ARNHEIM Rudolf - Percepcao - Erinaldo_nascimento (1)
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RUDOLF ARNHEIM E A FORMAO DE SUJEITOS ARTICULADORES DE EMOO E INTELECTO
Erinaldo Alves do Nascimento UFPB/UFPE
RESUMO Este texto analisa as contribuies dos estudos de Rudolf Arnheim para fundamentar o ensino de arte pautado numa concepo cognitivista da arte e de ensino, quando a nfase residia mais na autoexpressividade e no espontanesmo, sobretudo no contexto brasileiro. A ateno est focada no discurso sobre o ensino e sobre o que se requer para ser um bom docente. Este texto uma maneira de evidenciar a importncia de se conhecer autores basilares para fundamentar o ensino de artes na contemporaneidade. Palavras-chave: experincia visual intelecto - percepo - ensino - artes visuais
RESUMEN
Este artculo examina las aportaciones de los estudios de Rudolf Arnheim para apoyar la enseanza del arte guiado por una concepcin cognitivista del arte y de la educacin, quando el nfasis estaba ms en la autoexpresividad y la espontaneidad, sobre todo en el contexto brasileo. La atencin se centra en el discurso sobre la enseanza y sobre lo que se necesita para ser un buen maestro. Este texto es una manera de resaltar la importancia de conocer los autores bsicos para apoyar la enseanza de las artes en la sociedad contempornea. Palavras clave: experiencia visual intelecto - percepcin educacion - artes visuales
Se hoje difcil conceber uma dissociao entre percepo e criao, se
quase ningum mais supe que a criao surge do nada ou que a percepo seja
um ato passivo e casual, se no se duvida tanto que a arte no s sentimento,
mas tambm detentora e desencadeadora de uma significao cognitiva e
representacional, isso se deve, principalmente, aos enunciados formulados por
Rudolf Arnheim. Considerando, tambm, que ajudou a embasar o campo intelectual
responsvel pela (re)significao da denominao arte-educao e subsidiou
sistematizaes do trabalho educacional, pertinente empreender uma breve
anlise do que esse autor preconizava em termos de arte, infncia, ensino e para
ser um bom sujeito docente, aspectos temticos que foram explorados em minha
pesquisa de doutorado (NASCIMENTO, 2005).
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A influncia de Rudolf Arnheim foi preponderante na dcada de 1980 e
1990. Uma pesquisa, coordenada por Ana Mae Barbosa (1997, p. 21-22),
comprovou, ao analisar as teses sobre o ensino e aprendizagem da Arte, que as
dissertaes de mestrado e teses de doutorado, defendidas entre 1981 e 1993, nas
universidades brasileiras, que Rudolf Arnheim, depois de Herbert Read, o terico
ou estudioso mais invocado nesses textos.
A despeito de sua importncia para fundamentar vrias pesquisas, bem
como processos pedaggicos da Arte e seu ensino, Arheim um autor pouco
lembrado nos dias atuais. Tendemos a esquecer o passado, o antigo, e saudar ou
abraar o novo, como se o novo no tivesse uma histria, um percurso. Trazer
baila suas colaboraes, como um autor fundante de alguns princpios defendidos
para o ensino de Arte na contemporaneidade, um dos motivos que me impulsiona
a escrever sobre este autor.
O discurso de Arnheim procede dos princpios da Gestalt. Imbudo de
preceitos cognitivistas, rebatia a noo de arte como uma atividade misteriosamente
inspirada do alto e a concebia como um produto da atividade visual. A atividade
visual era uma atividade criadora da mente humana. Em vista disso, a experincia
visual era encarada como um processo dinmico e constitua a prpria percepo
em ao.
A percepo era o resultado de uma interao entre o objeto, a luz, como
transmissora de informao, e as condies cognitivas do observador. O texto de
referncia da produo intelectual de Arnheim Arte & percepo visual: uma
psicologia da viso criadora. Foi publicado inicialmente em 1954, mas somente em
1980 foi editado no Brasil.
O prprio autor reconhece que o mrito de sua contribuio foi discutir, a
partir da psicologia, o processo de visualizao da criao ou da experimentao da
arte, sem consider-la perifrica, nem instrumento da explorao da personalidade
humana. O processo perceptivo foi concebido, ao contrrio, como um conhecimento
especfico.
Como se pode observar, Arnheim explorava no apenas o funcionamento
da percepo, mas tambm a qualidade das unidades visuais e as estratgias de
sua unificao em um todo final e completo. Qualquer acontecimento visual era uma
forma com contedo, ambos influenciados pelas partes constitutivas (linha, cor,
textura, dimenso, proporo, etc.).
