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1 DIREITO ADMINISTRATIVO DIREITO ADMINISTRATIVO I – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA É o conjunto de entidades, órgãos e autoridades incumbidas de exercer a função pública 1 . Administração Pública não se confunde com Governo . Este é o conjunto de entidades, órgãos e autoridades que integram a estrutura constitucional do Estado). O Governo é estrutural e orgânico, estando ligado aos Poderes Políticos (Executivo, Legislativo e Judiciário). Já a Administração Pública é conjuntural e instrumental, ligando-se aos poderes administrativos. Os Poderes Políticos 2 (ou Poderes de Estado) possuem cada qual uma função típica. Ao Poder Legislativo incumbe a elaboração da leis, isto é, a criação do Direito. Ao Poder Judiciário incumbe a solução de conflitos. Ao Poder Executivo incumbe a concretização dos comandos legislativos. Apenas este último é objeto do Direito Administrativo, eis que é a Administração Pública que materializa a função executiva do Estado. I.1 – ASPECTOS FORMAL E MATERIAL DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA A Administração Pública deve ser analisada sob 2 aspectos: formal (quem a constitui ? ; como se estrutura ?), e material (qual o seu objeto, sua atividade ?). I.1.1 – Aspecto Formal ou Subjetivo ou Orgânico A Administração Pública se estrutura por meio dos seus agentes públicos (pessoas naturais 3 ), órgãos públicos (centros de competência) e pessoas jurídicas. I.1.2 – Aspecto Material ou Objetivo ou Funcional A Administração Pública se exerce funções administrativas (típicas) e funções políticas (ou de governo). ▪ Funções Administrativas: - Exercício de Poder de polícia; 1 Administração Pública (com maiúsculas) = sentido subjetivo, Poder Público. administração pública (com minúsculas) = sentido objetivo, atividade (interna ou externa). 2 Segundo parte da doutrina, a expressão “Poderes de Estado” é atécnica, pois na verdade o poder é uno, de modo que na verdade tratam-se de “funções de Estado”. 3 Parte da doutrina (inclusive Guilherme Pena) entende minoritariamente que pessoas jurídicas podem ser agentes públicos.

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1DIREITO ADMINISTRATIVO

DIREITO ADMINISTRATIVO

I – ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

É o conjunto de entidades, órgãos e autoridades incumbidas de exercer a função pública1.

Administração Pública não se confunde com Governo. Este é o conjunto de entidades, órgãos e autoridades que integram a estrutura constitucional do Estado). O Governo é estrutural e orgânico, estando ligado aos Poderes Políticos (Executivo, Legislativo e Judiciário). Já a Administração Pública é conjuntural e instrumental, ligando-se aos poderes administrativos.

Os Poderes Políticos2 (ou Poderes de Estado) possuem cada qual uma função típica.

Ao Poder Legislativo incumbe a elaboração da leis, isto é, a criação do Direito. Ao Poder Judiciário incumbe a solução de conflitos. Ao Poder Executivo incumbe a concretização dos comandos legislativos.

Apenas este último é objeto do Direito Administrativo, eis que é a Administração Pública que materializa a função executiva do Estado.

I.1 – ASPECTOS FORMAL E MATERIAL DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

A Administração Pública deve ser analisada sob 2 aspectos: formal (quem a constitui ? ; como se estrutura ?), e material (qual o seu objeto, sua atividade ?).

I.1.1 – Aspecto Formal ou Subjetivo ou Orgânico

A Administração Pública se estrutura por meio dos seus agentes públicos (pessoas naturais3), órgãos públicos (centros de competência) e pessoas jurídicas.

I.1.2 – Aspecto Material ou Objetivo ou Funcional

A Administração Pública se exerce funções administrativas (típicas) e funções políticas (ou de governo).

▪ Funções Administrativas:

- Exercício de Poder de polícia;

- Prestação de Serviços Públicos;

- Atuação sobre a Ordem Econômica;

- Atuação sobre a Ordem Social;

- Fomento Público.

▪ Funções Políticas

- Funções co-legislativas e de direção.

1 Administração Pública (com maiúsculas) = sentido subjetivo, Poder Público. administração pública (com minúsculas) = sentido objetivo, atividade (interna ou externa).

2 Segundo parte da doutrina, a expressão “Poderes de Estado” é atécnica, pois na verdade o poder é uno, de modo que na verdade tratam-se de “funções de Estado”.

3 Parte da doutrina (inclusive Guilherme Pena) entende minoritariamente que pessoas jurídicas podem ser agentes públicos.

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2DIREITO ADMINISTRATIVO

As funções administrativas típicas são a própria razão de ser da Administração Pública (através de seu exercício a Administração visa atender o interesse público primário, ou seja, o interesse da coletividade).

Já as funções políticas (ou de governo) visam atingir o interesse público secundário da coletividade, que é o interesse direto da própria Administração).

I.2 – DESCENTRALIZAÇÃO — art. 4º do DL nº 200/67

Quando a Administração Pública não possui meios para exercer todas as suas funções, promove a descentralização. Descentralização é técnica de distribuição de poder, praticada em busca da eficiência administrativa.

Segundo Diogo de Figueiredo, a Administração Descentralizada se divide em:

▪ Administração Indireta

- Autarquias

- Empresas Públicas

- Sociedades de Economia Mista

- Fundações Públicas

▪ Administração Associada

- Serviços Sociais Autônomos

- Entes em Parceria

- Entes em Colaboração

A Administração Indireta nasce da Lei. Já a Administração Associada nasce, via de regra, do contrato ou do ato administrativo4.

I.2.1 – Formas de descentralização

a) Descentralização Hierárquica

Atribuição de poder dentro da mesma entidade (ex: delegação de Poder do Presidente da República para um ministro de Estado). É o que Hely Lopes Meirelles chama de “desconcentração”.

b) Descentralização Institucional (ou Burocrática)

Atribuição de poder a outra entidade, que também é vinculada ao Poder Público, sendo parte da Administração Pública (ex: Autarquia). É o que Hely Lopes Meirelles chama de “outorga”.

4 Concessionárias de Serviço Público = Administração Associada (vínculo contratual com a Administração Direta). OS / OSCIP = Administração Associada (vinculadas à Administração Direta através do ato administrativo que reconheceu a sua qualidade). Serviços Sociais Autônomos = Administração Associada (criados mediante autorização legal, porém não integram a Administração Indireta)

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3DIREITO ADMINISTRATIVO

c) Descentralização por Delegação

Atribuição de poder a entidade privada, sem vínculo com o Estado (ex: contrato de concessão de serviço público).

d) Descentralização Social (“reconhecimento”)

Desenvolvimento de atividade por entidade privada, sem que tenha sido expedido qualquer ato formal do Estado atribuindo-lhe poder. Todavia, como a atividade explorada é de interesse do Estado, este a reconhece posteriormente (ex: atividades de ONGs, associações de moradores, etc.).

II – SETORES DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICAA doutrina divide a Administração Pública em 3 setores, com fulcro na forma como

sua atividade é exercida.

O 1.º Setor é composto pela Administração Direta e pela Indireta (fruto da descentralização hierárquica e institucional).

O 2.º Setor é composto pelos delegatários de serviço público (concessionários, permissionários e, para parte da doutrina, também os autorizatários5), sendo fruto da descentralização por delegação.

Por fim, o 3.º Setor é formado pelas chamadas “entidades intermédias” (entes de cooperação e de colaboração6), sendo fruto da descentralização social.

Obs.: Os entes da Administração Indireta se ligam ao ente descentralizador por Lei. Já os delegatários de serviço público são vinculados ao ente descentralizador por contrato administrativo.

II.1 – 1.º SETOR

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA DIRETA

A Administração Pública Direta compreende as entidades (União, Estados, DF e Municípios), órgãos (Secretarias, Ministérios, AGU, DP, MP, PGE...), e autoridades (agentes) do Poder Público.

II.1.1 – Entidades Públicas

As entidades públicas (entes políticos) têm personalidade jurídica própria, sendo pessoas jurídicas de direito público interno (todas elas) e externo (apenas a União Federal). Nisso se distinguem dos órgãos, que não possuem personalidade jurídica (embora alguns sejam dotados de capacidade processual — ex: MP, PGE, etc.).

II.1.2 – Órgãos Públicos — Teoria do Órgão

5 Parte da doutrina admite a existência da autorização de serviço público (ex: Marcos Juruena), citando o exemplo da banca de jornais e da autorização da passeata. Outra corrente contesta, sustentando que não existe a autorização de serviço público, mas apenas a autorização de uso de bem público, e inclusive os exemplos supra são de autorização de uso, e não de serviço (ex: Guilherme Peña de Moraes).

6 Diferença entre ente de cooperação e ente de colaboração: ambas são entidades privadas que desenvolvem atividade reconhecidas, posteriomente, como eficazes. A diferença está na própria iniciativa para sua criação: os entes de colaboração são constituídos pela sociedade, ao passo que os entes de cooperação são criados pelo Estado.

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4DIREITO ADMINISTRATIVO

Órgão é o centro de atribuições7 instituído para o desempenho de funções estatais por intermédio de seus agentes, cuja atuação é imputada à entidade à qual pertence.

A Presidência da República, por exemplo, é um órgão, isto é, um centro de competência em que são exercidas funções. Do mesmo modo são os Ministérios, que exercem funções dentro de suas atribuições, vinculando-se à direção exercida pelo órgão de cúpula, a Presidência.

Sabendo-se, portanto, que os órgãos públicos integram a estrutura interna da Administração Pública, os seus atos caracterizam execução direta de funções públicas por parte da Administração.

Enfim, órgão é o centro de atribuições criado para que sejam exercitadas as funções do Estado, através dos agentes que integram esse mesmo órgão, cuja atuação é imputada ao ente a que pertence.

Este conceito reflete a moderna teoria quanto à relação entre as entidades, os órgãos e os agente públicos (“Teoria do Órgão ou da Imputação”)8.

► CLASSIFICAÇÃO DOS ÓRGÃOS

a) Quanto à esfera de atuação:

• CENTRAIS = atuam em todo o território do ente a que pertencem.

• LOCAIS = atuam apenas em parcela do território do ente.

b) Quanto à posição estatal:

• INDEPENDENTES = criados pela CR/88, ocupando o ápice da estrutura administrativa e representando um Poder de Estado (ex: Presidência da República).

• AUTÔNOMOS = subordinados hierárquica e funcionalmente aos órgãos independentes, possuindo autonomia financeira e técnica, e exercendo função de planejamento, coordenação, controle ou supervisão de uma atividade (ex: Ministérios de Estado).

7 Alguns autores conceituam o órgão como “centro de competências”, porém é mais técnico usar a expressão “centro de atribuições”, até porque competência, tecnicamente, é termo ligado à função de julgar (ou seja, apenas na jurisdição é que há que se falar em competência). Na Administração Pública não há competências, e sim atribuições (no MP, por exemplo, não há conflito de competência, mas de atribuição).

8 Segundo a Teoria do Órgão, este atua através de seus agentes, cujos atos serão a ele imputados. Em outras palavras, o agente é o “presentante” do órgão, é o próprio órgão. Por conseqüência, os atos dos agentes do órgão público serão imputados à entidade à qual o órgão pertence. Foram superadas na doutrina e na jurisprudência as teorias do mandato e da representação, prevalecendo atualmente a teoria do órgão.

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5DIREITO ADMINISTRATIVO

• SUPERIORES = subordinados hierárquica e funcionalmente aos órgãos autônomos, possuindo autonomia apenas técnica, e dotados de poder de decisão dentro de sua esfera, tratando-se de sua atribuição precípua (ex: INCRA).

• SUBALTERNOS = subordinados hierárquica e funcionalmente aos órgãos superiores, não dispondo de qualquer tipo de autonomia, e tendo como função precípua a execução (ex: almoxarifado do INCRA).

c) Quanto à natureza da atribuição:

• DE AUTORIDADE = a natureza da atribuição do órgão é de decisão ou execução (ex: Juízo de Direito).

• AUXILIAR = a natureza da atribuição do órgão é de preparação técnica, e não de decisão ou execução (ex: Cartório).

d) Quanto à estrutura:

• SIMPLES = possuem apenas 1 centro de atribuições, sendo indivisíveis (ex: Juízo).

• COMPOSTOS = possuem mais de 1 centro de atribuições, sendo divisíveis (ex: Tribunais).

e) Quanto à atuação funcional:

• SINGULARES = atuam mediante manifestação unilateral de vontade.

• COLEGIADOS = atuam mediante deliberação majoritária entre seus membros.

f) Quanto à obrigatoriedade de existência:

• OBRIGATÓRIOS = sua instituição pelo Poder Público é obrigatória, vinculada.

• FACULTATIVOS = sua instituição é discricionária.

II.1.3 – Agentes PúblicosAgentes públicos são as (pessoas naturais “ou jurídicas9) que, a qualquer título,

temporária ou definitivamente, integram a estrutura administrativa, exteriorizando a vontade da Administração Pública por meio do exercício de cargo, emprego ou função pública.

a) Agentes Políticos

9 O prof. Guilherme Peña admite que pessoas jurídicas possam ser agentes públicos, embora boa parte da doutrina só se refira a pessoas naturais.

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6DIREITO ADMINISTRATIVO

- Exercem atribuições previstas na CR/88;- Mantêm vínculo político com o Estado;- Não estão sujeitos a nenhum regime funcional (estatutário, celetista ou especial), possuindo

regime jurídico próprio;- Possuem prerrogativas10 funcionais próprias;- Têm modo de provimento (ingresso nos quadros do Poder Público) e destituição (saída dos

quadros do Poder Público) próprios.

►CORRENTES QUANTO AOS AGENTES POLÍTICOS

1 – Restritiva (Di Pietro; Bandeira de Mello) = Apenas são agentes políticos aqueles que ocupam cargo fundamentla na estrutura política do Estado (Chefes do Executivo e seus auxiliares diretos; membros das Casas Legislativas);

2 – Ampliativa (Hely Lopes; Diogo de Figueiredo) = são agentes políticos também aqueles que exercem sua função com liberdade e independência (Magistrados e membros das funções essenciais à Justiça; membros dos Tribunais de Contas; membros das missões diplomáticas e consulares — embaixadores e cônsules)11.

b) Servidores Estatais

A classificação principal subdivide os servidores estatais em 3 categorias: servidores públicos, empregados públicos e servidores contratados.

Os servidores públicos ocupam cargos públicos, atuando na Administração Direta, Autárquica e Fundacional. Seu regime jurídico é estatutário, e o provimento é feito mediante concurso público de provas ou de provas e títulos.

Empregados Públicos são os que atuam nas Empresas Públicas e nas Sociedades de Economia Mista (espécies do gênero “Empresas Estatais”). Não ocupam cargo público, e sim emprego público. Seu regime é o celetista (CLT)12 , e são escolhidos mediante concurso público de provas ou de provas e títulos.

Contratados são os que exercem função pública em caso de urgência para a Administração Pública Direta, Autárquica e Fundacional. Não têm cargo público nem emprego público, mas tão somente função pública. Seu regime é especial, sendo escolhidos mediante processo seletivo simplificado (não chega a ser concurso público, mas tem que respeitar a meritocracia e a impessoalidade).

►APROVAÇÃO EM CONCURSO E DIREITO À POSSE

O artigo 77, VII, da CERJ determinava que, havendo Concurso Público, os candidatos aprovados deveriam ser nomeados e empossados em até 6 meses.

10 Prerrogativa = é funcional, decorrendo tão somente da função exercida, nada tendo a ver com a pessoa. Privilégio = é pessoal (A CR/88 veda qualquer tipo de privilégio, pelo princípio da igualdade — ex: não há mais Duques, Condes, Barões, Marqueses, etc.)

11 Diretores de Agências reguladoras = segundo Marcos Juruena, também são agentes políticos, pois têm mandato fixo, independente do mandato do Chefe do Executivo, e atuam com independência e liberdade (características fundamentais às Agências Reguladoras, a fim de dar segurança jurídica aos delegatários do serviços públicos por elas fiscalizados).

12 O regime jurídico dos empregados públicos é CELETISTA MITIGADO , pois nem todas as disposições da CLT são a eles aplicadas. Por exemplo: são escolhidos mediante concurso público; não têm Carteira de Trabalho – CTPS; não têm direito a FGTS; tomam posse no emprego; etc.)

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7DIREITO ADMINISTRATIVO

O STF recentemente declarou tal dispositivo inconstitucional, reafirmando a posição consagrada nas Súmulas 15 e 16 do Pretório Excelso (aprovação em concurso público não gera direito à nomeação, mas a nomeação gera direito à posse).

Há várias classificações dos agentes públicos. Porém, a que predomina é a de Oswaldo Aranha Bandeira de Mello. Segundo o saudoso autor, os agentes públicos seriam classificados em agentes políticos, servidores estatais e particulares em colaboração com o Poder Público.

► REGIME JURÍDICO ÚNICO (RJU) O Regime Jurídico Único não foi abolido pela EC/19, mas foi flexibilizado (deixou de ser

obrigatório, mas ainda pode ser adotado facultativamente). Com isso, é possível que haja na Administração Direta, Autárquica e Fundacional, simultaneamente servidores públicos e empregados públicos.

A tendência atual (2006) é de retorno ao RJU.

► CONTRATAÇÃO / / TERCEIRIZAÇÃO

São conceitos que não se confundem, apresentando diversas diferenças fundamentais.A contratação ocorre por motivo de urgência, e o contratado se torna agente público. A

relação entre a pessoa jurídica e o contratado (pessoa natural) é direta, linear. Às vezes limita-se a duração do contrato a certo período de tempo (ex: Universidade Pública contrata professor de determinada disciplina por tempo determinado devido a situação de urgência).

Na terceirização, por outro lado, não há vínculo entre o contratado (pessoa natural) e a pessoa jurídica. A relação é indireta, angular (o Poder Público contrata empresa, que tem a pessoa natural em seus quadros). A pessoa natural não presta concurso público nem participa de processo seletivo. A terceirização se refere apenas a atividades-meio, jamais podendo ocorrer no âmbito da atividade-fim (ex: admite-se a terceirização do serviço de limpeza de um prédio público, mas não se admite quanto ao próprio serviço prestado pelo Poder Público naquele prédio). Ex: Universidade Pública contrata empresa de limpeza.

Entende-se majoritariamente que na terceirização, a Administração Pública não responde por nenhuma obrigação (seja ela trabalhista ou previdenciária), nem mesmo subsidiariamente, pois não tem vínculo com a pessoa natural (v. art. 71 § 2.º, Lei 8666/93 c/c art. 31, Lei 8212/91 X Súmula 331/TST).

c) Particulares em colaboração com o Poder Público

Dividem-se em agentes delegados, agentes honoríficos e gestores de negócios públicos.

c.1) Agentes delegados

São aqueles que prestam serviço público por delegação (ex: concessionário, permissionário, autorizatário).

Embora parte da doutrina afirme que somente pessoa natural pode ser agente público, admite-se que pessoas jurídicas possam sê-lo.

c.2) Agentes honoríficos

São os que por requisição, designação ou nomeação exercem ofícios públicos. “São os que agem em honra do Estado” (ex: mesário em eleições; jurado no Tribunal do Júri).

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8DIREITO ADMINISTRATIVO

c.3) Gestores de negócios públicos

São os que, durante estado de necessidade público (circunstância excepcional), assumem a gestão da coisa pública em nome próprio (responsabilizando-se, pois, por eventuais prejuízos).

Os gestores de negócios públicos, enquanto durar a sua atuação, são considerados agentes públicos.

► AGENTE PÚBLICO // AGENTE DE FATO // USURPADOR DE FUNÇÃO PÚBLICA

A definição de tais conceitos é relevante para a aplicação da “Teoria da Aparência”, pela qual os agentes de fato e os usurpadores de função pública têm aparência de agentes públicos, embora não o sejam.

O Agente Público, salvo em hipóteses excepcionais como a dos gestores de negócio público, preenchem 2 requisitos: objetivo (exercer função pública); subjetivo (estar regularmente provido em cargo, emprego ou função pública.

Os atos praticados pelos agentes públicos produzem todos os efeitos internos (para a Administração) e externos (perante terceiros), desde que sejam observados os elementos do ato administrativo.

Já nos casos do agente de fato e do usurpador de função pública, apenas o requisito objetivo é preenchido, não se observando o requisito subjetivo.

Agente de Fato é aquele que ingressa na função pública em razão de erro (“agente de fato putativo”) ou de estado de necessidade pública (“agente de fato necessário”). Todavia, há atendimento do interesse público na sua atuação, apesar de irregular.

Os atos praticados pelo agente de fato são eficazes perante terceiros e perante a Administração, pela teoria da aparência.

Porém, se o caso for de erro (“agente de fato putativo”), os efeitos perante a Administração só se produzirão se houver a sanatória do ato pela autoridade superior hierarquicamente, produzindo-se normalmente os efeitos perante terceiros.

Usurpador de Função Pública é aquele que exerce a função pública não por erro ou por necessidade do Poder Público, mas sim por coação ou fraude. No caso de coação, é denominado “usurpador de função pública violento”, e no caso de fraude, “usurpador de função pública artificioso”. Não há qualquer interesse público em sua atuação.

Os atos praticados pelo usurpador de função pública são ineficazes, não produzindo quaisquer efeitos, internos ou externos.

II.1.4 – Delegação do Poder de PolíciaA doutrina majoritária entende que o Poder de Polícia seja sempre indelegável.

Todavia, a posição que prevalece nas bancas de todos os Concursos é no sentido contrário, de que pode haver delegação do Poder de Polícia.

A inadmissão da delegação do Poder de Polícia deixaria sem explicação algumas situações recorrentes, a saber: o DETRAN/RJ celebrou convênio com algumas Universidades, para que estudantes realizem vistorias em automóveis e emitissem os respectivos certificados; a concessionária Ponte S/A, sociedade privada, utiliza radares. Sabendo-se que a fiscalização é atividade típica do Poder de Polícia, tais situações só podem ser explicadas se se admitir a delegação de tal poder.

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9DIREITO ADMINISTRATIVO

► FASES DO PODER DE POLÍCIA

O Poder de Polícia se divide em 4 fases distintas, duas internas e duas externas:

1- Ordem de Polícia (Regulamentação) — ex: Código de Trânsito;

2- Consentimento — expedição de Carteira de Habilitação;

3- Fiscalização — ex: atividade dos agentes públicos nas ruas;

4- Sanção — emissão de multas.

O Código de Trânsito (CNT) caracteriza a ordem de polícia, pois trata-se de norma geral e abstrata. Já a emissão de Carteira de Habilitação (CNH) caracteriza o consentimento (anuência do Estado em que certas pessoas guiem carros pelas vias públicas, posto que foram preenchidos todos os requisitos para tanto). A fiscalização consiste na verificação do desempenho da atividade consentida: os agentes públicos fiscalizam se aqueles aos quais o Estado concedeu a habilitação estão agindo em conformidade com as prescrições da norma geral (CNT). Por fim, restando verificado que alguém infringiu as normas de trânsito aplica-se a sanção (multa).

Segundo Diogo de Figueiredo, as duas fases extremas do Poder de Polícia (regulamentação e sanção) são indelegáveis, por decorrerem diretamente do Poder de Império do Estado. Porém, as fases intermediárias (consentimento e fiscalização) podem ser delegadas a particulares.

Por isso os alunos das universidades que celebraram convênios com o DETRAN estão autorizados a realizar vistorias (ato de fiscalização), emitindo os respectivos certificados (ato de consentimento). Por outro lado, a Ponte S/A pode utilizar radares eletrônicos (ato de fiscalização), mas não pode aplicar multas aos infratores (ato de sanção), devendo enviar os dados aos órgãos públicos com atribuição para emitir as multas.

► MULTA DE TRÂNSITO

Alguns Municípios (ex: Niterói) terceirizaram o sistema de aplicação de multas de trânsito contratando cooperativa. Em face disso, diversas ações foram intentadas, e algumas sentenças anularam tais multas, por considerarem tais agentes como usurpadores de função pública. Porém, à luz do conceito acima, não se pode dizer que tais agentes são usurpadores de função pública, pois não ingressaram na função pública por meio de fraude ou coação.

Segundo o professor Guilherme Peña, trata-se de hipótese de estado de necessidade do Poder Público, por falta de tempo para realizar concurso público para o provimento de tais cargos. Assim, o caso caracteriza tais agentes como agentes de fato, sendo válidos os atos administrativos por eles praticados.

Quanto à validade da delegação do Poder de Polícia, os atos de fiscalização dos agentes de fato são válidos, desde que não apliquem as multas, e sim encaminhem os dados aos órgãos competentes.

ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA INDIRETA

A Administração Pública Indireta compreende as Autarquias, Fundações Públicas, Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista.

II.1.5 – AutarquiasA) Personalidade Jurídica

As Autarquias são pessoas jurídicas de direito público. O termo inicial da personalidade jurídica da Autarquia é o início da eficácia da Lei instituidora (v. art. 77 § 2.º, I, CERJ).

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10DIREITO ADMINISTRATIVO

B) Instituição, Organização, ExtinçãoA instituição das Autarquias se dá mediante Lei Ordinária, de iniciativa reservada ao

Chefe do Poder Executivo.A organização é feita mediante ato administrativo, na forma de Decreto13. Assim,

sendo a Autarquia criada por Lei de iniciativa exclusiva do Chefe do Executivo, a este compete a organização do ente, mediante Decreto (ato infralegal).

A extinção, pelo princípio da simetria, deve ser mediante Lei Ordinária (mesma forma prevista para a instituição).

C) Regime Jurídico FuncionalEm regra, o regime jurídico é o estatutário. Entretanto, tendo sido abolido o Regime

Jurídico Único, é possível atualmente que os agentes das Autarquias sejam regidos pela CLT (vide Lei 9962/00, art. 1.º).

D) PatrimônioPrevalece na doutrina o entendimento de que o patrimônio das Autarquias é

integralmente composto por bens públicos de uso especial(Usados por pessoas determinadas, atendidas as condições para a prestação dos serviços públicos.). Portanto, tais bens estão sujeitos a registro no RGI14 (art. 98, NCC).E) Objeto

O objeto da Autarquia é atividade tipicamente estatal, desempenhando atividades que, não obstante típicas do Poder Público, não são convenientes à Administração Direta (ex: guardas municipais, autarquias de trânsito).

F) FormaA forma da Autarquia é Intraestatal (a Autarquia está dentro do Estado, embora

integre a Administração Indireta — diz-se que a Autarquia é o ente da Administração Indireta que mais se aproxima da Administração Direta).

G) Privilégios Fiscais e Processuais15

As Autarquias dispõem de privilégios fiscais, consubstanciados na chamada “imunidade recíproca” (art. 150 § 2.º, CR/88). Em outras palavras, as imunidades recíprocas (que impedem que um ente político cobre tributo de outro) abrangem as Autarquias.

Quanto aos privilégios processuais, a Autarquia goza de todas as prerrogativas da Fazenda Pública:

- Prazo em quádruplo para contestar e em dobro para recorrer (art. 188 CPC);

- Duplo grau obrigatório nos casos do art. 475 do CPC;

13 Os atos do Chefe do Executivo têm a forma de Decreto.

14 Os bens públicos de uso comum não estão sujeitos ao registro no RGI. Todavia, os bens públicos de uso especial e os bens dominiais estão sujeitos a tal registro. Não há lei disciplinando a matéria, sendo doutrinário e jurisprudencial o entendimento.

15 A rigor, não é correto falar-se em “privilégio”, mas em “prerrogativa”, pois a CR/88 considera qualquer privilégio uma violação ao princípio da igualdade, sendo vedado (ex: não existem mais títulos de nobreza no Brasil). O privilégio é pessoal, ao passo que a prerrogativa é funcional, não havendo qualquer relevância quanto à pessoa, mas sim quanto à função. Portanto, a Fazenda Pública não possui privilégios, e sim prerrogativas (que decorrem da sua função, e não da sua personalidade).

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11DIREITO ADMINISTRATIVO

- Execução Fiscal (quando a Fazenda for exeqüente) — Lei 6830/80;

- Execução por Precatórios 16 (quando a Fazenda for executada) — art. 100, CR/88, c/c art. 730/731 CPC;

- Pagamento de despesas processuais apenas ao final (art. 27 CPC)17;

- Crédito privilegiado (a Fazenda não se submete a concurso de credores, não participando de processo de Falência nem de Insolvência). — art. 1571 CC/16.

► ANTECIPAÇÃO DE TUTELA EM FACE DA FAZENDA PÚBLICA Existe norma vedando a concessão de tutela antecipada em face da Fazenda Pública. A

doutrina diverge intensamente quanto à constitucionalidade dessa norma, à luz do princípio da inafastabilidade da jurisdição (art. 5.º, XXXV, CR/88). Segundo a maior doutrina, este dispositivo constitucional não determina apenas que a jurisdição seja prestada, mas que o seja de forma adequada e tempestiva. Assim, a vedação à concessão da medida antecipatória seria inconstitucional.

Entretanto, o STF declarou a constitucionalidade da referida norma.Não obstante a posição do STF, existem hipóteses extremas em que a medida é

comumente concedida (ex: em caso de Ação de Obrigação de Fazer em face do Estado ou do Município18 consistente no fornecimento de remédios para doentes hipossuficientes).

H) Justiça Competente

As demandas em que for parte Autarquia serão julgadas na Justiça Comum, em 1.º grau. Em se tratando de Autarquia Federal, a competência será da Vara Federal. Em se tratando de Autarquia Estadual ou Municipal, a competência será da Vara da Fazenda Pública (art. 109, I, CR/88).

I) Licitação

As autarquias estão sujeitas ao dever de licitar, nos termos da Lei 8666/93. A licitação é imposta às Autarquias para qualquer contrato administrativo que celebrem (compra, venda, serviços...), salvo os casos de dispensa.

J) Responsabilidade CivilAs Autarquias respondem objetivamente pelos danos causados por seus agentes

nessa qualidade ou a pretexto de exercê-la, na forma do art. 37 § 6.º da CR/88.

16 A execução contra a Fazenda Pública é feita mediante Precatórios, pois os bens públicos são impenhoráveis.

17 Não há nenhuma hipótese em que a Fazenda Pública seja obrigada a adiantar as despesas processuais. O pagamento só é feito ao final.

18 São solidários o Estado, a União e o Município na obrigação de fornecer medicamentos aos doentes hipossuficientes. Porém, é pouco comum que tal ação seja intentada em face da União, pois isso deslocaria a competência para a Justiça Federal, onde o trâmite dos processos é mais moroso.

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12DIREITO ADMINISTRATIVO

II.1.5.1 – Autarquias EspeciaisAs Autarquias Especiais caracterizam-se por serem dotadas de maior autonomia19.

O melhor exemplo de Autarquias Especiais são as Agências Reguladoras.

II.1.6 – Agências Reguladoras20

EVOLUÇÃO DO DIREITO ADMINISTRATIVO

Quanto à organização do Estado, o mundo viveu três momentos distintos no século XX, cada qual regido por uma ideologia diversa.

No início do século, prevalecia a ideologia liberal, em que o Estado tem funções reduzidas, intervindo o mínimo possível nas relações sócio-econômicas, e prestando-se apenas a funções de segurança, justiça e serviços essenciais (LIBERALISMO ). Os únicos direitos garantidos são os fundamentais e políticos.

Após a crise do anos 20, o Estado passou a ser organizado sob outra ideologia (modernismo, INTERVENCIONISMO , welfare state), intervencionista, assumindo diretamente alguns papéis econômicos, ora fomentando, ora restringindo determinadas atividades em prol do bem estar social. Surgem os direitos sociais, relativos ao emprego e às garantias do trabalhadores.

No fim do século, o Estado é reestruturado, diante da constatação de que não é capaz de suportar todas as atribuições que assumiu sob a égide da ideologia anterior, operando-se privatizações, DESCENTRALIZAÇÃO , e abrindo espaço para o 3.º setor, através principalmente das ONGs. No que tange à cidadania, surgem os chamados direitos difusos, indivisíveis e indetermináveis quanto aos titulares.

No Brasil, a redução expressiva da atuação empreendedora do Estado operou o deslocamento do campo de atuação do Estado, que passou de empresário a regulador, fiscalizando o exercício das atividades delegadas a particulares. Daí a profusão de leis editadas no país nas últimas décadas.

A crise fiscal, com a necessidade de retomada do equilíbrio orçamentário, aliada à constatação de que o Estado não dispõe de recursos suficientes para a adequada e eficiente prestação de todos os serviços de sua titularidade levou à transferência da execução de vários destes serviços ao setor privado. Todavia, tal transferência não significa que os serviços delegados perderam sua natureza pública. Com efeito, o Estado permanece responsável pela adequada e eficiente prestação dos serviços de sua titularidade, porém deixou de atuar como executor de tais serviços para atuar como regulador e fiscalizador da atividade dos delegatários.

Para a implementação do novo modelo administrativo idealizado, tornou-se imperioso atrair capitais privados para os setores de interesse público. Sabendo-se que tais investimentos somente ocorreriam se houvesse lucratividade e segurança jurídica, necessária se fez a criação de entes dotados de autonomia e independência(AGÊNCIAS REGULADORAS), capazes de reger de forma isenta as relações entre o concedente e o concessionário, conferindo estabilidade às normas e contratos.

Neste contexto surgem as AGÊNCIAS REGULADORAS , como centros de poder encarregados do exercício das novas funções assumidas pelo Poder Público.

AS AGÊNCIAS REGULADORAS

19 Ao contrário do que sustenta parte da doutrina, a OAB não é autarquia especial, não podendo ser assim considerada porque o art. 1.º da Lei 8906/94 estabelece que não há vínculo entre ela e o Poder Público (embora possa cobrar tributo — contribuição especial).

20 Bibliografia: Aulas proferidas polo professor Guilherme Peña de Moraes no CEPAD; Textos de Luís Roberto Barroso (“Agências Reguladoras”) e Marcos Juruena (“Agências Reguladoras” e “Regulação por Autoridades Independentes”) na Revista de Direito da PGE.

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13DIREITO ADMINISTRATIVO

► IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Ao Poder Público cumpre a elaboração de políticas públicas. Porém, tais políticas podem exigir a atuação direta e impositiva do Estado, envolvendo subordinação de interesses particulares e restrição de direitos individuais em prol do interesse coletivo, ou podem admitir a parceria com o setor privado.

Para a implantação de políticas que dispensem a exclusividade do Estado, admite-se a parceria com a iniciativa privada, mediante concessões, permissões, terceirizações, contratos de gestão, etc. (ex: terceirização da administração de hospitais públicos).

Por outro lado, no que concerne à implantação de políticas públicas impositivas, com necessária atuação do Estado, a execução é realizada via criação de Agências Autônomas, sob a forma autárquica.

As Agências Autônomas dividem-se em: Agências Executivas, que são encarregadas de implementar diretamente as políticas públicas; e Agências Reguladoras, que implementam políticas públicas mediante a orientação da execução privada do serviço considerado de relevante interesse público.

Através da Agência Reguladora, o Estado se exime da dispendiosa e infrutífera tarefa de criar e manter entidade concorrente com o setor privado, para passar a regular o modo de operação das entidades privadas, de modo a melhor atender ao interesse coletivo.

► CRIAÇÃO As Agências Reguladoras são criadas mediante lei específica, de iniciativa do

Chefe do Executivo do ente político titular do serviço, sob a forma de Autarquias Especiais, dispondo de personalidade jurídica de Direito Público. São especiais porque gozam de prerrogativas próprias, dotando-as de autonomia perante a Administração Direta21. A extinção das Agências Reguladoras deve seguir o princípio da simetria, decorrendo de lei (devidamente motivada).

