ATUAÇÃO DA ENFERMAGEM NA AVALIAÇÃO DA DOR NOS...

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* Bacharel em Enfermagem pela Universidade Federal de Sergipe. E-mail: [email protected] ** Bacharel em Enfermagem pela Universidade Federal de Sergipe. E-mail: [email protected] Artigo apresentado à Atualiza Cursos como requisito parcial para obtenção do título de Especialista em Enfermagem em UTI, sob orientação da Professora Msc. Cristiane Dias. ATUAÇÃO DA ENFERMAGEM NA AVALIAÇÃO DA DOR NOS PACIENTES CRÍTICOS DA UTI Ana Paula da Conceição Silva* Roseane Lino da Silva Freire** RESUMO A dor é considerada uma experiência subjetiva, emocional e individual que deve ser avaliada e descrita tão automaticamente quanto os outros sinais vitais. No entanto, se observa que esta prática é pouco realizada pela equipe de enfermagem nas Unidades de Terapia Intensiva (UTI). Este estudo teve por objetivo conhecer o que literatura tem reportado em relação à atuação da enfermagem na avaliação da dor nos pacientes críticos por meio de uma revisão sistemática da literatura. Os artigos foram pesquisados nas bases de dados LILACS e SciELO entre os anos de 2000 a 2012, constituindo-se uma amostra de oito publicações. Os resultados evidenciaram que a maioria dos profissionais de enfermagem tem conhecimento insuficiente sobre a identificação, avaliação e alívio da dor. A implementação de condutas sistemáticas de cuidado possibilita um manejo da dor mais completo e eficaz. Palavras - chave: Dor. Avaliação. Enfermagem.

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* Bacharel em Enfermagem pela Universidade Federal de Sergipe. E-mail: [email protected]

** Bacharel em Enfermagem pela Universidade Federal de Sergipe. E-mail: [email protected]

Artigo apresentado à Atualiza Cursos como requisito parcial para obtenção do título de Especialista em Enfermagem em UTI,

sob orientação da Professora Msc. Cristiane Dias.

ATUAÇÃO DA ENFERMAGEM NA AVALIAÇÃO DA DOR NOS PACIENTES

CRÍTICOS DA UTI

Ana Paula da Conceição Silva*

Roseane Lino da Silva Freire**

RESUMO

A dor é considerada uma experiência subjetiva, emocional e individual que deve ser avaliada

e descrita tão automaticamente quanto os outros sinais vitais. No entanto, se observa que esta

prática é pouco realizada pela equipe de enfermagem nas Unidades de Terapia Intensiva

(UTI). Este estudo teve por objetivo conhecer o que literatura tem reportado em relação à

atuação da enfermagem na avaliação da dor nos pacientes críticos por meio de uma revisão

sistemática da literatura. Os artigos foram pesquisados nas bases de dados LILACS e SciELO

entre os anos de 2000 a 2012, constituindo-se uma amostra de oito publicações. Os resultados

evidenciaram que a maioria dos profissionais de enfermagem tem conhecimento insuficiente

sobre a identificação, avaliação e alívio da dor. A implementação de condutas sistemáticas de

cuidado possibilita um manejo da dor mais completo e eficaz.

Palavras - chave: Dor. Avaliação. Enfermagem.

2

1 INTRODUÇÃO

A Unidade de Terapia Intensiva (UTI) é um setor complexo que admite pacientes em

estado crítico. Ela exige da equipe multiprofissional aguçada capacidade de observação,

conhecimento técnico-científico e experiência, a fim de identificar e controlar precocemente

qualquer alteração fisiológica.

Neste ambiente, a enfermagem assume papel preponderante na precoce identificação e

avaliação das alterações hemodinâmicas, já que são os profissionais que estão em maior

contato com tais pacientes.

O processo de avaliação de enfermagem é amplo e envolve a promoção, manutenção e

restauração do conforto e bem estar do paciente frente à vivência estressante e invasiva dos

tratamentos. Para tanto, ele deve levar em consideração os cinco sinais vitais: temperatura,

pulso, respiração, pressão arterial e dor.

