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1 ANÁLISE E PROPOSTAS DE MELHORIA DO PROCESSO PRODUTIVO ATRAVÉS DO MAPEAMENTO DO FLUXO DE VALOR Renata Portela Lima Teixeira (UFC) [email protected] Sérgio José Barbosa Elias (UFSC) [email protected] Dalvio Ferrari Tubino (UFSC) [email protected] Este artigo apresenta uma aplicação prática do mapeamento do fluxo de valor (MFV) em um setor de uma grande empresa de beneficiamento de castanhas de caju. Inicialmente é feita uma revisão teórica acerca da produção enxuta e da técnica mapeeamento do fluxo de valor. Na sequência, é apresentada a empresa e o setor de torragem, que foi objeto do mapeamento. A aplicação do MFV é mostrada seguindo-se as etapas preconizadas pela literatura, o que envolve o mapeamento do estado atual e do estado futuro. A utilização do MFV em uma indústria desse tipo, que se caracteriza pela grande variedade de produtos, necessita de alguns cuidados, a fim de que os resultados possam ser confiáveis e as propostas para implantação de um processo enxuto sejam viáveis sob o ponto de vista de sua aplicação na prática. O estudo possibilitou a identificação de possibilidades de melhorias no processo produtivo, no sentido de adequá-lo às diretrizes da lean manufacturing. Os melhoramentos propostos foram detalhados e os principais resultados obtidos apresentados. Palavras-chaves: produção enxuta; mapeamento do fluxo de valor, beneficiamento de castanha de caju XXX ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO Maturidade e desafios da Engenharia de Produção: competitividade das empresas, condições de trabalho, meio ambiente. São Carlos, SP, Brasil, 12 a15 de outubro de 2010.

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ANÁLISE E PROPOSTAS DE MELHORIA

DO PROCESSO PRODUTIVO ATRAVÉS

DO MAPEAMENTO DO FLUXO DE

VALOR

Renata Portela Lima Teixeira (UFC)

[email protected]

Sérgio José Barbosa Elias (UFSC)

[email protected]

Dalvio Ferrari Tubino (UFSC)

[email protected]

Este artigo apresenta uma aplicação prática do mapeamento do fluxo

de valor (MFV) em um setor de uma grande empresa de

beneficiamento de castanhas de caju. Inicialmente é feita uma revisão

teórica acerca da produção enxuta e da técnica mapeeamento do fluxo

de valor. Na sequência, é apresentada a empresa e o setor de

torragem, que foi objeto do mapeamento. A aplicação do MFV é

mostrada seguindo-se as etapas preconizadas pela literatura, o que

envolve o mapeamento do estado atual e do estado futuro. A utilização

do MFV em uma indústria desse tipo, que se caracteriza pela grande

variedade de produtos, necessita de alguns cuidados, a fim de que os

resultados possam ser confiáveis e as propostas para implantação de

um processo enxuto sejam viáveis sob o ponto de vista de sua

aplicação na prática. O estudo possibilitou a identificação de

possibilidades de melhorias no processo produtivo, no sentido de

adequá-lo às diretrizes da lean manufacturing. Os melhoramentos

propostos foram detalhados e os principais resultados obtidos

apresentados.

Palavras-chaves: produção enxuta; mapeamento do fluxo de valor,

beneficiamento de castanha de caju

XXX ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUÇÃO Maturidade e desafios da Engenharia de Produção: competitividade das empresas, condições de trabalho, meio ambiente.

São Carlos, SP, Brasil, 12 a15 de outubro de 2010.

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1.Introdução

O Mapeamento do Fluxo de Valor (Value Stream Mapping), apresentado por Rother e Shook

(1999), é uma ferramenta do sistema de produção enxuta que auxilia na busca e eliminação de

desperdícios e na melhoria contínua nos processos produtivos. Permite enxergar como os

fluxos de valores fluem de porta-a-porta, como os fluxos de informações e materiais estão

conectados para gerar um produto e quais áreas do fluxo devem ser melhoradas para ela

tornar-se enxuta.

Este trabalho visa identificar as possibilidades de melhoria no processo produtivo (setor de

torragem) de uma grande empresa de beneficiamento de castanha de caju, por meio do

Mapeamento do Fluxo de Valor, de tal forma a possibilitar um sistema de produção que esteja

em sintonia com a produção enxuta (lean production).

