ANA CLÁUDIA DE SOUSA...

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS FACULDADE DE EDUCAÇÃO ANA CLÁUDIA DE SOUSA RODRIGUES Produção De Sentidos E Processos Inferenciais: Um Estudo Da Compreensão Leitora De Alunos Do 3º Ano Do Ensino Fundamental I. CAMPINAS 2017

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

ANA CLÁUDIA DE SOUSA RODRIGUES

Produção De Sentidos E Processos Inferenciais: Um

Estudo Da Compreensão Leitora De Alunos Do 3º Ano

Do Ensino Fundamental I.

CAMPINAS

2017

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ANA CLÁUDIA DE SOUSA RODRIGUES

“Produção De Sentidos E Processos Inferenciais: Um

Estudo Da Compreensão Leitora De Alunos Do 3º Ano

Do Ensino Fundamental I.

Tese de Doutorado apresentada ao

Programa de Pós- Graduação em

Educação da Faculdade de Educação da

Universidade Estadual de Campinas para

obtenção do título de Doutora em

Educação, na área de concentração de

Educação, conhecimento, Linguagem e

Arte.

Este exemplar corresponde à redação final da Tese defendida por Ana Cláudia de Sousa

Rodrigues e aprovada pela Comissão Julgadora

Orientador: Sérgio Antonio da Silva Leite

Campinas

2017

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Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): Não se aplica.

Ficha catalográfica Universidade

Estadual de Campinas Biblioteca da

Faculdade de Educação Rosemary

Passos - CRB 8/5751

Rodrigues, Ana Cláudia de Sousa, 1972-

R618p Produção de sentidos e processos inferenciais : um estudo da

compreensão leitora de alunos do 3ºAno do ensino fundamental / Ana Cláudia

de Sousa Rodrigues. – Campinas, SP : [s.n.], 2017.

Orientador: Sérgio Antonio da Silva Leite.

Tese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Faculdade de Educação.

1. Inferência. 2. Leitura - Compreensão. 3. Letramento literário. 4.

Interdisciplinaridade. I. Leite, Sérgio Antonio da Silva,1946-. II. Universidade

Estadual de Campinas. Faculdade de Educação. III. Título.

Informações para Biblioteca Digital

Título em outro idioma: The production of meanings and inferential processes : from the

reading of narrative texts for students of the 3rd cycle of the first year- elementary school

Palavras-chave em inglês:

Inferences-reading

Comprehension- literacy

Interdisciplinarity

Área de concentração: Educação, Conhecimento, Linguagem e Arte

Titulação: Doutora em Educação

Banca examinadora:

Sérgio Antonio da Silva Leite

Elvira Cristina Martins Tassoni

Rildo José Cosson Mota

Cláudia Beatriz de Castro Nascimento Ometto

Márcia de Souza Mendonça

Data de defesa: 23-02-2017

Programa de Pós-Graduação: Educação

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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE

CAMPINAS FACULDADE/INSTITUTO

TESE DE DOUTORADO

Produção De Sentidos E Processos Inferenciais: Um

Estudo Da Compreensão Leitora De Alunos Do 3º

Ano Do Ensino Fundamental I.

Autor: Ana Cláudia de Sousa Rodrigues

COMISSÃO JULGADORA:

Prof. Dr. Sérgio Antônio da Silva Leite (Orientador)

Prof. Drª. Elvira Cristina Martins Tassoni

Prof. Dr. Rildo José Cosson Mota

Prof. Drª. Cláudia Beatriz de Castro Nascimento Ometto

Prof. Drª. Márcia Rodrigues de Souza Mendonça

A Ata da Defesa assinada pelos membros da Comissão Examinadora, consta no processo de vida acadêmica do aluno.

2017

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DEDICATÓRIA

Ao meu irmão, André Luís de Sousa Rodrigues (In

Memorian). Como a casa ficou vazia sem você! A sua

ausência dói na alma e ainda aperta o coração, mas é

preciso eguir adiante!

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AGRADECIMENTOS

Do início à conclusão deste trabalho, foram várias as pessoas que participaram durante este

percurso ao meu lado. Foram tantos os momentos, que agora neste exercício de relembrar

esta minha trajetória, me remeto aos momentos vividos com pessoas que estiveram

presentes, as que já não estão mais e, as que permaneceram no decorrer da caminhada ,

também as que surgiram no final e acompanharam o processo.

Gostaria de agradecer ao meu orientador Prof. Drº Sérgio Antonio da Silva Leite, que

acolheu meu projeto e acreditou deste do início, em minhas ideias, apesar do meu percurso

profissional e de pesquisa ser tão distinto do assumido na área que este estudo dialoga.

À Márcia Celestin e à Margarete de Faria, sem as quais este estudo não teria dado frutos,

pois foi através de nossas conversas que surgiu a ideia da pesquisa e pela irmandade.

Aos meus amigos e companheiros do ALLE: Ana Elisa, Alessandra, Cinthia, Fernanda,

Oton, pela amizade, pelas conversas e acolhimento nos momentos difíceis.

A todos os funcionários da instituição pesquisada, sobretudo à diretora Sílvia, vice-diretora

Priscila, à orientadora pedagógica Angélica e todos os professores da escola.

Às amiga queridas que não estão mais na escola mas que fazem parte da minha história:

Vilma e Érika.

Aos meus queridos amigos que sempre estiverem a prontos para uma conversa e que

fizeram e fazem minha vida mais alegre: Patrícia, Sandra F, Sandra X., Fernanda, Lauro,

Maria Aparecida e Amana.

Ao grupo de estudos e pesquisa – AFETO, pela troca de conhecimentos e acolhimento.

À Fran que contribuiu significativamente para a finalização deste estudo, por sua

disponibilidade e conhecimento.

Aos queridos alunos sujeitos desta pesquisa, que vi entrar tão pequeninos na escola e hoje

finalizaram o ciclo II e seguiram para o Ensino Fundamental – anos finais.

Aos meus pais Antonia e Sebastião que sempre me incentivaram a buscar realizar meus

sonhos, pelo apoio e dedicação.

À Sônia pelo carinho e atenção de sempre.

Ao Renan e a Maíra sempre disponíveis, presentes em vários momentos

importantes. Ao membros da banca, pela leitura atenciosa e contribuição da

discussão desta pesquisa.

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Para compreender um texto nós não apenas o lemos,

no sentido estrito da palavra: nós construímos um

significado para ele (...) Os leitores cuidam do texto.

Criam imagens e transformações verbais para

apresentar seu significado. E o que é mais

impressionante: eles geram significado à medida que

leem, construindo relações entre seu conhecimento, sua

memória da experiência, e as frases, parágrafos e

trechos escritos. (Merlin C. Wittrock, apud Manguel,

2004)

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RESUMO

Este estudo tem como objetivo investigar a produção de sentidos e processos inferenciais, a

partir da leitura de textos narrativos, por alunos do 3º Ano do Ciclo I – Ensino Fundamental

I, em uma escola da Rede Municipal de Campinas. Foram selecionados três alunos do

último ano do ciclo de alfabetização e analisadas as inferências produzidas por eles - de

base textual, base contextual e sem base textual e contextual - segundo o modelo teórico

proposto por Marcuschi (2008). Buscou-se relacionar, as inferências produzidas pelos

mesmos com as conexões feitas no seu contexto social e escolar. Partiu-se do pressuposto

que ler é inferir, sendo que a compreensão leitora está diretamente relacionada com a

capacidade de produção de inferências, considerando a situação imediata em que ocorre a

leitura e a contextualização cognitiva atreladas à organização dos conhecimentos e

experiências pessoais. A coleta de dados baseou-se em sessões de leitura, em que foram

utilizados 3 textos distintos, todos lendas da cultura popular brasileira: texto 1- “Dança do

Arco-íris”; texto 2 - “A origem do Oiapoque”; texto 3 - “Romãozinho”. Cada sujeito

selecionado participou de duas sessões de leitura de cada um dos textos. A cada leitura, o

sujeito leu em voz alta, em seguida elaborou comentários orais sobre o texto, com ou sem

intervenção da pesquisadora. Foram realizadas18 sessões de leitura, todas viodeogravadas e

transcritas. A partir desse material, foram identificados e analisados os tipos de inferências

produzidas pelos sujeitos, sendo tais inferências cotejadas com as experiências vivenciadas

pelos alunos nos primeiros anos de escolarização do ensino fundamental, em que se

destacaram trabalhos com projetos interdisciplinares, como Sacola, Roda da Leitura e

Festival Literário.).Verificou-se, nas inferências produzidas pelos sujeitos pesquisados, que

o investimento, realizado pela professora, em práticas pedagógicas que prezam pela

formação literária dos alunos contribuiu com processo de compreensão leitora, além da

formação de leitores engajados e proficientes.

Palavras-chave: inferências, compreensão leitora, letramento literário, projetos

interdisciplinares

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ABSTRACT

This study aims to investigate the production of meanings and inferential processes, from

the reading of narrative texts for students of the 3rd cycle of the first year - elementary

school, at a school in the Campinas Municipal School Net. Three students of last year

literacy cycle were selected and analyzed the implications produced by them – regarding to

textual basis, contextual basis and without textual and contextual basis - according to the

theoretical model proposed by Marcuschi (2008). This work tried to relate the inferences

produced by them with the connections made in their school and social context. The

standpoint was that reading is infer and that reading comprehension is directly related with

the inferences production capacity, considering the immediate situation in which there is

reading and cognitive contextualization linked to the organization of knowledge and

personal experiences. Data collection, based on reading sessions were used in three

different texts, all legends of Brazilian popular culture: Text 1 "Rainbow Dance"; Text 2 -

"The origin of Oiapoque"; Text 3 - "Romãozinho". Each student selected participated in

two sessions of reading each text. In every reading, the reader had prepared oral comments

on the text, with or without intervention of the researcher. Were realized eighteen reading

sessions, all of that taped and transcribed. From this material, types of inferences produced

by the students were identified and analyzed, such inferences collated with the experiences

of the students in the early years of schooling of elementary school, which stood out work

on interdisciplinary projects, such as Bag, Reading Reunion and Literary Festival. It was

found, in the inferences produced by the subjects surveyed, that the investment held by the

teacher in pedagogical practices that values the literary education of the students had

contributed to process of reading comprehension, besides the formation of readers engaged

and proficient.

Keywords: inferences-reading comprehension- literacy literary-interdisciplinary projects

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LISTA DE QUADROS E TABELAS

QUADRO 1:Quadro Geral de Inferência ............................................................................ 37

QUADRO 2: Quadro de Operações ................................................................................... 38

QUADRO 3: Horizontes de Compreensão Textual ........................................................... 40

QUADRO 4: Quadro explicativo dos horizontes de compreensão textual ........................ 41

QUADRO 5: Projeto Interdisciplinar – Ciclo I - 1ª Fase ................................................... 52

QUADRO 6: Projeto Interdisciplinar – Ciclo I - 2ª Fase ................................................... 63

QUADRO 7: Projeto Interdisciplinar – Ciclo I - 3ª Fase .................................................... 76

FIGURA 1: Indicadores de população, alfabetização e renda da área atendida pela escola

............................................................................................................................................. 99

FIGURA 2: Imagem de satélite........................................................................................ 101

TABELA 1: Resultados da Provinha Brasil – Leitura (teste 2) – Nível de Alfabetização ........ 103

TABELA 2: Resultados da Provinha Brasil – Leitura (teste 2) – Desenvolvimento das

Habilidades. ................................................................................................................................... 103

TABELA 3: Resultados da Provinha Brasil – Leitura (teste 2) – Rendimento nas Questões

Objetivas. ...................................................................................................................................... 104

TABELA 4: Cronograma de Sessões de leitura – Texto 1. .............................................. 106

TABELA 5: Cronograma de Sessões de leitura – Texto 2 ............................................... 107

TABELA 6: Cronograma de Sessões de leitura – Texto 3. .............................................. 107

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Sumário 1. INTRODUÇÃO ....................................................................................................................................... 12

1.1. OBJETIVOS ...................................................................................................................................... 14 CAPÍTULO 1............................................................................................................................................... 17

1. LEITURA: CAMPO DE INVESTIGAÇÃO, CONCEPÇÕES, ROCESSOS INFERENCIAIS

E PRODUÇÕES DE SENTIDOS 1.1. Campo de investigação ............................................................................................................. 17

1.2. Concepções .............................................................................................................................. 23

1.3. Inferências: algumas considerações. ........................................................................................ 31

1.3.1. Processos Inferenciais e produções de sentidos. ....................................................................... 34 1.4. Formação do sujeito leitor: escolarização da leitura e compreensão textual ............................ 42

CAPÍTULO 2............................................................................................................................................... 48 2. CARACTERIZAÇÃO DAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DE LEITURA E

EXPERIÊNCIAS LEITORAS 2.1. Projeto: “Espelho, espelho meu, diga quem sou eu...” ............................................................. 51

2.2. Projeto “Na Trilha da Minha Vida ...” ....................................................................................... 67 2.1. Projeto: “Viajando pelo Brasil, desvendando minhas origens” ................................................ 75 2.2. Sacola e Roda da Leitura .......................................................................................................... 91 2.3. FLISELLO – Festival Literário do Tosello .............................................................................. 93

CAPÍTULO 3............................................................................................................................................... 94 3. PERCURSO METODOLÓGICO ............................................................................................ 94 3.1. Base Teórica ............................................................................................................................. 94

3.2. Descrição do Bairro e da Escola ............................................................................................... 97

3.3. Descrição dos Sujeitos e procedimentos de coleta de dados .................................................. 104

3.4. A professora: concepção de ensino- aprendizagem ................................................................ 108

3.5. Categorias de Análise ............................................................................................................. 111

CAPÍTULO 4............................................................................................................................................. 112 4. PRODUÇÕES E ANÁLISE DE INFERÊNCIAS.................................................................. 112 4.1. Texto 1 - “A Dança do Arco-Íris” .......................................................................................... 113

4.1.1. Análise de dados sobre compreensão leitora e produção de inferências. ............................... 116 4.2. Texto 2 - “A Origem do Oiapoque” ....................................................................................... 130

4.2.1. Análise de dados sobre compreensão leitora e produção de inferências ................................ 132 4.3. Texto “Romãozinho” .............................................................................................................. 149

4.3.1. Análise de dados primários sobre compreensão leitora e produção de inferências. ............... 151 CAPÍTULO 5............................................................................................................................................. 168

5. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS ...................................................................................... 168 5.1. Processo de compreensão leitora ............................................................................................ 168

5.2. Aluno Pedro ............................................................................................................................ 168

5.3. Aluna Elisa .................................................................................................................................. 174

5.4. Aluno Luís. ............................................................................................................................. 178

5.5. As implicações das práticas pedagógicas de leitura nas produções inferenciais: leitura de

textos narrativos ............................................................................................................................... 180

CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................................................................ 184 REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................................................. 188 APÊNDICE ..............................................................................................................................................190 ANEXOS ................................................................................................................................................ 257

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1. INTRODUÇÃO

A presente pesquisa surgiu em consequência das reflexões e questionamentos

oriundos da prática de orientação pedagógica. Atuo como orientadora pedagógica em uma

escola da Rede Municipal de Campinas desde 2009. Há quase 8 anos, sou corresponsável

pelo trabalho dos professores dos Ciclos I e II, os quais atendem aos alunos do 1º ao 5º ano.

Ao chegar nesta escola, busquei compreender todo o processo de ensino-

aprendizagem que ocorriam na interação entre professores e alunos. Isso significou estudos

e pesquisas sobre o funcionamento do Ensino Fundamental I e a dinâmica que caracteriza

esse segmento de ensino.

O primeiro ano que estive na unidade escolar foi para tomar ciência do

funcionamento da escola, reuniões de assessoramento, estudos e para ouvir os professores

sobre suas práticas, entre outros assuntos abordados em reuniões pedagógicas.

No início do ano letivo de 2010, na RPAI (reunião pedagogia de avaliação

institucional) que ocorreu durante três dias do mês de fevereiro na escola, estávamos

reunidos: professores, orientadoras pedagógicas, vice-diretores e diretora para elaborar o

planejamento anual. Nesta reunião, ficou definido entre os professores do Ciclo I e II que os

conteúdos de ciências, história e geografia seriam trabalhados, no decorrer do ano, através

de projetos. No 1º trimestre; seria abordado ciências, no 2º, história e no 3º geografia.

O desenvolvimento dos projetos oportunizou a relação mais próxima entre

orientadora pedagógica e professores, no caso específico, a aproximação maior ocorreu com

a professora Mariana1, que na época ministrava aulas no 2º ano do ciclo I. Além disso, foi

uma oportunidade de aproximação também com os alunos. Essa experiência de trabalhar

com projetos interdisciplinares, me fez refletir sobre a importância de se “enxergar” o outro

na relação educacional, nas palavras de Cortella (2006):

“Buscar ‘enxergar’ o outro não implica de forma alguma aceitá-lo como é;

não há prática educativa coerente se não houver inconformidade, dado que

a própria palavra ‘educação’ significa conduzir para um lugar diferente

daquele em que se está. No entanto, a incompreensão da gênese e

desdobramentos dos valores e conhecimentos daqueles com os quais

convivemos é um obstáculo brutal para uma relação pedagógica autônoma

e produtiva”. (p.50/51)

Foi muito importante poder estar com os alunos conhecer um pouco mais de sua

cultura, seus gostos, suas brincadeiras, enfim, conhecer melhor esse universo que muitas

vezes é desconsiderado pela cultura escolar..

1 Nome fictício da professora pesquisada

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Embora o cargo de orientação pedagógica esteja diretamente atrelado aos

processos pedagógicos, muitas vezes, vivenciamos a maior parte do tempo na escola

resolvendo questões burocráticas. No entanto, como orientadora pedagógica, pude olhar de

uma forma mais efetiva para o desenvolvimento dos alunos.

Além dos projetos, passei a participar de várias outras atividades propostas pela

professora já citada, como a roda da leitura. Esta atividade é realizada em sala de aula, em

um momento específico da semana, quando os alunos socializam os livros lidos em casa

para a professora e demais colegas.

Com o passar do tempo, comecei a observar e concluir intuitivamente que

algumas práticas pedagógicas assumidas pela professora estavam contribuindo para a

formação de alunos mais questionadores, pois tinham uma relação mais afetiva com os

livros de literatura infantil e apresentavam características de leitores autônomos e

engajados, ainda no ciclo I do Ensino Fundamental.

Com o ingresso no doutorado, passei a observar, como pesquisadora, o

cotidiano do trabalho desenvolvido pela Professora Mariana e as posturas dos alunos diante

da leitura. Buscava ali, indícios de como nesse espaço escolar, através da mediação

pedagógica, a criança vai constituindo-se como leitora.

Trabalhar na mesma escola que escolhi para fazer esta pesquisa, contribuiu para

a minha constituição enquanto pesquisadora, pois, convivia, diariamente, com as crianças,

participava de suas rotinas e acompanhava a professora em diversas atividades na sala de

aula e fora dela.

Nessas relações interativas, a pesquisa foi delineando-se e a principal questão

que passou a nortear este trabalho foi: como crianças em fase de alfabetização tornam-se

leitoras proficientes ao final do 3º ano do Ciclo I? Para isso, buscou-se olhar para a

produção de inferências construídas por três sujeitos selecionados para esta pesquisa. Eram

alunos matriculados no final do ciclo I e que vivenciaram as mesmas práticas de leitura e

trabalho com projetos interdisciplinares desde o início da escolarização.

Para entender esse processo, foram feitas sessões de videofilmagens das

crianças selecionadas. O procedimento de leitura dos textos escolhidos e posteriores

comentários produzidos pelos alunos, que serão apresentados no decorrer do trabalho, dava-

se individualmente e em voz alta.

As sessões foram transcritas e utilizadas para obter dados sobre quais tipos de

inferências são produzidas pelas crianças em situações de leitura, considerando que ler é

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produzir sentidos a partir de processos inferenciais (MARCUSCHI,1985; 2007; 2008;

2011). A partir da análise dos diversos tipos de inferências produzidas em comentários orais

sobre textos narrativos, foi possível obter respostas sobre a proficiência leitora das crianças

pesquisadas.

As práticas da professora desenvolvidas em sala de aula foram consideradas

relevantes pois priorizavam a leitura literária em diversas atividades de leituras, sejam elas

para fruição ou mesmo nos projetos desenvolvidos com vistas à aprendizagem de vários

conteúdos escolares. Os processos de interação entre professora e alunos para apropriação

da atividade leitora é analisada a partir da teoria histórica cultural desenvolvida por

Vygotsky (2003) na interface entre as inferências produzidas pelos alunos e o processo de

aquisição da leitura enquanto prática social e cultural.

Posto isso, destaco os objetivos a que se propõe responder este trabalho.

1.1. OBJETIVOS

O principal objetivo deste estudo é investigar a produção de sentidos e

processos inferenciais, a partir da leitura de textos narrativos, por alunos do 3º Ano do Ciclo

I – Ensino Fundamental I, em uma escola da Rede Municipal de Campinas. Analisar-se-á a

compreensão leitora de crianças do 3º ano do Ensino Fundamental com enfoque nos

processos inferenciais de base textual, contextual e sem base textual e contextual

(MARCUSCHI, 2008.).

O objetivo secundário é relacionar as inferências produzidas pelos sujeitos

pesquisados, a partir da leitura de textos literários, lendas de origem brasileira, com as

conexões feitas com processo de escolarização da leitura vivenciados no decorrer de três

anos no ciclo I. Ou seja, com as principais práticas pedagógicas de leitura literária

desenvolvidas pela educadora que acompanhou este grupo de alunos durante esses anos do

ensino fundamental.

O presente texto está organizado da seguinte forma:

Capítulo 1 – Leitura: campo de investigação, concepções, processos inferenciais

e produções de sentido. Buscou-se fazer um levantamento bibliográfico acerca das diversas

faces e interfaces da leitura enquanto objeto de pesquisa. O leque de pesquisas na área é

bem amplo e com distintas abordagens e autores – sobre Estado da Arte em leitura: Ferreira

(1999); Martins (2005), Penido (2010), sociológicas e históricas: Chartier (2001; 2009),

Darton (1992), Certeau (2004). Sobre a leitura: como prática social, aprendizagem e

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desenvolvimento; compreensão de textos escritos; interdisciplinaridade, escola e leitura

literária; letramento e letramento literário; processos interativos e inferências; são

referências: Abreu (2001), Bakhtin, M.[Volochínov] (2012), Coscarelli (2003), Freire

(2006), Kleiman (1989; 2007;2008; 2012), Geraldi (2010), Silva (1985; 2004; 2005);

Marcuschi (1985; 2007; 2008; 2011), Lajolo(2002), Smolka (2009;2010), Soares ( 2010;

2011), Vóvio (2007), Zilberman ( 2004; 2009).

A proposta deste capítulo é discorrer sobre a leitura e suas interfaces. Procurou-

se fazer um histórico sucinto sobre o campo de investigação: leitura no Brasil; além disso,

como este objeto foi assumido pelas diversas áreas do conhecimento, considerando as

diversas concepções sobre ele.

Como esta pesquisa está atrelada ao processo de compreensão textual, à

interação autor, texto e leitor e à produção de inferências, recorreu-se também a uma

discussão preliminar sobre escolarização da leitura literária na escola.

Refletir sobre o campo de estudos, leitura significa pensar neste objeto de forma

ampla, com muitas possibilidades de abordagens. Neste caso, tratou-se de focar nas

perspectivas teóricas construídas por autores que versam sobre a leitura como produção de

sentidos, de inferências, de atividade e trabalho social.

Sendo assim, ancorou-se nas ideias defendidas por Kleiman; Marcuschi;

Bakhtin e Geraldi: autores elencados anteriormente. Foi explorada as abordagens teóricas

desenvolvidas por esses autores, com o intuito de dar visibilidade às concepções de leitura e

ampliar as possibilidades de reflexão e discussões neste campo de pesquisa.

Capítulo 2 – caracterização das práticas pedagógicas de leitura e experiências

leitoras. O principal objetivo deste capítulo é apresentar algumas das principais propostas

pedagógicas criadas, implementadas e aplicadas pela professora, sujeito desta pesquisa. A

mesma acompanhou a sala dos alunos pesquisados, durante os 3 anos do Ciclo I – Ensino

Fundamental.

Além disso, o intuito foi relacionar as principais experiências - em sala de aula,

nos projetos e atividades de leitura vivenciados pelos alunos pesquisados, com suas

produções de inferências, construídas a partir da leitura de textos narrativos, durante o

processo desta pesquisa.

As principais referencias utilizadas foram: Cosson (2011), Vygotsky (2003;

2012), Luria (2012), Smolka (2009) e Oliveira (2010). Além dos 3 cadernos de registros da

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professora que contém as atividades das três fases do projeto interdisciplinar.

Capítulo 3: buscou-se apresentar e discutir o percurso metodológico, com

ênfase nas reflexões sobre pesquisa de cunho qualitativo embasadas nos pressupostos de

Bogdan e Biklen (1994).

Foram levantados indicadores com o intuito de caracterizar o bairro, com

ênfase em dados populacionais, de alfabetização e renda, retirados do IBGE, acrescidos dos

resultados da Provinha Brasil – avaliação sobre leitura e matemática do ano de 2013. Com o

objetivo de dar visibilidade a formação da professora, sua concepção de ensino e

aprendizagem, foi utilizada entrevista com a mesma.

Capítulo 4 – Produções e análise de inferências. Neste capítulo apresentam-se

os textos selecionados para a pesquisa de campo e na sequência, foram feitas análises sobre

as inferências produzidas pelos alunos em cada uma das sessões de leituras em que os

sujeitos pesquisados participaram.

No capítulo 5 - Discussão dos resultados. Pretendeu-se neste capítulo

evidenciar os processos de produção de sentidos e compreensão leitora, de cada um dos

alunos pesquisados à luz do aporte teórico sobre produção de inferências.

Por fim apresentou-se as considerações finais com algumas discussões

pertinentes aos resultados de pesquisa e a formação do leitor proficiente.

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CAPÍTULO 1

1. LEITURA: CAMPO DE INVESTIGAÇÃO, CONCEPÇÕES,

PROCESSOS INFERENCIAIS E PRODUÇÕES DE

SENTIDOS

A leitura é também co-produção do texto, uma atividade orientada por

este, mas que lhe ultrapassa.... É preciso ultrapassar o já sabido e

reconhecido para construir uma compreensão do que se lê (do que se

ouve)” (GERALDI, 2010, p.103).

1.1. Campo de investigação.

Ao olhar para o ato de ler como objeto de investigação, constata-se que se está

diante de um objeto multifacetado e de difícil apreensão. Com o intuito de compreender

algumas de suas principais facetas, optou-se por traçar um histórico sucinto de sua origem,

enquanto objeto de pesquisa no Brasil. Para isso, recorreu-se ao contexto da produção de

pesquisa sobre leitura identificado por Ferreira2

(2002).

Segundo a autora, foi na década de 1960, mais precisamente em 1965, que

foram regulamentados os primeiros programas de pós-graduação (mestrado e doutorado)

no Brasil, e a temática leitura emerge pela primeira vez enquanto produção acadêmica

através da tese: Significado de alguns fatores psicológicos no rendimento em leitura, da

pesquisadora Maria José Aguirre, apresentada em concurso de livre-docência à cadeira de

Psicologia Educacional da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras da USP, em 1965. Esta

pesquisa, segundo Ferreira (1999), caracteriza-se como:

O primeiro esforço no delineamento da Leitura enquanto área específica

de reflexão e pesquisa, desvinculada da problemática maior do ensino de

Língua Portuguesa ou da área de Alfabetização. A pioneira e solitária

pesquisadora localizada em minha busca é Aguirre (1965), que, no

instituto de Psicologia da USP, apresenta sua tese de livre-docência

intitulada “Significado de alguns fatores psicológicos no rendimento em

leitura”. Trata-se de um trabalho preocupado em estudar o problema do

rendimento da leitura em alguns alunos de escola primária, tanto em

relação ao aspecto de deficiência quanto em relação aos rendimentos

médios e superiores de leitura. (FERRERIRA, 1999, p.43-44). .

2 Artigo: Contribuições para a escrita da história da produção acadêmica sobre Leitura, no Brasil –

1965 a 1979 – apresentado no GT sobre Alfabetização, Leitura e Escrita (2002). Informações

obtidas em https://www.fe.unicamp.br/alle/textos/NSAF-ContribuicoesEscrita.pdf.

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É pertinente ressaltar que, a partir da segunda metade da década de 60 do século

XX, a leitura, enquanto objeto de investigação, está atrelada às discussões do campo da

Psicologia e, com enfoque, no rendimento dos alunos da escola primária; temática a qual

permanece atual. É fato também que a política pública de educação brasileira vem, desde a

última década do século XX, apoiando práticas de avaliações externas tendo assumido,

como principal objetivo, levantar indicadores sobre o sistema educacional brasileiro.

Exemplo notório é o da Provinha Brasil – instrumento de avaliação de leitura e

matemática, vinculado ao Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica – Saeb,

implementada pelo MEC em 19903.

Neste sentido, é possível constatar que o levantamento dos índices de

rendimento baixos, médios e superiores de leitura demonstra uma preocupação em

mensurar e definir padrões do que sejam bons leitores, através de instrumentos criados por

várias instâncias de poder, sejam elas governamentais e legitimadas por pesquisas

científicas.

Tema recorrente na educação escolar, sobretudo nos primeiros anos do ensino

fundamental, fase em que a criança aprende a ler e a escrever. Nesse processo são

detectados os fracassos com relação à aquisição da leitura e da escrita. Com o intuito de

explicar os problemas na aprendizagem da leitura, muitos foram os culpabilizados: em

alguns casos, o método de ensino, em outros, o próprio aluno, o material didático, assim

como a cartilha, entre outros.

Com relação à leitura, enquanto campo de investigação, verificou-se que

Aguirre (1965) inaugura a pesquisa sobre este objeto de estudos, e o Instituto de Psicologia

da USP constitui-se como o lugar de origem de construção teórica. Contudo, nos anos

subsequentes, a “leitura ganha status, ampliando seu campo de atuação e incorporando os

estudos da Psicolinguística, Sociolinguística, Teoria da Literatura e Pedagogia, entre as

áreas mais consolidadas”. (FERREIRA, 1999, p.44).

Na sua tese de doutorado, Ferreira (1999) define que no 3º período de sua

pesquisa, que englobam os anos de 1991 a 1995, a maior parte das pesquisas sobre leitura

têm como lugares de produção as faculdades e institutos de Educação, Letras e Linguística,

e, caracterizam-se por uma diversidade de abordagens teóricas, metodológicas e interfaces

com outras áreas.

3 http://portal.inep.gov.br/web/provinha-brasil/historico.

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O foco que mais emerge na maioria dos trabalhos pesquisados é sobre

compreensão/ desempenho em leitura, sendo a temática mais constante em todo o período

estudado. Acerca dessas pesquisas, Ferreira (1999) assevera:

Os resumos que interrogam, estudam, descrevem o processo de

compreensão e desempenho em leitura sob a perspectiva do leitor,

preocupando-se com a concepção que o indivíduo tem sobre a

compreensão, ou com a maneira pela qual a compreensão se dá, se

processa, ou, ainda na identificação das habilidades, competência, níveis

de leitura. (FERREIRA, 1999, p.79)

Desta forma, a maioria dos estudos posteriores ao de Aguirre (1965), embora oriundos

de outros lugares de produção, além dos programas de pós-graduação em Psicologia, têm como

temática predominante a compreensão/desempenho em leitura. São pesquisas de caráter

quantitativo, com ênfase em descrição de experimentos e eficácia de técnicas, assim nos assegura

Ferreira (1999):

No foco compreensão/desempenho em leitura, o que se vê de modo mais

geral e ao longo de todo período (80-95) é a predominância das pesquisas

experimentais, que descrevem e analisam experimentos verificando a

eficácia de técnicas sob condições controláveis e com introdução de uma

ou mais variáveis, cujo controle é feito através de testes ou questionários

aplicados aos sujeitos, distribuídos em vários momentos ou etapas: “pré-

teste, treino e pós- treino”; “grupo de controle e não controle”.

(FERREIRA, 1999, p.81).

A autora apresenta em sua tese todas as temáticas das pesquisas desenvolvidas

sobre leitura e suas interfaces, considerando o período pesquisado pela mesma. Além das já

abordadas, são elas: proposta didática e análise do ensino de leitura; leitores-preferências,

gostos, hábitos, histórias e representações: o caso do professor/ bibliotecário como leitor;

texto de leitura usado na escola; memória da leitura, do leitor e do livro; concepção de

leitura. Estas informações propiciam obter uma primeira noção sobre as pesquisas

desenvolvidas sobre leitura em cursos de pós-graduação, na segunda metade do século XX,

as quais garantem uma visibilidade da formação do campo desta temática no Brasil e seus

lugares de produção.

Dando continuidade às pesquisas sobre o “estado da arte” em leitura, iniciadas

por Ferreira (1999) e Martins (2005), Penido (2010), em sua pesquisa, avança no tempo

cronológico e traça um panorama das pesquisas sobre leitura no Brasil, entre os anos de

2000 a 2005. A autora, com o intuito de contribuir com a ampliação do campo de pesquisa,

busca, além de dar visibilidade às principais produções do período citado, verificar a

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ampliação das produções dessa temática no período circunscrito.

Com relação à cronologia das produções, e em termos numéricos, Penido

(2010) verifica um total de 596 pesquisas entre os anos de 2001 a 2005, um número bem

significativo comparado à produção entre 1980 a 1995, que segundo Ferreira (1999) totaliza

189 pesquisas entre teses e dissertações. Dentre os resumos pesquisados por Penido (2010),

a maioria das pesquisas concentra-se nas áreas de Letras/Linguística e Educação,

considerando os aspectos de compreensibilidade a partir dos materiais estudados, do seu

ensino, das memórias de leitura, dos livros, dos leitores.

Os aspectos citados acima, foram muito bem levantados em sua pesquisa. Em

contrapartida, temáticas como: alfabetização, letramento e literatura não foram abordadas.

Nesse estudo, a autora concluiu que:

É interessante destacar que, ao realizarmos uma análise mais detalhada

nos resumos encontrados, notaremos que a maioria das teses e dissertações

analisadas trazem propostas que focam o trabalho dos professores com

leitura dentro das salas de aula, indicando que os educadores estão cada

vez mais se conscientizando acerca da importância e dos benefícios da

realização de atividades de leitura junto aos estudantes, e que muitas vezes

esses trabalhos são oriundos de relatos de sua própria prática dentro das

escolas brasileiras. (PENIDO, 2010, p.49).

Portanto, é possível afirmar que a maior parte das pesquisas no Brasil, no início

do século XXI, produzidas nos cursos de pós-graduação, tem como foco a leitura na sala de

aula; no entanto, não há dados que comprovem se essa é uma tendência atual nas pesquisas

– ainda que seja possível considerar que a leitura em sala de aula é uma temática muito

recorrente, sendo muitos os trabalhos que se preocupam em investigar esse campo e suas

interfaces.

O Grupo ALLE – Alfabetização, Leitura e Escrita – pertencente à Faculdade de

Educação da Unicamp, tem sido responsável por uma produção de trabalhos, entre

dissertações e teses, muito significativos, sobre a temática leitura e suas mais variadas

dimensões, tais como: o “Estado da Arte”, formação de leitores, biblioteca escolar,

construções das relações entre leitores e livros, ler por prazer, memórias de leituras, práticas

de leituras em diversos espaços, dentre outros temas (Ferreira, 1999; Marcelino, 2003;

Klébis, 2006; Sampaio, 2008; Aliaga, 2013; Carvalho, 2015, entre outros).

Por volta dos anos 90, como parte do ALLE, foi criado o grupo de estudos

denominado Grupo do Afeto, sob a coordenação de Leite (2006), reunindo pesquisas e

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discussões teóricas e metodológicas sobre a questão da constituição do sujeito leitor. Entre

outras temáticas também pesquisadas pelo grupo, as que abordam a temática da formação

do leitor tendo em vistas os processos de mediação, envolvem os trabalhos Grotta, (2000),

Silva, (2005), Souza, (2005) e Higa, (2007 e 2015).

Neste sentido, ao se debruçar sobre a última década, é possível afirmar,

considerando algumas das pesquisas desenvolvidas no Grupo de Pesquisas ALLE e o

subgrupo deste, o Grupo do Afeto, ambos sediados na Faculdade de Educação da Unicamp,

que existe um crescente interesse pelas pesquisas que abordam a leitura como objeto de

investigação.

Em uma busca superficial , não foram encontrados indícios sobre o

desenvolvimento desta temática em termos de regiões brasileiras, como visto nas pesquisas

de Ferreira (1999) e Penido (2010) No entanto, o crescente interesse pela leitura deve-se,

entre outros fatores, ao fato de ser um assunto recorrente em várias instâncias da sociedade

e debatido de forma exaustiva em congressos nacionais, como o COLE, por exemplo,

criado nos anos finais da década de 70 por pesquisadores da leitura, com o intuito de

discutir uma suposta crise de leitura no país e suas possibilidades de mudança; no interior

deste nasce a ALB – Associação de Leitura do Brasil: ambos, congresso e associação,

surgiram com determinados objetivos e empreenderam várias transformações na leitura no

cenário nacional atual4.

Um outro fator que parece ser um indício explicativo sobre a permanência e

recrudescimento das discussões e pesquisas sobre leitura, seria a necessidade de pensar e

repensar os resultados obtidos nas avaliações internas e externas, que têm demonstrado

índices muito baixos com relação à compreensão leitora. Um instrumento que tem sido

referência sobre os níveis de aprendizagem de leitura dos adolescentes brasileiros é o PISA

cujo objetivo é produzir indicadores que contribuam para a discussão da qualidade da

educação nos países participantes, de modo a subsidiar políticas de melhoria do ensino

básico. A avaliação procura verificar se as escolas de cada país participante estão

preparando seus jovens para exercer o papel de cidadãos na sociedade contemporânea5.

A periodicidade das avaliações ocorrem de três em três anos. As avaliações

abrangem as áreas de leitura, matemática e ciências; em 2000 e 2009, o foco foi em leitura.

Segundo o relatório de 2009, o marco referencial do Pisa é o conceito de letramento, que,

segundo o documento, é a capacidade de um indivíduo entender, empregar e refletir sobre

4 Disponível em: http://alb.com.br/alb/apresentacao. Acesso em: 25 de junho de 2016. 5 Disponível em: http://portal.inep.gov.br/pisa/sobre-o-pisa. Acesso em: 25 de junho de 2016.

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textos escritos, para alcançar objetivos, desenvolver conhecimentos e participar da

sociedade6.

Segundo o relatório do PISA de 2009, os alunos que apresentaram maior

desempenho em leitura são os que demonstraram ter desenvolvido o prazer pela

leitura; considerando esse indício, é feita uma recomendação para que práticas de leitura,

que visam ao prazer e a fruição, sejam incentivadas nas escolas.

O PISA possui sete níveis de proficiência em leitura. Embora tenha

demonstrado um avanço no níveis, entre 2000 e 2009, no ranking mundial, o Brasil

encontra-se com a maior porcentagem nos nível 1a (28,6 %) em comparação com a OCDE

(Organização para Cooperação do Desenvolvimento Econômico) que apresenta uma

porcentagem bem menor nesse mesmo nível (13,1%). As características das atividades de

proficiência leitora são:

Atividades neste nível requerem que o leitor localize um ou mais blocos

de informações explícitas, para identificar o tema central da proposta de

um autor em um texto de natureza familiar ou realizar uma conexão

simples entre uma informação do texto e o conhecimento cotidiano. A

informação requerida é evidente no texto, com pouca informação

competindo com ela. O leitor é dirigido para considerar informações

relevantes no texto e na atividade. (PISA, 2012, p.28).

Nessa avaliação de leitura, de 2009, os estudantes que participaram da prova

apresentaram 0,1% nas atividades de nível seis. Segundo os critérios de avaliação em

leitura e letramento:

Atividades neste nível requerem que o leitor realize múltiplas inferências,

comparações e contrastes com precisão e detalhamento. Elas requerem

que se demonstre uma compreensão completa e detalhada de um ou mais

textos que podem envolver integração de informação entre eles.

Atividades que requerem que o leitor lide com ideias desconhecidas, na

presença de informações concorrentes, e gere categorias abstratas de

interpretação. As atividades de refletir e avaliar requerem que o leitor

delineie hipóteses ou que avalie de forma crítica um texto complexo ou um

tópico desconhecido, levando em consideração múltiplos critérios e

perspectivas, e aplicando interpretações sofisticadas para além do texto.

Uma condição presente para exercícios de Acessar e Recuperar neste nível

é a precisão de análise e atenção refinada para encontrar detalhes pouco

perceptíveis nos textos. (PISA, 2012, p.29).

6 Disponível em: http://download.inep.gov.br/acoes_internacionais/pisa/resultados/2009/brasil_relatorio_nacional_PISA_2009.p df. Acesso em: 30 de junho de 2016.

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Ao tecer uma análise preliminar e superficial sobre as informações expostas, é

possível afirmar que o leitor adolescente brasileiro compreende o que está explícito no

texto, entende somente o que é familiar e faz conexões simples com o conhecimento

cotidiano. Desta forma, torna-se necessário identificar quais são os motivos que contribuem

para uma compreensão limitada acerca do texto e a pouca interação com o mesmo. Esta é

uma temática importante a ser investigada.

Outro ponto a ser retomado é sobre o foco sobre a compreensão leitora, ou

questões atreladas a ela, tais como: níveis de compreensão e rendimento em leitura. Essa

temática é recorrente nas pesquisas em leitura no Brasil, considerando a primeira pesquisa

de Aguirre (1965) e as discussões atuais. Para ampliar essa reflexão, é necessário articular

estas a temáticas como concepções de leitura, formação do sujeito leitor, escolarização da

leitura, sobretudo a literária, para se traçar um panorama sobre o que seria um leitor

competente. E que, segundo o relatório do PISA sobre a avaliação de 2009, é aquele capaz

de realizar múltiplas inferências.

1.2. Concepções

Diante dos aspectos elencados, torna-se importante refletir como os discursos

sobre este objeto – a leitura - foram constituindo-se no decorrer do tempo e ganhando

legitimidade. Vóvio (2007; 2010) define que os discursos sobre leitura estão entre a

unidade e a multiplicidade.

A leitura, compreendida como unidade, caracteriza-se por uma única concepção

autorizada e legítima do ato de ler, por acreditar que este ato possui um poder

transformador da sociedade; o enfoque se dá no tipo de material, em geral, dado a ler: a

valorização de obras literárias consideradas canônicas. Assim, o importante é apropriar-se

das grandes referências clássicas e considerar os outros tipos de textos: menores, pois é

preciso garantir o status de uma prática de difícil acesso, justificada pelo seu caráter

altamente intelectual. Além disso, o enfoque também recai sobre a frequência com que se

lê, a valorização do hábito, do consumo, do domínio das normas e as competências

necessárias para o que determina a compreensão correta do texto lido.

Esta concepção de leitura entende que há uma única interpretação textual, com

ênfase na homogeneização do sentido que o texto deve imprimir no leitor; “e a

pressuposição de uma relação direta entre o texto e uma recepção determinada mais pelo

objeto do que pelo leitor” (VÓVIO, 2007, P.67). Desta forma, a ideia da leitura como

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unidade foi legitimada por uma série de pesquisas que visavam detectar os problemas

relacionados à aquisição da leitura, sobretudo no espaço escolar, com incentivo às

dicotomias entre bom/mau leitor, leitores competentes/ incompetentes, com incentivo à

criação e implementação de políticas de avaliação de competências leitoras, já abordado

anteriormente neste trabalho. Sobre essa questão, Vóvio (2007) assevera que:

Consoante com o enfoque centrado na unidade, também se encontram

pesquisas desenvolvidas nas décadas de 1960 e 1970 voltadas a

demonstrar que a escolarização, a aquisição da linguagem escrita e o

acesso à leitura seriam sinônimos de progresso social e, no âmbito

individual, seriam responsáveis pelo desenvolvimento cognitivo e pela

aquisição de habilidades e conhecimentos necessários para adequar-se as

sociedades modernas. (VÓVIO, 2007, p.67)

Com relação às implicações dessa concepção de leitura, constituiu-se um ideal

de leitor padronizado, o qual deve atingir certos padrões normativos legitimados e

divulgados por lugares institucionalizados, como a escola, entre outros, os quais visam

educar por meio de conhecimentos que competem à construção e à participação em uma

sociedade moderna. Neste sentido, a leitura, sob uma perspectiva homogeneizadora, elitista,

pautada por critérios que definem práticas de leitura melhores e piores, textos apropriados

ou não, que focam somente no texto e não no contexto, no qual o leitor está inserido,

permitem que os próprios educadores desavisados assumam que há categorias de leitores e

legitimem essa ideia como verdade, tornando-a tradição inconteste. É o que explicita Abreu

(2007):

Aquilo que os discursos convencionais sobre leitura ensinam – até mesmo

para os professores – é que há leitores de segunda categoria, assim como

há cidadãos de segunda categoria: aqueles que não falam a língua da

escola e não leem os livros que a escola gostaria que lessem. “Esquece-se”

de que a leitura não é uma prática neutra, que no contato de um leitor com

o texto (assim como de um autor com o texto) estão envolvidas questões

culturais, políticas, históricas e sociais, “Esquece-se” de que as diferentes

leituras revelam diferentes modos de inserção nas formas da cultura e são

condicionadas por eles. (ABREU, 2001, p.156).

O discurso da ausência de uma cultura letrada no Brasil está presente ao se

comparar a história da leitura no Brasil, com a história da leitura europeia. Abreu (2001)

aponta que, através dos relatos dos viajantes no Brasil Colônia, os quais denunciavam

precárias condições de vida intelectual e ausência de escolas nesse período, foi possível a

construção da ideia de ausência, da falta de uma cultura letrada, por escritores da época, ao

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compararem a produção iconográfica europeia que apresentava as representações do que

seriam práticas de leitura legítimas, associando-as à ideia de conforto, intimidade do lar,

tranquilidade, prazer, em oposição aos “comentários pejorativos sobre a cultura letrada

local incorporaram-se ao senso comum, não requerendo mais qualquer tipo de

comprovação”. (ABREU, 2001p.141).

Desvelar o processo de leitura perpassada pelo discurso da unidade permite

compreender a construção e promoção de ideais que distinguem, definem e delimitam

práticas de leitura, materiais, modos e modelos de ler padronizados, considerados

referências, disseminados sobretudo pela escola. Sobre as referências europeias de como se

ler e as suas implicações na constituição de um discurso pedagógico no Brasil, Abreu

(2001) enfatiza:

“É em cenas semelhantes às europeias que se pensa, quando se discutem

as práticas de leitura a serem promovidas no Brasil contemporâneo. Uma

vez que elas parecem pouco frequentes – ou menos frequentes do que se

gostaria

– mantém-se o discurso da ausência da leitura, como parte central da ideia

de uma carência cultural brasileira. Esta premissa é particularmente

importante no discurso pedagógico que insiste no desinteresse dos alunos

pela leitura e nas dificuldades aí decorrentes.” (ABREU, 2001, p.148).

Em contrapartida a um enfoque da leitura apoiado no discurso da unidade, surge

o discurso sob o estatuto da diversidade, ancorado nos estudos e pesquisas

multiculturalistas, etnográficas, desenvolvidos pelas áreas da Antropologia, Ciências

Sociais e História Cultural. No entanto, cabe ressaltar que este paradigma, ao questionar o

ideal de unicidade do ato de ler, trouxe uma nova problemática, ao defender a pluralidade

pautada numa suposta neutralidade, por dar ênfase ao relativismo cultural. Neste sentido,

Vóvio (2007) alerta sobre os riscos ao se assumir uma concepção relativista com relação a

este ato tão complexo:

De um lado, a abordagem relativista tem como mérito o princípio ético e

metodológico do reconhecimento da diversidade, validação de diferentes

manifestações culturais e da contestação a padrões hegemônicos e da,

como já foi dito afirmação de vozes e discursos apagados ou

desconhecidos. O reconhecimento da diversidade acarreta ainda a

desnaturalização da perspectiva elitista, o que resulta fundamental para os

processos reivindicatórios que se originam no seio de grupos subalternos

ou em condição de desvantagem social. Por outro lado, se operada sob o

estatuto da neutralidade, atenua as desigualdades, obscurece o conjunto de

exigências em relação aos padrões de cultura escrita que colaboram para

exercício da cidadania em sociedades letradas. O processo de

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neutralização da ordem simbólica e das hierarquias sociais reveste-se de

uma intenção democrática que tem como consequência a imobilidade.

(VÓVIO, 2007, p.76).

Tal posicionamento relativista pode incorrer na implantação de ações

compensatórias na área educacional, ao substituir um padrão de leitura e leitores por outro,

sem o devido questionamento das relações de poder e jogos simbólicos que as constituíram.

Não basta valorizar práticas de leitura consideradas inferiores, ou oriundas de matrizes de

culturas populares, como tentativa de subverter uma ordem de valorização cultural em uma

dada sociedade, em que imperam outros tipos de relações, sobretudo de poder.

Portanto, nem uma concepção ancorada em uma abordagem hegemônica sobre

os modos de ler, os materiais, o domínio da norma culta e competências para a

compreensão textual, e tampouco uma concepção plural do ato de ler, mas que assume o

relativismo cultural, como forma de resolução da questão da valorização das produções

escritas de outros grupos sem visibilidade social: ambas posições apresentam limites nas

definições sobre o ato de ler.

Quanto à dinâmica de compreensão textual, pautadas em uma visão da leitura

enquanto unidade, definidas por regras rígidas de linguagem, de compreensão única,

desconectada de um lugar e um contexto social e histórico, Chartier (2002) tece uma crítica

a respeito dessa visão limitada, e extremamente objetivista dessa relação, demonstrando o

quão fragmentada ela pode ser:

Aplicada à teoria da leitura, esta perspectiva leva a observar quão

insatisfatórias são as abordagens que consideram o acto de ler como uma

relação transparente entre o texto - apresentado como uma abstracão,

reduzido ao seu conteúdo semântico, como se existisse fora dos objectos

que o oferecem a decifração - e o leitor - também ele abstracto, como se

as práticas através das quais ele se apropria do texto não fossem histórica e

socialmente variáveis. Os textos não são depositados nos objectos,

manuscritos ou impressos, que o suportam como em receptáculos, e não se

inscrevem no leitor como o fariam em cera mole. (CHARTIER, 2002,

p.25)

Em contrapartida, é através de uma concepção de leitura que esteja vinculada às

articulações entre práticas políticas, sociais, discursivas que compõem o mundo social e

construídas historicamente, que se torna possível ampliar as possibilidades de compreensão

da complexidade do ato de ler; pois inserido em uma dinâmica de tempo, espaço,

representações sociais, caracteriza-se pela ênfase nos processos, nos jogos simbólicos, nas

relações interativas que definem a diversidade de compreensões resultantes da apropriação

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entre o leitor e o material escrito. Sobre a questão da apropriação, Chartier (2002) discorre:

Pensar deste modo as apropriações culturais permite também que não se

considerem totalmente eficazes e radicalmente aculturante os textos ou as

palavras que pretendem moldar os pensamentos e as condutas. As práticas

que deles se apoderam são sempre criadoras de usos ou de representações

que não são de forma alguma redutíveis a vontade dos produtores de

discursos e de normas. O acto de leitura não pode de maneira nenhuma ser

anulado no próprio texto, nem os comportamentos vividos nas interdições

e nos preceitos que pretendem reguiá-los. (CHARTIER, 2002, p.136).

Portanto, entende-se o ato de ler como uma prática criadora, sendo que o

processo de compreensão ocorre na relação do sujeito com o objeto cultural escrito,

inserido em um determinado contexto social, histórico, político, econômico e cultural. Por

ser uma atividade criadora, tem um caráter subjetivo, de difícil apreensão Ao considerar que

tal ato é construído na interação entre o texto e seus leitores, Certeau (2004) defende que:

O texto só tem sentido graças a seus leitores; muda com eles; ordena-se

conforme códigos de percepção que lhe escapam. Torna-se texto somente

na relação à exterioridade do leitor, por um jogo de implicações e de

astúcias entre duas espécies de “expectativa” combinadas: a que organiza

um espaço legível (uma literalidade) e a que organiza uma démarche

necessária para a efetuação da obra (uma leitura). (CERTEAU, 2004, p.

266).

A compreensão de um texto, de um enunciado, é um ato linguístico complexo.

Ao olhar para o fenômeno da linguagem, Bakhtin/Volochínov (2012) elenca duas principais

orientações do pensamento filosófico-linguístico, as quais buscam explicar a linguagem

enquanto objeto de reflexão e estudo. No entanto, em sua descrição dessas duas orientações,

o autor descreve a incompletude de ambas. A primeira delas, denominada, subjetivismo

idealista:

A primeira tendência interessa-se pelo ato da fala da criação individual,

como fundamento da língua (no sentido de toda atividade de linguagem

sem exceção). O psiquismo individual constitui a fonte da língua. As leis

da criação linguística – sendo a língua uma evolução ininterrupta, uma

criação contínua – são as leis da psicologia individual, e são elas que

devem ser estudadas pelo linguista e pelo filósofo da linguagem. Esclarece

que o fenômeno linguístico significa reduzi-lo a um ato significativo (por

vezes mesmo racional) de criação individual.

(BAKHTIN/VOVLOCHÍNOV, 2012, p.74).

Analisar o fenômeno da linguagem sob a perspectiva do subjetivismo idealista é

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assumir uma condição monológica dos atos da fala e dos processos de enunciação, ao dar

ênfase somente a um dos componentes presentes no ato da linguagem, ou seja, o receptor. É

considerar que a criação individual determina todo ato linguístico, desconsiderando os

contextos sociais e de produção da linguagem. Essa orientação assevera que o indivíduo

tem pleno poder de criar e recriar expressões linguísticas. Ao considerar o processo de

compreensão textual, à luz dessa orientação, o texto, enquanto enunciado, é visto como uma

representação do pensamento do autor que o produziu, e cabe ao leitor/ouvinte, através da

sua capacidade intelectual, do seu psiquismo individual, dar sentido ao enunciado com base

na suas capacidades psicológicas, um movimento do interior do indivíduo para seu exterior.

