina de jejum, podemos calcular o índice de HOMA-IR (quadro 1). Este dado não é fundamental, mas é interes-sante por fornecer um valor numérico de quantificação da resistência à insulina (RI) inicial e se prestar ao acompanhamento clínico daqueles em tratamento. Valores acima de 2,71 são indicativos de RI na população brasileira.(9) Mas valores acima de 2 já se correlacionam com DHGNA (sensibilidade 85% e especificidade de 83%).(10)

Quadro 1. Cálculo do índice de HOMA-IR

Glicemia de jejum mg/dL x Insulina de jejum mg/dL

405

A SM (quadro 2) é um conjunto de fatores de risco para doença car-diovascular aterosclerótica.(11) Para diagnóstico devem ser preenchidos pelo menos 3 dos 5 critérios:

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Quadro 2. Critérios de síndrome metabólica (AHA, 2005)

Glicemia de jejum ≥ 100 mg/dL.

Triglicerídeos ≥ 150 mg/dL.

HDL < 40 mg/dL para homens / < 50 mg/dL para mulheres.

Pressão arterial sistólica ≥ 130 mmHg e/ou diastólica ≥ 85 mmHg.

Circunferência abdominal ≥ 102 cm em homens / ≥ 88 cm em mulheres

Lembramos que o Consenso Brasileiro de Dislipidemia (2007)(12) uti-liza a medida da circunferência abdominal adotada para a população ameríndia: valores ≥ 90 cm em homens e ≥ 80 cm em mulheres já são sugestivos de RI na América do Sul.

TRATAMEnTO

A perda da gordura visceral é um objetivo a ser buscado no tra-tamento de portadores de DHGNA. Por isso, exercício físico e dieta com redução de calorias são medidas tão importantes no manejo destes pacientes. Sabidamente, mudanças no estilo de vida previ-nem ou retardam o aparecimento de DM naqueles pré-diabéticos, assim reduzindo o risco cardiovascular.(13) No tratamento específico da EHNA, essas medidas também são impactantes. Segundo a lite-ratura,(14) um mínimo de 7% de perda de peso é necessário para se atingir algum impacto nas alterações histológicas, embora ainda não se tenha demonstrado melhora no grau de fibrose. Mas não apenas a perda de peso em si traz benefícios; a prática regular de atividade física, por si só, pode retardar a progressão para DM, melhorar o perfil lipídico(15) e, naqueles com DHGNA, reduzir enzimas hepáticas e esteatose.(16,17)

Nos que não conseguem emagrecer com mudança no estilo de vida, é possível que o uso de drogas como sibutramina e orlistate traga benefícios como melhora na bioquímica hepática, na RI, redução de peso e regressão da esteatose avaliada pela ultrassonografia.(18) A cirurgia bariátrica traz benefícios a obesos mórbidos; no entanto, ainda não é possível afirmar seu papel no tratamento da DHGNA

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COMO TRATAR A ESTEATO-hEPATITE nãO ALCOóLICA

pela falta de um conjunto representativo de ensaios clínicos bem desenhados.(19)

tratamento do pré-diabetesPré-diabetes é uma condição definida por qualquer uma destas três

situações:(20) - Glicemia de jejum entre 100-125 mg/dL (antiga “glicemia de jejum

alterada”).- Glicemia 2 horas após sobrecarga com 75 g de glicose: de 140-199

mg/dL (antiga “tolerância diminuída à glicose”).- Hemoglobina glicada entre 5,7% e 6,4%.Segundo a Sociedade Brasileira de Diabetes, a metformina (500 mg

até 2 g) é a droga de escolha para o tratamento do pré-diabetes.(20) É sabido que esta droga também melhora o perfil lipídico e pode induzir alguma perda de peso.(21) Uma alternativa à metformina seria a acarbose e, mais recentemente, a pioglitazona também foi aprovada como droga para este propósito.(22)

tratamento da dislipidemiaColesterol total elevado não é critério de SM, mas frequente-

mente acompanha HDL baixo, hipertrigliceridemia e é um fator de risco para doenças cardiovasculares. Estatinas são as drogas de escolha para o tratamento farmacológico inicial da hipercolestero-lemia, caso o nível de TG esteja abaixo de 500 mg/dL. A Diretriz Brasileira de Dislipidemias(12) recomenda a administração diária, preferencialmente à noite, embora a atorvastatina e a rosuvastatina possam ser administradas em qualquer horário devido à sua meia-vida prolongada (tabela 2).

É contraindicado o uso em pacientes com hepatopatias agudas, mas o mito de que estatinas não podem ser administradas a portadores de doenças hepáticas crônicas deve ser combatido. Efeitos adversos são raros e podem ser avaliados com a dosagem de TGO e CPK. A droga deve ser suspensa em caso de aumento progressivo ou acima de 10 vezes o LSN da CPK ou se persistência de sintomas musculares. Nos assintomáticos, elevação isolada até três vezes o LSN das transaminases não justifica a suspensão da droga. Hepatotoxicidade pode ser sinalizada por elevação do TAP e da bilirrubina direta, neste caso, a estatina deve ser suspensa e o quadro clínico, investigado.

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Tabela 2. Doses, efeitos sobre o LDL-C, excreção renal e meia-vida de eliminação das estatinas

Fármaco Doses LDL-C Excreção renal (%) Meia-vida (horas)Sinvastatina 20 a 80 mg - 27% a 42% 13 2Lovastatina 10 a 80 mg - 21% a 41% 10 3Pravastatina 20 a 40 mg - 20% a 33% 20 1,8Fluvastatina 20 a 80 mg - 15% a 37% 6 1,2Atorvastatina 10 a 80 mg - 37% a 55% < 5 14Rosuvastatina 10 a 40 mg - 43% a 55% 10 19

Fonte: adaptado da IV Diretriz Brasileira Sobre Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose - Departamento de Aterosclerose da Sociedade Brasileira de Cardiologia.(12)

Naqueles pacientes com TG > 500 mg/dL, o tratamento inicial deve ser a associação de um fibrato (tabela 3) com mudanças no estilo de vida. Caso posteriormente seja necessário adicionar uma estatina, deve-se evitar a administração concomitante destas drogas com genfibrozila, pelo risco de rabdomiólise.

Outro tratamento aprovado para hipertrigliceridemia são os ácidos gra-xos ômega-3 (4 a 10 g/dia). No entanto, trazem o inconveniente de poder aumentar o LDL e são recomendados apenas como terapia adjuvante ou de 2ª linha.(12) Em relação a esta droga, destacamos uma revisão feita em 2010(23) que encontrou evidências de benefício de seu uso na DHGNA, sinalizando que esta droga talvez venha a ser utilizada como medicamento de 1ª linha para o tratamento de hipertrigliceridemia em portadores de DHGNA.

Tabela 3. Doses dos fibratos disponíveis e efeito sobre HDL-C e TG

Medicamento Dose mg/dia HDL-C TriglicéridesBezafibrato 400 a 600 + 5 a 30% - 15 a 55%Ciprofibrato 100 + 5 a 30% - 15 a 45%Etofibrato 500 + 5 a 20% - 10 a 30%Fenofibrato 250 + 5 a 30% - 10 a 30%Genfibrozila 600 a 1200 + 5 a 30% - 20 a 60%

Fonte: Retirado da IV Diretriz Brasileira Sobre Dislipidemias e Prevenção da Aterosclerose - Departamento de Aterosclerose da Sociedade Brasileira de Cardiologia.(12)

tratamento da hipertensão arterial sistêmicaHAS não está diretamente associada a DHGNA, mas costuma estar

presente nos pacientes “plurimetabólicos” e faz parte da obrigação do médico iniciar o tratamento destes pacientes quando identificados. Se

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COMO TRATAR A ESTEATO-hEPATITE nãO ALCOóLICA

as medidas não farmacológicas falham, ou quando existem condições agravantes, o tratamento farmacológico está indicado.

A morbimortalidade cardiovascular é reduzida pelo uso de anti-hiper-tensivos,(24) notadamente: diuréticos, inibidores da enzima conversora da angiotensina, betabloqueadores, antagonistas dos canais de cálcio e bloqueadores do receptor AT1 da angiotensina. Alguns são distribuídos gratuitamente aos usuários do SUS: furosemida, hidroclorotiazida, captopril, enalapril e propranolol.

tratamento farmacológico da EHNAUma questão que se impõe neste ponto é a diferenciação entre portadores

de fígado gorduroso não alcoólico e EHNA. Mas como fazê-lo? A EHNA é caracterizada por injúria hepatocelular(25) (representada por balonização de hepatócitos), ou seja, o diagnóstico de certeza é feito através do exame histo-patológico, que ainda avalia o grau de fibrose. As aminotransferases não são confiáveis na diferenciação entre “esteatose simples” e EHNA, já que ambas podem cursar com níveis semelhantes de aminotransferases.(6)

Ainda estamos à espera de um bom método não invasivo que possa diagnosticar EHNA. No momento, dispomos de um escore específico para fibrose da DHGNA,(26) que se propõe a separar doentes com e sem fibrose avançada. A calculadora está disponível na internet: http://nafldscore.com. Atenção: este método não diagnostica EHNA! Um dado de fácil obtenção que se correlaciona com o diagnóstico de EHNA e fibrose avançada naqueles com DHGNA é o nível de ferritina acima de 1,5 vez o LSN.(27)

Inúmeros estudos já foram conduzidos para avaliar a eficácia de drogas no tratamento farmacológico da EHNA. Um ganha destaque: o estudo PIVENS,(28)

que comparou o efeito de vitamina E (800 UI/dia) e de pioglitazona (30 mg/dia) com placebo no tratamento da EHNA em 247 adultos não diabéticos. Ambas as drogas mostraram redução da esteatose, da inflamação lobular e no escore de atividade de DHGNA quando comparadas ao placebo. Nenhuma das drogas demonstrou melhora no índice de fibrose.

Atualmente, estas são as duas drogas com melhor evidência, em não diabéticos, para o tratamento farmacológico da EHNA.

Existem formulações comercialmente disponíveis de vitamina E em cápsulas de 400 UI. A pioglitazona é comercializada como comprimidos de 15, 30 e 45 mg, que devem ser utilizados 1x/dia.

É necessário acompanhamento clínico quanto aos efeitos indesejáveis de ambas as drogas: há controvérsias sobre se a vitamina E, em doses maiores

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que 400UI/dia, aumenta o risco de mortalidade geral(29,30) e há evidências de que aumenta o risco de câncer de próstata;(31) enquanto a pioglitazona vem sendo alvo de investigação sobre seu efeito no desenvolvimento de insufi-ciência cardíaca congestiva em diabéticos(32) e de câncer de bexiga.(33)

No caso de pacientes portadores de outras doenças hepáticas crônicas em associação com EHNA, não existem evidências do benefício da pio-glitazona nem da vitamina E sobre a doença hepática.

Outras drogas continuam a ser estudadas como tratamento para EHNA, como é o caso do ácido graxo ômega-3. Uma substância interessante é a cafeína: um estudo recente aponta para a relação inversa entre consumo de café e fibrose hepática na DHGNA, concluindo que o consumo de café está associado a redução no risco de fibrose nos pacientes com EHNA.(34)

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A Gastroenterologia na Prática Clínica • 215

Dr. Angelo Alves de Mattos

Capítulo 17

COMO Eu TRATO A ASCITEnO CIRRóTICO

Dr. Angelo Alves de Mattos

A ASCITE é uma complicação frequente, que ocorre na evolução de um paciente com cirrose. Pela elevada incidência e pelo mau prognóstico que acarreta ao paciente é fundamental um tratamento adequado.

