Estudo de adaptação do Questionário Epistemológico de...

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Psicologia e Educação 133 Vol. V, nº 1, Jun. 2006 Estudo de adaptação do Questionário Epistemológico de Schommer (SEQ) para estudantes universitários portugueses* Albertina L. Oliveira** Resumo: Neste trabalho de investigação dão-se a conhecer os resultados empíricos dos estudos de adaptação do Schommer Epistemological Questionnaire (SEQ) para a população de estudantes universitários portugueses. É um instrumento da autoria de Schommer (1990), que operacionaliza o modelo teórico da autora, acerca das crenças sobre o conhecimento e a aprendizagem (epistemologia pessoal), e que o concebe como sendo constituído por quatro dimensões: estrutura do conhecimento; estabilidade do conhecimento; velocidade de aprendizagem; e maleabilidade da capacidade de aprendizagem. A versão deste estudo foi testada numa amostra de 381 estudantes da Universidade de Coimbra, abrangendo alunos do primeiro ano de licenciatura e de anos avançados do mesmo ciclo de estudos, bem como estudantes de mestrado e de doutoramento. O SEQ é uma medida que avalia aspectos de âmbito metacognitivo (metacognição epistémica) e possibilita saber como é que os sujeitos concebem e interpretam a natureza do conhecimento e da aprendizagem, com base nas quatro dimensões postuladas pela autora. Palavras-Chave: Questionário Epistemológico de Schommer; Crenças epistemológicas; Cognição epistémica; Estudantes universitários. A study of the psychometric properties of the Schommer Epistemological Questionnaire in a sample of Portuguese university students Abstract: In this paper we present the empirical results of the psychometric analysis of the Schommer Epistemological Questionnaire (SEQ) for Portuguese university students. This questionnaire operationalizes Schommer’s theorectical model about epistemological beliefs, which assesses the following dimensions: structure of knowledge, stability of knowledge, speed of learning and ability to learn. The Portuguese version was tested on a sample of 381 students of the University of Coimbra, composed of four subgroups: freshman, seniors, master and doctoral students. Although the Portuguese findings confirms, in general, the factor structure reported by Schommer (1990), there were also noticed several problems. Some of them have already been pointed out in previous studies by other authors, namely, those concerning the ability to learn dimension and the reliability levels of the four factors. Key-words: Schommer Epistemological Questionnaire; Epistemological beliefs; Epistemic cognition; University students. _______________ * Investigação realizada com o apoio financeiro do Centro de Psicopedagogia da Universidade de Coimbra [FEDER/POCTI-SFA-160-490]. ** Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra.

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Vol. V, nº 1, Jun. 2006

Estudo de adaptação do Questionário Epistemológico de Schommer(SEQ) para estudantes universitários portugueses*Albertina L. Oliveira**

Resumo: Neste trabalho de investigação dão-se a conhecer os resultados empíricosdos estudos de adaptação do Schommer Epistemological Questionnaire (SEQ) paraa população de estudantes universitários portugueses. É um instrumento da autoriade Schommer (1990), que operacionaliza o modelo teórico da autora, acerca das crençassobre o conhecimento e a aprendizagem (epistemologia pessoal), e que o concebecomo sendo constituído por quatro dimensões: estrutura do conhecimento; estabilidadedo conhecimento; velocidade de aprendizagem; e maleabilidade da capacidade deaprendizagem. A versão deste estudo foi testada numa amostra de 381 estudantes daUniversidade de Coimbra, abrangendo alunos do primeiro ano de licenciatura e deanos avançados do mesmo ciclo de estudos, bem como estudantes de mestrado e dedoutoramento. O SEQ é uma medida que avalia aspectos de âmbito metacognitivo(metacognição epistémica) e possibilita saber como é que os sujeitos concebem einterpretam a natureza do conhecimento e da aprendizagem, com base nas quatrodimensões postuladas pela autora.Palavras-Chave: Questionário Epistemológico de Schommer; Crenças epistemológicas;Cognição epistémica; Estudantes universitários.

A study of the psychometric properties of the Schommer EpistemologicalQuestionnaire in a sample of Portuguese university students

Abstract: In this paper we present the empirical results of the psychometric analysisof the Schommer Epistemological Questionnaire (SEQ) for Portuguese universitystudents. This questionnaire operationalizes Schommer’s theorectical model aboutepistemological beliefs, which assesses the following dimensions: structure of knowledge,stability of knowledge, speed of learning and ability to learn. The Portuguese versionwas tested on a sample of 381 students of the University of Coimbra, composed offour subgroups: freshman, seniors, master and doctoral students. Although the Portuguesefindings confirms, in general, the factor structure reported by Schommer (1990), therewere also noticed several problems. Some of them have already been pointed outin previous studies by other authors, namely, those concerning the ability to learndimension and the reliability levels of the four factors.Key-words: Schommer Epistemological Questionnaire; Epistemological beliefs;Epistemic cognition; University students.

