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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARAÍBA
CENTRO DE CIÊNCIAS EXATAS E DA NATUREZA
CURSO DE GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA
Caracterização dos processos degradacionais no Município de São João do Cariri-PB
Eduardo Rubens de Medeiros
JOÃO PESSOA JANEIRO DE 2006
Eduardo Rubens de Medeiros
Caracterização dos processos degradacionais no Município de São João do Cariri-PB
Monografia apresentada ao Curso de Graduação em Geografia da Universidade Federal da Paraíba como requisito para obtenção grau de bacharel em Geografia .
Professor Paulo Roberto de Oliveira Rosa, Ms
(Orientador)
Geógrafa Maria José Vicente de Barros, Ms. (Co-Orientadora)
JOÃO PESSOA-PB JANEIRO DE 2006
M488c MEDEIROS, Eduardo Rubens de.
Caracterização dos processos degradacionais no Município de São João do Cariri, PB/Eduardo Rubens de Medeiros. - João Pessoa, 2006.
42p. Monografia (Graduação) UFPB/CCEN Orientador: Paulo Roberto de Oliveira Rosa 1. Erosão – processo – S. João do Cariri. 2. Degradação.
UFPB/BC CDU:631.459(043.2)
Eduardo Rubens de Medeiros
Caracterização dos processos degradacionais no Município de São João do Cariri-PB
Monografia aprovada pelo Curso de Graduação em Geografia da Universidade Federal da Paraíba como requisito para obtenção grau de bacharel em Geografia pela seguinte banca examinadora:
__________________________________________ Professor Paulo Roberto de Oliveira Rosa, Ms.
(Orientador)
__________________________________________________ Prof. Eduardo Pazera Jr, Dr.
(Examinador)
________________________________________________________ Prof. Rômulo da Silveira Paz, Dr.
(Examinador)
João Pessoa - PB,____/____/2006
À minha avó Dalvaci (“in memorian”)
pelos primeiros ensinamentos.
Aos meus pais Severino e Letice,
e, ao meu irmão Zico.
Dedico
Agradecimentos
Aos meus pais Severino e Letice pelo incentivo e paciência, e ao meu irmão Zico.
Em especial ao Prof. Paulo Rosa, mestre e amigo, pelos ensinamentos e dedicação ao longo
dessa jornada; e a Geógrafa Maria Barros pelas contribuições e em todos os momentos,
durante os trabalhos de campo e na co-orientação, sem eles esse trabalho não seria possível.
Aos professores Rômulo Paz e Eduardo Pazera por fazerem parte da banca examinadora.
Aos amigos e amigas do Laboratório de Geografia Aplicada Pablo, Conrad, Cunha, André,
Odete, Kallianna, Mônica, Liese e Ana Cláudia, que contribuíram para essa conquista.
Aos amigos Catolé (Rozeílton), Jorge, Diogo, Alex, Josinaldo e outros que marcaram a
nossa caminhada na Geografia.
As amigas Alessandra e Viviane, pela amizade e companheirismo durante essa etapa de
nossas vidas.
E ainda aos amigos Adnílton, Rivamar, Messias, Cleiton, Oade, Flávio, Betinho e a todos
que partilham comigo essa alegria.
O riacho não vi mais, cheio O inverno não voltou
E a seca que ali chegou Não quis mais se arretirar
Passarinho foi embora Não sei mais aonde mora
Se ainda sabe cantar Um antigo cajueiro
Manga rosa e coqueiro São saudades do lugar
[...] Será que o tempo não chora
Quando deixa tudo para trás Não podendo nunca mais
Tudo que passou passar
Trecho da música O Tempo e a Seca de Flávio José
Resumo O estudo tem por objetivo caracterizar os processos degradacionais que ocorrem no município de São João do Cariri. Durante a elaboração do trabalho optamos por trabalhar em duas escalas, sendo uma regional e uma outra local. Na escala regional analisamos algumas imagens aéreas e mapas, na intenção de melhor localizar os pontos que apresentam alguma degradação. Num segundo momento, verificamos no campo as possíveis “manchas” de degradação. Após a coleta de evidências no campo podemos caracterizar quais os processos degradacionais que vem ocorrendo no ambiente. Os principais fatores que vem contribuindo para que esses processos venham ocorrendo, são principalmente a retirada da cobertura vegetal, que deixa o solo desprotegido, causando o aceleramento desses processos nas áreas que apresentam uma maior vulnerabilidade
Lista de Figuras Figura 01 Mapa de localização do Município de São João do Cariri, PB......................... 22
Figura 02 Caracterização da vegetação.............................................................................. 24
Figura 03 Composição colorida de imagem Landsat, demonstrando a área do Município de São João do Cariri........................................................................................................
25
Figura 04 Caatinga com indivíduos arbóreos e densidade vegetal considerável......................... 27
Figura 05 Caatinga arbustiva com baixa densidade vegetal........................................................ 27
Figura 06 Erosão laminar favorecida pela declividade do relevo e baixa densidade vegetacional nas situações a e b........................................................................
28
Figura 07 Voçorocas instaladas em áreas onde ocorre pastoreio...................................... 29
Figura 08 Croqui elaborado em campo da Voçoroca I com seus respectivos cortes seccionais............... 30
Figura 09 Croqui elaborado em campo representando a Voçoroca II e seus respectivos cortes seccionais.....................................................................................................................
32
Figura 10 Pecuária extensiva na área da voçoroca...................................................................... 32
Figura 11 Estágios avançados de erosão da Voçoroca II.............................................................. 34
Figura 12 Estocagem de madeira para uso energético.................................................................. 35
Figura 13 Corte e queima da vegetação........................................................................................ 35
Lista de Tabelas Tabela 01 Tamanho das partículas de solos....................................................................... 17
Tabela 02 Estimativa da ocupação da vegetação da caatinga, solo exposto e águas superficiais no município de São João do Cariri – PB......................................