Em geral, os pacientes com ascite necessitam de hospitalização, embora aqueles com derrame peritoneal de pequeno volume pos-sam ser manejados em nível ambulatorial.

É fundamental que seja identificada, afastada ou tratada, quan-do possível, a causa da hepatopatia. Assim, por exemplo, em um paciente com hepatopatia decorrente do alcoolismo, é importan-te que o uso de álcool seja suspenso. O tratamento do VHB, da hepatite autoimune e da hemocromatose também pode traduzir uma melhora da ascite.

O repouso, enaltecido no passado, hoje em dia é regido pelas condições clínicas do paciente.

A dieta com restrição de sódio é um passo importante do tra-tamento, sendo preconizada uma restrição de 2 gramas ao dia. Em regra, é orientado somente que os pacientes não coloquem sal em sua dieta e que evitem alimentos sabidamente com maior

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COMO Eu TRATO A ASCITE nO CIRRóTICO

conteúdo de sódio (em média, fica permitida uma ingesta de 4,6 a 6,9 gramas de sal ao dia).

O déficit de excreção hídrica é um achado comum no cirrótico; no entanto, a ingestão de água só deve ser restringida naqueles pacientes em que a concentração sérica de sódio for inferior a 125-130 mEq/L. Caso o paciente apresente importante hiponatremia (inferior a 120 mEq/L), os diuréticos devem ser suspensos.

Como a resposta à dieta com restrição de sódio é pobre, o uso de diuréticos deve ser considerado desde o início do tratamento. Tendo em vista a presença de edema periférico concomitante proteger o paciente quanto ao desenvolvimento de hipovolemia, em decorrência de sua mobilização preferencial e ilimitada, fica sugerido que o tratamento possa resultar em uma perda média de 1 kg/dia naqueles pacientes com ascite e edema periférico e de 300-500 g/dia naqueles só com ascite (reabsorção limitada).

No início do tratamento, são utilizados diuréticos poupadores de potássio, preferencialmente a espironolactona, em decorrência do hiperaldosteronismo existente no paciente com cirrose. A dose inicial é de 100 mg, podendo ser aumentada a cada 3-5 dias, até um máximo de 400 mg/dia. O intervalo de dias utilizados para a modificação da dose é baseado no fato de que o pico de ação da droga é entre o 3º e 5º dia de seu uso. Esse regime resulta em uma natriurese adequada em 75% dos pacientes. Como os principais metabólitos da espironolactona, sua porção ativa, têm uma meia-vida plasmática longa, está justificada sua administração uma vez ao dia.

Ao redor de 20-30% dos cirróticos com ascite e com função renal preservada não respondem ao esquema proposto. Sendo o sítio de ação da droga ao nível do néfron distal, a retenção pro-ximal de sódio e de água explica a falha terapêutica em alguns pacientes. Nestes casos, associa-se um diurético de alça. A droga habitualmente utilizada é a furosemida, variando a dose de 40 a 120-160 mg/dia.

Existe controvérsia na literatura no que tange ao melhor es-quema de diuréticos a ser utilizado inicialmente nos pacientes

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Dr. Angelo Alves de Mattos

com cirrose e ascite. Santos et al. avaliaram a utilização de espi-ronolactona vs. espironolactona e furosemida em pacientes com ascite moderada, após dieta e repouso. Em um grupo, quando necessário, aumentavam a dose a cada 4 dias de ambos diuréti-cos (doses máximas de 400 mg para a espironolatona e 160 mg para a furosemida) e, no outro, o aumento da dose inicial era da espironolatona e, na ausência de resposta, era, então, acrescida a furosemida. A resposta ao tratamento, as complicações e a velocidade de mobilização da ascite foram semelhantes nos dois grupos. Recentemente, Angeli et al., também avaliando pacientes com ascite moderada, após dieta e repouso, fizeram estudo com desenho semelhante e observaram que o tratamento combinado foi mais efetivo na ascite moderada.

Em editorial, Bernardi M. comenta que embora os dois estudos sejam prospectivos, controlados e randomizados, eles avaliavam populações distintas. Assim, no primeiro estudo, 60% dos pacientes tinham ascite de início recente, 40% tinham aldosterona normal, e todos tinham creatinina dentro da normalidade, permitindo su-cesso com espironolactona isolada em dose baixa e com poucos efeitos colaterais. Já no segundo estudo, em 70% dos pacientes, a ascite era recidivante, a maior parte apresentava hiperaldostero-nismo e tinha diminuição da taxa de filtração glomerular. Então, o sucesso se fazia esperado, ou com altas doses de canrenoato, ou com tratamento combinado. Conclui referindo que os pacientes com ascite de início recente devem ser tratados de forma distinta daqueles com ascite recidivante. Recentemente, foram publicados os guidelines da European Association for the Study of the Liver (EASL), sendo que, a este respeito, se posicionam da maneira que segue: pacientes com um primeiro episódio de ascite podem ter seu tratamento com doses iniciais de espironolacona, no entanto, os pacientes com ascite recorrente devem ser tratados com a te-rapia combinada.

Nos pacientes com derrame peritoneal volumoso (ascite tensa) a proposta terapêutica a ser avaliada é a paracentese com repo-sição de albumina.

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COMO Eu TRATO A ASCITE nO CIRRóTICO

A terapêutica através da paracentese, com infusão endovenosa de 8 gramas de albumina por litro de ascite drenado, mostrou-se mais efetiva, acarretando menos complicações e diminuindo o tempo de internação dos pacientes, quando comparada com o tratamento à base de diuréticos. Ressaltamos que a reposição com albumina tende a minorar a disfunção circulatória que pode ocor-rer após a paracentese (disfunção circulatória pós-paracentese). Recente meta-análise avaliando trials prospectivos, controlados e randomizados em pacientes com ascite volumosa e que realiza-ram paracentese e reposição com albumina ou outros expansores demonstrou que a albumina diminui a incidência de síndrome pós-paracentese, de hiponatremia e de mortalidade.

Embora a paracentese terapêutica com reposição volumétrica seja o tratamento de eleição para os pacientes com ascite volu-mosa, ela não corrige a retenção renal de sódio existente e esses pacientes devem utilizar diuréticos após a remoção do líquido de ascite.

Quando do tratamento da ascite, é importante que o clínico esteja atento para evitar a utilização de medicamentos que prejudi-quem a função renal, tais como os anti-inflamatórios não esteroides, inibidores da ECA, antagonistas dos receptores da angiotensina e mesmo drogas nefrotóxicas, como os aminoglicosídeos.

É importante enfatizar que o transplante hepático é a forma de terapia definitiva a ser ofertada aos pacientes com ascite. Seriam, então, as alternativas anteriormente consideradas procedimentos terapêuticos que proporcionariam uma vida mais digna a esta população de pacientes até a sua realização. A sobrevida dos pa-cientes transplantados em nosso meio é excelente, sendo ao redor de 80% em 1 ano e de 60% em 15 anos.

O déficit de excreção de água, decorrente de uma anormalidade funcional renal, é um achado frequente nos cirróticos com ascite. A depuração de água livre está diminuída em 75% dos pacientes com cirrose, sendo que a hiponatremia pode ser observada em 1/3 dos mesmos, apresentando uma correlação direta com a gravidade da hepatopatia. Assim, drogas que aumentem a excreção de água livre

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Dr. Angelo Alves de Mattos

poderiam influir na hiponatremia dilucional e na hiposmolaridade, consequentes à retenção renal de água, observada nesses pacien-tes. Atualmente, os antagonistas dos receptores V2 (vaptans) estão sendo avaliados. Embora estudos iniciais com o satavaptan tenham sido promissores, o mesmo não ocorreu quando da avaliação em estudo de fase 3. Recentemente um outro medicamento, o tolvap-tan, foi aprovado pelo FDA para o tratamento da hiponatremia em pacientes com cirrose. A despeito de, atualmente, ser muito pobre a experiência com tais medicamentos em pacientes com cirrose e ascite, espera-se que, em futuro próximo, agentes aquaréticos venham a ser utilizados na prática médica, proporcionando, assim, resposta terapêutica mais eficaz quando em comparação com o tratamento convencional.

Ao finalizarmos esta revisão, entendemos de interesse as considerações feitas no último guideline da American Associa-tion for the Study of Liver Diseases (AASLD) e no da EASL no que tange ao tratamento da ascite. Assim, os principais passos a serem considerados são os que se seguem: tratamento da causa da hepatopatia; restrição de sódio e início precoce de diuréticos; restrição hídrica quando o sódio sérico for inferior a 120-125 mEq/L; na ascite tensa, realizar paracentese terapêu-tica, repondo albumina (mandatória quando o volume drenado for superior a 5 litros); e avaliar a indicação de transplante em pacientes com ascite.

BIBLIOGRAFIA RECOMEnDADA

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Dr. Rubens Basíle

Capítulo 18

COLELITíASE ASSInTOMáTICA – COnDuTA COnSERvADORA Ou

CIRúRGICA?

Dr. Rubens Basile

A LITÍASE BILIAR ASSINTOMÁTICA (LBA) é definida como a detecção incidental de cálculos biliares em exames de imagem (principalmente em US abdominal), em pacientes que não apresentam qualquer sintoma abdominal ou têm sintomas que aparentemente não são relacionados com a presença dos cálculos.

A prevalência de cálculos biliares, nos adultos, estimada mediante estudos epidemiológicos de necropsia e de investigação clínica, varia de 15 a 20%. A litíase vesicular é rara na criança, começa a ser identificada na adolescência, cresce de incidência entre os 35 e 55 anos e aumenta, gradualmente, a partir dos 55 anos. Estimativas baseadas em estudo de necropsia indicam que, aproximadamente, 50% dos pacientes idosos têm colelitíase aos 75 anos de idade.

Vários fatores estão envolvidos na formação dos cálculos biliares, entre esses podemos destacar: fatores genéticos, idade, sexo, obesidade, emagrecimento rápido, nutrição parenteral total, hipertrigliceridemia, hemólise crônica, ressecção ou doença ileal e cirrose hepática.

Na história natural da litíase biliar, 60 a 80% dos portadores de co-lelitíase são assintomáticos.

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COLELITíASE ASSInTOMáTICA - COnDuTA COnSERvADORA Ou CIRúRGICA?

Vários estudos epidemiológicos mostram um curso benigno para a doença.

Um estudo dinamarquês acompanhou durante 11 anos um grupo grande de pacientes com colelitíase assintomática detectada atra-vés de rastreamento ultrassonográfico e demonstrou a ocorrência de apenas 0,2% a 0,8%, por ano, de complicações ao final deste período.

Um estudo italiano sugere que a taxa anual de complicações seja entre 0,3% e 1,2% se os cálculos são inicialmente assintomáticos e de 0,7 a 2% se sintomáticos.

A dor biliar é a principal queixa na maioria dos pacientes sintomáticos com cálculos biliares. A dor é contínua, não em cólicas, de moderada a forte intensidade, localizada principalmente na região epigástrica ou hipocôndrio direito, podendo irradiar-se para o ombro direito e escápula. Ocorre geralmente após refeição rica em gorduras, tem início súbito e aumenta gradativamente durante 15 min a 1 hora, que permanece em um platô durante 1 hora ou mais, e depois diminui lentamente, poden-do sua intensidade durar cerca de 3 h. A dor que dura mais de 3 h (5 a 6 h) sugere colecistite aguda. Náuseas, vômitos e sudorese podem estar associados.

