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8 | VESTIBULAR | SALVADOR, SEGUNDA-FEIRA, 7/5/2007 9 | VESTIBULAR | SALVADOR, SEGUNDA-FEIRA, 7/5/2007 CINEMA Relação entre linguagem audiovisual e educação é subaproveitada nos processos seletivos de instituições de ensino superior da Bahia. Explorar o cinema é urgente, dizem especialistas Novos filmes, velhas questões LUCIANO DA MATTA Para Juvêncio [18] e Gabriela [17], o vestibular explora pouco o cinema RICARDO SANGIOVANNI [email protected] Há dois vestibulares, a Universidade Federal da Bahia [Ufba] passou a indicar uma lista de dez filmes como parte do possível conteúdo do exame. A chegada do cinema ao temido concurso deu esperanças de que uma centelha de sensibilidade amoleceria o coração do bicho-papão. Doce devaneio: dois anos se passaram e a triste realidade é que, de fato, pouca coisa mudou no script do vestibular. O que mudou mesmo foi a lista de filmes indicados para os próximos processos seletivos da Federal. Entre os dez, sete filmes aparecerão pela primeira vez em 2008 – curioso é que nenhum dos sete preteridos chegou a ser sequer mencionado nas questões das duas últimas provas. O cinema, como tantos assuntos, somou-se ao já extenso elenco de conteúdos figurantes no gigantesco programa do concurso. “Não acho o programa massacrante. Às vezes pensamos que é demais, mas um volume grande de conhecimento abre a mente, dá mais facilidade para o aluno se expressar“, contesta a professora Noélia Araújo, vice-diretora do Instituto de Letras. A unidade que seleciona os filmes. Fato é que, em dois anos, somente dois títulos caíram nas provas – Deus e o Diabo na Terra do Sol [1964] de Glauber Rocha, e Cidade de Deus [2002], de Fernando Meirelles. Foram aproveitados, embora tratados sem muito glamour: na soma, foram só duas questões, órfãs nas provas de literatura da segunda etapa, em 2006 e 2007. “O objetivo atual é entrelaçar literatura e cinema“, explica a professora. “Mas a Ufba já começou a articular a criação de um Instituto de Cinema. Com isso, a tendência é que, no futuro, o vestibular fale de linguagem cinematográfica“. BRECHA – Apesar de achar interessante a inclusão do cinema no programa do vestibular, Juvêncio Martins, 18, aluno do terceiro ano do colégio Antônio Vieira, não se ilude. “No vestibular, não dá para ir muito longe. Não tem brecha para sonhar“. O lamento é de um cinéfilo voraz – dos 10 filmes indicados para o concurso, ele já viu oito. Mas a lista de indicados de seus sonhos seria bem diferente – teria filmes de Tarantino, Almodóvar e Hitchcock. A insatisfação e os anseios ele partilha com um restrito grupo de amigos. Sua colega, Gabriela Muniz, 17, faz parte dele. “O vestibular tem uma visão estreita do conhecimento. O cinema é uma forma de arte. Comecei a gostar desde pequena, queria ver os filmes antigos para saber detalhes históricos. Cresci construindo uma visão mais crítica“. Quando falam de filmes, os dois destacam elementos como direção, roteiro e fotografia. ”É comum que as pessoas se prendam ao enredo. É uma visão superficial”, diz Gabriela. DO OUTRO LADO – ”Se depender da escola, não vamos assistir a filme nenhum. Não temos aula de audiovisual, nem contato com arte e cultura. Eles podiam fazer excursões, realizar mostras”. Quem assina a crítica é Arnaldo Marques Neto, 18, aluno do terceiro ano da Escola Estadual Manoel Novaes. Apesar das dificuldades, Arnaldo cultiva, numa espécie de trincheira, seu interesse pela cultura. Sobretudo pelos filmes. A batalha já mostra resultado: durante a entrevista, Arnaldo se deu conta de que já assistiu oito dos dez filmes indicados. Ele nunca fez