19
Tabela 03 Dados dos elementos da Voçoroca I................................................................. 31
Tabela 04 Dados dos cortes seccionais da Voçoroca I. ..................................................... 31
Tabela 05 Dados dos elementos da Voçoroca II................................................................ 33
Tabela 06 Dados dos cortes seccionais da Voçoroca II..................................................... 33
Tabela 07 Média mensal entre o período de janeiro de 1985 e dezembro de 2005........... 36
Tabela 08 Dados de precipitação no período de janeiro de 1985 a dezembro de 2005..... 37
SUMÁRIO
1 Introdução........................................................................................................................... 09
2 Arcabouço teórico-conceitual............................................................................................ 11
2.1 Os processos de desertificação ocorridos no mundo................................................... 11
2.2 O Semi-árido nordestino.............................................................................................. 12
2.3 Os processos de degradação das terras do semi-árido e a cultura do lugar................. 16
2.4 As formas de conservação do solo............................................................................... 17
2.5 A diversidade da Caatinga e sua importância para a região do Cariri........................ 18
3 Material e Métodos............................................................................................................ 21
3.1 Descrição Geral da área estudada................................................................................ 21
3.2 Metodologia................................................................................................................. 23
4 Resultados e Discussão....................................................................................................... 27
4.1 Processos degradacionais observados.......................................................................... 27
4.2 Caracterização de áreas com Voçorocas...................................................................... 29
4.3 A contribuição das precipitações para o início dos processos erosivos....................... 35
5 Considerações ..................................................................................................................... 39
Referências Bibliográficas..................................................................................................... 40
9
1 Introdução
O meio natural ou paisagem natural constitui sempre o resultado de uma interação
entre vários conjuntos da natureza: clima, relevo e hidrografia. A interação desses conjuntos
naturais vai criar condições para o estabelecimento da vida, seja ela vegetal ou animal. Dessa
forma observa-se que há interação entre eles que se influenciam mutuamente, ou seja, um age
sobre o outro, sendo modificados pela ação do homem. Assim a vegetação depende do clima e
dos solos, que por sua vez depende da topografia, do clima e também da vegetação. A existência
de vegetação dificulta a erosão, já que as folhas e galhos que caem são absorvidos pelo solo,
aumentando sua matéria orgânica.
De acordo com os estudiosos no assunto, no mundo inteiro a degradação vem
aumentando. Para Conti (1998) essa problemática “pode ser entendida como um conjunto de
fenômenos que conduz à transformação de determinadas áreas em desertos ou a eles
assemelhados”. Nimer (1988) faz uma relação com o clima, e em um segundo momento à
antropização. O autor diferencia o processo de desertificação do deserto propriamente dito, onde
conceitua o deserto como sendo “um fenômeno de certa forma acabado e resultante da evolução
de processos que alcançaram uma certa estabilidade final, e que pode ser definida como um
clímax ecológico”; o processo de desertificação é caracterizado como “um fenômeno em
transformação dinâmica cuja evolução ambiental está apontada para a direção do deserto” (id).
Em razão dessa complexidade, o conceito de desertificação mostra-se um pouco confuso.
Entendemos assim que esse tema é bastante complexo, sendo assim, buscamos um melhor sobre
10
desertificação. De acordo com o Dicionário Aurélio, desertificação é a “transformação de uma
região em deserto1 pela ação de fatores climáticos ou humanos”.
Há algum tempo se fala em desertificação no Nordeste brasileiro. A Paraíba, por estar
localizado na área delimitada pelo “Polígono das Secas”, desponta como uma região em que há a
ocorrência do fenômeno. O Município de São João do Cariri é um dos municípios apontados
como sendo propenso aos processos degradatórios, cujo clima predominante é o semi-árido.
Esses ambientes semi-áridos são indicados como susceptíveis aos fenômenos de degradação
devido à sua sensibilidade decorrente das condições climáticas inerentes a essa paisagem. O
objetivo desse trabalho foi verificar a situação dos processos degradacionais no Município de São
João do Cariri.
1 Região que recebe anualmente precipitação de água inferior a 250mm, ou em que essa precipitação é maior, porém distribuída de forma heterogênea, e que se caracteriza pela vegetação xerófila ou anual e pela fraca densidade populacional. (id).
11
2 Arcabouço teórico-conceitual
2.1 Os processos de desertificação ocorridos no mundo
A problemática da desertificação é um processo que vem sendo discutido por
pesquisadores de todo o mundo. Em 1972, na Conferência das Nações Unidas para o Meio
Ambiente ocorrida em Estocolmo, iniciou-se discussão sobre essa problemática, bem como cinco
anos mais tarde, em 1977 com a realização pelo Programa das Nações Unidas para o Meio
Ambiente (PNUMA), de uma conferência em Nairóbi, no Quênia.
A preocupação com estas questões tem sua origem nas tendências que vem se
manifestando em alguns lugares com a diminuição das precipitações, o que para alguns autores
está associada à degradação contínua do solo, acarretando assim outros processos degradatórios.
O Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) adotou o seguinte
conceito para desertificação: “degradação das terras áridas, semi-áridas e sub-úmidas secas,
resultante de vários fatores incluindo as variações climáticas e as atividades humanas”. No
território brasileiro, algumas áreas foram indicadas como propensas a esse fenômeno, onde
desponta o Nordeste, como a região em que há a ocorrência do fenômeno atingindo praticamente
toda a área delimitada como Polígono das Secas pelo Conselho Nacional de Geografia em 1949,
uma região em que predomina um rigor climático muito forte, cujo clima predominante é o semi-
árido. Esses ambientes semi-áridos são indicados como propensos aos fenômenos de degradação
devido à sua sensibilidade decorrente das condições climáticas inerentes a essa paisagem.
Tratando da temática, Ab’Sáber conceitua “como processos parciais de desertificação, todos
aqueles fatos pontuais, [...] degradações irreversíveis da paisagem e dos tecidos ecológicos
12
naturais” (1977, p. 1). O autor atribui o acréscimo de degradações pontuais no domínio das
caatingas às atividades agrárias rústicas praticadas pela população, dessas destaca o pastoreio
extensivo juntamente com outras ações deliberadas como propiciantes das “ulcerações dos
tecidos ecológicos” (1977. p 2). A partir de então, observa-se a inserção de outros termos que
devem ser discutidos com profundidade para o entendimento da temática.
