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103 Fisiologia do Sangue 6 A palavra homeostasia significa a ma- nutenção das condições de funcionamen- to dos diferentes componentes celulares do organismo. T odos os órgãos realizam fun- ções que contribuem para a homeostasia. A comunicação entre os diversos órgãos é feita pelo sangue. Este, pode ser entendido como um sistema de transporte em que as artérias, veias e capilares seriam as vias per- corridas. O sangue é o meio líquido que flui pelo sistema circulatório entre os diversos órgãos transportando nutrientes, hormô- nios, eletrólitos, água, resíduos do metabo- lismo celular e diversas outras substânci- as. A fisiologia do sangue estuda as suas múltiplas funções em interação com a nu- trição dos demais tecidos do organismo. O deslocamento do sangue no sistema circulatório ocorre por ação da bomba cardíaca e da sua condução pelas artérias, veias e capilares. O sangue circula no or- ganismo humano, transpor tando oxigênio dos pulmões para os tecidos, onde é libera- do nos capilares. Ao retornar dos tecidos, o sangue conduz o dióxido de carbono e os demais resíduos do metabolismo celular, para eliminação através da respiração, do suor, da urina ou das fezes. O sistema de defesa do organismo con- tra doenças e a invasão de germes patogê- nicos está concentrado no sangue. O equi- líbrio e a distribuição de água, a regulação do pH através os sistemas tampões, o con- trole da coagulação e a regulação da tem- peratura correspondem a outras importan- tes funções desempenhadas pelo sangue. As células do corpo humano, para fun- cionar adequadamente, precisam consumir oxigênio. As moléculas de hemoglobina contidas nos glóbulos vermelhos do san- gue transportam o oxigênio aos tecidos e, quando a sua oferta é reduzida, o funcio- namento celular se deteriora, podendo ces- sar e determinar a morte. O volume de sangue contido no siste- ma circulatório (coração, artérias, veias e capilares) constitui o volume sanguíneo to- tal, também chamado volemia. Um adul- to, dependendo do seu porte físico, pode ter de 4 a 8 litros de sangue no organismo. Em geral, a volemia tem relação com a ida- de e o peso dos indivíduos (T abela 6.1). O Tabela 6.1. Volemia estimada.

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Fisiologia do Sangue

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A palavra homeostasia significa a ma-nutenção das condições de funcionamen-to dos diferentes componentes celulares do

organismo. Todos os órgãos realizam fun-ções que contribuem para a homeostasia.A comunicação entre os diversos órgãos éfeita pelo sangue. Este, pode ser entendidocomo um sistema de transporte em que asartérias, veias e capilares seriam as vias per-corridas. O sangue é o meio líquido que fluipelo sistema circulatório entre os diversosórgãos transportando nutrientes, hormô-nios, eletrólitos, água, resíduos do metabo-lismo celular e diversas outras substânci-

as. A fisiologia do sangue estuda as suasmúltiplas funções em interação com a nu-trição dos demais tecidos do organismo.

O deslocamento do sangue no sistemacirculatório ocorre por ação da bombacardíaca e da sua condução pelas artérias,veias e capilares. O sangue circula no or-ganismo humano, transportando oxigêniodos pulmões para os tecidos, onde é libera-do nos capilares. Ao retornar dos tecidos,

o sangue conduz o dióxido de carbono e osdemais resíduos do metabolismo celular,para eliminação através da respiração, dosuor, da urina ou das fezes.

O sistema de defesa do organismo con-tra doenças e a invasão de germes patogê-

nicos está concentrado no sangue. O equi-líbrio e a distribuição de água, a regulaçãodo pH através os sistemas tampões, o con-

trole da coagulação e a regulação da tem-peratura correspondem a outras importan-tes funções desempenhadas pelo sangue.

As células do corpo humano, para fun-cionar adequadamente, precisam consumiroxigênio. As moléculas de hemoglobinacontidas nos glóbulos vermelhos do san-gue transportam o oxigênio aos tecidos e,quando a sua oferta é reduzida, o funcio-namento celular se deteriora, podendo ces-sar e determinar a morte.

O volume de sangue contido no siste-ma circulatório (coração, artérias, veias ecapilares) constitui o volume sanguíneo to-tal, também chamado volemia. Um adul-to, dependendo do seu porte físico, podeter de 4 a 8 litros de sangue no organismo.Em geral, a volemia tem relação com a ida-de e o peso dos indivíduos (Tabela 6.1). O

Tabela 6.1. Volemia estimada.

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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA

adulto tem aproximadamente 60 ml de san-gue para cada quilograma de peso corporal.Os elementos celulares correspondem aaproximadamente 45% do volume de san-gue, enquanto o plasma corresponde a 55%.

O sangue é um tecido que contém uma fase sólida, que compreende os elementoscelulares, e uma fase líquida, que correspon-de ao plasma (Fig. 6.1).

Os elementos celulares do sangue sãoas hemácias, os leucócitos e as plaquetas.

As hemácias são as células encarrega-

das do transporte de oxigênio para os teci-dos e do gás carbônico resultante do meta-bolismo celular; os leucócitos constituemum exército de defesa do organismo con-tra a invasão por agentes estranhos e asplaquetas são fragmentos celulares funda-mentais aos processos de hemostasia e co-agulação do sangue.

O plasma sanguíneo é constituido porelementos sólidos e água. Os elementos sóli-dos do plasma são, principalmente as

proteinas, gorduras, hidratos de carbono,eletrólitos, sais orgânicos e minerais, e hor-mônios. O plasma é um líquidoviscoso que contém 90% de águae 10% de sólidos, como protei-nas, lipídeos, glicose, ácidos esais, vitaminas, minerais, hormô-nios e enzimas. Em cada litro desangue existem 60 a 80 gramasde proteina. A maior parte é

constituida pela albumina; emmenor proporção estão asglobulinas, relacionadas à forma-ção de anticorpos para a defesado organismo e o fibrinogênio,uma proteina fundamental no

processo de coagulação do sangue.O organismo humano contém uma gran-

de quantidade de água, capaz de migrar en-tre os diversos compartimentos, impulsiona-da pelo fenômeno da osmose. A osmose éum processo físico que ocorre entre duas so-luções separadas por uma membrana per-meável, em que a água atravessa a mem-brana para o lado que contém o maior nú-mero de solutos, para igualar a suaquantidade nos dois lados da membrana.

ORIGEM DAS CÉLULAS DO SANGUENo início da gravidez, o embrião retira

os alimentos de que precisa das paredes doútero materno. À partir da terceira sema-na, passa a alimentar-se através o sanguematerno. No final do primeiro mês, o fetojá tem um coração rudimentar, que bom-beia o sangue para o corpo em formação.Nas primeiras semanas de gestação, o em-brião humano é acompanhado de uma es-pécie de bolsa, chamada saco vitelino.

Fig. 6.1. Diagrama que mostra a composição do sangue. Lista oselementos celulares e o plasma sanguíneo.

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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE

À partir de três semanas de gestaçãona parede externa do saco vitelino surgempequenas massas celulares, que vão setransformando em agrupamentos sanguí-neos, chamados ilhotas de Wolff. As pare-des dos primeiros vasos sanguíneos são for-madas pelas células que contornam asilhotas e, aos poucos, o interior das ilhotasvai ficando vazio. As células mais internasdas ilhotas transformam-se em glóbulosvermelhos primitivos.

O estudo das células precursoras dos

glóbulos vermelhos e das demais células doorganismo, nos dias atuais, adquiriu enor-me importância, devido ao potencialterapêutico desse grupo de células especi-ais, denominadas células-tronco. A célu-la-tronco hemopoiética tem uma grandecapacidade de auto-renovação e um gran-de potencial proliferativo. Estas proprieda-des permitem que as células-troncos pos-sam diferenciar-se em todas as linhagensde células sanguíneas. Além disso, como

recentemente demonstrado, as células-tronco hemopoiéticas tem a capacidade deconverter-se em outros tipos celulares,como o miocárdio, para citar o melhorexemplo das pesquisas nacionais.

No início do segundo mês, o sangue játem glóbulos vermelhos, glóbulos brancose plaquetas. Os vasos sanguíneos e glóbulosvermelhos se originam fora do organismodo embrião, ou seja, são de origem extra-

embrionária.Após o terceiro mês de vida fetal, a for-mação do sangue se processa no fígado eno baço. Esta fase é conhecida como fasehepática da fabricação do sangue fetal. Nametade do período da vida fetal, a medula

óssea começa a produzir o sangue, proces-so que se continua durante toda a vida ex-tra-uterina.

Após o nascimento, a grande maioriadas células do sangue é produzida pela me-dula óssea, o miolo gelatinoso que preen-che o interior dos ossos longos e do esterno.Os tecidos linfoides, localizados no baço,timo, amigdalas, gânglios linfáticos e pla-cas de Peyer no intestino, também colabo-ram nesta tarefa. A própria medula ósseacontém tecido linfoide e, em situações es-

peciais, encarrega-se sozinha da produçãode todas as células do sangue. A medulaóssea de praticamente todos os ossos pro-duz eritrócitos até os cinco anos de idade.À partir daí, a medula dos ossos longos tor-na-se mais gordurosa, exceto o úmero e atíbia, e deixam de produzir células após osvinte anos de idade. Acima dos vinte anos,a medula dos ossos membranosos, como asvértebras, as costelas, o esterno e a pelvesão os grandes produtores dos eritrócitos.

A matriz celular, existente na medulaóssea e nos tecidos linfoides é a célula

reticular primitiva, que aparece nas primei-ras fases de formação do embrião e funcio-na como uma fonte permanente de célu-las sanguíneas. A célula reticular primiti-va origina dois tipos distintos de células:as células reticuloendoteliais, que desempe-nham funções protetoras, englobando par-tículas estranhas e os hemocitoblastos, que

são as células produtoras de sangue e quedão origem às hemácias, alguns tipos deleucócitos e plaquetas.

O hemocitoblasto é uma célula volu-mosa que tem um núcleo ovoide. No inte-rior da medula óssea os hemocitoblastos

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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA

dividem-se e originam células menores, osproeritroblastos. Estas outras células tam-bém se dividem e originam os eritroblastosque sofrem diversas transformações até que,finalmente, perdem o núcleo e se consti-tuem nos eritrócitos. O processo de forma-ção das hemácias é denominado eritropoiese.

Nas malhas do retículo da medula dosossos também se desenvolvem os granuló-citos que, como as hemácias, descendemda célula reticular primitiva. Origina-seinicialmente, um tipo celular chamado

mieloblasto que, por sua vez se diferenciaem promielócito, cujo citoplasma tem grâ-nulos. Conforme a coloração dos grânulosseja violeta, azul ou vermelha, é que ospromielócitos se diferenciam nas célulasbrancas neutrófilos, eosinófilos e basófilos.Estes três tipos de leucócitos tem núcleoscom dois ou mais lobos e, por essa razão,são chamados de polimorfonucleares. Elestem granulações no interior do seucitoplasma e por isso são também chama-

dos de granulócitos.O tecido linfoide, que forma a estrutu-

ra básica do baço, do timo, dos gânglios lin-fáticos e de outros órgãos é o encarregadoda produção dos outros dois tipos de leu-cócitos, os monócitos e os linfócitos. Estascélulas tem núcleo simples e não temgranulações no seu citoplasma.

Os leucócitos são as unidades móveisdo sistema protetor do organismo. Após

a sua formação, os leucócitos são trans-portados pelo sangue, para as diferentespartes do organismo, onde poderão atu-ar, promovendo a defesa rápida contraqualquer agente invasor.

Os hemocitoblastos também formam

os megacariócitos, que, como o nome in-dica, são células que apresentam núcleoscaracteristicamente grandes. O citoplasmado megacariócito fragmenta-se em diver-sas porções, que ficam totalmente envol-vidas por uma membrana. Quando o me-gacariócito se rompe, libera diversas pla-quetas que são lançadas na circulação. Asplaquetas, portanto, não são células e sim,elementos celulares, porque são fragmen-tos de uma célula principal derivada dacélula primitiva hemocitoblasto.

As células sanguíneas e as plaquetastem origem comum nas células reticularesprimitivas. A sua produção é contínua,durante toda a vida do indivíduo, e regu-lada por diversos fatores que, em condiçõesnormais, mantém a concentração adequa-da de cada tipo celular, no sentido deotimizar as funções do sangue. Cada ele-mento celular do sangue, hemácias, leucó-citos e plaquetas desempenha funções es-pecíficas, relacionadas ao transporte de

gases, aos mecanismos de defesa do orga-nismo e ao sistema de hemostasia.

