Curso de Remédios Constitucionais

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Curso sobre REMÉDIOS CONSTITUCIONAIS PROF. Luciano Coelho Ávila Aula gravada para o programa SABER DIREITO – TV JUSTIÇA ________________________________________________________________________________ _______________ Curso de Remédios Constitucionais Professor Luciano Ávila Aulas exibidas nos dias 17, 18, 19 de setembro de 2008 Distinção entre direitos, garantias e remédios constitucionais. Rui Barbosa, analisando a Constituição de 1891, foi um dos primeiros estudiosos a enfrentar a distinção entre os direitos e as garantias fundamentais. Ele distinguiu “as disposições meramente declaratórias, que são as que imprimem existência legal aos direitos reconhecidos, e as disposições assecuratórias, que são as que, em defesa dos direitos, limitam o poder. Aquelas instituem os direitos, estas as garantias; ocorrendo não raro juntar-se, na mesma disposição constitucional, ou legal, a fixação da garantia, com a declaração do direito.” Assim, os direitos são bens e vantagens prescritos na norma constitucional, enquanto as garantias são os instrumentos através dos quais se assegura o exercício dos aludidos direitos (preventivamente) ou prontamente os repara, caso violados. Resta diferenciar as garantias fundamentais dos remédios constitucionais. Estes últimos constituem espécies do gênero

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Curso sobre REMÉDIOS CONSTITUCIONAISPROF. Luciano Coelho Ávila

Aula gravada para o programaSABER DIREITO – TV JUSTIÇA

_______________________________________________________________________________________________

Curso de Remédios Constitucionais

Professor Luciano Ávila

Aulas exibidas nos dias 17, 18, 19 de setembro de 2008

Distinção entre direitos, garantias e remédios constitucionais. Rui Barbosa, analisando

a Constituição de 1891, foi um dos primeiros estudiosos a enfrentar a distinção entre os

direitos e as garantias fundamentais. Ele distinguiu “as disposições meramente

declaratórias, que são as que imprimem existência legal aos direitos reconhecidos, e as

disposições assecuratórias, que são as que, em defesa dos direitos, limitam o poder.

Aquelas instituem os direitos, estas as garantias; ocorrendo não raro juntar-se, na mesma

disposição constitucional, ou legal, a fixação da garantia, com a declaração do direito.”

Assim, os direitos são bens e vantagens prescritos na norma constitucional, enquanto as

garantias são os instrumentos através dos quais se assegura o exercício dos aludidos

direitos (preventivamente) ou prontamente os repara, caso violados.

Resta diferenciar as garantias fundamentais dos remédios constitucionais. Estes

últimos constituem espécies do gênero garantia. Isso porque, uma vez consagrado o

direito, a sua garantia nem sempre estará nas regras definidas constitucionalmente como

remédios constitucionais (ex: habeas corpus, habeas data, etc.). Em determinadas

situações a garantia poderá estar na própria norma que assegura o direito. Exs: é inviolável

a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos

religiosos – art. 5, VI (direito) – garantindo-se na forma da lei a proteção aos locais de

culto e suas garantias (garantia); direito ao juízo natural (direito) – art. 5, XXXVII, veda

a instituição de juízo ou tribunal de exceção (garantia).

- Falemos, a partir de agora dos remédios constitucionais em espécie.

Do mandado de segurança: art. 5º, incs. 69 e 70 – CF.

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1) O remédio constitucional do mandado de segurança surge logo após a crise que produziu a

revisão da chamada “doutrina brasileira do habeas corpus”, com a reforma constitucional de

1926, que tornou evidente a necessidade de adoção de um instrumento processual-

constitucional adequado para a proteção judicial contra lesões a direitos subjetivos públicos

não protegidos pelo habeas corpus. Assim, a Constituição de 1934 consagrou, ao lado do

habeas corpus, e com o mesmo processo deste, o mandado de segurança para a proteção de

direito “certo e incontestável, ameaçado ou violado por ato manifestamente inconstitucional

ou ilegal de qualquer autoridade.” (art. 133, 33)

2) Após isso, o todos os textos constitucionais brasileiros, à exceção da Carta de 1937,

contemplaram o mandado de segurança. Na CF/88, o mandado de segurança foi previsto

pelo art. 5º, inc. 69, que dispõe: “conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito

líquido e certo, não amparado por habeas corpus ou habeas data, quando o responsável pela

ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no

exercício de atribuições do Poder Público.”