Dos Estados nordestinos, a Paraíba é um dos que se destacam com núcleos que
apresentam susceptibilidade a esse processo. Conforme destaca Medeiros et al (2004) a região
dos Cariris apresenta grandes possibilidades de processos degradacionais, bem como o Seridó
Oriental (Medeiros et al, 2003).
2.2 O Semi-árido nordestino
O Nordeste brasileiro diferencia-se pôr ser uma região de clima semi-árido, que
apresenta insolação e temperaturas elevadas, baixa nebulosidade, distribuição irregular das
chuvas durante o ano, e apenas duas estações definidas, sendo uma seca com períodos
prolongados e uma com chuvas, reduzida, ficando assim toda a região sujeita a longos períodos
de estiagem, que repercutem diretamente nas condições de permanência de determinadas
populações radicadas nesse ambiente. Em decorrência de todas essas condições, essa região foi
delimitada pelo Conselho Nacional de Geografia em 1949 e denominada de “Polígono das Secas”
(Duque, 1980, p.25). Os fatores provocadores dessas condições ecológicas repercutem na
cobertura vegetal e no solo, que geralmente, é pouco friável e desgastado. A cobertura vegetal
que predomina no semi-árido é a caatinga, que em sua grande maioria, apresenta afilia e/ou
caducifolia, bem como, outras adaptações para suportarem as condições do rigor climático
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presentes no local, das quais pode-se destacar o engrossamento da cutícula, redução da superfície
foliar; cobertura de cera, entre outras situações que lhes permitam a sobrevivência.
As características climáticas da área de estudo são marcadas pelo Clima Semi-Árido
quente, do tipo Bsh (segundo classificação de Köppen), extremamente complexo devido aos
diferentes sistemas de circulação atmosférica que ocorre na região Nordeste, e estando a área
localizada no Planalto da Borborema, este passa a funcionar como uma barreira natural,
impedindo a passagem de massas de ar que iriam provocar chuvas no interior. O ar perde então a
maior parte de sua umidade, e em conseqüência da condensação e do aumento da pressão, o ar
seca, e se aquece rapidamente, fazendo com que as massas de ar frio não cheguem até a região,
gerando uma área de “sombra de chuvas” provocando períodos prolongados de estiagem, e má
distribuição no espaço-tempo, podendo desencadear o “fenômeno da seca”. Devido à ocorrência
de secas estacionais e periódicas, são construídos açudes para o abastecimento da população
humana e animal, com também para ser utilizado na agricultura, mas, com a alta evaporação que
ocorre na região, o volume d’água dos açudes chega a reduzir significativamente nas estiagens
mais prolongadas ou chegam a ficar completamente secos.
As baixas precipitações que ocorrem, refletem nos processos de recarga hídrica, que
na região são praticamente nulos. Esse “déficit hídrico” caracteriza o caráter predominante de
rios intermitentes ou sazonais, em geral com leitos rasos, permanecendo secos por meses e cujos
intervalos de estiagem variam a cada ciclo hidrológico.
No cariri onde o regime de chuvas é de verão, é domínio da frente equatorial
continental (fEc), gerada pela massa de ar equatorial continental (mEc), e seu deslocamento não
atinge grandes distâncias, não adentrando muito para o interior, ocasionando a estiagem.
A massa de ar tropical continental e a massa de ar tropical atlântica são as mais
importantes, por conseguinte, principalmente no verão, para favorecer a ocorrência das chuvas.
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Nesse mesmo período do ano, a massa de ar equatorial atlântica (mEa), constituída pelos ventos
alísios não consegue ultrapassar o litoral nordestino, enquanto, no inverno avança muito, cedendo
lugar, no Nordeste, à mEc, quente e úmida, dotada de grande instabilidade.
Embora os ventos alísios, reforçados pela massa polar fria atlântica, nos meses de
inverno, consigam atingir o interior, a sua influência torna-se cada vez mais fraca à medida que
caminham em direção ao interior. Isto porque ao ascenderem nas primeiras elevações da costa,
sofrem aquecimento, tornando-se ventos ressecantes.
As precipitações que deveriam ser mais regulares no Nordeste são as comandadas
pela FIT, embora localizada ao norte do equador, no hemisfério norte. Ela é, porém, caracterizada
por sensíveis perturbações meteorológicas, ficando incerta no espaço e no tempo, logo, pode ou
não alcançar a região nordestina e, quando de sua ausência, sobrevêm os períodos de estiagem
prolongada, também conhecidos regionalmente por “secas”.
As estações chuvosas no sertão ocorrem, conseqüentemente, entre os meses de
janeiro e abril. Logo após esse período, esta massa desvia-se para o sul, deixando secos os meses
restantes.
Existe uma série de fatores que contribuem para a existência dos climas áridos, semi-
áridos e desérticos. Muitas vezes, apenas um fator pode ser determinante, outras vezes pode haver
a combinação simultânea de fatores que vão determinar as diferenças desses climas na superfície
terrestre. Dentre eles, podemos citar: a) a existência de uma corrente marinha fria, que dificulta a
evaporação das águas oceânicas reduzindo a umidade atmosférica, ocasionando a formação de
uma área seca mesmo que ela esteja próxima ao litoral, como é o caso do deserto de Atacama, no
Chile; b) os fatores topográficos são outra variável. O relevo e a altitude atuam formando
barreiras impedindo a chegada dos ventos úmidos do litoral para o interior. Esses fatores
topográficos provocam a existência de uma frente úmida, chamada de vertentes a barlavento e
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uma outra seca, chamada vertente a sotavento; c) a circulação das massas de ar também são
responsáveis pela precipitação e umidade de determinadas áreas da superfície terrestre, mas
devido a sua posição geográfica essas massas podem atuar sem uma carga de umidade suficiente
causando a redução de chuvas em determinadas localidades e d) a existência de um centro
permanente de alta pressão atmosférica varia de acordo com a altitude, ou seja, quanto menor a
altitude maior será a pressão atmosférica desse local e vice-versa. Portanto, as áreas deprimidas
do relevo terrestre correspondem às áreas de alta pressão atmosférica (anti-ciclônica), que são
dispersoras de ventos e não concentradoras de umidade.
