Curso de Treinamento para Seleção Competitiva Interna ... · No caso do Brasil, o acelerado...
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Curso de Treinamento para
Seleção Competitiva Interna
Classe Auxiliar de Enfermagem
Saúde do Idoso
Instrutor: Rômulo de Castro Martins
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INTRODUÇÃO
O envelhecimento populacional é uma realidade, sendo assim, os serviços de saúde,
bem como os seus profissionais, necessitam estruturar-se para atender à demanda vigente.
O conhecimento de aspectos do processo de alterações orgânicas, morfológicas e
funcionais que ocorrem com o envelhecimento (senescência) e das modificações determinadas
pelas afecções que freqüentemente acometem a pessoa idosa (senilidade) é fundamental para a
prestação de uma assistência de qualidade nos níveis de promoção, proteção e recuperação da
saúde.
O Idoso consome mais serviços de saúde, as internações hospitalares são mais
freqüentes e o tempo de ocupação do leito é maior do que o de outras faixas etárias sem que isto
se reverta em seu benefício. Em geral as doenças dos idosos são crônicas e múltiplas, perduram
por vários anos e exigem acompanhamento médico e de equipes multidisciplinares permanentes
e internações freqüentes. A maioria dos quadros de dependência desta população está associada
a condições crônicas que podem ser adequadamente manipuladas, muitas vezes, fora de
instituições hospitalares ou asilares.
A efetiva organização dos sistemas de saúde pressupõe o fortalecimento do nível
primário de atenção reforçando a necessidade de ruptura da visão piramidal. É fundamental a
organização dos serviços em ações básicas de atenção a saúde do Idoso na produção do cuidado
em defesa da vida. Tal enfoque será norteado por uma concepção de saúde que incorpora os
determinantes sociais e coletivos, ressaltando a importância da singularidade do Idoso e
tornando sujeito de sua própria condição de saúde.
A equipe de enfermagem deve zelar para que o idoso consiga aumentar os hábitos
saudáveis, diminuir e compensar as limitações inerentes da idade confortar-se com a angústia e
debilidade da velhice, incluindo o processo de morte. Deve ainda atuar estimulando o
autocuidado, atuando na prevenção e não-complicação das doenças inevitáveis,
individualizando o cuidado a partir do princípio de que cada idoso vai apresentar um grau
diferente de dependência, diferindo assim a maneira de assistência.
Conhecer as características afetas a população idosa, em especial as peculiaridades
relacionadas à saúde, aperfeiçoa o manejo do profissional, refletindo de maneira direta na
percepção do cuidado pelo usuário e no resultado do tratamento ofertado.
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1. O ENVELHECIMENTO
No Brasil, é definida como idoso a pessoa que tem 60 anos ou mais. Assim como no
Brasil, na cidade de Juiz de Fora, a população idosa tem crescido de forma rápida e em termos
proporcionais, chegando a 13,6% da população total.
O rápido crescimento da população idosa, em poucos anos irá mudar completamente o
atual quadro demográfico, trazendo efeitos significativos em todos os níveis da sociedade,
principalmente na saúde pública e conseqüentemente para os profissionais da saúde, requerendo
cada vez mais qualificação e excelência no atendimento deste segmento etário.
O IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - tem afirmado que o
contingente populacional da pessoa idosa tem indicadores expressivos em termos absolutos e de
crescente importância no conjunto da sociedade brasileira, demandando novas exigências de
políticas públicas de saúde e inserção ativa das pessoas idosas na vida social. A saúde pode
exercer forte impacto na qualidade de vida das pessoas idosas na medida em que se oferece um
maior acesso aos serviços de saúde.
Figura 01. Pirâmides Etárias de Juiz de Fora, Minas Gerais e Brasil
Fonte: IBGE, Censo Demográfico, 2010.
Além dos aspectos demográficos e epidemiológicos devemos destacar a questão
cultural, pois, cada sociedade vive de forma diferente, esta fase da vida. O envelhecimento é
definido como a mudança na estrutura etária da população, o que produz um aumento relativo
do número das pessoas acima de determinada idade, considerada como definidora do início da
velhice.
Os incontáveis modos de envelhecer podem ou não, garantir o envelhecimento saudável
e ativo. A velhice possui também a dimensão existencial, definida pela relação que o sujeito tem
do mundo e com a sua própria história. Viver é envelhecer e envelhecer é viver.
O processo de envelhecer é sem dúvida algo natural e gradual no ciclo de vida,
diferindo de um ser para outro, refletindo uma experiência heterogênea.
O envelhecimento, a velhice e as pessoas idosas, revelam a necessidade de discussões mais
aprofundadas. Envelhecer com dignidade é um direito humano fundamental. Toda a sociedade
deve reunir esforços para a garantia desse direito.
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Para tanto, torna-se necessário o processo contínuo de formação dos profissionais da
área de saúde para que a melhoria da qualidade da assistência possa ser garantida.
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2. LEGISLAÇÃO
O envelhecimento populacional tem sido amplamente reconhecido como uma das
principais conquistas da sociedade no século XX. Este cenário aponta grandes desafios para as
políticas públicas, principalmente as da área da saúde. No caso do Brasil, o acelerado processo
de envelhecimento está ocorrendo em meio a uma conjuntura econômica que gera dúvidas sobre
a expansão de mecanismos de proteção social para todos os grupos etários e, em especial, para
os idosos.
Desde os anos 1990, a Organização Mundial da Saúde (OMS) busca divulgar o conceito
de “envelhecimento ativo” no sentido de ampliar as formulações sobre envelhecimento, ainda
muito restritas à área da saúde. Como fundamento para a formulação desse referencial, em
1999, divulgou o documento: a perspectiva do curso de vida na manutenção da independência
no envelhecimento, chamando a atenção para a necessidade de políticas públicas apropriadas
que considerassem o envelhecimento e suas interconexões com fatores socioeconômicos e
ambientais.
Figura 2. Determinantes do Envelhecimento Ativo
O Brasil é um dos países pioneiros na América Latina em formular políticas que
incorporem questões relacionadas ao envelhecimento populacional. Como país signatário do
Plano Internacional de Ação para o Envelhecimento, de 1982, passou a agregar o tema na
agenda política, culminando com a presença do tema na Constituição de 1988.
A Constituição de 1988 foi a primeira a contar com um título — da Ordem Social.
Neste, o Capítulo VII refere-se às questões da família, da criança, do adolescente e do idoso.
Ressalta que o apoio aos idosos é de responsabilidade da família, da sociedade e do Estado, os
quais devem assegurar a sua participação na comunidade, defender sua dignidade e bem-estar e
garantir o seu direito à vida. Estabelece que os programas de cuidados aos idosos sejam
executados preferencialmente em seus lares e amplia para todo o território nacional a gratuidade
dos transportes coletivos urbanos para os maiores de 65 anos.
O período pós-1988 foi marcado por uma série de regulamentações do texto
constitucional no que concerne às políticas setoriais de proteção aos idosos.
Lei nº 8.842, de 04 de janeiro de 1994 – Política Nacional do Idoso: consiste
em incentivar e viabilizar formas alternativas de cooperação intergeracional;
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atuar junto às organizações da sociedade civil representativas dos interesses dos
idosos com vistas à formulação - implementar e avaliar políticas, planos e
projetos; priorizar o atendimento dos idosos em condição de vulnerabilidade por
suas próprias famílias em detrimento ao atendimento asilar; promover a
capacitação e a reciclagem dos recursos humanos nas áreas de geriatria e
gerontologia; priorizar o atendimento do idoso em órgãos públicos e privados
prestadores de serviços; e fomentar a discussão e o desenvolvimento de estudos
referentes à questão do envelhecimento
Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003 – Estatuto do
Idoso: contribuiu para a conscientização do direito dos idosos
em relação às questões de saúde. Esse estatuto compilou
diversos dispositivos legais que já estavam em vigor e veio
somar com a Política Nacional do Idoso e se tornar um dos
principais instrumentos de efetivação dos direitos do idoso
ampliando os conhecimentos na área do envelhecimento e da
saúde da pessoa idosa e formando uma base para a reivindicação de atuação de
todos (família, sociedade e Estado) para o amparo e respeito aos idosos. O
Estatuto vai além da PNI ao estabelecer também deveres e medidas de punição.
