Desafios e Perspectivas Da Politica Social

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    TEXTO PARA DISCUSSO NO 1248

    DESAFIOS E PERSPECTIVAS

    DA POLTICA SOCIAL

    Anna Maria Peliano (org.)

    Braslia, dezembro de 2006

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    TEXTO PARA DISCUSSO NO 1248

    DESAFIOS E PERSPECTIVAS

    DA POLTICA SOCIAL*

    Anna Maria Peliano (org.)

    Braslia, dezembro de 2006

    * Agradecemos os comentrios e contribuies de Andr Campos, Antnio Rodriguez Ibarra e Sergei Soares.

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    Governo Federal

    Ministrio do Planejamento,Oramento e Gesto

    Ministro Paulo Bernardo Silva

    Secretrio-Executivo Joo Bernardo de Azevedo Bringel

    Fundao pblica vinculada ao Ministrio do

    Planejamento, Oramento e Gesto, o Ipea

    fornece suporte tcnico e institucional s aes

    governamentais possibilitando a formulaode inmeras polticas pblicas e programas de

    desenvolvimento brasileiro e disponibiliza,

    para a sociedade, pesquisas e estudos

    realizados por seus tcnicos.

    PresidenteLuiz Henrique Proena Soares

    Diretor de Cooperao e Desenvolvimento

    Alexandre de vila GomideDiretora de Estudos SociaisAnna Maria T. Medeiros Peliano

    Diretora de Administrao e FinanasCinara Maria Fonseca de Lima

    Diretor de Estudos SetoriaisJoo Alberto De Negri

    Diretor de Estudos Regionais e UrbanosMarcelo Piancastelli de Siqueira

    Diretor de Estudos MacroeconmicosPaulo Mansur Levy

    Chefe de GabinetePersio Marco Antonio Davison

    Assessor-Chefe de ComunicaoMurilo Lbo

    URL: http://www.ipea.gov.br

    Ouvidoria: http://www.ipea.gov.br/ouvidoria

    ISSN 1415-4765

    JEL I30, J68, H55, I38, I18, I28, H11

    TEXTO PARA DISCUSSO

    Publicao cujo objetivo divulgar resultados de

    estudos direta ou indiretamente desenvolvidos pelo

    Ipea, os quais, por sua relevncia, levam informaes

    para profissionais especializados e estabelecem um

    espao para sugestes.

    As opinies emitidas nesta publicao so de exclusiva

    e de inteira responsabilidade do(s) autor(es), no

    exprimindo, necessariamente, o ponto de vista do

    Instituto de Pesquisa Econmica Aplicada ou o do

    Ministrio do Planejamento, Oramento e Gesto.

    permitida a reproduo deste texto e dos dados nele

    contidos, desde que citada a fonte. Reprodues para

    fins comerciais so proibidas.

    A produo editorial desta publicao contou com o

    apoio financeiro do Banco Interamericano de

    Desenvolvimento (BID), via Programa Rede de

    Pesquisa e Desenvolvimento de Polticas Pblicas

    Rede-Ipea, o qual operacionalizado pelo Programa

    das Naes Unidas para o Desenvolvimento (Pnud),

    por meio do Projeto BRA/04/052.

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    SUMRIO

    SINOPSE

    APRESENTAO 7

    1 ABRINDO O DEBATE: POLTICA SOCIAL EM TEMPOS DE CRISE 9

    2 SALRIO MNIMO E MERCADO DE TRABALHO: POSSVEIS EFEITOS BENFICOSDE UMA POLTICA DE VALORIZAO E DE FORTALECIMENTOINSTITUCIONAL DO SALRIO MNIMO 13

    3 PREVIDNCIA SOCIAL E REFORMAS 20

    4 INDIGNCIA E POBREZA: EFEITOS DOS BENEFCIOS PREVIDENCIRIOS,ASSISTENCIAIS E TRANSFERNCIAS DE RENDA 30

    5 DESAFIOS POSTOS AO SISTEMA NACIONAL DE SADE 40

    6 SUBSDIOS PARA MELHORAR A EDUCAO NO BRASIL 53

    7 SISTEMA PBLICO DE EMPREGO, TRABALHO E RENDA NO BRASIL:LIMITES E POSSIBILIDADES 72

    8 CONSIDERAES SOBRE A CONSISTNCIA E A DIRECIONALIDADEDAS AES GOVERNAMENTAIS 82

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    SINOPSE

    Este texto apresenta os resultados de um processo de discusso, no mbito daDiretoria de Estudos Sociais (Disoc), do Ipea, a respeito dos avanos, problemas edesafios das polticas sociais no Brasil. Para sua elaborao, a Disoc organizou intenso

    debate, visando construo de consensos entre os seus integrantes, por entender quea situao exigia mais que a simples expresso de posies ou opinies pessoais.O resultado apresentado a seguir, na forma de textos autorais, e est concentradoem temas que a Diretoria considerou especialmente relevantes na atual conjuntura esobre os quais possui conhecimento acumulado. Os captulos que compem estedocumento se dedicam s seguintes questes: Poltica de Valorizao do SalrioMnimo; Previdncia Social e Reformas; Efeitos dos Benefcios Previdencirios,

    Assistenciais e das Transferncias de Renda sobre a Indigncia e a Pobreza; Desafiospostos ao Sistema Nacional de Sade; Subsdios para Melhorar a Educao Brasileira;e Sistema Pblico de Emprego, Trabalho e Renda: limites e possibilidades. O texto

    aberto enfeixado com consideraes sobre a problemtica social e a direcionalidadeda ao do governo.

    Ao dar publicidade a essa reflexo, a Disoc espera estar contribuindo para que ospoderes pblicos e os atores sociais responsveis pelo futuro imediato possam fazerescolhas, tomar decises e conduzir as suas aes mais conscientes das implicaes que asacompanham e das conseqncias possveis. A temtica aqui tratada rica e complexa,e do seu debate no se deve esperar consensos fceis. Ao contrrio, trazendo a pblico acomplexidade inerente ao tema, o Ipea espera contribuir para o avano da discussopblica sobre os desafios que se colocam hoje para as polticas sociais brasileiras, assimcomo para os caminhos possveis para a reduo das iniqidades sociais que ainda

    hoje caracterizam o pas.

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    APRESENTAO

    Em meados de 2006, o Ministrio do Planejamento solicitou ao Ipea a elaborao deuma agenda que contemplasse as principais questes a serem objeto de uma novaestratgia de desenvolvimento nacional. Tal agenda tambm deveria contribuir para a

    preparao do Plano Plurianual (PPA) 2008-2011, que dever ser enviado ao CongressoNacional em 2007. Trata-se de uma obrigao institucional do Ministrio paracumprir o preceito estabelecido na Constituio Federal e que conforma a base dosistema de planejamento e gesto federal, fixando objetivos, estratgias, metas eindicadores para a ao do governo.

    Para atender a essa solicitao, cada uma das diretorias do Ipea encarregou-se depromover debate em suas respectivas reas de competncia com vistas a produzirpropostas pertinentes. A opo adotada pela Diretoria de Estudos Sociais (Disoc) foia de organizar intensa discusso, visando a confrontar opinies, aferir a posio do grupoe, inclusive, expor divergncias, por entender que um produto com as caractersticas do

    que havia sido demandado deve ir alm da simples expresso de posies ou opiniespessoais, ainda que assegurando o carter autoral dos textos.

    O resultado desse processo apresentado a seguir. No se trata de documentoque abranja todas as reas sociais e todos os problemas. Est concentrado naquilo quea Diretoria considerou mais importante na atual conjuntura e sobre o que acumulamaior experincia e conhecimento. Cabe ainda observar que, nas reas tratadas,alguns aspectos relevantes podero estar somente apontados, indicando que faltamelementos para sugerir propostas de interveno mais consistentes. Os debates quedevero decorrer deste Texto para Discusso (TD) podero, sem dvida, contribuirpara aprimoramentos futuros.

    Os captulos que compem este documento abordam os seguintes temas: Poltica deValorizao do Salrio Mnimo; Previdncia Social e Reformas; Efeitos dos BenefciosPrevidencirios, Assistenciais e das Transferncias de Renda sobre a Indigncia e a Pobreza;Desafios Postos ao Sistema Nacional de Sade; Subsdios para Melhorar a EducaoBrasileira; Sistema Pblico de Emprego, Trabalho e Renda: limites e possibilidades.Precede a apresentao desses temas uma apreciao geral dos problemas sociais e sucedea eles consideraes sobre a direcionalidade da ao governamental.

    Novas reflexes sobre os assuntos aqui abordados, bem como sobre temas queno foram tratados, fazem parte do prximo nmero da publicao Polticas Sociais:

    Acompanhamento e Anlise, na qual ser abordada a evoluo das diversas reas sociaisnos ltimos dez anos, e constatar a anlise das polticas governamentais em curso e aproposio das linhas de ao pertinentes.

    Ao dar publicidade a essa reflexo, a Disoc espera contribuir para o avano dadiscusso pblica sobre os desafios que se colocam para as polticas sociais brasileiras,assim como para os caminhos possveis para a reduo das iniqidades sociais queainda hoje caracterizam o pas.

    Anna Maria PelianoDiretora de Estudos Sociais

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    1 ABRINDO O DEBATE: POLTICA SOCIAL EM TEMPOS DE CRISE

    Ronaldo Coutinho Garcia*

    A democratizao do pas permitiu a elaborao da Constituio Federal de 1988 sobforma intensamente participada. Disto decorreu o apelido que lhe foi dado:

    Constituio Cidad. Posteriormente, as presses de setores organizados da sociedadepela regulamentao de diversos direitos sociais estabelecidos na nova Carta e pelaaprovao de importantes emendas constitucionais, levaram ampliao de direitos e aoestabelecimento de meios ao devido financiamento de sua implementao. Desdeento, o poder pblico intensificou e ampliou as aes na esfera social. Significativosavanos foram conseguidos, em quase todas as reas setoriais. Muitos de taisprogressos foram incrementados nos ltimos trs anos e meio, sendo que alguns delesse iniciaram em 2003 ou mesmo depois. Um espao de tempo curto para construirdiferenas em um quadro de desigualdades sociais to acentuadas e profundas comoem nosso pas. E, no entanto, aconteceu.

    O mais interessante que tais avanos tm-se dado ao longo de muitos anos debaixo crescimento do PIB, com a economia brasileira regredindo no rankingmundial(14a em 2005, contra 7a/8a posio no incio da dcada de 1980)1 e apresentando a piorperformance entre todos os emergentes. Deve ser lembrado, tambm, que, no ltimodecnio e meio, foi promovida transferncia financeira equivalente a quase 1,5 PIBaos credores do Estado. Para tanto, a participao do governo na renda nacionalsubiu, empurrada por uma carga tributria crescente, sobre uma base contributivaque no se ampliava, ao contrrio, encolhia na informalidade, na ilegalidade e naevaso/sonegao, gerando uma espiral descendente para a sociedade, a economia ea federao nacionais. Em simultneo, a participao do trabalho na distribuio

    funcional da renda acusa perda de quase um ponto percentual, por ano, desde incioda dcada de 1990, acompanhando a queda da renda mdia real dos trabalhadores.