HEMÁCIASA principal função das hemácias é

transportar oxigênio dos pulmões para ostecidos e o dióxido de carbono, dos teci-dos para os pulmões. O transporte do oxi-gênio é feito pela hemoglobina, através deligações químicas. As hemácias contém a

enzima anidrase carbônica, que acelera areação da água com o dióxido de carbono,tornando possível a remoção de grandesquantidades de dióxido de carbono, paraeliminação pelos pulmões. A hemoglobi-na funciona ainda como um sistema tam-

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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE

pão adicional, na manutenção do equilí-brio ácido-básico do organismo.

As hemácias,   glóbulos vermelhos oueritrócitos, são as células mais numerosasno sangue. Tem a forma de um discobicôncavo, com um excesso de membra-na, em relação ao conteudo celular. Amembrana em excesso permite à hemáciaalterar a sua forma na passagem pelos ca-pilares, sem sofrer distensão ou rotura. Aforma bicôncava da hemácia favorece aexistência de uma grande superfície de di-

fusão, em relação ao seu tamanho e volu-me. A hemácia circulante não tem núcleo,seu diâmetro médio é de aproximadamen-te 8 microns e a espessura é de 2 micronsna periferia e cerca de 1 micron na sua por-ção central.

A quantidade de hemácias no san-gue varia com o sexo. No homem adultonormal, sua concentração é de aproxi-madamente 5.200.000 por mililitro desangue, enquanto na mulher normal é de

4.800.000.A altitude em que a pessoa vive afeta

o número de hemácias em circulação. Aspopulações que vivem em grandes altitu-des, onde a pressão parcial de oxigênio noar é mais baixa, tem necessidade de umamaior quantidade de hemácias na circula-ção, para manter a oxigenação dos tecidosadequada.

No recém-nascido, a contagem de

hemácias revela quantidades superioresàs do adulto. No decorrer das duas pri-meiras semanas de vida, a quantidade dehemácias se reduz e estabiliza, até atin-gir os níveis do adulto normal.

Aproximadamente 60% da célula da

hemácia é constituida pela água e o res-tante pelos elementos sólidos. Da partesólida, 90% é ocupada pela hemoglobi-na e o restante corresponde às proteinas,substâncias gordurosas, fosfatos, cloro eíons de sódio.

A quantidade de hemácias no sistemacirculatório é controlada pelo organismo,de tal forma que um certo número deeritrócitos está sempre disponível para otransporte de oxigênio aos tecidos. Qual-quer condição que diminua a quantidade

de oxigênio nos tecidos, tende a aumentara produção de eritrócitos.Quando a medula óssea produz hemá-

cias muito rapidamente, várias células sãoliberadas no sangue antes de se tornaremeritrócitos maduros. Estas células mal de-senvolvidas podem transportar o oxigêniocom eficiência porém, são muito frágeis eo seu tempo de vida é menor.

A vida média das hemácias no orga-nismo é de 100 a 120 dias. Ao final desse

período suas membranas tornam-se frágeise elas são, na maioria, removidas da circu-lação pelo baço, enquanto a medula ósseaforma novas hemácias, para serem lançadasna circulação. Este processo de formaçãode hemácias é contínuo.

A hipóxia renal estimula a liberaçãode um fator eritropoiético que modifica umaproteina do plasma, transformando-a emeritropoietina ou hemopoietina que, por sua

vez, estimula a produção de glóbulos ver-melhos. A eritropoietina pode ser usadapara acelerar a produção de hemácias empacientes anêmicos ou em candidatos aprocedimentos cirúrgicos de grande porte.

A medula óssea para elaborar novos

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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA

glóbulos vermelhos aproveita restos de he-mácias envelhecidas e destruidas. O ferrocontido na hemoglobina é reaproveitado,para formar novas moléculas do pigmen-to. Células fagocitárias do baço, fígado,gânglios linfáticos e da própria medula en-carregam-se de destruir os glóbulos verme-lhos envelhecidos. À seguir, lançam na cir-culação o ferro que sobra, para que possaser reaproveitado. A produção de hemáci-as exige a presença de cianocobalamina(vitamina B12) e um fator da mucosa do

estômago, chamado de fator intrínseco, quese combina com a vitamina B12. O ácidofólico também participa do processo de for-mação e maturação das hemácias.

HEMOGLOBINAA hemoglobina é o principal compo-

nente da hemácia. Ela é formada no inte-rior dos eritroblastos na medula óssea.

A hemoglobina é o pigmento respon-sável pelo transporte do oxigênio para os

tecidos e confere à hemácia a sua colora-ção avermelhada. Quando a quantidade dehemoglobina combinada com o oxigênio égrande, o sangue toma a coloração verme-lho viva, do sangue arterial. Quando a com-binação com o oxigênio existe em peque-nas quantidades, a coloração do sangue évermelho escura, do sangue venoso.

A hemoglobina é formada pela uniãode radicais heme com uma proteina, cha-

mada globina. Cada molécula de hemoglo-bina contém quatro moléculas do radicalheme e dois pares de cadeias de polipeptí-deos, estruturalmente formadas por diver-sos amino-ácidos. A hemoglobina A, doadulto, é formada por um par de cadeias

de polipeptídeos chamados cadeias alfa (a)e um par de polipeptídeos chamados ca-

deias beta (b). O pigmento ou radical heme

contém moléculas de ferro no estadoferroso e é o responsável pela cor verme-lha da hemoglobina.(Fig. 6.2).

A cadeia alfa-globina é constituida porum grupo de 141 resíduos de aminoácidose tem o peso molecular de 15.750 Daltons.A cadeias beta é formada pela união de 146resíduos de aminoácidos e tem o pesomolecular de 16.500 Daltons. A hemoglo-

bina A resultante, tem um peso molecularaproximado de 64.725 Daltons.A estrutura química da molécula da he-

moglobina foi demonstrada por Perutz eKendrew que, em 1962 receberam o prê-

Fig. 6.2. Esquema da molécula da hemoglobina A quemostra os os quatro grupos heme ligados às cadeias depolipeptídeos (alfa e beta) e a ligação do radical hemecom as quatro moléculas de oxigênio.

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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE

mio Nobel de química, pelos seus traba-lhos com aquele pigmento. A configura-ção química da hemoglobina permite umaproveitamento excepcional; cada molécu-la pode transportar quatro moléculas deoxigênio. A combinação química do radi-cal heme com a molécula de oxigênio éfacilmente reversível, o que facilita a suacaptação nos capilares pulmonares e a sualiberação nos capilares dos tecidos. A li-gação do oxigênio à hemoglobina é dotipo cooperativo. Isto significa que a liga-

ção de uma molécula de oxigênio ao gru-po heme facilita a ligação da segundamolécula, que torna mais fácil a ligaçãocom a terceira molécula e, mais fácil ain-da, a ligação com a quarta e última mo-lécula, numa espécie de reação cuja ve-locidade aumenta à medida em que vaisendo processada. A oxihemoglobina é amolécula da hemoglobina saturada comquatro moléculas de oxigênio.

Durante as primeiras fases do desen-

volvimento embrionário do ser humano, osangue contém uma hemoglobina embrio-nária, chamada hemoglobina E, compostapor duas cadeias de polipeptídeos do tipoalfa e duas cadeias de tipo epsilon (e). Du-rante o estágio de vida fetal a hemoglobi-na embrionária é substituida pela hemo-globina fetal, denominada hemoglobina F.Este tipo de hemoglobina, tem enorme afi-nidade pelo oxigênio, e constitui uma

adaptação fisiológica, com a finalidade deextrair mais oxigênio da circulação mater-na da placenta, que tem uma PO

2relativa-

mente baixo. A hemoglobina fetal é forma-da pelos quatro radicais heme ligados àduas cadeias de polipeptídeos alfa (a) e

duas cadeias do tipo gama (g). A hemoglo-bina F se mantém nas hemácias circulantesem grande quantidade, nos recém-natos evai desaparecendo gradualmente nos pri-meiros meses de vida, para dar lugar à he-moglobina A, predominante no sangue doindivíduo adulto.

A capacidade de oxigenação dos teci-dos pelo sangue está relacionada ao núme-ro de glóbulos vermelhos circulantes e àquantidade de hemoglobina que contém.No adulto normal, cada 100 ml. de sangue

contém aproximadamente 15 gramas dehemoglobina.A forma bicôncava dos glóbulos ver-

melhos é ideal para a absorção e libera-ção rápida de gases. A ausência de nú-cleo também favorece o transporte deoxigênio, porque a célula pode contermaior quantidade de hemoglobina, con-tribuindo para sua maior eficiência porunidade de volume.

A estrutura molecular tetramérica,

com quatro moléculas do radical heme e acaracterística ligação cooperativa com ooxigênio, permitem à hemoglobina modi-ficar a sua afinidade pelo oxigênio, depen-dendo de diversos fatores, como o númerode moléculas de oxigênio já combinadas àsua própria molécula, a presença e quanti-dade de dióxido de carbono, o pH do san-gue, a temperatura e a quantidade de fos-fatos orgânicos presentes. Esses fatores

constituem um importante mecanismo decontrole, que permite à hemoglobina cap-tar oxigênio em um instante e liberá-lo efi-cientemente no instante seguinte.

A afinidade pelo oxigênio e a capaci-dade de liberação desse gás, são descritas

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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA

por equações e curvas que representam adissociação da hemoglobina. A curva dedissociação da hemoglobina representa arelação entre a pressão parcial de oxigêniono sangue e o percentual de saturação dahemoglobina. O sangue que deixa os pul-mões tem uma PO

2de 100 mmHg e, nes-

sas condições, a hemoglobina está plena-mente saturada. A curva de dissociação de-monstra o percentual de saturação dahemoglobina correspondente a cada valorda PO

2do sangue, conforme demonstra o

gráfico da figura 6.3.A análise da curva de dissociação dahemoglobina e a influência de diversos fa-tores na sua configuração, facilitam a com-preensão dos mecanismos de liberação dooxigênio nos tecidos. Quando a afinidadeda hemoglobina pelo oxigênio está aumen-tada, menos oxigênio é liberado nos teci-dos. O consumo celular de oxigênio dimi-nui a sua concentração no ambiente emque a célula se encontra. Com a redução

da concentração do oxigênio, o gradientedo oxigênio através a membrana celular sereduz e menos oxigênio se difunde na cé-

lula, reduzindo o PO2

intracelular e com-prometendo o metabolismo celular.

A afinidade da hemoglobina pelo oxi-gênio é um fenômeno dinâmico que podeser afetado por diversos mecanismos. Asmanipulações da fisiologia induzidas duran-te a circulação extracorpórea, como a hi-potermia, as alterações do equilíbrio áci-do-base, a hemodiluição e outras, podemmodificar a afinidade da hemoglobina pelooxigênio, levando à alterações da satura-ção e da liberação do oxigênio nos tecidos.

A curva de dissociação da hemoglobi-na pode ser modificada por alterações dopH. Se o sangue se tornar ácido, com o pHde 7,2 por exemplo, a curva de dissociaçãose desloca cerca de 15% para a direita. Seo sangue, ao contrário, estiver alcalino, como pH de 7,6, a curva se desloca para a es-querda. O aumento da concentração dodióxido de carbono e o aumento da tem-peratura corporal, também deslocam a cur-va para a direita.

Quando a afinidade da hemoglobinapelo oxigênio está aumentada em rela-ção ao normal, a curva de dissociação sedesvia para a direita e, menos oxigênio éliberado. Se a afinidade da hemoglobinaestá diminuida a curva de dissociação sedesvia para a esquerda e o oxigênio é li-berado com mais facilidade. A presençade grandes quantidades de hemoglobinafetal desvia a curva de dissociação da

hemoglobina para a esquerda, no feto eno recém-nato, facilitando a liberação deoxigênio aos tecidos.

HEMATÓCRITOA massa de glóbulos vermelhos exis-

Fig. 6.3. Curva de dissociação da hemoglobina. Mostraa correlação da saturação de oxigênio com a p02 dosangue. Alterações da curva refletem modificações dosangue produzidas por diversos fatores, conformeexplanação do texto.

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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE

tente no sangue constitui o hematócrito.O hematócrito é o percentual do volumede sangue ocupado pelas hemácias e, por-tanto, representa um índice da concentra-ção dos glóbulos vermelhos.

Quando se diz que uma pessoa tem ohematócrito de 40 significa que 40% dovolume sanguíneo são células vermelhas eo restante corresponde ao plasma. O he-matócrito do homem normal varia de 40 a45% (média de 42%), e o da mulher nor-mal oscila entre 38 e 42% (média de 40%).

