Dissertação Carlos Souza Pardim (versão final)
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MATO GROSSO DO SUL - UFMSCENTRO DE CINCIAS EXATAS E TECNOLOGIA - CCET
PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM EDUCAO MATEMTICAPPGEDUMAT
CARLOS SOUZA PARDIM
ORIENTAES PEDAGGICAS NAS ESCOLAS NORMAIS DE CAMPOGRANDE: UM OLHAR SOBRE O MANUAL METODOLOGIA DO ENSINO
PRIMRIO, DE THEOBALDO MIRANDA SANTOS
Campo Grande, MS2013
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CARLOS SOUZA PARDIM
ORIENTAES PEDAGGICAS NAS ESCOLAS NORMAIS DE CAMPOGRANDE: UM OLHAR SOBRE O MANUAL METODOLOGIA DO ENSINO
PRIMRIO, DE THEOBALDO MIRANDA SANTOS
Dissertao apresentada ao Programa de PsGraduao em Educao Matemtica daUniversidade Federal de Mato Grosso do Sulcomo requisito final obteno do ttulo deMestre em Educao Matemtica.
Orientadora: Prof. Dr. Luzia Aparecida deSouza
Campo Grande, MS2013
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CARLOS SOUZA PARDIM
ORIENTAES PEDAGGICAS NAS ESCOLAS NORMAIS DE CAMPOGRANDE: UM OLHAR SOBRE O MANUAL METODOLOGIA DO ENSINO
PRIMRIODE THEOBALDO MIRANDA SANTOS
Dissertao apresentada ao Programa de PsGraduao em Educao Matemtica daUniversidade Federal de Mato Grosso do Sulcomo requisito final obteno do ttulo deMestre em Educao Matemtica.
Orientadora: Prof. Dr. Luzia Aparecida deSouza
Campo Grande, MS, 05 de fevereiro de 2013
COMISSO EXAMINADORA
___________________________________________Prof. Dr. Luzia Aparecida de Souza
Fundao Universidade Federal de Mato Grosso do Sul__________________________________________
Prof. Dr. AntonioVicente Marafioti GarnicaUniversidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho
__________________________________________Prof. Dr.Heloisa da Silva
Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho
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Deus, Senhor da minha vida.
Juliana, minha amada esposa.
Aos meus pais, que sempre me apoiaram.
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AGRADECIMENTOS
Deus, pelo cuidado e amor por minha vida. Juliana, minha esposa que sempre me apoiou nos estudos.
Aos meus pais, Jos Francisco Pardim e Creuza de Fatima de Souza Pardim.
minha orientadora, professora Dr. Luzia Aparecida de Souza.
banca examinadora, pelas importantes contribuies.
A todos que me apoiaram. Obrigado.
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RESUMO
O presente trabalho resultado de pesquisa que teve como objetivo compreender, sob o filtrodos manuais pedaggicos, as orientaes nacionais/internacionais sobre as quais se estruturoua formao de professores da Escola Normal em Campo Grande. Para tanto, tomou-se aHermenutica de Profundidade, desenvolvida por John B. Thompson, para anlise de formassimblicas e trazida para a anlise de textos didticos por Oliveira (2008), como principalreferencial para anlise do manual Metodologia do Ensino Primrio, de Theobaldo MirandaSantos, utilizado, conforme arquivo escolar, na Escola Normal Joaquim Murtinho na dcadade 1950.Os resultados desta anlise apontam que o manual em questo serviu comoinstrumento de divulgao do pensamento catlico. Alm disso, o manual se insere num
perodo em que os cursos de formao de professores estavam preocupados em apresentar aosprofessores os melhores mtodos para se obter um ensino mais eficaz.
Palavras Chave: Theobaldo Miranda Santos. Manuais Pedaggicos. Escola Normal.Hermenutica de Profundidade. Campo Grande (MS).
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ABSTRACT
The objective of this work was understanding the international/nacional orientations whichorganized the preparation of teachers of Campo Grande Normal School. The principalreference to analyze symbolic forms of the pedagogic manual Metodology of ElementarySchools, written by Theobaldo Miranda Santos, was the Deph Hermeneutics, developed byJohn B. Thompson and designed by Oliveira (2008) to analysis of didactics books. These
pedagogic manual was used in the 1950s at Joaquim Murtinho Normal School, according fileschool's. The outcomes to point out that the pedagogical manual served as instrument ofdivulgation of catholic thoughts. Furthermore, the pedagogical manual was written in a periodthat courses of preparation of teachers were concerned in to show to teachers the bestmethods in order to obtain a teaching more effective.
Keywords: Theobaldo Miranda Santos. Pedagogical Manuals. Normal School. Hermeneuticsof Depth. Campo Grande (MS).
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LISTA DE ILUSTRAES
Figura 1Livro de portarias da Escola Normal Joaquim Murtinho de 1953................ 16
Figura 2Livro de portarias da Escola Normal Joaquim Murtinho de 1955................ 17
Figura 3Capa do manual Metodologia do Ensino Primrio....................................... 41
Figura 4Contedo de multiplicao da cartilha Vamos Estudar?........................... 102
Figura 5Contedo de multiplicao da cartilha Vamos Estudar?........................... 103
Figura 6Contedo de multiplicao da cartilha Vamos Estudar?........................... 104
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LISTA DE QUADROS
Quadro 1ndice do manual Metodologia do Ensino Primrio.................................... 46
Quadro 2 - Crticas aos mtodos ativos.......................................................................... 72
Quadro 3 - Distribuio das disciplinas do curso de regente de ensino primrio.......... 93
Quadro 4Distribuio das disciplinas do curso formao de professores primrios.. 94
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SUMRIO
INTRODUO ........................................................................................................... 11
1 ESCOLAS NORMAIS E OS MANUAIS PEDAGGICOS................................. 121.1 As Escolas Normais.................................................................................................. 121.2 Os Manuais Pedaggicos.......................................................................................... 18
2 A HERMENUTICA DE PROFUNDIDADE COMO REFERENCIALTERICO-METODOLGICO............................................................................. 222.1 Hermenutica de Profundidade................................................................................ 232.1.1 Anlise Scio-Histrica......................................................................................... 292.1.2 Anlise Formal...................................................................................................... 30
2.1.3 Interpretao / (Re) Interpretao.......................................................................... 312.2 Pesquisas que se Fundamentaram na Hermenutica de Profundidade..................... 312.3 Mobilizao da Hermenutica Nesta Pesquisa......................................................... 342.4 Paratextos Editoriais ................................................................................................ 38
3 UM OLHAR SOBRE O MANUAL METODOLOGIA DO ENSINOPRIMRIO................................................................................................................... 403.1 Sobre Metodologia Geral.......................................................................................... 533.1.1 Possveis direcionamentos acerca da Metodologia Geral...................................... 773.2 Sobre a Metodologia Especial.................................................................................. 773.2.1 Possveis direcionamentos acerca da Metodologia Especial................................. 89
3.3 Estabelecendo compreenses acerca da materialidade do manual Metodologia doEnsino Primrio.............................................................................................................. 89
4 MANUAL METODOLOGIA DO ENSINO PRIMRIO: PRODUODE/PARA A EDUCAO BRASILEIRA............................................................. 914.1 Algumas consideraes............................................................................................ 114
5 ALGUMAS CONSIDERAES: FOTOGRAFIAS DE UM FILME EMCONSTRUO............................................................................................................ 116
REFERNCIAS............................................................................................................ 120
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Introduo
O presente trabalho faz parte dos esforos do grupoHistria da Educao Matemtica
em Pesquisa que tem procurado mapear a formao de professores que ensinam matemtica
no estado do Mato Grosso do Sul.
Esta pesquisa iniciou-se em outubro de 2011, quando ocorreu uma mudana na
orientao do autor deste trabalho. Inicialmente, o projeto de pesquisa tinha como objetivo
investigar aspectos histricos de problema ldicos em livros didticos no ensino da
matemtica escolar na 1 fase do secundrio, sob a orientao do professor Dr. Luiz Carlos
Pais. Por motivos pessoais, a orientao foi passada professora Dra. Luzia Aparecida de
Souza.Buscando aproximar o projeto de pesquisa aos objetivos de pesquisa do grupo,
estruturou-se uma proposta de anlise de uma obra trabalhada nas aulas de metodologia nas
escolas normais de Campo Grande - MS. Do projeto inicial para este, manteve-se o interesse
do autor na anlise de textos didticos.
Reis (2011), em desenvolvimento de pesquisa de iniciao cientfica sobre as escolas
normais de Campo Grande1, identificou um pequeno acervo de livros e atas referentes
Escola Normal Joaquim Murtinho2
. Neste acervo foi encontrado um livro de portarias em queconsta a adoo do manual Metodologia do Ensino Primrio, alm de outras obras de
Theobaldo Miranda Santos. Alm desta informao, foi identificado, em uma das entrevistas
feitas nesta pesquisa, o uso de um manual voltado para o ensino primrio nas aulas de prticas
de ensino e, tambm, um caderno utilizado por uma ex-aluna da escola normal em que se
encontra a anotao de um contedo bem prximo daquilo que est no manual de Santos.
Partindo destas informaes, formulou-se o seguinte objetivo de pesquisa:
Compreender, sob o filtro dos manuais pedaggicos, as orientaes pedaggicas (nacionais/internacionais) sobre as quais se estruturou a formao de professores do ensino primrio
nas primeiras Escolas Normais de Campo GrandeMS.
Para alcanar este objetivo proposta uma anlise do manual Metodologia do Ensino
Primrio, escrito por Theobaldo Miranda Santos, edio de 1952.
1 Campo Grande atualmente capital do Mato Grosso do Sul, estado criado aps o desmembramento do estadode Mato Grosso no ano de 1977, sendo esta diviso efetivada no ano de 1979. At ento, a regio do atual estado
do Mato Grosso do Sul fazia parte do sul de Mato Grosso que tinha como capital a cidade de Cuiab.2A Escola Normal Joaquim Murtinho, que inicialmente recebeu o nome de Escola Normal de Campo Grande,
foi criada em 1930. Aps sete anos de sua criao, esta escola normal parou com suas atividades, voltando afuncionar, novamente, no ano de 1947.
