FACULDADE DE ENSINO SUPERIOR DA PARAÍBA-FESP...

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FACULDADE DE ENSINO SUPERIOR DA PARAÍBA-FESP CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO THAYNÁ ASSUNÇÃO FERREIRA BATISTA JUSTIÇA RESTAURATIVA E SUA APLICAÇÃO NOS CRIMES DE HOMICÍDIO CULPOSO CABEDELO- PB 2017

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FACULDADE DE ENSINO SUPERIOR DA PARAÍBA-FESP

CURSO DE GRADUAÇÃO EM DIREITO

THAYNÁ ASSUNÇÃO FERREIRA BATISTA

JUSTIÇA RESTAURATIVA E SUA APLICAÇÃO NOS CRIMES DE HOMICÍDIO

CULPOSO

CABEDELO- PB

2017

THAYNÁ ASSUNÇÃO FERREIRA BATISTA

JUSTIÇA RESTAURATIVA E SUA APLICAÇÃO NOS CRIMES DE HOMICÍDIO

CULPOSO

Trabalho de Conclusão de Curso em forma de Artigo

científico apresentado à Coordenação do Curso de

Bacharelado em Direito, pela Faculdade de Ensino

Superior da Paraíba – FESP, como requisito parcial para

a obtenção do título de Bacharel em Direito.

Área: Direito Penal

Orientador: Prof. Esp. Pablo Juan Nobrega de Sousa da

Silveira.

CABEDELO-PB

2017

A reprodução total ou parcial deste documento só será permitida exclusivamente para fins acadêmicos e científicos desde que seja referenciado, autor, titulo instituição, e ano de sua

publicação.

B333j Batista, Thayná Assunção Ferreira.

Justiça restaurativas e sua aplicação nos crimes de homicídio culposo / Thayná Assunção Ferreira Batista. – Cabedelo, 2017.

32F Orientador: Profº Esp. Pablo Juan Nóbrega de Sousa da Silveira.

ARTIGO CIENTÍFICO (GRADUAÇÃO EM DIREITO) FACULDADE DE ENSINO SUPERIOR DA PARAIBA.

1. Justiça. 2. Restaurativa. 3. Delito. I. Título.

BC/FESP CDU: 343

THAYNÁ ASSUNÇÃO FERREIRA BATISTA

JUSTIÇA RESTAURATIVA E SUA APLICAÇÃO NOS CRIMES DE HOMICÍDIO

CULPOSO

Artigo Científico apresentado à Banca Examinadora de

Artigos Científicos da Faculdade de Ensino Superior da

Paraíba – FESP, com exigência para a obtenção do grau

de Bacharel em Direito.

APROVADO EM _____/_______2017

BANCA EXAMINADORA

_______________________________________

Prof.Esp. Pablo Juan Nóbrega de Souza da Silveira

ORIENTADOR - FESP

________________________________

Prof° Ms. Roberto Moreira de Almeida

MEMBRO - FESP

__________________________________

Prof° Esp. Gabriela Henriques da Nóbrega

MEMBRO – FESP

A Deus por ter permitido o alcance deste projeto.

Dedico

AGRADECIMENTOS

Aos meus pais, pela educação que me deram para a vida.

A minha avó, Assunção e ao meu Tio Irajá, que sempre me apoiaram em tudo que

sempre almejei e que em toda minha jornada acadêmica sempre prestaram todo apoio para

que eu conseguisse conquistar meus objetivos.

Ao meu orientador, Prof° Pablo Juan, pelo apoio, compreensão, boa vontade,

sabedoria e ensinamentos ao longo do período de produção deste trabalho.

Enfim, a todos que contribuíram e torceram pela efetivação deste sonho que ora se

concretiza com a construção deste TCC.

“Só tem o direito de criticar aquele que

pretende ajudar.”

“Os princípios mais importantes podem e

devem ser inflexíveis.”

(Abraham Lincoln)

SUMÁRIO

1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS ........................................................................................ 8

2 CONCEITO E HISTÓRIA DA JUSTIÇA RESTAURATIVA .................................... 9

2.1 O PROCESSO HISTÓRICO DA JUSTIÇA RESTAURATIVA .................................... 10

2.2 A CONTEXTUALIZAÇÃO DA JUSTIÇA RESTAURATIVA ..................................... 12

3 MÉTODOS RESTAURATIVOS ................................................................................... 13

3.1 MEDIAÇÃO VÍTIMA/OFENSOR .................................................................................. 14

3.2 CÍRCULOS RESTAURATIVOS .................................................................................... 15

4 JUSTIÇA RETRIBUTIVA X JUSTIÇA RETRIBUTIVA ........................................ 16

4.1 CRISE DO SISTEMA RETRIBUTIVO ......................................................................... 18

4.2 HOMICÍDIO CULPOSO E JUSTIÇA RESTAURATIVA ............................................ 20

4.2.1 Justiça Restaurativa e a Ressocialização do Preso ..................................................... 21

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ....................................................................................... 22

REFERÊNCIAS............................................................................................................ 23

8

JUSTIÇA RESTAURATIVA E SUA APLICAÇÃO NOS CRIMES DE HOMICÍDIO

CULPOSO

THAYNÁ ASSUNÇÃO FERREIRA BATISTA

JUAN PABLO NÓBREGA DE SOUSA DA SILVEIRA

RESUMO

O presente trabalho é decorrente de pesquisa elaborada no campo da ciência criminal,

abordando como tema central a justiça restaurativa e a sua possibilidade ou não nos crimes

de homicídio culposo, enfatizando os métodos e práticas restaurativas e as várias formas de

contribuição para a vítima, comunidade o ao infrator. A metodologia adotada foi baseada em

pesquisas bibliográfica e documental, com abordagens no campo do conhecimento teórico.