O hematócrito, na ausência de anemia, temcorrelação com a quantidade de hemoglo-bina existente no sangue. O valor de 15g%de hemoglobina no sangue, correspondeaproximadamente ao hematócrito de 45%.A razão aproximada é de 1:3 em relaçãoao hematócrito, o que equivale a dizer que,o valor da hemoglobina multiplicado portrês, corresponde ao valor aproximado dohematócrito.

O hematócrito é determinado pela

centrifugação de uma amostra de sangueem um tubo capilar. Após 3 minutos decentrifugação, as hemácias, por sua maiordensidade, se depositarão no fundo dotubo. Sobre estas se depositará uma cama-da bem fina de glóbulos brancos e de pla-quetas, e no topo do tubo ficará o plasma.A camada que contém os leucócitos e pla-quetas é tão fina que não é considerada naleitura. No sangue normal, após a centri-

fugação, se para toda a coluna ocupada,atribuirmos o valor 100, teremos 45% ocu-pados pelas hemácias e 55% pelo plasma.Uma escala graduada permite a leitura di-reta da percentagem de hemácias existen-tes no sangue. Se, em uma amostra de san-

gue centrifugado, dividirmos o compri-mento da coluna de glóbulos vermelhospelo comprimento total da amostra(glóbulos + plasma), teremos o valor dohematócrito (Fig.6.4).

Quando a quantidade de glóbulos ver-melhos no sangue é inferior ao valor nor-mal, existe anemia. Nestes casos a determi-nação do hematócrito mostra valores abai-xo de 42% no homem e de 40% na mulher.Ao contrário, quando a quantidade de he-mácias é superior ao normal, existe poliglo-

bulia. O hematócrito estará acima de 45%.A hemodiluição usada na perfusãoreduz a concentração dos elementos ce-lulares do sangue; o hematócrito baixa avalores de 20 a 25%, dependendo do gráude hemodiluição. A redução do hemató-crito a níveis abaixo de 15% representaum valor de hemoglobina de 5 g%, quepode prejudicar o transporte e a ofertade oxigênio para os tecidos, causandohipóxia celular e acidose metabólica,

mesmo que a saturação de oxigênio dosangue arterial seja normal.

Fig. 6.4. Esquema dos tubos de hematócrito. Demonstrao resultado da centrifugação do sangue no tubo. Ashemácias se depositam no fundo do tubo, pela sua maiordensidade. Ilustra o aspecto do sangue normal, dasanemias e das policitemias.

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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA

Quanto maior o hematócrito, maior éo atrito entre as camadas ou lâminas dosangue que se desloca nos vasos sanguíne-os. O atrito entre aquelas camadas é umfator importante na determinação da vis-cosidade do sangue. A viscosidade eleva-da dificulta o fluxo de sangue através dosvasos de pequeno calibre e dos capilares.

Em função de mecanismos fisiológicosde adaptação, ou em conseqüência de al-terações patológicas, podem ocorrer alte-rações da quantidade de hemácias no san-

gue circulante (anemia ou policitemia)bem como alterações da estrutura e funçãoda hemoglobina (hemoglobinopatias).

ANEMIAA anemia corresponde à redução do

número de hemácias circulantes ou à re-dução do teor de hemoglobina contida nashemácias. As anemias podem ser causadaspor hemorragias ou por deficiente produ-ção de hemácias.

Se a perda de sangue é rápida, o indi-víduo apresenta hipovolemia, que suscitaa absorção de líquidos do interstício para osangue, diluindo os glóbulos vermelhos,produzindo a anemia. A perda crônica oulenta de sangue também resulta em ane-mia, porque a formação de novas hemáci-as não é suficientemente rápida para repora perda continuada.

Existem anemias causadas por incapa-

cidade da medula óssea produzir as célulasvermelhas, como a anemia aplástica, porexemplo, bem como anemias causadas porfalta de componentes essenciais ao meta-bolismo formador da hemoglobina, comoo ferro, a vitamina B12, o fator gástrico in-

trínseco e o ácido fólico. Outras anemiassão causadas por excessiva destruição dashemácias circulantes, como as anemiashemolíticas.Anemias Hemolíticas – Em conseqüên-cia de diversas alterações, freqüentemen-te hereditárias, um organismo pode pro-duzir hemácias com anomalias diversas, in-clusive da membrana celular, que as tor-nam particularmente frágeis e permitemque se rompam com facilidade, ao passarpelos capilares. Nessas condições, mesmo

quando o número de eritrócitos é normal,pode ocorrer anemia, porque o período devida útil das hemácias é muito curto. Umexemplo dessas anemias hemolíticas é aesferocitose hereditária, em que as hemá-cias tem a forma esférica, ao invés dediscóides. Essas células não tem a estrutu-ra da membrana normal dos discosbicôncavos e não podem ser comprimidas,rompendo-se com muita facilidade. Outrosexemplos seriam a talassemia ou anemiade Cooley e a anemia falciforme, esta últi-ma de grande importância em nosso meio.

POLICITEMIAA policitemia representa um aumen-

to, fisiológico ou patológico, da quantida-de de hemácias no sangue circulante. Acontagem das hemácias é superior a5.200.000 por mililitro de sangue e o he-matócrito, em conseqüência, está acima de

45%. O exemplo mais comum de policite-mia fisiológica é o das grandes altitudes,em que as populações tem maior quanti-dade de hemácias na circulação para com-pensar a menor concentração de oxigêniono ar atmosférico. Os efeitos da altitude

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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE

sobre o ser humano começam à partir dos2.400 metros.

A policitemia mais importante é a deorigem patológica e pode ser primária ousecundária.Policitemia Primária – A medula ósseaproduz quantidades excessivas de hemáci-as, sem que isso represente qualquer me-canismo de adaptação. O tipo clássico é aPolicitemia vera, uma condição neoplási-ca ou tumoral dos órgãos produtores decélulas sanguíneas. Ela gera uma excessi-

va produção de eritrócitos, leucócitos eplaquetas. O hematócrito nestas pessoaspode chegar aos 70 ou 80%. O sistemavascular se torna intumescido, muitos ca-pilares são obstruidos devido à viscosidadedo sangue, que nesta doença, pode aumen-tar até cinco vezes em relação ao normal.Policitemia Secundária – Os tecidos doorganismo são hipóxicos, como ocorrenas cardiopatias congênitas cianóticasque se acompanham de shunt intra-car-

díaco da direita para a esquerda. Ahipóxia crônica, estimula o organismo aproduzir glóbulos vermelhos em excesso,lançando-os na circulação para aumen-tar a oferta de oxigênio aos tecidos. Ohematócrito destas crianças pode alcan-çar os 80% e a viscosidade do sangueaumenta proporcionalmente. Nestas cir-cunstâncias, a hemodiluição pré-opera-tória é importante para favorecer a per-

fusão e a oxigenação tissulares, durantea circulação extracorpórea.Com freqüência, as alterações das hemá-cias são devidas à alterações da hemoglo-bina, como ocorre na anemia falciforme, queé, provavelmente, a hemoglobinopatia mais

comumente encontrada. Já foram identifi-cadas e catalogadas mais de 300 tipos dife-rentes de hemoglobinas, das quais cerca de10% podem se acompanhar de alteraçõesfuncionais e clínicas. Estas alterações dahemoglobina são raras e são encontradasapenas em alguns indivíduos de uma mes-ma família. Sua importância reside no fatode que um paciente portador dessas anor-malidades pode eventualmente, ser subme-tido à circulação extracorpórea e ahemoglobinopatia potenciar o desenvolvi-

mento de crise hemolítica severa, capaz decomprometer a função renal.Anemia Falciforme – É relativamente co-mum na população negra especialmente daÁfrica Central, onde parece ter se origina-do, por mutação genética. Na atualidade asua distribuição é bastante extensa, graçasà migração do povo africano para a maio-ria dos continentes. A doença ou seus tra-ços são facilmente encontrados na popu-lação negra ou em seus descendentes, in-

clusive em nosso país.A alteração primária da anemia

falciforme ocorre na hemoglobina. Existealteração de um dos resíduos de aminoáci-do nas cadeias da globulina beta, originan-do um tipo de hemoglobina chamada he-

moglobina S. A composição anormal daporção globina da hemoglobina, favorecea fácil cristalização do pigmento no interi-or das hemácias, além de tornar as células

mais frágeis. Os cristais da hemoglobina Ssão longos e tendem a alongar as hemáci-as, alterando a sua forma normal no san-gue. Quando a hemoglobina S cristaliza ese alonga, a hemácia deformada assume umformato curvo, como uma “foice”, fato que

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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA

originou a designação de falciforme. Estespacientes podem ter baixa tensão de oxi-gênio tecidual, por diversas razões, inclu-sive a formação de grumos celulares queobstruem os capilares e reduzem o fluxosanguíneo para diversos tecidos.

As hemoglobinopatias, como as de-mais alterações de origem genética, podemser do tipo homozigótico onde os dois pro-genitores transmitem o gene deficiente oupode ser do tipo heterozigótico onde o genedeficiente provém de apenas um dos pro-

genitores. Na anemia falciforme, a hemo-globina patológica pode ser do tipo Hb-SS(homozigótico) ou do tipo Hb-AS (hete-rozigótico), em que coexiste o caráter A dahemoglobina normal. A doença apenas semanifesta nos portadores do tipo Hb-SS,sendo os demais indivíduos, portadores dotipo Hb-AS, conhecidos como portadoresdo traço falciforme. Na população negraamericana 8% dos indivíduos tem o traçofalciforme, enquanto 0,2% tem a anemia

na sua forma plena.A anemia falciforme é transmitida atra-

vés do cromossoma 11, onde se localiza ogene mutante causador da alteração dacadeia beta da globina. A miscigenação dasraças produziu a expansão da doença que,em nosso país, pode cursar com formas deextrema gravidade.

As manifestações clínicas da anemiafalciforme incluem anemia hemolítica crô-

nica, complicações sistêmicas produzidaspor infartos de diversos órgãos, complica-ções renais da mesma origem e oclusões vas-culares periféricas. A vida média das hemá-cias falciformes é encurtada e, nos casosmais severos, pode ser de apenas 10 dias.

A circulação extracorpórea em paci-entes com anemia falciforme pode desen-cadear crises hemolíticas extremamenteseveras além de oclusões vasculares e ou-tras complicações sistêmicas.

HEMÓLISEA lise ou rotura das membranas das

células sanguíneas vermelhas é conheci-da como hemólise. A lesão da membranadas hemácias permite a liberação da he-moglobina para o plasma, constituindo

a hemoglobina livre. O fenômeno gera-do pelo aumento de hemoglobina livreno plasma em conseqüência da hemóli-se é a hemoglobinemia.

A quantidade de hemoglobina livre noplasma depende da capacidade e da velo-cidade de remoção do pigmento pelo or-ganismo de cada indivíduo. Normalmen-te, o sistema retículo-endotelial é capaz deremover cerca de 0,1 mg de hemoglobina/ Kg/minuto. Quando a hemoglobina livre

no plasma supera o valor de 100 mg%, ahemoglobina é filtrada pelos rins. A urinaque contém hemoglobina adquire a colo-ração avermelhada, característica dahemoglobinúria. Dependendo da quantida-de de hemoglobina, a coloração da urinapode variar de levemente avermelhada afrancamente vinhosa ou cor de “coca-cola”.A lesão renal produzida pela hemoglobinapode ocorrer quando os valores da hemo-

globina livre no plasma são superiores a3.000 mg%. Existem estudos que demons-tram que a lesão renal ocorre por ação doestroma das hemácias que perdem a he-moglobina. A existência de hemoglobinaspuras usadas em solução, como substitu-

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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE

tos do sangue, comprovam a importânciado estroma celular na produção da insufi-ciência renal conseguente à hemólise.

O plasma normal contém uma peque-na quantidade de hemoglobina livre, quecorresponde à hemoglobina liberada peladestruição das hemácias “velhas”, para asua renovação. A quantidade de hemoglo-bina livre no plasma normal é de aproxi-madamente 6 mg%. A circulação extracor-pórea adequadamente conduzida, com osequipamentos atualmente disponíveis, ele-

va a hemoglobina livre para 20 a 40 mg%,em função da hemólise produzida pelo trau-ma. Quando o trauma celular na perfusãoé excessivo, a hemoglobinemia é acentua-da e supera os 100 mg%, produzindo ahemoglobinúria.