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Cabe ressaltar que uma simples anlise descritiva (abordagem comumente utilizada
nas pesquisas com livros didticos, como as analisadas por OLIVEIRA, 2008) no permitiria
que, pela anlise de um texto especfico se fizessem inferncias sobre o cenrio mais amplo
que, aqui, se pretende compreender. Desse modo, a proposta metodolgica a ser apresentada
nesta dissertao articula-se fundamentalmente com o objetivo traado: trata-se da
Hermenutica de Profundidade, desenvolvida por Thompson (1995) para a anlise de formas
simblicas, e mobilizada no contexto de anlise de livros didticos (entendidos como formas
simblicas) por Oliveira (2008).
No primeiro captulo, apresenta-se uma discusso sobre as escolas normais e os
manuais pedaggicos, com o intuito de localizar a pesquisa num cenrio mais amplo que,
adiante, contribuir para o exerccio analtico proposto pela Hermenutica de Profundidade.No segundo captulo, apresentam-se algumas consideraes terico-metodolgicas
norteadoras desta pesquisa. Discute-se, neste momento, as dimenses da Hermenutica de
Profundidade, como as pesquisas tm se utilizado desta metodologia e, por fim, como esta
metodologia foi mobilizada nesta pesquisa. Neste momento, tambm, apresentado o
conceito de paratextos editoriais desenvolvido por Grard Genette que ser utilizado como um
instrumento para a anlise interna do manual de Santos.
No terceiro captulo, apresenta-se a dimenso de anlise interna/formal daHermenutica de Profundidade com uma anlise descritiva do manual de Theobaldo Miranda
Santos.
No quarto, captulo apresenta-se a dimenso scio-histrica da Hermenutica de
Profundidade. Neste momento, so investigadas as condies sociais, polticas, estruturais e
institucionais de produo do manual Metodologia do Ensino Primrio. Realiza-se
juntamente com esta dimenso de anlise a (re) interpretao desta obra.
Na sequncia, o texto Algumas consideraes: fotografias de um filme emconstruo traz um olhar acerca do processo investigativo sobre as orientaes pedaggicas
presentes na formao de professores primrios no sul de Mato Grosso luz de Theobaldo
Miranda Santos. Nessas consideraes, buscou-se uma articulao, sempre provisria, das
potencialidades da hermenutica de profundidade e seus diferentes movimentos analticos
para esta pesquisa.
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1 Escolas Normais e os Manuais Pedaggicos
Com o objetivo de analisar quais orientaes pedaggicas influenciaram a formao
de professores nas primeiras escolas normais de Campo Grande MS, estruturou-se uma
breve discusso sobre as escolas normais e os manuais pedaggicos, apresentando indcios do
que, em geral, as pesquisas tm investigado sobre tais temas, procurando esclarecer as
intenes desta pesquisa.
1.1Um pouco sobre as Escolas Normais
A preocupao com a instruo popular, efetivada a partir da Revoluo Francesa no
fim do sculo XVIII, desencadeou a implantao de vrias escolas, sob a responsabilidade do
Estado, voltadas para o ensino primrio e secundrio. Juntamente com a expanso destes
estabelecimentos de ensino, a necessidade de preparar professores capacitados que pudessem
assumir as salas de aula tambm se intensifica, acarretando a criao de estabelecimentos
voltados para a formao dos professores. Estes estabelecimentos foram denominados Escolas
Normais. Ao discutir os motivos que levaram estes estabelecimentos a receberem tal
denominao, Schaffrath (2008) aponta que:
Segundo Maria Isabel Giner (1985), Frederico II da Prssia (Alemanha),depois da Guerra dos Sete Anos, decidiu compor um novo sistemaeducacional onde o ensino fosse obrigatrio e houvesse normas para aformao de professores. Foi ento que os seminrios franceses destinados formao docente foram designados com o nome de Escolas Normais. (p.147)
O primeiro estabelecimento que recebeu este nome foi criado na Frana em 1795 3, e,
no decorrer do sculo XIX, se espalhou pelas grandes sociedades europeias e Estados Unidos,
se tornando importantes centros de formao docente (SCHAFFRATH, 2008).
A primeira escola normal no Brasil foi criada em Niteri, no ano de 1835, na
provncia4 do Rio de Janeiro. Em 1847, esta instituio se uniu a outras duas formando o
Liceu Provincial que encerrou suas atividades em 1851 (SCHAFFRATH, 2008).
3
A primeira Escola Normal criada na Frana, no ano de 1795, teve uma curta durao, sendo suprimida apsquatro meses de funcionamento.4 Provncia a denominao dada a cada uma das grandes reas administrativas em que o territrio brasileiro sedividia no perodo do Imprio desde o fim das Capitanias Hereditrias.
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Aps a abertura da escola normal em Niteri, outras provncias do Imprio tambm
criaram suas escolas normais. Estas escolas passaram por vrios momentos de instabilidade,
sendo que elas ora eram criadas, ora extintas, at comearem a se estabelecer a partir da
dcada de 1870.
Em Mato Grosso, segundo Tanuri (2000), a primeira Escola Normal foi criada em
1874. Porm, segundo Marcilio (1963) e Castanha (2008), j em 1840, foi instalada a escola
normal nesta provncia. Esta escola normal teve pouco tempo de durao, encerrando suas
atividades em novembro de 1844.
A partir das ltimas dcadas de existncia do Imprio (1870 a 1890) at as trs
primeiras dcadas do sculo XX (1900 a 1920), as escolas normais se expandiram por todo o
pas. O currculo das escolas normais, que inicialmente se limitava aos contedos de ensinoprimrio e apreenso de mtodos de ensino, passa a ganhar uma maior complexidade. O
modelo de escola normal estabelecido pelo estado de So Paulo tornou-se referncia para
implantao e organizao do ensino normal em vrios estados do Brasil. Isto se deu,
conforme Tanuri (2000), pelo envio de grupos de pessoas para estudarem o funcionamento da
instruo pblica em So Paulo e, tambm, pelas contrataes de professores paulistas
visando organizao do ensino em seus estados.
A partir da dcada de 1930, as escolas normais, impulsionadas pelos movimentoseducacionais, se consolidam como importantes centros de formao de professores para o
ensino primrio, ocorrendo, neste perodo, um aumento na criao de estabelecimentos desta
natureza e o surgimento dos primeiros Institutos de Educao5.
As escolas normais permanecem, at o final da dcada de 1960, como os principais
estabelecimentos de formao de professores primrios. Porm, no incio da dcada seguinte,
em 1971, com a publicao da lei n 5.692/71 de Diretrizes e Bases da Educao, conforme
aponta Saviani (2009), as escolas normais desaparecem, instituindo-se, em seu lugar, ahabilitao especfica de 2 grau para o exerccio do magistrio de 1 grau.
Como se pode perceber, as escolas normais assumiram papel fundamental na formao
de professores no Brasil e, portanto, tm despertado o interesse de vrios pesquisadores que
buscam compreender a histria da formao de professores no pas.
5Institutos de Educao foram centros de formao de professores primrios criados no incio da dcada de 1930.
Os principais institutos de educao do Brasil foram criados no Distrito Federal (atual municpio do Rio deJaneiro) e no estado de So Paulo. O Instituto do Distrito Federal era formado por uma Escola Secundria, umaEscola de Professores e uma Escola de Aplicao. Ambas as instituies acabaram por ser incorporadas sUniversidades criadas nestas duas regies.
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As pesquisas que vm sendo desenvolvidas sobre as escolas normais tm se dedicado
ao estudo da implantao, institucionalizao e consolidao das escolas normais nos estados
brasileiros (RODRGUEZ; OLIVEIRA, 2008; KULESZA, 1998; CASTANHA, 2008); das
polticas educacionais e de formao de professores (TANURI, 2000; SAVIANI, 2009), dos
interesses das elites pela implantao destas escolas nos estados (SCHAFFRATH, 2008).
Nesta pesquisa, ao estudar as escolas normais, tem-se como inteno, a partir da
anlise do manual pedaggico, contribuir para a compreenso acerca da formao de
professores do ensino primrio no pas, focando, especificamente, as escolas normais de
Campo Grande, atualmente, capital de Mato Grosso do Sul.
A primeira escola normal da cidade de Campo Grande, que neste perodo fazia parte
do estado do Mato Grosso, foi criada em 1930, denominando-se Escola Normal JoaquimMurtinho. Esta escola normal funcionou at 1937 quando, devido s reformas realizadas pelo
Interventor Federal Julio Strubing Muller, foi fechada. Neste mesmo perodo foi aberta outra
escola normal em Campo Grande, a Escola Normal Dom Bosco que funcionou junto ao
Colgio Nossa Sra. Auxiliadora, sob a responsabilidade de uma misso de freiras da Igreja
Catlica. Esta escola normal, pouco tempo depois, tambm encerrou as suas atividades.
As escolas normais somente voltaram a funcionar no estado de Mato Grosso, dez anos
aps 1937, durante a interveno de Jos Marcelo Moreira6
. Em Campo Grande, duas escolasnormais so (re) abertas: a Escola Normal Joaquim Murtinho, que j tinha funcionado
anteriormente; e a Escola Normal Nossa Sra. Auxiliadora que foi criada no mesmo colgio da
extinta Escola Normal Dom Bosco.
Ao iniciar estudos mais pontuais sobre as escolas normais de Campo Grande, a partir
do seu reestabelecimento, foi localizado nas portarias n 4/1953 e 2/1955 (pertencentes aos
arquivos da antiga Escola Normal Joaquim Murtinho, localizados em Escola Estadual de
mesmo nome) a indicao dos manuais adotados para a formao de professores primrios,conforme mostram as figuras abaixo.
6Jos Marcelo Moreira foi Interventor Federal do Estado de Mato Grosso (1946 1947) durante o incio demandato do presidente Eurico Gaspar Dutra. Manteve-se como Interventor at ser substitudo pelo GovernadorArnaldo Estvo de Figueiredo, eleito por meio de eleies diretas.
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Figura 1Livro de portarias da Escola Normal Joaquim Murtinho em 19537.
Fonte: Arquivo Escola Estadual Joaquim Murtinho.
7Escola Normal Joaquim Murtinho
Portaria 4/953
Usando das atribuies que lhe so conferidas pelo Regulamento baixado com o Dec. n 590 de 31-12-48apresenta a relao dos livros adotados no ano letivo de 1953:DesenhoRafael RotondaroEconomia domsticaIzabel de Almeida SerranoTrabalhos ManuaisBertha SchulrelterMetodologia do Ensino PrimrioTheobaldo Miranda SantosManual do Ensino PrimrioTheobaldo Miranda SantosPrticas Escolares: Antnio DAvilaPrtica de EnsinoT. Miranda SantosHistria Geral e do BrasilJoaquim SilvaSociologia Educacional - Amaral Fontoura e Delgado de CarvalhoBiologia Aplicado EducaoAristides Ricardo
Portugus para o GinsioJos Cretila JniorGeografia do BrasilAroldo de AzevedoPetite Historie de la Literature FranaiseLuiz A. P. VitoriaLingua PortugusaClvis Leite Ribeiro, Felipe Jorge, Jos Loureno e Walter Wey
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Figura 2Livro de portarias da Escola Normal Joaquim Murtinho ano 19558.
