Conclusoes_SexoPrivilegiado_MartinVanCreveld

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Conclusões do livro “Sexo privilegiado” de Martin van Creveld

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Conclusões do livro“Sexo privilegiado”

de Martin van Creveld

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Livro editado no Brasil pela editora Ediouro, 2004. Tradução de “The privileged sex”; ISBN 85-01-01482-2

Nota do organizador:Este documento não é o livro na íntegra. Aqui apenas reúnem-se as partes

finais de cada capítulo, onde o autor os resume e conclui cada um baseado num vasto número de documentações pesquisadas e apresentadas no desenvolvimento. Portanto, algumas informações referentes às páginas anteriores poderão vir truncadas.

As notas bibliográficas foram suprimidas. Recomenda-se fortemente a aquisição ou empréstimo do livro para examinar todas as referências a documentações que o autor pesquisou.

O livro somente teve uma edição no Brasil, e os motivos me parecem óbvios. Entretanto, ele ainda pode ser raramente encontrado em lojas virtuais e em “sebos”.

Eu dedico este documento a todas as mulheres virtuosas e, principalmente, aos homens que, mesmo diante da atual pressão do “politicamente correto”, ainda conseguem manter com muito esforço de vontade a sua masculinidade que lhe é própria e natural ― assim como era a dos grandes homens do passado, e como deveria ser nos dos homens de hoje.

Este documento não deve ser publicado em páginas ou links para download na Internet. Deve ser repassado apenas à pessoas que tem sincero interesse a estudar o assunto e que não podem ter acesso ao livro original.

Data desta edição do documento: 12/07/2009.

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Conclusões do capítulo 1: Três mitos

Esses três mitos compõem apenas uma pequena seleção daqueles que serviram para "provar" a opressão histórica das mulheres pelos homens. No entanto, um exame detalhado mostrou que os três são falsos. As mulheres da Grécia antiga não viviam confinadas em casa ou em cômodos da casa; ao contrário, participavam livremente da vida na cidade, inclusive de vários encontros públicos. A febre das bruxas, entre 1500 e 1560, não foi simplesmente um mecanismo inventado pelo patriarcado para controlar e punir as mulheres que não se punham em seu lugar, mas um sistema de idéias que parecia real à população da época e no qual homens e mulheres acreditavam firmemente. Entre outras coisas, a caça às bruxas era deliberadamente usada por mulheres para atingir outras mulheres; e essa pode ser uma explicação para o fato de a maioria dos acusados de bruxaria ser do sexo feminino.

Finalmente, se os nazistas tivessem oprimido as mulheres, dificilmente teriam atraído o apoio entusiasmado das alemãs. Ao contrário, o programa nazista destinava-se principalmente a ajudar as mulheres a desempenhar aquela que elas e suas líderes havia muito consideravam sua principal tarefa, isto é, a maternidade; em termos absolutos e relativos, o programa atingiu seus propósitos. Como os próprios nazistas ressaltaram, a cooperação das mulheres era no mínimo tão importante quanto a dos homens na implementação das políticas raciais. Isso era verdadeiro também num sentido bem mais sinistro. Se não fossem as denúncias feitas por e contra homens e mulheres, esse terrível sistema não teria sido possível.

Esses três mitos compõem apenas uma pequena seleção daqueles utilizados pelas feministas para demonstrar como os homens discriminaram, oprimiram e subjugaram as mulheres. Na verdade, o oposto é verdadeiro.

Longe de serem o sexo oprimido, a natureza e a sociedade conspiraram de várias maneiras para facilitar a vida das mulheres. Longe de serem discriminadas, as mulheres ainda são dispensadas de muitas das dificuldades impostas aos homens. Isso vale desde o momento em que nascem até o momento em que morrem; para não falar da vida mais longa que desfrutam entre um acontecimento e outro. Para se convencer dessas verdades, tudo que o leitor tem de fazer é ler com atenção as páginas que se seguem.

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Conclusões do capítulo 2: A masculinidade e seus problemas

Desde 1970, mais ou menos, uma enorme quantidade de literatura procura mostrar que as mulheres são desprezadas, oprimidas e discriminadas pelos homens. No entanto, o oposto é que é verdade.

Seja por razões biológicas, psicológicas ou sociais, as mulheres são consideradas particularmente interessantes, não os homens; era assim por volta de 1300, quando um certo Alberto Magno escreveu Women's secrets [Os segredos das mulheres], e é assim hoje. Seja por razões psicológicas ou biológicas, em quase todas as áreas há muito mais obras escritas sobre as mulheres do que sobre os homens, ontem e hoje. Em quase todos os estágios da vida, homens e mulheres quase sempre dificultaram as coisas para os primeiros. Como a mesma diferença foi observada entre primatas, ela pode ter um fundamento genético. No entanto, em geral é planejada por pessoas de ambos os sexos. O objetivo é preparar os homens para as agruras da vida adulta, e o método, tornar a vida deles difícil antes mesmo de se tornarem adultos.

O fato de as mulheres se esforçarem menos também pode ter algo a ver com a psicologia do acasalamento. Para ter acesso a uma mulher, o homem tem de agir e/ou pagar. Quanto melhor o seu desempenho e quanto mais puder pagar, mais impressionará a mulher e sua família; era assim entre os aborígines australianos e ainda é assim nas mais avançadas sociedades ocidentais. Ao contrário, uma das melhores maneiras de uma mulher atrair um homem é mostrar-se solitária, indefesa e pobre. Isso é particularmente verdadeiro se ela for jovem, bonita e se suas dificuldades puderem ser imputadas a outro homem. Para cada homem que já oprimiu uma mulher, sempre houve outro pronto para libertá-la e ganhar seus favores, mesmo que fosse preciso arriscar a vida. Caso não houvesse nenhum risco às vezes era necessário inventá-lo, como provam os torneios medievais cujo único propósito era resgatar alguma "donzela aflita".

Diante disso, quando se esforça, se vira e conquista a independência, a mulher trilha um caminho que não a leva a um parceiro; pior ainda, essa atitude pode ser contraproducente. Alguns estudos demonstram que as universitárias acham que os homens não gostam de mulheres inteligentes e elas podem ter razão; como já dissemos, para a mulher é melhor ser bonita do que inteligente porque os homens usam mais os olhos do que o cérebro. Hoje, como no século XIX, quanto mais bem-educada for uma :mulher e quanto mais bem-sucedida for sua carreira, menos probabilidade ela tem de se casar e/ou ter filhos.

Na maior parte do tempo, as meninas estudavam separadamente dos homens, situação justificada pela necessidade de preservar a decência, segundo diziam. E havia razão para isso. Depois que a co-educação virou norma, os meninos correm o risco de ser acusados de abuso sexual a partir dos cinco anos; é como se os professores, em sua maior parte do sexo feminino, quisessem puni-los por serem homens. Quando eram educadas longe dos meninos, as meninas quase sempre tinham uma vida escolar mais fácil. Depois, ou elas continuaram a ter mais facilidades ou sua presença "humanizadora" e "enternecedora" facilitou a vida de todo mundo. Os garotos que se comportavam mal, ou porque eram maltratados ou por causa da ausência de desafios, eram punidos - hoje são drogados. Tudo isso vale para épocas e lugares diferentes: o Ocidente e a China imperial no início do século XX; quando a maioria das pessoas freqüentava apenas algumas aulas do ensino fundamental ou quando 40% de uma determinada faixa etária entra em algum tipo de academia ou faculdade; quando a maioria dos jovens começava a trabalhar ainda na adolescência e quando "meninos" de 30 anos de idade ainda prestam exames

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e "meninas" da mesma idade ainda não deram à luz. Enquanto não têm grandes responsabilidades, as mulheres podem ter um desempenho

melhor que o dos homens. Já no século XIX, na Grã-Bretanha, o fato de as meninas tirarem notas mais altas do que os meninos causava comentários; hoje em dia, as escolares norte-americanas também se saem melhor que os colegas do sexo masculino. No entanto, chega o momento em que quase todas as mulheres querem engravidar, ter filhos e cuidar deles; e em que quase todos os homens, temerosos de não encontrar uma parceira ou de perder a que já têm, assumem o fardo extra resultante da decisão das mulheres. Enquanto os dois sexos se preparam para esse momento, as diferenças de educação - também conhecidas como "capital humano" - se fazem sentir. Por bem ou por mal, a maioria das mulheres abandona a corrida de ratos e/ou entra em um dos vários guetos femininos, nos quais se sente em casa e enfrenta menos competição. Por bem ou por mal, a maioria dos homens ou se mata de trabalhar em qualquer emprego ou continua a estudar para competir pelos cargos mais altos, de maior responsabilidade, mais difíceis e mais bem remunerados que a sociedade oferece. A maioria das mulheres passa a ser sustentada e protegida pelos homens; e os homens passam a sustentar e proteger as mulheres.