A criação das Agências Reguladoras compete ao Ente Político titular do serviço delegado. Este pode optar entre dois modelos institucionais distintos: a criação de Agências especializadas, destinando-se a regular setores específicos (exemplo da União Federal — ANEEL, ANATEL, ANP, ANAGUA, etc.); ou a criação de uma única Agência, com funções amplas, regulando uma pluralidade de serviços delegados pelo Ente da Administração Direta (exemplo do Estado do Rio de Janeiro — ASEP).

► AUTONOMIA A autonomia das Agências Reguladoras se justifica pelo fato de que, visando à

atração de empreendedores particulares para os serviços regulados, essas instituições devem ser imunes a indesejáveis e impertinentes ingerências do Poder Público, de modo a proporcionarem elevado grau de segurança jurídica aos que com ela contratarem.

As decisões das Agências Reguladoras são baseadas em critérios técnicos, e não em critérios políticos.

Assim, a autonomia das Agências Reguladoras se reflete em dois aspectos: político-administrativo e econômico-financeiro.

a) Autonomia Político-Administrativa

A autonomia político-administrativa das Agências Reguladoras se caracteriza pela previsão de mandato22 fixo23 para seus diretores, sendo estes dotados de estabilidade, ou seja, somente podendo perder o cargo dentro do período previsto por renúncia ou condenação 21 Autarquias Especiais são aquelas a que a lei instituidora confere privilégios específicos e aumenta sua autonomia em comparação com as autarquias comuns, sem que haja infração dos preceitos constitucionais próprios das autarquias (Hely Lopes Meirelles).

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transitada em julgado em processo administrativo e disciplinar24. A investidura dos dirigentes é feita mediante nomeação do Chefe do Executivo, passando pela aprovação do Legislativo (a fim de conferir legitimidade política à escolha dos diretores).

Obs.: Extinção da Agência Reguladora

No caso de extinção da Agência Reguladora, discute-se se seu dirigente tem direito subjetivo à remuneração pelo período restante de mandato, ou pelo período referente à quarentena. Uma corrente entende inexistir tal direito, sob o argumento de que, uma vez extinta a regra de organização da qual decorre a atribuição que justifica o benefício, este também se considera extinto. Outra vertente é no sentido de tal direito ser inerente à própria independência da Agência, sendo necessário assegurá-lo em prol da segurança jurídica dos investimentos.

Natureza da Função dos Dirigentes das Agências ReguladorasMarcos Juruena defende que os dirigentes das Agências Reguladoras devam

ostentar a posição de agentes políticos25, pois sua nomeação não obedece aos critérios gerais aplicáveis aos agentes públicos, sendo regida por critérios especiais. Outrossim, dispõem de independência técnica e política, podendo até mesmo decidir contrariamente a interesses políticos e econômicos, estando resguardados pela estabilidade do mandato fixo.

Contrabalançando a estabilidade dos diretores das Agências Reguladoras, a fim de evitar o locupletamento, há a previsão da chamada “quarentena”: os diretores estão impedidos de prestar, direta ou indiretamente, qualquer serviço às empresas sob sua regulação ou fiscalização26, durante determinado período após o fim de seus mandatos (em regra esse período é de 1 ano — ex: artigo 30, Lei 9472/96). Durante a quarentena, é assegurada ao ex-dirigente a remuneração equivalente à do cargo de direção que exercera.

b) Autonomia Econômico-FinanceiraQuanto à autonomia econômico-financeira das Agências Reguladoras, esta se

verifica pela previsão de dotações orçamentárias gerais, bem como pela possibilidade de instituição das chamadas “taxas de fiscalização e regulação” ou participações em contratos e convênios.

As taxas de regulação cobradas dos delegatários costumam ser a grande fonte de receita das Agências Reguladoras, sendo responsáveis pela autonomia econômico-financeira das autarquias. Por outro lado, critica-se o fato de que as Agências Reguladoras dependem de valores pagos pelos concessionários para se sustentar27.

22 A expressão “mandato” é infeliz, porque tecnicamente só se pode falar em mandato quando se tratar de cargos eletivos, o que não é o caso dos diretores das Agências Reguladoras (que são nomeados pelo Presidente da República, mediante critério político). O mais correto seria falar em “investidura com termo determinado”.

23 A direção das Agências Reguladoras é colegiada. Os mandatos dos dirigentes não devem ser coincidentes entre si nem com o ciclo eleitoral.

24 Há quem critique a previsão de mandato fixo para os diretores das Agências Reguladoras, sob o argumento de que, sendo nomeados livremente pelo Chefe do Executivo, sem concurso público, seriam exonerráveis ad nutum, a qualquer tempo, como ocorre com os dirigentes das demais autarquias. Todavia, Marcos Juruena e Luís Roberto Barroso defendem a previsão de mandato fixo, por ser requisito indispensável à autonomia político-administrativa das Agências.

25 Teoria ampliativa do conceito de agentes políticos.

26 Inclusive controladas, coligadas ou subsidiárias.

27 Segundo Marcos Juruena, a despeito de tornar-se independente de recursos orçamentários, a Agência Reguladora se sujeita à crítica de ser custeada pelos sujeitos por ela fiscalizados.

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15DIREITO ADMINISTRATIVO

Natureza da Taxa de RegulaçãoDiscute-se quanto à natureza da taxa de regulação ou fiscalização, havendo uma

corrente no sentido de que seja taxa propriamente dita e outra no sentido de ser preço contratual cobrado pelo concedente aos delegatários.

Luís Roberto Barroso entende que se trata de tributo. Marcos Juruena entende que não se trata de tributo, pois não há prestação de serviço público28 nem exercício de poder de polícia29.

► FORMA DE DELEGAÇÃO A delegação do serviço público é feita em regra mediante contrato de concessão

(pelo qual a remuneração do concessionário é feita mediante a cobrança de tarifas dos usuários). Assim, para tornar o serviço acessível ao usuário e ao mesmo tempo remunerar os elevados investimentos do delegatário, é necessário diluir a cobrança das tarifas em contratos de longo prazo. Ocorre que é quase impossível prever, no momento da celebração do contrato, que as situações podem surgir ao longo do período de duração do contrato. Isso realça ainda mais a importância da Agência Reguladora, devendo solucionar as questões que vierem a surgir durante a vigência do contrato conforme os princípios que nortearam sua celebração.

► LICITAÇÃO As Agências Reguladoras submetem-se à regra geral da licitação, pois celebra

contratos administrativos, tanto na execução de suas atividades-fim quanto na de atividades-meio.

Todavia, diante da complexidade das decisões a serem tomadas pelas Agências, bem como da agilidade necessária à função regulatória, o procedimento licitatório a que se submetem as Agências é distinto do comum, sendo simplificado (conforme autorizado pelo artigo 37 § 8.º da CR/88).

► OBJETO A função regulatória30 reflete-se em 4 aspectos principais:

a) Criação e aplicação das regras (preservando a modicidade da tarifa, a universalização e competitividade do serviço) — Função Normativa;

b) Fiscalização do cumprimento do contrato de concessão — Função Fiscalizatória;

c) Aplicação de sanções aos transgressores das regras — Função Sancionatória;

e) Arbitramento dos conflitos entre as partes envolvidas com o serviço — Função Decisória.

28 O serviço público é executado pelo delegatário, embora em colaboração com o ente público, que zela pelo atendimento do interesse público.

29 As limitações impostas pelo agente regulador não caracterizam poder de polícia, pois não consistem em restrição a direito individual, mas em regulação de serviços cuja titularidade já é do próprio Poder Público concedente. Assim, o Estado não está restringindo a liberdade do particular, e sim definindo os limites em que fará a delegação de suas atribuições. Em outras palavras, a Agência Reguladora não exerce poder de polícia, mas apenas fiscalização do cumprimento do contrato de concessão).

30 Os conceitos de Regulação e Regulamentação não se confundem. Regulação é o conjunto de elementos que representam uma função quase Legislativa (produção de normas), sem ser o próprio Poder Legislativo; uma função executiva (execução da norma), sem ser o próprio Poder Executivo; e uma função decisória (solucionando conflitos de interesse), sem ser o próprio Poder Judiciário. Regulamentação é a edição de norma em caráter complementar, por ente político (ex: Decreto — art. 84 IV, CR/88).

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16DIREITO ADMINISTRATIVO

► Função NormativaDiante da complexidade dos serviços regulados pelas Agências, bem como da

necessidade de decisões rápidas e de uma gestão ágil, capaz de atuar de forma eficiente em setores competitivos, as Agências Reguladoras dispõem de autonomia para emitir regras técnicas, sem a necessidade de debates políticos que acabariam por inviabilizar o exercício da função regulatória.

No que tange à função normativa das Agências, muito se discute se não atentaria contra o princípio da legalidade (reserva legal). Todavia, diante da necessidade de agilidade na tomada de decisões pelas Agências reguladoras, emergiu nova leitura do referido princípio. Assim, passou-se a distinguir entre reserva legal absoluta (em que o Legislador deve esgotar o tratamento da norma, não havendo discricionariedade dos agentes públicos para complementar seu regime) e reserva legal relativa (em que há espaço para a discricionariedade do agente público que executará a norma)31.

Obs.: CONFLITO DE COMPETÊNCIA Havendo conflito de competência entre Estado, União ou Município, refletindo sobre a

competência normativa das próprias Agências Reguladoras, tal conflito será resolvido ora mediante exercício de Poder Hierárquico (quando envolver entidades da mesma esfera de Poder — ex: dentro do mesmo Estado), ora pelo próprio STF (quando envolver entidades de unidades distintas da Federação).

► Função Decisória

As Agências Reguladoras são ainda autorizadas por lei a dirimir as controvérsias ligadas ao serviço regulado (sejam elas envolvendo o Poder Público ou entre particulares). A função das Agências é arbitral32.

Não há vínculo hierárquico ou decisório entre as Agências Reguladoras e a Administração Direta. Assim, as Agências funcionam como última instância administrativa para julgamento dos recursos contra seus atos. Destarte, não é possível o controle administrativo pela via do recurso hierárquico, sendo as decisões das Agências Reguladoras insuscetíveis de revisão ou modificação por qualquer agente político33. Em outras palavras, não se admite o controle hierárquico das decisões das Agências Reguladoras, bem como não se admite o controle externo do mérito de suas decisões pelo Tribunal de Contas. Apenas se admite o controle Judicial, ainda assim dentro dos limites da legalidade.

Obs.: CABIMENTO DA ARBITRAGEM EM CONFLITOS ENVOLVENDO A PRÓPRIA AGÊNCIA

Discute-se sobre o cabimento da arbitragem, funcionando a Agência Reguladora como árbitro e sendo suas decisões insuscetíveis de recurso hierárquico, quando a própria Agência for

31 Barroso distingue ainda entre reserva legal formal (referente a atos que tenham de ser emanados do Poder Legislativo) e reserva legal material (relativa a atos normativos emanados do Poder Executivo, embora com força de Lei — ex: MP, Lei Delegada).

32 Há quem entenda ser inadmissível a arbitragem regulatória, pois esta se refere aos interesses da coletividade, que é afetada pelos conflitos entre os atores da relação regulatória. Não se confunde, assim, com a arbitragem comercial, que se refere a interesses disponíveis.

33 Todavia, segundo Barroso, essa regra deve ser entendida com temperamentos, de modo a preservar a competência decisória do Chefe do Executivo, sobretudo no que se refere à implantação de políticas públicas e diretrizes, pois a ele foi conferida a legitimidade para tomar tais decisões, através do eleição popular.

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17DIREITO ADMINISTRATIVO

parte no conflito. Prevalece o entendimento de que o uso da arbitragem não pode ser restringido34, sob pena de inviabilizar a atuação do ente regulador, retirando a segurança jurídica dos contratos e a agilidade na solução de conflitos (Diogo de Figueiredo). Ademais, todos os termos do contrato de concessão são de conhecimento do concessionário no momento da celebração do pacto, sendo que este, ao aceitar as normas do contrato, deve se submeter a todas elas, devendo ainda confiar na isenção e no critério técnico das decisões.

Por outro lado, vigorando no Brasil o princípio constitucional da inafastabilidade da jurisdição (art. 5.º XXXV, CR/88), não pode ser negado a ninguém o acesso ao Judiciário. No entanto, a doutrina predominante entende que o controle judicial às decisões das Agências deve ser restrito à forma e à legalidade, não atingindo o mérito (ressalvadas as posições de Luís Roberto Barroso e Diogo de Figueiredo35). Todavia, ainda para os que entendem que o mérito das decisões também pode ser objeto de controle judicial, este controle deve se restringir aos fundamentos constitucionais, não atingindo as decisões técnicas, sob pena de quebrar a segurança jurídica das relações regidas pelas Agências.

Por fim, cumpre ressaltar que as Agências Reguladoras não se prestam apenas à regulação de serviços públicos delegados a particulares, podendo também disciplinar atividades eminentemente privadas. Igualmente, a função reguladora do Estado não se dirige apenas aos serviços delegados, mas também aos prestados diretamente pelo Poder Público. Entretanto, com as privatizações, a separação entre o setor público e o setor privado tornou-se mais nítida, realçando o papel das Agências Reguladoras.

Obs.: AUTARQUIAS TERRITORIAIS

São os antigos Territórios, que atualmente foram convertidos em Estados.

II.1.7 – Fundações Públicas

A) Personalidade Jurídica

Discute-se se o artigo 5.º IV do Decreto-Lei 200/67, ao classificar a Fundação Pública como pessoa jurídica de direito privado, foi ou não recepcionado pela CR/88. Sobre a questão surgiram 3 correntes doutrinárias:

A primeira corrente (Hely Lopes Meirelles) sustente ser a Fundação Pública pessoa jurídica de direito público. Logo, segundo esta corrente o artigo 5.º IV do DL 200/67 não foi recepcionado pela CR/88, diante do art. 37 XIX da Carta Política36.

A segunda corrente (José dos Santos Carvalho Filho) defende que a Fundação Pública é pessoa jurídica de direito privado, tendo sido recepcionado pela CR/88 o art. 5.º IV do DL 200/67.

34 Exceto quando se tratar de direitos indisponíveis.

35 Segundo Luís Roberto Barroso e Diogo de Figueiredo, os princípios da razoabilidade, moralidade, isonomia e eficiência, sendo dotados de normatividade, são fundamento de validade de qualquer ato administrativo. , podendo autorizar até mesmo o controle judicial do mérito dos atos administrativos das Agências Reguladoras ou dos Entes da Administração Direta.

36 Segundo o professor Guilherme Peña, o melhor dispositivo para fundamentação dessa vertente é o art. 37 XIX da CR/88, pois o art. 37 II não seria adequado (vez que nas empresas públicas — pessoas jurídicas de direito privado — também há concurso público).

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18DIREITO ADMINISTRATIVO

Por fim, a terceira corrente (Di Pietro; Bandeira de Mello; Diógenes Gasparini; Marcos Juruena) entende que a Fundação Pública tanto pode ser pessoa jurídica de direito público quanto de direito privado, conforme disponha a Lei que autoriza sua criação pelo Poder Público. Em outras palavras, trata-se de faculdade do legislador. Esta corrente é a que prevalece atualmente.

B) Instituição, Organização e ExtinçãoQuando a Fundação Pública for criada como pessoa jurídica de direito público

(“fundação autárquica”), aplicam-se a ela todas as regras referentes às Autarquias, no que tange à instituição, organização e extinção.

Quando se tratar de pessoa jurídica de direito privado, será constituída não por lei, mas mediante autorização legal (editada a lei autorizadora, de iniciativa do Chefe do Executivo, é facultado a ele criar ou não a Fundação37), sendo feita na forma do direito privado, com o arquivamento dos atos constitutivos no órgão competente.

A organização é feita mediante ato administrativo (Decreto). Quanto à extinção, deve observar o princípio da simetria, sendo feita mediante autorização legal.

C) Regime Jurídico FuncionalAs Fundações Públicas de direito público submetem-se ao mesmo regime funcional

das Autarquias (pode ser estatutário ou celetista, conforme disponham suas normas de organização).

Quanto às Fundações Públicas de direito privado, o regime jurídico funcional deverá ser sempre o celetista, nos termos do artigo 1.º da Lei 9962/0038.

D) Patrimônio

O patrimônio das Fundações Públicas será sempre composto de bens públicos de uso especial (sejam elas de direito público ou de direito privado). Quanto aos bens imóveis, é necessário o registro no RGI.

E) Objeto

O objeto das Fundações Públicas é residual, sendo definido por exclusão (“qualquer atividade de interesse da coletividade que não seja típica de ente estatal — nesse caso será objeto de Autarquia — e que não tenha finalidade de lucro — nesse caso será objeto das empresas estatais).

37 Embora a lei autorizadora seja de iniciativa do Chefe do Executivo, há discricionariedade quanto à efetiva criação da Fundação, podendo ou não ser feita conforme a conveniência do administrador. 38 Prevalece o entendimento de que a Lei 9962/00 é nacional (aplicando-se a todo o território nacional, abrangendo Estados e Municípios, salvo quando Lei Estadual a afaste no âmbito do respectivo Estado — o Estado do RJ a afastou).

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19DIREITO ADMINISTRATIVO

Exemplo de Fundação Pública é a UERJ: o ensino superior não é atividade tipicamente estatal (só o ensino fundamental o é), e trata-se de instituição sem fim de lucro. Logo, é Fundação Pública.

F) FormaAs Fundações Públicas de direito público assumem a forma de Autarquia

(“fundações autárquicas”). Já as Fundações Públicas de Direito Privado têm a forma de fundações privadas nos termos da lei civil (artigo 24 CC/16; artigo 62 NCC).

G) Privilégios Fiscais e Processuais

As Fundações Públicas sempre gozam dos mesmos privilégios fiscais das Autarquias (quer sejam de direito público, quer de direito privado). Trata-se de imunidade recíproca.

Quanto aos privilégios processuais, apenas as Fundações Públicas de direito público os possuem (nos mesmos termos das Autarquias). As Fundações Públicas de direito privado não gozam de privilégios processuais39.

H) Justiça Competente

Nas demandas envolvendo Fundações Públicas de direito público, a regra quanto à Justiça competente é a mesma das Autarquias. Assim, será competente a Justiça comum Federal ou Estadual, conforme haja ou não interesse da União Federal.

No que tange às Fundações Públicas de direito privado, a Justiça competente será sempre a Justiça comum estadual (não há interesse da União nem mesmo se a Fundação for Federal, pois não integra a Fazenda Pública da União).

I) Responsabilidade Civil

A responsabilidade civil das Fundações Públicas será sempre igual à das Autarquias (objetiva).

J) Licitação

Quanto ao procedimento de licitação aplicam-se às Fundações Públicas as mesmas regras relativas às Autarquias.

II.1.8 – Empresas Públicas

A) Personalidade Jurídica

Será sempre de direito privado. As Empresas Públicas adquirem essa natureza porque se constituem nos moldes da legislação civil (arquivamento dos atos constitutivos junto ao Registro próprio (art. 77 § 2.º II CERJ c/c art. 5.º DL 200/67).

B) Instituição, Organização e Extinção

Quanto a esses aspectos, o regime das Empresas Públicas será sempre o mesmo das Fundações de direito privado, inclusive sob o mesmo fundamento (constituídas e extintas mediante autorização legal, e organizadas mediante Decreto).

C) Regime Jurídico Funcional

O regime do funcionalismo será sempre celetista. Todavia, o regime celetista na Administração Pública é mitigado em 3 pontos:

39 Entretanto, competência de foro pode ser prevista por Lei Estadual (ex: CODJERJ), sem que isso caracterize privilégio processual. Assim, o CODJERJ pode estabelecer foro específico (ex: as causas envolvendo Fundações Públicas são sempre da competência das Varas da Fazenda Pública).

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20DIREITO ADMINISTRATIVO

1) Os dissídios entre empregador e empregado são da competência da Justiça do Trabalho, e não da Vara da Fazenda Pública;2) O empregado público é equiparado ao servidor público para fins penais (art. 327 § 1.º CP);3) O empregado público é também equiparado ao servidor público para os fins do art. 2.º da Lei 8429/92 — improbidade administrativa40).

D) Patrimônio

Hely Lopes defende que os bens das Empresas Públicas são bens públicos de uso especial, pois em caso de extinção da Empresa, tais bens revertem em favor da Administração Direta, através do ente criador da Empresa.

A vertente predominante (Juruena, Carvalho Filho e Gasparini), porém, sustenta que tais bens são particulares, pois não têm a principal característica dos bens públicos: a impenhorabilidade. Logo, não se poderia dizer que são patrimônio público.

► EXECUÇÃO CONTRA EMPRESA PÚBLICA Os bens da Empresa Pública são privados, sendo em regra penhoráveis. No entanto, pelo

princípio da continuidade do serviço público, tais bens somente serão penhoráveis até o limite em que o ato de constrição não gere prejuízo ao serviço público.

Se a penhora dos bens da Empresa Público puder causar prejuízo ao serviço público por ela prestado, a execução não poderá ser feita dessa forma, respondendo subsidiariamente o ente criador.

Assim, a parcela do patrimônio da Empresa Pública cuja penhora não causar prejuízo ao serviço público será executada por quantia certa contra devedor solvente, nos termos do CPC. Porém, a parcela cuja penhora puder vir a causar prejuízo ao serviço público será considerada impenhorável, à luz do princípio da continuidade do serviço público, devendo ser executada em face do ente criador, segundo a regra da execução em face da Fazenda Pública (sistema de Precatórios).

Os débitos que o patrimônio da Empresa Pública não for suficiente para garantir também serão executados em face do ente criador, mediante o sistema de Precatórios.

Em resumo, pode-se dizer que só há execução mediante Precatórios em face de Empresa Pública se houver insolvência ou se houver risco de prejuízo ao serviço público.

E) Objeto

O objeto das Empresas Públicas será sempre a prestação de serviço público (art. 175 CR/88) ou a exploração de atividade econômica (art. 173 CR/88). Por isso são também chamadas “Empresas Públicas de Prestação de Serviço Público” e “Empresas Públicas de Intervenção no Domínio Econômico”.

► ARTIGO 173 DA CR/88 — FUNDAMENTO DAS PRIVATIZAÇÕES O artigo 173 da CR/88 é o grande fundamento da política de privatizações implantada

pelos últimos governos. Afinal, tal dispositivo exige, para a criação e manutenção de empresas estatais, a concorrência de certas condições (imperativo de segurança nacional ou relevante interesse coletivo, a serem definidos por lei). Tal regra deve ser sempre observada.

F) Forma

A forma das Empresas Públicas é livre, podendo ser civil ou mercantil. Porém, deve sempre limitar a responsabilidade do Estado pelos débitos da Empresa (logo, pode ser S/A e Ltda., mas não pode ser Em Nome Coletivo, pois esta espécie empresarial não limita a responsabilidade do sócio).

G) Privilégios Fiscais e Processuais

40 A Lei de Improbidade Administrativa contém conceitos ainda mais amplos do que os do CP, abrangendo até mesmo aqueles que não são agentes públicos, desde que tenham concorrido para o ato de improbidade.

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21DIREITO ADMINISTRATIVO

As Empresas Públicas não gozam de tais privilégios, pois deve ser observado o princípio da isonomia (como atuam no mercado de competição, não podem ter privilégios que as coloque em patamar diferenciado).

H) Justiça competente

Será competente para o julgamento das demandas em que forem parte Empresas Públicas o Juízo singular na Justiça Estadual ou Federal, conforme a Empresa Pública seja da União ou de outro ente federativo (vide art. 109, I, CR/88).

I) Licitação

Nas Empresas Públicas de Prestação de Serviço Público é obrigatória a observância da Licitação.

Quanto às Empresas Públicas de Intervenção no Domínio Econômico, ainda perdura divergência doutrinária, vez que a obrigatoriedade de licitação pode inviabilizar a atividade, tornando a Empresa ineficiente para a disputa em mercado de competição. Bandeira de Mello sustenta que a licitação é obrigatória, salvo quando sua observância causar comprometimento da atividade econômica. Jessé Torres, por sua vez, entende que as Empresas Públicas de Intervenção no Domínio Econômico não se sujeitam à Lei de Licitações (pois são regidas por leis41 específicas), submetendo-se porém aos princípios da Licitação previstos nas leis específicas que as regem (EC/19 c/c art. 22 XXVII, CR/88).

Obs.: No RJ, havia lei relativa às licitações em âmbito estadual. Marcos Juruena questiona sobre a validade de tal lei em face da edição posterior da Lei Federal 8666/93, à luz da norma do artigo 24 § 4.º da CR/88 (que determina que a lei federal geral posterior suspende a eficácia da lei estadual, no que lhe for contrária).

J) Responsabilidade Civil

As Empresas Públicas Prestadoras de Serviço Público submetem-se à responsabilidade civil objetiva, pela teoria do risco, em virtude da atividade que exercem (artigo 37 § 6.º da CR/88).

Já as Empresas Públicas de Intervenção no Domínio Econômico se submetem à teoria subjetiva (pois devem se submeter ao mesmo tipo de responsabilidade a que se submetem as empresas privadas, a fim de preservar sua competitividade, observando-se o princípio da isonomia).

II.1.9 – Sociedades de Economia Mista

São pessoas jurídicas de direito privado, conceituadas no artigo 5.º do DL 200/67, e guardando diversas semelhanças com as Empresas Públicas (as S.E.M e as E.P. são espécies do gênero “empresas estatais”).

São 3 as diferenças entre as Sociedades de Economia Mista e as Empresas Públicas: quanto à forma, quanto ao patrimônio e quanto à Justiça competente. Nos demais aspectos, seu regime jurídico é idêntico.

A) PERSONALIDADE JURÍDICA

De direito privado, assim como as Empresas Públicas, e também sob o mesmo fundamento.

41 A Lei deve ser em sentido estrito, não podendo ser, por exemplo, Decreto (a Petrobras tinha Decreto regulamentando suas licitações, e o STF afastou sua validade).

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22DIREITO ADMINISTRATIVO

B) INSTITUIÇÃO, ORGANIZAÇÃO E EXTINÇÃO

São feitas de forma idêntica à das Empresas Públicas.

C) REGIME JURÍDICO FUNCIONAL Idêntico ao das Empresas Públicas (CLT).

D) PATRIMÔNIO Aqui reside a primeira diferença entre as S.E.M. e as E.P..

Quanto à índole dos bens, aplica-se às Sociedades de Economia Mista o mesmo regime das Empresas Públicas (inclusive as mesmas divergências doutrinárias).

Porém, na Empresa Pública o capital pertence integralmente ao Poder Público (podendo ser uma única entidade — sociedade unipessoal — ou mais de uma — sociedade pluripessoal). Assim, todo o capital é público. Por outro lado, na Sociedade de Economia Mista o Poder Público possui apenas a maioria do capital com direito a voto (50% +1), mantendo o controle acionário, porém não possui todo o capital.

E) OBJETO Aplicam-se quanto ao objeto das S.E.M. as mesmas prescrições aplicáveis às E.P..

F) FORMA Quanto à forma as S.E.M também se distinguem das E.P..

Nas Sociedades de Economia Mista, a forma será sempre de S/A (a lei 10.303/01 — nova Lei das S/A — não fez qualquer alteração quanto a essa regra), valendo ainda o artigo 235 da Lei 6.404/76.

G) PRIVILÉGIOS FISCAIS E PROCESSUAIS As Sociedades de Economia Mista não os possuem, assim como as Empresas

Públicas, em virtude do princípio da isonomia.

H) JUSTIÇA COMPETENTE Será sempre competente para o julgamento das demandas envolvendo Sociedade

de Economia Mista a Justiça Estadual (Vara Cível, e não Vara da Fazenda Pública), ainda que sejam federais. As S.E.M. não foram incluídas no artigo 109, I, da CR/88, que só fez referência às Empresas Públicas.

A Ação só correrá perante a Justiça Federal se houver litisconsórcio com entidade que atraia o foro para a Justiça Federal (porém, nesse caso, a competência não terá nada a ver com o S.E.M.).

► MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO DE DIRETOR DE S.E.M. E E.P.

Se as estatais forem de prestação de serviço público, cabe MS. Porém, se se tratarem de estatais de intervenção no domínio econômico, há discussão quanto ao cabimento do mandamus.

A primeira corrente (Celso Agrícola Barbi) entende que não é cabível o remédio, por não se tratar de autoridade administrativa. Já a segunda corrente (Marcos Juruena) é pelo cabimento do

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remédio, por se tratar de autoridade administrativa (por se tratar de diretor de ente da Administração Indireta, exercendo parcela de poder público, sendo por lei considerado autoridade pública). Prevalece a segunda corrente (cabimento do MS).

► FALÊNCIA DA E.P. E DA S.E.M .

O artigo 242 da Lei 6404/76 (que vedava a falência da S.E.M.) foi revogado expressamente pela Lei 10303/01). Todavia, como não há outra norma a respeito da matéria, permanece a divergência doutrinária, com 3 correntes sobre o tema.

A primeira vertente (Juruena; Carvalho Filho) entende que as S.E.M. não se sujeitam à falência e, por analogia, as E.P. também não se sujeitam ao procedimento falimentar.

A segunda vertente (Gasparini; Tavares Borba) sustenta que podem falir tanto a E.P. quanto a S.E.M., pois o art. 242 da Lei 6404/76 não foi recepcionado pela CR/88 (à luz do art. 173 § 1º), e essa tendência foi reforçada agora, com a expressa revogação daquele dispositivo.

Por fim, a terceira corrente (Bandeira de Mello) entende que as estatais forem de atividade econômica, poderão falir. Se for E.P. de prestação de serviço público, pode falir (mas os bens afetos ao serviço público não são arrecadados, revertendo ao ente criador, que responderá subsidiariamente, pelo princípio da continuidade do serviço público). Se for S.E.M. prestadora de serviço público, não poderia falir (porém, com a revogação do art. 242, aplicar-se-lhe-ia a mesma regra das E.P. prestadoras de serviço público).

II.1.10 – Estudos sobre Empresa Pública e Sociedade de Economia Mista42

As Empresas Públicas (EP) e as Sociedades de Economia Mista (SEM) se submetem, quanto à sua existência, ao Direito Público. Quanto ao seu funcionamento, submetem-se parcialmente ao Direito Privado.

Só podem ser constituídas se houver lei reconhecendo a existência de relevante interesse coletivo ou imperativo de segurança nacional (art. 173, CR/88).

A definição das áreas de atuação é feita mediante Lei Complementar (art. 37, XIX, CR/88)43. São os casos excepcionais em que o Estado, abrindo mão de sua personalidade jurídica de Direito Público, se submete ao regime de Direito Privado, excepcionando o princípio da livre iniciativa.

Quanto à criação de SEM, Juruena entende que não há necessidade de licitação para a escolha do parceiro do Poder Público, pois não se trata de contrato administrativo (em que os interesses das partes são contrapostos), mas sim de convênio44 (em que os interesses são harmoniosos, convergindo para o mesmo objetivo, de modo a caracteriza affectio societatis). Logo, não se tratando de nenhum dos contratos previstos no artigo 37 XXI da CR/88, não há a necessidade de licitação (“a confiança e a identidade de objetivos não são licitáveis”). Não havendo critério objetivo para o julgamento de propostas (pois a confiança e a experiência são

42 Texto de Marcos Juruena, fornecido por Ronald Sharp.

43 A maior doutrina entende, à luz da redação do artigo 37 XIX da CR/88m que só será necessária Lei Complementar para a definição da área de atuação das Fundações Públicas. Marcos Juruena, entretanto, faz uma leitura distinta do dispositivo, entendendo que a Lei Complementar deve definir a área de atuação também para as EP e SEM, cabendo à Lei Ordinária tão somente a criação de Autarquia. Porém, há ainda muita controvérsia a respeito.

44 A distinção entre contratos e convênios é de Hely Lopes Meirelles, sendo seguida unanimemente pela doutrina.

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subjetivas), não pode haver licitação (ainda pesam controvérsias graves em relação a isso, com parte da doutrina entendendo ser necessária a licitação nos moldes clássicos).

Quanto ao funcionamento das empresas estatais, o regime é híbrido, não havendo predominância do regime público nem do privado. Por exemplo: Empresas Privadas têm liberdade para contratar; já as Empresas Públicas têm que fazer licitação (não obstante seja mediante procedimento mais simples do que o da Administração Direta, já que as estatais competem no mercado, necessitando maior agilidade). Pelo princípio da isonomia, as estatais não podem se submeter ao mesmo regime licitatório das Autarquias, pois tratam-se de entes diferentes, com campos de atuação diferentes45.

Embora haja de fato procedimento licitatório (em observância aos princípios da isonomia, eficiência, impessoalidade e economicidade), as estatais não celebram contratos administrativos (pois, atuando no mercado, não podem se utilizar de cláusulas exorbitantes), mas sim contratos privados. A licitação, portanto, é apenas para escolher o contratado46.

Quanto à admissão de pessoal, a posição atual é de que as estatais, qualquer que seja o seu objeto, têm que respeitar o concurso público (o que não afeta a competitividade nem a isonomia, e atende aos princípios da impessoalidade e da meritocracia). Mas o concurso é procedimento apenas para escolha de empregados. O regime dos empregados públicos é o celetista.

Quanto à natureza dos bens das estatais, há nova divergência doutrinária. Hely Lopes e Odete Medauar entendem que são bens públicos de administração especial. Juruena defende que, no momento em que saem da Administração Direta, passam a ser bens privados, embora continuem protegidos por Ação Popular e alienação mediante licitação.

Acordos entre acionistas são válidos, desde que não acarretem quebra do poder de controle do Estado. A alienação de ações que importe em transferência do controle da estatal exige lei autorizadora47, bem como licitação. Porém, se a alienação não resultar em transferência de controle, pode ser feita sem lei autorizadora e sem licitação.

A SEM é fruto de uma decisão política do Estado, ao admitir que não pode sozinho atender ao interesse público, buscando parceiros privados para a melhor e mais eficiente prestação do serviço público.

Juruena admite a cláusula arbitral em SEM, com fulcro no artigo 109 § 3.º da Lei das S/A.

Quanto aos benefícios fiscais, Juruena encampa tese de Flávio Willeman, no sentido de que são inadmissíveis até mesmo para as estatais prestadoras de serviços públicos (pois o serviço público é uma espécie de atividade econômica, sendo prestado sob regime de concorrência, não podendo haver tais benefícios, sob pena de quebra de isonomia).

45 Juruena entende, minoritariamente, que o artigo 119 da Lei 8666/93 era inconstitucional, com base no princípio da isonomia, por tratar de forma igual entidades desiguais. Porém, a EC 19 sanou o vício, prevendo regimes diferenciados de licitação (v. art. 173 § 1.º, CR/88). 46 Há ainda outros entendimentos a respeito da licitação nas estatais:A) Todas as estatais se submetem ao regime licitatório da Lei 8666/93, pois ainda não foi regulamentado o artigo 173 § 1.º da CR/88. B) Só as estatais exploradoras de atividade econômica se submetem ao regime especial de licitação, ficando as prestadoras de serviço público sujeitas à lei 8666/93 (Juruena critica essa corrente, entendendo que, como a CR/88 não faz distinção, não cabe ao intérprete fazê-lo).

47 Atualmente, prevalece o entendimento de que a lei autorizadora pode ser genérica, não precisando ser específica para cada caso (ex: política de privatizações).

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A responsabilidade subsidiária do Estado pelas obrigações das estatais, só ocorre após a liquidação do débito e quantificação do valor da responsabilidade do Estado, que pagará mediante precatórios. Caberá então ao Estado a decisão política de extinguir a estatal ou injetar mais capital para que ela sobreviva e continue sua atividade.

