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Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa Universidade Federal da Paraíba 15 a 18 de agosto de 2017 ISSN 2236-1855 1232 CONFLITOS E TENSÕES NA HISTÓRIA DO COLÉGIO BRIGADEIRO NEWTON BRAGA Jussara Cassiano Nascimento 1 Introdução Ao desenvolver uma pesquisa no espaço de uma instituição escolar, deparamo-nos com um enorme quebra cabeças a ser desvendado, pois devem ser encontradas algumas peças que são indispensáveis para que se possa recompor esse jogo e sendo assim, documentos, legislação, utensílios escolares, projetos, alunos, famílias, professores, fotografias, ex-alunos e tantas outras coisas que ali se encontram são importantes para nos fornecer pistas para a realização da pesquisa. Sanfelice nos informa que: [...] uma Instituição Escolar ou educativa é a junção ou síntese de múltiplas determinações, de várias instâncias como a política, econômica, cultural, religiosa, da educação geral, moral, ideológica, que agem e interagem entre si, formando dessa maneira a cultura e a identidade daquela instituição (SANFELICE, 2007, p.75). Cada instituição escolar possui uma identidade própria, porém ela também é fruto de fatores externos que são acomodados de acordo com o que está acontecendo na sociedade, por isso ao realizar estudos sobre instituições escolares, não podemos dar explicações de forma direta e imediata a partir do que percebemos no seu interior, é preciso contextualizar o momento social, histórico e político no momento inicial e posterior à sua fundação. O contexto histórico e educacional no período da fundação do ginásio O período em que ocorreu a fundação do Ginásio Brigadeiro Newton Braga foi marcado por diversas reformas que estavam acontecendo na área educacional, ligadas ao ensino secundário. Clarice Nunes (2000) nos informa que: o que denominamos de ensino secundário corresponde atualmente ao segundo segmento do ensino fundamental. No entanto, questões a ele referidas nesse passado, não tão distante, reaparecem com força, projetadas no atual nível do ensino médio (NUNES, 2000, p. 36). 1 Doutora em Educação pela Universidade Católica de Petrópolis. Membro do Grupo de Pesquisa LER/UERJ. Docente no Colégio Brigadeiro Newton Braga. E-Mail: <[email protected]>.

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Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa – Universidade Federal da Paraíba – 15 a 18 de agosto de 2017

ISSN 2236-1855 1232

CONFLITOS E TENSÕES NA HISTÓRIA DO COLÉGIO BRIGADEIRO NEWTON BRAGA

Jussara Cassiano Nascimento1

Introdução

Ao desenvolver uma pesquisa no espaço de uma instituição escolar, deparamo-nos com

um enorme quebra cabeças a ser desvendado, pois devem ser encontradas algumas peças que

são indispensáveis para que se possa recompor esse jogo e sendo assim, documentos,

legislação, utensílios escolares, projetos, alunos, famílias, professores, fotografias, ex-alunos

e tantas outras coisas que ali se encontram são importantes para nos fornecer pistas para a

realização da pesquisa. Sanfelice nos informa que:

[...] uma Instituição Escolar ou educativa é a junção ou síntese de múltiplas determinações, de várias instâncias como a política, econômica, cultural, religiosa, da educação geral, moral, ideológica, que agem e interagem entre si, formando dessa maneira a cultura e a identidade daquela instituição (SANFELICE, 2007, p.75).

Cada instituição escolar possui uma identidade própria, porém ela também é fruto de

fatores externos que são acomodados de acordo com o que está acontecendo na sociedade,

por isso ao realizar estudos sobre instituições escolares, não podemos dar explicações de

forma direta e imediata a partir do que percebemos no seu interior, é preciso contextualizar o

momento social, histórico e político no momento inicial e posterior à sua fundação.

O contexto histórico e educacional no período da fundação do ginásio

O período em que ocorreu a fundação do Ginásio Brigadeiro Newton Braga foi marcado

por diversas reformas que estavam acontecendo na área educacional, ligadas ao ensino

secundário. Clarice Nunes (2000) nos informa que:

o que denominamos de ensino secundário corresponde atualmente ao segundo segmento do ensino fundamental. No entanto, questões a ele referidas nesse passado, não tão distante, reaparecem com força, projetadas no atual nível do ensino médio (NUNES, 2000, p. 36).

1 Doutora em Educação pela Universidade Católica de Petrópolis. Membro do Grupo de Pesquisa LER/UERJ. Docente no Colégio Brigadeiro Newton Braga. E-Mail: <[email protected]>.

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O ensino secundário foi introduzido pelos jesuítas na sociedade colonial brasileira há

cerca de 500 anos e é neste contexto que surgem os primeiros colégios de ensino secundário,

como sendo produto da missão da companhia de Jesus no Brasil.

Os colégios de ensino secundário no Brasil trouxeram como marca a perspectiva de

acesso à universidade, algo que durante anos somente se fazia viável aos filhos da elite. No

âmbito da história geral da educação, a origem dessas escolas se encontra nos pensionatos

para bolsistas universitários. Esses pensionatos tinham como função introduzir ordem e

disciplina entre os discentes. Os primeiros colégios datam do século XIII, sendo que alguns

deles receberam pensionistas pagantes entre esses bolsistas.