A dor, “experiência sensorial e emocional desagradável associada a uma lesão real ou

potencial”, deve ser registrada no mesmo ambiente e ao mesmo tempo em que são avaliados

os outros sinais com o objetivo de assegurar ao indivíduo uma assistência holística e

efetiva.1,2

A avaliação da dor é complexa e não se resume apenas à intensidade. As

características dolorosas também devem ser registradas, incluindo o seu início, local,

irradiação, periodicidade, tipo da dor, duração e fatores desencadeadores.

Esta avaliação deve fazer parte das atividades diárias da equipe de enfermagem e é

justificada pelas alterações que este sinal pode gerar no quadro clínico do paciente: alterações

nos padrões de sono, apetite e libido; inquietação; irritabilidade; ansiedade; alterações de

energia; sudorese; diminuição da capacidade de concentração; taquicardia; hipertensão;

palidez; dentre outras.

Entretanto, em função da sua subjetividade e da dificuldade da mensuração, a dor,

quinto sinal vital, não é valorizada pela grande maioria dos profissionais.1 Diante disso, surge

um importante questionamento: Como a enfermagem está atuando na avaliação da dor nos

pacientes críticos da UTI?

Conhecer o que os artigos e a literatura têm reportado em relação à atuação da

enfermagem na avaliação da dor pode contribuir para a sistematização da conduta destes

profissionais que atuam em um ambiente tão hostil e que requer cuidados especializados e

diferenciados.

3

2 MATERIAL E MÉTODOS

Trata-se de um estudo de revisão sistemática da literatura que consiste,

principalmente, no levantamento e na analise crítica dos principais trabalhos publicados sobre

determinado assunto. Este tipo de trabalho serve para reunir dados publicados isoladamente

em um conjunto de dado lógico e crítico.3,4

Para guiar este estudo, formulou-se a seguinte

questão: Quais são as evidências científicas sobre a avaliação da dor pela equipe de

enfermagem em pacientes críticos na UTI?

Essa investigação foi desenvolvida ao longo de uma série de etapas que incluiu a

escolha do tema, o levantamento bibliográfico preliminar, a elaboração do plano de trabalho,

localização e obtenção das fontes, leitura do material, fichamento dos artigos, análise dos

resultados, interpretação dos dados e redação do texto. 3,4

A seleção dos artigos foi realizada por meio da Biblioteca Virtual em Saúde (BVS),

com acesso via Internet à Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde

(LILACS) e Scientific Electronic Library Online (SciELO). Além da busca manual de

citações nas publicações inicialmente identificadas.

Para a busca dos artigos, foram utilizadas palavras-chaves em português selecionadas

mediante consulta aos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS): Dor, Avaliação e

Enfermagem. A partir da combinação desses descritores foram localizadas 197 publicações,

sendo 114 referências da LILACS e 83 do SciELO. Estudos encontrados em mais de uma

base de dados foram considerados somente uma vez.

Para a seleção dos artigos realizou-se, primeiramente, a leitura dos resumos das 197

publicações com o objetivo de refinar a amostra por meio de critérios de inclusão e exclusão.

Incluíram-se artigos originais, disponíveis na íntegra, que abordaram a atuação da

enfermagem na avaliação da dor de pacientes adultos e críticos, publicados em inglês ou

português, no período de 2000 a 2012. Foram excluídos artigos de revisão da literatura,

publicações que não se enquadravam no recorte temporal estabelecido e estudos com crianças.

Assim, a amostra final foi constituída por 08 artigos (Figura 1), os quais foram

submetidos à leitura criteriosa e registrados em um quadro sinóptico com os dados coletados:

autores, ano, objetivos, método, população e resultados/conclusões (Quadro 1).

Finalmente, realizou-se a análise de conteúdo através da leitura e releitura dos

resultados dos estudos, procurando identificar aspectos relevantes que se repetiam ou se

destacavam.5

4

Figura 1: Seleção das publicações sobre a atuação da enfermagem na avaliação da dor nos pacientes

críticos (2000-2012), Salvador 2012.