Tendo como principal objetivo a reparação dos danos provenientes dos delitos causados às

partes envolvidas e, sempre que possível a reconstrução das relações rompidas. Mostra-se

como uma alternativa ao modelo retributivo, tendo em vista a necessidade por mudanças

mais profundas e concretas diante das ineficiências e deslegitimidade do sistema penal. A

pesquisa permitiu demonstrar que a justiça restaurativa é uma alternativa ao sistema de

justiça criminal, pois consiste em um paradigma não punitivo, fundado em valores, onde seu

objetivo não é o delito, mas sim o conflito conseqüente ao delito, e procura equilibrar o

atendimento às necessidades das vítimas e da comunidade com a necessidade de reintegração

do agressor a sociedade. É na justiça restaurativa que a vítima tem a oportunidade de expor

seus sentimentos e percepção relativos ao dano sofrido, e ao ofensor de conhecer o impacto

de suas ações e de eventualmente esclarecer que as conseqüências do seu ato transcenderam

a sua intenção, bem como o reconhecimento do erro.

PALAVRAS-CHAVE: Justiça Restaurativa. Delito. Crimes. Homicídio Culposo.

1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

Com o aumento nítido no número de pessoas presas e processadas criminalmente no

país e considerando que o sistema de justiça atualmente encontra-se falido, estudiosos se

esforçam em pesquisar métodos alternativos para a solução de conflitos, com o objetivo de,

oferecer outras soluções para o fato criminal.

No Brasil o modelo de justiça penal utilizado nos dias de hoje é, primordialmente, o

retributivo, isto é, corresponde o mal causado pelo infrator da norma penal aplicando uma

sanção a ela. Fora isso, frisa-se que este modelo atual não vem apresentando soluções e

Aluna concluinte do Curso de Bacharelado em Direito da Fesp Faculdade, semestre 2017.2 e-mail:

[email protected]. Advogado. Professor da FESP. Especialista em Gestão Pública, Direito Administrativo e Direito Constitucional.

Coordenador de Monitoria, Estágio do Centro de Conciliação Mediação e Arbitragem da FESP Faculdades.

.

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resultados satisfatórios, visto que, alem de ser espantoso o crescimento do número de

pessoas presas, o de reincidência é semelhantemente alarmante. Dessa forma, destaca-se a

importância deste trabalho, pois se dirige a examinar outros instrumentos para solucionar ou

enfrentar os conflitos penais, que não somente a pena.

A justiça restaurativa está ganhando destaque em vários países do mundo, bem com,

no Brasil. Através de ações do Ministério da Justiça e do Projeto de Lei 7.006/2006, por

exemplo, mostra-se a preocupação das autoridades em oferecer uma resolução eficaz na

solução de crimes para a comunidade, vítima e para os infratores da norma penal.

O objetivo deste trabalho é analisar se a justiça restaurativa se enquadra como uma

alternativa para as soluções de conflitos na área penal, em especial, nos crimes de homicídio

culposo, fazendo isso a partir da análise de todo o sistema retributivo nos dias atuais e de

suas experiências práticas no Brasil.

Para cumprir com o objetivo apresentado esse trabalho se dividirá em dois. Na

primeira parte será estudado todo o processo histórico e a contextualização da Justiça

Restaurativa, incluindo o seu conceito, modo de funcionamento, vantagens e ainda, um

estudo perfunctório acerca dos métodos possíveis para a resolução de conflitos.

Na segunda parte será feito um comparativo entre a justiça retributiva com a justiça

restaurativa, em seguida uma analise do nosso sistema atual, incluindo o conceito,

funcionamento e suas falhas, também será verificada a possibilidade da aplicação do modelo

restaurativo de justiça nos crimes de homicídio culposo.

A importância em se estudar o tema dá-se devido aos dados, que serão mostrados

neste trabalho, mostrarem a necessidade urgente de se repensar à forma de aplicação da

justiça neste país. Desta forma, é importante o estudo da justiça restaurativa para o emprego

no sistema penal de justiça brasileira, em especial sua aplicação nos crimes de homicídio

culposo, que é uma forma essencial para a ressocialização dos infratores e para uma

melhoria nas vidas das famílias envolvidas nesses conflitos.

A pesquisa foi realizada com o emprego de técnica bibligráfica e documental,

utilizando a legislação brasileira, livros, e artigos de cieníficos, em pesquisa de natureza

qualitativa, e o método utilizado foi o dedutivo, em pesquisa teórica.

2 CONCEITO E HISTÓRIA DA JUSTIÇA RESTAURATIVA

10

Por se tratar de algo novo, principalmente se comparado à justiça tradicional, é

relevante primeiro que se apresente uma definição atual e o modo como se atua a justiça

restaurativa, para que, em seguida, conheça o trajeto histórico que a consolidou.

Inicialmente, pode-se dizer que a justiça restaurativa se apresenta como um modelo

não punitivo, fundado em valores, que possui como seu objetivo principal a reparação de

danos provenientes do delito causados às partes envolvidas – vítima, ofensor e comunidade.

Para definir melhor o que é a justiça restaurativa, há uma resolução de 2002/12 do

Conselho Econômico e Social das Nações Unidas, que possui a seguinte definição:

“Programa de Justiça Restaurativa significa qualquer programa que use processos

restaurativos e objetive atingir resultados restaurativos.” e prossegue, dizendo que esses

processos restaurativos são quaisquer processos onde vítima e ofensor, assim como as

demais pessoas ou membros da comunidade que foram de alguma forma abalada pelos

conflitos em questão, ou seja:

A Justiça Restaurativa constitui-se como um conjunto ordenado e sistêmico de

princípios, técnicas e ações, por meio dos quais os conflitos que causam dano são

solucionados de modo estruturado, com a participação de vítima, ofensor, famílias,

comunidade e sociedade, coordenados por facilitadores capacitados em técnica

autocompositiva e consensual de conflito, tendo como foco as necessidades de

todos envolvidos, a responsabilização ativa daqueles que contribuíram direta ou

indiretamente para o evento danoso e o empoderamento da comunidade e

sociedade, por meio da reparação do dano e recomposição do tecido social

rompido pela infração e suas implicações para o futuro (PENIDO, 2015, P. 13).

