Fernando Pessoa

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1. Quando as crianças brincam em sou ao menos sinta Isto no coração. Quando as crianças brincam E eu as oiço brincar, Qualquer coisa em minha alma Começa a se alegrar. E toda aquela infância Que não tive me vem, Numa onda de alegria Que não foi de ninguém. Se quem fui é enigma, E quem serei visão, Quem sou ao menos sinta sto no coração. !. "qui neste sossego e a#artamento Aqui, neste sossego e apartamento, Nesta quieta solidão sem fim, Sem cuidado ou tormento Que ocupe este momento, Da vida e mundo volto-me para mim. Tão breve sombra do que pude ser e encontro, tão perdida semel!ança "om min!a vida por acontecer, Tão nocturna lembrança Do dia e do viver, Que se perturba a solidão , e eu moro Entre homens novamente # novamente c!eio $ que fui de outros, e que rememoro, #, memorando-o, % mais insubsistente. T%nue, va&io, in'til, imperfeito. $. " criança que fui chora na estrada A criança que fui c!ora na estrada. Dei(ei-a ali quando vim ser quem sou) as !o*e, vendo que o que sou % nada, Quero ir buscar quem fui onde ficou.

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1. Quando as crianas brincam em sou ao menos sinta Isto no corao. Quando as crianas brincamE eu as oio brincar, Qualquer coisa em minha almaComea a se alegrar.E toda aquela infnciaQue no tive me vem, Numa onda de alegria Que no foi de ningum. Se quem fui enigma, E quem serei viso, Quem sou ao menos sinta Isto no corao. 2. Aqui neste sossego e apartamento

Aqui, neste sossego e apartamento, Nesta quieta solido sem fim, Sem cuidado ou tormento Que ocupe este momento, Da vida e mundo volto-me para mim. To breve sombra do que pude ser Me encontro, to perdida semelhana Com minha vida por acontecer, To nocturna lembrana Do dia e do viver, Que se perturba a solido, e eu moro Entre homens novamente E novamente cheio O que fui de outros, e que rememoro, E, memorando-o, mais insubsistente.Tnue, vazio, intil, imperfeito.

3. A criana que fui chora na estrada A criana que fui chora na estrada. Deixei-a ali quando vim ser quem sou; Mas hoje, vendo que o que sou nada, Quero ir buscar quem fui onde ficou.

Ah, como hei-de encontr-lo? Quem errouA vinda tem a regresso errada. J no sei de onde vim nem onde estou. De o no saber, minha alma est parada.

Se ao menos atingir neste lugarUm alto monte, de onde possa enfimO que esqueci, olhando-o, relembrar,

Na ausncia, ao menos, saberei de mim, E, ao ver-me tal qual fui ao longe, acharEm mim um pouco de quando era assim.4. Era uma criana pobre a passar

Era uma criana pobre a passarTo pequena, e um seu olhar,Pousou em mim, pousou em vo, Porque eu ia passando, pensando,Em grandes coisas meditando, Deixara em casa o corao. Mas depois acordei e vi,Que no sentia, que no senti. Eu creio em Deus e em Cristo, mas no Tive ali o meu corao.

Porque que eu penso tanto e andoAlheio a quanto vai pensando, No mundo, e criana, at?Porque que eu no tenho sperana e fE no sou nada do que sou?Porque que a criana passouSem que eu sequer a olhasse bem?Meu corao no ningum!Ah, o crime de no ter sentidoNaquele olhar pobre e perdido Para os meus olhos, sua dor!E eu sou poeta e pensador!

5. LULLABY

6. Quem foi que regou as flores?

7. Ah que maada o piano

Ah, que maada o pianoEternamente a tocarL em cima, no outro andar!

Ah, que tristeza o cessar!Sempre era gente a tocar!Sempre tinha companhiaNessa constante arrelia.

Vizinha, se no morreu,Que aquele piano seuVolte de novo a maar!Sem ele penso e sou eu,Com ele esqueo a sonhar...

M msica? Sim, mas hAt na msica mUm sentimento de algum.No sei quem o sente ou d,No sei quem o d ou tem.

No deixe de me maarCom o contnuo tocarDo seu piano frequente.Ah, torne-me a arreliarE mace-me eternamente!

A quem s, tudo maisQue o que est naquilo que .Notas falsas, desiguais No se importe: a minha f,Meu sonho, vo a reboqueDo que toca mal e atDo piano, o no sei qu...Toque mal; mas toque, toque!

8. Ratos 9. Abro o ba e minha vista

10. Para onde vai a minha vida e quem a leva?