Os fatores mencionados podem ser responsáveis pela formação de climas áridos,
semi-áridos e até desérticos em algum lugar na superfície terrestre, entretanto, no caso do
Nordeste brasileiro, com a exceção da corrente marinha, pois a nossa é quente, a junção dos
demais fatores contribuem para definir as condições de semi-aridez do cariri e sertão paraibano: o
planalto da Borborema intercepta a chegada de frentes úmidas provenientes do litoral, as massas
de ar seco que chegam à região têm sua umidade reduzida, e a região esta localizada em uma área
de alta pressão.
Estas são as causas principais que determinam o aparecimento das “secas” no interior
do Nordeste, em média uma vez em cada década. Como vemos, a seca é de fato, um fenômeno
natural e, em parte, fator determinante de algumas atividades econômicas, sobretudo as
agropastoris, mas ela não pode ser responsabilizada pelos índices de pobreza e
subdesenvolvimento da região, mesmo porque nem todo Nordeste é seco.
16
2.3 Os processos de degradação das terras do semi-árido
Desde a colonização, a caatinga vem sendo explorada, o processo de utilização do solo
para a prática da agricultura que se faz presente (principalmente de subsistência), pecuária, que é
praticada de forma extensiva, extração mineral e vegetal e assim, o processo de devastação da
vegetação da Caatinga foi cada vez mais se intensificando. Essa utilização, em alguns momentos,
de forma indevida, acaba por propiciar uma mudança no ritmo dos elementos formadores desse
bioma. Essa alteração no ritmo desencadeia mudanças no ambiente, com um elevado índice de
degradação em algumas regiões, com isso pode-se identificar “manchas” desnudas de vegetação,
expondo assim o solo aos agentes intempéricos, acarretando processos erosivos provocados pelo
escoamento superficial, que vão degradar os solos, tirando destes a pouca formação pedogenética.
De acordo com Rosa (2005, p. 31) o susbstrato cristalino por estar localizado muito próximo à
superfície do relevo favorecem as formações de enxurradas erodindo a camada de solos em
direção à jusante dos cursos d’água.
A desagregação das partículas do solo se dá através principalmente das chuvas e do
vento, mas, o homem é o fator que mais contribui para o seu desenvolvimento. Na tabela 1,
mostramos o tamanho das partículas segundo LEINZ (1980). A meteorização – transformações
das rochas em solo sob a ação dos fenômenos climáticos e biológicos – vem modelando as várias
formas de relevo ao longo do tempo no nordeste brasileiro. Estas formas decorrentes das
modificações climáticas acompanharam a modificação da drenagem, suposta endorreica em
períodos anteriores para uma drenagem parcialmente exorreica atualmente.
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Tabela 01 – Tamanho das partículas de solos.
Diâmetro (mm) WENTWORTH
Diâmetro (mm) ATTERBERG
Matacão 256 200 Blocos (Cascalho grosso) 64 – 256 20 – 200 Seixos (Cascalho fino) 4 – 64 2 – 20 Grânulo 2 – 4 Areia grossa 1/4 – 2 0,2 – 2 Areia fina 1/16 – 1/4 0,02 – 0,2 Silte 1/256 – 1/16 0,002 – 0,02 Argila < 1/256 < 0,002 Fonte: LEINZ, (1980)
2.4 As formas de conservação do solo
A cobertura vegetal tem como efeito a interceptação da precipitação, causando o
amortecimento da chuva protegendo o solo contra a erosão, e reduzindo os efeitos do escoamento
superficial. De acordo com Araujo (2002, p.45).
as áreas que dispõem de cobertura vegetal plena são consideradas ambientes de estabilidade, tendo em vista que os processos mecânicos da morfogênese têm pequena participação nesses meios, em decorrência de que a vegetação possa agir com elemento amortecedor da energia cinética das gotas das chuvas, diminuindo o processo erosivo e o escoamento superficial
O controle da manutenção da cobertura vegetal nas áreas de caatinga é quase sempre
impossível, o que gera problemas para a preservação dos solos, refletindo nos processos erosivos.
O reflorestamento é uma das atividades indicadas para a preservação das vertentes, mas na
maioria das vezes se torna inviável economicamente.
Nas áreas em que ocorre o cultivo agrícola, o mais indicado é o uso de plantio em
curvas de nível, para que o escoamento seja reduzido. Em alguns locais é indicado o
terraceamento e plantio de vegetação em sentido perpendicular à declividade da encosta.
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2.5 A diversidade da Caatinga e sua importância para a região do Cariri
O Nordeste brasileiro tem a maior parte de seu território coberto pela vegetação de
Caatinga, que se distribui pelos estados do Ceará, Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco,
Sergipe, Alagoas, Bahia, parte do Piauí e norte de Minas Gerais, e apresenta uma grande
diversidade, encontradas nas mais diferentes situações edafoclimáticas (Agreste, Cariri, Carrasco,
Seridó, Sertão, entre outros). Sua hidrografia é formada em sua maioria pôr rios intermitentes. A
temperatura média fica em torno de 27°C e a precipitação apresenta variações de 250 mm – 1000
mm com ocorrência de déficit hídrico em virtude das altas temperaturas e a evapotranspiração.
Durante um período de estiagem prolongado, a Caatinga se torna praticamente branca (na língua
indígena Caatinga significa - Mata Branca), essa é uma descrição da caatinga durante a seca,
mas nem sempre é assim, com a chegada das chuvas a terra e o verde tomam conta da região
deixando a mata toda florida. Mesmo quando chove, somente em algumas áreas, onde a
abundância de chuvas é maior, e os solos são mais profundos – áreas de sedimentação ou
deposição, geralmente várzeas e/ou junto às margens ou à foz dos rios, para onde os sedimentos
são carreados proveniente do trabalho de erosão, a agricultura se torna possível.
A vegetação ao longo do tempo vem adaptando-se ao clima predominante na região.
