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Abril de 2007 • Ano 4 • nº 33 www.desafios.org.br do desenvolvimento desafios Abril de 2007 • Ano 4 • nº 33 desafios E-GOV Brasil é 17º colocado no ranking mundial de governo eletrônico. As prefeituras precisam melhorar DESIGUALDADE Estudos do Ipea analisam por que as políticas de desenvolvimento regional falham MEXA-SE Pesquisa inédita mostra a relação dos brasileiros com o esporte. Caminhada supera futebol como atividade predileta S.O.S. Museus Falta de público, recursos e profissionais qualificados prejudica as cerca de 2,2 mil instituições existentes no Brasil. Mais de 70 já fecharam as portas R$ 8,90

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A b r i l d e 2 0 0 7 • A n o 4 • n º 3 3 w w w . d e s a f i o s . o r g . b r

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Abril de 2

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33

desafios

E-GOVBrasil é 17º colocado no ranking mundial de governo eletrônico. As prefeituras precisam melhorar

DESIGUALDADEEstudos do Ipea analisam por que as políticas de desenvolvimento regional falham

MEXA-SEPesquisa inédita mostra a relação dos brasileiros com o esporte. Caminhadasupera futebol como atividade predileta

S.O.S. MuseusFalta de público, recursos e prof issionais qualif icados prejudica as cerca de

2,2 mil instituições existentes no Brasil. Mais de 70 já fecharam as portas

R$ 8,90

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Alexandre de Avilla GomidePedágio urbano: sou a favor

Helder FerreiraPunição: vingança ou prevenção?

desafiosdo desenvolvimento

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Entrevista Paul DempseyEspecialista em mercado de aviação avalia crise mundial que afeta companhias

Tecnologia Combustível com futuroBrasil precisa investir para aproveitar crescimento do consumo mundial de álcool

Políticas Públicas O equilíbrio na diversidadeSó ações integradas poderão reduzir disparidades no desenvolvimento regional

Cultura Museus à beira de um ataque de nervosInstituições pedem socorro. E desde 2003 há um sistema federal para geri-las

E-Gov Cidadania on-lineRanking de governo eletrônico da ONU classifica Brasil na 17ª posição

Esporte A pátria das bicicletas, quimonos, raquetes e chuteirasO brasileiro gosta de suar a camisa. Pesquisa mostra como, quando, onde e por quê

Melhores Práticas Remédio para tudoCom acesso ao patrimônio genético nacional, a Extracta investe num novo antibiótico

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Sumário

Artigos

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SUMARIO 04/04/07 11:58 Page 4

6 Desafios • abril de 2007

Ao contrário do ocorrido na edição passada, desta vez foi muito fácilescolher a reportagem que seria capa: toda a equipe ficou impressionadacom a situação caótica vivida pela maioria dos museus brasileiros.Falta de público e de verbas não foi surpresa, mas a carência deprofissionais capacitados e a ausência de um sistema de gestão queotimize o funcionamento das instituições, isso, sim, foi novidade.Por todos esses motivos, decidimos estampar na capa o sincero pedido de socorro dos museus, que precisa urgentemente ser ouvido pelasautoridades ligadas à cultura e à educação. Já que estamos discutindogestão, na entrevista desta edição, Paul Dempsey, um dos mais respeitadosespecialistas em regulação do setor de transportes aéreos, evita sercategórico, mas afirma que, desde que os Estados Unidosdesregulamentaram o mercado, as linhas aéreas só acumulam perdasfinanceiras. De quebra, sugere que o Brasil autorize maior participação de capital estrangeiro nas companhias aéreas. Por outro lado, o governomarca um ponto positivo na reportagem “Cidadania on-line”. Ocupandoo 17º lugar no ranking da Organização das Nações Unidas de governoeletrônico, o Brasil mostra competência. Desde a entrega da declaração de Imposto de Renda até o agendamento de perícias médicas, o brasileiropode resolver muitos problemas apenas clicando no mouse. Com essesavanços, ganha tempo para dedicar-se a outras tarefas mais prazerosas,como praticar ou acompanhar esportes. Esse é o tema da reportagem da página 46, que apresenta uma ampla pesquisa sobre a relação dosbrasileiros com o esporte. O futebol continua sendo o maior alvo daspaixões, mas não é a modalidade mais praticada. A caminhada é aatividade predileta de homens e mulheres. A matéria mostra como,quando e por qual motivo a população, de todos os cantos do país,se coloca em movimento. E, por falar na população de todos os cantos,a reportagem “Equilíbrio na desigualdade” analisa as políticas dedesenvolvimento regional e mostra que, apesar de bem-intencionadas,até agora elas não conseguiram diminuir a distância que separa oshabitantes do Brasil pobre do remediado e do rico. Problema difícil, masque precisa ser enfrentado sob pena de continuarmos com nossa imensapátria fragmentada. Boa leitura!

Andréa Wolffenbüttel, Jornalista Responsável

Cartas ou mensagens eletrônicas devem ser enviadas para: cartas@desaf ios.org.brDiretoria de redação: SBS Quadra 01, Edifício BNDES, sala 801 - CEP 70076-900 - Brasília, DFVisite nosso endereço na internet: www.desaf ios.org.br

Carta ao leitor

Patrocínio

desafiosdo desenvolvimento

www.desafios.org.br

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea)PRESIDENTE Luiz Henrique Proença Soares

Programa das Nações Unidas para oDesenvolvimento (Pnud)REPRESENTANTE INTERINO NO BRASIL Kim Bolduc

DIRETOR-GERAL Luiz Henrique Proença Soares

ASSISTENTE Mary Cheng

CONSELHO EDITORIAL Andréa Wolffenbüttel,Alexandre Marinho, Bruno Araújo, Divonzir Gusso,Francisco Gaetani, João Carlos Magalhães,Leonardo Rangel, Luiz Fernando L. Resende,Luiz Henrique P. Soares, Mary Cheng,Murilo Lobo, Pérsio Davison

RedaçãoSBS Quadra 01, Edifício BNDES, sala 801CEP 70076-900 - Brasília, DFTel.: (61) 3315-5188 Fax: (61) 3315-5031

JORNALISTA RESPONSÁVEL Andréa Wolffenbüttel

ColaboradoresTEXTO Anderson Gurgel, Eliana Simonetti,Gustavo de Paula, Lia Vasconcelos, Marina Nery,Ottoni Fernandes Jr. e Sucena Shkrada Resk

FOTOGRAFIA Marcelo Hollanda

ILUSTRAÇÃO Orlando Pedroso

REVISÃO Ivana Gomes

ARTE E DIAGRAMAÇÃO Renata Buono DesignRenata Buono, Rafaela Ranzani e Luciana Sugino

FOTO DA CAPA Fernando Bueno

Circulação e PublicidadeRua Urussuí, 93, 13° andarCEP 04542-050 - São Paulo, SPTel./Fax: (11) 3073-0722

Administração Instituto UniempAv. Paulista, 2198, conjunto 161CEP 01310-300 - São Paulo, SPTel.: (11) 2178-0466 Fax: (11) 3283-3386

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Impressão Prol Editora Gráfica

Distribuição Fernando Chinaglia Distribuidora S/A

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

Organização das Nações Unidas

OS ARTIGOS E REPORTAGENS ASSINADOS NÃO EXPRESSAM, NECESSARIAMENTE,A OPINIÃO DO IPEA E D OPNUD.É NECESSÁRIA A AUTORIZAÇÃO DOS EDITORES PARA A REPRODUÇÃO TOTAL OU PARCIAL

DO CONTEÚDO DA REVISTA.

CARTA+EXPEDIENTE 04/04/07 12:00 Page 6

8 Desafios • abril de 2007

GIRO

Às vésperas de completar 47 anos,Brasília,PatrimônioHistórico da Humanidade, está malconservada parasua pouca idade. Professores do grupo de pesquisaPatologia, Recuperação e Manutenção de Estruturas,do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental daUniversidade de Brasília (UnB), que acompanham adeterioração dos monumentos desde 1995, divulga-ram um relatório preocupante. Quase todos os edifí-cios construídos há mais de quatro décadas têm pro-blemas estéticos,funcionais ou estruturais.A catedralde Brasília, cuja estrutura data de 1960, apresenta fis-suras nos pilares; e a fachada do Museu Histórico, na

praça dos Três Poderes,está com o mármore rachado.Esse tipo de deterioração é perigosa porque afeta asarmaduras internas de aço.Já o aço visível das escadasdo Palácio do Itamaraty está corroído. Há ainda ou-tros tantos problemas para resolver nas edificaçõesda capital federal, desenhada pelo arquiteto OscarNiemeyer, que têm uma marca: são de concretoaparente, o que as deixa mais vulneráveis à ação dotempo. Como existem falhas no cadastro técnico dasedificações, os pesquisadores propõem a criação deum acervo reservado para a memória da construçãocivil de Brasília no Museu da República.

Pesquisa da Faculdade de SaúdePública da Universidade de SãoPaulo (USP) avaliou o estado nu-tricional de alunos da rede pú-blica da capital paulista, com ida-de de 7 a 10 anos. Detectou que aobesidade em crianças, principal-mente no sexo masculino, é maisfreqüente do que a desnutrição.De 112 crianças estudadas, 8%

estavam desnutridas, 23% tinhamexcesso de peso, 28% estavamobesas e 40% registravam pesonormal. O trabalho foi apresenta-do como tese de mestrado porCarolina Menezes Ferreira,que re-comendou a implantação de aulasde educação nutricional nas esco-las. Segundo ela, é costumeiro queas crianças façam apenas três re-

feições ao dia (as que são ofereci-das nas escolas), quando o idealseriam cinco a seis refeições diá-rias. E não são registradas ati-vidades físicas suficientes paraqueimar as calorias ingeridas. Suapreocupação: a obesidade impli-ca maior probabilidade de desen-volvimento de doenças como hi-pertensão e diabetes.

Pesquisa Andréa Wolffenbüttel Texto Eliana Simonetti

Preservação

Obras de Brasília pedem socorro

Alimentação e saúde

Gordinhos e gordinhas

Monitordas reformas

O Congresso viveu um marçoagitado. Preocupados com opróprio reajuste salarial, oPlano de Aceleração do Cres-cimento (PAC) e a CPI do Apa-gão Aéreo, congressistas de-ram pouca atenção às refor-mas. A exceção foi a reformapolítica, que está no centro dodebate, especialmente depoisda declaração, pelo TribunalSuperior Eleitoral, de que omandato é do partido, e não docandidato eleito. Porém, antesdisso já havia sido instalada aFrente Parlamentar pela Re-forma Política com Participa-ção Popular; e o presidenteda Câmara, Arlindo Chinagliaaproveitou para prometer quea reforma será votada até ofinal de maio. Fora isso, sóduas referências. A primeiraveio do deputado Antonio Pa-locci, que defendeu a imple-mentação gradual de umaampla reforma previdenciá-ria. E a segunda partiu da Co-missão de Educação e Cultura,que pediu o desarquivamentoda reforma universitária, en-gavetada no final da legisla-tura passada.

Embratur

giro 04/04/07 12:02 Page 8

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Brasil e Japão

De olhos bem abertos

Durante o mês passado, todas asatenções estavam voltadas para oresultado da visita do presidentenorte-americano ao Brasil. Mas,enquanto os holofotes ilumina-vam George W. Bush, japoneses ebrasileiros trabalhavam para es-treitar as relações comerciais en-tre os dois países.Entre os dias 12e 15 de março, sessenta empresasbrasileiras, sob coordenação daAgência de Promoção de Expor-tações e Investimentos (Apex),participaram da maior feira dealimentos da Ásia, a Foodex, coma expectativa de fechar negóciosde até 30 milhões de dólares. AEmbraer assinou acordo para avenda de dez jatos EMB 170 paraa Japan Airlines e aguarda confir-mação de encomenda de maiscinco aviões. Um encontro doComitê de Cooperação Econô-mica Brasil-Japão, em São Paulo,reuniu dirigentes de empresas eautoridades de governo dos doispaíses – e os debates giraram emtorno do fato de que a estabili-dade econômica, as instituiçõesdemocráticas e o mercado con-sumidor justificam investimentosno Brasil. Nesse ponto, parece ha-ver acordo. Desde o início do ano

passado, o JBIC, banco de fo-mento do Japão semelhante aobrasileiro Banco Nacional de De-senvolvimento Econô-mico e So-cial (BNDES), negocia um em-préstimo de 1,3 bilhão de dólarespara o desenvolvimento de pes-quisas, lavouras e instalações in-dustriais para a produção de bio-combustíveis. Desse total, mais de85 milhões de dólares seriamdestinados à Empresa Brasileirade Pesquisa Agropecuária (Em-brapa) – a fundo perdido. O mer-cado japonês não é nada despre-zível. Pode chegar a 6 bilhões delitros anuais até 2010 com a de-terminação de adição de 3% deetanol à gasolina.

As mudanças climáticas do plane-ta trouxeram,pelo menos,uma boanotícia para o Brasil.Como as chu-vas foram bem distribuídas pelopaís,e as plantas se nutrem do CO2

que tem sido lançado em excessona atmosfera, a safra de grãos de-verá ser recorde – mesmo com umaárea plantada 3,5% inferior à doano passado. O sexto levantamen-

to nacional do ciclo 2006/2007,realizado pela Companhia Nacio-nal de Abastecimento (Conab) emfevereiro, prevê produção de 127,6milhões de toneladas – 5,7% maisdo que a marca passada – e que asexportações deverão ser, também,maiores. Das quase 50 milhões detoneladas de milho que serão co-lhidas, por exemplo, 6,5 milhões

deverão ser embarcadas para o ex-terior, especialmente para os EUA,cujo consumo tem aumentado emrazão do crescimento da produçãode etanol.A notícia é especialmentepositiva porque os preços interna-cionais desses produtos estão emalta. Pena que os produtores nãotenham apostado nos resultados eplantado ainda mais.

Entre 1989 e 2006, foi registradaqueda de 40% no número de adul-tos fumantes no Brasil,o que é umfeito positivo. Segundo a Orga-nização Pan-Americana de Saúde,o fumo é responsável pela mortede mais de 1 milhão de pessoaspor ano nas Américas.Agora, emlinha com a Convenção-Quadropara o Controle do Tabaco daOrganização das Nações Unidas(ONU), o Brasil, que permanecemaior produtor e segundo maiorexportador de tabaco do mundo,pretende reduzir a oferta do pro-

duto.A empreitada não é fácil,poisa atividade é bastante lucrativa,mas o governo busca maneiras delevar os agricultores a mudar deramo. Técnicos do Ministério daFazenda estudam a cobrança, aosetor fumageiro, da Contribuiçãosobre Intervenção do Direito Eco-nômico (Cide),hoje incidente so-bre combustíveis. E já existem ex-periências de substituição do cul-tivo do fumo por girassol, utiliza-do para a produção de biodiesel,epor árvores,cuja madeira é vendi-da à indústria moveleira.

Tabaco

Obrigada por não plantar

No século XVIII,o ouro de MinasGerais era transportado pela Es-trada Real – um caminho estreitoque se estende por 1,4 mil qui-lômetros e atravessa Minas Gerais,Rio de Janeiro e São Paulo. O pas-seio, com paisagens belíssimas,atrai turistas, mas tem potencialpara muito mais.Para estimular asvisitas, desde junho do ano passa-do empresários (250, até o mo-mento), o Programa das Nações

Unidas para o Desenvolvimento(Pnud) e o Banco Interamericanode Desenvolvimento (BID) estãoinvestindo em profissionalização ecapacitação de pessoal, e na for-matação de novos produtos. Aidéia é desenvolver pacotes parapúblicos específicos, interessadosem ecologia,produtos orgânicos eturismo de aventura. Os idealiza-dores contam com o apoio de con-sultores estrangeiros.

Turismo

Um caminho que vale ouro

Nova supersafra

Vantagem passageira do efeito estufa

Rogério Reis/Petrobras

Agên

cia

Rura

l/Goi

ás

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O que pude verif icar nos Estados Unidos é que, após a desregulação ENTREVISTA

Leo Pinheiro/Valor/Folha

ENTREVISTA 04/04/07 12:05 Page 10

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Desafios - Com essa perspectiva tripla do

mercado de aviação, o senhor considera que o

Brasil deve ou não mudar o controle aéreo para

mãos civis?

Dempsey - Em primeiro lugar, é pre-ciso analisar sempre o mercado aéreode um país de acordo com suas espe-cificidades. As características chinesasjamais serão as mesmas das indianas,por exemplo. Em relação ao caso bra-sileiro, trata-se de analisar eficiência ecusto. É mais caro o controle civil ouo militar? Em qual deles há mais segu-rança para o passageiro? Qual deles o-casionará mais atrasos e congestiona-

mentos? São variáveis desse gêneroque necessitam ser levadas em conta.Mesmo em outros países em que os ci-vis mantêm o controle, há muita infra-estrutura em mãos militares. O Brasiltambém deve refletir em qual vertentepoderá haver controle político exacer-bado por autoridades de governo. Nãovou me arriscar a dar uma opinião emfavor de um controle ou de outro, atéporque não sou um estudioso das con-dições específicas do Brasil, mas estoufornecendo as variáveis que precisamser avaliadas para uma tomada de de-cisão nesse assunto.

Desafios - Como especialista em regulação do

espaço aéreo, o senhor defende um mercado

mais, ou menos, regulado?

Dempsey - O que pude verificar nosEstados Unidos é que, após a desregu-lação da indústria aérea, em 1978, asperdas financeiras cresceram progres-sivamente. Na era pré-regulação nosEstados Unidos não houve falência decompanhias aéreas. Mas em 1981-1982 duas grandes companhias aéreasamericanas faliram e uma foi liquida-da. As perdas financeiras do mercadoaéreo foram da ordem de 1,4 bilhãode dólares. De 1990 a 1994, cinco

da i ndústr ia aérea , em 1978, as perdas f i nance i ras cresceram progress i vamente

Poucos profissionais entendem tanto do mercado de aviação quanto Paul Stephen Dempsey.Afinal, como ele mesmo diz, sua perspectiva tem pelo menos três visões: a de ex-advogado deuma extinta agência de regulação da aviação norte-americana (Civil Aeronautics Board), a de

acadêmico de economia (professor do Institute of Air & Space Law, da McGill University, no Canadá)e a de empresário preocupado com os negócios, proprietário da bem-sucedida Frontier Airlines, quecomeçou com duas aeronaves em 1994 e hoje já possui 55, que voam nos Estados Unidos, no México eno Canadá.Do alto de toda essa experiência,ele avalia a crise das companhias aéreas em todo o mundo.

Voando às cegas

Paul DempseyP o r M a r i n a N e r y , d o R i o d e J a n e i r o

ENTREVISTA 04/04/07 12:06 Page 11

12 Desafios • abril de 2007

Desafios - E quem pagou todo esse prejuízo?

Dempsey - Os passageiros pagaram ascontas.E os acionistas sofrem também.No caso das empresas que entraramem concordata, os credores se transfor-maram em acionistas. As empresas aé-reas também deixaram de ter um lucromaior. Houve época em que o lucro erade 6%, mas ele declinou radicalmenteapós a tragédia das torres gêmeas em11 de setembro de 2001. Hoje, a mar-gem de lucro de 2% a 3% é considera-da muito boa. Desde a invenção da ro-da, no longo prazo ninguém ganhoudinheiro transportando pessoas.

grandes empresas aéreas entraram emfalência e duas em liquidação. Naque-le período, o prejuízo foi de mais 13bilhões de dólares. Por fim, de 2000 a2006 cinco grandes empresas aéreastambém faliram. O rombo somentenestes últimos seis anos alcançou 35bilhões de dólares. A indústria aéreanorte-americana perdeu todo o lucroauferido desde o vôo inaugural dosirmãos Wright. É como disse AlfredKahn, um dos maiores estudiosos daregulação econômica: “A competiçãodestrutiva tem sido uma das surpre-sas desagradáveis da desregulação”.

Paul Stephen Dempsey esteve no Brasil emmarço para participar de um seminário pro-movido em parceria pelo consulado dos Es-tados Unidos e a Coordenadoria de Regu-lação da Diretoria de Estudos Macroeconô-micos do Instituto de Pesquisa EconômicaAplicada (Ipea). Aproveitou a viagem paravisitar empresas aéreas, como a Gol e a Lí-der Táxi Aéreo, ambas em Belo Horizonte, Mi-nas Gerais.

Dempsey iniciou a vida profissional nadécada de 1970, quando foi advogado do CivilAeronautics Board e da Interstate CommerceCommission (ICC), os antigos órgãos regu-ladores da aviação civil e dos transportes fer-roviários dos EUA. Ele é formado em Jorna-lismo e Direito pela University of Georgia(EUA), com doutorado em Direito da AviaçãoInternacional pela McGill University. É autorde cerca de vinte livros e monografias, entreos quais The Social and Economic Conse-quences of Deregulation (“As conseqüênciassociais e econômicas da desregulação”),Flying Blind: The Failure of Airline Deregu-lation (“Voando às cegas: o fracasso da des-regulação aérea”) e Airline Management:Strategies for the 21st Century (“Adminis-tração da aviação: estratégias para o séculoXXI”), publicado no ano passado. Entre 1979e 2002, foi editor do Transportation LawJournal e costuma, até hoje, publicar artigosem diversos periódicos.

Atualmente é professor catedrático deGovernança Global em Direito Aéreo e Espa-cial e diretor do Institute of Air & Space Lawda McGill University, em Montreal, no Canadá.Dempsey é também vice-presidente e diretorda Frontier Airlines, Inc., empresa que está no13º ano de operação e emprega aproximada-mente 5 mil pessoas. Tem uma frota de 55aeronaves, sendo 48 Airbus 319s e sete Air-bus 318s. Serve 66 cidades, inclusive noMéxico e no Canadá. Pelo sétimo ano conse-cutivo, o Departamento de Manutenção da em-presa recebeu da Federal Aviation Administra-tion (FAA) o prêmio Diamante (1999-2006),que é o mais importante da instituição e con-decora o treinamento avançado de profission-ais de manutenção de aeronaves.

De aviões e de leis

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Desafios - Essa situação prejudica mais as

grandes companhias ou as pequenas?

Dempsey - A menos que as grandesempresas aéreas aumentem o fatura-mento, elas têm uma estrutura de cus-tos insustentável. Suas principais des-pesas são com a força de trabalho (32%dos custos do setor de transporte aé-reo) e combustível (18% dos custos).As empresas que estão entrando nomercado têm certa vantagem em rela-ção a esses custos.

Desafios - Existe semelhança entre o mercado

brasileiro e o americano?

Dempsey - O mercado é semelhantedo ponto de vista geográfico, mas di-fere muito em número de companhiase de pessoas transportadas.

Desafios - Hoje o preço é o principal critério

na escolha da companhia aérea?

Dempsey - Depende do consumidor.Há os que preferem preço e tambémos que optam pela qualidade do ser-viço. Hoje, o consumidor de passa-gens aéreas paga por um produto an-tes de consumi-lo: não sei se vou che-gar na hora, se as malas vão chegar, sea comida é boa, se haverá um assentovazio do meu lado ou se ele abrigaráuma linda mulher ou ainda uma pes-soa obesa.

Desafios - Como o senhor analisa o mercado

aéreo hoje?

Dempsey - Ao contrário do que sepensa, os custos de combustível hojesão mais baixos do que na década de1970. Se os ajustarmos pela inflação,eles estão mais baratos do que jamaisforam.A demanda é muito cíclica, combase sazonal e muito influenciada portendências econômicas internacio-nais, confiança do consumidor e me-do. Mesmo sem eventos extraordiná-rios, a demanda flutua mensalmente,diariamente, a cada hora. Por essas ra-zões, é muito difícil ajustar as carên-cias e os excessos de demanda. E mais:a capacidade da companhia aérea ex-cede a demanda em uma larga mar-gem (de 20% a 30%).

Desafios - Mas por que as empresas aéreas so-

frem implacavelmente com essa capacidade ociosa

e não conseguem solução para a situação?