Para a extinção da estatal, observa-se o princípio da simetria. Assim como para a sua criação é necessária Lei48 em sentido estrito reconhecendo a existência dos requisitos constitucionais (imperativo de segurança nacional ou relevante interesse coletivo), para a extinção exige-se lei afastando tais requisitos.

Juruena entende que, não obstante a revogação do artigo 242 da Lei das S/A, as estatais não devem se sujeitar à falência (pois esta se presta a atender o interesse privado dos credores, ao passo que a continuação da atividade da estatal atende ao interesse público, de modo que a falência, sendo princípio processual de interesse privado, não pode prevalecer sobre o interesse público). Segundo ele , deve haver uma Lei (decisão política) quanto à atuação do Estado em caso de insolvência da estatal, podendo-se continuar a atividade se isso for do interesse coletivo. Portanto, Juruena manteve sua posição quanto à falência, apesar da revogação do artigo 242 da Lei 6404/76 pelo Novo Código Civil49.

Ainda quanto ao artigo 242 da Lei das S/A, discute-se sobre a penhorabilidade dos bens da SEM. Hely Lopes e Odete Medauar diziam que essa disposição era inconstitucional, porque tais bens são públicos, logo impenhoráveis. Segundo essa corrente, a revogação do artigo 242 significou o reconhecimento daquela inconstitucionalidade. Porém, ainda há grande controvérsia (o STF já declarou a constitucionalidade de Lei que autorizou a criação da EBCT, prevendo execução contra tal empresa por Precatórios, por serem impenhoráveis seus bens).

Segundo Juruena, a privatização é dever do Estado, decorrendo do princípio da livre iniciativa (art. 2.º, IV, CR/88), quando não estiverem presentes os requisitos constitucionais, sendo em tais casos inconstitucional a manutenção das estatais. Além disso, a privatização tem outro objetivo: reorganizar a intervenção do Estado na Economia.

II.2 – 2.º SETOR O 2.º setor da Administração Pública é constituído pelos delegatários de serviços

públicos.

II.2.1 – Conceito de Serviço PúblicoServiço Público é toda e qualquer atividade prestada direta ou indiretamente pelo

Estado por intermédio de pessoas políticas e pessoas administrativas (1.º Setor), como também por entidades delegatárias (2.º setor), sob regime jurídico próprio, para atender às necessidades sociais.

II.2.2 – Princípios Informativos do Serviço Públicoa) Generalidade

O serviço público deve destinar-se ao maior número possível de pessoas, sem discriminação entre os usuários.

b) Continuidade

48 Não pode ser ato administrativo nem decisão judicial, devendo ser lei em sentido estrito.

49 As divergências acerca do artigo 242 da Lei das S/A permanecem, nos mesmos termos, mesmo após a revogação do dispositivo, pois as várias correntes doutrinárias a respeito se baseavam em princípios, e não na mera leitura do artigo. Assim, todos os autores mantiveram suas posições anteriores, subsistindo a controvérsia.

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26DIREITO ADMINISTRATIVO

A execução do serviço público não pode sofrer solução de continuidade, devendo ser ininterrupta.

c) Modicidade

A prestação do serviço público deve ser custeada por valores módicos (pois o lucro não é a finalidade precípua da Administração Pública, podendo apenas decorrer da boa administração).

d) Eficiência

A execução do serviço público deve ter o menor dispêndio necessário e obter o maior ganho possível.

e) Cortesia

Deve sempre haver boa relação entre o prestador do serviço público e os usuários.

II.2.3 – Classificação dos Serviços Públicosa) Quanto aos destinatários

• Coletivos (uti universi) Os destinatários são usuários indeterminados, sendo imensurável a sua utilização

individual. Os usuários não têm direito subjetivo ao serviço.O custeio dos serviços públicos coletivos se dá mediante a cobrança de impostos (ex:

educação, segurança, saúde...)

• Individuais (uti singuli)

Os destinatários são determináveis, sendo possível mensurar sua utilização individual. Assim, os usuários que satisfazem as condições têm direito subjetivo ao serviço.

O custeio dos serviços públicos individuais se dá mediante a cobrança de taxa ou tarifa (o STF entende que se a prestação50 do serviço for obrigatória ao Estado o custeio é feito por taxa; se a prestação não for obrigatória ao Estado, sendo-lhe facultativa, o custeio será por tarifa — ex: transporte público).

b) Quanto à essencialidade

• Em sentido estrito (essenciais)

A execução é necessária à coletividade, assegurando a subsistência e o desenvolvimento de seus membros (ex: água e esgoto).

• De utilidade pública (não essenciais)

A execução não é necessária, mas sim conveniente para a coletividade, visando ao bem estar e conforto de seus membros (ex: estacionamento público).

► INTERRUPÇÃO DE SERVIÇO PÚBLICO ESSENCIAL POR INADIMPLEMENTO

Sobre a possibilidade de interrupção no fornecimento de serviço público essencial devido ao inadimplemento do usuário, duas correntes se formaram:

50 E não a tomada do serviço (ou seja, o enfoque sai do usuário e vai para o prestador). — entendimento mais moderno do STF.

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27DIREITO ADMINISTRATIVO

A 1.ª (PGE/RJ e Marcos Juruena) entende ser admissível a interrupção, nos termos do artigo 6.º § 3.º, II, da Lei 8987/95, desde que tenha havido prévia notificação extrajudicial do usuário.

A 2.ª (Plínio Martins, MP e STJ) entende ser inadmissível a interrupção, conforme a regra do artigo 22 do CDC. A interrupção fere o devido processo legal (pois a cobrança deveria ser feita pelos meios próprios — Execução ou Monitória), além de caracterizar autotutela51 não prevista em lei, logo ilegal. Por fim, trata-se de retrocesso nos direitos do consumidor, sendo vedado pela CR/88 (princípio da vedação do retrocesso).

c) Quanto à execução

• Próprios

Executados pela Administração Pública Direta (entes políticos), havendo superioridade do Poder Público em face do usuário (jus imperii).

• Impróprios

Podem ser executados pela Administração Indireta (entes administrativos) ou por delegatários, não havendo superioridade entre o prestador e o usuário.

Obs.: A delegação só é possível na execução indireta do serviço público (serviço público impróprio).

II.2.4 – Delegação do Serviço PúblicoSão 2 as formas de delegação do serviço público: concessão e permissão.

Há intensa divergência quanto à possibilidade de delegação mediante autorização. Uma vertente (Hely Lopes Meirelles) admite a autorização de serviço público, independentemente de licitação, entendendo que a Lei 8666/93 só se aplica à permissão e à concessão (art. 21, XI e XII, CR/88). A outra vertente (José dos Santos Carvalho Filho) não admite a autorização, sustentando que tal forma de delegação violaria o princípio licitatório e a própria moralidade administrativa (art. 25 § 2.º c/c art. 175 caput c/c art. 30, V, CR/88).

II.2.5 – Concessão de Serviço PúblicoCONCEITO

É o contrato administrativo pelo qual a Administração Pública Direta (concedente) transmite a prestação do serviço público, antecedida de licitação e precedida ou não de execução de obra pública, sob seu planejamento e controle, a pessoa jurídica ou consórcio de empresas (concessionário) que demonstre possuir condições técnicas para prestá-lo, por prazo determinado, por sua própria conta e risco, com remuneração paga pelos usuários.

ESPÉCIES Há 2 tipos de concessão:

a) Simples (O objeto contratual é uno — a prestação do serviço público);

b) Precedida de Obra Pública52 (o objeto contratual é dúplice — a obra e o serviço).

NATUREZA JURÍDICA

51 Não se confunde com o atributo da auto-executoriedade dos atos administrativos, pois esta só se verifica quando não há conflito de interesses (o que não é o caso).52 O contrato de Concessão de Serviço Público Precedido de Obra Pública não se confunde com o Contrato de Obra Pública (neste a remuneração se dá diretamente pelo contratante — a Administração Pública —, e não pelos usuários).

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28DIREITO ADMINISTRATIVO

Trata-se de contrato administrativo, distinguindo-se dos demais contratos da Administração Pública por conter cláusulas específicas: previsão expressa do objeto; definição da forma, modo, tempo e condição da prestação do serviço; previsão de direitos e deveres das partes (concedente, concessionário e consumidor); indicação da tarifa a ser cobrada.

Os objetivos de tais cláusulas específicas são: assegurar a prestação do serviço público adequado; preservar o equilíbrio econômico-financeiro; garantir a melhoria e ampliação do serviço público; assegurar o lucro do concessionário.

► QUESTÂO - É possível o financiamento do investimento do concessionário do serviço público mediante cobrança antecipada da tarifa aos usuários?

A posição da PGE, do TJ/RJ e de Diogo de Figueiredo é de que sim, devendo contudo haver 2 modificações contratuais: a tarifa deixará de ser contraprestação, adquirindo caráter de financiamento; o concessionário assumirá o caráter de gestor de recursos financeiros públicos, sujeitando-se à Lei de Responsabilidade Fiscal. (ex: a Via Lagos cobrou pedágio antes de realizar as obras na rodovia concedida).

LICITAÇÃO Na Concessão de Serviço Público, a licitação é sempre necessária (exigível). Na

concessão simples, a modalidade deve ser a concorrência (art. 14 Lei 8987/95).

No caso de privatização com simultânea concessão, aplica-se o artigo 27, I, da Lei 9074/95 c/c artigo 4.º § 3.º da Lei 9491/97: a concessão pode ser realizada mediante licitação na modalidade leilão.

No caso de privatização sem concessão53 (extinção da concessão quando da privatização), aplica-se o artigo 17, II, “c”, da Lei 8666/93: dispensa-se a licitação, podendo haver pregão na Bolsa de Valores.

RESPONSABILIDADE CIVIL Quanto aos serviços públicos, incide a responsabilidade objetiva, pela teoria do

risco, na forma do artigo 37 § 6.º in fine da CR/88.

O concedente responde subsidiariamente pelos danos causados a terceiros, desde que haja insolvência ou falência do concessionário.

Obs.: No caso de dano decorrente de falha ou inexistência de fiscalização do concedente (culpa in vigilando da Administração Direta), o concessionário responde integral e objetivamente perante o terceiro lesado, podendo regredir (com base na teoria subjetiva) contra o concedente, na proporção de sua culpa.

53 Empresa Pública concessionária de serviço público e autorizatária de uso de bem público (ex: CEDAE tem autorização para explorar o rio Guandu) = Se for privatizada com simultânea concessão de serviço público, extingue-se a relação jurídica de autorização de uso, constituindo-se de plano, pela continuidade do uso, uma nova relação jurídica, de direito privado, qual seja, a locação (o Poder Público receberá do concessionário alugueres, poderá propor despejo, etc.).

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29DIREITO ADMINISTRATIVO

PRAZO O prazo de duração do contrato de concessão é sempre determinado. Porém, varia

conforme o serviço concedido, de acordo com o valor do investimento e o grau de complexidade do serviço.

Doutrina e jurisprudência são unânimes em declarar que o artigo 57, II, da Lei 8666/93, não se aplica aos contratos de concessão de serviço público (ou seja, este contrato, conforme sua complexidade, ao contrário dos demais contratos administrativos, pode durar mais de 60 anos).

Em regra, a duração dos contratos de concessão é bastante longa, a fim de garantir o lucro do concessionário, mantendo a equação eocnômico-financeira, e ao mesmo tempo assegurar a modicidade da tarifa. Em outras palavras, para que o concessionário possa ser remunerado pelos pesados investimentos e ainda obtenha lucro, sem que se cobre usuários uma tarifa excessiva, é preciso que o contrato seja longo, diluindo os lucros do concessionário para que este possa cobrar tarifa módica.

EXTINÇÃO São 5 as modalidades de extinção do contrato de concessão de serviço público:

a) Reversão

- A causa da reversão é o advento do termo final do contrato.- Não há forma solene para essa espécie de extinção do contrato.- O efeito da reversão é a indenização prévia do concessionário, pelos bens afetos ao

serviço, que serão revertidos ao domínio público (salvo no caso de reversão onerosa54).

b) Anulação

- A causa da anulação é a existência de vício de legalidade (isto é, a verificação de ilegalidade no contrato).

- Quanto À forma, a anulação se dá mediante ato administrativo ou ato judicial (decisão em Ação).

- Não há indenização do concessionário.

c) Caducidade

- Decorre do inadimplemento do concessionário.

- Materializa-se sob a forma de ato administrativo do concedente.

- Quanto aos efeitos, gera indenização posterior dos danos emergentes suportados pelo concessionário.

d) Rescisão

- A causa é o inadimplemento do concedente.

- A única forma possível para a rescisão é de ato judicial em Ação própria55.

- O efeito é a indenização prévia do concessionário pelos danos emergentes e pelos lucros cessantes.

54 Reversão Onerosa = a tarifa é maior, para amortizar o valor da reversão antes do termo final do contrato.55 Não se admite a exceção do contrato não cumprido em face do Poder Público.

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30DIREITO ADMINISTRATIVO

e) Encampação

- A encampação decorre do interesse público, não havendo inadimplemento das partes.

- Opera-se sob a forma de Lei autorizativa.- O concessionário receberá indenização prévia apenas pelos danos emergentes, não

sendo indenizado pelos lucros cessantes.

II.2.6 – Permissão de Serviço Público

CONCEITO E NATUREZA JURÍDICA

Ato ou contrato administrativo pelo qual a Administração Pública Direta (“permitente”) transmite a prestação de serviço público, mediante licitação, sob seu controle e fiscalização, a pessoa natural ou jurídica (“permissionário”) que demonstre ter as condições técnicas exigidas, por prazo certo, e por sua conta e risco, remunerado pela tarifa paga pelos usuários, aplicando-se-lhes as normas pertinentes à concessão de serviço público.

A natureza jurídica da permissão de serviço público é controvertida. Segundo o artigo 40 da Lei 8987/95, seria contrato administrativo (negócio bilateral). Esse é o entendimento de Di Pietro. Por outro lado, há corrente em sentido contrário, entendendo tratar-se de ato administrativo (ato unilateral), com fundamento no artigo 120 da Lei 9472/9756 (Hely Lopes Meirelles). O STF e o STJ entendem que a natureza é de contrato administrativo.

MODALIDADES a) Simples

É a regra geral. A permissão simples tem 3 características:

• Unilateral — O Estado impõe seu conteúdo, por vontade unilateral, no uso da prerrogativa do jus imperii;

• Precária — Pode ser extinta a qualquer tempo, sem indenização;

• Discricionária — Cabe ao permitente escolher que serviços devem ser delegados. Todavia, não há discricionariedade na escolha do permissionário, sendo obrigatória a licitação.

b) Condicionada

É a exceção. Na permissão condicionada o permitente se autolimita, restringindo as cláusulas que lhe dão prerrogativas.

Nesse tipo de permissão, atribui-se direito ao permissionário, sobretudo o de receber indenização por extinção da permissão antes de determinado prazo.

II.2.7 - Diferenças entre Permissão e Concessão

Além da discussão quanto à natureza da permissão, que a diferencia da concessão, cuja natureza de contrato administrativo é pacífica, há outras distinções entre as espécies de delegação de serviço público.

56 O referido artigo refere-se a “termo”, donde se depreende que a natureza seria de ato.

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31DIREITO ADMINISTRATIVO

Quanto ao vulto econômico, a concessão é sempre superior à permissão. Os serviços que demandam maiores investimentos exigem também maior segurança jurídica e maior duração, sendo portanto objeto de concessão , e não de permissão.

Quanto ao delegatário, na concessão será pessoa jurídica ou consórcio de empresas. Já na permissão, pode ser pessoa jurídica ou natural.

Por fim, quanto à encampação, na concessão há o direito de indenização prévia (art. 37, Lei 8987/95). Na permissão, a indenização é posterior (art. 79 § 2.º, Lei 8666/93).

II.3 – 3.º SETOR

O 3.º Setor da Administração Pública é composto pelas entidades intermédias (entes de cooperação e entes de colaboração).

As entidades de cooperação são criados pelo próprio Estado. Os principais exemplos são os serviços sociais autônomos (ex: SENAC, SENAI, SEBRAE, SESI, SESC,...).

As entidades de colaboração, por outro lado, são criadas por particulares. Os principais exemplos são as organizações sociais (NOS, etc.).

II.3.1 – Serviço Social AutônomoA) Personalidade Jurídica

A personalidade jurídica dos serviços sociais autônomos é de direito privado, adquirida no momento do arquivamento dos atos constitutivos no Registro competente.

B) Instituição, Organização e Extinção

Nos mesmos moldes das Sociedades de Economia Mista e das Empresas Públicas.

C) Regime Jurídico FuncionalCeletista. Todavia, exige-se processo seletivo, embora este não chegue a configurar

concurso público.

D) PatrimônioFormado por bens particulares.

E) Objeto

O objeto dos serviços sociais autônomos será sempre atividade de interesse público, sem fim lucrativo (segundo Diogo de Figueiredo, o objeto será “interesse público não estatal”).

F) Forma A forma pode ser de Associação Civil ou de Fundação Privada, conforme a

conveniência da entidade.

G) Privilégios Fiscais e ProcessuaisNão têm, pois não compõem a Fazenda Pública.

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32DIREITO ADMINISTRATIVO

H) Justiça CompetenteSegundo a súmula 516/STF, a Justiça competente para processar e julgar as

demandas envolvendo serviços sociais autônomos á a Justiça Estadual (ainda que se trate de entidade federal).

I) LicitaçãoO artigo 1.º § único da Lei 8666/93 enumera as entidades que devem se submeter

ao procedimento licitatório.

Quanto aos serviços sociais autônomos, a União não exerce controle hierárquico, embora exerça controle funcional (controla o capital e o pessoal).

Daí surgem 2 correntes antagônicas: a) Há controle do Poder Público, devendo portanto submeter-se à licitação (Carvalho Filho); b) Não há controle por parte do Poder Público, pois não há hierarquia, logo não há o dever de observância do procedimento licitatório, embora os princípios da licitação57 devam ser observados (Di Pietro). O STF adota a 1.ª corrente, exigindo a licitação.

J) Responsabilidade CivilOs serviços sociais autônomos não se submetem à regra do artigo 37 § 6.º da

CR/88, pois não prestam serviço público, mas sim serviço de utilidade pública58. Assim, aplica-se-lhes a regra do Código Civil (responsabilidade subjetiva).

II.3.2 – Entidades de Colaboração

A) Personalidade Jurídica

Segue as mesmas regras da personalidade jurídica dos serviços sociais autônomos (personalidade jurídica de direito privado).

B) Instituição, Organização e Extinção

Todas as organizações sociais são instituídas, organizadas e extintas por particulares, nos moldes da Lei Civil, podendo vir a ser credenciadas junto ao Poder Público, através do Ministério encarregado da respectiva atividade, desde que satisfaçam as condições legais impostas para tanto.

Pode haver alteração dos atos constitutivos, a fim de permitir a satisfação das condições legais para o credenciamento.

C) Regime Jurídico Funcional

57 Impessoalidade, Isonomia, Legalidade, Moralidade, Publicidade, Probidade Administrativa, Julgamento Objetivo, etc. (vide art. 3.º, Lei 8666/93).

58 A doutrina distingue entre serviço público (em sentido estrito) e serviço de utilidade pública. Entende-se que a regra do artigo 37 § 6.º da CR/88 só se aplica ao serviço público em sentido estrito.

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33DIREITO ADMINISTRATIVO

O regime jurídico funcional das entidades de colaboração é o celetista. Porém, admite-se a cessão especial de pessoal por parte da entidade credenciadora (Administração Direta). Os encargos relativos aos funcionários, nesse caso, serão do Poder Público cedente.

D) PatrimônioComposto de bens particulares. Admite-se, contudo, a permissão especial de uso de

bens públicos.

E) ObjetoO mesmo dos serviços sociais autônomos (atividade privada de interesse público).

F) Forma

A forma segue a mesma regra dos serviços sociais autônomos.

G) Privilégios Fiscais e Processuais

Não têm, pois assim como os serviços sociais autônomos, não compõem a Fazenda Pública.

H) Justiça CompetenteÉ a Justiça Estadual (entendimento pacífico).

I) LicitaçãoA licitação é dispensável sendo permitida a contratação direta, nos termos do artigo

24, XXIV, da Lei 8666/93, e da Lei 9648.

J) Responsabilidade CivilAplica-se a mesma regra dos serviços sociais autônomos.

II.3.3 – Contratos de Gestão e Acordos de ProgramaSão os principais instrumentos utilizados pelas entidades intermédias.

Para a melhor compreensão do contrato de gestão e do acordo de programa, há que se recorrer ao quadro sinótico abaixo, sobre os PACTOS ADMINISTRATIVOS.

PACTO ADMINISTRATIV

O

CONTRATO ADMINISTRATIV

O

ACORDO ADMINISTRATIV

O

Convênio

Contrato de Gestão

Consórcio

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34DIREITO ADMINISTRATIVO

II.3.3.1 – Pacto AdministrativoPacto Administrativo é qualquer negócio consensual de que a Administração Pública

Participa. Trata-se de gênero, compreendendo 3 espécies: contrato administrativo, acordo administrativo e protocolo administrativo.

a) Contrato Administrativo (Lei 8987/95)

Ato administrativo bilateral, firmado por pessoa jurídica de Direito Público na qualidade de contratante, em que se verifica a existência de interesses contrapostos entre o contratante e o contratado, mediante troca de prestações.

b) Acordo Administrativo

Ato administrativo plurilateral, em que a pessoa jurídica de Direito Público figura como interessado, havendo interesses concorrentes entre as partes, com adição de prestações.

O acordo Administrativo se subdivide ainda em 4 espécies: • Consórcio = Acordo adminiatrativo firmado entre pessoas jurídicas de Direito Público de mesma espécie (ex: Estado X Estado ; Município X Município ; Autarquia X Autarquia ; etc.).

• Convênio = Acordo administrativo firmado entre pessoas jurídicas de Direito Público de espécies diferentes (ex: União X Estado), ou entre pessoa jurídica de Direito Público e pessoa jurídica de Direito Privado (ex: Estado X Empresa Privada), ou entre pessoa jurídica de Direito Público e pessoa natural (Município X Médico).

• Contrato de Gestão

• Acordo de Programa

c) Protocolo Administrativo

Ato administrativo preparatório que fixa as condições de um ato administrativo futuro, que lhe dará execução (ex: “Protocolo de Intenções” entre Estado e entidade privada).

II.3.3.2 – Contrato de Gestão (art. 37 § 8.º, initio, CR/88)

O contrato de gestão envolve atividade tipicamente estatal. Através dele há ampliação da autonomia gerencial, orçamentária e financeira (ex: DETRAN exerce atividade estatal, consistente no poder de polícia no trânsito. Por contrato de gestão, o Poder Público pode ampliar a autonomia do DETRAN para que exerça outras atividades, proporcionando maior eficiência).

Em geral o contrato de gestão incide sobre as entidades de cooperação (SESI, SENAC, etc.).

II.3.3.3 – Acordo de Programa (art. 37 § 8.º, in fine, CR/88)

O acordo de programa não se refere a atividades tipicamente estatais, mas sim a atividades sujeitas ao regime da livre iniciativa. Todavia, são atividades de interesse Estatal, para

PROTOCOLO ADMINISTRATIVO

Acordo de Programa

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35DIREITO ADMINISTRATIVO

o desenvolvimento econômico planejado. O acordo de programa consiste na transferência de recursos econômicos e humanos às entidades de colaboração, fixando-se metas de desempenho.

Trata-se de instituto típico das entidades de colaboração.III – ATOS ADMINISTRATIVOS

III.1 - CONCEITO

Ato administrativo é a exteriorização da função administrativa que, sob regime jurídico de Direito Público, objetiva a aquisição, conservação, modificação, transmissão ou extinção de direitos para a consecução do interesse público.

O conceito de Ato administrativo é firmado conforme critério objetivo, ou seja, quanto ao conteúdo do ato, não se confundindo com o de ato da Administração Pública (aferido conforme critério subjetivo, ou seja, quem pratica o ato). Assim, nem todo ato da Administração Pública é ato administrativo, pois o Poder Público também pratica atos de direito privado (ex: atos de comércio, contratos de direito civil, etc.).

► ATOS DE ADMINISTRAÇÃO ( FATOS ADMINISTRATIVOS )

São atividades materiais que produzem efeitos para a Administração Pública. Por exemplo: Na ação de Desapropriação, o decreto de Utilidade ou Necessidade Pública é ato administrativo, enquanto que a imissão provisória na posse é fato administrativo (ato de administração).

III.1.1 – Abuso de PoderSegundo doutrina de José Cretella Júnior, Abuso de Poder é gênero, com 2

espécies:

a) Desvio de Poder = Abuso qualitativo ligado a ato administrativo (exemplo: desapropriação por motivos pessoais, sem que haja interesse público).

b) Excesso de Poder = Abuso quantitativo ligado a fato administrativo (exemplo: decreto expropriatório legitimamente expedido, porém utilizando-se a Administração Pública de excesso de força policial quando da imissão provisória na posse).

III.2 – ELEMENTOS DO ATO ADMINISTRATIVO (requisitos)

São 5 os elementos dos atos administrativos: competência, motivo, forma, objeto e finalidade.

Todos os elementos do ato administrativo devem ser analisados à luz da função pública.

O fundamento legislativo da doutrina que elenca os elementos do ato administrativo é o artigo 2.º da Lei 4717/65.

III.2.1 – Competência59

Limite ou medida da função administrativa. Em outras palavras, é o ÂMBITO EM QUE O AGENTE ADMINISTRATIVO PODE EXPRESSAR A VONTADE DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA .

59 A doutrina adota maciçamente o termo “competência”. Porém, trata-se de termo atécnico, pois na verdade em âmbito administrativo não há competência, e sim atribuição (a competência se refere apenas à jurisdição).

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O fundamento da competência é em regra a lei. Porém, excepcionalmente a competência pode ser prescrita na CR/88 (ex: art. 84) ou em norma infralegal (ex: Resolução GPGJ n.º 1066/02 — regula a atuação do MP/RJ na Ação Civil Pública e no Inquérito Civil Público).

Os critérios para fixação de competência são os seguintes: material (quanto à especificidade da função); hierárquico (quanto ao grau de responsabilidade do agente público); temporal (quanto ao intervalo de tempo); espacial (quanto ao local do fato).

A competência administrativa possui 2 características fundamentais:

• Improrrogabilidade = Não se admite a prorrogação de competência em âmbito administrativo, ao contrário do que ocorre no Processo Civil. A competência administrativa não pode ser modificada pela vontade do particular, sendo sempre absoluta (não há em Direito Administrativo competência relativa).

• Inderrogabilidade = A competência não pode ser modificada pela vontade do agente público, exceto em 2 casos: avocação e delegação60.

III.2.2 – MotivoSituação de fato ou de direito que dá ensejo ao exercício da função administrativa.

► MOTIVO / MÓVEL / CAUSA

Motivo, como visto, é uma situação, fática ou jurídica, que justifica o exercício da função administrativa.

Causa é a relação de pertinência entre o motivo e o objeto do ato, tendo em vista um fim.

Móvel é o propósito do agente público que pratica o ato administrativo. Trata-se de critério subjetivo interno (“o que o moveu a praticar o ato”). O motivo é expresso no ato administrativo; o móvel não. Da mesma forma, o vício de motivo enseja anulação do ato, enquanto que o vício do móvel não.

► MOTIVAÇÃO

Motivo não se confunde com motivação. Esta é a expressão do motivo, isto é, a forma de manifestação do motivo.

A motivação compõe-se de 3 elementos: a) descrição do fato; b) descrição da norma; c) subsunção do fato à norma, demonstrando-se a relação entre eles.

Quanto ao momento, a motivação pode ser concomitante (motivação expressa no momento da prática do ato) ou sucessiva (manifestada após a prática do ato).

Quanto ao instrumento, pode ser contextual (expressa no mesmo instrumento do ato) ou aliundi (expressa em outro instrumento).

Quanto à exigidilidade da motivação, há 3 entendimentos diversos:

A) Maria Sylvia Zanella Di Pietro entende que a motivação é exigível em todos os atos administrativos (essa tese é criticada por não se adequar à sociedade e à economia modernas,

60 No MP e na Magistratura, o poder de avocação e de delegação é mitigado, em face dos princípios do Juiz Natural e do Promotor Natural (o artigo 5.º, LIII, da CR/88 estabelece não apenas o princípio do Juiz Natural, como também o princípio do Promotor Natural — “ninguém será processado por Promotor incompetente, nem julgado por Juiz incompetente”).

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que exigem agilidade nas decisões — ex: Semáforo e guardas de trânsito praticam atos administrativos, mas não motivam tais atos.)

B) Oswaldo Aranha Bandeira de Mello defende que a motivação seja necessária apenas nos atos vinculados (aqueles em que a lei prevê todos os elementos). Essa corrente é criticada porque não prevê a motivação dos atos discricionários (entende-se modernamente que estes atos precisam ainda mais da motivação, a fim de permitir o controle do ato).

C) José dos Santos Carvalho Filho sustenta que a motivação é exigível sempre que a lei a exigir, seja em atos vinculados, seja em atos discricionários (o comando legal exigindo a motivação é mais comum nos atos discricionários do que nos vinculados). — Tese majoritária.

III.2.2.1 – Teoria dos Motivos DeterminantesNos atos discricionários, se houver motivação, o agente público fica vinculado ao

motivo expresso, podendo o ato ser anulado por vício de motivo caso se comprove que o motivo expresso não existiu. Em outras palavras, “ os atos administrativos, quando tiverem sua prática motivada, ficam vinculados aos motivos expostos, para todos os efeitos jurídicos. Tais motivos é que determinam e justificam a realização do ato, e, por isso mesmo, deve haver perfeita correspondência entre eles e a realidade.(...) Havendo desconformidade entre os motivos determinantes e a realidade, o ato é inválido.” (Hely Lopes Meirelles).

Exemplo: Em concurso público, a regra é de que o critério da Banca Examinadora não seja passível de controle judicial, cabendo controle tão somente quanto à legalidade. Todavia, no concurso para AGU, a Banca Examinadora justifica suas notas. Assim, cabe o controle judicial dos critérios adotados, caso não se verifiquem os motivos alegados.

A teoria dos motivos determinantes permite o controle judicial dos atos discricionários, quando estes forem motivados.

Nos atos vinculados, a falta de correspondência entre os motivos alegados e a realidade também gera a invalidade. Todavia, nestes atos o motivo já é expresso em lei, bem como todos os elementos do ato administrativo.

III.2.3 – FormaA forma do ato administrativo é o modo de exteriorização da função administrativa.

Não se confunde com formalidade (modo pelo qual a forma é mainfestada).

Ao contrário do que ocorre no Direito Privado (em que vige o princípio da liberdade das formas, pois os interesses tutelados são privados), no Direito Público vige o princípio da Solenidade das Formas (pois tutela interesses públicos).

III.2.4 – ObjetoObjeto do ato administrativo é o fim imediato da função administrativa, isto é, o

resultado prático perseguido.

Os requisitos de validade do objeto do ato administrativo são: a) Possibilidade física e jurídica; b) Liceidade (conformidade com a ordem jurídica).

O ato administrativo não pode ter objeto absolutamente impossível (ou seja, não pode ser impossível para toda e qualquer pessoa). Não se verifica a invalidade do ato se o objeto for relativamente impossível (impossível para algumas pessoas, mas não para todas).

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III.2.5 – FinalidadeÉ o fim mediato do exercício da função administrativa. A finalidade do ato

administrativo é sempre o interesse público.

O ABUSO DE PODER é exatamente o vício da finalidade, manifestando-se sob duas formas já vistas (desvio ou excesso).

Obs.: ELEMENTOS / PRESSUPOSTOS Bandeira de Mello faz distinção ontológica entre pressupostos e elementos. Segundo ele,

pressuposto é o que se faz necessário à formação do ato administrativo. Assim, só haveriam 2 pressupostos do ato administrativo: objeto e forma (estes seriam portanto os mais importantes elementos, chamados “elementos mínimos” do ato administrativo).

Quanto aos elementos propriamente ditos, seriam os demais (competência, motivo e finalidade), necessários à validade do ato.

III.3 – ATRIBUTOS DO ATO ADMINISTRATIVO Os atos administrativos gozam de 4 atributos fundamentais: presunção de

legalidade e legitimidade; imperatividade; exigibilidade; auto-executoriedade.

Alguns atos administrativos não dispõem de alguns desses atributos, mas ainda assim mantêm o status de atos administrativos.

Exemplo: Atos Negociais (autorização, permissão, licença) = não gozam de imperatividade; Atos Heteroexecutórios61 (multa, expropriação) = não gozam de auto-executoriedade, devendo ser executados por outro órgão.

III.3.1 – Presunção de Legalidade e LegitimidadeTodo ato administrativo goza de presunção relativade legalidade (conformidade

com a ordem jurídica) e legitimidade (conformidade com o interesse público)62.

Essas presunções decorrem da exigência de celeridade e segurança das atividades do Poder Público. Com efeito, este não poderia ficar na dependência da solução de impugnações dos administrados quanto à legalidade e legitimidade dos seus atos, para só então dar-lhes execução.

Daí decorre a regra processual da inversão do ônus da prova em favor da Administração Pública. Da mesma forma, decorre desse atributo dos atos administrativos e regra de que o controle dos atos do Poder Público é em geral repressivo, e não preventivo.

III.3.2 – ImperatividadeOs atos administrativos são cogentes, isto é, independem da vontade do

administrado, impondo-se a ele, ainda que envolvam direito individual.

Enquanto que a presunção de legalidade e legitimidade opera no âmbito da validade do ato administrativo, a imperatividade se verifica quanto à sua eficácia.

III.3.3 – ExigibilidadeO ato administrativo deve ser cumprido pelos administrados, independentemente

de ordem judicial.

61 Doutrina de Diogo de Figueiredo.

62 Há doutrinadores que só se referem à presunção de legalidade, porém o mais correto é falar-se em presunção de legalidade e legitimidade.

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► IMPERATIVIDADE // EXIGIBILIDADE Pela imperatividade, a Administração Pública constitui unilateralmente uma obrigação para

o administrado.

Já pela exigibilidade há utilização de meios para o cumprimento voluntário, por parte do administrado, da obrigação constituída unilateralmente pela Administração Pública.

III.3.4 – Auto-executoriedadeO ato administrativo pode ser executado pela Administração Pública

independentemente de ordem judicial autorizando-a.

► AUTO-EXECUTORIEDADE // EXIGIBILIDADE A exigibilidade consiste no uso de meios de coerção sobre o administrado para que cumpra

voluntariamente63 a obrigação a ele imposta.

Na auto-executoriedade, o Poder Público usa meios de sub-rogação, isto é, invasão do patrimônio do executado para que este cumpre o ato mesmo que involuntariamente.

III.4 – CLASSIFICAÇÃO DOS ATOS ADMINISTRATIVOS III.4.1 – Quanto à formação da vontade da Administração Pública

a) Simples

A rigor é um só ato, praticado por um só órgão.

b) Composto

A rigor são 2 atos, praticados por 2 órgãos: o ato principal e o acessório (que tem o objetivo de dar eficácia ao ato principal). Exemplo: Parecer de Procurador do Estado — ato principal que só adquire eficácia após o ato acessório de aprovação pelo PGE.

c) Complexo

Trata-se de 1 ato, decorrendo da vontade contraposta de 2 ou mais órgãos (exemplo: Lei, que decorre da vontade contraposta do Congresso e do Presidente).

