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.~ ~ft APVIPRE Associaçio Portuguesa d. Vitiml5 d. Preconceito Religioso Vila Nova de Santo André, 16 de Junho de 2014 Assunto: Aluguer de instalações concedido à entidade religiosa Associação das Testemunhas de Jeová Exmos.(as) Srs.(as) o direito à liberdade de religião é um direito consagrado em qualquer Estado que se afirme democrático e laico. Este direito implica, não apenas a liberdade de escolher ter ou não ter qualquer religião ou convicções religiosas, mas também ser protegido pela lei contra qualquer espécie de discriminação associada a esse mesmo direito. Em muitos países tem-se vindo a constatar que ocorrem sucessivos casos de discriminação religiosa, em especial, perpetrados por pessoas e organizações que de alguma forma se opõem a determinadas religiões ou grupos religiosos minoritários. São também muitos os casos, em que são as próprias associações religiosas, que de algum modo, agem de forma discriminatória contra seus membros e ex-membros. Esta é a forma de discriminação menos visível na sociedade, embora vez por outra, surjam reportagens e artigos jornalísticos que trazem à luz do dia, casos de verdadeira discriminação religiosa que envolvem confissões religiosas e ex-membros, onde estes são emocionalmente pressionados e até mesmo ostracizados, sendo forçados a limitar os seus direitos fundamentais à luz da Constituição Portuguesa e dos Direitos Humanos. A discriminação religiosa tem um impacto profundo na vida duma pessoa, podendo até mesmo levar a problemas emocionais, conduzindo à depressão profunda e suicídio. É uma área pouco explorada em Portugal e da qual, a maioria da população pouco ou nada conhece. É normal o indivíduo, alvo de tal discriminação, remeter-se ao silêncio, vivendo sozinho tal dura experiência. Tais casos ocorrem principalmente, quando o indivíduo decide abandonar a religião na qual foi criado e educado, tendo toda a sua vida social e familiar dentro de tal religião. Inúmeros testemunhos de ex- membros de determinadas confissões religiosas, queixam-se dos abusos verbais e emocionais a que são expostos ao decidirem sair ou afastar-se de determinada religião. Para piorar as coisas, muitas vezes tais situações são criadas, não apenas pelas motivações pessoais dos membros familiares fiéis à religião, mas pelas próprias confissões religiosas, que através de seus líderes, incentivam e orientam tais membros a rejeitarem e ostracizarem os familiares e amigos que abandonam a religião, acusando-os de traição, apostasia e abandono da "religião verdadeira". A APVIPRE- Associação Portuguesa de Vítimas de Preconceito Religioso é uma associação de carácter beneficente e filantrópico sem fins lucrativos, que foi constituída com o fim de proporcionar a todos aqueles que a ela recorrerem, ajuda a vítimas de discriminação religiosa praticada por indivíduos ou organizações, defendendo os seus direitos e interesses, tendo por base a legislação vigente e a Declaração Universal dos Direitos do Homem, contra qualquer preceito religioso que promova de alguma forma, actos ilícitos ou ofensivos aos direitos humanos e dignidade, bem como a ocultação ou a impunidade dos seus responsáveis. 1

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APVIPREAssociaçio Portuguesa

d. Vitiml5 d. Preconceito Religioso

Vila Nova de Santo André, 16 de Junho de 2014

Assunto: Aluguer de instalações concedido à entidade religiosa Associação das Testemunhas de Jeová

Exmos.(as) Srs.(as)

o direito à liberdade de religião é um direito consagrado em qualquer Estado que se afirme democrático elaico. Este direito implica, não apenas a liberdade de escolher ter ou não ter qualquer religião ou convicçõesreligiosas, mas também ser protegido pela lei contra qualquer espécie de discriminação associada a essemesmo direito.

Em muitos países tem-se vindo a constatar que ocorrem sucessivos casos de discriminação religiosa, emespecial, perpetrados por pessoas e organizações que de alguma forma se opõem a determinadas religiõesou grupos religiosos minoritários.

São também muitos os casos, em que são as próprias associações religiosas, que de algum modo, agem deforma discriminatória contra seus membros e ex-membros. Esta é a forma de discriminação menos visívelna sociedade, embora vez por outra, surjam reportagens e artigos jornalísticos que trazem à luz do dia,casos de verdadeira discriminação religiosa que envolvem confissões religiosas e ex-membros, onde estessão emocionalmente pressionados e até mesmo ostracizados, sendo forçados a limitar os seus direitosfundamentais à luz da Constituição Portuguesa e dos Direitos Humanos.