    Por tais condies, era de se esperar uma piora generalizada em grande nmero deindicadores sociais durante a presente dcada. No isto, no entanto, o que mostram asestatsticas e as anlises feitas. Apesar de ao longo dos anos 1990 o desemprego ter maisdo que dobrado, de a informalidade no mercado de trabalho ter ultrapassado aformalidade, de a massa salarial ter sido achatada, hoje constatvel que a mortalidadeinfantil e a desnutrio esto caindo, a escolaridade mdia est aumentando, reduzem-seas desigualdades regionais, raciais e de gnero no acesso educao, a cobertura daateno sade eleva-se, a quase totalidade dos idosos recebe benefcios assistenciais ou

    previdencirios, constata-se significativa ampliao de cobertura pela Previdncia Sociale o nmero e a proporo de miserveis esto a declinar.

    Tais tendncias benficas podem causar alguma surpresa. Elas resultam, noentanto, da ampliao significativa da atuao governamental nas principais reassociais. A presso incisiva de diversos setores organizados da sociedade brasileira na defesada extenso de direitos massa da populao, a compreenso de parte majoritria doCongresso Nacional da importncia de assegurar prioridade oramentria a certas reas

    * Tcnico de Planejamento e Pesquisa da Diretoria de Estudos Sociais (Disoc) do Ipea, [email protected]. Indicadores do Desenvolvimento Mundial, Banco Mundial, julho de 2006. Medido pelo Mtodo Atlas.

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    da poltica social e a disposio governamental em executar determinados programas deao, fez que os indicadores sociais tivessem o comportamento observado nos ltimosanos, expressando melhorias concretas em importantes dimenses da vida social.

    Dois dos resultados recentemente mais destacados foram a gerao de mais dequatro milhes de empregos formais (de 2003 a meados de 2006) e a desconcentrao

    na distribuio pessoal dos rendimentos, medida pela Pnad/2004 e 2005.Tal processo configurou o rompimento de uma situao de longa inrcia, pois as

    taxas de desemprego no recuavam e a informalidade crescia, a estrutura da distribuiopessoal dos rendimentos conhecia apenas pequenas alteraes, evidenciadas por ndicesde Gini que variavam, entre 1997 e 2003, de 0,602 para 0,585 e que, de 2003 a 2004,conheceu desconcentrao mais forte, caindo a 0,574, e para 0,566 em 2005. bastante provvel que estas trajetriaspossamse manter nos prximos anos, devido aoconsidervel aumento do emprego formal, da relativamente rpida recuperao dacapacidade aquisitiva do salrio mnimo, da ampliao e valorizao dos benefciosprevidencirios e assistenciais e do incremento, em nmero e valor, das transferncias de

    renda, mediante o Bolsa Famlia. Os investimentos produtivos passam a conheceraumentos sistemticos (ainda aqum do potencial da economia e das necessidades dasociedade), incorporando inovaes tecnolgicas mediante a importao de bens de capitalde ltima gerao (real valorizado), propiciando elevaes da produtividade e reduo depresses inflacionrias. O aumento da eficincia dos rgos arrecadadores de tributos econtribuies e o prprio crescimento do PIB esto a ajudar a viabilidade do percurso.

    Essa conjuntura abre considerveis espaos para se promover aperfeioamentose aprofundamentos na poltica social do governo federal, com o intuito de ganharsinergia, convergncia e amplitude. Inicialmente, h de se reconhecer que ainda notemos uma poltica social integrada, regida pelos mesmos princpios e orientaes

    estratgicas. Por conta disso, no tem sido possvel sermos mais eficazes noenfrentamento das desigualdades sociais extremas o nosso principal e maisdramtico desafio. No que se imagine uma poltica social capaz de, por si s, dar contade to magno e estrutural problema. Afinal, se temos um padro de acumulao privada,um estilo de crescimento econmico e uma histria de atuao estatal concentradores eprodutores de iniqidades sociais (causamaterde tantos outros problemas), no hpoltica social que resolva, por mais competente, integrada e eficiente que seja.

    Problemas de naturezas diversas ainda so perceptveis na atuao das reasresponsveis pela poltica social no Brasil. Muitos se referem s especificidades decada uma delas. Outros lhes so comuns. o caso das deficincias de planejamento

    e gesto, que a todas afetam. So poderosos fatores a reduzir a eficincia e a eficcia,dificultando que a poltica social cumpra a contento o seu objetivo de diminuirdesigualdades e oferecer proteo, com qualidade e ao mais baixo custo. Tambmgeneralizadas so as dificuldades de universalizar/democratizar o acesso e de garantira continuidade na prestao dos direitos sociais. Na sade isso se apresenta sob o desafiode assegurar a universalidade e integralidade na ateno doena e de intensificara promoo da sade. Na rea de educao, o objetivo ainda a alcanar universalizaro acesso e tornar possvel a progressividade com qualidade. A assistncia socialenfrenta o difcil desafio de garantir o direito renda, aos servios assistenciais e depromover a autonomia. A previdncia social luta por ampliar o acesso e garantir

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    a permanncia, em condies sustentveis. A totalidade dos trabalhadores que busca seempregar no consegue contratos formais, permanecendo e ascendendo neste mercadode trabalho, gozando das protees que deveriam corresponder a essa condio.Todas as reas setoriais (Infra-estrutura, Fomento e Regulao da Produo,Fazendria e Financeira, Cincias e Tecnologia, entre outras) do governo ainda noagem sob a diretriz de reduzir as desigualdades sociais e aquelas que do substncia a

    sua poltica social esto a desejar no que se refere atuao marcada pelas exignciasda eqidade.

    O objetivo de universalizar os direitos sociais e de estender a todos osmecanismos da proteo social requer a adoo de princpios que conduzam continuada reduo das desigualdades. Pautar-se pelo critrio da eqidade passa a serimperativo em uma realidade social como a brasileira. Ainda que no se disponha demtodo consagrado para avaliar se as aes governamentais esto sendo conduzidas sobo signo da eqidade, o seu princpio orientador bastante simples: tratardiferentemente os desiguais, beneficiando os inferiorizados, como condio inarredvelpara alcanar a igualdade.2 Esse tem sido o caminho3 adotado (aqui e em outrospases) para universalizar o acesso aos direitos, para a reduo da iniqidade, para aconstruo de efetivos e democrticos sistemas de seguridade, para buscar maishomogeneidade social, para construir sociedades mais coesas, pacficas e prsperas.

    Evidentemente, a adoo de tal princpio conduz a dilemas. Muitos deles sofortemente dependentes da correlao de foras sociais, para que se faa a opo proposta.Muitos outros podem ser mais bem equacionados quando em perspectiva temporalalongada, permitindo que se troque ganhos de determinada qualidade no presente poroutros, de distinta natureza, no futuro. Alguns tantos podem ser enfrentados medianteconstrues criativas, que combinem aes inovadoras com negociaes inteligentes,

    produzindo viabilidade para o que se apresentava como momentaneamente impossvel.Outros tantos podem exigir do decisor elevado discernimento, provada capacidade delidar com o contraditrio, clara viso do futuro que se quer alcanar, complexo suportepara a tomada de decises crticas e muita determinao.

    O fato, sempre atestado pela histria, que existem alternativas para as peremptriasafirmaes de que h apenas um nico caminho ou uma nica forma de lidar comrestries ou com decises dilemticas (sempre penalizando os mais fracos, social, polticae economicamente). Governar com o objetivo de promover mudanas, de reduziriniqidades sociais demanda estratgias bem desenhadas, competncias mobilizadas eadequadamente organizadas, resultados pretendidos bem delineados, para que se possam

    conduzir aes consistentes, no presente, e lidar com o futuro como o produto de umcomposto dinmico de necessidade, contingncia, acaso e escolha.4

    No so poucos os estudiosos e analistas que advertem sobre se fazer poltica e tomardecises ouvindo apenas os que professam determinada e rgida concepo, os quedefendem religiosamente apenas uma linha de ao, principalmente quando soaltamente especializados ou tcnicos setoriais:

    2. No deve ser confundido com o simplificador igualitarismo.3. o mesmo trilhado pelas Leis Orgnicas da Sade e da Assistncia Social, pelo Fundef (e pelo Fundeb), pela polticade incluso previdenciria, pela atual poltica de financiamento habitao popular, entre outras.4. DROR, Yehezkel. A Capacidade paraGovernar. So Paulo: Fundap, 1999, p. 284.

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    () a forte inclinao de todos os Ministrios de estreitar o escopo da deciso presidencial, node expandi-lo. Eles esto organizados para desenvolver uma poltica preferida, no uma srie deescolhas. Se forado a apresentar opes, o ministrio tpico vai desenvolver duas alternativasabsurdas como espantalhos apontando para a sua opo preferida o que normalmente aparecena posio intermediria. Ao tomar uma deciso em total ignorncia, qualquer Presidente podesatisfazer seus Ministros escolhendo cegamente a opo 2 (intermediria) de qualquer das trsescolhas submetidas sua aprovao.5

    Na prtica, as opes so apresentadas mais ou menos assim: i) explodir o mundo;ii) fazer o que estamos dizendo; ou iii) fugir correndo.

    O alerta tem pertinncia ao se tratar de poltica social (mas claro que vale paratodas as outras). So fortes as tenses presentes na elaborao e na execuo doOramento da Unio, por conta da disputa entre os diversos interesses a se beneficiaremdos gastos do governo. O confronto entre despesas no financeiras e aquelas destinadasao servio da dvida torna-se objeto de ampla cobertura da mdia, repercutindo asposies dos credores. So pblicas as presses e demandas por reduzir os gastos sociaisdo governo. Os interesses que as exercem se enquadram perfeio nas proposies

    opcionais caricaturadas ao final do pargrafo anterior. Reconhecem que um dos eixosda poltica social do atual governo a forte transferncia de renda, mediante benefciosprevidencirios, assistenciais e o Bolsa Famlia, para os segmentos de base da nossaestrutura social. E vem nisso fonte de desequilbrios e insustentabilidades fiscais(colocando em risco o servio da dvida pblica), sem se dar conta das conseqnciassociais e civilizatrias de uma brusca reduo ou interrupo desses fluxos. Defendema no recuperao do salrio mnimo ou que os seus eventuais aumentos no sejamtransmitidos aos benefcios que conseguiram reduzir a ignominiosa concentrao nadistribuio pessoal dos rendimentos. Advogam elevar a desvinculao das receitas daUnio, penalizando fortemente as reas de sade, educao, previdncia e assistncia eprogramas socialmente transformadores, como reforma agrria, Pronaf, saneamento ehabitao popular.

    Assim fazem, minimizando os riscos sociais implcitos em tais propostas e deixandode projetar as inevitveis conseqncias dessas opes, entre os quais se pode lembraro clima de insegurana pblica e de violncia no qual vivemos. Desconsideram osbloqueios mobilidade social ascendente, estabelecidos nas ltimas dcadas, causaprovvel para o fato de milhes de brasileiros terem migrado para pases desenvolvidos(parte majoritria vivendo na clandestinidade) e para a expanso desenfreada do crime,organizado ou no. Reclamam das modestas taxas de crescimento da economianacional (em 2005, nas Amricas, foi maior apenas que a do Haiti) e no estabelecemas relaes entre concentrao de renda e riqueza, desemprego, esterilizao financeira,insuficiente investimento governamental e baixo crescimento.