Dessa forma, a justiça restaurativa consiste em um processo colaborativo voltado

para resolução de um conflito caracterizado como crime, que envolve uma maior

participação da vítima e do ofensor. Ressalta-se ainda, sendo um novo modelo de resolução

de conflitos, que expressa uma forma de justiça mais centrada na reparação, tendo mudanças

mais profundas e concretas frente às ineficiências do sistema punitivo, onde não visa

somente às sanções punitivas, mas busca-se então uma pacificação das relações sociais

envolvidas no conflito.

2.1 O PROCESSO HISTÓRICO DA JUSTIÇA RESTAURATIVA

A história da justiça restaurativa é um tanto controversa e relatada de diferentes

formas pelos autores. A objeção principal de se determinar qual foi o processo histórico que

antecedeu e transpassa a noção atual que se tem de justiça restaurativa tem de se, em parte,

às diversas origens do que se chamam práticas restaurativas. Desta forma, existe uma

11

diversidade de contextos histórico-culturais em que a sua atividade foi e são exercidas,

opiniões distintas de como deve ser a justiça restaurativa e que papel deve exercer na

sociedade.

Jaccoud, (2013), salienta que, desde a era pré-cristã, comunidades já se utilizavam de

práticas restaurativas, inscrito em documentos como no código sumeriano (2050 a.C), ou o

código de Hammurabi (1700 a.C.). Jaccoud, além disso, faz referência a práticas

restaurativas notado em comunidades pré-estatais presente em todos os Continentes, como os

povos da América do Sul, África, Europa, América do Norte e Nova Zelândia.

Para Barcelar, Gomes e Muniz (2015), a justiça restaurativa inseriu nos espaços

institucionais a partir da década de 70 e 80 nos Estados Unidos da América, Canadá e Nova

Zelândia, que inspirados nos costumes aborígenes e indígenas dos maoris e dos navajos,

introduziram o método usado por essas comunidades para resolver os conflitos, através dos

diálogos e com a participação de todos os atores afetados pelo problema. A partir de 1989, a

Nova Zelância fez da justiça restaurativa o centro de todo o seu sistema penal para a Infância

e Juventude. Dessa maneira, chegou à aprovação do Estatuto das Crianças, Jovens e suas

Famílias em 1989, por meio do qual:

Estendeu-se às famílias a primazia da responsabilidade pelos encaminhamentos

que seriam dados as crianças e jovens em conflito com as leis da sociedade. Disso

resultaram as chamadas reuniões de grupo familiar, das quais participavam não

apenas o adolescente em causa, e sua família, mas também os demais envolvidos,

bem como representantes das instâncias estatais, para a construção coletiva de uma

solução de conflitos que não influenciava apenas os implicados, mas a comunidade

como um todo (ORTEGAL, 2015, p. 13).

Conforme em que os primeiros trabalhos de justiça restaurativa foram mostrando

resultados positivos, o número de projetos cresceu com celeridade. Contudo o crescimento

de grupos sem supervisão passou a conceber preocupação quanto à qualidade dos trabalhos

desenvolvidos.

No Brasil, a prática da justiça restaurativa começou há aproximadamente 10 anos,

com três projetos pilotos acolhido pela Secretaria de Reforma do Judiciário (Ministério da

Justiça) e pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, nas cidades de

Brasília/DF, no Juizado Especial Criminal do Núcleo Bandeirantes; em Porto Alegre/RS,

com o Projeto “Justiça para o Século 21”, coordenado pela 3° Vara do Juizado Regional da

Infância e da Juventude, e em São Caetano do Sul/SP, com o Projeto “Justiça, Educação,

Comunidade: Parcerias para a cidadania” (PRUDENTE, 2012).

12

O Conselho Nacional de Justiça, por meio de Resolução 225, de 31 de maio de 2016,

dispôs sobre a “Política Nacional de Justiça Restaurativa no âmbito do Judiciário”. Essa

disposição se faz atento ao frustrado sistema punitivo, o qual não expõe um método eficaz

contra a violência. Ao contrário, possui um sistema caro e afanoso, que não leva à

responsabilização; não compreende a vítima em suas dificuldades; não possibilita de modo

efetivo a reparação do dano sofrido, e que com um tempo, acaba por intensificar a violência,

aumentando a fragilidade de todos os envolvidos e o desgastamento do tecido social.

(PENIDO, 2012.)

A iniciativa desta resolução se faz para alcançarmos a construção de uma política que

não conculque num sistema punitivo hierárquico, mas num sistema de real compromisso,

não meramente individual (daquele que cometeu diretamente a ofensa, mas geral (de todos

que cooperaram direta ou indiretamente para o acontecimento da ofensa) e horizontal; que

trata da vítima em suas necessidades (proveniente do impacto da violência), bem como do

ofensor; que promove a verdadeira e integral reparação do dano acarretado.

2.2 A CONTEXTUALIZAÇÃO DA JUSTIÇA RESTAURATIVA

O sistema tradicional de justiça tem foco na sanção e na apreciação da culpa, que não

ouve e nem considera a vítima, deixando de lado a acepção de responsabilização e de

reparação, tampouco buscam dar significação à punição do ofensor – alterando qualquer

noção dos envolvidos, que apontam a ter participação secundária no curso do processo.

A justiça restaurativa tem exatamente a capacidade de conceder à comunidade maior

dignidade e percepção do seu papel, visto que reconhece e trabalha nas dimensões de todos

os impactados direta ou indiretamente pelo conflito, isto é, da vítima, do ofensor e da

comunidade, da seguinte maneira:

a) Dimensão da vítima

Na dimensão da vítima a Justiça Restaurativa procura buscar o seu empoderamento,

na medida em que o conflito compromete o sentido de autonomia.