Finalmente, como os recursos são escassos, ao serem instados a sustentar as mulheres, os homens têm de competir. Além de todos os sofrimentos que envolve, a competição impede os homens de se abrir com as pessoas. As responsabilidades pesadas que assumem e o tratamento severo que recebem não devem ser mencionados; quanto maior o sucesso, mais vale a regra. Espera-se que o homem "suporte tudo", a despeito do que "tudo" possa significar. Se confessar suas dificuldades, será desprezado por seus pares e evitado pelas mulheres. Tudo isso explica por que os homens "choram muito menos que as mulheres"; e por que os homens casados são os que menos procuram ajuda psicológica. Afinal, eles têm responsabilidades. Se falharem, as esposas podem ser as primeiras a abandoná-Ios. Explica também por que as tentativas de criar movimentos pelos direitos dos homens não deram muito certo. Juntando-se a esses movimentos, os homens se castram, por assim dizer. Além disso, nada que se faça na companhia de estranhos compensa a ausência de comunicação.

Como acontece em alguns contos de fadas, o melhor que um homem pode esperar é encontrar um estranho numa hospedaria, pagar-lhe uma taça de vinho, despejar suas aflições e ser presenteado com algum conselho sagaz. Numa das versões da história, ele se vê reduzido a conversar com um peixe. Alguns leitores poderão achar que este capítulo, com sua ênfase na dificuldade de se tornar homem, é piegas e autocomiserativo. Nesse caso, meu argumento estará provado.

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Conclusões do capítulo 3: Homens, mulheres e trabalho

Este capítulo mostrou que, no que diz respeito ao trabalho, as mulheres sempre desfrutaram mais privilégios que os homens. Em grande medida, a raiz dessa diferença de tratamento está nas características biológicas de ambos os sexos, que sempre limitaram o tipo de trabalho que as mulheres eram capazes de executar. Certamente, elas impediam que as mulheres com filhos, e em menor grau também as que não tinham filhos, se afastassem de casa; mesmo durante a Segunda Guerra Mundial, das 106 mil mulheres empregadas nas empresas ferroviárias norte-americanas, apenas 25 - menos de um quarto - trabalhavam nas ferrovias propriamente ditas. Se, como dizem, "é muito mais fácil na prática deixar um emprego remunerado e ocupar uma função doméstica do que o contrário", é porque, talvez, o trabalho dos homens seja mais árduo.

Os privilégios das mulheres não eram nem uniformes nem uniformemente distribuídos. Toda vez que uma revolução tecnológica e econômica acontecia, como a transição da agricultura para a indústria ou da indústria para os serviços, o trabalho de homens e mulheres era profundamente afetado. Num momento as mulheres trabalhavam nos campos; no momento seguinte, nas fábricas. Num momento trabalhavam em casa; no momento seguinte, em escritórios ou vendas. Na maior parte do tempo, prevaleceu uma divisão clara do trabalho, na qual as mulheres se concentravam em um leque relativamente pequeno de ocupações, e os homens tomavam conta do restante. De vez em quando uma emergência, como um período de grande atividade agrícola ou uma guerra, obrigava as mulheres a realizar as tarefas dos homens. No entanto, apenas temporariamente; ao longo do tempo a divisão tradicional era restabelecida. Ao definir o que era adequado para os homens e para as mulheres, considerações culturais e ideológicas também desempenhavam um papel; com muita freqüência levavam as pessoas a sentir pena das mulheres por elas terem de fazer o que os homens faziam costumeiramente.

Enquanto o trabalho era considerado um fardo, as mulheres, como os homens, faziam o possível para evitá-lo. Mas, ao contrário dos homens, elas contavam com a ajuda dos parentes do sexo masculino e dos costumes sociais dominantes. Às vezes o trabalho dos homens de gerações anteriores tornou-se o hobby das mulheres, como montar a cavalo, fazer cerâmica etc.; nesse sentido também as mulheres representam a classe que vive de renda. A religião e o direito proporcionaram proteção adicional, ao menos em tese. Assim, em 1931 o papa Pio XI declarou que era "intolerável que as mulheres tenham de se engajar em ocupações remuneradas fora do lar por causa do baixo salário do pai; tal abuso deve ser abolido a qualquer custo". Talvez seguindo esse exemplo, a constituição irlandesa de 1937 decretou, no artigo 41.2.2, que "as mães não devem ser obrigadas pela necessidade financeira [grifo meu] a trabalhar".

Os pensadores socialistas e as feministas declararam que o trabalho é um direito e um privilégio, mas a situação permanece fundamentalmente a mesma. Compreensivelmente, a maioria das mulheres compelidas a trabalhar por circunstâncias econômicas continua a encarar o trabalho como um fardo. Como as estatísticas mostram, elas costumam aproveitar a primeira oportunidade para fugir dele; incidentalmente, essa é uma das razões pela qual o feminismo não fez muito sucesso entre as operárias. Quanto às mulheres que trabalham sem precisar, em sua maioria elas também mantiveram os privilégios. A saber, desempenhar tarefas leves e em menor quantidade; o direito de abandonar o emprego quando bem emendem; o direito de se aposentar mais cedo; e, como cereja do bolo, o direito de afirmar hipocritamente que, ao

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contrário dos homens, o que lhes interessa no trabalho não é o dinheiro, mas as "oportunidades de crescimento pessoal". Hoje e sempre, quanto mais alta a classe a que elas pertencem - em grande parte graças ao trabalho de algum homem - mais isso é verdade. Até mesmo na China a flexibilização do comunismo vem produzindo uma classe de mulheres desocupadas; além de não serem censuradas, aquela que consegue tornar-se concubina de um homem rico é freqüentemente considerada um exemplo de liberdade e independência. Onde quer que seja, as mulheres que fazem essa opção podem acabar com tempo livre e o controle da bolsa. Entre todos os descendentes de Adão, talvez elas sejam as únicas a quem o castigo não se aplica.

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Conclusões do capítulo 4: Dos dotes ao seguro social

A quantidade e a variedade de mecanismos que a sociedade inventou para garantir que as mulheres fossem sustentadas pelos homens são estarrecedoras. Muitos são informais, mas muitos estão escritos nas legislação. Seja como for, com freqüência eles tiveram como conseqüência sanções que variaram da censura dos vizinhos à prisão. Hoje e sempre, a única maneira de escapar é desistir de tudo e emigrar para outro país; mas mesmo essa tentativa pode ser ou proibida ou não funcionar.

Na maior parte do tempo, era uma questão de cada homem ser obrigado a cuidar dos familiares do sexo feminino, em geral a esposa ou as esposas. Muitas vezes as mulheres se casavam especificamente para que alguém provesse sua subsistência; o acordo pré-nupcial que não obriga o marido a sustentar a mulher ainda não foi inventado, assim como a mulher que o aceitaria ainda não foi descoberta. Aqui e ali as mulheres que não encontraram um homem para sustentá-Ias tomaram um caminho diferente. Nos Estados Unidos, nos séculos XIX e XX, às vezes elas tinham a opção de se juntar a alguma comunidade utopista; em troca tinham de se entregar a todos os integrantes do sexo masculino. Por último, mas não menos importante, mesmo depois do divórcio elas recebiam algum tipo de apoio financeiro, ou esperavam receber. Essa era a situação em algumas das mais antigas culturas conhecidas. E ainda é assim em muitas sociedades.

Na maioria das épocas e dos lugares, as mulheres que por alguma razão não tinham um parente do sexo masculino para cuidar delas dependiam da caridade. Como os homens, elas podiam ter de trabalhar antes de se tornarem elegíveis à caridade, ou então tinham de provar que eram incapazes de trabalhar. Ainda assim, no geral a vida delas era

mais fácil do que a dos homens. Isso era verdade especialmente se elas tivessem filhos e se evitassem a promiscuidade. Às vezes as mulheres conseguiam viver de caridade mesmo que estivessem aptas para o trabalho, mesmo que fossem promíscuas e mesmo que não tivessem filhos; um feito que os homens só conseguiam emular, na melhor das hipóteses, se tivessem uma mulher para sustentar.

Com o surgimento dos modernos sistemas de bem-estar social, o estado assumiu várias formas de sustento que antes eram de responsabilidade dos maridos, dos familiares do sexo masculino ou das instituições de caridade. Como sempre, era mais fácil para as mulheres obter benefícios se elas não tivessem um homem e se tivessem filhos. Vários programas eram deliberadamente projetados para beneficiar (quase) exclusivamente as mulheres; era assim na Grã-Bretanha, nos Estados Unidos e no Canadá. Já o papel dos homens era pagar. Era assim nas cidades européias da Idade Média e do início da Idade Moderna, onde correspondiam a algo entre 9% e 28% dos contribuintes do imposto de renda; ainda é assim na maioria dos estados de bem-estar social.