Fonte: Arquivo Escola Estadual Joaquim Murtinho.
8Escola Normal Joaquim Murtinho
Portaria 2/1955
Usando das atribuies que lhe so conferidas pelo Regulamento baixado como Dec. n 590 de 31-12-1948apresenta a relao dos livros adotados no ano letivo de 1.955.DesenhoOlavo FreireArte AplicadaPortugusCurso Normal de Aida CostaAnatomia e Fisiologia Humanas e Noes de Higiene de Carlos CostaDidtica de Minina de Rafael GrisiHigine e Puericultura, de Valdemar de OliveiraPsicologia Educacional Guerino CasasantaPrticas Escolares de Antnio dvilaFundamentos Sociais de Educao de Delgado de Carvalho e Amaral NogueiraMetodologia do Ensino Primrio de Teobaldo de MirandaFrancs de Maria Junqueira SmithIngls Amlia Ken
Msica deMatemtica de Elemento Aritemetico de F. T. D.Desenho e Caligrafia deHistria do Brasil de
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Como se v, os manuais escritos por Theobaldo Miranda Santos aparecem nos dois
anos (1953 e 1955). Entre estes manuais, o manual Metodologia do Ensino Primrio merece
especial ateno nesta pesquisa, pois por meio deste material que as orientaes sobre os
mtodos de ensino chegaram ao mbito desta e, possivelmente, da outra escola normal9 que se
estabeleceu nesta cidade.
1.2 Manuais pedaggicos
Os manuais pedaggicos foram importantes instrumentos de formao de professores
para o ensino primrio. A histria desses manuais est vinculada histria da formao de
professores e, como parte desse contexto, so importantes fontes de pesquisa para acompreenso de como os seus autores assimilaram as principais ideias pedaggicas, didticas
e metodolgicas, bem como as orientaes curriculares governamentais que circulavam no
mbito da educao de determinado perodo. Desse modo, os manuais pedaggicos
funcionaram como uma espcie de filtro, em que os autores estruturaram aquilo que, segundo
suas concepes, era a sntese dos mais importantes e necessrios conhecimentos para a
formao de professores capacitados para o exerccio de sua profisso (VALDEMARIN;
CAMPOS, 2007; SILVA, 2002; SILVA 2007).Os autores, ao apresentarem os trabalhos de pedagogos, psiclogos, filsofos,
bilogos, etc. nos manuais pedaggicos, defenderam posies, indicaram mtodos,
apontando-os como os melhores modos de se trabalhar determinado contedo, apresentaram
objetivos e valores para o ensino de determinado contedo, agindo no como divulgadores
passivos das pesquisas, mas ativos, indicando, na escrita do manual pedaggico, suas
concepes de ensino, de escola, de mtodo, principalmente pelo fato de serem profissionais,
que de uma forma ou outra, estiveram envolvidos com o ensino primrio (VALDEMARIN;CAMPOS, 2007; SILVA, 2002; SILVA, 2007). Por esse motivo, estes autores estabeleceram,
por meio de seus manuais, uma influncia sobre a maneira de se pensar e realizar a educao
por parte de futuros professores. Deste modo, os manuais pedaggicos colaboraram para a
consolidao de prticas escolares que esto presentes at hoje nestas instituies de ensino.
(SILVA 2007).
9Alm destas atas que apontam o uso do manual Metodologia do Ensino Primrio, foi encontrado um cadernode uma ex-aluna da Escola Normal Nossa Senhora Auxiliadora, em que se encontra um contedo bem prximodaquele encontrado no manual de Santos. Por esse motivo, acredita-se na possibilidade deste manual ter sidotambm utilizado nesta escola normal.
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Como toda produo simblica10, os manuais pedaggicos, ao se referirem ao ensino,
incorporaram concepes de vida, de ensino e de valores de seus autores, influenciados,
tambm, pelos acontecimentos sociais, polticos e econmicos que fizeram parte do seu
contexto de produo, sofrendo, portanto, constantes transformaes desde o incio de suas
primeiras publicaes, buscando-se adequar s exigncias educacionais de cada poca.
Silva (2007), ao estabelecer como ponto de partida para os estudos dos manuais
pedaggicos as publicaes no Brasil e em Portugal iniciadas no final do sculo XIX,
distingue trs marcos referenciais de produo destes manuais. O primeiro marco abrange o
final do sculo XIX e incio do sculo XX. Neste perodo, os manuais pedaggicos tinham a
preocupao de passar aos futuros professores instrues a respeito da organizao escolar e,
tambm, de prescrever de forma pontual como desenvolver o trabalho em sala de aula.O segundo marco se estabelece com o surgimento e propagao dos ideais do
movimento conhecido como Escola Nova, a partir das primeiras dcadas do sculo XX,
quando a pedagogia assume um carter mais cientfico e os manuais comeam a apresentar
uma preocupao maior com os saberes referentes infncia. Com isso, os contedos
pedaggicos passaram a ter uma influencia maior desses materiais. Os manuais no traziam
receitas de como ensinar, mas sim a apresentao de proposio de fundamentos
(VALDEMARIN; CAMPOS, 2007) que ajudariam o professor a tomar decises necessriaspara tal objetivo.
O terceiro marco estabelecido a partir de meados da dcada de 1940, quando se
inicia uma nova forma de elaborao dos manuais pedaggicos, no Brasil, identificada como a
tecnizao do ensino (SILVA, 2002; 2007). Neste momento, os manuais pedaggicos
voltaram a valorizar os contedos de metodologia e didtica preocupando-se com uma
apresentao de receitas prontas de ensino enfatizando ao longo dos captulos aspectos
relacionados ao planejamento do trabalho docente, desde a definio dos objetivos at asestratgias de transmisso de conhecimentos aos alunos e de avaliao (SILVA, 2002, p.13),
mas, desta vez, as etapas de aprendizagem da criana permaneceram respeitadas.
Silva (2002), ao analisar a produo e circulao de saberes nos manuais didticos do
Brasil de 1930 a 197111, caracteriza as mudanas que ocorreram na escrita dos manuais
pedaggicos em trs momentos: de 1930 a 1946; de 1947 a 1959; e de 1960 a 1971. O
10 Este conceito e sua caracterizao sero discutidos em texto prprio mais adiante.11 Silva (2002) aponta que a data inicial da pesquisa define-se em funo de mudanas levadas a efeito em
escolas normais de vrios estados no Brasil e, principalmente, de um notvel aumento de publicaes destinadasaos futuros professores. Delimitando o marco final, considera-se a promulgao da LDB, n. 5692, que substituias antigas instituies pela Habilitao Especfica para o Magistrio e ainda o fato de, nesse momento, as ediesse apresentarem por meio de recursos tipogrficos mais sofisticados (p.01).
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primeiro momento caracterizado como o entusiasmo pelo movimento escolanovista
(SILVA 2002; p. 11) e os autores mais citados nos manuais pedaggicos so aqueles
pertencentes ao movimento da Escola Nova tais como John Dewey12, Ovdio Decroly13, Johan
Friedrich Herbart14, Georg Kerschensteiner15, entre outros. O segundo momento, que ocorre
entre 1947 a 1959, caracterizado pela proposio de metodologias de ensino (SILVA,
2002; p. 12) quando as discusses metodolgicas comeam a receber um maior interesse por
parte dos autores. Os nomes de John Dewey e de outros que se consagraram no movimento da
Escola Nova continuam a ser utilizados, porm o nome de autores de manuais de didtica,
psicologia educacional, metodologia, entre outros, comeam a ter presena na escrita desses
manuais. O terceiro e ltimo momento, estabelecido entre 1960 e 1971, caracterizado pela
apresentao de tecnologias a servio da eficincia das atividades pedaggicas (SILVA,2002, p. 12). Neste momento, h a predominncia das metodologias e tcnicas didticas e,
apesar de encontrar-se ainda a citao de grandes nomes do movimento escolanovista, h um
destaque maior para os autores que realizaram uma sntese do pensamento educacional
(SILVA, 2002, p 09), como por exemplo, Aguayo y Sanchez16, Theobaldo Miranda Santos,
Loureno Filho17, entre outros.
As disputas ideolgicas entre os diferentes grupos sociais, tambm se manifestaram na
elaborao dos manuais pedaggicos. Estes grupos sociais, ao perceberem o grande valor queos manuais pedaggicos possuam como meio de divulgao e conformao de ideais,
investiram na escrita destes materiais na inteno de propagar as suas concepes. No Brasil,
os manuais pedaggicos foram utilizados como instrumento de disputa entre dois grupos: os
catlicos e os renovadores. Os renovadores inspirados pelos ideais escolanovistas de
gratuidade, laicidade, e obrigatoriedade do ensino. Os catlicos buscando retomar os espaos
perdidos, principalmente, no meio educacional (ALMEIDA FILHO, 2008).
12 John Dewey, nascido no estado de Vermont, EUA, em 1859, foi um filsofo e pedagogo cujas ideiasinfluenciaram o movimento educacional conhecido como Escola Nova em vrios pases. apontado como umdos fundadores da escola filosfica do Pragmatismo.13 Ovdeo-Jean Decroly, nascido em Renaix, na Blgica, foi um mdico que, ao combater o modelo de ensino desua poca, contribui para uma renovao da teoria educacional na infncia.14 Johan Friedrich Herbart, nascido em Oldenhurgo, na Alemanha, em 1776, foi um dos precursores do projetode tomar a pedagogia como disciplina cientfica. Seus estudos mais importantes se deram no campo dafilosofia da mente.15 Georg Kerschensteiner, nascido em Munique, na Alemanha, em 1854, foi um pedagogo que estabeleceu avalorizao da inteligncia prtica na pedagogia, ops-se ao intelectualismo de Herbart.16 Alfredo Miguel Aguayo, nascido no ano de 1866, na cidade de Ponce, em Porto Rico, foi um pedagogo degrande influncia na pedagogia cubana. Trabalhou como professor na Universidade de Havana, lecionando asdisciplinas de psicologia pedaggica, histria da pedagogia e higiene escolar. Alm disso, foi autor de livros
como:Didtica da Escola Nova ePedagogia cientfica.Sua obra foi bastante divulgada na Amrica Latina. NoBrasil suas obras foram publicadas pela Companhia Editora Nacional.17 Manuel Bergstrom Loureno Filho, nasceu em Porto Ferreira, no Estado de So Paulo, no Brasil, foi um dosrepresentantes do movimento educacional da Escola Nova no Brasil, que lutou pela renovao no ensino.