Portanto, não há interação: a atividade de linguagem fica restrita a um único

fator que compõe a linguagem, e o diálogo entre o eu, o outro e o meio enquanto

componente imprescindível na composição do discurso é desconsiderado, segundo a crítica

feita por Bakhtin/Volochínov (2012).

A segunda orientação sobre o pensamento filosófico-linguístico, é o objetivismo

abstrato: “é preciso procurar as raízes desta orientação no racionalismo dos séculos XVII

e XVIII. Tais raízes mergulham no solo fértil do cartesianismo”

(BAKHTIN/VOLOHÍNOV, 2012, p.85). Neste sentido, esta tendência tem como foco o

domínio do sistema linguístico sobre o sujeito. Bakhtin/ Volochínov (2012) explicita os

principais aspectos desta vertente ao comparar com a tendência anterior, já evidenciada

anteriormente:

Segundo esta tendência, o centro organizador de todos os fatos da língua, o

que faz dela o objeto de uma ciência bem-definida, situa-se, ao contrário,

no sistema linguístico, a saber o sistema das formas fonéticas, gramaticais

e lexicais da língua. Enquanto que, para a primeira orientação, a língua

constitui um fluxo ininterrupto dos atos de fala, onde nada permanece

estável, nada conserva sua identidade, para a segunda orientação a língua é

um arco-íris imóvel que domina este fluxo. Cada enunciação, cada ato de

criação individual é único e não reiterável, mas em cada enunciação

encontram-se elementos idênticos aos de outras enunciações no seio de

um determinado grupo de locutores. São justamente estes traços idênticos,

que são assim normativos para todas as enunciações – traços fonéticos,

gramaticais e lexicais - que garantem a unicidade de uma língua e sua

compreensão por todos os locutores de uma mesma comunidade.

(BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 2012, p.79).

A concepção de linguagem assumida pelo objetivismo abstrato entende a língua

composta por regras gramaticais, e o sistema linguístico definido por um conceito estático e

formalista, que não leva em consideração os sujeitos no momento da enunciação. Dessa

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forma, há somente um aspecto do desenvolvimento da linguagem e da comunicação que é

considerado em detrimento do processo da relação entre os interlocutores e o contexto de

produção de enunciados.

Nesta perspectiva, o texto enquanto componente de uma atividade comunicativa

é considerado um produto acabado, composto por sentidos determinados e delimitados,

sendo o ato de compreensão a retirada desses sentidos e ou ideias encontrados no texto. Tal

perspectiva torna a compreensão textual fragmentada e reducionista, pois não prevê uma

prática de leitura que valorize os aspectos extralinguísticos; além disso, a relação entre

autor, texto e leitor é passiva.

Ao discutir o problema da linguagem enquanto objeto científico,

Bakhtin/Volochínov (2012) questiona as duas orientações, pelo caráter incompleto de

ambas, já que a primeira foca no indivíduo, como elemento primordial para o

desenvolvimento da linguagem, e a segunda, no sistema linguístico. Ao se considerar, no

ato de compreensão textual, somente o texto, como elemento principal, incorre-se no

erro de estabelecer uma relação passiva entre autor e leitor, através do texto.

Bakhtin/Volochínov (2012) define a compreensão nesta perspectiva:

A compreensão passiva caracteriza-se justamente por uma nítida

percepção do componente normativo do signo linguístico, isto é, pela

percepção do signo como objeto-sinal: correlativamente, o

reconhecimento predomina sobre a compreensão.

(BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 2012, p.102).

Ao se tomar o texto enunciado, como ato de fala impresso e de natureza social,

o processo de compreensão necessariamente adquire um caráter interativo e cooperativo,

pois o processo de significação ocorre dentro de um contexto. Neste sentido, retomemos as

palavras de Bakhtin/Volochínov (2012):

O livro, isto é, o ato da fala impresso, constitui igualmente um elemento

da comunicação verbal. Ele é objeto de discussões ativas sob a forma de

diálogo e, além disso, é feito para ser apreendido de maneira ativa, para

ser estudado a fundo, comentado e criticado no quadro do discurso

interior, sem contar as reações impressas, institucionalizadas, que se

encontram nas diferentes esferas da comunicação verbal (críticas,

resenhas, que exercem influência sobre os trabalhos posteriores, etc).

(BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 2012, p.127).

Cabe ressaltar que, embora tenha sido citado o exemplo do livro, como objeto a

ser compreendido como elemento da comunicação verbal, do diálogo entre dois polos da

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comunicação, em uma perspectiva interativa, nesta pesquisa foram utilizados textos

narrativos populares e lendas do universo cultural brasileiro, sistematizados por

antropólogos, etnógrafos, folcloristas, dentre outros pesquisadores, e organizados por uma

autora, em formato de um livro. Portanto, os textos integram um livro, que não possui uma

única narrativa do início ao fim, mas várias narrativas com elementos e conteúdos diversos.

Estas questões serão tratadas com mais ênfase nos capítulos subsequentes.

Entende-se aqui o texto como o ato da fala impresso, elemento da comunicação

verbal, o qual deve ser apreendido de forma ativa, de maneira que o leitor aproprie-se dos

enunciados produzidos pelo autor e desenvolva um discurso interior e exterior, imbricado

com as situações extralinguísticas construídas a partir de seus conhecimentos históricos

sociais e as condições contextuais, no momento de leitura, capazes de gerar enunciados

através do diálogo com o texto lido, através da interação verbal.

O processo de compreensão surge da interação entre autor, leitor, a partir do

texto. A () posição do leitor nessa relação, considerando a perspectiva dialógica, é de

ouvinte ativo, seja de um texto falado, ou escrito, posição caracterizada por Bakhtin (2011)

como uma ativa posição responsiva:

... O ouvinte, ao perceber e compreender o significado (linguístico) do

discurso, ocupa simultaneamente em relação a ele uma ativa posição

responsiva: concorda ou discorda dele (total ou parcialmente) , completa-

o, aplica-o, prepara-se para usá-lo, etc; essa posição responsiva do ouvinte

se forma ao longo de todo o processo de audição e compreensão desde o

seu início, às vezes literalmente a partir da primeira palavra do falante.

(BAKHTIN, 2011, p.271).

Portanto, a compreensão ocorre na relação dialógica entre a palavra emitida

pelo autor, através do texto escrito. No caso desta pesquisa, que trata da compreensão de

textos narrativos, a compreensão ocorre em sua relação com as respostas ativas produzidas

pelo leitor, considerando seus conhecimentos sociocognitivos e o contexto em que se dá o

processo de leitura, relação em que “qualquer tipo genuíno de compreensão deve ser ativo,

deve conter já o germe de uma resposta” (BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 2012, p.136).

Ao analisar a compreensão leitora, das crianças no final do ciclo I – 3ºano, a

partir das suas inferências sobre textos lidos, procurou-se evidenciar as ressignificações dos

textos promovidas pelas crianças no processo de compreensão, a produção de réplicas

ativas – comentários, tecidos a partir de posturas ativas diante dos enunciados dos autores

das narrativas. Com relação a este conceito abrangente de compreensão, Bakhtin (2012)

assevera:

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Compreender a enunciação de outrem significa orientar-se em relação a

ela, encontrar o seu lugar adequado no contexto correspondente. A cada

palavra da enunciação que estamos em processo de compreender,

fazemos corresponder uma série de palavras nossas, formando uma

réplica. Quanto mais numerosas e substanciais forem, mas profunda e real

é a nossa compreensão. (BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 2012, p.137).

Desta forma, a qualidade da compreensão textual está atrelada à capacidade de

dar respostas aos enunciados do texto lido, através das palavras produzidas pelo leitor, em

uma relação responsiva ativa, formulando réplicas: “A compreensão é uma forma de

diálogo; ela está para a enunciação assim como uma réplica está para a outra no diálogo”

(BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 2012, p.137).

Como contribuição aos conceitos bakhtinianos, sobre compreensão e

significação, Geraldi (2010) amplia as discussões sobre o ato de ler/compreender, produzir

significados, ao defender a ideia de que:

Ler não é apenas reconhecer o signo com suas significações do passado.

Ler é construir uma compreensão no presente com significações que,

entranhadas nas palavras, são dissolvidas pelo seu novo contexto – que

incluem também as contrapalavras do leitor – para permitir a emergência

de um sentido concreto, específico e único, produto da leitura que está

realizando. (GERALDI, 2010, p.103).

Neste sentido, ler e “compreender é opor a palavra do locutor uma contrapalavra”

(BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 2012, p.137). E o que os dados desta pesquisa demonstram

são a construção de contrapalavras, de réplicas ativas, de alunos, crianças na faixa etária

dos 8 a 9 anos, que têm muito a dizer sobre suas experiências leitoras, produzem atitudes

responsivas ao serem convidadas a ler textos sobre a cultura popular brasileira,

direcionados à crianças.

Para analisar os comentários elaborados pelos alunos do 3º ano do ciclo I, em

situação de leitura e produção de comentários sobre os textos, serão utilizadas as categorias

definidas por Marcuschi (1985; 2007; 2008; 2011), ênfase nos processos inferenciais de

leitura, de base sociocognitiva. Também será discutida, de forma sucinta, a noção de

inferência (COSCARELLI, 2003), considerando seus principais aspectos em consonância

com a compreensão leitora e alguns referenciais teóricos.

1.3. Inferências: algumas considerações.

Segundo Coscarelli (2003), “as inferências podem ser de muitos tipos, podem

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ser feitas em diferentes momentos da leitura e são feitas levando-se em consideração

elementos do texto e do contexto, além de conhecimentos prévios do leitor”

(COSCARELLI, 2003, p.01). Além disso, a autora destaca que, no processo de produção de

inferências, devem ser considerados dois elementos importantes para que elas ocorram:

fontes de informação usadas na compreensão e a teoria dos esquemas.

Com relação aos elementos textuais, estes são imprescindíveis para o processo

de compreensão textual, pois ajudam o leitor estabelecer coerência e coesão de ideias, entre

partes do texto, considerando elementos formais da língua; no entanto, esses elementos não

são suficientes para a construção de sentidos a partir da leitura, pois para que ocorra a

compreensão efetiva na relação com o texto escrito, deve-se considerar a interlocução com

elementos extralinguísticos.

Com relação ao processo de compreensão textual, Coscarelli (2003) aponta a

importância da teoria dos esquemas, a qual pressupõe que as vivências culturais, sociais e

os conhecimentos adquiridos estão registrados na memória de longo prazo do indivíduo, e

são representadas através de esquemas mentais, acionados em determinadas situações,

inclusive nas quais é necessária a produção de inferências ao ler um texto escrito. Sobre a

teoria dos esquemas, a autora afiança que:

A teoria dos esquemas versa sobre como o conhecimento é representado e

sobre como essa representação facilita o uso do conhecimento. De acordo

com ela, o conhecimento é organizado em unidades que trazem, além do

conhecimento em si, informações sobre como ele deverá ser usado. Essa

teoria trabalha com a ideia de significados prototípicos, ou seja, os

significados são guardados como situações típicas ou eventos que

exemplificam determinado conceito. Um esquema, portanto, é uma estrutura

de dados que representa os conceitos armazenados na memória e contém

uma rede de relações que se acredita existirem entre os constituintes de um

determinado conceito. Existem esquemas representando nosso conhecimento

sobre todos os conceitos: aqueles que subjazem aos objetos, situações,

eventos, sequências de eventos, ações e sequências de ações.

(COSCARELLI, 2003, p.20).

De uma forma genérica, “nossa compreensão está ligada a esquemas cognitivos

internalizados, mas não individuais e únicos” (MARCUSCHI, 2008, p.228). O ato de

compreender, no caso desta pesquisa textos escritos, está também associado aos

conhecimentos ativados no decorrer da leitura, que dizem respeito aos conceitos formados

pelas experiências dos indivíduos, as quais são de caráter sócio-histórico. Sendo assim,

“compreender não é extrair conteúdos de textos. Por isso mesmo, nem tudo é visto por

todos do mesmo modo e há divergências na compreensão de textos por parte de diferentes

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leitores” (MARCUSCHI, 2008, p. 229).

O conceito de esquemas mentais contribui para que se possa ter uma noção mais

efetiva de como ocorrem os processos de compreensão, de significação e ressignificação,

no ato da leitura de textos escritos. E, sobretudo, as relações que ocorrem entre a ativação

dos esquemas mentais e a produção de inferências – categoria de análise assumida nesta

pesquisa. Sobre o contato com texto no momento da leitura e suas conexões com as

informações ativadas através da ativação dos esquemas mentais, Coscarelli (2003) declara

que:

Ao ler, o leitor provavelmente vai procurar guardar aquelas informações do

texto que são importantes para que seu objetivo de leitura se cumpra. As

demais informações ou serão esquecidas ou poderão ser recuperadas por

meio da capacidade do leitor de ativar os esquemas que trazem situações

prototípicas relacionadas com essas informações. O leitor não guarda todas

as informações de todos os textos que lê porque usa alguns critérios para

selecionar as informações que ele vai guardar.Um dos principais critérios é o

grau de importância da informação do texto para os objetivos de leitura.

Outro é a novidade da informação: se a informação é nova e interessa, deve

ser armazenada; haverá informações, por outro lado, que não serão

guardadas porque já o são. Parece paradoxal, mas muitas informações lidas

são conhecidas do leitor e, por isso, não serão armazenadas, mas ativadas,

pois já existiam. (COSCARELLI, 2003, p. 22).

A partir das considerações expostas, é possível reafirmar que é na relação

dialógica com o texto que ocorre a compreensão, e que a leitura e o processo de

compreensão devem ser reconhecidos como trabalho social, já que “compreender exige

habilidade, interação e trabalho”. (MARCUSCHI, 2008, p.230). Embora os processos

citados tenham caráter social e histórico, como já discorrido neste texto, há que se pontuar

que cada leitor na sua individualidade, enquanto sujeito sócio-histórico, produz significados

distintos a partir da interação com o texto, considerando os objetivos de leitura, a

capacidade do leitor de selecionar informações significativas e relacioná-las aos esquemas

mentais acionados no decorrer do ato da leitura.

Portanto, a produção de inferências é consequência da relação entre os

conceitos que fazem parte de um esquema, os quais interagem a partir de um determinado

contexto e de objetivos de leitura, que serão determinantes na quantidade e na

complexidade de inferências constituídas na leitura de um texto. Desta forma, a

compreensão leitora está diretamente associada a produções de inferências; no entanto, este

conceito é bem amplo e existe uma multiplicidade de definições e modos de operar

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associados ao mesmo. Com relação ao conceito de inferência, Coscarelli (2003) adverte

que:

Embora a noção de inferência seja de extrema importância para os estudos

relacionados com a leitura, por ser parte integrante desse processo, e esteja

sempre presente em textos relacionados com a compreensão da linguagem,

esse conceito geralmente não é bem definido[...]Essa excessiva

abrangência do conceito de inferência é problemática para a caracterização

do fenômeno, pois reúne sob o mesmo título operações muito diversas,

trazendo assim dificuldades para o estudo dele. (COSCARELLI, 2003,

p.32).

Apesar de se estar diante de um conceito de análise complexo, optou-se nesta

pesquisa por utilizar as classificações propostas por Marcuschi (1985; 2007; 2008; 2011).

Para este autor, “a compreensão leitora é resultado do processo inferencial em um universo

cultural- cognitivo” (MARCUSCHI, 1985, p.03). Desta forma, os dados que serão

apresentados posteriormente são resultantes da leitura desenvolvida por crianças e as

inferências elaboradas a partir das relações com textos narrativos. Assim, foi possível

verificar as diversas relações que as mesmas estabeleceram com seu universo cultural-

cognitivo, com contexto de leitura, sinalizando as diversas formas de compreensão textual e

produção de sentidos através de comentários emitidos sobre as leituras. Neste sentido,

Marchuschi (2008) estabelece um diálogo entre leitura, inferências e produção de sentidos:

Sendo uma atividade de produção de sentidos colaborativa, a compreensão

não é um simples ato de identificação de informações, mas uma construção

de sentidos com base em atividades inferenciais. Para se compreender bem

um texto, tem-se que sair dele, pois o texto sempre monitora o seu leitor para

além de si próprio e esse é um aspecto notável quanto a produção de sentido.

(MARCUSCHI, 2008, p.233).

A seguir serão discorridas as relações entre leitura, processos inferenciais e

produção de sentidos, a partir das abordagens traçadas por Marcuschi (1985; 2007; 2008;

2011) em diálogo com as análise de leitura e compreensão leitora propostas por Kleiman

(1989; 2007; 2008; 2012) e na sua interface com a escolarização da leitura e suas

implicações.

1.3.1. Processos Inferenciais e produções de sentidos.

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Ao analisar a compreensão leitora de crianças do 3º ano do Ensino Fundamental

com base nos processos inferenciais, Marcuschi (2008), torna-se imprescindível retomar os

principais modelos teóricos que definem os significados do que é compreender:

De maneira geral, hoje podemos distribuir os modelos teóricos que tratam

da compreensão em dois grandes paradigmas que podem ser por sua vez

desmembrados em muitos outros subconjuntos específicos. Esses dois

conjuntos poderiam ser agrupados em duas hipóteses: (A) Compreender é

identificar (metáfora de conduto). (B) Compreender é inferir (metáfora da

planta baixa). (MARCUSCHI, 2008, p.237).

Neste estudo, assume-se a seguinte afirmativa: compreender é inferir e, com o

intuito de desvendar esse processo complexo, cabe expor a definição defendida nesta

pesquisa do que é língua, sua interface com o processo de compreensão, sobretudo a

compreensão de textos escritos, com ênfase nos textos narrativos. Como Marcuschi (2008),

defende-se que a noção de língua deve ser tomada como atividade e a compreensão como

um processo de base sociointerativa. Neste sentido, torna-se necessário explorar esse

conceito, o qual está embasado nas teorias do paradigma do tipo (B), como foi citado

anteriormente. Para Marcuschi (2008):

Já no caso das teorias no paradigma de tipo (B), que postula a

compreensão como inferência, toda compreensão será sempre atingida

mediante processos em que atuam planos de atividades desenvolvidos em

vários níveis em especial com a participação decisiva do leitor ou ouvinte

numa ação colaborativa. Aqui poderíamos adotar a metáfora da

compreensão como construção. A língua é vista como uma atividade e não

como um instrumento; uma atividade sempre interativa, ou seja, o

processo de compreensão se dá como uma construção coletiva.

(MARCUSCHI, 2008, p.232).

Com a finalidade de entender a leitura como processo inferencial, reitera-se a

noção de língua adotada, a qual, além de uma atividade de caráter interativo, “não é sequer

uma estrutura; ela é estruturada simultaneamente em vários planos, tais como o fonológico,

o sintático, o semântico e o cognitivo, que se organizam no processo de enunciação”

(MARCUSCHI, 2008, p.240). Confirma-se, assim, a importância da noção de língua,

assumida nesta pesquisa, a qual também é cultural, histórica, social, heterogênea e situa-se

no âmbito das relações dialógicas. Sobre as relações entre língua e comunicação verbal,

Bakhtin (2012) nos aponta:

A língua vive e evolui historicamente na comunicação verbal concreta,

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não no sistema linguístico abstrato das formas da língua nem no psiquismo

individual dos falantes.[...] É nessa mesma ordem que se desenvolve a

evolução real da língua : as relações sociais evoluem ( em função das

infra- estruturas), depois a comunicação e a interação verbais evoluem no

quadro das relações sociais, as formas dos atos da fala evoluem em

consequência da interação verbal, e o processo de evolução reflete-se,

enfim, na mudança das formas da língua.

(BAKHTIN/VOLOCHÍNOV,2012, p.128-129).

Considerando o conceito de língua como dinâmico e sua evolução resultante das

transformações infraestruturais das sociedades, como bem sinaliza Bakhtin (2012), e as

relações dialéticas entre as transformações socioculturais e ideológicas decorrentes das

mudanças superestruturais, “a língua permite a pluralidade de significações e as pessoas

podem entender o que não foi pretendido pelo falante ou o autor do texto” (MARCUSCHI,

2008, p.241). Deste modo, o texto não é tomado como um produto acabado e estático, em

que as informações devem ser “retiradas” do seu conteúdo, como se estes fossem portadores

de informações objetivas a serem reconhecidas e elencadas pelos leitores.

Este modelo conceitual de texto tradicional preza pela codificação e

decodificação, como habilidades essenciais de compreensão, concepção muito difundida no

ensino escolar há mais de 50 anos e ainda prática recorrente por muitos professores em

várias de nossas escolas, além de presente em manuais de educação, como os livros

didáticos.

Partindo do pressuposto que compreender é inferir, discorre-se aqui sobre as

relações entre autor, texto e leitor, fundamentais para que se possam apontar indícios sobre

como a criança apropria-se do texto escrito, o qual foi produzido em um determinado

contexto, por um autor que se expressa através da linguagem escrita, emitindo suas ideias

por meio de signos socialmente construídos.

A partir desta perspectiva, retoma-se a ideia de que a compreensão textual está

necessariamente associada à produção de inferências e estas por sua vez apresentam

diversos tipos de processos, os quais extrapolam a dependência puramente das informações

textuais, atingindo outras dimensões, como bem coloca Marcuschi (1985):

Se inferir é extrair proposições novas a partir das relações estabelecidas

entre as proposições dadas no texto, o mais importante não são as relações

de natureza simplesmente lexicais feitas automaticamente, Trata-se muito

mais, de uma tentativa de extrair as intenções pretendidas pelo autor.

Neste caso as regras inferenciais mais produtivas não são as de caráter

lógico apenas e sim as associações semânticas, os raciocínios analógicos,

as leis conversacionais ou os princípios pragmáticos. Isto porque a

inferência é um processo dependente do texto, do contexto de enunciação

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implícito, do contexto reconstruído local e temporalmente e dos

conhecimentos prévios do leitor (MARCUSCHI, L. A., 1985).

Como já foi abordado anteriormente, as inferências também são conceitos

utilizados como contribuição de análise para a compreensão leitora, sejam elas de caráter

“cotextual/ contextual e cognitiva regida por certas regras” (MARCUSCHI,2008, P.254.

São elas que indicam os níveis de compreensão leitora. Dentre várias possibilidades, foram

selecionados as categorias a seguir, que serão utilizadas nas análises dos dados de pesquisa.

Quadro 1: Quadro Geral de Inferências

Fonte: MARCUSCHI.2008, p. 254.

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Quadro 2: Quadro de Operações

Tipo de operação

inferencial

Natureza da

inferência

Condições de realização

1. dedução Lógica Reunião de duas ou mais informações textuais que

funcionam como premissas para chegar a outra

informação logicamente. A conclusão será necessária se a

operação for válida. Operação pouco comum em

narrativas.

2. indução Lógica Tomada de várias informações textuais para chegar a uma

conclusão com valor de probabilidade de acordo com o

grau de verdade das premissas.

3. particularização Lexical

Semântica

Pragmática

Tomada de um elemento geral de base lexical ou fundado

em experiências e conhecimentos pessoais

individualizando ou contextualizando num conteúdo

particular com um lexema específico.

4. generalização Lexical

Pragmática

Saída de uma informação específica, por exemplo, um

lexema, para chegar à afirmação de outra mais geral.

5. sintetização Lexical

Semântica

Pragmática

Condensação de várias informações tomando por base

saliências lexicais sem que ocorra uma eliminação de

elementos essenciais.

6. parafraseamento Lexical

Semântica

Alteração lexical para dizer a mesma informação sem

alteração fundamental de conteúdo proposicional.

7. associação Lexical

Semântica

Pragmática

Afirmação de uma informação obtida através de saliências lexicais ou cognitivas por associação de ideias.

8. avaliação ilocutória

Lexical

Semântica

Pragmática

Atividade de explicitação dos atos ilocutórios com

expressões performativas que os representam. Funciona

como montagem de um quadro para explicitação de

intenções e avaliações mais globais.

9. reconstrução Cognitiva

Pragmática

experiencial

Reordenação ou reformulação de elementos textuais com

quadros total ou parcialmente novos. Diverge do

acréscimo na medida que insere algo novo situado no

velho. No caso das narrativas, opera como uma estratégia

de mudar o discurso direto em indireto e vice-versa.

10. eliminação Cognitiva

Experiência

Lexical

Exclusão pura e simples de informações ou dados

relevantes e indispensáveis, impedindo até mesmo a

compreensão dos dados que permanecem.

11. acréscimo Pragmática

experiencial

Introdução de elementos que não estão implícitos nem são

de base textual, sendo que muitas vezes podem levar até a

contradições e falseamentos.

12. falseamento Cognitiva

Experiencial Atividade de introduzir um elemento e afirmar uma

proposição falsa que não condiz com as informações

textuais ou não pode ser dali inferida.

Fonte: MARCUSCHI, 2008, p.255.

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O quadro geral de inferências e o quadro de operações inferenciais, apresentados

acima, detalham alguns dos principais processos inferenciais, tais como as ações: tipo de

operação inferencial, natureza da inferência e condições de realização que podem nos dar

indícios das várias formas de compreensão, produzidas a partir da leitura de textos escritos.

Considerando que:

No caso de inferência, o produto pode variar grandemente de indivíduo para

indivíduo, uma vez que elas não ativam apenas as relações entre

conhecimentos lexicais. O universo em que tais inferências se situam é o

contexto cognitivo formado pelos pré-conhecimentos do indivíduo, pelas

crenças, as circunstâncias em que o texto é lido e os conhecimentos das leis

do discurso. (MARCUSCHI, 1985, p 06).

Portanto, ler é inferir, é produzir sentidos através de uma relação dialógica com o

texto, uma relação pautada por diversos aspectos, já sinalizados, considerando que sempre se

parte de um input textual e que existem extrapolações não autorizadas no processo de

compreensão de um textual. A questão que se coloca é como orientar os alunos que estão se

apropriando da leitura, já que a grande maioria das crianças aprende formalmente a ler nos

bancos escolares, sobretudo na maioria dos casos de alunos que estudam em escola pública, o

acesso à leitura ocorre necessariamente no espaço escolar. Para Marcuschi (1985), a

investigação sobre processos inferenciais tem relevância didática, pois:

Em primeiro lugar, fica clara a necessidade de uma noção de texto como

unidade linguística de natureza comunicativa. Isto dá ao texto um caráter

menos estático; retira-lhe a autonomia absoluta de algo pronto quanto ao

sentido; obriga o autor a adotar estratégias de colaboração mais eficazes e

definidas. Tudo isso impõe ao professor em sala de aula que trabalhe o texto

dentro de perspectivas menos estanques e desenvolva exercícios que

permitam a penetração no implícito e nas intenções subjacentes.

(MARCUSCHI, 1985, p. 14).

O autor defende a importância didática de se olhar para o texto de uma forma mais

ampla, como evento comunicativo e as produções de inferências como produtos da

compreensão textual. Desta forma, o professor poderá romper com uma visão tradicional de

conceito de texto escrito e sua utilização em sala de aula, sobretudo assumir e valorizar as

múltiplas faces dos sentidos produzidos pelos alunos, a partir dos processos de compreensão.

No entanto, o processo de compreensão textual pode ocorrer de diversas maneiras, pois cada

indivíduo irá apropriar-se do conteúdo a partir de seus conhecimentos, vivências, de uma forma

dialógica, por meio da interação verbal; há que se considerar que existem níveis de

compreensão que são caracterizados por horizontes. Marcuschi (2007) faz uma analogia com

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orizonte

1.1.4. Compreensão leitora e escolarização

MARCUSCHI, 2007, p. 99 (Tudo desconfigurado...)

Horizonte Indevido

Horizonte Problemático

Horizonte Máximo

Horizonte Mínimo

“uma cebola” e os horizontes são comparados às “camadas da cebola” e reproduzidos no

formato de um diagrama. Para melhor entender o processo de compreensão textual, segue:

QUADRO 3 : Horizontes de Compreensão Textual

Falseamentos

Extrapolações

Cópia

Falta de

Horizonte

Paráfrases

Inferências Possíveis

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QUADRO 4: Quadro explicativo dos horizontes de compreensão textual...

1. Falta de horizonte – uma leitura nesta perspectiva apenas repete ou copia

o que está dito no texto. Permanecer nesse nível de leitura é agir como

se o texto só tivesse informações objetivas inscritas de modo

transparente. A atividade do leitor se reduziria a uma mera atividade de

repetição. Repetir um texto nem sempre é garantia de que se

compreendeu efetivamente, pois sabemos que decorar um texto não

garante compreensão.

2. Horizonte mínimo – teremos o que aqui se chama de leitura parafrástica, ou

seja, uma espécie de repetição com outras palavras em que podemos deixar algo

de lado, selecionar o que dizer e escolher o léxico que nos interessa.

Certamente, vamos colocar alguns elementos novos, mas nossa interferência

será mínima, e a leitura fica ainda em uma atividade de identificação de

informações objetivas que podem ser ditas com outras palavras

3. Horizonte máximo – perspectiva que considera as atividades inferenciais no processo de compreensão, isto é, as atividades de geração de sentidos pela

reunião de várias informações do próprio texto, ou pela introdução de

informações e conhecimentos pessoais ou outros não contidos no texto. É uma

leitura que inclui as entrelinhas; não se limita à paráfrase, nem fica

reduzida à repetição.

4. Horizonte problemático – embora este horizonte não seja em

princípio descartável como inadequado, ele vai muito além das

informações do pró- prio texto e se situa no limite da

interpretabilidade. Trata-se do âmbito da

extrapolação. São leituras de caráter pessoal, em que há investimento de

conhecimentos pessoais muito grande. Na escola, essa esfera é tida como a da

“opinião pessoal” e ali se instala quase que um vale-tudo.

5. Horizonte indevido - é a área da leitura errada.

MARCUSCHI, 2007, P. 99

A partir da ideia de horizontes, é possível detectar e analisar as origens das

produções de inferências construídas na relação entre autor, texto e leitor. Como já discutido

anteriormente, o entendimento de todo esse processo contribui para que as práticas

pedagógicas do professor, em suas aulas de leitura ou mesmo no decorrer do trabalho

pedagógico de alfabetização e letramento, sejam desenvolvidas em uma perspectiva mais

crítica , pois a mediação em sala de aula em atividades que privilegiam a leitura, contribui

de forma significativa para que os alunos tenham mais criatividade, argumentação e um

olhar crítico, a partir das relações estabelecidas com os textos. Ainda sobre a relevância

didática do trabalho com as inferências, Marcuschi (1985) indica um segundo destaque para

a importância de pesquisas sobre essa temática:

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Em segundo lugar, revela a necessidade de trabalhar o leitor (o aluno)

numa perspectiva crítica, desenvolvendo nele capacidade de raciocínio

para além da contextualização cognitiva estrita. Só assim surgirá o leitor

crítico capaz de processar o texto em qualquer circunstância, sem estar

investindo apenas sua subjetividade. Isto significa, pois, que num primeiro

momento deve ser ter o máximo respeito pelo leitor que se tem pela frente

e num segundo momento deve se partir para um trabalho efetivo e crítico

junto a este leitor para que ele se liberte pelo menos dos elementos

puramente idiossincráticos.

A seguir, serão discorridas as intrínsecas relações entre a utilização do texto na

sala de aula, a escolarização do texto literário, a compreensão leitora e a produção de

sentidos. O que possibilita uma reflexão sobre alguns indícios do desenvolvimento da

leitura na escola, reiterando as relações complexas entre o autor, texto e leitor, sobretudo no

espaço escolar.

1.4. Formação do sujeito leitor: escolarização da leitura e compreensão textual.

Considera-se que a aprendizagem da leitura é consequência do processo de

escolarização, em geral, ocorrida no ambiente escolar. Isto é o que Kleiman (2008)

denomina de “descontextualização de linguagem”, pois a relação estabelecida entre o leitor

e o autor é constituída pelo distanciamento.

Embora seja uma interação marcada pela distância – o autor e o leitor -, ela é

necessária para o desenvolvimento da aprendizagem, para o desenvolvimento da

criatividade e da imaginação, pois, historicamente, as atividades escolares são pautadas pela

utilização de textos de gêneros variados, com objetivos e conteúdos diversos.

A compreensão textual fica comprometida quando não há, por parte da

instituição escolar, formas adequadas de mediação entre autor, texto e leitor, as quais

possam garantir o processo de aquisição da leitura de forma efetiva e crítica. “Daí que uma

questão fundamental para o ensino seja como ensinar a criança a compreender o texto escrito”.

(KLEIMAN, 2008, p.7).

Desta forma, o ato de compreender textos escritos, no caso desta pesquisa,

caracteriza-se por processos múltiplos, envolvendo ações linguísticas, sociais e cognitivas,

como já exposto. Sendo o texto um evento comunicativo, os sentidos não estão no texto,

tampouco no leitor, eles são construídos na relação os interlocutores, em um contexto

específico.

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Com relação aos aspectos cognitivos da leitura, é importe ressaltar que refletir

sobre o que se lê é uma das bases para a formação de um leitor proficiente, autônomo e crítico;

além disto, refletir sobre o saber construído neste processo é uma forma de desenvolver

atividade de metacognição, como propõe Kleiman (2008):

Refletir sobre o conhecimento e controlar os nossos processos cognitivos são

passos certos no caminho que leva à formação de um leitor que percebe

relações, e que forma relações com um contexto maior, que descobre e infere

informações e significados mediante estratégias cada vez mais flexíveis e

originais. (KLEIMAN, 2008, p.9-10).

A busca pela análise e entendimento de como se processa o ato de compreensão

textual caracteriza-se por uma tarefa difícil, haja vista que este processo é composto de várias

dimensões, como já ressaltado anteriormente, e apreendê-lo significa interpretar as redes de

relações concernentes a este ato. Para isto, Kleiman (2008) descreve as dimensões a serem

apreendidas na compreensão do processo textual, sendo que um deles abrange uma série de

fatores os quais o compõem: o conhecimento prévio.

A compreensão de um texto é um processo que se caracteriza pela utilização

de um conhecimento prévio: o leitor utiliza na leitura o que ele já sabe, o

conhecimento adquirido ao longo de sua vida. É mediante a interação de

diversos níveis de conhecimento, como o conhecimento linguístico, o textual,

o conhecimento de mundo, que o leitor consegue construir o sentido do texto

[...] Pode-se dizer com segurança que sem o engajamento do conhecimento

prévio do leitor não haverá compreensão. (KLEIMAN, 2008, p.13).

Portanto, considera-se a importância do conhecimento prévio para que sejam

analisadas as relações entre autor, texto e leitor. Reitera-se que o mesmo é composto pelos

conhecimentos linguísticos, conhecimento textual e conhecimento de mundo ou enciclopédico.

Com relação ao conhecimento linguístico: é aquele adquirido com a língua materna, que

acontece de forma espontânea, pois está atrelado à origem da criança, à língua falada pelo

grupo social, ao vocabulário utilizado e diz respeito à sua identidade sociocultural. Este

conhecimento também se relaciona às regras da utilização da língua apreendida na instituição

escolar.

Com relação ao conhecimento textual, este está relacionado à estrutura textual; são

marcas que definem a composição do texto e suas características, que são classificadas como

estrutura narrativa e estrutura expositiva. Sobre o primeiro tipo, este tem como caraterísticas a

ênfase na marcação temporal cronológica, na causalidade – evidências ou os porquês dos fatos,

as ações de causa e efeito, destaque aos agentes das ações – personagens; cenários onde são

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apresentados os personagens; uma complicação inicial e o desenrolar da trama até a

resolução do problema.

Em contrapartida, na estrutura expositiva, a orientação temporal é irrelevante,

com enfoque temático nas ideias, que são organizadas de maneira lógica: “premissa e

conclusão, problema e solução, tese e evidência, causa e efeito, analogia, comparação,

definição e exemplo”. (KLEIMAN, 2008, p.18).

O conhecimento de mundo ou conhecimento enciclopédico é o terceiro fator

que compõe o conhecimento prévio; este está atrelado aos conhecimentos obtidos

formalmente, assim como informalmente, construídos na instituição escolar ou em outras

instituições como a família, a igreja, entre outros espaços de produção sociocultural.

Foram considerados alguns elementos para desvendar as relações complexas

que estão na dinâmica da compreensão de textos escritos. Buscou-se elencar alguns dos

principais elementos, tais como: concepções de língua e texto; relações entre autor, texto e

leitor; a leitura e a compreensão como processos cognitivos e interacionistas; análise das

estruturas textuais como marcas formais que definem os objetivos de leitura.

Estamos diante de um o objeto de pesquisa - compreensão leitora –

o qual possui muitas dimensões; sendo assim, tem-se como tarefa crucial entender as

relações entre essas dimensões e como estas se fazem presentes na formação do sujeito

leitor. Observar como este constitui-se um leitor engajado na escola, considerando as

práticas de uma professora específica e como essas impactam na produção de inferências de

crianças que estão em pleno processo de alfabetização e letramento.

Diferentemente da fala, na qual a apropriação ocorre de forma não planejada,

através do contato com outras pessoas da mesma cultura em que se está inserida, a leitura é

aprendida em espaços institucionalizados ou em espaços informais, sua aquisição deve ser

explicitamente organizada e socialmente dirigida. Segundo Bresson (2001), com relação à

escrita e à leitura:

Não podem ser um objeto espontâneo de aquisição: trata-se aí

necessariamente, de práticas sociais instituídas em que o simples contato

com os escritos e a observação das leituras, silenciosas ou não, não são

suficientes para transmitir. (BRESSON, 2001, p.26).

Ler para as crianças ou ler com as crianças são atividades fundamentais, pois é

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ouvindo contos, fábulas, mitos, notícias, poemas, enquanto não sabem ler autonomamente,

que elas vão tendo acesso a tudo que a escrita representa. Isto porque o ato de ler não é

passivo: “É um ato que requer atenção, vigilância que mobiliza também a liberdade e a

imaginação do leitor. Falar do ato da leitura é indicar que não se lê ‘com os olhos’, mas

com os saberes, julgamentos, emoções e valores” (CHARTIER apud MORTATTI, 2011, p.

55).

A apreciação pela criança do conteúdo do objeto cultural livro, mediado pela

escola entre outras instâncias de socialização cultural, possibilita troca de experiências,

entre o aprendido e o vivido; é nesta relação que se configura o sentido estético, que só

emerge no encontro de alguém (sujeito) com alguém (outro sujeito) ou com algo (objeto)

(PINO, 2007).

Portanto, existe uma experiência individual de sensibilização, de subjetivação

do real simbólico, expressa através de signos pela apropriação da leitura de um texto

literário, por exemplo, entendido como uma produção humana: um texto ou um livro, uma

obra literária, que não possui um valor intrínseco e não um valor em si mesmo. A

significação é atribuída social, cultural e historicamente às coisas materiais ou imateriais,

definidas por grupos sociais em determinados espaços e tempos históricos, como ensina

Pino:

As significações só adquirem direito de “cidadania” ou de existência

cultural quando reconhecidos por algum tipo de coletividade ou grupo

cultural. Isso explica por si só duas coisas: que se o gosto é uma

experiência pessoal, subjetiva, só se torna cultural quando encontra um

ambiente social que o acolhe; segundo que os valores e as significações

culturais podem ser, e quase sempre o são, diferentes em diferentes épocas

e em diferentes grupos de uma mesma ou diferente época ou sociedade.

(PINO, 2007, p.115).

O sujeito leitor constitui-se através de suas referências - individuais e sociais;

históricas e existenciais - construindo novas significações e sentidos a partir de processos

entretecidos às vivências do universo da leitura e do ato de compreensão, o qual apresenta

“o caráter multifacetado, multidimensionado deste processo que envolve percepção,

processamento, memória, inferência e dedução”. (KLEIMAN, 1989, p. 7).

Este trabalho busca delimitar a leitura em um espaço específico: o escolar.

Neste sentido, acredita-se que o ensino da leitura, enquanto prática social e intelectual, e o

desenvolvimento do gosto e prazer pela mesma são funções da instituição escolar. A Escola

se constituiu historicamente como espaço legítimo e fundamental para o desenvolvimento e

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formação do sujeito leitor, embora muitas destas práticas desenvolvidas neste espaço ainda

caracterizam-se por uma concepção de leitura reducionista, privilegiando apenas seu uso

instrumental, não que o ensino da técnica, da apropriação dos signos não seja

imprescindível para a constituição do leitor, mas ela não pode ser um fim em si mesma.

Segundo Kleiman (2012), a maioria das práticas escolares são nefastas e

afastam o sujeito do universo do texto, da leitura e da linguagem. A autora retoma as

memórias de leituras de uma grande maioria de pessoas que vivenciaram o processo de

escolarização:

Devemos lembrar que, para a maioria, a leitura não é aquela atividade no

aconchego do lar, no canto preferido, que nos permite isolar, sonhar,

esquecer, entrar em outros mundos, e que tem suas primeiras associações

nas estórias que a nossa mãe lia antes de dormir. Pelo contrário, para a

maioria, as primeiras lembranças dessa atividade são a cópia maçante, até

a mão doer, de palavras da família do da, “Dói o dedo do Didu”; a procura

cansativa, até os olhos arderem, das palavras com dígrafo que deverá ser

sublinhado naquele dia; a correria desesperada até o dono do bar que

comprar o jornal aos domingos, para a família achar as palavras com a

letra J. Letras, sílabas, dígrafos, encontros consonantais, encontros

vocálicos, ”dificuldades” imaginadas e reais substituem o aconchego e o

amor para essas crianças, entravando assim o caminho até o prazer.

(KLEIMAN, 2012, p.23).

As práticas relatadas por Kleiman (2012), apesar de estarem no universo das

memórias, do passado, não significam que não ocorram mais, tornando-se obsoletas; ao

contrário, pode-se afirmar que são atuais e recorrentes na maioria das escolas nos dias de

hoje. Desta forma, o trabalho desenvolvido pela professora participante da pesquisa busca

romper com práticas mecanicistas do ensino de leitura, sua proposta didática visa ao

investimento em atividades mais interessantes, representadas no uso de gêneros literários,

pois em suas aulas são utilizados diversos tipos de textos: contos, poesia, histórias em

quadrinhos, parlendas, fábulas, também textos informativos e cartas. Nesta pesquisa será

dada ênfase na leitura de lendas.

Sendo a escola o espaço legítimo da constituição de conhecimentos, saberes e

artes em “saberes escolares” que se apresentam nos currículos e programas de ensino,

torna-se inevitável a escolarização de livros de literatura e textos literários. Segundo Soares

(2011):

O que se pode criticar, o que se deve negar não é a escolarização da

literatura, mas a inadequada, a errônea, a imprópria escolarização da

literatura, que se traduz em sua deturpação, falsificação, distorção, como

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resultado de uma pedagogização ou uma didatização mal compreendidas

que, ao transformar o literário em escolar, desfigura-o, desvirtua-o,

falseia-o. (SOARES, 2011, p.22)

Através dessa pesquisa, pode-se observar e analisar o trabalho pedagógico de

uma professora que desenvolve práticas pedagógicas através de projetos interdisciplinares:

história, ciências e geográfica - fazendo uso de textos literários que rompem com a

escolarização literária inadequada no ambiente escolar, a partir da valorização da função

social da leitura e escrita nos processos de alfabetização e letramento, da utilização de

textos de diferentes gêneros explorados e apropriados sem fragmentação, como acontecem

nos livros didáticos.

Esse posicionamento da professora está de acordo com Soares (2011), que

define como prática adequada de escolarização da literatura infantil “aquela que conduza

mais eficazmente às práticas de leitura que ocorrem no contexto social e às atitudes e

valores que correspondem ao ideal de leitor que se quer formar” (p.25).

A utilização dos textos e livros literários em sala de aula pela professora citada,

a utilização de práticas pedagógicas significativas com vistas à apropriação destes tipos de

texto por grupo de crianças, durante 3 anos de escolarização, contribuiu para que as mesmas

apresentassem vários processos inferenciais durante as leituras e compreensão de textos

escritos. São estes “processos inferenciais” (MARCUSCHI, 1985, p.15), produzidos por

crianças em situações de pesquisa, que fornecerá os indícios de como estes compreendem

um texto.

No capítulo 2, serão apresentadas as principais práticas pedagógicas: projetos

interdisciplinares, sacola da leitura e o FLISELLO, desenvolvidas pela mesma professora

nos 3 anos de escolarização das crianças pesquisadas, exceto o FLISELLO, evento cultural

e literário que foi apropriado por toda unidade escolar.

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CAPÍTULO 2

2. CARACTERIZAÇÃO DAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS DE

LEITURA E EXPERIÊNCIAS LEITORAS

Como a leitura se esquematiza, se constitui, se desenvolve, tanto em nível

psicológico/individual quanto sócio/ideológico? Como a leitura – e,

portanto, a forma escrita de linguagem – marca o desenvolvimento

psíquico das crianças e seu processo de aprendizagem? (SMOLKA, 2010,

p.44/45).

Este capítulo tem como objetivo apresentar algumas das principais propostas

pedagógicas criadas, implementadas e aplicadas pela professora, sujeito desta pesquisa, que

acompanhou a sala dos alunos pesquisados, durante os 3 anos do Ciclo I – Ensino

Fundamental. Além disso, pretende-se relacionar as principais experiências - em sala de

aula, nos projetos e atividades de leitura vivenciados pelos alunos pesquisados, com suas

produções de inferências, construídas a partir da leitura de textos narrativos, durante o

processo desta pesquisa.

As atividades propostas pela professora foram registradas no planejamento

anual e foram sendo apropriadas pelos demais professores da escola, no decorrer dos anos,

tornando-se um dos projetos coletivos da unidade escolar.

As propostas pedagógicas, que serão expostas aqui, e que fazem parte do

projeto político pedagógico da escola, foram embasadas nas “Diretrizes Curriculares para o

Ciclo I e II, do Ensino Fundamental da Prefeitura de Campinas”. Os três primeiros anos de

escolarização são dedicados à alfabetização e ao letramento das crianças, segundo as

perspectivas teóricas de Kleiman (2009, 2008,2007,2005,1999,1995), Soares (2004) e Rojo

(2009).

Esse documento propõe um trabalho didático a partir de uma diversidade de

gêneros textuais e de múltiplas linguagens. No entanto, o como fazer, a definição das

escolhas pedagógicas dos professores, está atrelada à sua formação como leitor e às

concepções que possui sobre leitura, escolarização e formação da criança leitora. Sendo

assim, embora haja um referencial a ser seguido, são diversos os enunciados que estão

implícitos e ou explícitos no fazer pedagógico dos professores, concepções que se

materializam em suas práticas cotidianas de ensino de leitura.

A primeira proposta a ser apresentada e discutida é o projeto interdisciplinar

que envolve as disciplinas de história, ciências e geografia. Surgiu a partir das

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discussões de planejamento na unidade escolar, em 2010, como estratégia para se

trabalharem os conteúdos citados, os quais não eram tão prestigiados como as disciplinas e

os conteúdos de Língua Portuguesa e Matemática. Neste sentido, a professora Mariana,

como já desenvolvia com suas turmas alguns projetos de letramento, tendo como parâmetro

a aprendizagem da leitura e escrita, considerando sua função social, encabeçou as

discussões sobre o projeto interdisciplinar e o sistematizou. No início, eram 3 projetos

distintos: “Qualidade de Vida”; “Minha escola, minha casa e meu bairro” e “Identidade e

Memória”. No entanto, cada um desses projetos foi avaliado e repensado a cada final de

ano letivo.

Em 2011, os projetos foram reescritos com o intuito de aprimorá-los e torná-los

efetivamente interdisciplinares, já que os mesmos mantinham divisões disciplinares:

história, ciências e geografia. A alteração teve início no 1º Ano do Ciclo I, sala em que

acompanhei o desenvolvimento pedagógico das crianças, como orientadora pedagógica da

escola, na qual foi feita esta pesquisa.

O projeto interdisciplinar atualizado foi organizado em um único projeto, com

início no 1º ano do Ciclo I, tendo sua finalização no 2º ano do Ciclo II (5º ano) – em um

encadeamento de conteúdos das áreas já citadas. Embora seja um projeto único, o mesmo

apresenta suas especificidades de objetivos gerais e específicos, por ano e ciclo, estando

divididos em temas gerais que abarcam todo assunto a ser tratado em cada ano.

Com relação ao Ciclo I, o Projeto está organizado em três temas: 1º Ano -

“Espelho, espelho meu, diga quem sou eu...”; 2º Ano – “Na Trilha da Minha Vida” e 3º

Ano - “Viajando pelo Brasil, desvendando minhas origens”.

Com relação aos conceitos de transversalidade e interdisciplinaridade, Kleiman

(1999) assevera que:

Transversalidade e interdisciplinaridade são conceitos inseparáveis, pois

alimentam-se, mutuamente. A interdisciplinaridade questiona a

fragmentação e a linearidade do conhecimento; a transversalidade

questiona a alienação e o individualismo no conhecimento. Ambas podem

ser postas em prática através do trabalho coletivo. (KLEIMAN, 1999, p.

22).

A opção pedagógica por um projeto de caráter interdisciplinar associa-se a um

posicionamento que concebe o ser humano como ser integrado, autônomo, o qual é sujeito

participante na construção do conhecimento. Abordar os conteúdos de forma interdisciplinar

não é somente romper com a fragmentação dos mesmos, mas sobretudo com uma formação

profissional histórica, marcada por “esta identidade social do professor, o sujeito que

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sabe o saber produzido por outros, e que o transmite”. (GERALDI, 2010). É assumir uma

concepção de educação crítica e menos alienante, em que o conhecimento é constituído nas

relações entre professores e alunos, utilizado como instrumento de resistência e

transformação.

O projeto interdisciplinar exposto tem como um dos principais eixos a

utilização da leitura literária. Ao ser indagada pela pesquisadora sobre o(s) motivo(s) da

seleção de livros e textos de literatura infantil para compor o projeto interdisciplinar, a

professora Mariana relata que:

Os livros de literatura infantil foram inseridos nos projetos porque eles

abriam uma reflexão sobre os assuntos que seriam trabalhados, além disso

havia o propósito de incentivo à leitura. Com essa prática as crianças

começaram a ler mais e estabelecer relações entre um livro e outro, e entre

fatos ocorridos no cotidiano, na história da humanidade, de nosso país.

(relato da professora Mariana).

Como relatado pela professora, no projeto interdisciplinar desenvolvido no ciclo

I é utilizado o discurso literário, como estratégia para iniciar uma discussão sobre os

assuntos em questão, ou mesmo, através deles, ampliar a temática em diálogo com textos de

gêneros distintos, em uma dinâmica intertextual. Esta prática de inter-relações textuais

contribui para a construção de redes interdisciplinares, sendo que um dos objetivos é a

formação de leitores proficientes e críticos. Para Kleiman (1999):

O significado de um texto não se limita ao que apenas está nele; seu

significado resulta da intersecção com outros. Assim, a intertextualidade

refere-se às relações entre os diferentes textos que permitem que um texto

derive seus significados de outros. Os textos incorporam modelo,

vestígios, até estilos (no caso das paródias) de outros textos e de outros

gêneros. Diz-se que todo texto remete a outros textos no passado e aponta

para outros no futuro. (KLEIMAN, 1999, p.62).

Ao desenvolver um trabalho pedagógico com ênfase em uma rede de

conhecimentos que dialogam, acredita-se que mais significativa será a aprendizagem para o

educando, e a compreensão dos conceitos será mais efetiva. Ainda, sobre a

intertextualidade, Kleiman (1999) expõe:

A intertextualidade é um fenômeno cumulativo: quanto mais se lê, mais se

detectam vestígios de outros textos naquele que está lendo e mais fácil se

torna perceber as suas relações com outros objetos culturais e, portanto,

mais fácil é sua compreensão. (KLEIMAN, 1999, p.62).

O incentivo à prática da intertextualidade é uma das características do projeto

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interdisciplinar implementado na unidade escolar pesquisada, pois pode se observar que há

um encadeamento dos conteúdos e conceitos das áreas de história, ciências e geografa, os

quais são desenvolvidos a partir da leitura e discussão de diversos textos: narrativos,

informativos, imagéticos entre outros, presentes nas etapas previstas para o

desenvolvimento do projeto.

Sobre o ensino de leitura em língua materna, são muitas as práticas ainda a

serem rompidas, muitas são consequência de concepções de educação conservadoras e

conteudistas que defendem, para a maioria da população, uma escola com um currículo

mínimo, que se limite ao ensino de leitura, cálculo e outras noções elementares. Há uma

urgência de mudanças de concepção que deve ser delegada à escola e a seus profissionais,

ou seja, que se repensem tais práticas de ensino de leitura alienantes e se implemente outra

concepção de formação do leitor, como sugere Geraldi (2010):

E entre formar ‘lectores’ e formar ‘lectores e auctores’, insinua-se na sala

de aula (perigosamente) uma outra concepção de leitura, não mais um ato

solitário, muito menos um ato de repetição do já dito. Mas um ato de

produção, que leva em conta “todos os conhecimentos anteriores da língua

e nossa experiência de vida”. Onde cada leitura é nova escrita de um texto.

(GERALDI, 2010, p. 112).

Neste sentido, apresenta-se o projeto interdisciplinar, o qual se acredita estar

embasado em uma concepção de ensino de língua materna que corresponda à formação de

um leitor e autor, produtor de inferências, a partir das leituras de textos de gêneros

diferentes e da promoção de discussões e comentários impulsionados pelos mesmos, no

decorrer do desenvolvimento do projeto e, concomitantemente, desta pesquisa.