_______________* Investigação realizada com o apoio financeiro do Centro de Psicopedagogia da Universidade de Coimbra

[FEDER/POCTI-SFA-160-490].** Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação da Universidade de Coimbra.

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Introdução

O modelo teórico das crençasepistemológicas de Schommer (1990) foiproposto pela autora na sequência de umaconsideração sistemática e aprofundada dediversas correntes de investigação acercada epistemologia pessoal, emanadas dotrabalho fundador de Perry (1970, 1981)e sua equipa. Este autor, ao seguir lon-gitudinalmente licenciandos da Universi-dade de Harvard, do primeiro ao quartoano do curso, através de entrevistas,verificou que muitos dos alunos recém-chegados à universidade acreditavam queo conhecimento era simples, resultava daacumulação de factos imutáveis e eradominado pelas autoridades ou especialis-tas. Porém, ao concluírem os estudosuniversitários, passavam a ver o conheci-mento como complexo, relativo, contingen-te e contextual, sendo resultante sobretudoda razão e da investigação empírica. Apósquase duas décadas de investigações, Perrye a sua equipa chegaram à conclusão deque o modo como os estudantes constru-íam o seu mundo não se devia tanto afactores de personalidade, mas resultavade um processo de desenvolvimentocognitivo, lógico e coerente. Foi proposto,assim, um esquema de desenvolvimento,constituído por uma sequência de noveposições, cada uma das quais representan-do uma reorganização qualitativa dasestruturas de atribuição de significado. Deacordo com este modelo, os alunos per-correm uma trajectória de desenvolvimen-to, que vai desde o pensamento dualistaaté ao compromisso com o relativismo.O trabalho de Perry serviu de base a muitaslinhas de investigação que vieram a centrara atenção em diversos aspectos daepistemologia pessoal, tais como os estu-dos de King e Kitchener (1994), acercadas concepções das pessoas sobre o co-

nhecimento e a realidade (modelo do juízoreflexivo), o estudo de Baxter-Magolda(1992), onde as questões de género foramespecialmente focadas (modelo de refle-xão epistemológica) e o estudo sobre osmodos de conhecimento das mulheres, deBelenky e colaboradores (1986).Em 1990, Schommer, partindo do princí-pio de que a epistemologia pessoal é umdomínio complexo, e de que os investi-gadores que se haviam debruçado sobreo tema focavam diversos aspectos, propôsuma reconceptualização das concepçõesepistemológicas, apresentando um modelomultidimensional. A epistemologia pesso-al é vista pela autora como um sistemade crenças, com várias dimensões mais oumenos independentes. Segundo Schommer,o seu modelo apresenta diferenças impor-tantes relativamente aos trabalhos préviosno domínio. Para além de (1) identificarcrenças distintas, veio a conceber oconstructo (2) como sendo constituídotambém por crenças acerca da aprendiza-gem, (3) considerou que o desenvolvimentodas mesmas pode não ser sincrónico, (4)reconheceu a necessidade de existir equi-líbrio ou alguma estabilidade, (5) introdu-ziu a nomenclatura de crenças, (6) bemcomo propôs uma avaliação quantitativadas mesmas.Relativamente ao primeiro aspecto – iden-tificação de crenças distintas –, o modelode Schommer foi inicialmente concebicocomo sendo constituído por: 1) crençasacerca da estrutura do conhecimento (co-nhecimento simples), variando, segundo aautora, entre um entendimento deste comoum conjunto de elementos isolados, frag-mentados, e outro que o percebe como umcerto número de conceitos com um ele-vado nível de relação ou de integração;2) crenças acerca da estabilidade doconhecimento (conhecimento certo), osci-lando entre uma concepção imutável ou