qualquer curso de cinema, mas demonstra um espírito crítico afiado. ”As pessoas não prestam atenção em como a música induz a um determinado sentimento e até encobre erros do filme. Não olham a parte analítica”. Além do cinema, Arnaldo gosta de estudar filosofia e jogar RPG com os amigos. Ele explica porque não descuida da cultura. “Quem se limita só a aprender português e matemática não tem futuro. Vai arranjar um emprego de peão, ganhar, no máximo, R$ 800 por mês. Quem vai longe é quem conhece bem geografia, história, filosofia“. “Enquadramento, plano, seqüência e ritmo não são só aspectos técnicos. São elementos que transmitem um modo de ver a vida. Falta dar atenção a esta discussão na Bahia. Geralmente, lidamos com isso por intuição“. A avaliação é do produtor audiovisual Cláudio Marques. Ele é um dos organizadores da mostra Cinema no Vestibular . ”As discussões abordam não só o enredo, mas também o contexto histórico e a linguagem dos filmes”, diz outra organizadora, Conceição Miranda. Os convidados são professores das áreas de cinema, história e filosofia da Ufba e da Faculdade de Tecnologia e Ciências. Mesmo não cobrando filmes no vestibular, a Universidade do Estado da Bahia [Uneb] realiza mostras no interior do Estado. Nos dias 10 e 14 deste mês, acontece em Caetité a terceira edição do CineDebate, com filmes e palestras que discutem a relação entre o cinema e a história. Segundo o organizador do evento, professor Jairo Nascimento, o objetivo é levar ao público clássicos do cinema – esta edição exibe Roma, Cidade Aberta [1957], de Roberto Rosselini, e Noites de Cabíria [1957], de Federico Fellini. A Uneb também organiza o circuito Cinema no Campus, em Valença. Os filmes são exibidos às quartas e sextas-feiras, seguidos de debates coordenados pelos professores Surya Pombo, Fabio Josué e Andréa Lago. Em São Paulo, uma iniciativa interessante é o projeto Cine-Educação, parceria entre a Fundação Mapfre e a Cinemateca de São Paulo. O projeto, coordenado pela pedagoga Sílvia Meirelles, leva professores das escolas públicas do estado até a Cinemateca. Lá, eles assistem filmes e participam de oficinas, onde recebem noções básicas de linguagem, movimentos e prática com câmera, intenção do diretor, exercícios de roteiro e argumento. Em dois anos, 635 professores passaram pelo curso. “A idéia é que eles transmitam o que aprenderam aqui aos alunos. Essa geração é bombardeada pela linguagem audiovisual, então precisa ‘aprender a ler‘. Explorar o cinema é urgente“, conclui. Educadores dão alternativas de como usar o cinema Divulgada em 2003, a notícia de que a Ufba recomendaria filmes para o vestibular chegou a inspirar fôlego novo ao professor de língua portuguesa e apresentador de TV, Jorge Portugal. “Achei que fosse cair como uma bomba no despertar da sensibilidade, da fome de informação“. Mas na prática, o que era para ser uma bomba não passou do estouro raquítico de um estalo de salão. Não teve força suficiente para abalar de modo significativo a cultura ”conteudista“ do mercado pré-vestibular. Serviu só para chamuscar um tanto mais o ânimo de quem já não se contenta com tal modelo. “Em pré-vestibular parece que há uma maldição. Tudo vira esquema“. PROVA DE UM FILME SÓ – A indicação de muitos filmes é um exemplo da tendência ao ”entupimento“ de informação – algo a que o professor Portugal se refere com revolta. Para ele, a riqueza de um filme poderia dar pano para manga não para uma questão, mas para a prova inteira. “Pegue uma obra como Deus e o Diabo [na Terra do Sol]. Além da realidade sócio-política, você tem ali um contexto geográfico. Dali já dá para tirar geografia, para