É importante uma avaliação e discernimento clínico criterioso evitando-se atribuir aos cálculos biliares sintomas oriundos de outras afecções do sistema digestivo. Manifestações inespecíficas, como fla-tulência, pirose, empachamento, eructações, desconforto abdominal e intolerância a alimentos gordurosos sugerem outras doenças digestivas (doença do refluxo gastroesofagiano, dispepsia funcional e síndrome do intestino irritável).

São basicamente dois argumentos em favor da conduta expectante ou conservadora:

1. Na história natural da doença: a apresentação inicial é a dor biliar não complicada, a complicação (colecistite, pancreatite, icte-rícia obstrutiva e colangite) raramente é a primeira manifestação da doença e a baixa frequência com que ocorreriam estas complicações (0,2% a 1,5% a.a): 0,3% para a colecistite aguda, 0,2% para a icterícia obstrutiva, 0,04% a 1,5% para a pancreatite aguda, raramente íleo-

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Dr. Rubens Basíle

biliar e o risco de desenvolvimento de câncer da vesícula de 0,12% a 0,3% em 30 anos.

2. Riscos da colecistectomia: a mortalidade geral da colecistectomia varia de 0,14% a 0,5% em estudos diferentes, dependendo da idade, condições clínicas dos pacientes e de comorbidades presentes.

Complicações aparentemente crescentes decorrentes de LIVB (lesões iatrogênicas da via biliar) - transecções, grampeamentos, es-tenoses, lacerações ductais, principalmente na cirurgia laparoscópica (0,1% a 0,3% na cirurgia convencional e de 0,4% a 0,6% na cirurgia laparoscópica).

Pode ocorrer aparecimento ou aumento do refluxo biliar gastroeso-fágico e ocorrência relativamente frequente de diarreia colerética.

A LIVB pode ter complicações se não for tratada adequadamente e em tempo hábil, com episódios de colangite, cirrose biliar secundária, insuficiência hepática e óbito.

As cirurgias para correção dessas lesões biliares têm seus próprios riscos, incluindo novamente a mortalidade perioperatória e na colecis-tectomia laparoscópica pode haver um risco adicional de 0,02% de lesão intestinal ou vascular durante a inserção do trocarte.

A SAGES - Society of American Gastrointestinal and Endoscopic Surgeons, nas suas diretrizes para aplicação clínica da cirurgia laparos-cópica do trato biliar, publicadas em 2010, não coloca a LBA como uma das indicações de cirurgia laparoscópica, afirmando que os cálculos biliares assintomáticos geralmente não são uma indicação para esse procedimento.

Da mesma forma a WGO – World Gastroenterology Organisation - Practice Guidelines, em suas diretrizes para a LBA, não indica a cole-cistectomia profilática, exceto nas seguintes circunstâncias:

- pacientes que vivem em locais remotos demais para o tratamento médico se houver alguma complicação da litíase.

- pacientes que vivem em áreas de alto risco para colangiocarcino-ma, como Chile e Bolívia.

- doentes imunossuprimidos (transplantados, p. ex.), que têm maior risco de complicações como colangite.

- pacientes com diabetes tipo 1, apesar de não terem maior preva-

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COLELITíASE ASSInTOMáTICA - COnDuTA COnSERvADORA Ou CIRúRGICA?

lência de litíase biliar, mas quando idosos têm maior risco de surgirem complicações inflamatórias.

- doentes com perda rápida de peso.- vesícula em porcelana, pelo alto risco de câncer da vesícula.As considerações para os que optam pelo tratamento conservador

referem que na maioria dos casos os riscos da cirurgia são maiores do que os benefícios esperados e, portanto, a colecistectomia profilática não constitui indicação para litíase biliar assintomática.

Os que optam pela cirurgia argumentam que a menor morbidade associada aos melhoramentos estéticos, recuperação mais rápida, pro-porcionados pela cirurgia videolaparoscópica, reacendeu as discussões sobre o tratamento cirúrgico dos pacientes assintomáticos. Há um maior contingente de pacientes sabidamente portadores de litíase biliar assin-tomática carentes de definição terapêutica que muitas vezes não aceitam a conduta conservadora. A possibilidade de ocorrerem complicações da litíase (colecistite aguda, pancreatite aguda, icterícia obstrutiva e câncer de vesícula biliar) como primeira manifestação da doença, geralmente mais graves, em situações adversas e em idades mais avançadas. Muitos pacientes não aceitam correr os riscos das complicações, mesmo que sejam estatisticamente pequenos.

Com relação a LIVB, argumentam que nos casos assintomáticos o risco seria menor, devido à inexistência do processo inflamatório vigente, o qual seria um complicador da técnica operatória e um facilitador da ocorrência de lesões.

Muitos consideram a colelitíase assintomática uma doença e não um achado, e portanto deve ser tratada.

A cirurgia pode levar à cura definitiva da doença e proteger o pa-ciente de complicações.

Outros argumentos como a associação entre litíase biliar (cálculos > 3 cm) e câncer da vesícula também são aventados. Cerca de 70 a 85% dos casos de carcinoma da vesícula apresentam cálculos em seu inte-rior. Taxas maiores de carcinoma de vesícula e colangiocarcinoma, em pacientes com colecistolitíase foram encontradas em alguns estudos de necropsia e caso-controle. Vesícula calcificada “em porcelana” também é um fator de risco para câncer de vesícula.

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Dr. Rubens Basíle

As considerações para os profissionais que optam pela conduta ci-rúrgica baseiam-se geralmente nos seguintes argumentos: A CL é um procedimento seguro, houve um avanço na tecnologia instrumental com imagens de alta resolução, e com consequente melhora na experiência profissional e segurança do procedimento.

A cirurgia em qualquer das modalidades constitui o tratamento de-finitivo da colelitíase, prevenindo as suas complicações.

Um grupo selecionado de pacientes pode ser considerado como ex-ceção à regra (embora não seja consenso) e a cirurgia profilática eletiva pode constituir a conduta terapêutica mais adequada, por apresentarem um risco mais elevado de complicação ou por se encontrarem em con-dição de vulnerabilidade:

• Concomitante a cirurgias abdominais de outra natureza. Com-binada ao tratamento cirúrgico da obesidade mórbida (perda rápida de peso).

• Suspeita de neoplasia ou risco de malignidade (vesícula em por-celana, cálculo associado com pólipo ≥ 1 cm, cálculos > 3 cm, parede vesicular espessada).

• Pacientes jovens (expectativa de vida maior que 20 anos – risco aumentado da evolução para colelitíase sintomática).

• Doença hemolítica crônica.• Cálculos menores que 3 mm ou lama biliar.• Difícil acesso à assistência médica (lugares remotos) e provenientes

de áreas de risco para desenvolvimento de colangiocarcinoma (Chile e Bolívia).

• Pacientes imunodeprimidos pelo risco de colangite, em especial transplantados.

Controvérsias à parte, os casos de colelitíase assintomática devem ser analisados individualmente.

A colecistectomia profilática não está indicada na maior parte dos pa-cientes assintomáticos, mas deverão ser alertados sobre o aparecimento dos sintomas e informados sobre as possíveis complicações.

A decisão terapêutica (conservadora ou cirúrgica) deverá ser sempre compartilhada com os pacientes, que devem ser informados dos riscos de uma e de outra conduta.

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COLELITíASE ASSInTOMáTICA - COnDuTA COnSERvADORA Ou CIRúRGICA?

REFERênCIAS

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A Gastroenterologia na Prática Clínica • 227

Dr. José Galvão-Alves

Capítulo 19

PAnCREATITE AGuDA – TERAPêuTICA CLínICA

Dr. José Galvão-Alves

UM DOS GRANDES DESAFIOS da medicina clínica cirúrgica é a terapêutica da pancreatite aguda (PA), em especial na forma grave, na qual a necrose da glândula e da gordura peripancreática tem sido o fator de risco predominante para a má evolução. Nos Estados Unidos, mais de 300.000 pacientes são admitidos anualmente por PA(1) e cerca de 20.000 evoluem para óbito nesse mesmo período.(2)

Prevenir síndrome de resposta inflamatória sistêmica (SRIS), in-fecção e sepse diminuiria a falência múltipla de órgãos e a morbi-letalidade.

DEFInIçãO

Entende-se por pancreatite aguda o processo inflamatório do pân-creas e/ou de tecido peripancreático, de inúmeras etiologias, que se manifesta, em sua maioria, por dor abdominal, elevação das enzimas pancreáticas (amilase e/ou lipase) no sangue e alteração morfológica identificada à tomografia computadorizada de abdome (TC) ou à ul-trassonografia (US).

Considera-se, com propósito diagnóstico, elevação das enzimas pan-creáticas a nível acima de três vezes o seu limite superior.

A associação de dor com mais um dos parâmetros anteriormente cita-dos, elevação das enzimas ou alteração morfológica, é diagnóstico de PA.

Merece apreciação a situação de dor abdominal em barra no andar

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PAnCREATITE AGuDA - TERAPêuTICA CLínICA

superior do abdome associada a náuseas e vômitos, muito sugestiva de origem pancreática que, no entanto, cursa com enzimas e tomografia computadorizada normais. Embora não possamos excluir PA, também não podemos confirmá-la.

Este grupo de pacientes, que responde por 5% a 10% do total das pancreatites agudas, deve ser orientado para investigações futuras, mais especializadas, e para manter-se atento a novos epi-sódios dolorosos.(3)

CLASSIFICAçãO

Em 1992, um grupo de 40 especialistas em doenças pancreáticas reuniu-se em Atlanta, Geórgia, EUA, sob a coordenação do Pro-fessor Edward L. Bradley III, responsável pelo Departamento de Cirurgia do Memory University School of Medicine, para rever as principais definições e terminologias sobre pancreatite aguda e que constituem guias ainda atuais do nosso conhecimento sobre esta patologia.(4,5) Mais recentemente, algumas considerações buscam atualizar esta classificação.

Pancreatite aguda leve (Edematosa intersticial)Forma mais comum de apresentação (80% a 90%), caracteriza-se

por doença restrita ao pâncreas com evolução clínica e laboratorial favoráveis. Por vezes, é de diagnóstico extremamente difícil, pois pode cursar com enzimas pancreáticas e tomografia computadorizada do pâncreas normais.

Embora possa apresentar toxicidade sistêmica, esta é geral-mente autolimitada. A mortalidade gira em torno de 2% e, muitas vezes, está relacionada com o estado clínico prévio do paciente (tabela 1).(6)

Tabela 1. Classificação

Formas evolutivas Mortalidade (%)

Leve (intersticial) < 2%

Grave (necrosante)Necrose estéril 10%

Necrose infectada 30%

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Dr. José Galvão-Alves

Pancreatite aguda grave (necrosante)Doença sistêmica grave, com necrose pancreática e peripancreá-

tica e síndrome da resposta inflamatória sistêmica (SRIS). Evolui frequentemente com falência de órgãos e complicações locais, como necrose infectada, pseudocisto e abscesso. A mortalidade pode atingir de 20% a 40%. Nessa forma de apresentação, a to-mografia computadorizada com contraste em bolo (mapeamento dinâmico do pâncreas) apresenta um índice diagnóstico próximo a 95%.