As informações foram coletadas diretamente a partir de observações e levantamento de dados

numéricos que possibilitassem a confecção do MFV e sua posterior análise. Trata-se assim, de

uma pesquisa ação de natureza qualitativa, que utiliza o estudo de caso em uma empresa de

grande porte (GIL, 2002).

2. Revisão teórica

2.1 Produção enxuta

De acordo com Womack et al. (1992), a produção enxuta tem como objetivo produzir

pequenos volumes de produtos de ampla variedade, empregando equipes de trabalhadores

multiqualificados em todos os níveis da organização, além de máquinas altamente flexíveis e

cada vez mais automatizadas. Busca a perfeição com custos sempre declinantes, ausência de

produtos defeituosos, nenhum estoque e uma gama variável de novos produtos.

Ohno (1997), Liker (2005), Correa et al. (2001), Corrêa e Corrêa (2004), Womack e Jones

(2004) e Tubino (1999) estabelecem como passo preliminar para a aplicação do Sistema

Toyota de Produção a identificação e eliminação dos desperdícios, que foram assim

identificadas: de superprodução de mercadorias desnecessárias; de espera, dos funcionários

pelo equipamento de processamento para finalizar o trabalho ou por uma atividade anterior;

em transporte desnecessário de mercadorias; do processamento desnecessário, devido ao

projeto inadequado de ferramentas e produtos; de estoque à espera de processamento ou

consumo; de movimento desnecessário de pessoas; de produzir produtos defeituosos. Liker

(2005) acrescenta uma oitava perda, que ele considera um dos maiores desperdícios, que

consiste em não utilizar a criatividade das pessoas que trabalham na organização.

A Mentalidade Enxuta (lean thinking) é uma forma de produzir cada vez mais com cada vez

menos. Para que isso seja possível, é necessária a utilização de seus princípios: especificar o

valor, identificar a cadeia de valor, fluxo, produção puxada e perfeição (WOMACK; JONES,

2004).

Para Dennis (2008), a produção enxuta significa fazer mais com menos – menos

tempo, menos espaço, menos esforço humano, menos máquinas, menos material,

fornecendo aos clientes o que eles desejam. A produção enxuta representa um novo

paradigma em termos de sistema produtivo capaz de proporcionar elevados níveis

de produtividade e qualidade, por meio da eliminação dos desperdícios que ocorrem

no processo produtivo (LIKER, 2005). Para Womack e Jones (2004), o ponto

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essencial para o sistema de produção enxuta é o valor, o valor que o cliente final dá

ao produto ou serviço, porém poucas empresas promovem agressivamente essa

definição de valor.

Segundo Machado (2006), fornecer ao cliente um produto errado significa desperdício. Para

evitar este desperdício, o primeiro passo no pensamento enxuto deve ser uma análise do

contato com consumidores específicos, a fim de entender suas necessidades particulares em

determinado momento e o quanto eles estão dispostos a pagar por isso (valor agregado).

Valor, que é o ponto essencial da produção enxuta, significa a capacidade de oferecer um

produto/serviço no momento certo a um preço adequado, conforme definido pelo cliente. A

base da produção enxuta é, uma vez eliminados os desperdícios, reduzir os custos de

produção e maximizar a satisfação do cliente, ou seja, do valor agregado (WOMACK;

JONES, 2004; DAVIS et al., 2001).

As atividades que acontecem nas operações de uma organização podem ser assim

classificadas (HINES; TAYLOR, 2000):

- Atividades com adição de valor: são atividades que, na visão do cliente, valorizam o

produto/serviço e que acrescentam características que são a razão de seu consumo;

- Atividade sem adição de valor: são atividades que, na visão do cliente, não valorizam um

produto/serviço e que não acrescentam características necessárias a ele;

- Atividades necessárias sem adição de valor: são atividades que, na visão do cliente, não

valorizam um produto/serviço e que não acrescentam características necessárias a ele, mas

estão presentes, por limitações atuais do processo de transformação, como por exemplo, a

necessidade de fazer uma inspeção nas peças produzidas por determinada máquina porque ela

é muito antiga e não confiável. Para que a inspeção não ocorresse, seria preciso um vultoso

investimento, o que não é possível a curto prazo.