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absoluta do mesmo, e outra que o entendecomo provisório; 3) crenças acerca da fontedo conhecimento, variando entre o co-nhecimento proveniente da autoridadeomnisciente e aquele que é derivado daevidência empírica e do raciocínio (porém,atendendo a que este factor não emergiunas análises factoriais a que a autorasubmeteu o modelo, este foi revisto, demodo a integrar somente quatro dimen-sões); 4) crenças acerca da velocidade daaprendizagem (aprendizagem rápida) ca-racterizadas, num extremo, pela perspec-tiva de que, ou se aprende rapidamente,ou não se consegue aprender e, no outro,pela concepção de que a aprendizagem égradual; e 5) crenças acerca da capacida-de para aprender (capacidade fixa), vari-ando entre a perspectiva de que ela é umaentidade fixa, à nascença, e outra que aentende como uma capacidade susceptívelde ser melhorada, com o tempo e aexperiência. Estes cinco tipos de crençasforam consideradas como entidades úni-cas, tendo a autora introduzido, destaforma, uma perspectiva mais analítica, emrelação aos modelos da epistemologiapessoal que precederam o seu trabalho(Schommer, 1990; Duell & Schommer-Aikins, 2001; Schommer-Aikins, 2004).No que respeita à inclusão de crençasacerca da aprendizagem (segundo aspec-to), Schommer inspirou-se nas investiga-ções de Dweck e Leggett (1988), sobreas crenças acerca da maleabilidade dacapacidade de aprendizagem, e deSchoenfeld (1989), sobre as crenças rela-tivas ao desempenho na matemática, asquais conduziram à proposta da dimensãovelocidade de aprendizagem (Schommer-Aikins, 2004). A consideração destas duasúltimas dimensões como parte integranteda epistemologia pessoal tem gerado, noentanto, grande controvérsia, havendoautores que defendem a sua exclusão do

constructo (e.g., Hofer & Pintrich, 1997;Clarebout et al., 2001; Hofer, 2004),enquanto outros têm encontrado algumapoio para a sua conceptualização comoparte integrante das crençasepistemológicas (e.g., Schommer, Crouse& Rhodes, 1992; Stromso & Braten, 2003).Quanto ao terceiro aspecto – provávelausência de sincronia no desenvolvimentodas crenças –, Schommer, ao concebê-lascomo um sistema mais ou menos indepen-dente, sublinha a ideia de que elas não têm,necessariamente, o mesmo nível de sofis-ticação umas em relação às outras, sendoeste aspecto particularmente importantequando as pessoas se encontram em fasede mudança das crenças epistemológicas(Schommer, 1994; Duell & Schommer-Aikins, 2001; Schommer-Aikins & Hutter,2002).Relativamente à necessidade de equilíbrio(quarto aspecto), a autora defende que aposse de crenças epistemológicas extremaspode ser muito problemática, dando oexemplo das pessoas, ao não aderirem aqualquer noção de certeza, poderem en-frentar problemas do foro psicológico, taiscomo depressão ou desespero, ou ainda,na posição oposta, os sujeitos ao acredi-tarem que o conhecimento nunca muda,tenderem a manifestar uma elevada rigi-dez e dogmatismo. Neste sentido, paraassegurar o equilíbrio, as pessoas comcrenças de ordem superior ou sofisticadasmantêm a noção de que há um núcleorestrito de conhecimento, que é estável. Ouseja, o funcionamento a níveisepistemológicos avançados pode coexistircom o pensamento de nível mais baixo,funcionando como se fosse um ponto deequilíbrio, ou uma base de sustentação(Schommer-Aikins et al., 2000; Schommer-Aikins, 2004).No que respeita à nomenclatura de cren-ças (quinto aspecto), a introdução desta

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noção deve-se, segundo a autora, a umconjunto de características, que se têmverificado a nível da epistemologia pes-soal, que a aproximam do constructo decrenças, de acordo com a clarificação dealguns autores (e.g., Pajares, 1992), taiscomo tenderem a mostrar uma fraca re-lação com a lógica, a serem resistentes àmudança, a exercerem uma forte influên-cia no pensamento e a incluírem compo-nentes da esfera afectiva (Schommer-Aikins, 2004).No que concerne à avaliação quantitativa(sexto aspecto), Schommer introduziu umaabordagem quantitativa, passando a utili-zar como operacionalização das crençasepistemológicas um questionário (o Questi-onário Epistemológico de Schommer). Ainspiração para os itens proveio de umarevisão dos estudos qualitativos, que pre-cederam a sua linha de investigação(Schommer-Aikins, 2004)Tendo em conta o postulado mais distin-tivo deste modelo – o caráctermultidimensional das crençasepistemológicas, e com vista a testá-lo, doisestudos com estudantes universitáriosrevelaram, através de análises factoriais,a existência de quatro factores, designadospor capacidade de aprendizagem inata,conhecimento simples, aprendizagem rá-pida e certeza do conhecimento(Schommer, 1990; Schommer et al., 1992).Um resultado idêntico foi obtido numaamostra de alunos do ensino secundário,com algumas adaptações do instrumentooriginal (Schommer, 1993). Contudo, sealguns estudos têm validado uma parteconsiderável das dimensões do constructo,mesmo em amostras de culturas diferentes(e.g., Ohtsuka et al., 1996; Stromso &Braten, 2003), outras investigações ques-tionam fortemente a sua estruturadimensional, levantando sérias reservas aomodelo (e.g., Clarebout et al., 2001, Hofer,