André Petitat (1992) analisa esses colégios em quatro dimensões: (1) o espaço, (2) o

tempo, (3) a seleção de aspectos sócio-culturais e (4) a estrutura de poder. Quanto ao espaço,

os locais diversos escolhidos por professores independentes são trocados por prédios únicos

com várias salas de aula e como decorrência vieram o controle, a planificação do estudo, a

gestão centralizada e a vigilância. Esse ambiente favoreceu uma gradação sistemática e a

divisão das matérias.

Em meados do século XX, as lutas pelo humanismo na educação brasileira se

expressavam por meio de diferentes representações sociais com diversos projetos para a

educação secundária. Estava em evidência a manutenção dos estudos clássicos e a

proeminência da cultura científica, sobretudo, no que se referia à formação voltada para a

cultura geral, como nos afirma Abreu (2005, p.65):

[...] o currículo obrigatório da escola secundária brasileira compreende, nos quatro anos do primeiro ciclo ou curso ginasial, Português, Latim, Francês, Inglês, Matemática, História Geral, Geografia Geral, História do Brasil, Geografia do Brasil, Ciências Naturais, Desenho, Trabalhos Manuais, Economia doméstica, e Canto Orfeônico.

Nesse contexto histórico e social, a passagem de um programa centrado na lógica e na

dialética para um programa que buscasse dar conta do estudo das belas letras, segundo

Petitat (1992) significava uma pedagogia fundada na escrita, onde esse micromundo dos

colégios exercitava o poder moderno mediante uma organização burocrática, que vai se

constituindo no século XVI, no qual o estado em ascensão retira a autonomia das cidades e

dos senhores.

Pela ação dos Jesuítas esses colégios se multiplicaram com êxito e seu sucesso deve-se a

serem instituições organizadas e regulamentadas com um método considerado moderno de

ensino, sendo eficazes para a transmissão dos conhecimentos.

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O Brasil teve seus primeiros colégios após a chegada dos jesuítas. Sua instalação

significou a introdução de uma cultura letrada em um ambiente onde predominava a cultura

oral, e o império da fé foi configurado através de conflitos culturais vivenciados por oposição

entre civilizados e bárbaros. A palavra passou a ter uma função social, além de constituir-se

como comunicação da vida social.

O enfoque dos colégios sob a disseminação da cultura escrita tornou mais clara a sua

importância uma vez que a escrita deixava de ser apenas um recurso de instituições

religiosas, jurídicas e comerciais para se tornar traço característico da burguesia, o que para

essa classe significava um certo distanciamento entre os de “baixo”, afirmando sua

superioridade social (Petitat, 1992).

Os colégios brasileiros foram aos poucos se espalhando pelo litoral e seus professores

jesuítas reconhecidos como primeiros mestres intelectuais da nossa gente.

Clarice Nunes (1980) informa que o momento da implantação dos colégios no Brasil, é

um momento de verdadeira revolução do espaço mundial mediante a expansão marítima,

comercial e cultural na Europa, pois mesmo tendo como referência as universidades

europeias, não nasceram diretamente delas. Eles nasceram da política de separação

instaurada pelos jesuítas entre o ensino destinado aos filhos dos colonos mais abastados e o

ensino destinado aos indígenas.

Com a expulsão dos jesuítas pela política pombalina, o ensino secundário passou a ser

oferecido em aulas avulsas nas diversas províncias. Mesmo com a chegada da política

imperial, a instrução primária pretendia cumprir seu papel civilizador e a instrução

secundária serviria para formar a elite portadora de privilégios do pequeno círculo que

participava do poder de Estado.

Alguns colégios como o Pedro II, o Colégio Caraça, os Liceus provinciais, o Ateneu do

Rio Grande do Norte, os Liceus da Bahia e da Paraíba fazem parte dessa história dos colégios

no Brasil e servem para sinalizar que essas iniciativas tinham como objetivo a educação da

elite (Nunes, 2000). Mesmo com a República, essa concepção permaneceu no país até a

promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação em 1961 com a Lei nº. 4.024, nossa

primeira LDB (Lei de Diretrizes e Bases).

A preparação do curso secundário como curso regular já havia se estabelecido pela

reforma Rocha Vaz em 1925 que definiu seis anos seriados de estudos para o curso

secundário com o objetivo de oferecer um preparo geral para a vida. Era a primeira vez que o

ensino secundário aparecia como prolongamento do ensino primário. Os estudantes que

terminavam seus estudos em seis anos recebiam o diploma de bacharel em ciências e letras.

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Aquele que fizesse somente cinco anos poderia realizar o vestibular para qualquer curso

superior.