5

Quadro I – Sinopse dos artigos sobre a atuação de enfermagem na avaliação da dor, segundo autoria, ano, objetivos, método, população e resultados/conclusões.

Autor e Ano Objetivos Método População Resultados/Conclusões

Vila e Mussi, 2001(12)

Identificar como os enfermeiros aliviam a dor de

pacientes durante o pós-operatório, no CTI.

Estudo Qualitativo;

Entrevista semiestruturada;

Análise de Conteúdo.

Centro de Terapia Intensiva (CTI);

São Paulo-SP;

14 enfermeiros.

Os enfermeiros utilizam tanto a terapêutica medicamentosa como a

complementar para o alívio da dor e consideram a sua avaliação

como conduta inicial para estabelecer ações de prevenção e alívio da dor.

Ribeiro et al., 2011

• Compreender o conhecimento do enfermeiro

acerca do conceito e da avaliação da dor como

quinto sinal vital em pacientes vítimas de trauma. • Identificar recursos e instrumentos utilizados na

aferição do dor.

• Conhecer as medidas adotadas pelo enfermeiro

para aliviar a dor da vítima de trauma.

• Verificar o grau de importância da mensuração da

dor atribuída pelo enfermeiro

Estudo Qualitativo,

Descritivo e de Campo; Questionário e Teste de

Conhecimento;

Análise de Conteúdo

Pronto Socorro (PS), Unidade de

Terapia Intensiva (UTI), Unidades de Tratamento de Queimados (UTQ) e

Centro Cirúrgico (CC);

Aracaju/SE;

27 enfermeiros.

• A avaliação da dor é vista como por aspectos subjetivos e

objetivos;

• A maioria (59, 3%) desconhece os instrumentos de avaliação e dentre os que conhecem a escala numérica foi a mais referida;

• Estratégias de controle de dor: farmacológicas, não

farmacológicas e combinadas;

• Todos consideram a avaliação da dor importante e um caminho

para o tratamento humanizado e qualificado.

Bottega e Fontana,

2010

Descrever as impressões dos enfermeiros sobre o

uso de uma escala visual analógico de avaliação da

dor em adultos.

Estudo Qualitativo;

Escala Visual Analógica;

Questionário;

Unidades Clínica e Cirúrgica;

Hospital Regional do Rio Grande do

Sul-RS; 14 enfermeiros.

O uso da escala possibilitou que os enfermeiros percebessem a dor

como o quinto sinal vital e facilitou a tomada de decisões do

enfermeiro.

Pedroso e Celich,

2006

Identificar o conhecimento da equipe de enfermagem em relação à avaliação da dor,

sensibilizando-a para instituí-la como quinto sinal

vital, no cotidiano profissional.

Estudo Quanti-Qualitativa; Questionário: Palestra

Educativa.

CTI; Rio Grande do Sul-RS

14 membros da equipe de enfermagem.

A equipe tem noção de apenas uma escala para avaliação da dor e reconhecem alguns sinais de dor, mas não tem como prática

sistemática entendê-la como quinto sinal vital. Assim, ao avaliar os

outros sinais, não investiga a dor.

Magalhães et al.,

2011

Caracterizar a percepção e as dificuldades da

equipe de enfermagem frente à identificação,

quantificação e manuseio da dor dos pacientes

vítimas de trauma e treiná-la para sua avaliação e adequado tratamento.

Estudo prospectivo e

Quantitativo;

Questionário;

Curso de Capacitação.

UTI – Trauma;

São Paulo-SP;

51 profissionais de enfermagem.

• 84,3% tinham conhecimento sobre o tema “dor quinto sinal vital”.

Destes, 54,9% adquiriram o conhecimento na prática;

• Antes da capacitação, 94,1% identificavam a dor pelas expressões

faciais. Após o treinamento, passaram a identificar pela taquicardia

(94,1%); • 96% atuavam no controle da dor comunicando ao médico;

• A maioria tem conhecimento insuficiente sobre a dor.