Dempsey - As aeronaves precisam serencomendadas muitos anos antes daentrega efetiva. Aviões são compradosem época de fartura e entregues notempo das vacas magras. Além disso,as empresas aéreas possuem custos fi-xos muito altos e suas aeronaves voammesmo quando a receita cai. Nem asfalências das empresas eliminam acapacidade ociosa, apenas a redistri-buem, porque as aeronaves das com-

“A margem de lucro das

companhias aéreas já

foi de 6%. Hoje, de 2%

a 3% é considerada

muito boa. Desde

a invenção da roda,

no longo prazo ninguém

ganhou dinheiro

transportando pessoas”

Leo Pinheiro/Valor/Folha

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14 Desafios • abril de 2007

truturar as rotas. Fundamental é re-duzir a capacidade das empresas, por-que é sempre mais fácil subir o morroque descer.

Desafios - Assim como nos EUA, muitas com-

panhias aéreas brasileiras foram à falência ou

enfrentaram terríveis crises f inanceiras. O que

pode ser feito especif icamente aqui no Brasil?

Dempsey - Uma alternativa seria o

panhias falidas se transferem para afrota de outras empresas.

Desafios - E quais são suas sugestões para as

companhias aéreas saírem dessa situação?

Dempsey - Acredito que as empresasfalidas têm de se reorganizar através deuma composição por credores. Tam-bém é preciso reduzir o custo da forçade trabalho, padronizar a frota e rees-

governo aumentar o limite de partici-pação estrangeira no capital das com-panhias aéreas brasileiras. Hoje, o li-mite é 20%, enquanto nos EUA é 25%e a Europa permite 49%. É consensoque o mercado gosta de voar pela ban-deira que tem mais liberdade.

Desafios - Há algo mais que o governo possa

fazer?

Dempsey - A primeira opção é nãofazer nada. Deixar que o mercado seajuste sozinho. Mas o governo tam-bém pode nacionalizar a indústria, fa-zer uma reforma tributária e de leistrabalhistas, além de renunciar às leisantitruste. Pode ainda reduzir as res-trições ao capital estrangeiro na parti-cipação do capital das empresas aéreas.Por fim, meu conselho é re-regular aindústria aérea.

Desafios - Que mudanças o senhor prevê para

o mercado aéreo brasileiro nos próximos anos?

Dempsey - A tendência é que no Brasilocorra o que houve nos Estados Uni-dos: passagens aéreas totalmente ven-didas pela Internet.Será o fim da maio-ria das agências de turismo brasi-leiras. A concorrência ficará cada vezmais acirrada, com preços tão baixosque não cobrirão os custos fixos. Hojeos preços são transparentes, sem in-termediários, consultados imediata-mente on-line. Não há como esconderou majorar os preços, porque senãovocê perde o cliente. d

“As aeronaves precisam

ser encomendadas

muitos anos antes da

entrega efetiva. Aviões

são comprados em

época de fartura

e entregues no tempo

das vacas magras”

Leo Pinheiro/Valor/Folha

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A l e x a n d r e d e Á v i l a G o m i d eARTIGO

s congestionamentos de trânsito e asmás condições do transporte públicosão problemas reais das grandes cidadesbrasileiras. Pesquisas do Ipea já avalia-

ram os gastos provocados pelos engarrafamentos.No que se refere apenas aos custos do tempo per-dido e da poluição causados, sobretudo pelos au-tomóveis, os valores atualizados pela AssociaçãoNacional dos Transportes Públicos para 2003 atin-giram a cifra de 10 bilhões de reais por ano nasáreas urbanas. As pesquisas mostraram tambémque os engarrafamentos aumentam o número deveículos necessários para realizar os serviços deônibus urbano, aumentando as tarifas.

Ao decidir usar seu automóvel, o motorista le-va em consideração apenas o seu custo adicionalcom aquela viagem (o gasto com combustível,porexemplo).Ele não leva em conta que a sua decisãocausará custos também para outras pessoas: co-mo o congestionamento tem relação direta com onúmero de veículos trafegando numa via,a entra-da de mais um automóvel contribuirá para o au-mento do tempo perdido das demais pessoas queestão circulando naquela rua ou avenida.

Cingapura foi a primeira a adotar o “pedágiourbano”, ou a cobrança pelo uso das vias conges-tionadas, como forma de reduzir os engarrafa-mentos, em 1975. Tal política parte do princípiode que o causador deve assumir a totalidade doscustos gerados pela sua opção, e não reparti-losinjustamente com a sociedade. Os resultados fo-ram bem-sucedidos,diminuindo expressivamen-te o volume de tráfego. Mas foi o sucesso da expe-riência londrina que definitivamente atraiu a aten-ção dos gestores públicos.Desde fevereiro de 2003o motorista que entrar com o seu automóvel na re-gião central de Londres nos dias úteis, das 7 às 18horas, paga uma taxa.A cobrança é feita eletroni-camente. Segundo a Transport for London, nosprimeiros anos de implantação a medida reduziuo volume de tráfego em 20% e foi gerada uma re-ceita líquida de mais de 60 milhões de libras porano,investida no transporte público – melhoran-do os serviços da capital.Destacam-se também osbenefícios para o meio ambiente urbano (o ar es-tá mais limpo e as ruas agradáveis para os pedes-

tres). O número de bicicletas em circulação subiue o tempo médio das viagens por ônibus foi re-duzido. A medida, devido a seu sucesso, foi umdos carros-chefe da campanha vitoriosa de reelei-ção do prefeito da capital britânica em 2004. EmEstocolmo, o governo local decidiu experimentara medida antes de implantá-la definitivamente.Durante o primeiro semestre de 2006, quem de-sejasse adentrar no centro da cidade nos dias desemana,entre 6h30 e 18h30,pagava uma taxa.Noinício,o anúncio da medida recebeu o repúdio dapopulação, mas o sucesso resultou na sua aprova-ção no referendo realizado em setembro de 2006.A medida foi reintroduzida permanentemente noinício de 2007.

No Brasil, a cidade de São Paulo adota o rodí-zio de veículos. De acordo com o final da placa eo dia da semana, automóveis e caminhões nãopodem circular nas ruas e avenidas do centroexpandido da cidade das 7 às 10 horas e das 17às 20 horas. No entanto, avalia-se que tal medidajá tenha se esgotado devido à compra pelas pes-soas de um segundo carro com final de placadiferente. O pedágio urbano, por sua vez, é con-siderado uma medida mais eficiente, pois, em vezde canalizar os recursos das pessoas para a com-pra de outro carro, ele gera receita para se inves-tir no transporte público.

O senso comum diz que para resolver os con-gestionamentos nas grandes cidades basta aumen-tar a capacidade das vias.A realidade,todavia,temrefutado tal prescrição.A cada viaduto ou via no-va inaugurada, surgem mais carros, pois essasobras têm o efeito de incentivar as pessoas a usarmais os automóveis.

O pedágio urbano é uma forma de melhorar otrânsito e o transporte público.A simples cópia depráticas adotadas em outros países pode apresen-tar maus resultados no Brasil, devido aos distin-tos contextos. Porém, uma coisa é certa: se nadafor feito, os congestionamentos e seus custos so-cioeconômicos e ambientais só aumentarão aolongo do tempo. Por que não experimentar?

Alexandre de Ávila Gomide é pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica

Aplicada (Ipea)

Pedágio urbano: sou a favor

"A cada viaduto ou

via nova inaugurada,

surgem mais carros e

congestionamento,

pois essas obras têm

o efeito de incentivar

as pessoas a usar mais

os automóveis"

ODivu

lgaç

ão

Artigo_Ipea 04/04/07 12:10 Page 15

Estudos i nd i cam que o consumo

mund ia l de á l coo l combust í ve l passará dos 26 b i l hões de l i t ros

atua is para 205 b i l hões em 2025. Quarenta pa íses já m is turam o

etano l à gaso l i na como forma de redu z i r a em issão de gases que

provocam efe i to es tu fa e a dependênc ia de petró l eo impor tado.

Tudo isso representa um enorme mercado que se abre para o

Bras i l , porém sem invest imentos em tecno log ia esse potenc ia l

pode acabar sendo exp lorado por outros produtores

P o r O t t o n i F e r n a n d e s J r . , d e S ã o P a u l o

TECNOLOGIA

Combustível com

futuro

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Jason Reed / Reuters

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18 Desafios • abril de 2007

O etanol extraído da cana-de-açúcar gasta menos energia renovável para ser produzido

Brasil chegou ao alto do pódio nacorrida para produzir etanol ex-traído da cana-de-açúcar, umcombustível ecológico que deve

ocupar cada vez mais espaço na propulsãodos veículos em todo o planeta, especial-mente naqueles países que não produzempetróleo. Nenhum outro país consegueproduzir o etanol a um preço tão competi-tivo graças aos ganhos de produtividadeem toda a cadeia produtiva, com novas va-riedades de cana-de-açúcar,passando pelalogística para levá-la até as usinas,sem con-tar o uso de subprodutos, como o bagaço,

baseada no milho para o primeiro lugar. Epoderá, também, perder a vantagem tec-nológica, pois uma poderosa coalizão queenvolve fundos de investimento, empresasde biotecnologia,centros de pesquisa e far-to dinheiro público poderá, em dez anos,tornar o etanol norte-americano de celulosetão competitivo quanto o brasileiro,que usaa cana-de-açúcar como matéria-prima.Emmarço, o Departamento de Energia norte-americano anunciou os seis projetos de usi-nas para produzir etanol celulósico que re-ceberão 385 milhões de dólares de financia-mento oficial,cerca de 40% do investimen-

na geração de energia elétrica. A cana-de-açúcar já tem quase quinhentos anos depresença econômica no Brasil, desde queos colonizadores portugueses começarama plantá-la para fazer açúcar, rapadura ecachaça, à base do trabalho escravo de ín-dios e negros.

Apesar de toda a experiência acumula-da e de sua vantagem competitiva, o Brasilproduziu no ano passado 17,4 bilhões delitros de etanol e perdeu a liderança mun-dial para os Estados Unidos, com 18,5 bi-lhões de litros, onde generosos subsídiosgovernamentais impulsionaram a produção

O

Hoje existem 336 de álcool operando no Brasil. Novos investimentos levam à previsão de que, até 2013 elas serão 409

Única/Divulgação

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Desaf ios • abril de 2007 19

do que o feito com o milho e também reduz a emissão de gases de efeito estufa

to total. Um dos projetos tem como líder aempresa de biotecnologia canadense Iogen,que emprega enzimas produzidas pela en-genharia genética para acelerar o processode quebra das cadeias de celulose.Essas en-zimas podem ser usadas nos restos de cul-turas agrícolas, como palha, e outrasmatérias-primas, como madeira e grama,para liberar açúcares e, em seguida, pro-duzir etanol.

Insumos Cientistas e autoridades dos Esta-dos Unidos elegeram o etanol produzidocom celulose como o biocombustível que

permitirá aliviar a dependência do petróleoimportado,sem os efeitos colaterais indese-jáveis,como a alta dos preços dos alimentosou do custo dos insumos para os produ-tores de carne, que dependem do milhoproduzido no meio-oeste norte-americano.No mês passado, Samuel Bodman, o se-cretário de Energia dos Estados Unidos,dis-se que a meta é tornar o etanol celulósico tãocompetitivo quanto o produzido com cana-de-açúcar.Assim,seria possível adicioná-loem quantidades crescentes à gasolina paracortar em 20% o consumo desse combus-tível até 2017, conforme objetivo definidopelo presidente George W.Bush,em janeiro.Com essa nova política, a demanda poretanol, apenas nos Estados Unidos, deveráchegar a 133 bilhões de litros em 2017 e aoferta de etanol de milho deverá respon-der por apenas 43% do total. Isso porqueo insumo faz parte de um sistema de tec-nologia madura, empregada há quase cemanos, com pouco espaço para ganhos deprodutividade.

Para conseguir alcançar a meta estipu-lada, o governo norte-americano apostaproduzir o etanol de celulose a um custo de28 centavos de dólar por litro, ou 47% dovalor conseguido hoje em dia, segundo oscálculos de técnicos do Departamento deEnergia.Atualmente, o custo de produçãodo etanol de cana-de-açúcar é de 22 cen-tavos de dólar por litro no Brasil, enquan-to o que é extraído do milho custa 30 cen-tavos de dólar nos Estados Unidos.

O governo norte-americano não tempoupado esforços nem recursos para am-pliar a produção de etanol, com investi-mento anual da ordem de 1,5 bilhão dedólares, segundo calcula o engenheiroagrônomo Roberto Rodrigues, ex-minis-tro da Agricultura e diretor da Federaçãodas Indústrias do Estado de São Paulo(Fiesp). No caso brasileiro, Rodrigues con-sidera essencial coordenar a atuação dosoito ministérios e diversas autarquias rela-cionadas com a produção de etanol e de-finir as prioridades da política de pesquisae desenvolvimento no setor.“É preciso de-finir quais são as linhas de pesquisa prio-

ritárias para aumentar a produtividadeem toda a cadeia do etanol, com concen-tração de investimentos naquelas que sãomais promissoras”, defende Eduardo Car-valho, presidente da União da Indústriada Cana-de-Açúcar (Unica), que reúnecerca de cem empresas de açúcar e álcool.Para ele, ainda há muito espaço para au-mentar a produtividade na agroindústriado etanol, de olho no crescente mercadointerno e nas exportações para países queadotaram a mistura desse biocombustívelà gasolina.

Emissões Um estudo realizado pelo Centrode Gestão e Estudos Estratégicos (CGEE) epela Agência Brasileira de Desenvolvi-mento Industrial (ABDI), em abril de2006, calcula que o consumo mundial deálcool combustível passará de 26 bilhõesde litros anuais em 2004 (2,2% da gasoli-na consumida) para 205 bilhões de litrosem 2025 se for adicionada na proporçãode 10% à gasolina, cujo consumo chegariaa 1,7 trilhão de litros anuais. Atualmente,quarenta países já adotam políticas queobrigam misturar de 2% a 10% de etanolà gasolina utilizada por veículos. O obje-tivo é diminuir a dependência de petróleoimportado e reduzir as emissões de gasesque provocam o aumento da temperaturaglobal, pois combustíveis que usam etanolextraído da celulose ou da cana-de-açú-car são cerca de 50% menos poluentes quea gasolina. E a simples mistura de 10% deetanol à gasolina diminui em até 19% aemissão de gás de efeito estufa. Outravantagem do etanol é que gera muito maisenergia do que é empregado no seu cicloprodutivo: no caso da cana-de-açúcar, ca-da unidade de energia fóssil utilizada noprocesso gera 8,3 unidades de energia re-novável. O combustível extraído do milhogera apenas 1,4 unidade de energia re-novável para cada unidade de energia fós-sil, que é muito menos produtivo no que-sito balanço energético.

A política energética norte-americana,com a meta de substituir 20% da gasolinaconsumida no país,em benefício do etanol,

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puxa a demanda e cria incentivos para pro-dutores em todo o mundo. Já começam aser construídas usinas comerciais nos Es-tados Unidos que apostam na conversãoenzimática da celulose, como a da Iogen.Apesar das promessas do etanol celulósico,há um enorme mercado potencial para asusinas de álcool brasileiras, pois as taxas etarifas que incidem sobre as importaçõesnorte-americanas devem cair antes de 2017.No entanto, esse objetivo só será atingidose houver aumento da produtividade e daárea plantada, para não repetir o fiascoocorrido no ano passado, com a alta do ál-cool combustível no mercado interno, noperíodo da entressafra canavieira. O preçodo etanol subiu para o valor mais alto emcinco anos e obrigou as distribuidoras decombustível a reduzir de 25% para 20% ovolume misturado à gasolina.

Carvalho, da Única, garante que nãohaverá mais problemas na oferta de etanol,pois o potencial do mercado interno e in-ternacional – e as vantagens competitivasbrasileiras – atrai pesados investimentospara o setor,inclusive de grandes grupos es-trangeiros. “O número de usinas produ-

toras de etanol deverá passar das 336 uni-dades atuais para 409 na safra de 2012/2013, com investimento da ordem de 15bilhões de dólares anuais”, calcula Carva-lho.O Banco Nacional do Desenvolvimen-to Econômico e Social (BNDES) confirmaesse boom de novos investimentos, pois ovalor dos financiamentos de equipamentose máquinas do banco para o setor subiu de102 milhões de reais em 2005 para 237 mi-lhões em 2006, como informa o diretorCláudio Bernardo Junqueira,e deverá baternos 370 milhões de reais no final deste ano.A abertura de novas usinas exige a amplia-ção dos canaviais, pois uma destilaria ca-paz de produzir 170 milhões de litros deetanol anuais absorverá a produção decana-de-açúcar de uma área de 35 mil hec-tares se alcançar a produtividade de 85 li-tros de álcool por tonelada de cana.

Temor A saturação de regiões produtoras,como São Paulo, onde o custo da terra nuaaumentou cerca de 130% entre 2002 e 2005,empurra as novas usinas para os estados doCentro-Oeste e Norte do país e aumenta otemor de ambientalistas de que a expansão

resulte em destruição da floresta amazôni-ca. Rodrigues, da Fiesp, descarta essa pos-sibilidade, pois em sua conta existem 200milhões de hectares de pastagens no Brasil;desse total, 90 milhões de hectares pode-riam ser usados para a produção de ali-mentos e uma parcela de 22 milhões dehectares oferece condições para o plantiode cana-de-açúcar, sem deslocar a pro-dução de carne ou leite, pois a pecuáriabrasileira consegue produzir mais na mes-ma área graças ao investimento em tec-nologia. Mas o melhor caminho, propôsRodrigues em entrevista para o site Inova-ção,da Universidade Estadual de Campinas(Unicamp),seria investir em pesquisa e de-senvolvimento, o que possibilitaria dobrara produção de etanol em dez anos,manten-do a mesma área plantada de cana-de-açú-car, da ordem de 6 milhões de hectares.

É grande o potencial de aumento daprodutividade do setor no Brasil, comomostra a trilha percorrida pela indústriaalcooleira desde 1975, quando foi im-plantado o Programa Nacional do Álcool(Proálcool) pelo regime militar como alter-nativa para a dependência do petróleo im-

20 Desafios • abril de 2007

Graças a novas variedades adaptadas aos mais diversos terrenos e climas e a avanços

Cerca de 6 milhões de hectares são dedicados ao cultivo da cana-de-açúcar no Brasil. Graças à utilização de moderna tecnologia, cada hectare rende, em

Fotos Única/Divulgação

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portado, cujo preço quadruplicara de 2,9dólares o barril em setembro de 1973 pa-ra 12,4 dólares em março de 1974. OProálcool foi movido a pesados subsídiospara agricultores e usinas produtoras deetanol, acompanhado do controle dospreços dos combustíveis, mas serviu paradar a partida a um ciclo de modernização,que chegou até a tecnologia dos motores deautomóveis. A crise financeira do estadobrasileiro nos anos 1980 jogou por terra omodelo desenhado pelo Proálcool, mas asemente foi plantada e o setor produtor deaçúcar e álcool se modernizou brutalmentedepois que cessou a intervenção estatal nadefinição de preços e na concessão de sub-sídios em 1997.

A produtividade da lavoura canavieirabrasileira cresceu em média 2,3% ao anoentre 1975 e 2004,segundo demonstra umestudo publicado na revista Choices, daAmerican Agrucultural Economics Asso-ciation,no segundo semestre de 2006,parachegar, na média, a 80 toneladas de canapor hectare.O trabalho,assinado pelos pes-quisadores brasileiros João Martines-Filho,Heloisa Burnquist e Carlos Vian,revela que

o processo não foi acompanhado pela in-dústria que produz álcool combustível,poisa produtividade cresceu apenas 1,17% porano no período. Um estudo coordenadopor Marcos Landell, do Instituto Agro-nômico de Campinas (IAC), ligado à Se-cretaria da Agricultura do Estado de SãoPaulo, desnuda o aumento da eficiência dalavoura canavieira e das usinas que pro-duzem álcool combustível em São Pauloentre 1975 e 2005: o período de safra que iade maio a outubro agora se estende de abrila novembro; a produção de cana por hec-tare passou de 65 toneladas para 80 tone-ladas por hectare; em 1975 era preciso re-plantar a cana a cada três anos e agora o pe-ríodo dobrou e cada muda agüenta 5,7 cor-tes, em média; há trinta anos, cada tonela-da de cana limpa, sem palha, produzia 65litros de álcool e agora gera 90 litros.

Variedades Um dos impulsos para a maioreficiência da agricultura da cana-de-açú-car veio de centros de pesquisa, como oCentro de Tecnologia Canavieira (CTC),de Piracicaba, São Paulo, ou do IAC, quecriaram novas variedades da gramínea,

mais produtivas e resistentes às doenças.OCTC é sucessor da Copercana,uma coope-rativa de agricultores paulistas que surgiuna metade da década de 1970 e foi a pio-neira na pesquisa de novas cultivares decana e modernas técnicas de plantio e ma-nejo. Desde 2004, assumiu o formato deuma associação civil de direito privado,quereúne 320 funcionários, dos quais 120 de-dicados à pesquisa.É mantida por 150 uni-dades produtoras de açúcar e álcool da re-gião Centro-Sul, mas também atende a 12mil fornecedores de cana.

“Atualmente damos consultoria em to-do o ciclo produtivo e fazemos uma com-pleta auditoria e propostas de aperfeiçoa-mento,desde as variedades adaptadas a ca-da faixa de terreno,técnicas de manejo,co-lheita, até soluções logísticas para levar amatéria-prima à usina, bem como paraaperfeiçoamento da etapa industrial”, ex-plica Tadeu Andrade, diretor de pesquisado CTC de Piracicaba. O processo de cria-ção de uma nova variedade de cana-de-açúcar pode demorar até dez anos para en-trar em produção comercial. Começa noslaboratórios de Piracicaba, passa pela es-

tecnológicos, a produtividade da cana-de-açúcar brasileira cresceu 2,3% por ano desde 1975

média, 80 toneladas Em 1975, o período de safra da cana-de-açúcar ia de maio a outubro. Agora se estende de abril a novembro

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cano confia que o investimento em pes-quisa e desenvolvimento e o comprome-timento do setor de biotecnologia possafazer o custo das enzimas usadas no pro-cesso de produção do etanol celulósicocair de 45 centavos para 10 centavos dedólar por galão de etanol, permitindo queo combustível chegue ao mercado a umcusto competitivo.

Piloto Apesar das vantagens do processo deprodução de etanol usado no Brasil,o CTCcontinua buscando alternativas, asseguraAndrade, diretor do centro. De seus labo-ratórios nasceu uma nova tecnologia, de

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O processo de produção de uma nova var iedade de cana-de-açúcar pode levar até

um grande salto na produtividade indus-trial, confia Carvalho, da Única. Elas serãoequipadas com caldeiras de alta pressão,que garantem aumento da eficiência tér-mica, mesmo usando o atual processo deprodução, com a moagem da cana e a fer-mentação da garapa. Embora reconheçaque os Estados Unidos têm grande poten-cial de produzir etanol pelo processo enzi-mático, ele acha que será impossível im-pedir que a nova tecnologia seja usada noBrasil e, nesse ponto, coloca muita expec-tativa no acordo tecnológico alinhavadocom a visita de Bush no mês passado. ODepartamento de Energia norte-ameri-

tação experimental em Miracatu,na regiãoda Serra do Mar de São Paulo – onde ficaem quarentena, longe de plantações co-merciais –,segue para outra área de teste naBahia, onde fica o banco genético. Depoisque passa por essas barreiras, a nova varie-dade é plantada nos 400 hectares de terra doCTC em Piracicaba, última prova antes deser distribuída aos associados.“Hoje temosvariedades adaptadas aos diversos microcli-mas da região Sudeste e monitoramos os re-sultados através de fotografias tiradas de sa-télites,com uma tecnologia desenvolvida emconjunto com o Instituto Nacional de Pes-quisas Espaciais (Inpe)”,informa Andrade.

