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  • Anlise de O Aplogo de Machado de Assis: Um teor crtico frente

    sociedade que esse engenhoso artista/escritor, universalizou.

    *David Bruno Narciso

    Este trabalho objetiva-se analisar o texto Um Aplogo de Machado de Assis valendo-se da teoria semitica.

    O objetivo deste artigo fazer uma anlise semitica do Aplogo de Machado de Assis: Agulha e a Linha. Um Aplogo diferencia-se da fbula por ter personagens seres inanimados. Este que aqui vamos analisar apresenta duas figuras em primeiro plano a discutir qual delas detinha a maior parte da produo. Essas figuras so Agulha e Linha. Agulha e Linha so propriedades de uma Baronesa e instrumentos de produo de uma Costureira. Percebe-se que a linha busca o objeto de valor que ir ao baile e a Agulha manipulada para realizar o desejo da Linha. Por fim aparece a figura de um alfinete CUJO trabalho se resume em pregar coisas e onde ele para ali fica. O alfinete auto afirma-se inteligente por no abrir caminhos para ningum e no servir de trampolim para o sucesso alheio. O desfecho da narrativa d-se com a agulha trancada numa gaveta, numa caixinha da Costureira e a linha pregada ao corpo da Baronesa. A moral da estria exposta no texto tenho servido de agulha a muita linha...

    A Agulha questiona a Linha a respeito do motivo de estar to orgulhosa. Para a Agulha, a Linha no possui nada superior aos outros envolvidos na produo das roupas. A Linha, porm afirma ser ela a parte mais importante no processo de produo. Isso se pode justificar pela posse do objeto valor. Para a Agulha a prerrogativa o trabalho nele est o sentido de sua vida e sua odissia se resume em buscar a construo da melhor indumentria. A Linha, porm no foca sua busca no trabalho, mas no resultado dele. O valor est na possibilidade de acompanhar a Baronesa nas melhores festas e receber elogios alm de poder conhecer diferentes pessoas, ou seja, o Glamour.

    A Agulha verdadeiramente quem pode fazer a Linha alcanar seu objeto valor. A Linha pode prender pedaos de pano, dar feio a babados e etc, mas necessita que a Agulha abra o caminho e desbrave o

  • solo desconhecido. A linha, reconhecendo que ai est a possibilidade do seu sucesso e alcance de seu objeto valor, provoca a Agulha ao inferiorizar o seu trabalho. A Agulha para provar sua superioridade no processo de produo se entrega a mo da costureira e com esmero realiza seu trabalho. A Linha no momento da produo faz como quem nem escuta as provocaes da Agulha que, realizada por poder executar novamente seu trabalho, alcana seu objeto-valor.

    A Agulha apresenta no texto certa conscincia que seu trabalho possua grande importncia sendo quem fura o pano e vai adiante, puxando voc e para a Agulha, a linha vem atrs obedecendo ao que eu fao e mando. A Linha de fato reconhece essa superioridade no poder fazer, nas habilidades da agulha no processo de produo e por reconhecer sua superioridade na habilidade provoca a Agulha.

    Porm, a Agulha e a Linha s realizam os trabalhos que estiverem em conformidade ao Querer Fazer de outro elemento do texto, a Costureira. Esta detm a habilidade do fazer, sendo Agulha e Linha meios de produo e a Costureira a trabalhadora e operria no processo de produo. Dessa forma O poder fazer est nas mos da Agulha e da Linha, mas o querer fazer passa pelo consentimento da Costureira que pegou o pano, pegou a agulha, pegou a linha e construiu o vestido.