A seguir, será feita uma análise comparativa entre o projeto em cada fase de

aplicação, com os registros diários produzidos pela professora sobre o desenvolvimento do

mesmo. Buscou-se fazer essa análise comparativa para que se possam obter dados

complementares sobre as experiências dos educandos ao participarem do projeto

interdisciplinar sobre leitura e sua possível relação com a produção de inferências – dados

obtidos neste trabalho de pesquisa.

Segue a descrição do projeto na fase desenvolvida no 1º ano do Ciclo I –

2.1. Projeto: “Espelho, espelho meu, diga quem sou eu...”

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QUADRO 5: Projeto Interdisciplinar – Ciclo I - 1ª Fase

CURSO: 1ª ano ciclo I – Ensino Fundamental ANO:

2012

Campinas - SP

CIÊNCIAS/HISTÓRIA/GEOGRAFIA

Os conteúdos de Ciências, História e Geografia serão trabalhados por meio de projeto, durante o ano

letivo.

PROJETO: ESPELHO, ESPELHO MEU, DIGA QUEM SOU EU...

JUSTIFICATIVA: ao trabalhar a identidade, estaremos estudando o verdadeiro “eu”, um

autoconhecimento através do corpo, fases da vida, estrutura familiar, lugar que vive, vivências de

cada um, debatendo e refletindo as diferentes histórias apresentadas, podendo então, promover a

ampliação das relações afetivas, o respeito à diversidade e à inclusão.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS:

criar um espaço de reflexão sobre a própria identidade;

reconhecer-se parte integrante de uma família e de outros grupos sociais próximos;

compreender a diversidade de organizações familiares em suas diferenças e semelhanças;

conhecer e explorar diferentes fontes históricas;

comparar imagens para perceber as diferenças temporais;

conhecer a organização do lugar em que está inserido;

descrever e registrar percursos rotineiros;

observar imagens, mapas, dados sobre o espaço que ocupa;

observar, registrar e preservar a natureza manifesta em seus espaços de convívio;

conhecer o esquema corporal humano, nomear suas partes, perceber as diferentes

características físicas e os sentidos que usamos para perceber o mundo;

cuidar do próprio corpo desenvolvendo hábitos de higiene e alimentação saudável;

entender o conceito de ser vivo;

perceber e reconhecer as diferenças entre os seres vivos, a diversidade da vida;

utilizar procedimentos de pesquisa para apropriação de conhecimentos.

compartilhar informações, ouvir e respeitar ideias dos colegas;

executar tarefas em grupo;

realizar as atividades propostas com empenho, respeito aos outros e ao ambiente;

valorizar a vida em todas as suas formas de manifestação;

ter iniciativas em relação à preservação ambiental;

valorizar as histórias, a cultura, os saberes dos colegas;

olhar, observar, descrever, registrar e analisar o espaço em que vive (casa, escola, bairro);

representar o espaço em que vive;

valorizar o espaço e o tempo vivenciado;

realizar processos simples de reciclagem e a reutilização de materiais.

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ETAPAS PREVISTAS:

Apresentar aos alunos a proposta do projeto e do produto final;

leitura (feita pela professora) do livro: “Bisa Bia, Bisa Bel” – Ana Maria Machado, realizada

em capítulos: capítulo 1- No fundo de uma caixinha (descoberta da foto da Bisa Bia); capítulo

2 – Pastel bochechuda (a foto da Bisa na escola); capítulo 3 – Tatuagem transparente (bisa Bia

estava no coração de Isabel); capítulo 4 – Conversa de antigamente (Isabel aprende coisas de

antigamente com bisa Bia); capítulo 5 – Meninas que assoviam (os conselhos de bisa Bia);

capítulo 6 – Um espirro e uma tragédia (desentendimento entre bisa Bia e Isabel); capítulo 7 –

A dona da voz misteriosa (a dona da voz misteriosa é bisa Bia); capítulo 8 – Trança de gente

(os alunos levam para a escola fotos das bisas);

a cada leitura de capítulo, uma reflexão e comentários das crianças;

discutir as fontes de memórias contidas na história de Bisa Bia;

trazer de casa fotografias e objetos que fazem lembrar pessoas ou acontecimentos da vida de

cada um;

discutir a frase: “Todos nós temos uma história” (relembrar a história de Isabel do livro Bisa

Bia, Bisa Bel e o que a fez lembrar ou entender a cultura de sua família);

leitura do conto: “Branca de Neve e os sete anões”;

filme: Branca de Neve e os sete anões;

discussão de como Branca de Neve foi uma filha desejada, e as dificuldades e conflitos

vividos com a madrasta;

pesquisa com os pais de como receberam a notícia de que teriam um filho, o período de

gestação e o momento do parto (onde nasceu, que dia, mês e ano), primeiros dias do bebê,

peso, altura, cuidados. Quando começou a andar, a falar, qual foi a primeira palavra;

pesquisar o nome: quem escolheu, por que escolheu, o seu significado;

olhando no espelho: como sou aspectos físicos, estudar as partes do corpo;

leitura de imagens sobre o corpo, livro: “Dos pés à cabeça” – Marie Houblon;

trabalhar os órgãos do sentido. Como sinto o mundo?

introduzir a questão da alimentação saudável, os alimentos de que gostamos e os que

precisamos comer;

leitura do livro: “Alimentos bons e certos” – Mário Gomboli

fazer uma salada de frutas e elaborar uma receita;

fazer uma salada de folhas;

o que fazer com as cascas das frutas e talos de verduras? Receitas;

discutir os hábitos de higiene com o próprio corpo e com os alimentos;

a partir da pergunta: somos todos iguais? – introduzir a história da África;

leitura do livro: “Menina bonita do laço de fita” – Ana Maria Machado;

filme Kiriku e a Feiticeira;

discutir as características da Menina do laço de fita e do Kiriku;

confeccionar a boneca Abayomi e contar a sua história;

observar e discutir a cultura na aldeia de Kiriku, a organização familiar e comparar com a

nossa;

socializar a organização familiar (cada aluno conta sobre sua família);

filme: Procurando Nemo;

discutir o filme enfocando a estrutura familiar;

vivência em família: o que gostamos de fazer, relação entre os membros da família;

profissão dos pais, importância de cada profissão;

construção da árvore genealógica;

temos animais de estimação? Quais? Conversar sobre os cuidados que devemos ter com os

animaizinhos e introduzir o estudo dos seres vivos;

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minha família vive em um lugar. Qual?

leitura do livro: “Onde Estamos” – Ely Barbosa;

discussão e apreciação da leitura;

leitura dos livros: “Uma Casa para Viver” – Maria Luísa Aroeira e Miriam L. da M. Fontes e

“As casas de ontem e de hoje” – Carlos Reviejo, que discutem vários tipos de moradia

começando pelas cavernas;

filme: Up, altas aventuras;

refletindo as leituras feitas e o filme, cada um conta como é sua casa;

construção da maquete da casa;

onde fica minha casa (rua, bairro);

como é o bairro que moramos (infraestrutura);

nosso bairro é bem cuidado?;

e nossa escola, como é? (estrutura física, funcionários, alunos). O que está bom e o que não

está. Como melhorar?

introduzir a questão da preservação do meio ambiente;

refletir o que podemos fazer para contribuir com o meio ambiente (economia de água e

energia, reciclagem e reutilização do lixo;

construir brinquedos com lixo reciclado.

Cada etapa será discutida, sistematizada e iremos construindo o livro da vida.

PRODUTO FINAL: Livro da Vida

BIBLIOGRAFIA:

AROEIRA, M. L., MOTA, M. L. Uma casa para viver. Belo Horizonte: Dimensão, 2008.

BARBOSA, E. Onde estamos? São Paulo: Paulinas, 2006.

BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília:

MEC/SEF

CAMPINAS. Diretrizes Curriculares para os anos iniciais do Ensino Fundamental. Versão II/2011.

Coleção Ciranda, cirandinha. São Paulo: Paulus, 2010.

GOMBOLI, M. Alimentos bons e certos. São Paulo: Paulus, 2002.

HOUBLON, M. Dos pés à cabeça. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2005. MACHADO,

A. M. Bisa Bia, Bisa Bel. São Paulo: Moderna, 2007.

. Menina bonita do laço de fita. São Paulo: Ática, 2005.

MUNDURU, D. Kabá Darebu. São Paulo: Brinque-Book, 2002.

REVIEJO, C. As casas de ontem e de hoje. Curitiba: ed. Base, 2008.

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O enunciado do projeto já remete a uma fala bastante conhecida não somente

pelas crianças, mas por adultos que tiveram contato com as narrativas infantis, como é o

caso da “Branca de Neve”, cuja fala da personagem/madrasta “Espelho, espelho meu, diga

quem sou eu...”, foi utilizada como mote para a primeira fase do projeto. A personagem da

história da Branca de Neve, conhecida por esses dizeres, ao estar diante de um espelho

mágico, obrigava-o a responder-lhe, positivamente, que sua beleza era incomparável a de

qualquer outra mulher que habitasse o reino.

Em contrapartida, os dizeres tão conhecidos na história da literatura infantil

foram apropriados e ressignificados em um contexto pedagógico, passando a ser associados

com a construção da identidade da crianças. Com a utilização do espelho como metáfora, e

através de atividades significativas de leitura, discussões, produções textuais, dinâmica de

grupo, troca de experiências, poderá ser possível responder: quem sou eu?

Com relação às etapas do projeto, este inicia-se com a apresentação do projeto

pela professora, e o produto final esperado. Na etapa seguinte, a proposta é fazer a leitura do

livro de literatura infantil: “Bisa Bia Bisa Bel” - obra vencedora de vários prêmios, escrita

pela renomada autora de livros infantis: Ana Maria Machado. A atividade está organizada

em: 1) leitura de cada capítulo do livro com as crianças, em voz alta, pela professora e 2)

reflexão sobre cada um dos capítulos associados aos objetivos e conteúdos a serem

trabalhados como planejado.

Além de seguir o planejamento, a professora possui um caderno de registros

sobre as atividades do projeto; este caderno cumpre a função de um diário sobre a

implementação das atividades planejadas. Utilizou-se este documento para dar visibilidade

às experiências vivenciadas pelos alunos da sala. Embora as atividades pedagógicas não

tenham sido restritas somente à leitura de textos, focou-se nos registros das práticas de

leitura propostas no projeto e vivenciadas em sala de aula.

No primeiro dia de registro, a professora fez a leitura do 1º capítulo do livro

“Bisa Bia Bisa Bel” (Ana Maria Machado), e relatou que:

“Após leitura, as crianças fizeram um reconto oral e discutimos a leitura

feita. Na discussão, recuperamos a questão dos guardados que temos em

casa, aquela caixa em que estão as lembranças do passado das famílias. As

crianças relataram coisas que ainda têm de quando eram bebês”. (Caderno

de Registro, Projeto Espelho, espelho meu, diga quem sou eu. Professora

Mariana, 2012).

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A passagem evidenciada acima, demonstra que, ao ler o primeiro capítulo do

livro de Ana Maria Machado – “Bisa Bia Bisa Bel” – obra que discute sobre as histórias de

vida de pessoas de gerações distintas, a professora, através do input textual, faz

intervenções entre o que foi lido e coordena uma discussão sobre a história do livro,

associando com as vivências dos alunos. Nesta relação, é possível afirmar que a professora,

com esse tipo de prática, constrói possibilidades de diálogos entre o texto lido e as

experiências do “universo cultural- cognitivo” (MARCUSCHI, 1995) das crianças,

remetendo às memórias de uma infância não tão distante, mas repleta de significados.

Após a leitura do primeiro capítulo, os alunos participaram de uma “roda da

memória”, onde cada criança expôs para os demais colegas e para a professora um objeto

significativo, o qual representasse passagens significativas da vida de cada um deles. A

professora relata que foi bem interessante essa atividade.

Na mesma semana, a professora retomou a leitura do livro, segundo capítulo e,

após a leitura, as crianças fizeram o reconto oral, sendo discutidas questões referentes à

semelhança física das crianças com seus parentes. Foi proposta para a turma uma entrevista

para fazer com os pais, para colher informações referentes ao nascimento e primeiro ano de

vida de cada um dos alunos.

No dia seguinte, foi lido para as crianças o terceiro capítulo, segundo o relatório

da professora, que descreveu, no livro de registro, detalhes sobre o conteúdo deste capítulo

e expôs o que foi feito após a leitura do mesmo:

“Discutimos o trecho lido e combinamos de na próxima aula trazer fotos

das bisas e das avós. Socializamos as entrevistas que as crianças fizeram

com os pais sobre dados de seu nascimento e primeiro ano de vida”.

(Caderno de Registro, Projeto Espelho, espelho meu, diga quem sou eu.

Professora Mariana, 2012).

A professora relatou o seguinte, através do registro diário, correspondente à

semana do dia 05/03/2012 ao dia 09/02/2012:

“Li para as crianças do capítulo 4 até o 8 do livro Bisa Bia, Bisa Bel.

Discutimos todos os capítulos e as crianças fizeram ilustrações. Depois do

último capítulo fizemos o reconto oral do livro todo. Fiquei feliz das

crianças lembrarem de detalhes que eu havia esquecido, como foi o caso

dos objetos que Bisa Bia contou à bisneta que existiam na época dela,

como por exemplo: o urinol (penico)”. (Caderno de Registro, Projeto

Espelho, espelho meu, diga quem sou eu. Professora Mariana, 2012).

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Cabe aqui retomar como a professora utiliza o livro de literatura infantil em sala

de aula. O que se pode observar é que a mesma leu o primeiro livro proposto no projeto, e

desenvolveu as práticas pedagógicas de leitura, além de outras associadas a ela, como se

verifica na sequência:

1) leitura feita pela professora em voz alta em sala de aula, para a turma toda;

2) reconto feito pelas crianças a cada capítulo lido;

3) organização de roda da memória em que, a partir da leitura do livro, as crianças

puderam levar para a escola “ objetos de memória” e relatar suas histórias de vida

para os colegas;

4) reconto oral do livro na íntegra;

5) ilustrações feitas pelas crianças sobre o livro lido.

Ainda no mês de março, a professora iniciou o segundo livro de literatura

infantil intitulado “Tem um avô no meu quintal”. Ela justificou, em seus registros, que era

um livro que não tinha sido inserido no planejamento, mas devido à temática estar

relacionada com as discussões sobre memória e história pessoal, foi incluído.

Aproveitamos a história para falar de tudo que aprendemos com nossos

avós. As crianças contaram que aprendem brincadeiras com os avós como:

corda, pipa, pião, esconde-esconde, além disso os avós são excelentes

contadores de histórias e que gostam de estar com os avós.

Esse livro contribuiu muito com nosso trabalho, pois permitiu refletir

sobra a importância de aprender com os mais velhos e saber respeitar a

cultura, o modo de viver de cada um. (Caderno de Registro, Projeto

Espelho, espelho meu, diga quem sou eu. Professora Mariana, 2012).

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É pertinente ressaltar que, no caso do livro “Tem um avô no meu quintal”. O

que ficou bastante marcante, na leitura que fez com os alunos sobre este livro, foram as

possibilidades de relações que o mesmo permitiu, o resgate de brincadeiras antigas de rua

citadas pela professora e, além disso, a história também suscitou a discussão sobre a

importância de respeitar os mais velhos e o modo de viver de cada um. Na leitura deste

livro foi possível verificar as diversas relações entre a história e as vivências das crianças e

de suas famílias.

Como registrado no planejamento da professora, a história lida para os alunos

foi “A Branca de Neve e os Sete anões”. Fica evidente, no relato da professora, a

participação efetiva das crianças no processo de discussão sobre os textos lidos e a

produção de comentários. No caso desta história, é relatado o seguinte:

“Hoje li para as crianças o livro: “Branca de Neve e os Sete Anões”. Ao

terminarmos de ler as crianças comentaram que conheciam a história de

outro jeito. Então, expliquei que existem várias versões da história, e

fizemos um relato de como são as versões que conhecemos. Concluímos

que o que muda de uma versão para a outra são as tentativas de matar a

Branca de Neve utilizadas pela madrasta e como a Branca de Neve acorda

do sono profundo após morder a maçã”. (Caderno de Registro, Projeto

Espelho, espelho meu, diga quem sou eu. Professora Mariana, 2012).

Nesse trecho do registro da professora, nota-se uma atitude leitora por parte dos

alunos marcada pela intertextualidade, pois as crianças perceberam que existem versões

para uma mesma história. Isso foi possível devido ao conhecimento prévio que as mesmas

acionaram quando tiveram contato com uma das versões do conto “Branca de Neve e os

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Sete Anões” lida pela professora, a qual abriu uma discussão sobre esse

questionamento das próprias crianças.

Comumente, subestimam-se as crianças na faixa etária, em que estão em

processo de alfabetização. É recorrente a preocupação excessiva em ensinar a ler e a

escrever de forma alfabética, no primeiro ano escolar. Muitos desses educadores sempre

questionam o trabalho desenvolvido na educação infantil, pois dizem que as crianças

chegam ao ensino fundamental sem conhecer minimamente as letras e os números. Essa

necessidade de alfabetizar as crianças - no sentido de que elas apropriem-se do código,

acaba por fragmentar o conhecimento e, sobretudo, implica em não ouvir o que a criança

tem a dizer.

Ao ler o conto da “Branca de Neve e os Sete anões para as crianças, a

professora percebeu que os mesmos já conheciam a história Além disso, identificaram

diferenças no conteúdo do conto. Ao considerar esses saberes das crianças, a professora

investiu em uma reflexão, permitida pela leitura de uma das versões, em comparação com

outras suscitadas pelos alunos. Essa mediação pedagógica rompeu com a visão de um

aluno tradicional que não sabe ler e escrever, convencionalmente, e por não ter as

ferramentas de comunicação, são considerados imaturos para possuírem conhecimentos

sobre leitura e, incapazes de fazer relações. Será que são mesmos? Ou os educadores ainda

não aprenderam a ter sensibilidade e voltar o olhar pedagógico para o aluno, escutar o que o

outro tem a dizer, mesmo que este seja criança e esteja em uma fase de desenvolvimento

sócio cognitivo inicial.

Ao se lançar luz sobre as práticas pedagógicas de leitura ocorridas na sala do 1º

Ano A, da EMEF. Prof. André Tosello, a partir dos registros da professora da sala, é

possível reiterar o quão importante e significativo para o aprendiz são os conteúdos e os

conhecimentos adquiridos na escola, quando abordados de maneira criativa, através da

reflexão e da interação verbal entre professores e alunos, valorizando os conhecimentos

prévios, as histórias de vida. Neste sentido, a opção pela literatura contribui para a mudança

de olhar sobre o educando, mais humanizada. É o que afirma Cosson (2011):

Na leitura e na escritura do texto literário encontramos o senso de nós

mesmos e da comunidade a que pertencemos. A literatura nos diz o que

somos e nos incentiva a desejar e a expressar o mundo por nós mesmos. E

isso se dá porque a literatura é uma experiência a ser realizada. É mais que

um conhecimento a ser reelaborado, ela é a incorporação do outro em mim

sem renúncia da minha própria identidade. No exercício da literatura,

podemos ser outros, podemos viver como outros, podemos romper os

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limites do tempo e do espaço de nossa experiência e, ainda assim,

sermos nós mesmos. É por isso que interiorizamos com mais intensidade

as verdades dadas pela poesia e ficção. (COSSON, 2011, p. 17)

Foram muitas as atividades desenvolvidas a partir do projeto interdisciplinar,

como apresentado (planejamento anual), nessa dinâmica. Em um outro momento foram

usados livros de literatura. Um deles foi o livro de Ana Maria Machado “Menina Bonita do

Laço de Fita”, utilizado a partir de uma indagação, segundo a professora:

“Após falarmos um pouco sobre como manter uma vida saudável com boa

alimentação, exercícios físicos e higiene, começamos a pensar na seguinte

questão: Somos todos iguais? Para iniciarmos as discussões fizemos a

leitura do livro: “Menina Bonita do Laço de Fita” - Ana Maria Machado”.

(Caderno de Registro, Projeto Espelho, espelho meu, diga quem sou eu.

Professora Mariana, 2012).

Novamente, apareceu em seus registros a utilização dos livros de literatura

infantil, para o início de uma conversa, de uma discussão sempre atrelada a uma temática

importante, e também para responder aos conteúdos curriculares. Mas não somente para tal:

sobretudo, percebe-se o objetivo de fazer a criança pensar, refletir sobre a construção do

conhecimento. Após ler o livro para e com os alunos, foi exibido o filme “Kiriku e a

Feiticeira” - filme que aborda a história de uma criança que vive em uma aldeia na África.

A professora solicitou que os alunos fizessem uma lista das características dos personagens

principais e, em seguida:

“Questionei as crianças sobre o que diferia nas duas histórias. Relataram

que, além do lugar em que viviam, o Kiriku conhecia sua história porque

perguntou para a mãe, foi atrás do avô e a menina não sabia, pois quando o

coelho questionava porque ela era tão “pretinha” sempre inventava uma

história. As crianças disseram que é importante a gente conhecer a própria

história”. (Caderno de Registro, Projeto Espelho, espelho meu, diga quem

sou eu. Professora Mariana, 2012).

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Além de incentivar a discussão e a comparação sobre as características dos

personagens do livro e do filme, essa atividade propiciou às crianças chegar à conclusão de

que é importante conhecer a própria história. Isso desencadeou conversas sobre os gostos,

os desejos e as escolhas de cada sujeito da turma, possibilitando a compreensão das

diferenças e a valorização do outro. Foram introduzidas as reflexões sobre a história do

Nemo - filme e, da boneca Abayomi, para finalizar as questões sobre as diferenças pessoais,

familiares e culturais.

Um outro livro foi introduzido para dar continuidade às discussões sobre

organização familiar: “A melhor família do mundo”, de Susana Lopez, o qual aborda a

temática da adoção da personagem principal. Pelo que foi registrado pela professora, a

leitura deste livro foi profícua, para que os alunos se sentissem no lugar do outro, nessa

história específica, da criança abandonada, “enxergando” a importância de uma família que

cuida do outro sem, necessariamente, ter laços familiares consanguíneos.

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Após uma série de atividades intensas sobre a formação das famílias de cada

criança e reflexões sobre os diversos tipos de organização familiar, foram produzidos

esquemas sobre a árvore genealógica de cada sujeito da sala; inclusive, foi abordada a

importância do animal de estimação ser tratado com carinho e sua posição como um ente da

família. Na sequência do trabalho pedagógico, as reflexões se ampliaram a partir de

conversas sobre o lugar onde se vive. Para subsidiar as discussões, a professora leu para e

com as crianças os livros “Onde Estamos”, de Ely Barbosa e “Uma Casa para Viver”, de

Maria Luísa Aroeira e Míriam L. da M. Fontes.

Esta prática propiciou comparações entre os conteúdos dos dois livros: um livro

mais voltados para o entendimento da ocupação do espaço e suas relações entre casa, rua,

bairro, cidade e assim sucessivamente; e o outro sobre a história das moradias no decorrer

da história. Segundo a professora, a leitura dos livros, sobretudo do “Uma casa para viver!

fez com que:

“As crianças tiveram curiosidade a respeito do surgimento do dinheiro,

então falamos sobre como viviam os homens da caverna, depois os

nômades que procuravam comida e que depois começaram a plantar,

então expliquei o mercado de troca e que com o crescimento populacional

tiveram que usar moedas de trocas (que ainda não era dinheiro como

temos hoje), mas as coisas foram caminhando até que chegasse como

somos hoje.” (Caderno de Registro, Projeto Espelho, espelho meu, diga

quem sou eu. Professora Mariana, 2012).

Além dos livros citados, foram utilizados outros que estão no projeto, além de

alguns que foram inseridos no decorrer do mesmo. Entretanto, o objetivo não foi dar conta

de todas as especificidades das práticas pedagógicas desenvolvidas no projeto

interdisciplinar. Selecionaram-se algumas passagens, as quais dão visibilidade à utilização

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de textos literários no processo de aquisição de alfabetização e letramento pelos alunos

desta sala, com ênfase no que Cosson (2011) chama de letramento literário - um conceito

que rompe com as apropriações tradicionais de textos literários na escola. Para este autor:

Nesse caso é fundamental que se coloque como centro das práticas

literárias na escola a leitura efetiva dos textos, e não as informações das

disciplinas que ajudam a constituir essas leituras, tais como a crítica, a

teoria ou a história literária. Essa leitura também não pode ser feita de

forma assistemática em nome de um prazer absoluto de ler. Ao contrário,

é fundamental que seja organizada segundo os objetivos da formação do

aluno, compreendendo que a literatura tem um papel a cumprir no âmbito

escolar. (COSSON, 2011, p.23).

Em geral, os livros de literatura são utilizados nas séries iniciais como um

artefato cultural lúdico, para momentos de recreação, lazer e para trabalhar com os alunos

as escritas de algumas palavras que contribuem para a alfabetização. Além disso, os

professores costumam selecionar livros com pouco texto, pois acreditam, como sinalizado

anteriormente, que os alunos ainda não têm maturidade cognitiva para apropriarem-se de

histórias mais complexas, textos mais densos. Por outro lado, os professores não

conhecem as obras literárias, não pesquisam títulos e não investem seu tempo nessas

leituras.

Sendo assim, a literatura não é explorada da forma como deveria. O que se traz

nesta pesquisa é a possibilidade de um investimento, por parte de uma educadora, em

práticas pedagógicas de leitura literária, as quais são caracterizadas por letramento

literário.

A seguir é apresentada, na íntegra, a segunda fase do projeto interdisciplinar, e

retomados os registros feitos pela professora sobre o desenvolvimento do mesmo no 2º ano

do Ciclo II. Algumas práticas pedagógicas do ensino de leitura são recorrentes; entre

outras que serão relatadas, apresentam-se novas possibilidades de se trabalhar com a

leitura literária na escola.

QUADRO 6: Projeto Interdisciplinar – Ciclo I - 2ª Fase

CURSO: 2ª ano ciclo I ANO: 2013

Campinas- SP

CIÊNCIAS/HISTÓRIA/GEOGRAFIA

Os conteúdos de Ciências, História e Geografia serão trabalhados por meio de projeto, durante o

ano letivo.

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PROJETO: “NA TRILHA DA MINHA VIDA...”

JUSTIFICATIVA: o Projeto “Espelho, espelho meu, diga quem sou eu...”, realizado no ano

letivo de 2012, tem a finalidade de trabalhar a origem de cada família, história do sobrenome, as

raízes culturais/sociais/étnicas de cada aluno, bem como as relações entre os seres vivos nesse

percurso, observando, pesquisando, investigando os lugares (espaços percorridos, vividos)

através de várias fontes de informações: documentos, relatos, objetos, imagens, estabelecendo

relações entre o presente e o passado, pensando no futuro

OBJETIVOS ESPECÍFICOS DE HISTÓRIA:

Reconhecer-se como sujeitos que fazem história em seus grupos de convívio.

Contextualizar sua história pessoal e familiar no âmbito das relações sociais da escola.

Analisar documentos históricos e fontes de informação, tais como documentos escritos,

relatos orais, objetos pessoais, imagens e reconhecer algumas de suas funções.

Identificar permanência e transformações sociais, econômicas e culturais nas vivências

cotidianas das famílias e da escola, estabelecendo relações entre o presente e o passado.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS DE GEOGRAFIA:

Conhecer a diversidade de moradias e discutir aspectos humanos e sociais envolvidos.

Explorar percursos rotineiros e identificar o próprio endereço e o da escola, fazendo uso

de representações cartográficas.

Conhecer e reconhecer os espaços escolares e suas funções.

Analisar, relacionar e comparar informações sobre o espaço geográfico que ocupam.

Valorizar e respeitar o ambiente escolar e seus recursos humanos e preservá-lo como

espaço coletivo.

Reconhecer e valorizar os diferentes papéis sociais desempenhados por si e pelas pessoas

da família, da escola, da comunidade e de outros meios em que estejam inseridos.

Identificar e discutir a estrutura do trânsito e as sinalizações existentes no entorno da

escola e sua relação com a mobilidade.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS DE CIÊNCIAS:

Relacionar as fases da vida com as transformações do corpo humano e os diferentes

comportamentos a elas associados.

Compreender que o alimento é fonte de energia para o desenvolvimento físico.

Compreender as relações entre os seres vivos e os espaços em que vivem.

Identificar as características (físicas, alimentares, reprodutivas, locomoção) de diferentes

grupos de animais.

Relacionar os períodos do dia e da noite no planeta aos hábitos diurnos e noturnos dos

seres vivos.

ETAPAS:

Apresentar aos alunos a proposta do projeto e do produto final.

Retomar “o projeto: Espelho, espelho meu, diga quem sou eu...”.

O meio em que vivemos: chuva de ideias (o que é meio ambiente?), o que temos no

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meio ambiente (seres vivos, seres não vivos, recursos naturais).

Livro: Onde Estamos?

Planeta Terra – observação e estudo do Globo Terrestre (localizar nosso país).

O que temos no planeta Terra? Seres vivos (quais?), recursos naturais (quais?).

Classificação dos seres vivos (reino dos animais, reino das plantas, reino dos

fungos, reino protista, reino monera e vírus).

Estudo do reino animal (como são os grupos: características, habitat, alimentação,

reprodução).

Homem – animal racional – características do ser humano, suas relações no meio

ambiente, transformações ocorridas durante as fases da vida.

Recursos naturais necessários à vida (solo, ar, água).

Ciclo da água.

Preservação dos recursos naturais.

Alimentação – fonte de energia para o desenvolvimento físico.

Livro: “Energia do Alimento” – valor nutricional dos alimentos.

Cuidados com a saúde – higiene, vacinação, atividades físicas.

Relações que o homem estabelece com os outros seres.

Produção de um livro contando a história de vida de um ser vivo (características,

reprodução, alimentação, habitat, relações com o meio ambiente).

Socialização das pesquisas, apresentação do livro para os colegas.

Voltando ao globo terrestre, localizar o Brasil.

Pesquisar o mapa do Brasil e localizar o Estado de São Paulo.

Estudo do mapa de São Paulo e localizar nossa cidade – Campinas.

Estudo do mapa de Campinas, localizar o bairro em que mora e onde está localizada

a escola.

Localizar a rua em que cada um mora.

Como é o trânsito em nossa cidade, no nosso bairro e em nossa rua.

A cada estudo do lugar que ocupamos iremos construindo as páginas do livro

sanfonado: “Onde Estamos? Meus lugares...”

Chegar até a casa e descrever a família.

Livro: “A árvore da família”.

Pesquisa do sobrenome da família – origem/significado.

Pesquisa do brasão da família.

Socialização dos dados obtidos nas pesquisas com os colegas.

História da formação do povo brasileiro.

Livro: “Tem Tupi na oca e em quase tudo que se toca”.

Livro: “Meu Tataravô era Africano”.

Entrevista coletiva com a Orientadora Pedagógica Ana Cláudia (professora de História).

Trabalho em pequenos grupos sobre a formação do povo brasileiro, tendo como

fontes de pesquisa a entrevista com a Ana Cláudia, textos oferecidos pela professora

e o livro “Meu Tataravô era Africano”.

Confecção de cartazes para a socialização das pesquisas.

Livro: “A colcha de retalhos”.

Roda de imagens e objetos que trazem as raízes culturais e as memórias de cada família.

Livro: “Felpo Filva”.

Quem sou? Autobiografia.

Livros: 1- “Carta errante, avó atrapalhada, menina aniversariante”, 2- “Tem uma

história nas cartas da Marisa”, 3- “De carta em carta”.

Recebendo uma carta – cada aluno receberá uma carta escrita pela professora.

Meios de comunicação.

Escrita de uma carta contando aos pais as descobertas, as trilhas que estamos

percorrendo no projeto.

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Ida ao Correio postar as cartas.

Pesquisa com os pais sobre fatos marcantes na vida da criança e da família.

Confecção de uma almofada com a autobiografia.

Socialização da autobiografia.

Construção do jogo de trilha com os fatos marcantes da vida de cada um.

Passeio de Maria Fumaça (túnel do tempo).

PRODUTO FINAL:

Jogo de trilha – “Na trilha da minha vida”.

AVALIAÇÃO:

Entendendo a avaliação como um instrumento para o planejamento e encaminhamento do

trabalho docente, para que os alunos possam concluir os objetivos propostos, ela será

processual. Inicia-se com a diagnóstica e segue com o acompanhamento dos alunos em todas as

etapas, observando, registrando o processo de ensino-aprendizagem (dificuldades, avanços,

caminho percorrido). Todo o processo será documentado em caderno de registro (observações

da professora e autoavaliação dos alunos), atividades realizadas pelos alunos.

BIBLIOGRAFIA

ADELSIN. Cuidar bem do ambiente. São Paulo: Peirópolis, 2009.

BARBOSA, E. Onde estamos? São Paulo: Paulinas, 2006.

BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília:

MEC/SEF.

CAMPINAS. Diretrizes Curriculares da Educação Básica para o Ensino Fundamental – Anos

Iniciais: Um processo Contínuo de Reflexão e Ação: Prefeitura Municipal de Campinas,

Secretaria Municipal de Educação, Departamento Pedagógico/organização e coordenação:

Heliton Leite de Godoy, 2012.

FURNARI, E. Felpo Filva. São Paulo: Moderna, 2006. MACHADO,

A. M. De carta em carta. São Paulo: Moderna, 2002.

MARTINS, G., TELLES, T. S. Meu Tataravô era Africano. São Paulo: DCL, 2008.

MELLETT, P., ROSSITER, J. Energia do Alimento. São Paulo: Scipione, 1994.

PINSKY, M. Carta errante, avó atrapalhada, menina aniversariante. São Paulo: FTD, 1999.

SANTOS, W. M. Tem Tupi na oca e em quase tudo o que se toca. Belo Horizonte: Autêntica, 2011.

SILVA, C. C., SILVA N. R. A colcha de retalhos. São Paulo: Editora do Brasil, 1995.

STAHEL, M. Tem uma história nas cartas da Marisa. São Paulo: Clube do Livro, 1986.

ZAKZUK, M. A árvore da família. São Paulo: Panda Books, 2007

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2.2. Projeto “Na Trilha da Minha Vida ...”

Ao iniciar a segunda fase do projeto interdisciplinar, a professora retomou os

caminhos percorridos pelas crianças na primeira fase deste, relembrando com eles o que

aprenderam, através de uma conversa informal e foi introduzindo novas temáticas, dando

continuidade ao desenvolvido no ano anterior. Houve uma ampliação das discussões sobre

os espaços ocupados pelas crianças, passando pela casa, bairro, cidade. Foram introduzidas

atividades sobre ambiente natural e ambiente modificado, para isso a professora recorreu

ao livro “Esta casa é minha!”, de Ana Maria Machado.

Segundo os registros da professora, a leitura do livro possibilitou a discussão

sobre ambientes naturais e ambientes modificados e, após as discussões, foi utilizado o

livro didático de ciências para a construção dos conceitos científicos e a leitura de

imagens. Isto possibilitou que as crianças ampliassem a dimensão do micro e do macro, e

as possibilidades de vida nesses ambientes. Foi retomada com os alunos a temática sobre o

ambiente em que vivemos.

Para subsidiar as reflexões sobre ambiente em que vivemos, a professora releu

para as crianças o livro “Onde Estamos?”, de Ely Barbosa, para focar no vários lugares em

que se pode estar ao mesmo tempo. Segundo a professora:

“Após a leitura, discutimos os ambientes em que vivemos, as

crianças acharam fantástica a viagem do quarto ao universo e do

universo para o quarto, perceberam que ocupamos vários

ambientes” (Caderno de Registro, Projeto Na Trilha da Minha Vida,

Professora Mariana, 2013).

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Aqui aparece uma prática que é a releitura de um mesmo livro de literatura com

objetivos pedagógicos distintos. Segundo os relatos da professora em seu caderno de

registros, foi possível verificar que, no segundo ano, ela buscou trabalhar com textos mais

teóricos para conceituar todo o conhecimento que os alunos vinham construindo através das

discussões promovidas pela leitura dos livros de literatura, na interface com suas vivências,

desde o primeiro ano escolar. Cabe ressaltar a importância do papel de mediação da

professora na aquisição dos conhecimentos conceituais, ou sistematizados. Para Vigotsky

(2012), a criança aprende muito antes de entrar na escola. Segundo o autor:

Tomemos como o ponto de partida o fato de que a aprendizagem da

criança começa muito antes da aprendizagem escolar. A aprendizagem

escolar nunca parte do zero. Toda a aprendizagem da criança na escola

tem uma pré-história. Por exemplo, a criança começa a estudar aritmética,

mas já muito antes de ir à escola adquiriu determinada experiência

referente à () quantidade, encontrou já várias operações de divisão e

adição, complexas e simples; portanto a criança teve uma pré-escola de

aritmética, e o psicólogo que ignora esse fato é um cego. (VIGOTSKY,

2012, p.109).

A afirmação de Vigotsky (2012), sobre a ignorância do psicólogo por não ver

que a criança aprende antes mesmo de entrar na escola, é um preceito que serve para o

professor que não enxerga e não valoriza as experiências prévias da criança, as quais o

autor denomina de idade pré-escolar.

Ao analisar o desencadeamento do projeto interdisciplinar proposto pela

professora Mariana, é possível afirmar que a mesma não somente valorizou, no primeiro

ano de escolarização das crianças, os conhecimentos prévios adquiridos por elas na idade

pré-escolar, assim como valeu-se dos livros de literatura para dialogar com esses

conhecimentos e, a partir disso, ampliar seu repertório.

Estar atenta a essas questões e, sobretudo à escolarização, e ir desenvolvendo

estratégias que permitam as crianças a apropriarem-se dos conceitos abstratos, é um os

papéis da escola. Sobre o processo de aprendizagem pré-escolar e a escolar. Vigotisky

(2012) considera:

Pela sua importância, este processo de aprendizagem, que se produz antes

que a criança entre na escola, difere de modo essencial do domínio de

noções que se adquirem durante o ensino escolar. Todavia, quando a

criança, com suas perguntas, consegue apoderar-se dos nomes dos objetos

que as rodeiam, já está inserida numa etapa específica de aprendizagem.

Aprendizagem e desenvolvimento não entram em contato pela primeira

vez na idade escolar, portanto, mas estão ligados entre si desde os

primeiros dias de vida da criança. (VIGOTISKY, 2012, p. 110).

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Dito isto, faz-se necessário reiterar a importância da mediação da professora

para a aquisição dos conceitos científicos desenvolvidos pela escolarização e, sobretudo,

criar estratégias de intervenção que valorizem o desenvolvimento intelectual da criança.

Para o autor, “o aprendizado escolar produz algo fundamentalmente novo no

desenvolvimento da criança” (VIGOTSKY, 2010). Com o objetivo de compreender este

processo, o autor faz uso de um novo conceito: a zona de desenvolvimento proximal, que

estabelece que “o aprendizado deve ser combinado de alguma maneira com o nível de

desenvolvimento da criança”. (VIGOTSKY, 2010, p.95).

As relações reais entre o processo de desenvolvimento e a capacidade de

aprendizado da criança são marcadas por dois níveis de desenvolvimento: a) nível de

desenvolvimento real - é o indicativo do que a criança pode fazer por ela mesma, ou seja,

este nível diz respeito ao “nível de desenvolvimento das funções mentais da criança que se

estabeleceram como resultado de certos ciclos de desenvolvimentos já

completados”(VIGOTSKY,2010, p.95,96); b) nível de desenvolvimento proximal – estão

relacionadas “àquelas funções que ainda não amadureceram, mas que estão em processo de

maturação, funções que amadurecerão, mas que estão presentemente em estado

embrionário” (VIGOTSKY, 2010, p.98).

Em suma, entre o nível de desenvolvimento real, que se refere às etapas do

desenvolvimento já alcançadas, e o nível de desenvolvimento potencial, aquelas que

deverão ser atingidas, entre uma e outra, existe a zona de desenvolvimento proximal,

espaço em que deve ocorrer a atuação do professor, o qual deve ter como objetivo intervir

para que a criança alcance uma nova fase de desenvolvimento intelectual.

Portanto, a tarefa do professor é fundamental para que seus alunos, no processo

de ensino-aprendizagem, consigam atingir os propostos educativos. No caso específico da

criança que está na fase de apropriação de sistemas simbólicos, como a leitura e a escrita,

cabe ao professor, enquanto sujeito mediador desse processo, criar estratégias de

aprendizagem, atividades de diversos níveis de conhecimento que deem conta de contribuir

para o crescimento intelectual dos seus alunos.

No decorrer da segunda etapa do projeto, a professora utilizou um outro livro de

literatura para dar continuidade à discussão sobre os espaços ocupados, e fez relações com

as crianças sobre os lugares estudados, tais como quarto, casa, escola, bairro, cidade,

ampliando para planeta terra, lua, sol, estrelas, ou seja, a composição da nossa galáxia. O

livro utilizado é “Estrelas e Planetas”, de Pierre Winters.

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Na sequência, foi montado um roteiro de discussão sobre a leitura do livro e

feito um registro coletivo sobre as respostas obtidas nas discussões coletivas. Em seguida,

os próprios alunos montaram, cada um, um livro próprio sobre os espaços estudados. A

ênfase dos estudos desta vez foi sobre a organização política do Brasil, com seus estados,

culminando na cidade de Campinas, suas regiões e a composição de seu bairros, com

discussão sobre pertencimento. Até chegar na organização do bairro onde moram as

crianças, com uma profícua reflexão sobre transportes, sinais de trânsito e orientações para

os pedestres.

Após essas discussões, o foco do trabalho pedagógico voltou-se para a

composição familiar; para isto, a professora, retomou as reflexões ocorridas no primeiro

ano, através do livro “A Árvore da Família”, de Maísa Zakzuk. Foi levantada com os alunos

a história dos sobrenomes das crianças e desenvolvidos os conceitos: gerações e imigração.

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Este livro foi lido em partes e, no decorrer da leitura, a professora solicitou que

os alunos fizessem pesquisas a partir das questões: Por que me chamo assim? História do

sobrenome. Concomitante à leitura do livro, foi feita a socialização das pesquisas dos

alunos. Em seguida, a professora elaborou uma lista com os sobrenomes das crianças.

Os estudos sobre a origem dos sobrenomes propiciaram a discussão sobre como

o Brasil foi formado, quem foram os povos que chegaram nestas terras. As conversas entre

professora e alunos renderam tanto que ultrapassou os séculos, até chegar nos primeiros

habitantes que vivam no Brasil, antes da chegada dos portugueses. Para compreender um

pouco da história dos povos indígenas, a professora leu com os alunos o livro “Tem Tupi na

Oca, e em quase tudo que se toca”, de Walter Moreira Santos. Sobre essa experiência, a

professora relatou:

“Após a leitura, fizemos uma reflexão sobre a vida dos índios, retomamos

a nossa visita à aldeia em Cabreúva, em 2012, a leitura do “Diário de

Caxi”. As crianças falaram sobre a vida do índio antes e depois da chegada

dos portugueses ao Brasil (retrataram essa passagem através de desenhos).

Estudamos palavras de nosso vocabulário que têm origem indígena”.

(Caderno de Registro, Projeto Na Trilha da Minha Vida, Professora

Mariana, 2013).

É pertinente ressaltar que, após a leitura do livro, no momento da reflexão sobre

o que foi lido, foram associadas às experiência de um estudo do meio, em que as crianças

tiveram contato com o modo de vida dos Guaranis. Isso permitindo que as mesmas

fizessem relações entre os modos de vida antes e depois da chegada dos portugueses ao

Brasil. A leitura possibilitou uma discussão mais complexa, em que aparecem conceitos de

mudanças e permanências, imprescindíveis para a compreensão de muitos conteúdos

históricos.

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Na sequência do projeto, foi lido pela professora o livro de literatura “Meu

Tataravô era Africano”, de Georgina Martins e Teresa Silva Telles. Sobre a leitura deste

livro a professora faz a seguinte observação:

“A cada capítulo do livro fomos discutindo a vinda dos africanos para o

Brasil como escravos, toda a vivência que tiveram (trabalho escravo,

castigos, péssimas condições de vida, vendidos como mercadoria, as

fugas, os quilombos, as leis, ...). As crianças ficaram espantadas com

todas as situações e elaboraram questões para a Orientadora Pedagógica

” (Caderno de Registro, Projeto Na Trilha da Minha Vida, Professora

Mariana, 2013).

Através da história contida no livro citado, as crianças emocionaram-se com a

difícil vida dos africanos no Brasil, sentiram-se na condição do outro, o sofrimento, a

saudade da terra natal. Esses sentimentos foram despertados a partir da leitura de textos

narrativos, onde os personagens se tornam mais próximos do leitor. Acredita-se que um

livro didático, com uma linguagem mais abstrata e conceitual, na maioria das vezes, não

suscita tais sentimentos, pois a preocupação é com uma linguagem mais científica. Aqui

fica claro como a utilização de textos dessa natureza atinge a sensibilidade da criança.

Como relatou a professora, os alunos elaboraram questões para uma entrevista

marcada com a orientadora pedagógica da escola, que também é professora de história, para

sanar algumas dúvidas da história dos escravos africanos no Brasil. Para fechar a

discussão sobre a formação do povo brasileiro, as crianças, em grupo, produziram telas e

um texto coletivo, representando as cenas dos capítulos iniciais da história do Brasil.

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Depois das discussões sobre a formação do povo brasileiro, a professora

retornou à questão sobre a origem de cada família, agora com novas informações através

das leituras, pesquisas, tais como a origem do sobrenome e a árvore genealógica de cada

criança. Foram retomadas com as crianças as discussões sobre a história da família, com

ênfase na, na saudade, nos objetos que representam o tempo histórico. Foi lido pela

professora o livro “Colcha de Retalhos”, de Conceil Corrêa da silva e Nye Ribeiro Silva.

De acordo com a professora:

As crianças trouxeram objetos e fotos que retratam as memórias das

famílias. Discutimos um pouco o que é memória, o que é saudade. As

crianças disseram que saudades podemos sentir de uma pessoa que está

longe, de um lugar que já fomos, de coisas que já passaram. Disseram

também que memória pode estar em objetos, em fotos em livros, em

cartas...”(Caderno de Registro, Projeto Na Trilha da Minha Vida,

Professora Mariana, 2013).

Após a leitura do livro, foi feita uma roda de memória, em que cada criança

levou, para socializar com o grupo, alguns objetos referentes à história da sua família: fotos

dos pais, avós, tios etc; roupa dos pais quando pequenos, calçados, quadros, registros de

nascimento, cartas, entre outros objetos representativos da história das crianças, os quais

remetem à memória histórica.

A partir dessas reflexões, foi introduzido o estudo sobre gêneros textuais,

assunto surgido em decorrência dos conhecimentos que as crianças já tinham sobre a

estrutura de uma autobiografia e da carta. A professora leu com as crianças o livro “Felpo

Filva”, de Eva Furnari. Segundo a professora:

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“Com essa leitura, conversamos sobre vários gêneros textuais: autobiografia,

carta, cartão postal, bula, manual de instrução, poesia, fábula, conto... As

crianças escreveram a primeira versão autobiografia. Estudamos a estrutura

de uma carta. As crianças fizeram a leitura da primeira versão da

autobiografia para a sala.” (Caderno de Registro, Projeto Na Trilha da Minha

Vida, Professora Mariana, 2013).

Na sequência do trabalho, foram selecionados pela professora dois livros

de literatura que abordam como um dos assuntos a carta. Os livros são “Tem uma História

nas Cartas da Marisa”, de Mônica Stahel e “Carta Errante, Avó Atrapalhada”, de Mirna

Pinsky.Com relação a esses livros, foram feitos:

“Leitura e comentários, trabalhamos a cultura da menina, da avó e as

lembranças da avó (retrospectiva da sua própria vida)”. (Caderno de

Registro, Projeto Na Trilha da Minha Vida, Professora Mariana, 2013).

É importante ressaltar que, após as leituras dos livros de literatura, é recorrente

que a professora solicite o reconto da história e que produzam comentários sobre os livros

lidos.

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Para enriquecer as discussões sobre o gênero carta, atrelados a outros assuntos

discutidos no decorrer do projeto interdisciplinar, a professora propôs para os alunos a

leitura do livro “De Carta em Carta”, de Ana Maria Machado. Segundo os registros da

professora:

“Uma leitura emocionante, que encanta e traz a importância da

alfabetização e de se comunicar através da carta. Estudamos a estrutura de

uma carta, como escrevê-la e suas funções”. (Caderno de Registro, Projeto

Na Trilha da Minha Vida, Professora Mariana, 2013).

Além da leitura dos livros citados, a professora preparou uma atividade interessante.

Segue o registro:

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“Durante o mês de outubro, as atividades do projeto foram: a professora

escreveu uma carta para cada aluno dizendo da alegria de tê-los como

alunos e do desenvolvimento que tiveram durante o ano. As cartas foram

postadas no correio no dia 14 de outubro. As crianças escreveram cartas

para um familiar contando sobre as atividades que veem realizando no

projeto de história. As cartas foram levadas ao correio pelos próprios

alunos.” (Caderno de Registro, Projeto Na Trilha da Minha Vida,

Professora Mariana, 2013).

Na sequência da leitura dos livros que remetem à temática carta e suas

interfaces, como relatado no registro, a professora escreveu uma carta para cada aluno,

expondo sobre o processo de aprendizagem que cada um vivenciou naquele ano. Esta

prática foi muito significativa, pois os alunos sentiram-se motivados por terem recebido

nas suas casas, uma carta da professora. Uma experiência que promove o aprendizado de

conhecimentos conceituais através de uma relação de afeto com o objeto cultural.

A segunda fase do projeto foi finalizada no final do ano com uma exposição e apresentação

cultural dos alunos da sala.

2.1. Projeto: “Viajando pelo Brasil, desvendando minhas origens”

QUADRO 7: Projeto Interdisciplinar – Ciclo I - 3ª Fase.

CURSO: 1ª ano ciclo I – Ensino Fundamental

ANO: 2014

Campinas - SP

CIÊNCIAS/HISTÓRIA/GEOGRAFIA

Os conteúdos de Ciências, História e Geografia serão trabalhados por meio de projeto, durante o ano

letivo.

Projeto: “Viajando pelo Brasil, desvendando minhas origens”

Justificativa: dando continuidade ao projeto, “Na trilha da minha vida”, realizado no ano letivo de

2013, o presente projeto tem a finalidade de convidar as crianças a comemorarem e celebrarem o

tempo. O tempo passado, o tempo presente, para desvendar a própria história.

O projeto justifica-se por trabalhar as heranças culturais trazidas das diferentes regiões do Brasil pelos

pais e avós dos alunos, estudando os diferentes espaços, tipos de moradias, meios de transportes,

vegetação, cuidados com o meio ambiente, alimentação, saúde, características físicas e culturais das

pessoas de cada região.

Objetivos de Ciências:

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Compreender que o corpo humano é constituído de ossos, músculos e articulações que

permitem movimentos variados para interagir com o ambiente;

Reconhecer hábitos alimentares e de higiene, fundamentais para a saúde e para uma vida

saudável, relacionando-os às condições sociais, que são ou não asseguradas à sua

comunidade;

Compreender a importância da preservação de todas as espécies para o equilíbrio ambiental;

Identificar as características dos vegetais e os seus diferentes grupos;

Compreender os movimentos do Planeta Terra (translação e rotação), relacionando-os às

estações do ano e suas interferências no ambiente e no ciclo vital dos seres vivos.

Objetivos de Geografia

Identificar e avaliar as ações humanas em diferentes espaços, tempos e suas transformações;

Utilizar recursos visuais (desenho, foto, mapa, plantas e outros) como instrumentos de

análise dos diferentes espaços;

Apropriar-se, gradativamente, dos conceitos dos pontos cardeais, como referência;

Identificar e descrever as diferenças e semelhanças entre o modo de vida no campo e na

cidade, as formas de produção em diferentes espaços, reconhecendo suas inter-relações;

Analisar e comparar a natureza expressa no espaço vivido em relação às suas

manifestações presentes em outros ambientes;

Conhecer e valorizar diferentes atividades econômicas, suas especificidades e relações

entre elas e com a natureza;

Analisar e discutir a estrutura do trânsito e as sinalizações existentes no bairro e sua

relação com a modalidade;

Conhecer os diferentes meios de transportes utilizados nas regiões brasileiras.

Objetivos de História

Reconhecer-se como sujeito que faz história em seu grupo de convívio e nas relações

com outros grupos sociais, desenvolvendo uma postura de cidadania;

Reconhecer permanências, semelhanças e transformações sociais, econômicas e culturais

no cotidiano das famílias, escola e seu entorno;

Analisar documentos históricos e fontes de informação, tais como documentos escritos,

relatos orais, objetos pessoais e imagens, relacionando-os com acontecimentos no tempo

em seus grupos de convívio;

Identificar permanências e transformações sociais, econômicas e culturais do entorno da

escola (bairro, distrito), estabelecendo relações entre o presente e o passado.

Conhecer a cultura das regiões brasileiras e reconhecer sua influência no cotidiano

familiar e da comunidade.

Conteúdo de Ciências

Corpo humano – relação ossos, músculos e articulações nos movimentos;

Formas de locomoção, restrição de movimentos;

Alimentação saudável;

Saúde corporal e bucal;

Preservação ambiental e das espécies;

Morfologia vegetal;

Diferenciação de tipos de plantas;

Regularidade dos movimentos da Terra: translação e rotação;

Passagem dos dias e noites;

Estações do ano;

Horário de verão.

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Conteúdos de Geografia:

O bairro da escola: localização, infraestrutura;

Os bairros formam a cidade: o centro e a periferia como áreas de uma cidade;

Localização (bairro, cidade, estado, país);

Divisão das regiões brasileiras;

Mapas: leitura e análise de títulos, legenda, fonte – partindo da moradia, bairro, cidade,

estado, país, continente, mundo;

Pontos cardeais como instrumento de orientação espacial;

Zona rural: características, transformações, dificuldades, desenvolvimento e qualidade de

vida;

Zona urbana: características, transformações, dificuldades, desenvolvimento e qualidade

de vida;

Atitudes de cuidado e preservação do meio em que se vive;

As relações entre trabalho, profissões e renda (no tempo e no espaço);

O movimento no trânsito – pedestres, motoristas, passageiros;

Melhoria qualitativa da mobilidade: sinalização de trânsito horizontal e vertical, direção

defensiva.