No ano de 1931 a Reforma Francisco Campos reafirmou a função do ensino secundário

e elevou sua duração para sete anos, dividindo-se em dois ciclos: o primeiro de cinco anos,

chamado de fundamental e o segundo de dois anos chamado de curso complementar. Esse

curso complementar tinha o currículo diferenciado e assumia posição de enciclopedismo

especializado.

A reforma Gustavo Capanema em 1942, afirmava a dualidade do ensino ao opor o

ensino primário e profissional e o ensino secundário e superior, onde a função do ensino

secundário seria oferecer uma sólida cultura geral, apoiada sobre humanidades antigas e

modernas, com objetivo de preparar os homens que assumiriam responsabilidades dentro da

sociedade e da nação.

A Lei Orgânica de Ensino Secundário de 1942 reestruturou o ensino secundário da

seguinte forma: (1) o primeiro ciclo, chamado ginasial; e (2) o segundo ciclo subdividido em

clássico e científico, o que não significou qualquer caráter de especialização, sendo

considerado um curso de cultura geral e de cultura humanística, no qual prevalecia o sistema

de provas e exames previstos na legislação anterior.

Alguns motivos levaram à ampliação dessa demanda pelo ensino secundário e novas

alternativas pedagógicas surgiram a partir da LDB de 1961, permitindo o aparecimento de

classes experimentais (NUNES, 2000, p. 45).

Acontecia também o temido exame de admissão pelos adolescentes, que representou

por algumas décadas a linha divisória e decisiva entre a escola primária e a escola secundária,

carregando uma série de silogismos, principalmente para adolescentes que tanto o temiam.

O exame de admissão para o ensino secundário era caracterizado como o exame de

maior prestígio e ascensão social, pois conforme as Leis Orgânicas era destinado às

individualidades condutoras, enquanto os demais eram destinados às massas.

Para Geraldo Bastos Silva a expansão do ensino secundário no país estava ligada ao

crescimento demográfico, às exigências de maior escolarização motivadas pelo

desenvolvimento brasileiro de industrialização sobre a área urbana e ao crescimento do

ensino primário (SILVA, 1969, p. 301-307).

No intervalo entre o Estado Novo e o Regime Militar de 1964 a pressão das classes

médias e operárias em torno de líderes políticos populistas obrigava-os a institucionalizar os

momentos em busca de educação escolarizada, reivindicando a abertura de Ginásios

públicos.

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Em suma, a expansão do ensino secundário se fez pelo estabelecimento de ginásios nas

localidades onde anteriormente o ensino secundário era inexistente. Com o crescimento da

rede e das matrículas o corpo docente passou a ser recrutado por uma série de processos

emergenciais.

Nunes (2000) em texto intitulado “o velho e bom ensino secundário: momentos

decisivos” nos informa que a região sudeste em comparação com as demais regiões do país,

era a mais beneficiada em termos de educação secundária, pois estavam matriculados nessa

região cerca de 60% da matrícula total do ensino secundário no país.

Comparando-se com os demais níveis de ensino, houve um aumento da população em

idade escolar e grande parte dos adolescentes ainda permanecia fora da escola, tanto na zona

urbana quanto na zona rural. Segundo Nunes (2000) em 1957 de 100 alunos que

frequentavam o nível primário, apenas 14 chegavam ao nível subsequente e apenas 1% dos

indivíduos era das classes populares. Para ela, a expansão do ensino secundário era fruto das

contradições entre uma política populista, o atraso em níveis educacionais do país e a evasão

dos estudantes que mostravam as dificuldades econômicas e sociais que as famílias

enfrentavam.

A escola que representava para esses jovens uma perspectiva de ascensão social era a

escola secundária, considerado uma escolha alternativa lógica no sentido de trazer vantagens

relativas aos diferentes tipos de educação.

As classes populares também desejavam uma condição melhor para seus filhos, mas

não havia escolas suficientes. Em função de demandas sociais pelo ensino secundário, a

política pública se vê pressionada a dar respostas aos apelos populares e investir na expansão

com o objetivo de conter as tenções sociais geradas por problemas como o aumento dos

alimentos, alto custo dos transportes, falta de energia; porém ao invés de conter as tensões

essa expansão estimulou as pessoas reivindicarem uma boa remuneração profissional

(NUNES, 1980).

A pressão pela expansão do ensino secundário ao final dos anos 1950 havia criado uma

situação irreversível que exigia uma maior intervenção do poder público e como assinala

Spósito (1984) havia o desejo de que as classes populares também tivessem acesso ao ginásio.

Essa abertura do ginásio em continuidade ao primário também estava sendo incentivada pelo

Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos (INEP), sob a direção de Anísio Teixeira.

Nas décadas de 1950 e 1960 as lutas não se davam somente pela expansão do número

de escolas secundárias, mas também a insatisfação segundo Nunes (1980) fortalecia

movimentos que pretendiam quebrar aquela rigidez curricular da escola secundária, trazendo

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à cena disciplinas práticas e vocacionais. O primeiro passo dessa quebra de rigidez registrado

pela história da educação brasileira é o da criação de classes experimentais, que surgiram em

1959 na gestão de Gildásio Amado na Diretoria de Ensino Secundário. Essas classes

experimentais estavam baseadas no modelo francês das nouvelles classes, que objetivavam

novos currículos, métodos e processos de ensino.