O entendimento dos conceitos e técnicas dessa filosofia de produção, de forma organizada e

prática, possibilitam as empresas a reduzirem seus estoques em todos os níveis, incrementar a

capacidade produtiva disponível sem grandes investimentos adicionais, reduzir os tempos de

fabricação, melhorar a produtividade, reduzir os custos de armazenamento e a movimentação

de materiais, melhorar a qualidade dos produtos fabricados, aumentar o desempenho na

utilização de material e em conseqüência de tudo isso satisfazer as expectativas de seus

clientes, tornando-as altamente competitivas (MOURA, 1992).

Para eliminação de desperdícios e alcance das metas estabelecidas, a produção enxuta lança

mão de um conjunto de abordagens e ferramentas, tais como o 5S, a Troca Rápida de

Ferramentas, kanban, poka yoke, entre outras (SLACK et. al, 2002).

A Mentalidade Enxuta (lean thinking) é uma forma de produzir cada vez mais com cada vez

menos. Para que isso seja possível, é necessária a utilização de seus princípios: especificar o

valor, identificar a cadeia de valor, fluxo, produção puxada e perfeição (WOMACK; JONES,

2004):

- Especifique o valor: O valor, na mentalidade enxuta, significa determinar o quanto cada

consumidor está disposto a aceitar ou pagar pelo produto final. O valor é algo que atende

diretamente às necessidades específicas e locais dos clientes. Vem à tona a pergunta: Será que

estão sendo atendidas somente as necessidades básicas dos consumidores ou coisas

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desnecessárias estão sendo alocadas ao produto? Na realidade cabe ao produtor repensar todo

o produto, colhendo dados, realizando pesquisas, buscando dessa maneira melhorar o que o

produto oferece;

- A cadeia de valor: Uma vez definido o valor do produto, torna-se necessário eliminar todas

as etapas produtivas de um determinado processo que não gerem valor. Consiste em eliminar

“muda” durante toda a fase de transformação do produto. Baseia-se em mapear todas as

cadeias de valores que identifique as ações necessárias para produzir um produto específico e

dividi-los em três categorias: aqueles que realmente criam valor; aqueles que não criam valor,

mas são necessários para os sistemas de desenvolvimento do produto, atendimento de

produtos ou produção (“muda” tipo um) e, portanto, ainda não podem ser eliminadas; ações

que não criam valor conforme percebido pelo cliente (“muda” tipo dois) e assim, podem ser

eliminados imediatamente;

- Fluxo: fluxo significa analisar toda a cadeia de valor pelo qual um produto deve ser

submetido. A idéia básica é eliminar desperdícios, tais como estoque, que por sua vez gera

esforço humano demasiado, desperdício de tempo e requerimento de espaços maiores para

que a produção funcione;

- Produção Puxada: trata de saber o que o cliente necessita para em seguida iniciar o processo

de produção. A partir da necessidade inicial do cliente os setores produtivos envolvidos são

acionados somente no momento necessário (just-in-time), chegando até a área de compras,

que acionará o fornecedor no momento certo. Para que tal ocorra, todas as fronteiras de

comunicação com os clientes têm que ser destruídas e mais do que nunca os processos têm

que fluir;

- Perfeição: quando se fala de eliminar desperdícios, começa-se por uma atividade que seja

muito importante no processo, ou seja, que seja propício a eliminar muitos desperdícios.

Incluem-se também nesse princípio o kaikaku, ou melhoria radical. Depois de ter eliminado

alguns dos desperdícios, caminha-se para atingir outras atividades dentro da empresa. Com

isso tem-se que a empresa eliminou diversos tipos de “muda” e o objetivo agora é ir em busca

de eliminar mais desperdícios, implantando desta maneira a filosofia de melhoria contínua,

almejando assim a perfeição. Uma filosofia que prevê este tipo de tratamento é o kaizen.

2.2 Mapeamento do fluxo de valor (MFV)

O MFV é uma ferramenta do Sistema de Produção Enxuta, que permite às empresas uma

visualização completa de todo o fluxo de valor de seu processo produtivo. Segundo Rother e

Shook (1999), fluxo de valor é toda ação (agregando valor ou não) exigida para transformar a

matéria-prima em um produto final até sua entrega ao cliente. Mapear o fluxo de valor é

percorrer o caminho de todo o processo de transformação de material e informação do

produto.