A discriminação religiosa tem um impacto profundo na vida duma pessoa, podendo até mesmo levar aproblemas emocionais, conduzindo à depressão profunda e suicídio. É uma área pouco explorada emPortugal e da qual, a maioria da população pouco ou nada conhece. É normal o indivíduo, alvo de taldiscriminação, remeter-se ao silêncio, vivendo sozinho tal dura experiência.

Tais casos ocorrem principalmente, quando o indivíduo decide abandonar a religião na qual foi criado eeducado, tendo toda a sua vida social e familiar dentro de tal religião. Inúmeros testemunhos de ex­membros de determinadas confissões religiosas, queixam-se dos abusos verbais e emocionais a que sãoexpostos ao decidirem sair ou afastar-se de determinada religião.

Para piorar as coisas, muitas vezes tais situações são criadas, não apenas pelas motivações pessoais dosmembros familiares fiéis à religião, mas pelas próprias confissões religiosas, que através de seus líderes,incentivam e orientam tais membros a rejeitarem e ostracizarem os familiares e amigos que abandonam areligião, acusando-os de traição, apostasia e abandono da "religião verdadeira".

A APVIPRE- Associação Portuguesa de Vítimas de Preconceito Religioso é uma associação de carácterbeneficente e filantrópico sem fins lucrativos, que foi constituída com o fim de proporcionar a todos aquelesque a ela recorrerem, ajuda a vítimas de discriminação religiosa praticada por indivíduos ou organizações,defendendo os seus direitos e interesses, tendo por base a legislação vigente e a Declaração Universal dosDireitos do Homem, contra qualquer preceito religioso que promova de alguma forma, actos ilícitos ouofensivos aos direitos humanos e dignidade, bem como a ocultação ou a impunidade dos seus responsáveis.

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É também seu objetivo, trabalhar na promoção da consciencialização da sociedade portuguesa para estatemática. que embora pareça à primeira vista algo de menos valor. afeta de forma dramática a vida demilhares de pessoas. Promover a aplicação da Constituição Portuguesa e dos Direitos Humanos nesterespeito, é assim um dos seus principais objetivos.

É exatamente com este último objetivo em mente que vos endereçamos esta carta, de modo a colocá-los apar duma informação que provavelmente não possuem com respeito à Associação das Testemunhas deJeová a quem eventualmente no futuro se coloque a possibilidade de alugaí o vosso espaço físico paraeventos promovidos por esta entidade religiosa.

É de louvar em primeiro lugar, a disposição de V. Exas. em permitirem que um espaço como o vosso sejacedido para eventos culturais e religiosos (como é o caso). Por permitirem tal uso, revelam tolerânciareligiosa digna de registo, neste respeito com as Testemunhas de Jeová.

No entanto, pretendemos através desta carta alertar V. Exas. para o lado negro da questão, queprovavelmente não estarão a par e este prende-se com a forma como as Testemunhas de Ieová vivem a suareligião. bem como a forma controladora e repressiva como são tratadas e manipuladas pela sua liderança.A acrescentar a tudo isto, existem os vários problemas relacionados com a prática da ostracização de ex­membros e o encobrimento pela liderança de predadores sexuais em seu meio. Para isto contribuemsuas doutrinas e políticas organizacionais que regem com mão-de-ferro cada aspeto da vida de umaTestemunha de Jeová.

Vez por outra, artigos jornalísticos revelam "o que se passa por detrás do pano" nesta organização religiosa.O último artigo publicado na revista nacional, Sábado, apresentou de modo cândido, o testemunho de váriasTestemunhas e ex-Testemunhas que demonstram o clima de medo e controlo existente neste ambientefechado e altamente controlador

(link para download do artigo: https:jjapp.box.comjsjyOuqkga39j30v6ee88qj).

Um dos aspetos já mencionados acima que contribui para tal clima, é o medo que cada Testemunha de Jeovátem de cometer algo que vá contra as cerca de uma centena de regras e leis estabelecidas pela liderança eque pode resultar na sua expulsão da religião.