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Bem antes que Robert Saunders e Dick Field, Arnheim rebatia enunciados
preconizadores de que a criana desenha a partir de uma fonte no visual, isto , de
conceitos abstratos. Ele asseverava, em contraposio, que a criana desenha o
que ela consegue visualizar em cada etapa ou estgio de sua vida.
Alertando para que no fossem desconsideradas essas etapas de
desenvolvimento infantil, Arnheim (1991, p. 193-194) sugeria que o ensino fosse
baseado no processo mutante da concepo visual do estudante, de acordo com
seus princpios, e que as intervenes do professor fossem dirigidas pela exigncia
do processo individual de crescimento. As atividades educacionais deveriam ser
encaminhadas de modo a desafiar o estudante a trabalhar em tarefas de
organizao visual em seu prprio nvel de concepo e de execuo.
Ao considerar o pensamento visual como indivisvel, recomendava que
essa tarefa deveria envolver todas as reas do currculo. O sujeito docente
necessitava estar apto a observar a mente pensante e perceptiva na interao com
as aspiraes, paixes e temores do ser humano total (ARNHEIM, 1980, p. 196).
Ele considerava o estudo da arte, quando feito corretamente,
indispensvel para a formao em qualquer outro campo do saber. Em vista disso,
rejeitava truques tcnicos que sobrepujassem o nvel de concepo do estudante e
o ensino isolado dos meios de expresso visual.
Similar ao que Lanier ir preconizar anos depois, Arnheim (1993, p. 71;72)
julgava imprescindvel que o estudo da arte na educao tivesse como objetivo a
prpria arte, desde o comeo, e em todo o momento. A imagem capaz de centrar a
ateno porque oferece a presena viva do que o espectador reconhece como
essncia da experincia humana.
possvel depreender do seu discurso que uma das atribuies da arte na
educao ajudar a desenvolver a capacidade de perceber a produo artstica
como algo concreto, encarando-a como um todo, pois nada que o artista ps em seu
trabalho pode ser negligenciado pelo observador.
Defendia que o debate em torno da arte deveria ter clara a inteno de
intensificar a experincia e a compreenso da arte, primando pelo que se pode
arrancar de sua concreticidade. A esse respeito, asseverava: a experincia
artstica direta o que faz com que merea a pena falar de arte (ARNHEIM, 1993,
p. 77).
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Numa poca em que se valorizava, excessivamente, a expresso ou
emoo, Arnheim (1993, p. 49-51) concebia-a como um ato de cognio, uma luta
motivacional causada pela cognio e um despertar causado por ambas. As
atividades relacionadas ao sentimento, ele a chamava de intuio.
A percepo intuitiva era entendida como a principal forma que tem a
mente de explorar e compreender o mundo. A intuio era considerada a base
sobre a qual se fundavam os conceitos intelectuais. Logo, a percepo intituitiva
era inseparvel das aportaes da memria, da organizao e da formao de
conceitos.
A percepo intuitiva e a sedimentao intelectual eram vistas como
intercambiveis. O ensino e a aprendizagem, de cada matria, necessitam fazer o
intelecto e a intuio interagirem. O sujeito docente precisa tornar explcitas as
categorias visuais, extraindo princpios subjacentes e mostrando relaes estruturais
em ao, sem excluir a intuio espontnea.
Contrariando suposies que afirmam que arte no tem funo ou que no
serve para nada, Arnheim (1993, p.81-83) ressaltava seu contedo e significado. A
estrutura da forma visual, para ele, encontrava respaldo na histria da arte, a qual
demonstra que a arte que teve xito nunca esteve desprovida de contedo
significativo.
Ao preconizar que no h arte sem funo, Arnheim rebatia,
incisivamente, as suposies de que as artes eram hierarquicamente superiores aos
ofcios, que as atividades cerebrais e manuais eram dissociadas, ou que a
percepo relacionava-se, apenas, liberao emocional.
A arte na educao, para Arnheim (1993, p. 89; 95), deveria explorar a
aprendizagem visual, por intermdio do manejo dos fenmenos visuais e da
organizao do pensamento. Para ele, o melhor professor, tanto nas artes como no
resto da educao, no o que consegue compartir tudo o que sabe ou o que
guarda tudo o que poderia dar, mas o que, com sabedoria de um bom jardineiro,
observa, julga e estende a mo quando sua ajuda necessria.
As contribuies de Arnheim ainda no tiveram o devido reconhecimento.