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inquestionvel a importante contribuio dos manuais pedaggicos na formao de
professores destinados ao ensino primrio e da conformao de conhecimentos e prticas
difundidos por estes, mas deve-se considerar que, da mesma forma que os manuais so uma
interpretao de seus escritores baseados em suas concepes pedaggicas, os professores das
Escolas Normais e os futuros professores do ensino primrio, tambm exerceram a sua
interpretao sobre as orientaes contidas nestes manuais, concordando ou discordando
destas.
Nesta pesquisa, procurar-se-, por meio da Hermenutica de Profundidade,
desenvolvida por John B. Thompson e proposta como sensibilidade metodolgica para a
anlise de textos didticos por Oliveira (2008), identificar traos das orientaes pedaggicas,
presentes no manual Metodologia do Ensino Primrio, de Theobaldo Miranda Santos,indicadas para a formao de professores nas escolas normais de Campo Grande. Como j foi
apontado, este manual foi utilizado, na dcada de 1950, na formao dos professores
primrios da Escola Normal Joaquim Murtinho e, possivelmente, na Escola Normal Nossa
Sra. Auxiliadora18.
Esta pesquisa soma-se aos esforos que vm sendo desenvolvidos pelo grupo Histria
da Educao Matemtica em Pesquisa, que tem procurado mapear a formao de professores
que ensinam matemtica no estado do Mato Grosso do Sul.
18 Conforme j apontado em nota de rodap anterior, foi encontrado um caderno de uma ex-aluna desta EscolaNormal que contm contedo bem semelhante ao contedo presente no manual de Theobaldo Miranda Santos.
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2 A Hermenutica de Profundidade como referencial terico-metodolgico
Toda pesquisa, e mais especificamente, a pesquisa em histria da educao
matemtica, baseia-se em pressupostos tericos e metodolgicos que fundamentam a maneira
pela qual o pesquisador entende e faz a sua pesquisa. Por esse motivo, abordar-se-o, a seguir,
discusses que tm como inteno situar o leitor sobre os pressupostos/concepes que
fundamentam esta pesquisa.
Bolvar et al. (2001), ao discutir as diferenas entre as pesquisas com abordagens
qualitativas e quantitativas, aponta como principal diferena a forma como fazem emergir a
teoria. Segundo ele, enquanto nas pesquisas quantitativas [...] as categorias esto
previamente selecionadas coleta dos dados, [...], de tal forma que de antemo se determina
que dimenses ou eventos so instncias de uma categoria de interesses [...] 19(BOLVAR et
al., 2001, p. 106, traduo nossa),nas pesquisas qualitativas se [...] coloca a nfase na
construo ou gerao indutiva de categorias que permitem dar uma identidade categorial e
classificao aos dados recolhidos20 (BOLVAR et al., 2001, p. 106, traduo nossa).
Partindo desta diferenciao, caracteriza-se esta pesquisa como seguindo uma abordagem
qualitativa, pois a partir da compreenso dos contextos de produo e recepo do manual
Metodologia do Ensino Primrio que se procurar entender a influncia e o papel das
orientaes pedaggicas que chegaram, sob o filtro dos manuais pedaggicos, s escolas
normais de Campo Grande. Alm disso, ao estabelecer previamente as categorias, conforme
propem as abordagens quantitativas, passa-se a ideia da existncia de um significado latente,
que espera a ao do pesquisador para ser encontrado. Esta viso ingnua e desconsidera o
papel ativo do pesquisador sobre o que (e o modo pelo qual) investiga. Inscrever esta pesquisa
numa abordagem qualitativa significa, tambm, reconhecer que a objetividade como anulao
daquele que pesquisa, proposta pela viso positivista, ilusria e impossvel de ocorrer numapesquisa. A busca para que a viso do pesquisador no afete o objeto de investigao , em
princpio, falha, pois esse objeto constitui-se frente ao pesquisador pelos filtros de seu
olhar. A prpria fonte, torna-se documento frente a intencionalidade e a mobilizao do
pesquisador.
Esta pesquisa, alm de pautar-se por abordagem qualitativa, se insere no campo da
Histria da Educao Matemtica. Realizar uma pesquisa historiogrfica pressupe um
19 [...] las categorias estn previamente selecionadas a la recogida de los datos, [...], de tal forma que deantemano se determina qu dimensiones o sucesos son instancias de uma categoria de inters [...].20 [...] se pone el nfasis em la construccin o genera cininductiva de categorias, que permitan aportar unaidentidade categorial y classificacin a los datos recogidos.
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reconhecimento de que no s as questes e os mtodos que conduzem as investigaes so
do presente, quanto so os indivduos de um passado que j no existe (BLOCH, 2001). Os
indcios deixados pelo passado so articulados em tramas chamadas de verses histricas.
Estas, por sua vez, no so criaes descompromissadas, mas sim construes plausveis que
se baseiam em documentos produzidos pelo pesquisador21 (ALBUQUERQUE JUNIOR,
2007). Desse modo, o exerccio historiogrfico envolve uma articulao daquilo que o
investigador interpreta dos signos deixados pelo passado e por ele identificados como tais no
presente (ALBUQUERQUE JUNIOR, 2007).
Dentro deste exerccio historiogrfico, com objetivo de compreender quais orientaes
pedaggicas chegaram s escolas normais de Campo Grande por meio dos manuais
pedaggicos, tornou-se necessrio a procura por uma metodologia que possibilitassedesenvolver esta investigao abrangendo no apenas a estrutura interna desses materiais,
como exemplo, as teorias que so abordadas e a forma de apresentao escolhida pelos
autores, mas, tambm, o seu contexto de produo, sendo este entendido como as influncias
externas recebidas no decorrer da elaborao e utilizao deste material, tais como, as
orientaes governamentais, as tendncias educacionais que estavam em alta naquele
momento, como era trabalhado o manual pedaggico pelos professores etc. Encontrou-se na
Hermenutica de Profundidade de Thompson (HP) uma metodologia que se enquadra nospressupostos de investigao citados anteriormente. A seguir, apresentar-se- em que consiste
esta metodologia, procurando pontuar como a HP permite a esta pesquisa, para alm da
compreenso e anlise do manual, uma compreenso da formao de professores nas escolas
normais em Campo Grande.
2.1 A Hermenutica de profundidade de Thompson (HP)
Thompson, em seu livro Ideologia e Cultura Moderna: Teoria social crtica na era
dos meios de comunicao de massa, de 1995, na inteno de contribuir para o que, segundo
ele, uma tarefa permanente de desenvolver uma teoria crtica das sociedades modernas
(THOMPSON, 1995 p. 425), afirma que o desenvolvimento dos meios de comunicao de
massa contribuiu de maneira significativa para o desenvolvimento das sociedades modernas,
assumindo a midiao da cultura como uma das caractersticas constitutivas dessas
21 Trata-se do posicionamento de que o pesquisador cria ou constitui determinado indcio como documento emum processo de significao. A criao material de documentos tambm participa desse processo, como, porexemplo, no caso de fontes orais (antes inexistentes) produzidas em situaes de entrevista.
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sociedades. Para Thompson (1995), a expresso midiao da cultura entendida como o
processo geral atravs do qual a transmisso das formas simblicas se tornou sempre mais
mediada pelos aparatos tcnicos e institucionais das indstrias da mdia (p. 12). Este autor
afirma que as pesquisas interessadas no desenvolvimento das sociedades industriais,
modernas ou no, no se atentaram para essa caracterstica constitutiva das sociedades
modernas, ou no desenvolveram um trabalho satisfatrio em torno deste tema.
Thompson, ao desenvolver as suas argumentaes, analisa as concepes de cultura e
de ideologia que existem/existiram discutindo como estes conceitos surgiram, se
estabeleceram e se modificaram no decorrer dos sculos e, por fim, elabora a sua prpria teia
argumentativa. Ao desenvolver a sua concepo acerca da cultura, afasta-se do carter
restritivo imposto pela concepo clssica22 de cultura, que privilegia trabalhos e valores dealguns em detrimento de outros. Difere-se, tambm, da concepo descritiva23 ao considerar
o conceito de cultura estabelecido por esta vertente, vago, em alguns usos, e em outros,
redundante. Por fim, distancia-se da concepo simblica24, ao considerar que o conceito de
cultura estabelecido por esta vertente, alm de outras dificuldades, no d ateno devida aos
contextos sociais estruturados dentro dos quais os fenmenos culturais so produzidos,
transmitidos e recebidos (THOMPSON, 1995, p. 180). Ao elaborar a sua concepo de
ideologia, busca fugir de um vis que considera a ideologia como uma espcie de cimentosocial, no sentido de manter estveis as sociedades. Para Thompson existem poucos
fundamentos e evidncias que garantam esta estabilidade. O autor tenciona fugir, tambm, da
ideia de atribuir s formas simblicas o carter ideolgico prprio destas. Na sua viso, as
formas simblicas serem ideolgicas, depende da maneira pela qual so usadas e como so
entendidas em contextos sociais especficos. Distingue-se, tambm, de outras concepes, ao
considerar a ideologia no apenas em relao s formas de poder institudas no estado
moderno. Alm destas, considera as relaes de poder e dominao que esto mais presentes
22 Nesta concepo, segundo Thompson (1995) o conceito de cultura definido como o processo dedesenvolvimento e enobrecimento das faculdades humanas, um processo facilitado pela assimilao de trabalhosacadmicos e artsticos e ligado ao carter progressista da era moderna (p. 170). Esta concepo vincula-se, nosomente, mas principalmente, aos filsofos e historiadores alemes do sculo XVIII.23 Nesta concepo, cultura de maneira geral o conjunto de crenas, costumes, idias e valores, bem como osartefatos, objetos e instrumentos materiais, que so adquiridos pelos indivduos enquanto membros de um grupoou sociedade (THOMPSON, 1995, p. 173). Esta concepo est ligada pesquisadores como Tylor, professorde Antropologia na Universidade de Oxford, no final do sculo XIX; Malinowski, antroplogo pertencente aoincio do sculo XX; entre outros.24 Esta concepo de cultura identificada por Thompson iniciou-se nos trabalhos de L. A. White, e foi colocado
no cenrio da Antropologia por Clifford Geertz. De acordo com essa concepo, segundo Thompson (1995) oconceito de cultura o padro de significados incorporados nas formas simblicas, que inclui aes,manifestaes verbais, e objetos significativos de vrios tipos, em virtude dos quais os indivduos comunicam-seentre si e partilham suas experincias concepes e crenas.