Melhorias A meta é cortar custos e melho-rar a produtividade em toda a cadeia pro-dutiva. Um dos trabalhos visa desenvolverum sistema de controle biológico da cigar-rinha, uma praga que atinge as lavouras decana-de-açúcar.Esse novo método deve sermuito mais barato quando comparado aosdefensivos químicos tradicionais. O custopara imunizar 1 hectare deve cair de 288reais para 12 reais.Outra linha de pesquisa,implementada com um parceiro da indús-tria, busca desenvolver um sensor que per-mite à máquina de colher cana ajustar oponto de corte o mais baixo possível em re-lação ao terreno. Na avaliação de Andrade,também é preciso avançar as políticas pú-blicas de fomento à pesquisa e desenvolvi-mento no setor que produz álcool com-bustível, com a liderança de um único ór-gão,que poderia ser o Ministério de Ciênciae Tecnologia, e o mapeamento de todos oscentros de pesquisa existentes, com a defi-nição de linhas de prioridade.“É preciso re-tirar os entraves para aprovar pesquisas comvariedades geneticamente modificadas,poisa biotecnologia garante ganhos de até 30%de produtividade de uma geração da plan-ta para outra,enquanto nas variedades con-vencionais o aumento é de 2% a 3%.Assim,seria possível reduzir o prazo para que cul-tivares mais produtivas sejam cultivadascomercialmente”, defende Andrade.

As novas usinas produtoras de etanolem construção ou em projeto vão garantir

Usina de produção de etanol no Colorado, Estados Unidos: apesar da experiência acumulada, no ano passado

Rick Wilking /Reuters

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Desaf ios • abril de 2007 23

hidrólise rápida da celulose do bagaço decana-de-açúcar, que já está sendo empre-gada numa usina piloto, em Pirassununga,no interior de São Paulo.O novo sistema re-sultou de uma parceria do CTC com a De-dini Indústria de Base, a maior fabricantebrasileira de equipamentos para a produçãode etanol.No processo,patenteado pela em-presa com o nome de Dedini Hidrólise Rá-pida (DHR), um solvente ácido dilui a lig-nina que protege a celulose do bagaço dacana, quebra a cadeia de carbono e gera osaçúcares que serão transformados em eta-nol.O aperfeiçoamento desse processo po-derá dobrar a produtividade da indústria

alcooleira.Atualmente é possível extrair 6,4mil litros de álcool das 80 toneladas de canalimpa produzidos em 1 hectare.Com o pro-cesso DHR, o bagaço resultante da moa-gem da cana – hoje usado para abastecer ascaldeiras e gerar energia elétrica – poderiagarantir uma produção adicional de 5,6 millitros de álcool por hectare. Andrade, doCTC, explica que a palha da cana poderiaser usada na produção de eletricidade e pa-ra alimentar as caldeiras, o que exigiria pe-quenas mudanças nas colhedeiras e no sis-tema de alimentação das caldeiras.

O esforço público e privado para au-mentar a competitividade brasileira na pro-

dução de etanol e abrir a possibilidade detransformar o país no principal produtormundial exigirá atenção também ao pro-cesso de comercialização e de distribuição.Para que o produto ganhe escala global,nospaíses que adotaram políticas para mistu-rar o etanol à gasolina,será necessário trans-formar o combustível numa commodity, oque exigirá que sejam estabelecidos pa-drões de qualidade. Um primeiro passonessa direção foi o convênio firmado entreos dois órgãos encarregados da normatiza-ção de produtos, no Brasil e nos EstadosUnidos – Instituto nacional de Metrologiae Normatização (Inmetro) e National Ins-titute of Standards and Technology (NIST)–,que tende a definir padrões,uma vez queos dois países respondem por 72% da pro-dução mundial de etanol.Também será ne-cessário montar uma infra-estrutura detransporte, com dutos especializados quelevem o combustível até centrais de arma-zenamento.E,se o Brasil tem expectativa dese tornar o principal fornecedor para ospaíses em desenvolvimento, será precisocriar centrais de armazenamento no exte-rior e contar com empresas que dominemo mercado internacional de energia. Issotornará inevitável a presença da Petrobrasno circuito,embora seus maiores lucros se-jam provenientes da gasolina e de outrosderivados de petróleo.

dez anos para entrar em produção comerc ia l

União da Agroindústria Canavieira de São Paulo (Única)www.unica.com.br

Departamento de Energia dos EUAwww.energy.gov

Iogen Corporationwww.iogen.ca

Instituto Agronômico de Campinas (IAC)www.iac.sp.gov.br

Centro de Tecnologia Canavieira (CTC)www.ctc.com.br

Saiba mais:

o Brasil produziu menos álcool combustível do que os norte-americanosd

Etanol 04/04/07 12:20 Page 23

O equilíbrio na diversidade

POLÍTICAS PÚBLICAS

Embr

atur

politicas 04/04/07 13:15 Page 24

Debates em torno das melhores formas para reduzir as desigualdades no país ocorrem em

diversas esferas. Há inúmeros estudos a respeito do tema, os mais recentes real izados

pelo Ipea, acerca dos fundos constitucionais de f inanciamento. Conclusão que sintet iza as

anál ises: uma única fórmula é incapaz de resolver o problema. É preciso o envolv imento de

todos no planejamento e na apl icação ef icaz e ef ic iente de pol ít icas e recursos que

respeitem as característ icas locais e promovam o desenvolv imento

P o r E l i a n a S i m o n e t t i , d e S ã o P a u l o

Ésabido que regiões – países, esta-dos, cidades ou mesmo bairros –não caminham de forma igual,equilibrada ou na mesma direção.

As disparidades, muitas vezes, são peque-nas.Em outras são notáveis e impingem di-ficuldades de toda sorte às populações me-nos favorecidas. Dados do Fundo Mone-tário Internacional indicam que a diferençade renda per capita entre a Suíça e Moçam-bique é de cerca de 500 dólares para 1. NoBrasil também se verificam desproporcio-nalidades gritantes. O Atlas de Desenvol-vimento Humano no Brasil, produzido peloPrograma das Nações Unidas para o De-senvolvimento (Pnud), indica que, no ano2000,81,75% dos moradores do municípiode Belágua,no Maranhão,tinham renda in-ferior a 37,75 reais por mês.Não muito dis-tante dali, em Fernando de Noronha, Per-nambuco, esse mesmo percentual era de0,02%. O Índice de Desenvolvimento Hu-mano Municipal (IDH-M) de São Caetanodo Sul,na Grande São Paulo,era o mais ele-vado do país: 0,919. Manari, em Pernam-buco,era o pior do ranking nacional: 0,467.

No entorno do Distrito Federal,onde es-tá instalada a administração do governofederal,há dezenove municípios que vivem

politicas 04/04/07 13:17 Page 25

26 Desafios • abril de 2007

A Pol ít ica Nacional de Desenvolv imento Reg ional, criada em fevereiro, pretende serv ir

obtenção dos melhores resultados ao me-nor custo.Essa é uma meta perseguida tam-bém por outros. Há exemplos de pesquisasem prefeituras, governos estaduais e aindaem organizações não-governamentais einstituições de fomento nacionais e multila-terais.“Precisamos construir uma políticaque integre esforços.Somente assim a guer-ra fiscal poderá ser detida e haverá chancede crescimento equilibrado com respeito àscaracterísticas específicas de cada região”,diz Alexandre Furlan, secretário de Indús-tria, Comércio e Tecnologia do estado deMato Grosso.

Complexo O descompasso resulta de umcomplexo de fatores,e apenas uma medida,ou uma linha de ação,mesmo que bem exe-cutada,não basta para superá-lo.“É precisoque haja recursos a juro baixo, que as pes-soas estejam informadas e possam obtê-lossem grande burocracia.Que os empreende-dores sejam preparados.Que haja educação

de qualidade para as empresas encontrarema mão-de-obra de que necessitam e os tra-balhadores aumentarem seus rendimentos.É necessário, ainda, suporte à organizaçãode sistemas cooperados, que reduzam cus-tos e tornem os negócios mais competitivos.E devemos considerar que grandes empre-sas criam oportunidades,sua atividade tempoder multiplicador cujo efeito é a melho-ria do ambiente”, resume Tagore Vilarimde Siqueira, economista do Banco Nacio-nal de Desenvolvimento Econômico e So-cial (BNDES) que dirige os trabalhos dainstituição na região Nordeste.

O país conta com organismos que tra-balham com os temas citados por Siqueira.O Serviço de Apoio a Micro e PequenasEmpresas (Sebrae) oferece cursos, consul-toria, estudos e suporte para que os em-preendedores obtenham sucesso em suasinvestidas. Há um conjunto relativamenteamplo de fontes de crédito para impul-sionar o investimento privado. O BNDES

basicamente do agronegócio. Segundo da-dos do Instituto Brasileiro de Geografia eEstatística (IBGE),Cristalina e Luziânia re-gistram elevados índices de produção degrãos,e Águas Lindas e Valparaíso de Goiásnada produzem.Nesta última cidade,aliás,há 380 cabeças de gado,enquanto Formosasoma um rebanho de mais de 200 mil ani-mais.Propriedades rurais mecanizadas,ad-ministradas em moldes empresariais, comuso intensivo de capital e baixa ocupação demão-de-obra convivem com outras cujastécnicas são rudimentares – o que implicadisparidades de produtividade e competi-tividade. O potencial turístico não é explo-rado.Não há empreendimentos de tecnolo-gia de ponta. E, para completar, entre 1991e 2003 a população cresceu à taxa anual de5,67%, mais do que o dobro da média doestado de Goiás.

Aí,políticas públicas adquirem relevân-cia na indução de mudanças estruturaispara geração de empregos, promoção dacompetitividade,desenvolvimento do capi-tal social e suporte ao ingresso no comérciointernacional. A questão é que, embora opaís acumule, em sua história, um vastoleque de políticas voltadas para dirimir oproblema, ele persiste. Uma das razões, di-zem os estudiosos, está no fato de que emgeral as providências são adotadas sem a-nálise prévia nem acompanhamento de re-sultados.Assim, são desperdiçados recur-sos – dinheiro público, esforços de em-preendedores, esperança de trabalhadorese muito mais.

Pesquisadores do Instituto de PesquisaEconômica Aplicada (Ipea) vêm se debru-çando sobre o tema há anos. Em todos ostrabalhos é reconhecida a importância daimplementação de políticas públicas nosentido de abrandar dessemelhanças so-ciais e econômicas.De um lado,constatamque a redução da ação do Estado é prejudi-cial ao país como um todo.De outro,desco-brem que a falta de acompanhamento dosprogramas, em especial numa situação derecursos limitados, afasta as chances de al-cance dos objetivos pretendidos.A preocu-pação é produzir subsídios que permitam a

Contrastes: em todos os setores e regiões do país, a mecanização convive com formas rudimentares de

Dgusa

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Desaf ios • abril de 2007 27

atua nessa área desde o início da décadade 1950. Crédito rural e habitacional tam-bém estimulam a atividade empresarial –e buscam imprimir maior dinamismo aregiões que, mesmo localizadas em áreasdesenvolvidas, como o Sudeste e o Sul,apresentam níveis baixos de desenvolvi-mento. Na mesma linha, funcionam osincentivos fiscais de reinvestimento e deredução do Imposto de Renda.

No âmbito do governo federal,estão emoperação mecanismos de intervenção vol-tados para áreas historicamente atrasadas –com melhores ou piores resultados, con-forme a época e a região (veja o gráfico “Cré-

dito governamental ao setor privado”,na pág.

26). Exemplos são os Fundos Fiscais deInvestimento (Finam, para o Norte, e Fi-nor, para o Nordeste), o Fundo de Recu-peração Econômica do Estado do EspíritoSanto (Funres); e os Fundos de Desenvol-vimento da Amazônia (FDA) e do Nor-deste (FDNE). Os fundos constitucionais

de financiamento do Nordeste (FNE), doNorte (FNO) e do Centro-Oeste (FCO) ab-sorvem todos os anos o correspondente a0,8% do PIB.Nas regiões Norte e Nordeste,programas desse tipo têm resultado emtaxas inéditas de crescimento econômico -no caso do Nordeste,1 a 2 pontos percentu-ais acima da média nacional (leia o quadro

“Fundos constitucionais de financiamento”,

ao lado).“Se houvesse a organização dos tra-balhos em rede e fossem detectadas as fal-has nas ações empreendidas, certamenteteríamos resultados melhores”, argumentaSiqueira.“Afinal, temos regiões deprimidastambém fora do Norte e do Nordeste.”

Aqui vale a pena anotar uma iniciativado BNDES. Trata-se do Programa de Di-namização Regional (PDR).O banco elevao valor de recursos investidos, reduz a taxade juro dos empréstimos em 1 ponto per-centual e admite operação sem intermedia-ção em municípios onde a carência é maior.Só não contempla, independentemente da

para a s i s temat i z ação de i ns t r umentos de f i nanc i amento con t i dos no Orçamento

Fundos constitucionais definanciamentoCriados em 1988,os fundos constitucionais definanciamento são compostos por 3% da ar-recadação de dois impostos: Imposto de Renda(IR) e Imposto sobre Produtos Industrializados(IPI) – transferidos pelo Tesouro Nacional parao Ministério da Integração e, daí, aos bancosNordeste (BNB), Amazônia (Basa) e do Brasil(BB), que cuidam das operações – e pelos ju-ros resultantes dos empréstimos. Das transfe-rências de impostos, o FNE (do Nordeste) ficacom 1,8%,e a cada um dos outros dois fundos,do Centro-Oeste (FCO) e do Norte (FNO), cabe0,6%.Assim,o dinheiro disponível depende dodesempenho da arrecadação (resultado do di-namismo econômico) e também da boa admi-nistração dos financiamentos. O que não é re-passado a empresas é aplicado em títulos pú-blicos – e rende juros que aumentam o bolodisponível para crédito no ano posterior. Se-gundo estimativas do Departamento de Gestãodos Fundos do Ministério da Integração Nacio-nal, cerca de 45,5 bilhões de reais empresta-dos desde 1989 garantiram a manutenção oua criação de mais de 6 milhões de empregos.

O FCO disponibiliza crédito aos setoresindustrial, agroindustrial, agropecuário, mine-ral, turístico,comercial e de serviços.Sua áreade atuação abrange o Distrito Federal e os es-tados de Goiás,Mato Grosso e Mato Grosso doSul – 463 municípios.

O FNO alcança os estados do Acre,Amapá,Amazonas,Pará,Rondônia,Roraima e Tocantins– 449 municípios.Oferece crédito a micro,pe-quenas, médias e grandes empresas dos se-tores mineral, industrial,agroindustrial, turísti-co,de infra-estrutura,comercial e de serviços.

O FNE tem como área de atuação 1.952municípios do Nordeste,norte de Minas Geraise Espírito Santo.Pelo menos a metade de seusrecursos vai para a região do semi-árido.Pro-dutores,empresas,associações e cooperativasde produção podem ser beneficiárias. É dadapreferência a pequenos e miniempreendedo-res em projetos que envolvam preservação am-biental ou atividades inovadoras.

produção, o que compromete a competitividade dos produtos

Onofre Brito/ASN

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28 Desafios • abril de 2007

Os f undos cons t i t uc i ona i s de f i nanc i amen to não se d i r ec i onam pr i o r i t a r i amen te

se de uma investigação acerca dos resulta-dos obtidos com empréstimos concedidosa empreendimentos das regiões Norte,Nor-deste e Centro-Oeste,entre 2000 e 2003,emdois pontos: variação de vagas de trabalhoe média salarial. Para tanto, compara o de-sempenho de firmas formais tomadoras enão tomadoras desses recursos.A conclu-são: apenas no Nordeste os recursos do fun-do constitucional tiveram algum impactosobre o número de empregos, embora nãosobre o salário. O trabalho é composto deuma série de equações, que buscam amedição mais precisa da variação de em-prego e renda. Entretanto, seus autores re-conhecem limitações.“Não sabemos, porexemplo,se as empresas que não foram be-neficiadas com recursos dos fundos consti-

tucionais recorreram a outros meios de fi-nanciamento”, diz Angelo da Silva.“O quenos interessa,no caso,é abrir um precedentede acompanhamento mais minucioso dosgastos públicos e uma frente de discussão.”

A pesquisa foi antecedida de outra,reali-zada em 2006, que chegou a uma consta-tação dramática: os empréstimos dos fun-dos constitucionais de financiamento nãose direcionam de forma prioritária aos esta-dos ou municípios mais pobres.Ou seja,sãoprocurados por empresas prósperas, emregiões de índice de desenvolvimento hu-mano elevado,onde há universidades e gen-te empreendedora.“Identificamos um para-doxo em termos de políticas públicas, poisos recursos têm contribuído para o aumen-to das desigualdades dentro das regiões”,revela Angelo da Silva. Ele trabalhou comMansueto Facundo Almeida e GuilhermeMendes Resende na pesquisa “Uma análisedos fundos constitucionais de financiamen-to do Nordeste (FNE),Norte (FNO) e Cen-tro-Oeste (FCO)”.As razões para o fenô-meno são muitas.Vão da carência de infor-mação a complexidades burocráticas e fal-ta de ações proativas das instituições finan-ciadoras. Considerando que é necessária atomada de medidas para a promoção demaior eqüidade no país, o próximo passoda equipe será uma análise dos contratos,das dificuldades de acesso a financiamentoe do valor de recursos liberados por empre-sa.“Somente uma série de estudos poderáfundamentar políticas mais eficientes e efi-cazes”, conclui o pesquisador.

“Intervenção estatal e desigualdades re-gionais no Brasil: contribuições ao debatecontemporâneo”, de Aristides MonteiroNeto,cuida da crise do Estado na última dé-cada e de suas conseqüências em termos dedesigualdades regionais.Constata a reduçãoda importância da intervenção governa-mental para minorar as disparidades entreregiões.Entre as informações que reúne,al-gumas são alarmantes. Entre 1990 e 2002,as taxas de expansão dos produtos regionaisforam ainda menores do que as verificadasnos anos 1980, período recessivo conheci-do como “década perdida” (veja as tabelas

localização, empreendimentos relativos acomércio e serviços pessoais,infra-estrutu-ra de energia elétrica e telecomunicações.Entre os que podem se beneficiar do pro-grama estão municípios do sudoeste pau-lista, do Vale do Jequitinhonha, em MinasGerais, e do sul do Rio Grande do Sul – to-dos eles bolsões de pobreza com índices dedesenvolvimento humano semelhantes aosdo semi-árido nordestino.

Mais.A integração vem se verificando.No início de março, os secretários de Fa-zenda da região Norte formalizaram a cria-ção de um fórum para a elaboração depolíticas de desenvolvimento econômico esocial. Em Mato Grosso, o Consórcio In-termunicipal de Desenvolvimento Regionalreúne os municípios de Carlinda,Alta Flo-resta,Paranaíta,Apiacás,Nova Monte Verdee Nova Bandeirantes, cuja economia, basi-camente rural,enfrentou um período de es-tagnação nos últimos anos. Resultado: deacordo com dados do governo estadual,en-tre 2002 e 2006, apenas com recursos doFCO liberados para o setor rural,foram ge-rados 285.014 empregos (97.897 diretos e187.117 indiretos). Nos últimos quatroanos, o estado registrou 1,5 bilhão de reaisde investimentos industriais consolidados.

A Política Nacional de DesenvolvimentoRegional (PNDR),criada por decreto fede-ral em fevereiro, pretende servir para a sis-tematização de instrumentos de financia-mento contidos no Orçamento,dos fundosde desenvolvimento regional,de incentivose benefícios fiscais. O maior volume de re-cursos concentra-se nos fundos constitu-cionais de financiamento, que dispõem de9,3 bilhões de reais em 2007.

RadiografiasAs pesquisas desenvolvidas noIpea buscam a compreensão de qualidadese falhas das ações empreendidas até o mo-mento. Uma de suas linhas de pesquisa in-vestiga os fundos constitucionais de finan-ciamento.O trabalho mais recente,“Eficáciado gasto público: uma avaliação do FNE,FNO e FCO”, é de autoria de AlexandreManoel Angelo da Silva,Guilherme MendesResende e Raul da Mota Silveira Neto.Trata-

FCO FNO FNE Total

1991 308,7 308,7 926,3 1.543,9 Alta de 71,1%

em uma década

2001 528,3 528,3 1.585,1 2.641,9

Fonte: Dados da STN reelaborados pela Secretaria de DesenvolvimentoRegional do Ministério da Integração Regional, coletados por AristidesMonteiro Neto/TD 1229, Ipea

Intervenção estatale desigualdade

Repasses da Secretaria deTesouro Nacional aos fundosconstitucionais de investimento(em mil reais de 2002)

Período Taxa de crescimento

1947-1969 -1,5

1970-1985 -2,9

1986-2002 -1,0

*Índice de Theil é uma medida do grau de igualdade de distribuição queconsidera, em seus cálculos, médias aritméticas e geométricas da rendafamiliar per capta.As taxas de crescimento foram obtidas por meio de ajus-tamento de funções exponenciais em regressão de mínimos quadrados.Fonte: Dados brutos da FGV e do IBGE trabalhados por Aristides MonteiroNeto/TD 1229, Ipea

Evolução das desigualdades

interestaduais

entre 1947 e 2002*

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gasto governamental nos períodos de 1991-1995 e 1996-2000 teve efeito propagadormais que proporcional sobre a queda nonível de atividade – um alerta acerca do po-tencial expansivo dos investimentos públi-cos sobre a economia.

Mobilização Em anos recentes, a ação dogoverno tem-se feito notar.As superinten-dências de desenvolvimento da Amazônia(Sudam) e do Nordeste (Sudene) foram re-criadas.Entre 2003 e 2006,o Banco do Nor-deste (BNB) injetou quase 20 bilhões dereais na economia do Nordeste,sendo maisda metade proveniente do FNE – valor quecorresponde a mais de 40% do que foi apli-cado desde a criação do Fundo.O Plano deAplicação de Recursos do FNO do Bancoda Amazônia (Basa) para 2007 inclui duasnovas modalidades de financiamento. OPrograma Nacional de Fortalecimento daAgricultura Familiar (FNO-Pronaf) apóiaatividades que empreguem produtores ru-rais e suas famílias. O Programa de Finan-ciamento do Desenvolvimento Sustentávelda Amazônia (FNO-Amazônia Sustentá-vel) subsidia empreendimentos que promo-vam a reabilitação de áreas degradadas,uti-lizem tecnologias para a redução de im-pactos ambientais,adotem técnicas que au-mentem a competitividade,desenvolvam aaqüicultura e o potencial turístico da região.

O setor turístico também está no foco doPrograma de Desenvolvimento do TurismoRegional do Centro-Oeste do FCO. Desdejaneiro,as taxas de juro cobradas pelo Ban-co do Brasil (BB) nas operações para o se-tor caíram 17%.Os recursos podem ser di-recionados para hotéis, pousadas, renova-ção de parque tecnológico,agências de via-gens,restaurantes e outros bens e serviços –inclusive por médias e grandes empresas.Cada tomador pode emprestar até 4,8 mi-lhões de reais – mas o montante pode atin-gir 40 milhões nos casos em que os projetosforem considerados de alta relevância parao desenvolvimento regional. A Perdigão,uma das maiores empresas de alimentos decapital nacional, e seus fornecedores saca-ram empréstimos do Fundo para viabilizar

à s á r eas ma i s pob res e , a ss im , con t r i b uem pa ra o aumen to das des i g ua l d ades

“Intervenção estatal e desigualdade”, na pág.

ao lado).“A perda de raio de ação do Estadosobre instrumentos de política econômicaimplicou a deterioração de sua capacidadepara imprimir trajetória benigna ao cresci-mento e o estancamento da desconcentra-ção produtiva”,diz Monteiro Neto.Faltaraminvestimentos públicos, e os privados nãoatenderam às necessidades dos menos fa-

vorecidos. Assim, acentuou-se a concen-tração de riqueza.“A queda do investimen-to público se fez notar em todas as grandesregiões,com efeitos deletérios sobre as taxasde crescimento do Produto Interno Bruto(PIB) total e per capita.Contribuiu para quea desconcentração produtiva no país fosseparalisada”, acrescenta. Mais: sua pesquisaencontrou indicações de que a redução no

Fundos constitucionais favorecem empresários de regiões ricas e não alcançam mais pobres

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Saiba mais:

30 Desafios • abril de 2007

Houve progressos. No Espírito Santo, o número de pobres caiu à metade entre 1992 e 2005

Ministério da Integraçãowww.integracao.gov.br/fundos/fundos_constitucionais

Banco do Nordeste (BNB)www.bnb.gov.br

Banco da Amazônia (Basa)www.basa.com.br

Banco do Brasil (BB)www.bancodobrasil.com.br

Banco Nacional de Desenvolvimento Econômicoe Social (BNDES)www.bndes.gov.br

Crédito governamentalao setor privado noBrasil, em % do PIB*

* Foram considerados desembolsos diretos, indiretos e subsidiários do BNDES, Fundos Constitucionais de Investimento, crédito rural parainvestimento, crédito habitacional e Fundos Fiscais de Investimento.