Waterkemper e

Reibnitz, 2010

Revelar as concepções e contribuições de enfermeiros sobre a avaliação da dor em pacientes

com câncer em cuidados paliativos

Pesquisa Qualitativa; Coleta de dados através do Método

do Arco Juan Charles

Maguerez.

Unidade de Cuidados Paliativos do Centro de Pesquisas Oncológicas

(CEPON);

Florianópolis-SC Seis enfermeiras.

• É importante valorizar a dor do outro e compreender que só quem a sente é que pode avaliar até onde ela vai;

• É preciso resgatar nos profissionais de saúde a consciência sobre

os processos de trabalho em suas diferentes dimensões do cuidado através do despertar da capacidade crítico-reflexiva.

Silva et al, 2011

Investigar o conhecimento e a prática dos

enfermeiros intensivistas sobre a avaliação da dor em pacientes críticos, identificando as principais

intervenções implementadas.

Pesquisa descritiva de corte

Qualitativo;

Questionário.

UTI – Hospital Universitário da

Paraíba-PB; 10 enfermeiros.

A dor é a causada por vários procedimentos invasivos, sendo

difícil de ser analisada por ser fenômeno subjetivo, individual e emocional.

Nascimento e Kreling, 2010

Analisar a implementação da avaliação da dor

como quinto sinal vital em um hospital escola.

Pesquisa quantitativa;

Questionário;

Unidades de internação: Queimado,

Clínica, Cirúrgica e Moléstias Infecciosas;

Londrina-PR;

188 técnicos e auxiliares de enf.

• Cerca de 79% dos profissionais relataram avaliar a dor como sinal

vital, sendo o bem estar do paciente o motivo mais citado. • Para 64% dos profissionais, o hospital incentiva a avaliação da

dor e como sugestão, 49% relatam a necessidade de cursos e

treinamento.

6

3 RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os oito artigos que compuseram a amostra desta pesquisa analisaram, de maneira

geral, as percepções, conhecimentos e/ou atuação da equipe de enfermagem na avaliação da

dor dos pacientes críticos internados no âmbito hospitalar. Destes, cinco ocorreram nas UTIs

de hospitais de grande porte, nos estados de São Paulo (02), Sergipe (01), Rio Grande do Sul

(01) e Paraíba (01).

Os outros três artigos ocorreram nas Unidades Hospitalares Cirúrgicas (RS),

Oncológica (SC) e de Queimados (PR) e foram incluídos no estudo por retratarem pacientes

críticos e possuírem conclusões significativas sobre o tema. Quanto ao ano de publicação,

destacaram-se os anos de 2001 (01), 2006 (01), 2010 (03) e 2011 (03).

Em relação aos aspectos metodológicos, todas as pesquisas foram quantitativas, com

destaque para os estudos exploratório-descritivos desenvolvidos em unidades especializadas.

A principal técnica empregada para a coleta de dados foi a entrevista com a equipe de

enfermagem, através de questionários. Eles buscaram conhecer o perfil da amostra quanto ao

sexo, idade e tempo de serviço, além de identificar o conhecimento e a prática da equipe com

relação à avaliação e condutas destes profissionais diante da dor dos pacientes críticos.

A partir dos resultados apresentados pelos estudos em análise, constituíram-se quatro

categorias temáticas: Dor: Quinto sinal vital; Avaliação da dor; Atuação da enfermagem na

avaliação da dor e Instrumentos da avaliação da dor.