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nos contextos sociais das pessoas e que, segundo o autor, so, muitas vezes, mais importantes
para os indivduos. Evita-se, por fim, em sua concepo, a ideia de que a ideologia uma
iluso, uma distoro do real. Esses conceitos, discutidos e reelaborados por este autor,
so de extrema importncia no desenvolvimento do referencial metodolgico para a anlise
das formas simblicas mediadas pelos meios de comunicao.
Ao denominar a sua concepo de cultura como estrutural, afirma que os fenmenos
culturais so as
formas simblicas em contextos estruturados e, portanto, analisar a cultura consisteno estudo das formas simblicas isto , aes, objetos e expresses significativasde vrios tipos em relao a contextos e processos historicamente especficos esocialmente estruturados dentro dos quais, e por meio dos quais, essas formassimblicas so produzidas, transmitidas e recebidas (1995, p.181).
Thompson concebe ideologia como sendo as maneiras como o sentido25, mobilizado
pelas formas simblicas, serve para estabelecer e sustentar relaes de dominao26 [...]
(1995, p. 79). Segundo este autor, estudar a ideologia27 seria procurar compreender como as
formas simblicas esto sendo mobilizadas para criar, fixar, estabilizar, manter e reproduzir as
relaes de dominao sempre considerando o contexto no qual est inserida a forma
simblica, pois esta no ideolgica em si mesma.
O autor mobiliza os conceitos de ideologia e cultura para analisar discursos
veiculados em meios de comunicao de massas (CARDOSO, 2009, p. 26). Segundo
Cardoso (2009), a anlise de um discurso uma anlise cultural, que foca as formas
simblicas, em relao aos contextos que as produzem, transmitem e recebem (p. 26),
procurando sempre identificar como as formas simblicas so mobilizadas para estabelecer e
manter relaes de dominao.
25 Thompson diz que o sentido no qual est interessado o sentido das formas simblicas que esto inseridasnos contextos sociais e circulando no mundo social (1995, p. 79).26Para Thompson uma relao de dominao quando h relaes sistematicamente assimtricas de poder.Poder a capacidade que possibilita ou capacita alguns indivduos a tomarem decises, e perseguirem certosfins ou realizarem interesses [...]. (1995, p. 199).27 Thompson classifica a ideologia em dois tipos de concepes: a neutra, e a crtica. Segundo Thompson, asconcepes neutras so aquelas que tentam caracterizar fenmenos como ideologia, ou ideolgicos, semimplicar que estes fenmenos sejam, necessariamente, enganadores e ilusrios, ou ligados com os interesses dealgum grupo em particular.(1995, p. 72). J as concepes crticas, segundo o mesmo autor, so aquelas que
possuem um sentido negativo, crtico ou pejorativo [...] implicam que o fenmeno caracterizado como ideologia ou ideolgico enganador, ilusrio ou parcial; e a prpria caracterizao de fenmenos como ideologiacarrega consigo um criticismo implcito ou a prpria condenao destes fenmenos. (1995, p. 73). A respeito
desta ltima classificao, o autor distingue quatro critrios de negatividade que compem, ou no, asconcepes que se enquadram nela. Segundo ele, a ideologia pode: ser abstrata ou impraticvel, ser errnea ouilusria, expressar interesses dominantes ou sustentar relaes de dominao. Ainda, conforme o autor aponta, asua formulao sobre a ideologia se enquadra dentro da concepo crtica.
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Thompson, aps estabelecer o que chama de uma viso terica geral sobre cultura,
ideologia e meios de comunicao de massa, discute mais detalhadamente o referencial
denominado Hermenutica de Profundidade, por meio do qual podero ser analisadas as
formas simblicas em seus contextos scio-histricos, considerando, tambm, a estrutura
interna dessas formas.
Formas simblicas, para o autor, so as aes e falas, imagens e textos, que so
produzidos por sujeitos e reconhecidos por eles e outros como construtos significativos
(1995, p. 79). As formas simblicas so caracterizadas por cinco aspectos, a saber: o
intencional, o convencional, o estrutural, o referencial, e o contextual. Os quatro primeiros
aspectos se referem ao significado assumido pela forma simblica, e o quinto aspecto nos
direciona para suas caractersticas socialmente estruturadas.Uma forma simblica possui um aspecto intencional, pois em sua criao sempre h
uma inteno, um interesse. Estas criaes so produzidas por um sujeito e direcionadas para
um sujeito. Com relao a este aspecto, Thompson levanta algumas consideraes
importantes de serem discutidas aqui. Primeiramente, o fato de um sujeito ser capaz de agir
intencionalmente no quer dizer que ele
[...] produziu este objeto intencionalmente, ou que esse objeto o que o sujeitopretendia produzir; ao invs disso, dizer, simplesmente, que esse objeto foiproduzido por, ou que foi percebido como produzido por, um sujeito sobre quem[poder-se-ia] dizer, em certas ocasies, que fez isso intencionalmente.(THOMPSON, 1995, p. 184)
Uma segunda considerao levantada por Thompson diz respeito ao significado.
Segundo o autor, o significado de uma forma simblica, ou dos elementos constitutivos de
uma forma simblica, no necessariamente idntico quilo que o sujeito-produtor
tencionou ou quis dizer ao produzir a forma simblica (THOMPSON, 1995, p. 185).
Assim, textos (orais, escritos ou imagticos) so significados por seus leitores de modo nodeterminante ou plenamente explicvel em relao inteno de dizer de seu autor.
As formas simblicas possuem um aspecto convencional, pois ao serem produzidas
seguem (ou so influenciadas por) padres, regras, cdigos ou convenes estabelecidas pelas
instituies sociais, que se relacionam diretamente com esta no decorrer da sua elaborao.
Pode-se tomar como exemplo um advogado produzindo uma petio ao juiz. Ele deve seguir
as regras estabelecidas pelo frum para a elaborao de tal documento, deve entregar esta
petio num prazo determinado, ao mesmo tempo este advogado deve estar atento s normasgramaticais e ortogrficas da lngua na qual ele est inserido, deve, tambm, estar de acordo
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com o rgo que regulamenta a sua profisso no pas. A quebra de uma destas regras pode
trazer consequncias graves ao processo defendido por este advogado e, at mesmo, a ele
prprio.
Thompson faz uma distino entre as regras, cdigos e convenes envolvidos na
produo, construo e emprego de formas simblicas, de um lado, e aquelas envolvidas na
interpretao das formas simblicas pelos sujeitos que a recebem, do outro (1995, p. 186). O
primeiro denominado pelo autor como regras de codificao, o segundo denominado
como regras de decodificao. O uso dessa terminologia no traz consigo, entretanto, a
ideia de que, ao ser codificado, um texto passa a ter um significado inerente a ser desvelado
pelo leitor. Assume-se, aqui, o pressuposto de que os indcios materiais de um texto marcam
um certo regime de plausibilidade, mas as significaes so mltiplas e no h determinismona relao codificao e decodificao. O prprio autor assume que estes dois conjuntos
de regras no necessariamente coexistem. Uma forma simblica produzida seguindo
determinadas regras e convenes pode ser decodificada de maneiras distintas. Pode ser at
que algo que foi codificado jamais venha ser decodificado, ou algo que nunca tenha sido
codificado venha o ser decodificado28.
O terceiro aspecto caracterstico das formas simblicas o aspecto estrutural. Para
Thompson, isso significa que as formas simblicas so construes que exibem umaestrutura articulada (1995, p. 187). Portanto, as formas simblicas possuem elementos
internos bem articulados entre si com o objetivo de dar algum significado ao que se quer
transmitir. esse aspecto que d condies de analisar internamente uma forma simblica.
Thompson distingue entre a estrutura de uma forma simblica, de um lado, e o
sistema que est corporificado em uma forma simblica particular, de outro (1995, p.187).
Para realizar a anlise da estrutura de uma forma simblica indica-se analisar os elementos
que a compe identificando as relaes estabelecidas entre esses elementos. Para analisar osistema que est corporificado em uma forma simblica, deve-se concentrar os esforos em
perceber como se d a reunio dos elementos que formam um conjunto coerente entre si. O
primeiro tipo de anlise contribui para a compreenso do segundo, assim como o segundo
contribui para a compreenso do primeiro.
Mesmo que as anlises citadas anteriormente sejam importantes para uma melhor
compreenso do significado transmitido pelas formas simblicas (THOMPSON, 1995, p.
188), elas ainda so limitadas. So limitadas pois, apesar das formas simblicas terem uma
28Essa situao ocorre quando um indivduo interpreta eventos ou padres naturais como sendo, ou que socausados por, um ser sobrenatural, ou divino.
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estrutura interna, elas tambm referem-se a algo ou algum que jamais se identificar com o
significado. Outra limitao desse tipo de anlise se deve ao fato de no contemplar o aspecto
contextual da forma simblica, ou seja, as relaes e influncias em que essas formas esto
inseridas.
O quarto aspecto caracterstico das formas simblicas o aspecto referencial. As
formas simblicas, ao serem construdas, sempre tm a finalidade de se referir, representar e
dizer algo sobre determinada coisa. Pode-se tomar como exemplo o livro didtico de
matemtica que, segundo Oliveira (2008), tem como objeto referencial a educao
matemtica.
O quinto e ltimo aspecto das formas simblicas o aspecto contextual. As formas
simblicas so construdas em contextos sociais historicamente estabelecidos e levam em si asmarcas das relaes sociais existentes neste ambiente. Alm disso, as formas simblicas
tambm so recebidas por indivduos inseridos em contextos sociais que podem se diferenciar
daquele no qual a forma simblica foi produzida. Compreender, ou no, uma forma simblica
depende das capacidades e dos recursos que o indivduo capaz de empregar para
realizar a interpretao.
At aqui foram discutidos os principais aspectos que constituem uma forma simblica.
A partir deste momento, apresentar-se- a metodologia proposta por John B. Thompson,conhecida como a Hermenutica de Profundidade.