Os homens continuam a desempenhar o papel de caixa automático vivo, mas as condições em que eles são obrigados a pagar pioraram. Enquanto a família era o principal mecanismo de ajuda às mulheres, os homens davam as cartas e as beneficiadas eram parentes. Depois, com a introdução da caridade, de qualquer maneira eles podiam escolher se pagariam e quem deveria receber ajuda. Muito embora, no dia-a-dia, eles delegassem essa tarefa às mulheres de sua própria classe, que podiam então conquistar a reputação de ser caridosas à custa dos homens. Finalmente, o advento do estado de bem-estar social fez com que qualquer pretensão ao voluntariado desaparecesse. O erário assumiu, recolhendo o dinheiro necessário com impostos ou "contribuições" ao seguro social. O resultado é que muitos dos beneficiários eram mulheres das quais os homens nada sabiam, e provavelmente não queriam saber; quanto menos elas

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evitarem uma gravidez, mais benefícios terão. À primeira vista, um marido, uma instituição de caridade, um moderno sistema de bem-

estar social e - em alguns casos - uma comunidade utopista são totalmente diferentes. De fato, eles operam de modos distintos, mas o princípio é o mesmo. Todos são parcialmente, alguns diriam primariamente, projetados para transferir recursos dos homens, considerados mais capazes de ganhar a vida, para as mulheres, tidas como menos capazes. Todos tendem a estabelecer condições para a ajuda que oferecem, exigindo que as mulheres tenham determinadas atitudes e evitem outras. Historicamente, o preço que as mulheres tinham de pagar era evitar a promiscuidade e cuidar dos filhos adequadamente. Sob o estado de bem-estar social, nem isso elas têm de fazer.

Como até mesmo as menininhas que ainda brincam de boneca rapidamente entendem quem consome e quem paga, não é de admirar que "hoje em dia muitas norte-americanas não entendam a posição feminista". Ao contrário do que pretendem alguns, essas mulheres não são nem fracas nem tolas. Aquelas que estão bem de vida têm conhecimento, e se ressentem, do fato de que o imposto pago por elas e os respectivos maridos é usado principalmente em benefício de outras mulheres; aquelas que estão na outra ponta do assistencialismo sabem quem paga a conta. Ambos os grupos entendem que o arranjo pelo qual alguém cuida de suas finanças em troca de elas desempenharem o "papel de dona de casa e mãe" é freqüentemente "injusto" . Isto é, injusto do ponto de vista dos homens.

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Conclusões do capítulo 5: Enfrentando a lei

A discussão deste capítulo não esgota as vantagens legais que as mulheres têm em relação aos homens. Algumas são relativamente menores, como quando as mulheres costumavam ser dispensadas do dever de servir no júri quase que automaticamente, ou quando uma lei de Oklahoma proibiu a venda de cerveja para mulheres menores de dezoito anos e homens menores de 21 anos. Segundo essa lei, um jovem que convidava uma garota para sair podia oferecer-lhe uma bebida enquanto ele próprio não podia beber. O paradoxo é que as mulheres, devido a sua menor massa corporal e possivelmente também a outros fatores, são mais suscetíveis ao álcool. Se a lei tivesse sido concebida para ajudar um rapaz a embebedar a garota com quem saiu e assim seduzi-Ia, não poderia ser melhor; mas uma vez que ela fosse seduzida, poderia depois levá-lo ao tribunal por ter se aproveitado dela. Apesar de todos os bizarros efeitos dessa lei, o preceito legal que favorece os homens em relação às mulheres está enraizado de forma tão firme que a Suprema Corte teve dificuldades para derrubá-Ia. No fim, conseguiu, mas só após instituir um "meio termo" da racionalidade inteiramente novo, entre a "racionalidade mínima" e o "escrutínio rigoroso".

Na maioria dos negócios, e a menos que se prove que ocorreu fraude, um contrato assinado tem de ser honrado e, se for necessário, pode-se recorrer à justiça e à polícia para que ele seja cumprido. Não se o negócio em questão for o das mães de aluguel e a pessoa que assina o contrato for uma mulher. Para citar uma especialista no assunto, "atualmente, a mãe contratada pode romper o contrato ao menos de quatro modos. Ela pode (1) se recusar, no fim, a ser inseminada; (2) tanto abortar quanto deixar de abortar o feto contra a vontade do casal que a contratou; (3) prejudicar por negligência o feto durante a gravidez; e/ou (4) recusar a dar a criança depois de ela ter nascido". A disposição para permitir que mulheres reneguem seus compromissos é igualmente evidente nos casos de guarda dos filhos. Assim, o homem que assinou um termo público de renúncia num cartório, abrindo mão da guarda, pode dizer adeus a seu(s) filho(s). Já a mulher não, pois um documento similar pode ser desconsiderado.

Às vezes, a impressão que se tem é de que a própria "discriminação” só existe na medida em que é contra as mulheres. Veja-se o caso de Joe Hogan que, em 1982, quis ser admitido no programa de enfermagem da Universidade do Mississípi e foi rejeitado. A Suprema Corte finalmente decidiu a seu favor, mas não porque a universidade estivesse discriminando os homens; ao contrário, porque por admitir apenas mulheres ela havia dado "credibilidade à velha crença de que só mulheres, e não homens podem ser enfermeiras, e [tornou] a pressuposição de que a enfermagem é um campo para mulheres uma profecia que se cumpre por si mesma". Em outras palavras, a razão pela qual a corte concedeu o que Hogan requeriu foi porque, de uma maneira diferente, a proibição também discriminava as mulheres; desnecessário comentar.

A seguir, a lei de imigração. Interpretando a antiga lei bíblica, meu país permite às mães judias que queiram imigrar trazer seus filhos com elas em quaisquer circunstâncias. Já os pais judeus não. Eles só podem fazê-lo se provarem que a mãe das crianças é também judia. Não só essa prática é discriminatória, como ainda abre todos os tipos de possibilidades interessantes do ponto de vista da mãe. Por exemplo, uma mulher judia que vive na Diáspora e se divorcia de seu marido não-judeu fica em condições de praticamente poder impedir o contato entre o homem e os filhos se ela mudar para Israel, para onde ele só poderá ir como turista. Casos assim de forma algum são imaginários; de tempos em tempos, chegam às manchetes.

Antes que se ache que esse é um caso isolado, é só lembrar que nenhum outro país atraiu

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mais imigrantes no século XX que os Estados Unidos. Ora, a lei americana permite às mães trazer os filhos nascidos fora do matrimônio; no entanto, o mesmo privilégio não é estendido aos pais. O que torna a questão significativa é o fato de que, em particular em muitos países em desenvolvimento, casamentos formais contraídos sob os auspícios do estado são a exceção em vez da regra. Como resultado, um homem vindo de uma sociedade assim corre o risco de não ter sua paternidade reconhecida pelo Serviço de Imigração. Isso acontece mesmo quando seus filhos sempre viverem com ele e mesmo se ele é o único provedor deles; o que aconteceria se uma mãe fosse tratada da mesma maneira é um desafio à imaginação. A lei britânica parece com a norte-americana nesse aspecto, concedendo às mulheres muitos privilégios que não são estendidos aos homens. Por exemplo, pelo Commonwealth Immigrants Act [Lei de Imigração] de 1962, uma mulher casada com um homem que foi isento de ser deportado é também isenta. Um homem, no entanto, não desfruta esse privilégio. Se sua mulher for isenta, ele ainda assim será deportado.

Tanto nos Estados Unidos quanto na Grã-Bretanha, a lei de imigração reflete a noção muito disseminada mas inteiramente insubstanciada de que as mães têm uma ligação mais forte com os filhos do que os pais. Em ambos os países, ela reflete também a noção de que os homens, ao trabalharem e retirarem empregos da população nativa, ameaçam a economia, enquanto as mulheres não. Como resultado, criou-se uma curiosa situação. Uma mulher que quiser se juntar a seu marido que já está na GrãBretanha pode fazê-lo sem problemas. Um homem que quiser se juntar a sua mulher será submetido a um interrogatório abrangente e, se der qualquer sinal de que deseja conseguir um emprego (possivelmente para tirar a mulher e os filhos do sustento pelo estado!) será mandado de volta a seu país de origem. Em outras palavras, uma mulher é admitida mesmo sendo economicamente inútil e querendo viver à custa dos contribuintes; um homem é recusado se quiser se tornar economicamente útil achando um emprego e pagando impostos. Nenhuma surpresa que, entre 1973 e 1983, três vezes mais mulheres imigrantes do que homens foram admitidas na Grã-Bretanha; mesmo depois de 1994, quando a lei foi reescrita, com termos neutros quanto ao gênero, as mulheres ainda continuaram a desfrutar alguns privilégios.