No sistema tradicional a vítima é vista apenas como objeto de prova, quando em

verdade é a principal atingida pelo conflito e deveria participar ativamente de sua

resolução.

A Justiça Restaurativa oportuniza à vítima esta participação e o conhecimento das

medidas que estão sendo adotadas para reparar o mal sofrido.

Essa dimensão (a da vítima) é essencial no processo restaurativo ainda que ocorra de

maneira indireta ou simbólica (exemplo: homicídio, em que a vítima é representada

pela família; tráfico de drogas, em que a vítima é sociedade).

b) Dimensão do ofensor

13

Na do ofensor busca incutir nele o senso de responsabilização, para que compreenda

efetivamente as consequências da sua conduta e o mal causado e contribua,

conscientemente, com a construção de mecanismos para a reparação desse mal.

O agressor não se sente responsável pelo dano quando é condenado a repará-lo por

meio de uma decisão verticalizada. Muitas vezes, sente-se vítima da sociedade

quando é condenado a reparar o dano e não percebe que a sua reparação é uma

forma de amenizar o mal.

Trabalha-se também com o ofensor o sentido de pertencimento. Para que se sinta

responsável pela resolução do conflito deve se sentir parte da comunidade que

desestruturou com a sua conduta.

Assim como a vítima, a presença do ofensor também pode ser indireta ou simbólica

(exemplo: falecimento no curso do processo).

c) Dimensão da comunidade

Na dimensão comunitária, pretende resgatar e fortalecer o senso de coletividade e o

sentimento de corresponsabilidade, no estabelecimento de inter-relações horizontais.

Em grande parte das relações conflituosas, a comunidade na qual a vítima e o

ofensor pertencem é atingida pelo conflito e deve ter a prerrogativa de colaborar na

restauração dos interessados.

A participação ativa da comunidade diminui a sensação de impunidade, que muitas

vezes decorre do desconhecimento do processo e das medidas aplicadas.

O sentimento de inoperância do Estado leva as pessoas a querer fazer “justiça com

as próprias mãos (ZEHR, 2012, p. 70).

As atividades da justiça restaurativa recomendam o envolvimento, sempre que

possível, de todos aqueles que têm interesse numa ofensa específica, em um processo de

forma geral identifica e trata os danos, deveres e obrigações desinentes da ofensa, a fim de

desenvolver o restabelecimento das pessoas e endireitar as coisas, na medida do possível

(ZEHR, 2012,).

Conforme Zehr, para as vítimas é possível conceder um sentimento de restauração,

mesmo que na esfera simbólica, possibilitando explicações para algumas questões que as

perturbam, por exemplo: Porque eu? Essa pessoa tinha alguma coisa pessoal contra mim?

Essa pessoa vai fazer novamente? Eu poderia ter feito algo para evitar me tornar vítima? Uma

diversidade de dúvidas que podem e devem ser elucidadas.

É válido considerar que a justiça restaurativa não é sinônimo de perdão ou impunidade

e, na realidade brasileira, sequer objetiva competir com as diversas formas tradicionais de

aplicação do direito. Há situações que não permite práticas restaurativas, e a solução

tradicional deve ser utilizada.

3 MÉTODOS RESTAURATIVOS

Os modelos restaurativos instituem-se em valores, procedimentos e resultados

definidos, mas presume o consentimento de ambas as partes, no caso o autor do fato e a

14

vítima. As negociações devem ser razoáveis e as obrigações feitas, devem atender ao

princípio da proporcionalidade.

Ao recepcionar as partes em conflito o facilitador tem a responsabilidade de criar um

clima de serenidade e confiança, suscitando um ambiente tranqüilo, no qual as pessoas

envolvidas consigam tratar o fato com respeito e urbanidade, evitando que a reunião se torne

um bate boca com acusações mútuas. O facilitador deverá estabelecer as condições e regras de

comportamento ao iniciar a reunião, conforme a orientação do facilitador, todos os envolvidos

terão o direito de expor suas considerações, porém sempre feito no momento oportuno.

(ZEHR, 2012)

Há diversos métodos para a prática da justiça restaurativa – como mediação

transformativa, mediação vítima-ofensor (Victim Offender Mediation), conferências

familiares (circular narrativa), conferência (Conferencing), círculos decisórios (Sentencing

Circles), círculos da pacificação (Peacemaking Circles), restituição (Restitution).

3.1 MEDIAÇÃO VÍTIMA/OFENSOR

O Prof. Marshall (2012, p.45) considera a justiça restaurativa como um sistema pelo

qual “as partes envolvidas em determinado crime, vítima e ofensor conjuntamente decidem a

melhor forma de lidar com os desdobramentos da ofensa e suas implicações futuras”.

Vale salientar que a justiça restaurativa desenvolve uma estrutura conceitual

significativamente distinta da chamada justiça tradicional ou justiça retributiva. A justiça

restaurativa ressalta a importância de enaltecer o papel das vítimas e membros da comunidade

junto aos ofensores (réus, indiciados, acusados ou autores do fato) que são de fato

responsabilizados diante as pessoas que foram vitimizadas, recompondo as perdas materiais e

morais das vítimas e dispondo de grandes oportunidades para o diálogo, negociação e acerto

de questões. Isto, quando exequível, possibilita uma maior compreensão de segurança da

comunidade, real resolução de conflitos e satisfação moral por parte dos envolvidos.

(UMBREIT, 2012.)