3) O texto constitucional também prevê o mandado de segurança coletivo, que poderá ser

impetrado por partido político com representação no Congresso Nacional, organização

sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo

menos um ano, em defesa de seus membros ou associados (art. 5º, inc. 70, a e b).

4) No âmbito infraconstitucional, a ação de mandado de segurança encontra-se disciplinada

pela Lei n. 1533/51, pela Lei 4.348/64 e pela Lei 5021/66.

Considerações gerais sobre o remédio do mandado de segurança.

5) O MS é uma ação judicial, de rito sumário especial, a ser utilizada quando direito líquido e

certo do indivíduo for violado por ato de autoridade governamental ou de agente de pessoa

jurídica privada que esteja no exercício de atribuição do Poder Público. É sempre ação de

natureza civil, ainda quando impetrado contra ato de juiz criminal, praticado em processo

penal.

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6) O MS é ação de natureza residual, subsidiária, pois somente é cabível quando o direito

líquido e certo a ser protegido não for amparado por outros remédios judiciais (habeas corpus,

habeas data, ação popular, etc.)

7) O MS é cabível contra o chamado “ato de autoridade”, entendido como qualquer

manifestação ou omissão do Poder Público ou de seus delegados no desempenho de

atribuições públicas. Ressalte-se que as omissões da autoridades também podem violar

direito líquido e certo do indivíduo, legitimando a impetração do mandado de segurança.

8) Porém, nem todo o direito é amparado pela via do mandado de segurança: a Constituição

exige que o direito invocado seja líquido e certo. Direito líquido e certo é aquele demonstrado

de plano através de prova documental, e sem incertezas, a respeito dos fatos narrados pelo

declarante. É o que se apresenta manifesto na sua existência, delimitado na sua extensão e

apto a ser exercitado no momento da impetração. Se a existência do direito for duvidosa; se a

sua extensão ainda não estiver delimitada; se o seu exercício depender de situações e fatos

ainda indeterminados, não será cabível o mandado de segurança. Esse direito incerto,

indeterminado, poderá ser defendido por outras vias, mas não em sede de MS. Por essa razão,

não há dilação probatória no mandado de segurança; as provas devem ser pré-constituídas,

documentais, levadas aos autos do processo no momento da impetração.

9) Mas atenção !!! Segundo a orientação dominante, a exigência de liquidez e certeza recai

sobre a matéria de fato, sobre os fatos alegados pelo impetrante para o ajuizamento do

mandado de segurança. Estes, sim, necessitam de comprovação inequívoca, de plano.

10) Isso significa que a matéria de direito, por mais complexa e difícil que se apresente, pode

ser apreciada em mandado de segurança (STF). A alegação de grande complexidade jurídica

do direito invocado não é motivo para obstar a utilização do MS. A propósito, vide súmula

625 do STF (Controvérsia sobre matéria de direito não impede concessão de mandado de

segurança).

11) Legitimidade ativa para impetrar MS:

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a) as pessoas físicas ou jurídicas, nacionais ou estrangeiras, domiciliadas ou não no

Brasil;

b) as universalidades reconhecidas por lei, que, embora sem personalidade jurídica,

possuem capacidade processual para a defesa de seus direitos (ex: o espólio, a massa

falida, o condomínio de apartamentos, a herança, a sociedade de fato, a massa do

devedor insolvente, etc...);

c) os órgãos públicos de grau superior, na defesa de suas prerrogativas e atribuições;

d) os agentes políticos (governador de estado, prefeito municipal, magistrados,

deputados, senadores, vereadores, membros do MP, membros dos Tribunais de

Contas, Ministros de Estado, Secretários de Estado, etc.), na defesa de suas atribuições

e prerrogativas;

e) o Ministério Público, competindo a impetração, perante os Tribunais locais, ao

promotor de Justiça, quando o ato atacado emanar de juiz de primeiro grau;

12) Legitimidade passiva (autoridade coatora):

a) autoridade pública de qualquer dos poderes da União, dos Estados, do DF e dos

Municípios, bem como de suas autarquias, fundações públicas, empresas públicas e

sociedades de economia mista;

b) agente de pessoa jurídica privada, desde que no exercício de atribuições do Poder

Público (só responderão se estiverem, por delegação, no exercício de atribuições do

Poder Público). Atenção: a autoridade coatora será o agente delegado (que

recebeu a atribuição) e não a autoridade delegante (que efetivou a delegação) –

Esse é o teor da Súmula 510 – STF.