A despeito de terem ajudado a lanar as bases discursivas e educacionais para a
consolidao do ensino de arte e de suas respectivas implicaes pedaggicas,
pouco se comenta sobre seu pioneirismo e importncia.
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Como no existe confronto com o que se via, fazia, agia e dizia antes,
muitos dos seus enunciados so veiculados sem mencion-los. Isso se percebe,
principalmente, naquelas publicaes que omitem as referncias bibliogrficas,
como o caso da famosa experincia relatada por Fayga Ostrower (1991), na qual
bastante visvel a apropriao das contribuies de Arnheim, e naquelas que
esquecem que s se avana a partir do que foi dito e feito antes.
Os enunciados de Arnheim lanam incisivos questionamentos tradio
mimtica e expressivista da arte na educao e projetam um consistente lastro
discursivo para a gestao de outros enfoques discursivos enfatizadores da
especificidade da arte e de seus efeitos no sujeito leitor, como vem ocorrendo
atualmente.
Em suma, Arnheim fornece uma perspectiva singular, procedente da
Gestalt com um rico teor cognitivo. Ajuda a compreender, a partir desse enfoque, o
que fazem os sujeitos para produzirem arte e o que faz a arte para produzir sujeitos
de uma maneira e no de outra.
Para Arnheim, a arte, como um produto da atividade visual, resulta de um
processo dinmico entre intuio e intelecto, forma e funo, contedo e significado,
texto e contexto de produo e de recepo. O ensino visto como um processo
incorporador de mutaes na percepo visual, de acordo com o nvel de
significao intuitiva e intelectual.
Arnheim faz referncia a um ensino que pode ser implementado em
diversos campos do saber, propiciador de um jogo cognitivo, a partir da
concreticidade da arte e das demais modalidades de produo visual. Enfatiza a
articulao entre o todo e suas partes no processo de anlise de imagens, pois
reconhece que a fragmentao isolada do resto e a dependncia exclusiva da
abstrao verbal no favorecem ampliao do processo perceptivo.
Nesse contexto, a atuao docente de referncia deve ser capaz de ajudar
a discernir categorias visuais, enaltecendo princpios subjacentes e relaes
estruturais em ao, respeitando o nvel de compreenso intituitiva e cognitiva do
sujeito discente.
Os textos de Arheim no consideravam o sujeito refm de si mesmo, mas
tentavam contribuir para que ele se percebesse dotado de processo cognitivo e de
capacidade de criao a partir da percepo de objetos e imagens que permeavam
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o cotidiano. A percepo poderia ser acionada por experincias articuladoras de
critrios formulados pela teoria da criatividade e da Gestalt.
A infncia, tal como a prpria percepo, era vista em mutao,
convivendo com diferentes nveis de intuio e de significao a partir da interao
com a produo visual em sua concreticidade, com potencial criativo para mudar a
realidade percebida. Valorizava-se um sujeito docente especializado provocador de
experincias perceptivas e acionador de dispositivos mentais impulsionadores da
criatividade, de acordo com o nvel de compreenso intituitiva e cognitiva do sujeito
discente.
Referncias ARNHEIM, Rudolf. Arte & percepo visual : uma psicologia da viso criadora. 6 ed. So Paulo: Livrara Pioneira, 1991. _______Consideraciones sobre la educacin artstica. Barcelona: Paids, 1993. BARBOSA, Ana Mae (org.). Arte-educao : leituras no subsolo. So Peulo: Cortez, 1997. FOESTER, Gerda Margit Schtz. Arte-educao: pressupostos terico-metodolgicos na obra de Ana Me Barbosa. Goinia, 1996, Dissertao (Mestrado em Educao Escolar Brasileira), Universidade Federal de Gois. NASCIMENTO, Erinaldo Alves do. Mudanas nos nomes da arte na educao: qual infncia? que ensino? quem o bom sujeito docente? So Paulo, 2005, Tese (Doutorado em Artes), Universidade de So Paulo. VARELA, Julia. Categoras espacio-temporales y socializacin escolar. Del individualismo al narcisismo. LARROSA, Jorge (Ed.). Escuela, poder y subjetivacion. Madrid: La Piqueta, 1995. ERINALDO ALVES DO NASCIMENTO doutor em Artes (ECA-USP); mestre em Cincia da Informao (UFPB) e Graduado em Educao Artstica (UFRN). professor do Departamento de Artes Visuais (UFPB) e do Mestrado em Artes Visuais (UFPB/UFPE). Coordena o Grupo de Pesquisa em Ensino das Artes Visuais (CNPQ). autor do livro Ensino do Desenho: do artfice/artista ao desenhista auto-expressivo". e-mail: [email protected]