    H de se ter em conta que a extrema desigualdade social hoje existente foiconstruda com mtodo e determinao, no se tratando apenas de difcil heranacolonial, do latifndio ou da escravido. O fato de sermos um dos campees mundiaisda desigualdade deve nos levar a questionar sobre o que foi feito nos ltimos setentaanos, h um quarto de sculo, durante a dcada passada, no ano findo, ontem e o queser feito hoje para contrariar as tendncias inquas e os processos produtores dedesigualdades. Quais as opes e as omisses praticadas em passados diversos que

    5. NELSON, Michael. A Presidncia e o Sistema Poltico Americano. So Paulo: Ed. Alfa-Omega, 1985, p. 619-20.

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    respondem pelo quadro atual de iniqidades? No eram opes inevitveis; muitos pasesfizeram escolhas distintas, e agora ficamos a olhar para eles com uma certa cobia.

    Estamos conhecendo importantes avanos em nossa poltica social. Eles soresponsveis por alteraes nas condies de existncia de muitas dezenas de milhes debrasileiros miserveis e pobres, contribuindo, ademais, para aumentar o faturamentoe a lucratividade de muitas empresas. Experimentamos um processo indito de promoode acesso ao sistema bancrio e ao crdito (financiamento ao consumo e, tambm, produo familiar). Presenciamos uma igualmente indita expanso de serviosodontolgicos para a populao pobre desse pas e da eletrificao rural e de pequenascomunidades interioranas. As aes afirmativas ganham volume e extenso, ao mesmotempo em que a cultura nacional passa por vigorosa dinamizao. Depois de dcadas,o pas volta a contar com uma poltica habitacional dirigida para as parcelas de menorrenda e v a indstria da construo civil ganhar novo mpeto, com todos osbenficos efeitos de encadeamento que traz.

    Contudo, problemas persistem, alguns se tornaram mais graves, outros ganharamem complexidade, novos surgiram. Os desafios e as exigncias so crescentes. Nos textosque vm a seguir, alguns desses problemas sero evidenciados e analisados, e propostasapresentadas para os seus respectivos enfrentamentos. Deve-se ter sempre em conta que omelhor momento para enfrentar qualquer problema ao seu nascedouro, quando, aindafraco, demanda poucos recursos ou esforos para a sua superao. Com o tempocrescem, tornam-se mais exigentes, fortes e, no limite, insuperveis. Apesar do ditopopular, o que no tem soluo (no momento), solucionado no est.

    2 SALRIO MNIMO E MERCADO DE TRABALHO: POSSVEISEFEITOS BENFICOS DE UMA POLTICA DE VALORIZAO

    E DE FORTALECIMENTO INSTITUCIONALDO SALRIO MNIMO

    Jos Celso Cardos Jr.*

    Roberto H. Gonzalez*

    Na literatura econmica, no existe consenso terico nem evidncia empricadefinitiva sobre a complexa relao que em cada sociedade se estabelece entre salriomnimo e mercado de trabalho. No obstante, h cerca de uma dcada (ou pelomenos desde que o pas reconquistou certa estabilidade monetria), o debate sobreo papel do salrio mnimo na sociedade brasileira em suas vrias dimenses recrudesceu. Mas ainda paira no ar certa frustrao de expectativas porque, com a mesmarapidez com que os debates em torno desta questo so anualmente retomados, elestambm se dissipam velozmente depois de maio (ms em que, tradicionalmente, sepromove o seu reajuste anual), sem que nenhuma resoluo poltica mais duradouratenha sido tomada, alm claro daquela pertinente definio de um novo valoranual de referncia nacional.6

    * Tcnicos de Planejamento e Pesquisa da Diretoria de Estudos Sociais (Disoc) do Ipea, [email protected];,[email protected]. Cabe lembrar que desde 1997 o reajuste anual do salrio mnimo uma atribuio exclusiva do Poder Executivo, nohavendo nenhuma regra explcita nem ndice de preos predefinido para indexao.

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    De todo modo, o atual governo trouxe para seu centro decisrio (notadamentepara o Ministrio do Trabalho e Emprego MTE) parte dos segmentos sociais quesempre defenderam a posio de que o salrio mnimo deveria ser objeto explcitoe ativo de poltica pblica, indo, portanto, na contramo de uma longa ausncia depreocupao governamental neste campo. Isso se manifesta na trajetria de quedasistemtica do seu poder aquisitivo real, desde pelo menos o incio dos governosmilitares, queda esta somente estancada (mas no totalmente recuperada) a partir de1995. Este fator deve ter contribudo, recentemente, no s para o acirramento dodebate pblico sobre o tema, mas tambm pela instituio via Decreto Presidencialde 20 de abril de 2005 de uma Comisso Quadripartite, de carter consultivo, nombito do MTE, composta por representantes do governo, dos empresrios, dostrabalhadores e dos aposentados e pensionistas, para propor um Programa Nacionalde Fortalecimento do Salrio Mnimo.

    No entanto, alm do intenso debate terico e poltico que est sendo travado nointerior desta Comisso (fato em si mesmo benfico para elevar a qualidade das

    discusses pblicas), a nica resoluo prtica tomada a respeito do salrio mnimofoi a fixao de novos valores de referncia nacional que incorporaram ganhos reais dealgo como 7,9% em 2005 e 13% em 2006, fazendo os valores nominais saltarem,respectivamente, para R$ 300,00 e agora para R$ 350,00.7

    No obstante as dificuldades polticas para se consolidar um programaminimamente consensual de fortalecimento do salrio mnimo, tal qual prev a referidaComisso, h elementos tericos e empricos suficientes para sustentar as posiesdaqueles atores sociais que defendem a criao de uma Poltica Nacional deRevalorizao do Salrio Mnimo, superando os limites da viso fiscalista at entodominante tanto no debate intragovernamental como naquele conduzido pela mdia.

    Desde a perspectiva analtica aqui pleiteada, a questo do salrio mnimo numasociedade como a brasileira, marcada por grandes desigualdades sociais, regionaise salariais, adquire carter vital que ultrapassa a mera dimenso oramentria empauta. No fundo, trata-se de saber se se justifica a instaurao de polticas governamentaisativas para regular no s as condies de utilizao e proteo social da fora de trabalho,mas tambm as condies de remunerao de parte expressiva da populao ocupada,bem como de parte pondervel da populao inativa detentora de direitosconstitucionais de natureza previdenciria e assistencial.8

    Em outras palavras, a construo de uma Poltica de Revalorizao do SalrioMnimo meritria, no contexto brasileiro, porque envolveria ao menos cincodimenses diretamente atreladas ao padro de desenvolvimento nacional, o que lheconfere carter estruturante no rol das polticas pblicas de corte federal. Apesar de

    7. Estimativas referentes ao ganho real anual foram fornecidas pelo Ministrio do Trabalho e Emprego.8. Estimativas feitas por Montagner (2005) com base em informaes da Pnad/2003 do conta de que algo como 30%da populao brasileira seja de alguma forma afetada pelas decises que circundam o salrio mnimo, j que tambm asfamlias das pessoas ocupadas (com carteira, sem carteira, autnomos e domsticas), aposentadas, pensionistas,desempregadas sob abrigo do seguro-desemprego e pessoas extremamente pobres sob o abrigo do BPC/LOAS, estariamsendo afetadas pelas resolues em torno do salrio mnimo oficial. A respeito, ver MONTAGNER, P. O salrio mnimoe a dinmica social. In: BALTAR, P.;DEDECCA, C;KREIN, J. D. (orgs.) Salrio Mnimo e Desenvolvimento. Campinas-SP:Unicamp/Instituto de Economia, 2005.

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    complexa, e considerando ainda o espao limitado que esta nota possui para tratar dotema, uma discusso por demais importante na conjuntura atual para no seraqui um pouco mais explorada.

    2.1 SALRIO MNIMO, NVEL DE OCUPAO E DISTRIBUIO DOSRENDIMENTOS

    A primeira e mais clara dimenso de anlise aquela que procura relacionar os impactosque possveis aumentos reais do salrio mnimo teriam sobre o mercado de trabalho,tanto no que diz respeito ao nvel de emprego agregado como sobre a determinao donvel e distribuio dos salrios. De antemo, cabe a advertncia de que qualquer efeitode aumentos reais do salrio mnimo (e outros salrios) sobre qualquer variveleconmica do sistema no pode jamais ser desvinculada do ambiente geral no qualocorrem, particularmente, dentro do contexto macroeconmico que no fundo quemvai sancionar ou no os movimentos deflagrados por determinado aumento real dosalrio mnimo.9 Exemplificando: de se esperar que num contexto de crescimento do

    produto agregado, ou melhor ainda, de expectativa de crescimento futuro do nvel de renda,aumentos reais de salrios sejam mais facilmente incorporveis nas estruturas de custosdas empresas e famlias do que em contextos de retrao das atividades econmicas.10

    Assim sendo, aumentos reais de salrio mnimo podero ter impacto positivosobre o mercado de trabalho, tanto no que diz respeito ao nvel de emprego como aonvel dos salrios, sempre que a trajetria esperada de comportamento de variveis-chave da economia como investimento, produto, renda e lucro forem ascendentes.Em tais condies, no s o nvel geral de emprego no deve se reduzir, como hindicaes de que o aumento real do salrio mnimo no informalize as relaes detrabalho.11 Ademais, no que se refere ao nvel salarial e sua distribuio, de se esperar

    que ele afete tanto as remuneraes de base do mercado de trabalho formalizado,como tambm as remuneraes de base do mercado informal.12 Em ambos os casos,ainda que a influncia no seja direta e imediata (repasses automticos), elafuncionar indireta e diferidamente no tempo como espcie de farol ou guia dereferncia para futuras negociaes. Evidente que o poder de barganha sindical emcada categoria profissional definir as possibilidades de sucesso da empreitada. Masindependentemente disso, tambm em ambos os casos, provvel que, subindo onvel salarial da base da pirmide distributiva, ocorra alguma reduo na enormeheterogeneidade do leque de remuneraes.13

    9. Esta advertncia de cunho metodolgico pertinente, porque muitos estudos empricos em torno desta questo

    simplesmente esquecem este detalhe, extraindo concluses gerais de contextos bastante particulares.10. A meno tambm s famlias importante, porque grande parte das trabalhadoras que recebem em torno dosalrio mnimo so domsticas em residncias particulares.11. Issopode no ser verdade no que se refere ao emprego domstico assalariado, tal qual ficou demonstrado em 2004,quando este tipo de ocupao cresceu 5,9% na categoria sem carteira, retraindo-se em 0,2% na categoria com carteira(saldo lquido de + 4,2% em relao a 2003).12. O emprego domstico pode novamente ilustrar a questo, pois, embora tenha crescido na categoria sem carteira, ofez tendo como base de remunerao o salrio mnimo oficial.13. De fato, em uma ampla compilao de estudos sobre o assunto, Corseuil e Servo (2001) contabilizaram muitasevidncias de determinao positiva entre salrio mnimo e demais salrios da economia, como tambm entre salriomnimo e melhoria da distribuio de renda. A respeito, ver CORSEUIL, C. H.; SERVO, L. M. Salrio Mnimo e Bem-EstarSocial no Brasil: uma resenha da literatura. In: LISBOA, M.; MENEZES-FILHO, N. (orgs). Microeconomia e Sociedade noBrasil. Rio de Janeiro-RJ: Contra Capa Livraria, 2001.