Fica bastante claro que existem duas grandes formas evolutivas de PA, com apresentações clínicas distintas e que envolvem con-dutas diagnósticas e terapêuticas diferentes. Enquanto o paciente com pancreatite aguda leve pode ser adequadamente tratado em um leito de enfermaria por uma equipe experiente, o portador de pancreatite aguda grave necessita de internação em centro de te-rapia intensiva, muitas vezes com uma equipe mais completa, da qual devem fazer parte clínicos, cirurgiões, endoscopistas, inten-sivistas, radiologistas intervencionistas, nutrólogos, fisioterapeutas respiratórios, entre outros.

Coleção fluida agudaEsta condição ocorre precocemente no curso da PA, localiza-se mais

frequentemente próximo ao pâncreas e não há tecido de granulação ou fibrose que a envolva (fig. 1).

Figura 1. Pancreatite aguda. Coleção líquida aguda.

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PAnCREATITE AGuDA - TERAPêuTICA CLínICA

Figura 2. Pancreatite aguda. Necrose parenquimatosa e

peripancreática.

Estas coleções constituem o substrato para o pseudocisto e o abs-cesso pancreático agudo.

Necrose pancreáticaCorresponde a uma área focal ou difusa de parênquima pancreático

não viável que é tipicamente associado à necrose gordurosa peripan-creática (fig. 2).

É o principal fator morfológico de gravidade da PA, e o padrão ouro para sua identificação é a tomografia computadorizada com contraste oral e venoso.

A distinção entre necrose estéril e infectada é crítica, pois a presença de infecção aumenta a morbiletalidade e obriga-nos a uma drenagem preferencialmente cirúrgica.

Já a necrose estéril pode nos permitir um criterioso acompanhamento clínico laboratorial.

Esta importante distinção, entre estéril e infectada, deve ser conduzida através de punção por agulha fina guiada por TC, cujo material coletado será encaminhado à coloração pelo Gram e cultura (fig. 3).

Pseudocisto agudoPseudocisto é uma coleção de suco pancreático, envolvida por uma

parede não epitelizada (fig. 4), originário de pancreatite aguda, trauma pancreático ou pancreatite crônica.

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Dr. José Galvão-Alves

Figura 3. Punção por agulha fina de coleção suspeita de infecção guiada por tomografia. Infecção confirmada.

Figura 4. Pseudocisto no corpo pancreático.

É rico em enzimas pancreáticas e estéril. Sua formação requer quatro ou mais semanas a partir do início da pancreatite aguda.

Abscesso pancreáticoColeção intra-abdominal, purulenta, circunscrita, geralmente na pro-

ximidade do pâncreas, contendo pouco ou nenhum tecido necrótico e que se origina de uma pancreatite aguda ou trauma pancreático (fig. 5).

Ocorre tardiamente na evolução da PA, geralmente a partir da 4ª semana ou mais do início do quadro.

Origina-se muito provavelmente de uma necrose delimitada com subsequente liquefação e infecção secundária.

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PAnCREATITE AGuDA - TERAPêuTICA CLínICA

Deve ser diferenciado da necrose infectada, pois esta não é bem delimitada e contém grande quantidade de tecido necrótico, ao passo que o abscesso tem pouca necrose em seu interior e contém pus com cultura positiva para bactéria ou fungo.

Mais recentemente tem-se proposto a denominação de “necrose or-ganizada” para a situação em que a necrose é bem delimitada por um tecido granuloso, mas ainda não liquefeito para tornar-se pseudocisto e também bastante rico em conteúdo necrótico para ser considerado um abscesso. Logo, a partir do tecido necrótico poderíamos ter inúmeras formas de apresentação (fig. 6).

É fundamental ter a percepção atual de que necrose infectada é di-ferente de abscesso, e que pseudocisto infectado deve ser considerado abscesso.

Saliente-se que o índice de mortalidade por necrose infectada é o dobro daquele por abscesso pancreático.

terapêuticaA apresentação clássica da pancreatite aguda tem como sintoma

cardinal a dor, presente em cerca de 95% dos pacientes.(7,8) Embora a dor “em barra” ou “em cinto” seja a mais característica, esta encontra-se presente em no máximo 30% a 50% dos casos, sendo a localização epi-gástrica a forma de apresentação mais comum (60%). Cabe lembrar que em muitas vezes ela se comporta de maneira atípica e pode localizar-se em qualquer ponto do tórax ou do abdome.

Figura 5. Abscesso pancreático em cauda pancreática.

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Dr. José Galvão-Alves

Figura 6. Algoritmo – Pancreatite aguda – formas evolutivas

Fonte: J. Galvão, 2009

Náuseas acompanhadas de vômitos, presentes em 80% das vezes, podem tornar-se incoercíveis, impossibilitando a hidratação oral e con-tribuindo para o estado de hipovolemia desses pacientes.(7,8)

Distensão abdominal por diminuição de peristalse (íleo paralítico), equimose periumbilical (sinal de Cullen) ou nos flancos (sinal de Grey-Turner) e ascite livre podem ser identificadas no exame físico do abdome.

A presença de equimose, vista em apenas 3% das pancreatites, tra-duz necrose e hemorragia no retroperitônio e, assim como a ascite, relaciona-se com maior gravidade do quadro(7,8) (fig. 7).

Manifestações sistêmicas, distantes do pâncreas, representam também pior prognóstico e podem expressar-se através de alterações nos mais variados aparelhos e sistemas.

A primeira decisão na terapêutica do paciente com pancreatite aguda é decidir em que setor ele deverá ser internado. Nos casos indicativos de uma forma leve optamos por deixá-lo num leito de

início

1º - 4º Dia

6º - 21º Dia

4º - 7º Semana

intersticial

Resolução

necrosante

Pseudocisto Abscesso

necrose organizada

necrose nãoorganizada

estéril

necrose nãoorganizadainfectada

PANCREATITE AGUDA

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Figura 7. Sinal de Cullen (equimose periumbilical) e de

Grey-Turney (equimose no flanco) por complicações hemorrágicas

da pancreatite aguda.

enfermaria, ao passo que aqueles com sinais de gravidade e/ou co-morbidades significativas devem ser lotados no Centro de Terapia Intensiva.

Este grupo de pacientes depende de médicos competentes, instituição qualificada, equipe de saúde harmonizada e experiente.

reposição volêmicaEm decorrência da não ingestão hídrica adequada, da perda vo-

lêmica decorrente de vômitos, sudorese, perspiração, íleo paralítico e queimadura retroperitoneal, a volemia destes pacientes será tão menor quanto a gravidade do quadro, e a mesma poderá agravar o estado geral em decorrência de má perfusão renal, intestinal e pan-creática. Na PA grave, associa-se ainda a vasodilatação decorrente da liberação de mediadores inflamatórios. Portanto, pouco volume numa rede vascular mais dilatada tem como consequências, possíveis, a hipotensão e o choque.

Apesar da aceitação universal de que o paciente com PA deva receber uma ressuscitação volêmica generosa, poucos são os estudos em huma-nos que avaliam tal paradigma. Estudos de Banks(23) correlacionando a hemoconcentração como um marcador de gravidade da PA reforçam esta teoria. Outros estudos, no entanto, não reforçam esta conduta como obrigatória.(24-26)

Somos de opinião de que a ressuscitação hídrica deve obedecer a uma cuidadosa avaliação hemodinâmica do paciente, bem como a

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Dr. José Galvão-Alves

coexistência de comorbidades que possam dificultar a introdução de grandes volumes como a insuficiência cardíaca e/ou renal.

Isto visto, propomos reidratação de acordo com a gravidade de depleção volêmica, e sendo assim os mais graves deverão receber em torno de 500 a 1.000 mL/hora e aqueles mais equilibrados cerca de 250 a 350 mL/hora.(27)

Deve-se ressaltar a importância de entender a reposição de fluidos como uma conduta dinâmica e baseada em parâmetros clínicos-labo-ratoriais de vigília contínua.

Outro ponto a se discutir na hidratação endovenosa é o tipo de flui-do a ser administrado. Na PA leve não há dúvida quanto à preferência pelos cristaloides (soro fisiológico e/ou Ringer 3); no entanto, quando se trata de forma necrosante, é bem provável que tenhamos que associar os coloides, em especial a albumina humana. Em casos especiais de PA em alcoolista com hepatopatia crônica concomitante pode-se cogitar o uso de plasma fresco.

A administração de concentrado de hemácias deve ser indicada quando o hematócrito está abaixo de 25% ou quando entre 25% a 30%, mas com instabilidade hemodinâmica presente.(27)

AnalgesiaA dor é o mais comum sintoma da pancreatite aguda e principal

razão de busca ao setor de Emergência. Ela por vezes é lancinante e de difícil controle, necessitando desde analgésicos comuns até o uso de opiáceos.

Existem várias medidas disponíveis para alívio da dor, a começar pelo jejum, denominado dieta zero oral, que elimina o estímulo gas-troentérico ao pâncreas e, por conseguinte, a secreção pancreática. Em presença de íleo paralítico substancial, a introdução de uma sonda nasogástrica de curta duração (24 a 48 horas) pode promover alívio sintomático significativo.

A analgesia farmacológica deve evitar a via oral e, preferencialmente, se faz por via endovenosa.

Os analgésicos comuns como a dipirona (metamizol) em infusão contínua, na dose de 320 mg/hora, ou em bolus na dose de 2 gramas endovenoso a cada 8 horas têm se mostrado efetivos no controle da dor da PA.(26)

Esta substância não é agressiva à mucosa gastrointestinal e aos rins;

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no entanto, apresenta risco de provocar agranulocitose em pequeno número de usuários.(26) Tem sido nossa primeira opção há muitos anos, inclusive devido à sua disponibilidade e custo.

Os anti-inflamatórios não hormonais são os mais utilizados na prática clínica como analgésicos não opioides; no entanto, seus principais paraefeitos, como hemorragia digestiva, disfunção renal e mielotoxicidade, obrigam-nos a recomendá-los com cautela e por curto período.

Por último, observa-se o uso dos opinoides EV em ordem progressi-va: tramadol, meperidina e morfina (tabela 2), que devem ser utilizados cuidadosamente, pois têm ação nos receptores opinoides do sistema nervoso central e seu uso pode associar-se à dependência, em especial nos alcoolistas.(27)

Embora citado na literatura,(27) não temos indicado o fentanil como analgésico em PA.

Os opinoides também têm sido recomendados para uso por via epidural; no entanto, não a utilizamos na PA e sim, por vezes, na dor refratária de pancreatite crônica e câncer pancreático.

Tabela 2. Analgésicos opioides

Nome Dose Via Intervalo

Tramadol 100 a 150 mg EV 6/6 h – 8/8 h

Meperidina 10 mg EV 4/4 h – 6/6 h

Morfina 2 mg EV 4/4 h – 6/6 h

NutriçãoA dieta zero por via oral deve ser conduta comum a todas as formas

de pancreatite aguda e tem sido recomendada em todos guidelines sobre o assunto.(23,28)

Na PA leve esta conduta deve ser mantida por 4 a 7 dias, quando então uma evolução clínica e laboratorial favorável nos autorizaria a reintroduzir lenta e progressivamente a alimentação oral. Naqueles com alívio precoce da dor, peristalse presente, sensação de “fome”, leucó-citos e PCR próximos ao normal, por volta do quarto dia reiniciamos a alimentação com apenas líquidos claros no sentido de observar-se a

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Dr. José Galvão-Alves

aceitação. Em caso de boa resposta, progredimos uma dieta branda, líquido pastoso, isenta de lipídeos.

Caso a aceitação seja difícil, o reinício da alimentação oral deverá ser conduzido com maior cuidado e de forma mais lenta.