Segundo Gomes (2009) o estatuto é a forma legal de maior potencial no que se
refere a proteção e regulamentação dos direitos da pessoa idosa.
Portaria GM nº 2.528, de 19 de outubro de 2006 – Política Nacional de
Saúde da Pessoa Idosa: Esta política tem a finalidade de trabalhar em dois
grandes eixos, a capacidade funcional da população idosa: as pessoas idosas
independentes e a parcela frágil deste segmento populacional. A finalidade
primordial da PNSI é recuperar, manter e promover a autonomia e a
independência dos indivíduos idosos, direcionando medidas coletivas e
individuais de saúde para este fim, em consonância com os princípios e
diretrizes do SUS. A capacidade funcional da população idosa, demanda na
organização dos serviços um olhar para além das doenças, buscando a
compreensão quanto aos aspectos funcionais do individuo que envelhece como
também as condições socioeconômicas e a capacidade de autocuidado.
Linha Guia em Saúde do Idoso – Secretaria de Estado de Saúde de Minas
Gerais, 2006: é um documento que propõe a implementação das políticas de
Atenção à Saúde do Idoso, no âmbito do Estado de Minas Gerais. Seu objetivo
é servir de subsídio técnico, orientando sobre a assistência à saúde do Idoso
com o propósito de se unificar condutas e subsidiar a implementação e a
qualificação das ações.
Resolução SES nº 1.583, de 19 de janeiro de 2008 – Programa Mais Vida /
Rede de Atenção à Saúde do Idoso de Minas Gerais: tem por alvo a
população de 60 anos ou mais e sua finalidade é melhorar a qualidade de vida
da pessoa idosa. Para tanto, busca oferecer um padrão de excelência nas ações
de saúde, de modo que a população tenha longevidade, com independência e
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autonomia. A missão do Programa é implantar uma Rede de Atenção à Saúde
da População Idosa no Estado, através de um sistema articulado e integrado,
que assegure os princípios doutrinários do SUS de equidade, universalidade e
integralidade. As ações do Programa Mais Vida incluem a descentralização da
assistência, por meio da implantação dos Centros Mais Vida, a organização da
rede e a capacitação dos profissionais da Atenção Primária à Saúde (APS) para
a atenção à Saúde do Idoso.
Lei nº 12.925, de 06 de fevereiro de 2014, que institui as Políticas
Municipais da Terceira Idade: ficam instituídos os Jogos Municipais da
Terceira Idade, da cidade de Juiz de Fora, a serem disputados anualmente no
mês de Outubro, em período a ser definido pelos Órgãos Competentes do Poder
Executivo.
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3. FISIOLOGIA DO ENVELHECIMENTO
O envelhecimento é um processo contínuo durante o qual ocorre um declínio
progressivo de todos os processos fisiológicos. Mantendo-se um estilo de vida ativo e saudável
pode-se retardar as alterações morfofuncionais que ocorrem com a idade.
Alterações causadas pelo envelhecimento
Com o declínio gradual das aptidões físicas, o impacto do envelhecimento e das
doenças, o idoso tende a ir alterando seus hábitos de vida e rotinas diárias por atividade e formas
de ocupação pouco ativas. Os efeitos associados à inatividade e a má adaptabilidade são muito
sérios. Podem acarretar numa redução no desempenho físico, na habilidade motora, na
capacidade de concentração, de reação e de coordenação, gerando processos de auto-
desvalorização, apatia, insegurança, perda da motivação, isolamento social e a solidão.
Alterações Visuais - As alterações morfológicas e fisiológicas sofridas pelas estruturas do olho
ao longo do envelhecimento acabam por interferir na acuidade visual dos idosos. Em geral,
entre a quarta e quinta décadas da vida, essas alterações geram os primeiros sintomas
oftalmológicos, e o mais comum é a diminuição da capacidade de acomodação ou de
focalização de objetos próximos (presbiopia). Com o passar dos anos, ocorre a diminuição do
campo visual periférico, da sensibilidade ao contraste, da discriminação das cores, da
capacidade de recuperação após exposição à luz, da adaptação ao escuro e da noção de
profundidade. Como a córnea torna-se menos sensível, suas lesões podem passar despercebidas
no envelhecimento fisiológico. Entretanto, a atrofia do epitélio pigmentar da retina e a
degeneração da porção central da sua mácula, a fóvea, são as causas mais graves de perda visual
em idosos. Além disso, o tamanho da pupila diminui e ela se torna mais lenta nas respostas à
escuridão ou à luminosidade intensa; o cristalino torna-se esbranquiçado, menos flexível e
levemente opaco, resultado do agrupamento de componentes proteicos da lente. Relacionada
com a idade, a catarata é uma causa de cegueira em uma escala global, envolvendo influências
genéticas e ambientais. Nela, ocorrem modificações pós-translacionais e acúmulo de
cromóforos fluorescentes, aumentando a susceptibilidade ao dano oxidativo, embora esse
processo comece a partir da quarta década de vida. À medida que a área opaca aumenta, a visão
torna-se cada vez mais comprometida. Anatomicamente, a perda de gordura em volta dos olhos
provoca seu afundamento dentro da órbita e a redução da força dos músculos extraoculares
dificulta a rotação dos olhos e a movimentação nos planos vertical e horizontal. Vários estudos
têm mostrado que o enfraquecimento da visão provocado pelo envelhecimento fisiológico reduz
a estabilidade postural e aumenta significativamente o risco de quedas e fraturas em idosos.
Alterações Do Sistema Vestibular - A partir da quarta década de vida, são observadas
alterações anatômicas e fisiológicas no sistema vestibular que se acentuam com o passar do
tempo. São processos degenerativos que levam à redução gradual na densidade dos receptores e
no número de células receptoras de algumas estruturas do sistema. A principal conseqüência do
envelhecimento natural do sistema vestibular é a degeneração do reflexo vestíbulo-ocular, sendo
manifestação clássica de sua falência o desequilíbrio quando há rotação do corpo, que acarreta o
desvio da marcha. Além dos episódios de tontura e vertigem, outro grande problema surge em
conseqüência dos freqüentes eventos de desequilíbrio na população geriátrica: as quedas. Esse
risco aumenta consideravelmente com o avançar da idade (acima dos 80 anos), quando
associado a outras doenças crônicas como o diabetes, e ainda pela polifarmácia, comum na
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velhice. As vestibulopatias em idosos costumam estar associadas a outros sistemas responsáveis
pelo controle postural, como a visão e as sensações proprioceptivas. Estas se caracterizam por
sinais enviados ao SNC por receptores sensoriais presentes nos músculos, tendões e nas
articulações, que aferem ao movimento e à estabilidade do corpo. Assim, a conduta terapêutica,
normalmente centrada em exercícios de reabilitação vestibular, é significativamente abrangente.
Alterações musculoesqueléticas e ósseas - No ser humano, o sistema muscular alcança sua
maturação plena entre 20 e 30 anos de idade. Os diferentes tipos de músculos são formados por
grupamentos distintos de fibras musculares, cujo diâmetro aumenta gradualmente durante o
crescimento fisiológico. A partir dos 30 anos de vida, a densidade muscular diminui, ocorre
perda gradual e seletiva das fibras esqueléticas que dão lugar a tecido adiposo e colágeno. Após
os 35 anos, há alteração natural na cartilagem articular que, associada às alterações
biomecânicas adquiridas ou não, provocam ao longo da vida degenerações diversas que podem
levar à diminuição da função locomotora e da flexibilidade, acarretando maior risco de lesões.
