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1 CISTITE ENFISEMATOSA EM FELINO NÃO DIABÉTICO - RELATO DE CASO EMPHYSEMATOUS CYSTITIS A NON-FIABETIC CAT – A CASE REPORT Luana Mirela de Sales PONTES 1 ; Vitor Miranda de TRAVASSOS 2; Angélica da Costa Ferreira de Souza²; Joane Isis Travassos VIEIRA³ ; Ellen Cordeiro Bento da Silva 4 ; Evilda Rodrigues de LIMA 5 1 Estudante de graduação em Medicina Veterinária, Universidade Federal Rural de Pernambuco, [email protected] 2 Médico Veterinário, R2 do Programa de Residência em Área de Saúde do Departamento de Medicina Veterinária, UFRPE – Pernambuco 3 Mestranda em Ciência Veterinária – UFRPE 4 Professora Adjunta do Departamento de Morfologia e Fisiologia Animal, Universidade Federal Rural de Pernambuco 5 Professora Titular do Departamento de Medicina Veterinária, Universidade Federal Rural de Pernambuco. Resumo: A cistite enfisematosa é uma enfermidade infecciosa que acomete o trato urinário inferior de humanos, cães e gatos. Sua ocorrência ainda é pouco compreendida, mas sua principal etiologia consistente na presença da diabetes mellitus e a presença de bactérias que predispõem o desenvolvimento de gás na parede e luz vesical. Este estudo objetiva incluir a cistite enfisematosa na síndrome das Doenças Idiopáticas do Trato Urinário Inferior dos Felinos na ausência da diabetes e de bactérias. Um paciente felino deu entrada no Hospital Veterinário, do Departamento de Medicina Veterinária, da Universidade Federal Rural de Pernambuco, com suspeita de cistite. Foi solicitado USG - abdominal, dosagem de glicose sérica, cultura bacteriana e antibiograma. O laudo ultrassonográfico indicou a presença de cistite enfisematosa, entretanto o resultado da cultura bacteriana foi negativo e a glicose encontrava-se dentro dos valores de referência. Com base nos resultados dos exames clínicos foi prescrito um tratamento baseado na Cistite Idiopática Felina e solicitado uma USG - abdominal após 60 dias. A segunda avaliação descreveu a vesícula urinária sem presença de pontos ecogênicos flutuantes e sedimentosos, paredes lisas, regulares, normoespessadas e simétricas. Conclui-se que a cistite enfisematosa quando não associada a distúrbios sistêmicos, como a diabetes mellitus, e na ausência de bactérias deve ser classificada como Cistite Idiopática do Trato Urinário Inferior dos Felinos. Palavras-chave: Trato urinário inferior; Cistite Idiopática Felina; ultrassonografia. Keywords: Lower urinary tract; Feline Idiopathic Cystitis; Ultrasonography. 38º CONGRESSO BRASILEIRO DA ANCLIVEPA, 2017 - RECIFE/PE 38º CONGRESSO BRASILEIRO DA ANCLIVEPA, 2017 - RECIFE/PE Anais do 38º CBA, 2017 - p.0274

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CISTITE ENFISEMATOSA EM FELINO NÃO DIABÉTICO - RELATO DE CASO

EMPHYSEMATOUS CYSTITIS A NON-FIABETIC CAT – A CASE REPORT

Luana Mirela de Sales PONTES1; Vitor Miranda de TRAVASSOS2;

Angélica da Costa Ferreira de Souza²; Joane Isis Travassos VIEIRA³;

Ellen Cordeiro Bento da Silva4; Evilda Rodrigues de LIMA 5

1 Estudante de graduação em Medicina Veterinária, Universidade Federal Rural de Pernambuco, [email protected] 2 Médico Veterinário, R2 do Programa de Residência em Área de Saúde do Departamento de Medicina Veterinária, UFRPE – Pernambuco 3 Mestranda em Ciência Veterinária – UFRPE 4 Professora Adjunta do Departamento de Morfologia e Fisiologia Animal, Universidade Federal Rural de Pernambuco 5 Professora Titular do Departamento de Medicina Veterinária, Universidade Federal Rural de Pernambuco.