13) Competência para o processo e julgamento do mandado de segurança:

A competência para o processo e julgamento do MS é definida ratione personae, ou seja,

em razão de quem seja a autoridade pública ou o agente delegado e pela sua sede

funcional. É irrelevante, para fixação da competência, a matéria a ser discutida em

MS. Assim, se um Ministro de Estado pratica um ato por delegação recebida do

Presidente da República, o tribunal competente para apreciar o MS impetrado contra tal

ato do ministro será o STJ (CF 105, I, b), não o STF (que seria o Tribunal competente se o

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ato tivesse sido praticado pelo próprio Presidente da República – CF 102, I, d).

Observação importante para provas: segundo o STF, todos os Tribunais têm

competência para julgar, originariamente, os MS contra os seus próprios atos, os dos

respectivos presidentes e os de suas câmaras, turmas ou seções. Assim, MS contra ato do

STJ, do Presidente do STJ ou de uma turma do STJ, será julgado pelo próprio STJ, e

assim sucessivamente. No âmbito da Justiça Estadual, caberá aos próprios estados-

membros cuidar da competência para a apreciação do MS contra atos de suas autoridades,

por força do art. 125-CF.

14) O Ministério Público é oficiante obrigatório no MS, como parte pública autônoma,

encarregada de velar pela correta aplicação da lei e pela regularidade do processo. Sua

atuação é imparcial, como fiscal da aplicação da lei, podendo opinar pelo cabimento ou

descabimento da ação. É indispensável o efetivo pronunciamento do MP no feito, sob pena de

nulidade.

15) O MS admite desistência, independentemente do consentimento do impetrado. Porém,

segundo a jurisprudência do STF, essa faculdade de desistência encontra limite no julgamento

de mérito da causa. Assim, uma vez julgado o mérito do MS, o demandante pode até desistir

de recurso eventualmente interposto, mas a decisão recorrida será mantida intacta, pois não

lhe será permitido desistir do processo, sobretudo quando a decisão lhe for desfavorável.

16) O MS pode ser repressivo ou preventivo, conforme se destine a reparar uma ilegalidade

ou abuso de poder já praticados ou apenas a afastar uma ameaça de lesão ao direito líquido e

certo do impetrante. O MS poderá ser, também, individual (para proteger o direito líquido e

certo do impetrante ou impetrantes, no caso de litisconsórcio ativo) ou coletivo (impetrado

por partido político, organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente

constituída e em funcionamento há pelo menos 1 ano, em defesa dos interesses de seus

membros ou associados). A exigência de 1 ano somente recai sobre as associações, não

obrigando as organizações sindicais e entidades de classe.

17) No MS coletivo, o interesse invocado pertence a uma categoria, grupo ou classe,

agindo o impetrante como mero substituto processual (legitimação extraordinária) na

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relação jurídica, daí porque não se exige a autorização expressa dos titulares dos

direitos, conforme exigência do art. 5º, inc. 21 da CF, que contempla caso de

representação. Ou seja, se uma associação pleitear judicialmente determinado direito

em favor de seus associados por outra via que não seja a do mandado de segurança

coletivo, será necessária a autorização expressa, prescrita no art. 5º, inc. 21. Mas em se

tratando de MS tal exigência não incidirá, por se tratar de hipótese de substituição

processual.

- Não se exige, também, que o direito defendido pertença a todos os filiados ou

associados. Basta que pertença a parte deles. Súmula 630 – STF (Ex: Um benefício

que aproveite apenas aos delegados de polícia inativos – parte da categoria).

- Outro detalhe importante: embora sendo uma ação coletiva, segundo o STF, para o

ajuizamento de MS coletivo, exige-se a comprovação de direito subjetivo, líquido e

certo de um grupo, categoria ou classe, não se permitindo a sua utilização para o fim

de proteger direitos difusos e gerais da coletividade.

18) O prazo para impetração do MS é de 120 dias, a contar da data em que o

interessado tiver conhecimento oficial do ato a ser impugnado (publicação do ato na

imprensa oficial, por exemplo). Trata-se, de acordo com o STF, de prazo decadencial,

não passível de suspensão ou interrupção. Não ocorre a decadência, entretanto, se o

MS tiver sido protocolado a tempo perante juízo incompetente. Para o STF,

referido prazo decadencial não é inconstitucional (súmula 632 – STF – É

constitucional lei que fixa o prazo para a impetração de MS.)