Ao contrário do que acontece por exemplo na religião católica e outras religiões que respeitam os direitoshumanos consagrados na Carta das Nações Unidas, as Testemunhas de Jeová têm uma forma deexcomunhão extremista, onde o membro para além de ser cortado do convívio e comunhão religiosa, étratado por todos os seus "irmãos espirituais" como estando morto físicamente. Esta morte social promoveassim a exclusão total, dentro e fora da prática religiosa propriamente dita.

Para piorar as coisas, a liderança ensina a todos os seus membros (familiares ou não) que, de modo a seremleais a Deus, devem cortar todos ou praticamente todos os laços sociais com o ex-membro. Nem mesmo umolá pode ser dito a alguém que foi expulso ou decidiu sair por não concordar mais com a religião.

Como V. Exas. poderão imaginar, tal acção promovida pela liderança, divide não apenas anteriores amigos ecompanheiros de anos de associação, mas vai ao ponto de interferir nos laços naturais consanguíneos ondeum pai, mãe, filhos, etc. podem-se ver privados do amor, afeto e carinho tão necessários no seio familiar.

Devido a isto, muitas são as Testemunhas e ex-Testemunhas que sofrem de ansiedade e problemasemocionais e psicológicos causados por este tipo de situação imposta pela diretrizes da religião.

E não há como negar que isto é assim, pois as publicações das Testemunhas de Jeová estão cheias destasorientações e advertências no âmbito da desassociação (excomunhão) e dissociação (saída por livrevontade).

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Por exemplo, o livro '14mor de Deus" publicado pelas Testemunhas de Jeová, diz o seguinte nas páginas 207­209:

Como devemos tratar uma pessoa desassociada? A Bíblia diz: "Cesseis de ter convivência com qualquer que se chameirmão, que for fornicador, ou ganancioso, ou idólatra, ou injuriador, ou beberrão, ou extorsor, nem sequer comendocom ta homem." (1 Coríntios 5:11) Com respeito a qualquer pessoa que "não permanece no ensino do Cristo", lemos:"Nunca o recebais nos vossos lares, nem o cumprimenteis. Pois, quem o cumprimenta é partícipe das suas obrasiníquas." (2 João 9-11) Nós não nos associamos com desassociados, quer para atividades espirituais, quer sociais. ASentinela de 15 de dezembro de 1981, página 21, disse: "Um simples 'Oi' dito a alguém pode ser o primeiro passopara uma conversa ou mesmo para amizade. Queremos dar este primeiro passo com alguém desassociado?"

Após estabelecer algumas diretrizes para os familiares que vivem juntos na mesma casa, onde existe apermissão para algum convívio com aqueles que estão desassociados, passa a estabelecer o seguinte para osfamiliares que já não são Testemunhas de Jeová e que não vivem no mesmo lar (podem ser pais, filhos, avós,primos, tios, etc.):

Em outros casos, o parente desassociado talvez não faça parte da família imediata ou seja um membro da famíliaimediata que não mora na mesma casa. Embora em raras ocasiões talvez se precise cuidar de um assunto familiar comum parente desassociado, tal contato deve restringir-se ao mínimo possível. Membros leais de uma família cristã nãoprocuram desculpas para ter tratos com um parente desassociado que não more na mesma casa. Em vez disso, alealdade a Jeová e à sua organização os faz seguir os princípios bíblicos relacionados com a desassociação. Seu

proceder leal visa o bem do desassociado e pode ajudá-lo a se beneficiar da disciplina recebida. - Hebreus 12:11.

Sim, por detrás dos sorrisos e do aparente ar feliz das Testemunhas de Jeová, esconde-se um mundoaltamente controlado e repressivo que a maioria do público desconhece.

Visto que as Testemunhas de Jeová encaram a sua organização religiosa como a detentora da verdadeabsoluta do ponto de vista espiritual, tudo o que emana da Sede Mundial onde está o chamado CorpoGovernante (nos E.DA), a liderança máxima da religião, é encarado como sendo enviado pelo próprio Deus.

Por isso, as Testemunhas de Jeová encaram com alguma naturalidade e frieza estas e outras circunstânciasimpostas pela liderança, pois são levadas as crer que tais orientações são divinas e que aquele que não ascumprir será rejeitado por este, podendo mesmo sofrer a total destruição na Guerra do dia de Deus, ondeapenas as Testemunhas leais serão poupadas à carnificina.

Outra situação bem mais grave, é que devido às suas políticas internas, propicia-se o encobrimento depredadores sexuais, constituindo-se num risco para as crianças. Devido à política religiosa interna, de quepara haver uma acusação, são necessárias duas testemunhas oculares, muitos são os casos em que asvítimas não têm conseguido obter a protecção e a ajuda necessárias para si.