Obs.: PROCEDIMENTO Procedimento64 é composto de 3 ou mais atos encadeados, ordenados para a consecução

de um ato final (ex: procedimento judicial, legislativo, administrativo...).

Não se confunde com o ato complexo.

A importância prática da classificação dos atos administrativos é para a definição da autoridade coatora em caso de Mandado de Segurança.

63 Voluntariedade não se confunde com espontaneidade. O ato pode ser praticado voluntariamente sem ser espontâneo, quando o agente for coagido a fazê-lo.

64 Segundo Hely Lopes, Procedimento Administrativo “é a sucessão ordenada de operações que propiciam a formação de um ato final objetivado pela Administração. É o iter legal a ser percorrido pelos agentes públicos para a obtenção dos efeitos regulares de um ato administrativo principal”.

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Segundo Hely Lopes (corrente majoritária), no ato composto, autoridade coatora é a que pratica o ato principal; no ato complexo, é quem manifesta a última vontade; no procedimento, quem o preside.

Há ainda outra corrente, minoritária, capitaneada por Sérgio Ferraz (MP), no sentido de que, nos atos compostos e nos atos complexos, todas as autoridades que atuam são coatoras. Já no procedimento, o coator seria o órgão que o realizou, e não a autoridade que o presidiu (pois o pólo passivo será sempre o órgão, independentemente da autoridade coatora a ele vinculada).

III.4.2 – Quanto ao grau de Liberdade da Administração Pública

a) Vinculados

Nos atos vinculados, todos os elementos estão enumerados em norma legal, não havendo nenhum juízo de valor do agente público na prática do ato, cabendo-lhe apenas verificar se a situação de fato corresponde à situação de direito.

Estando presente todos os elementos do ato, há direito adquirido à prática deste (Súmula 15/STF).

O Poder Judiciário pode controlar a legalidade dos atos vinculados.

b) Discricionários

Nos atos discricionários, apenas os elementos “ competência ”, “ forma ” e “ finalidade ” estão enumerados na lei. Assim, há juízo de valor do agente público quanto ao objeto e ao motivo, valorando-se tais elementos de acordo com os critérios da conveniência e oportunidade. Esse juízo de valor é o MÉRITO ADMINISTRATIVO.

Mesmo estando presentes todos os elementos do ato discricionário, não há direito adquirido à prática do ato, pois ainda haverá o mérito administrativo (juízo de valor quanto à conveniência e oportunidade sobre o objeto e o motivo do ato).

A princípio, o Poder Judiciário não pode controlar diretamente o mérito do ato discricoinário (Súmula 16/STF), podendo controlá-lo apenas quanto à legalidade.

O mérito administrativo é verificado apenas nos atos discricionários. Os atos vinculados são analisados apenas sob a ótica da legalidade.

► MÉRITO ADMINISTRATIVO É o juízo de valor do agente público quanto à conveniência e oportunidade, sobre o objeto

e o motivo do ato administrativo discricionário.

► DISCRICIONARIEDADE TÉCNICA / POLÍTICO-ADMINISTRATIVA

Trata-se de doutrina de Diogo de Figueiredo, distinguindo entre a discricionariedade técnica e a discricionariedade político-administrativa.

A diferença entre essas espécies de discricionariedade é quanto ao critério usado pelo agente público para a prática do ato administrativo, variando conforme o critério usado seja técnico ou político-administrativo.

A discricionariedade da atividade normativa das Agências Reguladoras é técnica. Diogo de Figueiredo, apoiado por Marcos Juruena, diz que as normas editadas pelas Agências Reguladoras têm índole de Lei, quando o critério da discricionariedade for técnico (posição não pacífica, sendo questionada por parte da doutrina em face dos princípios da Soberania e da Separação dos Poderes).

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Quanto ao controle judicial da discricionariedade administrativa, prevalece o entendimento consagrado na Súmula 16/STF, no sentido de que não cabe o controle judicial do mérito administrativo.

Diogo de Figueiredo, minoritariamente, defende o controle do mérito administrativo, não de forma direta (quanto ao próprio juízo de valor), mas de forma indireta, ou seja, quanto aos limites em que o mérito é aplicado (ex: análise do princípio da razoabilidade, que limita o mérito).

Exemplos práticos :

• Indivíduo presta concurso para soldado da PM, sendo reprovado na prova física. Impetra MS objetivando invalidar o ato que o eliminou do concurso.

- O pedido é manifestamente improcedente (entendimento do TJ/RJ). A uma, porque o edital tem presunção de legalidade e legitimidade, e qualquer impugnação deve ser feita na via administrativa e previamente ao ato de inscrição (pois a inscrição pressupõe anuência do candidato com todos os termos do edital). A duas porque o ato de exclusão do candidato é ato administrativo, dotado de presunção de legalidade e legitimidade, cabendo ao impetrante o ônus da prova. Finalmente, porque o critério da Banca é mérito administrativo, não podendo ser controlado diretamente pelo Judiciário.

• Questão do MP — Indivíduo presta concurso para PM e é aprovado. Posteriormente, pratica ato incompatível com a função, sendo preso disciplinarmente e, além disso, licenciado e excluído da corporação a bem do serviço público pelo Conselho Disciplinar. Impetra MS objetivando sua reintegração sob os seguintes fundamentos: a) A competência para a exclusão é da Justiça Militar Estadual (art. 125 § 4.º CR/88), e não do Conselho Disciplinar; b) Descabe a aplicação de 2 sanções (prisão e exclusão), por caracterizar bis in idem; c) Houve desproporção entre a falta praticada e a sanção aplicada, cabendo punição mais branda.

- O pedido é improcedente, pelas seguintes razões: a) A competência é do Conselho Disciplinar, e não da Justiça Militar Estadual, pois não se trata de crime militar; b) Não há bis in idem, pois a prisão disciplinar não é sanção, e sim medida assecuratória dos fins da sanção a ser aplicada (semelhante à medida cautelar); c) A aferição da gravidade da infração é mérito administrativo, não podendo sofrer controle judicial.

• “Banda Podre da Polícia” — Exclusão de policiais que respondiam a processos administrativos disciplinares ainda não conclusos, mediante colocação em disponibilidade. O Governador do Estado emitiu 2 Decretos: o primeiro declarou a desnecessariedade dos cargos ocupados pelos policiais que respondiam a tais processos, e o segundo os colocou em disponibilidade.

- Cabe MS para anular tal ato do Governador do Estado, reintegrando os servidores, bem como indenização por danos materiais e morais.

Trata-se de abuso de poder por desvio de finalidade, pois o Governador utilizou o instituto da disponibilidade para exonerar servidores sem o contraditório.

Não se trata de mérito administrativo, porque o abuso de poder torna ilegal o ato. Logo, sendo ilegal, o controle judicial é exercido sobre a legalidade do ato (o que é sempre possível), e não sobre o mérito.

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42DIREITO ADMINISTRATIVO

Os danos material e moral são evidentes, pelo período em que o servidor ficou injustamente sem receber (dano material) e pela exposição de seu nome na mídia, como participante da “banda podre”, sem que estivesse concluído o processo disciplinar (dano moral).

• Edital de Concurso Público pode exigir idade ou sexo para o preenchimento dos cargos?

- Sim, desde que tal exigência seja adequada ao conteúdo ocupacional do cargo (ex: fixação de idade para o cargo de soldado da PM).

• Pode prever a realização de Exame Psicotécnico?

- Sim, desde que o teste seja fundamentado em critérios objetivos (científicos), possibilitando ampla defesa em caso de reprovação.

• Pode exigir experiência profissional?

- Sim, quando for razoável tal exigência em razão do cargo (ex: MP, Magistratura). Todavia, há divergência quanto ao momento em que deve ser aferida tal experiência. O TJ/RJ entende que o momento de aferição é o último dia do prazo de inscrição para o concurso. Já o STF entende que o momento correto para a aferição da experiência profissional é a data da posse (pois a experiência é requisito para o exercício do cargo, e não para a prova).

III.4.3 – Extinção dos Atos AdministrativosO ato administrativo pode ser extinto de forma normal ou de forma anormal,

conforme o quadro abaixo:

EXTINÇÃO DOS ATOS

ADMINISTRATIVOS

Normal

EXECUÇÃO MATERIAL

ADVENTO DO TERMO FINAL

IMPLEMENTO DA CONDIÇÃO RESOLUTIVA

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43DIREITO ADMINISTRATIVO

• ANULAÇÃO

Forma anormal de extinção do ato administrativo decorrente de ilegalidade (vício de legalidade). O ato já nasce ilegal.

Pode decorrer de ato da Administração ou de ato Judicial (Súmula 15/STF). A anulação é cabível tanto em atos vinculados quanto em atos discricionários.

• REVOGAÇÃO

Forma anormal de extinção do ato administrativo que decorre de juízo de conveniência e oportunidade do agente público.

A revogação decorre apenas de ato administrativo, jamais podendo decorrer de ato judicial (Súmula 16/STF).

A revogação só cabe nos atos discricionários.

Anormal

DESAPARECIMENTO DO

SUJEITO (morte,

DESAPARECIMENTO DO OBJETO

RENÚNCIA

RETIRADA

ANULAÇÃO

REVOGAÇÃO

CASSAÇÃO

CADUCIDADE

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44DIREITO ADMINISTRATIVO

• CASSAÇÃO

Forma anormal de extinção do ato administrativo pelo descumprimento de condições impostas para a subsistência do ato65. O ato nasce legal, extinguindo-se posteriormente pelo descumprimento de condição por parte do administrado.

A cassação só pode decorrer de ato administrativo, jamais de ato judicial.

• CADUCIDADE

Forma anormal de extinção do ato administrativo decorrente do advento de norma legal posterior à prática do ato, que o torne superveniente contrário à ordem jurídica (ilegal). Em outras palavras é a extinção do ato administrativo por ilegalidade superveniente.

A caducidade só pode decorrer de ato administrativo.

IV – LICITAÇÃOIV.1 – CONCEITO

Licitação é o procedimento administrativo voltado à escolha da proposta mais vantajosa para a contratação pretendida pelo Poder Público.

A licitação é procedimento prévio à celebração dos contratos administrativos (salvo as exceções legais), tendo como objetivo fundamental a escolha da melhor proposta, segundo critérios objetivos, no melhor interesse da coletividade. Deve, entretanto, resguardar os direitos dos proponentes, seguindo os princípios da licitação.

Os fundamentos normativos da Licitação são os seguintes:

- Art. 22, XXVII, CR/8866 (EC 19);

- Art. 37, XXI, CR/88;

- Art. 173 § 1,º, III, CR/88;

- Art. 175 CR/88;

- Lei 8666/93.

Obs.: LEI 8.666/93 Discute-se se a Lei 8666/93 é nacional (art. 22, XXVII, CF) ou federal.

A análise da natureza dos dispositivos desta lei deve ser feita individualmente (artigo por artigo).

É certo que o art. 17, I e II, é norma federal, não abrangendo os demais entes federativos (STF).

65 Ex: Questão da prova do MP —Sujeito recebe autorização para vender produtos artesanais na rua. Porém, começa a vender produtos industrializados. Trata-se de hipótese de cassação, pois o ato foi legal, e a revogação se deve ao descumprimento das suas condições por parte do administrado.

66 Neste dispositivo, a expressão “normas gerais” tem 2 características específicas: a) As normas gerais veiculam princípios, e não regras; b) As normas gerais têm aplicação uniforme em todo o território nacional. Apenas as normas que possuem essas características são consideradas gerais.

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45DIREITO ADMINISTRATIVO

► APLICABILIDADE DA LEI 8666/93 AOS CONCURSOS PÚBLICOS A doutrina e a jurisprudência entendem que as regras da Lei 8666/93 se aplicam por

analogia aos concursos públicos, embora esses não sejam procedimento preliminar para a celebração de contratos administrativos, mas sim requisitos para a investidura em cargo público.

IV.2 – REGIMES DE LICITAÇÃO

Após a EC 19, que codificou a redação do artigo 22, XXVII, da CR/88, são 2 os regimes de Licitação existentes no ordenamento jurídico pátrio.

A Administração Direta, autárquica e fundacional seguirá regime licitatório único, previsto em lei própria do respectivo ente político67 (para os entes políticos que não tiverem leis próprias sobre licitação, aplica-se a Lei 8666/93).

Quanto às Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista, o art. 173 § 1º, III, da CF prevê a edição de estatuto geral, podendo cada uma delas ter seu regulamento próprio de licitação, observados os princípios gerais da licitação previstos na Lei 8666/93.

Na falta de Lei específica, são 3 as vertentes doutrinárias:

▪ 1ª Corrente (Di Pietro; Juruena) = Não se sujeitam à Lei nº 8.666/93. Logo, podem elaborar seus regulamentos individuais observando apenas os princípios constitucionais.

▪ 2ª Corrente (TCU; Jessé Torres) = Sujeitam-se à Lei nº 8.666/93, até que seja editado o estatuto exigido pela CF. Podem, portanto, elaborar seus estatutos individuais, porém sempre observando as regras gerais da Lei nº 8.666/93 (que não podem ser descumpridas).

▪ 3ª Corrente (Bandeira de Mello) = Apenas as prestadoras de serviço público sujeitam-se à Lei nº 8.666/93, devendo elaborar seus estatutos de acordo com as normas gerais traçadas na lei geral. Já as exploradoras de atividade econômica não se sujeitam à Lei nº 8.666/93, podendo elaborar seus estatutos apenas em observância dos princípios constitucionais.

Obs.: Dentro da 3ª Corrente (minoritária), surge ainda outro questionamento: as estatais exploradoras de atividade econômica estão dispensadas de obedecer a lei n 8.666/93 quanto às atividades-meio, ou apenas quanto às atividades-fim ? Há divergência.

IV.3 – DESTINATÁRIOS DA LICITAÇÃO São os seguintes os órgãos que se subordinam à Lei 8666/93:

a) Administração Pública Federal Direta, Autárquica e Fundacional;

b) Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista (sempre devem licitar, a despeito da discussão acima);

c) Entidades controladas direta ou indiretamente pela União Federal68.

67 Cada ente político (Estado, Município, União) deve ter sua Lei própria de Licitação, aplicável à Administração Direta, às Autarquias e Fundações Públicas. Aqueles que não tiverem Lei própria se submetem à Lei 8666/93.

68 Vide, a respeito, as anotações quanto à discussão doutrinária acerca da aplicabilidade da Lei 8666/93 aos serviços sociais autônomos.

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46DIREITO ADMINISTRATIVO

IV.4 – PRINCÍPIOS DA LICITAÇÃO A referência legal aos princípios da licitação encontra-se no artigo 3.º da Lei

8666/93. Estes princípios se dividem em básicos (os enumerados expressamente na lei) e correlatos (acrescentados pela doutrina).

IV.4.1 – LegalidadeSegundo este princípio, a licitação se subordina à norma legal, de modo que a

atividade administrativa ligada à licitação é limitada pela estrita legalidade69.

A verificação de qualquer ilegalidade no procedimento licitatório gera sua NULIDADE, e também a nulidade do contrato administrativo dele decorrente, nos termos do artigo 49 caput e § 2.º, Lei 8666/93.

Obs.: Verificada fraude na licitação em favor de determinado concorrente, sem que este seja vencedor, não deve ser anulado o procedimento licitatório, pois não houve prejuízo (a nulidade só se verifica quando há efetivo prejuízo).

IV.4.2 – ImpessoalidadeNão se admite, na licitação, o favorecimento pessoal.

IV.4.3 – MoralidadeO procedimento licitatório é dirigido pelos interesses finalísticos da Administração

Pública. Qualquer ato imoral, além de anular o procedimento, imputa responsabilidade administrativa do agente.

IV.4.4 – IsonomiaA Administração Pública deve zelar pela igualdade de condições entre os licitantes,

não podendo conceder benefício individual ou impor ônus que desequilibrem a disputa.

► EDITAL COM PREVISÃO DE RESERVA DE MERCADO Discute-se sobre a legalidade de editais de licitação que prevêem reserva de mercado,

com base no artigo 179 da CR/88 (ex: 10% do objeto do contrato reservado às microempresas). Trata-se de cláusula ilegal, eivando de NULIDADE o edital, pois a CR/88 não previu

reserva de mercado em favor das microempresas, que devem concorrer no mercado em igualdade de condições. A única facilidade concedida é a simplificação das obrigações das microempresas (ex: obrigações previdenciárias, tributárias,etc.).

► EDITAL PREVENDO CRITÉRIO TERRITORIAL PARA DESEMPATE É ilegal o edital que prevê que, em caso de empate, o critério de desempate será territorial

(ex: em caso de empate, será vitoriosa empresa sediada no território Estado licitante, onde recolherá ICMS). Tal cláusula viola o princípio da isonomia, pois o desempate não pode seguir critério externo, devendo ser sempre por sorteio (vide art. 3.º § 1.º, I, Lei 8666/93).

69 A legalidade se apresenta de forma distinta para os particulares e para o Poder Público. Com efeito, no direito público o princípio da legalidade impõe que “o agente público apenas pode agir de acordo e na forma da lei”. Já no direito privado, a legalidade significa que “tudo o que não for proibido é permitido”.

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47DIREITO ADMINISTRATIVO

IV.4.5 – PublicidadeO procedimento licitatório deve ser o mais público possível.

• Art. 43 § 1.º = A abertura dos envelopes é feita em público, bem como o anúncio do resultado. Porém, a análise das propostas e dos documentos é sigilosa.

• Art. 21 § 1.º = Não é obrigatória a publicação integral do edital, bastando que seja publicado resumo.

• Art. 23 § 4.º = É facultada a adoção de forma com maios publicidade, ainda que não haja previsão legal. Porém, é peremptoriamente vedada a adoção de forma menos pública do que a prevista.

• Art. 39 = Nas licitações de enorme vulto, além do edital exige-se a realização de Audiência Especial.

• Art. 41 § 1.º = Cabe impugnação prévia ao edital (regra aplicável, por analogia, também aos concursos públicos).

IV.4.6 – Probidade AdministrativaOs gentes públicos envolvidos com o procedimento licitatório devem agir com

honestidade. As penas para o agente que pratica atos de improbidade administrativa estão previstas no artigo 37 § 4.º da CR/88.

IV.4.7 – Vinculação ao Instrumento Convocatório“O EDITAL É A LEI DO CERTAME .” (Hely Lopes Meirelles). O edital vincula tanto o

Poder Público quanto os proponentes (v. art. 41).

Verificando-se no decorrer do certame a inconveniência ou inviabilidade do edital, o Poder Público não pode alterá-lo, devendo invalidá-lo e reabrir o procedimento em novos termos.

• Art. 41 caput = O edital é inalterável, salvo erro material, e desde que não afete as propostas70.

• Art. 48 § único = O proponente que não obedecer o edital será desclassificado.

IV.4.8 – Julgamento ObjetivoOs critérios para julgamento das propostas devem ser objetivos, sendo vedada a

adoção de critérios subjetivos.• Art. 44 § 3.º = É impossível o oferecimento de vantagem ou desvantagem.

IV.4.9 – Princípios Correlatosa) Procedimento Formal (art. 4.º)

O procedimento licitatório deve seguir rigorosamente suas fases, conforme a ordem legalmente prevista, sob pena de nulidade.

b) Sigilo na Apresentação das Propostas (art. 94)

70 Aplicando-se essa regra, por analogia, aos Concursos Públicos, é questionável a validade do Concurso para PGE de 2003, pois foi alterado o edital mediante aumento da nota mínima para aprovação e diminuição do número de vagas.

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48DIREITO ADMINISTRATIVO

O conteúdo das propostas é inviolável, sendo absolutamente sigiloso. O PREGÃO (nova modalidade de licitação) mitiga este princípio, pois prevê o oferecimento das propostas oralmente.

A abertura da documentação ou das propostas, ou a revelação de seu conteúdo antecipadamente, além de ensejar a anulação do procedimento, constitui ilícito penal (art. 94).

c) Competitividade (art. 90)

Qualquer ato que atente contra o princípio da competitividade torna o procedimento nulo.

IV.5 – CONTRATAÇÃO DIRETA Ocorre a contratação direta quando o contrato é celebrado sem a realização de

procedimento licitatório. São hipóteses de contratação direta: a licitação dispensada; a licitação dispensável; e a licitação inexigível.

IV.5.1 – Licitação DispensadaLicitação dispensada é a proibida por lei. As hipóteses estão previstas no artigo

17 da Lei 8.666/93.

Obs.: O Art. 17, I, “b”, da Lei 8666/93 está com a eficácia suspensa por decisão do STF. O entendimento do Pretório Excelso é de que a expressão “...qualquer esfera de governo...” caracteriza exacerbação da competência legislativa da União (pois esta só pode legislar sobre normas gerais de licitação, e ao utilizar tal expressão, criou norma específica, aplicável até mesmo às outras esferas de governo — Estados e Municípios —, o que é vedado pela CR/88).

IV.5.2 – Licitação DispensávelLicitação dispensável é a materialmente possível, porém dispensada por lei.

O ato de dispensa é discricionário, só sendo cabível nos casos expressamente enumerados no artigo 24 da Lei 8666/93.

► LICITAÇÃO DESERTA / LICITAÇÃO FRUSTRADA São conceitos semelhantes, ambos tornando a licitação dispensável, nos termos do artigo

24, porém não se confundem.

Licitação deserta é aquela em que não houve nenhum proponente, sendo impossível a repetição do procedimento sem prejuízo para o Poder Público (art. 24, V, Lei 8666/93).

Licitação frustrada (ou fracassada), por outro lado, é aquela em que houve proponentes, porém todos foram julgados como inabilitados, ou tiveram suas propostas desclassificadas (art. 24, VII, Lei 8666/93). Nesse caso, a Administração Pública tem a faculdade de abrir prazo de 8 dias para o oferecimento de novas propostas, sob penas de, não sendo oferecidas, ou sendo novamente rejeitadas, haver contratação direta.

IV.5.3 – Licitação InexigívelInexigível é a licitação materialmente impossível, ou seja, aquela em que a

competição é inviável (art. 25, lei 8666/93). O ato administrativo que declara a inexigibilidade da licitação é vinculado, pois não existe outra opção. O rol do artigo 25 da Lei 8666/93 é exemplificativo, podendo haver outras hipóteses de inexigibilidade.

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49DIREITO ADMINISTRATIVO

► “EXCLUSIVIDADE ” (art. 25, I)

O inciso I do artigo 25 alude a “exclusividade”. A doutrina discute em que âmbito deve ser aferida tal exclusividade, para os fins de inexigibilidade da licitação (estadual, municipal, nacional). A tese que prevalece é de que depende da modalidade de licitação.

Assim, em se tratando de concorrência (modalidade adequada a licitações de grande vulto), a exclusividade deve ser aferida em todo o território nacional.

Em se tratando de tomada de preço (médio vulto), o critério será o cadastro do ente licitante.

Se se tratar de convite (pequeno vulto), a exclusividade é aferida no âmbito da praça licitante.

Por fim, no caso de licitação internacional, a exclusividade é medida no âmbito da região comercial brasileira.

Obs.: “SERVIÇOS TÉCNICOS PROFISSIONAIS ESPECIALIZADOS ” (art. 25, II)

Para a caracterização da hipótese de inexigibilidade de licitação prevista no inciso II do art. 25, é preciso que a licitação se refira a atividade que exija conhecimentos técnicos ou práticos maiores do que os exigíveis àqueles que possuem habilitação legal. Também é necessário que haja reconhecimento público da capacidade do profissional contratado. (ex: a Administração Pública deseja contratar os serviços de advocacia de Sérgio Bermudes).

Obs.: ATIVIDADE PUBLICITÁRIA Entende-se que para serviços de publicidade é sempre exigível a licitação (pois tratam de

atividade decorrente da criatividade humana, de modo que é sempre possível a competição).

IV.6 – MODALIDADES DE LICITAÇÃO São 6 as modalidades de licitação previstas em lei: Concorrência; Tomada de

Preços; Convite; Concurso; Leilão; Pregão.

IV.6.1 – Concorrência

• VULTO ECONÔMICO = grande vulto.

• PARTICIPAÇÃO = qualquer interessado, ainda que não cadastrado.

• INSTRUMENTO CONVOCATÓRIO = edital.

• PRAZO MÍNIMO = 45 dias a 30 dias.

• HABILITAÇÃO = feita em fase específica do procedimento.

IV.6.2 – Tomada de Preços

• VULTO ECONÔMICO = médio vulto.

• PARTICIPAÇÃO = interessados cadastrados e cadastráveis (aqueles que satisfazem as condições mínimas para a obtenção de cadastro até 3 dias antes do fim do prazo para a apresentação das propostas).

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50DIREITO ADMINISTRATIVO

• INSTRUMENTO CONVOCATÓRIO = edital.

• PRAZO MÍNIMO = 30 dias a 15 dias.

• HABILITAÇÃO = decorre do próprio cadastro (não há fase específica.

IV.6.3 – Convite

• VULTO ECONÔMICO = pequeno vulto.

• PARTICIPAÇÃO = convidados (cadastrados ou não) e cadastrados (estes deverão manifestar a vontade de concorrer até 1 dia antes do fim do prazo de apresentação das propostas)71.

• INSTRUMENTO CONVOCATÓRIO = Carta-Convite.

• PRAZO MÍNIMO = 5 dias.

• HABILITAÇÃO = Presumida (quanto aos convidados); e decorrente do cadastro (para os cadastráveis).

IV.6.4 – Concurso72

Modalidade adequada à escolha de projeto artístico, técnico ou cultural. Há previsão de remuneração ou prêmio ao vencedor.

IV.6.5 – LeilãoAdequada à alienação de bens móveis e imóveis desafetados (imprestáveis à

Administração Pública).

IV.6.6 – PregãoPregão é a nova modalidade de licitação, criada pela MP 2108/01, tendo sido

convertida em lei, através da Lei 10520/02. Aplica-se a todos os entes políticos (a Lei 10520/02 é Lei nacional, e não lei federal).

Trata-se de modalidade de licitação adequada à contratação de serviços comuns e à aquisição de bens comuns, independentemente do valor estimado para o objeto do contrato, mediante oferecimento de lances ou propostas verbais em sessão pública.

O pregão de certa forma mitiga o princípio do sigilo na apresentação das propostas, pois na 2.ª fase do procedimento estas são apresentadas verbalmente.

São 7 as principais diferenças entre o pregão e as demais modalidades de licitação:

• Valor estimado do objeto do contrato = é irrelevante (art. 1.º).

• Direção do procedimento licitatório = cabe ao pregoeiro (que recebe, julga e classifica as propostas), e não à Comissão de Licitação (como ocorre nas outras modalidades) — art. 3.º, IV.

• Instrumento Convocatório = admite-se o meio eletrônico (internet) — art. 4.º, I.

71 Bandeira de Mello, em posição isolada, entende que os cadastráveis também podem participar dessa modalidade de licitação.

72 Não se confunde com o concurso público, pois este é requisito de investidura em cargo público, ao passo que aquela é modalidade de licitação.

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51DIREITO ADMINISTRATIVO

• Proposta = na 1.ª fase do procedimento, são apresentadas de forma escrita e sigilosa; na 2.ª fase, só participam os autores das melhores propostas, havendo oralidade nos lances — art. 4.º, VIII.

• Critério de julgamento e classificação = exclusivamente o menor preço (único caso) — art.4.º, X.

• Habilitação = é posterior ao julgamento e classificação (ao contrário das outras modalidades)— art. 4.º, XII.

• Homologação e adjudicação = a adjudicação ocorre antes da homologação73 — art. 4.º, XXI e XXII.

IV.7 – TIPOS DE LICITAÇÃO Não se confundem com as modalidades de licitação, pois se referem ao critério de

julgamento e classificação das propostas. São 4: menor preço; melhor técnica; preço e técnica; maior lance.

IV.7.1 – Menor PreçoO único critério é a vantagem econômica auferida pela Administração Pública.

Assim, só há 1 único envelope, relativo aos preços, sendo declarado vencedor aquele que apresentar o menor preço.

Esse critério só se aplica à modalidade PREGÃO .

IV.7.2 – Melhor técnicaO critério é a perfeição do objeto do contrato, porém sem deixar de levar em conta

o preço.

Será proclamado vencedor aquele que apresentar a melhor técnica e o menor preço. Se a melhor técnica não corresponder ao menor preço, o proponente tem a oportunidade de reduzir seu preço para ser o vencedor. Não aceitando diminuir o preço, a opção passa para o proponente de 2.ª melhor técnica, e assim sucessivamente, até que a melhor técnica e o menor preço coincidam, proclamando-se o vencedor.

IV.7.3 – Técnica e preçoConjugam-se os dois critérios (melhor técnica e menor preço). Assim, há 2

envelopes (um relativo à técnica e o outro relativo ao preço), sendo vencedor aquele que obtiver a melhor média ponderada entre técnica e preço.

IV.7.4 – Maior lanceTrata-se do tipo de licitação aplicável às alienações, sendo o critério o do maior

valor oferecido.

O critério do maior lance só se aplica à modalidade LEILÃO .

73 Quanto aos outros procedimentos, ainda pesam divergências sobre a ordem da homologação e da adjudicação. Prevalece o entendimento de que a homologação ocorre antes da adjudicação, mas ainda não é pacífica essa tese.

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52DIREITO ADMINISTRATIVO

IV.8 – PROCEDIMENTO O procedimento licitatório se divide em 2 grandes fases, cada qual subdividida

em etapas definidas, sem que essas Fases se limitam pelo ato de Publicação do Edital. São elas: a Fase Interna e a Fase Externa.

A FASE INTERNA é anterior à publicação do Instrumento Convocatório. Em outras palavras, ocorre enquanto apenas o Poder Público tem ciência do procedimento, não havendo ciência da licitação aos eventuais interessados74.

• Requisição do objeto

• Estimativa do Valor

• Autorização da Despesa

• FASE INTERNA • Elaboração do Instrumento Convocatório75

• Análise Jurídica (a cargo da Procuradoria)

• Publicação

• Instrumento Convocatório Publicado

• Habilitação dos Proponentes

• FASE EXTERNA • Julgamento e Classificação das Propostas

• Homologação (atestado de idoneidade do procedimento)

• Adjudicação76

Obs.: Vitória em procedimento licitatório, assim como aprovação em concurso público, não gera direito adquirido ao contrato, mas mera expectativa de direito. O direito adquirido se refere apenas à preferência na celebração do contrato, de modo que, se for desrespeitada a classificação, o preterido poderá reivindicar a contratação.

V – CONTRATOS ADMINISTRATIVOS

V.1 - CONCEITO Contratos administrativos são atos administrativos bilaterais em que a

Administração Pública figura como contratante, tendo por fim a consecução de interesses contrapostos mediante a troca de prestações.

74 Nessa fase, a participação da Procuradoria (PGE, PGM) é fundamental.75

Ou contratação direta, se for o caso.

76 Prevalece a corrente segundo a qual, pelo artigo 46 § 3.º da Lei 8666/93, a homologação do procedimento ocorre antes da adjudicação (Bandeira de Mello, Juruena). Há, porém, outra corrente (Hely Lopes, Gasparini), no sentido de que a adjudicação vem antes da homologação (art. 38, VII, Lei 8666/93).

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53DIREITO ADMINISTRATIVO

Contrato Administrativo é espécie do gênero “Pacto Administrativo”. Não se confunde com o contrato de gestão (art. 37 § 8.º CR/8877), que não é contrato, e sim acordo administrativo.

► CONTRATOS DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA Gênero de que são espécie os contratos administrativos (sujeitos ao regime de direito

público, tendo a Administração Pública prerrogativas que a colocam em posição de supremacia em relação ao contratado, tais com as cláusulas exorbitantes) e os contratos privados da Administração Pública (sujeitos ao regime de direito privado, estando as partes no mesmo nível ex: locações, etc.).

V.2 – REGIME JURÍDICO DOS CONTRATOS ADMINISTRATIVOS

O regime jurídico a que se sujeitam os contratos administrativos é formado, segundo ensinamento de Maria Sylvia Di Pietro, por prerrogativas (cláusulas exorbitantes ) e sujeições (equação econômico-financeira).

Os contratos administrativos têm 2 tipos de cláusulas: as cláusulas regulamentares (que fixam o objeto do contrato e as condições para que seja executado) e as econômicas (que cuidam da equação econômico-financeira, estipulando os investimentos necessários, o valor da tarifa a ser cobrada, etc.). Apenas as cláusulas regulamentares podem ser modificadas unilateralmente pela Administração Pública (ainda assim, desde que observem a equação econômico-financeira). As cláusulas econômicas não pode sem alteradas unilateralmente.

V.2.1 – Cláusulas ExorbitantesCláusula exorbitante é toda e qualquer cláusula do contrato

administrativo que atribua ao contratante (Poder Público) prerrogativa estranha ao regime de direito privado. As cláusulas exorbitantes estão enumeradas TAXATIVAMENTE no artigo 58 da Lei 8666/93.

São as seguintes as cláusulas exorbitantes:

a) Modificação Unilateral

Admite-se a alteração unilateral do contrato por parte do contratante (Poder Público), desde que seja em cláusulas regulamentares, e que seja respeitada a equação econômico-financeira do contrato. Não cabe nas cláusulas econômicas.

b) Rescisão Unilateral

A Administração Pública pode rescindir unilateralmente os contratos administrativos, por inadimplemento do contratado (com ou sem culpa) ou por relevante motivo de interesse público.

c) Fiscalização da Execução

Consiste na supervisão, acompanhamento e intervenção da Administração Pública no contrato.

Como visto supra, é a única cláusula exorbitante que não é incompatível com o regime de direito privado.

d) Aplicação de sanções administrativas (ex: art. 86/87, Lei 8666/93)

77 O artigo 37 § 8.º da CR/88, ao se referir a “contrato”, não se refere a contrato administrativo, e sim a contrato de gestão.

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54DIREITO ADMINISTRATIVO

Decorre do atributo da auto-executoriedade dos atos administrativos, pelo qual estes podem ser executados pela própria Administração Pública independentemente de decisão judicial (exceção: multa — ato hetero-executório, em que se faz necessária autorização judicial, obtida em processo que deve observar o contraditório e a ampla defesa).

e) Inoponibilidade da exceção de contrato não cumprido

O contratado não pode opor a exceção de contrato não cumprido em face da Administração Pública.

Todavia, se o atraso da Administração for superior a 90 dias, contratado pode requerer judicialmente a paralisação da execução do contrato ou a rescisão judicial, além das perdas e danos materiais78 e morais (art. 58, V, c/c art. 78, XV, Lei 8666/93).

Obs.: Se o atraso for inferior a 90 dias, porém tornar impossível a execução do contrato, a solução, segundo Carvalho, é a propositura de Medida Cautelar Inominada, por parte do contratado, tendo como objetivo a paralisação da execução do contrato.

► CLÁUSULAS EXORBITANTES EM CONTRATOS PRIVADOS DA ADMINISTRAÇÃO

Discute-se sobre o cabimento de cláusulas exorbitantes em contratos privados da Administração Pública. Há 2 correntes a respeito: a) É cabível, com fundamento no art. 62 § 3.º, I, da Lei 8666/93, formando os chamados “contratos quase-públicos” ou “contratos privados de figuração pública” (Di Pietro, Juruena, Watanabe). B) É inadmissível, pois geraria confusão entre os tipos de contratos da Administração, vez que as cláusulas exorbitantes são em regra incompatíveis com o regime de direito privado79 (Jungstedt). Prevalece a 1.ª corrente.

► TRANSFERÊNCIA DE PRERROGATIVAS PÚBLICAS Parte da doutrina sustenta que os contratos administrativos comportam ainda um 6.ª

cláusula exorbitante, consistente na transferência de prerrogativas públicas. Exemplo dessa cláusula seria a transferência do Poder de Polícia a particulares, nas fases de fiscalização e consentimento80.