De fato, tão intenso é o preconceito social em favor das mulheres que afeta até a legislação cujo objetivo é estabelecer a "igualdade" entre os sexos. Por exemplo, quando o senado norte-americano aprovou a Equal Rights Ammendment [Emenda sobre Direitos Iguais], acrescentou um parágrafo conhecido como a "cláusula Hayden" (em função de quem a propôs, Carl Hayden). A cláusula determinava que a ERA "não será constituída de modo a prejudicar quaisquer direitos, benefícios ou isenções ora ou adiante concedidos pela lei às pessoas do sexo feminino"; em outras palavras, que não negaria os privilégios que as mulheres já desfrutavam. Uma lógica similar prevalece na Índia, um país que responde por um sexto da população mundial. Interpretando a constituição, o ministro da Justiça, Chagla, manteve que um estado tinha permissão de discriminar em favor das mulheres e contra os homens. No entanto, não podia discriminar em favor dos homens e contra as mulheres.

No início do século XXI, em muitos países, e de qualquer maneira que se analise a situação, os privilégios legais das mulheres são ao menos tão abrangentes quanto sempre foram. Como certas autoras nunca cansam de nos dizer, nas sociedades patriarcais são os homens que fazem as leis. Como todas as sociedades conhecidas têm sido patriarcais, só se pode concluir que as mulheres deviam agradecer aos homens por seus privilégios. Essa interpretação ganha peso se se considera o fato de que, quanto mais feminina a maneira que a mulher se comporta ao ser presa ou ir a julgamento, mais leniente será o tratamento dado a ela. No tribunal, sua melhor tática é usar uma saia - não, todavia, uma minissaia e uma blusa que, ao mesmo tempo

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que mostre claramente que ela é uma mulher, evite qualquer sinal de decote. O próximo passo, praticamente obrigatório, é explodir em lágrimas no momento adequado, como tanto Lorena Bobbit quanto a dama do forno de microondas fizeram. Comparado ao jeito como tratam as mulheres, os homens só têm a si mesmos para agradecer pelo jeito como tratam uns aos outros. Sempre foi assim e, podemos confiantemente prever, sempre será.

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Conclusões do capítulo 6: No bucho de Marte

A acreditar em certos cientistas, a relutância masculina em agredir as mulheres tem raízes biológicas. Mesmo se não se acreditar nesses cientistas, não há dúvida de que a proibição de bater em meninas - jovens mulheres - é instilada em meninos - jovens homens - desde quando ainda estão engatinhando. Enquanto são pequenos, suas pífias tentativas de bater em meninas maiores que eles são vistas com divertida tolerância. Então, assim que ficam tão fortes quanto, ou mais fortes do que as meninas, a proibição torna-se efetiva. Dali em diante, a única mulher em que um homem pode tocar é a sua esposa, e mesmo nesse caso vimos como, em todas as épocas e lugares, a sociedade tentou limitar o que ele podia fazer com ela.

O que se aplica a confrontos um a um se aplica igualmente ao uso coletivo da violência conhecido como guerra. Com certeza, tanto para as mulheres quanto para os homens a guerra é, a maior parte do tempo, um inferno. Ainda assim, as mulheres, diferentemente dos homens, não são forçadas a servir nela; na medida em que o objetivo da guerra é preservar a vida da comunidade, fazê-lo seria absurdo e contraproducente. Seja acompanhando exércitos em campanha, ou como soldados ou combatentes, as mulheres quando servem sempre o fazem como voluntárias. Tendo se alistado como voluntárias, continuam a desfrutar muitos privilégios. Em tempo de paz, esses privilégios podem ir de alojamentos melhores a serviços mais confortáveis, e de pagamento extra a uma disciplina mais relaxada. Em tempo de guerra, nenhum país jamais obrigou mulheres a participar dos combates, ou está em vias de obrigar. Em toda a história só um exército - o russo na Primeira Guerra Mundial - tentou formar uma força de mulheres com a intenção de fazê-las combater. Sem conseguir suportar a disciplina a que a comandante (mulher) as submeteu, mais de cinco em cada seis desertou antes mesmo de chegar ao front; tampouco se tentou de alguma forma impedi-las de fazê-lo.

Outra diferença entre os voluntários homens e mulheres é que dos primeiros se requer que se alistem de uma vez por todas, e se tentarem se esquivar do compromisso, serão severamente punidos. Isso não ocorre com as mulheres, que na prática, embora não na teoria, podem retirar seu consentimento a qualquer momento que escolherem. Se encontrarem qualquer dificuldade em fazê-lo, podem obter o mesmo resultado ficando grávidas; estando ou não grávidas, com muita freqüência as mulheres são dispensadas e mandadas para casa em vez de serem punidas. Em toda a vida social, militar ou civil, é impossível encontrar um privilégio maior.

Seja por não serem consideradas membros da comunidade política, como em tribos ou nas antigas cidades-estado; ou por serem consideradas "inocentes", como na Idade Média; ou por serem classificadas como "civis", na Europa de 1700 em diante; as mulheres, em troca de não participarem da guerra ficam, até certo ponto, imunes a seus horrores. Na guerras tribais, como nos impérios antigos, essa imunidade consistia "apenas" no direito de não serem mortas. No entanto, com freqüência incluíam mais coisas. Em casos em que homens são aprisionados em vez de executados, as mulheres podem ser libertadas. Historicamente, é raro as mulheres serem reféns para garantir o bom comportamento de seus parentes. Quando são tomadas como reféns, como por exemplo em assaltos a banco, seqüestros de aviões, e similares, elas invariavelmente são libertadas antes dos homens. Não raro, homens são voluntários para se tornar reféns para que as mulheres possam ser libertadas. Um homem cuja libertação viesse através de uma mulher que tomasse seu lugar seria tratado com desprezo, e com razão; o que explica que ele só exista na mitologia grega.

Às vezes, e até certo ponto, as mulheres ficam imunes aos horrores da guerra mesmo quando participam dela. Se ocorrer da imunidade de uma mulher ser acidentalmente violada, como acontecia com algumas das travestidas e também àquelas que têm a má sorte de ser

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consideradas "efeito colateral", esse fato provavelmente será lamentado, chorado e justificado. Se ocorrer de sua imunidade ser deliberadamente violada, esse fato, é provável, levará os perpetradores a serem desprezados, postos em ostracismo ou punidos. Estando essas diferenças incorporadas na lei formal ou apenas validadas pelo costume, o resultado final é que as mulheres tendem a emergir da guerra em todas as suas formas muito melhor do que os homens; ao ponto de, quanto mais freqüente e ferozes as guerras, mais provável que o equilíbrio demográfico penda em favor delas. Isso vale tanto para as tribos de índios norte-americanos quanto para o sulista depois da guerra civil; tanto para a União Soviética depois da Segunda Guerra Mundial quanto para o Camboja em seguida aos inacreditáveis eventos que ocorreram em seus "campos de extermínio" durante a década de 1970. Seja como for que se os considere, os privilégios das mulheres em relação à guerra são ao mesmo tempo numerosos e indiscutíveis. Assim sempre foi, e assim, esperemos, sempre será.

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Conclusões do capítulo 7: A qualidade de vida

Se a interpretação oferecida nestas páginas está correta, a diferença mais básica entre homens e mulheres é que elas são menos resistentes à vida dura do que os homens. Em parte por um desejo de aventura, em parte porque não tinham alternativa, os homens sempre partiram para os lugares mais adversos, não raro pondo em risco a própria vida e freqüentemente para nunca voltar. Em parte porque são mais sensatas, mas em grande medida porque tiveram uma alternativa, poucas mulheres foram se juntar a eles, e então só quando as condições já haviam melhorado consideravelmente. Até os dias de hoje, quanto mais duras e menos confortáveis as condições de um dado lugar, menos serão as mulheres.

O fato de que o corpo dos homens é mais adequado para o trabalho pesado ao ar livre já era óbvio para os gregos antigos. De fato, deve ter sido do conhecimento de qualquer sociedade que alguma vez existiu; caso contrário, essa sociedade não teria sobrevivido. Isso explica por quê, como seria de se esperar e tanto quanto se saiba, a revolução demográfica se espalhou do topo para baixo. A primeira classe a sentir seus efeitos foi a nobreza, e os primeiros lugares em que ocorreu foram as cidades e os conventos. As três tinham em comum o fato de terem praticamente eliminado o dever de a mulher se envolver com o trabalho na agricultura. Ao impedir que as mulheres ficassem grávidas e dessem à luz, os conventos também eliminaram outra das principais fontes dos problemas de saúde e da mortalidade sobre o qual as pessoas na época não tinham controle. Problemas que, em relação à população em geral, só ficaram sob controle perto do fim do século XIX.

O processo pelo qual as mulheres começaram a viver mais do que os homens é só raramente mencionado nos livros de história. Talvez porque a longevidade feminina é tida como certa. Sabendo que as mulheres se saem melhor do que os homens em todos os países, menos um punhado deles, as pessoas assumem que sempre foi assim; e têm fornecido as mais absurdas explicações para isso. Nada, no entanto, está mais longe da verdade. Em particular, durante o século XIX - que por caso é também o primeiro período para o qual estatísticas nacionais se tornaram disponíveis -, o fenômeno deu margem a muitos comentários. Especialistas trabalhando para o governo e a iniciativa privada argumentaram que a civilização e seus confortos beneficiaram mais as mulheres do que os homens.