Já nas formas de apresentação mais grave, por tratar-se de condição hipermetabólica e catabólica, a perda de proteínas é de tal relevância que aumenta significativamente a morbiletalidade destes pacientes.(30,31) Neste grupo, impõe-se a intervenção nutricional o mais precocemente possível, pois ao cabo de uma semana esgotará a reserva proteica se não suplementada adequadamente.(32)

A primeira decisão em nutrir-se o paciente com PA grave recai sobre a via de inserção do suplemento alimentar.

Os cinco maiores estudos comparativos, randomizados(33-35) e sua meta-análise(36) demonstram que a alimentação enteral é consistentemen-te superior à nutrição parental, com menor custo, menos complicações e melhor evolução.

Isto se deve especialmente à maior eficiência da nutrição enteral em preservar a função intestinal, diminuir translocação bacteriana, melhorar a imunidade local e sistêmica, diminuindo a desnutrição, a infecção, a sepse e a falência múltipla de órgãos.(32)

As dietas ricas em ácido graxo ômega-3, arginina e glutamina têm mostrado uma redução significativa nas complicações sépticas e fa-lência múltipla de órgãos em pacientes que têm lesão intra-abdominal moderada a grave.(37)

O cuidado ao optar-se pela nutrição enteral é posicionar a sonda nasoenteral, ainda que por via endoscópica, a cerca de 20 a 30 cm do ângulo de Treitz(32) (fig. 8).

Em algumas situações, como íleo paralítico grave, não aceitação da dieta enteral, e outras, pode-se necessitar do uso da nutrição parenteral total, embora de maior custo, com risco de hiperglicemias extremas e de infecção no cateter.

Ambas necessitam de um grupo de nutrição enteral/parenteral de excelência.

AntibioticoterapiaEm razão da alta frequência da infecção bacteriana em pacientes

com pancreatite aguda necrosante e sua clara correlação com eleva-da morbiletalidade, este assunto tem provocado inúmeras reuniões

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PAnCREATITE AGuDA - TERAPêuTICA CLínICA

Figura 8. Sonda nasoenteral.

e trabalhos científicos, buscando-se a conduta antimicrobiana mais adequada.(38)

Na pancreatite aguda leve, sem necrose, não há nenhum motivo para o uso de antimicrobianos, muito menos profilático.

O principal substrato para infecção pancreática e/ou peripancreática é a presença de necrose e sua extensão.(39)

Em pacientes com menos de 50% de tecido necrótico, 23% apresen-tarão infecção, ao passo que pacientes com mais de 50% de área de necrose podem atingir até 84%.(39)

O risco de infecção aumenta também com a duração da doença, podendo atingir até 70% por volta da terceira semana(40) (fig. 9).

Os pacientes com uma agressão aguda do tipo necrótica têm dimi-nuição significativa das defesas imunes, o que os torna mais vulneráveis a infecção local e sistêmica.(41)

Os patógenos podem então atingir o tecido necrótico por via he-matogênica, linfática ou por translocação bacteriana através do trato gastrointestinal.(38,41)

O trato gastrointestinal, inflamado e parético, é a mais importante fonte dos patógenos envolvidos na infecção da PA,(39,41,42) o que pode ser confirmado pela identificação dos bacilos Gram-negativos entéricos em 50% a 70% das culturas do tecido necrótico infectado(41) (tabela 3).

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Dr. José Galvão-Alves

Tabela 3. Micro-organismos identificados na necrose infectada

Patógeno %

Gram-negativos 50 a 70

Cocos Gram-positivos 20 a 40

Anaeróbios < 10

Fungos 10 a 40

Por último, sabendo-se que a necrose e sua extensão são impor-tantes fatores de risco para infecção local na PA e que os patógenos na infecção primária, em sua maioria, são bacilos Gram-negativos entéricos, cabe-nos avaliar quais os antimicrobianos mais adequados a esta situação.

Imipeném-cilastina foi o primeiro agente antimicrobiano que se mostrou efetivo em reduzir as complicações infecciosas neste grupo de pacientes.(43) Este antimicrobiano de amplo espectro concentrava-se adequadamente no tecido pancreático e peripancreático.(43)

O segundo grupo de escolha para infecção bacteriana na PA é

Figura 9. Infecção e duração da pancreatite aguda.

Infecção x Tempo

24%

36%

71%

< 7 > 7 < 14 > 14 < 21

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PAnCREATITE AGuDA - TERAPêuTICA CLínICA

a quinolona, em especial a ciprofloxacina, que associada ao me-tronidazol tem se tornado uma opção ao imipeném quando não disponível.

Inúmeros trabalhos(38) têm avaliado o uso adequado dos antimicrobia-nos profiláticos na pancreatite necrosante; no entanto, não há consenso na literatura sobre o mesmo.(38,42)

Quanto à infecção fúngica, especificamente a relacionada com Can-dida albicans, parece ser de ocorrência secundária, posterior ao uso de antimicrobianos profiláticos.(44)

Sabedores pois que a Pancreatite Aguda Necrosante tem um alto índice de infecção, que as bactérias envolvidas são sensíveis a anti-microbianos de amplo espectro, como carbapenéns e a associação de ciprofloxacina e metronidazol e que estes concentram-se de forma eficaz no pâncreas inflamado, natural pensar em utilizá-los precocemente na Pancreatite Aguda Grave e com isto diminuir o risco de infecção, sepse e mortalidade. Artigos de Beger e cols.(42) na década de 1980 e de Pedarzoli(43) na década de 1990 pareciam indicar que o uso “profilático” de antimicrobianos na Pancreatite Aguda Necrosante diminuiria a sepse e suas complicações. Seguiram-se outros(45,46) indicando que o uso nas primeiras 72 horas poderia diminuir morbiletalidade.

Com base nestas informações universalizou-se o uso precoce de antimicrobianos com o objetivo de evitar a infecção da necrose pancreática.

Em sequência, dois grandes estudos, multicêntricos, randomi-zados, duplos-cegos têm mudado nossa opinião quanto ao uso de antimicrobianos na necrose pancreática estéril. Isenmann e colaboradores(47) publicaram em 2004 no Gastroenterology estudo baseado em evidências mostrando que o uso de ciprofloxacino e metronidazol não previne infecção e suas complicações na Pan-creatite Aguda Grave.

Em seguida, Dellinger e cols.,(48) em estudo multicêntrico, envolvendo 32 centros nos EUA e Europa compararam o uso de meropenem e place-bo no 5º dia após admissão com Pancreatite Aguda Grave e a medicação foi administrada continuamente por 7 a 21 dias. Este importante estudo não demonstrou diferença entre o grupo que usou antimicrobiano e o placebo quanto a infecção pancreática e peripancreática, intervenção cirúrgica e mortalidade.

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Baseado nestes estudos o uso de antimicrobiano fica restrito à presença de sepse biliar ou infecção pancreática e peripancreática confirmada.

Para tanto, em casos que desconfiamos da possível presença de infecção bacteriana, optamos por rastreá-la cuidadosamente com culturas de sangue, urina e se disponível, de tecido ou secreção da área de necrose coletada através da punção com agulha fina guiada por TC (fig. 3).

Necrose infectadaAproximadamente 30-40% dos pacientes com Pancreatite Necrosante

desenvolvem infecção da necrose. O método ideal de diagnosticá-la é a punção guiada por agulha à tomografia computadorizada com uma sensibilidade de 95% apenas ao Gram. Na ausência de infecção, a ne-crose é tratada conservadoramente.

Já na necrose infectada deve-se iniciar imediatamente antimicrobia-nos que atinjam alta concentração pancreática, como os carbapenéns (imipeném e meropeném), quinolonas com metronidazol com altas doses de cefalosporinas.

Caso o paciente apresente uma alta suspeita de infecção e não seja disponível a punção por TC, fato comum em nosso meio, antibióticos devem ser iniciados. Aqui não estamos falando de prevenção, mas sim de terapêutica da infecção.

Já a drenagem cirúrgica, endoscópica ou radiológica deve ser realiza-da no momento adequado de acordo com a condição de cada paciente.

No passado, o diagnóstico de infecção na necrose pan-creática era indicação de intervenção cirúrgica imediata; no entanto, isto tem se modificado. Em resumo, a conduta atual mais adequada seria melhor estabilizar o paciente, já em uso de antimicrobianos e permite uma maior e melhor organização da necrose infectada.(49)

Após uma revisão de 11 estudos, com 1.136 pacientes, os autores concluíram haver uma significativa relação entre o momento cirúrgico e mortalidade.(49)

O consenso atual é que o manejo inicial da necrose infectada, em pacientes clinicamente estáveis, deve observar um curso de 2 a 4 se-manas de antimicrobianos antes da abordagem cirúrgica.

Nos casos mais graves, a conduta deve ser selecionada “caso a caso”.

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PAnCREATITE AGuDA - TERAPêuTICA CLínICA

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A Gastroenterologia na Prática Clínica • 245

Dra. raquel Canzi almada de souza

Capítulo 20

COMO TRATAR PAnCREATOPATIAS – REPOSIçãO EnzIMáTICA

Dra. raquel Canzi almada de souza

O PÂNCREAS PARTICIPA DIRETAMENTE DA MANUTENÇÃO do estado nutricional do organismo. Esta glândula secreta, dentro da luz duodenal, um suco rico em enzimas digestivas como lipase, proteases e amilase, permitindo com isso a quebra dos macronutrientes em partículas menores, capazes de serem então absorvidas pelos enterócitos. A tabela 1 relaciona algumas enzimas pancreáticas e seu mecanismo de ação.

Na ausência ou na redução da produção e secreção dessas enzimas, tipicamente ocorrerá a má digestão e disabsorção dos nutrientes, em especial das gorduras, associada a deficiências de ácidos graxos es-senciais e vitaminas lipossolúveis, com sintomas variáveis de acordo com o grau de insuficiência, desde desnutrição subclínica até franca esteatorreia e caquexia.(1,2) A absorção das proteínas também pode ser afetada com hipoalbuminemia. Como definição, qualquer situação em que a quantidade de enzimas pancreáticas secretadas no duodeno seja insuficiente para manter o processo digestivo normal é considerada insuficiência exócrina pancreática (IEP). Um resumo das manifestações clínicas da IEP é apontado na tabela 2.

O tratamento convencional da IEP, independente da etiologia, é a terapia de reposição de enzimas pancreáticas (REP) por via oral.(3,4) Fibro-se cística, pancreatite crônica, obstrução maligna do ducto pancreático, ressecções da glândula pancreática, são alguns exemplos de situações que rotineiramente requerem a REP. O diabetes mellitus também pode evoluir com progressiva atrofia pancreática e IEP.(2)

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COMO TRATAR PAnCREATOPATIAS - REPOSIçãO EnzIMáTICA

Tabela 1. Principais enzimas pancreáticas e seus mecanismos de ação

Enzimas pancreáticas Principal mecanismo de ação

Lipase Age na micela, sendo capaz de fazer a hidrólise da gordura em ácidos graxos e monoglicerídeos

Colesterol-esterase Causa a hidrólise dos ésteres de colesterol

Fosfolipase Cliva os ácidos graxos em fosfolipídios

Tripsinogênio Quimotripsinogênio Desdobram proteínas integrais e parcialmente degeneradas em peptídeos de vários tamanhos

Carboxipeptidases Clivam alguns peptídeos em aminoácidos isolados

Amilase pancreática (a) Faz a hidrólise do amido, do glicogênio e da maioria dos outros carboidratos (com exceção da celulose), formando dissacarídeos e trissacarídeos

Tripsina (tripsinogênio ativado) É capaz de desencadear uma gama de reações que ativam todas as enzimas proteolíticas

Tabela 2. Manifestações da insuficiência exócrina do pâncreas

Deficiência Apresentação clínica

Lipase Diarreia, esteatorreia, emagrecimento, flatulência, desnutrição, hipoproteinemia, edema

Proteases Diarreia, azotorreia, emagrecimento, desnutrição, hipoproteinemia, edema

Amilase Flatulência, diarreia

Vitamina A* Cegueira noturna

Vitamina D* Osteomalacia, hipocalcemia, osteoporose

Vitamina E* Neuropatia, ataxia cerebelar, anemia hemolítica

Vitamina K* Coagulopatia

Vitamina B12* Anemia megaloblástica, glossite, neuropatia

*deficiências com manifestações clínicas raras, dependentes das reservas do organismo.