V.2.2 – EQUAÇÃO ECONÔMICO-FINANCEIRA

Em linhas gerais, pode-se conceituar a equação econômico-financeira como a adequação entre o objeto do contrato e o preço avençado. Em outras palavras, é o equilíbrio contratual.

Violada a equação econômico-financeira do contrato administrativo, são 2 os meios possíveis de recomposição da equação: o reajuste e a revisão.

O reajuste decorre da alteração do preço dos insumos, devendo estar autorizado no contrato. O prazo mínimo para que seja efetuado novo reajuste é de 1 ano (Lei 9065/95).

78 Parte da doutrina não admite a indenização por lucros cessantes.

79

Exceto a cláusula de fiscalização da execução do contrato, que é a única cláusula exorbitante que não é incompatível com o regime privado.

80 Como já visto, as fases de regulamentação e sanção são indelegáveis a particulares.

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55DIREITO ADMINISTRATIVO

A revisão decorre da quebra de equação, não necessitando de previsão contratual, e podendo ocorrer em qualquer intervalo, desde que se verifique a sua causa legítima.

V.2.3 – Extinção dos Contratos Administrativos

São diversas as causas de extinção (rescisão) dos contratos administrativos, conforme o quadro abaixo:

Assim, a rescisão administrativa decorre de ato administrativo motivado por uma das causas acima enumeradas (vide artigos 78 e 79, Lei 8666/93).

• Rescisão de Pleno Direito

RESCISÃO

DO CONTRATO

Administrativa

Judicial

Amigável

De Pleno Direito

Inadimplemento do Contratado

Motivo de Interesse Público

Com culpa

Sem culpa

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56DIREITO ADMINISTRATIVO

Exemplo: Falência do contratado81 (art. 78, IX); perecimento do objeto; falecimento do contratado (art. 78, X); etc.

Poderá haver ou não indenização do contratado, conforme previsão legal ou contratual.Havendo divergência quanto ao dever ou não de indenizar, ou quanto ao valor da

indenização, a controvérsia só poderá ser dirimida pelo Judiciário (pois não cabe rescisão administrativa nessa hipótese).

• Rescisão Judicial

Seu instrumento é a Ação82 (pelo rito Ordinário). Admite-se a cumulação com pedido de indenização, compensação, retenção, etc..

É cabível tanto para o contratado (em caráter obrigatório) quanto para o contratante (em caráter facultativo, pois a Administração Pública pode rescindir o contrato administrativamente).

Havendo culpa da Administração na rescisão do contrato, cabe indenização ao contratado.

• Rescisão Amigável

As partes decidirão amigavelmente sobre a indenização a ser ou não paga ao contratado.

A rescisão amigável deve obrigatoriamente ser precedida de autorização escrita e motivada de autoridade competente (art. 79 § 1.º, Lei 8666/93).

Segundo Hely Lopes Meirelles, trata-se de distrato, devendo seguir a regra geral de que o distrato deve observar a mesma forma do contrato.

• Rescisão Administrativa

Sendo por interesse público, ou por inexecução sem culpa do contratado, este fará jus a indenização.

Sendo a rescisão por culpa do contratado, adquire o caráter de sanção, podendo a Administração Pública aplicar punições ao contratado, como as previstas no artigo 80 da Lei 8666/93 (multa e indenização ao Poder Público, execução da garantia contratual, retenção dos créditos decorrentes do contrato até o limite dos prejuízos causados à Administração).

► OCUPAÇÃO PROVISÓRIA

Assunção imediata da obra ou serviço pela Administração, com posse e utilização do local, instalações, material e pessoal, sendo posteriormente devolvidos e ressarcidos.

Trata-se de meio eficaz para a evitar a prolongada paralisação de obras ou serviços públicos, no caso de rescisão do contrato administrativo por inexecução (com culpa ou sem culpa).

81 No caso de concordata do contratado, permite-se à Administração Pública manter o contrato, assumindo o controle de determinadas atividades de serviços essenciais (art. 80 § 2.º, Lei 8666/93).

82 Hely Lopes Meirelles faz menção à “rescisão judicial indireta”, que seria a invalidação do contrato por via de Ação Popular, desde que lesivos ao patrimônio público, nos termos do art. 5.º, LXXIII, CR/88 c/c Lei 4717/65. Admite-se ainda a anulação mediante Mandado de Segurança, quando decorrer de ato ilegal ou abusivo de autoridade.

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57DIREITO ADMINISTRATIVO

V.2.3.1 – Causas de Inadimplemento sem culpaSão as seguintes as causas de inadimplemento do contratado sem culpa, dando

ensejo à rescisão do contrato administrativo:

a) TEORIA DA IMPREVISÃO = Fato imprevisível que onera excessivamente o contrato, rompendo a equação econômico-financeira, não sendo tal fato atribuível a qualquer das partes (ex: calamidade pública; comoção social).

b) FATO DO PRÍNCIPE = Fato imprevisto e excepcional atribuído ao contratante (Poder Público), sendo genérico e extracontratual, incidindo indiretamente sobre o contrato administrativo (ex: aumento de imposto que cause onerosidade excessiva, inviabilizando a execução do contrato).

c) FATO DA ADMINISTRAÇÃO = Fato imprevisto e excepcional atribuído ao Poder Público, sendo específico e contratual, incidindo diretamente sobre o contrato (ex: havendo contrato de obra pública, a Administração não disponibiliza espaço para estacionamento, impedindo a execução do contrato).

d) SUJEIÇÃO IMPREVISTA = Circunstância natural conhecida do contratante e desconhecida do contratado, não tendo sido este cientificado por aquele, ou desconhecida de ambas as partes, vindo a causar onerosidade excessiva (ex: em contrato de obra pública para construção de linha de metrô, verifica-se a existência de enorme pedra no subsolo, de modo que tal pedra deverá ser perfurada a altíssimo custo, mediante a utilização de diversos explosivos caros).

e) CASO FORTUITO E FORÇA MAIOR = Evento imprevisível e inevitável que torne absolutamente impossível o objeto do contrato administrativo (caso fortuito é fato natural, e força maior é fato humano).

V.2.4 – Suspensão do Contrato Administrativo Hely Lopes Meirelles admite a suspensão do ato administrativo, sob o argumento de

que, se motivos de interesse público autorizam a rescisão do contrato (art. 78, XII, Lei 8666/93), com muito mais propriedade permitem a sua suspensão, pois esta é um minus em relação à extinção (princípio geral de direito — “quem pode o mais, pode o menos”).

Exige-se, entretanto, que a suspensão seja realizada mediante ato administrativo motivado, pois a suspensão deve ser ao máximo evitada, de modo a impedir, na medida do possível, a paralisação do serviço ou obra.

DIREITO ADMINISTRATIVO

I – RESPONSABILIDADE CIVIL DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA I.1 – CONCEITO

Responsabilidade civil é o dever jurídico derivado ou secundário de ressarcir ou reparar os danos causados pela conduta culposa do agente a outrem.

A responsabilidade civil não se confunde com a responsabilidade penal. Porém, a diferença entre elas não está na substância, e sim na gravidade da lesão ao bem jurídico tutelado (a penal é mais intensa).

Na responsabilidade penal a sanção será preventiva (ou repressiva, segundo alguns). Na civil, a sanção será reparatória ou compensatória.

Obs.: OBRIGAÇÃO / RESPONSABILIDADE

▪ Obrigação é o dever jurídico originário ou primário (conduta imposta pela ordem jurídica).

▪ Responsabilidade é dever jurídico secundário ou derivado (decorre da violação do dever jurídico primário).

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58DIREITO ADMINISTRATIVO

Obs.: RESSARCIR OU REPARAR / INDENIZAR

Na reparação, há ato ilícito violando direito individual e causando dano.

Na indenização, há ato ilícito, causando não um dano, e sim um prejuízo. Está em jogo interesse público (e não direito individual).

Existe ainda uma sutil diferença entre reparação e ressarcimento. Ressarcimento é ligado a dano material. Reparação é ligada a dano moral.

Ex: veículo público colide com veículo particular = ressarcimento.

Ex: desapropriação = indenização.

I.2 – PRESSUPOSTOS A responsabilidade civil tem 3 pressupostos: um subjetivo, um objetivo e um causal.

O pressuposto subjetivo é a conduta culposa do agente (em termos amplos, ambrangendo as condutas comissivas e omissivas, próprias ou alheias).

O pressuposto objetivo é o dano (patrimonial ou moral).

Finalmente, o pressuposto causal é o nexo de causalidade (relação de causa e efeito entre a conduta e o dano).

I.3 – ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE CIVIL

I.3.1 – Extracontratual (aquiliana) — art. 186 NCC

Decorre de violação de dever geral de não lesar ( neminen laedere ) . Essa espécie de responsabilidade civil admite ainda 2 subespécies, conforme seja ou não exigida demonstração de culpa ou dolo: Objetiva e Subjetiva.

I.3.2 – Contratual — art. 389 NCC

Decorre de violação de dever contratual. Divide-se em: de meio (em que a obrigação exige apenas a conduta, independentemente do resultado obtido); e de fim (em que a obrigação exige não apenas conduta, como também resultado, havendo violação pela não obtenção de qualquer deles).

I.4 – RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

É o dever jurídico derivado ou secundário imposto às Pessoas Jurídicas de Direito Público e às de Direito Privado prestadoras de serviço público, de ressarcir ou reparar danos que seus agentes, no exercício de suas atribuições ou a pretexto de exercê-las, causarem a terceiros (art. 37 § 6.º, CR/88).

O CC/16 continha dispositivo acerca da responsabilidade do Estado (art. 15). Já o NCC não contém regra específica. Assim, atualmente o fundamento jurídico da responsabilidade civil do Estado é apenas constitucional, não mais havendo fundamento legal.

Obs.: RESPONSABILIDADE DO ESTADO / RESPONSABILIDADE DA ADMINISTRAÇÃO

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59DIREITO ADMINISTRATIVO

Discute-se quanto à correta denominação a ser aplicada a este instituto, havendo 2 vertentes antagônicas.

▪ 1.ª corrente (Hely Lopes Meirelles) = O termo mais correto seria “Responsabilidade da Administração Pública”, pois a responsabilidade decorre de atos de administração, e não de atos de governo.

▪ 2.ª corrente (Bandeira de Melo; Guilherme Peña) = defende que o termo mais adequado seria “Responsabilidade do Estado”, pois a responsabilidade também decorre de atos legislativos e judiciais, que não são da administração.

A responsabilidade civil do Estado é sempre extracontratual. Assim, só se aplica a norma do artigo 37 § 6.º da CR/88 quando a relação não é contratual. Quando a relação for contratual, e o dano decorrer da violação de cláusula do contrato, aplica-se quanto ã responsabilidade a regra do contrato.

Obs.: RESPONSABILIDADE DO ESTADO / RESPONSABILIDADE DO AGENTE PÚBLICO

O artigo 37 § 6.ª da CR/88 prevê tanto a responsabilidade do Estado quanto a do agente público (a primeira parte do dispositivo se refere à responsabilidade do Estado, e a Segunda se refere à reponsabilidade do agente).

A responsabilidade do Estado é em regra objetiva (salvo as exceções legais). Já a responsabilidade do agente público é sempre subjetiva.

Assim, são 2 teorias diferentes, aplicadas a 2 relações jurídicas diferentes. Por isso parte da doutrina não admite a denunciação da lide por parte do Estado, nas ações de responsabilidade civil. O argumento é de que, ao misturar as teorias, haveria prolongamento da instrução processual (já que a culpa do agente teria que ser provada), prejudicando a vítima, que demoraria mais a receber o ressarcimento ou a reparação. Para essa corrente, o Estado pode acionar regressivamente o agente causador do dano através de ação própria, independentemente de denunciação da lide (resguardando-se o interesse do Estado sem prejudicar a vítima).

I.4 – TEORIAS SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADOI.4.1 – Irresponsabilidade Civil

Esta foi a primeira teoria aplicada à responsabilidade do Estado. Segundo esta teoria, o Estado não responde pelos danos causados por seus agentes, devido à intangibilidade da soberania.

I.4.2 – Responsabilidade Subjetiva por Culpa do AgenteDe acordo com esta teoria, o Estado responde desde que seja provada a

culpa e seja identificado o agente causador da infração. O fato gerador da responsabilidade, portanto, é a falta do agente.

I.4.3 – Responsabilidade Subjetiva por Culpa do ServiçoNesta teoria, exige-se prova de dolo ou culpa, mas não se exige

identificação do agente causador do dano. Assim, o fato gerador da responsabilidade é a própria falta do serviço, caracterizada por 3 modalidades: INEXISTÊNCIA ; INADEQUAÇÃO (mau funcionamento); ou RETARDAÇÃO (atraso).

I.4.4 – Responsabilidade Objetiva por Risco AdministrativoEsta teoria dispensa prova de dolo ou culpa, respondendo o Estado desde que

se comprove o dano e o nexo causal. Assim, o Estado só não responde se for verificada a existência de causa excludente do nexo causal (caso fortuito, força maior, fato exclusivo da vítima ou de terceiro).

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60DIREITO ADMINISTRATIVO

I.4.5 – Responsabilidade Objetiva por Risco IntegralSegundo esta teoria, o Estado sempre responde, ainda que ocorra qualquer das

excludentes do nexo de causalidade.

I.5 – TEORIA ADOTADA NO BRASILNo Brasil, a responsabilidade civil do Estado é tutelada em regra pela teoria

objetiva. Porém, excepcionalmente pode ser aplicada a teoria subjetiva.

a) Conduta Comissiva = Aplica-se o artigo 37 § 6.º da CR/88 (teoria objetiva).

b) Conduta Omissiva = Há 2 correntes:

▪ 1.ª Corrente (Bandeira de Melo) = Aplica-se sempre a teoria subjetiva pela culpa do serviço (ex: bala perdida; desabamento; acidente com “surfista ferroviário”; etc.).

▪ 2.ª Corrente (Sérgio Cavalieri) = No caso de omissão específica83 do Poder Público, a responsabilidade é objetiva pelo risco administrativo.

Prevalece a 2.ª CORRENTE84.

I.6 – ASPECTOS PROCESSUAIS — AÇÃO DE RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADOA Ação de Ressarcimento ou Reparação em face do Estado é que vai veicular a

pretensão da vítima.

A) Legitimidade Passiva

Há 2 correntes a respeito:

▪ 1.ª Corrente (Hely Lopes) = A legitimidade passiva é exclusiva do Estado, que depois deve regredir, se quiser;

▪ 2.ª Corrente (Bandeira de Mello) = A legitimidade passiva é concorrente do Estado e do agente. Assim, é possível a propositura da Ação em face apenas do Estado, apenas do agente, ou em face de ambos em litisconsórcio passivo facultativo (porém, estando no pólo passivo o agente, aplica-se a teoria subjetiva).

Prevalece a 1.ª CORRENTE.

B) Denunciação da Lide

São 2 as correntes acerca da possibilidade de denunciação da lide pelo Estado ao agente público nas Ações de Responsabilidade Civil.

83 Omissão Específica do Poder Público = É a causa direta e imediata do não impedimento do dano. EX: Morte de Presidiário dentro da Prisão (a causa do não impedimento do dano foi a omissão específica do Poder Público, que tinha a obrigação específica de zelar pela integridade física do indivíduo acautelado). EX: Ferimento de Estudante dentro de escola privada (porque o concessionário presta serviço público) ou pública (o Estado se omitiu especificamente, ao não evitar a lesão dentro de estabelecimento sobre o qual se comprometera a guardar). EX: Alagamento (se o Poder Público foi avisado do risco de alagamento e não tomou providências, houve omissão específica).

84 Vide Jurisprudência aplicando esta teoria: STF – RE 109.615 (Rel. Celso Melo); TJ/RJ – Ap. 3611/99 (Rel. Sérgio Cavalieri).

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61DIREITO ADMINISTRATIVO

▪ 1.ª Corrente (Maria Sylvia Di Pietro; Diógenes Gasparini; Yussef Cahali) = Deve haver a denunciação da lide pelo Estado ao agente, na forma do artigo 70. III, do CPC, evitando-se assim uma 2.ª Ação (do Estado em face do agente). Aplica-se o princípio da economia processual.

▪ 2.ª Corrente (Bandeira de Mello; Carvalho Filho) = Não pode haver denunciação da lide, porque isso geraria confusão de fundamentação, misturando-se as teorias sem que o autor concorra para esse tumulto processual (não se aplica o art. 70, III, do CPC). Afinal, a responsabilidade do Estado é objetiva, bastando prova do nexo causa, ao passo que a responsabilidade do agente é subjetiva, necessitando de prova da culpa. Assim, a mistura das teorias na mesma Ação atrasaria a solução, prejudicando a vítima. Por fim, ressaltam que o Estado não seria prejudicado com a vedação à denunciação da lide, pois pode acionar regressivamente o agente independentemente da denunciação.

▪ 3.ª Corrente (Alexandre Câmara; Cândido Dinamarco) = Tecnicamente não se trata de hipótese de denunciação da lide, e sim de chamamento ao processo, pois o caso é de solidariedade (porém, os publicistas entendem que não há solidariedade, pois a responsabilidade do Estado é diferente da do agente, embora sejam cumuladas).

O STJ tem entendimento recente no sentido de que cabe a denunciação da lide no caso (adotando a 1.ª CORRENTE).

C) CRITÉRIOS PARA A FIXAÇÃO DO MONTANTE DA REPARAÇÃO OU RESSARCIMENTO

C.1) NO CASO DE MORTE DE FILHO MENOR, QUE NÃO TINHA SALÁRIO PROVADO - A forma de pagamento é através de PENSÃO .

- A base é de 1 SALÁRIO-MÍNIMO/MÊS 85.

- A duração do pagamento é até a data em que o menor completaria 65 ANOS de idade (expectativa de vida) ou até a MORTE DOS PAIS (pois o direito à pensão não se transmite aos sucessores).

C.2) Indenização por dano moral1) Pela GRAVIDADE DO ATO praticado pelo autor;

2) Pela INTENSIDADE DO SOFRIMENTO da vítima;

3) Pelo CARÁTER PUNITIVO da condenação (conforme a condição econômica do agressor e da vítima).

I.7 – Responsabilidade Civil das Pessoas Jurídicas de Direito Público da Administração Indireta e das Pessoas Jurídicas de Direito Privado prestadoras de serviço público

Em se tratando de Autarquias, Fundações Públicas, Empresas Públicas, Sociedades de Economia Mista, etc., a responsabilidade é regida da seguinte forma:

Como visto, estas pessoas jurídicas respondem objetivamente, nos termos do artigo 37 § 6.º da CR/88.

85 Se a vítima tinha salário provado, o valor da pensão será o do salário.

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62DIREITO ADMINISTRATIVO

Quanto ao Estado, tem responsabilidade subsidiária (ou seja, só responde se a pessoa jurídica se tornar insolvente).

Assim, a Ação deve ser proposta apenas em face da pessoa jurídica. Apenas no caso de esta se tornar insolvente é que poderá ser proposta nova Ação em face do Estado , com base na sua responsabilidade subsidiária.

I.8 – RESPONSABILIDADE CIVIL POR ATO ADMINISTRATIVO

1.8.1 – Responsabilidade do Estado por Obra Pública

Segundo Cretella Jr., deve-se distinguir entre o dano oriundo da obra pública (aquele que decorre simplesmente da existência da obra, sem que haja qualquer consideração sobre eventuais irregularidade na sua execução) do dano decorrente de culpa do empreiteiro (aquele que decorre de irregularidade na execução da obra, que não causaria dano se fosse executada com perfeição).

No 1.º caso (dano decorrente da obra em si), a Ação é contra o Estado. Exemplo: Dano causado a comerciante pela colocação de tapumes em obras, retirando a visibilidade de seu estabelecimento

No 2.º caso (dano causado pela má execução da obra), a Ação é contra a empresa contratada, tendo o Estado apenas responsabilidade subsidiária (em caso de insolvência da empresa). Exemplo: Dano causado pelo estouro de um cano em obra pública, inundando várias residências.

1.8.2 – Responsabilidade do Agente Político

Segundo doutrina de Hugo Mazzilli, só há responsabilidade por ato de agente político no exercício de suas funções se houver prova de dolo ou fraude.

► QUESTÃO MP/2003 — Quando o Promotor atua como custus legis , pode responder civilmente?

R: NÃO, pois como fiscal da Lei sua atividade é meramente opinativa, não tendo potencialidade lesiva (não há atividade postulatória nem decisória).

Assim, mesmo que se verifique a existência de dolo ou fraude, e mesmo que tenha sido integralmente acolhida a promoção do MP, a responsabilidade só pode ser imputada ao Juiz (que pratica ato decisório).

Logo, conforme a doutrina de Hugo Mazzilli, o Promotor de Justiça só pode responder civilmente quando atuar como parte.

Isso não impede, contudo, que o Promotor venha a responder criminal e administrativamente, se for provado o cometimento de ilícito dessas naturezas.

1.8.3 – Responsabilidade Civil do Estado por Ato Legislativo

O sistema pátrio em regra não admite a responsabilização do Estado por atos Legislativos próprios (Leis), pois as normas produzidas pelo Poder Legislativos são genéricas e abstratas. Quanto aos atos legislativos impróprios (atos legislativos praticados pelo Poder

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63DIREITO ADMINISTRATIVO

Executivo), admite-se a responsabilidade, desde que sejam concretos e individuais, e que venham a causar danos específicos a pessoas determinadas.

Porém, há 2 hipóteses excepcionais em que se admite a responsabilidade civil do Estado por Atos Legislativos:

a) Norma Inconstitucional86 (ainda que seja geral e abstrata) = desde que seja declarada a sua inconstitucionalidade pelo STF.

b) Norma individual e concreta (ainda que legal e constitucional) = desde que cause dano específico a terceiros.

A Súmula 266 do STF admite Mandado de Segurança apenas em face de Lei individual e concreta, vedando a utilização de tal remédio no caso de Lei geral e abstrata.

Obs.: Álvaro Lazarini distingue ainda entre a responsabilidade por norma individual e concreta, ou seja, pelo dano decorrente da norma em si (responsabilidade por ato legislativo), e a responsabilidade por ato praticado com base na norma, ou seja, pelo dano causado pela prática de ato administrativo baseado na norma geral e abstrata (responsabilidade por ato administrativo).

Obs.: RESPONSABILIDADE POR DANOS DECORRENTES DE MP NÃO CONVERTIDA EM LEI

Flávia Piovesan, isoladamente, contempla ainda mais uma hipótese de responsabilidade do Estado por ato Legislativo, no caso de dano decorrente de Medida Provisória posteriormente rejeitada pelo Congresso Nacional, não sendo convertida em Lei.

Trata-se de ato legislativo, embora atípico (porque a norma foi criada pelo Poder Executivo).

1.8.4 – Responsabilidade do Estado por Ato Jurisdicional

O Direito Brasileiro admite 2 hipóteses de responsabilidade civil do Estado por ato jurisdicional, tratando-se inclusive de direitos fundamentais (art. 5.º LXXV, CR/88):

a) Erro Judiciário;

Ressalte-se que Carvalho Filho (Banca-MP) entende que a hipótese de erro judiciário que gera responsabilidade civil do Estado é restrita à matéria penal, não se estendendo à matéria civil.

b) Prisão por tempo superior ao fixado na sentença penal condenatória transitada em julgado.

86 Hely Lopes Meirelles entende que o Estado jamais pode responder por norma genérica e abstrata, ainda que seja declarada inconstitucional pelo STF

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64DIREITO ADMINISTRATIVO

Bandeira de Melo e a DPGE entendem, minoritariamente, que o Estado responde também por prisão provisória (de qualquer espécie87), se o sujeito for posteriormente absolvido (qualquer que tenha sido o fundamento da prisão).

O TJ/RJ e o MP rejeitam essa tese, entendendo que a prisão provisória é medida cautelar, e que a eventual responsabilização do Estado em caso de absolvição engessariam a atividade do Poder Público, dificultando as apurações de fatos criminosos.

1.9 – Responsabilidade Tarifada (ou limitada)

1.9.1 – Fundamento e hipóteses legais

A chamada “responsabilidade tarifada” do Estado decorre de imposição legal, importando na limitação da reparação ou ressarcimento devido por causa de sinistro. Ocorre nas atividades potencialmente perigosas.

Exemplos: ▪ Acidente Nuclear (Lei 6.453/77);

▪ Acidente de Trabalho Urbano (Lei 6.367/76);

▪ Acidente de Trabalho Rural (Lei 6.195/74);

▪ Acidente Ferroviário (Lei 2.681/12);

▪ Acidente Ambiental em Atividade Petrolífera (Lei 9.966/00).

Parte da doutrina (ex: Paulo Afonso Leme Machado; DPGE) entende que TODAS AS HIPÓTESES DE LIMITAÇÃO DA RESPONSABILIDADE DO ESTADO SÃO INVÁLIDAS , pois a limitação é vedada pelo artigo 37 § 6.º da CR/88. Segundo esta corrente, as Leis anteriores à CR/88 nesse sentido não foram recepcionadas , e as posteriores são inconstitucionais .

1.9.2 – RESPONSABILIDADE CIVIL POR ACIDENTE EM TRANSPORTE AÉREO

O transporte aéreo é serviço público, nos termos da CR/88. Todas as empresas que exploram esta atividade são concessionárias de serviço público.

Assim, a regra seria a aplicação da responsabilidade objetiva, nos termos do artigo 37 § 6.º da CR/88.

Porém, o Código Brasileiro de Ar — CBA (datado de 1985) previa responsabilidade tarifada nesse caso, com fulcro na Convenção de Viena (firmada na década de 20 e inserta no Direito Interno através de Decreto Legislativo.

Todavia, a doutrina e a jurisprudência rechaçaram a aplicação do CBA, por considerarem que a norma que previa a responsabilidade tarifada não foi recepcionada pela CR/88 (que consagra o princípio da reparação integral). Ademais, o CDC prevê responsabilidade objetiva, prevalecendo sobre a Legislação anterior por ter índole constitucional.

Por fim, ressalta-se que a Convenção de Viena foi firmada numa época distante, em que o transporte Aéreo era apenas experimental, sendo freqüentes ao acidentes e perdas de bagagens. Assim, limitou-se a responsabilidade por acidentes envolvendo transporte aéreo para permitir o desenvolvimento da atividade. Contudo, o panorama mudou, de tal forma que hoje o avião é considerado o mais seguro meio de transporte existente.

87 Exemplo: preventiva, temporária, em flagrante delito; decorrente de sentença penal condenatória não transitada em julgado; decorrente de pronúncia.

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65DIREITO ADMINISTRATIVO

Outrossim, as bagagens usadas à época eram simples (roupas, sapatos, papéis), de modo a média da indenização fixada na Convenção de Viena é desatualizada (hoje fazem parte das bagagens laptops, aparelhos eletrônicos, CD`s, DVD`s, etc.).

Destarte, hodiernamente não é aceita a responsabilidade tarifada por danos causados durante contrato de prestação de serviço de transporte aéreo, aplicando-se o CDC, à luz do princípio da reparação integral previsto na CR/88.

I.10 – PRESCRIÇÃO CONTRA O PODER PÚBLICOO NCC, em seu artigo 206 § 3.º, V, prevê prazo prescricional de 3 anos para a Ação

de Responsabilidade Civil, sem especificar se este prazo abrange as Ações em face do Estado ou se só se aplica aos particulares (a Lei anterior — CC/16 e Dec-Lei 20.358/32 — previa prazo de 5 anos para qualquer ação em face da Fazenda Pública, inclusive de Responsabilidade Civil).

A 1.ª Corrente (majoritária) entende que o prazo de 5 anos permanece, pelo princípio da especialidade (o NCC, sendo norma genérica, não teria revogado as normas específicas anteriores).

A 2.ª Corrente (Carvalho Filho, Guilherme Peña) entende que o prazo passou a ser de 3 anos com o advento do NCC, pois a prescrição qüinqüenal é prerrogativa do Poder Público, e não pode existir prerrogativa prejudicial.

II – SERVIDOR PÚBLICO II.1 – AGENTE PÚBLICO

“Servidor Público” é espécie do gênero “Agente Público”.

Agente Público é toda e qualquer pessoa natural ou jurídica que, a qualquer título, transitória ou definitivamente, integra a estrutura da Administração Pública, mediante exercício de cargo, emprego ou função pública.

► QUESTÃO — Pessoa Jurídica pode ser agente público?

R: SIM, excepcionalmente (ex: agente delegado88). Por isso não é correto falar que o agente público é pessoa natural, pois pode excepcionalmente ser pessoa jurídica.

O Agente Público tem 2 pressupostos:

▪ Pressuposto Objetivo = exercício de função estatal;

▪ Pressuposto Subjetivo = regular investidura.

Obs.: AGENTE DE FATO / USURPADOR DE FUNÇÃO PÚBLICA

Tais conceitos são doutrina de Diogo de Figueiredo (Banca-MP).

88 Delegatário de serviço público.

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66DIREITO ADMINISTRATIVO

Ambos satisfazem apenas o pressuposto objetivo para a caracterização de Agente Público, não atendendo ao pressuposto subjetivo (regular investidura).

O Agente de Fato exerce função pública sem regular investidura devido a ERRO (caso do “agente de fato putativo”) ou devido a ESTADO DE NECESSIDADE PÚBLICO (caso do “agente de fato necessário” — ex: aquele que, percebendo que os sinais de trânsito estão queimados, assume a função de guarda de trânsito).

Usurpador de Função Pública é aquele que, para exercer a função pública, usa de FRAUDE (“usurpador astucioso”— ex: aquele que usa roupas de PM e age como tal) ou de VIOLÊNCIA (“usurpador violento” — ex: aquele que rouba crachá de servidor público para agir como se o fosse).

Os atos praticados pelo Agente de Fato Necessário são eficazes (pois tutelam interesse público).

Já os atos praticados praticados por Agente de Fato Putativo são eficazes externamente, perante terceiros (pela teoria da aparência), mas são ineficazes internamente (perante a Administração Pública), necessitando de sanatória para serem convalidados.

Por fim, os atos praticados por Usurpador de Função Pública (de qualquer tipo, astucioso ou violento) são ineficazes, gerando inclusive Responsabilidade Civil do Estado (pela teoria da culpa provada), por ter permitido a usurpação (culpa in vigilando)

II.2 – CLASSIFICAÇÃO DOS AGENTES PÚBLICOS

São diversas as classificações dos agentes públicos existentes na doutrina. Porém, a que prevalece é a de Bandeira de Melo.

Assim, Agente Público é o gênero, possuindo 3 espécies:

▪ Agente Político;

▪ Servidor Estatal (servidor público; empregado público; contratado);

▪ Particular em Colaboração com o Poder Público (agente delegado; agente honorífico; gestor de negócios público).

II.2.1 – Agentes Políticos

As características dos Agentes Políticos são as seguintes:

a) Ocupam o ápice da estrutura administrativa, representando Poder de Estado;

b) Mantém vínculo político com a Administração Pública;

c) Exercem atribuições constitucionais;

d) Possuem prerrogativas funcionais;

e) Possuem modos de escolha e destituição próprios.

Quanto à configuração dos Agentes Políticos, são 2 as principais correntes doutrinárias:

▪ 1.ª Corrente: RESTRITIVA (Maria Sylvia Di Pietro; Bandeira de Melo) = Agentes Públicos são apenas aqueles que ocupam cargos estruturais da ordem política (Chefe do Executivo e seus auxiliares diretos; Membros das Casas Legislativas).

▪ 2.ª Corrente: AMPLIATIVA (Hely Lopes Meirelles; Diogo de Figueiredo) = São Agentes Políticos aqueles que exercem cargos com liberdade funcional (Vhefe do Executivo e seus auxiliares diretos; Membros das Casas Legislativas; Magistrados; Membros das Funções Essenciais à Justiça; Membros dos Tribunais de Contas; Membros de Missões Diplomáticas e Consulares).

Obs.: DIRETORES DE AGÊNCIAS REGULADORAS

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67DIREITO ADMINISTRATIVO

Marcos Juruena e a PGE sustentam que os Diretores das Agências Reguladoras são Agentes Políticos.

O professor Guilherme Peña entende que a rigor não podem ser classificados como Agentes Políticos, pois ocupam cargo de diretores em autarquias, logo são servidores públicos (embora tenham prerrogativas que os distinguem das demais servidores públicos).

II.2.2 – Servidores Estatais

Os servidores estatais se subdividem em: servidores públicos; empregados públicos; contratados.

A) Servidores Públicos

▪ São próprios da Administração Pública Direta, Autárquica e Fundacional.

▪ Submetem-se ao regime jurídico estatutário;

▪ Ocupam cargo público;

▪ São escolhidos mediante concurso público.

B) Empregados Públicos

▪ São próprios de Empresa Pública e Sociedade de Economia Mista;

▪ São regidos pela CLT (com algumas mitigações);

▪ Possuem emprego público;

▪ São escolhidos mediante concurso público.

C) Contratados

▪ São próprios da Administração Pública Direta, Autárquica e Fundacional, em caso de urgência que autorize a contratação temporária;

▪ Submetem-se a regime jurídico específico;

▪ Exercem função pública em situações de urgência, temporariamente, sem possuírem cargo ou emprego;

▪ Escolhidos mediante processo seletivo simplificado.

II.2.3 – Particulares em Colaboração

Os particulares em colaboração subdividem-se em: Agentes Delegados; Agentes Honoríficos; Gestores de Negócios Públicos.

A) Agentes Delegados

Prestam serviço público por delegação (ex: concessionário e permissionário de serviço público).

B) Agentes Honoríficos

Exercem ofício público mediante requisição, nomeação ou designação (ex: mesário nas eleições; jurado no Tribunal do Júri).

C) Gestores de Negócios Públicos

Assumem a gestão de coisa pública em nome próprio, durante estado de necessidade pública.

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68DIREITO ADMINISTRATIVO

Obs.: AGENTE DE FATO NECESSÁRIO / GESTOR DE NEGÓCIOS PÚBLICO Tais figuras não se confundem, distinguindo-se pela forma de exercício da função.O Agente de Fato Necessário atua em nome do Estado (assim, quem responde pelos

seus atos é o Estado).Já o Gestor de Negócios Público age em nome próprio (logo, a responsabilidade é dele

próprio, dependendo do dolo).

II.3 – ORGANIZAÇÃO FUNCIONAL

A organização funcional dos servidores públicos é feita em quadros, carreiras, classes (ou categorias), e cargos.

II.3.1 – Quadro Funcional

Conjunto de carreiras, cargos isolados e funções de confiança de um mesmo órgão ou entidade.

Exemplo: O Quadro Funcional da Polícia Civil engloba todos os Delegados, Inspetores, Escrivães, etc..

II.3.2 – Carreira

Conjunto de classes ou categorias da mesma profissão, escalonadas hierarquicamente, de modo o possibilitar a progressão profissional.

Exemplo: Na Polícia Civil, os Delegados são escalonados hierarquicamente em “Classe A”, “Classe B” e “Classe C”, podendo ser promovidos.

II.3.3 – Classe ou Categoria

Conjunto de cargos com as mesmas atribuições, denominação, retribuição pecuniária e responsabilidade.

Exemplo: Delegados “Classe A” da Polícia Civil.

II.3.4 – Cargo

Lugar instituído na organização funcional para ser preenchido por um titular. É a estrutura mínima da organização funcional

Exemplo: Delegado “Classe A” Titular da Delegacia X.