De fato, observa-se alterações da estrutura do colágeno como redução do comprimento das
cadeias de condroitina na cartilagem articular. Porém, é importante salientar que tais alterações
não indicam que a pessoa tenha uma doença articular degenerativa ou venha a apresentá-la, e
sim que existe uma possibilidade aumentada de que a cartilagem articular possa sofrer lesões
decorrentes de obesidade, trauma, doença metabólica, fatores hereditários e pelo desgaste
próprio do tempo de vida.
Com o avanço da idade, a perda muscular é progressiva, porém, não apresenta um
comportamento linear em função do tempo, sendo mais pronunciada no sexo feminino do que
no masculino, estimando-se uma perda de aproximadamente 5% por década até os 50 anos, e a
partir daí, 10% por década até os 80 anos. Nos idosos, há uma importante diminuição na
proporção de fibras musculares anaeróbicas de contração rápida em comparação com as fibras
aeróbicas de contração lenta. Prejudicado pela fraqueza muscular progressiva, o idoso tende a
posturas viciosas irregulares e compensatórias, mas que impõem um agravamento crescente às
estruturas do aparelho locomotor, levando à lentificação da marcha e perda de equilíbrio, fatores
esses que induzem a uma maior tendência a quedas e fraturas.
A sarcopenia, perda de massa muscular esquelética e de força associada ao
envelhecimento, acarreta morbidade e mortalidade significativas. A força muscular não depende
apenas da massa e, portanto, a avaliação de ambas é mandatória na avaliação do idoso. A partir
dos 75 anos, o grau de sarcopenia é um dos indicadores da chance de sobrevivência do
indivíduo. As causas para a sarcopenia são múltiplas, sendo as principais a disfunção
mitocondrial, alterações endócrinas, distúrbios nutricionais, imobilidade, inatividade física e
doenças neurodegenerativas. Quanto aos mecanismos hormonais associados à sarcopenia,
podemos citar a ativação do sistema renina-angiotensina e o consequente aumento dos níveis de
angiotensina II, implicados na atrofia muscular por levarem ao aumento dos níveis da E3 ligase
atrogina e, assim, à proteólise. Se levarmos em conta a prevalência da hipertensão arterial no
idoso, este pode ser um mecanismo relevante, contribuindo para a sarcopenia. Hormônios que
levam ao anabolismo muscular, como a insulina, o fator de crescimento semelhante à insulina 1
(IGF-1), hormônios tireoidianos e a testosterona promovem acúmulo de proteína e a hipertrofia
muscular e decaem com a idade, favorecendo o decréscimo da massa muscular. A resistência à
insulina, que aumenta com o envelhecimento, é mais um dos fatores de propensão à sarcopenia,
sendo esta diretamente proporcional ao conteúdo de gordura intracelular.
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As mitocôndrias, a "usina de força" dos músculos, decaem em número e capacidade
funcional com o envelhecimento. Mecanismos possíveis para a perda progressiva destas
organelas são a lesão do DNA mitocondrial e o deficit das células na remoção das mitocôndrias
danificadas. O DNA mitocondrial é mais susceptível a lesões do que o nuclear, devido à
proximidade com as espécies reativas de oxigênio geradas na mitocôndria, por ser um DNA não
enovelado como o DNA nuclear (assim mais exposto a danos químicos) e porque os
mecanismos de reparo do DNA mitocondrial não são tão eficazes quanto os do DNA
nuclear. Para o descarte de mitocôndrias disfuncionais, é fundamental a autofagia, processo de
degradação intracelular, o qual decresce com o envelhecimento. Além das mitocôndrias
disfuncionais, outra característica do envelhecimento é o acúmulo de proteínas alteradas. O
acúmulo dessas proteínas indutoras do estresse do retículo endoplasmático e morte celular tem
sido ligado à morte das células pancreáticas no diabetes tipo 2 e dos neurônios.
Novamente, o processo de autofagia degradando depósitos de proteínas intracelulares,
além das mitocôndrias disfuncionais, parece ser fundamental para retardar o envelhecimento,
prevenindo o estresse do retículo endoplasmático e um estímulo à apoptose e liberação
excessiva de espécies reativas de oxigênio, oriundas das mitocôndrias disfuncionais. Além
disso, a autofagia degrada gotículas lipídicas intracelulares, um dos mais precoces marcadores
da resistência à insulina e da perda muscular com o envelhecimento.
A restrição calórica sem desnutrição, que parece ser até o momento o único mecanismo
comprovado como capaz de retardar o envelhecimento em várias espécies e não apenas no
homem, é um indutor da autofagia, tornando a célula mais capaz de livrar-se de seu "lixo". O
estímulo gerado pela restrição calórica à autofagia e à degradação protéica via proteassomos
deve ser enfatizado como um possível mecanismo para a sua ação. Ademais, o exercício
aeróbico diminui o dano mitocondrial associado ao envelhecimento, o que corrobora a noção de
que os efeitos antienvelhecimento da restrição calórica e do exercício físico passam pelo "bem-
estar" das mitocôndrias.
Ao lado dos tecidos muscular e cartilaginoso, o tecido ósseo, em constante processo de
remodelação (formação pelos osteoblastos e reabsorção pelos osteoclastos), sofre alterações
consideráveis ao longo do envelhecimento, levando à osteopenia fisiológica.
O esqueleto tem três funções importantes: sustentação para o sistema
musculoesquelético; proteção de órgãos internos vitais e reservatório metabólico para a
hematopoiese e a homeostase do cálcio. Cerca de 90% da massa óssea é alcançada na segunda
década de vida e o pico de massa óssea ocorre em torno dos 35 anos de idade. As alterações
relacionadas principalmente à diminuição da densidade mineral e à perda óssea iniciam em
torno da quarta década de vida. A atrofia óssea causada pelo envelhecimento não é homogênea,
pois, até os 50 anos de idade, perde-se, sobretudo osso trabecular, gerando uma osteopenia
reversível. Após essa idade, perde-se, principalmente, osso cortical e a perda óssea é
irreversível.
Tanto os osteoclastos quanto os osteoblastos possuem receptores de estrogênio, e,
devido à redução do estrogênio na menopausa, a osteopenia é mais acelerada e perceptível no
sexo feminino, sendo associada a uma atividade osteoclástica aumentada. Já na perda óssea
relacionada com a idade, o processo é mais lento e resulta de hipoatividade osteoblástica. Sem
dúvida, a osteopenia é um fator de risco para fraturas em idosos, mas não é patognomônica da
osteoporose. Nos homens, o osso trabecular se torna progressivamente mais fino com a idade,
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não havendo a perda de contato entre as porções de osso trabecular, como ocorre nas mulheres
após a menopausa.
No que diz respeito à microarquitetura óssea, uma característica do envelhecimento é a
diminuição na estatura, com perda média aproximada de 2 cm por década, a partir dos 60 anos,
independentemente do gênero. Tal alteração se manifesta de forma mais acentuada na coluna
vertebral do que nos membros, e decorre principalmente de modificações dos elementos do
tecido conjuntivo dos discos intervertebrais, que perdem a capacidade de absorver água,
tornando os ligamentos de elastina menos distensíveis e propensos a sofrer fragmentações
sucessivas. A estabilidade dos segmentos móveis e a sustentação da coluna vertebral também
apresentam alterações no idoso, pois a função dos ligamentos anteriores e posteriores da coluna
vertebral sofre redução com o avanço da idade. Isto afeta diretamente a diminuição da
capacidade de realizar tensão de "repouso" sobre a coluna vertebral e a ausência da força de
tensão dos ligamentos, que contribuem para a adoção da postura flexionada para frente comum
nos idosos. A consequente doença degenerativa articular do idoso provoca alterações ósseas e
da superfície articular, como os osteófitos resultantes da osteoartrite, a radiculopatia pela
compressão dos nervos e redução na atividade da miosina adenosino-trifosfase (ATPase) das
fibras musculares, levando à fraqueza muscular e ao desequilíbrio, proporcionando um aumento
na incidência de quedas.