Conteúdos de História

Como aprendemos na interação com os outros;

Reconhecimento e análise de documentos históricos e fontes de informações da vida

pessoal, familiar e da escola e seu entorno;

História pessoal, familiar, da escola e seu entorno;

Aspectos históricos do presente e passado nas famílias, escola, bairro e seu entorno;

História dos antepassados com ênfase nos locais de nascimento;

Aspectos culturais, econômicos e sociais das regiões brasileiras;

Direitos e deveres das crianças.

Etapas:

Retomada dos projetos “Espelho, espelho meu, diga quem sou eu...” (2012) e “Na trilha

da minha vida” (2013);

Pesquisa com os pais para descobrir de que região, estado e cidade do Brasil vieram os

bisavós, avós e pais;

Montar, na sala de aula, o mapa do Brasil dividido em regiões e cada aluno irá marcar a

região de origem da família;

Livro “Histórias da Nossa Gente”, de Sandra Lane;

Estudo das regiões brasileiras (localização dos Estados que compõe cada uma delas);

Explorando a vegetação/recursos naturais da Região Norte: texto – A história do guaraná;

Pesquisa de plantas, árvores da Região Norte;

Livro “Seringueira”, de Regina Casé e Estevão Ciavatta;

Estudo da estrutura dessa vegetação;

Explorando a vegetação/recursos naturais da Região Nordeste: Texto – O sapo encantado;

Pesquisa sobre plantas/árvores da Região Nordeste;

Estudo dessa vegetação;

Explorando a vegetação/recursos naturais da Região Centro-oeste: texto – Na roda do

jatobá;

Pesquisa sobre plantas/árvores da Região Centro-Oeste;

Estudo dessa vegetação;

Explorando a vegetação/recursos naturais da Região Sudoeste: Texto – Os sabiás;

Pesquisa sobre plantas/árvores da Região Sudeste;

Estudo dessa vegetação;

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Explorando a vegetação/recursos naturais da Região Sul: Texto – A lenda do mate;

Pesquisa de plantas/árvores da Região Sul;

Estudo dessa vegetação;

Relacionar todos os tipos de vegetação estudados com as condições ambientais e

climáticas, trabalhando os movimentos da Terra (translação e rotação), as estações do ano

e a questão do horário de verão;

Alimentação saudável – a importância dos vegetais na alimentação e na medicina;

Relacionar a boa qualidade de vida (higiene, alimentação, exercícios físicos, lazer) ao

desenvolvimento do corpo humano, principalmente com os ossos, os músculos, as

articulações, a saúde corporal e bucal;

Preparar uma exposição com a vegetação típica de cada região, algumas plantas

medicinais e a importância da vegetação para a boa qualidade de vida dos seres vivos;

Fazer uma horta com garrafas pet;

Ensaio da música “Herdeiros do Futuro”, de Toquinho (refletir sobre a preservação

ambiental e das espécies);

Encerramento do 1º trimestre;

Refletir sobre os aspectos estudados no ano de 2013 referentes ao bairro, à escola, ao

nosso lugar no espaço, para iniciarmos o estudo das regiões do Brasil, pensando no

espaço que ocupam;

Livro “A Paisagem”, de Maria Luiza Favret;

Livro “As Histórias e os Lugares”, de Elias José;

Livro “Ópera Brasil de Embolada”, de Rodrigo Bittencourt (leitura, reflexão, discussão

sobre as paisagens e problemas do Brasil);

Retornar a Região Norte para estudo do espaço: Texto: A lenda da bacaba – observação e

estudo do mapa, Estados/Capitais, bandeiras, algumas características geográficas da

região;

Retornar a Região Nordeste: Texto – A princesa de Jericoacoara – observação e estudo do

mapa, Estados/Capitais, bandeiras, algumas características geográficas da região;

Retornar a Região Centro-Oeste: texto – O Sol e a Lua – observação e estudo do mapa,

Estados/Capitais, bandeiras, algumas características geográficas da região;

Retornar a Região Sudeste: Texto – A mochila de ouro – observação e estudo do mapa,

Estados/Capitais, bandeiras, algumas características geográficas da região;

Retornar a Região Sul: Texto – São Sepé – observação e estudo do mapa,

Estados/Capitais, bandeiras, algumas características geográficas da região;

Observar as transformações ocorridas nos ambientes pela ação humana;

Identificar as diferenças dos espaços urbanos e rurais e as condições de vida, verificar as

profissões predominantes em cada região;

Identificar os meios de transportes utilizados nas regiões, os impactos ambientais,

sinalizações e leis de trânsito;

Representar por meio de maquetes os principais espaços de cada região do Brasil;

Ensaios de um musical para apresentação para os pais: “Notícias do Brasil”, de Milton Nascimento;

Encerramento do 2º trimestre;

Livro “Falando Banto”, de Eneida D. Gaspar (leitura e discussão da influência do

vocabulário Banto em nossa língua);

Retornar a Região Norte: Texto – A história do manganês – Aspectos históricos e

culturais da região (festas, hábitos, culinária, artesanato, dialeto, um pouco da história de

cada estado;

Retornar a Região Nordeste: Texto – O governador do sertão, livro: “Lampião e Maria Bonita - o rei e a rainha do cangaço” – Liliana Iacocca – aspectos históricos e culturais da região (festas, hábitos, culinária, artesanato, um pouco da história de cada estado;

Livros “O Tabuleiro da Baiana”, de Sônia Rosa; “Capoeira”, de Sônia Rosa; “Maracatu”,

de Sônia Rosa;

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Literatura de Cordel;

Livro “O Herói de Damião – em a descoberta da capoeira”, de Iza Lotito;

Retornar a Região Centro-Oeste: Texto – Romãozinho – aspectos históricos e culturais da

região (festas, hábitos, culinária, artesanato, um pouco da história de cada estado;

Retornar a Região Sudeste: Texto – Chico Rei – aspectos históricos e culturais da região (festas,

hábitos, culinária, artesanato, um pouco da história de cada estado;

Livros “Jongo”, de Sônia Rosa; “Feijoada”, de Sônia Rosa;

Retornar a Região Sul: Texto – Um castelo no céu – aspectos históricos e culturais da região

(festas, hábitos, culinária, artesanato, um pouco da história de cada estado;

Estabelecer relações entre a cultura de cada região e as influências dela em nossa vida, o que

herdamos e usamos no nosso dia-a-dia;

Identificar as influências culturais das regiões brasileiras trazidas por imigrantes para nossa

escola e nosso bairro;

Pesquisar o modo de vida das crianças de cada região brasileira e analisar se os direitos e

deveres a elas atribuídos estão sendo garantidos;

Selecionar aspectos de cada região para um desfile cultural;

Confeccionar fantasias para o desfile;

Confeccionar telas para cenário do desfile com características marcantes de cada região;

Apresentação do desfile ao som de músicas que caracterizam cada região do Brasil.

Produtos Finais:

1º Trimestre – exposição da pesquisa sobre vegetais típicos de cada região do país, vegetais

utilizados na medicina, horta em garrafas pet e apresentação musical “Herdeiros do Futuro”,

de Toquinho;

2º Trimestre - maquetes dos principais espaços de cada região do Brasil e apresentação do

musical “Notícias do Brasil”, de Milton Nascimento;

3º Trimestre – desfile cultural das regiões brasileiras.

AVALIAÇÃO:

Entendendo a avaliação como um instrumento para o planejamento e encaminhamento do trabalho

docente, para que os alunos possam concluir os objetivos propostos, ela será processual. Inicia-se com

a diagnóstica e segue com o acompanhamento dos alunos em todas as etapas, observando, registrando

o processo de ensino-aprendizagem (dificuldades, avanços, caminho percorrido). Todo o processo

será documentado em caderno de registro (observações da professora e autoavaliação dos alunos),

atividades realizadas pelos alunos e uma avaliação integrada ao final de cada trimestre.

BIBLIOGRAFIA

BALL, Johnny. Pense em um número – uma viagem fascinante ao mundo dos números

BITTENCOURT, Rodrigo. Ópera Brasil de embolada. RJ: Pallas, 2010

BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais. Secretaria de Educação Fundamental. Brasília:

MEC/SEF.

BUENO, Renata. Poemas Problemas. São Paulo: Editora do Brasil, 2011.

CAMPINAS. Diretrizes Curriculares da Educação Básica para o Ensino Fundamental – Anos Iniciais:

Um processo Contínuo de Reflexão e Ação: Prefeitura Municipal de Campinas, Secretaria Municipal

de Educação, Departamento Pedagógico/organização e coordenação: Heliton Leite de Godoy, 2012.

CAMPINAS. Quadro de Suporte Pedagógico das Diretrizes Curriculares do Ensino Fundamental:

subsídios à prática educativa. Prefeitura Municipal de Campinas, Secretaria Municipal de Educação,

Departamento Pedagógico, Assessoria de Currículo e Pesquisa Educacional, Organização: Heliton

Leite de Godoy, 2013.

CARVALHO, M. Problemas? Mas que problemas?! Estratégias de resolução de problemas

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Ao iniciar a terceira fase do projeto interdisciplinar, foi feita uma retrospectiva

com os alunos sobre o desenvolvimento das duas fases anteriores. A professora relatou

que as crianças lembraram prontamente, com riqueza de detalhes, os momentos vividos

nos dois anos do seu processo de escolarização. Em seguida, foi exposto para sala que o

projeto será uma sequência de tudo que já foi estudado e que será feito um passeio pelo

Brasil para descobrir que “muito que somos e temos são heranças das regiões brasileiras.”

(Prof. Mariana).

Para iniciar o projeto, os alunos fizeram uma pesquisa sobre o lugar de origem

dos pais e outras pessoas da família. Após desenvolvidas as pesquisas, foi proposto para os

alunos estudarem as influências da cultura dos outros estados na vida cotidiana de cada

um. A professora produziu um mapa de papel e colocou na parede da sala, cada aluno com

um bonequinho, também de papel afixou no mapa, a região de origem da família.

O livro “Histórias da Nossa Gente”, de Sandra Lane, foi apresentado para as

crianças e feita a leitura do prefácio escrita pelo cantor e compositor Rubinho do Vale. Em

seguida, a professora leu a apresentação do livro para as crianças e mostrou uma imagem.

matemáticos em sala de aula. Petrópolis, RJ: Vozes, 2005.

CASÉ, Regina e CIAVATTA, Estevão. Seringueira. São Paulo: Editora Martins Fontes, 2011.

FAVRET, Maria Luiza. A Paisagem. São Paulo: FTD, 2008.

FURNARI, Eva. Os Problemas da Família Gorgonzola. São Paulo: Global, 2004.

IACOCCA, Liliana. Lampião e Maria Bonita – o Rei e a Rainha do Cangaço. São Paulo: Ática, 2005.

JOSÉ, Elias. As Histórias e os Lugares. São Paulo: Paulus, 2005.

LANE, Sandra. Histórias da Nossa Gente. Belo Horizonte: Mazza Edições, 2010.

LOTITO, IZA. O Herói de Damião – em a Descoberta da Capoeira. São Paulo: Girafinha, 2006.

ROSA, Sonia. Capoeira. RJ: Pallas, 2009.

O Tabuleiro da Baiana. RJ: Pallas, 2009.

Feijoada. RJ: Pallas, 2009.

Jongo. RJ: Pallas, 2009.

SALERNO, Silvana. Viagem pelo Brasil em 52 histórias. São Paulo: Companhia das Letrinhas, 2006.

TEIXEIRA, M. R. Matemática em mil e uma histórias – quem inventou o dinheiro? São Paulo: FTD, 2010.

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Segundo seu registro:

“Perguntei para as crianças o que a imagem retratava. Prontamente

responderam que a imagem mostrava a chegada dos portugueses ao Brasil.

Fiz a leitura do capítulo 1: História da Nossa Gente’. Durante a leitura, as

crianças foram se lembrando de vários aspectos estudados no ano passado

(história dos índios, chegada dos portugueses, resistência dos índios,

confronto de culturas). As crianças fizeram comentários lembrando como

e em que condições os africanos chegaram ao Brasil. Terminamos a leitura

desse capítulo e construímos um comentário coletivamente.” (Caderno de

Registro 1, Projeto “Viajando pelo Brasil, desvendando minhas origens,

Professora Mariana, 2014).

Com a leitura do livro citado, a professora retomou as discussões sobre a

história do Brasil, ao estudar a formação do povo brasileiro. Nesta fase do projeto, a ênfase

das discussões recaiu sobre a chegada dos portugueses, a implantação da escravidão no

Brasil - período colonial. O livro traz informações sobre alguns personagens importantes da

nossa história, como Chico Rei e Zumbi dos Palmares. Segue a continuidade do relato da

professora:

Com as histórias relatadas no livro “Histórias da Nossa Gente”, as crianças

puderam perceber o quanto o nosso país é rico em diversidade cultural, a

partir de agora embarcaremos em uma viagem às cinco regiões do Brasil.

Vamos? Boa Viagem? (Caderno de Registro 1, Projeto “Viajando pelo

Brasil, desvendando minhas origens, Professora Mariana, 2014).

Ao retomar as práticas de leitura desenvolvidas no 1º e no 2º anos, é possível

inferir que a apropriação deste livro caracteriza-se por novos elementos, tais como: leitura

do prefácio e discussão do mesmo; leitura da apresentação do livro; leitura de imagens com

o intuito de promover a discussão de conceitos aprendidos no 2º ano; contato com

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personagens reais da história do Brasil, narrados em forma de biografia. Ao comparar o uso

dos livros de literatura nas fases anteriores do projeto e na terceira fase, verifica-se uma

complexidade no uso desses materiais e as várias possibilidades de diálogo, sejam com

conceitos científicos, o apelo às experiências prévias do leitor, o uso de imagens como

forma de incentivar a retomada dos conhecimentos adquiridos e o incentivo a desvendar

conhecimentos novos.

Este livro também foi utilizado para o ensino de conhecimentos conceituais da

área de ciências, sobre vegetações nativas das 5 regiões do Brasil, temática que possibilitou

que os alunos acionassem os conhecimentos já adquiridos sobre a organização do Brasil em

regiões e suas especificidades históricas, culturais e ambientais.

A seguir, o livro trabalhado com os alunos foi “Viagem pelo Brasil em 52

histórias”, uma coletânea de narrativas do universo popular brasileiro, organizado pela

autora Silvana Salerno.

O primeiro texto lido com as crianças foi: “A história do Guaraná”, o qual diz

respeito à vegetação da região norte do Brasil. Segundo a professora:

“Lemos o texto em uma leitura compartilhada, depois discutimos as

seguintes questões: Que tipo de texto temos? Em que local acontece a

história? Quais são os personagens? O que entenderam da história? As

crianças souberam identificar que se trata de uma lenda e a compararam

com a lenda da mandioca. Falamos um pouco sobre a cultura indígena e

sobre a utilidade do guaraná.” (Caderno de Registro 1, Projeto “Viajando

pelo Brasil, desvendando minhas origens, Professora Mariana, 2014).

A leitura do texto sobre a história do guaraná foi realizada de forma

compartilhada, ou seja, cada criança leu um trecho em voz alta e em seguida a professora

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fez uma nova leitura do mesmo. Esta prática de leitura compartilhada apareceu pela

primeira vez nos registros da professora, possivelmente por as crianças já estarem

alfabetizadas; estas são convidadas a fazer uma leitura em sala, onde cada uma delas lê um

fragmento do texto. A pesquisadora esteve na sala em alguns momentos em que a

professora estava desenvolvendo a leitura compartilhada com seus alunos, sendo possível

observar que todos participavam, independente da fluência leitora, todas as crianças

respeitavam e contribuíam ajudando os alunos que demonstrava uma maior dificuldade

com a leitura.

Outro aspecto importante a ser ressaltado é que, após a leitura, a professora

propôs uma reflexão, através da formulação de algumas questões, que não têm o intuito de

mensurar o que se sabe através de respostas corretas ou erradas. Estas são elaboradas para

direcionar a reflexão e adquirir conhecimentos novos a partir dos já obtidos; são questões

com objetivos distintos, e as respostas são indícios para que a professora possa avaliar o

desenvolvimento dos alunos. Cabe ressaltar o registro que ela fez ao identificar os alunos

que conseguiram identificar o que é uma lenda e comparar com outra lenda já lida.

Após trabalhar com o texto narrativo lenda, a professora introduziu o gênero

informativo para ampliar os conhecimentos sobre vegetação do norte do Brasil e, em

seguida, leu com as crianças o livro “Seringueira”, de Regina Casé e Estevão Ciavatta.

Sobre a leitura deste livro, a professora registrou que:

“Durante a leitura, fomos parando para comentários e explicações, levei

para as crianças um pedaço de caule de uma seringueira, a semente e uma

pedaço da borracha[...] levei também fotografias de um seringal e da

extração de látex. Em seguida fizemos uma sistematização”. (Caderno de

Registro 1, Projeto “Viajando pelo Brasil, desvendando minhas origens,

Professora Mariana, 2014).

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A professora finalizou as discussões sobre a vegetação do nordeste com o

depoimento de um aluno da sala, cuja a família é do Pará, e este pôde relatar suas

experiências vivenciadas naquele estado da região norte.

Sobre a vegetação da Região nordeste, a professora leu para os alunos o

texto “Sapo Encantado”, também retirado o livro de Silvana Salerno. Segundo relato da

mesma:

“Fizemos a leitura do texto e as crianças, após reconto, identificaram

aspectos da vegetação contida no texto. Depois estudamos os aspectos da

vegetação nordestina, sempre com a ajuda de um mapa para que as

crianças percebessem na região a predominância de cada espécie.”

(Caderno de Registro 1, Projeto “Viajando pelo Brasil, desvendando

minhas origens, Professora Mariana, 2014).

Após a leitura do texto, pode-se inferir, a partir do registro da professora, que os

alunos já sabiam quais as informações deveriam explorar, ou seja, os mesmos identificaram

os aspectos da vegetação nordestina, contidas na narrativa. Ao que indicam os indícios,

recuperaram essa informação de maneira autônoma. Após a leitura do texto narrativo, os

alunos registraram informações científicas sobre a vegetação nordestina.

Para o estudos das demais Regiões do Brasil e sua vegetação e meio ambiente

natural, foram utilizados outros textos do livro já citado “Viagem pelo Brasil em 52

histórias”; os textos selecionados foram “Na Roda do Jatobá” – Região Centro-Oeste, “Os

Sabiás” – Região sudeste e “A Lenda do Mate” – Região Sul. Os procedimentos didáticos

foram os mesmos: leitura compartilhada, leitura feita pela professora, comentários dos

textos lidos, complementação feita pela professora com outros textos de gêneros

informativos e científicos.

Após os estudos das cinco regiões do Brasil, com ênfase nas vegetação, tipos de

alimentos, animais, o assunto abordado passou a ser a organização do espaço brasileiro.

Para apresentar os conteúdos de geografia, a professora faz a seguinte explanação:

“A geografia estuda o espaço que ocupamos, os lugares que existem no

planeta Terra. Paisagem, em geografia, é tudo que podemos ver em um

lugar: as casas, as ruas, os rios, as pontes, as plantações, as matas, as

montanhas, o mar. Nem sempre as paisagens nos revelam coisas boas,

muitas vezes observamos poluição, destruição. Continuaremos nosso

passeio pelo Brasil, estudando um pouco das paisagens de cada região.”

(Caderno de Registro 1, Projeto “Viajando pelo Brasil, desvendando

minhas origens, Professora Mariana, 2014).

A professora convidou novamente os alunos a uma viagem pelo Brasil, desta

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vez com uma olhar para aspectos relacionados à sua geografia. Essa “viagem” tem um

ponto de partida e de chegada, seguindo um mesmo itinerário proposto ao se estudar o meio

ambiente brasileiro, ou seja, começando os estudos pela Região Norte, com a leitura do

texto “A lenda da bacaba” . Além da descrição das paisagens dessa região, foi trabalhada

com os alunos a organização política do território e a divisão em Estados.

Para a reflexão sobre a Região Nordeste, o texto selecionado foi “A Princesa de

Jericoacoara” e, posteriormente, estudados os Estados que compõem essa região. Com

relação à Região Centro-Oeste, foi lido o texto “O Sol e a Lua”, sobre as experiências

leitoras das crianças sobre este texto. A professora relata:

“Fizemos uma leitura compartilhada, depois as crianças fizeram o reconto

e comentários. As crianças explicaram que se tratava de uma lenda

(quando não tinham como explicar alguns fenômenos e situações os índios

e povos mais antigos usavam as lendas).

Como estamos iniciando o estudo geográfico da Região Centro- Oeste, fiz

a seguinte pergunta: O que o texto nos traz da Região Centro-Oeste? As

crianças responderam que aparecia: lugar de caça/ floresta/pantanal;

reserva indígena; rio Xingu e Estado do Mato Grosso. Após o estudo do

texto, fomos para o mapa do Brasil localizar a Região Centro-Oeste,

observamos os estados e países vizinhos.” (Caderno de Registro 1, Projeto

“Viajando pelo Brasil, desvendando minhas origens, Professora Mariana,

2014).

É importante ressaltar que, nesta passagem do registro, as crianças já

demonstram, a partir de seus comentários, conhecer algumas características de uma lenda.

Conhecimentos muito significativos, pois contribuíram para que compreendessem a função

social do texto lido. Um outro aspecto relevante no registro da professora diz respeito aos

elementos que as crianças reconhecem no texto e relacionam os mesmos às características

geográficas referentes à Região Centro-Oeste.

O texto selecionado para a introdução dos estudos sobre a Região sudeste foi

“A Mochila de Ouro”. Sobre o registro de leitura:

“Fizemos uma leitura compartilhada do texto (cada criança leu um

pedaço). Depois pedi para que comentassem. As crianças relataram

questões relacionadas ao egoísmo, avareza, a ser bom ou mau. Falaram

sobre a terra boa para plantar. Questionei as crianças quanto à ocupação da

Região Sudeste, disseram que existe mais zona urbana que rural e que

muitas pessoas saem, principalmente da Região Nordeste, para vir

trabalhar principalmente em São Paulo. Discutimos um pouco essa

questão, pois muitas vezes essas pessoas passam por muitas dificuldades

tendo que morar em favelas.” (Caderno de Registro 1, Projeto “Viajando

pelo Brasil, desvendando minhas origens, Professora Mariana, 2014).

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Novamente verifica-se a prática da leitura compartilhada e comentários sobre o

texto lido pelos alunos. Nesta leitura nota-se que a discussão sobre o espaço geográfico é

ampliado ao se produzirem inferências relacionadas a questões sociais decorrentes de

ocupação desordenada do espaço e geração de pobreza. Em seguida a essas discussões,

foram introduzidos conceitos sobre divisão política da região sudeste e a formação dos

estados.

Para finalizar o estudo sobre as Regiões brasileiras, à luz dos conceitos

geográficos, foi feita uma leitura compartilhada e discussão da lenda “São Sepé”, a qual

aborda a Região Sul do país. Foram identificados pelos alunos os estados pertencentes a

essa Região e mais características peculiares de cada um deles. Ao final do segundo

trimestre, os diversos trabalhos produzidos foram apresentados em uma exposição,

concomitante a uma mostra de danças sobre a temática estudada.

A fase seguinte da “viagem pelo Brasil” foi recuperada pela professora através

de uma série de experiências vivenciadas pelas crianças desde o 1º ano o Ciclo I. Segue o

relato da professora:

“Voltamos um pouco ao Projeto ‘Na Trilha da Minha Vida’, quando

estudamos nossas origens, voltamos à história do Brasil desde o

descobrimento. Vimos que quando os portugueses chegaram, encontraram

os índios e que depois foram chegando outros povos dentre eles os

africanos. Expliquei que nosso vocabulário tem muita influência indígena

e africana. Fizemos a leitura do livro ‘Falando Banto’, de Eneida D.

Gaspar.” (Caderno de Registro 1, Projeto “Viajando pelo Brasil,

desvendando minhas origens, Professora Mariana, 2014).

Com a leitura do livro citado, foram trabalhadas palavras e expressões de

origem indígena e africana que fazem parte da nossa cultura, as quais são usadas no dia a

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dia. Para iniciar as reflexões sobre os conteúdos de história, a professora fez uma

retrospectiva do que foi estudado nas duas primeiras fases do projeto interdisciplinar,

conversou com os alunos sobre a origem de suas famílias, a importância dos objetos como

símbolos de memória, a composição étnica do povo brasileiro. Além do livro de literatura, a

professora propôs o estudo da letra da música “E outros quinhentos virão” – Palavra

Cantada, com o objetivo de retomar as origens da história do Brasil.

Na sequência, a proposta foi retomar a “Viagem pelo Brasil” a partir de uma

perspectiva cultural e histórica. Para isso foi lido o texto “A História do Manganês” (do

mesmo livro da Silvana Salerno). A partir da leitura, foram desenvolvidas pesquisas sobre

as especificidades culturais de cada estado que compõe a Região Norte e apresentadas para

os alunos músicas regionais: Cantiga de Penas; Rodaciranda; Ubirajara.

A professora solicitou para os alunos pesquisas sobre a Região nordeste do

Brasil. Após a socialização das mesmas e o trabalho com texto informativo, ela leu com os

alunos o livro “Lampião e Maria Bonita: o Rei e a Rainha do Cangaço”, de Liliana

Iacoccca. Sobre a leitura deste livro, a professora relata:

“Um texto bastante longo e denso. Após a leitura, as crianças teceram

alguns comentários. Partimos para a segunda leitura que foi compartilhada

do texto: ‘O Governado do Sertão’. Na discussão, as crianças

relacionaram as vivências de Lampião (de querer justiça social) com os

nossos dias. Falaram também sobre preconceito. Construímos um texto

coletivo contando um pouco sobre a vida de Lampião”. (Caderno de

Registro 1, Projeto “Viajando pelo Brasil, desvendando minhas origens,

Professora Mariana, 2014).

Aqui, mais uma vez, a professora utilizou dois textos sobre a mesma temática

para subsidiar as discussões dos alunos, ou seja, a importância do recurso da

intertextualidade como incentivo à produção de inferências, comentários sobre os textos

lidos pelos alunos.

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Para dar continuidade à “Viagem” pela Região nordeste, além de outros

aspectos da cultura nordestina, que é muito diversa e rica, foram enfatizados pela

professora a culinária e a capoeira. Para esta reflexão, foram utilizados os livros “ O Herói

de Damião: em a descoberta da Capoeira”, de Iza Lotito; “ Capoeira” ,de Sonia Rosa e “ O

Tabuleiro da Baiana”, de Sônia Rosa.

Sobre a Região nordeste, foram desenvolvidos muitos trabalhos pedagógicos,

desde produções de textos coletivos até estudo do gênero cordel e produção de livrinhos

pelos alunos sobre este gênero. Em seguida, a professora introduziu o texto “Romãozinho”

como início dos estudos da Região Centro-Oeste, texto também retirado do livro: “Viagem

pelo Brasil e 52 histórias”. Para ampliar os estudos sobre a história e cultura desta Região,

foi utilizada a música “Quero-quero” (Matogrosso do Sul) – Palavra Cantada e textos

informativos. Para trabalhar a Região sudeste, o texto selecionado foi “Chico Rei”, de

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Silvana Salerno. Sobre a leitura deste texto, a professora relata:

“Lemos o texto e discutimos. As crianças falaram sobre a escravidão,

lembraram-se de trabalhos feitos no ano passado, comentaram sobre a

chegada dos africanos no Brasil em navios negreiros, a venda de escravos.

Falamos um pouco sobre o Aleijadinho e suas obras.” (Caderno de

Registro 2, Projeto “Viajando pelo Brasil, desvendando minhas origens,

Professora Mariana, 2014).

Este relato sucinto demonstra algumas das relações que os alunos estabeleceram

sobre o conteúdo aprendido nos anos anteriores com o atual e como, a partir dos livros e

textos lidos, a intervenção da professora através de suas práticas pedagógicas contribuíram

para a produção de inferências com base em um “universo Cultural- cognitivo”

(MARCUSCHI, 1985).

O texto escolhido para representar a Região sul foi “Um Castelo no Céu”, de

Silvana Salerno. Sobre a leitura deste texto, aparece no registro da professora uma prática, a

qual não se tem registro em momentos de leitura anteriores a este. Segue:

“As crianças leram o texto em pequenos grupos, discutiram e depois

fizemos a socialização com a turma toda. Durante o trabalho, percebi que

os grupos se organizaram muito bem para fazer a leitura e as discussões.

Na socialização, os grupos fizeram o reconto do texto e colocaram suas

opiniões...” (Caderno de Registro 2, Projeto “Viajando pelo Brasil,

desvendando minhas origens, Professora Mariana, 2014).

Desta forma, é possível afirmar que esta última prática pedagógica de leitura,

descrita no registro da professora Mariana, é caracterizada por uma total autonomia dos

alunos na relação com o texto. A professora demonstra orgulho diante da confiança que os

alunos apresentam ao participarem de uma atividade de leitura proposta por ela. O projeto

foi finalizado com outras atividades elencadas no planejamento anual. Os registros feitos

pela educadora fornecem pistas sobre como é o seu trabalho e como as crianças vão se

apropriando dos textos literários conduzidos a partir de uma abordagem interdisciplinar dos

conteúdos de história, ciências e geografia.

Pode-se inferir que as práticas pedagógicas, apresentadas e discutidas,

demonstram a preocupação da educadora em atuar na zona de desenvolvimento proximal de

seus alunos, pois, pelas suas práticas, pode-se afirmar que o ensino ministrado por ela prevê

o que a crianças aprenderam – zona de desenvolvimento real, a etapa superada de

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aquisição de conhecimento e, o que ela tem possibilidade de apreender – zona de

desenvolvimento potencial. Sobre os processos de aprendizagem e desenvolvimento na

criança, Vigotsky (2012) considera que:

[...] a característica essencial da aprendizagem é que engendra a área de

desenvolvimento potencial, ou seja, que faz nascer, estimula e ativa na

criança um grupo de processos internos de desenvolvimento no âmbito das

inter- relações com outros, que, na continuação, são absorvidos pelo curso

interior de desenvolvimento e se convertem em aquisições internas da

criança. [...] Por isso, a aprendizagem é um momento intrinsicamente

necessário e universal para que se desenvolvam na criança essas

características humanas não –naturais, mas formadas historicamente.

(VIGOTSKY, 2012, p. 115).

Para Vigotsky (2012, p.13), é preciso “reexaminar todo processo das disciplinas

formais, do papel e da importância de cada matéria no posterior desenvolvimento

psicointelectual geral da criança”, Ao considerar essa afirmação, reitera-se a importância de

um trabalho pedagógico alicerçado na valorização dos conhecimentos prévios das crianças,

no seu caráter interdisciplinar e no compromisso da formação em um sujeito que produz

conhecimentos. A seguir, será exposta uma prática pedagógica desenvolvida pela

professora Mariana.

2.2. Sacola e Roda da Leitura

A Roda de leitura não é algo inovador enquanto prática pedagógica. É uma

atividade presente no cotidiano escolar, principalmente na educação infantil e no ensino

fundamental, sobretudo nos anos iniciais. Contudo, não se pode afirmar que existam

procedimentos, manuais que são seguidos por todas as escolas, como uma espécie de

protocolo de como proceder na Roda de Leitura.

Dessa forma, os professores que desenvolvem essa prática em sala de aula

fazem com diversos objetivos, considerando as especificidades de sua turma de alunos:

faixa etária; desenvolvimento cognitivo e afetivo; valores culturais, sociais e ideológicos.

A professora Mariana já desenvolve esta prática pedagógica há alguns anos.

Com o objetivo de desenvolver o prazer pelos textos literários envolvendo, inclusive

a família, agregou a sua sistematização a maleta da leitura, na sua sala do 1º ano, do ensino

fundamental, desde 2012.

São duas maletas que foram confeccionadas pela professora, cada uma delas

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contendo dez livros e um caderno de anotações. A cada semana, duas crianças levam a

maleta e registram da forma que preferir a leitura que julgaram mais interessante; a família

também registra como foram os momentos de leitura. Os registros são socializados com a

turma. Além desses registros escritos, os alunos socializam com os colegas na Roda de

Leitura, os livros que mais gostaram, podendo ser os que estavam na maleta ou os que

foram retirados da biblioteca, outra opção para obter livros de literatura.

Toda semana há um momento específico para a Roda da Leitura; os alunos

acomodam-se em círculo, da maneira mais confortável e a professora vai chamando cada

uma das crianças, seguindo a organização do círculo/roda, e faz perguntas sobre o livro que

a criança leu: Qual o autor(a) desse livro? Você já leu outra história parecida com essa?

Qual a parte que você mais gostou desse livro? Além das perguntas, a professora pede à

criança: “conta pra gente um pouquinho da história”.

Todas as crianças envolvem-se na atividade, ouvindo o colega relatar sobre a

história do livro lido e também participando na sua vez de fazer o relato. Essa prática

demonstra a importância de ler para as crianças, ou ler com as crianças. Com relação ao

fazer cotidiano da sala de aula, o que se pretende com a prática Roda da Leitura é o

incentivo à criação, à imaginação e ao prazer pelo texto literário, considerando os

conhecimentos vivenciados pelos alunos e os adquiridos no momento do contar e ouvir

histórias, com a mediação significativa da professora. Dessa forma, a visão de um ser uno,

em que o cognitivo e o afetivo se interpenetram, deve permear todo processo que envolve

ensino e aprendizagem.

Com relação à afetividade, Wallon e Vygotsky demonstram que as

manifestações emocionais ganham complexidade atuando no universo simbólico, ou seja,

assumem o caráter social da afetividade quando argumentam que a relação afetividade –

inteligência é fundamental para o processo de desenvolvimento humano. Sendo assim, as

interações ocorridas são marcadas pela afetividade, o pensamento tem origem na

motivação, que inclui inclinações, necessidades, interesses, impulsos, afeto e emoção.

Como complementa Leite (2006): “o acesso ao mundo simbólico se dá por meio das

manifestações afetivas que permeiam as mediações que se estabelecem entre o sujeito e o

outro” (p. 24).

O que se almeja com determinadas práticas é a constituição de um leitor

autônomo, que compreenda as diversas funções da leitura em nossa sociedade, e possa

utilizá-la para seu crescimento, enquanto indivíduo e sujeito histórico. No entanto, anterior

a essa visão política, o que se espera é que a criança, nos primeiros anos de escolarização,

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possa desfrutar do prazer, da fantasia, da imaginação que a leitura é capaz de produzir, e

que essa educação dos sentidos seja incentivada e desenvolvida pela escola, em outros

espaços de sociabilidade, ressignificando as práticas de leitura – literária, capazes de

formar seres humanos mais éticos e conscientes de suas ações.

2.3. FLISELLO – Festival Literário do Tosello.

O Festival Literário do Tosello é um evento implementado na escola, em 2013,

com o objetivo de propiciar aos alunos um encontro com a literatura, a arte, a história, as

memórias que envolvem nosso cotidiano. O Festival ocorre durante dois dias consecutivos,

no mês de outubro, em comemoração ao dia das crianças. No primeiro, dia ocorrem as

oficinas em que a criança tem a oportunidade de ler, criar, imaginar, conhecer, aprender e

interagir com as obras, os colegas, os artistas, em atividades lúdicas. No segundo, os alunos

apreciam uma peça de teatro, uma apresentação musical. É um evento que reúne toda a

escola em momentos de prazer e encantamento, propiciados pela leitura e outras expressões

artísticas.

Em 2013, a autora homenageada foi Ana Maria Machado, os alunos tiveram a

oportunidade de conhecer melhor a biografia dessa autora e sua produção literária, através

das oficinas em que todos da escola participaram. No ano seguinte, em 2014, foi a vez de

Vinícius de Moraes ser homenageado e os alunos apropriarem –se de suas produções para

as crianças. Em 2015, tiveram o prazer de entrar em contato com o universo das obras de

Eva Furnari, autora já conhecida das crianças através do trabalho desenvolvido em sala de

aula pelas professoras. O FLISELLO é uma oportunidade única de acesso a um evento de

literatura, que as crianças da escola não têm contato, pois tradicionalmente a data em

comemoração ao dia das crianças sempre foi nesta escola e em muitas outras, como um dia

de entretenimento, regado a brincadeiras e lances diferentes.

Neste capítulo, procurou-se expor de forma sucinta o trabalho desenvolvido por

uma professora comprometida com a educação de qualidade e, com novas estratégias de se

ensinar o ler e o escrever nos primeiros anos do ensino fundamental. Seu trabalho foi

apropriado pela escola, transformando-se em um projeto coletivo de educação. No próximo

capítulo, será discorrido o percurso metodológico percorrido para o desenvolvimento desta

pesquisa.

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CAPÍTULO 3

3. PERCURSO METODOLÓGICO

O objetivo dos investigadores qualitativos é o de melhor compreender o

comportamento e experiência humanos. Tentam compreender o processo

mediante o qual as pessoas constroem significados e descrever em que

consistem estes mesmos significados. Recorrem à observação empírica

por considerarem que é em função de instâncias concretas do

comportamento humano que se pode reflectir com maior clareza e

profundidade sobre a condição humana. (BOGDAN e BIKLEN,1994,

p.70).

3.1. Base Teórica

Para responder as questões da pesquisa e os objetivos relacionados à mesma,

buscou-se lançar luz nos processos de compreensão leitora de crianças matriculadas no 3º

ano do ciclo I - Ensino Fundamental I as quais participaram, durante os 3 primeiros anos de

escolarização, deste ciclo de Alfabetização. Além disso, foram evidenciadas as práticas

pedagógicas de leitura desenvolvidas pela educadora, que permaneceu durante esse ciclo de

formação atuando junto aos alunos. Desta forma, espera-se identificar como essas práticas

refletem nas inferências produzidas por crianças em situações de leitura.

O objeto de estudo desta pesquisa envolve a compreensão leitora de crianças em

fase de alfabetização/letramento, as quais tiveram a oportunidade de participar de projetos

interdisciplinares desenvolvidos nas disciplinas de ciências, história e geografia, entre

outras práticas de leitura literária, com ênfase na formação do sujeito leitor.

Para esta investigação optou-se pela abordagem qualitativa, pelo fato desta

metodologia valorizar a produção de dados de forma descritiva, sobre pessoas, lugares em

diversos contextos. Neste sentido, “as questões a investigar não se estabelecem mediante a

operacionalização de variáveis, sendo, outrossim, formuladas com o objetivo de investigar

os fenômenos em toda a sua complexidade e em contexto natural” (BOGDAN e

BIKLEN,1994, p.16).

Com relação ao contexto deste estudo, foi definido o espaço escolar, lugar onde

se estabelecem as diversas relações, não somente de ensino-aprendizagem, mas de

interações sociais diversas. A opção pela instituição escolar pode ser significativa para o

pesquisador, na medida em que existia a possibilidade de participar como observador das

vivências do cotidiano escolar. No entanto, cabe-lhe ter clareza do seu lugar neste contexto,

para que seja garantida a naturalidade das ações e atitudes dos sujeitos pesquisados, diante

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da sua presença. Segundo Bogdan e Biklen (1994):

Como os investigadores qualitativos estão interessados no modo como as

pessoas normalmente se comportam e pensam em seus ambientes naturais,

tentam agir de modo a que as atividades que ocorrem na sua presença não

difiram significativamente daquilo que se passa na sua ausência.

BOGDAN e BIKLEN, 1994, p. 68).

A instituição escolar onde a pesquisa foi realizada é a mesma em que a

pesquisadora ocupa o cargo de orientadora pedagógica; sendo assim, a relação que se

estabelece entre a pesquisadora e os sujeitos pesquisados no decorrer da investigação, pode

se tornar complexa e confusa, pois ambos os papéis ocupados pela mesma pessoa, podem

gerar dificuldades de compreensão pelos sujeitos pesquisados e, também, contribuir para

que a pesquisadora, em algumas situações, possa ter ações incoerentes com seu papel

desempenhado em uma ou outra função. Sobre esses aspectos, Bogdan e Biklen (1994),

asseveram que:

Conduzir uma investigação com pessoas que conhece pode ser confuso e

embaraçoso. O treino de um investigador, mais do que a aprendizagem de

Cv 7Yompetências e procedimentos específicos, consiste na análise de [

impressões acerca de si próprio e da sua relação com os outros. Implica

que se sinta no papel de “investigador “. Se os objetos do seu estudo são

pessoas que conhece, a transferência da sua personalidade própria para a

de investigador faz-se de forma ambígua. (BOGDAN e BIKLEN, 1994 p.

87).

Como orientadora pedagógica, participo das atividades profissionais

concernentes ao cargo, tanto as que tangem às questões pedagógicas do ciclo I e II, como as

relacionadas às exigências burocráticas. Exceto às segundas-feiras, o restante da semana,

nos períodos da manhã e tarde, a orientadora está presente na escola, resolvendo várias

questões, frutos das demandas do cargo. As crianças não entendem muito bem o que é ser

orientadora pedagógica, havendo sempre a necessidade de explicar qual a função deste

cargo na escola. É interessante como são curiosos, sempre questionando o que uma

orientadora faz na escola. Percebe-se que as crianças têm a necessidade de compreender a

função de cada um dos funcionários na unidade educacional.

Procuro estar sempre presente nos espaços ocupados pelos professores e alunos,

nos horários de aulas e em outros momentos do dia, tais como: refeitório, quadra de

esportes, biblioteca e sala de informática. Sempre vou às salas de aula para conversar com

professores e alunos sobre algum assunto e, muitas vezes, por solicitação de alguns

professores, conversando com alunos que necessitam de orientação.

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No início da pesquisa, como ainda não tinha definido se faria a pesquisa com

todos os alunos da sala ou se definiria um grupo de alunos específico, passei a estar

presente semanalmente na sala de aula, sempre nas atividades de leitura que a professora

havia planejado: rodas da leitura, leituras de textos literários do projeto interdisciplinar,

entre outras atividades que envolvessem a participação das crianças em situações de leitura.

Desta forma, com a turma pesquisada, houve um processo de aproximação mais

efetivo, pelo fato de a pesquisadora estar em contato direto com as crianças, ou seja, por

conta da presença praticamente diária na sala de aula dessa turma. Isso gerou um

estreitamento nas relações entre ambos, contribuindo para que, nos momentos de pesquisa

de campo, os sujeitos pesquisados agissem de forma espontânea. Embora os dados tenham

sido coletados em 2014, essa turma foi acompanhada pela pesquisadora em vários

momentos, desde de 2012. Com a filmadora em mãos, passou-se a filmar quase que

semanalmente as rodas de leitura ocorridas na sala da professora Mariana; em um segundo

momento, foram filmadas as aulas de leitura, mais sistematizadas, cujo objetivo era

apreender as práticas pedagógicas desenvolvidas pela professora e os debates promovidos a

partir dessas leituras.

A partir do momento que os objetivos de pesquisas foram melhor delineados,

foi possível elaborar um “plano de investigação” (BOGDAN e BIKLEN,1994, p.83) e

definir quais dados deveriam ser produzidos na pesquisa; isso ocorreu de forma mais

sistemática em 2014

Após várias observações das aulas da professora, dos debates promovidos a

partir da leitura de textos literários pelas crianças, dos recontos feitos pelas mesmas nas

rodas da leitura, a questão principal da pesquisa ficou assim definida: Quais as inferências

produzidas pelas crianças do 3º ano do ensino fundamental I a partir da leitura de textos

narrativos (lendas brasileiras)? Um segunda questão surgiu a partir da principal, ou seja:

Quais as relações entre as inferências produzidas pelos alunos e os suas experiências

vividas, considerando seu universo cultural cognitivo (MARCUSCHI, 1985) e as práticas

pedagógicas de leitura vivenciados na escola?

Para responder a principal questão, houve a necessidade de especificar como os

dados seriam produzidos, ou seja, em que contexto imediato, e quais textos seriam

utilizados para a produção de inferências; além disso, quantas e quais crianças seriam

selecionadas para esta pesquisa de campo. Ao que tudo indicava, a investigação, além da

abordagem qualitativa, definiu-se como um estudo de caso centrado no procedimento de

observação, em um local específico dentro da instituição: um grupo específico de

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pessoas a serem observadas em relação a uma atividade específica, no caso leitura de

textos escritos e produção de comentários orais- videogravados e posteriormente transcritos.

A opção pela instituição educacional, a qual a pesquisadora trabalha, pode ser

um entrave para o desenvolvimento da investigação, como já foi exposto e, ao selecionar

uma espaço e um grupo específico dentro da instituição para uma investigação, significa

também envolver-se em uma situação de risco, como alertam Bogdan e Biklen (1994):

A escolha de um determinado foco, seja ele um local na escola, um grupo

particular, ou qualquer outro aspecto, é sempre um acto artificial, uma vez

que implica a fragmentação do todo onde ele está integrado. O

investigador quantitativo tenta ter em consideração a relação desta parte

com o todo, mas, pela necessidade de controlar a investigação, delimita a

matéria de estudo. Apesar de o investigador tentar escolher uma peça que

constitua, por si só, uma unidade, esta separação conduz sempre a alguma

distorção. (A parte escolhida é considerada pelos próprios participantes

como distinta e, pelo observador, como tendo identidade própria.

(BOGDAN e BIKLEN, 1994, p. 91).

Essas questões permearam todo o período de coleta de dados, a professora da

sala explicou para as crianças sobre a pesquisa e que seria feita uma seleção de alunos. Em

conversa com a professora, procuramos escolher os alunos que se situassem em níveis de

desenvolvimento diferentes, mas que demonstrassem uma relação mais próxima com os

textos escritos. Isso não foi difícil, pois todos os alunos da sala já sabiam ler e teciam

comentários em vários espaços e nas várias atividades promovidas pela professora. A seguir

serão apresentadas as principais informações sobre a escola, espaço onde foi desenvolvida a

pesquisa e a seleção dos alunos.

3.2. Descrição do Bairro e da Escola

A pesquisa de campo ocorreu em uma Escola Municipal de Campinas,

denominada EMEF – Escola Municipal de Ensino Fundamental unidade educacional

localizada na Vila Aeroporto, Região do Ouro Verde, pertencente à Região Sudoeste da

cidade de Campinas. O bairro onde está localizada fica muito próximo da Rodovia dos

Bandeirantes, sendo sua população composta sobretudo de migrantes oriundos de diversas

regiões do país, os quais se fixaram, na sua grande maioria, em Campinas, pelo seu

potencial de empregabilidade. A cidade transformou-se, na segunda metade do século XX,

em um polo de desenvolvimento industrial e tecnológico de referência do Estado de São

Paulo. Sobre a migração e trabalho pode-se destacar que:

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Desde a década de 1990, assiste-se na região de Campinas a uma

intensificação dos fluxos populacionais intra-regionais, reforçando a

percepção de que vivemos uma era de proliferação dos

deslocamentos, já que a instabilidade do emprego e as oscilações na

renda põem em marcha permanente toda uma população em busca de

trabalho e moradia possíveis. (PESSOA, 2004. p.185).

Estas questões de caráter social, econômico e cultural têm refletido na dinâmica

das matrículas e da frequência escolar, pois o processo de itinerância da população escolar é

uma realidade vivenciada pela instituição de ensino: muitos alunos matriculados no início

do ano não permanecem na escola, havendo um grande número de pedidos de transferência

de matrículas para escolas de outras regiões do município, para outras cidades do estado e

para outros estados; em contrapartida, a demanda por matrículas na escola extrapola as

vagas oferecidas.

Acredita-se que essa mobilidade urbana seja decorrente das dificuldades

causadas pela instabilidade de trabalho e também por conta de configurações familiares.

Além disso, é recorrente o retorno das famílias que vieram de regiões distantes e decidem

retornar para o seu lugar de origem. Os deslocamentos contínuos das famílias dos

estudantes acaba por comprometer sua vida escolar, já que os mesmos não criam um

vínculo com a professora da sala e o processo de aprendizagem fica fragmentado.

A seguir, serão descritas algumas das principais características da região onde a

escola está localizada, a partir de dados obtidos do censo demográfico de 2010.

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Figura 1: Indicadores de população, alfabetização e renda da área atendida pela

escola.

Considerando os dados do censo demográfico de 2010 (Fonte IBGE), foi

possível fazer algumas análises a partir dos números. Sobre o primeiro mapa - população

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total - há cerca de 17.730 habitantes, nos setores representados no mapa - Vila Aeroporto e

adjacências, ou seja, o bairro no qual está localizada a EMEF e seu entorno tem uma alta

concentração de habitantes.

No segundo mapa - sobre o rendimento mensal por domicílio, pode-se concluir

que cerca de 16,9% dos domicílios dessa região (Vila Aeroporto e adjacências) possuem

renda média mensal de até 1/2 salário mínimo/pessoa. Esse é o valor médio mas a variação

de cores no mapa demonstra que existem diferenças dentro do próprio bairro. Os setores do

bairro e imediações, com as duas cores mais escuras, correspondem às comunidades mais

carentes (ocupações, favelas, etc) onde as pessoas possuem renda média mensal mais baixa.

Os dados acima podem ser contrastados com a média do mapa 3 que indica que

cerca de 2,20% apenas dos domicílios da Vila Aeroporto e adjacências possuem renda

média mensal de 10 ou mais salários mínimos por pessoa. Onde isso é demonstrado no

mapa (cor mais escura) existem condomínios fechados cuja renda média/mês é mais

elevada que a maior parte do bairro em que eles estão inseridos.

Em síntese, a EMEF está inserida em uma região populosa da cidade (mapa 1),

onde cerca de 16,9% dos domicílios/residências possuem renda média mensal de igual ou

menos de 1/2 salário mínimo por pessoa; apenas 2,20% dos domicílios possuem renda

média mensal igual ou acima de 10 salários mínimos por pessoa. Por ser uma escola situada

na periferia da cidade, a maior parte dos alunos matriculados são oriundos das

ocupações/comunidades existentes no bairro e imediações, cuja renda média mensal da

residência é igual ou inferior a 1/2 salário por pessoa, com um grau de escolaridade da

população também baixo (ver mapa de escolaridade).

Segue uma imagem de satélite, para uma maior visibilidade, sobre o bairro e

adjacências onde está inserida a EMEF.

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Figura 2: Imagem de satélite

A escola está organizada em três períodos: manhã, tarde e noite. No período da

manhã, funciona o Ciclo I: 1º A e B; 2º A e B; 3ºA e B - totalizando 6 salas deste segmento

de ensino; e o Ciclo II: 4º A e B; 5ºA e B – 4 salas. No período da tarde, a unidade escolar

atende alunos do Ciclo III (6ºs e 7ºs anos) e o Ciclo IV (8ºs e 9ºs anos). A EJA (1º, 2º, 3º e

4º termos) funciona à noite. A equipe gestora da escola é formada por um diretor, dois vice-

diretores e dois orientadores pedagógicos.

Esta unidade escolar está localizada em uma área de risco, pois foi construída

sobre um córrego, desde a sua fundação, em 1982. É um prédio que já passou por diversas

reformas, no entanto, alguns problemas infraestruturais são recorrentes e permanecem sem

solução. Já ocorreram várias solicitações ao poder público para a mudança de prédio. Em

2011, houve um alagamento decorrente de uma forte chuva e o prédio ficou interditado por

uma semana, voltando a funcionar depois de algumas reparações.

Apesar da precariedade do edifício e do descaso do poder público em resolver

tal situação, a equipe de profissionais desta escola municipal tem buscado garantir uma

educação de qualidade para as crianças, jovens e adultos matriculados, através de uma série

de ações e projetos interdisciplinares, alguns deles já foram abordados no capítulo 2

pesquisa, pois estão diretamente vinculados às práticas desenvolvidas pela professora

Mariana, educadora que acompanhou os alunos durantes os 3 anos do ciclo I.

Além disso, a EMEF, há três anos, oferece aos seus professores Grupos de

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Formação (GF), certificados pela prefeitura da cidade. No ano de 2014, a professora

Mariana ministrou um GF sobre “Projetos Pedagógicos na Escola Ciclada”, com a

participação de professores de diversas áreas e segmentos. No ano seguinte, foram dois GFs

ministrados pela mesma profissional: “Projetos Pedagógicos na Escola Ciclada – módulo II

e “Reflexões sobre a Alfabetização”. Estes cursos têm contribuído para a formação de

professores em exercício e também para mudanças de práticas pedagógicas.

Em 2013, funcionava nesta unidade escolar apenas um 2º ano do Ciclo I, sala

composta pelos alunos pesquisados. Naquele ano, foi aplicada a Provinha Brasil 7- na

avaliação sobre leitura, a sala ficou no nível 5:

Neste nível, os alunos demonstram ter alcançado o domínio do sistema de

escrita e a compreensão do princípio alfabético, apresentando um

excelente desempenho, tendo em vista as habilidades que definem o aluno

como alfabetizado e considerando as que são desejáveis para o fim do

segundo ano de escolarização. Assim, os alunos que atingiram este nível já

avançaram expressivamente no processo de alfabetização e letramento

inicial. Para além das habilidades dos outros quatro níveis, demonstram,

por exemplo: • compreender textos de diferentes gêneros e de

complexidade diversa, identificando o assunto principal e localizando

informações não evidentes, além de fazerem inferências. (INEP,

PROVINHA BRASIL, 2013).

O resultado obtido pelos alunos do 2º ano da EMEF, em 2013, na Provinha

Brasil, foi o melhor da cidade de Campinas em comparação com outras escolas municipais.