A hemólise pode ser produzida por re-ações a certos medicamentos, como umprocesso auto-imune, devido à presença dehemoglobinas anormais ou, no caso maisfreqüente da circulação extracorpórea, por

trauma físico.O tratamento mais utilizado para pre-

venir as conseqüências da hemólise exces-siva consiste em administrar bicarbonatode sódio, para alcalinizar o plasma e a uri-na, inibindo a cristalização da hemoglobi-na livre. Administra-se ainda o manitol,na tentativa de promover a lavagem dostúbulos renais, por uma diurese osmóticaabundante.

LEUCÓCITOSO organismo possui um eficiente sis-

tema de combate aos diferentes agentesagressores, tóxicos ou infecciosos comobactérias, fungos, vírus e parasitas. Este

sistema inclui as células brancas ou leu-cócitos, os macrófagos dos tecidos e osistema linfóide.

Os leucócitos são considerados as uni-dades móveis do sistema protetor do orga-nismo, porque podem deixar a correntesanguínea e migrar para locais onde suaação seja necessária. Após a sua formação,as células brancas são lançadas no sangueonde circulam, até que sejam necessáriasem algum ponto do organismo. Quandoisso ocorre, os leucócitos migram para o

local necessário, especificamente as áreasde inflamação, fazendo uma defesa rápidacontra os agentes infecciosos. Na eventu-alidade de invasão do organismo por bac-térias, os leucócitos são lançados na circu-lação em grandes quantidades.

Existem normalmente no sangue peri-férico de 6.000 a 8.000 leucócitos por mili-litro de sangue, divididos em cinco tipos:neutrófilos, eosinófilos, basófilos, monó-citos e linfócitos. Sua distribuição

percentual no sangue periférico corres-ponde à da tabela 6.2.

Os neutrófilos no sangue periférico sedistribuem em formas jovens, com o nú-cleo em bastão e formas adultas, com onúcleo segmentado.

Os três primeiros tipos de leucócitos,

Tabela 6.2.Tipos de leucócitos no sangue periférico.

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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE

organismo, os eosinófilos entram na circu-lação em grandes quantidades. Os eosinó-filos são também importantes na destrui-ção de coágulos velhos ou organizados. Fi-cam armazenados nos tecidos, ondeocorrem as reações antígeno-anticorpo.Tem a propriedade de fagocitar e digerir ocomplexo antígeno-anticorpo, após o pro-cesso imune ter desempenhado suas fun-ções. Durante as reações alérgicas, a produ-ção de eosinófilos pela medula óssea é au-mentada. Os eosinófilos só atingem as áreas

inflamadas nas fases finais do processo infla-matório. A maior importância dos eosinófi-los é na detoxificação de proteinas estranhase nos mecanismos de alergia. Os eosinófi-los possuem receptores para as imunoglo-bulinas IgE e IgG e para algumas proteinasdo sistema do complemento.

A função dos basófilos parece estar re-lacionada à liberação de heparina no localde uma agressão, para impedir a coagula-ção no sangue. Os basófilos no sangue

circulante se localizam perto da parede doscapilares. O sangue transporta os basófilospara os tecidos, onde se transformam emmastócitos e liberam heparina, histaminae quantidades menores de bradicinina eserotonina. Eles são muito importantes emalguns tipos de reações alérgicas, porque otipo de imunoglobulina ligado à estas rea-ções é a IgE, que tem propensão a se fixaraos mastócitos e basófilos. Nesta ocasião,

o antígeno específico reage com o anticor-po e esta reação faz com que o mastócitose rompa, liberando histamina, bradicininae serotonina que provocam as reações dosvasos sanguíneos dos tecidos, que consti-tuem as manifestações da alergia.

Quando a medula óssea interrompe aprodução de leucócitos, o organismo ficadesprotegido contra agentes invasoresbacterianos ou de outra natureza. A inabi-lidade para produzir leucócitos na medulaóssea é conhecida como agranulocitose.Diversos medicamentos e alguns hipnóti-cos barbitúricos podem produzir agranulo-citose, por inibição da medula óssea.

OS LEUCÓCITOSDURANTE A PERFUSÃO

A circulação extracorpórea ativa osneutrófilos por diversos mecanismos,dentre os quais a liberação de frações docomplemento e de calicreina, além deoutros fatores. Os neutrófilos, quandoativados, liberam substâncias que contri-buem para a gênese da reação inflama-tória generalizada que a circulação ex-tracorpórea determina. Alguns radicaistóxicos e peroxidases são também produ-tos liberados pelos leucócitos ativados.

Durante a perfusão, os neutrófilos ten-dem a se acumular nos pulmões, ondeseus produtos tóxicos produzem aumen-to da permeabilidade vascular e edemaintersticial.

Os leucócitos ativados liberam radi-cais livres de oxigênio que em determi-nadas circunstâncias podem produziroclusão microvascular. Os efeitos dessesradicais são melhor conhecidos durante

a fase de reperfusão coronariana, após odesclampeamento da aorta. Uma quan-tidade de agentes produzidos pelos leu-cócitos participam ativamente das rea-ções que constituem a resposta inflama-tória sistêmica do organismo (RISO).

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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA

PLAQUETASAs plaquetas são corpúsculos ou frag-

mentos de células gigantes, os megacarió-citos, formadas na medula óssea. Elas tema forma de discos diminutos arredondados,e na realidade, não representam células esim corpúsculos celulares. Os magacario-citos se fragmentam em plaquetas, que sãoliberadas na circulação sanguínea.

As plaquetas não tem núcleo; seu diâ-metro médio é de 1,5 μ (micron) e a espes-sura varia de 0,5 a 1 m.

As plaquetas são de fundamental im-portância nos processos de hemostasia ecoagulação do sangue. Quando oocorrelesão do endotélio de um vaso sanguíneo,as plaquetas são ativadas, aderem ao localda lesão e aglutinam-se umas às outras. Aomesmo tempo liberam substâncias que ati-vam outras plaquetas promovendo a for-mação de grumos plaquetários, que obstru-em o local da lesão do vaso e, em últimaanálise, promovem a interrupção da perda

sanguínea. Essa é a principal função dasplaquetas no fenômeno de hemostasia.Além disso, as plaquetas participam ativa-mente da cascata da coagulação do san-gue, liberando várias proteinas e lipopro-teinas que ativam determinados fatores dacoagulação.

As propriedades mais importantes dasplaquetas, relacionadas à sua participaçãonos mecanismos da hemostasia e da coa-

gulação do sangue estão relacionadas natabela 6.3.A adesividade permite que a plaqueta

possa aderir ao endotélio vascular lesadoou à qualquer outra superfície diferente doendotélio normal. A agregação permite que

as plaquetas possam aderir umas às outras,constituindo grumos plaquetários que sãoa origem do futuro coágulo. A serotonina

liberada pelas plaquetas estimula aadesividade e a aglutinação, além de pro-duzir vasodilatação local. Os fatoresplaquetários III e IV participam das rea-ções da cascata da coagulação. As plaque-tas participam ainda, em conjunto com afibrina da elaboração de um coágulo final,cuja retração produz uma massa firme, comexpulsão do soro do seu interior.

A estrutura interna das plaquetas ébastante complexa, quando analisada ao

microscópio eletrônico (Fig. 6.5). Uma ca-mada externa, chamada glicocálice, rica emglicoproteinas, envolve as plaquetas e con-tém receptores para diversos agentes ca-pazes de ativar as plaquetas. Algumasglicoproteinas da camada de revestimentoda membrana plaquetária são importantespara as funções de adesividade e agrega-ção. Abaixo dessa camada glicoproteicaexiste a membrana plaquetária, que tem

três lâminas. Em contato com a lâmina maisinterna da membrana da plaqueta existeum conjunto de filamentos especializados,próximos de um sistema canalicular, comdiversos canalículos, que penetram no in-terior das plaquetas, chamado sistema

Tabela 6.3. Principais propriedades das plaquetas.

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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE

canalicular aberto. Esse sistema canalicularaumenta bastante a área da superfície daplaqueta e permite a expulsão de produtossecretados para o plasma. O citoplasma dasplaquetas é viscoso e contém numerosasorganelas e grânulos. No citoplasma existemmicrofilamentos e túbulos densos, que contémactina e miosina e contribuem para man-

ter a forma discoide, bem como para for-mar alongamentos ou pseudópodos, alémde contrair as plaquetas, quando estimu-ladas pelo aumento do cálcio no interiordo citoplasma. A contração desses micro-filamentos comprime as organelas e grânu-los do citoplasma, e expremem o seu con-teúdo para o plasma através do sistemacanalicular aberto, constituindo um sofis-ticado mecanismo de liberação das diver-

sas substâncias produzidas pelas plaquetas.As organelas e os grânulos do interiordo citoplasma são de vários tipos, como asmitocôndrias, os grânulos densos e os grânu-

los alfa, principalmente. Os grânulos alfacontém o fator IV plaquetário, que parti-

cipa da coagulação do sangue, e contémainda betatromboglobulina e fibrinogênio.Os grânulos densos contém reservas dedifosfato de adenosina (ADP), trifosfato deadenosina (ATP), cálcio e serotonina.Outros grânulos do citoplasma contém ain-da catalase, fosfatase ácida e outrasenzimas. O sistema tubular denso contémciclo-oxigenase que converte o ácidoaracdônico da membrana em prostaglan-dinas e em tromboxano A2, que é a subs-tância vasoconstritora mais potente do orga-

nismo, cujo metabolito é o tromboxano B2.A adesão e a agregação das plaquetaspodem ser estimuladas por uma série desubstâncias, chamados agentes agregantes,como ADP, adrenalina, trombina, coláge-no, vasopressina, serotonina, ácido arac-dônico e tromboxano A2. Estes agentesagregantes estimulam receptores da superfí-cie das plaquetas, que liberam cálcio nocitoplasma e desencadeiam a sua contraçãoe a compressão das organelas e grânulos.

O A.T.P. (trifosfato de adenosina), li-berado pelas plaquetas, fornece energiapara a formação de um coágulo firme eestável.

A concentração normal das plaquetasno sangue é de 150.000 a 400.000 por mi-lilitro de sangue. Cerca de 30.000 plaque-tas são formadas por dia, para cada milili-tro de sangue; as plaquetas circulantes sãototalmente substituidas a cada 10 dias. A

quantidade mínima de plaquetas capaz deassegurar a hemostasia adequada oscila emtorno de 50.000 por mililitro de sangue. Énecessário, contudo, que as plaquetas te-nham função normal, para que ahemostasia se processe adequadamente. As

Fig. 6.5. Diagrama da plaqueta vista ao mocroscópioeletrônico. Indica a composição da membrana e de

numerosas estruturas e organelas intra-plaquetárias,conforme a descrição do texto.

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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA

plaquetas danificadas se mantém na circu-lação porém, sua atividade fica prejudica-da, não sendo eficazes para a manutençãoda hemostasia.

AS PLAQUETAS NACIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA

As plaquetas sofrem alterações bas-tante significativas durante a circulaçãoextracorpórea, que resultam em dificul-dades com a hemostasia e a coagulaçãodo sangue.

O início da perfusão se acompanha deadsorção e deposição de proteinas do plas-ma nas superfícies internas dos tubos, oxi-genadores e filtros, especialmente fibrino-gênio, gamaglobulinas e em menor propor-ção, a albumina. Forma-se uma verdadeiracamada de revestimento proteico, que emcinco segundos tem a espessura de aproxi-madamente 5 Angstron e, em 1 minuto deperfusão, alcança a espessura de 125Angstron. Outras proteinas, inclusive fa-

tores de coagulação e lipoproteinas, sãotambém adsorvidas, porém em menoresquantidades que o fibrinogênio. Sobre esserevestimento proteico, rico em fibrinogê-nio, depositam-se plaquetas que são, dessaforma, seqüestradas da circulação.

Antes do início da perfusão, certos pro-dutos liberados pela incisão dos tecidos,como a tromboplastina tissular, estimulamas plaquetas de forma a reduzir a resposta

ao estímulo agregante da adenosina emcerca de 40%. Esta redução da capacidadefuncional das plaquetas coincide com a ele-vação do nível de tromboxano B2 no plas-ma, de duas a quatro vêzes o valor inicial.

A heparina tem um efeito direto sobre

as plaquetas; seu uso prolongado é associ-ado a redução do número de plaquetascirculantes. A trombocitopenia observadana perfusão também é resultado da ação daheparina utilizada para a anticoagulação.