1970 3,0

1975 6,3

1980 3,2

1985 2,2

1991 1,7

1995 2,2

2000 3,0

Fontes: BNDES e STN in Aristides Monteiro Neto/TD 1229, Ipea

a construção de um complexo industrialinaugurado no final de março na cidade deMineiros,em Goiás.Ali estão sendo proces-sadas 81 mil toneladas anuais de produtosà base de carne de aves. O complexo é umdos maiores empregadores do estado, com2 mil funcionários e 9 mil trabalhadores in-diretamente ligados a suas atividades. APerdigão fornece insumos e assistência téc-nica aos produtores e compra sua produção.

O BB estabeleceu neste ano, também,uma estratégia de Desenvolvimento Regio-nal Sustentável (DRS).No Mato Grosso doSul, por exemplo, 750 famílias de agricul-tores do município Glória de Dourados,emque a principal atividade produtiva é a cria-ção de gado leiteiro, vêm sendo beneficia-das. O programa envolve onze parceiros edezenove ações para incrementar a pro-dução,melhorar a qualidade do leite e a in-fra-estrutura produtiva, adequar as pro-priedades à legislação sanitária e ambiental,promover a recuperação do meio ambientee reestruturar associações.

Resultados Há sinais de que os esforços paraencurtar a distância da prosperidade entrediferentes áreas geográficas e dos rendimen-tos dos brasileiros têm surtido efeito.Na úl-tima década houve redução de 11 pontospercentuais na proporção de pobres entre apopulação cearense. O estado ainda ocupaa oitava pior posição no ranking nacionalda concentração de renda,conforme dadosdo IBGE.Mas a situação já foi bem pior: noano 2000, o Ceará era campeão nacionalnesse quesito.O avanço é atribuído ao com-bate à pobreza implementado no Programade Desenvolvimento Econômico Regional,que tem investido na reestruturação espa-cial das cidades de médio porte do interiore na formação de Arranjos Produtivos Lo-cais (APLs). Em 2006, entre os onze esta-dos beneficiados pelo FNE, o Ceará foi osegundo colocado, tanto em volume de re-cursos quanto em número de operaçõesrealizadas.Recebeu mais de 86 mil emprés-timos, num valor total de 586 milhões dereais,que corresponderam a 12,8% dos re-cursos disponibilizados pelo fundo.

Estudos do IBGE e do Ipea mostramque o Espírito Santo também evoluiu emtermos de desigualdade social.Entre 1992 e2005, o número de pessoas pobres resi-dentes no estado caiu quase à metade. Paraa obtenção desse resultado foram aplicadosrecursos federais, mas também foram im-plementados programas estaduais,de inves-timento na melhoria dos serviços de edu-cação e saúde, transportes, meio ambientee saneamento,que possibilitaram a interio-rização do desenvolvimento econômico.Para que os indicadores melhorem aindamais,foi criado,em março,o Fundo de De-senvolvimento do Interior,com 30 milhõesde reais provenientes de parte do lucro obti-do em 2006 pelo Banco do Estado do Es-pírito Santo (Banestes).

Mato Grosso é o estado brasileiro quemais cresceu nos últimos vinte anos. SeuPIB saltou 315% e a atividade agropecuáriaregistrou aumento de 1.200% entre 1985 e2004. Um dos investimentos provenientesdo FCO que contribuíram para esse desem-penho: a expansão da usina da empresaBarralcool,em Barra do Bugres,no interiordo estado. No final de 2006, a instalação setornou a primeira usina integrada de pro-dução de biodiesel, álcool combustível eaçúcar; e a terceira maior unidade de pro-

dução de biodiesel entre as catorze existen-tes no país,segundo informação do Minis-tério de Minas e Energia. Os dados do mi-nistério indicam que suas atividades envol-vem catorze municípios, empregam 600pessoas na zona rural e 80 na área urbana.

Recentemente, o Instituto Mundial dePesquisa para o Desenvolvimento Econô-mico, da Universidade das Nações Unidas(UNU-Wider), lançou um projeto sobredisparidades espaciais no desenvolvimen-to humano que reuniu estudos, alguns so-bre o Brasil, numa série denominada “Spa-tial Disparities in Human Development”.Embora tratem de realidades diferentes,permitem conclusões genéricas.A desigual-dade é elevada e, em muitos países, cres-cente. Isso por motivos naturais (de locali-zação, qualidade da terra e disponibilidadede água,por exemplo),de concentração po-pulacional (pois nas cidades tende a havermaior investimento em educação e tecnolo-gia, o que gera elevação de produtividadenum círculo virtuoso), de infra-estruturae abertura comercial.A aplicação de políti-cas públicas adequadas à administraçãodas disparidades e à descentralização daatividade econômica é, de acordo com osestudos, necessidade evidente em todo oplaneta. O Brasil, como se viu nesse apan-hado de estudos e casos, está nessa luta,para dar maior qualidade de vida à popu-lação e deixar de figurar, nos rankings in-ternacionais, como um dos países mais de-siguais do mundo. d

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H e l d e r F e r r e i r aARTIGO

os últimos meses, eventos violentos, co-mo o assassinato do menino João Hélio,reacenderam, na sociedade brasileira,um antigo debate sobre as penas apli-

cadas aos infratores e o significado de tais puni-ções. Uma fala comum é que “a pena de morte épouco para os bandidos”,devendo a punição apli-cada causar sofrimento máximo ao infrator. Essedesejo de punição desmedido, no entanto, perdeforça no debate público porque coloca em xequea limitação do poder do Estado em punir: só exis-te crime se previsto em lei,a pena só pode ser apli-cada após um devido processo legal em que segaranta amplo direito de defesa etc.

Mas e se a Lei de Talião for a medida? A defesada pena de morte ou de penas cruéis pode se ba-sear no “Olho por olho, dente por dente”. Esseprincípio permitiria fazer “justiça”à vítima (fami-liares, amigos) e seria “pedagógico”, ao fazer o in-frator sentir ele mesmo a dor que causou. Mas háproblemas nessa “justiça” e nessa “pedagogia”. Apena de morte ou cruel cria outras vítimas: mes-mo que se deixe de lado o agressor,sua família seráexposta a um forte e injusto sofrimento.Além dis-so, corre-se sempre o risco de punir irreparavel-mente um inocente. Em termos “pedagógicos”,tais penas transmitem ainda para a sociedade oprincípio de que a agressão física é legítima se forpraticada contra alguém que merece, mesmo quejá esteja submetido pelo Estado. Isso tende a ali-mentar a cultura da violência, reduzindo interdi-tos morais para o controle da agressividade.

Outra fala comum na sociedade é a defesa da“prisão perpétua para os criminosos”. Se a pu-nição visa ao controle do crime,a prisão perpétua,mesmo que não eficiente, é uma pena eficaz, poisgarante que o infrator nunca mais terá a chancede,fora da prisão,cometer um novo crime.No en-tanto,tal pena exclui completamente o infrator doconvívio em sociedade. A sociedade exime-se dequalquer influência sobre os crimes, o único res-ponsável é o indivíduo. Não importa mais sefamília,vizinhança,escola,Estado e sociedade emgeral tiveram,por ação ou omissão,qualquer efeitosobre o respeito às leis e aos direitos ou sobre aconstituição do indivíduo que cometeu aquele

crime. A sociedade assume que pode excluir umindivíduo,mesmo que não o tenha protegido con-tra violências na infância,não lhe fez apreender asnormas de convívio social e de controle dos im-pulsos,não lhe deu oportunidades de inserção so-cial etc. O princípio da solidariedade está rompi-do e, por isso, não há necessidade de se tentar suarecuperação. No entanto, a Constituição de 1988abriu mão dessa pena,confiante na capacidade dasociedade de encontrar outras punições capazesde prevenir a violência e permitir a reinserção so-cial dos infratores.

Mas é possível recuperar um infrator? Váriossão os testemunhos de pessoas que se arrepende-ram de seus atos atrozes e construíram nova vidaem igrejas. Se tais testemunhos são verdadeiros,cabe comprovação, mas estudos realizados naInglaterra e nos Estados Unidos mostram que hávários casos de egressos do sistema penal que fo-ram acompanhados por alguns anos e que nãovoltaram a reincidir em seus delitos.

Cabe aqui propor outra perspectiva.Uma teo-ria básica na criminologia é que a prevenção aocrime por meio da aplicação de penas se dá peladissuasão dos indivíduos. Essa dissuasão é frutomenos da dureza da sanção e mais do risco que opossível infrator percebe de que ocorrerá punição.No Brasil, esse problema é gravíssimo. Um dascausas das altas taxas de homicídio do país é queo risco de alguém que cometa tal crime seja puni-do é inferior a 10%.

Por fim, é louvável que o Congresso esteja dis-cutindo propostas para a redução da violência,mas é preciso, além de dar uma rápida resposta àsociedade, enfrentar problemas relevantes para apolítica pública.Que mudanças legais podem per-mitir aumentar a eficiência da polícia, tornar oprocesso criminal mais ágil ou fazer com que a Leide Execução Penal seja respeitada no Brasil? É nabusca por soluções para esses problemas que sepode obter uma melhor eficiência do Complexode Segurança Pública, Justiça Criminal e SistemaPenitenciário na prevenção à violência.

Helder Ferreira é pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica

Aplicada (Ipea)

Punição: vingança ou prevenção?

“Em termos

‘pedagógicos’, as

penas cruéis

transmitem para a

sociedade o princípio

de que a agressão

física é legítima se for

praticada contra

alguém que merece,

mesmo que já esteja

submetido pelo

Estado”

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Artigo_Ipea2 04/04/07 13:23 Page 31

CULTURA

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Cultura 04/04/07 13:26 Page 32

Museus à beira de um

ataque denervos

P o r S u c e n a S h k r a d a R e s k , d e S ã o P a u l o

O Bras i l con ta com cerca de 2 ,3 m i l i ns t i t u i ções museo lóg i cas a t i vas , mas

prat icamente todas sofrem com a fa l ta de púb l ico, de recursos e de prof iss iona is

qua l i f i cados. Atua lmente, 76 estão com as por tas fechadas. As esperanças do

se tor es tão depos i t adas no S i s tema Bras i l e i ro de Museus, um novo reg ime de

ges tão que começou a ser imp lan tado em 2003

Cultura 04/04/07 13:27 Page 33

34 Desafios • abril de 2007

A o c o m p l e t a r 6 0 a n o s , o M a s p , d o n o d o m a i o r a c e r v o d e a r t e m o d e r n a d a

Museus públicos e privados bra-sileiros enfrentam hoje umabatalha diária para garantir asobrevivência no mercado cul-

tural.Falta de recursos para melhorar a in-fra-estrutura, a programação e o acervo,além de carência de mão-de-obra qualifi-cada, são as principais dificuldades apon-tadas pelas instituições.Das 2.285 unidadesdistribuídas no país, 76 estão com as por-tas fechadas,enquanto outras centenas con-vivem com o fantasma da crise.As estatís-ticas integram o Cadastro Nacional doDepartamento de Museus e Centros Cul-turais do Instituto do Patrimônio Históri-co e Artístico Nacional, do Ministério daCultura (Iphan/Minc).

Um dos anúncios mais recentes foi o

fechamento em março,por tempo indeter-minado, do Museu Internacional de ArteNaif do Brasil (Mian), no Rio de Janeiro,coordenado pela Fundação Lucien Finkel-stein. À procura de parceiros, atualmente ainstituição conta somente com o apoio daSecretaria Municipal de Cultura do Rio deJaneiro, na cobertura a um terço de suasdespesas.O espaço cultural inaugurado em1995 é considerado um dos mais impor-tantes representantes mundiais do gênerode pintura intitulado de ingênuo e primiti-vo, com um acervo superior a 6 mil obras,algumas do século XV.

“Não temos previsão de reabertura.Porenquanto,atenderemos visitas agendadas emonitoradas com no mínimo dez pessoas.O museu aberto custa muito caro, desde a

folha de pagamento até as contas de con-sumo. Nos últimos anos, tivemos dificul-dades para consolidar projetos com a ini-ciativa privada e com outras fontes de re-cursos públicos.Estamos concentrando es-forços nesse sentido para mudar essequadro”, afirma a diretora da instituição, amuseóloga Jacqueline Finkelstein.

Ao completar 60 anos, o maior acervode arte moderna da América Latina,o Mu-seu de Arte de São Paulo – Assis Chateau-briand (Masp), também não escapa aosproblemas financeiros e vê seu públicominguar ano a ano.Administrado pela so-ciedade civil sob a presidência do arquite-to Júlio Neves, a instituição, nos últimosanos, acumulou um caixa negativo quechega a 10 milhões de reais.

Pinacoteca do Estado de São Paulo: um dos mais tradicionais espaços de arte no Brasil enfrenta dificuldades para adquirir novas peças para o acervo

Rodney Suguita/Folha Imagem

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Desaf ios • abril de 2007 35

A m é r i c a L a t i n a , v ê s e u s v i s i t a n t e s m i n g u a r e m e s u a s d í v i d a s c r e s c e r e m

Sem uma solução imediata, o atual cu-rador coordenador do Masp, o crítico dearte Teixeira Coelho, defende que uma dassaídas para revitalizar a instituição é investirna formação de coleções mais completas eatrativas ao público, por meio da troca deobras de determinados artistas com outrasinstituições, além de buscar efetivamentepatrocinadores. O patrocínio foi o únicomeio de garantir recentemente a mostra deuma coleção internacional de obras doartista espanhol Francisco de Goya.

A parceria público-privada parece ter setornado imprescindível. Pelo menos essa éa opinião de Vera Lúcia Bottrel Tostes, di-retora do Museu Histórico Nacional, noRio de Janeiro, uma unidade federal inau-gurada em 1922, detentora de um dosmaiores acervos nacionais, superior a 268mil peças.“Hoje,mais de dois terços dos re-cursos da instituição, 3,8 milhões de reais,provêm de convênios,e cerca de 1,7 milhãode reais vêm do Iphan, valor que é destina-do à manutenção básica de infra-estrutu-ra”, diz. Para manter um público anual nafaixa de 150 mil pessoas, a diretora contaque é estratégico recorrer à versatilidade.“Promovemos exposições temporárias,es-petáculos de música,teatro e programaçãopara crianças, além de outros eventos cul-turais”, relata.

A maior dificuldade enfrentada peloMuseu, segundo a diretora, é a renovaçãoe a ampliação de seu quadro funcional,preenchido por 70 profissionais fixos e omesmo número de temporários. Em con-curso aberto pelo Iphan no ano passado, aunidade recebeu só um arquivista e um his-toriador.“Nosso acervo é muito grande eprecisamos de profissionais especializados.

Algumas técnicas têm de ser passadas degeração para geração e não se aprendem sóna universidade. Mantemos cursos de for-mação, mas não conseguimos captar essamão-de-obra, que acaba indo para outrasopções mais atrativas financeiramente nomercado”, constata Tostes. O maior exem-plo desse déficit operacional está na ma-nutenção da coleção de moedas do museu,que é a maior da América Latina.“Só temosdois profissionais para cuidar do acervo eum deles está prestes a se aposentar.”

Para Cristiana Tejo, diretora do MuseuMunicipal de Arte Moderna Aloísio Ma-galhães (Mamam), no Recife (PE), o trâ-mite lento da viabilização dos recursos pro-venientes de órgãos governamentais é ou-tro fator que obriga os gestores a buscar oauxílio da iniciativa privada.“A verba insti-tucional geralmente só cobre as despesasbásicas e a programação anual e não dá pa-ra fazer obras de manutenção”, relata.

Segundo a diretora,atualmente o museuprecisa reformar urgentemente suas insta-lações elétricas e ampliar sua acessibilidadepara atender o público com segurança.“Oprédio é de madeira e tem três pisos, semdispor de um elevador. Com isso, inviabi-liza a visita de idosos e portadores de defi-ciência. Já enviamos projetos ao governofederal e preparamos incursões com a ini-ciativa privada, além de ampliar o diálogocom a sociedade civil para tentarmos obteros recursos.”

Longo prazo Marcelo Mattos Araújo, dire-tor da Pinacoteca do Estado de São Paulo,que está no hall dos mais tradicionais e efi-cientes espaços de arte do Brasil,afirma queum dos aspectos importantes na gestão

museológica é não perder a perspectiva deplanejamento de médio e longo prazo.Pro-jetos imediatistas, segundo ele, podem serfatais para a instituição. Mesmo assim, co-mo os demais museus brasileiros,tem difi-culdades de fazer novas aquisições para oacervo, dependendo praticamente de doa-ções.Também não consegue efetivar proje-tos de modernização, como da página naInternet, que se encontra em manutenção.

“Para manter a instituição viva, nossodesafio é buscar a articulação entre o poderpúblico, a sociedade civil e a iniciativa pri-vada,além de acompanhar as novas lingua-gens contemporâneas e promover a inclu-são social, por meio de entrada gratuita nomuseu aos sábados, entre outras ações”,afirma Araújo. Com um público anualaproximado de 500 mil pessoas, a Pinaco-teca do Estado possui atualmente um acer-vo com cerca de 6,5 mil itens de obras artís-ticas que vão desde a segunda metade doséculo XIX até a fase contemporânea. Osucesso de público, entretanto, não podeser utilizado como elemento absoluto deavaliação,na opinião do diretor.“O que de-vem ser julgadas são a natureza e a quali-dade dessa relação”, diz.

Infra-estrutura O quadro da crise do se-tor museológico ganha mais elementosquando ingressa no interior do Brasil. Nacidade de São Raimundo Nonato, no Par-que Nacional da Serra da Capivara (PI), acoordenadora da Fundação do Museu doHomem Americano (Fumdham), a antro-póloga Niède Guidon, afirma que tem co-mo principal adversária a precariedade dainfra-estrutura logística local. Segundo aespecialista, a situação pode comprometer

Situação das instituições no Brasil (em %)

Fonte: Departamento de Museus e Centros Culturais do Iphan

94,2 3,2

0,8 1,8

Museus presenciais em funcionamento Museus virtuais em funcionamento Museus fechados Museus em fase de implementação

Cultura 04/04/07 13:29 Page 35

Regiões Sul e Sudeste concentram quase 70% dos museus(número de museus por região)*

*19 Museus virtuais Fonte: Departamento de Museus e Centros Culturais do Iphan

Sudeste 941

Sul 710

Nordeste 469

Centro-Oeste 167

Norte 97

o futuro da unidade, que é a única referên-cia sistematizada no Brasil sobre arte ru-pestre,com um acervo composto por maisde 1 milhão de peças.

“O maior problema são os sucessivosadiamentos e investimentos financeiros‘perdidos’ pela gestão pública, desde 1998,para a construção do aeroporto interna-cional na região”, critica. Segundo Niède,as obras foram interrompidas, apesar de oempreendimento ser estratégico para a im-plementação de um pólo turístico voltadopara o desenvolvimento socioeconômicolocal. O governo do Piauí anunciou que ainauguração do aeroporto está programa-da para o ano que vem.

“Sem aeroporto e com as estradas esbu-racadas, que representam um perigo terrí-vel, principalmente na estação das chuvas,são recebidos somente 12 mil turistas porano,em vez dos 3 milhões aguardados.Des-se modo,fica difícil assegurar a manutençãodo Museu e,sobretudo,manter a exposiçãoem dia com as novas descobertas”, diz. Sóno ano passado foram descobertos mais200 sítios arqueológicos, segundo Niède.

A arqueóloga afirma que essa situaçãodificulta a auto-sustentabilidade do projetoe prejudica os investimentos feitos até ago-ra.A instituição chegou a receber recursosde diversos organismos, como o Banco In-teramericano de Desenvolvimento (BID),que possibilitou a contratação de uma fir-ma suíça responsável pelo estudo destina-do à organização e pela oferta de atrativosàs visitas. O Iphan em 2005 também apoi-ou a modernização de parte da exposição.

Espelho do país O diretor do Departamen-to de Museus e Centros Culturais doIphan/Minc, José do Nascimento Júnior,constata que a realidade dos museus bra-sileiros espelha a realidade do país.“São ins-tituições vivas e, nesse sentido, refletem ocontexto econômico,social e cultural ondeestão inseridas.Assim,os problemas vão deinfra-estrutura à falta de qualificação depessoal”, diz.

Para Adolfo Nobre, presidente da As-sociação Brasileira de Museologia (ABM),

36 Desafios • abril de 2007

Ún ica referênc ia s istemat izada, no Bras i l , sobre ar te rupestre, o Museu do Homem

na maioria dos casos falta compreensão porparte dos gestores quanto ao papel dosmuseus e suas finalidades.“São instrumen-tos para o desenvolvimento social, de per-cepção crítica da realidade, suporte educa-tivo, gerador de renda e de auto-estima”,afirma.Outras dificuldades são decorrentesda ausência de padrões universais defini-dos, o que estimula a prática de procedi-mentos informais, que vão desde a aquisi-ção até o descarte de acervos,passando poratividades de restauro e permissão de re-produção não documentada devidamente.

Nobre considera que atualmente os pe-quenos museus municipais registram amaior dificuldade do sistema para adequar-se a um padrão mínimo de gestão museo-lógica, pois, em muitos casos, não têm or-çamento próprio nem profissionais quali-ficados. “Os maiores problemas de umagestão são a falta de um horizonte definidoe o desconhecimento do instrumento quese tem em mãos para alcançar os objetivospretendidos.”

Mas o Departamento de Museus e Cen-tros Culturais do Iphan/Minc começou,em2003,a dar os primeiros passos para acabarcom essa “informalidade” da gestão dos

museus. Nesse ano foi lançada a PolíticaNacional de Museus (PNM), que resultouna criação do Sistema Brasileiro de Museus.O novo modelo administrativo ainda estáem fase de implementação, em parceriacom municípios, estados e sociedade civil.Segundo o órgão federal,o objetivo é orga-nizar e otimizar projetos nas unidades pú-blicas e privadas distribuídas pelo país.

Cadastramento Uma das ações mais re-centes foi a criação do Cadastro Nacionaldos Museus, resultado de um levantamen-to realizado entre março e outubro de2006, quando foi celebrado o Ano Na-cional dos Museus, atualizado no mês pas-sado. O novo levantamento aponta a exis-tência de 2.403 instituições mapeadas, oque representa mais de 400% do total ca-dastrado no último guia publicado noBrasil, em 2000. Nesse panorama estão in-cluídos também museus fechados (76) ouem processo de implementação (42) en-tre 2007 e 2008. A maioria é do tipo pre-sencial, sendo somente dezenove virtuais(veja gráfico na pág. 31).

Segundo Nascimento Júnior,diretor dodepartamento,alguns dos resultados signi-ficativos do PNM são o fortalecimento depolíticas públicas por meio do cadastro e oaumento de editais de financiamentos,quejá possibilitaram a modernização de diver-sos museus. Entre eles o projeto de infor-matização do Museu de Arte do Rio Gran-de do Sul Ado Malagoli e a implementaçãodo Programa de Registro, Difusão e Sal-vaguarda das Manifestações Culturais doEstado do Pará,no Museu da Imagem e doSom do Pará. São investidos aproximada-mente 95 milhões de reais ao ano,entre Or-çamento federal e Lei Federal de Incentivoà Cultura.

O problema está na concentração dosinvestimentos nas regiões Sul e Sudeste dopaís, onde ficam 70% das unidades, de a-cordo com Nobre, da ABM.“Isso se devenão só ao fato de que a maioria das insti-tuições estão instaladas nessas regiões,mas também à falta de qualificação pro-fissional para a elaboração de projetos de

Cultura 04/04/07 13:30 Page 36

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Amer icano recebe anualmente 12 mi l v is i tantes. Eram esperados 3 mi lhões

O Museu do Homem Americano, no Piauí, conta com mais de 1 milhão de peças em seu acervo, mas não recebe visitantes suficientes para se manter

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38 Desafios • abril de 2007

Levantamento realizado neste ano aponta a existência de 2.285 museus em funcionamento

captação nas regiões Norte, Nordeste eCentro-Oeste” (veja gráfico na pág. 32). Omuseólogo estima que a questão será gra-dualmente resolvida com políticas afirma-tivas e com o reforço no oferecimento decursos e oficinas de elaboração de proje-tos nessas regiões.