A mediação entre vítima e ofensor é apresentada como o primeiro modelo na

mediação. A mediação é a prática mais utilizada entre os Países que exercem a Justiça

Restaurativa. Há mais de 500 programas na Europa e mais de 300 nos Estados Unidos. As

pesquisas destes programas vêm apresentando um aprimoramento na relação vítima-ofensor, a

diminuição do medo na vítima e maior possibilidade do cumprimento do acordo por parte do

ofensor. É uma das atividades com mais tempo de aplicação, executando em alguns países

15

vinte anos de utilização (a exemplo dos Estados Unidos e Canadá), apresentando o primeiro

programa noticiado de mediação vítima-ofensor o estabelecido em 1974 em Kitchener,

Ontario- Canada, pela comunidade Mennonite (MARSHALL, 2012).

A mediação e as outras atividades não requerem, a priori, previsão legal própria para

serem usadas do âmbito penal. Propõe, apenas, dispositivos legais que acolhe as medidas a

serem usadas como a reparação-conciliação ou soluções consensuais, tirando a possibilidade

de pena ou atenuando-a.

Diante do exposto, percebe-se que a mediação consiste num encontro vítima-ofensor,

com o propósito de construir um acordo reparador, usando da mediação de um terceiro

(mediador). Atualmente, têm-se analisado a permissão do envolvimento de familiares e

amigos da vítima ou do ofensor de forma a possibilitar maior apoio emocional aos

implicados. Dessa forma a mediação retrata, portanto, uma exigência daqueles que pertencem

dela, ou, seja:

exige que os indivíduos (quer isoladamente ou como membros da sociedade)

encarem e reconheçam os interesses dos outros como condicionantes das suas

próprias acções ou omissões. Pensar activamente e respeitar os interesses dos outros

e ajustar o comportamento em conformidade não é somente um meio para atingir

um fim, mas o objectivo em si mesmo (MIERS, 2013, p. 51).

Portanto, a mediação vítima-ofensor resume-se em oferecer uma chance à vítima de

reunir-se com o ofensor num ambiente protegido e estruturado. Auxiliado por um mediador,

um e outro têm a probabilidade de construir um plano de ação para tratar o conflito e resolvê-

lo.

3.2 CÍRCULOS RESTAURATIVOS

Os círculos restaurativos são ambientes dialógicos, que tem por objetivo a resolução

não violenta de conflitos, reparação de danos, restauração de segurança e dignidade, onde

possibilita a participação de qualquer pessoa envolvida do problema, direta ou indiretamente,

independente de faixa etária, em âmbito comunitário, familiar, escolar, ligados a políticas

públicas como a de assistência social, ou espaços não governamentais, ao Sistema de Justiça e

Segurança, ou em esfera organizacional, inclusive em empresas (LIMA, 2013).

Conforme Pranes “os círculos restaurativos superam outras ferramentas mediativas

para transformação de conflitos. Pois, o fazem com o objetivo de dar suporte às partes,

16

construindo espaços para suas demandas pessoais”, ou seja, os círculos restaurativos visam ir

além do acordo, preocupam-se também em desenvolver um ambiente onde todos consigam

expressar suas necessidades mais íntimas (PRANES, 2010, p. 21).

Os círculos restaurativos mostram propósitos distintos. No mesmo contexto o autor,

cita que os círculos apresentam as seguintes modalidades: “diálogo, compreensão,

restabelecimento, sentenciamento, apoio, construção do senso comunitário, resolução de

conflito e reintegração”. Há também três etapas distintas que constituem os círculos

restaurativos, o Pré-Círculo, Círculo e Pós-Círculo. Os indivíduos ao aceitaram integrar o

círculo precisam assinar o termo de consentimento, um instrumento que comprove a

voluntariedade em adentrar dos círculos, obrigando-se a respeitar os princípios e valores

determinados (PRANES, 2010, p. 23).

Portanto, os círculos restaurativos oferecem aos envolvidos na questão uma

oportunidade de diálogo e entendimento mútuo, coordenado por um facilitador, do qual papel

não é de notoriedade, atuando de forma sutil na orientação do encontro, objetivando criar

empatia entre as partes, através da expressão de sentimentos e contação de histórias,

procurando a compreensão das necessidades atuais, as que pretendem ser atendidas e as do

tempo do fato cometido.

4 JUSTIÇA RETRIBUTIVA X JUSTIÇA RETRIBUTIVA

Atualmente o mundo enfrenta novos tempos e, neste contexto, as sociedades de todos

os países vêm encarando desafios em diversos campos das relações humanas e destas para

com o meio ambiente, desse ponto emergindo a violência e, por conseqüência, a

criminalidade, que tanto assustam as pessoas. Dentro deste cenário, aumentam os apelos e os

debates em busca de uma saída para combater a transgressão, em todos os meios de

manifestação, nas escolhas, nas famílias, nas ruas, no trânsito, entre outras.

Zehr (2012) apresenta duas formas de ver o crime, a primeira é a lente retributiva se

une basicamente na última das dimensões sociais. E o faz regressando a comunidade algo

impessoal e abstrato. A justiça retributiva descreve o estado com vítima, o comportamento

danoso com descumprimento de regras e julga irrelevante o relacionamento entre a vítima e o

infrator. Os crimes, então, estão em outra categoria, apartados dos outros tipos de dano. Já a

lente restaurativa, considera que , dessa forma identifica as pessoas como vítimas e identifica

a centralidade das dimensões inter-pessoais. Os insultos são definidos como danos pessoais e

como relacionamentos inter-pessoais. O crime é o rompimento de pessoas e relacionamentos.

17

QUADRO 1. Formas de ver o crime.

Fonte: Zerh, 2012.

Há o surgimento de um “clamor popular”, alimentado pela mídia, a premência

infindável de “respostas penais duras”, com a edição de leis que determinam punições das

mais severas aos infratores. Em outros termos, afirma-se que a única proposta viável para

extinguir os problemas relacionados às pessoas envolvidas, em casos de violência e em

conflito com a lei, seria a ampliação do poder estatal de punir.