II.4 – CLASSIFICAÇÃO DOS CARGOS

a) Vitalícios

Os cargos vitalícios são os que atribuem a maior garantia a seus ocupantes, pois uma vez adquirida a vitaliciedade (após 2 anos de exercício efetivo), o servidor só pode perder o cargo por sentença judicial transitada em julgado.

No Brasil só existem 3 exemplos de cargos vitalícios: Magistratura (art. 95, I, CR/88); Ministério Público (art. 128 § 5.º, I, “a”, CR/88); Membros dos Tribunais de Contas (art. 73 § 3.º CR/88).

b) Efetivos

Os cargos efetivos conferem menor garantia a seus ocupantes, pois após a aquisição da estabilidade (após 3 anos de exercício efetivo), o servidor pode perder o cargo tanto por sentença judicial transitada em julgado quanto por decisão final em processo Administrativo (observados o contraditório e a ampla defesa).

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69DIREITO ADMINISTRATIVO

A EC 19 acrescentou ainda outras hipóteses de perda do cargo pelo servidor estável: desempenho insuficiente verificado através de processo de avaliação (art. 41 § 1.º, III, CR/88); excesso de gasto orçamentário (art. 169 § 4.º CR/88).

c) Em Comissão

Cargo em comissão é aquele que não atribui nenhuma garantia ao seu ocupante, sendo de livre nomeação e de livre exoneração (art. 37, II, in fine, CR/88).

► QUESTÃO — A sentença penal condenatória pode acarretar a perda de cargo vitalício, n/f do artigo 92 do Código penal, ou só se refere a cargos efetivos, sendo preciso o ajuizamento de outra ação para esse fim ?

R: Para cargos vitalícios não se aplica o artigo 92 do CP. A LOMP (Lei 8.625/93), no artigo 38 §§ 1.º e 2.º, menciona AÇÃO CIVIL DE DECLARAÇÃO DE

PERDA DO CARGO . Assim, somente através dessa Ação é que o Promotor vitalício pode perder o cargo.

A LC 35/79 (LOMAN), em seu art. 27, bem como a Lei 8443/92 (LOTCU), em seu art. 73, não esclarecem sobre a necessidade de Ação Civil própria. Porém, entende-se que, assim como o MP, também não são atingidos pelo artigo 92 do CP.

► QUESTÃO — Existe distinção entre efetividade e estabilidade ?

R: São institutos diferentes, não se confundindo.A Efetividade é ligada ao cargo.Já a Estabilidade é característica do servidor público, que só a adquire após 3 anos de

exercício efetivo do cargo.Assim, nem todo ocupante de cargo público é estável.

► Existe estabilidade sem efetividade ?

R: Existe estabilização, no caso do art. 19 do ADCT. Porém, esta hipótese não é tecnicamente uma hipótese de estabilidade (trata-se apenas de estabilização).

Obs.: SUSPENSÃO DO EXERCÍCIO DO CARGO Estágio cumprido em um órgão público pode ser aproveitado em outro. Porém, excepcionalmente, se no primeiro cargo o servidor já tiver adquirido estabilidade,

pode ser mantido, com o exercício suspenso, sem qualquer remuneração, até que seja adquirida a estabilidade ou vitaliciedade no novo cargo, após o que serão servidos exonerado do antigo.

Não existe previsão legal dessa exceção. O Estatuto dos Servidores Civis do RJ não a prevê. Trata-se de entendimento de Carvalho Filho (Banca-MP).

Ressalte-se que a suspensão do exercício só é possível caso o servidor já seja estável no cargo anterior.

Obs.: FUNÇÃO DE CONFIANÇA / CARGO EM COMISSÃO Não se confundem (vide art. 37, V, CR/88).Função de Confiança só pode ser exercida por servidor de carreira. Cargo em comissão

admite ocupação por quem não está na carreira nem no quadro funcional, observada a porcentagem mínima de servidores de carreira.

II.5 – CRIAÇÃO E EXTINÇÃO DE CARGOS PÚBLICOS

Em regra, os cargos públicos são criados e extintos por LEI, da seguinte forma:

• No Poder Executivo = Mediante Lei de iniciativa reservada do Chefe do Executivo (art. 61 § 1.º, II, “a”, CR/88).

• No Poder Judiciário = Mediante Lei de iniciativa reservada do Presidente do Tribunal (art. 96, II, “b”, CR/88).

• No Ministério Público = Mediante Lei de iniciativa reservada do Procurador-Geral (art. 127 § 2.º, CR/88).

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70DIREITO ADMINISTRATIVO

• No Poder Legislativo = Trata-se de exceção à regra geral. A criação dos cargos é feita mediante Resolução da respectiva Casa Legislativa (art. 51, IV, CR/88).

► QUESTÃO — O Brasil admite Decreto Autônomo ?

R: O Decreto Autônomo é aquele que faz as vezes de Lei, isto é, que inova no ordenamento jurídico, buscando seu fundamento de validade diretamente na CR/88 (e não em Lei, excepcionando a pirâmide normativa).

O STF entendia inadmissível o Decreto Autônomo. Porém, com o advento da CE 32/01, o Direito Brasileiro passou a admitir expressamente o Decreto Autônomo, em uma única hipótese: Art. 82, VI, “b”, CR/8889 (entendimento pacífico).

O cargo vago pode ser extinto mediante Decreto Autônomo (esse dispositivo excepciona também o princípio da simetria das formas, pois o cargo criado mediante Lei é extinto mediante Decreto Autônomo).

II.5.1 – Provimento

Provimento é o ato administrativo que formaliza o preenchimento do cargo público. Há 2 formas de provimento:

a) Originário = Cria uma nova relação estatutária, seja porque o agente não era servidor público, seja porque já era servidor mas estava vinculado a outro quadro funcional da Administração Pública (ex: Nomeação).

b) Derivado = Não gera nova relação estatutária, pois o servidor público já era vinculado ao mesmo quadro funcional (ex: Promoção).

Obs.: INGRESSO O ingresso na carreira é sempre na classe inicial, sendo vedado o ingresso em classes

superiores. Porém, pode-se admitir contratação temporária.

► QUESTÃO — Admite-se ascensão funcional como forma de provimento válida ?

R: Ascensão funcional é a mudança de cargo, em carreiras diferentes, dentro do mesmo quadro funcional (ex: Escrivão de Polícia Civil passa a ser Delegado), após o servidor atingir a classe máxima da carreira originária.

O STF tem entendimento pacífico de que a ascensão é inconstitucional, por violar o princípio do concurso público (art. 37, II, CR/88)90.

II.5.2 – Regime Constitucional

O regime jurídico-constitucional dos servidores públicos efetivos encontra-se no artigo 37 da CR/88.

a) Acessibilidade

O acesso aos cargos públicos é permitido aos brasileiros natos e naturalizados, bem como a estrangeiros, observados os requisitos previstos em lei ou resolução (vide artigos 37, I; 51, IV; 52, XIII; 61 § 1.º, II, “c”; 96, I, “b”; 127 § 7.º; 207 § 1.º., todos da CR/88).

Os requisitos para o acesso ao cargo público podem ser mais ou menos restritos, conforme o próprio cargo.

Há cargos que são privativos de brasileiros natos (vide art. 12 § 3.º CR/88).

b) Concurso Público

89 “Artigo 84 – Compete privativamente ao Presidente da República: VI – dispor, mediante decreto, sobre: b) extinção de funções ou cargos públicos, quando vagos.”

90 Vide, a propósito, a ADIn n.º 362.

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71DIREITO ADMINISTRATIVO

O concurso público está previsto nos artigos 37, II, III e IV; 96, I; 127 § 2.º; 129 § 3.º; 131 § 2.º; 132 caput; 134 p.u., todos da CR/88).

Concurso Público é procedimento administrativo com o objetivo de aferição da capacidade intelectual, física e psíquica dos candidatos, bem como escolha dos melhores para provimento em cargo ou emprego público, segundo a complexidade das funções, e observada a ordem de classificação.

Trata-se do pressuposto para a investidura em cargo ou emprego público (salvo as exceções legais).

► Princípios do Concurso Público:• Competição;• Igualdade; • Moral Administrativa91.

► Procedimento do Concurso Público:Divide-se em 6 fases:

1- Regulamento Ato que veicula as matérias que serão objeto de questionamento —

conteúdo programático — e as normas gerais sobre organização e realização do concurso;

2- Edital Ato que torna pública a abertura do concurso, fixa os requisitos para o

ingresso na carreira, e convoca os candidatos a dele participarem. É no edital, e não no registro, que se abre o concurso92;

3- Inscrição Nesta fase, os candidatos declaram que satisfazem as condições

previstas no edital. A inscrição pode ser provisória ou definitiva, conforme o edital. É obrigatória a previsão de recurso administrativo contra o eventual

indeferimento da inscrição);

4- Provas Atos praticados perante Bancas Examinadoras conforme critérios

objetivos previstos no edital e segundo as matérias estabelecidas no regulamento;

5- Resultados Ato que ordena os candidatos aprovados segundo sua classificação;

6- Homologação Ato que declara válido o concurso.

► QUESTÃO — Admite-se fixação de altura, sexo, idade, etc., em edital de concurso público ?

R: SIM, desde que em conformidade com o conteúdo ocupacional do cargo (entendimento do STF).

► QUESTÃO — Admite-se a previsão teste psicotécnico como fase eliminatória ?

R: SIM, desde que embasado em critérios objetivos pré-fixados, e com possibilidade de defesa. É possível até mesmo o caráter eliminatório, observadas essas condições.

91 Doutrina de Marcelo Caetano.

92 O concurso é aberto com a publicação do edital, feita após a aprovação do regulamento.

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72DIREITO ADMINISTRATIVO

► QUESTÃO — Admite-se a previsão de exigência de qualificação profissional ?

R: SIM, desde que seja necessária ao exercício do cargo.O STF entende que a qualificação profissional deve ser aferida na data da posse (pois a

exigência não é para a participação no concurso, e sim para o exercício do cargo).Porém, o OETJ/RJ entende que a data de aferição da qualificação profissional do candidato

é o último dia do prazo de inscrição93.

► QUESTÃO — Admite-se investigação social em concursos públicos (ex: investigação sobre a existência de IPL, Ação Penal ou Termo Circustanciado em nome do sujeito) ?

R: SIM, pois isso não fere a presunção de inocência94. Como não se trata de ação penal, e sim procedimento administrativo de concurso público, não se pode argüir a violação desse princípio.

Ademais, não é a existência de IPL sobre o candidato que vai impedir a sua participação no certame, mas sim o seu comportamento inadequado95 (aferido pela existência de IPL).

► QUESTÃO — A impugnação do edital deve ser prévia ?

R: SIM, sob pena de presumir-se a concordância do candidato com os termos do edital. O fundamento desse entendimento é a aplicação do artigo 41 da Lei 8.666/93 (entendimento do TJ/MG — vide Apelação 71.883).

► QUESTÃO — Prova Oral.

R: O STJ considera válida a aplicação de prova oral, inclusive em fase eliminatória, e até mesmo mediante critério subjetivo (embora haja quem entenda, minoritariamente, que a prova oral fere o princípio da impessoalidade, porque nela o candidato se apresenta à Banca).

► QUESTÃO — Não estando prevista no edital do concurso público isenção de taxa de inscrição, existe algum meio de pleitear tal isenção ?

R: SIM. Cabe Mandado de Segurança, com pedido de liminar (Art. 72, II, ADCT-CERJ). O direito de acesso a cargo público é direito fundamental, tendo eficácia imediata (art. 5.º

CR/88).Ressalte-se que a PGE não aceita essa tese, sustentando que essa norma é de eficácia

limitada. Assim, não havendo lei regulamentar, a lei não é aplicável.

► QUESTÃO — É possível o controle judicial sobre os critérios da Banca examinadora e quanto à atribuição de notas ?

R: NÃO, pois trata-se de mérito administrativo, havendo discricionariedade. Porém, se houver motivação dos critérios e das notas, pode haver o controle judicial, com

base na teoria dos motivos determinantes.

► QUESTÃO – Candidato aprovado em concurso público homologado tem direito adquirido à nomeação ?

93 O prof. Guilherme Peña critica essa posição do OETJ/RJ, por entender que viola o princípio da razoabilidade (o fundamento da posição do TJ/RJ seria a igualdade entre os que se inscrevem sem ter o requisito e os que não se inscrevem por o terem. Todavia, trata-se de igualdade hipotética, sendo irrazoável a posição do TJ/RJ)..94 Segundo Antônio Scarance, a presunção de inocência é uma regra de tratamento (vedando o tratamento de culpado antes da condenação) e de prova (impondo o ônus da prova da culpa a quem acusa).

95 Exemplo: Inquérito aberto em virtude de delito culposo de trânsito não é suficiente para caracterizar comportamento inadequado para fins de concurso público, não podendo o candidato ser eliminado apenas por isso.

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73DIREITO ADMINISTRATIVO

R: Em regra não, pois há mera expectativa de direito à nomeação. Porém, no caso de preterição de ordem há o direito adquirido do preterido (Súmula 15/STJ).

Já a nomeação gera direito à posse (Súmula 16/STJ)96.

► QUESTÃO — É possível a abertura de concurso público durante o prazo de validade do anterior, havendo candidatos aprovados ?

R: Segundo o STF e o STJ, SIM, desde que seja respeitada a ordem classificatória do 1.º concurso e depois do 2.º, e desde que não fique configurado abuso de poder (ex: esperar o fim do prazo do 1.º concurso para nomear os aprovados no 2.º, fraudando a ordem de classificação).

► QUESTÃO — Candidato aprovado em concurso que está sub judice tem direito à nomeação ?

R: Não se aplica no caso a teoria do fato consumado (oriunda do Direito Francês, pela qual uma situação constituída ilegalmente mediante concessão de liminar — concedida em face do periculum in mora — é convalidada).

► QUESTÃO — A norma do artigo 77, VII, da CERJ é constitucional (prevê 180 dias para a investidura — nomeação, posse e exercício) ?

R: Trata-se de norma Inconstitucional, pois fere o poder discricionário da autoridade nomeante (que nomeia se e quando quiser, conforme critérios de conveniência e oportunidade).

Vide RE 190.264 — STF.

► QUESTÃO — A então Governadora do Estado do RJ nomeou candidatos aprovados em concurso para a polícia Civil no último dia de seu mandato. Sua sucessora não deu posse aos nomeados, alegando que a nomeação fora ilegal por ferir a Lei de Responsabilidade Fiscal. Houve violação da LRF ?

R: • PGE = O ato de nomeação é nulo por violar a LRF.• MP; TJ/RJ = O ato é válido, pois não se criou despesa, já que não houve posse e exercício.

Embora em regra a nomeação dê direito à posse, isso não necessariamente ocorre, pois o concurso pode ser anulado.

► QUESTÃO — É comum a concessão de liminares de índole antecipatória em favor de candidatos em concursos públicos, contra o Poder Público. Assim, pergunta-se: Cabe a concessão de Antecipação de Tutela contra o Poder Público inaudita altera pars ?

R: O artigo 1.º da Lei 9.494/97 veda a concessão de Antecipação de Tutela contra o Poder Público inaudita altera pars, somente permitindo a concessão de tal medida após a manifestação da Fazenda. O STF declarou essa norma constitucional.

Por outro lado, o Enunciado n.º 6 do I Encontro de Juízos das Varas da Fazenda Pública é no sentido do cabimento da medida, inclusive sem a manifestação do Poder Público, ainda que importe em devolução de dinheiro, desde que seja caso de restabelecimento de direito.

Há ainda o Enunciado n.º 11 do Encontro dos Juízes do TJ/RJ, no mesmo sentido, autorizando a medida.

II.6 – LIBERDADE DE ASSOCIAÇÃO DOS SERVIDORES PÚBLICOS (art. 37, VI, CR/88)

A atividade sindical do servidor público se distingue da do empregado privado.

Com efeito, a atividade sindical do empregado privado compreende reivindicação social (por melhores condições) e reivindicação econômica (por melhores salários).

96 O STF entende que a posse deve ser em prazo razoável (em torno de 30 dias).

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74DIREITO ADMINISTRATIVO

Já a do servidor público se resume à reivindicação social (por melhores condições), uma vez que a remuneração é fixada por lei, não podendo ser portanto objeto de reivindicação.

Quanto ao enquadramento social, no regime privado existem 2 categorias: econômica (patronal) e profissional (empregados). Já no serviço público só há a categoria profissional (pois o Estado não tem o intuito de obtenção de lucro com a prestação do serviço público).

Obs.: PARTICIPAÇÃO DE SERVIDOR PÚBLICO EM CENTRAL SINDICAL Central sindical não é sindicato. É pessoa jurídica de direito privado que congrega

sindicatos97. Assim, o STF admite que servidor público integre tais Centrais.

II.7 – DIREITO DE GREVE DO SERVIDOR PÚBLICO

O artigo 37, VII, da CR/88 prevê o direito de greve dos servidores públicos, “nos termos e nos limites definidos em lei específica”.

Trata-se de norma constitucional de eficácia limitada. Não há lei regulando o exercício do direito de greve pelos servidores públicos.

Diante deste quadro, o STJ entende que o direito de greve dos servidores públicos não pode ser exercido, porque ainda não foi regulado. Assim, toda greve é ilegal e inconstitucional, sendo possível inclusive o desconto em folha dos dias perdidos em função da greve, independentemente de autorização judicial (vide MS 4.288 — STF).

II.8 – RETRIBUIÇÃO PECUNIÁRIA

Em regra a retribuição pecuniária dos servidores públicos tem a forma de REMUNERAÇÃO . Excepcionalmente, porém, pode consistir em SUBSÍDIO .

A remuneração é subdividida em: a) Vencimentos; b) Vantagens Pecuniárias.

Obs.: PROVENTO É a remuneração dos servidores aposentados.

II.8.1 – Vencimento

Vencimento é a parcela da remuneração do servidor público fixada por lei e devida pelo exercício da função pública. Em outras palavras, é a parcela fixa da remuneração.

II.8.2 – Vantagens

As vantagens decorrem da ocorrência de determinados fatos, enumerados em lei. São portanto a parcela acrescida.

As vantagens se dividem em Adicionais (de tempo de serviço ou de função) e Gratificações (de serviço ou pessoais).

Os Adicionais são acrescidos de forma definitiva ao vencimento, sendo incorporados (permanecem mesmo que a função exercida deixe de apresentar as condições que levaram à concessão do adicional).

Já as Gratificações são temporárias, não tendo caráter definitivo. Só duram enquanto permanecer a condição que lhes deu ensejo.

• Adicional de Tempo de Serviço = decorre do tempo de exercício de função pública (não necessariamente a mesma) — ex: triênios.

• Adicional de Função = decorre da função exercida.

97 Não há lei definindo o que sejam as Centrais Sindicais. Há apenas 3 diplomas normativos aludindo a tais entidades: Art. 18 § 3.º da Lei 7.998/90; Art. 3.º § 3.º da Lei 8.036/90; Art. 3.º § 2.º da Lei 8.213/91).

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75DIREITO ADMINISTRATIVO

• Gratificação de Serviço = decorre das condições do serviço (de segurança; de onerosidade; de salubridade).

• Gratificações Pessoais = decorrem de circunstâncias pessoais do servidor (ex: gestante).

Obs.: PREMIAÇÃO EM PECÚNIA POR MÉRITO ESPECIAL ( Gratificação por Bravura ) Trata-se de gratificação atribuída a PM, Bombeiro ou Policial Civil, por ato considerado de

bravura. A concessão é feita mediante ato individualizado do Governador do Estado.

Esta premiação foi prevista pelo Decreto Estadual n.º 21.753/95. Porém, foi revogada, genericamente, pelo Decreto Estadual n.º 26.249/00.

Discute-se, portanto, se as gratificações já concedidas validamente, na vigência do Decreto inicial, foram revogadas automaticamente pelo segundo Decreto (que é genérico), ou se devem ser revogadas individualmente.

Tratando-se de gratificação de serviço (concedida devido a questões de segurança da função), o TJ/RJ entende que há incorporação, apesar de ser gratificação. Assim, tendo sido concedida de forma motivada e individual a cada servidor contemplado, não pode ser revogada por ato genérico (tecnicamente não se trata de incorporação, que não cabe nas gratificações, mas sim de falta de revogação válida, pois a revogação deve ser individual e motivada, pelo princípio da simetria).

Ressalte-se que a eventual prisão do servidor não afasta essa gratificação por si só, podendo entretanto ser a motivação necessária para a revogação individual da gratificação.

II.8.3 – Subsídio

Subsídio é a espécie de remuneração do servidor público fixada em parcela única, vedado acréscimo de qualquer outra espécie remuneratória (art. 39 § 4.º, CR/88).

A fixação do subsídio é feita através de Lei de iniciativa comum dos Presidentes da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, do STF e da República República (art. 48, XV, CR/88) — única hipótese de lei de iniciativa comum. Diante da dificuldade de se unir todos esses agentes para a composição desse Projeto de Lei, ainda não existe a Lei. Logo, no Brasil ainda não foi implantado o sistema de subsídios.

Cargos para os quais a CR/88 prevê remuneração mediante subsídio:

a) Chefes do Executivo e seus auxiliares diretos (art. 39 § 4.º);b) Membros das Casas Legislativas (art. 39 § 4.º);c) Magistrados (art. 95, III);d) Membros do Ministério Público (art. 128 § 5.º, I, “c”);e) Membros das funções essencias à Justiça — AGU, DP, PGE, PGM (art. 135).

► QUESTÃO — Subsídio é remuneração própria de Agente Político ?

R: NÃO. A princípio, são atribuídos a agentes políticos, mas podem excepcionalmente ser fixados para outros servidores organizados em carreira, como por exemplo os policiais(vide art. 39 § 8.º e art. 144 § 9.º, CR/88)98.

Obs.: TETO RETRIBUTIVO É o valor máximo do subsídio. Atualmente é unificado, estando previsto no artigo 37, XI, in

fine, da CR/88 (o parâmetro é o subsídio do Ministro do STF).

► QUESTÃO — Admite-se Lei Estadual fixando teto retributivo unificado estadual ?

R: NÃO, pois não há valor fixado a nível federal (STF), de modo que não há parâmetro a ser seguido , o que abriria espaço para possíveis distorções (ex: um Desembargador ganhar mais do que um Ministro do STF).

98 O artigo 39 § 8.º da CR/88 é norma constitucional de eficácia limitada, precisando pois de norma infraconstitucional regulamentadora.

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76DIREITO ADMINISTRATIVO

► QUESTÃO — É possível, na hipótese de haver fixação de teto, que alguém receba acima do subsídio, sem que a questão se ligue a direito adquirido ?

R: Sim, pois o teto não se aplica às Empresas Públicas e às Sociedades de Economia Mista que não recebem recursos do Estado para pagamento de despesas de pessoal e outras em geral (vide art. 37 §§ 8.º e 9.º, CR/88).

Exemplo: PETROBRÁS (não se sujeitará ao teto quando este for fixado, pois é Empresa Pública e não recebe recursos do Estado para o pagamento de despesas de pessoal e outras.

► QUESTÃO — Quando for fixado o teto, aqueles que recebem acima do valor fixado terão direito adquirido a manterem as remunerações ?

R: Segundo entendimento do STF, quem recebe mais do que o teto NÃO tem direito adquirido a manter a remuneração, que será reduzida para se enquadrar ao teto quando este for fixado (art. 29, EC 19/98).

Na doutrina ainda existe discussão acerca da possibilidade de direito adquirido em face de norma constante de Emenda à Constituição (o professor Guilherme Peña entende que há o direito adquirido, mas está resignado com a posição da jurisprudência diante do artigo 29 da EC 19/98).

II.8.4 – Isonomia / Paridade / Equiparação / Vinculação

ISONOMIA e PARIDADE presumem igualdade ou similitude de atribuições dos cargos. Na Isonomia os cargos são do mesmo Poder de Estado (ex: Defensor Público e procurador do estado). Na Paridade os cargos pertencem a Poderes de Estado diferentes (ex: Procurador do estado e Procurador da ALERJ) — vide art. 39 § 1.º, CR/88.

Por outro lado, EQUIPARAÇÃO e VINCULAÇÃO pressupõem cargos com atribuições diferentes. Na Equiparação há relação de comparação horizontal entre cargos de atribuições diferentes, sem hierarquia, para conferir-lhes a mesma remuneração (ex: Juiz e Promotor). Na Vinculação há uma relação de comparação vertical com hierarquia entre cargos com atribuições diferentes, com o fim de manter a mesma diferença de retribuição com o passar do tempo (ex: Juiz e TJJ) — vide art. 37, XIII, da CR/88.

A CR/88 admite a Isonomia e a Paridade (art. 39 § 1.º). Porém, a equiparação e a vinculação são vedadas (art. 37 XIII).

Obs.: EQUIPARAÇÃO ENTRE PROMOTOR DE JUSTIÇA E JUIZ Recentemente foi liminarmente declarado inconstitucional um dispositivo da LOMP que

previa a equiparação remuneratória entre Promotor e Juiz, o que a CR/88 veda expressamente, como visto.

II.8.5 – Acumulação Remunerada de Cargos (art. 37, XVI, CR/88)

A acumulação GRATUITA de cargos é possível , não havendo vedação legal.

Porém, a acumulação remunerada só será possível se estiverem presentes os requisitos e preenchidas as hipóteses constitucionais.

• Requisitos:- Compatibilidade de Horários;- Observância do Teto retributivo unificado.

• Presentes os requisitos, será possível a acumulação nas hipóteses previstas expressamente na CR/88:

- Art. 37, XVI, “a” , “b” , “c”.- Art. 95 p.u., I.- Art. 128 § 5.º, II, “d”.- Art. 38, III, initio.

Obs.: ACUMULAÇÕES PERMITIDAS PARA MAGISTRADOS E PROMOTORES DE JUSTIÇA Existe diferença entre as normas de acumulação para Juízes e Promotores.O Juiz pode exercer um único magistério público ou privado.Já o Promotor pode exercer um único magistério público, e vários privados.

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77DIREITO ADMINISTRATIVO

► QUESTÃO — É possível a acumulação de remuneração com proventos ? E de proventos com proventos ? E a acumulação tríplice ?

R: A acumulação de proventos com remuneração é possível, desde que os cargos respectivos sejam hipoteticamente acumuláveis em atividade (entendimento do STF) — exemplo: não se pode acumular cargo de Juiz e aposentadoria como Juiz.

Da mesma forma, a acumulação de proventos com proventos também é admissível desde que os cargos sejam hipoteticamente acumuláveis em atividade (entendimento também do STF) — exemplo: não se pode acumular 2 aposentadorias de Juiz.

No entanto, a acumulação tríplice é sempre vedada.

Obs.: CARGOS ELETIVOS E ACUMULAÇÃO (art. 39 CR/88)O servidor que ocupar cargo eletivo estadual, federal ou Distrital deve se afastar

temporariamente do seu cargo público originário, sem remuneração, enquanto exercer o mandato.

Prefeito Municipal deve se afastar temporariamente de seu cargo público original, sem remuneração, enquanto durar o mandato.

Quanto ao Vereador, se houver compatibilidade de horários, pode haver a acumulação remunerada, desde que seja observado o teto unificado. Porém, se não houver compatibilidade, deve haver afastamento temporário do cargo original, com opção de remuneração.

Obs.: CARGOS EM COMISSÃO E ACUMULAÇÃO Cargos em comissão não admitem acumulação remunerada (pois não há qualquer

previsão constitucional nesse sentido).

II.8.6 – Previdência Social do Servidor Público

QUADRO GERAL DO SISTEMA DE PREVIDÊNCIA SOCIAL

PREVIDÊNCIA

SOCIAL PRIVADA (art. 202 CR/88)

Regime Próprio (art. 40 CR/88)

RGPS (art. 201 CR/88) – L.8213/91

Em Regime Aberto (capital aberto)

Em Regime Fechado (capital fechado)

Cada ente Federativo tem seu regime próprio de Previdência Social, aplicável a todos os seus servidores em cargos efetivos (ex: União = Lei 8112/90 e Lei 6880/80).

O Regime Geral (RGPS), previsto na Lei 8.213/91, é aplicável a todas as entidades federativas, aplicando-se aos servidores ocupantes de cargos em comissão, aos empregados públicos, aos contratados e aos empregados contratados.

Obs.: OBRIGATORIEDADE DE EXISTÊNCIA DE REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA SOCIAL É obrigatória a existência de Regime Próprio de Previdência Social para a União, sendo

facultativa para os demais entes federativos (que podem criá-lo ou não, conforme sua discricionariedade).

Os entes que não tiverem regime próprio serão regidos pelo RGPS (Lei 8.213/91). Os que criarem regime próprio deverão fazê-lo na forma da Lei 9.717.

Em qualquer caso, aplica-se o RGPS nas lacunas eventualmente existentes nos regimes próprios.

III – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

O tema da Improbidade Administrativa é regido pelos artigos 15, V, e 37 § 4.º, ambos da CR/88. Quanto á fundamentação legal, encontra-se na Lei 8.429/92.

III.1 – CONCEITO

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78DIREITO ADMINISTRATIVO

IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA consiste nos “atos revestidos de natureza cível e tipificados em Lei Ordinária Federal que atentem contra princípio a Administração Pública, ainda que não importem em enriquecimento ilícito ou prejuízo ao erário”.

Segundo Ives Gandra, “são atos ilegais, ilegítimos ou ilícitos voltados para a corrupção”.

São 2 as características da Improbidade Administrativa:

a) Ato de natureza cívelNão é crime, sendo ilícito civil (embora o mesmo ato possa ser ilícito civil, penal e

político-administrativa — cada qual perquirido por ação própria99).

b) Ato tipificado em Lei Ordinária FederalO tipo é aberto, contendo enumeração meramente exemplificativa (basta a

configuração dos requisitos para que haja a improbidade administrativa, ainda que não haja expressa previsão legal do ato).

III.2 – SUJEITOS

III.2.1 – Ativo

• Atos de Improbidade Administrativa Própria = Agente Público (em sentido amplo), pois só ele pode praticar tais atos.

• Atos de Improbidade Administrativa Imprópria = Beneficiário ou partícipe do ato, ainda que não esteja vinculado à Administração Pública100.

III.2.2 – Passivo

São 5 os possíveis sujeitos passivos de atos de improbidade administrativa:

• Órgão da Administração Pública Direta;• Entidade da Administração Pública Indireta;• Empresas (ainda que privadas) incorporadas ao patrimônio público;• Empresas (ainda que privadas) que recebem algum incentivo financeiro (ex: subsídio) ou tributário (ex: isenção);• Empresas (ainda que privadas) cuja criação ou manutenção dependeu ou depende de no mínimo 50 % de capital público101.

Obs.: IMPROBIDADE PRATICADA POR PARTICULAR, E CONTRA PARTICULAR Ressalta-se que a Improbidade Administrativa pode ser praticada por particular (no caso

da improbidade administrativa imprópria), e inclusive em prejuízo de particular (no caso de empresas privadas que recebem incentivos, ou que são incorporadas ao patrimônio público, ou que dependem em 50 % de patrimônio público para a sua criação ou manutenção).

III.3 – CLASSIFICAÇÃO (TIPOLOGIA) DOS ATOS DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

III.3.1 – Atos que impliquem em enriquecimento ilícito

Estão previstos no artigo 9.º da Lei 8.429/92. Trata-se de TIPO ABERTO .

• REQUISITOS CUMULATIVOS:

- Conduta Dolosa;- Obtenção de vantagem patrimonial indevida; - Nexo de Oficialidade entre o exercício da função e a vantagem patrimonial indevida.

99 Ação de Improbidade Administrativa versa sobre matéria CIVIL , não perquirindo sobre ilícito penal.

100 Semelhante extensão do conceito está no artigo 327 do CP.

101 O 3.º Setor da Administração Pública (ex: ONG’s) é abrangido pelo conceito de Improbidade Administrativa.

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79DIREITO ADMINISTRATIVO

Obs.: ÔNUS DA PROVA DO DESEQUILÍBRIO ENTRE O PATRIMÔNIO E A RENDA DO AGENTE PÚBLICO Discute-se se basta a prova do desequilíbrio para a configuração da improbidade

administrativa, ou se é necessária a prova dos 3 requisitos:A 1.ª Corrente (Wallace Paiva Martins Jr) entende que basta a prova do desequilíbrio,

invertendo-se o ônus da prova quanto aos demais requisitos.Já a 2.ª Corrente (Alexandre de Moraes; Guilherme Peña) entende que é necessária a

prova de todos os requisitos cumulativos para a configuração da improbidade administrativa, pois não há norma legal autorizando a inversão do ônus da prova102.

O STJ e o STF adotam a 2.ª CORRENTE, que prevalece.

III.3.2 – Atos que importem em prejuízo ao erário

Estão previstos no art. 10 da Lei 8.429/92. Trata-se também de TIPO ABERTO .

• REQUISITOS CUMULATIVOS :

- Conduta dolosa ou culposa103;- Lesão ao patrimônio público;- Nexo de oficialidade entre a conduta e a lesão ao patrimônio público.

► QUESTÃO — A lesão ao patrimônio público caracterizadora de improbidade administrativa nessa modalidade é exclusivamente econômico-financeira, ou pode ser de outra índole (ex: moral, ambiental, etc.) ?

R: São 2 as correntes a respeito.• 1.ª Corrente (Fernando Rodrigues Martins) = A lesão tem que ser exclusivamente

econômico-financeira.• 2.ª Corrente (Emerson Garcia) = Admite-se a caracterização da improbidade

administrativa por qualquer tipo de lesão, inclusive moral.Prevalece a 2.ª CORRENTE, abraçada pelo STJ e pelo STF.

III.3.3 - Atos que atentem contra os princípios da Administração Pública

Estão previstos no art. 11 da Lei 8.429/92. Trata-se de TIPO SUBSIDIÁRIO (ocorre quando não há prova dos outros tipos — ato imoral de que não se tenha prova do prejuízo ao erário ou do enriquecimento ilícito)104.

• REQUISITOS CUMULATIVOS - Conduta dolosa;- Violação de princípios constitucionais (art. 37 CR/88) ou legais da Administração

Pública;- Nexo de oficialidade.

III.4 – SANÇÕES COMINADAS

O Artigo 37 § 4.º da CR/88 faz menção a 3 sanções por atos de improbidade administrativa:

102 A inversão do ônus da prova é medida processual de caráter excepcional. Portanto, sua aplicação precisa ser autorizada por norma legal expressa.

103 Esta é a única hipótese de ato de improbidade administrativa praticado mediante conduta culposa.104 Exemplo apontado pelo professor como sendo de possível improbidade administrativa pela violação de princípio da Administração Pública: Os bancos colocados na Praia de Icaraí têm o formato de um “J”, inicial do nome do Prefeito de Niterói na ocasião da colocação dos bancos (Jorge Roberto Silveira). Isso em tese fere o princípio da impessoalidade.

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80DIREITO ADMINISTRATIVO

• SUSPENSÃO DOS DIREITOS POLÍTICOS;

• PERDA DA FUNÇÃO PÚBLICA 105;

• RESSARCIMENTO AO ERÁRIO .

O Artigo 12 da Lei 8.429/92 prevê ainda outras sanções:

• PERDA DOS BENS E VALORES ACRESCIDOS IRREGULARMENTE AO PATRIMÔNIO DO AGENTE;

• MULTA CIVIL;

• PROIBIÇÃO DE CONTRATAR COM O PODER PÚBLICO OU RECEBER BENEFÍCIOS FISCAIS OU CREDITÍCIOS .

Obs.: PREVISÃO LEGAL DE SANÇÕES Não é inconstitucional a previsão de outras sanções além das previstas na CR/88, pois a

previsão constitucional é mínima.