Capacitação O Programa Nacional de For-mação e Capacitação do PNM existe des-de 2003 e até agora registrou mais de 11mil participantes em 22 estados e no Dis-trito Federal, mas ainda não foi suficientepara solucionar uma das maiores carênciasdo setor: a de mão-de-obra qualificada.“Esperamos em 2007 atingir a marca decem oficinas, capacitando aproximada-mente 15 mil pessoas”, diz NascimentoJúnior. Na grade há temas como Implan-tação, Gestão, Organização e Segurançaem Museus.As ações também se estendema parcerias com universidades para a cria-ção de cursos de graduação e pós-gradua-ção em Museologia.

Até 2003, apenas a UniRio e a Univer-

sidade Federal da Bahia (UFBA) formavammuseólogos no país. Atualmente, a situa-ção melhorou um pouco. Estão em fun-cionamento um curso de pós-graduaçãono nível de mestrado e mais três de gra-duação vinculados à Universidade Federalde Pelotas (UFPEL), no Rio Grande doSul, à Fundação Educacional Barriga Verde(FEBAVE), em Santa Catarina, e à Uni-versidade Federal do Recôncavo da Bahia(UFRB).São previstos mais quatro cursos,ainda em fase de implantação, nas Univer-sidades Federais do Pará (UFPA), de Bra-sília (UnB), de Minas Gerais (UFMG) e deSergipe (UFS).

Outra medida tomada no ano passa-do pelo Departamento de Museus e Cen-tros Culturais do Iphan/Minc foi a apro-vação de uma portaria para regulamentara ligação entre as associações de amigos demuseus e as instituições federais. SegundoNascimento Júnior, a medida tornará a re-lação mais transparente.“As associaçõestêm contribuído de forma positiva para oprocesso de sustentabilidade e para a me-

lhoria das instituições museológicas, masé importante que esse intercâmbio sejaclaro para a sociedade e as esferas públi-cas”, afirma.

Adolfo Nobre, da ABM, explica que ocontrole é necessário porque as associaçõesde amigos de museus, em muitos casos,funcionam como a principal fonte de re-cursos das unidades, pela facilidade quetêm de arrecadar e gastar, sem necessidadede enfrentar os trâmites burocráticos exigi-dos pelas leis que regulam o uso de verbaspúblicas.“Já são conhecidos casos em queos museus se tornaram reféns de suas asso-ciações, e vice-versa. Fico receoso apenasquanto ao caráter legal da portaria, já que aConstituição Federal estabelece a liberdadede associação e o Código Civil prevê as for-mas de organização dessas entidades”,ana-lisa Nobre. O museólogo acredita que adestinação de mais recursos públicos aosmuseus federais atenuará essa situação.

Criação do Ibram Na pauta do ProgramaNacional de Museus (PNM),o que ainda é

Uma das experiências museológicas mais bem-sucedidas na atuali-dade é o Museu da Língua Portuguesa, sob coordenação da Secretariade Estado da Cultura, localizado no prédio restaurado da históricaEstação Ferroviária da Luz, em São Paulo. A unidade completou um anode funcionamento em março e já superou a marca de 570 mil visitantes.

O projeto é resultado de um investimento expressivo de 37 milhõesde reais, realizado pela administração pública estadual com a FundaçãoRoberto Marinho e patrocínio do setor empresarial por meio da LeiFederal de Incentivo à Cultura.

O diretor executivo do Museu da Língua Portuguesa, Antônio Carlosde Moraes Sartini, credita o significativo volume de público ao planeja-mento da instituição, mas afirma que, sem a realização de diagnósticosperiódicos da gestão, a instituição pode perder o foco de sua propostaprincipal.“O museu foi criado para mostrar que a língua portuguesa éum patrimônio do cidadão, quebrando conceitos elitistas e herméticos.”A implementação exige muito esforço, segundo ele, já que é difícil que-brar o paradigma de ter um acervo que não é material.

O sucesso da língua

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no Brasil, 400% mais do que se tinha conhecimento no último guia publicado, em 2000

aguardado pelo setor, está a aprovação doProjeto de Lei que cria o Instituto Brasileirode Museus (Ibram), uma nova autarquiapara gerir os 28 museus atualmente ligadosao Iphan. Os ministérios do Planejamentoe da Cultura estão na fase final de elabo-ração do texto.“Esperamos que,com o lan-çamento ainda em 2007, haja um avançonos programas e projetos específicos quecolaboram para o crescimento do setor”,diz Nascimento Júnior, do Iphan/Minc.

Nobre, da ABM, explica que a criaçãode uma instituição dessa natureza é umareivindicação antiga da comunidade mu-seológica.“Poderá estabelecer uma nova fa-se para os museus no Brasil, longe do cole-cionismo dos ilustrados, das propagandasde estado e dos estereótipos de depósito decoisas velhas”, considera.

O Estatuto dos Museus, que é a nor-matização do setor, é mais uma lacuna aser preenchida e está sob análise na Câ-mara dos Deputados.“O texto foi objetode ampla discussão com o Comitê Gestordo Sistema Brasileiro de Museus, resul-

tando no Projeto de Lei nº 7.568/06. Cer-tamente quando for aprovado será ummarco regulatório”, analisa NascimentoJúnior.A estimativa é que a votação ocor-ra ainda neste semestre.

Educação Apesar de todas as ações já de-senvolvidas até agora pelo PNM, Nas-cimento Júnior afirma que a tarefa de me-lhoria e sustentabilidade dos museus bra-sileiros tem ainda uma longa trajetória pelafrente.“É preciso adensar as ações da Po-lítica Nacional para que se tornem umapolítica de Estado. Para tanto, precisamosampliar as possibilidades de financiamen-to e fomento em todas as esferas de governoe não apenas no governo federal”, afirma.

O antropólogo conclui que as trans-formações devem ocorrer também naárea de educação.“A escola é um espaçode formação humanística e precisa incor-porar em seu currículo conteúdo que sen-sibilize os jovens e as crianças para asquestões de memória e patrimônio. Essarevolução poderia, a princípio, ser capi-

taneada pelas secretarias municipais e es-taduais de Educação”, diz.O fato de o uni-verso museológico nacional requerer ain-da muito aprimoramento não impede quenovos projetos estejam em andamento nopaís. O que é possível registrar atualmenteé a ampliação da visão empresarial commais ênfase em iniciativas temáticas degrande porte, além de projetos com cole-ções particulares, entre outras.

Nesse viés, um dos anúncios mais re-centes é o início das obras do Museu doFutebol, no Estádio Municipal Paulo Ma-cho de Carvalho (Pacaembu), em SãoPaulo. O projeto, lançado no final de 2005,tem previsão de inauguração em 2008.Orçado em 25 milhões de reais, reúne opoder público municipal com a FundaçãoRoberto Marinho, a Confederação Brasi-leira de Futebol (CBF) e parceiros da ini-ciativa privada. Mas, como qualquer ou-tro empreendimento, vai requerer apóssua inauguração uma gestão moderniza-da para enfrentar os obstáculos impostoshoje pelo mercado cultural.

Para isso, já estão programadas algumas ações estratégicas nesteano. Segundo Sartini, uma delas é o fechamento de uma parceria com aprefeitura de São Paulo para levar gratuitamente ao museu cerca de 30mil famílias que são atendidas por programas sociais. Atualmente, amaior parte do público da unidade são mulheres na faixa dos 30 a 50anos, com nível secundário ou universitário concluído.

Na área tecnológica, o museu pretende repaginar seu portal naInternet.“Constatamos que está estático e partimos para sua reformu-lação com a proposta de torná-lo um ponto de encontro das comunidadesde língua portuguesa em vários países do mundo”, diz. E outra novidadeestá sendo implementada nas mostras temporárias de grandes autores.“O público escolar começará a receber cartilhas com base na mostrade obras de Clarice Lispector, porque avaliamos que o museu deve terum papel mais ativo além de suas portas, contribuindo também na salade aula”, afirma o diretor.

Desde outubro do ano passado, a administração da unidade está soba direção da Organização da Sociedade Civil de Interesse Público(Oscip) Instituto Brasil Leitor (IBL).“Oitenta por cento dos recursos sãoprovenientes do governo do estado e 20% da própria IBL. Mas, no futuro,a intenção é que essa fatia não-governamental aumente principalmente

nas exposições temporárias e nas atividades regulares. É importante, en-tretanto, que o Estado continue a assumir suas responsabilidades namanutenção da infra-estrutura”, diz Sartini. O valor anual dos repassesdo governo chega a 2,8 milhões de reais.

O diretor-geral do IBL,William Nacked, afirma que a participação deórgãos não-governamentais na gestão de patrimônios públicos facilita acaptação de parceiros e a auto-sustentabilidade da instituição.“O Estadotem pouco tempo, dinheiro e liberdade gerencial, além de responder poroutras atribuições. Os museus, por uma ordem de prioridades, acabam fi-cando para trás. E é aí que a sociedade civil pode colaborar. E a trans-parência nessa relação existe porque somos cobrados e só permanece-remos enquanto tivermos eficiência”, diz.

Sílvia Antibas, diretora do Departamento de Museus e Arquivos daSecretaria de Estado da Cultura de São Paulo, afirma que a presençamais expressiva da sociedade é uma tendência que cresce nos princi-pais museus públicos paulistas. Hoje também estão sob gestão compar-tilhada a Pinacoteca do Estado, o Museu da Casa Brasileira, o Museu daImigração e o Museu da Imagem e do Som (MIS).“Neste ano, o Museu deArte Sacra e o de Brodósqui (com obras de Cândido Portinari) iniciarãoa experiência”, diz a diretora.

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da Receita Federal, possibilitando a entre-ga da declaração do Imposto de Renda dePessoa Física (IRPF) via Internet. Outroavanço brasileiro foram as urnas eletrôni-cas adotadas pelo Tribunal Superior Elei-toral (TSE)”, acredita Roberto Nogueira,professor do Instituto Coppeade (Pós-Graduação em Administração) da Univer-sidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).O voto na urna eletrônica foi implantado apartir de 1996, ano em que apenas os mu-nicípios com mais de 200 mil habitantes ex-perimentaram a novidade. As eleições de2000 foram as primeiras 100% informati-zadas. Só para ter idéia da agilidade queesse expediente trouxe,à meia-noite do dia1º de outubro passado, quando se realizouo primeiro turno do pleito de 2006, 90%dos votos já haviam sido totalizados peloTSE e as informações estavam disponíveisno site www.tse.gov.br. E olha que estavamsendo disputadas 513 vagas para deputadofederal, 1.059 para deputado estadual oudistrital, 27 para senador, 27 para gover-nador e uma para presidente da República.

Desde sua instituição, em 1991, o pro-grama de Imposto de Renda de Pessoa

Você, caro leitor, já deve ter passa-do pela nada agradável experiên-cia de ficar horas numa fila de al-gum órgão público para realizar

algum serviço ou até mesmo para obteruma simples informação. Perdem-se tem-po e paciência.Filas intermináveis no Insti-tuto Nacional do Seguro Social (INSS) parater notícias sobre o andamento de proces-sos de revisão de benefícios, por exemplo,são corriqueiras na vida do cidadão bra-sileiro. A boa notícia é que essa realidadecomeça a mudar. Agora, bastam dois cli-ques para saber como anda seu proces-so. Também é fácil fazer, pela Internet, o

requerimento de auxílio-doença e o agen-damento de perícia médica em algum pos-to do INSS de sua escolha. Só o governofederal coloca à disposição cerca de 2 milserviços por meio de trezentos portais.

Não é segredo para ninguém que a tec-nologia da informação tem proporciona-do,nos últimos anos,mudanças radicais nocotidiano das pessoas. O governo não po-deria,é claro,ficar de fora.O surgimento desites governamentais representa uma po-derosa ferramenta de interação entre oEstado e a sociedade,possibilitando não sóque o cidadão participe mais dos assuntosem discussão,mas também que tenha aces-so rapidamente às informações e aos ser-viços que o governo oferece. O Brasil jáavançou muito, mas parece consenso entreos especialistas que o ainda tem grandesdesafios a enfrentar para oferecer à sua po-pulação um governo eletrônico em toda asua potencialidade.

Algumas iniciativas brasileiras no quese convencionou chamar de governo ele-trônico são mundialmente reconhecidas.“O grande marco inicial do governo ele-trônico no Brasil foi a entrada no ar do site

Cidadania on-lineP o r L i a V a s c o n c e l o s , d e B r a s í l i a

Neste ano, a Receita Federal espera que 23 mi lhões de

declarações do Imposto de Renda cheguem v ia Internet.

Em outubro do ano passado, mais de 100 mi lhões de

e l e i t o r e s exp r e s sa ram sua op i n i ã o p r e s s i o nando a s

tec l as da u rna e l e t rôn i ca . E o por ta l da Câmara dos

Deputados recebe, mensalmente, cerca de 1,2 mi lhão

de consul tas. O Brasi l ocupa um honroso 17º lugar no

rank i ng da ONU de governo e l e t rôn i co, mas a i nda há

muito por fa zer, sobretudo no âmbito munic ipal .

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42 Desafios • abril de 2007

Pesquisa de 2005 do Ibope NetRat ings mostrou que o e-gov é bastante procurado:

Federal (Comprasnet, www.comprasnet.gov.br) – também são uma iniciativa bem-sucedida (leia quadro abaixo).

Destaques De acordo com uma pesquisa de2005 do Ibope NetRatings, o governoeletrônico tem sido bastante procurado:12,68% dos brasileiros tinham usado algumserviço nos últimos doze meses daqueleano.Isso significa que 40% das pessoas queutilizaram a Internet no período acessaramalgum serviço de governo eletrônico. Osdestaques na categoria foram consulta aocadastro de pessoa física (6%), declaraçãodo Imposto de Renda (5%), informaçõessobre serviços públicos de educação (3%),inscrições em concursos públicos (3%),informações sobre empregos (2%) e pa-gamentos de Imposto sobre a Proprie-dade de Veículos Automotores (IPVA),multas e licenciamento (2%). Dados de2003 indicam que, 72% dos serviços dis-ponibilizados pelo governo, 48% são in-formativos (consulta) e apenas 19% pos-suem maior interatividade (processamen-to).“O grande problema é que os serviçosoferecidos na Internet pelo governo ain-da são muito fragmentados. Há muita

sobreposição de informações entre as es-feras federal, estadual e municipal”, afir-ma Nogueira.

Várias são as experiências espalhadaspelo Brasil de oferecer, pela Internet, infor-mações e serviços aos cidadãos. Em Per-nambuco, um novo portal foi construído,em tempo recorde, para que todos os in-teressados possam acompanhar pela In-ternet as contas do governo do estado.Para isso, basta digitar www.portalda-transparencia.pe.gov.br.A página traz to-das as receitas e as despesas do estado de-talhadas e não requer senha nem cadastro.“O portal estava no programa de governoe, depois das eleições terem sido definidas,o site foi ao ar no dia 2 de março”, explicaRicardo Dantas, secretário da Controla-doria-Geral de Pernambuco. O portal traztambém um glossário para que as pessoasentendam os termos técnicos e uma seçãodedicada às crianças, que podem se fami-liarizar com o sistema fiscal por meio de jo-gos e gibis. Segundo Dantas, uma novaversão do site deve estar pronta em junho,quando os internautas terão acesso a umportal com mais funcionalidades – porexemplo, as contas dos municípios do es-

Física conquista cada vez mais adeptos.Neste ano, a Receita Federal (www.recei-ta.fazenda.gov.br) prevê que aproximada-mente 23 milhões de declarações de IRPFsejam entregues, superando o percentualdo ano passado,de 99%.Fazer a declaraçãoera uma tarefa que, tempos atrás, demora-va dias. Hoje, o contribuinte que opta pordeclarar seu IRPF pela Internet o faz de for-ma rápida, segura e sem precisar sair decasa.A cada ano o programa é aperfeiçoa-do.A grande novidade para a declaração de2007 é a possibilidade de dividir em até oitovezes o imposto devido e fazer o débito di-retamente na conta corrente.Até o ano pas-sado, o imposto só podia ser dividido ematé seis vezes e o débito em conta não erapermitido. Outro avanço é que, pela pri-meira vez, o programa do IRPF poderá serusado por deficientes visuais. Para isso, aReceita fez alterações no software de modoa compatibilizá-lo com os programas devoz utilizados pelos deficientes. Isso querdizer que os contribuintes poderão ouvirtudo o que está na tela. Compras governa-mentais pela Internet – o chamado pregãoeletrônico, que tem o nome oficial de Sis-tema de Compras Eletrônicas do Governo

Nos últimos anos, uma silenciosa revolução vemocorrendo no governo federal na hora de realizaras licitações.Esqueça a burocracia, sua inevitávellentidão e aquele amontoado de papéis.Só no anopassado 11,1 bilhões de reais, ou seja,57% do to-tal contratado, foram adquiridos virtualmente pormeio do chamado pregão eletrônico. O pregão,que funciona como um leilão reverso no qual adisputa ocorre com o envio sucessivo de lancespela Internet, foi batizado de Sistema de ComprasEletrônicas do Governo Federal (Comprasnet) epode ser acessado no www.comprasnet.gov.br. Emnúmeros de processos de compras, foram realiza-dos, em 2006, 27.682 pregões eletrônicos, o quecorrespondeu a 64,9% das licitações no ano pas-sado. Isso representou uma economia de 1,8 bi-

lhão de reais – o valor é a diferença de 14% en-tre o preço de referência (o preço máximo aceitopela administração por cada produto ou serviço)e o que efetivamente foi contratado após a dispu-ta on-line entre os fornecedores, já que o vence-dor é aquele que oferece o menor preço. RogérioSantanna, secretário de Logística e Tecnologia daInformação do Ministério de Planejamento, Orça-mento e Gestão, acredita que o principal fatorpara a redução dos valores pagos é o própriofuncionamento do pregão: a concorrência é ex-plícita e as empresas abaixam seus valores mi-nuto a minuto. Nas demais modalidades, há ape-nas a sugestão de preço, enviada dias antes daabertura das propostas.

Para ter uma idéia de como a prática está se

tornando cada vez mais difundida,em 2002 o pre-gão eletrônico significou apenas 0,8% do total dovalor contratado. Percentual que subiu para 3,8%em 2003, 5,8% em 2004 e 20,8% em 2005. Comesses resultados,o crescimento do Comprasnet em2006 em relação a 2002 foi de espantosos17.926%. O pregão eletrônico só não é mais usa-do porque essa modalidade tem limitações: con-forme a legislação prevê, o pregão virtual só valepara a aquisição de bens e serviços comuns,ou se-ja, aqueles com especificações (requisitos exi-gidos no edital) amplamente conhecidas no mer-cado, como serviços de vigilância e limpeza, com-putadores, material de escritório e medicamentos.

O pregão eletrônico não só representa eco-nomia de dinheiro, mas também de tempo. Um es-

Dou-lhe uma, dou-lhe duas, dou-lhe três... comprado!

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Desaf ios • abril de 2007 43

12,68% dos brasi le iros t inham usado a lgum serv iço nos ú l t imos doze meses

tado. O novo site terá as informaçõesatualizadas diariamente; hoje em dia, a at-ualização é mensal. “Esse site inaugurauma nova era de transparência no estado,além de estimular o controle social. É umaconvocação geral para que a populaçãoparticipe, elogie e critique”, afirma Dantas.

Prefeituras Segundo a Pesquisa de Infor-mações Básicas Municipais do InstitutoBrasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),de 2001, o Brasil possuía 5.560 municípiose apenas 24,17% (1.344) das prefeituras ti-nham sites na Internet. Em 2005, o IBGEreeditou a pesquisa e verificou que houveum expressivo crescimento no número demunicípios com site na Internet: de 24,17%(1.344) para 38,90% (2.163), representan-do um aumento de 14,73%.Mesmo assim,ainda há um número grande de cidades fo-ra da rede. Pesquisa sobre o governo ele-trônico nos municípios brasileiros feitapela Universidade Federal de São Carlos(UFSCar) aponta que as razões para aausência de sites de gestões municipais naInternet geralmente estão relacionadas aoscustos de desenvolvimento e manutenção,à carência de consciência política por parte

tudo que será lançado em maio, feito pela Fun-dação Instituto de Administração (FIA) em con-sórcio com a IDS-Scheer Sistemas de Proces-samento de Dados e com o escritório SundfeldAdvogados, mostra, em suas conclusões preli-minares, que o tempo de uma contratação pormeio da modalidade eletrônica demora em mé-dia dezessete dias – desde que é formalizadaa solicitação de determinada compra à área deaquisições do órgão até a assinatura do con-trato.“A concorrência normal dura no mínimosessenta dias. Os custos operacionais do pre-gão eletrônico costumam ser 40% mais baixosdo que qualquer outro processo de compra”,afirma Adolpho Pacheco Filho, gerente de pro-jeto da FIA.

Ilustração Orlando

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44 Desafios • abril de 2007

Em 2001, dos 5.560 mun ic íp ios bras i le i ros, apenas 1.3 44 prefe i turas t inham s i tes

dos governantes e a entraves políticos.Nesse cenário não muito animador,ga-

nha destaque a pequena cidade de Piraí,com 23 mil habitantes, no Rio de Janeiro(www.pirai.rj.gov.br). O município cole-ciona prêmios. Ganhou, em 2001, o Prê-mio Gestão Pública e Cidadania, concedi-do pela Fundação Getulio Vargas (FGV) epelo Banco Nacional de DesenvolvimentoEconômico e Social (BNDES) e foi vence-dor do prêmio Cidades Digitais Latino-Americanas, na categoria Cidades de Pe-queno Porte,em 2004.“Temos um conceitoampliado de governo eletrônico, que en-volve, além, é claro, do site da cidade, umarede de transmissão pública de dados,ima-gem e voz com acesso disponível em váriospontos da cidade”, explica Franklin DiasCoelho, professor da Universidade FederalFluminense (UFF) e coordenador do pro-jeto Piraí Digital. Além de informaçõesmais corriqueiras, como perfil econômicoda cidade e população, programação de e-ventos e telefones úteis, o site de Piraí traz apossibilidade de gerar guias para pagamen-to de impostos. Até junho, o portal traráuma novidade para os moradores da cida-de. Está sendo desenvolvido um sistemapara a gestão da educação municipal. Pormeio do site, os pais poderão ter informa-ções sobre as escolas, fazer pré-matrículaon-line dos filhos e mesmo acompanhar seeles estão indo à aula direitinho.

Justiça O Judiciário também vem tentan-do se aproximar da população por meioda tecnologia. O Tribunal de Justiça de SãoPaulo (TJ/SP), que pode ser acessado nowww.tj.sp.gov.br, está passando por pro-fundas reformulações para melhor aten-der o cidadão.“Nosso objetivo é prestar ser-viços à população e facilitar seu acesso aoJudiciário por meio do acompanhamentoon-line dos processos. Todos os processosdo Juizado Especial Cível de São Paulo já es-tão digitalizados.No caso dessa vara,a pes-soa não só acompanha seu andamento co-mo também visualiza o processo”,conta E-duardo Francisco Marcondes, juiz assessorda presidência do TJ/SP. Até o final deste

ano, segundo ele, todos os processos doTJ/SP estarão digitalizados, o que totaliza17 milhões de processos em primeira ins-tância e 700 mil recursos em segunda ins-tância. Outra novidade é que até abril seráinaugurado um Fórum na Freguesia do Ó,bairro paulistano, que comportará cincovaras,todas funcionando sem papel.“O Fó-rum terá lugar para audiências. Fora essesprocedimentos,que precisam ser feitos pre-sencialmente, todo o resto funcionará viaInternet”, diz Marcondes.