Além das classes experimentais, outras propostas foram implementadas dentro do

Ministério da Educação com o slogan de modernização do ensino secundário, onde os

momentos decisivos ocorreram entre 1961 e 1964 quando foram criados os ginásios

industriais e os ginásios populares idealizados por Lauro de Oliveira (NUNES, 1980).

A Lei de Diretrizes e Bases de 1961 estava nos seus primeiros dias e o projeto dos

ginásios modernos se apoiavam na legislação do ensino industrial. Os ginásios vocacionais

foram definidos como escolas comunitárias instaladas de acordo com as características

culturais e socioeconômicas do lugar, porém ocorreu um fechamento ligado as possibilidades

de ingresso nestes ginásios, quando a Secretária de Educação procurou estender o ensino

ginasial para uma maior parcela da população.

A partir de 1961, o ensino secundário em uma perspectiva ampla, referia-se a educação

de nível médio e estava ligado a todo tipo de estudos pós-primários (comercial, industrial,

agrícola e normal) e numa perspectiva restrita, o ensino secundário referia-se ao ramo

secundário do primeiro ciclo definido pela lei 4024 de 1961. Segundo Gildásio Amado (1964),

o governo brasileiro a partir de 1960 define uma política para o ensino médio, incentivando a

criação de ginásios integrados (AMADO, 1964).

A Criação do Ginásio Brigadeiro Newton Braga

Realizar o trabalho de investigação com a história das instituições escolares não é

simplesmente contar a estória de uma escola. Essa tarefa exige recuperar as estórias contadas

pelos sujeitos e o levantamento e dados documentais e/o iconográficos para tecer um tapete

da história tecelã que nos fala Ginzburg. É encontrar nessas malhas novas nuances que

trazem relevância aos dados coletados, porque podem ser interpretados como recortes da

história naquele período de estudo, podem então, revelar o movimento real da sociedade. Nas

palavras de Nosella e Buffa (2005, p. 8) isso quer dizer que “a metodologia a ser seguida tem

como linha de orientação descrever o particular, explicitando suas relações com o contexto

econômico, político, social e cultural, dialeticamente relacionados”.

Nossa tentativa é de sermos rigorosos com a metodologia e não cair no relato

impregnado da emoção, com o risco do pecado do reducionismo teórico que tem por

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consequência o particularismo, saudosismo, personalismos ou a construção de apologias.

Para reconstrução desta história foi necessário recorrer a alguns documentos existentes no

Centro de Memória2 da escola e no III Comando Aéreo Regional (COMAR); realizar

entrevistas com professores que atuaram, e que atuam na instituição, bem como, trazer a voz

dos ex-alunos, pois como Benjamin (1994, p. 37), “um acontecimento vivido é finito, ou pelo

menos encerrado na esfera do vivido, ao passo que o acontecimento lembrado é sem limites,

porque é apenas uma chave para tudo o que veio antes e depois”.

Para trazer um pouco desta história3, foi preciso retornar ao debate em torno da criação

de uma Força Aérea única. Em 1939, no início da Segunda Guerra Mundial, foi constatado

que a forma como se desenvolviam os combates no além-mar, revelaram a necessidade da

criação de um Ministério exclusivo para gerenciar a aviação brasileira.

Em janeiro de 1941, o Excelentíssimo Senhor Presidente da República Getúlio Vargas

criou o Ministério da Aeronáutica (MAER), estabelecendo a fusão das forças aéreas do

Exército e da Marinha numa só corporação que foi denominada de Forças Aéreas Nacionais.

Pouco tempo depois, em maio de 1941, o nome da recém-nascida força aérea muda para

Força Aérea Brasileira (FAB), nome que permanece até os dias de hoje.

Com a criação da FAB e a extinção da Base de Aviação Naval, foi fundada a Base Aérea

do Galeão que, inicialmente, abrigou a Escola de Especialistas da Aeronáutica, pois havia

necessidade de controle do espaço aéreo nacional e do posicionamento político do governo

brasileiro na Geopolítica Internacional, sendo urgente a necessidade de formar especialistas

que tivessem condições de atuar e contribuir com o governo nas questões que diziam respeito

ao espaço aéreo.

O país vivia um período de intensas reivindicações que seguiam na esteira de dar

respostas às demandas políticas e sociais do processo de modernização e desenvolvimento.

Nesse contexto, a superação de problemas sociais, econômicos e culturais se tornou centro

das atenções. Como nos alerta Nunes (2000, p. 46): “No intervalo entre o Estado Novo e o

regime militar de 1964, as populações urbanas, sobretudo das classes médias e operárias,

pressionavam os líderes políticos populistas em torno da institucionalização dos movimentos

reivindicatórios de educação escolarizada”.