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    No contexto brasileiro dos ltimos dois anos, esta conjuno favorvel de fatoresparece ter ocorrido. Apesar do comportamento oscilante do PIB e das inmerasespecificidades setoriais, as expectativas empresariais eram majoritariamentepositivascom relao s perspectivas de recuperao econmica e crescimento mais sustentvelno futuro imediato. Isso parece ter sido verdade particularmente para os setoreseconmicos vinculados s exportaes e queles sensveis expanso do crdito

    pessoal verificada no perodo (setores produtores de bens de consumo durveis, comoautomotivo, eletroeletrnico e moveleiro; e setores produtores de bens de consumono-durvel, como txtil, calados, bebidas e alimentos). Com isso, os aumentos reaisde salrio mnimo puderam ser absorvidos pelo sistema econmico em simultneoa aumentos do nvel geral de ocupaes, da formalizao dos contratos de trabalho eda reduo da desigualdade de rendimentos, evidenciando a no-inexorabilidade dasteorias que advogam em favor de um trade-offinevitvel entre aumentos reais desalrios e queda do nvel de emprego ou informalizao dos contratos.

    2.2 SALRIO MNIMO E NVEL GERAL DE PREOS

    Uma segunda dimenso importante de anlise se refere aos impactos decorrentes deaumentos reais do salrio mnimo sobre o nvel geral de preos da economia.Tambm neste caso, vale a advertncia metodolgica feita acima: qualquer impactoque se venha a obter contexto-dependente. Em outras palavras, um aumento real desalrio mnimo apenas se converter em inflao se os setores econmicos afetadospelo reajuste estiverem operando com capacidade instalada plena ou quase-plena. Emcaso contrrio, premidos pela concorrncia, tanto os mercados competitivos (flex

    price) como os mercados oligopolizados (fix price), mas contestveis num ambiente deabertura comercial externa e dlar desvalorizado, devem ter alguma dificuldade emrepassar, imediata e automaticamente, seus aumentos de custos aos preos finais.

    Alm disso, como dito acima, se as expectativas destes setores econmicos foremotimistas quanto evoluo futura de variveis como investimento, produto, renda elucros, aumentos de custos podem ser absorvidos, at um certo ponto, sem que asmargens esperadas de rentabilidade precisem ser sacrificadas.

    Esta combinao de fenmenos virtuosos tambm parece ter ocorrido naexperincia brasileira recente, pois os aumentos reais do salrio mnimo se deram emsimultneo queda da inflao esperada e ao aumento da lucratividade geral daeconomia, ainda que para ambos os eventos tenham contribudo para a poltica de

    juros altos do perodo.14

    14. Com respeito relao entre salrio mnimo e inflao, note-se que a mdia dos ndices de preos INPC, IGP-DI,IGP-M e INPC-Fipe passou de 18,9% ao ano em 2002 para 8,7% em 2003, 9,3% em 2004 e 2,9% no acumulado de2005, segundo dados do Bacen (Indicadores de Conjuntura). No mesmo perodo, o salrio mnimo teve sucessivosaumentos reais, da ordem de 1,4% em 2002, 0,5% em 2003, 2,2% em 2004, 7,9% em 2005 e 13% em 2006,segundo informaes do MTE. Acerca da relao entre salrio mnimo e desempenho empresarial, veja-se que osaumentos reais supracitados para o salrio mnimo ocorreram em um ambiente macroeconmico no qual salvo emalguns segmentos, houve melhora de certa forma generalizada na condio financeira das grandes empresas industriais(JACOB, C.; ALMEIDA, J. S. G. Endividamento e Resultado das Empresas Industriais no Terceiro Trimestre de 2005. SoPaulo-SP: IEDI, 2005). Com base neste mesmo trabalho citado, observa-se que considerando cinco instituiesfinanceiras (Banco do Brasil, Bradesco, Ita, Unibanco e Banespa) classificadas entre as dez maiores no ranking do

    Banco Central, a taxa de retorno anualizada sobre o Patrimnio Lquido no terceiro trimestre de 2005 foi de 31,4%,

    registrando um forte aumento em relao ao mesmo perodo de 2004 (23,1%)(JACOB; ALMEIDA, 2005).

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    2.3 SALRIO MNIMO, COMBATE POBREZA E BEM-ESTAR SOCIAL

    A terceira dimenso relevante de anlise reporta-se aos impactos propriamente sociaisdecorrentes de aumentos reais do salrio mnimo. Como dito acima, se o contextomacroeconmico for promissor, aumentos reais do salrio mnimo no devemcomprometer nem o nvel geral de emprego, nem o nvel de formalizao do

    trabalho, nem tampouco o piso e o poder aquisitivo real das remuneraesdo mercado. Evidente que nesta hiptese otimista, aumentos reais de salrio mnimoconverter-se-iam em aumento de bem-estar social para trabalhadores ocupados(estatutrios, com carteira, sem carteira, autnomos e domsticas) afetados por estapoltica de revalorizao. Alm destes, ganhos de bem-estar tambm seriam visveispara aposentados, pensionistas, desempregados sob o amparo do seguro-desempregoe pessoas extremamente pobres sob a guarida da assistncia social (BPC/Loas), j quepara todas estas categorias vale o preceito constitucional que estabelece o salrio mnimocomo piso vinculado (e nacionalmente uniforme) dos benefcios da seguridade social.

    Na literatura nacional sobre o assunto, dominante a bibliografia que comprova

    a correlao positiva entre aumentos reais do salrio mnimo e reduo dos nveisabsoluto e relativo da pobreza, no s entre os ocupados no mercado de trabalho, masprincipalmente em domiclios nos quais h pelo menos um membro recebendobenefcios da seguridade social vinculados ao salrio mnimo.15

    2.4 SALRIO MNIMO E DESENVOLVIMENTO TERRITORIAL

    Associado aos impactos sociais apontados acima, haveria uma quarta dimensonecessria de anlise, ligada aos impactos de ordem propriamente regional (estaduaise municipais), proveniente de aumentos reais do salrio mnimo. Esta umadimenso particularmente importante no caso brasileiro, pois o salrio mnimo

    constitucionalmente vinculado ao piso dos benefcios sociais da previdncia,assistncia e seguro-desemprego, representa parte importante de uma estratgia eficazde combate s desigualdades territoriais de renda. Evidente que a isto deveriamacoplar-se outras polticas de desenvolvimento local, inclusive para garantir queimpactos territoriais decorrentes de aumentos reais de salrio mnimo possamtambm ser absorvidos pelos mercados de trabalho locais.

    Porm, na ausncia de polticas explcitas de desenvolvimento territorial-local, osbenefcios da seguridade social transferidos diretamente a indivduos residentes emregies de rendaper capita inferior mdia nacional, tm cumprido papel extremamente

    15. Em trabalho de relatoria realizado na Cmara dos Deputados no incio de 2000, o deputado federal Eduardo Paesproduziu grande compilao de trabalhos tcnicos sobre os impactos sociais de aumentos reais do salrio mnimo.Ancorado nestes estudos, concluiu que: O atual sistema previdencirio brasileiro, baseado em regime de repartiosimples, possibilita sua utilizao pelo Estado como a mais importante instncia de distribuio de rendas e combate pobreza. (...) Nesse sentido, pode-se afirmar que a Previdncia Social representa hoje, em pleno limiar do sculo XXI, umverdadeiro fundo de combate pobreza para quase 65% dos seus beneficirios e familiares. (p. 105). Para maisdetalhes, ver PAES, E. Salrio Mnimo: combatendo desigualdades. Rio de Janeiro-RJ: Mauad, 2002. Estes mesmosresultados foram posteriormente comprovados em outros estudos, dos quais vale mencionar, entre tantos, apenas trs: i)CAMARANO, A. A. (org.) Os Novos Idosos Brasileiros: muito alm dos 60. Rio de Janeiro-RJ: Ipea, 2004; ii)DAIN, S.;LAVINAS, L. Proteo Social e Justia Redistributiva: como promover a igualdade de gnero. Rio de Janeiro-RJ: FASE,2005; e iii) DELGADO, G.; THEODORO, M. Desenvolvimento e Poltica Social. In: JACCOUD, L. Questo Social ePolticas Sociais no Brasil Contemporneo. Braslia-DF: Ipea, 2005.

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    relevante na sustentao dos nveis de renda e de consumo locais. Em muitos casos,mais precisamente em 3.773 municpios, de 5.561 existentes no Brasil em 2003 (68% dototal),16 o montante transferido monetariamente em nome da seguridade social(aposentadorias, penses, benefcios assistenciais e seguro-desemprego) foi maior que omontante transferido em nome do Fundo de Participao dos Municpios (FPM),demonstrando o poder da seguridade social (e do preceito constitucional que vincula

    seus benefcios ao salrio mnimo) em transferir renda para regies mais pobres,estimulando o desenvolvimento local.

    2.5 SALRIO MNIMO E FINANAS PBLICAS

    Por fim, uma quinta dimenso inescapvel de anlise deve levar em conta um duploefeito de aumentos reais do salrio mnimo sobre as finanas pblicas. De um lado,o impacto fiscal decorrente do aumento dos gastos pblicos; de outro, o impactotributrio decorrente do aumento da arrecadao de impostos e contribuies sociais.Estas duas dimenses do problema caminham juntas e precisam ser tratadas

    simultaneamentepara fins de uma anlise mais isenta e precisa do assunto.Do lado dos impactos fiscais (praticamente o nico que considerado em

    grande parte das anlises correntes), haveria que se analisar no s o peso deaumentos reais do salrio mnimo nas contas propriamente sociais (previdncia,assistncia e seguro-desemprego), mas tambm o peso destes aumentos no oramentopblico como um todo, a fim de se ponderar corretamente as prioridades de gasto emcurso na economia (gastos sociais, dvida pblica, juros, investimentos, gastos compessoal etc.) e os respectivos deslocamentos que continuamente esto se processandono interior do oramento pblico. Alm disso, seria preciso investigar os efeitosredistributivos destes gastos associados a aumentos reais do salrio mnimo,confrontando-os com os objetivos sociais do governo e da sociedade.

    Do lado dos impactos tributrios (aspecto praticamente ignorado no debatecorrente), haveria que se analisar os efeitos potencialmente virtuosos sobre a economiae sobre a arrecadao de impostos e contribuies sociais, provenientes de aumentos reaisdo salrio mnimo que, incorporados s estruturas de custos das empresas, convertem-sepaulatinamente em aumento da massa salarial tributvel e em expanso do consumocorrente tambm tributvel. Em ambos os casos, a despeito da regressividade intrnsecada estrutura de arrecadao ainda vigente no pas, trata-se, em grande medida, defontes de financiamento constitucionalmente criadas e vinculadas aos gastos sociaisimpactados por aumentos reais do salrio mnimo, quais sejam, benefcios mnimosda previdncia, assistncia e seguro-desemprego.17

    Em suma, das observaes relativas a esta ltima (mas no menos importante)dimenso de anlise, cabe ressaltar dois aspectos cruciais. Primeiro que tais observaesrelativizam a viso em voga acerca do suposto dficit explosivo da previdncia, j que,constitucionalmente, os gastos previdencirios, assistenciais e do seguro-desemprego

    16. Ver MONTAGNER, P. op. cit., p. 53.17. Tais fontes compem o negligenciado Oramento da Seguridade Social, que, entre outros tributos, recolheexclusivamente para si a Contribuio de Empregadores e Trabalhadores para o INSS, o PIS/Pasep (FAT), a Cofins, a CSLLe a CPMF. Com exceo da primeira, todas as demais contribuies sociais tm perdido algo como 20% de seus totais,transferidos ao Tesouro Nacional por meio da DRU (Desvinculao de Recursos da Unio), com vistas ao cumprimentodas metas anuais de supervits fiscais.