Acontece que o paradigma punitivo – alicerce do direito penal e de vários sistemas que

determina a punição como maneira de resposta a um comportamento malquisto -, nos dias de

hoje, mais do que nunca, vem enfrentando a suas debilidades, pois não está apto a assegurar

os resultados a que se sugerem, quais seja, obstar, por um lado, que pessoas infrinjam as

normas, e, por outro, ocasionar a ressocialização daqueles que já terminaram de cumprir suas

punições, de maneira que não retornem a repetir as ações tidas por indevidas. (SALMASO,

2014.)

Portanto, é chegada a hora, de a sociedade repensar o caminho percorrido até então,

analisando sobre a “grande fé” no sistema punitivo e, ao mesmo tempo achar novas formas de

agir e pensar que, de fato, possam solucionar o problema da violência, sem retroalimentá-la, o

que passa indispensavelmente pela responsabilização consciente, pela procura da

compreensão, pelo suporte das necessidades, pelo ensejo e, sem detrimento e com prioridade,

de mudanças consideráveis nas instituições e na estrutura social.

18

4.1 CRISE DO SISTEMA RETRIBUTIVO

O sistema punitivo atual, como meio de comando social do delito, expõe notórios

sinais de fracasso. A doutrina é amena em exibir pontos cruciais de seu retrocesso,

delimitando seus critérios desiguais de aplicação. Dessa forma surgem alguns

questionamentos:

E se, no final das contas, estivéssemos diante de um fenômeno mais amplo do que o

simples mau funcionamento de um sistema punitivo? Sem aí, ao invés de reformas

pragmáticas ou de aperfeiçoamentos tópicos, estivéssemos diante do desafio de

reordenar a própria idéia de ‘Justiça Criminal’? Seria possível imaginar uma justiça

que estivesse apta a enfrentar o fenômeno moderno da criminalidade e que, ao

mesmo tempo, produzisse a integração dos autores à sociedade? Seria possível

imaginar uma justiça que, atuando para além daquilo que se convencionou chamar

de ‘prática restaurativa’, trouxesse mais satisfação às vítimas e às comunidades? Os

defensores da Justiça Restaurativa acreditam que sim (ROLIM, 2013. p. 90.).

O autor destaca a justiça restaurativa como uma via para reordenar a justiça criminal,

pois a justiça restaurativa possui um objetivo principal, no qual, preservar o convívio pacífico

entre os integrantes da sociedade é o mais importante. Para tanto, o Estado dispõe de poder

punitivo, poder este que no século XVII, a privação de liberdade era considerada como uma

possibilidade mais humana aos castigos corporais e à pena de morte. No entanto, passado

poucos anos as prisões se tornam a principal, se não o único instrumento usado pelo Estado

com intuito de realizar o ius puniendi, instrumento este que, na realidade, teria de ser usado

como ultima ratio.

Esse uso extremo e brutal da prisão, além de descumprir com as funções que

legitimam a existência da justiça criminal, fere de forma insanável os direitos e garantias de

todas as pessoas, ou seja: “A ideia de que a repressão total vai sanar o problema é totalmente

ideológica e mistificadora. Sacrificam-se direitos fundamentais em nome da competência

estatal em resolver os problemas que realmente geram a violência” (LOPES, 2013. p. 16.)

Os impactos marginalizadores do cárcere e a impossibilidade estrutural de a instituição

carcerária executar as funções que a ideologia penal lhe designa, evidenciam o fracasso do

sistema penal tradicional. Desta maneira o autor esclarece:

O desvelamento das (in)capacidades do sistema punitivo, pelas inúmeras vertentes

da crítica criminológica (contraposições dos efeitos reais e funções declaradas),

desde apresentação dos efeitos perversos gerados pela desigualdade da incidência

criminalizadora, deflagrou o desgaste e o esvaziamento em todos os modelos de

justificação, notadamente das doutrinas ressocializadoras (CARVALHO, 2012. p.

68).

19

Depois do reconhecimento da crise de legitimidade e efetividade do sistema, várias

alternativas ao encarceramento foram recomendadas e implementadas, com intuito de

diminuir e/ou conter a punição extrema, como, as penas e medidas alternativas, implantada

pela Lei n° 9.099/1995. Contudo, as alternativas aderidas somente aumentaram o campo de

operação do direito penal, mostrando um verdadeiro propósito e/ou tentativa de remendar o

paradigma punitivo, ou seja:

As populações carcerárias continuam a crescer ao mesmo tempo em que as

‘alternativas’ também crescem, aumentando o número de pessoas sob o controle e

supervisão do Estado. A rede de controle e intervenção se ampliou, aprofundou e

estendeu, mas sem efeito perceptível sobre o crime e sem atender as necessidades

essenciais da vítima e ofensor (ZEHR, 2012. p. 62).

Afirma ainda, que:

A busca de alternativas à privação de liberdade representa outra tentativa de

remendar o paradigma. Ao invés de procurar alternativas à pena, o movimento em

prol de alternativas oferece penas alternativas. Criando novas formas de punição

menos dispendiosas e mais atraentes que a prisão, seus proponentes conseguem

manter o paradigma em pé. Contudo, pelo fato de constituírem apenas outro

epiciclo, não questiona os pressupostos que repousam no fundamento da punição. E

por isso não tem impacto sobre o problema em si – a superlotação carcerária –,

problema para o qual pretendiam ser a solução (ZEHR, 2012. p. 90).

Todavia, não há como modificar a situação do sistema penal inserido em um

paradigma puramente punitivo-retributivo, no qual, pela natureza dos mecanismos existentes

(basicamente a pena), terminará sempre sobressaindo à resposta da força. E ainda com a

ineficiência do sistema penal, o mesmo resiste intacto e irredutível a todo movimento de

reforma mais profunda, passando somente por modificações superficiais, as quais unicamente

ratificam as incontáveis falências da justiça criminal.