A REP deve sempre que possível mimetizar a secreção pós-prandial fisiológica das enzimas pancreáticas, tanto em qualidade como em quantidade. Apesar de não se alcançar a quantidade fisiológica de lipa-se secretada (360.000 UI) por nenhum dos produtos comercializados, com a introdução dos tratamentos atualmente disponíveis observa-se uma excelente resposta, com melhora da digestão e absorção da gor-dura ingerida. Como alguma quantidade de secreção de lipase endó-gena é preservada na PC e em outras situações da IEP, doses iniciais

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Dra. raquel Canzi almada de souza

de enzimas com 25.000 a 40.000 unidades de lipase por refeição são recomendadas para a grande maioria dos pacientes com ajuste de dose baseado na necessidade clínica individual (intensidade dos sin-tomas, grau de esteatorreia e quantidade de gordura na dieta).(3) Não se deve ultrapassar a dose de 10.000 unidades de lipase/kg dia.(2) O ajuste da dose deve ser feito sempre após alguns dias de observação, ao menos duas semanas. Em pacientes com dificuldade de deglutição ou que não tolerem engolir um maior número de cápsulas, é possível abrir as mesmas e misturar as microesferas de enzimas em alimento acidificado, por exemplo, suco de maçã, tendo-se o cuidado de não mastigar as microesferas. A correção das eventuais deficiências de vitaminas lipossolúveis (A, D, E, K) e/ou vitamina B12 deve ocorrer de forma simultânea à reposição de enzimas.

Alguns pacientes podem não responder adequadamente à terapia com enzimas pancreáticas, sendo necessária uma apropriada avalia-ção para identificar a causa da falta de resposta terapêutica. A figura 1 resume a terapia de REP. Vários fatores podem estar associados à falha de resposta terapêutica, entre eles falta de adesão ao tratamento pelo paciente, doses subótimas das enzimas, deficiência na secreção pancreática de bicarbonato, composição alterada dos sais biliares, anormalidades no transporte pelos enterócitos, alteração na motili-dade intestinal, supercrescimento bacteriano e falha na absorção de ácidos graxos de cadeia longa. Outros fatores como dieta com alta concentração de fibras e uso de antiácidos contendo cálcio e mag-nésio podem aumentar a esteatorreia.(5) Também fatores associados na preparação das enzimas podem interferir, como tamanho das partículas das enzimas, características de dissolução da preparação, taxa de esvaziamento gástrico, momento de tomada das enzimas em relação à ingesta de alimentos. A recomendação atual é utilização de enzimas administradas como minimicroesferas acido-resistentes, com cobertura para liberação entérica. A administração deve ser feita durante as refeições.(6)

Naqueles pacientes que aderiram adequadamente à administração das enzimas e não tenham resposta satisfatória, a dose de enzimas pode ser aumentada (dobrada).(7) É importante lembrar que é fre-quente a diminuição da secreção de bicarbonato pancreático, nos pacientes com IEP, determinando um nível muito baixo de pH duo-denal. Isto atrapalha a dissolução adequada das enzimas que têm

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COMO TRATAR PAnCREATOPATIAS - REPOSIçãO EnzIMáTICA

Figura 1. Esquema de terapia de reposição de enzimas pancreáticas.

*Inibidores de bomba de prótons. ** Antagonista dos receptores de histamina 2

Investigar outras causas para esteorreia e/ou diarreia (giardíase,

doença celíaca, etc...) doenças hepáticas

Investigar/tratar supercrescimentobacteriano

Acrescentar IBP* ou ant. H2**

Aumentar dose de enzimas pancreáticas

Terapia com reposição de enzimas pancreáticas (25.000 e 40.000 UI)

lipase/refeição

INSUFICIêNCIA ExóCRINA PANCREáTICA

Boa resposta

ManterDieta com triglicerídeos

de cadeia-média

Investigação negativa

Resposta inadequada

Resposta inadequada

Resposta inadequada

Resposta inadequada

cobertura para liberação entérica, e reduz a precipitação dos sais biliares. Então, naqueles pacientes em que a má digestão de nutrien-tes persiste, deve-se adicionar um antagonista de receptor H2 ou um inibidor de bomba de prótons.(8,9) Na persistência dos sintomas,

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Dra. raquel Canzi almada de souza

outras condições sobrepostas a IEP, como giardíase, doença celíaca, supercrescimento bacteriano e síndrome da alça cega após cirurgia intestinal devem ser avaliadas. Também a persistência de abuso de álcool em pacientes com PC de origem alcóolica pode ser a respon-sável pela perda de peso e diarreia. Testes que medem a função exócrina do pâncreas como a elastase-1 fecal ou testes respiratórios com triglicerídeos com 13C marcado podem ajudar confirmando ou não a resposta à REP.(10) A introdução de dieta com triglicerídeos de cadeia média está indicada nos casos refratários.

Os efeitos colaterais associados à terapia de REP são pouco frequentes, lembrando que as enzimas atuam dentro do lúmen in-testinal, ou seja, a terapia é intraluminal e não sistêmica. Entre os efeitos indesejáveis mais frequentes estão a dor abdominal (9%). Cefaleia, vertigens, flatulência e constipação também são descritos.(2)

Situações mais raras incluem alergia associada à proteína suína, hipe-ruricemia, deficiência de ácido fólico e irritação da mucosa oral.(2,3)

Porém a mais grave complicação associada à REP é a colopatia fibrosante descrita em crianças com fibrose cística, em geral usan-do doses muito altas de enzimas, em que se descobriu deposição de colágeno na submucosa do cólon e/ou íleo-terminal, causando fibrose e estenoses colônicas.

COnCLuSãO

A reposição de enzimas pancreáticas por via oral é o tratamento padrão para a má digestão associada à IEP. O tratamento em geral é bem tolerado, sendo a avaliação clínica (melhora da esteatorreia, ganho de peso) suficiente para monitorar a resposta terapêutica. Em adultos, a dose inicial de enzimas é 25.000 unidades de lipase por refeição principal. O ajuste da dose deve ser individualizado de acordo com a resposta clínica. As enzimas devem ser toma-das durante as refeições, para assegurar adequado contado com os nutrientes. Terapia adjunta com agentes inibidores da acidez gástrica pode ser útil nos pacientes que não melhoram com o progressivo aumento da dose de enzimas. Outras condições so-brepostas à IEP devem ser consideradas, como supercrescimento bacteriano, giardíase e doença celíaca na persistência da não resposta ao tratamento.

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COMO TRATAR PAnCREATOPATIAS - REPOSIçãO EnzIMáTICA

REFERênCIAS

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Dra. Dulce reis Guarita • Dr. Guilherme Eduardo Gonçalves Felga • Dr. Carlos de Barros Mott

Capítulo 21

TRATAMEnTO DA DOR nA PAnCREATITE CRônICA

Dra. Dulce Reis Guarita

Dr. Guilherme Eduardo Gonçalves Felga Dr. Carlos de Barros Mott

A GRANDE MAIORIA DOS CASOS DE PANCREATITE CRÔNICA, em nosso meio, tem etiologia alcoólica e seu tratamento deve ser ini-cialmente clínico, visando à correção da sintomatologia; no entanto, mesmo quando bem orientado, pode ser ineficaz, em razão do caráter progressivo da doença.(1)

A manutenção da ingestão alcoólica triplica a mortalidade e a incapacidade para o trabalho, sendo a suspensão do álcool impres-cindível; para tanto, o paciente necessita conhecer os benefícios da interrupção do hábito e, se necessário, ser encaminhado para grupos de apoio ou para equipes multidisciplinares que possam auxiliá-lo. Apesar da abstinência alcoólica permitir evolução menos conturbada da doença, ela não impede que as lesões histológicas progridam. O tabagismo acelera a evolução da pancreatite crônica e facilita o aparecimento do câncer de pâncreas e também deve ser evitado.

Fora das crises dolorosas, nos períodos assintomáticos da doença, preconiza-se dieta pobre em lipídios, os quais devem constituir 20 a 25% de teor calórico total; mesmo sabendo-se que as proteínas estimu-lam a secreção pancreática e podem desencadear dor, é aconselhável

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TRATAMEnTO DA DOR nA PAnCREATITE CRônICA

a prescrição de dieta hiperproteica, pois os pacientes estão, muitas vezes, desnutridos.

A dor na pancreatite crônica pode ser em surtos (tipo A) ou contínua (tipo B), deve ser avaliada por escala visual analógica (EVA) e ser tratada com a menor dose possível de medicação que a alivie.(2)

O ponto mais importante para que seja corretamente abordada é a evidência de alterações em todos os níveis do sistema nervoso, central e periférico, naqueles pacientes portadores de pancreatite crônica com dor, estando as alterações neuronais bem demonstradas, bem como os receptores PAR-2 e TRPV1 para a dor; as modificações neuronais obser-vadas só ocorrem em portadores de pancreatite crônica e de carcinoma de pâncreas.(3-6)

Face a existência deste comprometimento, que vai além da glân-dula pancreática, pacientes submetidos a derivações ou, mesmo, a ressecções pancreáticas, podem ter dor, há má resposta a bloqueios celíacos, há alterações eletroencefalográficas e os doentes podem responder à pregabalina.(7)

Nas crises de agudização (crises dolorosas), os cuidados terapêuticos assemelham-se, em linhas gerais, aos utilizados para as pancreatites agudas.

Como o substrato anatomopatológico das crises de agudização é, quase sempre, representado por edema, a mortalidade durante as mesmas é praticamente nula. A simples restrição da alimentação, por um ou dois dias, ou mesmo a manutenção da dieta à base de hidra-tos de carbono, associada à administração de analgésicos injetáveis, é suficiente para o retorno às condições normais em curto espaço de tempo. Somente se justifica a passagem de sonda nasogástrica quando as crises são muito intensas e, sobretudo, quando acompanhadas de vômitos repetidos.

Um dos aspectos importantes no tratamento das pancreatites crô-nicas agudizadas é a analgesia.(8) Tradicionalmente, a meperidina foi preferida em relação à morfina por um teórico risco de que esta aumentasse a pressão do esfíncter de Oddi; no entanto, não há evi-dências clínicas de que a morfina cause ou agrave as pancreatites ou as colecistites. O cloridrato de tramadol (50 a 100 mg até de seis em seis horas, em injeção intravenosa lenta) ou o cloridrato de bu-prenorfina (0,3 mg, por via intramuscular, até de seis em seis horas) são opções para estes pacientes, aliando boa potência analgésica a

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poucos efeitos adversos. Deve ser prescrito um esquema analgésico com horários fixos, respeitando a meia-vida da droga utilizada, mas mantendo doses de resgate conforme a necessidade individual. Se houver persistência da manifestação dolorosa após uma semana, apesar dos cuidados médicos, complicações podem ter se instalado, dentre as quais se destacam a necrose pancreática e os pseudocistos. O cloridrato de tramadol tem efeitos semelhantes aos da morfina, com menos efeitos colaterais.