Obs.: APLICAÇÃO CUMULATIVA DE SANÇÕES Não é necessária a aplicação cumulativa de todas as sanções previstas, devendo o Juiz

aplicá-las conforme a gravidade do fato e o grau de culpa do agente (princípio da individualização da pena).

III.5 – ASPECTOS PROCESSUAIS

III.5.1 – Ação Cabível

A doutrina se divide em 2 correntes a respeito do cabimento de Ação Civil Pública no caso de Improbidade Administrativa.

• 1.ª Corrente (Carvalho Filho – Banca MP) = Se a hipótese for de ressarcimento ao erário, não cabe ACP, conforme disposto no artigo 17 da Lei 8.429/92106. Nesse caso caberia, portanto, Ação de Improbidade Administrativa.

• 2.ª Corrente (STJ; STF; MP) = Cabe ACP em qualquer hipótese, pois o artigo 129, III, da CR/88 prevalece sobre a lei, por ser norma constitucional. O STJ admite até mesmo, em caso de lesão ao erário, ACP proposta pelo MP, e não apenas pelo ente público lesado.

Prevalece a 2.ª CORRENTE.

Obs.: AÇÃO CIVIL PÚBLICA / AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA São Ações semelhantes, mas não se confundem, apresentando algumas diferenças:a) Legitimidade Ativa = Na Ação de Improbidade é mais restrita, porque Associações

não têm legitimidade (só o MP e os entes públicos lesados têm legitimidade).b) Informações Prévias = Na Ação de Improbidade Administrativa há a previsão de

informações prévias, antes da citação do réu, o que não há na ACP.c) Conteúdo da Sentença = Na Ação de Improbidade, as sanções são clausuladas (só se

pode graduar as sanções, mas não se pode aplicar outra além das previstas), ao contrário da ACP, que admite qualquer sanção.

III.5.2 – CONDIÇÃO ESPECÍFICA

Discute-se se o exercício da ACP exige, como condição específica, a rejeição das contas pelo respectivo Tribunal de Contas.

Uma corrente entende que a rejeição das contas é condição específica. Porém prevalece o entendimento de que não há essa condição específica, não sendo condicionado o

105 Indisponibilidade de bens não é sanção, mas sim medida cautelar típica .106 A Lei prevê procedimento ordinário, e a ACP tem procedimento especial. Por isso é incabível nesse caso, cabendo Ação de Improbidade Administrativa.

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81DIREITO ADMINISTRATIVO

exercício da ACP ao prévio exaurimento da via administrativa (princípio da inafastabilidade da jurisdição — art. 5.º XXXV, CR/88)107.

Obs.: INQUÉRITO CIVIL COMO CONDIÇÃO ESPECÍFICA Não prevalece a tese de Wilney Magno, de que o Inquérito Civil é condição específica para

o exercício da ACP. É amplamente majoritário o entendimento de que o Inquérito Civil é dispensável, podendo

a ACP ser proposta independentemente da existência de tal inquérito.

► QUESTÃO — O TCU seria o Juiz Natural para o julgamento das contas dos agentes políticos em exercício junto aos respectivos entes ?

R: Carvalho Filho entende que NÃO, porque a única função de Estado que não admite exercício atípico é a Jurisdicional, logo a atuação do TC tem natureza meramente administrativa, não afastando a competência do Judiciário.III.5.3 – Competência

A Lei 10.628/02 prevê foro especial por prerrogativa de função, alterando o artigo 84 do CPP. Discute-se, portanto, se na Ação de Improbidade Administrativa cabe foro por prerrogativa de função.

Qual seria, portanto, o Juízo Competente ? A Lei 10 628/02 é constitucional ?

• ANTES DA LEI 10.628/02:- 1.ª Corrente (Ives Gandra; Gilmar Mendes) = Já existia o foro especial, em virtude da

extrema gravidade das sanções aplicáveis.- 2.ª Corrente (Fábio Konder Comparato; Guilherme Peña) = Não havia foro especial, pois

o ato de improbidade administrativa é ilícito civil, e só há foro especial nos casos de ilícito penal.Prevalecia a 2.ª CORRENTE, adotada pelo STJ e pelo STF.

• DEPOIS DA LEI 10.628/02:- Entendimento Amplamente Majoritário (Hugo Mazzilli; Damásio de Jesus108; MP109; TJ/RJ110)

= A Lei é manifestamente inconstitucional, porque a competência do STF, STJ, TRF e TJ é fixada em norma constitucional (federal ou estadual, conforme o caso), não cabendo ampliação dessa competência mediante Lei Ordinária. Trata-se, portanto, de hipótese de flagrante inconstitucionalidade formal. Além disso, não se deve confundir a Ação de Improbidade Administrativa (de natureza civil) com Ação Penal, pois cada qual é julgada pelo respectivo Juízo competente (o foro especial só vale para a Ação Penal).

Existe ADIn em trâmite perante o STF acerca dessa Lei (não foi concedida liminar). Há também Reclamação em trânsito perante o STF, pugnando pelo reconhecimento de que Agente Político não pratica ato de improbidade administrativa, mas apenas crime de responsabilidade.

O STF, segundo o professor Guilherme Peña, deve decidir politicamente, no sentido de que a Lei 10.628/02 é inconstitucional, porém reconhecendo que Agente Público não pratica ato de improbidade administrativa, mas apenas crime de responsabilidade111.

III.5.4 – Partes

Como visto, a legitimidade ativa na Ação de Improbidade Administrativa é da Pessoa Jurídica de Direito Público lesada e do MP.

107 A única exceção constitucional ao princípio da inafastabilidade da jurisdição (art. 5.º, XXXV) é quanto ao Direito Desportivo, em que se condiciona o exercício da Ação ao exaurimento da via administrativa (art. 217 § 1.º, CR/88).

108 Vide texto de Damásio E. de Jesus constante no endereço www.cjdj.com.br (janeiro/03).

109 Vide Resolução GPGJ n.º 1.129/03.

110 Decisão recentemente proferida pela 1.ª Vice-Presidência do TJ/RJ.

111 Reconhecendo-se que o agente político não pratica ato de improbidade administrativa, mas apenas crime de responsabilidade, a competência para o julgamento de seus atos será do Poder Legislativo, e não do Poder Judiciário. Assim, todas as ações em trâmite serão extintas sem julgamento do mérito, por impossibilidade jurídica do pedido. A doutrina em peso critica essa posição.

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82DIREITO ADMINISTRATIVO

Se a Ação for proposta pela Pessoa Jurídica, o MP atuará obrigatoriamente como custus legis (órgão interveniente).

Se for proposta pelo MP, a Pessoa Jurídica deve ser intimada para, querendo, integrar o pólo ativo da Ação (a falta dessa intimação gera nulidade absoluta do processo).

► QUESTÃO — A Pessoa Jurídica lesada pode usar sua representação jurídica para defender o agente réu, a ela vinculado, em Ação de Improbidade Administrativa (ex: em Ação de Improbidade proposta em face do Governador do Estado, pode este ser defendido pelo Procurador-Geral do Estado) ?

R: • 1.ª Corrente (Sérgio Sérvulo da Cunha) = SIM, por aplicação da Teoria do Órgão (o agente praticou tais atos não em nome próprio, mas em nome da Pessoa Jurídica, sendo admissível que esta use sua Procuradoria para defender o agente).

• 2.ª Corrente (Jurisprudência Pacífica do STF e do STJ) = NÃO, por ser imoral. A própria atuação da Procuradoria em favor do agente já caracterizaria novo caso de improbidade administrativa.III.5.5 – Medida Liminar e Decisão de Mérito

São 6 as sanções cabíveis na Ação de Improbidade Administrativa, já analisadas anteriormente.

CABE LIMINAR (ex: medida cautelar típica de indisponibilidade dos bens do réu até o trânsito em julgado).

► QUESTÃO — Cabe a aplicação da medida cautelar de indisponibilidade dos bens adquiridos pelo agente antes da vigência da Lei 8.429/92 ?

R: • 1.ª Corrente (Alexandre Moraes, STJ) = NÃO, sob pena de a lei retroagir em prejuízo do réu, o que a CR/88 veda expressamente.

• 2.ª Corrente (Emerson Garcia) = SIM, porque a vedação constitucional só se refere a Ações Penais, e a Ação de Improbidade é Ação Civil, não havendo óbice.

III.5.6 – Prazo Prescricional

O artigo 23 da Lei 8.429/92112 prevê os prazos prescricionais aplicáveis á Ação de Improbidade Administrativa.

Obs.: PRAZO PRESCRICIONAL NO CASO DE LESÃO AO ERÁRIO O artigo 23 da Lei 8.429/92 não prevê prazo prescricional para a Ação de Improbidade

Administrativa por Lesão ao Erário.Assim, o STJ e o STF entendem que nesse caso a ação é imprescritível.

IV – BENS PÚBLICOS

IV.1 – REGÊNCIA

A matéria relativa aos bens públicos foi bastante alterada pelo NCC (Lei 10.40/01).

Os bens públicos são regidos pelas seguintes normas:

▪ Art. 20, CR/88 (bens dos Municípios);▪ Art. 26, CR/88 (bens dos Estados);▪ Art. 176 caput, CR/88 (bens da União);▪ Art. 16 § 3.º, ADCT (bens do DF);▪ Arts. 98/103, NCC.

112 “Art. 23 – As Ações destinadas a levar a efeito as sanções previstas nesta Lei podem ser propostas: I – até 5 (cinco) anos após o término do exercício de mandato, de cargo em comissão ou de função de confiança; II – dentro do prazo prescricional previsto em lei específica para faltas disciplinares puníveis com demissão a bem do serviço público, nos casos de exercício de cargo efetivo ou emprego.”

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83DIREITO ADMINISTRATIVO

IV.2 – CONCEITO

O melhor conceito de bens públicos é o seguinte: “bens de qualquer natureza pertencentes a pessoa jurídica de Direito Público que integra a Administração Direta (União, Estados, DF e Municípios) e Indireta (Autarquias e Fundações de Direuito Público), sob regime jurídico próprio”.

► QUESTÃO — Bens de Empresas Públicas e Sociedades de Economia Mista são considerados públicos ?

R: ▪ 1.ª Corrente (Hely Lopes Meirelles; Toshio Mukai) = São BENS PÚBLICOS DE USO ESPECIAL, pois no caso de extinção da estatal os bens revertem ao patrimônio da Administração Direta Instituidora.

▪ 2.ª Corrente (Carvalho Filho; Diógenes Gasparini; Marcos Juruena) = São BENS PRIVADOS, pois não têm um atributo que é próprio dos bens públicos: a impenhorabilidade. O fato de a Administração Pública Direta responder subsidiariamente em caso de a penhora não saldar o débito não descaracteriza a natureza privada dos bens.

Prevalece a 2.ª CORRENTE.Ressalte-se que o artigo 98 do NCC (que revogou o artigo 65 do CC/16) prescreve que só

são públicos os bens das pessoas jurídicas de Direito Público, o que, segundo o professor Guilherme Peña, encerra a questão (os bens das estatais são privados).

IV.3 – CLASSIFICAÇÃO DOS BENS PÚBLICOS (art. 66 CC/16 ; art. 99 NCC)

IV.3.1 – De uso comum do povo

São afetados (por destinação natural, lei ou ato administrativo) ao uso e fruição geral da coletividade.

Exemplos: praias; praças; ruas; mar; rio; etc.

IV.3.2 – De uso especial

São afetados (por lei ou ato normativo, mas nunca por destinação natural) à prestação descentralizada de serviço público.

Exemplos: prédios públicos; repartições públicas; etc.

IV.3.3 – Dominiais (ou dominicais)

Não possuem finalidade pública (são desafetados).

Exemplos: terras devolutas; dívida ativa; moedas; etc.

IV.4 – CRITÉRIOS PARA A DISTINÇÃO ENTRE AS ESPÉCIES DE BENS PÚBLICOS

IV.4.1 – Quanto à utilização

a) De uso comum Usados por pessoas indeterminadas (qualquer um do povo), desde

que estejam em conformidade com sua destinação jurídica; que o uso não cause sobrecarga invulgar (uso excessivo); e que não seja necessária comunicação à autoridade administrativa.

Admite-se utilização remunerada desde que, paga a taxa, não haja restrição ao uso (ex: Maracanã).

Em determinados casos pode haver restrição ao uso, por questões de segurança e higiene (ex: interdição de praias por estarem impróprias ao banho).

b) De uso especialUsados por pessoas determinadas, atendidas as condições para a

prestação dos serviços públicos.

c) DominiaisNão são usados.

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84DIREITO ADMINISTRATIVO

IV.4.2 – Quanto à alienação

a) De uso comumEnquanto estiver afetado não pode ser alienado. Apenas após a

desafetação pode ser alienado.

b) De uso especialAssim como ocorre com os bens de uso comum, não podem ser

alienados enquanto estiverem afetados, só podendo sê-lo após a desafetação.

c) DominiaisPodem ser alienados a qualquer tempo, porque não estão afetados.

Obs.: PRESSUPOSTOS DA ALIENAÇÃO 1) Prova de Interesse Público (aferido mediante processo administrativo);2) Avaliação Prévia;3) Licitação (na modalidade “Leilão”);4) Autorização Legislativa (se for bem imóvel) — art. 17, I e II, Lei 8.666/93.

Obs.: DESAFETAÇÃO A desafetação é feita em regra mediante ato da mesma natureza do que gerou a afetação

(ex: lei, ato administrativo, etc.), pelo princípio da simetria das formas. Porém, excepcionalmente, a desafetação pode decorrer de fato natural que retire a

destinação pública do bem (ex: ruína, desabamento, explosão, etc.).

IV.4.3 – Quanto ao Registro Público dos Bens Imóveis

Não há lei a respeito do registro público dos bens públicos imóveis. Todavia, existe costume cartorário.

Assim, os bens públicos dominiais e os de uso especial são registrados no RGI. Já os de uso comum não necessitam de tal registro.

IV.5 – REGIME JURÍDICO DOS BENS PÚBLICOS

As principais características dos bens públicos são a inalienabilidade, a imprescritibilidade, a impenhorabilidade e a inonerosidade.

IV.5.1 - Inalienabilidade113

Os bens de uso comum e os de uso especial são inalienáveis enquanto afetados (após a desafetação são alienáveis).

Já os bens dominiais são livremente alienáveis, desde que respeitados os pressupostos para a alienação (já estudados).

IV.5.2 – Imprescritibilidade

Os bens públicos, de qualquer espécie, são insuscetíveis de prescrição aquisitiva (usucapião). Vide a respeito os artigos 183 § 3.º e 191 p.u., da CR/88, e o art. 102 do NCC.

A imprescritibilidade decorre da própria inalienabilidade dos bens públicos.

Vide, a propósito, a Súmula 340/STF.

Obs.: POSSE SOBRE BEM PÚBLICO

113 Existe um texto publicado na Revista EMERJ n.º 20, de autoria de Jessé Torres (Banca-TJ/RJ), no sentido de que o NCC repercute quanto ao regime jurídico dos bens públicos, ao prever como regra a alienabilidade dos bens dominiais (art. 101 NCC — vide art. 67 CC/16). Para os bens de uso comum e de uso especial a regra permanece sendo a inalienabilidade.

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85DIREITO ADMINISTRATIVO

Sobre bem público não pode haver posse, mas tão somente ocupação114.

Obs.: USUCAPIÃO EM BEM PÚBLICO É possível usucapião em bem público (ex: usucapião de domínio útil, v.g., em terreno

de marinha)115.Não é possível usucapião DO bem público, mas admite-se usucapião NO bem público.

► QUESTÃO — É possível usucapião de terra devoluta ?

R: Terras devolutas são terras de ninguém, sem nenhuma destinação. Tratam-se de bens públicos dominiais.

▪ 1.ª Corrente (STF; STJ; TJ/RJ; MP; José Carlos de Moraes Sales) = Não cabe, pois trata-se de bem público dominial, e a CR/88 é bem clara ao prescrever que bens públicos de qualquer natureza não são passíveis de usucapião.

▪ 2.ª Corrente (Álvaro Sagulo, isolado; DP) = Cabe, pois a CR/88 distingue entre terras coletivas e terras devolutas, e apenas as terras coletivas são imprescritíveis. Outrossim, deve-se observar o princípio da função social da propriedade. Por fim, aplicam-se as regras relativas à Legitimação da Posse116, por tratar-se de instituto semelhante (por também importar em alienação para particular).

Prevalece de forma esmagadora a 1.ª CORRENTE.

IV.5.3 – Impenhorabilidade

Bens públicos não respondem pelas obrigações contraídas pelo Poder Público (art. 100 CR/88).

Em razão disso, a Fazenda Pública possui uma prerrogativa processual: o procedimento específico para a Execução contra ela (art. 730/731 CPC — sistema dos Precatórios)117.

IV.5.4 – Inonerosidade

Os bens públicos de qualquer espécie não podem ser dados em garantia (art. 755/756 CPC). Em outras palavras, não podem ser onerados, não podem ser objeto de direitos reais de garantia (penhor, anticrese, hipoteca).

Obs.: CONSTITUIÇÃO DE DIREITOS REAIS SOBRE BEM PÚBLICO Os bens públicos, como visto, não podem ser objeto de direitos reais de garantia. Porém,

podem ser objeto de qualquer outro direito real sobre coisa alheia, desde que não seja de garantia (ex: pode ser constituído foro, uso, etc.).

IV.6 – FORMAS DE AQUISIÇÃO DE BEM PÚBLICO

A aquisição de bens pelo Poder Público pressupõe a existência de um procedimento, sob pena do cabimento de Ação Popular (art.1.º e 4.º da Lei 4717/65 c/c art. 60 e 70 da Lei 4320/64).

1) Compra, dação em pagamento, doação, permuta — Art. 17, I e II, Lei 8.666/93.

2) Usucapião (em favor do Poder Público118) — Art. 183 e 191, CR/88; Art. 1238/1244 NCC; Art. 1260/1262 NCC.

114 Os civilistas chamam a ocupação de posse ne ad usucapionen .

115 Trata-se de hipótese de usucapião de direito (ainda não aceita por alguns doutrinadores).

116 Legitimação da Posse = Instituto pelo qual se outorga a titularidade da ocupação de bem público a particulares (art. 29 § 2.º, Lei 6.383/76).

117 — Não pagamento de Precatório (ordem judicial de pagamento) enseja decretação de Intervenção Federal (art. 34, VI, CR/88); — Pagamento de Precatório fora da ordem cronológica de apresentação enseja seqüestro — que na verdade é arresto (art. 100 CR/88).118 Prevalece o entendimento, liderado por Hely Lopes Meirelles, de que cabe usucapião em favor do Poder Público.

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86DIREITO ADMINISTRATIVO

3) Desapropriação — Art. 5.º XXIV, 182 § 4.º, 184 e 186, CR/88; Lei Complementar 76/93; Lei 8.257/91; Lei 8.629/93; Lei 4.132/62; Decreto-Lei 3.365/41.

4) Acessão — Art. 1248/1252 NCC.

5) Herança Jacente — Art. 1822 NCC.

6) Arrematação — Art. 690 CPC.

7) Adjudicação — Art. 714 CPC.

8) Resgate de Aforamento — Art. 122, Decreto-Lei 9.760/46.

9) Aquisição ex vi legis (por força de lei) ▪ Loteamento (para formação de vias comuns) — Art. 22, Lei 6.766;▪ Perdimento de bens e instrumentos usados em crimes — Art. 91, II, CP; Art. 18 Lei

8.429/92;▪ Reversão em concessão de serviço público — art. 35 § 1.º, Lei 8.987/95;▪ Confisco — Art. 246 CR/88;▪ Criação de Município ou Estado (que adquirirá as terras do Município ou Estado

original) — art. 18 §§ 3.º e 4.º, CR/88).

► QUESTÃO — O artigo 1594 do CC/16 previa que a herança jacente pertencia ao Estado. Este artigo foi revogado pela Lei 8.049/90, que alterou sua redação para estabelecer que a herança jacente pertence ao Município. Assim, pergunta-se: No caso de uma sucessão aberta em 1985 (antes da vigência da Lei 8049/90), porém declarada jacente apenas em 1992 (após a vigência da referida Lei), a quem pertencerão os bens que compõem a herança declarada jacente ?

R: ▪ 1.ª Corrente (PGE; Luiz Guilherme Sauer) = Ao Estado, porque a sucessão foi aberta antes da vigência da lei 8049/90.

▪ 2.ª Corrente (PGM; STJ; Caio Mário; Orlando Gomes; Serpa Lopes; Washington de Barros) = Ao Município, pois o Poder Público não tem direito de saisina. Logo, os bens só se transferiram ao Poder Público após a declaração da jacência, quando já vigorava a Lei 8049/90.

Prevalece a 2.ª CORRENTE.

IV.7 – FORMAS DE GESTÃO DOS BENS PÚBLICOS

IV.7.1 – Concessão de Uso de Bem Público (Art. 239/240 LORJ)

Trata-se de contrato administrativo pelo qual a Administração Pública faculta o uso exclusivo de um determinado bem público a um particular, independentemente da existência ou não de interesse do Poder concedente (interesse eminentemente particular).

A concessão de uso exige autorização legislativa e licitação.

Não é ato precário (possui a estabilidade de um contrato), nem é discricionário, sendo vinculado (obedece um procedimento pré-estabelecido em lei).

Trata-se de contrato personalíssimo (intuitu personae), sendo intransferível sem o consentimento da Administração Pública (qualquer transferência deverá ser submetida à anuência do Poder Público).

Obs.: CONCESSÃO ESPECIAL DE USO (MP 2.220 /01)O fundamento constitucional é o art. 183 § 3.º da CR/88.Preenchidos os requisitos legais, trata-se de direito do possuidor, não lhe podendo ser

negada pelo Poder Público.Esta modalidade de concessão destina-se à moradia.Trata-se de direito transferível (inter-vivos ou mortis-causa).Extingue-se se o concessionário der destinação diversa ao bem, ou se vier a adquirir outro

imóvel (rural ou urbano).Pode ser outorgada em caráter coletivo, observadas as condições fixadas em lei.

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87DIREITO ADMINISTRATIVO

IV.7.2 – Permissão de Uso de Bem Público (Art. 239/240 LORJ)

Ato administrativo discricionário e precário, praticado para atender interesse concorrente do Poder permitente, do permissionário e do usuário.

Não se confunde com a PERMISSÃO DE SERVIÇO PÚBLICO (cuja natureza jurídica ainda é objeto de controvérsia, sendo contrato administrativo para uns e ato administrativo para outros).

Gera direitos subjetivos ao beneficiário (cabe, por exemplo, Ação Possessória).

IV.7.3 - Autorização de Uso de Bem Público (Art. 239/240, LORJ)

Ato administrativo discricionário e precário, praticado para atender a interesse preponderante do autorizatário.

Trata-se de ato unilateral, revogável a qualquer tempo, não gerando direito ao autorizatário.

Obs.: AUTORIZAÇÃO DE USO ESPECIAL (ART. 9.º LEI 10.257/01) Trata-se de autorização de uso para fim comercial, de imóvel de até 250m2, até o dia

15/06/2001.Trata-se de faculdade da Administração Pública, não gerando direito ao autorizatário.

IV.7.4 – Cessão de Uso de Bem Público (Art. 239/240, LORJ)

Ato administrativo pelo qual a Administração Direta faculta o uso de determinado bem público a outro ente ou órgão público.

IV.7.5 – Concessão de Direito Real de Uso sobre Bem Público (Art. 7.º/8º, Dec-Lei 271/67)

Contrato de direito privado que autoriza a transmissão da titularidade deste direito real a particular.

Em se tratando de contrato, dá ensejo a direitos do concessionário. Deve ser formalizada através de escritura pública ou termo.

Depende de autorização legislativa e licitação (salvo quando a concessão for de um ente público para outro — vide art. 17 § 2.º, Lei 8666/93).

O uso do bem de forma diversa da destinação pública prevista no contrato gera a reversão do bem à Administração Pública.

A concessão de direito real de uso de bem público se transfere, inter-vivos ou mortis causa.

IV.7.6 – Locação (Art. 87, Dec-Lei 9.760/46)

Contrato de direito privado cuja celebração pela Administração Pública é autorizada legalmente.

IV.7.7 – Aforamento (Art. 99, Dec-Lei 9.760/46)

Contrato de direito privado (semelhante à enfiteuse).

Obs.: ENFITEUSE / AFORAMENTO A ENFITEUSE foi extinta pelo NCC , ressalvadas as já instituídas validamente (atos

jurídicos perfeitos).O AFORAMENTO é uma espécie de “enfiteuse pública”, instituída em geral em terrenos

de marinha (pertencentes à União). O aforamento ainda existe.São 7 as principais características do aforamento:

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88DIREITO ADMINISTRATIVO

a) Constituição = contrato celebrado junto ao SPU (Serviço de Patrimônio da União), com a anuência do Presidente da República e do Conselho de Defesa Nacional — art. 99; 100; 105, Dec-Lei 9.760/46.

b) Senhorio = é sempre a União federal.c) Bem enfitêutico = bem público federal (em geral terrenos de marinha).d) Foro = 0,6 % sobre o valor do domínio pleno do bem, a ser pago anualmente.e) Laudêmio = 5 % sobre o valor do domínio pleno do bem, a ser pago sempre que

houver transferência do domínio útil.f) Resgate do Aforamento = 17 % sobre o valor do domínio pleno.g) Comisso (infração pelo não pagamento do foro pelo enfiteuta) = não necessariamente

enseja a extinção do aforamento, pois pode haver o “revigoramento do aforamento”, através do pagamento do valor fixado pela União.

IV.8 – ALIENAÇÃO DOS BENS PÚBLICOS

Os bens públicos podem ser alienados de 6 formas:

IV.8.1 – Venda, doação, dação em pagamento, permuta (art. 17, I e II, Lei 8.666/93)

Essas formas de alienação constituem contratos de direito privado.

A doação exige autorização legal, avaliação e licitação.

A permuta119 exige autorização legal e avaliação, mas dispensa a licitação.

IV.8.2 – Concessão de Domínio

É o instrumento hábil para a alienação de terras devolutas. A concessão de domínio depende sempre se autorização legislativa.

Se o bem objeto da concessão for superior a 2.500 hectares, além da autorização legislativa será necessária ainda a aprovação prévia do Congresso Nacional (art. 188 § 1.º, CR/88).

Se a concessão for de um ente público para outro, pode ser feita por lei, sem a necessidade de registro. Porém, se for feita em favor de particular, deve ser levada ao RGI.

IV.8.3 – Legitimação da Posse (art. 29 § 2.º, Lei 6.383/76)

Consiste na alienação do bem público ao titular da licença de ocupação, “pelo valor histórico da terra nua”.

Não se confunde com usucapião (mesmo porque não existe usucapião de bem público).

Transfere-se o domínio da área devoluta120 ao particular que exerce a posse observando sua função social. Expedido o título, o particular deve registrá-lo no RGI.

A legitimação da posse é o instrumento mais adequado para a execução da REFORMA AGRÁRIA .

IV.8.4 – Incorporação (art. 235, Lei 6.404/76)

Trata-se da alienação (por qualquer via, exceto doação) de um bem afetado a um órgão da Administração Direta, para uma entidade da Administração Indireta, para a formação do seu patrimônio (no caso de Autarquia ou Fundação Pública) ou do seu capital social (no caso de Empresa Pública ou Sociedade de Economia Mista).

119 Pode haver reposição em dinheiro, sem que isso descaracterize a permuta.

120 Terras devolutas = pertencem ao Poder Público, mas não estão em utilização, nem têm qualquer fim administrativo específico (ex: art. 20, II, CR/88).

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89DIREITO ADMINISTRATIVO

Exemplo: O Estado do Rio de Janeiro transfere um bem da Secretaria de Estado de Saúde para uma Autarquia criada para pesquisas científicas.

IV.8.5 – Investidura (art. 17 § 3.º, Lei 8.666/93)

Investidura é a alienação de um bem público, em razão de “alteração de alinhamento”.

Ocorre quando uma determinada área se torna inútil, por ter sido incorporada a outra propriedade. Apenas o titular da propriedade “dominante” pode adquirir a área remanescente por investidura.

Na investidura é desnecessária a licitação (art. 17 § 3.º, Lei 8666/93).

Exemplo: O Poder Público realiza obra de ampliação de uma determinada rua, com a criação de 3 novas pistas. Com isso, uma das calçadas é reduzida a tamanho inexpressivo, perdendo sua utilidade. Esse resíduo da calçada pode ser alienado ao proprietário do imóvel lindeiro, pois ele é o único que poderá dar utilidade ao bem.

IV.8.6 – Retrocessão (art. 519 NCC121)

Consiste na alienação do bem expropriado, em virtude de desvio de finalidade, ao seu anterior proprietário, por valor correspondente ao pago a título de indenização quando da desapropriação.

A) Pressuposto da Retrocessão

O pressuposto da retrocessão é a chamada TREDESTINAÇÃO ILÍCITA (uso do bem expropriado para finalidade distinta daquela afirmada no Decreto expropriatório, sem que se atenda o interesse público122).

A tredestinação só se configura se a desapropriação for consumada (ou seja, só se configura após o pagamento da indenização e a transferência da propriedade ao Poder Público, com a respectiva transcrição no RGI).

B) Natureza Jurídica da Tredestinação Ilícita

São 3 as principais correntes acerca da natureza jurídica da tredestinação ilícita, pressuposto da retrocessão.

• 1.ª Corrente (Seabra Fagundes; Cretella Júnior; Bandeira de Melo; José Carlos de Moraes Sales; Lúcia Vale Figueiredo) = Trata-se de Direito Real, de modo que o expropriado dispõe do direito de reivindicar a posse do bem.

• 2.ª Corrente (Clóvis Bevilácqua; Orlando Gomes; Caio Mário; Sílvio Rodrigues) = Trata-se de Direito Pessoal, logo o expropriado não pode reivindicar a posse do bem, mas tão somente pleitear o ressarcimento ou reparação dos danos sofridos123.

• 3.ª Corrente (Roberto Barcelos Magalhães; Maria Sylvia Di Pietro) = Trata-se de Direito Misto. Assim, a princípio é direito real, exceto se o bem tiver sido alterado substancialmente (hipótese em que o expropriado não reivindicará a posse, mas pleiteará ressarcimento ou reparação).

121 Antigo art. 1150 do CC/16.

122 Não caracteriza tredestinação ilícita o uso do bem para fim diverso do afirmado no Decreto Expropriatório, se for mantido o interesse público (exemplo: bem expropriado para a construção de escola, porém usado para a construção de hospital).

123 A desapropriação, por si só, não causa dano, mas sim um prejuízo, sendo por isso paga indenização ao expropriado. Porém, no caso de tredestinação ilícita, ocorre um dano, caracterizado pela perda de um bem do expropriado injustificadamente, sendo o mesmo utilizado fora do interesse público.

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90DIREITO ADMINISTRATIVO

O STJ e o STF firmaram posição no sentido de abraçar a 1.ª CORRENTE (Direito Real, conferindo ao expropriado a faculdade de reivindicação da posse do bem).

► QUESTÃO — No caso de o Poder Público não atribuir nenhum fim ao bem expropriado (demora excessiva no uso do bem), aplica-se à retrocessão por analogia o disposto no artigo 10 do Dec-Lei 3.365/41124 ?

R: São 2 as vertentes doutrinárias a respeito dessa questão.• 1.ª Corrente (Seabra Fagundes) = Aplica-se analogicamente o artigo 10 do Dec-Lei

3.365/41. Logo, o prazo é de 5 anos, após o qual se presume a ocorrência de tredestinação ilícita.

• 2.ª Corrente (Hebert Chamoun) = Não se aplica o artigo 10 do Dec-Lei 3.365/41, pois este dispositivo não se refere à retrocessão, não se podendo presumir a ocorrência de tredestinação ilícita.

V – INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE

V.1 – INTRODUÇÃO

V.1.1 – Intervenção do Estado

O Estado contemporâneo se caracteriza por ser intervencionista, condicionando os princípios da proteção à propriedade privado e da livre iniciativa ao bem-estar social.

Segundo Hely Lopes Meirelles, são 2 as principais modalidades de intervenção do Estado: no domínio econômico (intervenção sobre a atividade lucrativa desempenhada pelas empresas, apresentando por isso conteúdo dinâmico); e na propriedade (intervenção sobre bens situados no território nacional, apresentando por isso conteúdo estático, por recair sobre bens).

Intervenção na propriedade “é o ato pelo qual o Poder Público retira ou restringe direitos dominiais privados, ou sujeita o uso de bens privados ao interesse público”.

V.1.2 – Propriedade

A propriedade é direito real titularizado e exercido por pessoa natural ou jurídica, reunindo as faculdades de usar (dar destinação econômica ao bem), fruir (captar os frutos produzidos pela coisa) e dispor (retirar a substância, destruir ou alienar a coisa) de bens corpóreos, móveis ou imóveis, e de reivindicá-los de quem quer que injustamente os detenha ou possua.

V.1.2.1 – Aspectos da Propriedade

a) Aspecto Interno ou Econômico = Compreende o uso, a fruição e a disposição do bem.

b) Aspecto Externo ou Jurídico = Abrange a exclusão (afastamento da esfera de domínio de outrem) e a seqüela (perseguição contra quem injustamente detenha ou possua o bem).

V.1.2.2 – Características da Propriedade

a) Exclusividade = A propriedade não pode, em regra, pertencer a mais de uma pessoa. Exceção = Condomínio.

b) Plenitude = A propriedade abrange, em regra, todas as suas faculdades inerentes (usar, fruir, dispor, reivindicar).

124 “Art. 10, Dec-Lei 3.365/41 — A desapropriação deverá efetivar-se mediante acordo ou intentar-se judicialmente dentro de 5 (cinco) anos, contados da data da expedição do respectivo decreto e findos os quais este caducará. Neste caso, somente decorrido 1 (um) ano, poderá ser o mesmo bem objeto de nova declaração. Parágrafo Único — Extingue-se em 5 (cinco) anos o direito de propor ação que vise a indenização por restrições decorrentes de atos do Poder Público.”

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91DIREITO ADMINISTRATIVO

Exceção = Propriedade limitada ou restrita (ex: enfiteuse).

c) Perpetuidade = A propriedade é perpétua, caracterizando-se essa perpetuidade por 3 aspectos:

• Hereditariedade (pode ser adquirida mortis-causa).• Imprescritibilidade (o não exercício da propriedade, por si só, não gera sua perda

por prescrição aquisitiva — usucapião —, só havendo a possibilidade de perda se aliado ao não exercício houver posse ad usucapionen de outrem).

• Inviolabilidade (a propriedade é tutelada pelo Estado, enquanto satisfizer sua função social; se não for observada a função social da propriedade, o Estado não só deixa de tutelá-la, como passa a intervir).

Exceção à perpetuidade é a propriedade resolúvel (sujeita a condição resolutiva ou a termo).

V.1.2.3 – Princípio da Função Social da Propriedade (art. 182 §§ 2.º e 4.º c/c art. 184 c/c art. 186, todos da CR/88)

A propriedade é analisada sob 2 aspectos: a titularidade (objeto do Direito Privado), que é absoluta, por ser oponível erga omnes; e o exercício (objeto do Direito Público), que é relativo, podendo ser ponderado com outros direitos, caso não satisfaça sua função social.

Obs.: DIREITO ABSOLUTO O Direito Público brasileiro não admite nenhum direito absoluto. Nem mesmo o

direito à vida é absoluto (pois admite-se a legítima defesa contra a vida; admite-se pena de morte em estado de guerra...).