Os fatores que produziram a revolução demográfica - primeiro nos países desenvolvidos, depois nos em desenvolvimento - foram a melhora nos padrões de vida, por um lado, e um tratamento médico melhor, por outro. Embora tenha havido muita controvérsia sobre que fatores constituintes do padrão de vida contribuíram mais, no presente contexto cabe entendê-los num sentido mais amplo. O mais importante foi a transição do campo para cidade. Outros foram as melhoras na alimentação, habitação, instalações higiênicas e por assim por diante. Não é preciso dizer que tudo isso beneficiou também os homens, além das mulheres. No entanto, o organismo feminino é menos resistente ao tipo de infecção que resulta do contato com a sujeira. Sendo assim, no geral, o avanço da civilização beneficiou as mulheres antes, e mais, do que os homens; quanto mais alta a classe a qual pertenciam, mais isso é verdadeiro.

Por ter praticamente eliminado certas doenças, e controlado outras, a medicina beneficiou tanto os homens quanto as mulheres. Mas nesse campo também pode ser argumentado que houve mais benefícios para as mulheres do que para os homens. Os avanços médicos mais importantes que, em termos relativos, favoreceram mais as mulheres do que os homens foram os anticoncepcionais e a assistência perinatal. Entre si, esses dois fizeram cair o tipo de mortalidade feminina associada à gestação para uma fração tão pequena do que era que mal

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pode ser expressa em pontos percentuais provavelmente nenhum outro fator fez mais para mudar o equilíbrio entre homens e mulheres.

Enquanto as mulheres ficaram com uma fatia desproporcional dos benefícios, os homens fizeram uma parte desproporcional do trabalho. Primeiro foi a transição do campo para a cidade, que deixou os homens fazendo a maior parte do trabalho manual ao ar livre, em condições difíceis, e em lugares tão adversos que só loucos quereriam morar. Então, veio a Revolução Industrial que fez com que mais homens do que mulheres ficassem expostos a doenças ocupacionais e acidentes de trabalho. Dessa forma, embora tanto os homens quanto as mulheres tenham se beneficiado, a melhora na qualidade de vida das mulheres foi carregada nos ombros dos homens; sem mencionar o fato de que hoje, como sempre, mais de 90% das descobertas e invenções que impulsionam o processo continuam a ser feitas por homens.

Para realmente se entender a desigualdade do fardo, vamos supor que os homens atendessem às feministas, fornecendo às mulheres bancos de esperma projetados de tal forma a produzirem apenas meninas, e então morressem en masse. Numa situação assim, dado que a mulher média sempre dependeu do trabalho dos homens, a civilização como a conhecemos com certeza entraria em colapso. A mineração, a extração de petróleo, a indústria pesada e a química, o transporte de longa distância, a maioria das formas de construção e muitos tipos de agricultura (incluindo reflorestamento, pescaria em águas profundas, e talvez a criação de animais domésticos grandes) praticamente cessariam. Sob tais condições, mais de 90% da população atual do mundo morreriam de fome. As cidades ficariam desertas. Muito da cultura, que é um produto das cidades, também entraria em colapso. As mulheres sobreviventes provavelmente voltariam a uma vida primitiva baseada na horticultura. Habitariam em cabanas e sofreriam de uma permanente escassez de proteína animal. A julgar pelos precedentes históricos e pré-históricos, sua expectativa de vida seria reduzida em cerca de quarenta anos.

Pior ainda para os homens é que, com freqüência, em vez de agradecimentos o que eles recebem são reclamações. Mulheres cujos futuros maridos são forçados a trabalhar feito escravos, para aumentar a riqueza exigida deles para o casamento, reclamam, ou no mínimo têm reclamações feitas em seu nome, de que os homens recebem "um pontapé inicial para a vida". Mulheres cujos maridos trabalham tanto que mal têm tempo para passar com a família reclamam. Mulheres cujos maridos ficam em casa o dia inteiro também reclamam. Mulheres cujas vidas são sustentadas por AFDC reclamam que uma burocracia inventada e dirigida pelos homens está invadindo suas vidas, e mulheres cujas vidas foram salvas por cesarianas reclamam que médicos machos chauvinistas imperialistas estão invadindo seu úteros. Algumas mulheres reclamam de serem os homens e não elas que servem como cobaias no teste de remédios novos. De uma ou duas sabe-se que reclamaram até de não ter de pagar impostos; com certeza, a única vez em toda a história que se fez tal reclamação.

Dado os incontáveis privilégios que desfrutam as mulheres, essa situação dá margem a questão se não há algo em sua natureza e/ou situação social que as predispõe a reclamar; e também, se o feminismo moderno não é apenas mais uma dessas reclamações.

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Conclusões do capítulo 8: O sexo que reclama

Enquanto tudo no presente livro indica que as mulheres são de fato o sexo privilegiado, tudo no presente capítulo indica que as mulheres são o sexo que reclama. Parafraseando Nietzche em Assim falou Zaratustra, em relação às feministas em particular tudo é reclamação, e essa reclamação tem apenas uma causa: o fato de que as mulheres, ao reclamarem, têm uma chance muito maior de conseguirem o que querem do que os homens.

Assim compreendida, a tendência maior das mulheres de reclamar de problemas reais ou imaginários é uma conseqüência direta de sua relativa fragilidade física e/ou menor competitividade. Aquele que, em média, Deus ou a natureza ou os hormônios fizeram competitivo e forte vai atrás de conseguir tudo o que pode. Aquela que, em média, os hormônios ou a natureza ou Deus fizeram menos competitiva e forte se sai melhor implorando, bajulando, manipulando ou reclamando. Se tudo o mais falhar ela ainda pode chorar. Para a maioria das mulheres, na maioria das situações, a experiência mostra que essa tática funciona; se nada mais funcionar, quanto mais prontamente ela conseguir espremer água de seus olhos, melhor.

Essa linha de raciocínio também explica por que tantas mulheres bem-sucedidas não sentem nada mais do que desprezo por suas colegas mais fracas. Por exemplo, a rainha Artemísia da Cária - a primeira comandante mulher conhecida, e muito bem-sucedida - disse a seu senhor, o imperador Xerxes da Pérsia, que os gregos eram superiores aos persas como os homens eram às mulheres. A rainha Elisabete I da Inglaterra fazia piadas sobre as mulheres. Mary Wollstonecraft chamava as autoras mulheres de "ovelhas tímidas". A primeira-ministra Golda Meir chamava as feministas de "loucas"e "doidas". A primeira-ministra lndira Ghandi traiu a causa dizendo que não se via como uma mulher. A primeiraministra Margaret Thatcher não queria ter nada a ver com feministas. A cientista ganhadora do prêmio Nobel, Christiane Nusselein-Volhard, dizia que muitas de suas colegas davam má fama à ciência ao tagarelarem sobre feminismo em vez de trabalharem em sua área. A diretora da HewlletPackard, Carly Fiorina, disse que, no mundo dela, não havia tais coisas como telhados de vidro. Essas e inúmeras outras heroínas menos conhecidas têm orgulho, e com razão, de sua capacidade de fazer sucesso num mundo competitivo e de ter ganhado dos homens no próprio jogo deles. A última coisa que querem é ver suas conquistas reduzidas a favores especiais que possam ter recebido.

Por essa interpretação, também a inclinação maior das mulheres a reclamar não indica que "o desenvolvimento de uma doença mental de uma mulher, seja esquizofrenia ou psicose maníaco-depressiva, com freqüência é mais imprevisível e volúvel do que a de um homem"; sem contar que sua mente é "na verdade um pulso sincopado", o que quer que isso queira dizer. Ao contrário: desenvolvendo sintomas e se agarrando a eles, as mulheres provam que têm excelente compreensão tanto das vantagens quanto das desvantagens que resultam de sua estrutura física, de um lado, e de sua posição na sociedade, de outro. Se você não pode vencer alguém que, em média, é mais forte e mais competitivo do que você, você pode "manipulá-lo", fazendo-o se sentir culpado. Como em alguns tipos de luta, a própria força dos homens é usada contra eles; e, como mostra a história de Sansão e Dalila, com freqüência quanto mais forte ele é, mais fácil fica.