Thompson, fundamentado nos estudos de Dilthey, Heidegger, Gadamer, e Ricoeur,
estabelece algumas condies que devem ser consideradas ao se trabalhar com a hermenutica
em uma investigao scio-histrica. A primeira condio nos revela que estudar as formas
simblicas um problema de compreenso e interpretao, pois e las so produes
significativas.
A anlise formal ou interna da forma simblica no rejeitada por Thompson, eleafirma a importncia desta forma de anlise, mas esclarece que esta parcial por no
contemplar o fato de que as formas simblicas so produes significativas e que trazem
inevitavelmente problemas qualitativamente distintos de compreenso e interpretao
(1995, p. 358).
Outra importante condio a ser considerada se refere ao fato de que o analista social,
ao interpretar uma forma simblica, pode estar interpretando algo j interpretado pelos
sujeitos que produziram o campo-objeto em que a forma simblica est inserida.
Deve-se considerar que os sujeitos que constituem o campo-sujeito-objeto so, como
os prprios analistas sociais, sujeitos capazes de compreender, de refletir e de agir
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fundamentados nessa compreenso e reflexo (THOMPSON, 1995, p. 359). Neste sentido,
os sujeitos pertencentes ao campo-objeto no so indivduos passivos que aceitam as
situaes sem levantarem questionamentos, muito pelo contrrio, eles aceitam, refutam,
questionam, sendo possvel at a transformao do campo no decorrer do processo de
apropriao.
Por fim, a hermenutica nos lembra que os sujeitos que constituem parte do mundo
social esto sempre inseridos em tradies histricas (THOMPSON, 1995, 360). Estes
sujeitos so influenciados por valores e tradies que so passados de gerao em gerao. A
construo do novo sempre histrica, baseia-se em resduos do passado, seja por
aproximao ou afastamento.
Para analisar as Formas Simblicas, Thompson distingue trs exerccios emarticulao: a Anlise Scio-Histrica, a Anlise Formal ou Discursiva e
Interpretao/Reinterpretao.
2.1.1 Anlise Scio-Histrica
Realizar uma anlise scio-histrica de uma forma simblica consiste em reconstruir
as condies sociais e histricas de produo, circulao e recepo das formas simblicas(THOMPSON, 1995, 366). Nesta dimenso, busca-se compreender as condies nas quais a
forma simblica foi produzida, quais as intenes por trs de sua construo, que instituies
esto interessadas na sua produo, quais foram as condies de recepo da forma simblica.
Dentro da anlise scio-histrica, Thompson apresenta cinco dimenses de anlise
distintas. A primeira a ser apresentada so as situaes espao-temporais.
As formas simblicas so produzidas [...] e recebidas [...] por pessoassituadas em locais especficos, agindo e reagindo a tempos particulares e alocais especiais, e a reconstruo desses ambientes uma parte importanteda anlise scio-histrica. (THOMPSON, p.366)
Uma segunda dimenso estabelecida pelo autor se refere aos campos de interao nos
quais a forma simblica est inserida. Estes campos de interao so um espao de posies,
ou um conjunto de trajetrias que oportunizam relaes e acessibilidades diferentes a pessoas
diferentes.
As instituies sociais so a terceira dimenso de anlise estabelecida por Thompson.
Para o autor, as instituies sociais podem ser vistas:
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Como conjuntos relativamente estveis de regras e recursos, juntamente comrelaes sociais que so estabelecidas por eles. [...] Analisar instituies sociais reconstruir os conjuntos de regras, recursos e relaes que as constituem, traar seudesenvolvimento atravs do tempo e examinar as prticas e atitudes das pessoas queagem a seu favor e dentro delas. (THOMPSON, 1995, p. 367).
A quarta dimenso a anlise das estruturas sociais. Thompson emprega este conceito
para se referir s assimetrias e diferenas relativamente estveis que caracterizam as
instituies sociais e os campos de interao. Analisar a estrutura social identificar as
assimetrias, as diferenas e as divises. (THOMPSON, 1995, p. 367)
A quinta e ltima dimenso de anlise apresentada pelo autor envolve os meios
tcnicos de construo e transmisso das formas simblicas. O meio tcnico pode ser um
papel, uma pedra, a lngua, os gestos ,e dependendo do meio tcnico utilizado, consegue-se
um maior, ou menor grau de reproduo e fixidez29, e uma maior ou menor possibilidade de
participao para os sujeitos que utilizam o meio: a leitura de um livro, por exemplo, exige
conhecimentos diferentes daqueles que so necessrios para assistir um programa de
televiso.
2.1.2 Anlise Formal
A segunda dimenso de anlise de uma forma simblica denominada por Thompson
como anlise formal ou discursiva. Esta dimenso possvel, pois as formas simblicas
possuem uma estrutura articulada na inteno (irrecupervel) de dizer algo.
A anlise formal consiste na anlise das caractersticas estruturais internas, seus
elementos constitutivos e inter-relaes, interligando-os aos sistemas e cdigos dos quais eles
fazem parte (THOMPSON, 1995, p. 370).
So apontadas pelo autor algumas possibilidades de anlise: a semitica, a daconversao, a sinttica, narrativa e argumentativa. A maneira pela qual o pesquisador ir
realizar a anlise formal da obra uma escolha pessoal.
29 Entende-se por fixidez o tempo de durao que um meio tcnico possibilita transmisso de uma formasimblica. Thompson apresenta, como exemplo, a comparao entre o tempo de durao de uma mensagemescrita em uma pedra e uma escrita em pergaminho ou papel. A primeira tem uma durao maior que a segunda.
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2.1.3 Interpretao/ (Re)interpretao
A terceira dimenso do enfoque da Hermenutica de profundidade a
interpretao/(re)interpretao. Segundo Thompson (1995):
A interpretao constri sobre esta anlise [anlise discursiva], como tambm sobre
os resultados da anlise scio-histrica. Mas a interpretao implica um movimento
novo de pensamento, ela procede por sntese, por construo criativa de possveis
significados. (p. 375).
Portanto, trata-se da argumentao criativa e plausvel do analista, sintetizando as
informaes obtidas na anlise scio-histrica e formal ou discursiva. Segundo Oliveira
(2008):
nesse momento que as relaes entre a produo e as formas de produo, asinfluncias do contexto scio-poltico que interferiram no produto final [...] devemser construdas. No apenas nessa fase, mas muito fortemente nela, as relaesideolgicas, as formas como o sentido empregado para estabelecer e sustentarrelaes de poder, podem ser identificadas. (p. 43)
Para finalizar, ressalta-se que estas dimenses da HP no devem ser interpretadas
como situaes que ocorrem em momentos estanques, distintos. Ao contrrio: se realizam
simultnea e harmonicamente dando uma viso completa dos processos de produo e
recepo e, tambm das consequncias atribudas s formas simblicas30.
Trazendo essa discusso para o contexto educacional, a Hermenutica de
Profundidade comea a ser mobilizada para a anlise de textos dos mais variados e, desse
modo, torna-se uma metodologia potencial para o exerccio do qual esta pesquisa se prope.
2.2 Pesquisas fundamentadas na Hermenutica de Profundidade de Thompson
Este texto articula e apresenta exerccios de mobilizao da Hermenutica de
Profundidade na rea da Educao Matemtica. Oliveira (2008), ao identificar a ausncia de
uma reflexo metodolgica a respeito da anlise de livros didticos, apesar de vrias
pesquisas j terem sido realizadas no campo da Educao Matemtica, procurou, em seu
estudo, estruturar uma metodologia de anlise que contemplasse a anlise interna e um
30Apesar das dimenses da Hermenutica de Profundidade ocorrerem de forma simultnea a maneira pela qual
estas dimenses sero apresentadas obedecem a linearidade exigida pela escrita.
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estudo scio-histrico que permitisse compreender os vnculos entre a obra didtica e a
sociedade na qual ela estava inserida (p.12). Por esse motivo, ao entrar em contato com o
trabalho de John B. Thompson, prope a Hermenutica de Profundidade, como um modelo
alternativo para anlise destes materiais, cujas caractersticas j foram apresentadas
anteriormente.
Alm de Oliveira (2008), outras pesquisas tambm se utilizaram da Hermenutica de
Profundidade, mas, diferentemente deste autor que prope esta metodologia como um modo
de anlise, estas pesquisas utilizaram-se das dimenses metodolgicas propostas pela HP para
analisarem diferentes tipos de material. Cardoso (2009) utiliza-se desta metodologia para
analisar as tendncias que permeiam os discursos governamentais (PCNEM/99, PCNEM+/02
e Orientaes curriculares/06) voltadas para a orientao dos professores de matemtica doEnsino Mdio. Andrade (2012) mobiliza a HP para a anlise do livro Essai sur
lenseignement en general, et sur celui des mathmatiques em particulier, escrito por Lacroix
no sculo XIX. Silva (2010) utiliza-se desta metodologia com objetivo de construir um
histrico do contedo Matrizes a partir da anlise de obras didticas utilizadas para o ensino
no Brasil desde o final do sculo XVIII at o final do sculo XX (p. 9).
Em cada um dos usos desta metodologia possvel perceber algumas particularidades.
A pesquisa de Cardoso (2009), por exemplo, utiliza a palavra dimenso, ao se dirigir aosmomentos de anlise propostos pela HP. Oliveira (2008) se refere a estes momentos como
fases da HP, assim como Andrade (2011). J Silva (2010) ao se referir aos momentos de
anlise da forma simblica refere-se a eles como componentes da metodologia. Entre as
diferentes formas de se referir aos momentos de anlise da HP, opta-se, nesta pesquisa, por
aquela estabelecida por Cardoso (2009), por ser a que menos se distancia em tomar as anlises
scio-histrica, formal e a interpretao/ (re) interpretao como momentos que ocorrem
concomitantemente.Ao realizar a dimenso de anlise scio-histrica, Cardoso (2009) utiliza documentos
que fornecem as diretrizes legais e documentos que, na viso da autora, serviro de inspirao
para a produo dos PCNEM/99, PCNEM+/02 e Orientaes Curriculares/06. Entre estes
documentos foram analisados: a Constituio Nacional de 1985 (BRASIL, 1998); a Lei de
Diretrizes e Bases para a Educao Nacionala Lei 9394 de 1996, mais conhecida como
LDB/96 (BRASIL, 1996); o Plano de Desenvolvimento da Educao Nacionala Lei 10.172
de 2001, ou PNE/01 (BRASIL, 2001); as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino
Mdio o Parecer CEB/CNE n 15, de 01 de junho de 1998, ou DCNEM/98 (BRASIL,
1999); as Orientaes Curriculares do Ensino Mdio (BRASIL, 2004); Manifesto dos
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Pioneiros da Educao Nova, de 1932 (TEIXEIRA, 2004); o Manifesto dos Educadores, de
1959 (AZEVEDO, 2007); e o textoAlgumas normas do CNE, relativas ao ensino mdio e que
constam no Anexo. Conforme aponta a autora, os documentos foram estudados nos aspectos
polticos, scio-histricos e filosficos, que so relacionados ao trabalho pedaggico no
Ensino Mdio e que tm influncia nas propostas de ensino para a Matemtica (CARDOSO,
2009, p. 38).