E se o ato impugnado é de trato sucessivo (pagamento periódico de vencimentos,

prestações mensais de determinado contrato, etc.)? Aí o prazo de 120 dias renova-se a

cada ato. Se o MS é do tipo preventivo, naturalmente não haverá prazo para sua

impetração, porque não há se falar em ato coator concretizado nesse caso.

19) Hipóteses de descabimento de MS:

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a) Não cabe MS contra lei em tese (STF, súmula 266), pois para o questionamento de leis

em tese já existe a via apropriada do controle abstrato de constitucionalidade. A doutrina

brasileira sustenta que se afigura razoável a superação de referida súmula, pois há muitos

casos de leis que produzem imediatamente efeitos concretos, afetando posições jurídicas de

forma imediata, e que deveriam, portanto, ensejar o cabimento da ação constitucional. Essas

leis de efeitos concretos equivalem a atos administrativos e, por terem destinatários certos,

podem violar, de imediato, direitos individuais. (Exs: Leis que aprovam planos de

urbanização, as que fixam limites territoriais, as que criam novos Municípios, as que

concedem isenções fiscais, os decretos que desapropriam bens, os que fazem nomeações, etc.)

b) Também não cabe MS, nos termos do art. 5º, da Lei 1533/51, contra:

ato administrativo de que caiba recurso administrativo com efeito suspensivo,

independente de caução. É que, nesse caso, o interessado já dispõe de meio apropriado e

efetivo de impugnação do ato.

Decisão judicial de que caiba recurso apto a impedir a ilegalidade ou admita reclamação

correicional eficaz; O MS não é sucedâneo recursal.

atos disciplinares, salvo quando praticado por autoridade incompetente ou com

inobservância de formalidade essencial. Essa hipótese tem sido objeto de críticas severas

da doutrina, por impedir o exame do mérito de uma punição disciplinar, pois não haveria

sustentação jurídica para esse posicionamento da lei. O que pode ocorrer, em casos como

esses, é a não demonstração da liquidez e certeza do direito, tendo em vista a necessidade

de exame probatório mais dilargado.

20) Por fim, deve-se mencionar que o MS não pode ser impetrado como ação

substitutiva de cobrança (Súmula 269 – STF). Significa dizer que a concessão de MS não

produz efeitos patrimoniais, em relação a período pretérito, os quais deverão ser reclamados

administrativamente, ou pela via judicial apropriada. Ex: imagine-se que o Poder público

esteja realizando desconto indevido na remuneração mensal de um servidor desde o mês de

dezembro de 2004. O servidor, porém, só ajuizou o writ em março de 2005. Em setembro de

2005, é prolatada a sentença, reconhecendo a ilegitimidade de tal desconto. Nessa situação,

embora a sentença tenha reconhecido a ilegalidade do ato, a ordem mandamental, em relação

aos efeitos pecuniários (descontos indevidamente realizados), somente alcançará as

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prestações relativas ao período posterior à impetração (de março a setembro). Os descontos

realizados em período anterior ao ajuizamento do writ (dezembro a fevereiro) não serão

devolvidos por força da sentença mandamental; deverão ser reclamados na via própria,

judicial ou administrativa.

- HABEAS DATA: Art. 5, LXXII – CF.

1) Na linha de especialização dos instrumentos de defesa de direitos individuais, a

Constituição de 1988 concebeu o habeas data como instituto destinado a assegurar o

conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante constantes de registros ou

bancos de dados de entidades governamentais ou de caráter público e para permitir a

retificação de dados, quando não se prefira fazê-lo de modo sigiloso.

2) Concebido como instrumento de acesso aos dados constantes dos arquivos do Governo

Militar, o HD acabou por se constituir em instrumento de utilidade relativa no sistema geral

da Constituição de 1988. Talvez isso se deva, fundamentalmente, à falta de definição de um

âmbito específico de utilização não marcado por contingências políticas.

3) O HD é remédio constitucional, de natureza civil, submetido a rito sumário, que se destina

a garantir, em favor da pessoa interessada, o exercício de pretensão jurídica discernível em

seu tríplice aspecto: a) direito de acesso aos registros relativos à pessoa do impetrante; b)

direito de retificação desses registros e c) direito de complementação dos registros.