Dessa forma, pode-se concluir que, nos idosos, a redução do comprimento da coluna
vertebral, as alterações degenerativas das estruturas vertebrais que são forçadas a suportar a
carga dos discos e a ausência da força de tensão dos ligamentos irão contribuir para a adoção da
postura flexionada para frente e propiciar as quedas.
Alterações cardiovasculares - Indivíduos saudáveis e com idade avançada sofrem uma série de
alterações fisiológicas no coração, especialmente estruturais e funcionais, fundamentais para
melhor adaptação às necessidades inerentes ao processo do envelhecimento. O coração é
constituído por células musculares, os cardiomiócitos, moléculas de matriz extracelular,
destacando-se o colágeno e células intersticiais cardíacas, tais como fibroblastos e células
endoteliais. Por tratar-se de células terminalmente diferenciadas, a identificação recente de
células-tronco residentes no coração revelou que os cardiomiócitos são repostos, mas não na
proporção ideal para recuperação de função alterada conseqüente a eventuais perdas.
Com o envelhecimento, observa-se freqüentemente aumento na espessura da parede
ventricular, caracterizado por um decréscimo no número de cardiomiócitos, que se tornam
hipertróficos e, ainda, pelo aumento do conteúdo de colágeno. O metabolismo mitocondrial das
espécies reativas de oxigênio altera-se, contribuindo para maior secreção de colágeno e indução
de apoptose das células musculares lisas da parede arterial, o que leva ao aumento da rigidez
aórtica. A alteração da elasticidade aórtica colabora para hipertrofia do ventrículo esquerdo,
disfunção diastólica e insuficiência cardíaca congestiva. A maior massa ventricular esquerda faz
com que o peso do coração aumente de 1 a 1,5 g por ano.
Apesar das conhecidas alterações na função diastólica que normalmente acompanham o
envelhecimento, existe controvérsia em relação à função sistólica. A maioria dos estudos, feitos
com indivíduos saudáveis, aponta para manutenção da função sistólica e estreita correlação
entre disfunção diastólica e idade avançada. As células intersticiais cardíacas também sofrem
alterações com o envelhecimento, tendo participação importante na patogênese das doenças
cardiovasculares, como a aterosclerose. As espécies reativas de oxigênio derivadas das
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mitocôndrias contribuem para a manutenção de pequeno grau de inflamação crônica no leito
vascular, ativando as vias de sinalização redox. Recentes estudos apontam para o importante
papel das espécies reativas de oxigênio na indução de apoptose das células endoteliais e no
desenvolvimento do fenótipo senescente destas células, podendo levar ao comprometimento da
integridade dos vasos e da angiogênese.
No envelhecimento, é comum a redução da habilidade em alterar a freqüência cardíaca
de maneira adequada em resposta a situações de estresse, provavelmente devido à menor
resposta dos receptores beta-adrenérgicos. Ocorre ainda redução na resposta autonômica ao
estresse, incluindo diminuição do barorreflexo, o que torna habitual a variação da pressão
arterial com mudanças posturais, contribuindo assim para a elevada ocorrência de quedas em
idosos. As propriedades eletrofisiológicas do coração também se alteram no envelhecimento e
levam à maior ocorrência de arritmias, observando-se aumento na prevalência (tanto de taqui
como de bradiarritmias) após os 60 anos de idade. Nesta população são comuns as disfunções
sinusais e os bloqueios atrioventriculares, aumentando a incidência de implantação de marca-
passos. A ocorrência de focos ectópicos ventriculares e supraventriculares e as alterações das
propriedades dos canais iônicos cardíacos contribuem para a maior ocorrência das arritmias,
assim como para a variação dos parâmetros farmacodinâmicos e farmacocinéticos dos
medicamentos antiarrítmicos habitualmente utilizados.
Portanto, sendo freqüentes as alterações cardiovasculares que acompanham o
envelhecimento, é comum o uso de diversos medicamentos como diuréticos, anti-hipertensivos,
antiarrítmicos e vasodilatadores. Paradoxalmente, o tratamento medicamentoso contribui para a
elevada ocorrência de quedas nos idosos e não é rara a suspensão do seu uso. Por exemplo,
embora seja recomendável para idosos com fibrilação atrial o uso de anticoagulantes, o risco de
quedas nessa população restringe sua aplicação. Segundo o Ministério da Saúde do Brasil, cerca
da metade dos idosos que fazem uso de anti-hipertensivos e diuréticos sofre uma ou mais
quedas no prazo de um ano.
Alterações neurológicas - Diversas modificações fisiológicas e estruturais ocorrem no cérebro
ao longo da vida. São alterações multifatoriais, muitas das quais contribuem para a perda da
força e desequilíbrio em pessoas idosas e são potencializadas quando associadas a processos
patológicos. Desde o nascimento, a totalidade de neurônios necessários ao funcionamento do
organismo já estão presentes. Aos dois anos de idade, o cérebro atinge 80% do seu tamanho
adulto. O amadurecimento cerebral decorre da multiplicação de células da glia, gerando
aumento no depósito de mielina nas fibras nervosas, assim como novas conexões. O volume e o
peso do cérebro declinam com a idade, a uma taxa aproximada de 5% por década após os 40
anos, observando-se uma acentuação no declínio a partir da sétima década de vida.
O córtex cerebral é uma complexa região formada por bilhões de células nervosas
relacionadas a funções complexas como motricidade, sensibilidade e mecanismos cognitivos.
Dessa forma, o córtex é uma das regiões mais importantes do SNC. O sistema nervoso
periférico (SNP) também desempenha uma importante função sensóriomotora sobre o sistema
mantenedor do equilíbrio por meio de impulsos nervosos para a periferia, especialmente para os
músculos esqueléticos. As constituições histológicas, anatômicas e morfofuncionais dos SNC e
SNP diferem de forma significativa. Porém, tais estruturas compartilham um processo
fisiológico comum: o envelhecimento neuronal.
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O comprometimento da regulação da homeostase do cálcio e do mecanismo de proteção
antioxidante são duas causas importantes da degeneração neuronal observadas durante o
envelhecimento normal e na neurodegeneração. Na verdade, qualquer alteração no transporte ou
no armazenamento do cálcio, independentemente de seu grau, acarreta consequências
significativas para o envelhecimento. E seu aumento excessivo causa lipólise, proteólise,
mudanças na fosforilação proteica, perda da integridade citoesquelética e morte celular.
Nos distúrbios neurodegenerativos progressivos, como nas doenças de Parkinson (DP) e
Alzheimer (DA), a lesão neuronal pode ser causada por pequenas alterações da homeostase do
cálcio mantidas durante longos períodos de tempo. Há alguns anos, surgiu uma "hipótese do
cálcio" para explicar o avanço do envelhecimento cerebral, sugerindo que os mecanismos
celulares responsáveis pela manutenção dos níveis de cálcio citoplasmático têm um papel
fundamental no envelhecimento. Além disso, as alterações sustentadas da homeostase do cálcio
podem fornecer uma via comum para as alterações patológicas observadas nas doenças
neurodegenerativas.
Ao lado das alterações da homeostase do cálcio, a disfunção mitocondrial tem estreita
relação com a morte neuronal. As mitocôndrias são de suma importância na geração de
adenosina-5'-trifosfato (ATP), no sequestro do excesso de cálcio citoplasmático e na
"desintoxicação" dos neurônios causadas por espécies reativas de oxigênio.
Sabe-se que fatores genéticos controlam a susceptibilidade à desregulação do cálcio e
do estresse oxidativo, e a falha desses mecanismos pode causar morte neuronal. Mutações
gênicas provocam alterações nas proteínas e enzimas que deveriam sequestrar os radicais livres
(superóxido dismutase, glutato peroxidase) e regular a homeostase do cálcio (calmodulina). A
degradação proteica intracelular daí decorrente parece ser realizada por várias vias, desde a via
dependente dos lisossomos até a via dependente do cálcio. Além disso, cada via "trata" as
proteínas de maneira diferente, dependendo de sua sequência de aminoácidos.44 Ainda, a
disfunção mitocondrial dependente de cálcio provoca defeitos morfológicos e no tráfego dos
neurônios, sendo crítica para a degeneração neuronal observada na DP, na DA e na doença de
Huntington.