Dor: Quinto sinal vital

A dor é uma sensação desagradável, um sinal de alerta e uma experiência

extremamente subjetiva. Como tal, é conceituada pelos principais especialistas e pela

literatura atual como o quinto sinal vital.6-8

Predomina nos estudos a noção de que a dor é um estímulo nociceptivo desagradável,

um sinal de alerta, uma experiência subjetiva, algo angustiante, sofrida e uma resposta aos

procedimentos invasivos necessários na UTI. Entretanto, uma analise mais crítica mostra que

a maioria dos profissionais de enfermagem tem conhecimento insuficiente sobre o conceito,

identificação e qualificação da dor.9,10,12,13,16

Para Pedroso e Celich, esses profissionais não

têm como prática sistemática avaliar a dor como sinal vital, uma vez que não tem como

prática mensurá-la tanto quanto pulso, temperatura, pressão arterial e respiração.12

7

Somente em três estudos a equipe identifica a dor como quinto sinal vital, assim

devendo ser avaliado, registrado e tratado regulamente como os outros parâmetros

fisiológicos, embora não o faça habitualmente.11,14,15

Bottega e Fontana relataram que alguns profissionais ainda não se sensibilizaram sobre

a importância de vislumbrar a sensação dolorosa como um sinal vital. Disponibilizam nos

seus registros, apenas informações relativas aos outros quatro sinais vitais.15

Magalhães et al também evidenciou que a maioria dos profissionais (84,3%) conhece

o conceito “dor o quinto sinal vital”, sendo que 25,5% adquiriram esse conhecimento na

graduação, 27,5% em cursos teóricos, 41,2% em congressos e palestras e 54,9% no ambiente

profissional.11

Esses dados demonstram que vários profissionais adquiriram seus

conhecimentos sobre a dor durante o exercício da profissão e não na graduação.

Portanto, a falta de conhecimento constitui-se em um desafio para o cuidar em

enfermagem, sendo a educação um dos veículos capazes de promover instrução. É importante

entender profundamente o significado da dor a fim de garantir a avaliação e manuseio

adequados.9,11,12

Avaliação da dor

A avaliação da dor é muito importante no âmbito hospitalar, devendo fazer parte do

atendimento a qualquer paciente com queixa álgica, por ser um fenômeno subjetivo.17

Quanto

à importância da avaliação da dor, observou-se unanimidade dos estudos em considerar a

relevância de avaliar a intensidade da dor, já que dor não identificada e descrita não é tratada.

No estudo de Ribeiro et al, 100% dos enfermeiros atribuíram a avaliação da dor como

importante e, destes, 77,8% a classificaram como muito importante e como forma para um

tratamento humanizado, qualificado, que orienta a conduta terapêutica e restabelece o bem-

estar do paciente.9

A avaliação consiste em caracterizar a experiência dolorosa em todos os domínios,

identificar os aspectos que possam estar determinando ou contribuindo para a manifestação do

sintoma e aferir as repercussões da dor no funcionamento biológico, emocional e social do

indivíduo.18

Sobre os principais motivos relatados pelos profissionais de enfermagem sobre a

importância da avaliação da dor, Nascimento e Kreling entrevistaram 188 técnicos e

auxiliares. 208 motivos foram relatados pelos entrevistados, destacando-se: o bem estar do

paciente (21,1%) e o fato de que no hospital o paciente não deve sentir dor (18,7%).14

8

Para os enfermeiros questionados por Vila e Mussi, as ações iniciais para o alívio da

dor e promoção do conforto são a identificação da presença, do local, da intensidade e do tipo

de dor.13

Entretanto, essa avaliação da experiência dolorosa não é um procedimento fácil pela

visão da equipe de enfermagem.10,14

Na pesquisa de Pedroso e Celich os 14 membros da enfermagem entendem que a dor

pode ser avaliada pelos sinais de dor (45,83%), seguidos da queixa verbal do cliente (29,17),

da observação dos sinais vitais (20,83%) e da avaliação da escala de dor (4,17%).12

Rotineiramente, pacientes críticos requerem procedimentos invasivos como intubação

orotraqueal, acesso venoso, cateter arterial e sondas. Além disso, a admissão na UTI é por se

só provocadora de ansiedade, que é a sensação mais frequentemente associada à dor aguda,

sendo reconhecida como responsável pelo aumento da percepção dolorosa.19

Portanto, a enfermagem deve avaliar tanto os aspectos subjetivos (expressão facial,

impaciência, hipoatividade, choro, inquietação, posicionamento), quanto os aspectos objetivos