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    possuem fontes explcitas de financiamento e, de fato, esto sendo cobertos peloconjunto de recursos a eles destinados, com destaque para a Contribuio deEmpregadores e Trabalhadores para o INSS, o PIS/Pasep (FAT), a Cofins, a CSLLe a CPMF.18 Segundo que, olhando com ateno os dados relativos ao desempenhocorrente das finanas sociais federais, fica claro que o movimento de disputadistributiva no interior do oramento pblico federal se d a favor dos encargos da

    dvida pblica, em detrimento de todas as demais categorias de gasto, sobretudo osinvestimentos (comprometendo produto, renda e emprego) e os de natureza social, poiso Oramento da Seguridade Social vem crescendo sistematicamente frente dos GastosSociais Federais atrelados a aumentos do salrio mnimo.19

    CONCLUSO

    Nesta nota, a partir do debate conjuntural sobre salrio mnimo e mercado detrabalho, fez-se uma discusso acerca de possveis efeitos benficos que uma polticade valorizao real e de fortalecimento institucional do salrio mnimo poderia ter nasociedade brasileira. Em sntese, o conjunto de argumentos acima levantados

    encontrou respaldo na experincia brasileira dos ltimos dois anos (2004 e 2005),prevendo-se para 2006 repetio das mesmas condies. Realmente importanteparece ter sido a incorporao, pelo sistema econmico como um todo, dos aumentosreais do salrio mnimo no binio 2004-2005.

    claro que uma poltica desta natureza deveria buscar, em primeiro lugar, o fimdos reajustes anuais errticos, pois estes tanto aumentam a incerteza do ambienteeconmico como podem comprometer a sustentabilidade fiscal de outras polticas. 20

    Em segundo lugar, conferindo ao sistema econmico dose maior de previsibilidadee de sustentabilidade ao longo do tempo, bem provvel que uma poltica nacionalde recuperao real do salrio mnimo tenha de estar de alguma maneira atrelada

    evoluo do PIB real, tal qual sugerido nos captulos sobre previdncia e assistnciasocial neste mesmo documento.

    De qualquer modo, o fato relevante que, estando o ambiente macroeconmicorelativamente estabilizado e, na viso dos empresrios, com alguma perspectiva decrescimento sustentado para o futuro imediato, os aumentos reais do salrio mnimono binio 2004-2005 puderam ser absorvidos pelo sistema econmico em simultneoao aumento da ocupao e da formalizao dos contratos, da recuperao real dosrendimentos do trabalho, do aumento da massa salarial total, com alguma reduodas desigualdades de renda (proveniente, em 2005, de um aumento mais queproporcional dos rendimentos dos decis inferiores da distribuio), da queda da

    pobreza absoluta e relativa e detalhe crucial com a carga tributria de vinculaosocial crescendo acima dos gastos sociais federais.

    18. Para acompanhamento sistemtico acerca destas questes, ver IPEA.Boletim de Polticas Sociais: acompanhamentoe anlise, vrios nmeros, especialmente os captulos referentes Seguridade Social e Previdncia Social.19. A comprovao emprica deste argumento pode ser vista em pelo menos dois trabalhos recentes: i)ARAJO, E. A.As Contribuies Sociais no Brasil Ps CF/88: contribuies ou forma disfarada de cobrar impostos? Rio de Janeiro-RJ:mimeo, 2005; e ii)CARDOSO JR., J. C.; CASTRO, J. A. Dimensionamento e Anlise das Finanas Sociais do GovernoFederal no Perodo 1995/2002. Braslia-DF: STN, no prelo, 2006.20. Especialmente as polticas sociais de corte federal que usam o salrio mnimo como piso e/ou indexador de seusbenefcios (previdncia social, assistncia social e seguro-desemprego), alm das finanas pblicas municipais eestaduais que utilizam o salrio mnimo como piso e/ou indexador salarial local.

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    3 PREVIDNCIA SOCIAL E REFORMAS

    Guilherme Costa Delgado*

    INTRODUO

    O debate pblico, manifesto por sucessivas reportagens, balanos e anlisesconjunturais, vem apontando para uma suposta inevitabilidade de uma nova Reformada Previdncia, em 2007. Argumenta-se, ora sob a tica da justificao demogrfica,ora sob o critrio estritamente oramentrio, para o perigo de certa exploso fiscal,oriunda do crescimento das necessidades de financiamento do Regime Geral daPrevidncia Social (RGPS), para o que recomendam mudanas nas regras da Previdnciae da Assistncia Social, com o objetivo explcito de restringir direitos ou expectativas dedireitos sociais. No rol das reformas em cogitao destacam-se as seguintesmudanas do sistema de seguridade social brasileiro, que praticamente levariam desconstruo completa daquilo que a essncia do mesmo o oramento daseguridade social, assegurando recursos aos direitos sociais:

    1) Desindexao do salrio mnimo do piso dos benefcios previdenciriose assistenciais.

    2) Desconstitucionalizao das regras da seguridade social, especialmente dasvinculaes oramentrias, a exemplo dos trs principais tributos (Cofins, CPMFe CSLL).

    3) Elevao do limite de idade para aposentadoria para 65 anos homem e 63 anosmulheres.

    4) Reduo para at trs ou at cinco salrios mnimos do teto de contribuio

    compulsria no RGPS.Essas propostas no esto formalmente apresentadas no Congresso da maneira aqui

    exposta. Circulam em diferentes cogitaes, declaraes ou documentos de assessoria, emcarter preliminar. A evidncia pblica da discusso torna desnecessrio nominar autores.

    Essa agenda negativa (no sentido das regras vigentes) de reformas confronta-sepor outro lado, com a situao atual e concreta do sistema de seguridade social,especialmente do RGPS, que se defronta com vrios problemas de gesto paraatendimento dos segurados e beneficirios atuais. Por outro lado, h outro problema,que forte desafio para o futuro (2010 at 2050), qual seja a necessidade de proveratendimento s populaes hoje excludas da Previdncia e da Assistncia Social, e

    que certamente precisariam ser socorridas nas situaes de risco social (idadeavanada, invalidez, morte, recluso, doena etc.), mas ainda no encontraram lugarnos sistemas de seguro social da atualidade. Recorde-se que a funo ou finalidadeprecpua da Previdncia Social a proteo dos cidados em situao de risco, sendoa sustentabilidade fiscal do sistema condio mediadora.

    Observe-se, por seu turno, que a agenda de reformas da seguridade social podeser lida de trs maneiras: i) na linha desconstrutiva das regras constitucionais hojeexistentes, sob alegao da sua insustentabilidade fiscal; ii) na linha ora perseguidapelo governo da melhoria de gesto do sistema de direitos constitucionais hoje

    * Tcnico de Planejamento e Pesquisa da Diretoria de Estudos Sociais (Disoc) do Ipea, [email protected].

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    existentes, com mudanas normativas de carter infraconstitucional e administrativo,susceptveis de melhorar a eficincia do atendimento e do financiamento; e iii) nalinha das mudanas de longo prazo do sistema de seguridade, devidamenteprovisionado de recursos fiscais, com vistas a atender parcela da populao que seencontra dele excluda e por isso vulnervel aos riscos sociais. Vamos, nas sees 3.1,3.2 e 3.3 a seguir, tecer consideraes sobre cada uma dessas reformas em conjectura.

    A sntese conclusiva, sugere linha de reforma sem desconsiderar, no devido contexto, asadaptaes demogrficas ora em discusso na mdia (limite de idade para aposentar-se).

    3.1 SUSTENTABILIDADE FISCAL DO RGPS NO SISTEMADA SEGURIDADE SOCIAL

    Do ponto de vista estritamente previdencirio, as propostas de desindexao dosalrio mnimo dos benefcios, elevao imediata do limite de idade paraaposentadoria (65 anos) e desvinculao das contribuies sociais da seguridade socialno se explicam por critrios de justia distributiva. Nenhum dos seus defensoresinvocou tal princpio. Ao contrrio, o mvel dessas proposies sempre a tese da

    insustentabilidade fiscal do sistema de benefcios do RGPS, que supostamentecaminharia para insolvncia, mantidas as regras atuais. Essa hiptese, contudo, noobstante subjacente s propostas, fortemente questionveis sob enfoque do direitosocial, nunca foi demonstrada tecnicamente. Igualmente no demonstrada aassertiva de que essas propostas resolveriam o decantado dficit explosivo do RGPS.Infelizmente, neste campo sobram declaraes, frases de efeito e fetiches ideolgicos,e escasseiam estudos fundamentados.

    Eximimo-nos de comentar a proposta de reduo do limite de contribuio noRGPS, at porque essa sem fundamento lgico do ponto de vista do equilbrio fiscalou da reduo do dficit de caixa previdencirio, mas ao contrrio um fator de

    agravamento aprecivel do desequilbrio, em razo do corte de parte substancial daContribuio de Empregados e Empregadores.

    Observe-se que as trajetrias da arrecadao lquida e da despesa com benefcios doRGPS evoluram no perodo 1995-2005 para a criao de uma necessidade definanciamento (ver tabela 1) de praticamente zero no primeiro ano para 1,93% em 2005.

    H duas dinmicas, inteiramente distintas, para explicar a evoluo dessanecessidade de financiamento, suportada pelas contribuies sociais da seguridadesocial. necessrio explicar as causalidades para sobre elas atuar sem perder de vista asfunes e finalidades do RGPS e da seguridade social de forma mais geral, explorandocenrios prospectivos de sua sustentabilidade.

    TABELA 1

    Despesa e receita lquida do RGPS e necessidade de financiamento com % do PIBAnos Receita lquida de contribuies previdencirias Despesa com beneficirio Necessidade de financiamento1995 4,93 4,99 0,061996 5,18 5,23 0,041997 5,07 5,43 0,361998 5,10 5,88 0,781999 5,04 6,01 0,972000 5,06 5,97 0,912001 5,21 6,28 1,072002 5,28 6,54 1,262003 5,19 6,88 1,702004 5,30 7,11 1,812005 5,57 7,50 1,93Fonte: INSS SCN/IBGE.Elaborao: SPS/MPS.

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    3.1.1 Dinmica da despesa do RGPS

    Do lado da despesa h trs determinantes de sua evoluo que a explicam quaseintegralmente: i) a evoluo demogrfica do estoque de benefcios em manutenoa cada ano, dadas as regras atuais; ii) o crescimento em termos reais do preo 21desses benefcios; e iii) as decises judiciais terminativas que geram pagamentos de

    precatrios no sistema. Estes trs fatores explicativos do gasto previdencirio precisamser explicitados formalmente, em face da grande relevncia que ocupam na discussopoltica. Escrevendo essa relao em termos algbricos, temos a seguinte equao:

    t t t w t w 0

    t0 t0 0 w 0 t0 t0

    B E s to q u e B P P B d= + +

    B E s to q u e B P P B B

    Em que:

    Bt e Bt0 so os valores das despesas totais com benefcios no ano t e no ano zero,respectivamente, devidamente deflacionados.

    Estoque uma varivel de quantidade fsica de benefcios em manuteno nosistema em cada momento do tempo, ponderada pelos seus preos mdios t

    0

    PP

    .

    wt

    w0

    P

    P a variao real do salrio mnimo nos dois momentos do tempo,

    ponderada pela proporo w0

    t0

    B

    B,que indica a participao dos benefcios do salrio

    mnimo no total dos benefcios.