Tomados em conjunto, podemos afirmar que alterações fisiopatológicas características
de algumas doenças neurodegenerativas como a DP, também são responsáveis por quedas na
população idosa. Esses pacientes apresentam distúrbios motores frequentes, como tremor e
rigidez, levando a dificuldades no equilíbrio. Diferente da DP, que consiste em um distúrbio,
sobretudo motor, a DA é caracterizada por alterações cognitivas inerentes à atrofia cerebral e à
formação de placas amiloides e emaranhados neurofibrilares. Alterações nas reações de
equilíbrio e mesmo a ocorrência de quedas são comuns nos estágios avançados da doença,
embora em menor freqüência do que nos indivíduos parkinsonianos.
Alterações respiratórias - A alteração mais característica na parede torácica com o avanço da
idade é a rigidez. Não apenas as cartilagens se tornam espessas e calcificam, mas também os
ligamentos espinhais e articulações tornam-se mais rígidos. A alteração interna primária nos
pulmões é a perda da retração elástica. O resultado é uma modesta expansão da parede torácica
com a aparência de uma caixa torácica levemente cilíndrica.
Embora os mecanismos pulmonares ao repouso não pareçam se alterar de forma
importante, a perda da capacidade respiratória máxima declina em aproximadamente 40%. No
nível alveolar, a capacidade de troca de oxigênio e monóxido de carbono diminui em
14
aproximadamente 50% entre as idades de 30 e 65 anos. Embora essas alterações não sejam
perceptíveis ao repouso, os indivíduos sentem fadiga ou falta de ar quando o sistema
respiratório está sob tensão (ex: durante exercício ou doença importante). Os reflexos
pulmonares, como tosse e função ciliar, diminuem, predispondo os indivíduos idosos ao
acúmulo de secreções e pneumonia aspirativa.
Nenhuma dessas alterações produz anormalidades substanciais na saturação de oxigênio
ao repouso, mas todas produzem declínio constante na PO2 arterial. A PO2 arterial de muitos
indivíduos com mais de 80 anos é cerca de 70 a 75 mmHg. Como com outros achados
fisiológicos relacionados à idade, essas alterações não interferem com a função nas condições de
repouso, mas afetam dramaticamente a sobrevida durante uma doença respiratória grave.
Alterações do sistema excretor e urinário - O tamanho global dos rins diminui em
aproximadamente um terço e o fluxo sanguíneo nos rins diminui em cerca de 1% ao ano.
Iniciando no final dos 30 anos de idade, os néfrons corticais parecem se desligar e esclerosar a
um índice bem mais elevado do que os néfrons medulares, criando uma síndrome de
hiperfiltração que limita a capacidade de concentração máxima.
As alterações funcionais resultantes incluem capacidade diminuída de excretar um
volume de sal, taxa de filtração glomerular em declínio, capacidade retardada de recuperar o
equilíbrio de sódio e potássio durante estados de privação e dificuldade em conservar água em
situações de desidratação.
A bexiga apresenta tendência a se tornar mais irritável com o avanço da idade, podendo
gerar menos força durante a contração. Devido ao atraso na excreção de sódio e a alterações
ortostáticas, a noctúria é comum; os indivíduos mais idosos parecem produzir mais urina
durante a noite do que durante o dia. A alteração mais importante na bexiga pode ser o discreto
aumento em volume urinário residual da bexiga. A atrofia dos tecidos vaginal e uretral devido à
privação de estrógenos na pós-menopausa predispõe as mulheres a infecções do trato urinário.
Alterações endócrinas - Os níveis de hormônio do crescimento diminuem com o avanço da
idade, com perda inicial dos picos noturnos desse hormônio. Esses declínios podem contribuir
para a diminuição da força muscular, o adelgaçamento dos ossos e da pele e o aumento na
gordura associada com o envelhecimento. Atualmente não está claro se a reposição de fatores
do crescimento pode induzir uma reversão permanente das alterações musculares, ósseas e
cutâneas associadas com o avanço da idade.
Os índices de produção e de clearance da tiroxina, triiodotironina e calcitonina parecem
ser constantes com a progressão da idade, apesar do aumento da prevalência de doenças da
tireoide na fase tardia da vida. Há um aumento dos níveis do hormônio da paratireoide,
especialmente nas mulheres, com a progressão da idade, talvez com uma compensação para o
declínio, relacionado com a idade, da capacidade renal de manter níveis normais de fósforo e
cálcio no sangue.
As glândulas suprarrenais mantêm a capacidade de secretar cortisona com a progressão
da idade. A diidroepiandrosterona diminui 85 a 90% por volta dos 70 anos de idade, talvez
contribuindo para o comprometimento das funções imunes e cardiovasculares com a progressão
da idade. Os índices de secreção de renina e aldosterona declinam progressivamente com o
aumento da idade e não contribuem para o aumento dos índices de hipertensão com a
progressão da idade.
15
O conteúdo de insulina do pâncreas do idoso está aumentado, mas a liberação de
insulina em resposta à estimulação pode ser bloqueada com a progressão da idade. Há também
um declínio concomitante no clearance de insulina com a progressão da idade, com isto os
níveis plasmáticos de insulina em resposta à glicose permanecem relativamente preservados. A
resistência à insulina pode aumentar com a progressão da idade, mas a secreção de glucagon
parece estar bem preservada.
Os ovários mostram declínios dramáticos em estrógenos e progesterona conforme
ocorrem a fibrose e a atrofia. A menopausa ocorre em uma idade média de 51 anos, com
posteriores fogachos, perda óssea acelerada e atrofia dos tecidos sensíveis aos estrógenos. Os
níveis de testosterona diminuem em alguns homens, iniciando por volta da idade de 50 anos,
mas esses declínios não parecem afetar a produção do sêmen. A função sexual é relativamente
bem preservada, embora com um aumento (no período refratário e tempo até a excitação e uma
perda do turgor tecidual).
Alterações gastrointestinais - Uma ampla série de alterações ocorre nos tecidos
gastroenterológicos, mas a reserva da função gastrointestinal geral normalmente previne os
sintomas clínicos. As alterações bucais relacionadas à idade incluem menor produção de
dentina, retração da polpa da raiz e diminuição óssea do queixo. O gosto e o olfato declinam
progressivamente com o avanço da idade, com limiares mais elevados para sal, doces e certas
proteínas. O que se verifica é que os alimentos podem ter gosto mais amargo e seja necessária
uma quantidade maior de açúcar antes que algo tenha o gosto doce. A função da glândula
salivar normalmente não muda com a idade. A perda óssea e da musculatura da língua faz com
que esta última pareça aumentada.
O esôfago parece funcionar relativamente de forma normal. A força da contração
muscular, no entanto, diminui e ondas peristálticas se tornam mais lentas com o avanço da
idade. Também há tendência para que o esfíncter inferior se torne frouxo com o avançar da
idade.
A mucosa gástrica secreta menos ácido com o avançar da idade. Embora essas
alterações não pareçam afetar a digestão na maioria dos indivíduos, as condições associadas,
como gastrite atrófica, podem diminuir a absorção de nutrientes. A maioria dos estudos sugere
que um retardo no esvaziamento gástrico é uma característica do envelhecimento que leva a
uma sensação de saciedade falsa ou prematura, e pode comprometer a ingestão posterior de
alimentos.
O peso do fígado declina em um terço entre as idades de 30 e 90 anos, devido
primariamente à perda de hepatócitos. O resultado é uma diminuição da capacidade de processar
medicações, como os benzodiazepínicos e os componentes da dieta, como álcool e agentes
bloqueadores de vitamina k. As doses das mediações devem ser frequentemente ajustadas, e os
níveis sanguíneos das mesmas devem ser monitorizados quando possível.