2000). Hofer e Pintrich (1997), num artigode revisão dos conhecimentos, neste do-mínio, manifestam, igualmente, cepticismoquanto à clareza do constructo subjacentee tecem críticas consideráveis ao instru-mento que o operacionaliza, nomeadamen-te, ambiguidade na construção frásica dositens. Outro aspecto fortemente criticado,diz respeito aos baixos índices de consis-tência interna que têm sido consistentemen-te obtidos nos estudos, a nível das dimen-sões, sendo frequente encontrarem-secorrelações item-total negativas e próxi-mas de zero em vários itens do instrumen-to (e.g., Stromso & Braten, 2003).Contudo, sem se desconsiderar as fragi-lidades salientadas, diversos estudos têmapoiado as suposições de Schommer,quanto ao papel de relevo que as crençasepistemológicas desempenham em váriosdomínios, muito particularmente no planoda aprendizagem. Num dos primeirosestudos, Schommer (1990) envolveu alu-nos do ensino superior na tarefa da leiturade textos científicos, com informaçõesincoerentes, tendo-lhes pedido que avali-assem a sua confiança na compreensão dosmesmos e que completassem o últimoparágrafo de cada secção (que tinha sido,intencionalmente, omitido). Verificou-seque quanto maior era a crença no conhe-cimento certo, maior era a tendência dosestudantes para escreverem conclusões decarácter absoluto e quanto mais acredita-vam na rapidez da aprendizagem, maisdistorcidas eram as suas conclusões, maisbaixo era o seu desempenho num teste deavaliação e mais exagerada a sua confi-ança na compreensão do texto. Um resul-tado semelhante foi obtido por Kardash eScholes (1996). Ao nível do rendimentoescolar, constatou-se noutro estudo, depoisde controlada a inteligência geral, quequanto mais forte era a crença na apren-dizagem rápida, mais os alunos tendiam

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a apresentar resultados escolares baixos(Schommer, 1993). A relação entre ascrenças epistemológicas e as estratégias deaprendizagem também foi investigada porKardash e Howell (2000), tendo estesautores verificado que a crença na apren-dizagem rápida e com pouco esforço seencontrava associada, de forma negativa,à variedade de processos cognitivos eestratégicos, ou seja, a frequência com queos alunos utilizavam estratégias de apren-dizagem diversificadas era tanto maior,quanto maior era a sua crença de queaprender leva tempo e requer esforço. Emconsonância com os resultados encontra-dos por numerosos autores, no âmbito deoutros programas de investigação (e.g.,Perry, 1981; King & Kitchener, 1994),também Schommer (1993; Schommer etal., 1997) encontrou evidência empíricapara o carácter desenvolvimentista dascrenças epistemológicas, tendendo estas asofisticarem-se à medida que os sujeitosavançam na escolaridade.Em face dos resultados controversos apre-sentados acima, e com base nas sugestõesde diversos autores (e.g., Hofer & Pintrich,1997; Stromso & Braten, 2003), preten-demos com este trabalho, essencialmente,testar a dimensionalidade do constructo deSchommer, em alunos universitários por-tugueses e averiguar as qualidadespsicométricas do SEQ.

Método

AmostraA amostra do estudo é de naturezaprobabilística por agrupamentos, sendoconstituída por 384 alunos da Universida-de de Coimbra. Cento e setenta e cinco(45.57%) eram alunos da Faculdade deCiências e Tecnologia, 107 (27.86%)pertenciam à Faculdade de Ciências do

Desporto e Educação Física e 102 (26.56%)eram estudantes da Faculdade de Econo-mia. As idades dos sujeitos variaram entreos 18 e os 60 anos, sendo a média de 26e o desvio-padrão de 6.70. Relativamenteà composição sexual da amostra, 219(57.03%) eram indivíduos masculinos e165 (42.97%) pertenciam ao sexo oposto.A nível do ano frequentado pelos alunos,98 (25.52%) encontravam-se no primeiroano, 127 (33.07%) eram estudantes avan-çados nos estudos de licenciatura, 84(21.88%) frequentavam estudos demestrado e 75 (19.53%) realizavam estu-dos de doutoramento.

ProcedimentosOs dados foram recolhidos pela autora dopresente estudo, depois de se terem obtidoas necessárias autorizações institucionaisformais. A maior parte dos respondentespreencheram os questionários nas salas deaula, depois de uma breve explicação dainvestigação, de se ter realçado o carácteranónimo das respostas e a nãoobrigatoriedade da participação, bem comode se ter apelado para a honestidade dasrespostas. Nos casos em que nos foi detodo impossível contactar, pessoalmente,os sujeitos da amostra, procurámos obtero respectivo endereço de residência eenviámos o protocolo de recolha de dadospelo correio, acompanhado de um enve-lope selado, para a sua devolução. No total,a taxa de resposta foi de 70%.