(alterações hemodinâmicas, FC, PA, sudorese, palidez, exame físico e taquicardia) devido a

impossibilidade de muitos pacientes em se comunicação com a equipe.9

Nesse mesmo estudo de Ribeiro et al , os enfermeiros referiram a sudorese e a palidez

como as alterações fisiológicas mais presentes no paciente com dor. Em relação às alterações

comportamentais, citaram, em ordem crescente, a expressão facial, a queixa verbal, o choro e

o posicionamento protetor como os principais sinais e sintomas característicos do processo

álgico.9

Para Vila e Mussi, os enfermeiros precisam estar atentos e tornarem-se capacitados

para a avaliação de indicadores da dor, já que ela orienta a conduta terapêutica e restabelece o

bem estar do paciente.13

Magalhães et al reafirmou a importância do aperfeiçoamento sobre a dor através de

uma capacitação dos profissionais de enfermagem. Antes da capacitação 94,1% dos 51

profissionais identificavam a dor pela verbalização, 94,1% pelas expressões faciais e 62,7%,

pela presença de taquicardia. Após a capacitação houve aumento significativo dos

profissionais que passaram a identificar a dor pela taquicardia (94,1%), sudorese (82,3%) e

hipertensão arterial (86,2%).11

Atuação da enfermagem na avaliação da dor

Dentre os profissionais de saúde, o enfermeiro é o que detém o papel fundamental na

avaliação da dor. A vantagem de estar em contato diário coloca a equipe de enfermagem em

9

posição única para o desenvolvimento de relacionamentos plenos e obtenção de informações

sobre o estado físico e psicológico do paciente.20

Observou-se a preocupação real da enfermagem no processo de avaliação da dor em

todos os artigos analisados. Ela relata que atua na avaliação da dor, primeiramente, realizando

analises diárias: “perguntar se o paciente tem dor”, “descobrir o local da dor”, “avaliar a

intensidade da dor” e “analisar o tipo de dor do paciente”.10,13,16

A subjetividade é apontada como o maior obstáculo nesta primeira fase. Decifrar a

experiência dolorosa através da voz de quem a sente é a maior dificuldade, pois não pode ser

palpada e requer tempo e escuta qualificada.10,16

Por conta dessa complexidade, os

enfermeiros relatam que muitas vezes a avaliação da dor são objetivos secundários dentro da

UTI, ambiente agitado e rotativo.13

A segunda etapa na atuação da enfermagem é intervir nas crises álgicas. Para tanto, a

equipe necessita de conhecimento tanto do processo fisiológico como das estratégias de alívio

da dor.21

92,6% dos 27 enfermeiros pesquisados por Ribeiro et al referiram conhecer medidas

de alívio de dor e citam as farmacológicas, não farmacológicas e combinadas como as

principais. As medidas farmacológicas compreendem a analgesia e as medicações prescritas.

As não farmacológicas referem-se ao posicionamento adequado, conforto térmico, diálogo,

orientação, banho, repouso, ambiente confortável, retirada de fraldas molhadas ou sujas,

dentre outras medidas.9,10

Mesmo relatando esses conhecimentos, alguns enfermeiros não se

colocam como atores ativos na avaliação e alivio da dor. Em Magalhães et al, 96% dos 51

profissionais atuavam no controle da dor apenas pela comunicação ao médico.11

Como estratégias, Vila e Mussi recomendam que os enfermeiros podem lançar mão de

técnicas de relaxamento e distração proporcionando ao paciente uma maior sensação de

controle da dor. Eles apontam o toque como medida mais citada pela enfermagem para

promover o conforto: “achando que o toque alivia a dor”. “fazendo massagem para ver se

melhora a dor e conforta”. Outros importantes aspecto observado pelos autores sobre a

atuação da enfermagem diz respeito à explicação do motivo da dor ao paciente, a orientação

quanto as medidas tomadas, a valorização da dor referida e a adequada administração dos

analgésicos prescritos.13

O insucesso em proporcionar alívio adequado da dor é devido, sobretudo, à

dificuldade em se modificar intervenções inadequadas decorrentes da falta de conhecimento