Algumas plantas armazenam água, como os cactos; o umbuzeiro; outras se caracterizam por
terem raízes praticamente na superfície do solo para absorver o máximo da chuva.
A Caatinga é coberta por solos relativamente férteis. Embora não tenha potencial
agrícola. A região é rica em recursos genéticos, possuindo uma grande biodiversidade. Nos
períodos “bons”, quando ocorrem as chuvas, a vegetação ganha um colorido diversificado das
flores, e o solo fica coberto de plantas herbáceas.
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A Caatinga no Cariri é constituída principalmente de espécies lenhosas e herbáceas
de pequeno porte, apresentam em sua comunidade vegetal três estratos: arbóreos, acima de 3 m
de altura, arbustivo de 1,5 a 3 metros e o herbáceo, abaixo de 1,5 metros. De acordo com Teles
(2005), a maior parte do território municipal é coberta por caatinga arbustiva, conforme pode ser
observado na Tabela 2.
Tabela 02 – Estimativa da ocupação da vegetação da caatinga, solo exposto e águas superficiais no município de São João do Cariri – PB.
Tipos Porte da Vegetação Denominação Sub área Sub área Altura (m) (km²) (%)
Caatinga arbórea > de 3m C¹ 258.529 37% Caatinga arbustiva de 1,5 a 3m C² 328.074 47% Caatinga sub arbustiva + cultivo < de 1,5m C³ 77.578 11% Solo exposto Solo 30.594 4,60% Águas superficiais Água 3.204 0,40% Área total 697.979 100% Fonte: Teles, (2005).
A vegetação no cariri é constituída por espécies que tem um grande poder de
adaptação à temperatura elevada e a baixa umidade, e conseguem reerguer-se naturalmente em
áreas muito alteradas, devido ao seu grande poder de regeneração e capacidade de ficar por
longos períodos em estágio de dormência, desde que essa área não seja mais degradada pelo
homem.
De acordo com Braga (1976) a caatinga apresenta uma grande diversidade na sua
flora, apesar de vir sendo explorada a bastante tempo, ainda podemos observar a presença de
várias espécies típicas, tais como: angico (Piptadenia macrocarpa), catingueira (Caesalpinia
pyramidaleis), facheiro (Pilosocereus squamosus), faveleira (Cnidosculus phyllacanthus),
jurema-preta (Mimosa verrucosa), macambira (Bromelia laciniosa), mandacaru (Cereus
jamacaru), marmeleiro (Croton sincorensis), mofumbo (Combretum leprosum), pinhão bravo
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(Jatropha pohliana), xique-xique (Pilosocereus gounellei), entre outras. O bioma caatinga tem
grande importância para o cariri, sua conservação e preservação devem ser difundidas e
explorada de forma racional, sendo pelo potencial forrageiro, medicinal – diversas de suas plantas
são utilizadas pela população nativa como medicamentos, sendo possível encontrar nas feiras
livres cascas, folhas e raízes – madeireiro e faunístico.
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3 Material e Métodos
3.1 Descrição Geral da Área Estudada
Localizado na parte central do Estado, mais precisamente na Microrregião do Cariri
Oriental Paraibano, o município de São João do Cariri possui uma área territorial de 701,856
km2, sendo um dos mais antigos do estado da Paraíba. Foi criado pela Lei nº 540 de 15/11/1831.
A sede do município localiza-se sob as coordenadas - 07º23’27” de Latitude Sul e 36º31’58” de
Longitude Oeste (FIG 01), ficando a uma distância de 213,8 km da capital do Estado. O
município é cortado pelo rio Taperoá, que dá nome à sub-bacia que deságua na bacia do Paraíba
que corta grande parte do Estado da Paraíba; a altimetria varia entre 400 e 600m ficando sua
maior parte em torno dos 500m, e na sede apresenta altitude de 458m. O clima é quente e seco
com chuvas em curtos períodos e estação seca prolongada, caracterizando-se por apresentar
temperaturas médias anuais em torno de 25,5 ºC, e uma média pluviométrica em torno de
379,8mm.
A Microrregião do Cariri Oriental por sua vez fica compreendida na Mesorregião da
Borborema, entre o Agreste e o Sertão. Embora seja uma das regiões mais antigas do Estado, em
termos de povoamento, o Cariri apresenta os mais baixos índices de densidade demográfica do
Estado. Esta região caracteriza-se por apresentar uma vegetação baixa, muito espaçada e um solo
raso, arenoso e seco, apresentando ainda afloramentos graníticos. Essas características tornam-se
determinantes para aumentar a fragilidade do ambiente, favorecendo a instalação de processos de
degradação ambiental.
Município de São João do Cariri - PB
35º35º
35º35º
BRASIL
NORDESTE
PARAÍBA
0 460 920 km
0 10 20 30 4010 50 km
RN
PE
CE
FIGURA 01: Mapa de localização do Município de São João do Cariri, PB.
22
23
O município de São João do Cariri está incluso nessa porção do Estado paraibano,
apresentando condições semelhantes com pequenas variabilidades. Em seu quadro natural, pode-
se destacar a vegetação, que se constitui predominantemente de caatinga arbustiva arbórea. A
fisionomia dessa sub-formação é marcada por uma vegetação caducifólia, podendo ser aberta ou
fechada conforme a densidade e distribuição das espécies, sendo basicamente constituída por
estrato arbustivo e arbóreo, significativos e distintos.
3.2 Metodologia
O desenvolvimento do trabalho iniciou-se pelo levantamento bibliográfico existente
sobre o assunto. Em seguida optamos pôr trabalhar com duas escalas: regional e local ou de
detalhe. Na escala regional são identificadas as áreas que apresentam ausência de vegetação ou
solo exposto. Para isso utilizamos o mapeamento elaborado por Teles (2005), conforme
demonstra a Figura 02. Com base nessas informações da escala regional foi planejado um
trabalho de campo para dirimir as dúvidas e registrar algumas situações de interesse.
Foi utilizada também 24a imagem Landsat disponibilizada pela EMBRAPA, na
escala de 1:25.000, onde a falsa cor permite a identificação das áreas com e sem cobertura
vegetal, cuja representação da vegetação é pela presença do verde e as demais cores ausência
(FIG 03).