    0tB

    d o incremento em termos reais da despesa decorrente dos precatrios

    assumidos durante o ano fiscal.Considerando apenas as duas variveis previsveis mais relevantes evoluo do

    estoque e evoluo do salrio mnimo , temos forte evidncia emprica de queelas so responsveis cumulativamente, no perodo considerado (1995-2005), peloincremento real da despesa ao redor de 8,0% a.a. Observe-se que de 31/12/1995a 31/12/2005 o Estoque de Benefcios Emitidos pelo RGPS variou de 14.507,2 milpara 21.149,6 mil, portanto com crescimento decenal de 45,8%, que corresponderiaa um crescimento mdio anual de 3,8%. Essa trajetria de 1995 a 2005 refleteessencialmente uma dinmica de maturao do seguro social de pessoas com direitoadquirido no perodo, mas que ingressaram no mercado de trabalho na dcada de

    1970, quando cresceu fortemente o emprego formal (ver tabela 1).No mesmo perodo (1995-2005), o salrio mnimo variou de R$ 100,00 em

    maio de 1995 para R$ 300,00 em maio de 2005, que em termos reais representariaincremento de 60%, ou crescimento mdio anual de 4,8% (ver tabela 2).

    Observe-se que na dcada referida o reajuste cumulativo do salrio mnimo de200% em termos nominais (100 para 300 Reais) e de 60% em termos reais, que

    21. Os benefcios previdencirios so reajustados por lei uma vez ao ano, repondo-se o seu poder de compra pelavariao do INPC (no perodo). Mas os benefcios do salrio mnimo, por critrio constitucional, seguem outra norma,qual seja o ndice de Reajuste do Salrio Mnimo.

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    corresponderia a um reajuste mdio anual prximo a 5%. Essa taxa sobe fortementeem 2006 (eleva o crescimento mdio 1995-2006 para 81%), devido ao reajuste de13% concedido em maio de 2006. Se considerarmos apenas o perodo 1995-2005,temos, pois, impacto mdio do salrio mnimo na despesa do RGPS ao redor de 4%(1,05 versus1,34, pois 0,34 o fator da ponderao das despesas atuais na despesatotal com benefcios), (ver dados sobre o salrio mnimo na tabela 2).

    Deve-se ponderar, por outro lado, sobre o carter errtico e desproporcional daevoluo do salrio mnimo no perodo (tabela 2), com mudanas expressivas emalguns anos da srie, com picos (21% em 1995, 11,3% em 2001 e 13% em 2006) e vales(-4,5% em 1996, 0,2% em 1997 e 0,5% em 2003). Isto fator de desestabilizao dapoltica fiscal, previdenciria e trabalhista que precisa ser corrigido.

    Recorde-se que, alm da contribuio do salrio mnimo, h os cerca de quatropontos percentuais do crescimento da Despesa, de forma mais estvel, que advm docrescimento fsico do estoque de benefcios em manuteno no perodo. Essecrescimento, fruto do requerimento de benefcios pelos segurados do sistema, apresenta

    trajetria nos ltimos 25 anos (ver tabela 3), em torno desse patamar (4%). Refleteprimordialmente variveis demogrficas e secundariamente regras previdencirias.A demonstrao desta afirmativa no cabe no escopo deste texto. Mudanas de gestono sistema podem reduzir essa taxa, mas no se deve esperar alteraes substanciais parabaixo, neste patamar, devido natureza essencialmente demogrfica dos riscos sociais napopulao segurada que a evoluo do estoque de benefcios em manuteno reflete.

    3.1.2 Evoluo da arrecadao e potencial de ampliao

    A evoluo da arrecadao previdenciria recolhida na Contribuio de Empregadose Empregadores Previdncia Social segue outra dinmica, muito distinta das

    despesas. Depende fundamentalmente da evoluo do emprego formal (trabalhadorescom carteira mais autnomos contribuintes e empregadores contribuintes) e dataxa de remunerao desses segurados, cujos determinantes mais gerais esto no nvelda poltica macroeconmica. A trajetria recente dos contribuintes Previdncia no favorvel (ver tabela 4), exceo do pequeno perodo 2004-2005, em que de fatoh certa recuperao do emprego formal, com imediata repercusso na arrecadao.Na dcada de 1990, a Previdncia perde aprecivel massa de contribuintes menosonze pontos percentuais (ver tabela 2).

    Alm da massa salarial no setor formal da economia, outra varivel que temefeito importante sobre a arrecadao o estoque da Dvida Ativa, visto sobre o enfoquede dois fluxos relevantes: i) a proporo desse estoque que recuperada no ano soba forma de crditos recebidos por via judicial e/ou de acordos; e ii) a elevao do fluxoanual de adimplncia, relativamente ao pagamento devido no ano fiscal da Contribuiode Empregados e Empregadores (isso reduz o acrscimo da Dvida Ativa no ano).

    H evidncias de uma elasticidade arrecadao/PIB ao redor de 2,0 no perodo1995-2005 (ver tabela 4 anexa). Este resultado reflete dinmica virtuosa, ainda quemodesta, do crescimento do emprego formal, aliado reduo da sonegao e maiorrecuperao dos dbitos privados da Dvida Ativa. O crescimento da arrecadaolquida no perodo 1995-2005 de 50,2%, enquanto o crescimento cumulativo do PIB

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    de 24,41% e o incremento da Despesa de 102%. A resultante dessa discrepncia detrajetrias (Receita, Despesa e PIB) teria de gerar o surgimento e ampliao danecessidade de financiamento22 (ver Evoluo da Dvida Ativa na tabela 6).

    Trajetrias de crescimento econmico na faixa dos 4% a 5% ao ano do PIB sovirtuosas no sentido de sustentar melhoria de arrecadao, no apenas da Contribuio

    de Empregados e Empregadores, como das demais Contribuies do Oramento daSeguridade, na proporo do dobro da variao do PIB.

    Isso posto, pode-se inferir da relao PIB receita lquida previdenciria que,com crescimento mnimo de 4,0%, garantir-se-ia certa estabilidade na necessidadede financiamento do RGPS, mantido o patamar atual de evoluo da Despesa. Issosignifica uma necessidade de financiamento em torno de 2% a 2,5% do PIB,mantida a trajetria atual de crescimento da Despesa (cerca de 7,3% a.a.) e igual nvelda arrecadao lquida.

    Esclarea-se por oportuno que esse nvel de necessidade de financiamento nodeve criar dficit pblico (variao lquida no estoque da dvida pblica), visto quea expectativa de crescimento das Contribuies Sociais Cofins, CPMF e CSLL temtido no perodo recente o mesmo efeito virtuoso da Contribuio de Empregadose Empregadores, progredindo quase o dobro da taxa de crescimento do PIB.

    Do exposto, conclui-se que no h tendncia endgena e irreversvel elevaoda necessidade de financiamento do RGPS, como argumentam os defensores da tesedo dficit explosivo.

    Por outro lado, h que monitorar com cuidado as duas variveis-chave daDespesa Previdenciria o estoque de benefcios e a taxa de reajuste do salrio mnimo.Por seu turno, a melhoria na eficincia arrecadadora, combinada com uma gesto mais

    austera da Dvida Ativa Previdenciria, so procedimentos de administrao quedependem da regulamentao infraconstitucional, provavelmente com efeitos fiscaismais seguros que uma reforma constitucional desconstrutiva da seguridade social.

    Obviamente, todo o esforo fiscal e de melhoria do atendimento que se podeesperar do aperfeioamento nos mtodos de gesto precisa se apoiar em trajetria decrescimento econmico. Sem esta, os problemas do desequilbrio se magnificam.

    3.2 MUDANAS DE GESTO E DE REGRAS ASSOCIADAS DEMOGRAFIA

    Controlar a Despesa Previdenciria pelo lado de varivel estoque de benefcios

    requer restries muito profundas nas regras de concesso destes benefcios. Istoporque o estoque de benefcios do ano t + 1 depende do Estoque em t (irreversvel), das

    22. A equao que expressa a arrecadao previdenciria, segundo a estrutura institucional descrita nesta seo aseguinte:A

    t= a (n.w)

    t+ b (DA)

    t+ d

    t

    Em que:n.w a massa salarial formal no perodo;a a alquota de contribuio previdenciria;DA o valor de Estoque da Dvida Ativa Previdenciria;b a proporo de crditos previdencirios recuperados;ed o acrscimo do fluxo anual de adimplncia relativamente aos dbitos legais do ano fiscal.

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    concesses de novos benefcios em t + 1 (dependente das regras previdencirias e dademografia), deduzidas as cessaes de benefcios no perodo (depende essencialmentede fatores mdico-demogrficos).

    Toda a Reforma Previdenciria consubstanciada na Emenda Constitucionalno 20/1998 e legislao subseqente (em particular a Lei do Fator Previdencirio) provavelmente responsvel pela reduo de 1,0 (um) ponto percentual no estoque debenefcios em manuteno no RGPS, cujo crescimento havia se acelerado no imediatoperodo anterior reforma. Isso ocorrera parcialmente pelo efeito psicolgico criado peloclima de quebra de expectativas do direito ento criado (ver comparao do estoquebenefcios em manuteno nos perodos 1991-99 e 1999-2004, da tabela 3).

    O argumento fiscal estrito, invocado sem outra justificativa, pode, a curto prazo,gerar efeitos adversos prpria tese perseguida pelos fiscalistas. Por isso, a discusso atualsobre elevao do limite de idade para aposentadoria para 65 anos, apresentada em nomedo argumento da restrio fiscal, bastante duvidosa em termos da eficcia imediata.

    3.2.1 Mudana no limite de idade para aposentadoriaPor outro lado, considerada-se essa tese limite da idade aos 65 anos para aposentar-se ,sob a justificativa de argumento demogrfico, da elevao da expectativa de sobrevidados idosos e paralela elevao de proporo de idosos na populao e no estoque debenefcios em manuteno, h bases racionais para discusso da reforma.

    Observe-se que nos ltimos anos houve melhoria aprecivel da expectativa desobrevida das pessoas com 60 anos ou mais, que passou de 17,7 anos, em 1999, para20,3, em 2003. A projeo dessa tendncia acrescentaria de 3 a 4 anos sobrevida dosidosos, por dcada, at atingir patamar de estabilizao ainda no conhecido.

    Mas a proporo dos idosos brasileiros no conjunto da populao (pessoas com60 anos ou mais), mesmo com toda a evoluo recente da expectativa de sobrevida,ainda muito baixa em comparao internacional 8,4% da populao total, em2005, segundo o IBGE. Esse perfil completamente distinto do padro europeuatual ao redor de 20 a 26% , ou norte-americano em torno de 17% (ver dadoscomparativos para nove grandes pases em populao e/ou territrio na tabela 9).Segundo as ltimas estimativas publicadas pelo IBGE, com base no Censo de 2000,as propores de idosos na populao de 2005 a 2050 so as seguintes: 2005: 8,4%;2010: 9,5%; 2020: 12,6%; 2030: 16,01%; 2040: 19,3% e 2050: 21,9%.

    As projees para o futuro (2050) indicam tendncia de que at l o Brasil ter

    alcanado o limite inferior de proporo europia atual (ver tabela 5).Assim, mudana do limite de idade que se justifique em termos demogrficos deve

    considerar o perfil etrio brasileiro e sua dinmica de longo prazo, que no muda deforma explosiva, nem abrupta, mas perfeitamente coerente com regra de transio delongo prazo. Com base nesse padro, poder-se- estabelecer para 2020, por exemplo,regra de 65 anos para homens e 60 para mulheres, como idade mnima de aposentadoria,trazendo-a do futuro ao presente numa converso ao estilopro rata tempore.