Andrade (2012), ao realizar a anlise scio-histrica do livro de Lacroix, faz uma
discusso sobre os principais acontecimentos na Frana do final do sculo XVIII at meados
do sculo XIX que, na viso da autora, influenciaram a vida e a obra de Lacroix. Pelo que se
percebe, a autora procurou fazer um levantamento considerando as cinco dimenses que
envolvem a anlise scio-histrica. Para situar o momento histrico em que a obra foiproduzida, a autora discute a Revoluo Francesa, iniciada no fim do sculo XVIII, aponta a
influncia do pensamento iluminista no desencadeamento da revoluo e consequentemente
nas mudanas polticas e sociais da poca, e descreve tambm o cenrio de fome e misria em
que vivia a populao francesa daquele perodo.
Ao discutir as estruturas e instituies sociais, Andrade (2012) descreve como era a
vida das mulheres neste perodo e a importncia delas na Revoluo, como eram as famlias
francesas, como era o modo de produo e comercializao dos livros, o aumento da leiturapor parte da populao francesa, como era a educao na Frana. Neste momento, so
discutidos como eram os colgios franceses, o que foram as Escolas Centrais, como surgiram,
e qual a importncia dos liceus na Frana. Tambm foram discutidos o surgimento, a
implantao e a importncia da Escola Normal e da Escola Politcnica. Nestas discusses, a
autora sempre relacionou estas instituies com as mudanas proporcionadas pela revoluo.
Procurando contemplar os campos de interao da obra, a autora aponta os processos
de aprovao e adoo de livros-texto e as obras produzidas por Lacroix neste momento daFrana. Por fim, a autora discute, procurando contemplar os meios tcnicos de construo e
transmisso da obra, o modo como o livro de Lacroix foi estruturado internamente, as
representaes grficas, o tipo de material, e, alm disso, busca as mudanas ocorridas entre
as edies do livro analisado.
Silva (2010), ao realizar a anlise scio-histrica, faz uma discusso sobre o
movimento da matemtica moderna no mundo e no Brasil. Neste momento, ela j desenvolve
a sua interpretao/ (re) interpretao a respeito do ensino de matrizes presentes nos livros
didticos analisados.
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Com relao realizao da dimenso interna/ formal proposta pela Hermenutica de
Profundidade, Thompson (1995) no indica uma forma especfica de anlise. Ao contrrio, ele
deixa a escolha do mtodo de anlise interna ao analista. Nas formas simblicas analisadas em
cada pesquisa percebe-se uma variao de modos de anlise. Cardoso (2009), para a anlise
interna das orientaes governamentais para os professores de matemtica do Ensino Mdio,
utiliza-se da anlise argumentativa. Silva (2010) utiliza a anlise descritiva como modo de
anlise interna dos livros didticos de matemtica usados na pesquisa. Andrade (2012) utiliza-
se daquilo que ela chama de anlise discursiva que, na viso da autora, envolve a anlise
argumentativa, narrativa e sinttica.
Com relao dimenso denominada interpretao/ (re) interpretao, percebem-se,
tambm, algumas diferenas em sua realizao. Cardoso (2009) divide esta dimenso da HPem dois captulos, num dos quais a autora realiza a interpretao dos elementos obtidos nas
anlises scio-histrica e interna da forma simblica e, num outro, realiza a (re) interpretao.
Silva (2010) realiza o momento de interpretao/ (re) interpretao juntamente com a anlise
scio-histrica, relacionando, tambm, alguns elementos internos e externos obra.
Ressalta-se que essa concomitncia ou separao refere-se estruturao dos
trabalhos, tendo em vista que, como j defendido anteriormente, os movimentos analticos so
feitos, na maior parte das vezes, em simultaneidade.
2.3 Mobilizao da Hermenutica de Profundidade nesta pesquisa
Essa pesquisa pauta-se nessa metodologia por julg-la como tendo grande potencial
para alcanar os objetivos presentes, mas tambm por coadunar com os pressupostos j
esboados anteriormente e discutidos nas reunies do Grupo Histria da EducaoMatemtica em Pesquisa. Este grupo tem como um de seus objetivos a compreenso do
movimento de formao de professores que ensinam matemtica no sul de Mato Grosso,
atualmente Mato Grosso do Sul.
Na inteno de compreender as orientaes pedaggicas mobilizadas na estruturao
da formao de professores do ensino primrio de Campo Grande que chegaram por meio dos
manuais pedaggicos, foi adotado o texto de Theobaldo Miranda Santos, Metodologia do
Ensino Primrio, para a realizao da anlise. A escolha deste manual se deu por este ter
sido usado na formao de professores primrios na cidade de Campo Grande. Este uso foi
identificado numa das pesquisas do grupo, desenvolvida por Reis (2011) sobre a Escola
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Normal Joaquim Murtinho. A autora identificou, em sua pesquisa, no prdio desta extinta
escola normal, alguns documentos referentes ao seu perodo de funcionamento que tem incio
a partir da dcada de 1930. Entre estes documentos foi encontrado um livro de portarias, no
qual existe a citao dos livros utilizados pela escola normal e indicados nas portarias de n
4/1953 e 2/1955, conforme as figuras 1 e 2 apresentadas no captulo anterior.
Alm do fato deste livro ter sido encontrado na pesquisa de Reis (2011) como um
daqueles utilizados na Escola Normal, outros dois fatores tambm contriburam para esta
escolha: seu contedo trata da disciplina de metodologia do ensino primrio e, portanto, um
dos instrumentos cuja funo apresentar aos futuros professores mtodos para o ensino das
disciplinas do ensino primrio; e o fato de Theobaldo Miranda Santos ter outras de suas obras
citadas nestas portarias. Este autor tambm desenvolveu a coleo Vamos Estudar?, voltadapara o ensino primrio e direcionada a vrias regies do pas, que foi utilizada no ensino
primrio do estado de Mato Grosso31 segundo a professora Cndida dos Santos. Aluna da
Escola Normal Joaquim Murtinho no incio da dcada de 1950, Cndida afirma que sua
professora de Prtica de Ensino cobrava a matria que era da escola primria , voc era
obrigada a estudar e ler o livro Vamos estudar, da escola primria, e praticar todas as
matrias (REIS, 2011, p. 21).
Feita a escolha do manual Metodologia do Ensino Primrio, assume-se os manuaispedaggicos, e mais especificamente o manual j citado, como forma simblica, pois possuem
os cinco aspectos-chave que caracterizam um objeto ou qualquer outra produo humana
como forma simblica.
Os manuais pedaggicos so produzidos com alguma inteno, neste caso, de
apresentar aos futuros professores as melhores maneiras de se trabalhar os contedos do
ensino para que se obtenha uma maior eficcia no processo de ensino e aprendizagem.
Os manuais pedaggicos seguem determinadas convenes para que possam seradotados nas instituies de ensino. As orientaes governamentais, a lngua oficial do pas, a
presena de tendncias em alta no discurso educacional, so exemplos de possveis
influncias acerca da produo dos manuais pedaggicos, que tm uma estrutura interna
articulada. A maneira como se inicia um contedo e a forma de se apresentar atividades, so
exemplos de elementos que podem ser identificados e articulados nestes manuais. Ao serem
produzidos se referem a algo ou a alguma coisa, neste caso s metodologias de ensino
31 Vale relembrar que na dcada de 1950, na qual foram encontrados indcios do uso do manual Metodologia doEnsino Primrio, Campo Grande fazia parte da regio sul do estado de Mato Grosso, vindo a ser, logo aps adiviso deste estado em Mato Grosso e Mato Grosso do Sul, capital do estado de Mato Grosso do Sul.
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propostas para a formao de professores. Os manuais pedaggicos so produzidos em
contextos sociais e histricos que, de uma maneira ou de outra, influenciam na sua produo.
Aps esta caracterizao do manual pedaggico como forma simblica prope-se a
mobilizao da Hermenutica de Profundidade para a anlise dos manuais pedaggicos, mais
especificamente, o manual de Santos (1952) foco desta pesquisa. Ressalta-se, uma vez mais,
que os momentos propostos pela Hermenutica de Profundidade para a anlise das formas
simblicas so entendidos, nesta pesquisa, como dimenses, movimentos desta metodologia e
que so muitas vezes desenvolvidas, em ao, concomitantemente, embora o processo de
comunicao da anlise efetivada se estruture de modo linear e, portanto, ordenado. Desse
modo, ressalta-se a diferenciao desses dois momentos: o analtico propriamente dito e o de
comunicao (ou registro para comunicao). Trata-se de movimentos fundamentais aoexerccio investigativo, mas que articulam-se com dificuldade na apresentao linear do
catico.
Para o estudo scio-histrico da forma simblica, aqui analisada, foram realizadas
investigaes a respeito das escolas normais e dos prprios manuais pedaggicos. As
investigaes sobre as escolas normais contriburam para entender quais os objetivos de sua
criao, como esta foi entendida e incorporada no pas e, tambm, o papel destas instituies
na formao de professores primrios no Brasil. As investigaes sobre os manuaiscontriburam para uma compreenso do que foram estas formas simblicas, sobre a sua
importncia e influncia na formao de professores.
Prosseguindo com o estudo scio-histrico foram investigados o cenrio poltico e
educacional no Brasil e no estado do Mato Grosso, procurando compreender em que
condies o pas se encontrava e quais polticas educacionais vieram a ser implementadas no
pas. Alm disso, procurou-se identificar quais as instrues governamentais para a formao
das normalistas. Neste sentido, a anlise da lei orgnica do Ensino Normal (em nvelnacional), promulgada em 1946, e do regulamento n 590, de 1948, realizado pelo estado do
Mato Grosso sobre o ensino normal, foi importante. Procurou-se, tambm, compreender as
tendncias educacionais em alta no perodo da produo da forma simblica.