Daniel Sarmento sustenta que existe um único direito absoluto no ordenamento pátrio: o direito à não tortura.

Todavia, o professor Guilherme Peña critica essa posição, afirmando que a não tortura não é direito, e sim garantia do direito à integridade física (que por sua vez não é absoluto, admitindo-se sua lesão em caso de legítima defesa).

O princípio da função social da propriedade significa que a propriedade não é um fim em si mesma, sendo na verdade um meio para a consecução de um fim (o bem-estar social).

V.1.2.4 – Competência Legislativa

Nos termos do artigo 22, I, da CR/88, a competência legislativa é exclusiva da União, pois trata-se de direito real (abrangido pelo Direito Civil)125.

V.2 – INSTRUMENTOS DE INTERVENÇÃO DO ESTADO NA PROPRIEDADE

São 7 os instrumentos utilizados pelo Estado para a intervenção da propriedade privada: ocupação temporária; requisição; limitação administrativa; tombamento; parcelamento e edificação compulsórios; servidão administrativa; desapropriação.

V.2.1 – Ocupação Temporária (art. 136 § 1.º, II, CR/88 c/c art. 36, Dec-Lei 3.365/41 c/cart. 13 a 16, Lei 3.924/61)

Direito pessoal consistente na utilização provisória, pelo Estado, de bem imóvel, para fins de execução de obra pública ou prestação de serviço público, com indenização posterior dos prejuízos efetivamente causados.

Exemplo: Utilização, pelo Estado, de imóvel particular lindeiro a outro, em que se realiza obra pública.

V.2.2 – Requisição (art. 5.º, XXV; art. 22, III; art. 139, VII, CR/88 c/c Dec-Lei 4.812/42)

Direito pessoal de utilização provisória de bem móvel ou imóvel, ou ainda de serviço, em situação de perigo iminente, com indenização posterior dos prejuízos efetivamente causados.

125 Admite-se nessa caso a delegação legislativa da União para os Estados, via Lei Complementar. Porém, tal delegação não foi feita (o único caso em que houve efetivamente a delegação legislativa da união para os estados foi quanto ao piso salarial).

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92DIREITO ADMINISTRATIVO

Trata-se de direito mais amplo, decorrendo de situação específica (perigo iminente).

V.2.3 – Limitação Administrativa

A limitação administrativa não encontra previsão legal genérica, sendo prevista de forma específica nas próprias leis que a criarem.

Trata-se de ato administrativo ou ato legislativo, veiculado por Lei ou por Decreto, e praticado no exercício do poder de polícia, consistente na restrição do uso da propriedade de bem imóvel, através da imposição de obrigação de fazer ou de não fazer com o fim de adequá-la à sua função social.

Exemplo: gabaritos municipais (limitam o exercício do direito de propriedade, pois eventuais construções não poderão ultrapassar as especificações.

V.2.4 – Tombamento (art. 23, III; art. 24, VII; art. 216, CR/88 c/c Dec-Lei 25/67 c/c Decreto 3.866/41)

Procedimento administrativo consistente na restrição do uso e disposição de bem móvel ou imóvel, para proteção do patrimônio histórico e cultural brasileiro, sem indenização dos prejuízos causados.

É instrumento mais amplo do que a limitação administrativa, e tem finalidade vinculada (proteção do patrimônio histórico e cultural).

V.2.5 – Parcelamento e Edificação Compulsórios *art. 182 § 4.º, I, CR/88 c/c art. 5.º, Lei 10.257/01)

Ato legislativo veiculado em Lei específica para área incluída no Plano Diretor consistente em sanção imposta ao proprietário de bem imóvel urbano não edificado, sub-utilizado ou não utilizado, para efeito de sua adequação à função social.

Obs.: IPTU PROGRESSIVO (progressividade da alíquota do IPTU com base na localização do bem) — EC N.º 29

O IPTU progressivo previsto na EC n.º 29 consiste na variação da alíquota do tributo conforme a localização do imóvel (ex: a alíquota do IPTU relativo a imóvel situado no Leblon será maior do que a de imóveis no Méier).

Guilherme Peña entende que é inconstitucional esse dispositivo, pois a CR/88 prevê apenas uma hipótese de IPTU progressivo (art. 182 § 4.º, II, CR/88), como sanção pelo descumprimento da função social da propriedade. Assim, como a EC 29 não faz qualquer menção à função social, é inconstitucional a fixação de IPTU progressivo.

Outrossim, essa atividade caracteriza bis in idem , pois a base de cálculo do imposto (valor venal) já é maior para tais imóveis, não se podendo aumentar também a alíquota.

V.2.6 – Servidão Administrativa (art. 40, Dec-Lei 3.365/41)

Direito real consistente na utilização permanente de bem imóvel para a execução de obra pública, prestação de serviço público e trânsito de agentes públicos, com indenização prévia dos prejuízos efetivamente suportados.

A servidão administrativa decorre de ato administrativo decorrente de procedimento administrativo, sendo formalizada através de escritura pública (se houver acordo) ou sentença judicial constitutiva (se não houver acordo).

Qualquer que seja o instrumento de formalização da servidão administrativa (escritura pública ou sentença judicial), deve ser levado ao RGI.

Obs.: PERDA DA UTILIDADE ECONÔMICA DO BEM DECORRENTE DA SERVIDÃO ADMINISTRATIVA Segundo lição de Lúcia Vale Figueiredo, se a servidão administrativa gerar perda da

utilidade econômica do bem, deve ser realizada obrigatoriamente a desapropriação do mesmo (em observância ao princípio da moralidade administrativa).

Obs.: SERVIDÃO ADMINISTRATIVA / DESAPROPRIAÇÃO

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93DIREITO ADMINISTRATIVO

A desapropriação importa em resolução do domínio (perda da propriedade), sendo a indenização fixada no valor da propriedade.

Já a servidão administrativa não gera perda da propriedade, sendo a indenização fixada no valor dos prejuízos efetivamente suportados.

Obs.: SERVIDÃO ADMINISTRATIVA / SERVIDÃO PRIVADA A servidão administrativa envolve Pessoa Jurídica de Direito Público, tutelando interesse

público.A servidão privada envolve pessoa jurídica de Direito Privado ou pessoa natural, tutelando

interesse particular. ► QUESTÃO — É admissível a instituição de servidão administrativa através de Lei ?

R: Esta questão se refere á discussão sobre a natureza jurídica do terreno marginal (previsto por Leis Municipais e estaduais em diversas unidades federativas no Brasil).

Discute-se se o terreno marginal é bem público ou particular.Se se entender que o terreno marginal é bem particular, então se estará admitindo que há

uma servidão administrativa instituída por lei (única hipótese). Porém, se se considerar bem público, não haverá qualquer hipótese no Direito Brasileiro de servidão administrativa instituída por lei.

São 2 as correntes a respeito:• 1.ª Corrente (Hely Lopes Meirelles) = Trata-se de bem particular, logo caracteriza

servidão administrativa instituída por lei.• 2.ª Corrente (Bandeira de Melo) = Trata-se de bem público, logo o livre trânsito de

agentes públicos consiste em mera faculdade decorrente da propriedade do Estado. Não há servidão pública criada por lei no Direito Brasileiro.

O STJ, o STF e o TJ/RJ têm entendimento pacífico no sentido de adotar a 2.ª CORRENTE (bem público). Assim, segundo os melhores Tribunais, não há no Direito Brasileiro nenhuma hipótese de servidão administrativa instituída por lei.

Obs.: TERRENO DE MARINHA E TERRENO MARGINAL Terreno de Marinha é a faixa de terra que vai até 33 metros da linha de preamar de

1833, e também a linha de 33 metros das margens de rios e lagos até o ponto em que ainda há influência da maré. Trata-se de bem público dominical da União.

Terreno Marginal é a faixa de terra que vai até 15 metros das margens dos rios e lagos, a partir do ponto em que não há mais influência da maré, ou seja, a partir do ponto em que não há mais terreno de marinha. Nos terrenos marginais há livre trânsito de agentes públicos, o que gerou discussão acerca de sua natureza jurídica (bem público ou bem particular) para que se defina se este livre trânsito de agentes públicos caracteriza mera faculdade decorrente da propriedade (se se tratar de bem público) ou caracteriza servidão administrativa (se se tratar de bem particular).

Como visto, foi decidido que o terreno marginal é bem público, assim como o terreno de marinha.

15 metr

osR

I ------------ (INFLUÊNCIA DA MARÉ)

O 33 metros

33 metros

------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------M A

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94DIREITO ADMINISTRATIVO

R-----------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------------

V.3 – DESAPROPRIAÇÃO

A desapropriação é o sétimo meio de intervenção do Estado na propriedade. Trata-se da intervenção mais drástica que há. Devido à sua grande relevância, será estudada em um capítulo próprio, ao contrário das demais.

V.3.1 – Conceito

“Desapropriação é o procedimento pelo qual há a transferência da propriedade de bem particular para o domínio público, em razão de utilidade pública, necessidade pública ou interesse social.” (vide art. 5.º XXIV, c/c art. 182 § 4.º, III, c/c art. 184, todos da CR/88)

Trata-se de forma originária de aquisição da propriedade pelo Estado (o bem expropriado fica livre de qualquer ônus vício anterior).

A desapropriação decorre do poder de império do Estado, ao seu domínio eminente sobre os bens e à própria soberania interna.

Todavia, o exercício da desapropriação se limita, conforme a CR/88, pelo princípio do devido processo legal. Ademais, a propriedade privada é um dos pilares da ordem econômica, devendo ser protegida (salvo se não observar a sua função social).

V.3.2 – Natureza Jurídica da Desapropriação

A natureza jurídica da desapropriação é de PROCEDIMENTO (podendo assumir a natureza administrativa ou a forma judicial).

V.3.3 – Procedimento da Desapropriação

O procedimento da desapropriação tem 2 fases: DECLARATÓRIA e EXECUTÓRIA . Cada fase configura uma natureza.

A fase declaratória é administrativa, na qual há a declaração da hipótese da expropriação (utilidade pública, necessidade pública ou interesse social), veiculada através de Decreto.

A fase executória consiste na execução das medidas suficientes à transferência da propriedade para o Poder Público (estimativa da indenização e transferência do bem). Esta fase pode ser administrativa ou judicial. Uma vez declarada a hipótese da expropriação, pode haver acordo quanto ao valor da indenização (caso em que a fase executória será administrativa, sujeita apenas a homologação judicial) ou pode não haver acordo (caso em que a fase executória será judicial, mediante Ação de Desapropriação126).

V.3.3.1 – Efeitos do Decreto Expropriatório

O Decreto Expropriatório é o ato pelo qual o Poder Público declara a hipótese de expropriação (necessidade pública, utilidade pública ou interesse social).

126 Na Ação de Desapropriação, somente se admite discussão quanto ao valor da indenização a ser paga pelo Poder Público, não se podendo discutir quanto à essência do Decreto expropriatório. Assim, não se pode discutir quanto à utilidade pública, necessidade pública ou interesse social declarados no Decreto expropriatório.

Terreno de Marinha

TERRENO MARGINAL

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95DIREITO ADMINISTRATIVO

A declaração expropriatória é ATO CONDIÇÃO (ato que precede a efetivação da transferência do bem).

Não possui efeitos materiais, pois a desapropriação só se inicia de fato com o acordo ou com a citação do proprietário e a oferta do preço provisório na Ação de Desapropriação).

O Decreto Expropriatório não impede o uso do bem pelo proprietário, de qualquer forma (pode construir, aliená-lo, etc.). é ilegal a denegação de Alvará de construção no imóvel, bem como qualquer outra restrição ao uso do bem, com base no Decreto Expropriatório (pois este não possui efeitos materiais).

Agentes públicos podem transitar pelo bem, após o Decreto Expropriatório. Porém, isso não induz posse (art. 7.º Dec-Lei 3365/41). Se tal trânsito de agentes públicos causar prejuízo ao proprietário, será passível de indenização.

Obs.: CADUCIDADE DO DECRETO EXPROPRIATÓRIO Em se tratando de desapropriação por utilidade pública ou necessidade pública, o Decreto

Expropriatório caduca em 5 anos (art. 10, Dec-Lei 3365/41).Em se tratando de desapropriação por interesse social, o prazo é de 2 anos (art. 3.º, Lei

4132/62).No caso de Desapropriação para fins de urbanização com fulcro no Estatuto da Cidade (Lei

10.257/01), o prazo é de 5 anos (art. 8.º § 4.º).UMA VEZ CADUCO O DECRETO EXPROPRIATÓRIO, SÓ PODE SER RENOVADO APÓS 1 ANO DA DECADÊNCIA .

V.3.4 – Ação de Desapropriação

A) FORO COMPETENTE

O foro competente para a Ação de Desapropriação é o da situação do bem127 (critério aplicado também à desapropriação Indireta).

B) PRAZO

O prazo será o mesmo da decadência do decreto Expropriatório. Assim, será de 5 anos ou 2 anos, conforme a hipótese da desapropriação (necessidade, utilidade ou interesse). Vide, a propósito, o ponto relativo à caducidade do Decreto Expropriatório.C) DEPÓSITO PROVISÓRIO E IMISSÃO PROVISÓRIA NA POSSE

O Poder Público pode oferecer depósito provisório, decretando-se a imissão provisória na posse.

A imissão provisória do Poder Público na posse do bem exige intimação do expropriado sobre a oferta do depósito provisório (o qual deve ser justo, conforme critérios fixados em avaliação judicial, jamais podendo ser irrisório, uma vez que gera a perda da posse do bem pelo expropriado)128.

O prazo de validade da imissão provisória na posse é de 120 dias, improrrogável e impassível de renovação (art. 15 § 2.º, Dec-Lei 3365/41).

D) CONTROLE JUDICIAL O controle judicial é feito na própria Ação de Desapropriação ou em Ação Direta do

expropriado (art. 20, Dec-Lei 3365/41). Cabe, em tese, Mandado de Segurança, desde que presentes os pressupostos (ilegalidade do procedimento ou desvio de finalidade). Cabe, ainda, Ação Declaratória de Nulidade do Procedimento, com fulcro no artigo 35 do Dec-Lei 3365/41 (a qual será revertida em perdas e danos, e não em reivindicação, pois o bem já terá sido incorporado ao patrimônio público, e bem público não é passível de reivindicação).

Porém, o Poder Judiciário somente pode exercer controle sobre a legalidade do procedimento ou o valor da indenização, não podendo decidir sobre a existência do pressuposto declarado no Decreto Expropriatório (art. 9.º, Dec-Lei 3365/41).

127 Salvo nos casos de competência da Justiça Federal, em que o foro competente será o da capital do Estado.

128 Segundo o STF, apenas a desapropriação em si exige justa indenização, podendo o depósito provisório ser em valor inferior ao do bem. Para a Defensoria Pública, a posição é de que o depósito provisório deve ser justo, conforme avaliação judicial, sob pena de ferir o artigo 5.º, XXIV, da CR/88.

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96DIREITO ADMINISTRATIVO

E) DESAPROPRIAÇÃO DE IMÓVEIS URBANOS

Segundo o Dec-Lei 1.075/70, nos casos de desapropriação de imóveis urbanos, só é admitida a imissão provisória do Estado na posse do bem após a intimação do expropriado, com prazo de 5 dias para se manifestar (impossível a decretação da medida inaudita altera pars)129.

F) FIXAÇÃO DO VALOR DA INDENIZAÇÃO O artigo 27 do Dec-Lei 3365/41 traz critérios para a fixação do valor da indenização. Há

ainda previsão de compensação pela valorização da área remanescente pertencente ao expropriado (a jurisprudência não admite, mas a Defensoria Pública aceita esta tese).

G) BENFEITORIAS Segundo o artigo 26 § 1.º do Dec-Lei 3365/41, a realização de benfeitorias pelo

expropriado, antes da efetivação da Desapropriação, é livre (o Decreto Expropriatório, como visto, não possui efeitos materiais, não impedindo o livre exercício do direito de propriedade, em todos os seus aspectos, pelo proprietário do bem). Após a efetivação da Desapropriação (com a celebração do acordo administrativo ou o início da Ação de Desapropriação), apenas serão indenizadas as benfeitorias necessárias e as úteis (estas, desde que autorizadas pelo expropriante).

V.3.4 – Efeito da Desapropriação

O efeito da desapropriação é a transferência da propriedade do bem particular para o Poder Público.

A desapropriação é modo originário de aquisição da propriedade. Assim, qualquer vício eventualmente existente na propriedade anterior não repercute sobre a propriedade do ente expropriante.

Obs.: DANO / PREJUÍZO Dano (moral, material ou estético) gera obrigação de ressarcimento ou reparação.

Prejuízo gera obrigação de indenização.Na desapropriação não há dano, e sim prejuízo. Assim, o prejuízo suportado pelo particular

será indenizado.

V.3.5 – Hipóteses de Desapropriação

Necessidade Pública significa “circunstância excepcional que motiva esse tipo de intervenção na propriedade”.

Utilidade Pública significa “conveniência da Administração Pública em implementar a desapropriação”.

Interesse Social significa “melhor atendimento ao interesse social, ainda que não se trata de circunstância excepcional ou de conveniência da Administração Pública”.

V.3.6 – Classificação

Necessidade ou Utilidade Pública (art. 5.º, XXIV, initio, CR/88 c/c Dec-Lei 3.365/41)

ORDINÁRIA Interesse Social (art. 5.º, XXIV, in fine, CR/88 c/c Lei 4.132/62)

129 Entendo que a descrição legal encontrada no art. 6.º do Dec-Lei 1075/70 para a aplicação da regra que veda a concessão de imissão provisória na posse inaudita altera pars (“O disposto neste Dec-Lei só se aplica à desapropriação de prédio residencial urbano, habitado pelo proprietário ou compromissário comprador, suja promessa de compra esteja devidamente inscrita no RGI.”) é semelhante à de “bem de família”. Assim, aplicar-se-ia tal regra não apenas aos imóveis usados como residência, mas também aos alugados, cujos frutos civis ajudassem na subsistência do locador, aplicando-se por extensão a jurisprudência do STJ sobre o bem de família (trata-se de posição própria minha, não encontrada em livros, mas contando com a simpatia da prof.ª Helena Elias).

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97DIREITO ADMINISTRATIVO

DESAPROPRIAÇÂ0

EXTRAORDINÁRIA Para fins de urbanização (art. 182 § 4.º, III, CR/88 c/c Lei 10.257/01130)Para fins de Reforma Agrária (art. 184 c/c Lei 8.629/93 c/c LC 76/93)

São 3 os principais critérios para a classificação das espécies de Desapropriação:

a) Quanto à Competência Declaratória

Na desapropriação ordinária, sob qualquer fundamento, a competência declaratória é de qualquer ente federativo (União, Estados, DF e Municípios).

Na desapropriação extraordinária para fins de urbanização, a competência declaratória é exclusiva do Município.

Na desapropriação extraordinária para fins de Reforma Agrária, a competência declaratória é exclusiva da União.

b) Quanto ao Objeto

Na desapropriação ordinária, sob qualquer fundamento, podem ser objeto da expropriação bens de quaisquer natureza (desde que sejam suscetíveis de apreciação econômica).

Na desapropriação extraordinária para fins de urbanização, o objeto deve ser bem imóvel urbano que não atenda a função social da propriedade, já tendo sido impostas as demais medidas progressivas previstas no artigo 182 da CR/88.

Na desapropriação extraordinária para fins de Reforma Agrária, o objeto é específico: bem imóvel rural que não atenda à sua função social (art. 186 CR/88)131.

c) Quanto à Indenização

Na desapropriação ordinária, sob qualquer fundamento, a indenização é prévia e em dinheiro132 (embora seja possível a imissão provisória do Poder Público na posse do bem).

Na desapropriação extraordinária para fins de urbanização, a indenização é feita na forma prevista no artigo 182 § 4.º, III, da CR/88 (mediante Títulos da Dívida Pública).

Na desapropriação extraordinária para fins de Reforma Agrária, a indenização é paga na forma prevista no artigo 184 da CR/88.

Obs.: ART. 243 CR/88

130 O prof. Carvalho Filho, titular da Banca de Direito Público do MP, está escrevendo obra sobre o Estatuto da Cidade (Lei 10.257/01).

131 A função social da propriedade rural está definida no artigo 186 da CR/88: “Art. 186 – A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente. Segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:I – aproveitamento racional e adequado;II – utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;III – observância das disposições que regulam as relações de trabalho;IV – exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.”

132 A indenização deve ser paga em dinheiro, não ficando o expropriado sujeito a Precatório. Segundo Toshio Mukai, isso significa que deve ser expedido mandado de pagamento em favor do expropriado.

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98DIREITO ADMINISTRATIVO

O art. 243 da CR/88 utiliza a denominação “expropriação”. Está regulado pela Lei 8257/91.Porém, apesar da terminologia usada, não se trata, tecnicamente, de expropriação, pois

não há previsão de indenização (por interpretação sistemática da CR/88, percebe-se que ela não admite desapropriação sem indenização). TRATA-SE DE CONFISCO.

Obs.: NULIDADE DA DESAPROPRIAÇÃO DE IMÓVEL URBANO SEM O PAGAMENTO PRÉVIO Segundo dispõe o artigo 46 da LC 101/00 (Lei de Responsabilidade Fiscal), é nula de pleno

direito a desapropriação de imóvel urbano sem o pagamento prévio da indenização ou o depósito judicial do valor.

V.3.7 – Objeto

A desapropriação recai, em regra, sobre bens de qualquer natureza, suscetível de avaliação econômica.

Porém, existem situações excepcionais em que bens suscetíveis de avaliação econômica não são passíveis de desapropriação, devido a impossibilidade jurídica ou impossibilidade econômica.

Obs.: DESAPROPRIAÇÃO DE POSSE A posse legítima e de boa-fé pode ser objeto de expropriação, pois é direito apreciável

economicamente, não estando elencado entre as exceções.

Obs.: DESAPROPRIAÇÃO DE COTAS, AÇÕES E VALORES MOBILIÁRIOS DE SOCIEDADE As ações, cotas e demais valores mobiliários relativos ao capital social de sociedades

empresárias ou simples são bens móveis, suscetíveis de apreciação econômica.Assim, podem ser objeto de desapropriação.Discute-se, porém, quanto à possibilidade de o Estado expropriar cotas de Sociedade Ltda.

de pessoas, sem a concordância dos demais sócios (acho que cabe, pois o interesse público prevalece).

V.3.7.1 – Impossibilidade Jurídica de Desapropriação

Existem exceções à regra de que todo bem pode ser passível de desapropriação. São os casos de impossibilidade jurídica.

A impossibilidade da sujeição do bem à desapropriação pode ser jurídica ou natural, conforme o fundamento.

Exemplos de bens com IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA de serem desapropriados:

a) Bens imóveis rurais produtivos (art. 185 , II, CR/88) São insuscetíveis de desapropriação para fins de reforma agrária, por expressa

vedação constitucional. Porém, não há empecilho à desapropriação por outros fundamentos (por utilidade pública, interesse público, etc.).

b) Direitos representativos de capital de empresas cujo funcionamento dependa de autorização pública (art. 2. § 3.º, Dec-Lei 3365/41)

Exemplos de bens com IMPOSSIBILIDADE NATURAL de serem desapropriados:

a) Pessoa humanaPessoa humana não é bem, é sujeito de direitos.

b) Direitos PersonalíssimosNão podem ser expropriados, embora seus efeitos econômicos possam sê-lo. Por

exemplo, não se pode expropriar o direito a ter propriedade intelectual, mas pode-se desapropriar direitos autorais.

c) Moeda Corrente

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99DIREITO ADMINISTRATIVO

Moeda corrente não pode ser expropriada (pois é o próprio meio de pagamento da indenização, de modo que não há interesse nem utilidade em se trocar dinheiro por dinheiro).

Porém, moedas antigas podem ser desapropriadas (ex: para museus).

d) Cadáver• 1.ª Corrente (José Carlos Morais Sales) = é juridicamente impossível, por violar

preceitos éticos, além de não haver possibilidade de definir o expropriado.• 2.ª Corrente (Carvalho Filho) = é possível, desde que estejam presentes todos

os demais pressupostos para a desapropriação. É a corrente que prevalece (ex: desapropriação para fins científicos, em favor de universidade pública).

Obs.: TERRENOS MARGINAIS • 1.ª Corrente (Hely Lopes Meirelles) = são bens particulares, logo são suscetíveis de

desapropriação.• 2.ª Corrente (Celso Antônio Bandeira de Melo) = são bens públicos, de modo que não

podem ser expropriados.

► QUESTÃO — Existe a possibilidade de uma entidade federativa expropriar um bem de outra entidade federativa ?

R: SIM, desde que sejam satisfeitas 2 condições cumulativas: autorização legislativa; respeito à hierarquia federativa133 (a União pode expropriar bens de Estados e Municípios, e os Estados podem expropriar bens de Municípios). — vide art. 2.º § 2.º, Dec-Lei 3.365/41.

► QUESTÃO — Pode uma entidade federativa expropriar bens de uma entidade administrativa ?

R: Se houver hierarquia federativa, a jurisprudência é pacífica no sentido da possibilidade de expropriação, aplicando-se analogicamente o dispositivo supra mencionado (ex: a União pode expropriar bens de autarquias municipais e estaduais).

Porém, existe divergência quanto à possibilidade de expropriação quando há violação da hierarquia federativa (ex: Município expropriar bem de autarquia federal). São 3 as posições a respeito:

• 1.ª Corrente (Sérgio Ferraz) = É possível, por analogia ao dispositivo supra.• 2.ª Corrente (Hely Lopes Meirelles) = É possível, desde que o bem não esteja afetado

ao serviço público.• 3.ª Corrente (Bandeira de Melo) = Não é possível, por romper a hierarquia federativa,

consagrada no artigo 2.º § 2.º do Dec-Lei 3365/41.Prevalece a 3.ª Corrente, adotada pelo STF.

V.3.8 – Competência para a desapropriação

Segundo Jessé Torres (Banca – TJ/RJ), há uma diferença entre competência legislativa, competência declaratória e competência executória.

Competência Legislativa é a aptidão para a produção de normas legais sobre a desapropriação. Está definida no artigo 22, II, da CR/88 , sendo privativa da União.

Competência Declaratória é a aptidão para declarar a utilidade pública, necessidade pública ou interesse social do bem. Em outras palavras, é a aptidão para declarar os pressupostos da desapropriação. Está definida no art. 2.º do Dec-Lei 3365/41 c/c art. 14 do Dec-Lei 512/69, sendo das entidades federativas (União, dos Estados, do DF e dos Municípios).

HÁ, PORÉM, UMA ÚNICA EXCEÇÃO , PREVISTA NO DEC-LEI 512/69 , EM QUE A COMPETÊNCIA DECLARATÓRIA NÃO É DAS ENTIDADES FEDERATIVAS, SENDO DE UMA ENTIDADE ADMINISTRATIVA : O DNER .

133 Este dispositivo (art. 2.º § 2.º do Dec-Lei 3365/41) é o único em todo o sistema jurídico brasileiro que consagra a hierarquia federativa. Todo o ordenamento jurídico trata os entes federativos como iguais (a própria CR/88 não menciona tal hierarquia, preceituando que os entes federativos são autônomos, e apenas a própria Federação é que é soberana). Porém, segundo o prof. Guilherme Peña, esta norma é constitucional, pois embora não haja propriamente uma hierarquia federativa, há uma hierarquia de interesses, de modo que os interesses nacionais se sobrepõem aos regionais e aos locais (o que em última análise acaba conferindo certa prevalência à União sobre os Estados, DF e Municípios).

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100DIREITO ADMINISTRATIVO

Competência Executória é a aptidão para executar as medidas tendentes à transferência da propriedade do bem particular para o domínio público (art. 3.º do Dec-Lei 3365/41 c/c art. 31, VI e 4 o p.u. da Lei 8987/95 ). Pertence a todas as entidades federativas e respectivas entidades administrativas.

HÁ UMA ÚNICA EXCEÇÃO LEGAL, EM QUE AS CONCESSIONÁRIAS DE SERVIÇO PÚBLICO TÊM COMPETÊNCIA EXECUTÓRIA NA DESAPROPRIAÇÃO, PREVISTA NO ART 31, VI E 40 P.U., DA LEI 8987/95 . TAMBÉM É CONCERNENTE A RODOVIAS .

V.3.9 – Destinação do Bem

A regra geral é de que o bem expropriado seja destinado à pessoa jurídica de direito público (ou, excepcionalmente, de direito privado) que houver promovido (executado) a desapropriação.

Há, porém, exceções em que o bem não será destinado à pessoa jurídica que houver executado a expropriação:

a) art. 4.º do Dec-Lei 3365/41 (“desapropriação por zona”) = o bem expropriado não é destinado à pessoa jurídica que promoveu a desapropriação, sendo destinado à venda.

b) art. 5.º, “i”, § 1.º (“desapropriação para construção ou ampliação de distrito industrial”) = nesta hipótese o bem expropriado pode ser destinado à venda ou à locação.

c) art. 4.º da lei 4132/62 (“desapropriação por interesse social”) = o bem pode ser destinado à locação ou à venda.

d) art. 182 § 4.º III, CR/88 c/c art. 8.º § 5.º da Lei 10.257/01 (“desapropriação para fins de urbanização”) = o bem expropriado não será destinado à pessoa jurídica que promoveu a desapropriação, sendo destinado á venda, para alguém que possa promover a urbanização.

V.3.10 – Desapropriação Indireta134

Não se trata de desapropriação, mas sim de apossamento administrativo. A desapropriação indireta seria nada menos do que um “esbulho” do Poder Público (que toma a posse do bem sem observar o procedimento legal previsto).

Não há qualquer procedimento, não tendo sido nem ao menos declarada a hipótese de expropriação.

PASSADO O PRAZO DA PRESCRIÇÃO AQUISITIVA DO BEM, DURANTE ESTADO DE APOSSAMENTO ADMINISTRATIVO (DESAPROPRIAÇÃO INDIRETA), E PRESENTES OS REQUISITOS DA POSSE AD USUCAPIONEN , OCORRERÁ A AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE PELO PODER PÚBLICO MEDIANTE USUCAPIÃO .

Cabe Ação Possessória contra a desapropriação indireta (ou, caso se queira defender não a posse, mas a propriedade, cabe Ação Petitória).

Porém, uma vez dada destinação pública ao bem, não caberá mais Ação Possessória, pois o interesse público prevalece sobre o interesse particular. Nesse caso, caberá apenas Ação de Indenização contra o Estado (a indenização será devida acrescida de juros moratórios e compensatórios, correção monetária e honorários advocatícios).

Obs.: DIREITO DE EXTENSÃO O expropriado pode exigir que o Poder Público inclua na Desapropriação a fração

remanescente do bem, caso seja perdida a sua utilidade em face da própria Desapropriação (art. 19 § 1.º, Lei 4504 c/c art. 12, Dec. 4958/03).

V.3.11 – Retrocessão (art. 519 NCC135)

134 A Desapropriação Indireta é expressamente mencionada pelo Dec-Lei 3.365/41, art. 15-A § 2.º (com redação dada pela MP 2.183/01).135 Antigo art. 1150 do CC/16.

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101DIREITO ADMINISTRATIVO

Consiste na alienação do bem expropriado, em virtude de desvio de finalidade, ao seu anterior proprietário, por valor correspondente ao pago a título de indenização quando da desapropriação.

A) Pressuposto da Retrocessão

O pressuposto da retrocessão é a chamada TREDESTINAÇÃO ILÍCITA (uso do bem expropriado para finalidade distinta daquela afirmada no Decreto expropriatório, sem que se atenda o interesse público136). Trata-se de espécie de desvio de finalidade (art. 2.º p.u., Lei 4717).

A tredestinação só se configura se a desapropriação for consumada (ou seja, só se configura após o pagamento da indenização e a transferência da propriedade ao Poder Público, com a respectiva transcrição no RGI).

Pode haver retrocessão também se não for dada qualquer destinação ao bem no prazo legal (vide artigo 519 NCC).

B) Natureza Jurídica da Tredestinação Ilícita

São 3 as principais correntes acerca da natureza jurídica da tredestinação ilícita, pressuposto da retrocessão.

• 1.ª Corrente (Seabra Fagundes; Cretella Júnior; Bandeira de Melo; José Carlos de Moraes Sales; Lúcia Vale Figueiredo) = Trata-se de Direito Real, de modo que o expropriado dispõe do direito de reivindicar a posse do bem.

• 2.ª Corrente (Clóvis Bevilácqua; Orlando Gomes; Caio Mário; Sílvio Rodrigues) = Trata-se de Direito Pessoal, logo o expropriado não pode reivindicar a posse do bem, mas tão somente pleitear o ressarcimento ou reparação dos danos sofridos137.

• 3.ª Corrente (Roberto Barcelos Magalhães; Maria Sylvia Di Pietro) = Trata-se de Direito Misto. Assim, a princípio é direito real, exceto se o bem tiver sido alterado substancialmente (hipótese em que o expropriado não reivindicará a posse, mas pleiteará ressarcimento ou reparação).

O STJ e o STF firmaram posição no sentido de abraçar a 1.ª CORRENTE (Direito Real, conferindo ao expropriado a faculdade de reivindicação da posse do bem).

► QUESTÃO — No caso de o Poder Público não atribuir nenhum fim ao bem expropriado (demora excessiva no uso do bem), aplica-se à retrocessão por analogia o disposto no artigo 10 do Dec-Lei 3.365/41138 ?

R: São 2 as vertentes doutrinárias a respeito dessa questão.• 1.ª Corrente (Seabra Fagundes) = Aplica-se analogicamente o artigo 10 do Dec-Lei

3.365/41. Logo, o prazo é de 5 anos, após o qual se presume a ocorrência de tredestinação ilícita. Há, inclusive, regra expressa no NCC (art. 519).

136 Não caracteriza tredestinação ilícita o uso do bem para fim diverso do afirmado no Decreto Expropriatório, se for mantido o interesse público (exemplo: bem expropriado para a construção de escola, porém usado para a construção de hospital).

137 A desapropriação, por si só, não causa dano, mas sim um prejuízo, sendo por isso paga indenização ao expropriado. Porém, no caso de tredestinação ilícita, ocorre um dano, caracterizado pela perda de um bem do expropriado injustificadamente, sendo o mesmo utilizado fora do interesse público.

138 “Art. 10, Dec-Lei 3.365/41 — A desapropriação deverá efetivar-se mediante acordo ou intentar-se judicialmente dentro de 5 (cinco) anos, contados da data da expedição do respectivo decreto e findos os quais este caducará. Neste caso, somente decorrido 1 (um) ano, poderá ser o mesmo bem objeto de nova declaração. Parágrafo Único — Extingue-se em 5 (cinco) anos o direito de propor ação que vise a indenização por restrições decorrentes de atos do Poder Público.”

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102DIREITO ADMINISTRATIVO

• 2.ª Corrente (Hebert Chamoun) = Não se aplica o artigo 10 do Dec-Lei 3.365/41, pois este dispositivo não se refere à retrocessão, não se podendo presumir a ocorrência de tredestinação ilícita.

V.3.12 – Desistência da Desapropriação

Admite-se a desistência da desapropriação, pelo Poder Público, até o momento da incorporação do bem ao patrimônio público (isto é, até o trânsito em julgado da sentença ou até o momento do registro do imóvel).

Opera-se a desistência pela revogação do ato expropriatório.

O bem deve ser devolvido nas mesmas condições em que foi recebido pela Administração Pública (tendo havido alteração essencial do bem, será incabível a desistência). O expropriado deve ser ressarcido pelos eventuais prejuízos sofridos.