4) O HD encontra-se regulado pela Lei 9.507, de 12 de novembro de 1997, que, no inciso III

do seu art. 7, acrescentou uma outra hipótese de cabimento da medida, além das

constitucionalmente previstas, a saber: “para a anotação nos assentamentos do interessado,

de contestação ou explicação sobre dado verdadeiro mas justificável e que esteja sob

pendência judicial ou amigável.”

- Essa garantia do HD não se confunde com o direito de obter certidões (art. 5, XXXIV, b –

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CF), ou informações de interesse particular, coletivo ou geral (art. 5, XXXIII). Havendo

recusa no fornecimento de certidões (para a defesa de direitos ou esclarecimento de situações

de interesse pessoal, próprio ou de terceiros), ou informações de terceiros, o remédio

apropriado é o mandado de segurança, e não o habeas data. Se o pedido for para

conhecimento de informações relativas à pessoa do impetrante, como visto, o remédio será o

habeas data.

5) Atenção: o direito a receber dos órgãos públicos informações de interesse próprio, em

sede de habeas data, não se reveste de caráter absoluto, cedendo passo quanto aos dados

protegidos por sigilo, em prol da segurança da sociedade e do Estado. Nos termos do art. 5,

XXXIII, o acesso a informações de órgãos públicos não abrange aquelas cujo sigilo seja

imprescindível à segurança da sociedade e do Estado. Evidentemente, tal ressalva não

pode ser banalizada, sob pena de se tornar inócua a garantia do HD. Com efeito, conforme

sustenta Pedro Lenza, em seu entender, infelizmente não acompanhado por parte da

jurisprudência, não se poderia negar o irrestrito direito de acesso às informações, sobre a

pessoa do impetrante, nem mesmo alegando o sigilo como imprescindível à segurança da

sociedade e do Estado. Isso porque não há como, em matéria de direito individual, utilizar-se

de interpretação restritiva. Ela há de ser, nessa matéria, ampliativa.” (Michel Temer)

6) Legitimidade ativa : O HD poderá ser ajuizado por qualquer pessoa física, brasileira

ou estrangeira, bem como por pessoa jurídica. Saliente-se, porém, que a ação é

personalíssima, vale dizer, somente poderá ser impetrada pelo titular das

informações.

7) Legitimidade passiva : No pólo passivo, podem figurar entidades governamentais, da

Administração Pública Direta (União, Estados, DF e Municípios) e Indireta (as

autarquias, as Fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, as Empresas

Públicas e as Sociedades de Economia Mista), bem como as instituições, entidades e

pessoas jurídicas privadas detentoras de banco de dados contendo informações que

sejam ou possam ser transmitidas a terceiros ou que não sejam de uso privativo do

órgão ou entidade produtora ou depositária das informações (ex: as entidades de

proteção ao crédito, como o SPC, o SERASA, entre outras).

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8) É irrelevante a natureza jurídica da entidade, que poderá ser pública ou privada. O aspecto

que determinará o cabimento da ação será o fato de o banco de dados ser de caráter

público, a exemplo do SPC. Note-se que, nesse caso, a entidade é de natureza privada, mas o

seu banco de dados é de caráter público (as informações sobre os consumidores podem ser

acessadas por terceiros).

9) Importante: Aspecto importante do cabimento do HD diz respeito à exigência legal de

que a ação somente poderá ser impetrada em Juízo diante da prévia negativa da

autoridade administrativa de fornecimento (ou de retificação ou de anotação da

contestação ou explicação) das informações solicitadas. Trata-se de uma das exceções

constitucionais ao princípio do controle jurisdicional imediato (art. 5, XXXV), configurando

hipótese de instância administrativa de curso forçado (a outra hipótese de curso forçado

está prevista pelo art. 217, par. 1 – CF).

10) Portanto, para que o interessado tenha interesse de agir, para o fim de impetrar habeas

data, é imprescindível que tenha havido o requerimento administrativo e a negativa pela

autoridade administrativa de atendê-lo, devendo tal negativa ou omissão da autoridade

administrativa vir comprovada na petição inicial (art. 8, par. Único, da Lei 9.507/97).

11) Outro dado interessante: No HD, não há necessidade de que o impetrante revele as

causas do requerimento ou demonstre que as informações são imprescindíveis à defesa

de eventual direito seu, pois o direito de acesso lhe é garantido, independentemente de

motivação, até porque o acesso aos próprios dados constitui, na visão da melhor doutrina,

uma materialização dos direitos de personalidade.