Este resultado teve uma grande repercussão no bairro, pois a mídia veiculou o nome da

escola e serviu como propaganda política do atual governo. Para a equipe gestora e para a

professora, o resultado positivo foi consequência da adoção de práticas pedagógicas que

priorizam o incentivo à leitura literária, ao desenvolvimento dos projetos interdisciplinares

e à forma de mediação assumida pela professora, a qual entende que os conteúdos

apropriados pelos alunos devam ser significativos para a sua formação escolar e humana.

7 http://provinhabrasil.inep.gov.br/

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TABELA 1: Resultados da Provinha Brasil – Leitura (teste 2) – Nível de Alfabetização

TABELA 2: Resultados da Provinha Brasil – Leitura (teste 2) – Desenvolvimento das

Habilidades.

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TABELA 3: Resultados da Provinha Brasil – Leitura (teste 2) – Rendimento nas

Questões Objetivas.

Os dados apresentados acima demonstram que 93% da turma de alunos do 2º

ano A, do ciclo II - ensino fundamental I, da EMEF pesquisada, demonstram ter alcançado o

domínio do sistema de escrita e a compreensão do princípio alfabético. Deste número, 70%

das crianças sabem inferir informação sobre o que leu (H10). Portanto, os dos dados obtidos

nesta avaliação externa instigaram a investigação sobre a compreensão leitora de algumas

das crianças selecionadas para a pesquisa, contribuindo para a necessidade de olhar para o

processo de formação destes leitores, através das produções de inferências e das relações

dialógicas entre autor, texto e leitor – novos sentidos são construídos a partir dessa

interação.

3.3. Descrição dos Sujeitos e procedimentos de coleta de dados

Foram selecionadas 3 crianças, sendo dois meninos e uma meninas, garantindo

que as crianças tivessem níveis diferenciados de relação com textos literários. Desta forma,

foram realizadas sessões de videofilmagens das 3 crianças, procedimento utilizado para

obter dados sobre quais tipos de inferências são produzidas pelas crianças em situações de

leitura, considerando que ler é produzir sentidos a partir de processos inferenciais

(MARCUSCHI, 2008).

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Os participantes desta pesquisa são alunos que estavam matriculados em 2014, no 3º

Ano A do Ciclo I, na EMEF. Os 3 alunos foram matriculados no 1º Ano da referida

escola e permaneceram juntos durante os 3 anos, que é a duração do Ciclo I nas Escolas de

Ensino Fundamental da Rede Municipal de Campinas8; foram alunos da professora

pesquisada durante todo este período de alfabetização e letramento, identificados pelos

nomes fictícios: Pedro, Elisa e Luís.

Os sujeitos selecionados também participaram de forma efetiva dos projetos

desenvolvidos pela professora: “A sacola da Leitura”, Projetos Interdisciplinares “Espelho,

Espelho meu, diga quem sou eu ..., “Na Trilha da Minha Vida” e “Viajando pelo Brasil,

desvendando minhas origens”. Além dos projetos citados acima, os alunos participaram, em

sala de aula, dos momentos de leitura e discussão de diversos textos, sobretudo dos

narrativos.

Buscou-se valorizar o desenvolvimento cognitivo e as experiências escolares e

extraescolares de cada criança participante da pesquisa, pois acredita-se que a diversidade

contribuiu para a riqueza dos dados e da pesquisa.

As vídeofilmagens ocorreram no segundo semestre de 2014. Foram escolhidos

5 textos, dos quais utilizaram-se os dados de 3: “A Dança do Arco-íris”; “A Origem do

Oaipoque” e “Romãozinho” (O primeiro texto foi selecionado de uma revista de grande

circulação nacional; desenvolvida para professores, contém dicas de atividades para

elaboração de aulas com diversas temáticas. Os outros textos foram retirados do livro

“Viagem pelo Brasil em 52 histórias” - Silvana Salerno (2009)9, volume que reúne lendas e

contos populares tradicionais de nosso país. Esse livro faz parte da bibliografia utilizada

pela professora da sala nos projetos interdisciplinares.

Não foi definido previamente um lugar específico onde ocorreriam as sessões

de leitura; dependendo da disponibilidade dos espaços nos dias marcados pela

pesquisadora, o lugares mais utilizados foram: a sala da orientação pedagógica, sala de

aulas, sala de informática e sala das professoras de educação especial.

Optou-se por realizar duas sessões de leitura de cada texto. Em cada uma delas,

os alunos puderam recontar a história lida e tecer comentários, de forma espontânea e

também direcionada, a partir de algumas questões levantadas pela pesquisadora em

decorrência de conversas estabelecidas com os alunos durante o desenvolvimento de seus

8 Diretrizes Curriculares da Educação Básica para o Ensino Fundamental – Anos Iniciais: Um processo Contínuo

de Reflexão e Ação: Prefeitura Municipal de Campinas, Secretaria Municipal de Educação, Departamento

Pedagógico / organização e coordenação: Heliton Leite de Godoy. – Campinas, SP, 2012 9 http://www.companhiadasletras.com.br/detalhe.php?codigo=403

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106

comentários sobre os textos lidos. Tal procedimento será melhor explicitado no capítulo

quatro destinado à análise e categorização das inferências produzidas pelos alunos.

Neste sentido, a opção por duas sessões de leitura para cada texto deve-se ao

pressuposto de que há uma ampliação das inferências sobre os textos lidos, já que nas

primeiras leituras, aparece mais a prática em recontar a história e fazer comentários. Além

disso, entre a primeira leitura e a segunda, teve um tempo decorrido em torno de 1 mês a

algumas semanas. Isso contribuiu para que os alunos tivessem novas experiências que,

direta ou indiretamente, impactaram sua segunda leitura e, consequentemente, a produção

de novas inferências.

Portanto, na segunda leitura, houve uma preocupação (da maioria dos alunos)

em interagir com os textos, através de dúvidas (perguntas direcionadas à pesquisadora) e

problematizações de algumas passagens de cada texto lido.

A sigla PL – primeira leitura, refere-se ao material utilizado na primeira leitura

efetuada pela criança em cada texto lido e sobre as inferências orais produzidas pelas

mesmas; e a SL, refere-se à segunda leitura desenvolvida e, consequentemente, às

elaborações de inferências obtidas nesse processo.

Os textos selecionados são do gênero lenda e narrativa popular, com temáticas

do universo da cultura brasileira. Privilegiaram-se narrativas das cinco regiões brasileiras,

tendo- se como critério de escolha a proximidade da temática desenvolvida pela professora

da sala no Projeto: “Viajando pelo Brasil, desvendando minhas origens”10,

TABELA 4: Cronograma de Sessões de leitura – Texto 1

TEXTO: “A DANÇA DO ARCO-ÍRIS”

1ª Leitura

Pedro - Junho de 2014

Elisa - Julho de 2014

Luís – Julho de 2014

10 Justificativa: dando continuidade ao projeto: “Na trilha da minha vida”, realizado no ano letivo de 2013, o

presente projeto tem a finalidade de convidar as crianças a comemorarem e celebrarem o tempo. O tempo

passado, o tempo presente, para desvendar a própria história.

O projeto justifica-se por trabalhar as heranças culturais trazidas das diferentes regiões do Brasil pelos pais e avós dos alunos, estudando os diferentes espaços, tipos de moradias, meios de transportes, vegetação,

cuidados com o meio ambiente, alimentação, saúde, características físicas e culturais das pessoas de cada

região. (Planejamento desenvolvido pela professora pesquisada).

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2ª Leitura

Pedro- Julho de 2014

Elisa – Julho de 2014

Luís – Julho de 2014

TABELA 5: Cronograma de Sessões de leitura – Texto 2.

TEXTO: “A ORIGEM DO OIAPOQUE”

1ª Leitura

Pedro - 13 de Agosto de 2014

Elisa - 14 de Agosto de 2014

Luís - 15 de Agosto de 2014

2ª Leitura

Pedro- 02 de Setembro de 2014

Elisa - 24 de Setembro de 2014

Luís - 25 de Setembro de 2014

TABELA 6: Cronograma de Sessões de leitura – Texto 3

TEXTO: “Romãozinho”

1ª Leitura

Pedro - 05 de Novembro de 2014

Elisa - 18 de Novembro de 2014

Luís – 05 de Novembro de 2014

2ª Leitura

Pedro - 18 de Novembro de 2014

Elisa - 27 de Novembro de 2014

Luís - 18 de Novembro de 2014

Após o período de coleta de dados, chegou o momento de voltar o olhar para a

análise dos dados, iniciando-se com as transcrições e, na sequência, debruçando-se

minuciosamente sobre o material produzido. Abandonar o campo pode ser uma tarefa

difícil, acompanhada de um sentimento de rompimento com as relações estabelecidas no

período de coleta. Como bem sinalizam Bogdan e Biklen (1994), “esse sentimento continua

de tal modo que, ao partir, sente que está a perder algo importante - dados novos que o

conduzirão as novas descobertas”. No final da coleta de dados, a dificuldade em abandoná-

lo se tornou tão evidente que sair do ambiente pesquisado, romper com as crianças e olhar

para o material produzido foi uma tarefa hercúlea.

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108

Os dados foram coletados através de 18 sessões de leitura videofilmadas e,

posteriormente, transcritas, com objetivo de obter dados sobre as inferências de base

textual, contextual e sem base textual e contextual (MARCUSCHI, 2008), produzidas pelos

3 alunos do 3º ano do ensino fundamental, a partir da leitura de textos narrativos. Desta

forma, foi possível levantar indícios sobre o processo de compreensão leitora das crianças

pesquisadas e associar à práticas de escolarização da leitura desenvolvidas pela professora

que acompanhou os alunos durante todos o ciclo I.

Defende-se que uma boa compreensão leitora é resultado das inferências

produzidas pelos sujeitos pesquisados e que um trabalho pedagógico comprometido, que

tenha como ênfase práticas de leitura de textos literários, entre outras atividades de leitura,

são processos que contribuem para a formação do leitor proficiente.

Portanto, embora o trabalho pedagógico não seja o foco desta pesquisa, o

mesmo contribuiu para analisar e cotejar as produções de inferências elaboradas pelos

sujeitos pesquisados, em sessões de leitura – coleta de dados - com as práticas pedagógicas

de leitura, a quais visam o acesso e uso de textos narrativos em diversos projetos e em

momentos de leitura em sala de aula, discutindo como a interface desses processos

comtemplam a formação de leitores engajados e proficientes. Assim, os sujeitos são

criadores de sentidos no decorrer do processo de leitura, produzindo diversos níveis de

inferências que definirão a construção da compreensão textual.

Defende-se aqui que o trabalho pedagógico desenvolvido pela professora,

comprometida com a qualidade do ensino da leitura, foi imprescindível para que os sujeitos

em processos de alfabetização e letramento se constituíssem em leitores autônomos,

engajados e proficientes.

Foram utilizados, nesta pesquisa, os cadernos de registros sobre o

desenvolvimento dos projetos interdisciplinares, implementados pela professora, além do

planejamento de cada ano trabalhado. Tais materiais constituem-se fontes documentais que

contribuíram para a compreensão do desenvolvimento de escolarização, sobretudo, literária

dos alunos pesquisados. Além disso, optou-se por apresentar algumas características

pessoais e profissionais da professora Mariana, com intuito de relacionar sua concepção de

educação à sua prática pedagógica.

3.4. A professora: concepção de ensino- aprendizagem.

A professora pesquisada - Mariana - trabalha no ensino fundamental desde

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2003. Antes desse período, teve experiência como monitora na educação infantil. Deixar a

educação infantil e assumir uma sala de ensino fundamental I gerou para essa profissional

uma série de questionamentos, entre eles:

Assumi uma segunda série, sendo que foi um choque sair da Educação

Infantil e ir para o Fundamental, pois na Infantil a fantasia e a realidade

caminham juntas, dando ênfase ao lúdico e entrei em uma sala de aula

com alunos sentados um atrás do outro, com um espaço muito menor, em

que a preocupação é o conteúdo. Nesse momento pensei como é para a

criança iniciar o Ensino Fundamental, pois a mudança é muito brusca,

enquanto aluna não tinha pensado nessa situação. Mas hoje, penso na

criança que sai de um ambiente muito espaçoso, onde circulam, brincam,

convivem em pequenos grupos, além do coletivo e entra em outro com

espaço totalmente reduzido, não tem nada adaptado à sua altura.

(MARIANA, 2005, p. 25).

Ao relatar sobre seu percurso profissional no “Memorial de formação: do ver ao

olhar, reflexões sobre minha formação”, produzido como exigência para a conclusão do

curso de pedagogia Programa Especial de Formação de Professores em Exercício,

promovido pela Unicamp, a professora já demonstra um olhar de reflexão sobre a

organização do ensino fundamental e questiona a mudança abrupta que ocorre no

atendimento da criança na educação fundamental. Esse olhar sensível da professora já é um

indício que esta profissional tem uma preocupação com o desenvolvimento da criança, com

seu bem-estar e com seu desenvolvimento integral.

Em uma outra passagem do mesmo memorial (MARIANA, 2005), a professora

questiona sobre os conteúdos ministrados na educação fundamental e sinaliza sobre a

importância da interdisciplinaridade como a melhor forma de se trabalharem os conteúdos

escolares. Segundo seu relato:

Vivenciando uma realidade de ensino em que o conhecimento acontecia

de forma compartimentalizada, ou seja, como se na cabeça tivéssemos

gavetas que se abrissem uma para cada disciplina, ficando difícil dominar

a totalidade do conhecimento global sobre a realidade, a

interdisciplinaridade surge como um caminho possível para amenizar

essa situação. Mas não significa que teremos um currículo não-

disciplinar e sim uma integração, articulação entre disciplinas.

(MARIANA, 2005, p.26).

Desta forma, esta profissional defende a adoção dos temas transversais como

opção às práticas pedagógicas, as quais visam à formação dos educandos baseadas somente

em conteúdos científicos, transmitidos de forma descontextualizada. Sobre essa temática, a

professora relata:

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Nesse sentido, ao discutirmos os Temas Transversais como eixos,

refletimos um trabalho na escola além dos conhecimentos científicos e

culturais tradicionais, para incorporar também a cultura popular

aproximando os saberes da realidade dos alunos aos conhecimentos

científicos e de outras realidades culturais. (MARIANA, 2005, P.26).

O relato da professora Mariana já demonstrava, há 10 anos atrás, uma

preocupação em buscar alternativas para desenvolver uma educação com vistas à

valorização do conhecimento prévio das crianças, as experiências vivenciadas em outros

espaços de sociabilidade, a preocupação com a organização do ensino fundamental, visando

à educação do corpo, ao controle disciplinar representado pelas salas de aulas com suas

fileiras e regidas pelo controle do tempo e espaço.

Em depoimento produzido pela professora, durante esta pesquisa, sobre suas

práticas pedagógicas e, sobretudo, sobre as atividades relacionadas à alfabetização e ao

projeto interdisciplinar desenvolvido pelos ciclos I e II, ela relata que:

Junto ao trabalho com projetos acontecia o processo de alfabetização, os

textos, os livros de literatura infantil que conduziam o projeto eram

também instrumentos de alfabetização. Tudo foi acontecendo ao mesmo

tempo em um processo dinâmico, os alunos se alfabetizavam e aprendiam

os conteúdos das demais disciplinas. (Entrevista concedida à

pesquisadora, 2015).

No trecho citado acima, fica clara a importância dos livros de literatura infantil

utilizados no projeto e a contribuição deste gênero no processo de alfabetização das

crianças. Em muitas situações, os conteúdos de ciências, história e geografia e conceitos de

diversas áreas de conhecimento são abordados a partir do universo da literatura. Durante a

entrevista concedida pela professora, ela relata a importância da prática da sacola da leitura,

iniciada com os alunos desde 2012 e que, neste ano, em 2015, foi ampliada para todo Ciclo

I e II.

Sobre a prática da sacola da leitura, a professora Mariana, analisa:

Outro trabalho que realizamos é a sacola da leitura, toda semana as

crianças levam livros e gibis para casa, para que possam junto com a

família fazer a leitura, depois na sala temos a roda da leitura, as crianças

contam sobre os livros que leram e relacionam com outros que leram

anteriormente. Nesse momento há uma troca entre as crianças, pois uma

questiona a outra, fazem inferências, auxiliam na lembrança do nome de

personagens, de momentos marcantes dos livros, contam sobre os autores

e criam um suspense com o intuito de deixar o colega com vontade de ler.

(Entrevista concedida à pesquisadora, 2015)

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Sobre a prática da sacola da leitura, a professora afirma que é uma atividade que

tem contribuído de forma significativa para a formação dos sujeitos leitores. Ela descreve a

média de livros lidos pelas crianças, durante os 3 anos que acompanhou a mesma turma, do

primeiro ao terceiro anos (2012, 2013 e 2014). Segundo a professora Mariana:

Essa atividade vem contribuindo muito com a alfabetização e com a

formação de leitores. As crianças leem em média 80 livros no primeiro

ano, 100 livros no segundo ano e 100 no terceiro. Durante as aulas

trabalhamos com vários gêneros textuais, sempre depois da leitura as

crianças tecem comentários, acontece uma discussão desses textos,

relacionando com acontecimentos vividos, leituras feitas anteriormente e

estudos que estão fazendo no projeto. (Entrevista concedida à

pesquisadora, 2015).

Os relatos da professora contribuíram para dar visibilidade às práticas

docentes desenvolvidas por ela, o que pensa sobre a educação, a sua concepção de ensino e

aprendizagem, a forma como compreende a escolarização das crianças, além da formação

do sujeito leitor. Sobre esse tipo de material, Bogdan e Biklen (1994) relatam:

A qualidade deste tipo de material varia. Alguns dos materiais fornecem

apenas detalhes factuais tais como datas em que ocorreram reuniões.

Outros servem como fontes de férteis descrições de como as pessoas que

produziram os materiais pensam acerca do seu mundo. (BOGDAN E

BIKLEN, 1994, p.176).

Dar visibilidade aos discursos contidos nos relatos pessoais e registros de

atividades profissionais contribuiu para a ampliação do olhar do pesquisador, lançando luz

sobre os processos investigados. Esses dados complementares “são provas detalhadas de

como as situações sociais são vistas pelos seus atores e quais os significados que vários

fatores têm para os participantes” (ANGEL apud BOGDAN e BIKLEN, 1994, p.177), que,

no caso, estejam ligados direta ou indiretamente à pesquisa.

3.5. Categorias de Análise

Após a coleta de dados, o material obtido nas sessões de leitura foi transcrito e

organizado em categorias, segundo o quadro geral de inferências, definido por Marcuschi

(2008, p.254,255). As principais categorias de análise e o quadro de operações - tipo de

operação inferencial, natureza da inferência e condições de realização - foram apresentados

no capítulo 1 e serão utilizados nas análises dos dados, no capítulo 4.

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112

CAPÍTULO 4

4. PRODUÇÕES E ANÁLISE DE INFERÊNCIAS

O leitor é produtor de jardins que miniaturizam e congregam o mundo. os

leitores são viajantes; circulam nas terras alheias, nômades caçando por

conta própria através dos campos que não escreveram, arrebatando os

bens do Egito para usufruí-los. (CERTEAU, 1990, p.269,270).

Neste capítulo, apresentam-se os textos selecionados para a pesquisa de campo.

O primeiro texto é: “A dança do arco-íris” – foi reproduzido na íntegra e enumerado em

cada linha para melhor cotejar as inferências produzidas pelo aluno com as passagens do

texto original. Em seguida, foram feitas pela pesquisadora possíveis análises sobre as

inferências produzidas pelos alunos. Esta disposição de apresentação do texto,

acompanhada de uma análise preliminar teve como referência a pesquisa de mestrado sobre

“O Papel do Processo Inferencial na Compreensão de Textos Escritos”. (MACHADO,

2005).

Os dados obtidos nas duas sessões de leitura deste texto foram organizados em

primeira e segunda leituras. Em cada uma das sessões foi feito o exercício de categorizar as

inferências produzidas pelos alunos pesquisados - Pedro, Elisa e Luís11 - considerando os

quadros produzidos por Marcuschi (2008), detalhados no capítulo 1, com ênfase nas

inferências de base textual, de base contextual e sem base textual e contextual

(MARCUSCHI, 2008, p.254).

Para a produção de dados desta pesquisa, foram selecionados pela pesquisadora

outros dois textos: “A Origem do Oiapoque” e “Romãozinho”, ambos trabalhados em sala

de aula pela professora Mariana, no 3ºano da turma de alunos, à qual pertencem as 3

crianças participantes deste estudo. Desta forma, foi possível observar, além das produções

de inferências, os sentidos construídos pelos alunos nas interações com os textos, assim

como os processos de compreensão leitora, ao estabelecer comparações entre os

comentários das leituras elaboradas pelas 3 crianças, da primeira à última leitura dos textos

narrativos, apropriados pelos mesmos em situações de leitura. Nos dados obtidos,

evidenciaram-se alguns indícios sobre a compreensão leitora dos sujeitos pesquisados e as

relações com os processos de escolarização, letramento literário e os conhecimentos

prévios adquiridos pelas crianças, em vários espaços de sociabilidade.

11 Nomes fictícios dos sujeitos pesquisados

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4.1. Texto 1 - “A Dança do Arco-Íris”

1 A DANÇA DO ARCO-IRIS

2 Há muito e muito tempo, vivia sobre uma planície de nuvens uma tribo muito feliz.

3 Como não havia solo para plantar, só um emaranhado de fios branquinhos e fofos como

4 algodão-doce, as pessoas se alimentavam da carne de aves abatidas com flechas, que faziam

5 amarrando em feixe uma porção dos fios que formavam o chão. De vez em quando, o chão dava

6 umas sacudidelas, a planície inteira corcoveava e diminuía de tamanho, como se alguém

7 abocanhasse parte dela.

8 Certa vez, tentando alvejar uma ave, um caçador errou a pontaria e a flecha se cravou no chão.

9 Ao arrancá-la, ele viu que se abrira uma fenda, através da qual pôde ver que lá embaixo havia

10 outro mundo.

11 Espantado, o caçador tampou o buraco e foi embora. Não contou sua descoberta a ninguém.

12 Na manhã seguinte, voltou ao local da passagem, trançou uma longa corda com os fios do chão

13 e desceu até o outro mundo. Foi parar no meio de uma aldeia onde uma linda índia lhe deu as

14 boas-vindas, tão surpresa em vê-lo descer do céu quanto ele de encontrar criatura tão bela e

15 amável. Conversaram longo tempo e o caçador soube que a região onde ele vivia era

16 conhecida por ela e seu povo como "o mundo das nuvens", formado pelas águas que

17 evaporavam dos rios, lagos e oceanos da terra. As águas caíam de volta como uma cortina

18 líquida, que eles chamavam de chuva. "Vai ver, é por isso que o chão lá de cima treme e

19 encolhe", ele pensou. Ao fim da tarde, o caçador despediu-se da moça, agarrou-se à corda e

20 subiu de volta para casa. Dali em diante, todos os dias ele escapava para encontrar-se com a

21 jovem.

22 Ela descreveu para ele os animais ferozes que havia lá embaixo. Ele disse a ela que lá no alto

23 as coisas materiais não tinham valor nenhum.

24 Um dia, a jovem deu ao caçador um cristal que havia achado perto de uma cachoeira. E pediu

25 para visitar o mundo dele. O rapaz a ajudou a subir pela corda. Mal tinham chegado lá nas

26 alturas, descobriram que haviam sido seguidos pelos parentes dela, curiosos para ver como se

27 vivia tão perto do céu.

28 Foram todos recebidos com uma grande festa, que selou a amizade entre as duas nações. A

29 partir de então, começou um grande sobe-e-desce entre céu e terra. A corda não resistiu a tanto

30 trânsito e se partiu. Uma larga escada foi então construída e o movimento se tornou ainda mais

31 intenso. O povo lá de baixo, indo a toda a hora divertir-se nas nuvens, deixou de lavrar a terra

32 e de cuidar do gado. Os habitantes lá de cima pararam de caçar pássaros e começaram a se

33 apegar às coisas que as pessoas de baixo lhes levavam de presente ou que eles mesmos desciam

34 para buscar.

35 Vendo a desarmonia instalar-se entre sua gente, o caçador destruiu a escada e fechou a

36 passagem entre os dois mundos. Aos poucos, as coisas foram voltando ao normal, tanto na

37 terra como nas nuvens. Mas a jovem índia, que ficara lá em cima com seu amado, tinha

38 saudade de sua família e de seu mundo Sem poder vê-los, começou a ficar cada vez mais triste.

39 Aborrecido, o caçador fazia tudo para alegrá-la. Só não concordava em reabrir a comunicação

40 entre os dois mundos: o sobe-e-desce recomeçaria e a sobrevivência de todos estaria

41 ameaçada.

42 Certa tarde, o caçador brincava com o cristal que ganhara da mulher. As nuvens começaram a

43 sacudir sob seus pés, sinal de que lá embaixo estava chovendo. De repente, um raio de sol

44 passou pelo cristal e se abriu num maravilhoso arco-íris que ligava o céu e a terra. Trocando o

45 cristal de uma mão para outra, o rapaz viu que o arco-íris mudava de lugar.

46 - Iuupii! - gritou ele. - Descobri a solução para meus problemas!

47 Daquele dia em diante, quando aparecia o sol depois da chuva, sua jovem mulher escorregava

48 pelo arco-íris abaixo e ia matar a saudade de sua gente. Se alguém lá de baixo se metia a

49 querer visitar o mundo das nuvens, o caçador mudava a posição do cristal e o arco-íris saltava

50 para outro lado. Até hoje, ele só permite a subida de sua amada. Que sempre volta, feliz, para

51 seus braços.

52 Lenda Indígena recontada por João Anzanello Carrascoza

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Figura 1: Capa da Revista Nova Escola, Figura 2: “A Dança do Arco-Íris”. Retirada da Revista Nova Escola:

Vol.

1 –contos para Crianças

e Adolescentes Contos para crianças e adolescentes, vol. 1. Ilus trador Alarcão.

O texto selecionado para a pesquisa é do gênero narrativo, uma lenda indígena.

A opção por ele justifica-se pelo conteúdo trabalhado pela professora desde o primeiro ano:

a questão indígena é um assunto que perpassa todo o ciclo I, sendo que as crianças

geralmente têm muito interesse nas histórias indígenas, abordadas pela literatura infantil. O

título do texto é “A Dança do “Arco-Íris”, e foi retirado da revista Nova Escola, edição

especial: “Contos para Crianças e Adolescentes” é uma coletânea de textos para serem

trabalhados pelos professores; a revista traz um guia com sugestões com atividades

pedagógicas.

A narrativa “Dança do Arco-Íris” faz parte do repertório de conhecimentos da

tradição de alguma etnia dentre as inúmeras que existiram no interior do território

brasileiro, embora não haja referência sobre a qual delas trata o texto; somente aspectos

gerais aparecem, como a cultura da caça, pesca e elementos da natureza. As lendas

caracterizam-se por componentes fantásticos, mágicos e passagens cheias de magias; no

entanto, as histórias são marcadas por indícios dos modos de viver de determinado povo e

sua cultura.

No tópico inicial (linhas 02 - 07), ocorre a delimitação genérica do tempo e

espaço, sem precisão dos mesmos; a trama acontece num tempo remoto, em uma planície

nas nuvens. São citadas as formas de alim entação da tribo, a qual era feliz. Já nas linhas

08 até a 11, é narrado o acontecimento gerador de uma situação de conflito, a descoberta de

um outro mundo e o primeiro impacto da descoberta que fez o caçador guardar segredo

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115

sobre o ocorrido.

Entre as linhas 12 e 21, o caçador retorna ao local da descoberta do “outro

mundo”, momento de encontro com uma linda índia que se encarrega de mostrar seu

mundo ao visitante. A linda índia demonstra conhecer o “mundo das nuvens” de onde o

caçador é originário e ainda relata todo o processo de formação das chuvas. Por fim, ocorre

o retorno do personagem ao seu mundo, mas a relação dos dois é selada com o retorno

diário do personagem ao mundo da linda índia.

Na passagem das linhas 22 e 23, a linda índia relata sobre os animais selvagens

existentes na terra e ele diz que no mundo das nuvens os bens materiais não são

valorizados. Nessas duas linhas, são evidenciados os valores distintos entre as duas

civilizações, sobretudo, no que tange aos bens materiais.

Nos trechos a seguir (linhas 24 - 27), é apresentada a curiosidade da linda índia

em conhecer o mundo do caçador, ele a leva para conhecer seu mundo, no entanto, toda a

família dela embarca nessa jornada sem ser convidada, pois seguiram o casal por

curiosidade. Neste trecho, podemos inferir que os parentes não tiveram um bom

comportamento ao seguir o caçador e a linda índia, dado que não haviam sido convidados

para conhecer o mundo do personagem.

Contudo, nas linhas 28 até 34, embora os parentes da linda índia não tivessem

sido convidados para conhecer o “mundo das nuvens”, eles foram recepcionados com uma

grande festa, selando a amizade entre as duas nações; no entanto, essa amizade durou pouco

em consequência do excesso de visitas do grupo de pessoas da terra a corda arrebentou.

Nas passagens entre as linhas 35 e 41, verifica-se que, apesar da desarmonia

estabelecida no “mundo das nuvens”, foi construída uma escada para que as visitas

continuassem, mesmo com os problemas, pois esses aumentaram com a circulação de

pessoas; por isso, o caçador resolveu destruir a escada e o contato entre os dois mundos foi

rompido. Embora a rotina do “mundo das nuvens” tivesse voltado ao normal, foi instalado

um conflito entre o personagem e sua linda índia. Com a ação do caçador, foi rompido o

contato entre ela e seus parentes, causando-lhe uma enorme tristeza.

Nas linhas 42 até 46, ao brincar com o cristal que ganhara de sua amada, o

caçador descobre uma maneira de resolver o conflito: devido à chuva que caía na terra, o

brilho do sol atravessou uma das frestas abertas no meio das nuvens, possibilitando a

entrada de raios de sol que, ao atingir o cristal, produziu um arco-íris, o qual serviu de

ponte entre um mundo e o outro. O caçador ficou imensamente feliz, pois descobrira a

chave para seus problemas.

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116

No tópico final (linhas 47-51), há a resolução do problema causado pelo

rompimento do contato entre os dois mundos e a consequente tristeza da índia, motivada

pela saudade dos seus parentes, que permaneceram na terra. O caçador passa a usar o cristal

para criar um arco-íris, o qual se tornou uma passagem para o mundo de sua amada. Porém,

essa passagem é controlada por ele, permitindo apenas que a linda índia transitasse entre

os dois mundos e mais ninguém, minimizando a saudade dela e evitando que os problemas

recomeçassem.

Pode-se inferir a simbologia do arco-íris nessa história, que está relacionado

como uma passagem entre dois mundos, e também a importância da figura masculina no

controle dessa comunicação.

As leituras foram feitas em voz alta, em um espaço no ambiente escolar,

definido pela pesquisadora, considerando a disponibilidade de acesso no dia definido

para as videofilmagens: sala de informática, sala de orientação pedagógica, sala de

educação especial e sala de aula.

4.1.1. Análise de dados sobre compreensão leitora e produção de inferências.

Serão analisados os dados obtidos a partir dos comentários das leituras

desenvolvidas pela criança, considerando os processos inferenciais de base textual, base

contextual e sem base textual e contextual. Busca-se evidenciar os processos de

compreensão leitora produzidos pelo aluno em dois momentos de leitura.

Texto 1/ Pedro - PL: A Dança do Arco-Íris, produção de inferências:

a) De base textual:

Após feita a primeira leitura, o aluno Pedro-PL reconta a história e em

seguida tece comentários sobre a mesma:

Pedro - P (linha 07): Eu gostei do texto...

Pedro - PL (linhas 09-10): Aí, um dia ele foi acertar a flecha num pássaro, mas só que

ele errou e caiu no chão, aí ele foi tirar a flecha de lá, abriu um buraco, aí ele botou ...

aí ele fechou e saiu, não contou pra ninguém.

Pedro - PL (linhas 10-12): Aí no outro dia ele voltou, abriu, desceu lá embaixo e

Texto 1: A Dança do Arco-Íris. Data: junho/ julho de 2014

Sujeito pesquisado: Pedro Primeira leitura: PL

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conheceu ... conheceu a moça. Aí eles ficaram conversando, aí ele saiu e quando ele

voltou, ela falou eram uns animais terríveis que tinham lá embaixo, e ele falou ...

falou... é... cada uma falando coisas de cima e de baixo.

Análise:

Nos comentários de base textual produzidos pelo aluno Pedro em sua primeira

leitura (PL), pode-se perceber que este busca fazer um diálogo com o texto lido,

posicionando- se diante do mesmo, sempre com a mediação da pesquisadora, através de

algum tipo de pergunta inicial: 1) O que você quer falar sobre o texto? 2) Muito bem, e aí?

E aí, o que você achou? Diante destes questionamentos, o aluno Pedro inicia seus

comentários embasados em juízos de valor: gostou ou não gostou da história, geralmente

com justificativa.

Na sequência, descreve o que entendeu e faz suas considerações, contudo não

há uma busca pela simples reprodução, pois em vários momentos ele tem uma postura

interativa com o texto, sem suprimir a estrutura textual, que não é recuperada de forma

linear, mas que apresenta um horizonte mínimo, “leitura parafrástica” (MARCUSCHI,

2011). O horizonte mínimo é caracterizado por uma leitura em que são repetidas algumas

partes do texto, com outras palavras, em que se pode deixar algo de lado e evidenciar outras

passagens.

Em alguns momentos, pode-se observar que o aluno associa o mesmo

acontecimento que dá origem ao enredo, ou seja, a abertura, um buraco/fenda nas nuvens,

que possibilitou o conhecimento de outro mundo, a Terra, pelo personagem-caçador.

Aparecem, em seus comentários, a sequência dos acontecimentos evidenciados no texto, o

encontro entre o caçador e a linda índia.

Após o aluno Pedro ter feito o reconto e a retomada da história através do uso de

paráfrases, a pesquisadora faz perguntas mais direcionadas, com objetivo de verificar se o

aluno faz alguma relação desse texto com outros estudados. Verifica-se que as inferências

de base contextual, na maioria dos casos, aparecem nos comentários dos alunos mediante a

intervenção da pesquisadora, propondo questões mais elaboradas e direcionadas.

Pesquisadora/ aluno Pedro - PL (linhas 27-28): Você já leu algum outro texto que fala sobre

essa questão indígena? Texto que fale sobre índio? Já leu alguma outra coisa?

Pesquisadora/ Aluno Pedro - PL (linhas 34-35): Ah, entendi, você percebeu alguma

diferença ou semelhança entre esse texto e outros que você leu sobre a civilização

indígena? O povo indígena?

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Essas questões permitem a produção de comentários e inferências de base

contextual. É importante ressaltar que se entende o conceito de contexto, aquele formulado

por Marcuchi (2007, 2008), exposto no capítulo 1.

De base contextual:

Aluno Pedro- PL (linhas 29-31): Ah, eu também já li a lenda do guaraná, que fala que

nasceu um índio, aí uma cobra picou ele, aí ele morreu, aí no lugar que ele foi enterrado,

nasceu uma planta que tinha olhos iguais os dele, que era o guaraná. A da mandioca

também e da... qual foi aquela lá que a gente fez dos índios? (ele se pergunta em voz

alta) .

Aluno Pedro- Pl (linhas 36-38): Esse texto aqui é diferente dos outros que eu li porque os

outros só falavam da plantação, de mulheres grávidas, de caçadores. Esse daqui fala que

o caçador encontrou outro mundo. Que na aldeia dele eles não tinham comida, comiam

aves, que a aldeia era cheia de nuvens.

Análise:

As respostas elaboradas pelo aluno Pedro estão relacionadas ao quadro geral

de inferências, proposto por Marcuschi (2008), em um nível do processo de compreensão

em que ocorrem extrapolações autorizadas, permeadas pelos processos cognitivos e

sociointerativos desenvolvidos e vivenciados pelo aluno em várias situações cotidianas

escolares e extraescolares. A partir dos conceitos definidos por Marcuschi (1985, 2007,

2008), podemos analisar as respostas dadas pelo aluno ao responder as perguntas da

pesquisadora como inferências de base contextual pragmáticas (experienciais) e

cognitivas (analógicas).

É pertinente ressaltar que o aluno extrapola as marcas textuais, ou seja, tem

uma atitude leitora marcada pela intertextualidade, explica as características deste texto

lido, associando outros textos do mesmo gênero, estudados na sala de aula, isso ocorre

mediante a pergunta da pesquisadora se o aluno percebeu alguma diferença entre o texto

lido (a dança do arco- íris) e outros estudados em sala de aula que falam sobre histórias

indígenas. Considerando esse questionamento, Pedro expõe as relações entre o texto lido

no momento da pesquisa com a lenda da mandioca e do guaraná.

As associações ocorrem através da comparação dos diversos elementos que

compõe o texto lido com os citados pela criança, sejam elas com o intuito de elencar

características em comum e outras que se diferenciam.

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Esse movimento de interface com outros textos do mesmo gênero – lenda -

demonstra já uma atitude de leitor proficiente, sendo o aluno pesquisado, com faixa etária

entre 08 e 09 anos, ainda em no processo de alfabetização, final do Ciclo I do Ensino

Fundamental, mas que demonstra um nível de compreensão leitora que rompe com o

mero decodificar de textos: a leitura é entendida nesse processo através de uma relação

dinâmica entre o leitor, o texto e o contexto.

b) Sem base textual e contextual:

Foi possível observar, nas inferências feitas pelo aluno, que não houve

falseamentos, ou seja, como descrito no quadro de operações: “atividade de introduzir um

elemento e afirmar uma proposição falsa que não condiz com as informações textuais ou

não pode ser dali inferida” (MARCUSCHI, 2008).

Texto 1/ Pedro – SL: A Dança do Arco-Íris, produção de inferências:

a) De base contextual:

Após feita pelo aluno a segunda leitura do texto “A dança do arco-íris”,

a pesquisadora inicia uma conversa com o sujeito pesquisado, fazendo a

seguinte pergunta:

Pesquisadora (linha 02): E aí? Você pensou em mais alguma coisa, além

daquelas que você havia pensado antes?

O conteúdo da pergunta foi pensado e elaborado com o objetivo de retomar a

leitura feita no primeiro encontro, para que o aluno pudesse elaborar reflexões

relacionando-as com a produção de inferências, a partir da segunda leitura. Segue a resposta

produzida pelo aluno:

Aluno Pedro- SL (linhas 03-07): Pensei, além de eu ter falado aquilo, é que minha família

também não gosta muito de festa, movimento, essas coisas.

Texto 1: A Dança do Arco-Íris.

Data: julho/agosto de 2014.

Sujeito pesquisado: Pedro

Segunda leitura:.SL

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120

E também não gostam que gente que vão muito lá em casa, tipo na copa, todo jogo do

Brasil, tava indo um monte de gente lá pra casa ver, aí meu pai fazia churrasco, mas eles

não gostavam muito do movimento.

Considerando a resposta do aluno, a pesquisadora faz a seguinte pergunta logo

em seguida:

Pesquisadora (linha 08): Ah! E o que isso tem a ver com o texto?

Prontamente o aluno responde:

Aluno Pedro- SL (linhas 09-12): Ah, por causa que além de um ficar indo pro outro lado,

invés de eles tarem gostando, num tava gostando. Eles tavam indo tanto, tanto, chega a

corda quebrou e construíram uma escada. Mas depois ele deu uma solução, pra ... quem

quisesse subir, subia e descia, pra namorada dele poderia ir.

Ao final dos comentários, o aluno é indagado pela pesquisadora se ele quer falar

mais algum aspecto do texto. A reposta é a seguinte:

Aluno Pedro - SL (linhas 26-29): Ah, eu também queria falar de outras lendas de frutas tipo

a do guaraná... foi um menino que nasceu aí depois a cobra matou ele, aí... aí, onde ele foi

enterrado nasceu...não onde foi colocado os olhos dele, nasceu uma frutinha chamada

guaraná, porque tinha o formato dos olhos dele.

Na sequência a pesquisadora faz uma nova intervenção e o aluno responde:

Pesquisadora (linha 30): E o que tem a ver uma lenda com a outra?

Aluno Pedro - SL (linhas 31-32): É por causa que as lendas, além de ser uma coisa assim

que as pessoas inventam, algumas são verdadeira outras inventadas, outras ainda não se a

sabem.

Análise:

As inferências produzidas pelo aluno Pedro, segunda leitura do texto “A Dança

do Arco-íris”, são, em sua maioria, de caráter textual e contextual, pois o aluno atem-se em

elementos presentes no texto e outros que dialogam com o mesmo, a partir de pistas textuais

há o movimento de retomada de experiências vividas em situações cotidianas em sua casa e

provenientes do espaço escolar.

O sujeito pesquisado já sabia, a partir da pergunta da pesquisadora, que deveria

apresentar outros elementos, além daqueles expostos na primeira leitura. Embora direcionada,

a questão elaborada pela pesquisadora possibilitou várias associações de base textual e

contextual, abrindo um leque de possibilidades de construção de sentidos.

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O aluno optou por fazer associações pragmáticas e experienciais. Ele selecionou

uma passagem do texto original (linhas 35-41), na qual o personagem (índio-caçador)

demonstra estar descontente com o “sobe e desce” das pessoas dos dois mundos (das nuvens

e da terra). Ancorado nessa base textual, o aluno foi capaz de mobilizar uma série de saberes

vivenciados, relacionando-os com conteúdo lido e comparando o fato do personagem não ter

gostado do movimento de pessoas em seu mundo, caracterizada pela “desarmonia entre sua

gente”, com um acontecimento vivenciado em sua casa durante os jogos da copa do mundo.

O aluno relata que muitas pessoas frequentavam esse ambiente para festejar, seu pai fazia

churrasco; no entanto, seus familiares não gostavam muito de festa.

Nas passagens entre as linhas 26 até 29, os comentários produzidos pelo aluno

em sua segunda leitura retomam a mesma relação feita após a primeira leitura, ou seja, a

associação do texto “A dança do arco-íris” com a lenda do guaraná. Na primeira leitura, o

aluno relata a lenda do guaraná, pois responde a pergunta da pesquisadora, se ele conhecia

ou tinha estudado uma outra história sobre os índios; no entanto, o aluno traz novamente em

pauta o reconto da lenda do guaraná sem a intervenção direta da pesquisadora. É importante

ressaltar o papel mediador da pesquisadora, no momento da pesquisa, na relação da criança

com o texto. A presença da pesquisadora não é imparcial, a sua atuação interfere na

produção de inferência do aluno pesquisado, é algo que tem que ser considerado pois os

questionamentos elaborados implicam necessariamente na construção dos diversos tipos de

inferências.

Pode-se considerar que o aluno, em seu processo de compreensão do texto lido,

percebe que compreender não é só ler, recontar e entender o conteúdo da história, mas é

também fazer relações entre histórias do mesmo gênero, neste caso específico, lendas

indígenas, comparações entre personagens. Há ainda um movimento da criança em levantar

as características de uma lenda, na tentativa de conceituá-la. Todo esse movimento feito

pelo aluno demonstra uma busca pela coerência, princípio que, segundo Kleiman (2008,

p.29), “rege a atividade de leitura e outras atividades humanas”.

É importante ressaltar que, na segunda leitura do texto, não aprecem

produções de inferências somente de base textual e também sem base textual e

contextual. As principais inferências são de base contextual.

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Texto 1/ Elisa - PL: A Dança do Arco-Íris, produção de inferências:

a) De base textual:

Pesquisadora (linha 01): e aí? (após o término da leitura)

Aluna Elisa - PL (linhas 03- 14): Eu achei muito legal porque fala de um índio, de uma

índia que... se... que o índio tava tentando pegar o pássaro, aí ele atirou a flecha no

lugar errado e abriu uma passagem para outro mundo. Aí, ele desceu lá escondido, aí

ele viu uma... uma índia que ele se apaixonou, os dois se casaram, aí eles namoraram,

mas aí a índia subiu pra lá e toda vez tinha festa, aí ficava um sobe e desce pra i e voltar

pros dois mundos. Aí, o índio não concordou com isso, então ele fechou, ele tapou o

buraco, aí depois começou chover de depois abriu o sol, que ele tava com o cristal, é que

ele ganhou da mulher. Aí as nuvens começaram a sacudir que fez chover, aí o cristal, é

... abriu um arco-íris que fazia... que se mudasse de posição o arco- íris ia pra outro

lugar. Aí ele só permitia que a mulher descia lá pra visitar a família dela, mas quando as

pessoas de lá de baixo queriam subir, não deixava, porque... ele não concorda com a

ideia, mas aí depois ficou assim, ele virava o cristal e o arco-íris virava pra outro lado.

Análise:

A aluna Elisa, em sua primeira leitura, após ler o texto em voz alta e

questionada

pela pesquisadora, inicia o reconto da história prontamente, com o enfoque nos

acontecimentos vivenciados pelos dois personagens principais, o índio e a índia. Segundo

o quadro de inferências de base textual (MARCHSCHI, 2008,P.255), a aluna apresenta

um processo dedutivo de natureza lógica ao reproduzir o texto lido: reunindo duas ou

mais informações textuais que serviram de premissas para se chegar a uma conclusão

válida, ou seja, a confusão entre o entra e sai da família da índia que vivia no “mundo

de baixo”, ao visitar de forma continua o “mundo das nuvens”, o que contribuiu para

que o índio resolvesse fechar a passagem e controlar a mesma através do cristal que

abriria um arco-íris para a descida da índia para visitar sua família, quando fosse

permitido por ele.

Texto 1: A Dança do Arco-Íris. Data: julho de 2014

Sujeito pesquisado: Elisa Primeira leitura: PL

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A aluna Elisa produz um tipo de operação inferencial marcada pela sintetização

das ideias, onde várias informações são tomadas a partir do input textual, consideradas as

principais ações dos personagens em uma sequência narrativa coerente com o desfecho da

história. Embora tenha sido suprimida partes da narrativa, não houve alteração na sua

compreensão, ocorrendo a chamada leitura parafrástica, “a leitura fica ainda numa atividade

de identificação de informações objetivas que podem ser ditas com outras palavras”

(MARCUSCHI, 2008, p. 259). As inferências demonstram que a leitura da aluna encontra-

se no “horizonte mínimo”, ela recupera as principais informações explícitas dos textos,

seleciona o léxico, no entanto, consegue compreender a sequência da narrativa, rompendo

com a mera atividade de repetição - “Falta de horizonte”.

b) De base contextual:

Após o reconto, a pesquisadora faz uma pergunta, considerando algumas

informações que aparecem nos comentários da aluna:

Pesquisadora (linhas 15-16): Por que que ele não concordava com a ideia? Por que ele

não concordava com a subida dos parentes dela?

Aluna Elisa – PL (linhas 17-18): Por que ele num. ficava feliz, então ele não deixou ,

mas a mulher mesmo assim queria visitar os parentes dela.

Em seguida, a pesquisadora faz uma pergunta mais genérica:

Pesquisadora (linha19): Muito bem! Mais alguma coisa? O que mais te chamou a

atenção no texto?

Aluna Elisa - PL (linhas 20-22): É que... a mulher queria que os parentes dela subiam, só

que o homem não deixava, porque ele não gostava, porque ficava um sobe e desce, fazia

festa todo dia e eu acho que ele não gostava.

Aluna Elisa – PL (linha 24): É e ficava... e o povo dele descia lá e ficava pegando coisa.

Eu acho que também ...

Pesquisadora (linha 25): E o que você acha que ele não gostava?

Aluna Elisa – PL (linha 26): Ah ..., humm... porque ele é mais quieto. Ele não

gosta muito de fazer bagunça.

Análise:

A aluna Elisa atinge, com relação aos horizontes de compreensão textual,

a fase do “horizonte máximo”, o qual a leitora produz inferências possíveis e rompe com

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a leitura meramente parafrástica: são inseridos novos elementos a partir dos

conhecimentos prévios da aluna, suas crenças e valores, atitude valorativa, quando a

mesma, afirma que o homem não deixou que a família da mulher a visitasse

constantemente. Observa-se que ela se refere de forma generalizada ao padrão de

comportamento que se deve ter um homem e uma mulher e não um caso pontual

relacionada aos personagens: índio e índia em um determinado contexto. Apoiando-se

nas passagens do texto (linhas 35 e 36) em que o personagem destrói a escada que dá a

passagem entre os dois mundos, a aluna conclui que ele não gostava de bagunça, era mais

quieto que a mulher, portanto destruindo a passagem, o índio não deixou que o trânsito

entre os dois mundos continuassem ocorrendo, em uma atitude arbitrária caracterizando o

poder de decisão assumido pelo homem em detrimento da vontade da mulher.

Um outro tipo de operação inferencial que se verifica nos comentários da

aluna é de associação pragmática, ou seja, Elisa conclui que o índio fechou a passagem

entre os dois mundos, por ser quieto e não gostar de bagunça. Em nenhum momento

aparece essa afirmação no texto: o que ocorre é uma “afirmação de uma informação

obtida através de saliências lexicais ou cognitivas por associação de ideias”.

(MARCUSCHI, 2008, p.255).

Na primeira leitura do texto “a dança do arco-íris”, a aluna apresenta

algumas inferências de base textual e contextual, no entanto, sua leitura caracteriza-se por

comentários baseadas nas informações textuais, feitas através da prática de reconto da

narrativa lida.

Texto 1/ Elisa - SL: A Dança do Arco-Íris, produção de inferências:

a) De base textual e contextual:

Pesquisadora (linhas 1-2): Nós vamos fazer agora a segunda leitura do texto: A dança do

Arco- Íris com a aluna Elisa.

Pesquisadora (linha 3): E aí? O que que você achou?

Aluna Elisa – SL (linhas 4-14): Achei legal, porque o homem tava tentando atirar a

flecha no pássaro pra ele levar pra eles comer, só que aí ele errou a mira e foi cair lá no

Texto 1 : A Dança do Arco-Íris.

Data: julho de 2014

Sujeito pesquisado: Elisa

Segunda leitura: SL

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chão, aí começou abrir uma venda que lá embaixo tinha outro mundo, aí um dia ele foi

lá e encontrou uma mulher que ele se apaixonou e namorou ela. Aí depois é, quando ela

ia subir pra visitar ele, os parentes dela queria subir junto, só que aí o homem não

gostava muito, porque ele achava que era muito chato, ele não ficava mais feliz quando

era só ele e o povo dele.

E o pessoal lá de baixo queria visitar o mundo das nuvens né que eles chamavam. Mas aí

um dia ele tava brincando com o cristal, que a mulher deu pra ele, aí começou chover

depois veio um raio de sol lá de baixo, aí abriu um outro buraco que...e aí a mulher dele

ficava com

saudade, aí ele deixava só a amada dele descer. Aí se alguém lá debaixo queria subir ele

virava o cristal e o arco-íris pulava pra outro lugar.

Aluna Elisa – SL (linhas 28-30): Que a mulher gostava de festa e o homem não, e o

pessoal lá de baixo queria visitar ela e ficava brincando lá no mudo das nuvens, ele não

gostava , ele não se sentia mais casa.

Análise:

Após a segunda leitura em voz alta do texto “A dança do arco-íris”, a

pesquisadora pergunta para a aluna o que achou do mesmo. A reposta é que achou legal e,

na sequência, inicia o reconto da história; mas desta vez, ao recontar a lenda, ela vai

acrescentando sua opinião, constrói inferências pragmáticas avaliativas, o que fica

explícito através nas passagens: “ele achava que era muito chato”; “ele não ficava

mais feliz”; “e o pessoal lá de baixo queria visitar ela e ficava brincando lá no mudo das

nuvens”; “ele não gostava , ele não se sentia mais casa”. Contudo, são avaliações

baseadas nos acontecimentos permitidos pelo texto, fazendo com que o leitor atinja,

dentro dos horizontes de compreensão textual, inferências possíveis.

Nos seus comentários não ocorrem muitas extrapolações de base contextual.

Foi possível fazer esta afirmação, pois assim como o aluno Pedro foi questionado pela

pesquisadora sobre o conhecimento que o mesmo tinha sobre lendas, a aluna também foi

indagada sobre tal questão e as respostas foram bem diferentes. No caso da aluna, ela

respondeu que não. Seguem as passagens este assunto:

Pesquisadora (linha 43): Você conhece outra história parecida com essa?

Aluna Elisa- SL (linha 44): Não.

Pesquisadora (linhas 45-46): Que fala de outros povos, povos indígenas? Você não se

lembra de nada que você já tenha lido antes disso?

Aluna Elisa – SL (linha 47): Não.

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Texto 1/ Luís - PL: A Dança do Arco-Íris, produção de inferências:

a) De base textual e contextual:

Após fazer a primeira leitura, em voz alta do o texto, a pesquisadora indaga o

aluno sobre o que achou do texto:

Pesquisadora (linha 1): E aí? O que você achou Luís?

Aluno Luís –PL (linha 2): Legal.

Pesquisadora (linha 3): Legal? Achou legal mesmo?

Em seguida, o aluno busca uma informação pontual no texto e faz relações com sua

vivência:

Aluno Luís – PL (linhas 4-7): Aqui quando falou (o aluno tenta buscar no texto o trecho que

ele quer expor), que tipo pegava o vapor da água, aí eu me lembrei de um negócio que a gente

estudou sobre como é que fazia chover, que o sol aquecia a água, aí fazia nuvens, aí tipo

quanto mais grande a nuvem mais chovia, aí caia a chuva e começava tudo de novo.

Seguindo o mesmo procedimento, o aluno seleciona outra passagem do texto

para fazer um diálogo com o mesmo:

Aluno Luís – PL (linhas 9-11): E quando falou do arco-íris aqui, falou que ele pegava o cristal

e movia para o arco- íris trocar de lugar . Então, eu também me lembrei bolha de sabão,

quando eu brincava com bolha de sabão, sempre eu via as cores tipo arco-íris, mais ou menos,

só que embaçado.