Nos primeiros minutos da perfusão,ocorre um rápido desaparecimento das pla-quetas do sangue circulante. Essa reduçãodo número de plaquetas independe da he-modiluição e ocorre tanto com os oxige-nadores de bolhas como com os oxigena-dores de membranas, sendo, contudo, mais

acentuada nos primeiros, devido à interfacecom o gás (Fig. 6.6).A conseqüência mais importante do

contato das plaquetas com os circuitos dacirculação extracorpórea é a redução dacapacidade de agregação, causa das difi-culdades com a hemostasia, logo após o fi-nal da perfusão.

As plaquetas reagem sempre do mes-mo modo aos diversos estímulos a que sãosubmetidas. O contato das plaquetas com

as superfícies não endoteliais dos circuitose aparelhos da circulação extracorpórea

Fig. 6.6. Alterações da quantidade de plaquetascirculantes durante perfusão com oxigenadores de bolhase de membranas. Nos oxigenadores de membranas, arecuperação do número de plaquetas é mais rápida.

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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE

provoca a ativação plaquetária, que ocor-re em quatro fases sucessivas:

1. Alterações da forma da plaqueta;2. Agregação primária;3. Agregação secundária;4. Depleção do conteudo granular.Imediatamente após o contato com as

superfícies estranhas do circuito, os elemen-tos contráteis do citoplasma das plaquetasproduzem modificações da sua forma, tor-nando-as globosas, mais arredondadas. Emseguida, as plaquetas formam pequenos

aglomerados que podem ser desfeitos comfacilidade, denominados agregados primá-

rios. Quando o estímulo que ativa as pla-quetas é de grande intensidade, os agrega-dos primários transformam-se em agrega-dos secundários, que já não se dissolvem,formando agregados irreversíveis. O está-gio final da ativação das plaquetas é a fasede liberação ou depleção. Diversas subs-tâncias são liberadas das organelas e grâ-nulos das plaquetas, para o plasma, das

quais as principais são o fator IVplaquetário, betatromboglobulina, fibrino-gênio e outras substâncias dos grânulos alfa.As granulações densas liberam ADP, ATP,cálcio e serotonina.

As fases iniciais, de alterações da for-ma das plaquetas e a formação dos agrega-dos primários, são reversíveis. As fases ir-reversíveis dependem da intensidade doestímulo e apenas ocorrem na circulação

extracorpórea, quando o traumatismo émuito intenso.O número de plaquetas 3 minutos

após o início da perfusão é de aproxima-damente 78% do normal, caindo para70% após 5 minutos.

O número de plaquetas inativadas, deforma discóide aos 8 minutos de perfusãoé de aproximadamente 57% do normal.Após os primeiros 15 minutos da perfusãoparece haver uma pequena recuperação dasplaquetas que mudaram de forma; a seguiras alterações se estabilizam e persistem emum mesmo nível até o final da perfusão.Nesta fase, o troboxano B2 está elevado;seus valores, contudo, dependem de vari-ações individuais.

O ponto máximo de redução da fun-

ção plaquetária ocorre logo após a admi-nistração da protamina. Após a perfusão,e até o final das primeiras 24 horas, o nú-mero de plaquetas circulantes permanecebaixo, ligeiramente acima de 120 a 130.000/ ml. Os indicadores da função plaquetáriavão se recuperando progressivamente.

Existe correlação entre a estruturamicroscópica das plaquetas e a sua fun-ção, inclusive a secreção e eliminação deseus produtos.

Pela microscopia eletrônica, o númerode plaquetas funcionalmente normais caiude 96% para 54%, oito minutos após o iní-cio da perfusão, o que significa que, prati-camente, metade das plaquetas foi ativa-da por oito minutos de circulação extra-corpórea. Próximo ao final da perfusão háum aumento considerável do teor de subs-tâncias liberadas pelas plaquetas no plas-ma, devido à destruição de plaquetas e à

formação de agregados secundários. Ou-tros estudos realizados com auxílio daagregometria, com e sem estimulação peloADP, mostraram resultados semelhantesaos da microscopia eletrônica.

A hemodiluição causa trombo-

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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA

citopenia, pelo efeito dilucional sobre asplaquetas. Numerosas plaquetas são tam-bém seqüestradas pelo baço e pelo fígado,retornando à circulação, após a saida deperfusão. A quantidade normal de plaque-tas de 150.000 a 300.000/mm3 cai, duran-te a circulação extracorpórea, para cercade 100.000/mm3 e, ocasionalmente, paravalores mais baixos.

A reversão das alterações das plaque-tas na perfusão não é imediata e parecedurar 6 a 8 horas, durante as quais podem

persistir alterações de diversos gráus nahemostasia.Quando a hemostasia é difícil usa-se in-

fundir concentrado de plaquetas na quanti-dade aproximada de 1 unidade de concen-trado para cada 10 Kg de peso do paciente,até um máximo de 5 a 6 unidades. As pla-quetas preservadas em refrigerador, contudo,também tem a função deprimida e a recu-peração completa da sua função após atransfusão, também não é imediata.

PLASMAA fase líquida, não celular, do sangue,

é constituida pelo plasma sanguíneo. Oplasma é uma solução amarelo pálida ouâmbar, viscosa, cuja composição tem 91%de água e 9% de substâncias dissolvidas.As principais substâncias em solução noplasma são as proteinas, hidratos de car-bono, lipídeos, eletrólitos, pigmentos, vi-

taminas e hormônios.O plasma permite o livre intercâmbiode diversos dos seus componentes com olíquido intersticial, através dos poros exis-tentes na membrana capilar. As proteinasplasmáticas, devido às dimensões da sua

molécula, em condições habituais, nãoatravessam a membrana capilar, permane-cendo no plasma. Outras substâncias dis-solvidas no plasma e as moléculas de água,contudo, se difundem livremente. A saídada água do plasma através os capilares écontrolada pela pressão coloido-osmóticae pelo estado da permeabilidade das mem-branas; o que equivale dizer que as protei-nas extraem água dos tecidos para os capi-lares, mas, dificultam a sua saída dos capi-lares para os tecidos. A albumina é o

principal responsável pela manutenção dapressão coloido-osmótica do plasma.O volume médio de sangue de um adul-

to normal, de 60 ml/Kg de peso, correspon-de aproximadamente a 35 ml de plasma e25 ml de hemácias por cada quilograma,quando o hematócrito está normal.

A concentração de proteinas no plas-ma é três vezes maior que no líquido in-tersticial.

PROTEINAS PLASMÁTICASAs proteinas são o principal componen-

te do plasma; as suas moléculas são de gran-des dimensões e de elevado peso molecular;são responsáveis por diversas característi-cas biofísicas do plasma, tais como a den-sidade, a viscosidade e a pressão osmótica.As proteinas plasmáticas participam dosprocessos de nutrição, coagulação, regula-ção do equilíbrio ácido-base e da imunida-

de do organismo.As proteinas do plasma são de três ti-pos principais, a albumina, as globulinas eo fibrinogênio.

A albumina tem o peso molecular de69.000 Dalton e corresponde a 55% do total

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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE

de proteinas plasmáticas, ou seja 4 a 6 g%.A sua principal função está relacionada àmanutenção da pressão coloido-osmótica.

As globulinas, tem o peso molecular en-tre 80.000 e 200.000 Dalton; correspondema três tipos principais: alfaglobulinas,betaglobulinas e gamaglobulinas. Juntas, asglobulinas correspondem a 38% do totalde proteinas. As globulinas alfa e beta trans-portam diversas substâncias ligadas às suasmoléculas, para todo o organismo. Asgamaglo-bulinas e algumas betaglobulinas

participam do sistema de defesa e nos me-canismos de imunidade e alergia.O fibrinogênio tem peso molecular en-

tre 350.000 e 400.000 Dalton; correspon-de a 7% do total de proteinas do plasma.O fibrinogênio é fundamental nos fenôme-nos da coagulação sanguínea. Existe entre100 e 700 mg de fibrinogênio em cada100ml de plasma. O fibrinogênio é forma-do no fígado e, devido ao seu grande pesomolecular, não costuma passar para o lí-

quido intersticial. Contudo, quando a per-meabilidade dos capilares está aumentada,o fibrinogênio pode surgir no interstício,em quantidades suficientes para permitircoagulação.

As proteinas plasmáticas são muitosensíveis aos diversos tipos de traumatis-mos, inclusive o térmico. Se submetidas àtemperaturas elevadas, da ordem de 45oC,podem ser desnaturadas ou destruidas, per-

dendo as suas funções.Os demais constituintes do plasma sãoimportantes no equilíbrio eletrolítico, nanutrição dos tecidos, no equilíbrio ácido-básico e no controle e regulação hormonaldo organismo.

GRUPOS SANGUÍNEOSO sangue dos diferentes indivíduos

possui propriedades antigênicas e imunesdistintas. Anticorpos existentes no plasmade um indivíduo, podem reagir com osantígenos existentes nas hemácias de ou-tro indivíduo. Raramente, os antígenos eos anticorpos de dois indivíduos, são iguais.

Quando ocorrem hemorragias ou ane-mia, freqüentemente são necessárias trans-fusões de sangue para repor a volemia erecompor a dinâmica circulatória. A trans-

fusão de sangue entre dois indivíduos deverespeitar a presença dos antígenos especi-ais dos góbulos vermelhos e dos anticorposdo plasma sanguíneo. Testes simples de la-boratório, permitem determinar o gruposanguíneo dos indivíduos ou a presença dosantígenos e anticorpos existentes no san-gue do doador e do receptor da transfusão.A transfusão de sangue entre indivíduosde grupos sanguíneos não compatíveis,determina reações de aglutinação dos

eritrócitos, hemólise e outras reações maisseveras que podem produzir a morte.

Foram identificados aproximadamen-te trezentos antígenos nas células san-guíneas humanas, dos quais apenas trin-ta tem ocorrência relativamente freqüen-te. Os demais surgem apenas em algumaspessoas de determinadas famílias, e sãomuito raros.

Os antígenos existentes nas hemácias

são constituidos de glicolipídeos oumucopolissacarídeos. Dentre os antígenosconhecidos, dois grupos ou sistemas, ocor-rem em todos os indivíduos e podem cau-sar reações de incompatibilidade nas trans-fusões. São o sistema de antígenos ABO e

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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA

o sistema de antígenos Rh. O sangue é clas-sificado em grupos, conforme a presençados antígenos do sistema ABO nas hemá-cias e em tipos, conforme a presença dosantígenos Rh no plasma.

SISTEMA ABONa superfície das hemácias podem exis-

tir dois antígenos específicos desse sistema,denominados antígeno A e antígeno B. De-vido ao modo de transmissão hereditária des-ses antígenos, os diferentes indivíduos podem

ter apenas um dos antígenos, ambos ou ne-nhum dos antígenos, em suas hemácias.A presença dos antígenos A e B é de-

terminada por genes que existem emcromossomas adjacentes, um gene em cadacromossoma. A presença dos genes deter-mina se a hemácia irá conter o antígeno.Por essa razão, existem seis possibilidadesde combinações genéticas, uma vez quecada indivíduo recebe dois genes, um decada progenitor. As possibilidades genéti-

cas são OO, OA, OB, AA, BB e AB. Essascombinações de genes são conhecidascomo genótipos; cada indivíduo possui umdos seis diferentes genótipos. O genótipoOO determina a presença do grupo san-guíneo O; os genótipos OA e AA determi-nam o grupo sanguíneo A; os genótipos OBe BB determinam o grupo sanguíneo B,enquanto o genótipo AB determina o gru-po sanguíneo AB.

O sangue do grupo A contém hemáci-as com o antígeno A e o sangue do grupoB contém hemácias com o antígeno B. Osangue do grupo AB contém hemácias comos antígenos A e B e o sangue do grupo Ocontém hemácias sem nenhum antígeno.

Esses antígenos das hemácias também sãoconhecidos como aglutinógenos, pela suacapacidade de produzir aglutinação dascélulas do sangue.

ANTICORPOS DO PLASMANo plasma sanguíneo existem anticor-

pos produzidos por determinação genéticade cada um dos genótipos. Os indivíduoscom sangue do grupo A, que tem o antígenoA nas hemácias, possuem os anticorposanti-B. Os indivíduos com sangue do gru-

po B, tem anticorpos anti-A; os indivíduosdo grupo AB não tem anticorpos e os indi-víduos do grupo O possuem ambos os an-ticorpos, anti-A e anti-B. Os anticorpos doplasma sanguíneo também são chamadosde aglutininas, pela sua capacidade de re-agir com os antígenos das hemácias pro-duzindo aglutinação celular (Tabela 6.4).