O envelhecimento está associado com uma redução significativa na área da superfície
do intestino delgado com consequente redução na absorção de alguns componentes da dieta,
como o cálcio. A função colônica parece declinar com o avanço da idade. A motilidade até a
área retossigmoide, medida pela passagem de marcadores, não parece declinar com o avanço da
idade.
16
No entanto, de forma distal a este ponto, a evacuação é caracteristicamente mais lenta
com o avançar da idade. A frequência de evacuações tende a declinar e a dureza das fezes
parece aumentar com o avanço da idade. A diverticulite está presente em aproximadamente 50%
das pessoas com mais de 80 anos e provavelmente está relacionada à redução das fibras
dietéticas e à maior pressão resultante sobre os tecidos colônicos.
17
4. CALENDÁRIO DE VACINAÇÃO DO IDOSO
Vacinas Quando
indicar
Esquemas e
recomendações Comentários
Disponibilização das
vacinas
Gratuitas
na rede
pública
Clínicas
Privadas
Influenza (gripe) Rotina Dose única anual
Os maiores de 60 anos
fazem parte do grupo de
risco aumentado para as
complicações e óbitos por
influenza. Desde que
disponível, a vacina
influenza 4V é preferível
à vacina influenza 3V, por
conferir maior cobertura
das cepas circulantes. Na
impossibilidade de uso da
vacina 4V, utilizar a
vacina 3V
Sim Sim
Pneumocócicas
(VPC13) e
(VPP23)
Rotina.
Iniciar com uma dose da
VPC13 seguida de uma
dose de VPP23 seis a doze
meses depois, e uma
segunda dose de VPP23
cinco anos depois da
primeira
• Para aqueles que já
receberam a VPP23,
recomenda-se o intervalo
de um ano para a
aplicação de VPC13. A
segunda dose de VPP23
deve ser feita cinco anos
após a primeira, mantendo
intervalo de seis a doze
meses com a VPC13.
• Para os que já
receberam duas doses de
VPP23, recomenda-se
uma dose de VPC13, com
intervalo mínimo de um
ano após a última dose de
VPP23. Se a segunda dose
de VPP23 foi aplicada
antes dos 65 anos, está
recomendada uma terceira
dose depois dessa idade,
com intervalo mínimo de
cinco anos da última dose.
SIM
VPP23
para
grupos de
risco
Sim
Tríplice
bacteriana
acelular do tipo
adulto (dTpa) /
Difteria, tétano e
coqueluche
Rotina.
• Atualizar dTpa
independente de intervalo
prévio com dT ou TT.
• Para idosos que
pretendem viajar para
paises nos quais a
poliomielite e endemica
recomenda-se a vacina
dTpa combinada a polio
inativada (dTpa-VIP).
• A dTpa-VIP pode
substituir a dTpa. Com
esquema de vacinação
básico para tetano
completo: reforço com
dTpa a cada dez anos.
Com esquema de
vacinação básico para
tétano incompleto: uma
dose de dTpa a qualquer
• A vacina está
recomendada mesmo para
aqueles que tiveram a
doença, já que a proteção
conferida pela infecção
não e permanente.
• Considerar antecipar
reforço com dTpa para
cinco anos após a última
dose de vacina contendo o
componente pertussis para
idosos contactantes de
lactentes.
dT SIM
SIM
dTpa e
dTpa-
VIP
18
momento e completar a
vacinação básica com uma
ou duas doses de dT
(dupla bacteriana do tipo
adulto) de forma a
totalizar tres doses de
vacina contendo o
componente tetanico
Hepatites B Hepatite B:
rotina
Três doses, no esquema 0
- 1 - 6 meses Sim Sim
Febre amarela
Rotina para
residentes
em áreas
de
vacinação.
Uma dose para residentes
ou viajantes para áreas de
vacinação (de acordo com
classificação do MS e da
OMS). Se persistir o risco,
fazer uma segunda dose
dez anos apos a primeira.
Vacinar pelo menos dez
dias antes da viagem
• Contraindicada para
imunodeprimidos.
Quando os riscos de
adquirir a doença superam
os riscos potenciais da
vacinação, o médico deve
avaliar sua utilização.
• Há relatos de maior risco
de eventos adversos
graves nos maiores de 60
anos, portanto, na
primovacinação, avaliar
risco/beneficio
Sim Sim
19
5. VULNERABILIDADES LIGADAS À SAÚDE DO IDOSO
O profissional de saúde não tem possibilidade de interferir na herança genética de um
idoso, mas ele está em uma posição privilegiada para desenvolver ações que promovam o bem-
estar e previnam agravos à saúde dos idosos.
Atividade Física e Nutrição - A promoção de ações que estimulem a realização de exercícios e
de práticas lúdicas é um importante espaço para a ação. Os benefícios da atividade física são
amplamente reconhecidos e incluem, além do fortalecimento da capacidade funcional, o
crescente bem-estar e a integração social dos idosos. No âmbito dos benefícios físicos, a
literatura da área costuma mencionar a melhora da resistência cardiovascular, aumento do tônus
muscular, maior flexibilidade articular, fortalecimento ósseo, perda de peso, melhora no perfil
lipoproteico, aumento do metabolismo, melhor trânsito gastrointestinal, ganhos na qualidade do
sono, entre outros.
A realização de atividades físicas precisa considerar, também, questões de segurança
como: usar calçados e roupas adequadas ao exercício, ingerir água em quantidade suficiente
para suprir as suas necessidades hídricas, e evitar exercícios ao ar livre quando estiver muito
quente ou muito frio. Oriente o idoso a buscar ajuda nos casos em que perceba qualquer reação
diferente da habitual. Quanto à nutrição, as necessidades dos idosos são influenciadas pelo seu
nível de atividades e por suas condições clínicas, além, é claro, da influência dos seus hábitos e
costumes familiares, étnicos e culturais no padrão alimentar. Muitas vezes, somam-se a estas
questões, outras referentes ao acesso do idoso aos alimentos, também moduladas por restrições
financeiras e pela capacidade física para o preparo das refeições. A orientação e o
acompanhamento por profissional da nutrição são fatores importantes para a determinação das
necessidades de ingestão de alimentos de um idoso. No entanto, a contribuição das observações
do profissional de saúde pode ajudar a detectar limitações cotidianas como dificuldades para
mastigar, o esquecimento do idoso sobre quando comer ou sobre como preparar um alimento.
Também cabe ao Enfermeiro estar atento às queixas dos idosos relacionadas a problemas bucais
que possam estar interferindo na adequada ingestão de alimentos.
Uso de Medicamentos e Suas Implicações - Cerca de um terço dos idosos utiliza diariamente
algum tipo de medicamento. Estes medicamentos podem ser prescritos ou não, sendo que
muitos fazem uso de mais de um tipo de medicamento, como cardiovasculares, anti-
hipertensivos, analgésicos, sedativos, laxantes, antiácidos, antidepressivos, etc. O uso
concomitante de vários medicamentos aumenta o risco de reações adversas e diminui os seus
níveis de segurança, pois pode ocorrer a troca de suas dosagens e de seus horários de ingestão,
ou anulação de um medicamento sobre os efeitos do outro.
Na revisão do uso de medicamentos, a equipe de enfermagem deve avaliar os benefícios
da terapia medicamentosa, os riscos de reações adversas e de interações medicamentosas,
considerando também o risco para reações que afetem o equilíbrio, a mobilidade, que causem
tonturas, quedas, constipação, incontinência urinária, certificando-se acerca de menores riscos e
maiores benefícios da terapia utilizada. Neste sentido, o trabalho integrado da Equipe de Saúde
e a troca de informações com o profissional médico podem auxiliar na tomada de decisão sobre
como manter o rol de medicamentos adequado às necessidades do idoso, com menor prejuízo
possível. A administração de terapia medicamentosa é um fator relevante para manter um idoso
saudável, mas possui, também, riscos significativos por envolver habilidades complexas. A
equipe de enfermagem pode atuar de forma colaborativa com os idosos garantindo a sua
20
segurança e o uso apropriado dos medicamentos, ensinando formas alternativas de reconhecer o
nome dos fármacos e o modo de ingerir os medicamentos, utilizando como referência símbolos
e práticas do cotidiano do idoso para facilitar, por exemplo, a memorização do horário do
medicamento. As estratégias educativas que podem ser empregadas pela equipe de enfermagem
junto aos idosos em relação à administração de terapia medicamentosa incluem a checagem do
uso correto dos remédios no dia a dia (doses e horários), a organização dos medicamentos, a
elaboração de mecanismos que auxiliem na identificação (ex. redefinição de embalagens), a
disponibilização da informação sobre posologia de maneira a facilitar a visualização, o estímulo
à ajuda dos familiares neste controle, a orientação sobre os efeitos dos medicamentos, bem
como suas interações com os alimentos e com outros medicamentos.