InstrumentosCom vista a testar, empiricamente, omodelo teórico das crençasepistemológicas, atrás referido, Schommerconstruiu um questionário, com 63 itens.Estes agrupam-se em doze subconjuntos,reflectindo as seguintes crenças: 1) oconhecimento é certo; 2) o sucesso nãoestá relacionado com o trabalho árduo; 3)

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as pessoas podem aprender a aprender; 4)a capacidade de aprendizagem é inata; 5)o processo de aprendizagem é rápido; 6)a aprendizagem ocorre com o primeiroesforço; 7) o esforço concentrado é umaperda de tempo; 8) a integração dos as-suntos deve ser evitada; 9) deve-se pro-curar respostas simples; 10) deve-se evitara ambiguidade; 11) deve-se depender daautoridade; e 12) deve-se evitar criticar aautoridade. Destes doze subconjuntos,quatro dimensões foram obtidas com al-guma consistência nos estudos empíricose não as cinco inicialmente postuladas porSchommer (1990, 1993; Schommer et al.,1992), ou seja, a dimensão fonte doconhecimento não foi empiricamenteverificada. As respostas dos sujeitos sãodadas numa escala de Likert, com cincopontos, variando de Discordo Fortemente,passando por Discordo, Neutro, Concor-do, até Concordo Fortemente. Quanto maiselevada for a pontuação obtida maissimplista é o sujeito, em termosepistemológicos.O SEQ foi traduzido para português pelaautora deste estudo, com a supervisãocientífica do Prof. Doutor António Simões.A versão portuguesa não apresenta alte-rações substanciais em relação à originalamericana, tendo havido a preocupação dese ser o mais fiel possível, nas instruções,nos itens e na escala de resposta. Com basenos resultados de um estudo preliminar,com 106 estudantes da Universidade deCoimbra (Oliveira, 2005), foi possívelaperfeiçoar a formulação de alguns itens,sendo clarificado o seu significado, a partirdos comentários feitos pelos sujeitos.

Resultados

Com vista a avaliar a dimensionalidade doinstrumento, e depois de termos consta-

tado, através do teste de esfericidade deBartlett (p<.001) e da medida KMO (>.80),que a matriz de correlações era adequadapara a realização de uma análise emcomponentes principais, efectuámo-la, apartir dos doze subconjuntos de itens, comrotação varimax, forçada a quatro facto-res, de acordo com o procedimento daautora do SEQ. O valor de cadasubconjunto é obtido somando-se os es-cores dos respectivos itens e dividindo-ospelo número destes últimos. Emconsequência, obtivemos uma estruturadimensional com quatro factores,explicativos de 53.2% da variância, bas-tante semelhante à que foi evidenciada nosestudos de Shommer.De seguida, determinámos a consistênciainterna de cada factor, através do coefi-ciente alfa de Cronbach, tendo-se verifi-cado que era bastante baixa e que sesituava, a níveis inaceitáveis, por se re-gistarem vários itens com correlações item-total negativas, ou praticamente nulas, quefaziam descer, substancialmente, a fideli-dade. Por conseguinte, procedemos à eli-minação desses itens, num total dedezassete (1, 2, 7, 9, 18, 22, 23, 29, 30,35, 45, 48, 53, 54, 56, 60 e 61). Este cortenão conduziu, todavia, à exclusão denenhum dos subconjuntos atrás referidos,pelo que a estrutura factorial poderia nãoestar comprometida. De seguida,recalculámos os valores dos 12subconjuntos, a partir dos 46 itens restan-tes e efectuámos uma nova análise decomponentes principais, nos mesmos ter-mos da anterior. Os quatro factores do SEQreemergiram (com apenas cinco iterações),explicando 58% da variância. A distribui-ção dos doze subconjuntos pelos factorespode ser consultada no quadro 1. O factor1 – aprendizagem sem esforço e rápida– apresenta um valor próprio de 1.89 eexplica 15.8% da variância. O factor 2 –

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estrutura do conhecimento – explica 14.6%da variância e tem um valor próprio de1.76. O factor 3 – estabilidade do conhe-cimento – explica 14.2% da variância,sendo o valor próprio de 1.70. O factor4 – capacidade de aprendizagem – con-tribui para explicar 13.5% da variância etem um valor próprio de 1.62.