Entradas Para quem quer usufruir dosserviços on-line do governo federal, sãoduas as principais portas de entrada vir-tuais. A primeira delas é o www.brasil.gov.br. Neste site, as informações mais pro-curadas são sobre aposentadoria por ida-de, auxílio-doença, concursos, Código Ci-vil Brasileiro e pré-natal. Já em relação aosserviços, os mais acessados são os ligadosà aposentadoria, como o andamento deprocessos de revisão de benefícios e deconcessão inicial de benefícios. O portalainda traz notícias, links para todos osórgãos federais, informações variadas so-bre o país e sua história, uma área dedica-da à transparência na qual o internautatem acesso ao Orçamento da União, àprestação de contas do governo e a umapágina que estimula a participação da so-ciedade por meio de fóruns de debate so-bre os temas que estão sendo discutidos naadministração federal. O cidadão tambémconsegue, por meio do site, encaminharidéias e sugestões para anteprojetos de leie instruções normativas.

A segunda grande porta de entrada é owww.redegoverno.gov.br ou o www.e.gov.br,dois endereços que conduzem ao mesmoportal.“O governo federal tinha cinco por-tais. Fizemos um esforço para reduzir esimplificar o acesso. O www.brasil.gov.br érecente, mas não poderíamos eliminar owww.redegoverno.gov.br, pois este é umdos endereços mais conhecidos pelos inter-nautas”, justifica Rogério Santanna, secre-tário de Logística e Tecnologia da Informa-ção do Ministério de Planejamento, Orça-

* Índice que determina se as ferramentas do governo eletrônicoestão sendo usadas em o todo seu potencial nos sites públicos.Fonte: Relatório sobre governo eletrônico 2005 das Nações Unidas

Class. País Índice

1 Estados Unidos 1,000

2 Reino Unido 0,996

3 Cingapura 0,996

4 Coréia do Sul 0,976

5 Dinamarca 0,973

6 Chile 0,911

7 Austrália 0,903

8 Canadá 0,892

9 Suécia 0,865

10 Alemanha 0,842

11 Finlândia 0,826

12 México 0,819

13 Japão 0,815

14 Nova Zelândia 0,803

15 Noruega 0,796

16 Malta 0,792

17 Brasil 0,750

Ranking da ONU

de governo eletrônico*

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Desaf ios • abril de 2007 45

mento e Gestão.No site,que pode ser aces-sado pelos endereços www.redegoverno.gov.br ou www.e.gov.br, o internauta tam-bém vai encontrar informações variadassobre o país,como previsão do tempo e es-pécies da fauna brasileira ameaçadas de ex-tinção. Conseguirá obter informações so-bre aposentadorias, documentos, alvarás,pagamentos ao governo, concursos e se-leções e processos na Justiça. O portal trazainda informações sobre o Legislativo bra-sileiro, dicas de como abrir um negócio euma página dedicada a pesquisas escolarescom temas como energia nuclear,pesquisasespaciais e literatura.

Congresso Participar do processo legis-lativo também ficou fácil. Existe o portaldo Senado Federal (www.senado.gov.br)e o da Câmara (www.camara.gov.br). Esteúltimo traz informações e dados para con-tato com todos os deputados federais.“Ocidadão consegue acompanhar o anda-mento de um projeto de lei. Mediante ca-dastro, a cada novidade sobre a tramitaçãoa pessoa recebe a notícia por e-mail. O

portal traz um sistema de áudio e vídeopara que o internauta possa acompanharos debates em plenário ao vivo. Tambémorganizamos chats e fóruns para debatepopular sempre com a presença de umparlamentar”, afirma Cássia Regina Bote-lho, diretora da assessoria de projetos es-peciais da diretoria-geral da Câmara dosDeputados e coordenadora-geral do co-mitê gestor do portal, que é composto de16 mil páginas e tem 1,2 milhão de aces-sos por mês. Segundo ela, os serviços maisprocurados são as notícias e o acompa-nhamento de projetos de lei.

O ranking da Organização das NaçõesUnidas (ONU) publicado no Relatório so-bre Governo Eletrônico de 2005 (unpan1.un.org/intradoc/groups/public/ documents/un/unpan021888.pdf) coloca o Brasil na17ª posição entre os 191 países pesquisa-dos (leia tabela na pág. ao lado). Figurandono topo da lista,o Brasil está na companhiados países mais desenvolvidos do mundo.De acordo com o relatório, os sites gover-namentais brasileiros não deixam quasenada a desejar em relação aos portais norte-

americanos: o Brasil oferece a seus cidadãostrês quartos dos serviços oferecidos pelogoverno dos Estados Unidos, o primeirocolocado no ranking.

O governo eletrônico não se traduz ape-nas no fato de o governo ter um portal naInternet. O processo exige um esforço deintegração das bases de dados dos diversosórgãos e níveis governamentais para que oacesso às informações e serviços seja maiságil e adequado às necessidades dos cida-dãos. Um grande desafio a ser enfrentado,portanto, é a construção de um governoeletrônico desburocratizado. Não bastasimplesmente reproduzir o organogramado governo e publicar dados econômicos,sociais, culturais e populacionais sobre opaís, os estados e os municípios.É necessá-rio dar voz à sociedade para que ela parti-cipe do processo democrático.É preciso darao cidadão a chance de realmente fazer usodessa ferramenta virtual por meio da ofer-ta de serviços que simplifiquem sua vida.Quem sabe não viveremos para ver o dia emque as filas no INSS se transformarão emcoisas de um passado muito distante?

na Internet . Em 2005, 2.163 admin istrações mun ic ipa is estavam na rede

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ESPORTE

A pátriade bicicletas, quimonos,

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Esportes 04/04/07 13:46 Page 46

Com uma predi leção especia l pelas prát icas esport ivas, o brasi le iro sua a camisa em

muitas modal idades, mostrando um gosto que vai muito além do futebol . Pesquisa

real izada sob encomenda para o canal por assinatura SporTV mostra como, quando

e por que a população entra em mov imento

raquetes, chuteiras...

Esportes 04/04/07 13:48 Page 47

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cional”,era mal dimensionada.Saber quan-tos, como, onde praticam e quais esportesera praticamente impossível.

Para todos que se interessam por esse as-sunto, a boa notícia é que estudos recentesajudam a lançar luz sobre a relação do bra-sileiro com os esportes e,também,de comoé a estrutura para a prática de inúmerasmodalidades desportivas por todo o ter-ritório verde-amarelo.O principal desses es-tudos é o Atlas do Esporte no Brasil,um es-forço coletivo e virtual que está gerando omaior banco de informações esportivas dopaís, criado em fins de 2004. Outra novi-dade, mais recente, é o Dossiê Esporte, feitopelo Instituto Ipsos Marplan,sob encomen-da do canal de TV por assinatura SporTV.Entre outras iniciativas, podem ser com-putadas também pesquisas do InstitutoBrasileiro de Geografia e Estatística (IBGE),sobre municípios, e do Ibope, sobre torci-das. Pioneiros, esses estudos são preciosospara o balizamento do mercado esportivonacional e das políticas públicas na área.Prometem dar um novo rumo ao mundoesportivo a partir de agora.

Entusiasmo Daina Ruttul, diretora execu-tiva do Ipsos Marplan, é responsável peloDossiê Esporte e mostra-se entusiasmadacom o resultado do trabalho. A principalconclusão tirada do estudo é que quase to-do mundo se interessa por esporte, e isso éconfirmado pelo alto índice de 94%, con-siderando os que praticam e/ou assistem aatividades esportivas.“O esporte é muitopresente na vida de todos,o que também faz

com que seja um tema universal e com altograu de importância na vida das pessoas”,diz Daina Ruttul.

Do total dos participantes da pesquisa,23% afirmam praticar esportes sempre;31%, regularmente; 22%, às vezes; e 24%nunca fazem atividades esportivas (veja grá-

fico abaixo). Brasília se destaca como capi-tal dos atletas, onde 27% da população sededica a algum esporte regularmente; emSão Paulo são 23% da base avaliada.A pes-quisa traz um dado surpreendente: 35% doscariocas afirmam ser completamente se-dentários, ou seja, nunca praticam ativida-des esportivas – os que sempre praticam al-guma atividade física somam 24%.

Além de gostar de esporte, 74% dosbrasileiros sabem que ele tem relação dire-ta com a saúde.Apenas 5% das pessoas pes-quisadas discordam dessa afirmação. Ou-tros 53% declaram gostar da sensação de es-forço que o esporte proporciona e 48% pro-curam um bom condicionamento físico.Em termos de modalidades esportivas, asmais representativas são o futebol,o vôlei,anatação e o basquete.

No quesito prática esportiva, a modali-dade preferida pelos entrevistados da pes-quisa é a caminhada,sendo a primeira opçãopara 40% das mulheres e 21% dos homens.Do total, 31% dos pesquisados caminhampara manter a forma e ter saúde, e 30%gostam de jogar futebol. Separados porgênero,54% dos homens têm o futebol co-mo o esporte mais praticado.Já para as mu-lheres, depois da caminhada, vem o vôlei,adotado por 14% delas. Esse esporte, que

48 Desafios • abril de 2007

No quesito prática esportiva, a modal idade preferida pelos entrev istados da pesquisa

uem não se lembra dos “90 mi-lhões em ação / pra frente,Brasil /salve a Seleção”? Na década de1970,quando essa canção foi cria-da, seu objetivo maior era exaltar

a euforia de um país que tomava partido (depreferência dos mandatários da época),masque vestia a camisa,calçava as chuteiras e iaa campo na sua torcida eufórica por umagrande equipe, que se tornaria um dosmaiores símbolos da nação.Independente-mente dos vieses políticos,o que já se via na-quela época era a percepção intuitiva, porparte dos dirigentes,de que o brasileiro,as-sim como muitos povos, sempre teve (econtinuaria tendo) uma relação muito fortecom os esportes, tanto no ato de praticarquanto no de torcer.

Os militares do Golpe de 1964 não fo-ram os primeiros.Muito antes deles,GetúlioVargas já sabia que falar a linguagem do es-porte poderia ser um bom jeito de fazerpolítica: muitas decisões daquele governoeram anunciadas no Estádio de São Januá-rio,do Vasco da Gama,antes das partidas defutebol.E até hoje a regra continua valendopara o atual presidente Luiz Inácio Lula daSilva, que encontrou na metáfora esportivao melhor jeito de discursar para o povo.

Por tudo isso, fica muito claro que o es-porte tem um acesso fácil aos corações ementes nacionais.Contudo,por muito tem-po essa paixão ficou no escuro.Sabia-se queo brasileiro é fã de esporte,mas não o quan-to.Até mesmo a adoração pelo futebol,queestudiosos como o antropólogo RobertoDaMatta já chamam de “instituição na-

Dossiê Esporte Dossiê Esporte

Quantos

praticam

Esportes

que

praticam

Caminhada Futebol

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Todos

Homens

Mulheres

Nunca

24%

Ás vezes/quase nunca

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Quase sempre/regularmente

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Sempre

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tomou o lugar do basquete no gosto da po-pulação, está em terceiro lugar, no consoli-dado,com 13% da preferência dos entrevis-tados (veja gráfico abaixo).

A pesquisa ainda consegue apontar no-vas tendências, como o fenômeno das cor-ridas. Já são 5% do total de entrevistadosque afirmam praticar esse esporte. Cons-tata-se uma expansão muito grande dessatendência, inclusive com a percepção deempresas e mídias do aumento do interesseda população pelo assunto. Surge no paísum circuito de corridas, com provas emvárias cidades. Por causa desse fenômeno,empresas já estão patrocinando eventos,montando equipes para correr juntos,aliando estratégias de recursos humanoscom a promoção da saúde. Um dos casosmais famosos é o Nike 10k,uma corrida derua realizada em São Paulo patrocinadapela fabricante de artigos esportivos norte-americana, que teve mais de 25 mil ins-critos na sua segunda edição, em 2006, en-volvendo atletas e amadores num percur-so de 10 quilômetros.

Fases da vida A pesquisa mostra que a prá-tica esportiva está presente ao longo da vi-da,porém com diferentes intensidades.“Noauge profissional é difícil manter a regula-ridade esportiva, mas, na terceira idade, háuma volta à prática, agora com uma opçãopor atividades que promovam a saúde e aqualidade de vida,como caminhada”,reve-la a diretora do Ipsos-Marplan.

A fase de maior energia e tempo dedica-dos ao esporte é a que vai dos 12 aos 14

é a caminhada, sendo a pr imeira opção para 40% das mulheres e 21% dos homens

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Corrida BasqueteNataçãoVôlei Ciclismo

O Dossiê mostra que caminhada é o esporte predileto dos brasileiros, sobretudo à medida que envelhecem

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Esportes que

acompanham

pela mídia

50 Desafios • abril de 2007

Outra paixão do brasileiro é o esporte de “sofá”: 28% dos entrevistados acompanham esportes

tição esportiva pela TV.A pesquisa abrangetambém o interesse da população peloacompanhamento, por meio dos veículosde comunicação, das competições esporti-vas. Segundo números do Dossiê do Espor-te,que mapeia os gostos,as preferências e oshábitos do entrevistado relacionados ao es-porte,28% dos brasileiros acompanham es-portes sempre.Outros 30% revelam assistira esse tipo de programa regularmente ouquase sempre.Às vezes ou raramente é a res-posta de outros 32%. Somente 10% dizemque nunca vêem os jogos (veja gráfico

abaixo). Brasília e São Paulo são as praçascom maior número de pessoas acompa-nhando esporte pela mídia com regulari-dade – 32%.

O Dossiê do Esporte constatou que a es-magadora maioria dos torcedores aposta naeterna preferência nacional,o futebol.Assim,82% dos pesquisados acompanha sempre omundo da “bola na rede”pela TV (veja grá-

fico abaixo).Sendo que o percentual aumen-ta entre os homens:96% dos torcedores ante89% das torcedoras – número que reflete oerro da frase “futebol é coisa de homem”.Um contraponto importante é que 54% dosentrevistados afirmam que nunca freqüen-tam estádios de futebol e somente 2% dosque mantêm esse hábito aumentaram a as-siduidade nos últimos tempos. O vôlei e oautomobilismo seguem como os esportesque alcançam,em seguida,grande interessena cobertura televisiva.

Aqui entra outro ponto abordado pelapesquisa,o fator ídolo.Muitos dos que ain-da preferem o automobilismo citam os

entre crianças, jovens, adultos e idosos.“Opessoal acima dos 60 anos tem muito inte-resse em participar das nossas atividades e,cada vez mais, são presença constante nosprogramas oferecidos”, afirma MachadoNeto. O esporte atua como instrumentoeducativo para essa parcela da população,colocando-os novamente no centro de umcenário.“Com o esporte o pessoal da tercei-ra idade faz novos amigos e muitos até par-ticipam de competições.”

O Sesc não trabalha com o esporte de al-to rendimento. O foco das ações são as doesporte voltado para a inclusão social e aaprendizagem.“A idéia é criar a cidadania es-portiva, ideal para as pessoas em geral”, co-menta Machado Neto.“As empresas privadaspodem se dar ao luxo de trabalhar com de-mandas; nós temos de criar as demandas.”Um exemplo disso é a formação de uma tur-ma para a prática dominical de badmintonno Sesc Vila Mariana. Essa modalidade,pouco conhecida no Brasil,é uma prática dejogo parecida com o tênis,substituindo-se abola por uma peteca.O gestor explica que aregião tem muitos descendentes de orientais,que trazem a cultura de praticar esse esportedos países de onde vieram suas famílias.Com isso,foi detectada a oportunidade paraatrair essas pessoas com o esporte. O pro-grama de badminton daquela unidade játem mais de trezentos praticantes inscritos,com uma freqüência média de sessenta pes-soas por fim de semana.

Pela TV Outra grande paixão do brasileiroé o esporte de “sofá”, ou seja, ver a compe-

anos. Dos 18 aos 24, observa-se uma que-da na prática esportiva, que se acentuaprofundamente dos 30 aos 44 anos – augeda carreira profissional.A volta ao esporteé observada após os 55 anos, quando aenergia para a atividade física diminui,mas há mais tempo disponível para esta-belecer essa rotina, aliada às necessidadesde saúde. Entre as modalidades prati-cadas, o futebol aparece na faixa etária quevai dos 10 aos 18 anos entre os homens,caindo continuamente até chegar próxi-mo a zero na faixa dos 69 anos.

Maturidade De maneira geral, a prática detodos os esportes diminui ao longo daidade, com exceção da caminhada, quecresce proporcionalmente ao envelheci-mento. Certamente a explicação é o baixoimpacto dessa modalidade no corpo,espe-cialmente nas articulações.Um bom exem-plo de trabalho com o público acima dos 60anos é o do Serviço Social do Comércio(Sesc) de São Paulo.A entidade oferece es-porte como atividade de tempo livre, mascom especial significado para os praticantes.“Entendemos o esporte como uma mani-festação cultural contemporânea que temcompromissos com o desenvolvimento dacidadania e com a melhoria da qualidade devida das pessoas”,explica Olegário Macha-do Neto, gerente da unidade Vila Mariana,localizada na zona sul de São Paulo.

O público-alvo do Sesc, trabalhadoresdo comércio e de serviços, além de depen-dentes e a comunidade em geral,forma umamassa de cerca de 1,3 milhão de pessoas,

AutomobilismoVôlei

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Mulheres

Futebol

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Quase sempre/regularmente

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Dossiê Esporte Dossiê Esporte

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grandes brasileiros do esporte na categoria,Nelson Piquet, Ayrton Senna e EmersonFittipaldi. Daina Ruttul comenta que apesquisa apontou que essas personalidadesdo mundo dos esportes realmente ficam namemória do torcedor.“O ídolo passa a serum exemplo na percepção das pessoas”,diz. Há uma importância muito grandedesses ídolos na formação da população.Ela dá como exemplo o caso do automobi-lismo: desde a morte de Ayrton Senna, háquase treze anos, o esporte caiu em produ-tividade de campeões e vitórias brasileiras,mas a audiência televisiva foi pouco preju-dicada no mesmo período.

Mas o amor por um clube ou por umídolo não se transforma, necessariamente,em prática esportiva. “Torcer por umclube pode levar à prática esportiva, masnão conseguimos obter dados que justi-fiquem essa afirmação; o maior incremen-to dos torcedores chamados de fanáticosé mesmo no acompanhamento midiáticodo esporte, especialmente do futebol”, co-menta Daina Ruttul.

Pioneiros Time de pesquisadores Lamar-tine DaCosta, professor da pós-graduaçãoda Universidade Gama Filho, no Rio de Ja-neiro, e também membro do comitê de

pesquisas do Comitê Olímpico Internacio-nal (COI),mostra entusiasmo com a inicia-tiva do Dossiê Esporte. Ele é um dos pio-neiros em mapear o esporte no Brasil, como lançamento em 2005 do Atlas do Esporteno Brasil,uma publicação que surgiu do es-forço coletivo de muitos pesquisadores es-palhados pelo país. Sem parâmetros decomparação nem mesmo diálogo até então,o pesquisador manifesta alegria com algu-mas conclusões do trabalho da Ipsos Mar-plan que se mostram convergentes com oque vem sendo feito no Atlas.

Pedro Garcia, diretor de negócios daSporTV, empresa que fomentou a pesquisa

sempre, outros 30% revelam assistir a esse tipo de programa regularmente ou quase sempre

Basquete

5

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3

5

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Vôlei de praia FutsalFutebol de praiaNatação Ginástica olímpica

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Os ídolos influem muito na preferência dos telespectadores. O automobilismo até hoje se beneficia dos grandes pilotos brasileiros

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os esportes são como produtos e modis-mos, variando em função da oferta e daclientela”, explica.

Sem dúvida,já fomos o país unicamentedo futebol, mas hoje existe uma variedadeincrível de atividades esportivas sendo pra-ticadas no Brasil. Além das modalidadestradicionais e recentes, há outras que sãoimportantes em determinados nichos, co-mo o handebol no universo escolar.Ou ain-da o fato de que existem no país cerca de 50milhões de bicicletas rodando por aí.Outroexemplo notável é o total de 1,3 milhão depiscinas recreativas, soma superada so-mente pelos Estados Unidos.

DaCosta ainda lembra que o esporte émultiprofissional, mas tem um grupo queestá mais vinculado a ele,que são os profis-sionais de educação física, medicina e mí-dia. Na educação física, ele lembra, há umcrescimento impressionante no número de

cerca de 410 pessoas.Atualmente,são apro-ximadamente 1.000 voluntários partici-pando das várias equipes de pesquisado-res que alimentam constantemente essabase de dados.

Estagnação De lá para cá, a equipe de Da-Costa mantém a preocupação de não in-terpretar os dados dessa área como se fos-sem de um setor qualquer, já que é impor-tante entender que determinada modali-dade pode ter uma fase de crise e retomaro fôlego depois. Ele explica que, analisan-do historicamente, percebe-se que quasetodas as modalidades cresceram no Brasil,mas boliche,futebol e basquete passam porum período de estagnação em quantidadede adeptos. Outro dado importante é queo número de clubes esportivos vem cain-do ao longo dos anos.“A melhor forma deentender essas oscilações é verificando que

52 Desafios • abril de 2007

O PIB do esporte tem aumentado a taxas acima do crescimento do PIB do país. Entre 2000 e

na qual se baseia o Dossiê Esporte,concordacom o responsável pelo Atlas do Esporte noBrasil.Ele comenta que sempre sentiu a ne-cessidade de mais informações sobre osgostos e as práticas do brasileiro na área es-portiva,dados fundamentais para a geraçãode negócios e parcerias.“Para desenvolver oesporte no país, precisamos entender me-lhor como o público se relaciona com aspráticas,que tipo de atividades prefere exer-citar, o que gosta de ver”, comenta.

DaCosta explica que o Atlas do Esporteno Brasil é um imenso banco de dados quesegue um modelo único de produção emterritório nacional.Ou seja,o estudo é cons-tantemente alimentado por uma rede depessoas que ajudam a mapear as práticas es-portivas em todo o Brasil.“Seguimos umametodologia coletiva que permite uma ges-tão compartilhada do conhecimento”, diz.Quando lançado, no final de 2004, eram

1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005

em R$ Brasil 974 1,101 1,199 1,346 1,556 1,769 1,902

Esporte 18,6 21,7 23,7 26,4 30,0 34,1 37,1

% do PIB Esporte 1,91 1,97 1,98 1,96 1,93 1,93 1,95

O PIB do

Brasil e

o PIB do

esporte

brasileiro(em bilhões)

Dossiê Esporte

O futebol é o esporte preferido dos homens, tanto como prática como para acompanhamento. A fase em que eles mais se dedicam à "paixão nacional" é

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Esportes 04/04/07 13:52 Page 52

Saiba mais:

Desaf ios • abril de 2007 53

formados, já que esse grupo profissionalpraticamente dobra a cada três anos. Em2001,eram 77 mil estudantes em faculdadesde educação física.Atualmente,são cerca de120 mil.“No Brasil,somente o turismo estáà frente da educação física em crescimentode número de profissionais.”

Um programa citado pelo coorde-nador do Atlas como exemplar no incen-tivo ao esporte no Brasil é o Agita SãoPaulo. Criado pelo Centro de Estudos doLaboratório de Aptidão Física de São Cae-tano do Sul (CELAFISCS) em conjuntocom a Secretaria de Estado da Saúde deSão Paulo, o projeto visa acabar com osedentarismo do paulistano e propõe aprática de 30 minutos de atividade físicapor dia, seja no cotidiano doméstico, sejaao ar livre, seja no trabalho.“O Agita SãoPaulo tem cifras de envolvimento de pes-soas que são até superiores aos númerosda Europa Ocidental”, conta DaCosta.Para ele, esse item, que é a prática esporti-va pela qualidade de vida, é um ponto queainda precisa ser mais bem estudado.

Nessa questão, ainda, uma pesquisa doMinistério da Saúde publicada em marçodeste ano mostra dados realmente alar-mantes. O Vigitel Brasil 2006, trabalho rea-lizado por meio de ligações telefônicas paracidadãos de todo o Brasil,concluiu que 29%dos adultos de todas as capitais brasileiras

não praticam nenhuma atividade física emcasa,no trabalho ou no lazer; 43% estão aci-ma do peso, 11% dos quais estão obesos.Ou seja, apesar de pequenas divergênciasentre as pesquisas, fica claro que é impor-tante separar a paixão ativa pelos esportesda passiva (pelo consumo nas mídias),sen-do esta última um caminho bastante rápi-do para o sedentarismo. Também não sepode concluir que todo sedentário terá pro-blemas de peso.