12) A impetração do HD não está sujeita a prazo prescricional ou decadencial, podendo a

ação ser proposta a qualquer tempo.

13) A competência para o julgamento do HD foi delineada pela Constituição, tendo por

critério a pessoa que pratica o ato (ratione personae). Exs: art. 102, I, d: competência

originária do STF para processar e julgar HD contra atos do Presidente da República; art.

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105, I, b – competência originária do STJ para processar e julgar HD contra atos dos

Ministros de Estado, dos Comandantes da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, ou do

próprio Tribunal.

14) Tanto o procedimento administrativo quanto a ação judicial de HD são gratuitos

(art. 5, inc. 77. Estão vedadas pela Lei quaisquer cobranças de custas ou taxas judiciais dos

litigantes, bem como de quaisquer valores para o atendimento do requerimento

administrativo. Ademais, não há ônus de sucumbência (honorários advocatícios) em HD. Para

o ajuizamento da ação, porém, exige-se advogado.

DO MANDADO DE INJUNÇÃO : art. 5, LXXI – CF.

1) A vigente Constituição, no intento de assegurar a plena eficácia e aplicabilidade de seus

dispositivos, instituiu um novo remédio constitucional, a ação denominada mandado de

injunção, cabível “sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício

dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à

soberania e à cidadania.”

2) Trata-se de um remédio constitucional colocado à disposição de qualquer pessoa que se

sinta prejudicada pela falta de norma regulamentadora, sem a qual resulte inviabilizado o

exercício dos direitos, liberdades e garantias constitucionais prescritas no transcrito inciso. A

preocupação, portanto, é conferir efetiva aplicabilidade e eficácia ao texto constitucional, para

que este não se torne “letra morta”, em razão da omissão do legislador ordinário na sua

regulamentação. Visa combater, portanto, a chamada violação negativa da Constituição.

3) Importante: embora não haja previsão expressa na Constituição, há pacífica orientação

do STF a respeito do cabimento do mandado de injunção coletivo, admitindo-se a

impetração pelas entidades sindicais ou de classe, com a finalidade de viabilizar, em favor

dos membros ou associados dessas instituições, o exercício de direitos assegurados pela CF e

que estejam inviabilizados pela ausência de regulamentação, nos mesmos termos previstos

para o mandado de segurança coletivo (MI 20/DF, rel. Min. Celso de Mello, 19.05.1994.)

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4) A competência para o julgamento do mandado de injunção é determinada em razão da

pessoa (ratione personae) obrigada a elaborar a norma regulamentadora, e que permanece

inerte. A CF fixa a competência para julgamento de mandado de injunção nos seguintes

dispositivos: art. 102, I, “q”; art. 102, II, “a”; art. 105, I, “h”; e art. 121, par. 4, V – CF.

5) O mandado de injunção não é gratuito e, para sua impetração, é necessária a assistência de

advogado.

- Distinções entre o MI e a ADI por omissão:

- É patente o paralelismo existente entre o mandado de injunção e a ação direta de

inconstitucionalidade por omissão, prescrita pelo art. 103, par. 2 – CF. Ambas as ações visam

a suprir uma omissão do legislador, diante da necessidade de regulamentação do texto

constitucional, mas possuem aspectos distintos, especialmente os seguintes: legitimação,

objeto, procedimento, julgamento e competência, efeitos da decisão, etc.

Hipóteses de descabimento do MI :

1) Segundo a jurisprudência do STF, não caberá mandado de injunção:

a) se já existe norma regulamentadora do direito previsto na Constituição, ainda que

defeituosa (mandado de injunção é remédio para reparar a falta de norma regulamentadora de

direito previsto na Constituição; se já existe a norma regulamentadora, ainda que

flagrantemente inconstitucional, não será mais cabível mandado de injunção; nesse caso, a

validade da norma poderá ser discutida em outras ações, mas não na via do mandado de

injunção);

b) diante da falta de norma regulamentadora de direito prevista em normas

infraconstitucionais (MS é remédio para reparar falta de norma regulamentadora de direito

previsto na Constituição Federal, e não para os casos de falta de norma regulamentadora que

esteja obstando o exercício de direito previsto em normas infraconstitucionais, tais como as

leis, tratados internacionais ou decretos publicados no exercício do poder regulamentar do

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Chefe do Executivo);

c) diante da falta de regulamentação dos efeitos de Medida Provisória não convertida em lei

pelo Congresso Nacional (pelo mesmo motivo explicitado no item anterior). A hipótese está

prevista pelo art. 62, parágrafos 3 e 11– CF.