O MFV é uma ferramenta essencial, pelos seguintes motivos: Ajuda a visualizar mais do que

simplesmente os processos individuais; Pode-se enxergar todo o fluxo; Ajuda a identificar

mais do que os desperdícios; Mapear ajuda a identificar as fontes de desperdício no fluxo de

valor; Fornece uma linguagem comum para tratar dos processos de manufatura; Torna as

decisões sobre o fluxo visíveis, de modo que possam ser discutidas; Junta conceitos e técnicas

enxutas, que ajuda a evitar a implementação de algumas técnicas isoladamente; Forma a base

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para um plano de implementação. Os mapas do fluxo de valor tornam-se referência para a

implantação enxuta; Mostra a relação entre o fluxo de informação e o fluxo de material; É

uma ferramenta qualitativa que descreve, em detalhes, qual é o caminho para a unidade

produtiva operar em fluxo (ROTHER e SHOOK, 1999).

3. Empresa objeto do estudo de caso

A empresa onde foi realizado o estudo é uma empresa de grande porte que beneficia um leque

inteiro de amêndoas de caju tanto para o exterior como para o mercado interno. Anualmente,

processa mais de 70.000 toneladas de castanhas de caju in natura em 15.000 toneladas de

amêndoas de caju, representando mais que 25% de todas as exportações do Brasil.

A empresa comercializa tanto amêndoas cruas quanto torradas. Uma parte da produção de

amêndoas cruas é destinada ao setor “torragem”, onde são torradas e salgadas para depois

serem comercializadas. Os produtos crus são destinados, em sua grande maioria, à

exportação, enquanto os torrados só são vendidos no mercado interno.

3.1 Setor de torragem

O principal motivo para a realização do estudo no setor de torragem foi em virtude de ser o

setor responsável pela preparação de todos os produtos comercializados no mercado interno, o

qual já vem sentindo certa dificuldade em atender a demanda existente, causada pela

desvalorização do dólar, que desestimulou a exportação. Tornando o fluxo produtivo desse

setor mais enxuto, reduzindo-se o seu lead time de produção e eliminando desperdícios, a

torragem poderia conseguir atender de maneira satisfatória a demanda sem atrasos,

conquistando assim novos clientes.

O setor de torragem é geralmente visto como uma “fábrica” a parte da empresa, responsável

pela preparação de todos os produtos que são comercializados somente no país. Atua

diretamente na torragem de amêndoas inteiras, granulado e farinha, e posteriormente, no

envase desse material na forma de embalagens trade e/ou varejo. Como processa, em geral,

amêndoas provenientes da própria empresa, a qualidade de seus produtos está ligada

diretamente com a qualidade da matéria-prima gerada nos setores anteriores.

3.2 Aplicação do MFV

O estudo se desenvolveu através de acompanhamentos dos processos englobados no setor.

Inicialmente foi feita uma visita, acompanhada pela líder de produção, com o objetivo de

conhecer, de forma simplificada, as etapas envolvidas na torragem de amêndoas.

Posteriormente cada etapa foi acompanhada separadamente, propiciando um estudo mais

detalhado. Conseqüentemente, algumas idéias de melhorias no processo foram propostas, de

forma a melhorar e aumentar a produtividade, reduzindo-se os desperdícios.

3.2.1 Etapa 1 – seleção de uma família de produtos

Foi feita uma matriz de relacionamentos “produtos versus processos”, mostrado na figura 1,

para o agrupamento dos diversos produtos do setor em famílias, facilitando na escolha do

produto a ser mapeado.

A família de produtos escolhida adotando-se o critério de maior participação na venda total

do setor. De acordo com as previsões de vendas feitas pelo setor de marketing, os produtos

desta família são os que possuem maior demanda no mercado, correspondendo a 37% da

venda total do setor.

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Figura 1. Seleção da família de produtos

Devido à complexidade de se mapear simultaneamente os três produtos da família, em

decorrência dos diferentes tempos de ciclos, apenas um produto foi escolhido para representar

a família, no caso, a castanha de caju sachê 50g, que sozinha corresponde a 21% da demanda

total do mercado. A demanda mensal média deste produto é de 6.799 caixas.

3.2.2 Etapa 2 – desenho do mapa do estado atual

As fronteiras do primeiro mapa do setor vão desde o fornecimento da matéria prima

(amêndoas W1 320) até a entrega das caixas ao armazenamento de produto acabado da

empresa.