dos profissionais em relação à avaliação da dor, às doses efetivas de analgésicos, ao tempo de

ação dessas drogas e aos seus efeitos colaterais.22

10

Além disso, os enfermeiros relataram que muitas vezes a dor é subestimada,

principalmente, por médicos, enfermeiros e auxiliares de enfermagem: “muitas vezes a

avaliação da dor e seu alívio são vistos como um aspecto secundário”, “outras coisas são

priorizadas em relação a dor”. Salientaram que pouco se previne a dor: “espera-se o paciente

ter a dor para depois tratá-la de maneira medicamentosa”.13

Entretanto, a literatura atual

defende que o controle da dor deve ser preventivo.

Esse dado é confirmado na pesquisa de Pedroso e Celich. Dos 14 membros da equipe

de enfermagem, 12 referem perguntar as vezes se o cliente está com dor ao verificar os sinais

vitais, enquanto que apenas dois sempre fazem essa pergunta. Além disso, mais da metade

nem sempre acreditam nas palavras do indivíduo que refere dor.12

A equipe de enfermagem necessita estar apto no processo de alívio da dor e na decisão

de condutas que promovam alívio e conforto aos pacientes críticos.13

Instrumentos da avaliação da dor

A eficiência do tratamento e a sua continuidade dependem de uma avaliação e

mensuração da dor confiável e válida. A tomada de decisão embasada no saber científico e na

ética confere credibilidade, eficiência e eficácia no trabalho do enfermeiro.7

Para tanto, é importante que a instituição de saúde possua um instrumento de avaliação

da dor apropriado. Os instrumentos mais utilizados são as Escalas da Dor, que levam em

conta o paciente envolvido, capacidade de comunicação e as habilidades dos profissionais em

interpretar comportamentos ou indicadores fisiológicos da dor.18,23

No que se diz respeito ao conhecimento das principais escalas de mensuração da dor

pela equipe de enfermagem, existiu divergências significativas entre os estudos. Na pesquisa

de Magalhães et al dos 51 profissionais de enfermagem pesquisados, 98,0% responderam

conhecer algum tipo de instrumento da dor; já em Ribeiro et al (9)

dos 27 enfermeiros, 59,3%

referiram não conhecer tai instrumentos.11

Entretanto, ocorreu uma unanimidade em relação à utilização das escalas de avaliação

da dor. A grande maioria dos profissionais relatou que o instrumento mais conhecido é a

Escala Verbal Numérica, mas que ela não é utilizada na prática assistencial por conta dos

profissionais não saber utilizá-la.9-12

Assim, as escalas são utilizadas como último recurso, visto que a avaliação é realizada

primeiramente pelos sinais de dor, seguidos da queixa verbal do cliente e da observação dos

sinais vitais.12

11

Alguns profissionais, que não utilizam as escalas numéricas, fazem uso dos descritores

verbais leve, moderado e intenso para avaliar a dor relatada.14

Todavia, as escalas têm a

vantagem de facilitar o contato cuidador e cliente, ao compartilhar-se a intensidade da dor e

fornece ao cliente um instrumento para se fazer entender.24

Diante disso, é imprescindível que a equipe de enfermagem reflita sobre a importância

da sistematização do cuidado, numa lógica que alia organização do tempo e satisfação das

necessidades relacionadas à dor. Fica evidente a necessidade de se buscar conhecimento sobre

a experiência dolorosa e os instrumentos de avaliação da dor, visando a humanização do

cuidado.11,13

4 CONCLUSÃO

A equipe de enfermagem possui um conhecimento superficial sobre as alterações

hemodinâmicas do processo álgico e as formas de avaliação e mensuração da dor. O déficit

literário sobre a sistematização da atuação da enfermagem na avaliação da experiência

dolorosa constitui-se outro desafio para o cuidar em saúde.

As escolas de enfermagem devem implementar no seu currículo disciplinas que

abordem o uso de instrumentos e escalas de avaliação e mensuração da dor, com o propósito

de ampliar e sistematizar o cuidado holístico. Além disso, as instituições de saúde devem

oferecer educação continuada em saúde, visando à melhoria e humanização do controlo e

alívio da dor.