Como se pode observar no quadro 1, noprimeiro factor estão saturados, de formaelevada, vários subconjuntos de crenças,destacando-se as que se referem à concen-tração do esforço, à rapidez da aprendi-zagem e ao carácter inato da capacidadede aprendizagem. Os três tipos de crenças,afectos a este factor, apresentam signifi-cação semelhante, embora seja mais amplado que a que foi proposta por Schommer,uma vez que esta autora conceptualizou

a dimensão velocidade de aprendizagemcomo sendo constituída apenas pelosubconjunto das crenças relacionadas coma rapidez de aprendizagem (Schommer,1990). De acordo com esta dimensãoteórica, os sujeitos com crenças maissimplistas, ou menos sofisticadas, acredi-tam que, ou se aprende de forma rápida

um determinado assunto, ou então não seconsegue aprendê-lo. Em contrapartida, osindivíduos epistemologicamente mais avan-çados (refinados) crêem que a aprendiza-gem ocorre, de forma gradual, e não deuma só vez. Ora, sendo estas, segundoSchommer, as crenças-chave desta dimen-são, não admira que o subconjunto rela-tivo ao esforço concentrado nela estejasaturado, dado que, em termos lógicos,facilmente se admite que quem crê que se

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aprende rapidamente também tenderá aacreditar que o esforço concentrado nãoconduzirá a grandes resultados e, por outrolado, quem considera que a aprendizagemé gradual e leva tempo, certamente tendea acreditar que é necessário investir es-forço na mesma. Por conseguinte, lógicae semanticamente, faz sentido a saturaçãodo subconjunto esforço concentrado noprimeiro factor. O subconjunto respeitanteà aptidão de aprendizagem ser inata já émais difícil de interpretar neste factor, jáque, teoricamente, ele integra-se na dimen-são relativa à maleabilidade da capacidadede aprendizagem (Schommer, 1990; Duell& Schommer-Aikins, 2001). Todavia, tem-se verificado, empiricamente, que estesubconjunto de crenças, ou não apresentasaturações substanciais em nenhum dosquatro factores (Schommer, 1990, 1998),ou surge integrado no factor rapidez daaprendizagem (Schommer, 1993; Kardash& Scholes, 1996), como é o caso do nossoestudo. Deste modo, o primeiro factor(aprendizagem sem esforço e rápida) in-clui também a crença de que a capacidadede aprendizagem é inata. Assim, um sujeitocom uma pontuação elevada neste factortende a acreditar que, para aprender, nãoé necessário grande esforço, que a apren-dizagem se faz rapidamente e que a capa-cidade para aprender é inata. Por sua vez,um educando com crenças mais sofistica-das crê que aprender requer esforço, levatempo e que a capacidade para aprenderpode ser modificada. Relativamente à fi-delidade deste factor, que podemos definirpor “Aprendizagem sem esforço e rápida”,o coeficiente alfa de Cronbach obtido foide .64, sendo constituído por 8 itens.O factor 2, que designamos “Estrutura doconhecimento” integra três subconjuntosdos quatro propostos por Schommer, sen-do formado pelas crenças de que o conhe-cimento depende da autoridade, da integra-

ção de elementos ou conceitos e de que sedeve evitar a ambiguidade. Os indivíduoscom uma elevada pontuação no factorconcebem o conhecimento como estandodependente da autoridade, comoestruturando-se em termos de compartimen-tos isolados e como tendo sentido absoluto.Contrariamente, os educandos mais sofisti-cados tendem a conceptualizar o conheci-mento como sendo construído pelo próprio,como possuindo uma estrutura de elevadainter-relacionação e integração e como ten-do uma pluralidade de sentidos. Osubconjunto procura respostas simples, queSchommer incluiu nesta dimensão, apresen-ta uma saturação modesta (estando a satu-ração principal no terceiro factor, como, aliás,se tem verificado nalguns estudos), pelo quenão o consideramos integrado neste factor.A sua consistência interna situou-se em .60e é formado por 12 itens.Por sua vez, o Factor 3, designado “Es-tabilidade do conhecimento” abrange trêssubconjuntos _ o conhecimento é certo,procura respostas simples e não se criticaa autoridade _, sendo essencialmentedefinido pelo primeiro destes. Uma ele-vada pontuação reflecte a crença de queo conhecimento é imutável e absoluto, deque se deve procurar respostas simples ede que se não deve questionar a autori-dade. Pelo contrário, um escore baixotraduz concepções mais sofisticadas, acer-ca do conhecimento, sendo este percebidocomo provisório, mutável e complexo,estando-lhe também subjacente a ideia deque o que a autoridade diz não se deveaceitar como a última palavra. Comoreferimos no parágrafo anterior, osubconjunto procura respostas simples estásaturado, principalmente, neste factor, oque já aconteceu nalgumas análisesfactoriais anteriores, sendo o caso do estudode Qian e Alvermann (1995), com alunosdo ensino secundário, e da investigação de