Após as inferências de base contextual, a pesquisadora faz uma intervenção e o

aluno elabora inferência de base textual, como se segue:

Pesquisadora (linha 13): Hum, que interessante! Muito bom! E que mais você tem assim, pra falar

da história?

Aluno Luís – PL: (linhas 14-19): Achei legal né, porque ele, o caçador errou o tiro, que ele

ia pegar uma ave, errou o tiro, aí abriu tipo uma passagem que levava pro mundo de baixo

Texto 1: A Dança do Arco-Íris. Data: julho de 2014.

Sujeito pesquisado: Luís. Primeira leitura: PL.

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onde ele encontrou é. uma menina que tipo ele foi se apaixonando. Aí, não sei quem aí

fechou a passagem, aí eles tipo nunca se encontraram mais.

Aluno Luís – PL (linhas 23-25): Aí o caçador brincava com o cristal, aí lá embaixo começou

a chover, aí veio o trovão. Que... o cristal que fez o arco-íris. Aí o caçador ficou mexendo o

cristal, que eu já falei, para o arco-íris mudar de lugar, aí tipo eles se encontraram. Eu acho.

A partir do que o aluno foi comentando, a pesquisadora intervém:

Pesquisadora (linha 27): E porque você achou interessante isso?

Aluno Luís – PL (linhas 28-30): Sei lá, porque os dois se apaixonaram, um ficava em cima e

outro embaixo, aí tipo não dava pra eles se encontrarem. Aí isto daqui, eu acho, que mistura

romance, meio romance com aventura.

Análise:

Ao explicar porque achou o texto legal, o aluno Luís busca informações

pontuais no texto, ele associa a informação sobre o lugar onde o índio vivia: “o mundo das

nuvens”, com a formação das nuvens e da chuva, ou seja, a partir do input textual, Luís

constrói inferências de base contextual pragmática experiencial, desenvolvidas através da

sua vivência escolar, pois ele afirma: “aí eu me lembrei de um negócio que a gente estudou

sobre como é que fazia chover...”. É possível considerar que o aluno elabora um tipo de

inferência marcada pela reconstrução, que pode ser de natureza cognitiva, semântica e

experiencial, pois é realizada pela “reordenação ou reformulação de elementos textuais

com quadros total ou parcialmente novos”. (MARCUSCHI, 2008, p.55). Esta afirmação foi

constituída mediante as informações que o aluno Luís acrescenta ao texto, são

conhecimentos aprendidos em sala de aula que dizem respeito aos conteúdos da disciplina

de ciências – vapor de água e produção das chuvas, são associados ao a palavra arco-íris,

ampliando o significado proposto no texto.

Em seguida, o aluno demonstra o mesmo procedimento: utiliza o termo arco-íris

que está no contexto textual e, utilizando essa palavra para elaborar uma outra inferência

contextual pragmática experiencial, associa o arco-íris com a bolha de sabão que produz as

cores do arco-íris. Uma associação relacionada às suas experiências de vida.

Quando a pesquisadora indaga Luís sobre o que mais ele tem para falar sobre a

história, o aluno produz inferências textuais, através de uma leitura parafrástica, ele reconta

trechos da narrativa: novamente com a intervenção da pesquisadora, ele dá continuidade ao

reconto.

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Com relação à compreensão textual, este aluno demonstrou um entendimento

do texto em que se apresentam mais inferências com base contextual do que textual.

Partindo dessa avaliação, é possível afirmar que ele estabelece um diálogo mais profícuo

com o texto do que a aluna Elisa. Pode-se concluir que, em termos de horizontes de

compreensão textual, Luís entra em um nível de horizonte denominado por Marcuschi

(2008) de problemático, por conta das extrapolações: “são leituras de caráter pessoal, onde

o investimento de conhecimentos pessoais é muito grande”. (MARCUSCHI, 2008, p. 259).

Nos comentário finais, o aluno Luís faz uma leitura do texto com o intuito de

explicar que gênero de texto ele está lendo e chega à conclusão que: “Aí isto daqui, eu acho,

que mistura romance, meio romance com aventura”. Não se sabe o que levou o aluno a

fazer essa análise sobre o texto, no entanto, têm-se indícios: este aluno participou do projeto

interdisciplinar que permeou todo o ciclo I, participou da sacola da leitura, dos

festivais literários, sendo provável que essas experiências tenham contribuído de forma

significativa para que o mesmo pudesse fazer constatações baseadas em suas experiências

prévias, sobre as características de um gênero textual.

Texto 1/ Luís- SL: A Dança do Arco-Íris, produção de

inferências:

a) De base contextual

Na segunda leitura do texto 1, o aluno Luís não faz o reconto do mesmo,

tampouco elabora inferências contextuais a partir do diálogo com a narrativa. O que ele

produz, com ou sem intervenção da pesquisadora, são questões: a todo momento ele

questiona os elementos textuais e também questiona as perguntas da pesquisadora. Para

dar inteligibilidade aos comentários elaborados pelo aluno, buscou-se fazer recortes dos

assuntos tratados, para análise mais efetiva, pois ele inicia seus comentários a partir de

uma informação textual, por exemplo: sobre por que o texto tem o título de “A dança do

arco-íris”; no entanto, retoma esse assunto depois de discorrer sobre outros assuntos

abordados no texto. Seguem os comentários:

Texto 1: A Dança do Arco-Íris. Data: julho de 2014

Sujeito pesquisado: Luís Primeira leitura: SL

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Pesquisadora (linha 1): E aí? O que que você quer contar a respeito desse texto?

Aluno Luís - SL (linha 2): É ... que eu não entendi uma coisa, por que o nome desse texto

é a dança do arco-íris?

Pesquisadora (linha 3): Por que que você acha?

Aluno Luís – SL (linhas 4 - 6): Não sei, o arco-íris não dança.

Não, o nome do texto é a dança do arco-íris se o arco-íris nem dança. (rindo, ironizando a

situação).

Aluno Luís – SL (linhas 7-8): A não ser que tipo, sei lá, dançaram ou festejaram por que

descobriu o negócio do arco-íris, descobriu sobre o arco-íris?

Pesquisadora (linha 29): Ele tava brincando com cristal na mão, e aí?

Aluno Luís – SL (Linha 30): O raio de sol bateu no cristal que saiu o arco-íris. Aí ele

descobriu o arco-íris.

Pesquisadora (linha 31): E esse arco-íris se tornou o que?

Aluno Luís – SL (linha 32): Outra passagem, uma passagem nova.

Pesquisadora (linha 33): Uma passagem nova! E o que ele fazia com o cristal?

Aluno Luís – SL (34): Movimentava pra poder descer lá embaixo ou subir de lá de baixo.

Pesquisadora (linha 35): Quem? Subir e descer de lá de cima e lá debaixo?

Aluno Luís – SL (linha 36): A mulher.

Pesquisadora (linhas 37-38):E ele movimentava o cristal, e esse movimento significa o que?

O que significa esse movimento pra lá e pra cá?

Aluno Luís – SL (linha 39): Sei lá.

Pesquisadora (linha 40): Pode ser comparado a que? Lembra do título?

Aluno Luís – SL (linha 41- 43): A dança do arco-íris. Ah entendi agora, porque ele

movimentava (gesto com a mão), como se o arco-íris tivesse dançando.

Agora descobriu tudo.

Análise:

O aluno faz a leitura em voz alta e, em seguida, a pesquisadora faz uma

pergunta aberta, deixando o aluno livre para contar o que quiser sobre o texto. Na

sequência, Luís se apoia no referencial arco-íris e diz que não entendeu a relação deste com

o texto, em uma atitude de questionamento sobre a relação do referente semântico com o

enunciado. Quando indagado pela pesquisadora sobre qual a sua opinião a respeito, o aluno

automaticamente diz que o arco-íris não dança, como pode o texto chamar a dança do arco-

íris? Isso significa que a leitura feita está associada à compreensão literal da palavra arco-

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íris e sua função. É pertinente afirmar que sua posição de questionamento é muito

importante para a construção da compreensão textual, pois está levantando dúvidas e

hipótese para, posteriormente, responder a sua dúvida, o que caracteriza uma operação

metalinguística, imprescindível para a formação de um leitor. Esse leitor não faz uma leitura

no nível parafrástico (SL): de forma intuitiva, compreende a narrativa como um evento

comunicativo e interacional.

Em diálogo entre texto, leitor, pesquisadora, o aluno chega à conclusão, a partir

de elementos textuais e extratextuais, que o título da lenda está relacionado com o

movimento que o personagem faz com o cristal, formando um arco-íris que serve de

passagem de um mundo ao outro para que a índia possa se mover entre os dois lugares.

Quando chega a essa conclusão, Luís se expressa com a frase: “agora descobri tudo”, uma

expressão que representa seu entendimento sobre o texto relacionando o enunciado com o

conteúdo, a partir de suas próprias reflexões.

A seguir, será apresentado o próximo texto utilizado na pesquisa. Os

procedimentos para verificar a compreensão leitora dos alunos a partir da produção

de inferências foram os mesmos: leitura oral e comentários, em dois momentos distintos

sobre o mesmo texto.

4.2. Texto 2 - “A Origem do Oiapoque”

1 A ORIGEM DO "OIAPOQUE"

2 Muitos anos atrás, a fome atingiu uma aldeia indígena. Havia pouca caça e quase nenhum

3 peixe, e a seca acabara com a plantação de mandioca. O mesmo tinha acontecido com muitas

4 árvores frutíferas, que não deram frutos. Enfraquecidas, as crianças ficavam doentes, e os 5 bebês e os velhos estavam morrendo. Por causa disso, a índia Tarumã, que estava grávida, 6 decidiu sair de lá para salvar o seu bebê. Ela tinha certeza de que sua criança morreria de

7 fome, pois, fraca como estava, provavelmente não teria leite para amamentá-la. E partiu em

8 busca de um lugar melhor para criar seu filho. Alguns dias se passaram. Sozinha na mata, 9 Tarumã já não tinha esperança. Começou então a chorar, com saudade de tudo o que deixara 10 para trás. Em desespero, pediu a Tupã para transformá-la numa cobra, de modo que pudesse 11 transpor a floresta e encontrar um lugar adequado para seu povo construir outra aldeia. 12 Admirado com a coragem da moça, o deus atendeu seu pedido. Durante meses, aquela grande 13 cobra vagou em busca de um local em que houvesse comida e água. Carregando o bebê, seu

14 peso era tanto que por onde passava ela deixava sulcos profundos no chão. Finalmente, 15 Tarumã encontrou um vale cortado por um riacho, com muitas árvores frutíferas e caça nas 16 redondezas. A índia-cobra ficou super feliz! Fez todo o trajeto de volta para avisar seu povo

17 que havia encontrado água e comida: agora, todos estavam salvos. Mas ela estava tão 18 empolgada que se esqueceu de pedir a Tupã para desfazer o encantamento. Quando estava 19 chegando à aldeia, o bebê nasceu. Tarumã teve sua filhinha bem na entrada do povoado. 20 Quando as pessoas viram que uma criança tinha nascido de uma cobra, acharam que fosse

21 algum tipo de bruxaria e mataram o bebê. Tarumã ficou louca de dor, mas não atacou sua 22 gente. Expressou sua tristeza com um choro tão prolongado que as lágrimas preencheram os 23 sulcos que seu corpo havia cavado na mata, transformando-os num grande rio. Com a perda do

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24 bebê, Tarumã não quis mais ser gente. Para esconder-se do mundo, mergulhou no rio de suas

25 lágrimas e adormeceu no seu leito. Na aldeia, os índios contam que as águas do rio ficam 26 revoltas nas noites de lua cheia, e quando Tarumã suspira pela falta da filha. Quando ela 27 chora, o volume de água aumenta tanto que o rio transborda e forma-se um grande alagado até 28 as ilhas próximas. Foi assim que esse rio ganhou o nome de Oiapoque.

29 (Inspirada em "A lenda do rio Oiapoque" )

Figura 3: Livro: Viagem pelo Brasil em 52 Histórias. Ilustração de Cárcamo.

Este segundo texto, utilizado para leitura e produção de inferências pelos

sujeitos pesquisados, possui características semelhantes ao primeiro (A Dança do Arco-

Íris): é uma lenda indígena, possui caráter metafórico, embora o texto apresente elementos

reais, por exemplo, a existência do rio Oiapoque.

A lenda discorre sobre a origem de um rio que fica na região Norte do Brasil. A

narrativa tem início com uma problemática sem um tempo definido, “há muitos anos atrás”.

Nas linhas 2 a 4, é apresentado o problema, ou seja, a fome arrasou a aldeia devido à

escassez de alimentos.

Diante da situação em que está a aldeia, assolada pela fome e a consequente

mortandade da população local, entre as linhas 4 e 7, aparece a personagem principal: a

índia Tarumã, que está grávida, se vê fraca e com medo de o seu bebê morrer de fome, pois

mal alimentada não terá condições de produzir leite para amamentá-lo, por isso, abandona a

aldeia para buscar alimento. O feminino, representado pela índia Tarumã, coloca em

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evidência a importância da figura feminina, capaz de ir em busca de soluções para sanar os

problemas vividos por ela e sua comunidade.

A passagem seguinte (linhas 7-12) é marcada por quatro momentos

importantes: a partida da aldeia; o desespero da índia por não encontrar nenhuma

possibilidade para a

resolução do problema da fome; o pedido ao deus Tupã para transformá-la em cobra; a

aceitação do pedido por Tupã, já que a índia demonstrou muita coragem.

Entre as linhas 12 e 16, verificam-se os primeiros indícios que podemos

relacionar ao título do texto, ou seja, Tarumã, transformada em cobra e pesada por conta

da gravidez de sua filha, por onde passava, abria sulcos na terra. Qual a importância

desses sulcos? Qual a relação deles com a origem do rio? São questões que serão

respondidas à medida que a história vai chegando ao seu desfecho, à resolução do

problema inicial da personagem.

O destino trágico para a índia Tarumã ocorre entre as linhas 16 e 21, quando a

índia-cobra retorna para a tribo para dar a notícia da descoberta de um novo lugar para

viver, no qual havia árvores frutíferas e caça; num lapso de esquecimento, a índia não

pede a tupã para voltar à forma humana, sendo assim, a filha da índia-cobra nasce na

entrada da aldeia. A população fica horrorizada com esse acontecimento, considerando

algo inaceitável e decide matar a criança.

Nas linhas 21 até 25, são apresentados a dor e o sofrimento vivenciados pela

personagem em função da morte de sua filha; diante deste fato, a índia não quis mais ser

gente e suas lágrimas de dor preencheram os sulcos abertos anteriormente nas terras por

onde passou, quando estava à procura de alimentos para si e todos da aldeia, e

“mergulhou no rio de suas lágrimas”, portanto, é um rio composto pelas lágrimas de dor

da índia-cobra. Essa é a representação lendária da formação do rio Oiapoque.

Entre as linhas 25 e 28, ocorre a associação da história da índia Tarumã com

a origem do nome do rio Oiapoque.

4.2.1. Análise de dados sobre compreensão leitora e produção de inferências

Texto 2: A Origem do Oiapoque. Data: Agosto de 2014.

Sujeito pesquisado: Pedro Primeira leitura: Pedro – PL

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Texto 2/ Pedro – PL: A origem do Oiapoque, produção de inferências:

a) De base textual:

Como no primeiro texto, o aluno fez a leitura de forma tranquila e segura; após

a finalização da mesma, a pesquisadora repete o procedimento, perguntando:

Pesquisadora (linha 01): E aí?

Pedro - PL (linhas 02-5): “Eu achei meio triste essa história, por causa que a aldeia deles

não tinha muita comida e nem água, então ela decidiu sair de lá, aí pra procurar outro

lugar, aí ela pediu pro...pro...Tupã (o aluno procura o nome do personagem no texto) pra

transformar ela em cobra, Aí como ele viu que ela tinha tanta coragem assim, aí ele fez o

pedido dela...”

Pedro – PL (linhas 6-12): “aí ela achou uma ilha com água e comida, aí ela foi falar pra

aldeia dela, só que ela tinha esquecido de falar pro Tupã tirar o feitiço dela, aí quando ela

chegou lá, o bebê nasceu. Aí todos viram que, então apareceram todos aí viram que um

bebê nasceu de ... de uma cobra, aí eles acharam que era bruxaria, aí eles mataram o bebê,

aí ela começou a chorar, aí o choro dela fez um rio, aí ela entrou dentro do rio e

adormeceu no leito, aí depois quando ela chora o volume de água é tanta, o rio transborda

e vira um alagado até as ilhas próximas, aí por isso que o rio ganhou o nome de

Oiapoque”.

Análise:

A leitura de um texto não ocorre de forma linear, pois não acontece nesse ato

um processo exato, detalhado e sequencial, por isso, a compreensão textual é dificilmente

apreendida, já que os sentidos construídos resultam a partir da interação comunicativa entre

leitor e autor, com base no texto, sem sua repetição literal.

Um dos aspectos cognitivos imprescindíveis para a compreensão textual é a

memória, conceito que segundo Marcuschi “não é um repositário caótico de coisas e sim

um instrumento estruturado e estruturante, com grande dinamismo e capaz de se

reorganizar a todo momento” (MARCUSCHI, 1985).

Considerando essas premissas, pode-se observar que, a partir do input textual,

após a primeira leitura do segundo texto, o aluno Pedro retoma toda a história, organizando

suas ideias de forma que possa recriá-la, seguindo as pistas do texto narrativo É importante

ressaltar que em poucas linhas ele abarca os principais acontecimentos da história.

No primeiro texto (A dança do arco-íris), o aluno não reconta com essa

propriedade, com essa habilidade de seguir uma sequência dos acontecimentos; pode-se

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afirmar que ele desenvolveu uma leitura mais proficiente, mais complexa. Isso,

provavelmente, deve-se às experiências leitoras ocorridas na escola com os projetos

interdisciplinares e maleta

da leitura, práticas pedagógicas que incentivam de forma significativa a constituição de um

leitor autônomo, capaz de refletir sobre o que lê e produzir inferências de diversas origens.

a) De base contextual:

Foram selecionados alguns fragmentos da primeira leitura feita pelo aluno

Pedro, nos quais o mesmo constrói uma hipótese sobre a intenção de a índia ter deixado o

bebê na aldeia, pois além de preservar a vida do bebê, o aluno infere que ela (índia) queria

que seu filho “vivesse mais” e não foi isso o que ocorreu, pois a criança foi morta.

Pedro – PL (linhas 14-18): “Ah, é eu achei legal porque ela queria deixar o filho dela ...

ela queria que o filho dela vivesse mais do que ela, mas só que depois ele morreu mais

primeiro.

Pesquisadora: “Humm, e o que que você acha disso?”

Pedro – PL (linhas 17-18): “É, apesar dela ter esquecido, também eles podiam achar que

ela roubou, que a cobra roubou o filho de alguém, da aldeia”.

Ao finalizar o comentário sobre sua percepção da história, a pesquisadora

utiliza a mesma estratégia para verificar as relações que o aluno pode fazer desse texto com

outros:

Pesquisadora (linhas 20-21): E você quer comentar mais alguma coisa? Essa história é

parecida com alguma outra que você tenha lido?

Aluno Pedro - PL (linhas 22-23): Essa história é parecida com uma que a professora já leu

pra gente, que era a lenda de alguma coisa que eu esqueci, que falava quando o homem

tava indo pra floresta....

Aluno Pedro – PL (linhas 43-46): Ah, o outro que eu li era, ele... o homem foi esperto, ele fez

....ele criou as filhas com um material aí elas tiveram vida na manhã seguinte , mas só que

essa daqui, eu achei triste por causa que era a coisa que ela mais queria era ter um filho,

mas só que o filho dela morreu.

Após a intervenção da pesquisadora, o aluno faz o reconto da lenda que foi

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trabalhada pela professora, tecendo comparações entre os dois textos.

Análise:

Os aspectos dos comentários do aluno evidenciam processos inferenciais com

base nos seus conhecimentos de mundo, adquiridos em várias instâncias de sua vida.

O aluno

reproduz a ideia de que a ordem natural das coisas é que os mais velhos morram primeiro

que os mais novos. Essa ideia não está explícita no texto lido, ele inferiu a partir do que

Marcuschi (1985) denomina de universo cultural-cognitivo: o aluno insere dados que

contribuem para o processo de compreensão textual. Pode-se afirmar que esse tipo de

inferência é de natureza lexical e pragmática, já que o aluno, apesar da pouca idade,

demonstra a construção de ideias sobre a morte e sua representação, para as pessoas que

vivenciam esse acontecimento. Além disso, se sensibiliza com a morte do bebê que foi

uma tragédia na vida da personagem.

Nas passagens desta primeira leitura (linhas 23 e 24), ao ser indagado sobre

se ele conhecia outro texto parecido com o lido, o aluno relata uma lenda que a

professora contou, diferente daquela citada por ele nos comentários sobre o texto “A

dança do arco-íris”.

A criança diz que não lembra o nome da lenda contada pela professora, no

entanto, reconta essa lenda buscando recuperar toda a sequência da narrativa. Ao

comparar o texto 2 com essa lenda, ele chama a atenção para o final das filhas do

personagem principal, as quais ficam vivas, algo que não ocorre no final do texto 2, pois

a filha da índia-cobra é morta.

A comparação no último exemplo expõe elementos de morte e vida, uma

história com final triste e a outra com um final feliz. Pode-se afirmar que a comparação

intertextual é observada com mais complexidade nos comentários do texto 2.

Não foi observado algum tipo de inferência sem base textual e ou contextual.

Texto 2: A Origem do Oiapoque. Data: Agosto de 2014.

Sujeito pesquisado: Pedro Segunda leitura: SL.

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Texto 2/ Pedro – SL: A Dança do Arco-Íris, produção de inferências:

a) De base textual e contextual:

Nessa segunda leitura do texto 2, a pesquisadora inicia a conversa

questionando se o aluno lembra a história e ele reponde afirmativamente; após ler o texto

na íntegra, o aluno reconta a história, no entanto, traz outros elementos que não foram

expostos na primeira leitura:

Pesquisadora (linha 01): Já faz um tempo, né, que você leu? Não sei se você

lembra da história.

Aluno Pedro – SL (linha 02): lembrar, até que lembro.

Pesquisadora (linha 04): E aí? (após feita a leitura).

Aluno Pedro- SL (linha 5): Legal.

Pesquisadora (linha 06): Por quê?

Aluno Pedro - SL (linhas 08-14): Porque, lá que eu já tinha falado antes, que ela não tinha

comida, então a Tarumã quis ver se tinha mais alguma ilha que tivesse água e comida. Aí

ela foi, ela pediu pro Tupã pra ela se transformar em cobra, ele transformou ela, aí ela

passou meses andando...aí até que ela encontrou a ilha e também, antes eu não tinha

percebido que foram por causa dos fulgos... dos sulcos dela, porque o rio se tornou, porque

ela ia andando e a terra ia... ia abrindo. Aí quando ela começou a chorar, aí a choradeira

dela foi toda pra aquele lado. Aí se tornou um rio.

Aluno Pedro - SL (linhas 15-16): Ah, uma única coisa que eu não entendi, foi, é como eles

tiveram a ideia de dar o nome de Oiapoque pro rio.

Pesquisadora (linha 25): Qual foi a pergunta que você fez mesmo?

Aluno Pedro – Sl (linha 26): Porque esse rio ganhou o nome de Oiapoque?

Pesquisadora (linha 27): Por que que você acha?

Aluno Pedro - SL(linha 28): Humm, será que foi pelo nome da aldeia, ou por causa... ah,

não sei porque.

Pesquisadora (linha 29): Tem esses textinhos aqui do lado, será que eles podem nos ajudar?

Aluno Pedro – SL (linhas 44-46): Ah, eu... eu também quase cheguei pertinho da resposta

...eu ia falar que era o nome de uma aldeia, aí você pediu pra mim lê isso daqui ... mas eu

tava pensando em falar que era o nome de uma aldeia.

Análise:

Ao recontar a história, são produzidas inferências de base textual, pois o

aluno

Pedro, nas passagens entre as linhas 08 e 14, busca, ao ativar a memória, retomar toda a

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sequência do texto; no entanto, os trechos enfatizados na segunda leitura são diferentes dos

da primeira. Nesta, o aluno enfatiza a passagem em que a criança é morta pela aldeia, por

ela ter nascido de uma cobra, embora ele relate os acontecimentos ocorridos em

consequência desse ato e atrele os mesmos à origem do rio; naquela, o aluno apresenta um

olhar mais de indagação, ele se fixa em uma palavra: “fulgos.... sulcos” . Ele afirma que

foi por causa dos sulcos que ela criou e sua “choradera” que o rio formado.

Depois de ter recontado a história, quem faz a pergunta para a pesquisadora é o

aluno, indagando-a “Porque esse rio ganhou o nome de Oiapoque?” (linha 26). Ao retornar

a questão para o aluno, ele responde com um pouco de insegurança, por conta da aldeia. Ele

já sabia a resposta, mas queria uma confirmação que ocorreu após um diálogo entre a

pesquisadora e o sujeito pesquisado.

A pesquisadora não responde de imediato, sugere que o aluno leia os textos

informativos complementares e, quando ele verifica que estava certo, que o nome dado

ao rio foi por causa do nome da aldeia “Oiampi” e depois “Oiapoque”, sentiu-se

satisfeito. Desta forma, Pedro ao formular uma questão sobre a origem do título do texto

e seu enredo, busca apoiar-se em suas memórias de leituras anteriores que abordavam

elementos da cultura indígena, seguindo as pistas semânticas do texto: a escrita e o som

da palavra Oiapoque, para confirmar sua hipótese sobre a origem indígena do nome do

rio, com a sugestão da pesquisadora utiliza-se de outros textos informativos para

confirmar sua ideia.

Na segunda leitura do texto 2 - A origem do Oiapoque - a relação

estabelecida entre o sujeito e o texto lido é de diálogo e questionamentos elaborados a

partir do seu próprio entendimento do conteúdo textual. Nesta segunda leitura, torna-se

complexa a categorização das inferências produzidas, pois todas originam-se do input

textual, o aluno não faz extrapolações contextuais, o único momento em que isso ocorre é

quando ele vai buscar em sua memória, em seu conhecimento prévio, a associação entre a

lenda que é de origem indígena e o nome do rio.

Acredita-se que essa relação só foi possível pelos conhecimentos adquiridos

anteriormente, através de leituras de lendas indígenas propostas pela professora no

projeto interdisciplinar e em livros selecionados pelo aluno na sacola da leitura. Com

isso, foi possível a formulação da hipótese de que o nome do texto e do rio estão

associados ao nome da aldeia, pois todos os personagens da lenda são de origem

indígena.

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Essa estratégia é de origem metacognitiva, pois envolve uma reflexão sobre o

conhecimento, e “controlar nossos processos cognitivos são passos certos no caminho que

leva à formação de um leitor que percebe relações, e que forma relações com um

contexto maior, que descobre e infere informações e significados mediante estratégias

cada vez mais flexíveis e originais”. (KLEIMAN, 2008, p.10).

Texto 2/ Elisa – PL: A origem do Oiapoque, produção de inferências:

a) De base textual:

Após a leitura em voz alta, a pesquisadora questiona a aluna, a qual responde

prontamente:

Pesquisadora (linha 1): E aí? Você gostou da história? Não gostou? O que você achou?

Aluna Elisa – PL (linha 2): Eu gostei.

Pesquisadora (linha 3): Hum, e o que você pode me contar?

Em seguida, a aluna busca retomar a sequência da narrativa; em alguns

momentos, ela recorre ao texto, nos trechos em que não lembra a história de memória,

buscando uma palavra ou expressão. No entanto, no seu reconto, verifica-se uma

reconstrução da história com riqueza de detalhes:

Aluna Elisa –PL (linhas 04-17): Eu gostei porque eles viviam em uma aldeia, onde a fome

tinha atingido eles e havia pouca caça e quase nenhum peixe, e a seca acabara com as

plantações de mandioca, com as árvores frutíferas, aí a mulher tava grávida ... uma mulher

chamada (a aluna procura o nome no texto) Tarumã, ela estava grávida, ela decidiu sair

para achar um lugar onde tinha comida, é... água pra aldeia dela, aí ela pediu pro Tupã,

que queria ser uma cobra pra procurar né, aí quando ela, ela avisou e toda vez que ela

passava lá deixava uma rastro né, aí ela chamou o povo dela, ela tinha achado uma aldeia

... não uma aldeia, um lugar. Aí eles construíram as casas, tinha água, tinha comida, aí ela

foi lá e chamou, aí quando eles tavam indo, aí o bebê tinha nascido, aí a Tarumã teve a

filhinha dela bem na entrada do povoado né. Aí quando as pessoas viram que a criança

Texto 2: A Origem do Oiapoque. Data: 14 de agosto de 2014.

Sujeito pesquisado: Elisa. Primeira leitura: PL

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tinha nascido de uma cobra, acharam que fosse algum tipo de bruxaria mataram o bebê, aí

a Tarumã ficou louca de dor, mas não atacou sua gente expressou a tristeza dela com um

choro tão prolongado que as lágrimas preencheram os sulcos que seu corpo havia cavado

na mata, aí formou tipo um rio, porque ela era grande.

Análise:

Elisa apresenta operações inferenciais apoiando-se no input textual. O tipo de

inferência mais comum que esta apresenta, no primeiro momento da leitura com a

intervenção da pesquisadora, é o parafraseamento, de natureza lexical e semântica em que

ocorre a “alteração lexical para dizer a mesma informação sem alteração fundamental de

conteúdos proposicional”. (MARCUSCHI, 2008, p.255). Embora sua leitura seja

parafrástica, é importante ressaltar que a reorganização do texto lido não é caracterizada por

uma reprodução linear da narrativa; é perceptível que a aluna apropriou-se de modelos

estruturais de reconto de textos, onde pode-se afirmar que esquemas mentais são acessados,

estes “concebidos como estruturas flexíveis em dinâmicas, que estão em constante

reestruturação, de acordo com as informações que vão sendo processadas no decorrer das

várias atividades cognitivas que as pessoas realizam”. (MACHADO, 2006, p.289).

Desta forma, acredita-se que Elisa, em três anos em que permaneceu na escola,

pôde vivenciar cotidianamente atividades de leituras, já exemplificados no capítulo 2,

assim

como práticas de leituras que foram ampliadas para outros espaços, as quais contribuíram

para que a aluna ao final do 3º ano do ciclo I já seja capaz de construir de forma

sistematizada a sequência de um texto narrativo, de forma autônoma, utilizando de seu

próprio universo semântico.

b) De base contextual:

Em seguida ao reconto produzido pela aluna Elis, em sua primeira leitura do 2º

texto, a pesquisadora faz uma nova intervenção, com o objetivo de incentivar a aluna a

travar um diálogo mais efetivo com o texto:

Pesquisadora (linhas 26-29): Então você me contou toda a história né?! Então, eu quero

saber assim também, que parte você mais gostou? Se você conhece alguma outra história

que tenha a ver com essa, o que você pensou sobre ... quando tava lendo essa história, se

você lembrou de alguma outra.

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A partir desse questionamento, entre outras intervenções da pesquisadora, a

aluna procura interagir com o texto, elaborando suas respostas, produzindo inferências de

base contextual:

Aluna Elisa – PL (linha 30): Ah... eu gostei mais da parte que ela tava chegando na aldeia e

o bebê nasceu.

Pesquisadora (linha 31): Hum, por que?

Aluna Elisa – PL (linhas 32-33): Porque aí é...teve a filhinha bem na entrada do povoado,

quando as pessoas viram que era uma criança nascida de uma cobra, aí elas mataram o

bebê. Pesquisadora (linha 34): E você gostou disso? Que mataram o bebê?

Aluna Elisa – PL (linhas 35-36): Não, que eu achei legal que uma criança nasce de uma

cobra, uma criança normal.

Pesquisadora (linha 37): Ah, o que você achou de legal nisso.

Aluna Elisa – PL (linha 38): Porque eu nunca tinha visto uma criancinha nascer de uma

cobra né!

Aluna Elisa – PL (linhas 43-44): Eu também achei legal a parte que ela quis se transformar

em cobra só pra achar um lugar pro povo dela ficar.

Pesquisadora (linha 45): Hum, porque que você acha legal

isso? Aluna Elisa – PL (linha46): Porque ela tava ajudando

a família. Pesquisadora (linha 47): E você acha importante

isso?

Aluna Elisa – PL (linha 48): A aluna faz sinal que sim com a cabeça.

Pesquisadora (linha 49): Por que?

Aluna Elisa – PL (linha 50- 51): Ah, porque é a sua família, se tem que cuida dela,

agora eu tenho dois irmãozinhos, eu cuido deles.

Análise:

As inferências contextuais elaboradas por Elisa foram feitas em um contexto

de diálogo entre o texto, com a contribuição da pesquisadora, por meio de perguntas

direcionadas. A aluna fixou-se em duas passagens da narrativa: a primeira sobre o fato de

a criança filha da personagem ter nascido de uma cobra: para aluna esse fato é

improvável, pois a mesma relata que nunca vira um acontecimento desse antes, para ela

uma criança normal não nasce de uma cobra. Este tipo de inferência demonstra que a

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aluna, fez uma associação com suas vivências pessoais e o conhecimento prévio sobre

nascimentos de bebês, ela não faz uma alusão a esse acontecimento ser possível pelo fato

de a história tratar-se de uma lenda: a inferência feita por ela fica em um nível pragmático

e experienciais.

A segunda passagem da narrativa considerada por Elisa refere-se ao ato de

cuidar. O que chama a atenção da menina é a preocupação da personagem, transformada

em cobra, se preocupar com a sua aldeia: essa atitude valorativa fez a aluna produzir um

tipo de operação inferencial por associação lexical, semântica e pragmática, em que

ocorre a “afirmação de uma informação obtida através de saliências lexicais ou

cognitivas por associação de ideias”. (MARCUSCHI, 2008, p.255). Neste caso, a aluna

apoiou-se na pista textual sobre o ato de cuidar, presente no decorrer da história e,

associou essa expressão ao que ela entendia por cuidar, exemplificando com uma ação

do seu cotidiano que remete ao cuidado que sua família teve com ela e agora que cresceu

um pouco, ela que é responsável por cuidar o irmãozinho mais novo.

Texto 2/ Elisa – SL: A origem do Oiapoque, produção de inferências:

a) Base textual:

A segunda leitura do texto 2 ocorreu depois de quarenta dias de efetuada a

primeira leitura. A pesquisadora orienta a aluna sobre como deverá ser feita a leitura:

primeiro em voz alta e, em seguida, comentários sobre o texto; além disso, a pesquisadora

pergunta se Elisa lembra de ter lido a história e pede para comentar sobre algo que não tinha

dito na primeira leitura. A aluna diz que lembra que já leu esse texto. Após a leitura a

pesquisadora indaga:

Pesquisadora (linha 01): Então?

Com a intervenção de uma palavra, a aluna já inicia o reconto da narrativa,

demonstrando que Elisa se apropriou de um modelo de prática de leitura escolarizada, o reconto e,

Texto 2: A Origem do Oiapoque. Data: 24 de setembro de

2014.

Sujeito pesquisado: Elisa. Segunda leitura: SL.

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responde a indagação com a expressão: eu gostei justificando o porquê e desenvolve a construção

da narrativa através de uma leitura parafrástica,

Aluna Elisa – SL (linha 1): Ah, eu gostei, porque fala de uma mulher que morava em uma

aldeia que, muitos anos atrás né, a fome atingiu a aldeia dessa mulher né. Aí, ela tava

grávida né, e ela não ia consegui é...amamentar a filhinha dela que ela tava grávida né.

Entre as linhas 2 a 29, Elisa reconstrói toda a narrativa, com autonomia; no

entanto, em boa parte desse processo, a aluna lança o olhar para o texto, utilizando-o com

apoio, apresenta pouca autonomia para a prática do reconto do texto.

b) De Base contextual

Após o reconto, a pesquisadora pergunta:

Pesquisadora (linha 30): Humm, muito bom! E o que mais você tem pra dizer dessa história?

Como na primeira leitura, a aluna repete que acha estranho um bebê nascer de uma cobra:

Aluna Elisa SL (linha 32): Que... muito estranho né, um bebê nascê de uma cobra.

A partir de ssa afirmação, ocorre um diálogo entre pesquisadora e aluna,

apresentado a seguir:

Pesquisadora (linha 32): Isso é possível?

Aluna Elisa – SL (linha 33): Não, acho que

não. Pesquisadora (linha 34): E porque aqui é

possível? Aluna Elisa – SL (linha 35): Porque

é uma lenda.

Pesquisadora (linha 36): Humm, em uma lenda é possível acontecer isso?

Aluna Elisa – SL (linha 37):

Raram! Pesquisadora (linha 38):

Por que?

Aluna Elisa – SL (linha 39): Porque não é real.

Pesquisadora (linha 40): Mas nada que tá aqui é

real?

Aluna Elisa – SL (linha 41): Acho que só as aldeias né, que existe índio , né.

Pesquisadora (linha 42): Humm, muito bem!

Aluna Elisa – SL (linha 43): Mas as outras coisas, acho que não.

Pesquisadora (linha 47): Entendi. E essa história te fez lembrar de alguma outra que você já

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tinha visto?

Aluna Elisa – SL (linha 48): Não.

Pesquisadora (linha 49): Estudado em sala de

aula? Aluna Elisa – SL (linha 50): Não.

Pesquisadora (linha 51): Humm, nunca viu uma parecida com

essa? Aluna Elisa – SL (linha 52): Balança a cabeça que não.

Pesquisadora (linha 53): Entendi.

Pesquisadora (linha 54-55): Que seja uma lenda, por exemplo, que não fala da Tarumã, fala

de outras coisas, você lembra?

Aluna Elisa – SL (linhas 56-57): Nós já trabalhamos a lenda do guaraná, a da mandioca e

mais outras aí que eu não lembro.

Pesquisadora (linha 58): E o que elas têm em comum com

essa? Aluna Elisa – SL (linha 59): Nada.

Aluna Elisa – SL (linha 60): Mas eu só sei que nós trabalhou várias

lendas. Pesquisadora (linha 61): Então não tem nada em comum?

Aluna Elisa – SL (linhas 61-67): A do guaraná é que o menino foi picado pela cobra que era

o jurupai, o espírito do mal né, aí ele morreu. Aí o tupã .... eu acho que é o Mesmo Deus, o

tupã... é ... ele falou que era pra ...é... quando é, pra quando é, teve várias trovoadas né, mas

aí, o povo quando viu é que o indiozinho morreu né, que é o (?) e a mãe dele queria tanto

um filhinho, aí depois o tupã falou que era pra plantar os olhos do menino que ia nascê uma

planta milagrosa, que era o guaraná.

Pesquisadora (linha 68): Então você identificou né? Que é o Mesmo

Deus. Aluna Elisa – SL (linha 69): Balança a cabeça positivamente.

Pesquisadora (linha 70): Então você encontrou uma semelhança.

Aluna Elisa – SL (linha 71): Risos.

Análise:

Foi descrito, praticamente, todo o diálogo travado entre a pesquisadora e a aluna

Elisa, para que se compreenda o processo de produção de inferências de origem

contextual.

Como na primeira leitura, o que chama a atenção de Elisa é o fato de o bebê nascer de uma

cobra, pois, segundo ela, isso é estranho; na primeira leitura não havia muito o

desenvolvimento dessa ideia, no entanto, através do diálogo com a pesquisadora, a aluna

chega à conclusão que, por ser uma lenda, isso não é real, ou seja , ela consegue avaliar que

somente a possibilidade de uma cobra ter um bebê humano é em uma lenda, ainda verifica

que embora aconteçam situações fantasiosas em uma lenda, é possível também aparecerem

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objetos e lugares que existem. Como é o caso citado por ela, que existem índios e aldeias.

Elisa, a partir de uma relação dialógica com o texto e com a pesquisadora, consegue

identificar de forma pragmática uma das características do gênero lenda, trabalhada em

sala de aula, como a própria aluna expõe. Desta forma, torna-se possível afirmar que a

aluna, na relação com o texto, elabora inferências de base contextual pragmática

experiencial; cognitivas analógicas, ao se posicionar como leitora, atingindo um

horizonte máximo de compreensão textual, por meio de inferências possíveis. A

compreensão ocorre pela reunião de várias informações do próprio texto, tais como:

elementos naturais e míticos; personagens recorrentes em outras lendas; um enredo que

explica a origem de algo, seja um rio, uma planta, etc. São marcas textuais, as quais

permitiram que a aluna fizesse associações intertextuais e as relacionasse com outros

tipos de informações, sejam elas de conhecimentos pessoais entre outros que não estão no

texto, mas que contribuem na geração de sentidos e compreensão leitora.

Dando continuidade ao diálogo, a pesquisadora pergunta se a aluna estudou

algum outro texto que se parece com o lido; Elisa diz que não reiteradamente, no entanto,

quando conta para a pesquisadora sobre uma lenda estudada em sala de aula, ela verifica

que o nome Tupã, ou melhor, o Deus Tupã, aparece em ambas as histórias e percebe, com

a ajuda da pesquisadora, uma semelhança entre os dois textos , produzindo inferência de

base contextual, associativa pragmática conversacionais, em que, através de uma

informação obtida no texto, há uma associação de ideias.

Texto 2/ Luís – PL: A origem do Oiapoque, produção de inferências:

a) Base Textual:

Após feita a leitura em voz alta, ocorre o seguinte diálogo entre a pesquisadora

e o aluno Luís:

Pesquisadora (linha 2): E aí? O que você achou? O que que você me conta (após a leitura).

Aluno Luís – PL (linha 3): Legal.

Texto 2: A Origem do Oiapoque. Data: 15 de agosto de 2014.

Sujeito pesquisado: Luís. Primeira leitura: PL.

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Pesquisadora (linha 4): É!

Aluno Luís – PL (linha 5): Porque essa história... posso reler tipo isso... reler só que não

ler, conta!

Pesquisadora (linha 6): Sim.

A partir da resposta afirmativa da pesquisadora, Luís inicia o reconto da

história: Aluno Luís – PL (linhas 07- 15) Que, muitos anos atrás, uma aldeia ficou com

muita fome, aí as crianças que ficou doente, os bebês e os velhos tavam morrendo... só que

a Tarumã, eu acho que é Tarumã mesmo, tava grávida, aí ela fugiu pro seu bebê não

morrer, aí com fome e sede, ela pediu, acho que foi pra Deus, sei lá quem aí, transformar

ela em cobra, aí não sei quando aí, ela virou cobra mesmo, aí, finalmente, uns meses, ela

achou a aldeia e ficou toda alegre. Aí os índios que viram o bebê, tipo filho da cobra, aí

acharam que era bruxaria e matou o bebê, aí a cobra ficou triste, mas mesmo assim não

quis matar os índios, aí o resto eu já esqueci... não sei que aconteceu aí que eu já esqueci.

Ah, ela foi pro mar, aí de tanto ela chorar, o mar tipo aumentou.

A pesquisadora indaga o aluno Luís:

Pesquisadora (linha 16): o mar?

O aluno segue com o reconto:

Aluno Luís – PL (linhas 17-19): Deixa eu ver se é o mar (procurou informação no texto),

foi no rio né .... “o rio transborda forma-se uma grande alagado”(trecho lido pelo aluno).

Aí por isso que agora o rio é chamado... tem um nome, ganhou um nome de Oiapoque.

Após o reconto:

Pesquisadora (linha 20): Muito bem!

Aluno Luís – PL (linha 21): Por isso que é a origem do Oiapoque.

Análise:

A pesquisadora faz uma intervenção inicial após a primeira leitura do texto 2:

sobre a opinião do aluno com relação ao texto lido, ele diz que achou legal. Ao ser

solicitado para contar o que achou interessante no texto, Luís pergunta se, ao invés de reler,

ele pode contar. Muito importante essa fala do aluno: possibilita constatar que o mesmo

prefere contar ao reler a história. O que essa postura diante do texto revela? É uma

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indagação muito pertinente que deve ser investigada, pois o contar mobiliza muito mais

elementos psicolinguísticos do que a atividade de ler, reproduzindo literalmente as palavras

contidas no texto.

O reconto do texto é construído através de uma leitura parafrástica, sendo que

um elemento que caracteriza a leitura deste aluno é a reflexão permanente no decorrer do

processo de reelaboração textual. Luís apresenta uma autonomia durante o reconto, mas

demonstra algumas dúvidas com relação a nomes, significados, marcadores temporais, o

que não impede que o mesmo compreenda a história; as estratégias metalinguísticas que

Luís faz uso contribuem para a sua compreensão textual, demonstrando assim uma

flexibilidade na leitura, característica de um leitor proficiente, pois “ele não tem apenas um

procedimento para chegar aonde ele quer, ele tem vários possíveis, se um não der certo,

outros serão ensaiados”. (KLEIMANM, 2012, p.76).

b) Base contextual

Finalizado o reconto e questionado novamente pela pesquisadora se o aluno tem

mais alguma coisa para contar, Luís:

Aluno Luís – PL (linhas 23-24): Posso ler esses pedacinhos aqui ó, que tem? (o aluno se refere aos

textos informativos que estão nas quatro pontas das páginas).

Pesquisadora (linha25): Pode.

Aluno Luís – PL (linhas 26-27): Estranho ... agora não tô entendendo, se aqui tarumã é a cobra né,

e aqui a tarumã é uma árvore ou cidade ou fruta, agora já não tô entendendo não. Confundiu tudo

agora.

Pesquisadora (linha 28): Ah, você acha que confundiu tudo?

Aluno Luís – PL (linhas 29-32): É porque aqui tá falando que tarumã é uma cobra...na verdade é

uma índia cobra né, e aqui , depois que eu li esse pedacinho, piquititico, eu vi que tarumã uma ....

“tupi quer dizer fruta que dá em cacho, o côco é uma das outras frutas também chamadas de

tarumã e a árvore é chamada também de tarumã”( trecho lido do texto informativo).

Pesquisadora (linhas 33-34): Então, porque será que é diferente? Em um texto a tarumã é uma coisa

e no outro texto a tarumã é outra? Por que você acha?

Aluno Luís – PL (linha 35): Ah, eu não sei!

Pesquisadora (linha 36): Imagina! O que que você pode pensar?

Aluno Luís – PL (linhas 37-38): Eu acho que tarumã ficou tão famosa assim, que deu o nome

também de árvore e frutas.

Pesquisadora (linha 39): Porque ela ficou famosa, ah entendi.

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Aluno Luís – PL (linha 40): Tipo isso, ficou tão conhecida assim.

Pesquisadora (linhas 41 - 43): E esse texto, é um tipo de que texto, esse aqui que você leu

grande, que fala da índia tarumã? Que tipo de texto?

Aluno Luís – PL (linha 44): Lenda.

Análise:

O suporte apresentado pela pesquisadora para o aluno, onde o texto foi

veiculado, faz parte de um livro sobre a história do Brasil; nas duas páginas em que se

encontra o texto, existem alguns textos informativos complementares, como exposto na

página 29 deste trabalho. Na sequência do reconto, o aluno Luís, talvez com objetivo de

obter mais informações sobre o texto narrativo, pede para ler os “pedacinhos” dos textos

informativos que se encontram nas laterais das páginas.

A leitura do texto complementar gera no aluno muitas dúvidas, sobretudo

quanto ao significado da palavra Tarumã: Luís diz não estar entendendo nada, no

entanto, busca fazer associações mentais e contextuais sobre o que significa Tarumã,

considerando as informações dos textos lidos, em que o referente Tarumã tem diversos

significados. Na dúvida gerada pelos significados distintos nos textos, Luís busca uma

saída para seu questionamento, concluindo que Tarumã ficou famosa (a índia cobra) e

que, diante disso, seu nome foi dado para árvores de frutas. Dessa forma, ao acessar

informações vivenciadas sobre lendas e ter aprendido sobre alguns elementos que

caracterizam uma lenda, Luís produz inferências de base contextual pragmáticas

conversacionais, experienciais e cognitivas analógicas.

Texto 2/ Luís – SL: A origem do Oiapoque, produção de inferências:

a) De base textual e contextual:

Optou-se, neste item, por apresentar dados da segunda leitura do texto 2, feita

pelo aluno Luís que estejam relacionadas a duas origens de inferências textuais e

contextuais, pois Luís intercala com suas opiniões, à medida que vai reconstruindo o

reconto do texto. Ele não faz o reconto e em seguida elabora inferências contextuais. Há

Texto 2: A Origem do Oiapoque. Data: 25 de setembro de

2014.

Sujeito pesquisado: Luís Segunda leitura: SL

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uma interlocução entre a busca pela reprodução do texto e uma postura de diálogo com o

mesmo, como é apresentado a seguir:

Pesquisadora (linha 1): Muito bem, e aí? (após a leitura )

Aluno Luís – SL (linhas 02 - 12) É, eu gostei porque fala de uma mulher, a Tarumã, acho que é o

nome, que ... a aldeia dela que tava tudo... ela ficou doente, morrendo, ela quis fugir pra salvar seu

filho, não tinha comida e nem água, ela pediu para tupã transformar ela em cobra. Aí , ela achou

.... esqueci o lugar, que tinha água e comida e frutas. Aí, quando ela foi chamar o povo, ela

esqueceu de falar pra tupã desfazer o pedido, aí o bebê tinha nascido quando ela chegou perto do

povo, aí todo mundo pensou que era bruxaria, porque uma criança nascer de uma cobra. Até que

isso não é comum né? (risos). Aí, mataram o bebê, aí a cobra Tarumã chorou, não sei, formou um

riacho, um rio, aí quanto mais ela chorava, mais aumentava, até que, e foi assim que esse rio

ganhou o nome de Oiapoque, agora entendi porque o nome é a origem do Oiapoque.

Pesquisadora (linha 13): Ah, você entendeu então? Por quê?

Aluno Luís – SL (linha 14): E agora? Não sei.

Pesquisadora (linha 15): Você falou que entendeu...

Aluno Luís – SL (linhas 16 -17): É a origem do Oiapoque porque aqui fala, que por conta das

lágrimas da cobra, fez um rio né que ganhou o nome Oiapoque.

Pesquisadora (linha 18): Muito bem.

Análise:

Após a intervenção da pesquisadora, o aluno responde que gostou da história

e inicia o reconto, de forma mais autônoma em comparação com a primeira leitura deste

mesmo texto. Passou mais de um mês entre uma leitura e outra nesse ínterim, o aluno pode

ter refletido mais sobre o texto, ter lido outros e experimentado outros momentos de leitura

em sala de aula. A aparente autonomia não gerou certezas absolutas com relação ao

conteúdo textual. O aluno faz uma leitura parafrástica, articulada com reflexões e lapsos de

memória em que ele mesmo se questiona, sobre suas análises e certezas e assim vai

produzindo inferências de base contextual pragmática e avaliativa: avalia a todo momento

suas atitudes diante das informações textuais e compara com conhecimentos prévios sobre a

relação entre o enunciado com a história de Tarumã e a origem do rio Oiapoque. O aluno

demonstra estratégias metacognitivas ao verbalizar suas reflexões, dúvidas e busca de

respostas às suas próprias dúvidas a partir do input textual.

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4.3. Texto “Romãozinho”

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Figura 4: Livro: Viagem pelo Brasil em 52 Histórias. Ilustração de Cárcamo.

Este terceiro texto utilizado na pesquisa possui as mesmas características dos

anteriores. Contudo, ao ser escolhido, foi considerada uma história popular que já havia

sido lida e discutida pela professora em sala de aula, a qual fazia parte da bibliografia

adotada por ela no projeto desenvolvido no terceiro ano do ciclo I. Esta estratégia foi criada

por se acreditar que, ao ler um texto já conhecido, em determinado contexto de mediação

escolar, os alunos seriam capazes de construir diversas relações e ampliar a produção de

inferências de base contextual.

O texto inicia com a apresentação de Romãozinho (linhas 1-3), suas

características de personalidade e a comparação com as personalidades de seus pais, que

eram bem diferentes da sua.

Entre as linhas 4 e11, ocorre a primeira ação do personagem, que encadeará as

demais, ou seja, o menino inventa uma história para o pai. Não é uma história simples,

comum, com intuito de entretenimento, sem maiores consequências na vida das pessoas

envolvidas na ação, mas uma história com conteúdos de traição, maldade, de “quebra” de

confiança do pai sobre a honestidade e fidelidade da mãe, com possibilidade de

consequências trágicas.

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Após ouvir a história contada por Romãozinho, sobre a traição da mãe, o pai

decidiu “tomar” satisfação com a mulher sobre o ocorrido, entre os trechos 12 e 16; não

acreditando na versão da mulher, o homem se vinga da traição “enterrando uma faca no

peito da mulher” – atitude decorrente do desespero ou talvez pela necessidade cultural de

“lavar a honra”.

Nas passagens seguintes (linhas 17-19), a mãe, antes de morrer, joga uma

“praga” no filho como forma de se vingar pelo ocorrido. A mãe deseja que o filho nunca

morra, que viva para sempre, que nunca descanse dessa vida e jamais tenha sossego. Na

linha 20, o pai morre de desgosto por ter matado a mulher.

Na linha 21, o texto expõe a falta de compaixão e sensibilidade de

Romãozinho diante da tragédia ocorrida na sua família em consequência de suas atitudes.

Nas passagens entre as linhas 25 e 28, são relatadas todas as maldades cometidas por

Romãozinho, depois de passado algum tempo, não se sabe ao certo quanto; no entanto,

pode-se inferir que esses acontecimentos são mais contemporâneos. Ainda é evidenciado

o medo que as pessoas sentem ao serem vítimas de tal criatura.

Entre as linhas 29 e 32, ocorre a finalização da história: há o relato de mais

uma maldade de Romãozinho, sendo também descrito que ele foi visto se transformando

em um fogo azul, na região da Chapada dos Veadeiros, e afirma que sua sina será vagar

eternamente pelo mundo fazendo maldade com as pessoas.

4.3.1. Análise de dados primários sobre compreensão leitora e

produção de inferências.