As aglutininas (anticorpos) são gama-globulinas, e a sua maior parte correspon-de a moléculas de imunoglobulinas das fra-

ções IgM e IgG.As aglutininas só começam a ser for-

madas após o nascimento, estando com-pletas, após os primeiros meses de idade.

SISTEMA OU FATOR RhAlém dos grupos sanguíneos O,A,B e

AB outros sistemas de antígenos determi-

Tabela 6.4. Características dos Diferentes GruposSanguineos.

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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE

nam características do sangue, dos quais omais importante é o sistema ou fator Rh.

Existem seis tipos comuns de antíge-nos Rh, designados por C, D, E, c, d, e.Um indivíduo que tem o antígeno C, nãoterá o antígeno c; ao contrário, o indiví-duo que não tem o antígeno C, sempreterá o antígeno c. A mesma relação ocor-re com os antígenos D-d e E-e. A formade transmissão dos caracteres relaciona-dos ao fator Rh, faz com que cada pessoatenha um antígeno de cada um dos três

pares. Os antígenos C, D e E, podem es-timular o desenvolvimento de anticorposanti-Rh, que causam reações às transfu-sões. Os indivíduos que possuem um dostrês antígenos, C,D ou E são chamadosde Rh(+), ou Rh positivo. Os demais in-divíduos, que possuem os antígenos c, de, são chamados de Rh(-), ou Rh negati-vo. Cerca de 85% dos indivíduos da po-pulação branca são Rh positivo, enquan-to os restantes 15%, são Rh negativo. Isto

significa, com relação ao sistema Rh que,85% da população tem o fator Rh pre-sente no sangue, enquanto 15% não temo fator Rh. Na população negra ameri-cana, cerca de 95% dos indivíduos sãodo tipo Rh positivo.

Outros fatores existentes, como osantígenos M, N, S, P, Kell, Lewis, Duffy,Kidd, Diego e Lutheran, podem ser im-portantes em circunstâncias especiais,

não sendo, contudo, testados na práticaclínica diária.A distribuição dos diferentes grupos

sanguíneos na população de acordo com osistema ABO é a da tabela 6.5. Quandolevamos em consideração a presença dos

dois sistemas A-B-O e Rh, a distribuiçãodos diferentes tipos sanguíneos na popula-ção, passa a ser a da tabela 6.6.

Para determinar o grupo sanguíneo dosindivíduos, duas gotas de sangue são colo-

cadas em lâminas de vidro e misturadas aamostras de soros que contém os anticorposanti-A e anti-B; observa-se o comporta-mento da mistura. Se houver aglutinaçãocom o soro anti-A, o sangue será do grupoA; se houver aglutinação com o soro anti-B, o sangue será do grupo B; se houver aglu-tinação com os dois soros, o sangue serádo grupo AB e, se não houver aglutinação,o sangue será do grupo O.

A determinação da presença do fatorRh é feita de modo semelhante. O soro parao teste contém anticorpos anti-Rh. Se hou-ver aglutinação, o sangue será do tipo Rhpositivo. Quando não há aglutinação, osangue é do tipo Rh negativo.

Tabela 6.5. Grupos sanguíneos na população geral.

Tabela 6.6. Incidência dos diferentes tipos sanguíneos napopulação.

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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA

TRANSFUSÃO DE SANGUEA transfusão de sangue entre diferen-

tes indivíduos é possível, respeitando-se apresença dos antígenos e anticorpos, o quesignifica, na prática, a determinação dacompatibilidade entre o sangue doador e osangue do indivíduo receptor.

Em geral, a transfusão de sangue deverespeitar os grupos sanguíneos, cada qualpodendo servir como doador para indiví-duos do mesmo grupo, após o resultadosdas provas cruzadas. Em condições excep-

cionais, contudo, pode-se admitir a trans-fusão entre indivíduos de grupos diferen-tes, desde que exista compatibilidade.

O sangue do grupo O não temantígenos e, portanto, pode ser doado aqualquer indivíduo do mesmo grupo, ou dosgrupos A, B ou AB. Entretanto, o sanguedo grupo O tem ambos os anticorpos anti-A e o anti-B e, dessa forma, o indivíduo dogrupo O, somente poderá receber sanguedo mesmo grupo. O doador de sangue do

grupo A, poderá doar ao receptor A; o gru-po B, poderá doar ao receptor B. As pesso-as que tem sangue do grupo AB, podemreceber doação de qualquer tipo de san-gue, porque o tipo de sangue AB, não pos-sui anticorpos. Essas pessoas, são chama-das de receptores universais. Todos os quetem o sangue tipo O, tem anticorpos anti-A e anti-B, e por isso podem doar seu san-gue a qualquer pessoa, mas só podem re-

ceber sangue do grupo O, são chamadasdoadores universais. As pessoas com Rhpositivo, só podem doar e receber sanguede outro Rh positivo. Quem tem Rh nega-tivo, pode doar para um Rh positivo, massó pode receber Rh negativo. O verdadei-

ro doador universal é o tipo O Rh negati-vo, que pode ser administrado a qualquergrupo sanguíneo, com qualquer tipo de fa-tor Rh. O diagrama da figura 6.7 mmostrao sentido em que as transfusões podem serfeitas, segundo os diferentes grupos sanguí-neos do sistema ABO.

REAÇÕES ÁS TRANSFUSÕESAntes de se fazer uma transfusão de

sangue, é necessário determinar o gruposanguíneo do receptor e do doador e fa-

zer a “prova cruzada”, ou seja testar o re -sultado da mistura do soro do receptorcom o sangue do doador. A ocorrência deaglutinação das hemácias indica incom-patibilidade.

As reações às transfusões por incom-patibilidade de grupos sanguíneos, inclu-em a hemólise dos eritrócitos, que pode serintensa, reações alérgicas de diversos gráuse, ao choque anafilático.

Outro tipo de reação às transfusões é a

insuficiência renal aguda, que, nessas cir-cunstâncias, se acompanha de mortalida-

O AB

A

B

Grupo O: doador universal

Grupo AB: receptor universal

Orientação das transfusões de sangue

Fig. 6.7. Diagrama que representa o sentido em que astransfusões de sangue são possíveis entre os diferentes

indivíduos. Os indivíduos do grupo O, apenas podemreceber o sangue do seu próprio grupo sanguíneo,porémpodem doas para os demais, A, B e AB. Os indivíduos dogrupo A, podem doar para o mesmo grupo e para o grupoAB, bem como podem receber do grupo O. Os do grupo B,podem doar para o mesmo grupo e para o grupo AB; podemcontudo, receber do grupo O. Finalmente, os indivíduosdo grupo AB podem doar apenas para os indivíduos domesmo grupo e podem receber dos demais grupos.

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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE

de superior a 50%. A insuficiência renal agu-

da é causada pela reação antígeno-anticor-po, com liberação acentuada de substân-cias tóxicas que produzem intensa vaso-constrição renal. A hemólise dos eritrócitoscirculantes, a queda da pressão arterial, ofluxo renal reduzido e o débito urináriobaixo, acompanham o quadro clínico. Avasoconstrição renal e o choque circula-tório agem em conjunto, na origem da in-suficiência renal.

As reações anafiláticas são o resultado

da ação das proteinas plasmáticas do doador,mas, algumas vezes, podem ser devidas aosanticorpos do receptor que reagem com osleucócitos do sangue transfundido, liberan-do inclusive a histamina dos basófilos.

TRANSMISSÃO DE DOENÇASPELAS TRANSFUSÕES

As transfusões de sangue ou dos seuscomponentes não são procedimentos isen-tos de riscos. A transfusão de sangue cole-

tado de portadores de diversas doençaspode contaminar os indivíduos receptoresdas transfusões. Numerosas doenças po-dem ser transmitidas pelas transfusões, dasquais as mais importantes são as diversasformas de hepatites e outras viroses, malá-ria, doença de Chagas, sífilis e AIDS ouSIDA (Síndrome da ImunodeficiênciaAdquirida), além de citomegalovirus eretroviroses transmitidas pelos vírus

HTLV-I e HTLV-II, dentre outras. A trans-missão da doença de Creutzfeldt-Jacob,popularmente conhecida como uma vari-ante do “mal da vaca louca” em seres hu-manos é objeto de numerosos estudos,principalmente na Inglaterra.

Alguns indivíduos são portadores dosagentes causadores das doenças, mas nãoapresentam os seus sintomas ou sinais. Sãochamados de portadores sadios. Quando osangue destes portadores é doado, transmi-te a doença ao receptor, quase sempre deuma forma aguda e de evolução rápida.

É imprescindível verificar a presençadaquelas doenças, antes de liberar o san-gue para a doação. Os portadores de vírusou outros agentes infecciosos não podemser doadores, em nenhuma circunstância.

Os doadores de sangue, em nossomeio, são habitualmente testados para apresença de malária, doença de Chagas,hepatites A, B,C e D, sífilis, e a presençado vírus HIV, causador da AIDS.

Na atualidade, a grande preocupaçãocom a transmissão de doenças por inter-médio das transfusões, está diretamente re-lacionada aos riscos da transmissão do ví-rus da imunodeficiência adquirida (HIV)e outros não menos graves. A contamina-

ção via transfusões, nos anos oitenta, viti-mou uma grande quantidade de hemofíli-cos e outros receptores, em todo o mundo.O vírus, aparentemente, pode permanecerno organismo por vários anos, sem quehajam manifestações da doença. Em de-terminadas circunstâncias, contudo, adoença pode se manifestar muito rapi-damente, após a transfusão do sangueinfectado pelo vírus.

Os elevados riscos da transmissão dedoenças pelas transfusões, tem estimuladoas equipes ao desenvolvimento de proto-colos especiais, visando à redução do usode sangue, durante a cirurgia e a circula-ção extracorpórea.

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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA

CUIDADOS NA CIRCULAÇÃOEXTRACORPÓREA

Nos dias atuais há uma extraordináriatendência à eliminar o uso de sangue ou,pelo menos, reduzir o seu emprego na mai-oria dos procedimentos cirúrgicos de gran-de porte.

Os cuidados com o manuseio do san-gue, visam proteger não apenas os pacien-tes, mas também os profissionais que par-ticipam dos procedimentos.

Todos os indivíduos que manuseiam

sangue, devem se precaver contra a possi-bilidade de transmissão de doenças. Ashepatites B, C e D, por exemplo, tem con-taminado incontáveis profissionais, entrecirurgiões, perfusionistas e enfermeiros decentro cirúrgico. Nos dias atuais, é alta-mente recomendável a vacinação preven-tiva de todo o pessoal do ambiente hospi-talar, contra a hepatite B. O uso de luvasde látex além da máscara facial, pelos per-fusionistas, é eficaz na prevenção contra a

inoculação acidental de agentes do sanguedos pacientes. As luvas devem ser usadasnão apenas durante o preparo do materiale da perfusão, mas durante todo o tempode contato com os equipamentos, até o seudescarte final.

Em um estudo publicado em 1988,Williams e cols. relatam a incidência de25% de infeccão de cirurgiões pelo vírusda hepatite B. Fry, em 1993 discutiu a esti-

mativa de 250 óbitos dentre o pessoal hos-pitalar, no ano de 1992, em conseqüênciade infecção por hepatite B. Kurusz, em re-cente pesquisa nos Estados Unidos, encon-trou que 4,6% do total de perfusionistasem atividade contrairam doenças transmi-

tidas pelo sangue, possivelmente pelo ma-nuseio durante a perfusão.

Diversos estudos tem demonstrado aeficiência das medidas preventivas simples,para proteção do pessoal contra contami-nação acidental.

A expansão do vírus HIV exigiu a in-trodução de novas rotinas de cuidados noambiente hospitalar, que privilegia a pro-teção do pessoal que tem contato com ospacientes.

Além dos cuidados gerais contra o cru-

zamento de infecções, em casos de cirur-gia de pacientes portadores do vírus HIV,recomenda-se, ao final do procedimento eantes do descarte dos equipamentos, cir-cular no oxigenador, cardiotomia e circui-tos usados, uma solução de formaldeido a10%, com o objetivo de esterilizar o mate-rial que vai ser desprezado. Esta medida éum importante complemento na proteçãocontra infecção acidental do pessoal res-ponsável pelo manuseio do lixo hospitalar.

HEMOSTASIA E COAGULAÇÃODO SANGUE

Normalmente o sangue flui no orga-nismo em contato com o endotélio vascular.A fluidez do sangue depende, além da in-tegridade do endotélio, da velocidade dofluxo sanguíneo, do número de células san-guíneas circulantes e, possivelmente, dapresença de heparina como anticoagulan-

te natural, produzido pelos mastócitos.Quando o sangue sai do interior dosvasos, perde a fluidez, torna-se viscoso eem pouco tempo forma um coágulo que,posteriormente se retrái, organiza ou dis-solve. Este é o fenômeno normal da

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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE

hemostasia, que consiste de um conjuntode fenômenos que visam interromper aperda continuada de sangue.