Caatinga Arbórea (> 3m)
Caatinga Sub-Arbustiva (< 1,5 m)
Caatinga Arbustiva (> 1,5 m)
Solo exposto / Rios temporários
Águas superficiais
LEGENDA
9196 000
9186600
9177200
9167800
9158400
763400 769800 776200 782600 789000 795400
Classes de vegetação em São João do Cariri - PB
4.0 0 4.0 8.0 12.0 16.0 Km
.
Figura 02: Caracterização da vegetação.Fonte: Teles, 2005. 24
25
FIGURA 03: Composição colorida de imagem Landsat, demonstrando a área
do Município de São João do Cariri Fonte: EMBRAPA
Para uma melhor localização e planejamento do trabalho de campo foram utilizadas
cartas topográficas da SUDENE na escala 1: 100.000, sendo a Folha SB.24-Z-D-II de 1985
referente a Juazeirinho e a Folha SB.24-Z-D-III de 1986 respectiva a Boqueirão, onde a junção
das duas propicia a localização total do Município de São João do Cariri.
No trabalho de campo (escala local) os procedimentos foram de descrição das feições
e registro fotográfico, para avaliar as condições atuais e os aspectos das feições erosivas e das
26
formas de ocupação encontradas, e identificação de processos de degradação. Foram plotados os
pontos verificados em campo, os quais foram localizados com o auxílio de um Garmin GPS III.
Na escala local foram feitos croquis e medições de algumas voçorocas, isso para
melhor representar o modelado das feições dos processos erosivos observados, procurando
compreender a relação entre os processos que vêm ocorrendo, sejam de ordem antrópica ou
natural.
Foram analisados ainda os dados de precipitação pluviométrica coletados na Bacia
Escola da Universidade Federal da Paraíba, localizada próxima à sede do município de São João
do Cariri – PB.
27
4 Resultados e Discussão
4.1 Processos degradacionais observados.
A coleta de evidências no lugar nos permitiu um aprofundamento na questão relativa
à ocorrência da dinâmica de processos degradacionais. Os principais fatores responsáveis pelos
processos erosivos são: as chuvas, a falta da cobertura vegetal, as características das encostas e as
propriedades dos solos. A interação desses fatores faz com que a erosão aja mais em um lugar
que em outro. Encontramos na área de estudo situações diversificadas com relação à cobertura
vegetal (Figuras 04 e 05), o que faz com que os processos ocorram de forma distinta, em virtude
da densidade da cobertura vegetal encontrada. Essa apresenta diferentes níveis de degradação,
com alguns remanescentes de Caatinga hiperxerófila de porte arbóreo, localizados, sobretudo,
próximo aos cursos d’água e terraços fluviais, formando as matas ciliares. Há ainda uma
densidade maior da vegetação em áreas de serra e morros isolados. Ocorrem também extensões
de solos desnudos relativos à descontinuidade da cobertura vegetal, que na maioria dos casos é
onde se iniciam os processos erosivos.
FIGURA 04: Caatinga com indivíduos arbóreos e densidade vegetal considerável. Foto: Maria Barros, 01/2006.
FIGURA 05: Caatinga arbustiva com baixa densidade vegetal. Foto: Maria Barros, 01/2006.
28
A alteração da densidade vegetacional é modificada pela retirada do corpo residual
que compõe a superfície do solo imediatamente abaixo das copas vegetais, permitindo a
percolação superficial da água que favorece a erosão laminar (FIG 06). Essa acontece em duas
fases que se constitui da remoção e do transporte dos sedimentos pelos agentes erosivos.
FIGURA 06: Erosão laminar favorecida pela declividade do relevo e baixa densidade
vegetacional nas situações a e b. Foto: Maria Barros, 01/2006.
Os primeiros processos que ocorrem são os ravinamentos, por onde escoam as águas
que não infiltram nos solos, evoluindo em alguns casos para as voçorocas. Assim, a partir das
enxurradas, surgem as torrentes que lixiviam a parte superficial do relevo, permitindo o
empobrecimento do solo, o que acabará por dificultar o repovoamento vegetal.
As vertentes de encostas com fraca densidade vegetacional favorecem a erosão
laminar, que se dá por gravidade permitindo um deslocamento acentuado de massa em sentido as
áreas deposicionais. Em áreas em que a declividade é acentuada, os solos se tornam frágeis,
favorecendo a formação da morfogênese que se sobressai à pedogênese e esse fato é agravado
quando não se tem vegetação, pois esta servirá como obstáculo para o movimento dos
sedimentos, dificultando seu deslocamento.
a b
29
A paisagem antropizada com a presença de atividades sócio-econômicas, aponta para
uma situação de instabilidade ambiental, com situações pontuais onde se verifica processos
degradacionais com presença de ravinamentos, que em estágios mais avançados evoluem para
voçorocas (FIG 07).
FIGURA 07: Voçorocas instaladas em áreas onde ocorre pastoreio. Foto: Maria Barros, 01/2006.
4.2 Caracterização de áreas com Voçorocas.
Das voçorocas observadas, optamos por analisarmos duas distintas. A primeira a qual
denominamos de Voçoroca I, apresenta estágios iniciais de degradação; e uma segunda,
denominada Voçoroca II, onde os processos estão em estágios mais avançados.
A Voçoroca I (FIG 08), localiza-se na margem esquerda da rodovia BR-412 (sentido
Boa Vista – São João do Cariri).
a b
30
FIGURA 08: Croqui elaborado em campo da Voçoroca I com seus respectivos cortes seccionais.
De acordo com o que observamos, a Voçoroca I encontra-se em estágio inicial no que
diz respeito à erosão. Entendemos que isso esteja ocorrendo em função da vegetação que ainda
encontramos no local, principalmente onde esta a cabeceira da mesma, o que funciona como um
fator favorável para que o processo não atinja estágios mais acelerados de erosão.