Normalmente, o primeiro pré-requisito para a reclamação de uma mulher obter sucesso é ela estar sem homem. Se ela tiver um, a menos que ele abuse dela, pressupõe-se que sua dificuldade principal esteja resolvida; dado que a responsabilidade por ela fica principalmente

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nas costas dele. Desde que ela não seja uma "prostituta" ou uma "piranha" - sob as novas regras de interrogatório, até mesmo que ela seja -, não ter um homem torna uma mulher indefesa por definição. Se, além disso, ela é também vista como fraca ou doente, melhores ainda suas chances de conseguir ajuda. Dos tempos de Moisés até os do AFDC[*], ter filhos com freqüência era o coringa do baralho. Uma mulher sozinha com filhos ganha um bônus muito maior do que um homem na mesma situação; o que talvez seja uma razão pela qual os pais viúvos ou divorciados casam de novo assim que podem. Por outro lado, as mulheres às vezes têm filhos especificamente com o propósito de obter ajuda, seja na forma do homem forçado a casar com elas, seja como caridade, seguro-social ou o que for. Finalmente, uma mulher cujos problemas podem ser atribuídos a outros que não ela mesma tem mais chances que qualquer outro de obter assistência. Em especial se esses outros são homens; que é uma das razões pelas quais as feministas estão sempre falando em patriarcado e opressão.

Na base de tudo está a busca sem fim de atenção. Atenção é algo que as pessoas de ambos os sexos desejam, e não há razão para acreditar que as mulheres mais do que os homens. Todavia, seus caminhos divergem. Aos olhos tanto dos homens quanto das mulheres, a única maneira de os homens atraírem atenção é sendo bem-sucedidos. Aos olhos tanto dos homens quanto das mulheres, as mulheres podem atrair atenção quase tão bem fracassando e/ou reclamando. Isso talvez explique por que, entre as pessoas com MBAs, afirma-se que há quatro vezes mais probabilidades de as mulheres procurarem ajuda psicológica do que os homens; o comportamento tolerado, até elogiado, nas fêmeas não é aceitável nos machos. Já em 1980, uma historiadora das mulheres escreveu: "se a 'depressão' vier a ser considerada como uma categoria indefinida onde cabe tudo, outra doença feminina aparecerá para tomar seu lugar na geração seguinte". Desde que os psicofármacos amenizaram o drama da maioria dos tipos de problemas mentais, sua profecia tornou-se verdade. Uma nova maneira de chamar atenção precisava ser descoberta. Várias tentativas foram feitas, mas nenhuma realmente pegou. Uma mudança de curso fez-se necessária; e o assédio sexual então surgiu, como o coelho da cartola de um mágico.

Como os problemas mentais, as reclamações das mulheres de assédio sexual com freqüência envolvem "um desejo de reconhecimento" que perpassa "durante as entrevistas" conduzidas com elas. Diferentemente dos problemas mentais, passa-se não na privacidade da clínica, mas nos tribunais. As mulheres muitas vezes podem escolher entre um julgamento público e um conduzido a portas fechadas; os quais, através de mudanças nas regras das evidências, tornaram-se um porto seguro para elas. O consolo é que, como tudo o mais, as reclamações de assédio sexual estão sujeitas à curva logística e um dia acabarão, quando essa também tornar-se uma categoria indefinida onde cabe tudo. Impossível saber o que virá depois do assédio sexual. Quem teria adivinhado que, depois das tentativas de provar que as mulheres podiam fazer qualquer coisa tão bem quanto os homens que marcaram a década de 1970, apareceriam as lacrimosas, desarvoradas vítimas de assédio sexual das décadas de 1990 e 2000?

Durante a maior parte da história, as mulheres reclamavam como indivíduos. Ultimamente, no entanto, começaram a expressar seus problemas de forma organizada e mudaram seu alvo de certos indivíduos homens para todos os homens, enquanto sexo; como uma mulher escreveu, "o feminismo é a histeria transformada". As definições do feminismo variam, tampouco se pode botar todas as feministas no mesmo saco. Há feministas de primeira geração, de segunda, de terceira e pós-feministas. Há feministas igualitárias e feministas de gênero, feministas de classe média e proletárias, feministas minoritárias, marxistas e ecofeministas. Há até mesmo um pequeno ramo do movimento feminista que alega representar as prostitutas e outras trabalhadoras do sexo; seu propósito é defendê-las das tentativas das feministas majoritárias de abolir as profissões das quais vivem. Com a possível exceção das

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prostitutas, cuja preocupação é demonstrar que elas não estão sendo exploradas pelos homens, a característica que todas têm em comum é sua tendência para reclamar. E, no entanto, é precisamente essa qualidade - talvez porque dada como óbvia - que não aparece em nenhuma das definições.

Tão firme é a determinação feminina de reclamar a qualquer custo que o patriarcado é amaldiçoado pelo que faz e pelo que não faz. Se se diz que as mulheres são o segundo sexo, está errado; mas se se diz que eles são o primeiro também está errado. Se pais abraçam suas filhas, podem ser culpados de abuso sexual de crianças; mas se "ignoram a sexualidade das meninas pequenas", essas meninas se tornarão "inseguras". Se menos meninas do que meninos freqüentam a escola é porque são discriminadas; se mais meninas do que meninos freqüentam a escola, é porque têm menos opções. Se as mulheres promíscuas são vistas com reservas, há um duplo padrão; se são encorajadas a fazê-lo, então "onde há licenciosidade, há terror". Se maridos não dão dinheiro a suas mulheres isso é causa para reclamar; mas se eles lhes dão uma mesada então trata- se de "abuso econômico".

Se o sustento dos filhos é instituído, as mulheres estão sendo desencorajadas de trabalhar. Se as empresas oferecem às mulheres licença-maternidade, garantia de ter seus empregos de volta depois de um período de ausência que pode durar anos, tempo parcial, horários flexíveis, cursos especiais de treinamento e a oportunidade de trabalhar em casa, tudo isso não passa de mecanismos para evitar que elas progridam na carreira. Se não há leis protegendo as mulheres que trabalham, é opressão; quando essas leis existem, isso prova que os homens estão tentando justificar a "dominação" em nome do cavalheirismo. As mulheres que não conseguem o que querem nos tribunais contra homens que supostamente as assediaram ou abusaram delas, reclamam; aquelas que conseguem também reclamam, dessa vez pelo "ônus psíquico" de testemunhar. Algumas feministas até reclamam que o tratamento muito mais leniente dado às mulheres por parte da lei é uma tática masculina concebida para "inferiorizar", "patologizar", "despolitizar" e "trivializar" as mulheres. Como Doris Lessing, ela mesma feminista, escreveu: "em geral são as mulheres mais estúpidas e ignorantes que atiram lama nos homens mais corteses e inteligentes".

Por volta da década de 1980, o coro das reclamações chegou ao ponto em que a própria liberdade foi atacada. Enquanto as mulheres eram prejudicadas por obstáculos legais que limitavam sua participação na vida pública, as feministas reclamavam que a ideologia e as políticas liberais não eram aplicadas às mulheres como eram aos homens. Agora que praticamente todos esses empecilhos foram removidos, as mesmas autoras reclamam que o liberalismo e a economia de mercado são armadilhas masculinas. Algumas sugerem que a necessidade de competir é injusta com as mulheres que, dizem, são em média menos assertivas e menos seguras do que os homens. Conseqüentemente, mesmo quando exigem igualdade para as mulheres elas também querem que sejam concedidos privilégios a elas; de vagas de estacionamento reservadas à discriminação reversa na educação, no trabalho e no tribunal. Outras feministas chegam a conclusões opostas. Imporiam, se pudessem, uma versão de controle totalitário a suas companheiras. Por exemplo, mudando as regras que governam as pensões para forçá-las a ir atrás de trabalho pago, mesmo se não quisessem. As mulheres que reclamam com freqüência obtêm dispensa de suas responsabilidades cotidianas, além de ajuda. Não os homens que, se são eles a reclamar, só o que ganham é desprezo. Portanto, costumam com mais freqüência fingir que está tudo bem, negando seus sintomas e levando a vida como sempre, aqueles que chegam a procurar ajuda psicológica não raro começam dizendo que "não querem falar sobre o assunto". Outros se autodestróem, voltando-se para o álcool ou as drogas em número muito maior do que as mulheres. Embora mais mulheres do que homens tentem

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cometer suicídio - tais tentativas não sendo mais que a forma mais extrema de reclamação -, mais homens do que mulheres realmente morrem. A tendência maior dos homens a se matar já era evidente no final do século XIX. Por volta da década de 1960, o mesmo fenômeno havia sido documentado na Austrália, Áustria, Tchecoslováquia, Dinamarca, Inglaterra, Finlândia, França, Alemanha, Hungria, Israel, Itália, Japão, Noruega, Escócia, Suíça, Suécia e nos Estados Unidos. Nesse último país, durante a década de 1990, quatro vezes mais homens do que mulheres de mais de 15 anos de idade se suicidaram, enquanto isso, tão longe de querer morrer estava o ato de muitas mulheres que supostamente tentaram se matar que se dizia terem como objetivo "o contato humano e a vida". Alega-se que uma em cada seis mulheres britânicas tenta se matar antes dos 25 anos. Se for verdade, só o que se pode concluir é que são notavelmente incompetentes para fazê-lo.