Existem três mecanismos principais,que se destinam a interromper a perda desangue através de um vaso lesado, e queconstituem os alicerces da hemostasia. Es-ses mecanismos são: resposta vascular, ati-vidade plaquetária e coagulação do sangue.

1. RESPOSTA VASCULAR 

Quando um vaso sanguíneo é lesado,

ocorre imediata contração da sua parede,que reduz o fluxo de sangue no seu interi-or, na tentativa de interromper a perda desangue. A redução de calibre do vaso re-sulta da contração das suas fibras muscu-lares e o espasmo vascular local pode du-rar até 20 ou 30 minutos.

Os tecidos injuriados liberam diversassubstâncias, como serotonina, histamina ea tromboplastina tissular, modernamentedenominada fator tissular, capaz de atuar

nas duas vias da coagulação. Localmente,a serotonina induz vasoconstrição que con-tribui para a eficiência do mecanismovascular da hemostasia. Tanto a serotonina,como a histamina, se liberadas em grandesquantidades, são absorvidas e, na circula-ção sistêmica tem efeito vasodilatador, quetende a reduzir a pressão arterial e, em con-seqüência minimizar a perda sanguínea.

2. ATIVIDADE PLAQUETÁRIAQuando as plaquetas ou trombócitos

entram em contato com os tecidos, no vasolesado, aderem à região da injúria e agre-gam-se a outras plaquetas, formando umtampão plaquetário, que busca obstruir a

lesão vascular. A primeira reação das pla-quetas em contato com superfícies nãorevestidas por endotélio, mesmo que denatureza biológica, é a adesão. Aquele con-tato ativa as plaquetas que, imediatamen-te, aderem à superfície não endotelial. Aseguir, as plaquetas entumescem, assumemformas irregulares com prolongamentos oupseudópodos, tornam-se pegajosas, secre-tam e liberam grandes quantidades deenzimas, difosfato de adenosina (ADP) etromboxano A2. A presença da trombina

contribui para acelerar a agregação das pla-quetas, enquanto o tromboxano A2 atuasobre as plaquetas próximas, agregando-asàs plaquetas anteriormente ativadas, paraformar o grumo ou tampão. A serotoninaliberada pelas plaquetas, contribui paramanter a vasoconstrição. A conversão dotrifosfato de adenosina em difosfato, libe-ra energia para manter a agregação das pla-quetas. O fator IV plaquetário inibe a ati-vidade anticoagulante da heparina, para

preservar o grumo e permitir a formaçãodo coágulo.

3. FORMAÇÃO DO COÁGULO

O mecanismo hemostático final seconstitui na modificação das proteinas doplasma para a formação do coágulo no lo-cal da injúria do vaso, interrompendo aperda de sangue. Substâncias da paredevascular lesada, das plaquetas, como o fa-

tor III plaquetário, e proteinas plasmáticasaderem à parede vascular lesada, inician-do o processo de coagulação do sangue. Aformação do coágulo é resultado de com-plexas alterações de um conjunto de pro-teinas do plasma, cuja etapa final é a trans-

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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA

formação do fibrinogênio em fibrina. Afibrina é a matriz proteica do coágulo, queforma um emaranhado semelhante à umarede, em que ficam retidas as plaquetas eas células vermelhas que participam do co-águlo formado.

O conjunto de proteinas plasmáticasque determinam a formação do coágulo échamado sistema de coagulação.

Após a sua formação, o coágulo sofreum processo de organização, que consistena invasão por fibroblastos que formarão

tecido conjuntivo cicatricial ou, simples-mente pode ser dissolvido, como resultadoda ação de enzimas proteolíticas. Em ge-ral, ambos os mecanismos ocorrem; o maisprecoce é a lise ou dissolução de parte docoágulo, enquanto a sua organização com-pleta em tecido conjuntivo fibroso, demo-ra de 5 a 10 dias.

SISTEMA DE COAGULAÇÃOA hemostasia natural envolve meca-

nismos vasculares, plaquetários e das pro-teinas plasmáticas, atuando em sinergiapara interromper a perda de sangue atra-vés um vaso seccionado. Durante os pro-cedimentos cirúrgicos a hemostasia é obti-da por meios mecânicos e térmicos, comoa ligadura dos vasos seccionados ou a co-agulação com o termocautério.

A coagulação do sangue, cuja etapa fi-nal é a conversão do fibrinogênio em

fibrina, envolve a participação de um gran-de número de substâncias, possivelmentemais de trinta, identificadas no sangue enos tecidos. Algumas dessas substânciaspromovem a coagulação e são denomina-das pró-coagulantes enquanto outras, ini-

bem a coagulação, sendo denominadasanticoagulantes. Em condições normais,predomina a ação das substâncias antico-agulantes e o sangue circulante não coa-gula. Quando, entretanto, um vaso se rom-pe, a atividade dos pró-coagulantes na árealesada torna-se predominante e se desen-volve um coágulo.

De uma maneira simplificada, podemosdizer que a formação do coágulo ocorre emtrês etapas principais: a. um complexo desubstâncias, denominado ativador da

 protrombinaé formado, em resposta à roturade um vaso, b. o ativador da protrombinapromove a conversão da protrombina em

trombina, e c. a trombina atua como umaenzima, para converter o fibrinogênio em

 filamentos de fibrina, que retém as plaquetas,hemácias e plasma, formando o coágulopropriamente dito.

A formação do coágulo de fibrina éiniciada pela ativação de um grupo de pro-teinas do sangue, que constituem um sis-

tema complexo e não inteiramente conhe-cido, denominado sistema de coagulaçãodo sangue. O sistema de coagulação funci-ona “em cascata”, mediante reações emcadeia, em que uma reação desencadeia ouacelera a reação seguinte.

As proteinas da cascata da coagulação,circulam continuamente no sangue e sãoconhecidas como fatores da coagulação . Es-ses fatores são representados internacional-

mente por algarismos romanos. Reagem emcadeia, em uma determinada seqüência,diferente da sua seqüência numérica querepresenta a ordem em que os fatores fo-ram descobertos. A tabela 6.7, lista os fa-tores da coagulação pela ordem numérica,

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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE

com os nomes pelos quais são mais conhe-cidos. Note que a relação não inclui o fa-tor VI, que ainda não foi descrito.

Tradicionalmente a coagulação do san-gue tem sido estudada de um modo simpli-ficado, para favorecer a compreensão des-se fenômeno de alta complexidade. Os me-canismos da coagulação do sangue,conforme a natureza do estímulo desenca-deador, tem sido propostos como se ocor-ressem seguindo duas vias distintas, conhe-cidas como via intrínseca e via extrínseca,

capazes de serem ativadas simultânea ouseparadamente, convergindo ambas parauma via terminal comum que consiste naformação do coágulo. A coagulação, con-tudo, na prática ocorre de um modo bas-tante diferente e as vias intrínseca e ex-trínsecas são interdependentes e sem limi-tes tão precisos quanto se aceitava, atéalguns anos passados. O fator tissular (FT)é o desencadeador do fenômeno da coa-gulação e pode atuar sobre fatores da coa-

gulação tanto da via intrínseca quanto davia extrínseca.

A via mais comum é a via extrínseca,que ocorre pela lesão de vasos sanguíneosou à partir de estímulos tissulares. Na via

extrínseca, uma substância dos tecidos, atromboplastina (FT) é liberada no local dainjúria do endotélio vascular e desencadeiaas reações da coagulação. A tromboplastinatecidual ou fator III, se combina com o fa-tor VII (acelerador da conversão daprotrombina do soro), na presença do fa-tor IV (cálcio), para ativar o fator X (Stuart-Prower), conforme o diagrama da

figura 6.8.A via intrínseca envolve a ativação deum fator existente no sangue, o fatorHageman (fator XII), também conhecidocomo fator de ativação pelo contato. Estefator se ativa ao contato com qualquer su-perfície que não seja o endotélio vasculare, em seguida ativa o fator XI. Ambos osfatores forçam a ativação do fator IX que,por uma vez ativado, converte o fator VIII

Tabela 6.7. Fatores da coagulação do sangue.

Fig. 6.8. Representa a via extrínseca da coagulação dosangue à partir da estimulação pela tromboplastinatissular.

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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA

(fator anti-hemofílico) à sua forma ativa,que forma um complexo com o cálcio e umfosfolipídeo (fator plaquetário III). Estecomplexo do fator VIII, cálcio e ofosfolipídeo, ativa o fator X (Fig. 6.9).

As vias extrínseca e intrínseca de ati-vação da coagulação iniciam-se à partir deestímulos diferentes, mas convergem naativação do fator X. O resultado da ativa-ção da via extrínseca ou da via intrínsecaé o mesmo, a presença do fator X ativado.A via extrínseca é mais veloz que a intrín-

seca. À partir da ativação do fator X, ambasas vias, extrínseca e intrínseca, seguem amesma via comum de estimulação, até aformação do coágulo final (Fig. 6.10).

O fator X ativado, juntamente como fator V (pró-acelerina), o fator IV (Cál-cio) e o fosfolipídeo convertem o fator II(protrombina) em trombina. A trombinaestimula uma série de reações, como aagregação plaquetária, a liberação deserotonina, ADP e do fator plaquetário

IV. Contudo, a ação mais importante datrombina ocorre sobre o fator I (fibrino-gênio). A trombina fragmenta o fibrino-gênio em um monômero da fibrina e doisoutros peptídeos, os fibrinopeptídeos Ae B. Os monômeros da fibrina se unempara formar os filamentos de fibrina, atra-vés a polimerização. Os filamentos defibrina aderem entre sí, estimuladas pelofator XIII, o fator estabilizador da fibrina,que exige a presença da trombina e docálcio. A malha de fibrina resultante, en-

globa plaquetas, hemácias e plasma, for-mando o coágulo definitivo. A antitrom-bina III (ATIII) é um inibidor datrombina circulante e contribui para im-pedir a polimerização da fibrina.

As plaquetas retidas no interior doscoágulos liberam certas substâncias pró-coagulantes. À medida que o coágulo seretrai, as bordas dos vasos sanguíneos rom-pidos aproximam-se, para o final dahemostasia.

Fig. 6.9. Representa a via intrínseca da coagulação dosangue, à partir da ativação pelo fator XII (Hageman).

Fig. 6.10. Representa a via comum da coagulação dosangue, à partir da ativação do fator X (Stuart-Power). Oestímulo ativador inicial pode ter percorrido a viaextrínseca, a via intrínseca ou ambas as vias. A coagulaçãosempre ocorre através aquelas vias, independente danatureza do estímulo inicial.

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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE

Uma vez formado, um coágulo san-guíneo pode se estender ao sanguecircundante, ou seja, o próprio coágulopode iniciar um ciclo vicioso para pro-mover mais coagulação. Uma das causasdesse fenômeno é a ação proteolítica datrombina sobre diversos outros fatores dacoagulação, além do fibrinogênio. Atrombina possui um efeito proteolítico di-reto sobre a protrombina, que induz a for-mação de mais trombina. Isto não ocor-re regularmente no interior dos vasos por-

que o fluxo sanguíneo remove a trombinae outros pró-coagulantes, liberados du-rante o processo de coagulação, comgrande rapidez. Contudo, pode ocorrercom sangue extravasado para o pericárdioou para o mediastino.

O sistema fibrinolítico, que dissolve oscoágulos formados é incorporado ao siste-ma de hemostasia. A fibrinólise (dissolu-ção do coágulo) depende do plasminogê-nio ou da pró-fibrinolisina, uma globulina

que, quando ativada, transforma-se emplasmina. A plasmina é uma enzima quedigere o filamento de fibrina e outras subs-tâncias como o fibrinogênio, o fator V, ofator VIII, a protrombina e o fator XII.

A heparina atua no sistema de coagu-lação, impedindo a ação da trombina so-bre o fibrinogênio, mediante a formação deum complexo heparina-antitrombina III.

O sistema fibrinolítico é de extraordi-

nária importância na delimitação da for-mação de trombos intravasculares; é ati-vado ao mesmo tempo que a cascata decoagulação. O ativador tissular do plasmi-nogênio (t-Pa) é sintetisado pelas célulasendoteliais e funcionam como o principal

ativador do plasminogênio. Esse mecanis-mo é de grande importância na manuten-ção do equilíbrio entre as forças que ten-dem a produzir coagulação e as que ten-dem a impedi-la.