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Kardash e Howell (2000), com estudantesdo ensino superior. Tal significa que ossujeitos, que acreditam que o conhecimen-to é absoluto ou imutável, também tendema percebê-lo como sendo simples, agru-pando-se estas crenças no mesmo factor,na nossa amostra, tal como sucedeu nosestudos acima mencionados. A fidelidadeencontrada neste factor, que é constituídopor 14 itens, foi de .66.O quarto e último factor “Capacidade deaprendizagem” é, igualmente, constituídopor três subconjuntos de crenças, obtendoo maior peso o que corresponde à crençade que não se aprende a aprender, seguidopela concepção de que o sucesso não serelaciona com o trabalho árduo e, por fim,pela ideia de que se aprende com poucoesforço. Este factor reflecte uma partesubstancial da dimensão teórica capacida-de para aprender, que é concebida comouma capacidade fixa, a partir de umaperspectiva simplista, e como uma capaci-dade susceptível de ser desenvolvida, a partirde um ponto de vista mais evoluído. Estefactor integra também as crenças de queo sucesso na aprendizagem se consegue comtrabalho e esforço, quando a sua leitura sefaz a partir de uma perspectiva sofisticada.A sua consistência interna é de apenas .55,sendo constituído por 12 itens.Dada a grande controvérsia, em torno daestrutura dimensional do SEQ, que atrásreferimos, e tendo em conta que os níveisde consistência interna por factor são baixos,procurámos aprofundar a análise dadimensionalidade do instrumento, através deuma análise factorial confirmatória. Noquadro 2 indicam-se os valores relativos aosprincipais índices de ajustamento (goodnessof fit summary) obtidos nesta análise.

Pela análise do quadro 2 verifica-se queo valor de χ2 é significativo. Todavia, esteresultado é de relativizar, dada a elevadasensibilidade deste teste a amostras detamanho grande. Assim, observa-se que oconstructo das crenças epistemológicasrevela índices de ajustamento bastantesatisfatórios (NFI, CFI e Lisrel GFI), sendoo NNFI o único que manifesta um valorinferior a .90. A adequação do ajustamen-to é, igualmente, realçada pelo RMR queé inferior a .05. Considerando as satura-ções das dimensões no constructo dascrenças epistemológicas, as crenças naaprendizagem sem esforço e rápida têmuma saturação de .722, as crenças acercada estrutura do conhecimento mostramuma saturação de .658, as crenças acercada estabilidade do conhecimento revelamuma saturação de .727 e as crenças sobrea maleabilidade da capacidade de apren-dizagem evidenciam uma saturação de.232. Todos os valores de saturação refe-ridos são significativos, não se registandonenhuma dimensão, cuja contribuição parao constructo seja desprezível. Todavia, asúltimas crenças referidas têm um pesobaixo, inferior ao critério mínimo geral-mente adoptado (.30).Para além das fontes de evidência devalidade factorial já referidas, podemosainda considerar as relações com outrasvariáveis, tais como correlações comvariáveis externas, com as quais o SEQ,supostamente, está relacionado (validadede constructo). Deste modo, tendo em contaos resultados de numerosas investigaçõessobre o desenvolvimento epistemológicodos sujeitos universitários, é de esperar queas crenças epistemológicas se encontremassociadas, significativamente, ao nível de

sacigólometsipesaçnercsadoledomodotnematsujaedsecidnÍ-2ordauQ

χχχχχ2 .l.g p IFN IFNN IFC IFGlersiLRMR

)odazidradnatse(

339.61 2 100. 149. 248. 749. 879. 440.

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estudos em que os educandos se encon-tram, sendo elas tanto mais sofisticadas,quanto mais avançados nos estudos for-mais se encontrarem os alunos.Assim, no sentido de se procurar verificarse existiam diferenças nas crençasepistemológicas, em função do nível deestudos dos sujeitos (a dimensão capaci-dade de aprendizagem não foi considera-da), e recorrendo a uma análise da variânciamultivariada (MANOVA), detectou-se umefeito multivariado significativo, registan-do-se um Lambda de Wilks com F

(9, 912)=

13.165 (p< .001). Com base nas ANOVASunifactoriais, verificaram-se diferençassignificativas nos factores: Aprendizagemsem esforço e rápida (F

(3, 377)= 6.771, p<

.001); Estrutura do conhecimento (F(3, 377)

=32.556, p< .001); e Estabilidade do co-nhecimento (F

(3, 377)= 9.515, p< .001).

Através dos testes post hoc constata-se queas diferenças, a nível da dimensão Apren-dizagem sem esforço e rápida ocorrementre os licenciandos principiantes e osmestrandos e entre os licenciandos avan-çados e os doutorandos; no que respeitaà dimensão Estrutura do conhecimento asdiferenças verificam-se entre oslicenciandos principiantes e os mestrandos,licenciandos principiantes e doutorandos,licenciandos avançados e mestrandos,licenciandos avançados e doutorandos, eentre mestrandos e doutorandos; quanto àdimensão Estabilidade do conhecimento asdiferenças registadas ocorrem entre oslicenciandos principiantes e mestrandos,bem como entre os primeiros e doutoran-dos.Efectuámos o mesmo tipo de análises paraverificar a existência de diferenças degénero nas crenças epistemológicas. O Fmultivariado associado ao Lambda deWilks foi de F

(3, 377)=3.349 (p= .019).