- LEGITIMAÇÃO ad causam PARA O MI:

- Qualquer pessoa física ou jurídica que se veja impossibilitada de exercer um determinado

direito constitucional por falta de norma regulamentadora. No mandado de injunção

coletivo, a legitimação pertence ao partido político com representação no Congresso Nacional

e à organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em

funcionamento há pelo menos 1 ano, em defesa dos interesses de seus membros ou

associados.

- No pólo passivo do mandado de injunção, devem figurar os órgãos ou autoridades

públicas que têm a obrigação de legislar, mas estejam omissos quanto à elaboração da

norma regulamentadora. Se a omissão for legislativa federal, o MI deverá ser impetrado em

face do Congresso Nacional, salvo se a iniciativa para a lei for privativa de outro órgão

ou autoridade, hipótese em que o mandado de injunção deverá ser ajuizado em face do

detentor da iniciativa privativa (ex: Presidente da República, nas situações do art. 61, par. 1 –

CF, por exemplo).

- O STF firmou o entendimento de que os particulares não se revestem de legitimidade

passiva ad causam para o processo do MI, pois somente ao Poder Público é imputável o

dever constitucional de produção legislativa. Dessa forma, só podem ser sujeitos passivos

do MI entes públicos, não admitindo o STF a formação de litisconsórcio passivo,

necessário ou facultativo, entre autoridades públicas e pessoas privadas.

Eficácia da decisão em MI: mudança de orientação do STF. Teoria não-concretista e

teorias concretistas do MI.

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- Direito de Petição – art. 5, XXXIV, “a” - CF.

- O direito de petição, previsto no art. 5, inc. 34, da CF, configura um clássico direito

fundamental já constante do Bill Of Rights, de 1689. A nossa Carta Constitucional de 1824 já

o consagrava e todas as demais Constituições brasileiras subseqüentes o albergaram. Trata-se

de importante instrumento de defesa não jurisdicional de direitos e interesses gerais ou

coletivos.

- A Constituição Federal assegura a todos, independentemente do pagamento de taxas, “o

direito de petição aos poderes públicos em defesa de direitos ou contra ilegalidade ou abuso

de poder.”

- O direito de petição, de natureza eminentemente democrática e informal (não há

necessidade de assistência advocatícia), assegura ao indivíduo, ao mesmo tempo, participação

política e possibilidade de fiscalização na gestão da coisa pública, sendo um meio para tornar

efetivo o exercício da cidadania. É o instrumento de que dispõe qualquer pessoa para levar ao

conhecimento dos poderes públicos fato ilegal ou abusivo, contrário ao interesse público, para

que sejam tomadas as providências necessárias. Poderá, também ser um instrumento para a

defesa de direitos perante os órgãos do Estado.

- No conceito de petição há de se compreender “a reclamação dirigida à autoridade

competente para que reveja ou eventualmente corrija determinada medida, a reclamação

dirigida à autoridade superior com o objetivo idêntico, o expediente dirigido à autoridade

sobre a conduta de um subordinado, como também qualquer pedido ou reclamação relativa

ao exercício ou à atuação do Poder Público.”

- É importante destacar as duas situações distintas que podem ensejar a petição ao poderes

públicos: a) defesa de direitos; b) reparação de ilegalidade ou abuso de poder. Nesta segunda

finalidade, o direito de petição pode ser exercido em prol do interesse coletivo ou geral,

absolutamente desvinculado da comprovação da existência de qualquer lesão a interesses

próprios do peticionário.

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- A legitimação é universal: qualquer pessoa, física ou jurídica, nacional ou estrangeira (ou

mesmo um interessado que não possua personalidade jurídica, como uma sociedade de fato),

pode peticionar aos poderes públicos, Legislativo, Executivo ou Judiciário, bem como ao

Ministério Público, contra ilegalidade ou abuso de poder, ou, se for o caso, em defesa de

direitos. Anote-se que não há aqui sequer que se cogitar de qualquer critério relativo à

capacidade de exercício, uma vez que o menor também poderá exercer o direito de

petição, se tiver consciência de seu significado. Em outros casos, deverá ser

representado por seus representantes legais.