Como prova a novela desempenhada pela princesa Diana durante a maior parte da década de 1990, nisso como em tudo mais as mulheres são o sexo privilegiado. Particularmente se são jovens, particularmente se são bonitas, e particularmente se dominaram a arte de parecer vulneráveis; se elas conseguem pôr a culpa de seu problema num homem, melhor ainda. Uma mulher assim decididamente consegue uma licença para se dedicar aos mais malucos comportamentos. Ela pode alternadamente comer e vomitar, jogar-se escada abaixo quando grávida, cortar-se com um cortador de limão, esfaquear-se nos braços e no peito com um canivete ou quebrar a porta de vidro de um armário. Quanto mais doido o seu comportamento, mais atraente fica; e maior o número de homens que sonham em salvá-la. Quanto ao homem em questão, seu único pecado foi ter sido proibido de casar com a mulher que amava. Ainda assim ele devia manter as aparências; sua dor, como a de seu tio-avô Eduardo VIII, não contava. Assim sempre foi e assim, a menos que a natureza das pessoas mude súbita e radicalmente, sempre será.

[*] (AFDC) Aid to Family with Dependent Children: programas de ajuda às famílias com crianças com problemas, já mencionados neste livro.

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Conclusões gerais

A conclusão mais importante deste estudo é que toda moeda tem dois lados - que as mulheres, embora não iguais aos homens em alguns aspectos, sempre e em toda a parte foram mais iguais em outros. Para cada desvantagem por que passam as mulheres, há um privilégio que só elas desfrutam. Para cada homem que teve de enfrentar adversidades, houve e há uma mulher que não passou por elas ou só o fez num grau menor. Alguns dos privilégios das mulheres parecem ter base biológica; outros, todavia, são socialmente construídos.

Outra possível conclusão deste estudo é que a inveja do pênis realmente existe. Se, diante de todas as provas, e não raro da própria experiência pessoal, milhões de mulheres sustentam que os homens se dão melhor; se elas insistem em aderir a qualquer vício masculino, de matar animais indefesos, a obter um "reforço do ego" assistindo desconhecidos do sexo oposto dançarem nus; se elas fazem tudo o que podem para entrar nas mais desagradáveis das ocupações masculinas, de subir em postes de telefone a lutar na guerra; se, ao fazê-lo elas às vezes arriscam sua saúde bem como sua integridade e vida; se no mínimo uma escritora feminista bem conhecida expressa sua alegria quanto ao "terremoto dos sexos" que fez com que, em algumas propagandas, "objetos fálicos [ ... ] emergissem [ ... ] da virilha das mulheres [itálico no original]"; se tudo isso é verdade, só se pode suspeitar que Freud afinal estava certo: as mulheres de fato anseiam pelo "óbvio 'a mais' que [os homens] têm".

Se a campanha para mostrar que as mulheres são oprimidas é tão repleta de disparates, então por que teve tanto sucesso a ponto de hoje em dia nos países desenvolvidos, a maioria das pessoas não conseguir nem conceber que muito do que ela apregoa é falso? Uma razão é a pura persistência com que foi conduzida. A nossa, afinal, é uma era democrática. Desde que somos todos supostamente iguais, o fracasso de algumas pessoas em conseguir tanto quanto os outros conseguem só pode resultar da discriminação, e não de outros fatores tais como diferenças hormonais. Embora não tenham sido as feministas que inventaram essa estratégia, talvez a razão de elas terem tido mais sucesso seja precisamente o fato de serem mulheres; em outras palavras, o próprio sucesso delas é em si mesmo mais uma prova de sua posição privilegiada na sociedade.

Talvez ainda mais importante seja o fato de que já faz quase sessenta anos desde que algum país desenvolvido entrou numa guerra séria, do tipo que poderia pôr em risco sua existência enquanto nação. Ora, se há alguma coisa no mundo que pode levar a uma trégua na batalha entre os sexos é a guerra; quando Simone de Beauvoir visitou Israel na primavera de 1967 ficou surpresa, e um tanto irritada, em descobrir que as mulheres israelenses não tinham interesse em ouvir o que, naquela época, parecia a elas um ultrajante disparate. A guerra não é um terreno fértil para o feminismo porque, enquanto dura, a maioria das mulheres fica em segurança em suas casas enquanto os homens são obrigados a lutar e morrer. A guerra não é um terreno fértil para o feminismo porque, enquanto dura, as mulheres precisam desesperadamente dos homens para defendê-Ias. Finalmente, a guerra não é um terreno fértil para o feminismo porque, como Aristóteles observou quanto a Esparta, enquanto os homens estão no campo de batalha as mulheres fazem o que bem entendem.

Em outras palavras, o feminismo é uma árvore que só cresce sob o luxo da paz; isso é tão verdade hoje quanto era sob a Pax Romana imperial, em que as mulheres desfrutavam direitos maiores do que durante a república; também era verdade durante os últimos anos antes da

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Primeira Guerra Mundial, quando as suffragettes argumentavam que a guerra não mais aconteceria. Em 2001, não há a vista ameaça que possa seriamente perturbar a paz dos países mais desenvolvidos. Por outro lado, se o preço da paz é a ascensão do feminismo - como certos filósofos do século XIX acreditavam - então talvez seja um preço que bem vale a pena pagar.

Contra esse pano de fundo, dois cenários se apresentam. O primeiro é a avalanche de reclamações feministas, e em particular aquelas referentes ao assédio sexual, levando a uma separação crescente entre os sexos. A integração já tem sido às vezes substituída pelo seu oposto; enquanto algumas mulheres usam os tribunais para conseguir entrar em escolas masculinas, cada vez mais outras exigem escolas que só atendam a elas. Talvez lugares de trabalho separados (como no fim do século XIX), transporte separado (como nas comunidades judias ortodoxas), escolas separadas (como durante a maior parte da história), instituições religiosas separadas (como nos monastérios cristãos e budistas) e tratamento médico separado não estejam longe. Talvez voltemos aos dias em que as mulheres dos governantes muçulmanos eram supostamente examinadas por médicos que só chegavam a ver um braço atravessando um buraco na parede. É corajoso o médico que, nos dias de hoje, admite examinar pacientes mulheres sem que uma enfermeira esteja presente na sala. É corajoso o professor universitário que, nos dias de hoje, permite a uma aluna que feche a porta quando ele a orienta em seus trabalhos ou teses. Se fosse para dizer a verdade, muitos professores não desejariam nada melhor do que ver suas alunas desaparecerem; de modo que, em vez de ficar esperando uma acusação de assédio, pudessem fazer seu trabalho.

Em muitos casos, nos dias de hoje, as regras da sociedade impedem tanto homens quanto mulheres de se comunicarem livremente como faziam e como talvez ainda gostariam de fazer. Nas escolas, a lição de que as mulheres são flores frágeis que sofrerão danos psicológicos permanentes só de entreouvir uma palavra feia começa a ser inculcada em crianças de cinco anos; no outro extremo, a força aérea dos Estados Unidos uma vez chegou ao ponto de mandar para a prisão um casal porque, durante o namoro, antes de se casarem, a mulher esteve sob o comando do homem. Em vez de tentarmos melhorar a comunicação entre os sexos, de muitas maneiras estamos fazendo o possível para impedi-Ia. Em vez de liberarmos as mulheres, assumimos que são tão vulneráveis que não podem ver uma fotografia de alguém nu sem terem um ataque histérico. Em vez de dar a elas maior poder, representamo-las como tolas demais para saber o que um conhecido homem quer delas e fracas demais para dizer a ele. Observando o modo como as coisas mudaram desde a década de 1970, poder-se-ia concluir que os países avançados decidiram voltar à época vitoriana em que, entre as classes altas, uma mulher solteira sozinha com um homem era um escândalo. Ou talvez, dada a inabilidade das pessoas de ambos os sexos ficarem longe do caminho umas das outras e evitarem equívocos quanto ao que constitui consentimento, a doutrina vitoriana das esferas separadas seja, de fato, a melhor.

Como meninos tendem a ir melhor em escolas masculinas do que em mistas, são eles quem tem mais a ganhar. Como os homens continuarão a ser necessários para fazer a maior parte do trabalho produtivo da sociedade, bem como protegê-la de seus inimigos internos e externos, são as mulheres quem têm mais a perder. Quanto mais alta a classe a que uma mulher pertence, mais provável será que a segregação renovada a obrigue a recuar para o lar - na medida em que tiver saído dele; dado que, de todas as pessoas, essas damas são as menos prováveis de trabalhar. Esse processo pode muito bem fazer com que as mulheres percam seu poder de ganhar dinheiro e sua liberdade de fazer o que quiserem. As mulheres talvez também venham a ser forçadas a se submeter a restrições quanto às roupas, ao comportamento etc. Quanto mais vulneráveis ao assédio elas alegam ser, mais provável é que isso aconteça.