Através da análise da variância unifactorialapurou-se que as diferenças significativas

se encontram apenas no factor Aprendiza-gem sem esforço e rápida (F

(1, 379)= 8.270,

p=.004), não se registando diferenças nosoutros dois factores (Estrutura do conhe-cimento: F

(1, 379)= .027, p=.869; Estabilida-

de do conhecimento: F(1, 379)

= 1.928, p=.166).

Discussão

Como se pode deduzir, pelo que atrás ficouexposto, a versão portuguesa do SEQ, apósa revisão a que foi submetido, revela umaestrutura relativamente estável, tendo emconta que emergiram quatro factores, commuitas similaridades aos de Schommer(1990), o que significa que as principaiscomponentes estão em conformidade como constructo teórico. As ligeiras diferençasverificadas na nossa estrutura factorial,comparativamente às principais america-nas, poderiam levar-nos a colocar a hipó-tese de estarem implicados nas crençasepistemológicas aspectos específicos dacultura portuguesa. Todavia, tais diferen-ças não nos parecem ser uma caracterís-tica singular da presente amostra, tendo emconta que foram encontrados agrupamen-tos semelhantes de crenças em estudosinternacionais, tal como fizemos referên-cia anteriormente.A reforçar a validade de constructo, e emconsonância como o facto de em diversasinvestigações se ter verificado, de formabastante consistente, que o nível educaci-onal dos sujeitos é um dos factores maispotentes no desenvolvimento da sofistica-ção epistemológica, a obtenção de diferen-ças significativas em função do nível deestudos, através da MANOVA, indica,efectivamente, que a sofisticaçãoepistemológica dos alunos tende a aumen-tar com o avanço nos estudos superiores,mas de forma lenta. As diferenças encon-

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tradas em função do género, que se situ-aram apenas no factor aprendizagem semesforço e rápida, estão em consonânciacom uma investigação longitudinal deSchommer (1993), embora com alunos doensino secundário, em que as raparigasmanifestavam um avanço epistemológicoligeiro, comparativamente aos rapazes, noque respeita às crenças sobre a aprendi-zagem, enquanto que em relação às cren-ças sobre o conhecimento não se encon-traram diferenças.Todavia, o modelo não parece estar isentode problemas. Do ponto de vistaconceptual, a dimensão capacidade deaprendizagem (ability to learn) reveloualgumas fragilidades, uma vez que, aosubmeter-se o SEQ a uma análise factorialconfirmatória, a dimensão referida apre-sentou uma saturação no constructo a umnível relativamente baixo (l=.232), apesarde ser significativo, em comparação comas restantes três. Os problemas com estadimensão tinham já emergido nalgumasinvestigações americanas, em que um dossubconjuntos que, teoricamente, a integra– a capacidade para aprender é inata – nãotem apresentado saturações sistemáticas narespectiva dimensão, evidenciando, emcontrapartida, saturações na dimensãovelocidade de aprendizagem, tal comosucedeu no presente estudo. Esta limita-ção reforça, em parte, a observação deHofer e Pintrich (1997) de que as crençasepistemológicas acerca da aprendizagem,parecem não ser parte integrante doconstructo da epistemologia pessoal, pois,segundo a revisão dos autores, não segueo padrão das outras dimensões, nemparecem ser um preditor útil desseconstructo. Daí que saia também reforça-da, com o nosso estudo, a necessidade,sugerida pelos autores, de refinar oconstructo de Schommer sobre as crençasepistemológicas. É de referir, ainda, que

esta dimensão não revelou um nível deconsistência interna minimamente aceitá-vel, pois, encontrámos um índice de fi-delidade inferior a .60. O problema dosbaixos níveis de consistência interna dosfactores não foi apenas verificado nestenosso estudo, tem sido um resultado re-correntemente encontrado nas investiga-ções internacionais, o que salienta, de novo,limitações no instrumento de medida.Schommer (2004) tende a desvalorizá-las,com base num argumento de Shavelson(2002), invocando que “a quantificação dascrenças epistemológicas é necessariamen-te difícil” (p. 22) e que, por vezes, énecessário subordinar a fidelidade à va-lidade, para que se possa captar umconstructo na sua abrangência ecomplexidadede, em vez de se procurar umconjunto bastante homogéneo de itens paraaumentar a fidelidade, estreitando dessaforma o constructo.Face ao que foi exposto, e tendo em conta,ainda, o número elevado de itens quetiveram de ser eliminados do instrumentoem análise, é de toda a conveniênciaprosseguir os estudos de validação doQuestionário Epistemológico deSchommer.

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