    Ao finalizar a performance existem dois planos de julgamento, o alfinete no plano das figuras e as pessoas no baile para o plano dos atores. O alfinete percebe pela sua experincia emprica do mundo e das relaes de produo que quem realiza o trabalho no recebe a glria pelo objeto construdo. O Alfinete relata a agulha que ela realizou a parte mais complicada na produo, abriu caminhos, furou e produziu, mas a linha, que ficou relaxadamente estacionada e carregada literalmente pela Agulha, agora receber a fama e o Glamour no Baile e a agulha voltar a caixinha de costura. Dessa mesma forma acontece com a Costureira, ela que corta e costura, ela que sabe manipular os meios de produo e ela quem possui a habilidade de construir o vestido, mas no ser ela a ir ao baile, no ser ela a receber as glrias pelo seu trabalho, talvez ela nem tenha roupa para ir ao baile, mas ela constri vestidos todos os dias, que so julgados pelas pessoas que esbarram na Baronesa nos bailes e festas.

  • Linha e Agulha tinham paixes, possuam desejos de ser algo perante a sociedade em que viviam. A linha apresentada como desarrumada, bagunada e enrolada, alem de no possuir meios de se fixar ao tecido e dessa forma nunca conseguiria ser um belo vestido. A linha provoca o estado de esprito da Agulha que se deixa levar pelas afrontas. Para a Agulha a linha no possua nenhuma habilidade to espetacular para expressar tamanho orgulho. Alguns argumentos da Agulha nos esclarecem que o reconhecimento de sua habilidade pelas outras pessoas seu objeto valor. A agulha provoca a agulha que cai no jogo e realiza o desejo da linha.

    A linha consegue se relacionar com seu objeto valor por meio do trabalho da Agulha.

    Da mesma forma que acontece na relao Costureira e Baronesa. O texto no apresenta se no os seus atos, mas pode-se atestar que o objeto valor da Baronesa ir s festas e bailes e ser admirada por todos enquanto que a Costureira espera que seu trabalho alcance a excelncia. Mas enquanto a Baronesa vai a festa a Costureira retorna a sua Casinha ou Quartinho.

    Agulha e linha conseguem chegar ao estado re relaxamento ou eufrico por entrarem em conjuno com seus objetos valor. A linha sai do estado de toda enrolada e disforme e toma forma no vestido da Baronesa enquanto a agulha consegue, colada aos dedos da Costureira, realizar suas habilidades.

    Consegui encontrar dois temas nesse texto: Um primeiro se refere a Classe Operria que realiza a produo,

    mas por no possuir os meios de produo no possui pra si o produto realizado. A Classe Operria no tem a propriedade privada dos meios de produo, dessa forma so obrigados a vender a sua fora de trabalho. Ficam com o reconhecimento da obra quem no produziu, mas o Estado e as Instituies legitimam seu lucro.

    O motor da histria a luta de classes e nesse texto est explicito o conflito entre classes sociais e suas respectivas exploraes.

    Podemos ver a explorao do trabalho da Agulha pela Linha e do trabalho da Costureira pela Baronesa.

  • Outro tema se refere diviso sexual do trabalho. Agulha, Baronesa, Linha e Costureira so figuras e atores do sexo feminino, enquanto o Alfinete e o Novelo so do sexo masculino. O Homem nessa histria a respeito de trabalho, passa despercebido, ele no realiza nada e ainda se auto afirma o sabe tudo e o nico dono da verdade. Pode-se perceber tambm uma aceitao cultural de que dessa forma o correto destacado na fala da Linha Agulha Que cabea, senhora? A senhora no alfinete. Sendo a cabea sinal de domnio de conhecimento a agulha no possui conhecimento

    O aplogo de Machado de Assis apresenta um tempo distante e um antigo espao pelo fato de comear com Era uma vez, no sabemos o espao real/tempo real que se sucedeu a ao, dessa forma o texto d um sentido universal ou seja, essa situao conflito pode se dar em qualquer espao/tempo.

    O narrador empresta a voz aos atores e figuras contidas no texto o que d a sensao de realidade e as figuras passam tomar caractersticas humanas (desejos, gostos, sentimentos) e o espectador-leitor ao presenciar a ao quase que real, pode se identificar com as personagens apresentadas durante a narrativa.

    O Enunciador na maior parte do texto a Linha e o Enunciatrio a Agulha que manipulada pelo Sujeito/Enunciador Linha.