trançar com o conhecimento da história. Você pode falar de química também – as condições da terra, do solo. Pode tirar física, biologia – botânica, ecologia. Você pode tirar isso tudo, porque está tudo ali, na obra“. Para Jorge Portugal, o vestibular acaba sendo uma ”sombra retroativa” que influencia todas as séries do ensino médio. Ainda assim, o coordenador pedagógico do 3º ano do colégio Antônio Vieira, José Teixeira, vê em mudanças no teor do concurso um caminho para transformações no ensino básico. Para ele, existem, atualmente, dois tipos de ensino pré-vestibular. “Para alguns, o objetivo é capacitar o aluno a resolver as questões das provas. Mas prefiro o modelo que propõe ensinar este aluno a fazer hiperlinks entre as disciplinas, abrir a cabeça para outras demandas“. Para ele, prescindir da linguagem audiovisual significa estar na marginalidade da vida contemporânea. ”O ensino que dispensa o universo das imagens não dialoga com o jovem. É um universo que apela muito à sensibilidade. É preciso estar atento, fazer uma análise crítica, e não consumir automaticamente”. GRAMÁTICA – O professor e crítico de cinema André Setaro defende a criação, no ensino básico, de uma disciplina de noções básicas de linguagens expressivas, além da literatura. Teatro, música e – é claro – cinema estariam entre elas. “Num livro como Dom Casmurro, o mais interessante é, além do enredo, a beleza da linguagem, a maneira como Machado de Assis cria o mistério e observa o comportamento humano. No cinema, os grandes autores, como Hitchcock e Kubrick, fazem a mesma coisa“, compara. ”Então, é preciso fazer o estudante do ensino médio ver que existe, para além da história, um realizador que manipula as imagens”. Setaro ressalta que é importante considerar que assim como a literatura, o cinema também é uma linguagem, com sintaxe e morfologia próprias. Mostras e debate podem ser boa opção DIVULGAÇÃO Com estilo fragmentado e temática pop, O Homem que Copiava é novidade na lista MAIS SETE FIGURANTES PARA O ELENCO Sete novos filmes se juntam a Deus e o Diabo na Terra do Sol, Cidade de Deus e O Baile Perfumado filmes dos próximos vestibulares da Ufba O Homem que Copiava | Jorge Furtado [Brasil, 2003]. Comédia de um jovem operador de fotocopiadora que precisa de R$ 38 para salvar a namorada O Que é Isto, Companheiro?| Bruno Barreto [Brasil, 2003]. Em plena ditadura militar, um grupo de jovens realiza um ousado seqüestro do embaixador norte-americano no Brasil Adeus, Lênin!| Good Bye, Lenin! – Wolfgang Becker [Alemanha, 2003]. Pouco antes da queda do muro de Berlim, uma mulher entra em coma e só desperta após a vitória capitalista Faça a Coisa Certa | Do The Right Thing – Spike Lee [EUA, 1989]. Uma família ítalo-americana se revolta com seus clientes, que não toleram mais ver no estabelecimento apenas quadros com fotos de artistas brancos. O Crime do Padre Amaro | El Crimen del padre Amaro – Carlos Carrera [México, Espanha, Argentina, França, [2002]. O noviço Amaro conhece a sensual Amélia e se apaixona. Baseado no romance do escritor português Eça de Queirós Caramuru: A Invenção do Brasil | Guel Arrares [Brasil, 2001]. Criado a partir de uma minissérie, conta a história do português Diogo Álvares, que chega ao Brasil em 1500 Diários de Motocicleta | The Motorcycle Diaries – Walter Salles Jr [EUA, 2004]. Narra a viagem pela América Latina que Ernesto Guevara fez, antes de se tornar “Che“ (foto) * Todo ano a Diretoria de Artes Visuais e Multimeios [Dimas] promove, durante o segundo semestre, a mostra “Cinema no Vestibular”, com filmes e debates com espceialistas, na Biblioteca dos Barris Caramuru