Ainda vale enfatizar que muitos medicamentos possuem como efeito colateral
repercussões na cavidade bucal do idoso. A situação mais frequente é a redução do fluxo salivar
(hipossalivação) acompanhada ou não da sensação de boca seca (xerostomia). Ambos os
agravos prejudicam a saúde bucal do idoso, aumentando o risco de desenvolvimento da cárie
dentária, doenças da gengiva e dificuldade no uso de próteses dentárias, além do desconforto
bucal. A equipe de enfermagem deve ficar atenta a tais questões e também evidenciá-las para
que, no processo de trabalho em equipe, isso seja considerado objeto de atenção do cirurgião-
dentista, num trabalho articulado entre os membros da equipe.
As Quedas - As quedas são uma preocupação quanto à segurança entre muitos idosos. A queda
pode ser definida como “um evento não intencional que tem como resultado a mudança de
posição do individuo para um nivel mais baixo, em relação a sua posição inicial”. A queda se dá
em decorrência da perda total do equilíbrio postural, podendo estar relacionada à insuficiência
súbita dos mecanismos neurais e osteoarticulares envolvidos na manutenção da postura. Alguns
autores referem-se à queda como uma síndrome geriátrica. Pessoas de todas as idades
apresentam risco de sofrer queda. Porém, para os idosos, elas possuem um significado muito
relevante, pois podem levá-lo à incapacidade, injúria e morte. Um episódio de queda pode levar
o idoso a sentir medo de que esta se repita, fazendo com que ele deixe de realizar suas
atividades usuais e limite sua independência. Muitas vezes, o resultado é a hospitalização e a
transferência para uma instituição de longa permanência para a reabilitação por longos períodos.
O custo social é imenso e torna se maior quando o idoso tem diminuição da autonomia e
da independência ou passa a necessitar de institucionalização. Nos serviços de emergência
norte-americanos, as quedas em idosos são eventos frequentes, causando lesões, constituindo a
principal etiologia de morte acidental em pessoas com idade acima de 65 anos. No Brasil,
segundo dados do Sistema de Informação sobre Mortalidade (SIM), o número de óbitos por
queda, considerando o registro do CID-BR-10, entre pessoas com 60 anos ou mais, em 2007,
alcançou 4.959. Embora, proporcionalmente, este número pareça pequeno (0,03%), é
preocupante que idosos venham a óbito exclusivamente pelo fato de terem sofrido episódio de
queda. Em estudo realizado com idosos que sofreram queda e foram atendidos em nível
hospitalar, em Ribeirão Preto, constatou-se que a maioria já havia sofrido quedas anteriores.
Metade dos idosos pertencia à faixa etária de 80-89 anos. O estudo mostrou também que boa
parte das quedas apresentou como causa um ambiente inadequado (54%), seguida por doenças
neurológicas (14%) e doenças cardiovasculares (10%). A maioria das quedas foi da própria
altura e relacionadas a problemas com ambiente do idoso, tais como: piso escorregadio (26%),
atrapalhar-se com objetos no chão (22%), trombar em outras pessoas (11%), subir em objetos
para alcançar algo (7%), queda da cama (7%), problemas com degrau (7%) e outros, em
menores números. Destaca como fatores de risco para as quedas uma combinação de perigos
21
ambientais e problemas de saúde. Entre os fatores que levam à queda e que estão associados à
saúde, salientamos: diminuição da acuidade visual, problemas cardiovasculares como
hipotensão postural ou síncopes, condições que afetam a mobilidade como artrites, fraqueza
muscular, problemas nos pés, falta de equilíbrio, incontinência urinária e reações adversas aos
medicamentos. Dentre os perigos ambientais que propiciam as quedas, estão a pouca iluminação
ou tipo de iluminação inadequada, piso molhado ou escorregadio, escadas ou calçadas em mau
estado, calçados inadequados, e objetos no chão, nos quais o idoso possa tropeçar. As
intervenções da equipe de enfermagem em relação a esse problema direcionam-se ao
gerenciamento das condições de saúde e à redução dos riscos ambientais. Algumas vezes,
intervenções simples na organização da mobília para propiciar uma passagem livre até o
banheiro ou manter uma luz acesa à noite podem reduzir consideravelmente o risco de quedas
no ambiente doméstico. Hoje, pode-se lançar mão de uma variedade de equipamentos de
segurança, como pisos antiderrapantes, barras de sustentação, apoios para os sanitários,
bengalas, andadores, todos com a finalidade de oferecer proteção ao idoso.
A Violência Contra o Idoso - Além das quedas, outro relevante fator de vulnerabilidade a que
se encontra exposto o idoso e a violencia. A violencia, tambem denominada de “maus-tratos”
precisa ser vista sob, pelo menos, três parâmetros: demográfico, sócioantropológico e
epidemiológico.
A Rede Internacional para Prevenção dos Maus Tratos contra a Pessoa Idosa define a
violencia contra esse grupo etário como “o ato (único ou repetido) ou omissão que lhe cause
dano físico ou aflição e que se produz em qualquer relação na qual exista expectativa de
confiança”. A violencia contra idosos se manifesta de diferentes formas, podendo ser: a)
estrutural: a que ocorre pela desigualdade social e é naturalizada nas expressões da pobreza, da
miséria e da discriminação; b) interpessoal: a que ocorre nas relações cotidianas; c)
institucional: aplicação ou omissão da gestão das políticas sociais e pelas instituições de
assistência.
No âmbito das instituições de assistência social e saúde, são frequentes as denúncias de
maus-tratos e negligência. São preocupantes as situações de abuso e negligência no interior dos
próprios lares, onde o choque de gerações, problemas de espaço físico, dificuldades financeiras
costumam se somar a um imaginário social que considera a velhice como “decadencia”. Em
uma investigação com o objetivo de compreender a situação de violência que grande parte dos
idosos brasileiros vivenciam, um estudo explorou os dados sobre morbidade e mortalidade por
violência, no período de 1980 a 1998, no Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM) do
MS e no Sistema de Informações Hospitalares (SIH-SUS) e realizou revisão bibliográfica acerca
da temática nas bases MEDLINE, LILACS E CLAVES, na década de 90. Os resultados da
investigação apontaram para a convergência entre as causas externas específicas de mortalidade
de idosos, e os motivos de internação por maus-tratos e as expressões de violência, muito mais
amplas, difusas, naturalizadas e reproduzidas na cotidianeidade das relações sociais no interior
das famílias, nas instituições e em diferentes contextos sociais. Mortes no trânsito (primeira
causa específica de morte) e quedas (primeira causa específica de internação) resultam, na
maioria das vezes, de negligências, omissões e maus-tratos. É importante ressaltar, também, a
universalidade do problema e sua dimensão histórica, presente nas sociedades complexas e
contemporâneas e nas comunidades primitivas. Chama-se a atenção para a necessidade de que
as políticas de prevenção e atenção à violência contra os idosos considerem as diferentes formas
de configuração do problema. Defende a formulação de políticas públicas que redefinam
positivamente o lugar do idoso na sociedade e privilegiem o cuidado, a proteção e sua
22
subjetividade, tanto em suas famílias como em instituições de longa permanência. No que diz
respeito ao autor da agressão contra o idoso, observe-se que os filhos são os principais
reclamados, sendo responsáveis por 207 denúncias de violência, seguidos de outros parentes. Os
familiares foram os autores de 132 denúncias e 85 eram provenientes de órgão públicos. A
violência intrafamiliar, importante representação da violência interpessoal, é toda ação ou
omissão que prejudique o bem-estar, a integridade física, psicológica ou a liberdade e o direito
ao pleno desenvolvimento de outro membro da família. Violência intrafamiliar é aquela que
acontece dentro da família, em casa ou fora dela, ou seja, nas relações entre os membros da
comunidade familiar, formada por vínculos de parentesco natural (pai, mãe, filha/filho etc.) ou
civil (marido/esposa, nora/genro ou outros), por afinidade (por exemplo, o primo ou parente do
marido/da esposa) ou afetividade (amigo ou amiga que more na mesma casa) (BRASIL, 2006).