12

NURSING PERFORMANCE IN PAIN EVALUATION IN SEVERE ILL UCI

PATIENTS

ABSTRACT

The pain is considered such a subjective, emotional and unique experience, that should be

evaluated and described as automatically as the vital signs. However, in practice, this is not

routine for the nursing staff in the Intensive Care Units (ICU). This article aimed knowing

what other authors have reported regarding nursing performance in pain assessment in severe

ill patients through a systematic literature review. Articles were searched in the databases

LILACS and SciELO between the years 2000 to 2012, resulting in a sample of eight

publications. The results demonstrated that most nurses have insufficient knowledge about

identification, evaluation and pain relief. Implementing systematic care actions enables a

more effective and complete pain management.

Keywords: Pain. Evaluation. Nursing staff.

13

REFERÊNCIAS

1 Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor (SBED). Hospital sem dor diretrizes para

implantação da dor como 5º sinal vital [acesso 2012 Abril 08]. Disponível em:

http://www.dor.org.br/profissionais/5_sinal_vital.asp;

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2012abril 08] Disponível em www.dor.org.br;

3 Marconi MA, Lakatos EM. Fundamentos de metodologia cientifica. 5ª ed. São Paulo

(SP): Atlas; 2003.

4 Gil AC. Métodos e Técnicas de Pesquisa Social. 5ª ed. São Paulo (SP): Atlas; 1999.

5 Bardin L. Análise de conteúdo. Lisboa. Edições 70: 1977.

6 Oliveira AS, Bermudez CC, de Souza RA, Souza CMF, Dias EM, Castro SCE, Bérzin F.

Impacto da dor na vida de portadores de disfunção temporomandibular. J Appl Oral Sci,

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7 Kreling MCGD, Cruz DALM, Pimenta CAM. Prevalência de dor crônica em adultos. Rev

Bras Enferm. 2006 Ago; 59(4):509-13

8 Porto CC. Semiologia Médica. 5ª edição Editora: Guanabara Koogan, 2005.

9 Ribeiro NCA, Barreto SCCB, Hora EC, Sousa MCS. O enfermeiro no cuidado à vítima de

trauma com dor: o quinto sinal vital. Rev. Esc. Enf. USP 2011; 45(1):146-52

10 Silva CCS, Vasconcelos JMB, Nóbrega JMB. Dor em pacientes críticos sob a ótica de

enfermeiros intensivistas: avaliação e intervenções. 2011; Rev Rene, Fortaleza, 2011 jul/set;

12(3):540-7

11 Magalhães PAP, Mota FAM,Saleh CMR,Secco LMD, Fusco SRG, Áquila LG.Percepção

dos profissionais de enfermagem frente à identificação, quantificação e tratamento da dor em

pacientes de uma unidade de terapia intensiva de trauma. Rev Dor. São Paulo, 2011 jul-

set;12(3):221-25

14

12 Pedroso RA, Celich KLS. Dor: quinto sinal vital, um desafio para o cuidar em

enfermagem. Texto ContextoEnferm. 2006;15(2):270-6.

13 Villa VSC,Mussi FC. O alívio da dor de pacientes no pós-operatório na perspectiva de

enfermeiros de um centro de terapia intensiva. Rev. Esc. Enferm. USP, São Paulo, v. 35, n.

3, 2001 p. 300-307.

14 Nascimento LA, Kreling MCGD. Avaliação da dor como quinto sinal vital: opinião de

profissionais de enfermagem. Acta Paulista Enfermagem, 2011, vol.24, n.1, p. 50-54

15 Bottega FH, Fontana RT. A dor como quinto sinal vital: utilização da escala de avaliação

por enfermeiros de um hospital geral. Texto contexto – enferm. Vol. 19 no.2, Florianópolis,

abr.-jan. 2010

16 Waterkemper R, Reibnitz KS. Cuidados paliativos: a avaliação da dor na percepção de

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