Texto 3/ 1ª leitura: Romãozinho, produção de inferências:

A escolha do terceiro texto para pesquisa seguiu os mesmos critérios dos dois

anteriores. Contudo, foi acrescentado mais um objetivo durante a obtenção de dados

sobre as produções de processos inferenciais e compreensão leitora, pois este texto era

conhecido pelos alunos pesquisados: ele fora utilizado em sala de aula pela professora

como subsídio para o desenvolvimento do projeto interdisciplinar “Viajando pelo Brasil,

desvendando minhas origens”.

Texto 3: Romãozinho. Data: Novembro de 2014. Sujeito

pesquisado: Pedro. Primeira leitura: PL.

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Considerando esta informação, a pesquisadora elaborou questões que

pudessem verificar se nas falas dos alunos apareceriam relações entre o texto lido no

momento da pesquisa e as leituras conduzidas pela professora em sala de aula.

a) De base textual:

Após a leitura efetuada pelo aluno, a pesquisadora usa a mesma estratégia de

pesquisa apresentada anteriormente, ou seja, uma pergunta bem genérica.

Pesquisadora (linha 01): Muito bem, e aí?

Aluno Pedro – PL (linhas 02-08): Fala que ele, o Romãozinho, era malcriado e era preguiçoso,

os pais dele eram boas pessoas, aí um dia a mãe pediu pra ele levar o almoço do pai, mas aí

quando tava no caminho, ele comeu toda galinha, aí ele levou pro pai, aí ele enganou o pai

falando que a mãe dele e outro homem tinham comido a galinha e botado os ossos na cesta pra

ele trazer, aí o homem ficou furioso e matou a mulher. Aí, antes da mulher, da mulher dele

morrer, ela amaldiçoou ele, aí até hoje ele ainda fica vagando pelas ruas, maltratando os

bichos, dando nó no rabo dos cavalos e dando medo nas pessoas.

Análise:

Ao responder à questão proposta pela pesquisadora, o aluno não emite sua

opinião

sobre o texto, como fez nos anteriores. Ele inicia o reconto dizendo “fala que” (o texto):

isso demonstra que o aluno, objetivamente, opta pelo recurso do reconto; na primeira

leitura de cada texto, essa prática é recorrente.

As inferências de base textual aparecem nos comentários, no decorrer do

procedimento de retomada da sequência do texto, com ênfase nos personagens, ação e

desenlace da trama. Considerando os elementos textuais mencionados, a natureza das

inferências produzidas são: lógica, lexical e semântica (parafraseamento), por apresentar a

partir das marcas textuais, uma sequência de acontecimentos que busca reproduzir o enredo,

atenta-se para uma lógica do desenvolvimento da história, sem suprimir momentos

importantes da narrativa.

Há a preocupação do aluno em reproduzir a história na íntegra, utilizando suas

próprias palavras. Percebe-se que, ao recontar essa lenda, o aluno demonstra bem mais

segurança do que apresentou ao recontar o primeiro texto desta pesquisa. Talvez por já

conhecê-lo, por já ter se apropriado com mais autonomia do processo de reconto e

comentários sobre o que foi lido.

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b) De base contextual:

Ao término do reconto, a pesquisadora introduz uma questão direcionada, com

o objetivo de verificar se o aluno faz relações com os conhecimentos adquiridos no projeto

desenvolvido pela professora. Segue o trecho do diálogo:

Pesquisadora (linha 09): E, você já conhecia essa história?

Aluno Pedro – PL (linha 10): Já, na sala a gente já tinha lido essa história.

Pesquisadora (linha 11): Hum, a professora deu esse texto pra vocês já? Ela deu esse texto pra

explicar o que?

Aluno Pedro - PL (linha 12 - 13): É, ela deu pra explicar... é a gente começou a fazer o centro-

oeste, aí a gente começou com a história de Goiás.

Pesquisadora (linha 14): Hum, vocês estudaram o centro-oeste por quê? Faz parte do que?

Aluno Pedro – PL (linhas 15-16): Faz parte do projeto que a gente tá fazendo ... é ... é, só não

lembro o nome (fica pensativo).

Pesquisadora (linha 17): O que vocês estudam nesse projeto?

Aluno Pedro – PL (linhas 18-19): A gente tá estudando todas as regiões, a gente estudou o

norte, agora a gente tá no finalzinho do nordeste e tá começando o centro-oeste.

Pesquisadora (linha 20): Hum, que interessante.

Aluno Pedro – PL (linha 21): Aí, depois a gente vai pro sul.

Análise:

Partindo do input textual, a pesquisadora indaga ao aluno se já conhecia a

história,

o qual responde afirmativamente à questão, diz que a professora já leu esse texto em sala de

aula; isso sugere que o aluno acionou operações sociocognitivas, com base no seu

conhecimento prévio de leitor/ouvinte, contido em sua memória.

Em seguida, a pesquisadora questiona o aluno Pedro se a “professora deu o

texto para explicar o quê?”, visando detectar se o aluno, através do estudo de textos

literários, mais especificamente um conto popular brasileiro (Romãozinho), estabeleceria

conexões com os conteúdos desenvolvidos no Projeto interdisciplinar (ciências, geografia e

história), já citado anteriormente.

O aluno Pedro associa esse texto ao projeto, dizendo que eles (alunos da sala)

começaram a fazer o centro-oeste e a história de Goiás. Ainda explica que, no projeto,

estudam as regiões, elenca as já estudadas e as que faltam estudar.

Pode-se afirmar que, a partir da leitura do texto e com as perguntas direcionadas

pela pesquisadora, o aluno produz inferências de base contextual pragmáticas experienciais

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e cognitivas, esquemáticas e analógicas. (MARCUSCHI, 2008), no momento em que os

aluno, a partir da materialidade do texto, associa seu conhecimento sobre regiões

geográficas brasileirasc retiradas da história aos conteúdos do projeto interdisciplinar.

Demonstrando suas experiências adquiridas em estudos anteriores, as quais são acessadas

na releitura do texto Romãozinho durante a pesquisa.

É importante ressaltar como é significativo para o aluno a prática de projetos

desenvolvido pela professora desde o primeiro ano de sua turma; isso aprece mais

efetivamente na segunda leitura do texto Romãozinho.

A seguir, será analisado o segundo grupo de inferências contextuais obtidas após

o término do diálogo já exposto. A pesquisadora questiona o aluno:

Pesquisadora (linha 32): E você queria falar mais alguma coisa a respeito dessa?

Aluno Pedro – PL (linhas 33-34): Ah, quando a professora leu pra gente, eu faço a mesma

pergunta: por que ele era tão malcriado se os pais dele eram tão bonzinhos?

Pesquisadora (linha 35): Você ficou com essa dúvida? Por que será hein? O texto explica

isso?

Aluno Pedro - PL (linha 36): Não muito.

Pesquisadora (linhas 37): Não né? E o que você acha? Que explicação você pensa pra isso?

Aluno Pedro - PL (linhas 38-39): Vai ver os pais dele criaram ele bem e depois ele, que

quando foi crescendo foi se tornando malcriado.

Pesquisadora (linha 40): Por que você acha que isso pode acontecer?

Aluno Pedro – PL (linhas 41-42): Por que já várias famílias, elas criaram o filho educado,

aí depois eles vão crescendo e ficando malcriados.

Pesquisadora (linha 43): E porque você acha que isso pode acontecer?

Aluno Pedro – PL (linhas 44-45): É, porque ... às vezes... é, por causa de um amigo, de

alguma coisa que deixou ele nervoso.

Pesquisadora (linha 46): Hum, você acha que pode ser isso então?

Aluno Pedro – PL (linha 47): A companhia né, de algum amigo.

Análise:

Novamente, o aluno dialoga com texto, busca respostas para dúvidas surgidas

na

interação dialógica entre leitor e texto. A questão apresentada pelo sujeito pesquisado é

universal, pode-se caracterizar como um questionamento de dilema humano, ou seja, ele

quer saber por que uma pessoa, ou criança (Romãozinho), era tão malcriada se os pais eram

tão bonzinhos.

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O nível de compreensão do aluno extrapola os aspectos de pura decodificação

textual e de produção de inferências de base apenas textual, com ênfase na preocupação de

seguir somente uma sequência da narrativa. O aluno sensibiliza-se com o acontecimento

trágico: o pai mata a mãe em consequência de uma mentira inventada pelo filho (a traição

da mãe com outro homem) e, a partir disso, elabora questionamentos para entender o fato.

A pesquisadora, ao devolver a pergunta para o aluno, obtém como resposta que

várias famílias educam bem seus filhos. Na concepção do aluno, várias crianças vivem em

um ambiente familiar bom, no entanto, mesmo assim, quando crescem, ficam malcriadas e

o motivo disso seriam as companhias. Provavelmente, essa afirmação está atrelada

ao seu universo cultural cognitivo, às crenças vivenciadas pelo aluno, seja no ambiente

familiar, nas orientações religiosas divulgadas em espaços para esse fim e na própria

vivência escolar.

Texto 3/ 2ª leitura: Romãozinho, produção de inferências:

a) De base contextual:

Ao término da leitura em voz alta, a pesquisadora, como de praxe, inicia o

diálogo com um breve “...e aí?”. Ao invés do reconto, o aluno faz uma série de

associações a partir do texto lido com histórias de assombração brasileiras; ele cita vários

personagens do universo da cultura popular: são feitas algumas relações com o saci-

pererê e o aluno diz, com convicção, que as histórias lidas por ele aconteceram na

Chapada dos Veadeiros, onde se passa a história de Romãozinho.

Verifica-se que o aluno Pedro, em sua segunda leitura do texto 3, a partir da

história, busca fazer todas as relações possíveis com outras leituras de textos literários,

também de outros gêneros e faz um percurso de ir e vir ao retomar o texto base. São

muitas informações inferenciais que ele traz de origem intertextual e contextual. Para

análise, optou-se em retomar um trecho em que o aluno, ao voltar o olhar para o texto,

constrói uma rede de relações entre a narrativa Romãozinho e, algumas atividades de

leitura desenvolvidas em sala de aula, a partir da prática de projetos interdisciplinares.

Texto 3: Romãzinho. Data: Novembro de 2014. Sujeito

pesquisado: Pedro. Segunda leitura: SL.

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Já foram expostas, em momentos anteriores, essas relações produzidas pelo

aluno no processo de compreensão de textos e produção de inferências; no entanto, os

trechos a seguir apresentam um detalhamento de significados das diversas leituras feitas

pelo sujeito pesquisado e sua capacidade de tecer relações, ao ponto de criar links de

diversos contextos, sem correr o risco de produzir inferências falseadoras.

Seguem os diálogos entre pesquisadora e aluno:

Aluno Pedro – SL (linha 27): Esse texto aqui é do centro-oeste, não é?

Pesquisadora (linha 28): É do centro-oeste. Aluno

1B (linha 29): Então é do centro-oeste.

Pesquisadora (30): Como você sabe que esse texto é do centro-oeste?

Aluno Pedro –SL (linhas 31-33): É porque a gente já tinha lido na sala e a gente tava fazendo é ... o

projeto “Viajando pelo Brasil desvendando nossas origens”, aí a gente foi do norte pro nordeste, aí

a gente estudou o centro oeste, aí a gente estudou o sudeste e agora a gente tá no sul.

Pesquisadora (linha 34): Em todas essas regiões vocês leram algum texto?

Aluno Pedro – SL (linha35): Sempre alguma lenda ... tem de pessoas ... de como surgiu a mandioca,

o guaraná.

Pesquisadora (linha 36): E essas lendas ajudaram vocês a compreenderem a região?

Aluno Pedro – SL (linha 37): Sim, e a compreender também os negros ...

Pesquisadora (linha 38): E o que mais?

Aluno Pedro –SL (linhas 39-40): Os negros eram bem maltratados pelos portugueses .... eles davam

comida no chão pra eles.

Pesquisadora (linhas 41-42): Ah, entendi. Estudando as regiões do Brasil vocês foram vendo como

era o dia a dia da época da escravidão, né?

Pesquisadora (linha 43): É importante saber dessas coisas né? Da nossa história né?

Aluno Pedro - SL (linhas 44- 46): A gente estudou a história do Chico Rei, que falava de um homem

que era escravo, aí sua família também foi, aí ele foi separado da família só ficou seu filho, aí eles

começaram a libertar os escravos colocando pó de ouro no cabelo.

Pesquisadora (linha 47): E como que eles libertavam com esse pó de ouro?

Aluno Pedro –SL (linhas 48-49): Eles iam economizando, aí eles falavam com o ... com o moço pra

ele... aí eles davam pó de ouro ... aí eles libertavam ....

Pesquisadora (linha 50): E compravam a liberdade. E você sabe o que eles compravam, como era o

nome?

Pesquisadora (linha 51): Carta?

Aluno Pedro – SL (linhas 52-53): De... a professora, a gente escreveu um texto, aí ela falou o nome,

mas acabei esquecendo.

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Pesquisadora (linha 54): Carta de alforria.

Aluno Pedro - SL (linha 55): É isso daí.

Pesquisadora (linha 56): Pra ficar livre, né?

Pesquisadora (linha 57): Isso mesmo, muito bem!

Análise:

Durante a produção de comentários, após o aluno expor todo seu conhecimento

sobre histórias de assombração, ao voltar ao texto, ele faz uma pergunta para a

pesquisadora, praticamente uma afirmativa, “se o texto é do centro-oeste”. A reposta dada

pela pesquisadora confirma sua dúvida e retorna a questão para o aluno: como você sabe

que esse texto é do centro-oeste?

A partir desse questionamento, o aluno explica que, através do projeto

“Viajando pelo Brasil, desvendando nossas origens”, eles (fala em nome da turma)

estudaram sobre todas as regiões e aprenderam várias lendas, como ele mesmo diz, sobre

as pessoas, o guaraná, a mandioca. Cabe ressaltar que, através dos estudos de textos de

caráter literário, o aluno teve a oportunidade de conhecer vários aspectos das regiões

estudadas: cultura, geografia e história.

Além do que foi exposto, chama a atenção as relações feitas pelo aluno a

partir da leitura do texto 3, como o tratamento dado aos negros pelos portugueses na

época da escravidão no Brasil, e relata, de forma sucinta, mas com muita propriedade, a

história de um personagem real da história do Brasil.

A questão que se coloca é: o que permitiu que o aluno fizesse tantas relações?

Pode-se afirmar que o universo cultural-cognitivo deste aluno é consequência das práticas

de leitura, sobretudo literária, adquirido em várias situações de aprendizagem promovidas

pela professora e que ultrapassaram os muros da escola, ficando internalizada e gerando

no aluno o hábito e o gosto por ler, contribuindo para formação de um sujeito na faixa

etária entre 08 e 09 anos, o qual lê e compreende de forma crítica e proficiente.

Existe um discurso muito proliferado pelos professores alfabetizadores: as

crianças moradoras de regiões periféricas e estudantes em escolas públicas não

conseguem ler e escrever, pois têm muitos problemas familiares e psicológicos que

atrapalham seu desenvolvimento. Muitos desses professores subestimam essas crianças e

optam, na maioria das vezes, pelo uso de metodologias de ensino de leitura e escrita

focadas na decodificação e memorização de textos, desconsiderando a importância da

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imaginação e criatividade como componentes essenciais ao desenvolvimento intelectual,

social e cultural de seus alunos.

O que foi descrito nestes dados analisados, sobre a leitura de uma criança do

3º ano do ensino fundamental, ciclo I, refuta esse discurso produzido e reproduzido

durante anos pelos profissionais da educação do ensino fundamental I.

Texto 3/ 1ª leitura: Romãozinho, produção de inferências:

a) De base textual e contextual:

Optou-se por apresentar as inferências de base textual e contextual, produzidas

pela aluna Elisa – primeira leitura do texto Romãozinho, em um mesmo item, pois a aluna,

após a leitura em voz alta, faz um reconto argumentativo; portanto, não se pode fazer uma

análise descolada entre inferências de base textual e contextual, já que a mesma, no decorrer

da reprodução textual, vai tecendo comentários, em constante diálogo com o texto.

A seguir, o diálogo entre a pesquisadora e a aluna Elisa sobre a primeira leitura

do texto 3:

Pesquisadora (linha 01): E aí?

Elisa – PL (linha 02): Eu gostei, né!

Pesquisadora (linha 03:) Por que que você gostou?

Elisa – PL (linhas 04 - 16): Sim e não né? Porque o Romãzinho era malcriado e preguiçoso, ele

fazia só coisa ruim, né. E, quando a mãe dele pediu pra levar comida lá pro pai dele... o pai dele

que tava lá trabalhando na roça.... é, ele atendeu com má vontade .... no caminho ele abriu a cesta e

comeu tudo e foi lá e levou pro pai dele,né! e ele inventou uma brincadeira que a mãe dele

almoçava galinha com homem que vai lá na casa dele quando o pai tá trabalhando, né! e falou que

quando eles acabaram de comer colocaram tudo os ossos na cesta pra ele levar né. Aí o homem

tava trabalhando na terra havia horas... aí ele tava louco de ciúmes e raiva né.... ele foi lá pra casa

dele correndo né , ele pegou a faca e enterrou no peito da mulher , a mãe dele acabou morrendo por

causa de uma brincadeira que ele fez e aí ela amaldiçoou ele né. Enquanto o mundo existir ele vai

ficar vivo ainda, aí é o homem depois logo morreu né, porque ele ficou doente de desgosto né. O

menininho nem se abalou, o Romãozinho, porque ele não era bonzinho, senão ele ia ficar triste. Aí,

Texto 3: Romãozinho.

Data: 18 de Novembro de 2014. Sujeito pesquisado: Elisa.

Primeira leitura: PL.

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conta na história que ele ganhou o mundo, né.

Aluna Elisa – PL (linhas 20-21): Aí é, quando a mãe dele morreu e amaldiçoou ele, é como se o

tempo tivesse parando na vida dele né, porque maldição de mãe pega (risos).

Pesquisadora (linha 27): E o que você acho dessa “brincadeira” aí, que ele fez com o pai

dele?

Aluna Elisa – PL (linha 28): Muito feio.

Pesquisadora (linha 29): Será que isso é brincadeira, mesmo? O que você acha que é?

Aluna Elisa – PL (linhas 30-31): Que não ama a mãe, que não ama o pai, acha que é uma

brincadeira legal, mas na verdade não é. Destruiu a própria família dele.

Pesquisadora (linhas 34-35): E você queria falar mais alguma coisa Elisa, a respeito do texto, assim,

que você lembra? Você já conhecia esse texto?

Aluna Elisa – PL (linha 36): Sim, nós já leu lá na sala.

Pesquisadora (linha 37): Ah!

Aluna Elisa – PL (linhas 38-39): E quando eu cheguei em casa eu fui ler lá pra minha mãe e pra

minha madrinha, que tava lá, né! Aí, elas falaram também do texto.

Pesquisadora (linha 40): Você leu esse texto pra sua mãe e sua madrinha?

Pesquisadora (linha 41): Ah! E porque você leu esse texto pra elas?

Aluna Elisa – PL (linha 42): Porque eu gosto de ler ...

Análise:

A partir da intervenção da pesquisadora (linha 1), Elisa inicia o reconto

dizendo que gostou do texto, no entanto quando indagada pela pesquisadora (linha 3), a

aluna diz que gostou e não gostou e, passa a tecer comentários sobre o mesmo, recuperando

a sequência da narrativa através de uma leitura parafrástica, em interface com elementos

argumentativos. Entre as linhas 04 a 16, no processo de compreensão do texto, Elisa busca

seguir uma linearidade de acontecimentos e introduz inferências de base contextual

pragmática avaliativa quando diz que o personagem não era “bonzinho”, pois não se abalou

e nem ficou triste com o desencadeamento de suas ações. Para a aluna, o tipo de ação

produzida pelo personagem, segundo o que ela entende de boas e más ações, fazia dele um

menino ruim.

Elisa diz, em várias partes do seu comentário, que o personagem fizera uma

brincadeira com o pai e a mãe e, quando questionada pela pesquisadora (linha 27) sobre se

o que o personagem tinha feito era realmente uma brincadeira, a aluna esclarece que

Romãozinho achava que era apenas uma brincadeira, mas na verdade não era, pois destruiu

sua família. Nessa passagem, a aluna faz um tipo de operação inferencial por associações de

informações obtidas através de saliências lexicais e cognitivas com outras ideias, a partir de

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suas experiências pessoais.

Elisa relata para a pesquisadora que já havia lido esse texto na escola, na sala

de aula, e diz que, quando chegou na sua casa, leu para sua mãe e madrinha, enfatizando

que elas também comentaram sobre a história. É interessante que esse dado demonstra

que a aluna apropriou-se de uma prática de leitura escolar - leitura e comentário, exposta

no capítulo 2, e reproduziu no ambiente familiar, e ainda

diz que fez isso por gostar de ler.

Texto 3/ 2ª leitura: Romãozinho, produção de inferências:

b) De base textual e contextual:

Após onze dias da primeira leitura do texto 3, a aluna Elisa foi convidada para

fazer uma nova leitura. Após a leitura em voz alta, a pesquisadora faz uma pergunta

direcionada, já que a aluna havia explorado muito bem o texto. Para que a abordagem do

texto não fosse repetitiva para aluna e para garantir a possibilidade de dados novos, a

pesquisadora inicia o diálogo com a seguinte pergunta:

Pesquisadora (linha 2-3): Você lembrou de alguma coisa, pensou em alguma coisa a mais

que você não falou na última leitura?

Aluna Elisa – SL (linha 4): Hum, mais ou menos.

Pesquisadora (linha 5): Pensou? O que que você pensou?

Aluna Elisa – SL (linhas 6-8): É, eu gostei mais ou menos porque essa história fala que

morreu a mãe e o pai né e, ele nem se abalou. Quando morre alguém da família todo

mundo se abala que fica até semanas sem ri.

Após o diálogo sobre o desenvolvimento da narrativa, a pesquisadora questiona

novamente sobre a leitura feita em sala de aula:

Pesquisadora (linha 17): Hum, você leu com a professora na sala de aula esse texto?

Aluna Elisa – SL (linha 18): Li.

Pesquisadora (linha 19): Ah, e como foi quando vocês leram?

Texto 3: Romãozinho.

Data: 27 de novembro de 2014. Sujeito pesquisado: Elisa

Segunda leitura: SL.

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Aluna Elisa – SL (linhas 20-21): Nós fizemos uma leitura junto com a professora, depois

nós pegou nosso caderno e escreveu algumas coisas.

Pesquisadora (linha 22): Humm e vocês leram esse texto dentro... que trabalho vocês

estavam fazendo?

Aluna Elisa – SL (linha 23): É, as regiões.

Pesquisadora (linha 24): Ah, e de que região é esse texto aí? Falou aí o nome, né!

Aluna Elisa – SL (linha 25): Goiás.

Com intuito de dar continuidade ao diálogo, a pesquisadora questiona:

Pesquisadora (linha 31): Você já leu bastante ele, né? Já conhece bem a história, né?

Aluna Elisa – SL (linha 32 - 34): Ah e também quando eu cheguei em casa é... eu fiz a

mesma coisa que nós fizemos lá na sala com minha mãe e minha madrinha. Eu li o texto

pra elas e elas comentaram também.

Análise:

Entre as linhas 2-8, a partir do questionamento da pesquisadora, sobre quais

outros elementos a aluna tinha pensado sobre o texto que não disse na primeira leitura,

Elisa repete suas impressões sobre um acontecimento pontual da narrativa, ou seja, a

morte do pai e da mãe do Romãozinho e sua completa falta de sentimento diante de fato

tão triste. Elisa produz inferências de base contextual de natureza pragmática e cognitiva,

pois elabora, a partir de uma situação textual, avaliações pessoais experienciais, no caso

específico o que a morte pode causar nas pessoas que perderam um ente querido: todos

da família ficam abalados sem rir por semanas. A aluna produz inferência comparativa

com a situação de Romãozinho, que foi incapaz de se abalar com a morte dos pais.

Entre as linhas 17-25, a pesquisadora faz uma intervenção que induz a aluna

Elisa a refletir sobre o texto lido no contexto da pesquisa e estabelecer relações com o

momento de leitura feito em sala de aula e as possíveis relações que podem ser

estabelecidas entre os dois momentos. As questões feitas pela pesquisadora fizeram com

que aluna refletisse sobre uma outros contextos, o de sala de aula e não o imediato da

pesquisa, considerando que o contexto não é tão somente a situação imediata, mas

sobretudo que compreensão “exige uma contextualização cognitiva dependente da

própria organização dos conhecimentos e experiências pessoais” (MARCUSCHI, 2004,

p.46). Desta forma, Elisa acionou os conhecimentos obtidos em sala de aula através da

sua memória e produziu inferências de base contextual associativa, quando diz que o

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texto está relacionada com a Região de Goiás: essa afirmação foi possível pois a

professora apresentou esse texto na sala de aula para trabalhar o projeto interdisciplinar

que aborda as regiões do Brasil.

Na ultima passagem selecionada dos comentários da segunda leitura do texto

3 produzidos pela aluna Elisa, ao ser indagada pela pesquisadora com uma pergunta

retórica (linha 31), a aluna prontamente expõe, novamente, como na primeira leitura, a

experiência de ter lido em casa o texto 3 para a mãe e a madrinha e reitera que ambas

comentaram sobre o texto que ela leu. Essa prática de leitura e comentários dos alunos

foi desenvolvida pela professora da turma, que trabalhou com as crianças durante os três

anos do ensino fundamental através de projetos interdisciplinares entre outras atividades

de incentivo à leitura literária.

Texto 3/ 1ª leitura: Romãozinho, produção de inferências:

a) De base textual.

Ao final da leitura em voz alta e da pergunta da pesquisadora, Luís diz que o texto 3 é legal e,

ao ser indagado o porquê, o aluno inicia o reconto. Segue

Pesquisadora (linha 1): E aí?

Aluno Luís – PL (linha 2): Achei legal.

Pesquisadora (linha 3) É? Por quê?

Aluno Luís – PL (linhas 4-10): Porque fala de um menino, que mentiu pro pai falando que a

mãe dele, uma mulher, né! Comeu galinha com um homem, aí o pai ficou com ciúmes e raiva

e matou a mulher, antes dela morrer, ela jogou uma maldi...amaldiçoou o filho, que

enquanto ele viver, ele nunca vai morrer. Só vai morrer quando for o fim do mundo. Aí, ele

... aí, o pai morreu doente, por conta que matou a mulher dele, e o filho ficou, meio que um

menino ruim, que ficou assombrando todo mundo, fazendo coisa ruim mesmo.

E, sei lá... acabou.

Texto 3: Romãozinho.

Data: 5 de Novembro de 2014.

Sujeito pesquisado: Luís

Primeira Leitura: SL.

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Análise:

O aluno Luís em sua primeira leitura do texto 3, após ler o texto em voz alta, faz

o reconto da narrativa, de uma forma autônoma e com segurança; é possível afirmar que o

aluno não encontrou nenhuma dificuldade em fazer o relato da história, procurou seguir a

sequência da narrativa dentro de um horizonte de compreensão textual mínimo

(MARCUSCHI, 2008, p. 258), com elaboração de paráfrases. A partir do input textual, Luís

expôs o conteúdo da narrativa de uma forma sintética, mas com início, meio e fim

b) De base contextual.

Quando questionado, novamente, pela pesquisadora sobre por que achou a

história legal, o aluno Luís tece algumas considerações sobre a história.

Pesquisadora (linha 11): E você achou legal, por quê?

Aluno Luís – PL (linhas 12- 14): Ah, e também essa história é um pouco parecida, essa

parte aqui é um pouco parecida com, a parte lá do saci-pererê. E aqui fala que o saci-

pererê, que no São Francisco no centro-oeste, no rio São Francisco entre dois... é o famoso

Romãozinho.

Pesquisadora (linhas 15 e 16): E como você sabe que ali (apontando para o texto

complementar) estava falando sobre o saci, neste textinho aí?

Aluno Luís – PL (linha 17): É que aqui em ciminha tá estado de Goiás?

Pesquisadora (linha18): Mas como você sabia que aí tava escrito sobre o saci de Goiás?

Aluno Luís – PL (linha 19): É que a professora tinha lido antes.

Pesquisadora (linha 20): Ah, então você já conhecia essa história? Quando que ela leu essa

história pra vocês?

Aluno Luís – PL (linha 21): O dia? Isso eu não lembro.

Pesquisadora (linha 22): Assim, em que momento, o que vocês estavam fazendo na sala de

aula. Aluno Luís – PL (linhas 23-24): Todo mundo leu, cada um leu uma parte, a

professora escolhia alguém aí lia mais ou menos até (indica uma parte do texto). Aí era

outro e até assim .... outro.

Em outras passagens, o aluno detalha o trabalho com o projeto interdisciplinar:

Pesquisadora (linhas 48-49): Tá, e quando ela usou esse texto na sala, você me disse que

todo mundo leu uma parte?

Aluno Luís – PL (linhas 50-51): Aí depois que todo mundo acabou, ela leu tudo de novo pra

ficar melhor. Tem uns que leem baixo, outros alto, alguns rápido ....

Pesquisadora (linha 52): Sei, e esse texto, fala de algum lugar?

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Aluno Luís (linhas 53- 54): De Goiás. É aqui fala de Goiás (apontando para o texto). E

aqui no cantinho fala do centro-oeste e o São Francisco e só.

Pesquisadora (linha 55): Tem alguma coisa a ver com que vocês estão estudando ou não?

Esse texto?

Aluno Luís – PL (linha 56): Não, agora não... eu acho.

Pesquisadora (linha 57): O que vocês estudaram?

Aluno Luís – PL (linha 58): O que nós estamos estudando?

Aluno Luís – PL (linha 59): É... as regiões. Centro-oeste.... que eu sei nós tamo no ....

nordeste.

Análise:

Ao ser indagado pela pesquisadora sobre o porquê de ter achado o texto legal, o

aluno Luís tem uma atitude leitora comparativa, faz inferências por associação de ideias de

natureza lexical, semântica e pragmática, ao dizer que a história do Romãozinho é um

pouco parecida com a do saci-pererê e, ainda, busca localizar a região onde acontece a

narrativa: cita Goiás e o Rio São Francisco. Questionado pela pesquisadora sobre como ele

sabe dessas informações, o aluno diz que “a professora tinha lido antes”. Acredita-se que

essas associações feitas pelo aluno devem-se ao fato de o mesmo já ter lido em sala de aula

com a professora e os colegas sobre a história do Romãozinho, e os demais textos

complementares foram explorados pela professora quando trabalhou com os alunos o

projeto interdisciplinar.

Na linha 22, a pesquisadora pergunta em que momento da aula foi lido o

texto. O aluno responde como foi lido e não o momento e enfatiza mais uma prática de

leitura em sala de aula de textos literários, como o aluno explicita nas linhas 23 e 24.

Nas linhas 50 e 51, o aluno novamente expõe como aconteceu a prática de

leitura em sala de aula: é interessante ressaltar que o aluno diz que todos leram e depois a

professora “leu tudo de novo para ficar melhor”. Para o aluno, a intervenção da

professora, através de sua leitura, contribuiu para que o texto ficasse melhor, ou seja,

pode-se definir a expressão ficar melhor como uma forma do incentivo da professora para

que os alunos compreendessem de forma mais efetiva a história.

Novamente, questionado pela pesquisadora se o texto fala de algum lugar,

Luís responde que é de Goiás, e cita a região centro- oeste e o Rio São Francisco,

demonstrando que produziu inferências de associações de ideias e de relações

intertextuais, pois ao usar os textos complementares o aluno pode acionar mais

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informações para interagir com o texto narrativo principal.

Texto 3/ 2ª leitura: Romãozinho, produção de inferências:

c) De base textual e Contextual.

Na sequência da leitura do texto 3, a partir da intervenção mínima da

pesquisadora, o aluno inicia uma série de associações emergidas do diálogo entre

pesquisadora, aluno e texto.

Pesquisadora (linha 1): E aí?

Aluno Luís –SL (linhas 2-6): Eu pensei que... tem uma parte aqui que fala que ele

assombra aqueles que vão passando pela estrada, aí isto daqui me lembrou muito uma

lenda que nóis lemos lá na sala que é de uma mulher que também fica assombrando, que

ela fica pedindo carona, aí quando chega numa curva , é fala que foi lá que ela morreu,

aí todo mundo...

Pesquisadora (linha 7): E você sabe o nome dessa lenda?

Aluno Luís – SL (linha 8): Não. Também aparece no gibi que eu li, de

terror. Pesquisadora (linha 9): Ah, essas histórias de assombração?

Aluno Luís (linha 10): Aí tinha aparecido uma menina que também morreu, só que foi no

penhasco.

Discussão sobre as características de Romãozinho:

Pesquisadora (linha 28): E você acha que o Romãozinho é só arteiro e brincalhão?

Aluno Luís – SL (linha 29): Hum!

Pesquisadora (linha 30): Ou não? Tem mais alguma coisa aí da personalidade dele?

Aluno Luís – SL (linha 31): Talvez lá no fundo, bem lá no fundo mesmo ele fosse um pouco

bonzinho.

Pesquisadora (linhas 32-33): Será? O que que ele fez? Você lembra o que que ele

fez? O que que ele fez?

Aluno Luís - SL (linhas 34-36): Ele mentiu pro pai falando que a mãe dele tava comendo a

Texto 3: Romãozinho.

Data: 18 de novembro de 2014. Sujeito pesquisado: Luís

Segunda Leitura: SL .

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galinha com homem que ia lá e o Romãozinho levou os ossos pro pai. Aí o pai ficou furioso

e com ciúmes e matou a mulher. Aí ela jogou uma maldição no filho.

Pesquisadora (linha 37): E qual era a maldição?

Aluno Luís – SL (linhas 38-41): Que ele, tipo assim, ia viver até o fim do mundo, não ia

morrer nunca. Só queria saber se ele não ia morrer nunca e se acontecesse um acidente que

ele fosse atropelado, o que ia acontecer? Ou ele ia ressuscitar ou ia abrir um escudo nele,

pra parar sei lá, o carro.

Aluno Luís – SL (linhas 47-48): Eu acho também, será que ele já sabia que o Romãozinho

era arteiro? Eu acho que a mulher podia ter falado, que podia ser uma brincadeira dele.

Pesquisadora (linha 49): Ah muito bem!

Aluno Luís – SL (linha 50): A parte lá que ela recusou ter comido com ele.

Pesquisadora (linha 51): Rurum poderia evitar a tragédia, né?

Aluno Luís – SL (linha 52): Rurum

Aluno Luís – SL (linha 53): Assim o Romãozinho não ia ficar assim, vivo pra sempre.

Pesquisadora (linha 54): E nem a mãe dele teria morrido, né?

Aluno Luís – SL (linha 55): Rurum.

Alunos Luís – SL (linhas 56-58): E o pai também, eu só não sei porque ele morreu de

doença. Não sei se ele morreu doente por causa que ele se arrependeu de ter matado ou se

ele ficou doente assim normal, pegou uma doença sei lá.

Pesquisadora (linha 59): Entendi, mais física, né?

Pesquisadora (linha 60- 61): Tá ótimo então! Mais alguma coisa Luís? Não mais?

Análise:

Os comentários sobre a segunda leitura do texto 3 foram ricas devido à

criatividade e ao interesse do aluno em interagir com o texto; foram produzidas muitas

inferências de base contextual, partindo do input textual. Buscou-se dar visibilidade às

principais inferências produzidas pelo aluno Luís em sua segunda-leitura.

Assim que o aluno termina a leitura em voz alta, a pesquisadora inicia o diálogo

com um simples: e aí? Em seguida a esta intervenção, o aluno expõe sobre uma das

características do texto, dizendo que conhece outras histórias de assombração e conta para

pesquisadora trechos de duas delas. Pode-se afirmar que o aluno elabora inferências do tipo

de operação denominada de acréscimo, de caráter pragmático e experiencial, ou seja,

caracteriza-se pela introdução de elementos que não estão implícitos nem são de base

textual, podendo muitas vezes levar a contradições e falseamentos. (MARCUSCHI, 2008,

p.255).

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Entre as linhas 28-41, o aluno, com a mediação da pesquisadora, discorre sobre

suas impressões sobre as características psicológicas de Romãozinho e, volta a tratar do

assunto sobre a maldição que a mãe do personagem jogou sobre o menino. Nas passagens

entre as linhas 38-41, Luís faz uma reflexão interessante sobre o texto, ele não está

convencido que o personagem ia viver para sempre, como isso poderia acontecer, caso ele

sofresse um acidente? É essa questão que permeia suas reflexões! Para ele, o menino

Romãozinho podia morrer por acidente, talvez ser atropelado. Neste sentido, Luís produz

inferências considerando as possibilidades de mudar o desfecho da história, por meio de

elementos novos, associações de novas ideias à história, pautadas em situações do seu

universo cultural cognitivo.

Nas linhas 47 e 48, Luís faz uma reflexão muito pertinente, ou seja, será que o

pai de Romãozinho não sabia que ele era arteiro? Segundo suas inferências baseadas em

uma suposição extratextual, essa informação poderia ter evitado a morte dos pais. Neste

sentido, o que o aluno em uma postura metalinguística está questionando, nas entrelinhas é:

como o pai não conhecia o filho? Não sabia que o mesmo era arteiro? E a mãe também?

Essas considerações que acionam elementos fora da dinâmica textual, contribuem para a

ampliação do olhar sobre o texto, aberto às várias possibilidades de interação e produção de

sentidos, sem esquecer que se pode incorrer no erro dos falseamentos.

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168

CAPÍTULO 5

5. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Modelo de desvelamento do mundo, a leitura encontra na literatura

eventualmente seu recipiente imprescindível. Preservar essas relações é

dar sentido a elas. E, se a escola não pode absorvê-las por inteiro,

igualmente não pode ser o lugar onde estas se rompem em definitivo, sob

pena de arriscar sua missão e prejudicar, irremediavelmente, o ser humano

a quem diz servir. (ZILBERMAN, 2009, p.34)

5.1. Processo de compreensão leitora

Neste capítulo, procurou-se evidenciar os processos de produção de sentidos e

compreensão leitora, de cada um dos alunos pesquisados. No capítulo 4, foi feita a

apresentação dos dados obtidos nas 18 sessões de leitura: os mesmos foram analisados

considerando as inferências de base textual, base contextual e sem base textual e contextual

(MARCUSCHI, 2008, p.255), produzidas pelos 3 alunos (Pedro, Elisa e Luís). No entanto,

com o intuito de possibilitar uma melhor visibilidade aos processos vivenciados pelas

crianças, são apresentadas, neste capítulo, as características da compreensão leitora das

crianças, tendo em vista as especificidades presentes nas inferências produzidas em cada

leitura, lançando o olhar sobre suas marcas mais recorrentes entre outros elementos

importantes para a análise da compreensão leitora.

Além das análises das produções das inferências desenvolvidas pelos alunos nas

sessões de leitura, buscou-se cotejar os dados da pesquisa com as experiências vivenciadas

por essas crianças: práticas de leitura literária promovidas em sala de aula além das

atividades envolvendo família e comunidade escolar, construídas no decorrer dos 3 anos de

escolarização do ciclo I do ensino fundamental.

5.2. Aluno Pedro

Em todas as sessões de leitura, o aluno leu a lenda e fez o reconto de forma

espontânea, sempre na primeira sessão de cada texto lido, demonstrando a apropriação de

uma prática de leitura escolarizada. Através de movimentos do corpo, foi possível perceber

a busca para recuperar os fatos, as ações dos personagens, em uma atividade intensiva de

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169

memória. Isso fica evidente no decorrer do reconto, pois mesmo sem ter sido solicitado que

a história fosse recontada, o sujeito opta por esse procedimento.

Ao se dirigir o olhar para esse processo – fica visível a natureza constitutiva das

aulas anteriores da professora nas rodas de leitura do momento da pesquisa (2014), pois, já

desde a primeira lenda, o aluno Pedro, tanto na primeira quanto na segunda atividade de

leitura de a “Dança do arco-íris” faz referência à lenda do guaraná aprendida e apreendida

nos anos anteriores (2012 / 2013).

O que se pode perceber é uma total autonomia do aluno em sua relação com o

texto lido, sendo essa segurança e autonomia imprescindíveis para que haja a compreensão

leitora e que foi alcançada, paulatinamente, nas relações estabelecidas com o que foi

aprendido em sala de aula nas atividades de leitura promovidas pela professora. Na primeira

leitura do texto 1 - “Dança do arco-íris” - Pedro apresenta mais inferências de base textual

comparada à sua segunda leitura, na qual, além das inferências textuais, apresentou também

as de origens contextuais.

Com relação às inferências de base textual, o aluno busca preservar a sequência

narrativa do texto; em contrapartida, não há uma preocupação em reproduzir a linguagem,

as palavras exatas utilizadas pelo autor. A criança recupera o texto a partir de uma “leitura

parafrástica” (MARCUSCHI, 2008), com ênfase em passagens que fazem mais sentido para

ela. Não é seguido um script, sendo selecionadas passagens significativas pelo sujeito leitor.

Nas inferências de base contextual, na primeira leitura do texto 1, as mesmas

ocorrem a partir das indagações feitas pela pesquisadora, cujo objetivo é verificar nos

comentários produzidos pelo aluno, relações desse texto com outros já estudados. O aluno

lembra-se de duas lendas estudadas em sala de aula - a lenda do guaraná e a da mandioca-

buscando recontar as duas de forma sucinta.

Além disso, o sujeito pesquisado tece comparações entre as lendas que ele já

havia lido em atividades de leitura na sala de aula, e outras informações contidas na lenda

“Dança do arco-íris”, com as inferências feitas pelo aluno são de base textual e contextual.

Pode-se verificar um tipo de operação inferencial associativa, sendo a natureza da

inferência lexical, semântica e pragmática. Ela é produzida pela “afirmação de uma

informação obtida através de saliências lexicais ou cognitivas por associações de ideias”

(MARCUSCHI, 2008). Portanto, o aluno pautou-se em informações obtidas no texto,

associando-as à sua vivência, sobretudo a escolar, o que lhe possibilitou uma

compreensão mais ampliada, mais informações linguísticas e extralinguísticas, e o

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170

capacitou a fazer comparações intertextuais.

A segunda leitura do texto - “Dança do arco-íris” - foi realizada um mês após a

primeira; os procedimentos de pesquisa foram os mesmos em ambas. O aluno fez a leitura

em voz alta e, ao terminar, a pesquisadora perguntou-lhe se havia pensado em mais alguma

coisa (sobre o texto), além daquelas já ditas na primeira leitura. O objetivo dessa questão

foi tentar obter outras informações, além daquelas exploradas pelo aluno na primeira leitura

do texto.

Ao ser indagado, a partir do texto lido, o aluno apresenta inferências de origem

contextuais. Ele amplia o horizonte de compreensão textual ao relatar uma experiência

vivida em sua casa, com sua família, durante os jogos da copa do mundo de 2014; apoiando-

se em uma passagem do texto, em que o personagem demonstra descontentamento com o

trânsito de pessoas em seu mundo, o aluno faz associações autorizadas entre o “mundo do

personagem” e o “seu mundo”.

Ao conceituar os diferentes tipos de horizontes de compreensão textual,

Marcuschi (2008) define esse tipo de nível de compreensão, apresentada pelo aluno, de

horizonte máximo:

Essa é a perspectiva que considera as atividades inferenciais no processo

de compreensão, isto é, as atividades de geração de sentidos pela reunião

de informações do próprio texto, ou pela introdução de informações e

conhecimentos pessoais ou outros não contidos no texto. É uma leitura do

que vai nas entrelinhas; não se limita à paráfrase nem fica reduzida () à

repetição. Esse horizonte representado pelas inferências constitui o

horizonte máximo da produção de sentidos. (MARCUSCHI,2008, p. 259).

Ao comparar a primeira leitura com a segunda, pode-se afirmar que houve uma

ampliação no processo de compreensão leitora, pois o aluno considerou novos elementos

de seu “universo cultural cognitivo” (MARCUSCHI, 1985) no diálogo com as informações

textuais. Essa extrapolação ocorreu somente na segunda leitura do texto 1.

Pode-se perceber que, na primeira leitura, o aluno fez movimentos de entender

a dinâmica do texto, fazendo reconto e uso da leitura parafrástica (horizonte mínimo),

enquanto que na segunda as relações são de caráter cotextual e contextual.

Na segunda leitura do texto 1, verifica-se que o aluno amplia as associações que

faz entre o texto e outras lendas. Na primeira leitura, o aluno relaciona esta lenda com

outras lidas em diversos momentos na escola, tecendo comparações, enquanto que, na

segunda leitura, ele retoma o movimento comparativo entre o texto 1, a lenda do guaraná e,

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171

ao buscar conceitos do que é lenda, partindo do seu conhecimento a respeito deste gênero,

extrapola essa relação.

Em agosto de 2014, foi feita a primeira leitura do texto 2, “A Origem do

Oiapoque”. Após o término da leitura, Pedro inicia o comentário posicionando-se diante do

texto: diz que achou a história triste e justifica sua afirmação através de elementos que

possam comprová-la.

O que ocorre não é um mero reconto da narrativa, mas um processo de

compreensão que visa recuperar os principais elementos da história, considerando a análise

da mesma. Neste caso, é possível considerar que houve avanços na leitura do aluno, em

comparação com as duas leituras do texto 1, feitas anteriormente; pois agrega, às suas

impressões sobre o texto, a prática do reconto para recuperar a história. Ocorre, assim, uma

interação comunicativa entre autor, texto e leitor mais efetiva.

Ainda no decorrer dos comentários da primeira leitura do texto 2, o aluno

associa os acontecimentos da história ao título do texto, ou seja, ele identifica os indícios

textuais necessários que expliquem o nome da lenda - “A Origem do Oiapoque”.

Com relação aos comentários de base contextual, observados na primeira leitura

deste texto, o aluno retoma a ideia de morte do bebê: afirma que a mãe queria que a criança

vivesse mais do que ela. Ao evidenciar essa passagem, esse enunciado; o sujeito dialoga

com questões históricas e culturais sobre o processo humano de vida e morte.

A nossa sociedade avançou em termos de conhecimento médico, de tratamento

de várias doenças, sendo que não vemos como natural a morte do recém-nascido antes da

mãe, exceto em situações de descaso de atendimento em hospitais públicos ou alguma

fatalidade. Entende-se como natural que a criança se desenvolva plenamente sob os

cuidados da mãe. Portanto, quando o aluno enfatiza a morte precoce da filha da personagem

índia, analisa como sendo um problema, uma grande tragédia para a mãe.

Pode-se concluir que o aluno aprendeu, seja no ambiente familiar e ou em

outros espaços de socialização, que a morte de um recém-nascido não deve ser algo natural,

demonstrando valores culturais e sociais interiorizados. Neste sentido, a compreensão do

aluno extrapolou as informações lexicais ao buscar elementos em seu contexto histórico –

cultural.

Ao considerar esse movimento de busca de produção de sentidos pelo aluno,

reitera-se, a partir dos dados desta pesquisa, que o ato de compreender não é uma ação

apenas linguística ou cognitiva. “É muito mais uma forma de inserção no mundo e um modo

de agir sobre o mundo na relação com o outro dentro de uma cultura e uma sociedade”

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(MARCUSCHI, 2007, p.89).

Ainda sobre a primeira leitura do texto 2, mais uma vez o aluno cita uma lenda

lida pela professora em sala de aula. Mesmo não se lembrando do título da lenda, ele busca

retomar toda a sequência da história e tece comparações intertextuais sobre o desenrolar das

narrativas, ou seja, sobre a lenda ouvida em sala de aula, ele infere com base em

informações lógicas que tem um final feliz, enquanto que o texto 2 – “A Origem do

Oiapoque” - tem um final triste.

A segunda leitura do texto 2 foi feita em 02 de setembro de 2014. Após a leitura

em voz alta, o aluno é questionado pela pesquisadora se ele se lembra da primeira leitura

efetuada. A criança responde de forma afirmativa à questão, diz que o texto é legal e busca

justificar seu comentário. Com esse questionamento, a pesquisadora teve como objetivo

verificar que tipos de relações o aluno faria ao comparar a leitura do mesmo texto em

momentos distintos.

Ele retoma trechos da narrativa e seleciona a passagem em que o choro da

personagem (Tarumã) preenche os sulcos que ela mesma tinha aberto com seu peso

(grávida), formando um rio. O aluno diz que não entendeu porque o rio levou o nome de

Oiapoque. Percebendo que a pesquisadora não irá responder a sua questão, o aluno

apresenta indícios que o levam a associar o nome Oiapoque com o nome de uma tribo. Para

justificar sua afirmação, o aluno faz uso de seu conhecimento prévio sobre lendas indígenas

e também da palavra Oiapoque, a qual sonoramente remete ao léxico da língua indígena.

Isto sugere que “compreender é, essencialmente, uma atividade de relacionar

conhecimentos, experiências e ações em um movimento interativo e negociado”

(MARCUSCHI, 2007, p. 95). É esse movimento relacional que se pode observar nas

inferências produzidas pelo aluno Pedro: percebe-se uma série de aspectos inter-

relacionados que são responsáveis pela construção da compreensão leitora proficiente.

Com os dados de leitura dos textos 1 e 2, expostos até aqui, pode-se afirmar que

o aluno demonstrou, a partir das inferências produzidas de origem textual e contextual ,

uma ampliação no diálogo com os dois textos apresentados; verificou-se, em vários

momentos, a prática do reconto, leitura parafraseada – ênfase no horizonte mínimo de

leitura, e, com o desenvolvimento das sessões de leitura , foi possível observar o

engajamento do aluno através de produções de inferências com base em seu “universo

cultural – cognitivo” (MARCUSCHI, 1985, p.3), possibilitando a ampliação de sua

compreensão para um “horizonte máximo de leitura” ( MARCUSCHI, 2008, p. 259).

Nas inferências produzidas pelo aluno, foi possível encontrar elementos das

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práticas de leitura vivenciadas na escola, como a leitura de lendas brasileiras, entre outros

gêneros narrativos e, também, o acesso, manuseio e exploração dos livros de literatura

infantil pela criança, com mediação da professora, pais e/ou responsáveis, de forma

sistematizada - como a sacola da leitura e as atividades atreladas aos projetos

interdisciplinares.

O 3º texto explorado na pesquisa – “O Romãozinho” - foi utilizado em duas

sessões de leitura, em novembro de 2014. Desta vez, o texto escolhido já tinha sido lido

pela professora em sala de aula durante o desenvolvimento do projeto “Viajando pelo

Brasil, desvendando minhas origens”. Ao considerar esse aspecto, as questões de pesquisa

elaboradas tiveram como objetivo verificar possíveis relações entre as inferências

produzidas nas duas sessões de leitura deste texto com a leitura vivenciada pelo aluno em

outro espaço e lugar (sala de aula).

Na primeira sessão de leitura, após ler o texto em voz alta, a pesquisadora elogia

sua leitura e diz genericamente: “e aí?” O aluno prontamente faz o movimento de reconto

da história, buscando dar conta de toda a sequência da narrativa. Ele não faz comentários

com juízos de valor, busca utilizar elementos coesivos como “fala que...”, “mas aí...” para

garantir a coerência textual e garantir um entendimento do enredo, considerando o início da

trama, seu desenrolar e o desfecho da história.

Em seguida, a pesquisadora questiona se o aluno já conhece essa história. A

partir dessa pergunta, ele expõe uma série de comentários explicativos – inferências

culturais, cognitivas, com o objetivo de relacionar a lenda com as atividades desenvolvidas

no projeto. Pedro relata para a pesquisadora que ficou com uma dúvida quando esse texto

foi lido em sala de aula: como Romãozinho podia ser tão malcriado, se os seus pais eram

tão bonzinhos? O aluno reflete e chega a uma justificativa, a partir do seu entendimento de

mundo.

Na segunda leitura feita pelo aluno, no mesmo mês, mas com um intervalo de

duas semanas, as inferências produzidas são em sua maioria de origem contextual e são

caracterizadas por uma relação de diálogo com o projeto desenvolvido pela professora, já

citado anteriormente. O que chama a atenção é a utilização de conceitos históricos já

formados como escravidão e a citação de história de vida, como a do Chico Rei, citada pelo

aluno para contar sobre o projeto.

Isso demonstra que a compreensão leitora está ancorada em um processo

complexo de produção de sentidos, composto pelos conhecimentos prévios, vivências

sociais, diálogo com o autor e seu texto. Sendo assim, pode-se afirmar que a leitura e a

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compreensão são consideradas um trabalho social, como define Marcuschi (2008):

A interpretação dos enunciados é sempre fruto de um trabalho e não uma

simples extração de informações objetivas. Como o trabalho é conjunto e

não unilateral, pois compreender é uma atividade colaborativa que se dá

na interação entre autor-texto-leitor ou falante-texto-ouvinte, podem

ocorrer desencontros. A compreensão é também um exercício de

convivência sociocultural. (p.231).

Quando o aluno Pedro faz associações entre o texto lido e as informações

obtidas em sua vivência escolar, ele estabelece conexões entre conteúdos estudados com as

produções de inferências nas sessões de leitura. É possível afirmar que essas relações

estabelecidas são consequências de uma intensa atividade interativa entre agentes culturais

e objeto de conhecimento.

Pode-se afirmar que os dados de leitura do aluno Pedro apresentam produções

de inferências de origem textuais bem estruturadas e contextuais, que primam pela intensa

relação com o universo cultural cognitivo do aluno, considerando principalmente sua

experiência escolar durante os 3 anos do ciclo I.

5.3. Aluna Elisa.

A aluna Elisa apresenta, em sua primeira leitura do texo1 – “A Dança do Arco-

íris”

- uma atitude de segurança e de síntese. Sua leitura é fluida e bem objetiva, caracterizada

por produções de inferências basicamente de origem textuais. As produções de inferências

de base contextual, surgem somente com as intervenções da pesquisadora, ao aplicar

questões abertas, as quais foram elaboradas com o intuito de não interferir no conteúdo das

respostas da aluna.