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    3.2.2 Reforma na gesto previdenciria

    Por seu turno, os problemas de gesto previdenciria e as regras infraconstitucionaisde acompanhamento do sistema contm potencial de melhoria da Previdncia Socialno desprezveis, com resultados favorveis tambm para a eficincia do gasto e da

    arrecadao.A atual direo do Ministrio da Previdncia concentra esforos, com sucessos j

    revelados, na melhoria do atendimento ao pblico, com o objetivo explcito defacilitar e atender melhor (sem filas) o pblico segurado. Por sua vez, a realizaooportuna e planejada do Censo dos Beneficirios, cancelou, numa primeira amostrade 2,4 milhes, algo como 120 mil benefcios irregulares podendo atingir at o finaldo ano proporo de cerca de 5% de cancelamentos irregulares do estoque total debenefcios em manuteno. Uma segunda etapa (do Censo), envolvendo mais de 14milhes de benefcios est em curso e j revela comportamentos aparentemente maisausteros do pblico na comunicao de benefcios cessados (por exemplo, morte do

    beneficirio). Essas mudanas de gesto requerem sistemtica realizao da pesquisaaplicada no sistema previdencirio, tarefa em que o Ipea, em Braslia, colaborafortemente com o Ministrio da Previdncia.

    Mudanas importantes ainda esto em curso, relativamente reformulao dosbenefcios por incapacidade (auxlio-doena, auxlio-acidente e aposentadoria porinvalidez), na legislao do Sistema Integrado de Pagamento de Impostos e Contribuiesdas Microempresas (Simples); da incluso previdenciria de micro-empreendimentos comfaturamento at 36 mil Reais por ano que devem facilitar a filiao previdenciria.

    H por ltimo um problema grave de gesto da Dvida Ativa Previdenciria,

    provavelmente a ser transferida nova Secretaria da Receita do Brasil. Essa gestopoderia melhorar fortemente, com providncias de alterao do rito processual fiscal-previdencirio, para inibir a ainda vultosa prtica da sonegao de Contribuies (vertabela 10, Evoluo da Dvida Ativa).

    Todas essas providncias so coerentes com melhoria geral na eficincia doatendimento e do gasto previdencirio. Essas medidas, com o auxlio de uma polticamais estvel de administrao do salrio mnimo, relacionada ao incremento do PIB,contribuiriam com grande eficcia para equacionar o perfil de longo prazo danecessidade de financiamento do sistema. Observe-se que a taxa de incremento realdo salrio mnimo varivel-chave para a gesto fiscal do sistema e, como demonstrado,

    este poderia crescer no entorno do incremento do PIB, sem provocar problemas definanciamento.

    3.3 REFORMA PARA INCLUSO PREVIDENCIRIA

    O Sistema Previdencirio Brasileiro, do qual o RGPS o pilar central, sofre desde o inciodos anos 1990 de um problema grave de desfiliao, em conseqncias do aumento dodesemprego e da precarizao das relaes de trabalho. A perda de contribuintes desde1980 at 2003, somente estancou a partir de 2004. A proporo da PopulaoEconomicamente Ativa (PEA) contribuinte em datas determinadas, revela em 2000percentual de 41,8% contra proporo de 55,6% em 1980, que uma data expressiva

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    pelo fato de corresponder ao momento final da expanso significativa do empregoformal na economia brasileira (ver tabelas 2 e 3).

    Tambm expressivo no mercado de trabalho o peso da PEA informal aoredor da metade (tabela 3), no segurada pelo RGPS ou por qualquer outro sistemaprevidencirio.

    Esta realidade do mercado de trabalho brasileiro, cadente em termos defiliao previdenciria, precisa ser revestida, sob pena de condenar a populaono segurada quase completa desproteo no futuro. verdade que uma partedesses 48,2 de PEA (ver tabela 3) no segurada, atendida pelo benefcioassistencial [Benefcio de Prestao Continuada a Idosos (65 anos) e Invlidos,com rendaper capita de do sm].

    TABELA 2

    Setor formal do mercado de trabalho conforme diferentes critrios previdencirios(Em % da PEA)

    Setor Formal 1 (contribuintes da Previdncia) 1980 1991 2000 2004

    1. Empregados com carteira assinada 43,8 42,1 30,9 29,52. Autnomos contribuintes 6,6 6,0 4,3 2,93. Funcionrios pblicos contribuintes 3,4 2,9 4,8 6,04. Empregadores contribuintes 1,8 2,5 1,8 2,2Subtotal (1+2+3+4) Setor Formal 1 (contribuintes da Previdncia) 55,6 53,5 41,8 40,65. Segurados especiais potenciais 9,3 8,96. Subtotal (subtotal 1 + item 5) segurados da Previdncia 55,6 53,5 51,1 49,5

    Fonte: Censo Demogrfico do IBGE (1980, 1991 e 2000) e Pnad-IBGE (2004).

    Elaborao: Disoc/Ipea.

    TABELA 3

    Setor informal (no segurado pela Previdncia)(Principais categorias em% da PEA, 2004)

    Total % H M

    1. Trabalhadores por conta-prpria no-agrcolas e no-contribuintes 11,8 8,1 3,72. Desempregados procurando emprego 8,9 5,0 3,9

    2.1 Outros procurando emprego sem contribuir com a Previdncia 6,0 3,7 2,33. Trabalhadores assalariados sem carteira de trabalho

    3.1 Rurais (3,44)3.2 Urbanos (18,01)

    21,5 11,3 10,2

    Subtotal (1+2+3) no segurados 48,20 28,1 20,1

    Fonte: Censo Demogrfico do IBGE (1980, 1991 e 2000) e Pnad-IBGE (2004).

    Elaborao: Disoc/Ipea.

    Porm, o sistema previdencirio socorre a populao em vrios outras situaesde risco social doena, morte, maternidade, recluso, assistncia famlia etc. , queesto fora de alcance dos benefcios da Lei Orgnica da Assistncia Social.

    A reforma por incluso um desafio no apenas do sistema previdencirio. Umaparte desse desafio pode ser respondida pelo crescimento econmico que leve a umamelhoria nos nveis de ocupao formalizada, a exemplo do que ocorreu no binio 2004-2005. Requereria no mnimo uma dcada para atingir a situao de 1980. Mas hcertamente outro campo importante de mudanas infraconstitucionais, susceptveis formalizao Previdenciria. So as mudanas de regras, alquotas e simplificaescontributivas que tragam ao sistema parte expressiva do chamado emprego informal microempreendimento, trabalho domstico, assalariados sem carteira, desempregadosinvoluntrios etc., principalmente o grupo sob auxlio-desemprego. Algum esforo

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    neste sentido vem sendo perseguido pelo Ministrio da Previdncia, mas as mudanas nogoverno atual (ver mudanas recentes no Estatuto da Microempresa), ainda noproduziram resultados. H uma grande variedade de relaes de trabalho informais,(ver tabela 7), cujo tratamento em termos previdencirios, visando sua formalizao,requer estudo mais aprofundado do mercado de trabalho.

    No cabe neste texto um comentrio mais alongado sobre este assunto, atporque no este o objetivo. O que cabe ressaltar a relevncia das mudanaseconmicas (crescimento) e de relaes de trabalho na Previdncia, de sorte a elevarsignificativamente a cobertura do sistema em direo ao trabalho informal umamalha difusa e at certo ponto precria de relaes de trabalho, distinta doassalariamento com carteira, que relao clssica do RGPS.

    CONCLUSO

    A agenda de reformas no Regime Geral de Previdncia Social ou no Sistema daSeguridade Social de maneira ampla contm identificaes de problemas e propostos

    de mudana que vo da virtual desconstruo do sistema de direitos sociais, erigidoa partir da Constituio de 1988, ampliao desse sistema, com vistas incluso doatual setor informal.

    As propostas de carter desconstrutivo (de direitos sociais bsicos salrio mnimo evinculaes tributrias, principalmente), utilizam fortemente o argumento do perigo dedescontrole da Despesa Previdenciria, para restringir direitos j existentes, e no cogitama ampliao do sistema. Secundariamente, utilizam o argumento demogrfico (limite deidade para aposentadoria elevado para 65 anos) para justificarem-se. Contraditoriamente,tambm agendam a reduo do teto de contribuio ao RGPS, com o que certamenteagravariam a situao fiscal.

    A anlise da situao oramentria do RGPS revela a necessidade de certoplanejamento das decises de curto prazo (taxa de salrio mnimo) e da gesto dosistema de benefcios, com vistas a inibir a acelerao das despesas, acima daquilo que necessrio garantia de direitos bsicos.

    Por sua vez, a melhoria da gesto do sistema arrecadador principalmente nosubsistema da Dvida Ativa , combinada com crescimento da economia a um nvel de4 a 5 anos, so suficientes para manter as necessidades do financiamento do sistema empatamares ao redor de 2 a 2,5 do PIB. Isto assimilvel dentro da estrutura atual doOramento da Seguridade, obviamente sem os desvios e desvinculaes cogitados poralguns ou de redues das contribuies do RGPS.

    Mudanas de longo prazo no limite de idade para aposentadoria, justificveispor razes demogrficas, poderiam ser planejadas para 2020, com regra de transiosuave, o futuro at o presente (critriopro rata tempore), retirando-se da agenda atualcerto espantalho de mudanas abruptas desnecessrias e contraproducentes.

    Finalmente, revelamos a situao atual da desproteo previdenciria, em quecerca de 48% da PEA no so segurados do sistema por terem dele sadorecentemente ou nunca nele terem ingressado (novos trabalhadores). Este problemaevidencia a necessidade de uma estratgia de filiao, em que certamente o crescimentoeconmico e a modificao das regras de formalizao, ainda restritivas ao setordesprotegido, so fundamentais.

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    TABELA 4

    Evoluo da quantidade de benefcios pagos pelo Regime Geral de Previdncia Social*,1995-2005

    1995 1996 1997 1998 1999 2000 20 01 2002 2003 2004 2005

    Quantidade 14.507.249 15.029.404 15.767.298 16.355.798 16.897.117 17.531.161 17.927.697 18.872.666 19.521.266 20.506.649 21.149.560

    Evoluo (%) 3,6 4,9 3,7 3,3 3,7 2,2 5,3 3,4 5 3,1

    Fonte: Anurio Estatstico da Previdncia Social e Boletim Estatstico da Previdncia Social.

    Obs.:* Benefcios previdencirios e acidentrios. No esto contabilizados os benefcios assistenciais pagos pelo INSS.

    TABELA 5

    Salrio mnimo nominal e real, 1995-2006Mai/95 Mai/96 Mai/97 Mai/98 Mai/99 Abr/00 Abr/01 Abr/02 Abr/03 Mai/04 Mai/05 Abr/06

    Valor Nominal 100 112 120 130 136 151 180 200 240 260 300 350

    Variao Nom.(%) 42,9 12,0 7,1 8,3 4,6 11,0 19,2 11,1 20,0 8,3 15,4 16,7

    Variao Real (%) 21,8 -4,5 0,2 3,4 1,4 5,3 11,3 1,4 0,5 2,2 7,9 13,0

    Fonte: Ministrio do Trabalho e Emprego Deflator utilizado INPC/IBGE.