É importante o acompanhamento das famílias dos idosos pela Equipe de Saúde da Família,
especialmente pela Enfermeira, pois evidenciam que é no contexto familiar que as agressões
contra os idosos são praticadas, em geral, pelos filhos homens. Estes e os cônjuges são
responsáveis por 2/3 dos casos de maus-tratos no cenário doméstico.
As diversas formas de violência contra idosos não se produzem isoladamente, mas
fazem parte de uma sequência crescente de episódios nos quais o homicídio é a manifestação
mais extrema. Existem condições particulares, individuais, familiares ou coletivas, que
aumentam o risco de ocorrência de violência intrafamiliar. A pessoa idosa torna-se mais
vulnerável à violência na medida em que apresenta maior dependência. O convívio familiar
estressante e cuidadores despreparados ou sobrecarregados tendem a agravar essa situação.
A Constituição Federal de 1988 afirma como obrigação dos filhos a assistência aos pais.
No entanto, estudos realizados pelo Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, com base nas
ocorrências registradas pela Delegacia de Proteção ao Idoso de São Paulo em 2000, revelaram
que 39,6% dos agressores são filhos das vítimas, 20,30% seus vizinhos e 9,3% outros
familiares. Os mecanismos implicados com o surgimento e a permanência da situação de
violência entre as famílias brasileiras são uma questão ainda a se solucionar. Sabe-se que, em
muitos casos, o agressor não é punido rigorosamente e o reclamante pode sentir-se exposto a
reações violentas por parte dos denunciados. A maioria das ocorrências de violência contra
idosos é revelada por denúncias anônimas, principalmente, por telefone.
A identificação de sinais de violência contra as pessoas idosas é frequentemente
negligenciada no atendimento à saúde, quer pela dificuldade em identificá-los, quer pela
ausência de suporte formal para auxiliar tanto a(s) vítima(s) quanto os profissionais. Essa
identificação de sinais de violência contra as pessoas idosas é, também, com certa frequência,
negligenciada no atendimento à saúde e deve ser notificada por meio de ficha apropriada. É
importante, para que as equipes de saúde da família possam identificar as várias formas de
violência, que sejam criados espaços de reflexão e capacitação sobre esse tema nos serviços de
saúde e nas demais instituições situadas na área de atuação da equipe. Cabe às equipes a
identificação dos casos suspeitos ou confirmados de violência, notificando-os, bem como a
promoção de ações de prevenção dessas violências, por meio de educação em saúde com os
familiares e estimulando uma rede de proteção à pessoa idosa. É também, um de seus papéis,
fomentar a cultura da paz e a promoção da saúde, estimulando hábitos e comportamentos
saudáveis, como também propor estratégias intersetoriais que busquem ambientes e entornos
seguros e saudáveis.
23
A Finitude e a Perspectiva da Morte - Outro aspecto importante na atenção à saúde do idoso é
a perspectiva da morte, que é parte da vida de todos nós e, mais intensamente, da história de
vida dos idosos. Aos 75 anos de idade, 63% das mulheres experienciaram a morte de seus
cônjuges e 20% dos homens perderam suas esposas. A experiência de perder familiares e
amigos, muitas vezes, provoca o medo da morte nas pessoas mais velhas. Este medo tem
características multidimensionais e a religiosidade constitui-se em um ponto de apoio externo
significativo. Fatores como a etnia, o sexo, a idade e o status socioeconômico influenciam o
controle que os indivíduos são capazes de manter sobre o medo da morte, sua ou do outro. É
interessante destacar que, embora a morte seja uma experiência inevitável em nossas vidas, ela
é, também, a etapa que mais relutamos em aceitar.
A dificuldade vivida por todos nós no enfrentamento das experiências de finitude e
morte exige da equipe de enfermagem um aprendizado sobre como lidar com esse processo,
desenvolvendo habilidades no manejo da complexa vivência dos indivíduos à morte, seus
familiares, amigos e demais envolvidos, inclusive a própria equipe de saúde. A equipe de
enfermagem precisa desenvolver um misto de sensibilidade, visão e conhecimentos que lhe
permita compreender as necessidades de cuidado e definir as intervenções eficazes para os
problemas identificados. O envolvimento pessoal e profissional com os processos de
nascimento e morte está relacionado com nossa própria história de vida, sobretudo, com as
experiências da família com a morte no passado, e no presente. Os sentimentos e as atitudes em
relação ao processo de viver, os significados atribuídos à morte em nossa cultura, as crenças
religiosas e/ou espirituais, a nossa filosofia de vida, a idade e o estado de saúde das pessoas,
enfim, são múltiplos e complexos os aspectos que afetam o processo de morte.
Os desejos pessoais dos familiares precisam ser respeitados. Deve-se ter cuidado para
não julgar as reações da família com base em suas próprias crenças e valores. É importante
encorajar os familiares e amigos a expressarem seus sentimentos de luto e de tristeza
abertamente, pois isto pode ajudar a superar os sofrimentos em relação à morte. Precisa-se ficar
atento aos familiares no período pós-morte, estudos demonstram índices mais elevados de
mortalidade durante o primeiro ano de viuvez, por exemplo. Assim, as intervenções de
enfermagem neste período devem considerar as ameaças potenciais ao indivíduo enlutado,
buscando articulação com redes de apoio familiar e social (visita de um membro da igreja, uma
assistente social, etc.) que possam acompanhar as semanas subsequentes à morte, evitando que
as emoções negativas provoquem adoecimento ou agravem problemas já instalados.
Idosos Vivendo em Locais de Cuidados Contínuos - A decisão familiar a respeito deste tipo
de necessidade costuma ser muito traumática e a orientação profissional é fundamental para
minimizar os sentimentos de culpa e frustrações quando a institucionalização torna-se
inevitável. Assim, quando o idoso precisa de cuidado intensivo para realizar suas necessidades
básicas de conforto, nutrição, hidratação, segurança e integridade da pele, frente à
impossibilidade de um familiar com dedicação capaz de atender tais necessidades, as
instituições de cuidado contínuo podem ser uma opção mais segura e adequada.
As instituições de cuidado contínuo ou de longa permanência já foram consideradas
como espaços inadequados para as práticas de cuidado. Atualmente têm sido revistas como
ambientes complexos e dinâmicos, oferecendo unidades de cuidado subagudo, onde
disponibilizam cuidados de ventilação, hiperalimentação e outros serviços, antes restritos aos
ambientes hospitalares. Alguns destes serviços, aliás, estão vinculados física e
organizativamente a hospitais, funcionando, algumas vezes, como hospital-dia. A equipe de
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enfermagem poderá orientar a família em relação aos fatores que devem ser avaliados para a
definição da instituição onde o idoso será cuidado, incluindo: a análise dos custos, da filosofia
de cuidado da instituição, da estrutura organizacional, dos serviços disponibilizados, da
qualificação e quantitativo da equipe, das instalações físicas oferecidas aos idosos residentes, da
qualidade dos alimentos servidos, das atividades existentes e do próprio espaço de participação
dos familiares na política institucional.