- Apresentada a petição, a autoridade pública está obrigada constitucionalmente ao seu

recebimento, ao exame e à expedição de resposta em tempo razoável – em respeito ao

postulado da celeridade processual, previsto no art. 5, inc. 78 – CF -, sob pena de implicar

ofensa ao direito líquido e certo do peticionário, sanável pela via do mandado de segurança.

- A omissão injustificada da autoridade pública poderá, também, ensejar a sua

responsabilização civil, administrativa e criminal.

- O direito de petição, entretanto, não se confunde com o direito de ação, nem o substitui.

Assim, o direito de petição, fundado no art. 5, inc. 34, “a”, da Constituição não pode ser

invocado, genericamente, para exonerar qualquer dos sujeitos processuais do dever de

observar as exigências que condicionam o exercício do direito de ação; tratando-se de

controvérsia judicial cumpre respeitar os pressupostos e os requisitos fixados pela legislação

processual comum.

- O direito de petição não poderá ser utilizado como sucedâneo da ação penal, de forma a

oferecer-se, diretamente perante o juízo criminal, acusação formal, em substituição ao

Ministério Público.

- O direito de petição não torna apto o interessado a postular em Juízo, em nome próprio.

Para isso, há de estar devidamente habilitado, na forma da lei. São distintos o direito de

petição e o direito de postular em juízo.

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- De acordo com o Min. Celso de Mello, o direito de petição “qualifica-se como prerrogativa

de extração constitucional destinada à generalidade das pessoas pela Carta Política. Traduz

direito público subjetivo de índole essencialmente democrática. O direito de petição,

contudo, não assegura, por si só, a possibilidade de o interessado – que não dispõe de

capacidade postulatória – ingressar em juízo, para, independentemente de advogado, litigar

em nome próprio ou como representante de terceiros ...” (AR 1354 AgR, 06.06.1997).

- DIREITO À OBTENÇÃO DE CERTIDÕES: ART. 5, INC. 34, “B” - CF.

- A CF assegura a todos, independentemente do pagamento de taxas, “a obtenção de

certidões em repartições públicas, para defesa de direitos e esclarecimento de situações de

interesse pessoal.”

- Cuida-se de garantia constitucional de natureza individual, sendo obrigatória a expedição da

certidão quando se destine à defesa de direitos e esclarecimento de situações de interesse

pessoal do requerente. Desse modo, tal garantia não pode ser invocada por quem pretenda

obter cópia de documentos a respeito de terceiro, a menos que este lhe tenha conferido

mandato de representação.

- O Estado está obrigado a prestar as informações solicitadas, ressalvadas as hipóteses de

proteção por sigilo, sob pena de ofensa a direito líquido e certo do requerente, por ilegalidade

ou abuso de poder, reparável na via do mandado de segurança.

- A jurisprudência firmou-se no sentido de que não se exige do administrado a

demonstração da finalidade específica do pedido. Todavia, o art. 2, da Lei n. 9051/95,

estabelece a necessidade dos interessados fazerem constar esclarecimentos relativos aos fins e

razões do pedido.” A mesma lei, no seu art. 1, fixa o prazo improrrogável de 15 dias,

contado do registro do pedido no órgão expedidor, para a expedição das certidões requeridas

dos órgãos da administração centralizada e autárquica, às empresas públicas, sociedades de

economia mista e às fundações públicas da União, dos Estados, DF e Municípios.

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- O não-fornecimento das informações englobadas no pedido de certidão, ressalvadas as

hipóteses de sigilo, poderá ensejar a responsabilidade civil do Estado, bem como a

responsabilização pessoal da autoridade que a denegou.

- Cabe ressaltar que, diante da negativa ilegal ao fornecimento de certidões, o remédio

judicial idôneo para a repressão da ilegalidade é o mandado de segurança, e não o habeas

data. Como exemplo, o direito de o funcionário público obter certidão perante a autoridade

administrativa para requerer a sua aposentadoria. Havendo negativa, o remédio cabível será o

mandado de segurança e não o HD.

- Por fim, inegável que o direito de certidão não é absoluto, podendo ser negado em caso

de o sigilo ser imprescindível à segurança da sociedade ou do Estado. Nesse sentido,

regulando o art. 23 da Lei n. 8.159/91, destaca-se o Decreto n. 4.553/2002.

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