Depois de feitas as primeiras observações, optamos por fazer algumas medições nas
feições da Voçoroca I. Essa mede cerca de 18,80m, com uma largura aproximada de 1,60m,
totalizando uma área aproximada de 30,08m² (Tabela 03). Foram feitos três cortes seccionais, no
sentido de saber o grau de erosão lateral que ocorre no sentido da desembocadura. No corte A-A’,
feito a 2,60m da cabeceira, a voçoroca media 1,10m de largura, com uma profundidade de 0,38m.
No corte B-B’ feito a feito 10,00m após o corte A-A’ a largura da voçoroca era de 1,80m, mas
com uma profundidade de 0,37m, portanto menor. No terceiro ponto que medimos a largura da
31
voçoroca foi de 2,00m e atingiu a profundidade de 0,41m. Observa-se que a profundidade nos
três pontos do canal não teve muita diferença, mas a largura sofreu grande alteração, chegando
próximo do dobro (Tabela 04).
Tabela 03 – Dados dos elementos da Voçoroca I.
VOÇOROCA I LOCALIZAÇÃO (UTM) M 0788205
9189446 Elementos dimensionais Dimensões Comprimento principal 18,80 m Largura 1,60 m Área aproximada (m²) 30,08 m²
Tabela 04 – Dados dos cortes seccionais da Voçoroca I.
CORTES SECCIONAIS (VOÇOROCA I) CORTES LARGURA (m) PROFUNDIDADE (m)
A – A’ 1,10 0,38 B – B’ 1,80 0,37 C – C’ 2,00 0,41
Diferentemente da Voçoroca I, a II localiza-se na margem direita da rodovia BR-412,
e apresenta estágios mais avançados de degradação, com uma área bem maior, em torno de
300m², com um comprimento de cerca de 30,00m e com largura de até 10,00m. Essa apresenta
dois canais principais (paralelos) com reentrâncias menores (FIG 09).
Nessa área degradada não há vegetação em seu entorno, o que acreditamos que veio a
favorecer o aceleramento da erosão, bem como a pecuária extensiva que também podemos
presenciar no momento da medição (FIG 10).
32
FIGURA 10: Pecuária extensiva na área da
voçoroca. Foto: Maria Barros, 01/2006.
FIGURA 09: Croqui elaborado em campo representando a Voçoroca II e seus respectivos cortes
seccionais.
Voçoroca II
33
Tivemos o mesmo procedimento utilizado na Voçoroca I, onde foram feitas algumas
medições e descrições das feições observadas. No primeiro canal fizemos apenas dois cortes, o
A-A’ e o B-B’. No corte A-A’ feito a 1,50m da cabeceira da voçoroca apresentava uma largura
de 1,80m e uma profundidade de 0,60m. No corte B-B’ feito a 16m da cabeceira, a largura
chegou a 3,30m e a profundidade mediu 0,55m. Observa-se que como no canal da Voçoroca I, o
erosionamento vertical apresentou redução, mas alargamento quase que dobrando. No segundo
canal foram feitos quatro cortes, sendo o corte C-C’ e o D-D’ em uma reentrância. O corte C-C’
próximo a cabeceira mede 1,55m de largura com 0,40m de profundidade. O corte E-E’ com uma
largura de 5m e 0,73m de profundidade é onde o processo apresenta-se mais aparente, com
afloramentos no leito do canal. As medições da Voçoroca II encontram-se apresentadas nas
Tabelas 05 e 06.
Tabela 05 – Dados dos elementos da Voçoroca II.
VOÇOROCA II LOCALIZAÇÃO (UTM) M 0781307
9187865 Elementos dimensionais Dimensões Comprimento principal 30 m Largura 10 m Área aproximada (m²) 300 m²
Tabela 06 – Dados dos cortes seccionais da Voçoroca II.
CORTES SECCIONAIS (VOÇOROCA II) CORTES LARGURA (m) PROFUNDIDADE (m)
A – A’ 1,80 0,60 B – B’ 3,30 0,55 C – C’ 1,55 0,40 D – D’ 2,30 0,57 E – E’ 5,00 0,73 F – F’ 2,30 0,48
Nessa segunda voçoroca, as dimensões são bem mais expressivas, chegando a
alcançar os micaxistos, que estão na camada subsuperficial do solo, conforme pode ser
34
visualizado na Figura 11, denotando o estágio em que se encontra a erosão na área da Voçoroca
II.
FIGURA 11: Estágios avançados de erosão da Voçoroca II.
O desmatamento ainda é uma prática comum no preparo da terra para a agricultura e
para a pecuária que, além de destruir a cobertura vegetal, vai gerar um desequilíbrio na interação
dos fatores abióticos - a qualidade da água, a degradação do solo - que acabam por interferir no
conjunto biótico, prejudicando a manutenção de populações vegetais e animais. Em alguns
lugares observa-se a derrubada da vegetação para o uso energético (FIG 12), que na maioria das
vezes é seguida de queimadas (FIG 13) cultivos e ou pastagens, que tem desencadeado a
instalação de processos erosivos. Desse modo vão aparecendo sulcos pela área, concentrados nas
vertentes, que vão desagregando as partículas de solo do relevo, levando o material para o nível
de base dos leitos.
35
FIGURA 12: Estocagem de madeira para uso
energético. 01/2006. FIGURA 13:Corte e queima da vegetação. Foto: Maria Barros, 01/2006.
4.3 A contribuição das precipitações para o início dos processos erosivos.
Sabe-se que os processos erosivos iniciam com o ciclo hidrológico. Com as
precipitações, parte da água é interceptada pelos vegetais, outra parte é evaporada ou infiltra no
solo. Com a saturação do solo, começa o escoamento e carreamento de material desagregado. A
precipitação é, portanto, um fator importante para a análise dos processos iniciais de degradação.
De acordo com os dados de precipitação pluviométrica coletada na sede da Bacia
Escola da Universidade Federal da Paraíba, localizada próxima da sede do município de São João
do Cariri – PB, verificamos que a distribuição das chuvas ocorre com maior freqüência entre
janeiro e abril, mas com ocorrências durante o ano todo. Analisando o período entre os anos de
1985 e 2005 (Tabela 07), verificou-se que o mês de março é o que ocorre mais precipitação, com
95,9mm e outubro é quando ocorre menor precipitação, com uma média de 4,4mm.