Nesse momento político destacamos a constituição da Campanha Nacional de

Educandários Gratuitos (CNEG), movimento que se caracterizava pela atividade de

2 O Centro de Memórias do CBNB foi inaugurado por ocasião das festividades do Jubileu de Ouro e nele constam arquivos de fotos, documentos e objetos que contam a história desta Instituição.

3 Dados históricos disponíveis em: <http://www.fab.mil.br>. Acesso em: 19 abr. 2013.

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voluntariado, com objetivo de ampliar a oferta do ensino secundário para atender a

população nas diferentes localidades brasileiras.

A história da CNEG tem uma trajetória longa que vamos fazer a tentativa de resumir

em função dos limites deste trabalho. A Campanha foi criada em 29 de julho de 1943, pelo

paraibano de Picuí, Felipe Tiago Gomes, na cidade do Recife-PE, com o objetivo de oferecer

um ginásio gratuito para estudantes pobres. A entidade foi originalmente denominada

Campanha do Ginasiano Pobre – CGP. Posteriormente, passou a ser a Campanha dos

Educandários Gratuitos – CEG, depois, Campanha Nacional dos Educandários Gratuitos –

CNEG, e atualmente é a Campanha Nacional de Escolas da Comunidade – CNEC, a tão

conhecida entidade mantenedora dos colégios Cenecistas. Hoje, a CNEC representa uma das

maiores organizações de ensino do país, atuando em todos os níveis educacionais, em 18

estados da federação. Possui 134 unidades de educação básica, 21 unidades de ensino

superior, mais de 100.000 alunos e mais de 8.000 colaboradores (dos quais, 6.000 em

atividades docentes)4. E, neste ano de 2014, a CNEC completa 71 anos de atuação.

Retomando a discussão para os anos da ainda CNEG e o contexto de criação do Colégio

Brigadeiro Newton Braga, objetivamos tecer os fios que enlaçam as duas histórias no

movimento de lutas pela expansão do ensino secundário. Em entrevista realizada com o Sr.

Antônio Joaquim Coelho da Cunha, Administrador da CNEC aqui no Rio de Janeiro, ele nos

esclarece que:

[...] A figura da CNEC aqui no Rio de Janeiro chamava-se Agnaldo Elias Guimarães, que era um Sargento da Aeronáutica. Ao conhecer Felipe Tiago Gomes criador da CNEC, gostou da ideia da criação dessas escolas [...] Então, a mágica da CNEC era dizer as lideranças da comunidade que assim como era possível criar a igreja, criar o clube de futebol, era possível criar escolas, essas comunidades iam se articulando, se movimentando e criavam condições de fundar as escolas e assim o Newton Braga foi criado, por uma iniciativa de um cidadão chamado Agnaldo Elias Guimarães.

E neste contexto, movidos pelo entusiasmo vigente neste cenário político, alguns

militares apostaram na possibilidade de um novo ginásio no Rio de Janeiro. Por iniciativa do

Sargento Agnaldo Elias Guimarães, do Capitão Aviador Max Alvim e do Capitão Murillo

Wanderley, no ano de 1959 foi possível iniciar o projeto de construção do Colégio que recebeu

o nome de Ginásio Brigadeiro Newton Braga. Este projeto já vinha sendo articulado desde o

ano de 1957 e tinha como propósito educar e formar os filhos dos militares e funcionários

civis da Força Aérea Brasileira.

4 Dados institucionais da CNEC disponíveis em http://www.cnec.br/site/.

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Sob o aviso nº 15 de 31 de março de 1960, o Major Brigadeiro do Ar, Francisco de Assis

Correa de Mello, , autoriza o funcionamento de um ginásio, dentro da área militar do Galeão,

destinado a ministrar ensino médio aos filhos de militares e funcionários civis daquela

Guarnição.

Os idealizadores do projeto resolveram homenagear o Major Brigadeiro Newton Braga,

dando seu nome ao estabelecimento de ensino devido a sua atuação brilhante na Força Aérea

Brasileira. Este Oficial da Aeronáutica participou de uma viagem inovadora, enfrentando o

Oceano Atlântico em um hidroavião chamado Jahu fazendo o primeiro percurso aéreo do

Brasil até a Itália em 1927.

Mas que local seria escolhido para iniciar o efetivo trabalho com o projeto? GERIN

(2008) informa que os primeiros passos levaram à escolha do Ginásio Capitão Lemos Cunha,

situado na área jurisdicional da Prefeitura da Aeronáutica do Galeão. Mas, quando o

professor Murillo Wanderley comunicou a decisão ao Ministro Álvaro Dias que, na época, era

o Presidente da Campanha dos Ginásios Gratuitos, foi constatado um conflito de interesses.

As cinco salas previstas para uso do novo ginásio, só poderiam prestar assistência aos

dependentes dos militares e civis da área do Galeão. A solução encontrada foi procurar outro

local para iniciar o funcionamento do Colégio. O local escolhido foi um galpão improvisado

ligado à Prefeitura da Aeronáutica, tendo sido indicado para o cargo de Diretor o Professor

Murillo Wanderley.