No desenho do mapa (figura 2), são registradas na caixa de dados, embaixo de cada etapa do

processo do produto (considerado no caso, uma caixa contendo 72 sachês 50g), as seguintes

informações: tempo de ciclo; tempo de troca nos processos (TR); número de pessoas

necessárias para operar o processo e o tempo de trabalho disponível por turno naquele

processo (em segundos, menos os intervalos de almoço e lanche).

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W1 320 = 1.100 caixas

Supervisor e Líder

Embalagem de amêndoas

cruas

Gerente de Produção

Solicitação de MP

Confirmação de Material

Setor deVendas

Previsão anual de vendas

APTPlanejamento mensal e semanal

6.799 cxs/mêsPallet = 90 caixas

2 turnos

Torrefação

2

TC = 30,4 seg.TR = 50 minut.3 turnos

24.300 seg. disp.Vazão = 427 kg/h

TC = 90 seg.TR = 1h30 minut.3 turnos

28.800 seg. disp.Capac. = 144 kg/h

E

150 cxs

TC = 22 seg.TR = o 3 turnos

24.300 seg. disp.

2 racks de W1 320 - 50

monoblocos cada

E

180 cxs

Revisões mensais

Envase Linha 3

3

Embalagem

2

Expedição

48 h

30,4 segundos 90 segundos

2 h

22 segundos

48 h

Tempo de processamento

= 11,5min.

Lead time de produção = 4

dias

Programação diária

Resfriamento

0

TC = 546,8 seg.TR = 03 turnos

28.800 seg. disp.Obs: 18 horas de resfriamento.

E

546,8 segundos

Entregas diárias

1 vez ao dia

Figura 2 – O Mapa do estado atual

Alguns problemas clássicos de uma produção empurrada podem ser observados no setor de

torragem. Três, dos sete desperdícios identificados por Taiichi Ohno que devem ser

combatidos na produção enxuta são identificados: Processo inadequado, pois observa-se que

no processo de resfriamento, as amêndoas levam um longo tempo para atingirem a

temperatura desejada para o envase, denotando o uso de um método ineficiente; Estoques -

pode-se verificar acúmulo de estoque sob a forma de matéria-prima, material em

processamento e produto acabado gerando desperdício de espaço principalmente nas áreas de

abastecimento e expedição do setor; Espera - no mapa, pode-se verificar o estoque de caixas

após o envase aguardando para serem lacradas, datadas e arrumadas em pallets, atividades

feitas no processo de embalagem. Isto ocorre porque só existe uma máquina na linha de

embalagem para executar essas tarefas, atendendo as três linhas de envase ao mesmo tempo.

Outro problema identificado foi o longo tempo de setup na linha 3 de envase. O operador, em

cada início de turno, deve fazer a limpeza da máquina empacotadora, o alinhamento da bobina

de sachê na máquina e a regulagem do peso do material, gastando em média um tempo de

uma hora e meia. Durante o turno, caso esteja trabalhando com o mesmo produto, o setup se

resume apenas a troca da bobina de sachê, que demora 45 minutos. Realizada 3 vezes durante

o turno, essa troca gera ainda um grande desperdício de embalagem.

3.3.3 Etapa 3 – desenho do mapa do estado futuro

Para atender a demanda do cliente dentro do tempo de trabalho disponível, o setor de

torragem precisa produzir uma caixa de sachê 50g de amêndoas torradas a cada 266 segundos.

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O gráfico de barras da figura 3 resume os tempos atuais totais dos ciclos para cada processo e

os compara com o takt time, podendo-se ver qual dos processos do fluxo produtivo da

torragem não consegue acompanhar a demanda do cliente.

Analisando-se os tempos de ciclo, todos os processos da torragem, com exceção do

resfriamento, têm capacidade além do suficiente para atender a demanda do produto em

questão, resultando em folgas na produção. No entanto, é importante lembrar que o cálculo do

takt time foi baseado na demanda de apenas um produto, que passa por determinado fluxo

produtivo do setor. Se mais produtos fossem levados em consideração, o número takt seria

menor, o que viria a diminuir essa folga.

O gargalo do fluxo produtivo do setor pode ser facilmente identificado: o processo de

resfriamento. Uma melhoria desse processo seria necessária para tentar trazer seu tempo de

ciclo abaixo do takt time.

A idéia da utilização do resfriador seria, ao reduzir o tempo de resfriamento, desenvolver um

fluxo continuo entre a etapa de torrefação e a linha 3 de envase, reduzindo o lead time de

produção. Entretanto, observando-se a figura 4, o fluxo contínuo não seria possível devido às

diferenças entre os tempos de ciclos dos processos envolvidos. O resfriador não conseguiria

absorver a vazão do forno, resultando em acúmulo de estoques entre eles.