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Faça a Coisa Certa | Do The Right Thing– Spike Lee [EUA, 1989]. Uma família ítalo-americana se revolta com seus clientes, que não toleram mais ver no estabelecimento apenas quadros com fotos de artistas brancos. ❚ Caramuru: A Invenção do Brasil | Guel Arrares [Brasil, 2001]. Criado a partir de uma minissérie, conta a história do português Diogo Álvares, que chega ao Brasil em 1500❚ O Crime do Padre Amaro | El Crimen del padre Amaro – Carlos Carrera [México, Espanha, Caramuru

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8 | VESTIBULAR | SALVADOR, SEGUNDA-FEIRA, 7/5/2007 9| VESTIBULAR |SALVADOR, SEGUNDA-FEIRA, 7/5/2007

CINEMA ❚ Relação entre linguagem audiovisual e educação é subaproveitada nos processos seletivos de instituições de ensino superior da Bahia. Explorar o cinema é urgente, dizem especialistas

Novos filmes, velhas questões

LUCIANO DA MATTA

Para Juvêncio [18] e Gabriela [17], o vestibular explora pouco o cinema

RICARDO SANGIOVANNIr s a n g i o @ g r u p o a t a rd e . c o m . b r

Há dois vestibulares, a UniversidadeFederal da Bahia [Ufba] passou aindicar uma lista de dez filmes comoparte do possível conteúdo doexame. A chegada do cinema aotemido concurso deu esperanças deque uma centelha de sensibilidadeamoleceria o coração dobicho-papão. Doce devaneio: doisanos se passaram e a triste realidadeé que, de fato, pouca coisa mudouno script do vestibular.

O que mudou mesmo foi a listade filmes indicados para os próximosprocessos seletivos da Federal. Entreos dez, sete filmes aparecerão pelaprimeira vez em 2008 – curioso é quenenhum dos sete preteridos chegoua ser sequer mencionado nasquestões das duas últimas provas. Ocinema, como tantos assuntos,somou-se ao já extenso elenco deconteúdos figurantes no gigantescoprograma do concurso. “Não acho oprograma massacrante. Às vezespensamos que é demais, mas umvolume grande de conhecimentoabre a mente, dá mais facilidade

para o aluno se expressar“, contestaa professora Noélia Araújo,vice-diretora do Instituto de Letras. Aunidade que seleciona os filmes.

Fato é que, em dois anos,somente dois títulos caíram nasprovas – Deus e o Diabo na Terra doSol [1964] de Glauber Rocha, eCidade de Deus [2002], de FernandoMeirelles. Foram aproveitados,embora tratados sem muito glamour:na soma, foram só duas questões,órfãs nas provas de literatura dasegunda etapa, em 2006 e 2007.

“O objetivo atual é entrelaçarliteratura e cinema“, explica aprofessora. “Mas a Ufba já começoua articular a criação de um Institutode Cinema. Com isso, a tendência éque, no futuro, o vestibular fale delinguagem cinematográfica“.

BRECHA – Apesar de acharinteressante a inclusão do cinema noprograma do vestibular, JuvêncioMartins, 18, aluno do terceiro ano docolégio Antônio Vieira, não se ilude.“No vestibular, não dá para ir muitolonge. Não tem brecha para sonhar“.

O lamento é de um cinéfilo voraz– dos 10 filmes indicados para o

concurso, ele já viu oito. Mas a listade indicados de seus sonhos seriabem diferente – teria filmes deTarantino, Almodóvar e Hitchcock. Ainsatisfação e os anseios ele partilhacom um restrito grupo de amigos.

Sua colega, Gabriela Muniz, 17,faz parte dele. “O vestibular temuma visão estreita do conhecimento.O cinema é uma forma de arte.Comecei a gostar desde pequena,queria ver os filmes antigos parasaber detalhes históricos. Cresciconstruindo uma visão mais crítica“.

Quando falam de filmes, os doisdestacam elementos como direção,roteiro e fotografia. ”É comum queas pessoas se prendam ao enredo. Éuma visão superficial”, diz Gabriela.

DO OUTRO LADO – ”Se depender daescola, não vamos assistir a filmenenhum. Não temos aula deaudiovisual, nem contato com arte ecultura. Eles podiam fazer excursões,realizar mostras”. Quem assina acrítica é Arnaldo Marques Neto, 18,aluno do terceiro ano da EscolaEstadual Manoel Novaes.

Apesar das dificuldades, Arnaldocultiva, numa espécie de trincheira,

seu interesse pela cultura. Sobretudopelos filmes. A batalha já mostraresultado: durante a entrevista,Arnaldo se deu conta de que jáassistiu oito dos dez filmes indicados.