Com o decorrer dos anos, observa-se o crescimento da demanda de estudantes na Ilha

do Governador, foi necessária uma ampliação do colégio e, em 04 de abril de 1960, ele

recebeu novas instalações, ainda improvisadas, na Base Aérea do Galeão. Esse prédio estava

desabitado e pertencia ao Quartel de Polícia da Aeronáutica. “Neste mesmo ano, no dia 29 de

abril foi fundado o Ginásio Brigadeiro Newton Braga (GBNB)” (GERIN, 2008, p.56).

Essa demanda teve como referência a comunidade da Ilha, localizada no entorno da

Base Aérea do Galeão, ponto que, na época, era considerado estratégico devido à posição para

observação e defesa do território nacional, não por acaso localizado na Ilha do Governador a

maior ilha da Baía de Guanabara. Mendonça (1998 apud GERIN, 2008, p. 54), informa que

“naquela época, a imagem da corporação armada até então estava associada ao seu papel de

defesa externa”.

Era visível que a área educacional necessitava de um maior empreendimento. Tanto as

famílias dos oficiais, que estavam a serviço do Governo Brasileiro, quanto a comunidade

local, precisavam de apoio na área educacional. Na década de 50, “a população da Ilha do

Governador já somava 29.278 habitantes” (IPANEMA, 1992 apud GERIN, 2008, p. 54).

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O colégio se expandia a cada dia e o prédio do Quartel da Polícia da Aeronáutica já

estava pequeno para o contingente de alunos e, após a visita do Brigadeiro Márcio de Souza e

Mello, as coisas mudaram, pois ele prometeu ajuda para encontrar um local mais adequado.

E, finalmente, com a ajuda do Brigadeiro, o colégio foi instalado em um terreno da

Aeronáutica, cuja amplitude é de 23.800,63 m². E, assim, o CBNB no ano de 1969 teve sua

sede própria instalada.

Com a construção de um local definitivo para ser a sede do colégio e com espaços

ampliados, iniciou-se o curso noturno e foi possível encontrar um espaço para a tão sonhada

biblioteca. Com essa ampliação do espaço, foi possível, no ano de 1969, iniciar o que naquele

momento ainda era denominado ensino primário, com a chegada da 1ª turma de 4ª série,

pela legislação atual (Lei de Diretrizes e Bases - LDB, nº 9.394/96), hoje 5º ano de

escolaridade do Ensino Fundamental.

No ano de 1973, o professor Murillo Wanderley deixou a direção do colégio e seguiram-

se outros diretores à frente do cargo, ao longo desses 50 anos. Podemos citar alguns deles:

Professor Sérgio, Coronel Monteiro, Professor Armando, Capitão Machado, Professor

Roberto Freitas, Professor Hugo Alves de Castro e, atualmente, o Professor Luiz Otávio

Ebendinger Martins.

No ano de 2013 aconteceu a 1ª eleição para diretor geral do colégio, onde todos os

professores civis e militares puderam escolher o candidato que tinha a plataforma política

mais adequada à escola que desejavam. Foram dois candidatos, sendo que o professor Luiz

Otávio venceu as eleições, continuando Diretor Geral do Colégio Brigadeiro Newton Braga.

Considerações Finais

Chego ao necessário balanço deste estudo, que aos poucos foi tomando corpo, me

permitindo construir um texto com base em documentos, narrativas e imagens, e assim

recompor a história do Colégio Brigadeiro Newton Braga, buscando compreender a

identidade que foi se formando ao longo dos seus cinquenta anos de existência.

O diálogo com os autores Paolo Nosella e Ester Buffa (2009), que desenvolveram vários

estudos sobre instituições escolares, foi pertinente porque seus livros me ajudaram a

direcionar o olhar para esta instituição de forma mais cuidadosa, me deixando atenta para o

fato de que estudos que envolvem as instituições escolares, causam impacto nas pessoas que

nela se encontram, apontando o quanto o cotidiano nos surpreende a cada dia, nos

mostrando que o mesmo é cercado de conflitos e tensões.

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Um ponto importante que destaco neste momento, foi com relação as fontes

documentais, pois no meu caso encontrei muita dificuldade, pois não houve uma

preocupação institucional em guardar documentação comprobatória sobre: a fundação do

Ginásio, o momento em que o mesmo passou a ser um Colégio que abrigava tanto o curso

ginasial quanto o curso científico; o regime de subordinação desta instituição; o Termo de

ajuste de conduta, dentre outros. Vale, destacar que muitos documentos foram localizados

durante a pesquisa.

E neste caso, o diário oficial da união foi um instrumento que muito utilizei em busca

desses documentos oficiais para formalizar a pesquisa. Porém, é preciso destacar que as

narrativas, a partir das entrevistas, foram as principais fontes deste estudo, porque elas não

eram fechadas, possibilitando ao entrevistado narrar o que vivenciou. Foi a partir das

mesmas, que cheguei ao real objeto desse estudo, que é a busca da identidade histórica desta

instituição.