O segundo cenário, e talvez o mais provável, é que o feminismo acabe desabando sob o

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peso de seus próprios absurdos. Hoje, como sempre, homens e mulheres desejam uns aos outros e não podem viver um sem o outro. Hoje, como sempre, ter uma carreira bem-sucedida enquanto também cuida da casa é um desafio que só uma minoria de mulheres consegue realizar com sucesso e que, muitas vezes, as deixa muito, muito cansadas. Hoje, como sempre, poucas mulheres - as feministas menos ainda - querem ter homens que "não têm como objetivo sucesso profissional ou posição de autoridade e [ ... ] não querem chefiar famílias ou serem maridos e pais"; ainda mais homens que sejam economicamente dependentes delas. Hoje, como sempre, quanto mais bem-sucedida uma mulher, menos provável que ela tenha marido ou filhos. É quase como se essas mulheres fizessem todo o possível para declarar guerra a seus próprios genes.

Pelo menos no que se refere à grande maioria das mulheres, o feminismo parece se debater contra o choque fundamental entre igualdade e privilégio. Aquele ou aquela que exige a primeira não pode ter o segundo; aquela ou aquele que exigem o segundo não podem ter a primeira. Se as mulheres de fato atingirem a verdadeira igualdade, perderão muitos de seus privilégios. Muitas, talvez a maioria, verão sua qualidade e expectativa de vida declinarem acentuadamente. Isso é especialmente verdadeiro no caso das mulheres casadas que, enquanto permanecem casadas, e não raro mesmo se não, sempre foram carregadas nas costas pelos homens. De Kollontai e Beauvoir a Greer e Dworkin, talvez boa parte do feminismo deva ser compreendido como uma tentativa de mulheres que não conseguiram atrair um homem de se vingar de suas companheiras mais afortunadas. Seja fazendo com que aquelas que preferem criar seus filhos a ter uma carreira se sintam como um cruzamento de imbecis com criminosas, como no caso de Wollstonecraft, seja transformando-as em lésbicas, como no caso de Rich; seja convencendo-as de que um casamento seguro é ruim para elas, como no caso de Gloria Steinem, antes de se casar.

Tampouco as próprias feministas ignoram esses problemas. Hoje em dia, no começo do século XXI, a "objetividade" do estado e as "leis neutras" que o regem não mais são considerados suficientes. Em vez disso, ao menos algumas autoras começaram a exigir que as mulheres recebam "tratamento mais do que igual" em toda uma variedade de áreas; de vagas reservadas de estacionamento até a guarda dos filhos e pagamento de pensões, e das instituições educacionais aos tribunais. Nos Estados Unidos, muitos milhões se voltaram contra a Equal Rights Amendment [Emenda sobre os Direitos Iguais], ajudando a explicar por que nunca foi ratificada. Outras temem, não sem razão, que a igualdade perante a lei possa fazer com que o número de infratores mulheres mandadas para a prisão aumente, e as condições em que são mantidas deteriorem. Chegou-se até mesmo a sugerir que as meninas provenientes de lares tradicionais têm menos probabilidade de serem presas do que aquelas criadas em lares mais igualitários ou por mulheres sozinhas. Se isso for verdade, talvez o patriarcado seja bom para jovens mulheres.

Ao mesmo tempo, e talvez porque tantas delas passaram a ter empregos remunerados e começaram a ver a vida dos homens de perto, algumas mulheres estão se dando conta de que essa vida não é só de diversão e prazer. Para citar equivocadamente três escritoras feministas importantes, a grande maioria das mulheres não quer nem brincar na "quadra" dos homens, nem exige sua porção da "potência" masculina. Em vez de compartilhar da "agonia" dos homens, ficam contentes em desfrutar os privilégios delas: ficar em ou voltar para, seus lares; passar os dias criando seus filhos ou cultivando seus jardins, e chegar tão perto do ideal platônico de contemplação quanto possível. Para essas mulheres, o feminismo em todas as suas variantes exerce pouca atração. Ainda mais porque, com freqüência, exige que elas traiam a confiança depositada nelas como filhas de homens, esposas de homens e mães de futuros

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homens. Outra razão pela qual o feminismo pode vir a implodir é a maneira que as feministas

tratam aquelas que se recusam a seguir seu chamado (e vice-versa). Mulheres que trabalham acusam as que não trabalham de não contribuírem com a causa da liberação; as mulheres que não trabalham acusam as que trabalham de nem serem mulheres. Em algumas pesquisas, mais da metade das mulheres diz que outras mulheres as trataram de forma pouco ética no trabalho. Alegando que "chefes mulheres com freqüência não as apóiam", mais de quatro a cada cinco preferem não trabalhar para elas. As mulheres com freqüência desvalorizam o trabalho de suas companheiras, por exemplo, chamando o trabalho doméstico de "pseudociência" e referindo-se a "cuidar das crias" como "funções animais". Enfim, as autoproclamadas "feministas do poder" inventaram o termo "feministas vítimas", as quais acusam de estarem sempre reclamando de tudo e não fazendo nada. Para citar Beauvoir de novo, "as mulheres são impiedosas umas comas outras".

Se o feminismo de fato refluir, talvez a perda tanto para os homens quanto para as mulheres - mas especialmente para estas - acabe nem sendo tão grande assim. Eis como Betty Friedan, que talvez tenha feito mais para pôr em andamento o movimento feminista moderno que qualquer outra pessoa, descreve sua vida no fim da década de 1950, antes dela e outras empunharem o estandarte da revolta:

Durante todos os anos em que estava trabalhando no livro A mística feminina, eu alegremente parava de escrever quando minha filha pequena chegava da escola ou quando os meninos tinham jogos de beisebol ou basquete, ou para fazer um martini quando meu marido chegava em casa, preparar o jantar, discutir, ir ao cinema, fazer amor, sair numa expedição ao supermercado ou a um leilão no sábado, organizar um piquenique em Fire Island, levar as crianças ao campo de batalha em Gettysburg, ou para acampar em Cape Hatteras - essas coisas todas da vida em família.

Para algumas pessoas de ambos os sexos isso talvez não soe tão mal assim. Ainda mais se a alternativa é gastar um bocado de horas todo o dia enfrentando o trânsito; passar o tempo entre essas viagens numa fábrica ou escritório; e fazer um trabalho do qual não se goste para um chefe que não suporte em troca de um pagamento que sempre dá a sensação de ser apenas o suficiente para manter a rotina, e nada mais.

Seja qual for o futuro das mulheres, para os homens é perfeitamente claro. Os homens continuarão em sua busca de poder, fama e riqueza de modo a poder depositar seus ganhos aos pés de uma ou mais mulheres. Continuarão a ser tratados de maneira mais dura pelos pais, pela escola e por outras instituições cujo propósito é preparar as pessoas para participar da vida adulta. Continuarão a trabalhar mais, e mais pesado, do que as mulheres; executando um número completamente desproporcional de tarefas sujas e perigosas, e sofrendo em conseqüência um número completamente desproporcional de acidentes. Seja individual ou coletivamente ou ambos, os homens continuarão a sustentar economicamente as mulheres através de quaisquer mecanismos que existam em qualquer época ou lugar. Sem o dinheiro público, que é o resultado avassalador de contribuições de homens, muitas organizações feministas já teriam ido à falência. Ao enfrentar o rigor da lei, os homens continuarão a ser tratados de forma mais severa do que as mulheres. Diante do horror da guerra, os homens continuarão a morrer para que as mulheres possam viver. Dessas e de inúmeras outras maneiras, os homens continuarão a fazer tudo o que podem para dar às mulheres uma vida mais fácil, melhor, mais confortável e mais longa do que a que eles mesmo desfrutam. O tempo todo ouvirão ou, muitas vezes, tentarão não ouvir, as reclamações das mulheres sobre tudo e sobre eles.

Nós, os homens, percebemos claramente que a natureza, ao nos fazer o "animal sem frutos" (Nietzche de novo) e nos forçando a competir pelas mulheres, fez de nós o sexo

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supérfluo. Dando-nos um corpo maior e mais robusto, também nos destinou a atuar como bestas de carga. Como nossa necessidade de mulheres é a que é, a maior parte do tempo realmente não ligamos para os privilégios delas. Tampouco, no fundo de nossos corações, gostaríamos que a situação mudasse. Afinal, todos nós nascemos de mulheres, e foram mulheres que nos criaram. Num certo sentido, só estamos pagando uma dívida. É verdade mesmo quando a carga for muitas vezes pesada, e mesmo se, ao carregá-la, formos às vezes forçados a fazê-lo com nossas próprias vidas. Deixando de sustentar as mulheres, perderíamos não só nossa existência mas nosso respeito próprio; talvez a razão real de as mulheres nunca terem lutado em guerras seja porque, pelo amor que temos a elas, preferimos morrer a vê-las morrer. Como diz um provérbio hindu, onde mulheres são reverenciadas, ali os deuses habitam. Mas seria bom se, de quando em quando, em meio às torrentes de ataques, pudéssemos ouvir o som de uma voz agradável de mulher dizendo: obrigada, parceiro.

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