DOENÇAS HEMORRÁGICASExistem doenças que afetam os siste-

mas da hemostasia ou da coagulação e pre-dispõem os seus portadores a fenômenoshemorrágicos espontâneos ou desencade-ados por procedimentos cirúrgicos. Alte-

rações do fígado podem produzir deficiên-cia de vitamina K e produzir hemorragias,em circunstâncias semelhantes. As princi-pais alterações da coagulação e dahemostasia são:

1. Deficiência de vitamina K2. Hemofilia3. TrombocitopeniaAlgumas doenças hepáticas podem

diminuir a formação de protrombina edos fatores VII, IX e X. A vitamina K é

sintetizada por bactérias no aparelhogastro-intestinal. A deficiência da vita-mina K ocorre como resultado de absor-ção insuficiente de gorduras e da vita-mina, pelo aparelho gastrointestinal. Adiminuição ou a ausência de bile impe-dem a digestão e a absorção pelo apare-lho gastrointestinal. Por essas razões, asdoenças hepáticas podem diminuir a pro-dução de vitamina K. Em um paciente

com deficiência de vitamina K, quandoseu fígado tem, pelo menos metade dafunção normal, a administração de vita-mina K, pode promover a formação defatores da coagulação em deficit no san-gue circulante.

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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA

HEMOFILIA

Alguns tipos de deficiências hereditá-rias da coagulação, que causam sangramen-to excessivo são as hemofilias. Cerca de83% das pessoas que apresentam síndromehemofílica, tem deficiências do fator VIII.Deficiências do fator XI são apontadas em2% daqueles indivíduos.

Modernamente consideram-se três ti-pos de hemofilias. A hemofilia clássica,conhecida como hemofilia A, que ocorreno sexo masculino é devida à deficiência

da atividade hemostática do fator VIII. Ahemofilia B resulta da deficiência do fatorIX, enquanto a deficiência do fator XI dacascata da coagulação produz a hemofiliaC, que é a forma mais rara.

TROMBOCITOPENIA

Trombocitopenia corresponde à redu-ção do número de plaquetas (trombócitos)em circulação no sangue periférico. Estaalteração predispõe os indivíduos à peque-

nas hemorragias em todos os tecidos docorpo. Estas hemorragias, em geral, provémdos capilares e não dos vasos maiores, comona hemofilia. A maior parte das pessoas quepossuem trombocitopenia, desenvolveanticorpos específicos que destroem as pla-quetas. Em alguns casos, esses anticorposapareceram em conseqüência de transfu-sões de sangue recebidas, porém, em geral,a causa mais comum está relacionada à

alterações auto-imunes, que favorece o de-senvolvimento de anticorpos contra as pró-prias plaquetas.

A lesão da medula óssea por irradiação,a aplasia da medula por hipersensibilidade amedicamentos e a anemia perniciosa, podem

também produzir grande diminuição no nú-mero de plaquetas, abaixo do nível mínimonecessário à hemostasia adequada.

Algumas crianças portadoras de cardi-opatias congênitas cianóticas, com gráuselevados de poliglobulia e hematócrito su-perior a 60%, podem apresentam distúrbi-os da coagulação. Nestes casos, com freqü-ência coexiste redução da concentração dealguns dos fatores da coagulação. Estasdeficiências tornam-se manifestas imedi-atamente após a circulação extracorpórea.

Algumas vezes, embora o número deplaquetas circulantes seja normal, a suafunção é deficiente. Esta condição é co-nhecida como trombastenia. Moderna-mente a aspirina e uma variedade crescentede agentes farmacológicos inibem as pro-priedades de adesão plaquetária, como pre-venção das tromboses, resultando em umfenômeno semelhante à trombastenia.

TRANSPLANTES COM E

SEM COMPATIBILIDADE ABOO transplante de órgãos pode ser

considerado um dos grandes avanços daciência médica do século XX. Não poracaso, dentre os principais ganhadoresdo Prêmio Nobel incluem-se alguns dospesquisadores e pioneiros das técnicas detransplante de órgãos. O grande fascínioexercido pelos transplantes de órgãosdeve- se ao fato de que a técnica pode ser

aplicada a uma variedade de órgãos, con-tribuindo para a recuperação funcionalde indivíduos que, de outra forma, esta-riam condenados à morte ou à uma exis-tência com severas limitações.

A atual pletora de conhecimentos e

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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE

potenciais aplicações das células-troncototipotenciais (embrionárias) tem desvi-ado as atenções da comunidade científi-ca para os transplantes de tecidos e deórgãos e, conseqüentemente, tem estimu-lado a busca de doadores compatíveis oua busca de métodos capazes de minimi-zar os efeitos das pequenas incompatibi-lidade que, naturalmente, são decorren-tes da necessidade de aproveitar-se aomáximo o sempre escasso número dedoadores disponíveis.

O transplante de órgãos tornou-se umamodalidade de tratamento de pacientesportadores de diversas doenças, em seus es-tágios terminais. Vários tipos de transplan-tes de órgãos são feitos com grande mar-gem de sucesso enquanto outros transplan-tes são tecnicamente mais complexos oudependem de uma compatibilidade quaseabsoluta para que não haja rejeição. A bar-reira imunitária, contudo, ainda constituio grande obstáculo, à aceitação dos órgãos

transplantados. Uma linha de drogas anti-rejeição procura “domar” a acentuada ati-vidade do sistema de defesa do organismoque interpreta o órgão transplantado comoum “agente agressor ou invasor”.

TRANSFUSÃO (TRANSPLANTE)DE SANGUE

O transplante mais realizado no mun-do é o transplante de tecidos sangue-san-

gue, ou seja, a transfusão de sangue entredois indivíduos, doador e receptor. A com-patibilidade exigida refere-se exclusiva-mente aos sistemas de antígenos ABO eRh. Recomenda-se sempre transfundirsangue do mesmo tipo, exceto em circuns-

tâncias especiais, cada vez mais raras. Asincompatibilidades de outros sistemas san-guíneos são detectadas pelas provas cruza-das. A grande disponibilidade de doadores,em relação aos demais transplantes, fazcom que um doador compatível seja en-contrado com grande facilidade.

Ao contrário do que ocorre com acórnea, os órgãos vascularizados e habitu-almente transplantados, como coração,pulmão, pâncreas, rim e fígado, represen-tando os principais, requerem uma avalia-

ção completa do doador, em busca de do-enças capazes de serem transmitidas ao re-ceptor. Além disso, a remoção dos órgãos aserem transplantados apenas pode ser fei-ta após a constatação da morte cerebralque requer uma bateria de exames e avali-ações neurológicas por um grupo de espe-cialistas, conforme um protocolo definidopela legislação específica.

Em linhas gerais podemos dizer que umpotencial doador deve preencher os se-

guintes critérios:Não apresentar insuficiência orgânica

que comprometa a função dos órgãos outecidos que possam ser doados, como in-suficiência renal, hepática, cardíaca, pul-monar, pancreática e medular;

Não apresentar doenças infecto-con-tagiosas transmissíveis por meio do trans-plante, como soropositivos para HIV, he-patite C, doença de Chagas, etc...

Não apresentar sepsis ou falência múl-tipla de órgãos;Não apresentar neoplasias, exceto tu-

mores restritos ao sistema nervoso central,carcinoma de pele;

Não apresentar doenças degenera-

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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA

tivas crônicas e com caráter de trans-missibilidade.

A compatibilidade sanguínea (sistemaABO) e a compatibilidade tissular (histo-compatibilidade) são condições essenciaispara o sucesso de um transplante de ór-gãos, ainda que, em alguns centros e paradeterminados transplantes, o protocolo sejaresumido apenas à tipagem ABO e ao usoprévio e posterior de potentes drogasimunosupressoras. Esse, em verdade, é ocaso mais comum na maioria dos centros,

devido às dificuldades logísticas para fazero encontro do melhor receptor para o do-ador disponível.

No caso do transplante renal, com do-ador vivo, além da compatibilidade ABO,são realizadas a prova cruzada HLA e atipagem HLA em seis loci, A, B e DR. Nocaso de doadores aparentados usa-se tam-bém a cultura mista de linfócitos. Nestecaso geralmente é escolhido aquele que,gozando de boa saúde, apresente melhor

compatibilidade imunológica.Quando se trata de um doador cadá-

ver, são necessárias a tipagem ABO e a au-sência de anticorpos linfotóxicos, eviden-ciada através da prova cruzada HLA comlinfócitos T e B. O receptor que apresen-tar o perfil de antígenos mais aproximadodo perfil do doador será o receptor maisadequado para o transplante.

Em todos os casos é indispensável a co-

bertura do receptor com um esquema far-macológico capaz de suprimir as defesasimunológicas e, desse modo, tornar impro-vável a rejeição. Várias combinações dedrogas incluem glicocorticoides, ciclospo-rina e outros agentes imunosupressores.

O sistema de antígenos que determinaa histocompatibilidade é genericamentedenominado HLA, sigla derivada deHuman Leukocyte Antigens. Correspon-de à uma série de antígenos presentes nascélulas brancas do sangue (leucócitos) enas células dos demais tecidos.

O sistema HLA possui mais de 100genes, que são responsáveis pela presençade antígenos HLA na superfície da mem-brana de nossas células. A tipagem de te-cidos é o nome dado ao teste que identifi-

ca as características do sistema HLA. Estatipagem é fundamental para as pessoas querecebem transplantes de órgãos.

Os conjuntos de HLA são herdados dosnossos pais, portanto, é possível identificarqual conjunto de informações são proveni-entes do pai e qual conjunto é herdado damãe, se a tipagem for realizada para a família.

Os antígenos mais freqüentementeanalisados são representados por letras, (A,B, C)/(G, H, I).

É possível que entre os seus familiares(avós, tios, sobrinhos, etc..) você encontrealgum indivíduo com características do sis-tema HLA semelhantes ao seu. Entre in-divíduos sem graus de parentesco, aschances de encontrar-se característicassemelhantes do sistema HLA variam en-tre 1:100 e 1:100.000.

TRANSPLANTES SEM

COMPATIBILIDADE ABOO transplante cardíaco em crianças,especialmente, neonatos portadores de le-sões de extrema gravidade, como é o casoda hipoplasia do coração esquerdo, algu-mas vezes apenas podem sobreviver por um

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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE

curto período de tempo. Nesses casos, es-sas crianças ou são colocadas em sistemasde suporte circulatório temporário, en-quanto aguardam um doador compatívelou sucumbem à sua doença.

A disponibilidade de doadores nessafaixa etária é mínima. Além dessa restri-ção a necessidade de compatibilidadeABO e tissular costumam inviabilizar umasubstancial parcela dos poucos transplan-tes possíveis.

Com o objetivo de otimizar o aprovei-

tamento dos poucos doadores existentes,algumas equipes de cirurgia cardíaca op-taram por realizar os transplantes indepen-dentemente de compatibilidade de qual-quer natureza. Assim, a compatibilidadeABO deixa de ser um pré-requisito essen-cial para a realização do transplante.

Essa conduta tem oferecido bons resul-tados iniciais. A incidência de rejeição émaior do que quando a compatibilidadeABO é respeitada mas, apesar disso, um

maior número de vidas podem ser salvas,devido ao melhor aproveitamento dos pou-cos órgãos disponíveis para os muitos re-ceptores das listas de espera.

TESTES DE COAGULAÇÃODO SANGUE

A perfusão, com alguma freqüência seacompanha de dificuldades com ahemostasia e a coagulação, mesmo após aneutralização adequada da heparina admi-nistrada para o procedimento. Esta tendên-cia à hemorragia pós-perfusão é maior nascrianças de baixo peso, ocorrendo, contu-do, em qualquer faixa etária.

A cirurgia cardíaca com circulação ex-tracorpórea requer o estudo pré-operató-

rio da coagulação do sangue. Os testes maiscomumente usados, são os tempos de coa-gulação e sangramento, contagem de pla-quetas, tempo e atividade de protrombinae tempo parcial de tromboplastina. A ati-vidade de protrombina mínima aceitávelpara uma coagulação adequada, após a cir-culação extracorpórea, corresponde aaproximadamente 75 a 80% do normal.

O conjunto de testes acima listados,constitui um bom rastreamento de defici-

ências qualitativas da hemostasia e da co-agulação. Valores anormais de qualquerdos testes, indicam a necessidade de estu-dos mais detalhados da coagulação e ava-liação por especialistas.

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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA

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