Visto que é política interna das Testemunhas de Jeová, não denunciar estes casos às autoridades, porqueconsideram que existe um segredo eclesiástico a ser mantido, têm sido muitos os casos também em que, aoser negada a acusação e não havendo provas, o presumido predador sexualjpedófilo continua solto e atémesmo continua a ser incentivado a pregar de porta-em-porta como qualquer Testemunha de Jeová o faz.Isto representa um perigo em potencial, não apenas para as Testemunhas de Jeová, mas para a sociedadeem geral.

É raro o mês em que casos destes não são expostos em jornais internacionais e uma simples pesquisa naInternet procurando por Testemunhas de Jeová/Pedofília (ou em inglês Jehovah's Witnesses/Pedophilia),demonstra o verdadeiro escândalo que tem resultado nestas políticas organizacionais, apenas comparadaem proporção com o que acontece atualmente no seio de outras grandes religiões organizadas.

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o caso de Candice Conti nos Estados Unidos da América é um exemplo recente disto mesmo, onde aorganização das Testemunhas de Jeová, a Watchtower, foi condenada a pagar uma indemnização dedezenas de milhões de dólares.

Gostaríamos de deixar bem claro que ao trazermos estes assuntos à atenção de V. Exas., tal não é movidopor nenhum antagonismo contra aquilo em que acreditam as Testemunhas de Jeová, mas tão simplesmenteporque entendemos serem estas práticas uma violação clara dos Direitos Humanos e da ConstituiçãoPortuguesa.

Para serem respeitados, para usufruírem da sua liberdade religiosa, têm de respeitar a liberdade dosoutros, sem cinismo nem hipocrisia. A excomunhão conforme a praticam é chantagem emocional, umaforma de tortura e não pode ser tolerada. De igual forma a sua política interna de não denunciarprontamente às autoridades os pedófilos, já fez centenas, senão milhares de vítimas.

V. Exas. podem ser um auxiliar precioso nesta pressão de mudança de políticas tão extremadas, fazendolembrar um passado que não queremos repetir.

Deixamos à consideração de V. Exas. o que fazer com esta informação, sabendo de antemão que não serãoinsensíveis perante aquilo que vos apresentamos. Sabemos que como cidadãos portugueses, prezam aliberdade individual e os valores democráticos que tanto nos custou a adquirir. Permitir com o nossosilêncio e até mesmo beneplácito, que movimentos religiosos continuem a pisotear os altos valoreshumanos declarados na Carta das Nações Unidas para os Direitos Humanos, certamente poderá deixar-noscom uma consciência pesada.

Pedimos por isso, que estejam atentos a tais factos e que no futuro, ao fazerem quaisquer tipo de acordoscom as Testemunhas de Jeová ou mesmo outras entidades, procurem saber que tipo de atitude estes têmpara com os valores que a nossa sociedade tanto preza. Todos os factos apresentados a V. Exas. sãoverídicos e as provam existem para quem as deseja analisar.

É objetivo da APVIPRE fazer tudo o que está ao seu alcance, de modo a informar a sociedade civil do perigoque pode existir no cerceamento das liberdades colectivas e individuais promovidas por religiões e gruposque usam de "influência social destrutiva" e que visam, acima de tudo, controlar e manipular seus membroscom objetivos menos dignos e claros.

Reconhecemos o direito que as Testemunhas de Jeová têm em exercer a sua liberdade religiosa, enquantoesta se conformar aos direitos e garantias dadas e pertencentes ao cidadão de um país democrático e laico.No entanto, é impossível que permaneçamos calados perante o pisoteamento sucessivo dos valoresinternacionais e nacionais com respeito à dignidade humana e àquilo que de direito todos nós temos direito,i.e. uma família unida, livre de preconceitos e que sabe conviver com as diferenças entre seus membros.

Agradecemos desde já a V. Exas. o tempo dispendido a ler esta carta que vos endereçamos, tendo a certezaque esta não caÍrá no esquecimento, devido aos factos graves que vos apresentamos e que envergonhamq alquer pessoa de bem em nosso país.

Atenciosamente,

Apartado 175 * 7501-909 Vila Nova de Santo André * Tel. 269 085 100 * Fax. 269 085 327 * e-mail: [email protected]

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