Assim, o modelo de justiça restaurativa se mostra como um paradigma contraste à

justiça criminal, apresentando soluções às primordiais falhas e ineficiência deste, mudando os

focos e as soluções. Desse modo tem foco, atenção no ato danoso, nos danos causados aos

envolvidos: vítima, infrator, e nas possibilidades de solucionar o conflito (ZERH, 2012).

Portanto, é de extrema importância a inclusão da Justiça Restaurativa no meio da

justiça criminal, pois a defasagem do sistema retributivo é nítida em todos os campos de

justiça, onde o Estado prioriza a forma mais severa de punição, sem se preocupar com o

índice de reincidência, com as condições das vítimas e tampouco dos infratores, tornando o

modelo restaurativo o mais eficaz, tanto para a ressocialização dos infratores, como para a

diminuição de crimes e também para as vítimas e todos os afetados.

20

4.2 HOMICÍDIO CULPOSO E JUSTIÇA RESTAURATIVA

Importante observar o seguinte: “Diz-se do crime culposo quando o agente, deixando de

empregar a atenção ou diligência de que era capaz, em face das circunstâncias, não previu o

caráter delituoso de sua ação ou resultado desta, ou, tendo-o previsto, supôs levianamente que

não se realizava” (NORONHA, 2014, p. 28).

Sabe-se que o fato típico é formado pelos seguintes elementos: conduta culposa ou

dolosa; resultado; nexo causal; tipicidade. O dolo e a culpa são os elementos subjetivos da

conduta. No direito penal apenas importam as condutas humanas motivada pela vontade, ou

seja, as ações providas de um fim. Na conduta dolosa, existe uma ação ou omissão voluntária

destinada a uma finalidade ilícita; Nela o agente anseia ou assume o risco da produção do fato

criminoso. Na conduta culposa, existe uma ação voluntária destinada a uma finalidade lícita,

porém, por a quebra do dever de cuidado a todos requerido, acontece um resultado ilícito não

desejado, cujo risco tampouco foi assumido (CAPEZ, 2015).

Uma primeira análise do tema, nos leva, muito provavelmente, à seguinte indagação:

como se falar em reparação em crimes contra a vida? Se a vítima não poderá ressuscitar,

como uma forma de restauração seria possível? Não nos resta dúvida que o bem jurídico vida

é o mais importante, e que as sociedades protegem por meio de seus ordenamentos jurídicos.

Porém, o fato de que a justiça restaurativa, quando se trata de reparação, não está

ligada unicamente àquela relativa aos efeitos materiais do delito. A concepção restaurativa é

que a violação do direito não constitui simples violação contra a ordem jurídica, mas sim uma

ruptura nas relações entre vítima, ofensor e comunidade. Portanto, é de suma importância

frisar que, dentre as espécies de homicídio, é mais palatável a idéia de método restaurativo

nos casos de culpa, pois se deve encarar como uma justiça que concede respostas mais

adequadas ao problema do homicídio culposo.

Nesse contexto, deve-se fazer o seguinte questionamento: o encarceramento puro e

simples do ofensor proporciona uma resposta adequada à vítima e a comunidade? Quanto à

vítima, está completamente desamparada dentro do atual paradigma. Quanto à comunidade,

há um efeito de prevenção geral positiva, porém poderia ser atingido dentro de uma

perspectiva restaurativa. A participação da comunidade no processo restaurativo corrobora a

prevenção geral negativa, pois afeta os indivíduos quanto aos efeitos deletérios da ação

negligente.

Em casos de culpa, a chance de o ofensor dialogar com as vítimas são maiores. De

outro lado, a capacidade das famílias das vítimas ouvirem o agressor e até mesmo entendê-los

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é proporcionalmente grande. É uma situação em que a aplicação dos métodos restaurativos

tem grande poder de pacificação social, no qual pode contribuir para uma melhoria de todo o

sistema punitivo brasileiro, para a reintegração do ofensor, sua ressocialização e para que as

famílias das vítimas possam compreender de certa forma o resultado.

4.2.1 Justiça Restaurativa e a Ressocialização do Preso

O sistema de resolução de conflitos, fundado no direito penal retributivo encontra-se

deteriorado no Brasil: presídios superlotados , com estabelecimentos que não oferecem o

mínimo de condições para atender às necessidades dos presos. Nesse contexto começou a

difundir a justiça restaurativa, que é um processo de “restauração” do ambiente social afetado

pela prática da conduta delituosa, que rompe a harmonial social. Contrapõe a justiça

restaurativa, em que a pena é vista simplesmente como uma “retribuição” pela prática da

infração delituosa.

Dessa maneira, surgem algumas indagações como: É possível, em curto prazo, o

Estado criar condições mais adequadas ao preso que está no sistema? É possível, em curto

prazo, o Estado aumentar o número de vagas no sistema prisional para suprir o déficit? O

Estado não possui condições para resolver de forma efetiva esses problemas, então, surge a

possibilidade da inserção da justiça restaurativa como forma de auxiliar nas resoluções de

conflitos, agindo juntamente com o processo tradicional.

A justiça restaurativa é um sistema de resolução de conflitos, que tem o intuito de

combater a ineficácia do sistema vigente, é uma resposta a ineficácia do modelo retributivo de

justiça, ou seja: “A justiça restaurativa propõe como um modelo alternativo de justiça,

sobretudo ao retributivo, como forma de se alcançar um acertamento entre ofensor e vítima,

superando a violência que marca o conflito” (MELO, 2012, p. 39).

Assim, neste sentido, algumas condutas sob as lentes restaurativas deveriam ser

inseridas pouco a pouco no contexto prisional, pois os princípios da justiça restaurativa vêm

ao encontro das necessidades proveniente do trabalho com pessoas privadas de liberdade,

especialmente àquelas relativas à resolução dos conflitos presente entre o apenado e seus

familiares. Considerando que, supressão de liberdade traz diversas conseqüências prejudiciais

aos apenados e suas famílias, principalmente no que é relativo à conservação dos vínculos

afetivos, os quais são de extrema importância no processo de retorno ao convívio social.