Dentre os teóricos que visitei para fazer a leitura do meu objeto de estudo, Carlo

Ginzburg (1989) foi o principal indicador do caminho metodológico que percorri. A partir da

sua proposta do Paradigma Indiciário, fui aos poucos juntando as peças e a partir dos

indícios que foram surgindo, fui montando o quebra cabeças que indicava a identidade que

foi se formando ao longo da história do CBNB.

A primeira questão que me moveu foi investigar o contexto social, político e

educacional que antecedeu a fundação do Ginásio Brigadeiro Newton Braga. E para isso,

trouxe estudo sobre a expansão do Ensino Secundário que marcaram um período de grande

efervecência social, política e ideológica em nosso país, cujas diversas mudanças foram se

efetivando.

Maria Thétis Nunes (1999), Geraldo Bastos Silva (1969) e Jayme Abreu (1955), foram

os autores que busquei dialogar devido a pertinência de seus livros para que pudesse situar o

objeto de pesquisa dentro de um debate historiográfico que envolveu a educação brasileira.

Eles me trouxeram dados sobre acontecimentos ligados a expansão do Ensino Secundário em

nosso país, inclusive no Estado do Rio de Janeiro, onde a reação do povo frente ao novo

contexto econômico, político e social exigiu do poder público direitos, principalmente no que

tange à escolaridade para seus filhos, pois compreendem que se eles tivessem acesso às

escolas secundárias teriam um futuro melhor.

As questões de ordem social, política e ideológica estavam apresentando um novo

Brasil que clamava por melhores condições de vida para o povo, que acreditava ser a área

educacional responsável por essas mudanças que julgavam necessárias. O governo por sua

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vez, não arcava com suas obrigações de construir novas escolas que pudessem abrigar

estudantes que vinham do interior, buscando ter uma vida melhor nas cidades, aumentando

a demanda por um maior número de escolas.

Foi nesse contexto de lutas por expansão da escola secundária no Estado do Rio de

Janeiro, que foi inaugurado um novo ginásio na Ilha do Governador, que mesmo tendo

priorizado o atendimento inicial somente para filhos de militares e funcionários civis

vinculados ao Comando da Aeronáutica, significou um importante diferencial para inúmeros

estudantes que estavam em idade escolar para frequentar o curso ginasial nessa localidade.

Segundo dados da pesquisa, a ideia do Professor Murillo Wanderley, fundador do

Colégio, foi de criar um Ginásio para prestar assistência aos filhos de militares e funcionários

civis vinculados ao Comando da Aeronáutica, porém segundo depoimentos, desejava que

tanto o corpo discente quanto o corpo docente daquele Ginásio, fosse estruturado segundo o

modelo militar, com regras e posturas próprias. Ou seja, seria um Ginásio de cunho militar,

que estaria vinculado ao Comando da Aeronáutica.

É preciso deixar claro que o primeiro diretor do GBNB, era um militar da ativa,

pertencente aos quadros do Comando da Aeronáutica – o Capitão Murillo Wanderley – que

de acordo com depoimentos, organizava sua gestão, a partir do modelo disciplinar militar

que ele julgava adequado para àquela instituição.

Depois da gestão do Capitão Murillo Wanderley que durou treze anos, outros diretores

assumiram a direção do CBNB. Os militares com pouco tempo, entre um ou dois anos e as

direções civis perduraram por mais tempo, cerca de dez anos de diferença. Cada gestor junto

a sua equipe organizou o Colégio conforme as suas concepções. Mas, não se pode perder de

vista o quanto uma gestão de caráter militar e tão duradoura imprimiu práticas bastante

pautadas nas práticas militares e que até hoje algumas e, em determinadas situações, são

mantidas como, por exemplo, nas datas comemorativas, quando há presença de militares da

Aeoronáutica. Também, é necessário, mais uma vez destacar que nos períodos de gestão de

civis se reproduz alguns comportamentos e práticas também militares.

Chego ao final deste estudo com a certeza de que os caminhos percorridos no

desenvolvimento de uma pesquisa vão aos poucos se delineando e trazendo novos

questionamentos que anteriormente não haviam sido pensados e que vão estruturando

nossas análises. Minha intenção inicial era a de recompor a história de uma instituição

escolar utilizando documentos legais, mas aos poucos, essa ideia inicial foi se modificando

porque no decorrer do caminho, outras necessidades surgiram.

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Foi preciso trazer essa história, recompondo os seus sentidos, a partir das leituras e

interpretações dos sujeitos selecionados para fazerem parte do estudo, o que norteou a tarefa

de realizar algumas mudanças no meio do caminho. Inicialmente desejava trazer a história

dessa instituição com destaque para o currículo que foi praticado ao longo de cinquenta anos,

porém a partir do diálogo com os sujeitos da pesquisa, eles me apontaram a necessidade que

tinham de conhecer oficialmente o tipo de instituição da qual faziam parte.