36
Tabela 07 – Média mensal entre o período de janeiro no intervalo de 1985 e dezembro de 2005.
Precipitação média mensal Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez 66,9 85,2 95,9 87,8 42,5 37,2 33,8 24,0 6,9 4,4 7,8 20,6
Fonte: Posto da Bacia Escola. São João do Cariri – PB
Nota-se também uma tendência para as irregularidades, com oscilações apresentando
muita dispersão, para mais ou para menos em relação à média pluviométrica do Município. De
acordo com a Tabela 08 verifica-se uma irregularidade muito grande na distribuição das chuvas,
com 1.178,5mm em 1985 e apenas 82,6 em 1993. Porém a média nesses vinte e um anos
analisados está bem acima da média histórica para o Município, que fica em torno de
379,8mm/anuais. Portanto, não vem ocorrendo a diminuição progressiva das chuvas.
A ocorrência de períodos sem chuvas regulares (estiagens) ocorreu poucas vezes
nesse intervalo, sendo o ano de 1993 o mais rigoroso período seco, com as precipitações
chegando somente a 82,6mm/anuais.
37
Tabela 08 – Dados de precipitação no período de janeiro de 1985 a dezembro de 2005.
Estação convencional - total de precipitação no período de janeiro de 1985 a dezembro de 2005 Total ANOS Mês Anual
Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez ( mm ) 1985 40,0 377,0 228,5 382,0 15,5 63,5 28,0 19,0 0,0 0,0 23,0 2,0 1178,5 1986 108,5 198,5 198,0 105,0 35,8 50,2 39,4 46,9 0,0 0,0 6,9 0,0 789,2 1987 31,0 93,5 204,5 64,5 6,5 30,5 34,0 2,1 1,6 3,0 0,0 0,3 471,5 1988 20,0 196,5 91,4 330,0 29,5 41,5 45,0 1,6 0,8 0,3 5,5 30,5 792,6 1989 12,4 0,0 63,2 191,0 51,9 30,6 44,7 30,0 0,6 2,1 1,5 178,8 606,8 1990 2,9 74,2 0,0 22,3 29,5 23,6 10,9 23,6 12,9 4,1 0,3 0,3 204,6 1991 0,2 12,5 144,1 10,3 48,5 14,2 11,0 25,1 3,4 0,1 8,6 0,0 278,0 1992 211,1 54,4 49,6 93,3 8,5 19,4 36,9 16,6 35,3 0,0 1,3 0,0 526,4 1993 2,3 0,0 0,4 1,0 10,5 19,0 24,5 9,6 0,1 13,7 0,0 1,5 82,6 1994 111,1 26,9 69,2 19,8 123,6 4,2 21,7 6,2 16,2 0,0 0,0 26,2 425,1 1995 0,0 107,9 107,8 73,5 103,6 24,6 53,4 1,5 1,3 0,0 73,0 0,0 546,6 1996 99,6 4,1 106,2 122,9 5,6 20,7 52,7 17,1 8,1 1,0 20,4 0,0 458,4 1997 69,4 30,6 106,5 68,4 55,8 15,9 22,0 20,9 5,0 0,0 4,1 0,0 398,6 1998 11,5 0,0 11,5 9,5 19,4 18,4 16,5 38,0 0,0 0,0 0,0 0,0 124,8 1999 1,2 4,8 35,6 1,7 43,0 20,4 37,0 3,6 0,5 7,9 0,1 29,2 185,0 2000 172,1 144,5 142,8 162,5 50,8 35,7 57,8 43,8 20,9 3,9 1,4 50,0 886,2 2001 22,2 0,3 134,5 12,6 1,6 81,6 34,2 31,2 18,1 51,7 0,0 11,1 399,1 2002 123,0 202,4 86,6 3,0 99,2 70,4 28,2 9,1 0,0 3,7 11,0 5,0 641,6 2003 68,4 30,1 23,8 47,4 14,5 21,7 5,5 99,4 13,7 0,5 1,1 0,0 326,1 2004 280,6 165,1 70,9 15,7 41,6 55,5 99,6 9,5 5,6 0,0 2,7 0,8 747,6 2005 17,3 65,8 139,3 106,8 98,0 119,1 6,2 48,5 1,0 0,0 2,5 97,4 701,9
Média Anual ( mm ) 512,9 Fonte: Posto da Bacia Escola. São João do Cariri – PB
38
A partir desses dados, observa-se que as precipitações no Município nesse intervalo
ocorreram com a predominância de períodos com alta concentração pluviométrica em curto
espaço de tempo. No ano de 1985, por exemplo, verificou-se um total de 382,0mm apenas no
mês de abril, superando a média anual do Município. A ocorrência de chuvas torrenciais
favorece o escoamento superficial, pois, o solo não consegue absorver a totalidade da água
precipitada que é maior que a capacidade de infiltração do solo.
39
5 Considerações
Ao final do estudo constatamos a ocorrência de degradação na área, com a presença
de processos erosivos fortes, conforme foi demonstrado através dos registros fotográficos
realizados na verificação feita em campo. Esses processos vêm ocorrendo em função
principalmente da retirada da cobertura vegetal para o consumo da energia, bem como o
pastoreio extensivo.
Observou-se a falta de vegetação em áreas consideradas de preservação permanente,
como é o caso das matas ciliares, o que revela um dos fatores marcantes para o aceleramento
dos processos de degradação da área, para os quais consideramos a necessidade de um
diagnóstico dos níveis de degradação a fim de elaborar um plano de recuperação para essas
áreas, pois, acreditamos que a preservação das mesmas é de extrema importância para a
manutenção dos cursos d’água e das populações ali residentes.
Se faz necessário estudos mais aprofundados sobre a vocação do lugar em termos
culturais para a utilização da caatinga de forma mais eficaz e de maneira sustentada, onde não
houvesse tanta interferência no meio natural, o que acarretaria em novas situações de alcance de
novo equilíbrio para o ambiente.
40
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