Economia Uma herança fundamental doesporte é o retorno em investimento que elepode trazer para países, municípios e co-munidades – essa é, por exemplo, a princi-pal discussão a respeito dos Jogos Pan-Americanos do Rio de Janeiro, neste ano.Pesquisa do IBGE de 2003 mostra que osrecursos aplicados na função de desportoe lazer têm aumentado na última década.Nesse período, o crescimento foi próximodos 20%.O Dossiê Esporte também mostraque o esporte é um grande empregador: em2004, o número de empregos diretos e in-diretos gerados pelo esporte era de 1,174milhão. E a massa salarial diretamente ori-ginada pelo esporte totalizou 71,29 mi-lhões de reais em 2005.

Outro dado importante é que o PIB doesporte tem aumentado, inclusive emtaxas acima do crescimento do PIB dopaís. Em 2000, o PIB brasileiro ligado aoesporte foi de 21,7 milhões de reais. Em2005, o número foi para 37,1 milhões dereais (leia tabela na pág. ao lado). Um cres-cimento de quase 71% em cinco anos.Apenas de impostos, o valor repassado ao

governo pelas modalidades esportivascresceu de 5,39% do PIB para 9,27% nomesmo período.

Com o Pan-Americano se aproximan-do, a questão sobre a importância e o lega-do do esporte para o Brasil se torna mais ur-gente na pauta do país. Como membro dogrupo de pesquisas do COI, DaCosta estáacompanhando de perto as novas tendên-cias para a montagem dos grandes eventos.Por isso mesmo, ele comenta que não hámais dúvida sobre a importância deles paraos países em que serão realizados, excetoquando eles são mal administrados.“É pro-vável que o Pan-Americano do Rio tenhadificuldades em dar o retorno previsto”,diz.Segundo ele, houve muita briga entre asdiferentes instâncias de governo no começodos trabalhos. “Para deixar um legado, éfundamental fazer um evento de maneiraque se trasnforme o país que o está sedian-do, principalmente a localidade central. Oevento precisa ser tratado como uma ala-vanca para o desenvolvimento social.”

“Atualmente, o COI está se baseandonessas premissas para apoiar novos even-tos”, diz.A dúvida sobre o Pan vem do fatode que as obras mais importantes para essaherança local não foram feitas,como a des-poluição da Baía da Guanabara e a linha demetrô que seria estendida até a Barra daTijuca, sede dos jogos. O pesquisador nãotem dúvida quanto ao apelo que o eventoterá na população, mas lamenta a perda deoportunidade dos gestores.“Associar o es-porte à qualidade de vida é a última tendên-cia no assunto,mas nesse quesito o Pan deveficar devendo”, reforça.

2005, o PIB esportivo saltou de 21,7 milhões de reais para 37,1 milhões – um aumento de 71%

Dossiê Esporte http://globosat.globo.com/sportv/hotsite/dossie/dossie_esporte.htm

Atlas do Esporte Brasileirohttp://www.atlasesportebrasil.org.br/

IBGE - Perf il dos Municípios Brasileiros / Esporte http://portal.esporte.gov.br/arquivos/censo_esporte2003.pdf

Vigitel 2006 – Estudo sobre doenças crônicas http://portalweb05.saude.gov.br/portal/arquivos/pdf/relatorio_vigitel_2006_marco_2007.pdf

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entre os 10 e os 18 anos

Esportes 04/04/07 13:53 Page 53

MELHORES PRÁTICAS

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P o r G u s t a v o d e P a u l a , d o R i o d e J a n e i r o , R J

OBrasil é dono da maior biodiver-sidade do planeta. Dos quase 2milhões de espécies catalogadaspela ciência, estima-se que 15%

habitem o território brasileiro. Pesquisa-dores acreditam também que 70% dasplantas existentes no mundo podem ser en-contradas aqui.O número de espécies comsementes no país gira em torno de 60 mil,o equivalente a 22% do total já descobertopelo homem. Até pouco tempo atrás, noentanto,o Brasil ainda não havia encontra-do uma maneira de agregar valor a seu ri-quíssimo patrimônio genético, transfor-mando-o em instrumento concreto para odesenvolvimento econômico e social, semprejuízo para o meio ambiente. Nossa gi-gantesca biodiversidade estava sob o risco

de transformar-se num troféu guardado naestante. Mas a ousadia de uma pequenaempresa carioca vem mudando os rumosda biotecnologia nacional e abrindo cami-nho para a produção de fármacos baseadosna natureza brasileira.

Fundada em 1998, por um grupo decientistas da Universidade Federal do Riode Janeiro (UFRJ), a Extracta MoléculasNaturais foi a primeira empresa privada aobter uma licença especial do Ministériodo Meio Ambiente para acessar o patrimô-nio genético brasileiro e constituir uma co-leção comercial de amostras da biodiversi-dade do país. A autorização do Conselhode Patrimônio Genético (CGEN) foi con-cedida em junho de 2004. A trajetória depioneirismo da empresa, porém, começoucinco anos antes. Em 1999,a Extracta con-seguiu firmar com a então Glaxo Wellcomeum contrato de 3,2 milhões de dólares, naépoca o maior acordo de terceirização tec-nológica ao sul da Linha do Equador.O in-teresse da multinacional era fazer com queum grande número de elementos naturaisextraídos da flora brasileira fosse testadocontra alvos biológicos específicos, possi-bilitando a identificação de novas drogas.Cabe lembrar que a Medida Provisória

para tudo

Extracta, uma pequena empresa carioca, nascida dentro da universidade, conquistou

a primeira licença especial do Ministério do Meio Ambiente para acessar o patrimônio

genético nacional e montar um banco de amostras com f im comercial. Atualmente,

ela conta com uma coleção com mais de 40 mil substâncias e aposta na fabricação

de um novo antibiótico contra infecções de pele

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nados, desde doutores e mestres até técni-cos de nível médio, com salários que osci-lam entre 2 mil e 10 mil reais.“Acima de tu-do, o contrato permitiu a constituição dabase para o desenvolvimento dos nossosprodutos de entrada no mercado. Atual-mente, nosso capital gira em torno de 9milhões de reais. Triplicamos o capital ini-cial”, afirma Carvalho, que também é fun-dador da Associação Brasileira das Empre-sas de Biotecnologia (Abrabi).

Antibiótico Criada para atender às grandesindústrias farmacêuticas nacionais e inter-nacionais, a Extracta aposta hoje na pro-dução de um antibiótico para infecções depele.“Estamos investindo dinheiro da em-presa para levar o produto até a fase detestes clínicos e comprovar sua eficácia.Assim, conseguiremos vender a licença àindústria farmacêutica, que ficará respon-sável pelo investimento final.A expectati-va é que o medicamento chegue às prate-leiras das farmácias em dois ou três anos.Acredito que podemos fazer um antibióti-co mais barato e melhor do que os exis-tentes hoje no mercado”, diz o presidenteda Extracta.

Com o medicamento, a estratégia daempresa é abrir caminho para o desen-volvimento de antibióticos contra infecçõeshospitalares. Por trás dos três compostospuros isolados contra o Staphylococcus au-reus, estão 49 plantas antibióticas. Dessegrupo, a Extracta identificou quinze comnível de atividade biológica muito próximoà vancomicina, uma substância pura tra-balhada há anos pela indústria farmacêu-tica e bastante utilizada no tratamento deinfecções hospitalares.A empresa acreditaque essas plantas são ótimas candidatas afitoterápicos, para a venda no Brasil, naEuropa e nos Estados Unidos.

As perspectivas são muito boas. A Ex-tracta está prestes a assinar um contrato in-termediário de 250 mil dólares com umaempresa nacional,cujo nome não pôde serrevelado,que vai financiar a implantação deum grande banco de biodiversidade quími-ca no Pará.O projeto prevê o georeferencia-

mento de toda a bacia amazônica. O obje-tivo é entender sua dinâmica, analisandodesde a queda das chuvas e as mudanças detemperatura até a vazão dos rios e o im-pacto disso tudo nas florestas ao redor. Aprevisão é que,após oito meses de trabalho,as duas empresas assinem um contratomaior, de 2 milhões de dólares.“O segun-do contrato nos permitirá prosseguir como trabalho de bioprospecção, o que resul-tará em definir que certas plantas têm mui-ta utilidade no tratamento de determinadasdoenças e que precisam ser cultivadas lo-calmente.Vamos aproveitar esse cultivo pa-ra produzir extratos, uma atividade muitomais avançada do que derrubar árvores.Ascomunidades que receberem esse aporte detecnologia vão vender o produto para umacadeia de agregação de valor industrial atéos grandes mercados, possibilitando o re-torno de benefícios. Nós queremos que,junto com os produtos,sejam aproveitadosos intelectos humanos escondidos no meioda floresta. No desenvolvimento local, oque importa não é só o fluxo de ida e voltade recursos financeiros e materiais, mas degente. É preciso abrir oportunidades”, ex-plica Carvalho.

Ampliação Para realizar os novos estudosna Amazônia, a Extracta terá de ampliar aparceria com a Universidade Federal doPará (UFPA), em Belém. Durante o con-trato com a Glaxo, a empresa carioca cons-truiu uma central de extração no campusda UFPA, nos moldes da que mantinha noRio de Janeiro. “Nós montamos e equi-pamos o prédio, transferimos a tecnologiae sustentamos a equipe básica, formadapor quatro cientistas e seis técnicos, todoseles contratados.” Na época, o gasto girouem torno de 600 mil reais.“Para eles, foium grande avanço. Antes do nosso inves-timento, o departamento de química dauniversidade contava com 17 doutores,mas enfrentava sérias dificuldades paramanter suas pesquisas.A estrutura que exis-tia para a produção de extratos era 1 metroquadrado de bancada,onde se fazia apenasalgo amostral para ensinar aos alunos.

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Para realizar os novos estudos na Amazônia, a Extracta terá de ampliar a parceria com

(MP) 2.186, que instituiu o CGEN e regu-lamentou o acesso e a utilização do patri-mônio genético,foi editada apenas em agos-to de 2001.

Passados três anos da assinatura do con-trato,a Extracta havia isolado dez compos-tos puros para a Glaxo.A multinacional,noentanto, não quis exercer a opção contra-tual de licença exclusiva para comercializa-ção.O acordo foi encerrado em 2003.“Nósdeterminamos sete inibidores de elastase,uma enzima cujo distúrbio é responsávelpor doenças pulmonares crônicas, e trêsprodutos antibióticos contra infecções hos-pitalares de Staphylococcus aureus resistenteà meticilina. Durante o trabalho, porém,ocorreu a fusão com a Smith Kline, e aGlaxo mudou sua política de desenvolvi-mento científico,direcionando o foco paraa engenharia genética. Com isso, a multi-nacional decidiu não prosseguir com oprojeto e assinou um destrato nos doandotodos os resultados”,conta Antonio Paes deCarvalho, presidente da Extracta.

Substâncias Os resultados a que se refereo cientista são os dez compostos purosjá mencionados, 14 adicionais, além de10.608 extratos alcoólicos e 29.847 fra-ções, totalizando 40.479 substâncias pron-tas para serem testadas contra qualquer al-vo biológico. É a maior e mais detalhada-mente registrada coleção de produtos na-turais da América Latina. Mantido em se-gredo industrial, esse material compõe obanco de biodiversidade química, que éa alma da empresa.

A existência física desse banco se traduzna câmara fria.É nela que as substâncias fi-cam armazenadas a menos de 30º C. “Oacordo com a Glaxo foi fundamental paraa estruturação da companhia.Só o maqui-nário de última geração que utilizamoscusta 1,5 milhão de dólares. Para ter idéia,nós montamos a primeira instalação in-dustrial brasileira capacitada a executar astecnologias de triagem biológica de alta ve-locidade.Sem falar que,para operar plena-mente,a empresa precisa empregar de trin-ta a quarenta profissionais finamente trei-

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a UFPA, em Belém, onde já constru iu uma centra l de ex tração semelhante à do Rio

Câmara fria onde fica o maior banco de produtos naturais da América Latina (ao alto, à esquerda). António Paes de Carvalho, presidente da Extracta (ao alto, à direita).

Laboratório da empresa, com equipamentos de triagem biológica de alta velocidade (acima)

Fotos Marcelo Hollanda

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Q u a s e me t ad e d a s c em d r og a s ma i s v e n d i d a s n o mun d o fo i c r i a d a c om ba s e

trabalho que ninguém fazia. Isso chamoumuito a atenção da comunidade científicae trouxe grande visibilidade para nós”,afirma o doutor em química orgânica Al-berto Cardoso Arruda, coordenador daCentral de Extração do Departamento deQuímica da UFPA.

A Extracta está às voltas também com oprojeto de construção da nova sede.No anopassado, a companhia decidiu reorganizaros negócios e vender seus 700 metros qua-drados de laboratórios químicos e biológi-cos instalados no Pólo de Biotecnologia doRio de Janeiro, que fica dentro do campusda UFRJ na Ilha do Fundão.“Nós vamosconstruir um prédio refinado,com cerca de1.000 metros quadrados de laboratórios eoutros 1.000 de instalações acessórias, co-mo a central de extração. Teremos cerca detrinta funcionários fixos,mas com estrutu-ra para abrigar até cem profissionais.A no-va sede deverá custar não menos do que400 mil dólares, além de 2 milhões de dó-lares em equipamentos. Estamos falandoem 2,4 milhões de investimento de sócios.

Não podemos fazer isso por conta própria,pois não sabemos a velocidade com que oscontratos vão entrar depois disso”, conta opresidente da empresa. A composição deparceiros ainda está sendo feita, e existe apossibilidade de a Extracta deixar a Ilha doFundão para ser remontada em Jacarepa-guá, onde há um número apreciável de in-dústrias farmacêuticas nacionais e interna-cionais.

Potencial O potencial da Extracta é enor-me. Basta lembrar que quase metade dascem drogas mais vendidas no mundo foicriada com base em compostos naturais.E que cerca de 30% dos medicamentostêm como princípio ativo elementos reti-rados da natureza. Isso porque apenas 5%da flora mundial já foi analisada para iden-tificar seu valor farmacológico potencial.No Brasil, a ciência conhece menos de 1,5mil espécies vegetais bioativas. Não poracaso, a Extracta observou que só 10%das plantas utilizadas na produção dos 680extratos ativos estudados por ela eram

Diante do grande desperdício de capaci-dade intelectual, nós nos propusemos adoar a estrutura necessária para a realiza-ção de um trabalho em escala industrial,atendendo ao contrato com a Glaxo.Assim,eles também poderiam absorver esse co-nhecimento e dar melhor formação a seusalunos”, lembra Carvalho.

Transferência Nessa nova etapa de traba-lho da Extracta, a equipe da UFPA rece-berá uma câmara fria e novos equipamen-tos. É possível que parte importante domaquinário da empresa no Rio seja leva-da ao Pará, possibilitando a transferênciada tecnologia avançada de robotização.“Será ótimo poder retomar as atividades.A parceria com a Extracta foi fundamen-tal em termos de instalações físicas, treina-mento de pessoal e transferência de tec-nologia. É extremamente positivo para auniversidade trocar idéias e experiênciascom o setor produtivo. Essa relação be-neficia muito a realização de pesquisas.Sem falar que nós ousamos realizar um

Exemplar de bromeliácea, planta que se mostrou ativa contra vários mecanismos de doenças (acima). Coletor da Extracta pesando amostras de vegetação extraída

Scx.hu

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conhecidas como medicamentosas.Mas a empresa não precisou realizar es-

tudos em laboratório para constatar que abiodiversidade brasileira ainda escondemuitos segredos. Para executar o contratocom a Glaxo, a Extracta teve de realizar acoleta de espécies vegetais.Ao todo, foramrealizadas 195 expedições em seis estados:Rio de janeiro (100), Pará (58), Minas Ge-rais (10), Espírito Santo (2), São Paulo (2)e Paraná (1).As equipes lideradas por eco-logistas, botânicos e engenheiros florestaispercorreram cerca de 10 mil quilômetrosquadrados de Mata Atlântica e FlorestaAmazônica. Exemplares de mais de 5 milespécies de plantas foram coletados paraanálise.“Nós deparamos com diversas es-pécies que nunca haviam sido identificadasou das quais não existiam registros nos doisbiomas que exploramos”,afirma Carvalho.

O biólogo e ecologista Flávio de BritoPereira, que liderou 57 expedições da Ex-tracta na Mata Atlântica, lamenta que sórestem hoje cerca de 7% da área original dafloresta. “É impressionante a riqueza da

em c ompo s to s n a t u r a i s . E c e r c a d e 3 0% d o s med i c amen to s , t ambém

Mata Atlântica. Só no Rio de Janeiro, euachei três espécies novas sem procurarmuito.A experiência que mais me marcou,no entanto,foi uma expedição que fizemosa São Pedro dos Ferros, em Minas Gerais,durante a primavera. Lembro que a equipecoletou mais de quinhentas amostras deplantas, quando a média é vinte amos-tras”, conta ele.

Surpresas As expedições, porém, não re-velaram apenas boas surpresas para a Ex-tracta. A empresa constatou que 70% daspropriedades de Mata Atlântica e 95% dosterrenos na Amazônia não têm proprie-dade documental estabelecida.Esse quadroimpõe dificuldades ao trabalho de biopros-pecção no Brasil.O CGEN só concede a li-cença a essa atividade mediante a apresen-tação de contrato de repartição de benefí-cios com o proprietário, que precisa pos-suir o título da propriedade ou a certidãode posse mansa e pacífica. É necessárioapresentar também um documento deanuência prévia testemunhando que aque-

le que preservou o patrimônio genético foidevidamente esclarecido a respeito do con-trato e seus objetivos.

O diretor de patrimônio genético doMinistério do Meio Ambiente, EduardoVélez, admite a necessidade de mudançasna MP 2.186.“Nós somos testemunha dasdificuldades enfrentadas pela Extracta,umaempresa cujo pioneirismo tem de ser desta-cado.Mas estamos trabalhando para tornara legislação mais ágil. Já apresentamos àCasa Civil um projeto de lei abolindo o sis-tema contratual. Hoje, o grande problemaé que toda a cadeia do processo tem de seregularizar, quando o que interessa paranós é só o início e o fim, ou seja, o patri-mônio genético brasileiro e o produto co-mercial”, afirma Vélez.

A proposta do Ministério do Meio Am-biente é criar um fundo federal para finan-ciar a realização de pesquisas e a conser-vação do patrimônio genético. A institui-ção acessaria um sistema eletrônico e ca-dastraria o produto e o fim pretendido. Alicença seria automática, e a empresa teriaapenas que informar o andamento do pro-cesso. Não haveria mais a necessidade defirmar contrato com os proprietários deterra. O dinheiro do fundo viria da tribu-tação sobre os lucros gerados com a patentede um produto.“Além do projeto de lei, es-tamos propondo uma medida provisória,que já deveria ter sido publicada, para ex-cluir as instituições da obrigação de ter deapresentar todos os contratos de repartiçãode benefícios. A empresa só teria de apre-sentar o contrato caso a atividade de bio-prospecção resultasse num produto comer-cial. Dessa forma, bastaria a anuência doproprietário.Temos de criar condições paraa promoção da biotecnologia e do uso sus-tentável da biodiversidade. Não podemosexportar só frutas”, conclui Vélez.

Mas, para melhorar o nível de inova-ção da nossa indústria e conseqüente-mente das nossas exportações, é precisoque um número maior de empreende-dores confie no potencial brasileiro, ex-plore o campo à frente e volte com a re-compensa do pioneirismo.

da mata (ao centro). Técnico prepara amostra para controle de qualidade dos extratos.

Fotos Divulgação/Extracta

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Um dos efeitos da elevação da tem-peratura na Terra,nos últimos anos,éo derretimento do gelo dos pólos,cu-ja conseqüência é a elevação do nívelde água nos oceanos e o alagamen-to de áreas litorâneas. Para compre-ender como funciona esse ambientee as transformações que estão ocor-rendo, a Organização das NaçõesUnidas criou um programa mundialde pesquisa – o Ano Polar Internacio-nal (API) – e estabeleceu que, de2007 a 2009, pesquisadores sedediquem ao tema. O envolvimento é

geral: 50 mil pesquisadores con-duzirão 227 projetos em 63 países.No Brasil, 28 projetos serão levadosadiante por trinta universidades ecentros de pesquisas. Para que issoseja possível,o Ministério da Ciênciae Tecnologia (MCT) disponibilizou9,2 milhões de reais,provenientes defundos setoriais, que serão repas-sados em dois anos por meio do Con-selho Nacional de DesenvolvimentoCientífico e Tecnológico (CNPq). Opaís tem experiência na área. Há 25anos mantém pesquisas na Antártica.

A preocupação com os efeitos quea emissão exagerada de dióxido decarbono (CO2), por indústrias, car-ros,produção agropecuária e muitasoutras atividades humanas, tem cau-sado no clima motivou uma especu-lação no mínimo curiosa.Pesquisa-dores calculam as probabilidadesde sucesso de captura e armazena-mento do gás para estancar seusdanos de imediato, sem ter de re-duzir o ritmo de vida nem alterar oshábitos das pessoas e das empre-sas – e ganhar tempo para o desen-volvimento de tecnologias limpas.Aidéia saltou das conjeturas para umfosso de 700 metros de profundi-dade, que começou a ser perfuradono mês passado próximo a Berlim,capital alemã.A intenção dos pes-quisadores do Centro Nacional dePesquisas em Geociências da Ale-manha é bombear 60 mil toneladasde dióxido de carbono (quantidadeequivalente à resultante da res-piração de 144 mil pessoas) para opoço e deixá-las ali por dois anos,estocadas em rocha porosa,arenitoe solução salina. Nesse período, ospesquisadores planejam observar,por dois fossos paralelos, como ogás se espalha pelo subsolo e de-terminar a viabilidade da estoca-gem subterrânea por longo prazo.

CIRCUITOciência&inovação

Pesquisa Andréa Wolffenbüttel Texto Eliana Simonetti

Aquecimento global II

Varrendo o gáspara debaixo do tapete

A Petrobras acaba de assinar doismemorandos de contratos.Um deles,firmado com o Ministério de Ener-gia e Recursos Minerais da Jordâ-nia, reconhece a competência daempresa no aproveitamento comer-cial do óleo de xisto – tecnologiaque começou a ser desenvolvida nofinal dos anos 1950 e foi patentea-da como Petrosix. No Brasil, a Uni-dade de Negócio da Industrializaçãodo Xisto da Petrobras, no Paraná,produziu cerca de 4,2 mil barrisdiários no ano passado.A Jordâniaquer suporte para extrair suas re-servas.O outro memorando foi assi-nado com o Japan Bank for Inter-national Cooperation. Os japonesesestão interessados em investir nopaís e, para isso, querem aproveitara capacidade de pesquisa e plane-jamento logístico da Petrobras.Pre-tendem que a empresa organize umplano para a aplicação de recursosem produção e comercialização deetanol,biodiesel e bioeletricidade.APetrobras, por seu turno, quer ga-rantir a exportação de 3,5 bilhõesde litros de biocombustíveis para oJapão até 2011 – mais do que o do-bro do que o Brasil exportou para osEstados Unidos no ano passado.Como se vê, está a todo o vapor.

Combustíveis

Petrobras atodo vapor

Aquecimento global

Expresso polar

RFID é a sigla em inglês usada paraas etiquetas inteligentes que aos pou-cos estão substituindo o código debarras. Permitem a identificação porradiofreqüência, a distância, e maiorcontrole sobre circulação de merca-dorias, por exemplo. Foram usadas

nos ingressos dos jogos da Copa doMundo de Futebol da Alemanha. Poisagora têm nova utilidade que em breveestará disponível no Brasil: o rastrea-mento de documentos em recipientesfechados ou em grandes depósitos.Osistema vai ajudar a acabar com o ex-

travio de papéis dentro de empresas.Ou ser útil no controle de processosdo Judiciário.A tecnologia foi desen-volvida pela empresa Recall, perten-cente ao grupo australiano Brambles,cuja especialidade, desde 1875, é aadministração de informações.