E nesse contexto, apontar algumas características curriculares, desenvolvidas no

cotidiano do CBNB, estaria contribuindo para com essa busca da identidade que foi se

formando, principalmente no que tange a matriz curricular porque desejava saber se o CBNB

ministra ou não disciplinas militares. Verifiquei que essa não foi uma prática desenvolvida na

história do CBNB.

Comecei a formular outras questões que passavam por essa busca da identidade

histórica que foi se formando nessa instituição ao longo de sua existência. Passei a perseguir

desde o momento da fundação do Ginásio Brigadeiro Newton Braga essa identidade e, a

partir dos diferentes indícios mapeados, fui dando contornos para essa questão que se

apresentou imprescindível compreender neste estudo.

Durante as entrevistas, alguns sujeitos me interpelaram dizendo que para eles o CBNB

é uma escola pública comum, porque nele estudam mais alunos que não possuem vínculo

com o Comando da Aeronáutica do que alunos que são filhos de militares. Esse

questionamento foi esclarecido de forma bem simples pela Professora Dra Lia Faria de

História da Educação da UERJ/ Maracanã, quando me trouxe o seguinte argumento: “As

pessoas precisam entender que as escolas públicas estão inseridas em três esferas:

municipal, estadual e federal. Os colégios militares são escolas públicas que se situam na

esfera federal”. Ou seja, o Colégio Brigadeiro Newton Braga é uma escola pública de âmbito

federal, que está sob os cuidados do Comando da Aeronáutica.

Em meio a tantos conflitos e tensões, fiz uma consulta ao Conselho Nacional de

Educação e recebi a seguinte resposta: o Colégio Brigadeiro Newton Braga é um Colégio

Militar de Ensino Médio que não tem a especificidade de oferecer Ensino militar. Porém,

nossa pesquisa apontou que apesar desse parecer oferecido pelo Conselho Nacional de

Educação, as ações cotidianas que envolvem o dia a dia dessa instituição se afasta do citado

por essa Lei, causando tantos conflitos e tensões dentro do espaço escolar.

O estudo me levou a perceber que os sujeitos que atuam nesta instituição estão em

busca dessa identidade. E, se fazem parte dos sujeitos que são militares, se reportam à

disciplina dos Colégios militares do Exército. Se fazem parte dos sujeitos da carreira dos

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funcionários civis, se reportam à uma disciplina menos rígida e que não tem posturas

militares.

Diante de tantos conflitos, destaco também a importância que o gestor e os sujeitos que

atuam nessa instituição possuem nessa busca pela identidade, pois eles vão através de suas

práticas, apontando caminhos que vão identificando a mesma. Se a maioria desses sujeitos

que atuam nessa instituição são militares, vão dar maior importância àquelas práticas que

julgam fazer com que o estudante se insira nos contextos da disciplina militar. Se a maioria

desses sujeitos são civis, suas ações cotidianas vão se inserir em um contexto voltado para

uma instituição civil.

Finalmente, o que posso destacar é que as referências legais afirmam que o CBNB é um

Colégio militar. Entretanto, na prática, ele não é uma instituição de ensino especificamente

voltada para o ensino militar, porque não objetiva a formação de um militar, e não tem

incluso nas suas rotinas curriculares aquelas que são próprias dos demais colégios militares,

que caracterizam a disciplina militar e que buscam doutrinar os seus alunos segundo o perfil

das forças armadas. A designação de colégio militar, no caso específico do CBNB, se apoia

somente no fato dele ser um órgão da Aeronáutica, gerido e administrado pelo Comando da

Aeronáutica, com seus professores, tanto civis quanto militares, diretamente vinculados a ela.

Destaco que essa relação ainda não é muito clara para os sujeitos que atuam nessa

instituição escolar, tais como gestores e professores, tanto civis quanto militares. Estes

sujeitos foram o principal alvo desta pesquisa, haja vista que não foi possível expandi-la para

toda comunidade escolar. O que posso concluir é que os sujeitos que participaram desta

pesquisa, estão em busca dessa identidade.

O que minhas investigações me levam a afirmar, a partir da legislação consultada, e dos

depoimentos coletados, é que o CBNB é um colégio de cunho militar porque: (1) não se trata

de uma organização militar (OM); (2) as práticas que são desenvolvidas no seu cotidiano, não

se inserem em um contexto de ensino militar; (3) a maioria dos gestores foram professores

civis, dando ao colégio características de uma escola regular; (4) não percebi em nenhum

momento da pesquisa, que houvesse interesse do Comando da Aeronáutica em modificar as

práticas desenvolvidas no cotidiano dos estudantes do CBNB, com uma postura mais efetiva,

tendo instruções cívico-militar, que inserisse os estudantes em um contexto voltado para a

carreira das armas. Portanto, volto a afirmar que o CBNB é um colégio de cunho militar, onde

os sujeitos da pesquisa estão em busca de uma identidade.

Portanto, colocar um ponto final neste estudo se torna para mim, um dilema, pois como

colocar um ponto final em algo que considero ainda estar em processo? Essa impossibilidade

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decorre do fato de existirem diversas demandas expressas por pesquisadores que buscam

aproximar a educação da vida.

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