Ele nunca fez qualquer curso decinema, mas demonstra um espíritocrítico afiado. ”As pessoas nãoprestam atenção em como a músicainduz a um determinado sentimentoe até encobre erros do filme. Não

olham a parte analítica”.Além do cinema, Arnaldo gosta

de estudar filosofia e jogar RPG comos amigos. Ele explica porque nãodescuida da cultura. “Quem se limitasó a aprender português ematemática não tem futuro. Vaiarranjar um emprego de peão,ganhar, no máximo, R$ 800 por mês.Quem vai longe é quem conhecebem geografia, história, filosofia“.

“Enquadramento, plano, seqüência eritmo não são só aspectos técnicos.São elementos que transmitem ummodo de ver a vida. Falta daratenção a esta discussão na Bahia.Geralmente, lidamos com isso porintuição“. A avaliação é do produtoraudiovisual Cláudio Marques. Ele éum dos organizadores da mostraCinema no Vestibular.

”As discussões abordam não só oenredo, mas também o contextohistórico e a linguagem dos filmes”,diz outra organizadora, ConceiçãoMiranda. Os convidados sãoprofessores das áreas de cinema,história e filosofia da Ufba e daFaculdade de Tecnologia e Ciências.

Mesmo não cobrando filmes novestibular, a Universidade do Estadoda Bahia [Uneb] realiza mostras nointerior do Estado. Nos dias 10 e 14deste mês, acontece em Caetité aterceira edição do CineDebate, comfilmes e palestras que discutem arelação entre o cinema e a história.

Segundo o organizador do

evento, professor Jairo Nascimento, oobjetivo é levar ao público clássicosdo cinema – esta edição exibe Roma,Cidade Aberta [1957], de RobertoRosselini, e Noites de Cabíria [1957],de Federico Fellini.

A Uneb também organiza o

circuito Cinema no Campus, emValença. Os filmes são exibidos àsquartas e sextas-feiras, seguidos dedebates coordenados pelosprofessores Surya Pombo, FabioJosué e Andréa Lago.

Em São Paulo, uma iniciativainteressante é o projetoCine-Educação, parceria entre aFundação Mapfre e a Cinemateca deSão Paulo. O projeto, coordenadopela pedagoga Sílvia Meirelles, levaprofessores das escolas públicas doestado até a Cinemateca.

Lá, eles assistem filmes eparticipam de oficinas, onde recebemnoções básicas de linguagem,movimentos e prática com câmera,intenção do diretor, exercícios deroteiro e argumento. Em dois anos,635 professores passaram pelo curso.“A idéia é que eles transmitam o queaprenderam aqui aos alunos. Essageração é bombardeada pelalinguagem audiovisual, então precisa‘aprender a ler‘. Explorar o cinema éurgente“, conclui.

Educadores dão alternativasde como usar o cinemaDivulgada em 2003, a notícia deque a Ufba recomendaria filmespara o vestibular chegou a inspirarfôlego novo ao professor de línguaportuguesa e apresentador de TV,Jorge Portugal. “Achei que fossecair como uma bomba nodespertar da sensibilidade, dafome de informação“.

Mas na prática, o que era paraser uma bomba não passou doestouro raquítico de um estalo desalão. Não teve força suficientepara abalar de modo significativoa cultura ”conteudista“ domercado pré-vestibular. Serviu sópara chamuscar um tanto mais oânimo de quem já não se contentacom tal modelo. “Empré-vestibular parece que há umamaldição. Tudo vira esquema“.

PROVA DE UM FILME SÓ – Aindicação de muitos filmes é umexemplo da tendência ao”entupimento“ de informação –algo a que o professor Portugal serefere com revolta. Para ele, ariqueza de um filme poderia darpano para manga não para umaquestão, mas para a prova inteira.

“Pegue uma obra como Deus eo Diabo [na Terra do Sol]. Além darealidade sócio-política, você temali um contexto geográfico. Dali jádá para tirar geografia, paratrançar com o conhecimento dahistória. Você pode falar dequímica também – as condições daterra, do solo. Pode tirar física,biologia – botânica, ecologia. Vocêpode tirar isso tudo, porque estátudo ali, na obra“.