Para um aprofundamento do estudo scio-histrico, foram realizados levantamentos a
respeito da vida e das produes de Theobaldo Miranda Santos, que contriburam para uma
melhor compreenso a respeito dos ideais/concepes deste autor e, tambm, dos campos de
interao nos quais ele se inseria.
Foram investigados, ainda, os dirios oficiais publicados no estado de Mato Grosso
dcada de 1950, com a inteno de encontrar informaes a respeito das escolas normais do
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estado e se havia alguma sugesto/indicao de livros a serem adotados pelos professores nas
escolas.
A anlise interna/formal foi realizada no manual Metodologia do Ensino Primrio,
editado em 1952. Para execuo desta dimenso realizou-se uma anlise descritiva,
identificando como a obra estruturada, quais os principais temas abordados e como eles so
abordados. Desenvolveram-se, tambm, algumas tabelas procurando identificar o que o autor
aceita ou rejeita daquilo que apresentado no texto.
Por fim, o desenvolvimento da terceira dimenso da Hermenutica de Profundidade
ocorreu simultaneamente s outras duas dimenses e um texto articulador foi produzido, de
modo a (re) interpretar todos os elementos que, de um modo ou outro, contriburam para a
constituio desta forma simblica utilizada nas escolas normais de Campo Grande.A Hermenutica de Profundidade contribui para uma compreenso sobre a formao
de professores primrios na cidade de Campo Grande na medida em que prope a articulao
entre o contexto scio-histrico e a estruturao interna da forma simblica.
Ao analisar o manual de Theobaldo Miranda Santos sob esta perspectiva, os
levantamentos referentes s situaes espao-temporais, aos campos de interao, s
instituies e estruturas sociais, e aos meios de construo e transmisso que constituem a
anlise scio-histrica, juntamente com os levantamentos estruturais internos, fornecem aopesquisador informaes importantes acerca de: como se pensava a educao, quais as
polticas e objetivos do governo a este respeito, quais disputas ideolgicas fizeram parte dos
debates educacionais nos perodos de produo da forma simblica, quais eram as concepes
de ensino e educao, quais instituies influenciavam a educao, em qual grupo social o
autor do manual estava inserido e o pensamento deste grupo a respeito da educao, quais os
objetivos do autor ao escrever o livro, quais as regulamentaes que orientaram a formao de
professores no pas e no estado, e, por meio da anlise de outros materiais produzidos peloautor, compreender quais as utilizaes que este fez daquilo que foi apresentado na
estruturao da forma simblica, bem como os usos feitos por alunos e professores do
manual, enriquecendo as interpretaes sobre a formao de professores primrios no perodo
de produo e utilizao desta obra.
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2.4 Paratextos editoriais
Como forma de complementar/apoiar a compreenso a respeito de alguns aspectos da
estruturao interna do manual Metodologia do Ensino Primrio, utiliza-se, tambm nesta
pesquisa, a concepo de Paratextos editoriais, desenvolvida por Gerrd Genette (2009).
Paratextos editoriais, segundo Genette (2009), so todas as produes (um nome de
autor, um ttulo, um prefcio, ilustraes, etc.) que, de uma forma ou de outra, reforam e
acompanham um texto para torn-lo presente, para garantir sua presena no mundo, sua
recepo e seu consumo, sob a forma, pelo menos hoje, de um livro [...] aquilo por meio
de que um texto se torna livro e se prope como tal a seus leitores, e de maneira mais geral ao
pblico (GENETTE, 2009, p. 9).Genette (2009) subdivide os paratextos em duas categorias, distintas em sua relao
espacial com o texto. Um paratexto que se situa em torno do texto, no espao do mesmo
volume, como ttulo ou o prefcio, e, s vezes, inseridos nos interstcios do texto, como os
captulos ou certas notas (p.12) so denominados pelo autor de peritexto. J num paratexto,
cuja localizao espacial no est anexada materialmente ao texto, como exemplo: as
conversas, entrevistas, correspondncias dirios ntimos, so denominados pelo autor de
epitextos.Considerando a situao temporal do paratexto, estes so divididos em: Paratextos
anteriores, que aparecem antes da existncia oficial do texto (panfletos, elementos ligados a
uma pr-publicao em jornais e revistas); oparatexto originalsurge juntamente com o texto
(prefcio, dedicatria); paratexto posterior, surge aps a publicao da obra (prefcio
introduzido a partir da segunda obra); paratexto tardio, surge, tambm, aps a publicao da
obra, mas assume um carter mais testamental, de despedida (prefcio, ou posfcio, tardio);
paratextos ntumos, so aqueles que aparecem quando o autor se encontra em vida;paratextos pstumos, so os paratextos publicados aps a morte do autor do texto. Genette
(2009) acrescenta que, da mesma forma que estes paratextos podem surgir durante todo
perodo de existncia do texto, eles podem desaparecer por diversos motivos.
Levando em conta aquilo que Genette chama de condio substancialdo paratexto so
duas as classificaes possveis: um paratexto pode ser textual ou factual. O autor aponta
como exemplos do primeiro caso os ttulos, prefcios, entrevistas, assim como enunciados,
de tamanhos bastante diversos, mas que compartilham o estatuto lingustico do texto (2009,
p. 14), ou seja, so textos de mesma natureza escritos que o texto que eles ajudam a
constituir. No caso dos paratextos de ordemfactual, o autor aponta que estes consistem num
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fato cuja prpria existncia, se conhecida do pblico, acrescenta algum comentrio ao texto
e tem peso em sua recepo (p. 14) citando como exemplos, a idade ou sexo do autor, [...] a
data da obra, [...] a pertena a uma academia, [...] obteno de um prmio literrio, [...] a
existncia [...] de um contexto implcito que precisa ou modifica em maior ou menor grau a
sua significao [...] (p. 14).
Esta abordagem proposta por Genette tem um grande potencial para esta pesquisa na
medida em que proporciona importantes ferramentas para a discusso a respeito dos
elementos que compe o manual pedaggico. O autor contribui, assim, para uma percepo
mais minuciosa e anlise dos indicativos de uma esttica prpria ao manual estudado.
Ressalta-se que esta pesquisa no a primeira a propor esta aproximao entre a
Hermenutica de Profundidade e os Paratextos Editoriais. Embora esta proposta seja nova nocampo da Educao Matemtica, Andrade (2012) se utiliza desta concepo, para a anlise do
livroEssais sur lenseignement en general, et sur celui des mathmatiques en particulier, de
S. F. Lacroix.
Da mesma forma que se pretende nesta pesquisa, Andrade (2012), em sua pesquisa,
mobiliza esta concepo como recurso complementar para a compreenso dos aspectos do
livro analisado em sua materialidade. Para esta pesquisadora, e tambm nesta pesquisa,
somente neste sentido [...] as indicaes de Genette complementam as disposies deThompson quanto Hermenutica de Profundidade (p. 45). Conforme aponta a autora, esta
abordagem aos paratextos contribui, principalmente, para anlise formal ou discursiva,
proposta por Thompson, mas, tambm em sua anlise scio-histrica na medida em que
oferece um contexto histrico para a materialidade da obra aqui mobilizada.
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3 Um olhar sobre o manual Metodologia do Ensino Primrio
Nas pginas que se seguem ser analisada/discutida a estruturao interna do manual
Metodologia do Ensino Primrio, de Theobaldo Miranda Santos. O manual aqui analisado
a terceira edio, publicada pela Companhia Editora Nacional, no ano de 1952. A anlise
deste manual ser feita de forma descritiva usando, tambm, como recurso o conceito de
paratextos editoriais de Genette (2009).
Segundo Genette (2009), o formato do livro durante boa parte de sua histria teve um
importante valor paratextual. Dependendo do formato-dobradura que possuam, os livros
produzidos tinham um determinado grau de importncia. Conforme este autor, o formato, nos
diais atuais, com certeza menos carregado de valor paratextual (p. 23), sendo estesnormalizados ou, como diz o autor, banalizados em torno dos formatos mdios do sculo XIX
(16 x 24 cm). O manual Metodologia do Ensino Primrio em sua terceira edio (1952) tem
como dimenso 14 x 20 centmetros. Baseado no que aponta Almeida Filho (2008), este
manual faz parte da primeira impresso da coleo Curso de Psicologia e Pedagogia (1945-
1954). Conforme aponta este autor, novas alteraes ocorreram em seu formato nas prximas
reimpresses (2 e 3) com exceo de sua ltima (4 reimpresso). Na segunda reimpresso,
houve uma diminuio nas dimenses do manual (13,5 x 19 cm), na terceira, um aumento (14x 20 cm).
Genette (2009) aponta que os recursos paratextuais da capa eram pouco explorados.
As capas dos livros geralmente se apresentavam mudas, salvo a indicao resumida do ttulo
e, s vezes, do nome do autor, que figurava na lombada (p.27). A partir do sculo XIX, ao
perceberem o potencial paratextual da capa, estes recursos passam a ser melhor explorados.
Dentre as possibilidades daquilo que se pode figurar numa capa, a presena do nome do autor,
do ttulo da obra e do selo do editor so praticamente obrigatrias.No caso do manual analisado, a sua capa a original e apresenta as seguintes
informaes: o nome da coleo, o nmero do volume, o nome do autor, numa fonte bem
maior apresentado o ttulo do manual e, bem mais abaixo, o nome da editora. Todas as
informaes esto centralizadas na capa, conforme a imagem abaixo:
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Figura 3Capa do manual Metodologia do Ensino Primrio
Fonte: Manual Metodologia do Ensino Primrio, 3 edio, ano1952.
O nome da coleo da qual este manual faz parte possibilita, j de incio, a inferncia
sobre quais temas sero abordados em seus volumes. Conforme aponta Almeida Filho (2008),
esta uma coleo cujo prprio coordenador foi Theobaldo Miranda Santos. Observando a
figura acima tm-se uma noo de como estruturada a capa dos outros manuais desta
coleo. O que muda desta capa para as demais so as cores de suas margens, a cor da borda
em que se encontram os temas e a cor das informaes escritas.
Outra informao latente na figura acima trata-se do nome do autor. Segundo Genette
(2009) o nome do autor, ao contrrio do que possa parecer, nem sempre foi um elemento
paratextual de um texto. Partindo disso, o autor distingue trs condies sobre as quais se
revestem o nome do autor: o onimato, o pseudonimato e o anonimato. O anonimato ocorrequando em um livro no imputada