A pregabalina por via oral, na dose de 75 a 300 mg/dia(6) pode me-lhorar a dor e, se necessário, os tricíclicos podem ser associados.

Os antioxidantes, como selênio, ácido ascórbico, alfatocoferol, be-tacaroteno e metionina(9) necessitam ter sua eficácia comprovada com mais estudos controlados.

Embora esta seja uma verdadeira celeuma na literatura,(10) a reposição enzimática regular leva, em nossa opinião, à redução da frequência e da intensidade das crises dolorosas por um mecanismo de feedback negativo na regulação da secreção pancreática. Desta forma, para os pacientes com crises dolorosas recorrentes, deve ser utilizado um esque-ma de reposição enzimática semelhante ao utilizado para os pacientes com insuficiência exócrina declarada.

Até o presente momento, não há justificativas para o uso de octreotida e outras propostas (estimulação magnética transcraniana, acupuntura, ervas medicinais, homeopatia) não têm comprovação científica, não podendo ser esquecido que placebos podem atuar em 20% a 30% dos pacientes por determinado período de tempo.(7)

TRATAMEnTO CIRúRGICO

Cerca de 20% dos pacientes portadores de pancreatite crônica são tratados cirurgicamente, especialmente quando houver persistência das manifestações dolorosas, impossibilitando o exercício das atividades normais, mesmo após abstinência do álcool e cuidados terapêuticos adequados, ou quando surgem complicações durante a evolução da doença, tais como pseudocistos pancreáticos complicados, ascite, der-rame pleural, necrose infectada, abscessos, fístulas pancreáticas, he-morragia digestiva de repetição ou incoercível e icterícia persistente.(11)

As principais indicações cirúrgicas nos portadores da pancreatite crônica em nosso grupo se encontram na tabela 1.

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TRATAMEnTO DA DOR nA PAnCREATITE CRônICA

Tabela 1. Indicações de tratamento cirúrgico em portadores de pancreatite crônica calcificante acompanhados pelo Grupo de Pâncreas (Clínico e Cirúrgico) do Hospital das

Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo(11)

Indicação n %Dor persistente 110 54Pseudocisto 20 9Ascite 19 8,6Icterícia 16 7,2Abscesso 13 5,9Derrame pleural 8 3,6Hemorragia digestiva 3 1,3Fístula 2 0,9Associação de fatores 2 0,9Total 193 100

O tratamento cirúrgico deve buscar controlar a dor, corrigir a obstrução canalicular, fazer ressecções econômicas do parênqui-ma glandular, retornar as enzimas ao tubo digestivo e corrigir as alterações de órgãos e estruturas vizinhas. De modo geral, as in-tervenções cirúrgicas podem ser divididas em dois grandes grupos, as derivações e as ressecções, sendo preferíveis as primeiras em relação às últimas, por permitirem maior preservação do parênqui-ma pancreático.

Em revisão recente (Cochrane Database),(12) tanto na pancreatite crônica com dilatação ductal, quanto nas fases iniciais da afecção, o procedimento cirúrgico foi superior ao endoscópico, tanto para o con-trole da dor, quanto para melhorar a função pancreática.

TRATAMEnTO EnDOSCóPICO

Nos últimos anos, vários procedimentos endoscópicos têm sido propostos no tratamento das pancreatites crônicas, sobretudo quando seus portadores desenvolvem crises dolorosas recidivantes, colestase, pseudocistos e derrames cavitários. Os procedimentos preconizados para este fim incluem esfincterotomia pancreática, isolada ou asso-ciada à retirada de cálculos localizados na cabeça do pâncreas, sendo a litotripsia cada vez mais utilizada, colocação de endopróteses no

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ducto pancreático principal ou na via biliar, drenagem de cistos de retenção e/ou pseudocistos e alcoolização de plexo celíaco, guiada por ecoendoscopia.

A endoterapia, para alguns autores ineficaz sem litotripsia extracor-pórea, poderia ser uma “ponte” capaz de postergar a indicação cirúrgica e, para tanto, deveria ser utilizada mais precocemente em pacientes com dor persistente.(2,7)

Assim, a endoterapia utilizada em portadores de estenoses deixa 100% dos pacientes sem dor logo após o procedimento, 50% sem dor após cinco anos e 30% vão para cirurgia mais tarde. Já a endoscopia em litíase tem como resultados a necessidade de fragmentação em 75% dos casos, 90% dos pacientes ficam sem dor logo após o pro-cedimento, 50% sem dor após cinco anos e 30% vão para cirurgia posteriormente.(2,7,9,13,14)

A infiltração do plexo celíaco com corticosteroides não é procedi-mento isento de complicações, como abscessos, diarreia, paraplegia, aumento da dor, hipotensão ortostática, e deve ser proposta com cautela e para casos específicos.(7)

REFERênCIAS

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TRATAMEnTO DA DOR nA PAnCREATITE CRônICA

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USO ADULTOApresentações e composição: Comprimido revestido de 50 mg em embalagens com 30 unidades. Comprimido revestido de 100 mg em embalagens com 10, 30 e 60 unidades. Indicações: Tratamento sintomático da dor ou desconforto abdominal, dos distúrbios da freqüência ou consistência das evacuações (constipação ou diarréia) e da distensão abdominal, decorrentes dos transtornos funcionais do intestino (SII). Tratamento sintomático das dores decorrentes dos transtornos funcionais das vias biliares. Preparação de enemas opacos. Contra indicações: hipersensibilidade conhecida aos componentes da fórmula. Precauções e advertências: É desaconselhável a utilização do brometo de pinavério durante a gravidez. Além disso, deve-se observar a presença de bromo, cuja administração no final da gravidez pode causar alterações neurológicas no recém-nascido (hipotonia, sedação). Em função da falta de estudos, recomenda-se não utilizar o brometo de pinavério durante a lactação. Interações medicamentosas: os estudos realizados não demonstraram interações medicamentosas com nenhum dos seguintes tratamentos concomitantemente prescritos: hipoglicemiantes orais, anticoagulantes e digitálicos. Reações adversas: foram relatados, raramente, alguns casos de alterações digestivas leves e casos isolados de reações cutâneas, algumas do tipo alérgico. Raramente pode haver agravamento da constipação e epigastralgia. Em casos de erupção cutânea, é conveniente interromper a administração do medicamento. Posologia: recomenda-se a administração de 1 comprimido de 50 mg, 3 ou 4 vezes ao dia, ou 1 comprimido de 100 mg, 2 vezes ao dia (manhã e noite). Excepcionalmente, a posologia pode ser aumentada para 6 comprimidos de 50 mg ou 3 comprimidos de 100 mg ao dia. Os comprimidos devem ser deglutidos inteiros, sem mastigar, com um pouco de água, imediatamente antes ou durante as refeições. Na preparação de enemas opacos, a posologia é de 2 comprimidos diários de 100 mg ou 4 comprimidos diários de 50 mg, nos 3 dias anteriores ao exame. MS - Registro MS – 1.0639.0254. SICO_NSPC_1209

Contraindicações: hipersensibilidade conhecida aos componentes da fórmula. Interações medicamentosas: os estudos realizados não demonstraram interações medicamentosas com nenhum dos seguintes tratamentos concomitantemente prescritos: hipoglicemiantes orais, anticoagulantes e digitálicos.Referências bibliográficas: 1) Guslandi M. Profilo farmacologico clinico del pinaverio bromuro. Minerva Med. 1994;85:179-85. 2) Poynard T, Regimbeau C, Benhamou Y. Meta-analysis of smooth muscle relaxants in the treatment of irritable bowel syndrome. Aliment Pharmacol Ther. 2001;15(3):355-61. 3) Siilif*®[Bula]. São Paulo: Nycomed Pharma. 4) Cloarec D et al. Efficacite du Dicetel 100 mg au coursdes troubles fonctionnels intestinaux: résultats d’une étude réalisée em pratique gastroentérologique. Rev Fr Gastroenterol. 1997;33(324-325):1107-35. 5) Corazziari E et al. Consensus report: clinical trial guidelines for pharmacological treatment of irritable bowel syndrome. Aliment Pharmacol Ther. 2003;18(6):569-80. 6) Cloarec D et al. Efficacité du pinaverium: 100mg, deux foius par jour, dans le traitement sumptomatique du syndrome de l’intestin irritable. Ann Gastroenterol Hepatol. 1997;33(4):181-4. 7) Awad R, Dibildox M, Ortiz F. Irritable bowel syndrome treatment using pinaverium bromide as a calcium channel blocker. Acta Gastroenterol Latinoam. 1995;25(3):137-44. Material destinado exclusivamente a profissionais habilitados a prescrever e/ou dispensar medicamentos. Setembro/2012

O alívio da dor abdominal1,2,3

DOR4,5

O principal sintoma da Sii:

dos casos.692%O brometo de pinavério diminui a dor em até

O brometo de

pinavério diminuiua duração da dor

de várias horas para

alguns minutos.7

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USO ORAL USO ADULTO ACIMA DE 18 ANOS Apresentações e composição: Comprimidos gastrorresistentes de 40 mg. Embalagens com 2, 30 ou 60 comprimidos. Indicações: TECTA® 40 mg está indicado para o tratamento das esofagites de refluxo moderada ou grave e dos sintomas de refluxo gastroesofágico. Também é indicado para tratamento intermitente de sintomas de acordo com a necessidade (on demand). Contraindicações: TECTA® não deve ser usado em casos de hipersensibilidade conhecida ao pantoprazol ou aos demais componentes da fórmula. TECTA®, assim como outros IBPs, não deve ser coadministrado com atazanavir/nelfinazir (vide Advertências e Precauções/Interações Medicamentosas). TECTA® não deve ser administrado em terapia combinada para erradicação do Helicobacter pylori a pacientes com disfunção hepática ou renal moderada a grave, uma vez que não existe experiência clínica sobre a eficácia e a segurança da terapia combinada nesses pacientes. Este medicamento é contraindicado na faixa etária de 0 a 18 anos. Categoria B de risco na gravidez: Este medicamento não deve ser utilizado por mulheres grávidas sem orientação médica ou do cirurgião-dentista. Advertências e Precauções: Quando prescrito dentro de uma terapia combinada, as instruções de uso de cada uma dos fármacos devem ser seguidas. Na presença de qualquer sintoma de alarme (como significante perda de peso não intencional, vômitos recorrentes, disfagia, hematêmese, anemia ou melena) e quando houver suspeita ou presença de úlcera gástrica, deve ser excluída a possibilidade de malignidade, já que o tratamento com pantoprazol pode aliviar os sintomas e retardar o diagnóstico. Casos os sintomas persistam apesar de tratamento adequado, investigações adicionais devem ser consideradas. Gravidez e lactação: Categoria B de risco na gravidez. Este medicamento não deve ser utilizado por mulheres grávidas sem orientação médica ou do cirurgião-dentista. TECTA® não deve ser administrado em gestantes e lactantes, a menos que absolutamente necessário, uma vez que a experiência clínica sobre seu uso em mulheres nestas condições é limitada. Estudos de reprodução em animais demonstraram uma fetotoxicidade leve com doses acima de 5 mg/kg. Os dados disponíveis sobre o uso de pantoprazol em lactantes são limitados. A excreção do pantoprazol no leite humano foi detectada em caso isolado após uma única dose oral de 40 mg. A relevância clínica desta descoberta não é conhecida. TECTA® só deve ser utilizado durante a gravidez e a lactação quando o benefício para a mãe for considerado maior que o risco potencial ao feto ou à criança. Pacientes idosos: Não é necessária nenhuma adaptação posológica para pacientes idosos. TECTA® pode ser utilizado por pessoas com mais de 65 anos. Em voluntários idosos, a ASC e a Cmax (concentração máxima) aumentam discretamente, quando comparadas às de indivíduos jovens; porém, estes aumentos não são clinicamente significativos. Não se recomenda nenhum ajuste posológico baseado na idade. A dose diária em pacientes idosos, via de regra, não deve ultrapassar os regimes posológicos recomendados. Pacientes pediátricos: A segurança e eficácia do emprego de TECTA® não foram estabelecidas em menores de 18 anos, portanto o seu uso não está indicado para pessoas menores de 18 anos. Insuficiência renal: para paciente com disfunção renal leve a moderada não é necessário ajuste posológico; a dose diária não deve ultrapassar os regimes posológicos recomendados. Nos casos de insuficiência renal grave o paciente deve ser cuidadosamente monitorado. Em pacientes com função renal reduzida (p. ex., pacientes em diálise), nenhum ajuste de dose é necessário. Assim como para indivíduos sadios, a meia-vida do pantoprazol é curta. Somente pequenas quantidades de pantoprazol são dialisáveis. Embora a meia-vida do principal metabólito tenha sido moderadamente aumentada para 2-3 h, a excreção é ainda rápida e, portanto não ocorre acúmulo. Insuficiência hepática: não é recomendado ajuste posológico para paciente com disfunção hepática leve a moderada. Em caso de redução intensa da função hepática a dose deve ser ajustada para 1 comprimido de 40 mg a cada dois dias. Em pacientes com insuficiência hepática grave, devem ser regularmente monitoradas as enzimas hepáticas durante o tratamento com TECTA®; se houver aumento nos valores enzimáticos, o tratamento deve ser descontinuado. A meia-vida aumentou para 7 e 9 horas, a ASC aumentou em um fator de 5 a 7 e a Cmax aumentou em um fator de 1,5 em pacientes com cirrose hepática em comparação com indivíduos sadios após a administração de 40 mg de pantoprazol sódico. Efeitos na capacidade de dirigir e operar máquinas: Reações adversas como tontura e distúrbios visuais podem ocorrer. Se afetado, o paciente não deve dirigir nem operar máquinas. Interações medicamentosas: O conteúdo de magnésico em um comprimido de TECTA® não é clinicamente significante (1,268 g a cada comprimido de 40 mg). Assim, não são esperadas diferenças nas interações medicamentosas entre o pantoprazol magnésico e o pantoprazol sódico. Como os demais membros de sua classe, TECTA® pode alterar a absorção de medicamentos cuja biodisponibilidade seja dependente do pH do suco gástrico, como o cetoconazol e itraconazol. Isso se aplica também a medicamentos ingeridos pouco tempo antes de TECTA®. Assim como outros medicamentos da mesma classe, não deve ser coadministrado com atazanavir/nelfinazir, pois a absorção desses antirretovirais é pH dependente, podendo ocorrer uma redução substancial na biodisponibilidade dos mesmos (ver ContraIndicações). Pantoprazol é extensivamente metabolizado no fígado. Inicialmente sofre desmetilação e oxidação a sulfonas pelas subenzimas CYP2C19 e CYP3A4 do citocromo P 450 (Fase I do metabolismo). Como conseqüência da baixa afinidade do pantoprazol e de seus metabólitos, o hidroxipantoprazol e o hidroxipantoprazol sulfona pelas enzimas do citocromo P 450, seu potencial de interação na Fase I é limitado, o que permite que o fármaco saia rapidamente do retículo endoplasmático e seja transferido subsequentemente para o citoplasma para ser conjugado com sulfato, na Fase II do metabolismo. Esta baixa afinidade resulta em predominância do metabolismo no sistema de conjugação (Fase II) que, ao contrário do sistema P 450, não é saturável e consequentemente não-interativa. Esta etapa independe do sistema enzimático citocromo P 450. A interação entre pantoprazol e outras substâncias metabolizadas na Fase I do metabolismo não pode, em princípio, ser excluída. Nos estudos sobre interações medicamentosas conduzidos até o momento, onde foram analisados os substratos de todas as famílias do citocromo P450 envolvidas no metabolismo de fármacos no homem, verificou-se que pantoprazol não afeta a farmacocinética ou a farmacodinâmica da carbamazepina, cafeína, diazepam, diclofenaco, digoxina, etanol, glibenclamida, metoprolol, naproxeno, nifedipina, fenitoína, piroxicam, teofilina, e contraceptivos orais. TECTA® não aumenta a excreção urinária dos marcadores de indução, ácido D-glucarídico e 6 ß-hidroxicortisol. Da mesma forma, os fármacos investigados não influenciaram a farmacocinética do pantoprazol. Embora, em estudos clínicos farmacocinéticos não tenha sido observada nenhuma interação durante a administração concomitante à femprocumona ou à varfarina, foram observados no período de pós-comercialização alguns casos isolados de alterações no INR (tempo de protrombina do paciente/média normal do tempo de protrombina) nessas situações. Consequentemente, em pacientes que estão sendo tratados com anticoagulantes cumarínicos, é recomendada a monitoração do tempo de protrombina/INR após o início, término ou durante o uso irregular de pantoprazol. Não existe interação na administração concomitante com antiácidos. De maneira geral, o tratamento diário com qualquer medicamento bloqueador de ácido por um longo tempo (p. ex., mais que três anos) pode levar a uma má absorção da cianocobalamina (vitamina B12). Estudos de interação farmacocinética em humanos, administrando-se pantoprazol simultaneamente aos antibióticos claritromicina, metronidazol e amoxicilina não demonstraram nenhuma interação clinicamente significativa. Ingestão com alimentos: O consumo de alimentos não interfere com as ações do TECTA® no organismo. Interferência em testes de laboratório: Em alguns poucos casos isolados, detectou-se alterações no tempo de coagulação durante o uso de pantoprazol. Desta forma, em pacientes tratados com anticoagulantes cumarínicos, recomenda-se a monitoração do tempo de coagulação após início, final ou durante o tratamento com pantoprazol. Reações adversas: O perfil de segurança do TECTA® não deve diferir do observado com o pantoprazol sódico, uma vez que ambos contêm o mesmo princípio ativo – o pantoprazol “livre” dissociado (ânion pantoprazol, íons Mg ou Na). Embora o pantoprazol (a substância ativa) seja muito bem tolerado, a maioria dos eventos adversos observados tem sido leve e transitória, não apresentando nenhuma relação consistente com o tratamento. Assim, podem ocorrer as seguintes reações adversas com o uso do produto: Reações incomuns (ocorrem entre 0,1% e 1% dos pacientes que utilizam este medicamento): Distúrbios do sono, cefaléia, diarréia, náusea/vômito, inchaço e distensão abdominal, dor e desconforto abdominal, constipação, aumento nos níveis de enzimas hepáticas (transaminases, γ-GT), vertigem, reações alérgicas como prurido, exantema, rash e erupções, astenia, fadiga e mal estar. Reações raras (ocorrem entre 0,01% e 0,1% dos pacientes que utilizam este medicamento): agranulocitose, hipersensibilidade (incluindo reações e choque anafiláctico), hiperlipidemias e aumento nos níveis de triglicerídios e colesterol, alterações de peso, depressão (e agravamento), distúrbios de paladar, distúrbios visuais (visão turva), aumento nos níveis de bilirrubina, urticária, angioedema, artralgia, mialgia, ginecomastia, elevação da temperatura corporal, edema periférico. Reações muito raras (ocorrem em menos de 0,01% dos pacientes que utilizam este medicamento): leucopenia, trombocitopenia, pancitopenia, desorientação (e agravamento). Reações de frequência desconhecida: hiponatremia; hipomagnesinemia; alucinação, confusão (especialmente em pacientes predispostos, bem como agravamento em pacientes cujos sintomas são pré-existentes), dano hepatocelular grave levando a icterícia com ou sem insuficiência hepática, nefrite intersticial, reações dermatológicas graves como síndrome de Stevens Johnson, eritema multiforme, síndrome de Lyell, fotossensibilidade. Atenção: este produto é um medicamento novo e, embora as pesquisas tenham indicado eficácia e segurança aceitáveis, mesmo que indicado e utilizado corretamente, podem ocorrer eventos adversos imprevisíveis ou desconhecidos. Nesse caso, notifique os eventos adversos pelo Sistema de Notificações em Vigilância Sanitária NOTIVISA, disponível em http://www8.anvisa.gov.br/notivisa/frmCadastro.asp, ou para a Vigilância Sanitária Estadual ou Municipal.Posologia e modo de usar: A posologia habitualmente recomendada é de 1 comprimido de 40 mg ao dia, antes, durante ou após o café da manhã, a menos que seja prescrito de outra maneira pelo seu médico. A duração do tratamento fica a critério médico e dependente da indicação. Na maioria dos pacientes, o alívio dos sintomas é rápido e um período de tratamento de 4 a 8 semanas é, em geral suficiente. TECTA® é para uso exclusivamente oral e os comprimidos devem ser ingeridos inteiros com um pouco de líquido. Na doença de refluxo gastroesofágico: Tratamento da esofagite de refluxo - 1 comprimido de 40 mg ao dia em um período de 4 semanas. Nos casos com esofagite não cicatrizada ou com sintomas persistentes é recomendado um período adicional de 4 semanas. Os sintomas recorrentes poderão ser controlados administrando-se 1 comprimido de TECTA® 40 mg ao dia, quando necessário (“on demand”), de acordo com a intensidade dos mesmos. A mudança para terapia contínua deve ser considerada nos casos em que os sintomas não puderem ser devidamente controlados sob terapia “on demand”. Em casos isolados de esofagite por refluxo, a dose diária pode ser aumentada para 2 comprimidos ao dia, particularmente nos casos de pacientes refratários a outros medicamentos antiulcerosos. MS – 1.0639.0256 MEDICAMENTO SOB PRESCRIÇÃO. TC40_1004_0212_VPS.

Contraindicação: Tecta® não deve ser usado em casos de hipersensibilidade conhecida ao pantoprazol ou aos demais componentes da fórmula. Interação medicamentosa: Tecta®, assim como outros medicamentos da mesma classe, não deve ser coadministrado com atazanavir/nelfinazir.

Apresentações:1

30 e 60 comprimidos Posologia na DRGE:1

1 comprimido de 40mg, 1x ao dia

pantoprazol magnésicodi-hidratado

40mg*

A PERSISTIREM OS SINTOMAS, O MÉDICO DEVERÁ SER CONSULTADO.

Material destinado exclusivamente a profissionais habilitados a prescrever e/ou dispensar medicamentos. 6077186 TE LIVRO PRE CONGRESSO 2012. OUTUBRO/2012.Referência bibliográfica: 1) Tecta® [Bula]. São Paulo: Nycomed Pharma.

Nycomed Pharma Ltda. Rua do Estilo Barroco, 721 - 04709-011 - São Paulo - SP. Mais informações poderão ser obtidas diretamente com o nosso Departamento Médico ou por meio de nossos representantes.*Marca depositada.

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