Para Jorge Portugal, ovestibular acaba sendo uma”sombra retroativa” que influenciatodas as séries do ensino médio.

Ainda assim, o coordenadorpedagógico do 3º ano do colégio

Antônio Vieira, José Teixeira, vêem mudanças no teor do concursoum caminho para transformaçõesno ensino básico.

Para ele, existem, atualmente,dois tipos de ensino pré-vestibular.“Para alguns, o objetivo écapacitar o aluno a resolver asquestões das provas. Mas prefiro omodelo que propõe ensinar estealuno a fazer hiperlinks entre asdisciplinas, abrir a cabeça paraoutras demandas“.

Para ele, prescindir dalinguagem audiovisual significaestar na marginalidade da vidacontemporânea. ”O ensino quedispensa o universo das imagensnão dialoga com o jovem. É umuniverso que apela muito àsensibilidade. É preciso estaratento, fazer uma análise crítica, enão consumir automaticamente”.

GRAMÁTICA – O professor e críticode cinema André Setaro defende acriação, no ensino básico, de umadisciplina de noções básicas delinguagens expressivas, além daliteratura. Teatro, música e – éclaro – cinema estariam entre elas.

“Num livro como DomCasmurro, o mais interessante é,além do enredo, a beleza dalinguagem, a maneira comoMachado de Assis cria o mistério eobserva o comportamentohumano. No cinema, os grandesautores, como Hitchcock e Kubrick,fazem a mesma coisa“, compara.

”Então, é preciso fazer oestudante do ensino médio verque existe, para além da história,um realizador que manipula asimagens”. Setaro ressalta que éimportante considerar que assimcomo a literatura, o cinematambém é uma linguagem, comsintaxe e morfologia próprias.

Mostras e debate podem ser boa opção

DIVULGAÇÃO

Com estilofragmentado e

temática pop, OHomem que

Copiava é novidadena lista

MAIS SETE FIGURANTES PARA O ELENCO

Sete novos filmes se juntam aDeus e o Diabo na Terra doSol, Cidade de Deus e O BailePerfumado filmes dos próximosvestibulares da Ufba

O Homem que Copiava |Jorge Furtado [Brasil, 2003].Comédia de um jovemoperador de fotocopiadora queprecisa de R$ 38 para salvar anamorada ❚

O Que é Isto, Companheiro?|Bruno Barreto [Brasil, 2003].Em plena ditadura militar,um grupo de jovens realizaum ousado seqüestro doembaixador norte-americanono Brasil ❚

Adeus, Lênin! | Good Bye,Lenin! – Wolfgang Becker[Alemanha, 2003]. Pouco antesda queda do muro de Berlim,uma mulher entra em coma e sódesperta após a vitóriacapitalista ❚

Faça a Coisa Certa | Do TheRight Thing – Spike Lee [EUA,1989]. Uma famíliaítalo-americana se revolta comseus clientes, que não tolerammais ver no estabelecimentoapenas quadros com fotos deartistas brancos. ❚

O Crime do Padre Amaro | ElCrimen del padre Amaro –Carlos Carrera [México, Espanha,

Argentina, França, [2002]. Onoviço Amaro conhece a sensualAmélia e se apaixona. Baseadono romance do escritorportuguês Eça de Queirós ❚

Caramuru: A Invenção doBrasil | Guel Arrares [Brasil,2001]. Criado a partir deuma minissérie, conta ahistória do português DiogoÁlvares, que chega ao Brasilem 1500 ❚

Diários de Motocicleta | TheMotorcycle Diaries – WalterSalles Jr [EUA, 2004]. Narra aviagem pela América Latina queErnesto Guevara fez, antes de setornar “Che“ (foto) ❚

*Todo ano a Diretoria de ArtesVisuais e Multimeios [Dimas]promove, durante o segundosemestre, a mostra “Cinema noVestibular”, com filmes edebates com espceialistas, naBiblioteca dos Barris

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