Controle de informação

Não se perde mais

Nasa

Circuito#33 04/04/07 14:03 Page 60

Desaf ios • abril de 2007 61

Em sete anos de investigação em dezestados, por mais de 30 mil km decerrado, pesquisadores da Universi-dade de São Paulo descobriram 253espécies de répteis. Os caçulas dafauna brasileira são dois lagartos.Foram encontrados nos parques na-cionais da Serra das Confusões, noPiauí,e Grande Sertão Veredas,entreMinas Gerais e Bahia. Descritos noSouth American Journal of Herpeto-logy,publicação da Sociedade Brasi-

leira de Herpetologia,são chamadoscarinhosamente de Stenocercus squa-rrosus e Stenocercus quinarius.Am-bos vivem em regiões de savana mui-to densa e seca,no topo de chapadas.O primeiro tem escamas arrepiadasno dorso e o segundo tem cincocristas ao longo do corpo. Compõemuma espécie comum na região dosAndes, mas pouco conhecida no Bra-sil. Sinal de quanto há a desvendar,ainda,na biodiversidade brasileira.

Biodiversidade

Caçulas da fauna brasileira

Informática II

Arranjo produtivo curitibano

Curitiba, a capital paranaense, temlarga tradição em planejamento –nas mais diversas áreas. É conside-rada cidade modelo.O transporte pú-blico é eficiente, há leis de zonea-mento que impedem a poluição ex-cessiva do ar e da água por indús-trias e preserva-se, ali, a qualidadede vida. Sua mais recente novidadeé a implantação de um Arranjo Pro-dutivo Local (APL) de softwares.Tra-ta-se de um projeto estratégico que

pretende propiciar a expansão dasempresas do setor com redução decustos (todas usarão as mesmascentrais de compras, recursos huma-nos e assessoria jurídica) e facili-dade de acesso a recursos disponi-bilizados pela Financiadora de Estu-dos e Projetos do Ministério da Ciên-cia e Tecnologia (Finep). Cerca decinqüenta empresas já manifestaraminteresse em participar e pelo me-nos dez confirmaram a participação.

A Universidade do Estado do Rio deJaneiro (Uerj) tem se destacado empesquisa de novos materiais. Em2005, ganhou o IF Gold, prêmio dedesign concedido há 51 anos numaexposição realizada na cidade deHannover, na Alemanha, com um tra-balho desenvolvido com a palmeirapupunha. De outra linha de pesquisanasceu a microempresa Fibra DesignSustentável. Começou suas ativida-des trabalhando com bambu e hojetem duas novas invenções para subs-tituir a madeira de lei na fabricaçãode móveis e revestimentos.Fibras dotronco de bananeira, com resina de

mamona,dão origem ao Bananaplac,laminado que pode tomar o lugar dafórmica. Da casca que envolve opalmito nasce o compensado de pu-punha. Os produtos ecológicos, bio-degradáveis e prensados a frio, queconsomem pouca energia, fizeramsucesso na feira Salone Satellite, deMilão, na Itália.A intenção da equipeda Fibra é repassar a tecnologia acooperativas para possibilitar o au-mento da renda de pequenos agri-cultores.Mais informações estão dis-poníveis na Internet nos endereçoswww.esdi.uerj.br/pupunha e www.es-di.uerj.br/bananaplac.

Novos materiais

Criatividade é que não falta

A empresa Cientistas Associados De-senvolvimento Tecnológico, incuba-da na Fundação Parque de Alta Tec-nologia de São Carlos (ParqTec), nointerior paulista,está desenvolvendoum sistema robótico que funcionarácomo uma plataforma: os usuáriospoderão aplicar diferentes progra-mas e equipamentos e adequá-lo àssuas necessidades, para oferecercursos a distância para aplicaçõesindustriais ou médicas,entre outras.O projeto é financiado pelo ConselhoNacional de Desenvolvimento Cientí-fico e Tecnológico (CNPq) e pela Fun-dação de Amparo à Pesquisa do Es-

tado de São Paulo (Fapesp). Espera-se que a novidade incentive a cria-ção de novos laboratórios de robó-tica, setor promissor que ainda en-gatinha no Brasil. Na mesma linha,aequipe da Cientistas Associadosmantém,desde o ano passado,o pro-jeto Robô na Escola, que ensina acrianças de bairros carentes da ci-dade para que servem a tecnologiae a ciência aplicada.O ParqTec pro-move a aproximação entre cientistase empresas desde sua criação, em1984. Iniciativas inovadoras que,além de negócios,geram desenvolvi-mento para a sociedade.

Informática I

Robô de 1.001 utilidades

UERJ/Divulgação

45 mil quilômetrosÉ a distância que será percorrida, nos cinco continentes, pelo ecoautomobilista Rainer Zietlow,a bordo de um furgão movido a gás natural veicular. Ele já passou pelo Brasil e quer provarque é possível dar a volta ao mundo quase sememitir gases de efeito estufa. Mais informações em www.ecofuel-world-tour.com.

Circuito#33 04/04/07 14:04 Page 61

Aos 15 anos, o Mercosul chegouà adolescência. Como todos osjovens nessa faixa de idade, elenão sabe bem o que pretende ser

quando se tornar adulto e não se conformamuito ao padrão ideal traçado para ele pe-los “pais fundadores”. Quando pequeno,tudo parecia sorrir para o Mercosul. De-pois, algumas desavenças internas mina-ram a paz do lar e o Mercosul nunca maisvoltou a ser o mesmo: entrou na adolescên-cia já com sérios problemas de comporta-mento e seus membros não parecem terprojetos coincidentes para o futuro.

Esse livro oferece um panorama amplo erealista das muitas conquistas alcançadas ede algumas frustrações acumuladas ao lon-go dos anos.O argentino Félix Peña desmis-tifica alguns mitos ou incompreensões quan-to ao alcance dos conceitos de “união adua-neira”e “mercado comum”. Ele reconhece asdificuldades e não tem a pretensão de resol-vê-las com fórmulas mágicas. Por isso pro-põe um caminho baseado numa arquitetu-ra flexível, dotada de três velocidades: Brasile Argentina caminhariam mais rápido, osdois menores teriam facilidades adicionais eos associados fariam sua integração gradati-va aos requerimentos da união aduaneira.Faltou dizer o que fazer com a Venezuela.Ou-

tro argentino, o ex-secretário da Indústria eComércio,Dante Sica,faz o balanço das mu-danças econômicas ocorridas nos diferentessetores e ramos produtivos dos membros,bem como nas suas macroeconomias. Ad-mite a existência de assimetrias,mas sua pro-posta seria uma volta ao espírito do Progra-ma de Integração e Cooperação Econômica(Pice) dos anos 1980.

O representante oficial do Ministério dasRelações Exteriores tratou da questão insti-tucional,ostentando uma postura equilibra-da quanto à não-opção pela supranaciona-lidade,um falso problema criado por espíri-tos acadêmicos. Ele prefere contrapor a essaalternativa teórica o reforço da efetividadedas decisões adotadas de comum acordo,cu-ja transposição para o terreno prático carece,precisamente, da eficácia requerida de nor-mas que garantam a segurança jurídica numespaço verdadeiramente integrado.O ex-di-retor do Banco Central Carlos Eduardo deFreitas aborda macroeconomia e finanças,demonstrando preocupação com a interfe-rência direta do governo da Venezuela nosmercados.

O economista do Banco Interamericanode Desenvolvimento (BID),Uziel Nogueira,examina os aspectos políticos e sociais, a-pontando a maior cooperação patronal na

área agropecuária e o acirramento das re-lações no setor industrial. Marcel Vaillant,consultor da Secretaria Técnica do Merco-sul,aborda as negociações comerciais exter-nas: os resultados são escassos em vista dasexpectativas geradas e existe a ameaça daperda de mercados em razão dos acordos bi-laterais entre os EUA e países da região. Orepresentante uruguaio na Associação Lati-no-Americana de Integração (Aladi), Au-gustin Espinosa, trata em detalhe da inte-gração física (energia,telecomunicações),dacooperação judicial e do Fundo de Correçãode Assimetrias, o Focem. O Brasil, conside-rado de maneira equivocada um país “não-assimétrico”, contribui com 70% dos 100milhões de dólares de obrigações não-reem-bolsáveis do Focem,mas só se beneficia com10% dos projetos a serem financiados. Ex-negociador pelo Brasil no Mercosul, o em-baixador Rubens Barbosa faz a síntese dostrabalhos nas diversas áreas tratadas peloseminário que deu origem ao livro. Concluique o Mercosul não vai desaparecer, mas seencontra num “plano inclinado”.

As mudanças são, obviamente, sempredifíceis e não é seguro que elas sejam ado-tadas no futuro previsível.Estaria o Mercosulcondenado a ser um eterno adolescente, os-tentando uma espécie de “complexo de PeterPan”? Impossível prever atualmente,tendo obloco completado recentemente 16 anos,mas adolescentes tardios costumam darmais trabalho do que o esperado…

Paulo Roberto de Almeida

Quinze anos de Mercosul

Mercosul 15 AnosRubens Antônio Barbosa (org.)Imprensa Oficial do Estado de SP, 2007,304 p., R$ 40,00

62 Desafios • abril de 2007

ESTANTElivros e publicações

Estante33 04/04/07 14:05 Page 62

P ersonalidades egocêntricas en-comendam obras de arte comum foco enaltecedor de suas su-postas qualidades: elas são egois-

ticamente centrípetas. O editor-historiadorJaime Pinsky é uma personalidade centrífu-ga e o lema de sua editora é,apropriadamen-te,“promovendo a circulação do saber”. Elerealmente tem muito a comemorar em vinteanos de disseminação ativa da cultura uni-versitária, que ajudou a promover no Brasilpós-ditadura. Em lugar de uma grande fes-ta, ele oferece um balanço honesto e umaavaliação sóbria de como o Brasil mudou –algumas vezes, para pior – nas duas primei-ras décadas de existência da sua editora.

Uma consulta ao índice confirma que oretrato cobre campos relevantes da vida na-cional: economia, trabalho e renda, políticaexterna, política interna, direitos humanos,cultura, saúde, esportes, mulheres, jornalis-mo, turismo, cidades, nutrição, alfabetiza-ção, comportamento e estudos da língua.Asmudanças mais perceptíveis foram prova-velmente observadas na língua e nos com-portamentos, com a geração Internet e umintenso recurso a novos modismos de ori-gem americana. A economia e a políticatambém sofreram grandes mudanças, maso balanço nessas áreas pode não ser dos maisgratificantes, uma vez que as decepções seacumulam em ambas.

Antonio Corrêa de Lacerda refaz a tra-jetória de luta contra a inflação, mas é obri-gado a constatar que as políticas econômicasmobilizadas foram incapazes de promover aretomada do crescimento.Márcio Pochmananalisa as transformações estruturais nomercado de trabalho e lamenta as tendênciasà flexibilização da legislação trabalhista,semregistrar que a rigidez desta última está naorigem da informalidade e do desemprego.Demétrio Magnoli não poupa o irrealismoda atual política externa,acusando-a de nos-tálgica do “Brasil Potência”.Na política inter-na,Leandro Fortes enfatiza o crescimento dofisiologismo e da corrupção: ele acredita queocorreu uma “despolitização deliberada do

povo brasileiro nas últimas duas décadas”.Oparadoxo é que “a cultura política nativa es-tagnou-se nas bordas do século XIX, embo-ra movida a urnas eletrônicas”. No campodos direitos humanos, Marco Mondainoconstata que o Brasil legal avançou, masmantém o abismo desumano do Brasil real,cruel para os pobres.

O texto sobre as cidades é sociologica-mente impressionista, perdendo a oportu-nidade de efetuar um diagnóstico dos gravesproblemas urbanos acumulados em duasdécadas de baixos investimentos em infra-estrutura. Da mesma forma, o ensaio sobrealfabetização se perde em considerações tipi-camente acadêmicas sobre a “psicogênese dalíngua escrita”, o construtivismo e o letra-mento, deixando de lado o contexto dessegrave problema: ele não é tão-somente resi-dual,uma vez que o analfabetismo funcionalestende-se assustadoramente (mas disso nãohá traço no texto). O médico AristodemoPinotti oferece, em contrapartida, uma boaapresentação das mudanças ocorridas nasaúde,com a consolidação do SUS,a amplia-ção da cobertura,avanços na prevenção pri-mária e a expulsão da classe média do sis-tema público. O capítulo seguinte informaque a desnutrição recuou bastante no Brasil,sendo hoje basicamente marginal; os pro-blemas do sobrepeso e da obesidade “ga-nham corpo”, se ousamos a expressão. Napolítica cultural, fomos do “neopopulismodifuso para a valorização do mecenato pri-vado agenciado pelo Estado”.

Nas “transformações da língua”, acom-panhamos a salada cultural dos neologis-mos, as inovações do “tucanês”e do “lulês”,sem esquecer os ataques nacionalistas dodeputado Aldo Rebelo contra os estrangei-rismos e a voga do politicamente correto.Asmulheres obtiveram grandes conquistas,mas sua participação política ainda é restri-ta. O texto sobre comportamento é poucoobjetivo, enfocando as trajetórias diferentesde três mulheres de 20, 30 e 40 anos. Para ojornalismo, João Batista Natali prefere con-centrar-se nas mudanças técnicas, que po-

dem ameaçar a sobrevivência do papel e tin-ta. Nos esportes, Heródoto Barbeiro acom-panha o crescimento do profissionalismoe o impacto da globalização, ao passo queo turismo recebe tratamento desigual, com-binando dados objetivos com impressõesdo autor. Ataliba de Castilho, finalmente,realiza um excelente levantamento dos es-tudos lingüísticos no Brasil, com uma bi-bliografia atualizada e uma discussão bemestruturada dos progressos alcançados pelalingüística no país, inclusive graças ao pró-prio trabalho da Editora Contexto na di-fusão de bons títulos nessa área.

Não se oferecem conclusões nem JaimePinsky realiza, em sua introdução, uma sín-tese dos problemas tratados, contentando-se em apresentar os autores e a se pergun-tar se os sonhos de democracia, de justiçasocial e as aspirações de cultura, saúde e ali-mentação balanceada podem ser realiza-dos. Os autores são todos “prata da casa” eas receitas obtidas com a venda do livro sãodestinadas a projetos educacionais bene-méritos. Excelente decisão para uma edito-ra voltada para a “disseminação do saber”.Vamos agora aguardar o livro dos trintaanos, em novo contexto...

Paulo Roberto de Almeida

Vinte anos de Brasil

O Brasil no Contexto, 1987-2007Jaime Pinsky (org.)Ed. Contexto, 2007, 256 p., R$ 33,00

Desaf ios • abril de 2007 63

Estante33 04/04/07 14:06 Page 63

Quem recebe os benefícios

Bolsa Família

INDICADORES

p o r A n d r é a

W o l f f e n b ü t t e l

64 Desafios • abril de 2007

O governo divulgou as contas de 2006 do Pro-grama Bolsa Família (BF), grande cabo eleitoraldo presidente Lula. Analisando regionalmenteos números, percebe-se que o Nordeste foi ogrande beneficiado. Mais da metade dos recur-sos (52%) do BF foi para o estados nordestinos,que contam com apenas 28% da população. Asegunda maior beneficiada foi a região Sudes-te, que recebeu 24% dos recursos. Os estadosdo Sudeste concentram a maior parte da popu-lação do país, mas também são os mais ricos,respondendo por 55% do PIB brasileiro. Obser-

vando a distribuição estadual, Bahia, Minas Ge-rais, São Paulo e Ceará lideram o ranking dosque mais receberam benefícios do BF. São esta-dos com perfis muito distintos, conforme se vênos gráficos relativos a cada um deles. Por fim,há três gráficos mostrando os valores de todosos estados. O primeiro compara a participaçãodo volume de benefícios recebidos com o ta-manho da população. O segundo compara a fa-tia dos benefícios recebidos com a participaçãono PIB. E o último mostra o valor médio mensalpago às famílias.Dívida interna é a soma de todos

os débitos assumidos por alguém junto a credores residentes no próprio país.Essa dívida pode ser de qualquer um,mas normalmente, quando se fala “dívida interna”, faz-se referência aosdébitos do governo, seja ele federal(inclusive o Banco Central), estadual,municipal, e também às estatais.Se o valor dessas despesas supera o das receitas, o governo só tem trêsalternativas: emitir papel moeda, aumentara carga tributária ou lançar títulos.Para evitar inflação, o governo federal tem optado pelas duas últimas soluções.Veja nos gráficos abaixo o comportamentoda dívida interna líquida do governofederal nos últimos anos.

O que é?

Dívida interna

Bahia • 1ºcolocado (em %) Minas Gerais • 2ºcolocado (em %)

São Paulo • 3ºcolocado (em %) Ceará • 4ºcolocado (em %)

Part. nos benefícios

do BF

Part. no nº defamílias

benef iciadas

Part. na população do país

Part. no PIB

do país

Part. nos benefícios

do BF

Part. no nº defamílias

benef iciadas

Part. na população do país

Part. no PIB

do país

Part. nos benefícios

do BF

Part. no nº defamílias

benef iciadas

Part. na população do país

Part. no PIB

do país

Part. nos benefícios

do BF

Part. no nº defamílias

benef iciadas

Part. na população do país

Part. no PIB

do país

13,412,7

7,5

4,9

8,9

23,4

9

24,5

4

22,8

8

26,2

1

25,7

2

31,

71 36,6

4

10,2

21,9

30,9

Dívida interna líquida do

governo federal e Banco Central

Em bilhões de reais

Em percentual do PIB(no mês de dezembro)

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

10 10,3 10,5

9,4

8,78

4,4

1,9

Fonte: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS)Fonte: Banco Central

267,

57

308

,52

363,2

4

417,

47

476,

36

617,

43 78

2,8

0

Indicadores#33 04/04/07 14:08 Page 64

Desaf ios • abril de 2007 65

Participação nos benefícios do Bolsa Família (em %)

Participação na população do país (em %)

Participação no PIB brasileiro (em %)

Nordeste52

Sudeste24

Sul9

Norte9

Centro-Oeste, 6

Nordeste28

Sudeste42

Sul15

Norte7

Centro-Oeste, 8

Nordeste14

Sudeste55

Sul18

Norte5

Centro-Oeste, 8

Comparação entre a participação nos recursos do Bolsa Família e na população (em %)

Comparação entre a participação nos recursos do Bolsa Família e no PIB do país (em %)

Valor médio mensal por família (em %)

25

20

15

10

5

0BA MG SP CE PE MA PA PB RS PR RJ PI AL RN AM GO SE ES SC MT TO MS RO DF AC RR AP

Fonte: Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS)

35

30

25

20

15

10

5

0BA MG SP CE PE MA PA PB RS PR RJ PI AL RN AM GO SE ES SC MT TO MS RO DF AC RR AP

70

65

60

55

50

45

40CE MA AM PB SE PA PI BA AC AL PE RN RR Brasil RO SC RS MG TO PR MT ES RJ SP MS GO AP DF

Part. nos benefícios do BFPart. na população total do Brasil

Part. nos recursos do BFPart. no PIB

Indicadores#33 04/04/07 14:09 Page 65

Em relação à matéria “A dura vi-da da sociedade alternativa” (De-safios nº 30, jan/2007), acho es-tranho que, pouco tempo depoisque a proposta do Microcrédito foilaureada com o Nobel da Paz, nãotenha sido feita uma reportagemacerca da viabilidade dos empreen-dimentos de economia solidáriano país. Por sinal, a matéria pecapor: a) basear-se demais na pro-posta do governo, que possui vá-rias lacunas; b) não alertar para aimportante participação de cen-trais sindicais nas experiências quederam certo; c) confundir disci-plina e hierarquia, típicos de qual-quer empreendimento,com a exis-tência ou não de patrão; e,por fim,d) desconsiderar a existência daExpo Brasil em evento realizadosob os auspícios do programa deDesenvolvimento Local Integradoe Sustentável, o DLIS.Voltando aoMicrocrédito: é esse mecanismo omais importante afluxo de recur-sos para a economia solidária demédio e pequeno porte. Aquelaque existe além das siderúrgicas.

Ecio RodriguesEngenheiro florestal

Rio Branco - AC

Caro Ecio, agradecemos suasobservações e prometemos publicar,em breve, uma reportagem abor-

dando os efeitos benéficos do Mi-crocrédito nos empreendimentos depequeno e médio portes.

Li a matéria sobre pedágio ur-bano (Desafios nº 31, fev/2007)e resolvi dar minha contribuiçãoao debate. Sou engenheiro civil,estudei planejamento urbano naEscócia e transportes na Ingla-terra. Fui professor do Departa-mento de Transportes da UFPR.Não creio que pedágio seja solu-ção,embora tenha sido no caso deLondres.

O Brasil não se pode dar ao luxode seguir todas as soluções válidaspara os países ricos, embora algu-mas já sejam viáveis.Uma alterna-tiva que não implique obras públi-cas talvez seja rejeitada pelas autori-dades, porque não aparece e nãodá votos,embora possa minimizaro problema da gestão da demandapor vias de transporte.

A gestão da demanda nadamais é do que alterar os horáriosde pico nas vias de transporte. Háhoras do dia que o número deveículos é de tal ordem que não hávias suficientes para atendê-los.Isso gera congestionamentos e,co-mo conseqüência, todos os malesa eles associados: poluição do ar,consumo excessivo de combus-tíveis, estresse etc. É preciso que aspessoas mudem os horários decirculação no sistema viário.

Para quem gosta de obras, hásoluções alternativas: ônibus ex-pressos circulando em canaletasexclusivas,trincheiras, flyovers,sis-temas binários de mão única emcada sentido, proibição de esta-cionamento ao longo das vias (oque exige a construção de maisestacionamentos fora das vias) etc.

Não se pode resolver uma difi-culdade criando novos problemas.Há necessidade de analisar a ques-tão como um todo: as vias, os veí-

culos, os motoristas, a legislaçãoetc. Alterar apenas um compo-nente do sistema significa trans-ferir o problema para outro lugar.A última alternativa seria pedágiourbano. Sei o que é dirigir emmegalópoles, porém não apoioessa pseudo-solução para o Bra-sil.Ainda não é hora. Quem sabeno futuro, quando formos real-mente ricos, seja o momento depensar nisso.

Luiz Carlos Pinto MartinsEngenheiroCuritiba - PR

Fico indignada com a propostade criação do pedágio urbano (De-safios nº 31, fev/2007), impostoou qualquer coisa que desfalqueainda mais o bolso da população.Pensar em ter um sistema eficientede vistoria nos carros para impedirque os veículos sem condiçõescontinuem circulando e quebran-do em plena Marginal Tietê noshorários de pico não é sequer pau-ta para discussão. Não, fazemquestão de interditar pistas paramanutenção em pleno horáriocomercial, como aconteceu na se-gunda-feira de Carnaval, que eradia útil, gerando um engarrafa-mento de mais de 6 quilômetros navia expressa da Marginal Tietê.Porque não realizam tais manutençõesde madrugada? Porque, é claro, fi-ca mais fácil falar que é necessáriotirar parte dos carros de circulaçãocobrando pedágio...

Elizete F. BernardoAdministradora de

empresasSanto André - SP

CARTAS A correspondênc i a para a redação deve se r env i ada para car tas@desaf i os .o rg .b r

ou para SBS Quadra 01 - Ed i f í c io BNDES - Sa la 801 - CEP: 70076-900 - Bras í l i a DF

Repr

oduç

ão

66 Desafios • abril de 2007

Acesse o conteúdo da revista Desaf ios do Desenvolvimento no endereço:

www.desafios.org.br

ENQUETEDesafios perguntou aos leito-res que visitam sua página naInternet se eles acreditam que asleis de incentivo cultural tiramdo governo o controle das polí-ticas culturais.A grande maio-ria, 75,4%, respondeu que não.Enquanto 24,6% consideraramque o governo perdeu o poderde conduzir a política culturalem razão das leis de incentivo.Veja a seguir algumas opiniõesa respeito.

O controle majoritário depolíticas públicas deve ficarcom o Estado, e não com omercado.

Humberto Rocha Engenheiro

Acredito que governos nãodevam controlar políticas cul-turais.É importante a livre ma-nifestação sem submissão auma visão de governo, quesempre será ideológica.

Gilson Jacob BergocArquiteto

O modelo de financiamentoà Cultura pelo qual o Brasil op-tou, transferindo à lógica em-presarial a decisão final sobrequais projetos receberão inves-timentos,aprofunda distorções,em vez de atender ao interessepúblico

José de Oliveira JúniorEscritor

CARTAS 04/04/07 14:10 Page 66