0

100

200

300

400

500

600

Torrefação Resfriamento Envase Embalagem

30,4 s

546,8 s

90 s

22s

Takt time = 266 segundos

Figura 3 – Tempos atuais de ciclo dos processos da torragem x takt time

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9

0

50

100

150

200

250

300

350

400

Torrefação Resfriamento Envase Embalagem

Takt time = 266 segundos

30,4s

90 s

22s

127s

Figura 4 – Tempos de ciclo dos processos da torragem com o resfriador x takt time

O recomendado seria aproximar os valores desses tempos de ciclo realizando um

balanceamento dos recursos disponíveis (tempo, pessoas, ferramentas e outros) entre os

processos. Neste caso, como todos os processos envolvidos são mecanizados, alterações nos

tempos de ciclo não são aconselháveis, pois poderiam influenciar, em menor ou maior

intensidade, na qualidade do produto.

Todavia, um fluxo contínuo poderia ser realizado entre o resfriador e a linha 3 de envase, pois

a diferença observada, entre os tempos de ciclo desses processos, é compensada levando-se

em conta as paradas que a linha 3 de envase realiza (3 trocas de bobinas de sachê por turno,

com 45 minutos de duração cada).

Outra opção para a implantação de um fluxo continuo entre esses processos seria, a redução

da velocidade da empacotadora, tentando aproximar o tempo de ciclo do envase ao tempo de

ciclo do resfriador, somado a melhorias no tempo de setup da linha 3. Com o aumento do

tempo de ciclo do envase, um de seus auxiliares de produção poderia ser transferido para

ajudar no transporte do material entre os dois processos que devem ficar imediatamente

próximos (figura 5).

TORRAGEM INTEIRAS

Forno a Óleo

Salinado

MONOBLO

CO

Fluxo do

Processo

MONOBLOCOS PROVENIENTES DO

FORNO

Linha 3 de envaseMONOBLOCO

RE

SFRI

ADOR

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Figura 5 – Layout proposto com a introdução do resfriador

Outro ponto que merece atenção, onde o fluxo de produção é quebrado, ocorre entre o envase

e a embalagem. As caixas ficam aguardando por aproximadamente 2 horas para serem

lacradas. Incorporar a linha de embalagem no fluxo contínuo significaria dedicá-la apenas à

linha 3 de envase. Isto resultaria em um equipamento muito subutilizado devido ao seu rápido

tempo de ciclo e na necessidade de comprar outro equipamento para atender as outras linhas

de envase do setor. Como se pode verificar, não valeria a pena incluir esse processo no fluxo

contínuo, sendo mais fácil controlar a produção entre o envase e a embalagem com um

sistema puxado.

A fim de controlar a produção entre os processos que não estão diretamente ligados em um

fluxo contínuo, podem-se usar os sistemas puxados. Um supermercado e duas linhas FIFO

(“first in, first out”, primeiro a entrar, primeiro a sair) seriam necessários para o fluxo de valor

desse produto.

Para a matéria-prima, seria interessante o uso de “quadrados kanban”, que são espaços

demarcados no chão, divididos em quadrados capazes de armazenar determinada quantidade

de material. A existência de quadrados vazios dispararia um pedido kanban ao fornecedor.

Esse sistema impediria os grandes estoques de matéria-prima, como observado no mapa do

estado atual, ou a falta da mesma.

Com o intuito de controlar o estoque entre o resfriador e o forno, e impedir que este produza

em grandes quantidades devido a sua alta vazão, uma linha FIFO poderia ser usada entre eles.

Para atender a demanda diária de 284 caixas, são precisos 1.022 quilos de amêndoas torradas

por dia, o que equivale a 10,3 lotes. Uma linha FIFO capaz de armazenar no máximo 10,5

lotes de amêndoas torradas seria suficiente. Sempre que a linha estiver cheia o forno pára de

produzir, evitando a superprodução e só retornaria a produzir no dia seguinte.

A embalagem manda as caixas para a expedição em pallets contendo 90 unidades. Para

atender a demanda diária do produto, 3 pallets seriam necessários por dia. Uma linha FIFO

capaz de armazenar 270 caixas poderia ser usada para controlar a produção entre esses

processos. A linha FIFO seria esvaziada diariamente. Seria recomendável que a linha de

embalagem, por atender as três linhas de envase, fizesse um revezamento adequado de acordo

com a produção de cada linha.