Resumo:

A cistite enfisematosa é uma enfermidade infecciosa que acomete o trato urinário

inferior de humanos, cães e gatos. Sua ocorrência ainda é pouco compreendida,

mas sua principal etiologia consistente na presença da diabetes mellitus e a

presença de bactérias que predispõem o desenvolvimento de gás na parede e luz

vesical. Este estudo objetiva incluir a cistite enfisematosa na síndrome das Doenças

Idiopáticas do Trato Urinário Inferior dos Felinos na ausência da diabetes e de

bactérias. Um paciente felino deu entrada no Hospital Veterinário, do Departamento

de Medicina Veterinária, da Universidade Federal Rural de Pernambuco, com

suspeita de cistite. Foi solicitado USG - abdominal, dosagem de glicose sérica,

cultura bacteriana e antibiograma. O laudo ultrassonográfico indicou a presença de

cistite enfisematosa, entretanto o resultado da cultura bacteriana foi negativo e a

glicose encontrava-se dentro dos valores de referência. Com base nos resultados

dos exames clínicos foi prescrito um tratamento baseado na Cistite Idiopática Felina

e solicitado uma USG - abdominal após 60 dias. A segunda avaliação descreveu a

vesícula urinária sem presença de pontos ecogênicos flutuantes e sedimentosos,

paredes lisas, regulares, normoespessadas e simétricas. Conclui-se que a cistite

enfisematosa quando não associada a distúrbios sistêmicos, como a diabetes

mellitus, e na ausência de bactérias deve ser classificada como Cistite Idiopática do

Trato Urinário Inferior dos Felinos.

Palavras-chave: Trato urinário inferior; Cistite Idiopática Felina; ultrassonografia.

Keywords: Lower urinary tract; Feline Idiopathic Cystitis; Ultrasonography.

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Revisão de literatura:

A cistite enfisematosa (CE) é uma enfermidade infecciosa incomum que acomete o

trato urinário inferior de humanos, cães e gatos. Sua ocorrência ainda é pouco

compreendida, sendo relatados cerca de 135 casos em humanos durante o período

de 50 anos (OLIVEIRA et al., 2006; THOMAS et al., 2007; NELSON e COUTO,

2015).

A principal etiologia da CE consistente na presença da diabetes mellitus como o

principal fator predisponente a formação de gases na parede da bexiga, no lúmen e

nos tecidos circundantes. A formação do gás dentro do trato urinário e na mucosa

luminal é geralmente um produto da fermentação da glicose ou albumina no tecido

que, aliada a leucopenia e menor perfusão tecidual, juntamente com a participação

de microrganismos a partir de processos fermentativos, predispõem o

estabelecimento das condições favoráveis ao desenvolvimento dióxido de carbono

pelo patógeno. Dentre as bactérias mais comuns que desencadeiam a CE nos

felinos são: E. coli e Clostridium spp (NELSON e COUTO; BRUHL et al., 2011).

Os exames de imagem como ultrassom e radiografia, possibilitam o diagnóstico da

afecção, tornando possível a visualização do gás e o consequente diagnóstico da

CE, visto que o reconhecimento da doença não é possível clinicamente (VEIGA et

al., 2012; OLIVEIRA et al, 2006).

A CE não associada a pacientes diabéticos é menos comum, sendo registrados

casos na espécie humana e poucos na canina. Entretanto, nos casos em que a

cistite enfisematosa não está ligada ao desequilíbrio da glicose sérica e na

ausência de bactérias fermentadoras em felinos, deve-se expandir o tratamento para

a vertente da Doença Idiopática do Trato Urinário Inferior dos Felinos (MOON at al,

2014; ZANON et al, 2012).

Descrição do Caso:

Um paciente felino, macho, castrado, raça SRD, cerca de 5 anos de idade, 4 kg, deu

entrada no Hospital Veterinário, do Departamento de Medicina Veterinária, da

Universidade Federal Rural de Pernambuco. Durante o exame físico inicial

observou-se apatia, prostração, vesícula urinária distendida e sensibilidade a

palpação na região abdominal.