    TABELA 6

    Benefcios em estoque emitidos pelo Sistema INPS-INSS, 1980-2004Taxa de incremento mdio anual

    Perodos Tempo de servio Idade InvalidezPenso

    por morteAuxlio-doena

    Total de benefciosem estoque

    1980-1991 6,6 4,9 4,4 6,6 -2,0 4,5

    1991-2004 7,1 6,7 1,6 3,5 8,9 4,8

    1991-1999 10,2 8,6 0,9 3,7 -1,4 5,1

    1999-2004 2,2 3,7 2,7 3,0 25,6 4,2

    Fonte: Anurio Estatstico da Previdncia Social e Boletim Estatstico da Previdncia Social.

    Obs.:* Benefcios previdencirios e acidentrios. No esto contabilizados os benefcios assistenciais pagos pelo INSS.

    TABELA 7

    Benefcios em estoque emitidos pelo INSS em cada ano(Em % de participao no total)

    AnosTempo de

    contribuio Idade InvalidezPenso

    por morte Auxlio-doena Outros Total

    1980 9,76 21,58 16,51 23,06 8,96 20,14 100,0

    1991 12,01 22,50 16,25 28,80 4,11 16,34 100,0

    1999 17,43 28,53 11,70 25,87 2,44 14,03 100,0

    2004 15,84 27,90 10,92 24,49 5,98 14,87 100,0

    Fonte: Anurio Estatstico da Previdncia Social e Boletim Estatstico da Previdncia Social.

    Obs.:* Benefcios previdencirios e acidentrios. No esto contabilizados os benefcios assistenciais pagos pelo INSS.

    TABELA 8

    Evoluo das despesas com benefcios previdencirios e da arrecadao lquida*,1995-2005

    1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 20042005

    acumulativo

    Despesa com benefciosprevidencirios 73,8 80,4 89,1 99,1 102,9 109,4 116,0 122,9 128,3 135,8 149,2

    (Variao %) 9,0 10,9 11,2 3,8 6,3 6,0 6,0 4,4 5,8 9,9 202,16

    Arrecadao liquida** 72,0 78,3 81,1 82,6 82,8 88,5 92,2 94,9 92,4 101,3 110,8

    (Variao %) 8,9 3,5 1,8 0,3 6,8 4,2 2,9 -2,6 16,4 9,4 150,14

    Necessidade de financiamento -1,8 -2,0 -8,0 -16,5 -20,0 -20,9 -23,8 -28,0 -35,9 -34,5 -38,4

    Taxa de variao do PIB 2,7 3,3 0,1 0,8 4,4 1,3 1,9 0,5 4,9 2,3 124,44

    (%)

    Fonte: AEPS, BEPS e Ipea/Data.

    Obs.: * Valores em R$ 1 bilho de janeiro de 2006, deflator INPC.

    ** A arrecadao lquida corresponde ao somatrio das arrecadaes e das receitas oriundas de recuperao decrditos, menos as transferncias ao Sistema S.

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    TABELA 9

    Proporo de idosos de 60 anos ou mais na populao total de nove grandes pasesPases Proporo de idosos em 2005 (%) Proporo de idosos projetada em 2050

    Argentina 13,9 24,8Alemanha 25,1 35,0Brasil 8,8 25,0Canad 17,9 31,8

    China 10,9 31,0Estados Unidos 16,7 26,4Frana 21,1 33,0ndia 7,9 20,7Japo 26,3 41,7

    Fonte: Diviso de Populao das Naes Unidas (2002).

    TABELA 10

    Evoluo da Dvida Ativa por tipo de parcelamento, 1995-2004(Valores em R$ 1 bilho de 2004, INPC)

    Tipo de parcel. 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004

    No Parcelada 41,43 37,94 52,31 81,84 90,87 107,6 66,51 90,78 88,43 98,26

    Convencional - - - - - - - 1,59 0,79 0,93

    Especial - - - - - - - 4,74 5,01 4,57

    Refis - - - - - - - 19,09 19,06 19,06

    Total 41,43 37,94 52,31 81,84 90,87 107,6 66,51 116,2 113,29 122,82

    Fonte: AEPS, vrios anos.

    4 INDIGNCIA E POBREZA: EFEITOS DOS BENEFCIOSPREVIDENCIRIOS, ASSISTENCIAISE DE TRANSFERNCIAS DE RENDA

    Luciana Jaccoud*

    A pobreza e a indigncia, enquanto reproduo de indivduos em situaes sociaismarcadas pela carncia e pela vulnerabilidade, no apenas se imps como questomaior, como tm efetivamente sido objeto de conjunto de intervenes de governo.Entre elas, vm-se destacando os programas de transferncias de renda e ospagamentos de benefcios previdencirios e assistenciais, cujos efeitos positivostornam-se cada vez mais evidentes. A anlise destes impactos e a necessidade decomplementar e fortalecer estas polticas so o objetivo do texto que se segue.

    4.1 POBREZA, VULNERABILIDADES E RISCOS

    Para fins de poltica pblica, tm-se considerado que os indivduos em situao deindigncia ou de extrema pobreza so aqueles cuja renda per capita inferior a desalrio mnimo, renda que no suficiente para garantir-lhes o acesso dirio a umaalimentao adequada. O grupo identificado como pobre aquele cuja renda situa-seentre e salrio mnimo, renda reconhecida como insuficiente para cobrir suasnecessidades bsicas, tais como moradia, transporte, sade e educao. Assim, apesarde supostamente no estar vivendo sobre a premncia da insegurana alimentar,a populao pobre encontra-se em condies de reconhecida vulnerabilidade dada adificuldade de fazer frente, de maneira satisfatria, a outras necessidades essenciais.

    * Tcnica de Planejamento e Pesquisa da Diretoria de Estudos Sociais (Disoc) do Ipea,[email protected].

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    Malgrado o amplo reconhecimento de que a pobreza um fenmenomultidimensional em que os indivduos so submetidos a um conjunto de privaesque no se restringem questo da renda monetria, dar-se-, aqui, continuidade sanlises que usam a insuficincia da renda comoproxyda populao que rene maiornmero de carncias. Neste sentido, comparando o ano de 2001 com o ano de 2004,a tabela 1 mostra que os ndices de pobreza e de indigncia tm-se reduzido no Brasil,

    em que pese essa trajetria de queda no ser contnua. Em 2004, o pas concentravaquase 20 milhes de pessoas abaixo da linha de indigncia e 52 milhes abaixo dalinha de pobreza.

    TABELA 1

    Nmero de pobres e de indigentes e proporo sobre a populao total, 2001-20042001 2002 2003 2004

    Nmero de indigentes (milhares) 23.883 22.576 24.585 19.769

    % de indigentes na populao 14,3 13,3 14,3 11,3

    Nmero de pobres (milhares) 55.596 56.006 58.402 52.458

    % de pobres na populao 33,3 33,0 33,9 30,1

    Fonte: Ipea, Radar Social, 2006.

    Entre o desemprego, ocupaes incertas, empregos precrios e rendasinsuficientes, a populao em situao de pobreza est submetida a vrios tipos decarncias. Contudo, ela vem sendo objeto de polticas pblicas que tm tido impactospositivos em seu nvel de renda. Ser apresentada, em seguida, anlise do impacto dosbenefcios previdencirios e assistenciais, assim como daqueles ofertados pelos Programasde Transferncia de Renda.

    4.2 ATIVOS E INATIVOS: AS TRANSFERNCIAS GOVERNAMENTAIS EMBENEFCIO DA POPULAO POBRE

    4.2.1 Ativos e inativos: o pblico dos benefcios monetrios

    Visando enfrentar a indigncia ou evitar situaes de pobreza, um conjunto bastantediversificado de benefcios em forma de renda monetria operado pelo governofederal. Para reflexo sobre o impacto e as perspectivas desse conjunto de aes, valediferenci-las em dois grupos. De um lado, os programas de transferncia de rendaque visam a garantir renda mnima a toda a populao pobre. Esto neste grupo osprogramas de bolsas e transferncias de renda vinculados comprovao de insuficinciade renda, entre os quais se destaca o Bolsa Famlia. De outro, os programas que tm por

    objetivo aportar recursos s populaes reconhecidas como incapazes ou dispensadasde arcar com sua sobrevivncia pelo prprio trabalho. Compe este grupo deprogramas o Benefcio de Proteo Continuada (BPC), tambm vinculado situaode insuficincia de renda, e a Previdncia Social.

    Ao observar com mais ateno estes dois grupos de programas, v-se que elesbeneficiam populaes distintas no que se refere sua participao no mercado detrabalho. As transferncias realizadas pela Previdncia Social e pelo BPC visam abeneficiar as populaes reconhecidas como incapazes de trabalhar ou comodispensadas de arcar com sua sobrevivncia pelo prprio trabalho. Nesse sentido, oBPC objetiva garantir renda mensal aos indivduos que, por situao de velhice ou de

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    incapacidade, devem-se ausentar do mercado de trabalho, mas que, no sendodetentoras de outros recursos seja na forma de renda familiar, seja de acesso aosbenefcios contributivos da Previdncia Social , no tm como manter suasubsistncia. De natureza no contributiva, o BPC garante renda de solidariedadenacional por meio do pagamento de benefcio mensal no valor de um salrio mnimoaos idosos (com 65 anos ou mais) e s pessoas com deficincia e incapacitadas para a

    vida autnoma, cuja renda familiar per capita seja inferior a do salrio mnimo.

    A Previdncia Social, por sua vez, de natureza total ou parcialmente contributiva,visa a garantir renda para as situaes de risco que retire ou dispense o indivduo daparticipao na vida economicamente ativa por situaes diversas (invalidez, velhiceou tempo de trabalho). Entre os benefcios previdencirios no pas, predominam osbenefcios de aposentadoria e penses por morte, que somam 94% do total.23

    Populao distinta coberta pelos Programas de Transferncia de Renda (PTR).Visando a garantir renda mnima a toda a populao muito pobre, estes programasalcanam principalmente aquelas famlias cujos membros adultos esto em idade

    economicamente ativa e participam do mercado de trabalho. Neste conjunto deprogramas, os mais antigos, os Programas Bolsa Escola e Bolsa Alimentao, fixavamcomo populao beneficiria famlias de renda inferior a salrio-mnimo per capita,com crianas em sua composio. O Programa Bolsa Famlia, institudo em 2003,fixou seu pblico-alvo qualquer famlia, independentemente de sua composio, cujarenda fosse inferior a R$ 45,00, e aquelas famlias com crianas cuja renda fossesuperior a R$ 45,00 e inferior a R$ 90,00. Os dois tipos de famlia teriam acesso abenefcios de valores diferentes, como ser mostrado adiante.

    4.2.2 A cobertura dos programas

    Quanto cobertura, o BPC, em maio de 2006, beneficiou 2.363.233 pessoas, sendoque destas 1.116.571 eram idosos e 1.246.662 eram pessoas portadoras de deficinciaque as incapacitam para o trabalho. Cabe lembrar que o BPC um benefcio queatende predominantemente uma clientela urbana. Entre os benefcios realizados pelaPrevidncia Social, destacam-se, no combate pobreza, aqueles no valor de umsalrio mnimo. So destinados maioria dos trabalhadores urbanos e a quasetotalidade dos trabalhadores rurais e representaram 65,6% do nmero de benefciospagos pela Previdncia Social no ms de maio, cobrindo quase 13 milhes de pessoas.No mesmo ms, o conjunto de pagamentos efetuados pelo BPC e pela Previdncia

    Social no valor de um salrio mnimo atingiu um total de 15.752.076 milhes depes