Ademais, visto que o ambiente prisional é praticamente em todos os casos, insalubre,

violento, segregador e constrangedor, todos esses fatores podem causar conflitos, mesmo nas

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relações efetivamente mais estáveis, pois as vivências do cárcere, as influências do meio

externo, tais como a discriminação e o preconceito são determinantes que podem prejudicar a

qualidade das relações.

Portanto, o caótico sistema prisional brasileiro nos mostra a necessidade urgente de

buscar novas soluções dos problemas, que envolvem o encarceramento do infrator. Dessa

maneira, a justiça restaurativa pode contribuir para a resolução do problema, pois possui como

primazia o não encarceramento do infrator.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Deste trabalho concluiu-se que a justiça restaurativa é um modelo de resolução de

conflitos mais humano do que o retributivo. Pois além de verdadeiramente solucionar a lide

das partes, fazendo com que o mal causado seja restaurado, que o infrator admita a

responsabilidade do dano realizado e que as partes procurem a reconciliação, logo, aproxima

os familiares e a sociedade a pessoa que praticou o crime, abstendo assim que ele volte a

praticar crimes, ao invés de somente o Estado punir.

O objetivo deste trabalho foi cumprido no momento em que os resultados mostrados

do modelo retributivo apresentam um modelo de justiça contemporâneo que se encontra

altamente ultrapassado e que a justiça restaurativa mostra-se como um modelo que visa

efetivamente resolver os conflitos. Foi exposto detalhadamente a justiça restaurativa, seu

conceito, princípios, sua história, como funcionam, suas aplicabilidades e vantagens,

concluindo-se que ela é uma ferramenta que mostra ótimos resultados para ser implantada no

sistema penal de justiça.

E em seguida, apresentado um comparativo entre a justiça restaurativa e a retributiva,

com ênfase na justiça retributiva que mostrou sua fragilidade no sistema penal em coibir os

crimes e a deficiência em reabilitar os dissociados devidos, entre diversos motivos, ao alto

índice de aprisionados no Brasil. A justiça restaurativa é o melhor meio para a aplicação nos

crimes de homicídio culposo, pois é uma forma essencial de ressocialização, de diminuição de

reincidência e de restabelecer os vínculos com a comunidade e a família da vítima.

Conclui-se que a justiça restaurativa é um modelo essencial para a ressocialização do

apenado, mostrando-se como uma saída aos que cometem crimes de homicídio culposo,

trazendo dessa forma uma significante melhoria para o sistema penal brasileiro, em que as

situações atuais são precárias, e uma melhoria nas vidas das famílias envolvidas nesse

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conflito, que sofrem e que com o sistema retributivo atual, onde não tem a oportunidade de

entender a situação.

A partir desta conclusão abrem-se espaços para que efetuem novas pesquisar nas áreas

das políticas criminais, bem como, implantar novos projetos no país que visem alternativas

que possam vir a substituir o modelo de justiça atual e solucionar os conflitos sem a

intervenção única e exclusiva do sistema de justiça criminal.

RESTORATIVE JUSTICE AND ITS APPLICATION IN THE CRIMES OF

HOMICIDE

ABSTRACT

The present work is based on research developed in the field of criminal science, focusing on

Restorative Justice and its possibility or not in crimes of culpable homicide, emphasizing

restorative methods and practices and the various forms of contribution to the victim,

community to the offender. The methodology adopted was based on bibliographical and

documentary research, with approaches in the field of theoretical knowledge. Its main

objective is to repair damages caused to the parties involved and, whenever possible, to

rebuild broken relationships. It is shown as an alternative to the retributive model, in view of

the need for deeper and more concrete changes in the face of inefficiencies and de-

legitimacy of the penal system. The research made it possible to demonstrate that Restorative

Justice is an alternative to the criminal justice system, since it consists of a non-punitive

paradigm based on values, where its objective is not the crime, but the conflict resulting

from the crime, and seeks to balance care the needs of the victims and the community with

the need to reintegrate the aggressor into society. It is in Restorative Justice that the victim

has the opportunity to expose their feelings and perceptions regarding the harm suffered, and

to the offender to know the impact of their actions and eventually to clarify that the

consequences of their act transcended their intention, as well as the recognition of error, can

also operate as a differential to the establishment of a better stage in the offender's history, as

well as to contribute to the restorative process of both the offender and the victim.

KEYWORDS: Justice Restorative . Crime. Crime. Muder Guilty.

REFERÊNCIAS

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“reintegração social” do sentenciado. Disponível em: <http://www.juareztavares.com/textos/baratta_ressocializacao.pdf> Acesso

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BATISTA, Nilo. Introdução crítica ao delito do direito penal brasileiro. 8 ed. Rio de

Janeiro: Revan, 2012.

CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Parte Especial, Saraiva, 2015,v. 2.

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CARVALHO, Salo de. Memória e esquecimento nas práticas punitivas: criminologia e

sistemas jurídico-penais contemporâneos. Porto Alegre: EDIPUCRS, 2012.

JACCOUD, Mylene. Princípios, tendências e procedimentos que cercam a justiça

restaurativa. Justiça Restaurativa: Coletânea de Artigos. Brasília: Ministério da Justiça e

pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD, 2013.

ZAFFARONI, Eugenio Raúl; PIERANGELI, José Henrique. Manual de direito penal

brasileiro: parte geral. 14. ed. São Paulo: RT, 2014.

ZEHR, Howard. Justiça restaurativa. São Paulo: Palas Athena, 2012.

ZEHR, Howard. Trocando as lentes: um novo foco sobre o crime e a justiça. São Paulo:

Palas Athena, 2012.