O tutor relatou que o animal apresentava disúria, polaciúria, periúria e prostração a

cerca de uma semana, negando a administração de medicações durante esse

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período. Sobre os hábitos do paciente foi descrito a convivência pacifica com outros

animais no mesmo ambiente e acesso a áreas externas para a realização das

necessidades fisiológicas. Quanto a alimentação foi relatado uso exclusivo de ração

seca (standart), mas sem descartar a possibilidade de ingestão de outros alimentos.

Os demais parâmentros fisiológicos, como temperatura retal e batimentos cárdio-

pulmonar apresentavam-se dentro da normalidade para a espécie, entretanto

encontrava-se com nível de desidrata ção leve e TPC em 2 segundos.

Sob suspeita de uma possível cistite foi solicitado USG – abdominal. Após o

resultado do exame de imagem foram solicitados: dosagem da glicose sérica, cultura

bacteriana e o antibiograma da urina, material este coletado via cistocentese e

encaminhado para o laboratório particular.

O laudo ultrassonográfico inicial concluiu presença de microlitíase e gás encistado

em vesícula urinária, indicando haver cistite enfisematosa associada à microlitíase,

além de paredes irregulares e espessadas, medindo 0,66 cm. O resultado da cultura

bacteriana foi negativo (bactérias: 0/campo e leucócitos: 1/campo), bem como a

glicose sérica encontrava-se dentro dos valores de referência (120mg/dL).

Transcorridos 60 dias de tratamento foi repetida o USG - abdominal, cuja vesícula

urinária apresentava-se sem presença de pontos ecogênicos flutuantes e

sedimentosos, paredes lisas, regulares, normoespessadas (0,1cm) e simétricas, cujo

resultado deliberou a alta médica do paciente.

Com base nos resultados dos exames clínicos, o tratamento realizado utilizou as

seguintes medicações: Cloridrato de prazosina 2mg/VO/BID; Escopolamina e

dipirona 2,5mg/VO/BID; Passiflora incarnata 3ml/VO/BID, além de alterações do

manejo como enriquecimento ambiental e aumento da ingestão hídrica.

Discussão:

A Doença do Trato Urinário Inferior dos Felinos (DTUIF) é um termo abrangente que

descreve qualquer desordem que afete a bexiga ou uretra dos gatos, resultando de

infecções bacterianas, fúngicas ou parasitárias, podendo ser classificada como

obstrutiva ou não obstrutiva. Em aproximadamente dois terços dos gatos jovens e de

meia-idade que apresentem polaciúria, estrangúria, periúria, disúria e hematúria,

nenhum diagnóstico é definido e por isso esta síndrome é conhecida como a Cistite

Idiopática Felina. A CIF acomete cerca de 50 a 65% dos felinos diagnosticados com

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DTUIF, tornando-se um desafio ao profissional pela capacidade de sua etiologia ser

multifatorial e complexa (MARTINS et al, 2013; NELSON e COUTO, 2015).

Na literatura veterinária são poucos os trabalhos que descrevem pacientes

portadores da CE não glicosúricos, sendo os casos relatados em animais da espécie

canina e afetados por três principais causas: infecções crônicas do trato urinário,

presença de divertículos no trígono da bexiga e administração em longo prazo de

esteroides. (FABI et al, 2016; MARTORELLI et al, 2016).

Diante dos pareceres laboratoriais, não foram encontradas as evidências etiológicas

clássicas da cistite enfisematosa, bem como não foram encontrados estudos

pregressos relatando felinos portadores de CE na ausência de bactérias e/ou

diabetes. Assim, diante dos particularidades da espécie felina, o paciente foi tratado

a partir dos estudos da CIF, obtendo sucesso e alta médica.

Conclusão:

Conclui-se que a cistite enfisematosa quando não associada a distúrbios sistêmicos,

como a diabetes mellitus e na ausência de bactérias fermentadoras, deve ser

classificada como a síndrome da Cistite Idiopática do Trato Urinário Inferior dos

Felinos.

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