Os intervalos de tempo que o material permaneceria nas linhas FIFOS foram estimados com

base na capacidade de produção e nos tempos de ciclo do último processo da linha.

Em um sistema puxado é possível programar a produção em apenas um ponto da cadeia de

valor, definindo assim o ritmo para todos os outros processos. Neste caso, a produção seria

programada no processo de torrefação, que definiria a quantidade necessária de amêndoas a

serem processadas nos outros processos, para atender a demanda estabelecida pelo setor

comercial.

Viabilizar o fluxo idealizado nos itens anteriores requer algumas melhorias nos processos. A

utilização do resfriador contínuo pode ser vista como a principal melhoria a ser introduzida no

setor de torragem.

Outro fator, que inclusive já vem sendo modificado no fluxograma do setor, é o número de

vezes que o produto acabado é levado da expedição ao APT (armazém de produto acabado da

empresa), passando de uma para três vezes ao dia, evitando o estoque de produto acabado na

área de expedição do setor de torragem.

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Figura 6 – Mapa do Estado Futuro

Pode-se agora desenhar o mapa do fluxo de valor completo do estado futuro, com os fluxos de

informação, de material e as necessidades de kaizen específicas. O desenho é ilustrado na

figura 6. Um plano de ação é necessário para a implementação das mudanças propostas.

4. Considerações finais

Quando comparados, os dados do estado atual e do estado futuro evidenciam significativas

melhorias no fluxo de produção mapeado (Tabela 1).

Pelo desenho do mapa do estado atual, três desperdícios elencados pela produção enxuta

foram facilmente detectados no setor (processo inadequado, estoques e espera de material

para ser processado) e poderiam ser reduzidos com as idéias de modificações apresentadas no

mapa do estado futuro. O MFV pode chamar a atenção dos responsáveis do setor para a

grande diferença existente entre o lead time de produção e o tempo de processamento, que é

quando realmente se está agregando valor.

A introdução de um novo processo de resfriamento e de um fluxo contínuo do resfriador até o

envase resultou em uma redução de 74% no tempo total de processamento. A eficiência

alcançada, mediante a diminuição desse tempo, iria refletir no aumento da produtividade do

setor, lembrando que este parâmetro é obtido da simples relação: produto total/quantidade de

trabalho aplicada.

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Tabela 1 – Comparativo mapa atual x mapa futuro

Por sua vez, a introdução de sistemas puxados para o controle de estoques entre os processos,

levou a uma redução de 57,5% no lead time de produção passando de 4 para 1,7 dias. Com o

lead time de produção reduzido e conseqüentemente maior rapidez na resposta ao cliente, o

setor de torragem teria mais condições de atender a demanda existente e ao futuro mercado

que se pretende conquistar.

No mapeamento do fluxo de valor, ao se idealizar o mapa do estado futuro, procura-se igualar

os tempos de ciclo com o takt time, com o objetivo de se produzir a quantidade certa no tempo

certo para o atendimento do cliente. Neste trabalho, a comparação dos tempos de ciclo dos

processos com o takt time (figura 4) revelou uma folga na produção. Contudo, é válido

ressaltar, que esta folga evidenciada só ocorreu por se tratar do mapeamento de apenas um

produto da família selecionada do setor. Esta folga pode ser aproveitada para a produção dos

outros produtos que passam pelo mesmo fluxo produtivo.

Tendo em conta todos os fluxos de produção dos produtos da torragem, melhorias no

resfriador contínuo precisariam ser realizadas, pois este teria que absorver a produção dos

outros fornos de torrefação e atender as outras linhas de envase. Neste caso, um fluxo

contínuo até o envase não seria possível a não ser com a aquisição de mais unidades de

resfriador o que traria mais custos para a empresa.

Trabalhando apenas com um resfriador, sistemas puxados poderiam ser utilizados para

controlar a produção entre ele e as linhas de envase, e concomitantemente a realização de

planejamentos para o nivelamento do mix de produção dos produtos em todos os processos.

Para um alto grau de nivelamento, teria que se conseguir a habilidade de se efetuar trocas

rápidas reduzindo-se os tempos de setup dos equipamentos.

Referências

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