    Por mais que haja a distncia no tempo durante a construo do texto pela forma que comea o texto pela ancoragem no tempo que alguns termos como Imperador, Baronesa, Ama e balaio das mucamas passam conotar um tempo distante, do Imprio, mas relaes parecem vivas e atuais durante o percurso que se do as situaes no texto.

    Para melhor seguir minha exposio, dividi o texto em: Questionamento; Justificativa; Fato; Aquisio do Objeto Valor;

    Moral desfecho. Questionamento: A Agulha questiona o ar de superioridade expressado pelo Velo de

    Linha, a agulha no via causa para tanta superioridade sendo a linha

  • insignificante no processo de trabalho e a Linha reconhece seu ar de superioridade e justifica que Deus dera esse ar de superioridade.

    Esse trecho pode figurar a Classe Operria no v superioridade na Burguesia para ficarem com tanto ar de superioridade. O Operariado tem conscincia de que toda a produo realizada realizada pelo seu trabalho enquanto que a burguesia s ostenta o ponpa. Porm a Burguesia procura meios para legitimar suas aes. Esses meios so a Religio, que monta a mentalidade da sociedade onde so condicionados a reconhecer uma submisso a Burguesia; O Estado que compem leis para legitimarem a propriedade privada da Aristocracia e da Burguesia e para punir os que no se enquadram e leis trabalhistas que achatam os salrios e segregam os produtores da glria de seus produtos.

    Justificativa; A Linha justifica sua superioridade pelo fato de ser ela a compor a

    parte visvel da obra e a Agulha quem abre o caminho para o servio da Linha. Dessa forma esse momento do texto apresenta uma diviso do trabalho e no uma superioridade, o texto mostra que ambas possuem habilidades que merecem ser reconhecidas como tal e que nenhuma superior mas ambas compem a produo.

    Para existir uma revoluo Industrial que se deu na Inglaterra e depois alastrou pela Europa e tomou o mundo precisou de uma revoluo Agricola. Para industrializar h a necessidade de haver matria prima. A transio da idade Mdia se deu com dois extremos, a Aristocracia possuindo a propriedade da terra e a Burguesia nas cidades realizando trocas por moedas dos excedentes do campo e manufaturados. A Classe operria se dividia e duas, os servos e Vassalos que no recebiam salrio mas tinham a liberdade de uso da terra devendo pagar courveia, tributos e banalidades ao Senhorio e o trabalho assalariado propriamente dito. Esse trabalho assalariado e o comrcio permitiu a compra de propriedades pela Burguesia, Assalariados e Arrendatrios. Outro evento que ocorria eram as corporaes de ofcio que eram unio de artesos para produo de produtos manufaturados. Nessas corporaes de ofcio comearam as evolues no processo de produo para maior aproveitamento de

  • tempo e dos meios de produo. Tem se ento uma diviso do trabalho e na sociedade um maior ou menor reconhecimento de determinadas funes no processo de Produo.

    Porm, relevante destacar que sem o retorna s leis que regiam o Imprio Romano no que diz respeito a propriedade privada isso tudo nunca aconteceria.

    Os trabalhadores quando saem do processo da produo procuram de diversas formas justificar seu posto de servio alegando maior formao profissional, tradio, trabalho duro ou at mesmo imanncia e benevolncia divina, mas na verdade o que ocorre a explorao do trabalho alheio para a satisfao de um objetivo prprio, ou seja, a aquisio do objeto valor.

    O Fato: Nesse momento do texto desloca o foco para o trabalho da

    costureira, mostra que nem uma nem a outra realizava trabalho e sim ambas eram passivas no processo da produo e quem realizava todo o trabalho era a Costureira e fica claro que Agulha e Linha eram simples meios de produo. Outro dado interessante que uma agulha e uma linha questionava sua superioridade mas estavam s a furar e pregar o melhor das sedas. Enquanto procuramos justificar nosso trabalho h algum que socialmente mais reconhecido como ns, porm, no mais ou menos importantes.

    Agulha e Linha so representados como galgos de Diana ou os Ces da Seda. So cachorros a abrir caminho e a carregar a que socialmente considerada uma Deusa.

    O narrador apresenta a Costureira e descreve seu trabalho. Ela guarda o trabalho para o dia seguinte e continua a trabalha no vestido da Baronesa, ao terminar ela espera o baile que no ir, mas passar a noite no ambiente de trabalho a esperar a Deusa Diana.

    A Aquisio do Objeto Valor: Na obra Um Aplogo, nesse ponto do texto o autor apresenta o

    pice da narrativa onde pode-se observar o conflito psicolgico entre as duas figuras. A Linha e o Maravilhoso Tecido de Seda estavam colados ao corpo da Baronesa que era preparado pela Costureira que tinha em

  • seu corpinho a Agulha espetada e seu simples vestido para dar algum retoque se necessrio.

    Durante a ao o Sujeito da Enunciao(?) no descreve o que passa na cabea das personagens, mas descreve o fato dando destaque aos objetos de valor que cada uma das figuras possuam e alcanavam seu estado de Euforia ou Disforia.

    A Linha chegava ao estado de conjuno com o seu objeto de valor Glamour apresentado pelo autor no vestir-se da Baronesa, compor o vestido da bela dama. E o discurso vitorioso da Linha:

    Ora, agora diga-me, quem que vai ao baile fazendo parte do vestido e da elegncia?

    E deixa para a Agulha o balaio das mucamas como destino. E ao olharmos pra colonizao e Imprio Brasileiros, percebemos que a mucama era a menor classe social entre as mulheres sendo que primeiro as mulheres nobres (Condessas, Baronesa, etc), corporaes de oficio e artess, e as escravas sendo a escria da sociedade. Machado deixou um ponto a se discutir aqui, acredito que racionalmente.

    A Agulha nada responde, mas fica claro que despertou seu desejo de tambm compor o baile e poder receber pelo trabalho realizado.

    Entre a Costureira e a Baronesa nada descrito, porm est claro que a Costureira, a que sabia confeccionar um vestido tambm teria o desejo de compor a festa, ou seja, possuir o objeto valor que a Baronesa detinha.

    Socialmente claro que essas relaes tambm acontecem, as grandes empresas pagam mseros salrios pelos servios prestados pela classe operria que s podem viver em pequenas caixinhas que chamam de casas. Alm de exibirem suas posses e certamente indagarem psicologicamente ...diga-me quem que vai ao baile... alm de estar em seus desejos que os trabalhadores tenham vidas piores que a escravos com o pouco que pagam pela sua pele e suor.

    Desfecho Moral: A Agulha nada fala, mas subentende-se o seu desgosto ao ver que

    trabalhou para realizar o desejo de outro e fora manipulada. Ela percebeu que no ia desfrutar de seu trabalho e deveria voltar a

  • caixinha da costureira para no dia seguinte ter energia para trabalhar novamente.

    O Alfinete aparece na estria como o que tem cabea e o possuidor da sabedoria. descrito pelo autor como de cabea grande e no menor experincia. O alfinete figura de uma sociedade que apia suas concluses na tradio. Esse ser medocre, que s faz ficar parado e em nada contribui tece a Moral do texto e apresenta uma alternativa a agulha. A fazer como ele, que pelo menos no serve de cavalo a ningum.

    A obra de arte um reflexo da realidade que todo expectador consciente passa a questionar. Em Um Aplogo, Machado de Assis apresenta com suas personagens atores uma luta de classes e a desigualdade social entre homens e mulheres e entre negros e brancos e jovens e velhos.

    O vestido foi festa por que era novo, mas no iria quando ficasse velho e velho com certeza cobriria o corpinho da costureira at chegar a pano de cho na mo das mucamas. Essa obra mostra um alto teor critico frente sociedade que esse engenhoso artista/escritor, universalizou.