Os resultados do diálogo entre a pesquisadora e Elisa, sobre o texto, promovem

a elaboração, pela aluna, de inferências de base contextual, com enfoque pragmático ao

evidenciar as ações e valores atribuídas ao índio: era quieto e não gostava de bagunça.

Na segunda leitura do texto 1, ao ser questionada pela pesquisadora sobre o que

achou do texto, a aluna diz que considera o texto legal e faz o reconto; contudo, diferente da

primeira leitura, a aluna reconstrói todo o texto lido atribuindo inferências pragmáticas

avaliativas. Elisa, assim como o aluno Pedro, demonstra conhecimento sobre as

características do gênero lenda. No entanto, não explora muito os conhecimentos que possui

sobre outras lendas indígenas, ainda que seja sabido que a aluna estudou, durante os dois

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primeiros anos do ciclo I, textos narrativos do gênero lenda. Somente se restringe a poucas

informações sobre o gênero abordado.

A leitura da aluna é marcada por adjetivos aplicados ao personagem principal –

o índio - construídos a partir das informações textuais. Elisa tem uma postura mais direta ao

dialogar com o texto, valoriza os elementos explícitos. É o que se pode concluir ao analisar

as duas leituras feitas sobre o texto 1.

A primeira sessão de leitura do texto 2 - “A Origem do Oiapoque” - ocorreu no

dia 14 de agosto de 2014. No processo de leitura e compreensão desse texto, a aluna, após a

leitura em voz alta, fez o reconto utilizando paráfrases, buscou evidenciar os principais

elementos da narrativa ao considerar a contextualização do problema, a resolução e o

desfecho.

A aluna, ao ler o texto, produz inferências apoiadas na estrutura textual; no

entanto, com a intervenção da pesquisadora, Elisa produz inferências de base contextual ao

questionar a passagem em que a personagem do texto – uma índia transformada em cobra -

“dá a luz” a uma criança. Ao ativar seus conhecimentos prévios sobre o assunto, a aluna diz

que não é normal tal fato ocorrer.

Outra passagem do texto, que é evidenciada pela aluna, versa sobre a atitude de

preocupação com a aldeia e ao cuidado com seu povo, demonstrado pela personagem índia

– cobra. É através de saliências lexicais que a aluna apresenta inferências contextuais

baseada em valores e experiências pessoais.

A segunda leitura do texto 2 ocorreu em 24 de setembro de 2014, após 40 dias

da primeira sessão de leitura. Os procedimentos foram os mesmos: leitura em voz alta e

reconto. Desta vez, a pesquisadora orienta a aluna Elisa a comentar sobre mais algum

assunto que não tenha dito na primeira leitura, ou algo de que tenha se lembrado que não

falou naquele momento e que poderia comentar. Essa estratégia foi utilizada para que aluna

pudesse refletir mais sobre o texto lido, já que a mesma apresenta uma relação bem direta e

objetiva com o mesmo.

Na segunda leitura do texto 2, novamente a aluna lê com fluidez; no entanto, ao

fazer o reconto, permanece apoiada na estrutura narrativa. Somente com a intervenção da

pesquisadora, a aluna dialoga com o texto. Diz que é muito estranho um bebê nascer de

uma cobra. Esta observação é feita novamente em sua segunda leitura. “Podemos afirmar,

sem exageros, que a qualidade da mediação vivenciada pelo aluno, em muitos casos,

determina toda a história futura da relação entre ele e os diversos conteúdos estudados”.

(LEITE, 2006, p.38)

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A aluna só elaborou inferências de origem contextual, com a intervenção da

pesquisadora. É perceptível que aluna entendeu o que leu; contudo, Elisa ficou na

expectativa dos questionamentos da pesquisadora e, conforme o diálogo sobre o texto foi

ocorrendo, a aluna foi fazendo conexões.

Em síntese, na segunda leitura do texto 2, Elisa conclui que: uma criança nascer

de uma cobra só é possível através de uma lenda, pois não é uma história real; na lenda,

também aparecem elementos reais, como índios; faz associação com o nome Tupã – Deus,

que aparece também na lenda do guaraná estudada em sala; percebe que o texto lido tem

relação com outras lendas já conhecidas por ela, tais como - mandioca e guaraná. As

principais inferências contextuais produzidas pela aluna (-expostas no capítulo 4) foram

geradas a partir de suas experiências pessoais e cognitivas.

No decorrer da pesquisa, estava entre 08 e 09 anos de idade e todas as

experiências vivenciadas com relação à leitura, sobretudo a literária, contribuiu para que a

aluna, nessa faixa etária, já apresentasse características de uma leitora proficiente.

A primeira sessão de leitura do texto 3 - “Romãozinho” - ocorreu no dia 18 de

novembro de 2014. Após terminar a leitura em voz alta, Elisa faz um reconto marcado por

produções de inferências textuais e contextuais. Diferentemente das quatro sessões de

leitura anteriores, nesta a aluna faz o reconto de forma argumentativa, emitindo opiniões

sobre o texto lido.

É interessante evidenciar alguns aspectos da primeira leitura de Elisa sobre o

texto

3. Primeiro ela diz que gostou do texto. Contudo, logo após a intervenção da pesquisadora,

ela diz que gostou e não gostou e justifica com atitudes tomadas do personagem para definir

as ações erradas, as quais, segundo ela, fazia com que o personagem não fosse “bonzinho” e

define, através de inferências contextuais (capítulo 4), o que são boas e más ações.

Uma outra passagem, sobre a compreensão leitora de Elisa, versa sobre o

significado da palavra brincadeira. A aluna diz para a pesquisadora que os pais do menino

morreram em decorrência de uma brincadeira do menino. Indagada sobre se a atitude de

Romãozinho foi realmente uma brincadeira, Elisa diz que talvez para o menino tenha sido,

pois ele não amava a mãe e o pai, “destruiu a família” (linhas 30-31, PL do texto 3).

As conclusões da aula sobre o texto são marcadas por inferências contextuais

baseadas em seu “universo cultural cognitivo” (MARCUSCHI, 1985), todas explicitadas no

capítulo 4.

Um outro aspecto muito importante, que aparece na primeira leitura – texto 3 de

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Elisa, é o relato que ela apresenta sobre a reprodução de uma prática de leitura desenvolvida

em sala de aula, em sua casa. Segundo a aluna, já conhecia este texto e, quando chegou à

sua casa depois de ter lido com a professora em sala de aula, leu para a mãe e a madrinha

que também fizeram comentários sobre o texto; a justificativa de Elisa para a pesquisadora

sobre sua atitude é que gosta de ler.

A segunda sessão de leitura do texto 3 ocorreu no dia 27 de novembro de 2014,

nove dias após a primeira. Na sequência da leitura em voz alta, novamente a intervenção da

pesquisadora é no intuito de abrir possibilidades de ampliar a compreensão da aluna por

meio de produções de novas inferências sobre a leitura. O questionamento é se a aluna

lembrou-se de alguma coisa, se pensou algo que não tenha falado na leitura anterior (linhas

2-3, SL, texto3).

Elisa segue praticamente o mesmo script da primeira leitura deste texto: diz que

gostou mais ou menos e produz inferências baseadas em suas experiências e valores

adquiridos nas relações sociais. A aluna reitera sobre o comportamento adequado que deve

se ter quando morre alguém da família: “Quando morre alguém da família todo mundo se

abala que fica até semanas sem ri” (linhas 7-8, SL, texto3).

Portanto, a morte dos pais do Romãozinho, em decorrência de sua

“brincadeira”, foi ressignificada pela aluna, através das interações com o texto, entre outros

elementos linguísticos, extralinguísticos e contextuais, responsáveis pela geração de novos

sentidos, que caracterizam sua compreensão leitora.

Em uma nova intervenção da pesquisadora sobre a leitura do texto 3, sobre a

utilização do mesmo em sala de aula, Elisa diz que já conhecia a história e que os alunos

fizeram uma leitura junto com a professora sobre este texto na sala (ela diz nós). Além

disso, a aluna explicita que essa história é referente às regiões do Brasil que estão estudando

e que na história fala sobre Goiás (projeto interdisciplinar). Por fim, a aluna conta

novamente que, ao chegar em casa, leu a mesma história para a mãe e a madrinha e na

sequência as mesmas comentaram sobre a história.

E suma, a aluna Elisa, matriculada no 3º ano do ensino fundamental do ciclo I,

compreende a função social da leitura e escrita, lê de maneira articulada palavras frases e

textos de diversos gêneros, e ainda reconhece os principais aspectos de um texto narrativo.

Compreende o gênero lenda, faz associações entre algumas das principais lendas indígenas

conhecidas e suas origens geográficas e identifica características da cultura brasileira nas

mesmas.

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Produziu, nas seis sessões de leitura dos três textos lidos nesta investigação,

uma série de inferências de origens textuais e contextuais, como já explicitado

anteriormente. Elisa vivenciou, de forma espontânea, uma prática de leitura aprendida na

escola com pessoas da sua família, indicando que essas ações pedagógicas foram muito

significativas e interiorizadas pela criança, contribuindo para a sua aprendizagem e

desenvolvimento intelectual e social.

5.4. Aluno Luís.

A primeira leitura do texto 1 - “A dança do arco-íris” - feita pelo aluno Luís,

ocorreu em julho de 2014 (não foi registrado o dia exato). Após a leitura em voz alta, a

pesquisadora questiona o que o aluno achou do texto e ele diz que achou legal; questionado

novamente pela pesquisadora se achou legal mesmo, Luís utiliza a expressão “aqui quando

falou...” e procura no texto o trecho que fala sobre o vapor d´agua, associando a um

conteúdo de ciências que estudou em sala de aula sobre como ocorre a produção de chuva.

Em seguida, o aluno seleciona a palavra arco-íris e associa às vivências pessoais sobre fazer

bolhas de sabão quando pequeno e o aparecimento das cores do arco-íris.

Com esses dados foi possível avaliar que o aluno Luís fez inferências

contextuais de natureza cognitiva, semântica e experiencial (MARCUSCHI, 2008, p.255),

como explanado no capítulo 4. A compreensão leitora de Luís caracteriza-se por

extrapolações de cunho pessoal, atingindo o que Marcuschi (2008) denomina de horizonte

problemático

Por ser do âmbito da extrapolação, este horizonte de compreensão textual pode

recair na esfera da pura e simples opinião pessoal sem dar a devida importância para as

informações textuais. No caso do aluno Luís, as inferências produzidas estão relacionadas

ao seu universo de experiências pessoais: espaço escolar e brincadeiras infantis.

Ainda na primeira leitura do texto 1, Luís, após essas associações citadas,

retomou a história através da prática do reconto e elaborou inferências de origem textual,

através de uma leitura marcada por paráfrases. Este aluno finalizou a primeira leitura do

texto com a conclusão de que o texto lido “mistura romance com aventura”. Esta afirmação

permite constatar que o aluno acessou seus conhecimentos prévios sobre gênero textual ao

concluir que e a história possui tais características.

A segunda leitura do texto 1 ocorreu no mesmo mês que a primeira, em julho de

2014; como não foi identificado precisamente o dia, não se sabe o tempo percorrido entre a

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primeira e a segunda leitura deste texto.

Após a leitura em voz alta, novamente, a pesquisadora sugeriu ao aluno contar o

quisesse sobre o texto. Luís apoiou-se no referencial arco-íris: questionou sobre a relação

entre ele e o título da história e argumentou que, como o texto tem o nome “dança do arco-

íris”, se o arco-íris não dança. Com o apoio da pesquisadora, em um diálogo entre ambos e

o texto, o aluno conclui as relações entre o enunciado e o conteúdo do texto.

A primeira sessão de leitura do texto 2 - “A Origem do Oiapoque” - ocorreu em

15 de agosto de 2014. Após a leitura em voz alta, o aluno diz que achou a história legal e

pede: “posso reler tipo isso? reler só que não ler, conta!” (linha 5, PL, texto 2). O reconto

efetuado sobre o texto 2 por este aluno caracteriza-se por uma dinâmica de leitura

parafrástica, com questionamentos sobre passagens do mesmo e um intenso diálogo

consigo, em uma tentativa de reconstruir situações e contextos da história. Outra

característica demonstrada na leitura do texto 2, efetuada por Luís, é a intertextualidade

(capítulo 4).

A segunda leitura do texto 2 ocorreu em 25 de setembro de 2014, 40 dias após a

primeira sessão de leitura deste texto. Nesta sessão, Luís reconstrói a história através de

produções de inferências de origens textuais e contextuais, em um diálogo constante com o

texto, apresenta estratégias metacognitivas, demonstra autonomia e segurança diante do

texto,

associa o título do texto com o desfecho da história, ou seja: o choro da personagem índia-

cobra a origem do rio Oiapoque. Faz essas associações através de suas reflexões.

O terceiro texto escolhido para a sessão de leitura foi “Romãozinho”. Como foi

exposto anteriormente, é um texto que foi lido e discutido em sala de aula, pois está

associado ao planejamento do projeto interdisciplinar. Na primeira sessão de leitura deste

texto, Luís faz o reconto de forma sintética, utilizando paráfrases, considerando as

principais ações da narrativa. Além das inferências textuais, o aluno apresenta inferências

de origem contextuais: associação do personagem “Romãozinho” com “Saci-Pererê”,

localiza geograficamente a história - explicitadas no capítulo 4.

Além disso, em seu comentário, o aluno Luís expõe uma prática de leitura de

textos literários desenvolvida pela professora da sala a qual, segundo ele, contribuiu para a

melhor compreensão textual: “leu tudo de novo para ficar melhor” (professora).

A segunda sessão de leitura do texto 3 ocorreu em novembro de 2014. Após a

leitura em voz alta e o questionamento da pesquisadora- e aí? – Luís, novamente, inicia um

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diálogo com o texto: Contudo desta vez, o aluno associa esta história com histórias de

assombração e relata uma história lida por ele, com alguns detalhes, também cita que leu

uma história de terror em um gibi, demonstrando que é um aluno que lê com frequência e é

capaz de discutir o que leu.

Uma outra caraterística da segunda leitura do texto 3, feita por Luís, é a análise

do comportamento do personagem Romãozinho, a discussão de suas características

pessoais e areflexão sobre as ações dele e suas consequências para si e para os outros

personagens da narrativa.

Em síntese , Luís é um aluno que apresenta diversas posturas diante da

interação com os 3 textos lidos, as quais caracterizam sua compreensão leitora: faz reconto

em diversos momentos, utilizando paráfrases; seleciona palavras significativas e, a partir

delas, faz relações com situações vivenciadas, tanto na escola, assim como em outros

momentos e espaços da sua vida; cria situações de reflexão a partir de palavras e expressões

que aparecem nos textos e nos títulos dos mesmos; ênfase na intertextualidade; relaciona

histórias do mesmo gênero, demonstra muita criatividade e criticidade ao produzir

inferências sobre os textos lidos.

5.5. As implicações das práticas pedagógicas de leitura nas produções inferenciais:

leitura de textos narrativos.

Cada um dos alunos pesquisados apresenta peculiaridades em relação aos

processos de compreensão de textos narrativos, em função do seu desenvolvimento

cognitivo, sociocultural e aprendizagem (VIGOTSKY, 2007). Contudo, há alguns pontos

convergentes, quando analisados os principais aspectos da compreensão leitora dos 3 alunos

desta pesquisa.

A partir da indicação dos dados de leitura, associados às práticas pedagógicas

com ênfase na formação do sujeito leitor, desenvolvidas pela professora, seja nos projetos

e/ou atividades em sala de aula, é possível afirmar que, nesses três anos de escolarização, a

qualidade das atividades de leitura promovidas pela educadora contribuiu de forma

significativa para que os alunos desenvolvessem uma relação de diálogo com textos

narrativos, através de uma postura crítica de questionamentos. Embora em níveis diferentes,

essa característica é encontrada na compreensão leitora dos 3 alunos.

Neste sentido, considera-se que os projetos interdisciplinares com ênfase na

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leitura de textos literários, como a Maleta e, posteriormente, a Sacola da Leitura, as práticas

de promoção da leitura literária – leitura diária e a criação do festival literário (FLISELLO),

foram ações planejadas com o objetivo de desenvolver a criatividade e a constituição do

leitor engajado e proficiente.

Sobre a Maleta / Sacola da Leitura, trata-se de uma prática pedagógica - como

já foi dito anteriormente - implementada desde o primeiro ano do ciclo I pela professora da

sala, foi organizada com os objetivos a seguir: ampliar o acesso aos livros de diferentes

gêneros textuais que compõem o universo da literatura infantil; envolver a família na

vivência da leitura; apreciar (individual e coletivamente) durante a leitura valores estéticos,

afetivos e éticos; desenvolver a linguagem oral, por meio do reconto do livro lido; exercitar

a escuta, respeitar o momento da fala dos colegas.

Uma outra prática muito importante desenvolvida pela professora é a leitura

diária de livros de literatura infantil, na qual ela seleciona livros que podem estar ou não

atrelados aos projetos e faz a leitura por capítulos ou partes. As crianças esperam ansiosas

para saber o que irá acontecer no dia seguinte, quando a história será retomada, sendo que

essa atitude instiga a curiosidade das crianças. No decorrer da leitura diária, a professora

estabelece sempre com os alunos um diálogo sobre o livro, deixa livre para que os alunos

façam comentários diversos sobre o texto lido.

Outra prática citada nesta pesquisa de incentivo à leitura é o festival literário,

que ocorre em outubro, em comemoração ao dia das crianças. Foi idealizado com o

objetivo de criar mais um espaço de promoção à leitura e práticas culturais atrelada à

literatura, como explanado no capítulo 2.

A leitura é entendida como uma atividade social e a compreensão como um

processo de trabalho social, marcada fundamentalmente pelas interações, as quais também

devem ocorrer em sala de aula entre professor-aluno, entre aluno-aluno e entre aluno -

objeto de conhecimento em uma relação dialógica

Em muitos casos, o espaço escolar é o único lugar onde as crianças, que moram

em regiões afastadas do centro da cidade, têm a oportunidade de ter acesso a livros de

literatura e poder vivenciar todas as possibilidades de entretenimento, reflexão, criatividade

e fantasia promovidos pelo universo da leitura literária. Isso só é possível quando os

professores entendem a dimensão e as possibilidades da ampliação do universo das crianças

pelo viés dessa arte.

Defende-se que todo esse processo de compreensão leitora, internalizada pelos

alunos pesquisados, é determinado, em grande medida, pelas práticas pedagógicas de leitura

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e pelos projetos desenvolvidos de forma interdisciplinar pela educadora, a qual permaneceu

os três anos de escolarização das crianças e utilizou a literatura de uma forma mais ampla,

ao contrário da utilização puramente instrumental desse bem cultural, pela maioria das

escolas.

Neste sentido, além da compreensão leitora ser marcadamente relacionada ao

trabalho social, à leitura enquanto atividade; está atrelada à prática social, à função social

da leitura. Com relação ao conceito da atividade de leitura e sobre as pesquisas

contemporâneas sobre esse tema, recorre-se à Kleiman (2004):

A concepção hoje predominante nos estudos de leitura é a da leitura como

prática social que, na Linguística Aplicada, é subsidiada teoricamente

pelos estudos do letramento. Nessa perspectiva, os usos da leitura estão

ligados à situação; são determinados pelas histórias dos participantes,

pelas características da instituição em que se encontram, pelo grau de

formalidade ou informalidade da situação, pelo objetivo da atividade de

leitura, diferindo segundo o grupo social. Tudo isso realça a diferença e a

multiplicidade dos discursos que envolvem e constituem os sujeitos e que

determinam esses diferentes modos de ler. (p.14)

A partir da análise dos dados da compreensão leitora dos alunos pesquisados, é

possível concluir que estes apresentam características de leitores proficientes e engajados

no final do ciclo I. Essa proficiência leitora, característica dos sujeitos pesquisados, deve-se,

sobretudo, às suas experiências leitoras, as quais já foram elencadas anteriormente. São

práticas de leitura literária desenvolvidas para garantir a formação do sujeito leitor crítico,

criativo e capaz de produzir inferências de diversas origens ao estabelecer o diálogo com o

texto.

Além do compromisso com a educação e a criatividade observada nas práticas

pedagógicas de incentivo à leitura, um outro aspecto imprescindível para a formação do

aluno leitor é a maneira afetiva com que a profissional conduz a mediação entre o aluno e o

objeto cultural a ser apropriado.

Sobre a importância da qualidade da mediação conduzida pelos agentes

culturais - nesse caso, a professora – pode-se afirmar que a afetividade é um fator

determinante para a aprendizagem dos alunos. “A afetividade está envolvida em todas as

principais decisões de ensino assumidas pelo professor, constituindo como fator fundante das

relações que se estabelecem entre os alunos e os conteúdos escolares”. (LEITE, 2006, p.38)

Cabe aqui ressaltar que afetividade não está restrita ao contato físico ou à

utilização de uma linguagem mais carinhosa. A dimensão afetiva, como ficou demonstrado

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nos resultados obtidos nas pesquisas efetuadas no início deste século (Leite, 2006),

“envolviam todo o processo de planejamento e desenvolvimento das práticas pedagógicas,

mesmo nas situações em que o professor não se encontra fisicamente presente no ambiente”

(p.08). Para o grupo do Afeto (subgrupo do ALLE

no capítulo 1 é descrito todo o processo de constituição tanto do ALLE quanto

do AFETO e a relação existente entre eles) coordenado pelo referido autor, a afetividade é

estudada a partir dos impactos promovidos pela mediação pedagógica, na relação que se

estabelece entre o aluno e os conteúdos ou práticas desenvolvidas em sala de aula.

Neste sentido, ao discorrer sobre a importância da afetividade nas mediações

efetuadas por professores em sala de aula na aquisição do conhecimento cultural, Leite e

Tassoni (2007) demonstram como as condições implementadas pelos professores em seus

fazeres pedagógicos são valiosos para a aprendizagem significativa do aluno. Essas

condições, além de promover o conhecimento significativo, são fundamentais para que o

aluno aprenda a gostar do que estuda; sobretudo que tenha gosto pela leitura literária, um

gênero capaz de seduzir a criança, pelo seu universo criativo, fantasioso e tão caro ao

desenvolvimento humano. O conhecimento adquirido pelos alunos nas relações interativas

com outros textos,

neste caso, e com outros textos do gênero lenda, foram apropriados pelos alunos a partir de

práticas de incentivo à leitura literária, as quais ocorreram no espaço escolar, mas rompem

com práticas de leitura escolarizadas, entendidas como tradicionais e fragmentadas,

fazendo o uso do texto como um pretexto para trabalhar questões formais da língua.

Os dados nos mostram uma outra relação da escolarização da literatura literária,

que produz outros sentidos e saberes. Esse saber, considerado escolar, está relacionado

aos usos da leitura que podem ser dados entre outros elementos “pelas características da

instituição em que se encontram” (KLEIMAN, 2004).

Assim, concluímos que a criança, ao final do Ciclo de Alfabetização, cujas

práticas sociais estejam totalmente imbricadas em práticas cotidianas de leitura e não

somente na decodificação de palavras e frases, seja capaz de demonstrar compreensão

leitora marcada por uma complexidade de relações estabelecidas entre autor, texto e leitor.

Fundamentando-se em uma concepção de alfabetização na perspectiva do

letramento literário Cosson (2011), a opção por um trabalho pedagógico pautado em tais

premissas, faz toda a diferença para a formação de crianças e jovens além de leitores

proficientes, questionadores de realidade, política, econômica, cultural e social em que

vivem.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

As produções literárias, de todos os tipos e todos os níveis, satisfazem

necessidades básicas do ser humano, sobretudo através dessa

incorporação, que enriquece a nossa percepção e a nossa visão do

mundo... A literatura desenvolve em nós a quota de humanidade na

medida em que nos torna mais compreensivos e abertos para a natureza, a

sociedade, o semelhante. (CÂNDIDO, 1988, p.179,180).

Este estudo surgiu da necessidade de promover uma reflexão sobre a formação

do leitor e como ocorre o processo da compreensão leitora, sobretudo no espaço escolar,

nos primeiros anos de alfabetização, pois essa é uma fase crucial do desenvolvimento

intelectual, social, cultural e emocional da criança e início da aprendizagem sistematizada.

“Conduzida por sua capacidade de imaginação e pela inventividade de sua linguagem, a

criança é capaz de criar sínteses, funções ou prolongamentos dos elementos extraídos de

uma ou mais histórias. (SILVA, 2010, p.77).

Portanto há que se “descobrir as relações entre o processo de desenvolvimento e

a capacidade de aprendizagem” (VIGOTSKY, 2010, p.95). Neste sentido, o (a) professor

(a), ao trabalhar com conhecimentos escolares em suas diversas áreas, deve considerar o

nível de desenvolvimento real da criança, para garantir que ocorra efetivamente a

aprendizagem, sobretudo, na fase em que as crianças iniciam a estruturação dos

conhecimentos da leitura e escrita. Ainda que a aprendizagem ocorra em diversos espaços e

inúmeras situações de interação, é na escola que ocorre sua regularização.

Comumente, considera-se que o aprendizado está, necessariamente, relacionado

ao desenvolvimento mental dos seres humanos. Para Vigostsky (2010):

Aprendizado não é desenvolvimento; entretanto, o aprendizado

adequadamente organizado resulta em desenvolvimento mental e põe em

movimento vários processos de desenvolvimento que, de outra forma,

seriam impossíveis de acontecer. Assim, o aprendizado é um aspecto

necessário e universal do processo de desenvolvimento das funções

psicológicas culturalmente organizadas e especificamente humanas.

(VIGOTSKY, 2010, p. 103).

Nesta pesquisa, buscou-se lançar luz à formação da criança leitora, nos 3

primeiros anos de escolarização, analisando como elas produzem sentidos e inferências a

partir da leitura de textos literários. Sendo assim, este estudo procurou ouvir o que as

crianças tinham a dizer sobre os textos disponibilizados para a leitura no decorrer da

pesquisa.

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Busca-se desenvolver o gosto pela leitura por meio de temas veiculados nos

meios de comunicação, campanhas educacionais promovidas por diversas instâncias

governamentais, com discursos sobre as possibilidades de acesso ao mundo da imaginação

e ao desenvolvimento da criatividade. No entanto, apesar do discurso sobre a importância

da formação do hábito da leitura e o investimento em um país de leitores, várias questões

permanecem para serem discutidas e aprofundadas.

Como já exposto neste estudo, são várias pesquisas que buscam retratar a leitura

em suas diversas abordagens Por exemplo: como esses leitores estão sendo formados?

Quais os tipos de práticas de leitura estão sendo implementadas nas escolas de ensino

fundamental I? Aumentar o número de aquisições de livros literários garantem a formação

de um leitor engajado? Qual o papel do professor nesse processo? Quais diretrizes

pedagógicas são facilitadoras? Segundo Silva e Zilberman (2004):

Pois, se ler e escrever convivem juntos desde os primeiros anos da escola,

nem sempre explicita sua relação com o que os motiva e possibilita: o

texto escrito, independentemente da sua natureza, tipo, linguagem

empregada, produtor ou destinatário. (...)Por consequência, a passagem à

condição de leitor, nem sempre acontece de maneira natural..(SILVA E

ZILBERMAN, 2004, p.13)

Neste sentido, olhar para o leitor que é formado no espaço escolar não é tarefa

fácil, pois implica olhar para as práticas de leitura escolarizadas tradicionais que,

historicamente, visam, única e exclusivamente, perpetuar a leitura como mero instrumento

gramatical e o texto como pretexto para aprender conteúdos diversos.

Desta forma, o que se pretendeu com esta pesquisa foi dar voz ao leitor que

finaliza o primeiro percurso escolar, a fase de alfabetização e, abordando sua compreensão

leitora, através das produções de inferências construídas a partir de textos literários. Sobre

estudos desta natureza, Silva (2010) assevera:

Somente agora o sujeito-criança parece ganhar um espaço maior de

análise e discussão, transformando-se, por isso mesmo, em objeto de

preocupação e de pesquisa em vários pontos do país. Ainda assim, e

considerando a grande quantidade e variedade de crianças deste país,

dentro ou fora das escolas, são poucos – muito poucos- os estudos que

tratam, por exemplo, de questões relacionadas com a estética da recepção,

com a compreensão e a fruição de textos diversos, com o consumo de

informações transmitidas por diferentes veículos de comunicação, com a

experiência literária construída pelas crianças ao longo de sua trajetória

acadêmica. (SILVA, 2010, p.68).

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Portanto, esta pesquisa buscou contribuir para ampliação dos estudos referentes

à compreensão leitora de crianças matriculadas no final do ciclo I, segundo as diretrizes

curriculares, produzidos pela Secretaria Municipal de Campinas.

Para a análise das inferências produzidas pelos 3 alunos sujeitos desta pesquisa,

foram utilizadas as categorias elaboradas por Marcuschi (1985; 2007; 2008; 2011), para

caracterizar o processo da compreensão leitora. Foi possível, através da análise dos dados

de pesquisa à luz do referencial teórico exposto, dar visibilidade às estratégias pelas quais

os sujeitos constroem a compreensão de textos narrativos.

As inferências produzidas pelos sujeitos desta pesquisa foram organizadas

basicamente em duas principais bases: de base textual e de base textual e contextual

(MARCUSCHI, 2008, p.255). Sendo utilizado 3 textos narrativos do gênero lenda,

selecionados da cultura popular brasileira.

A partir da primeira organização de inferenciais foi possível ampliar as análises

considerando o quadro proposto pelo autor: tipo de operação inferencial, natureza da

inferência e condições de realização. Além disso, foi possível definir os horizontes de

compreensão textual: falta de horizonte; horizonte mínimo, horizonte máximo; horizonte

problemático e horizonte indevido.

O uso dessas categorias de análise foi possível por estarem baseadas na

concepção de que ler é inferir (MARCUSCHI, 2008 p. 237), sendo esse processo também

praticado por crianças e não somente por leitores com mais escolaridade e experiência

leitora: os resultados sugerem que a criança tem muito a dizer sobre o seu processo de

compreensão leitora.

Embora os 3 alunos selecionados tenham iniciado o processo de alfabetização

somente dois anos e meio antes deste estudo, foi possível constatar, através das inferências

produzidas, o quão significativas foram as práticas pedagógicas de leitura empreendidas

pela professora da sala, a qual permaneceu durante 3 anos com a mesma turma.

Constatou-se neste estudo como é importante para o desenvolvimento

intelectual, emocional e social da criança, a utilização da linguagem literária. Conforme

Silva (2010):

Enquanto experiência de linguagem e, ao mesmo tempo, de revelação,

descoberta e aprofundamento de referenciais de realidade, a leitura de

literatura infantil influi significativamente no processo de

desenvolvimento da criança. Além da usufruição do texto literário, que é,

em si mesmo, um processo criativo, a aventura do ler vai permitir à

criança um refinamento de sua razão (inteligência) pelas reflexões feitas

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acerca do possível e do impossível, acerca dos problemas de seu tempo e

de seu contexto. (p.77)

Portanto, os dados demonstraram que práticas pedagógicas que incentivam a

leitura, sobretudo de textos literários, abordando conteúdos de forma interdisciplinar que

valorizam o diálogo entre os diversos conhecimentos humanos, sem hierarquizá-los, podem

fazer a diferença na escolarização das crianças. Principalmente daquelas que somente têm a

escola como único espaço de aprendizagem, de acesso aos objetos culturais, à discussão

sobre valores e a realidade que se vive.

Em suma, para que os anos que as crianças vivem na escola sejam repletos de

experiências e situações significativas para as mesmas. Neste sentido Silva (2010) alerta

para o risco:

Na ausência de integração e de comunicação real entre os professores, em

benefício dos alunos- leitores, continuaremos a falar aos ventos sobre a

importância da convivência com leitura, sem poder e sem saber como

concretizar, na prática, ações pedagógicas consequentes. E o leitor que se

dane no círculo da inconstância, da mesmice e da barafunda escolar!

(SILVA, 2010, p.76).

Neste sentido, para que realmente ocorram práticas pedagógicas significativas

de leitura e ênfase em um letramento literário, é necessário o comprometimento dos

professores através de um planejamento pedagógico que, efetivamente, tenha como objetivo

a formação de leitores proficientes, engajados e críticos.

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APÊNDICE

SESSÃO DE OBSERVAÇÃO - 1ª Leitura - PL

ATIVIDADE: leitura do texto – Dança do Arco-Íris

DATA: junho/julho 2014

Nº DE ALUNOS: 3 alunos

SÍNTESE DA ATIVIDADE: 3 alunos foram convidados à participarem da pesquisa, todos já estiveram presentes em outros momentos, em

outras sessões de observação, de certa forma, já estão acostumados com a dinâmica das filmagens, sendo que na maioria das vezes eles estivessem

acompanhados pela professora e alguns colegas de sala. Essa atividade foi feita em momentos distintos e individualmente, estando presente em

cada sessão o (a) alun(o) a e a pesquisadora. A atividade está organizada em dois momentos: 1º) leitura em voz alta efetuada pelo aluno e 2º)

análise livre sobre o texto lido e intervenções da pesquisadora através de perguntas genéricas e direcionadas.

OBJETIVO: analisar a proficiência leitora de um aluno do 3ºano do ensino fundamental, considerando o processo de compreensão textual, com

base nos níveis das inferenciais: a) de base textual, b) de base contextual e c) sem base textual ( Marcuschi, 2008).

Transcrição dos Comentários sobre o texto : Dança do Arco-Íris realizados oralmente por um aluno do 3º Ano do Ensino Fundamental de

uma Escola Municipal de Campinas. ( Pedro ) – Junho de 2014

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Pesq

Pespq

Pesq

Pesq

Pesq

Depois de já acomodado na sala de informática e o texto já entregue a pesquisador dá o seguinte comando: vamos

começar: O aluno prontamente iniciou a leitura em voz alta, leu com tranquilidade , no entanto , em alguns momentos

teve dificuldade para pronunciar uma ou outra palavra.

Utilizou o dedo para ajudar no processo de leitura. O aluno leu o texto no decorrer de 7 minutos ( 51 linhas).

E aí (Pedro) ? O que você quer falar sobre o texto?

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Pedro

Pedro

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Pedro

Pedro

Pedro

Pedro

Pedro

Pedro

Pedro

Pedro

Pedro

Pedro

Pedro

Pesq.

Pedro

Pesq

Pedro

Pedro

Pesq

Eu gostei do texto, porque eles ficavam... eles não tinha comida , eles ficavam caçando as aves e fazendo cordas com as

penas deles .

Aí , um dia ele foi acertar a flecha num pássaro, mas só que ele errou e caiu no chão, aí ele foi tirar a flecha de lá , abriu

um buraco, aí ele botou ... aí ele fechou e saiu , não contou pra ninguém . Aí no outro dia ele voltou, abriu desceu lá

embaixo e conheceu ... conheceu a moça. Aí eles ficaram conversando, aí ele saiu e quando ele voltou ela falou eram uns

animais terríveis que tinham lá embaixo, e ele falou ... falou... é... cada uma falando coisas de cima e de baixo.

Aí depois os de baixo queriam subir , os de cima queria descer, aí ele veno ( pergunta da pesquisadora, quem que é

ele?), o caçador... o caçador quando ele viu seu povo ... não comia mais aves, eles pegavam presentes que os debaixo

davam pra eles... aí ele ficou... aí ele fechou ... e ninguém nunca mais foi pra baixo ou pra cima . Aí eles voltaram a

comer aves , tudo voltou ao normal.

Aí quando ele tava brincando com o cristal , aí ele viu que ... ele viu que o arco-íris ficava mudando de lugar. Aí ele

teve uma ideia , sempre que ela queira descer pra ver os familiares dela, aí ele colocava o arco-íris de um lado, quando

os de cima queriam desce pra baixo, ele colocava de outro. Aí eles ficaram legal , do mesmo jeito que ele não tava

gostando do jeito com a aldeia dele , ele encontrou um jeito deles ficarem juntos.

O que mais, assim , que você achou dessa história?

Ah eu não gostei da parte que ele não gostou que eles descessem e subissem .

Por que?

Por causa que também era só uma aldeia que ficava lá embaixo, eles também tinham que conhecer outras pessoas, né?

Pra conhecer outras coisas , outros animais.

Então você acha que é interessante que eles se relacionassem? O aluno balança a cabeça afirmativamente.

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Pedro

Pedro

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Pedro

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Pesq.

Pedro

Pedro

Pedro

Pesq

Pedro

Pesq

Pedro

pesq

Pedro

Pesq

Pedro

Você já leu algum outro texto que fala sobre essa questão indígena? Texto que fale sobre índio? Já leu alguma outra

coisa?

Ah, eu também já li a lenda do guaraná , que fala que nasceu um índio, aí uma cobra picou ele , aí ele morreu , aí no

lugar que ele foi enterrado, nasceu uma planta que tinha olhos iguais os dele, que era o guaraná. A da mandioca

também e da... qual foi aquela lá que a gente fez dos índios ? ( ele se pergunta em voz alta) .

Que vocês fizeram pesquisa? Sobre os índios? Ah , sobre o que dos índios? Os modos de vida? É, as

culturas ... as plantações.

Ah , entendi, você percebeu alguma diferença ou semelhança entre esse texto e outros que você leu sobre a civilização

indígena? O povo indígena?

Esse texto aqui é diferente dos outros que eu li porque os outros só falavam da plantação, de mulheres grávidas, de

caçadores . Esse daqui fala que o caçador encontrou outro mundo. Que na aldeia dele eles não tinham comida, comiam

aves, que a aldeia era cheia de nuvens .

Essa aldeia ficava em outro lugar né? Que lugar ela ficava, essa aldeia?

A de cima ou de baixo?

A de cima.

Ficava bem pertinho das nuvens. Aí os caçadores iam caçar.

Você quer colocar mais alguma coisa?

Não.

Não. Então tá bom ! Obrigada tá bom.

De nada .

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Transcrição dos Comentários sobre o texto : Dança do Arco-Íris realizados oralmente por um

aluno do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. (Pedro).

Julho de 2014 – Segunda-leitura

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Pesq

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Pedro

Pedro

Pedro

Pedro

Pedro

Pesq

Pedro

Pedro

Pedro

Pedro

Pesq

Pedro

Pedro

Vamos começar...

E aí? Você pensou em mais alguma coisa, além daquelas que você tinha pensado

antes?

Pensei , além de eu ter falado aquilo, é que minha família também não gosta muito de

festa, movimento, essas coisas.

E também não gostam que gente que vão muito lá em casa, tipo na copa , todo jogo do

Brasil, tava indo um monte de gente lá pra casa ver , aí meu pai fazia churrasco, mas

eles não gostavam muito do movimento.

Ah! E o que tem a ver isso com o texto?

Ah, por causa que além de um ficar indo pro outro lado, invés de eles tarem gostando,

num tava gostando. Eles tavam indo tanto, tanto , chega a corda quebrou e construíram

uma escada. Mas depois ele deu uma solução, pra ... quem quisesse subir

, subia e descia, pra namorada dele poderia ir. E que solução que

foi essa?

Ah , foi uma solução pra uma coisa que ... as duas nações poderiam ser ameaçadas por

causa que eles iam tanto de uma lado pro outro... chega que eles não cuidavam

7 min. E 15 segundos de leitura

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Pedro

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Pedro

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Pedro

Pedro

Pedro

Pedro

Pesq

Pedro

Pedro

Pesq

Pesq

Pedro

mais das coisas, não cuidavam mais do gado, da plantação. Aí aos poucos as coisas

iam ficando... iam morrendo né! Aí , então, invés das duas tribos serem extintas ele

fechou o portão, quer dizer “o coisa”.

A passagem né ? O que mais que chamou atenção nesse texto, assim?

Ah, eu gostei por causa que além deles terem muitas plantações, eu também vi que

quando lá em cima tá sol, lá embaixo tá chovendo, e quando tá chovendo em cima lá

embaixo tá sol, aí então ele pode ver isso pelo... cristal.

Humm, entendi! Muito interessante! E daí... mais alguma coisa? Pedro balança a

cabeça negativamente.

Tem certeza?

Ah , eu também queria falar de outras lendas de frutas tipo a do guaraná... foi um

menino que nasceu aí depois a cobra matou ele, aí... aí , onde ele foi enterrado

nasceu...não onde foi colocado os olhos dele, nasceu uma frutinha chamada guaraná,

porque tinha o formato dos olhos dele.

E o que tem a ver uma lenda com a outra?

É por causa que as lendas, além de ser uma coisa assim que as pessoas inventam ,

algumas são verdadeira outras inventadas , outras ainda não se sabem.

Ah, entendi! São histórias fantasiosas? Mas que dizem respeito um pouco sobre a

realidade de um povo.

É

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Pedro

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Pedro

Pesq

Pedro

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Pesq

Pesq

Ah, tá! E porque você acha que chama arco-íris, a dança do arco-íris , o texto?

É por causa que eles ficavam fazendo uma dança, ia pra baixo , outros ia pra cima.

Ah, o arco-íris por causa da namorada dele, que pra ela descê e subi.

E ele fez o que ? Pra ela descer e subir?

Ele ficou movendo o cristal , daí o arco-íris ia pra uma lado e pro outro.

Ah, ficava movendo pra lá e pra cá! E através do arco-íris ela ... o que que ela fazia?

Ela poderia... tipo descê pra ver os parentes dela e depois subi.

Muito bem! Mais alguma coisa? Faz com a cabeça que não.

Muito obrigada, de novo!

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Transcrição dos Comentários sobre o texto : Dança do Arco-Íris realizados oralmente por

uma aluna do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. (Elisa).

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Elisa

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Elisa

Elisa

Pesq

Pesq

Pode começar a leitura Elisa .

Após o término da leitura a p. pergunta: e aí?

Eu achei muito legal porque fala de um índio , de uma índia que... se.... que o índio tava

tentando pegar o pássaro , aí ele atirou a flecha no lugar errado e abriu uma passagem

para outro mundo . Aí , ele desceu lá escondido, aí ele viu uma... uma índia que ele se

apaixonou, os dois se casaram, aí eles namoraram, mas aí a índia subiu pra lá e toda vez

tinha festa, aí ficava um sobe e desce pra i e voltar pros dois mundos . Aí , o índio não

concordou com isso, então ele fechou, ele tapou o buraco, aí depois começou chover de

depois abriu o sol, que ele tava com o cristal, é que ele ganhou da mulher. Aí as nuvens

começaram a sacudir que fez chover, aí o cristal, é ... abriu um arco-íris que fazia... que

se mudasse de posição o arco- íris ia pra outro lugar. Aí ele só permitia que a mulher

descia lá pra visitar a família dela, mas quando as pessoas de lá de baixo queriam subir,

não deixava, porque... ele não concorda com a ideia, mas aí depois ficou assim , ele

virava o cristal e o arco-íris virava pra outro lado.

Por que que ele não concordava com a ideia? Por que ele não concordava com a

subida dos parentes dela?

1º momento/ leitura individual e voz alta: A

sessão foi gravada na sala de informática da

escola. A leitura da aluna foi fluente , e

demorou em torno de 5min. 45 seg. para

fazer a leitura de 52 linhas. “Tropeçou” em

algumas palavras que provavelmente

desconhecia, mas isso não foi empecilho

para que ficasse insegura ou parasse a

leitura, prosseguia de forma bem segura, a

cada “tropeço”. Leu com entonação,

preocupando-se com o todo do texto e não

somente com as palavras.

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Por que ele num... ficava feliz, então ele não deixou , mas a mulher mesmo assim

queria visitar os parentes dela.

Muito bem ! Mais alguma coisa? O que mais te chamou a atenção no texto?

É que... a mulher queria que os parentes dela subiam, só que o homem não deixava ,

porque ele não gostava, porque ficava um sobe e desce, fazia festa todo dia e eu acho

que ele não gostava.

Ele não gostava?

É e ficava... e o povo dele descia lá e ficava pegando coisa. Eu acho que também ... E

o que você acha que ele não gostava?

Ah ... , humm... porque ele é mais quieto. Ele não gosta muito de fazer bagunça. Ah

entendi. Muito bem! Mais alguma coisa?

Não

Então tá bom , muito obrigada!

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Transcrição dos Comentários sobre o texto : Dança do Arco-Íris realizados oralmente por

uma aluna do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas.

(Elisa ). Julho de 2014 – Segunda Leitura

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Nós vamos fazer agora a segunda leitura do texto : A dança do Arco-Íris com a aluna

Elisa .

E aí? O que que você achou?

Achei legal, porque o homem tava tentando atirar a flecha no pássaro pra ele levar pra

eles comer, só que aí ele errou a mira e foi cair lá no chão, aí começou abrir uma

venda que lá embaixo tinha outro mundo, aí um dia ele foi lá e encontrou uma mulher

que ele se apaixonou e namorou ela. Aí depois é, quando ela ia subir pra visitar ele , os

parentes dela queria subir junto, só que aí o homem não gostava muito, porque ele

achava que era muito chato, ele não ficava mais feliz quando era só ele e o povo dele. E

o pessoal lá de baixo queria visitar o mundo das nuvens né , que eles chamavam. Mas

aí um dia ele tava brincando com o cristal, que a mulher deu pra ele, aí começou

chover depois veio um raio de sol lá de baixo, aí abriu um outro buraco que....e aí a

mulher dele ficava com saudade, aí ele deixava só a amada dele descer. Aí se alguém lá

debaixo queria subir ele virava o cristal e o arco-íris pulava pra outro lugar.

Ele só permitia a passagem da mulher dele.

E essa passagem era feita por onde?

A aluna leu a história em 5 min, 20 seg.

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É ... pelo buraco!

Pelo buraco?

É.

E como ela chegava lá?

Ela descia escorregando.

Por onde?

Pelo arco-íris.

Ah, e porque que você acha que chama a dança do arco-íris, o texto?

Porque eles ficavam dançando e depois disso aparecia um arco-íris?

Que mais? Não tem problema se você não lembrar tá! Mas assim, o que mais que

chamou atenção nesse texto?

Que a mulher gostava de festa e o homem não, e o pessoal lá de baixo queria visitar ela

e ficava brincando lá no mudo das nuvens, ele não gostava , ele não se sentia mais casa.

Humm, ele não se sentia mais em casa , né? É.

Ele foi obrigado a tomar uma atitude! Que atitude foi essa?

Ele teve que tapar o buraco, e só permitia a subida da mulher dele.

Ela ficou com ele lá , né?

É.

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Mas ela morria do que?

De saudade dos parentes dela.

E ele arrumou um jeito então.

É.

E qual foi esse jeito? Que você já me contou né?

É.

Você conhece outra história parecida com essa?

Não.

Que fala de outros povos, povos indígenas? Você não se lembra de nada que você já

tenha lido antes disso?

Não.

Então tá bom , quer falar mais alguma coisa?

Não.

Então tá bom.

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Transcrição dos Comentários sobre o texto : Dança do Arco-Íris realizados oralmente por um

aluno do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Luís).

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E aí? O que você achou 4A? Legal.

Legal? Achou legal mesmo?

Aqui quando falou ( o aluno tenta buscar no texto o trecho que ele quer expor),que

tipo pegava o vapor da água, aí eu me lembrei de um negócio que a gente estudou sobre

como é que fazia chover , que o sol aquecia a água , aí fazia nuvens , aí tipo quanto

mais grande a nuvem mais chovia , aí caia a chuva e começava tudo de novo.

Interessante!

E quando falou do arco-íris aqui , falou que ele pegava o cristal e movia para o arco-

íris trocar de lugar . Então , eu também me lembrei bolha de sabão, quando eu brincava

com bolha de sabão , sempre eu via as cores tipo arco-íris, mais ou menos , só que

embaçado .

Hum, que interessante! Muito bom! E que mais você tem , assim, pra falar da história?

Ah sei lá, achei legal!

Da própria história aí ?

Achei legal né, porque ele, o caçador errou o tiro, que ele ia pegar uma ave, errou o

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Luís

tiro, aí abriu tipo uma passagem que levava pro mundo de baixo onde ele encontrou é...

uma menina que tipo ele foi se apaixonando. Aí , não sei quem aí fechou a passagem ,

aí eles tipo nunca se encontraram mais.

Quem que fechou a passagem? Aí eu não me lembro.

Ah tá!

Aí o caçador brincava com o cristal, aí lá embaixo começou a chover, aí veio o trovão

Que... o cristal que fez o arco-íris. Aí o caçador ficou mexendo o cristal, que eu já

falei, para o arco-íris mudar de lugar, aí tipo eles se encontraram. Eu acho.

Aqui também tá falando que ( o aluno leu o nome do autor e dados sobre o texto). E

porque você achou interessante isso?

Sei lá, porque os dois se apaixonaram, um ficava em cima e outro embaixo , aí tipo não

dava pra eles se encontrarem. Aí isto daqui , eu acho , que mistura romance , meio

romance com aventura.

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Transcrição dos Comentários sobre o texto : Dança do Arco-Íris realizados oralmente por um

aluno do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Luís).

Julho de 2014 – Segunda Leitura

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Luís

E aí? O que que você quer contar a respeito desse texto?

É ... que eu não entendi uma coisa , por que o nome desse texto é a dança do arco-íris?

Por que que você acha?

Não sei, o arco-íris não dança.

Não, o nome do texto é a dança do arco-íris se o arco-íris nem dança. ( rindo,

ironizando a situação)

A não ser que tipo, sei lá, dançaram ou festejaram por que descobriu o negócio do arco-

íris, descobriu sobre o arco-íris?

Interessante sua pergunta, o que que tem a ver , por que se chama a dança do arco-íris?

Então, eu também não entendi nada.

E também , quando falou que ele “coisou” a linha, eu fiquei imaginando se a linha

ficou torta pra eles subir meio que em pé, ou se ficou reta pra poder escalar. Essa parte

eu não tava entendendo.

Aí eu tive que só usar a imaginação.

Aí quando falou que subia e descia e o fio não aguentou, eu acho que a mulher já tava

lá em cima quando o fio arrebentou, aí colocou a escada pra eles poder descer e subir.

Fez a leitura em 12 min.e 27 seg.

Embora o aluno tenha problemas de fono ,

troca o r pelo l, de proficiência na leitura de

palavras e frases, troca muitas vezes uma

palavra por outra semelhante quanto a

grafia. Sua leitura é atenta e com foco.

Comparado aos outros alunos ele demorou

mais tempo para finalizar a leitura do texto,

no entanto, ele se manteve concentrado o

tempo todo, fez uma leitura tranquila e

principalmente é um aluno que procura fazer

várias relações do texto lido com situações

vividas, com outros textos e é bem

questionador.

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Até que o caçador quis .... ele quebrou a escada e fechou a passagem e fechou a

passagem.

Por que você acha ?

Não sei, pra eles não se encontrarem mais.

E por que que ele não queria que eles se encontrassem mais?

Você tá fazendo muita pergunta difícil.

Se fechou a passagem foi por algum motivo?

Eu acho que foi pra ele ficar com ela, com a mulher dos sonhos dele.

Humm, muito bem!

Aí, mas a mulher ficava triste porque não tava mais vendo a família. E o caçador fazia

de tudo pra ela ficar feliz , menos abrir a passagem. Aí na tarde ele brincava com o

cristal e o chão tava tremendo, isso significa que lá embaixo havia chuva.

Ele tava brincando com cristal na mão, e aí?

O raio de sol bateu no cristal que saiu o arco-íris. Aí ele descobriu o arco-íris.

E esse arco-íris se tornou o que?

Outra passagem, uma passagem nova.

Uma passagem nova! E o que ele fazia com o cristal?

Movimentava pra poder descer lá embaixo ou subir de lá de baixo.

Quem? Subir e descer de lá de cima e lá debaixo?

A mulher.

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Luís

E ele movimentava o cristal , e esse movimento significa o que? O que significa esse

movimento pra lá e pra cá?

Sei lá.

Pode ser comparado a que? Lembra do título?

A dança do arco-íris. Ah entendi agora, porque ele movimentava ( gesto com a mão) ,

como se o arco-íris tivesse dançando.

Agora descobriu tudo.

Só que eu queria saber , como é que se fica em cima das nuvens e não cai?

Então, por que será ?

Porque quando cê olha assim na nuvem, parece que ela é tipo , sei lá , meio que

transparente , mais ou menos.

Por que neste texto é possível não cair?

Por que é uma história? Por que é uma lenda?

Isso, e o que tem a ver uma lenda....

Lenda não é verdade.

É o que?

Lenda é um conto, tipo isso. Conto inventado pra poder explicar. Aqui foi inventada

essa lenda pra poder explicar o arco-íris , como é que foi feito o arco-íris.

Depois eles descobriram que é por causa da chuva e do sol e não por causa do

cristal...

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Quem descobriu?

Isso eu não sei.

Só que aqui , esse tipo de lenda é só pra explicar e também tem lenda urbana pra

deixar a gente com medo.

Existe esses dois tipos de lenda que eu sei. Lenda urbana e lenda inventada.

Mais alguma coisa Luís?

Não.

Obrigada!

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SESSÃO DE OBSERVAÇÃO - Primeira Leitura ATIVIDADE: leitura do texto – A Origem do

Oiapoque DATA: Agosto de 2014

Nº DE ALUNOS: 3 alunos

SÍNTESE DA ATIVIDADE: 3 alunos foram convidados à participarem da pesquisa, todos já estiveram presentes em outros momentos, em

outras sessões de observação, de certa forma, já estão acostumados com a dinâmica das filmagens, sendo que na maioria das vezes eles estivessem

acompanhados pela professora e alguns colegas de sala. Essa atividade foi feita em momentos distintos e individualmente, estando presente em

cada sessão o (a) aluno ( a ) e a pesquisadora. A atividade está organizada em dois momentos: 1º) leitura em voz alta efetuada pelo aluno e 2º)

análise livre sobre o texto lido e intervenções da pesquisadora através de perguntas genéricas e direcionadas.

OBJETIVO: analisar a qualidade de leitura de um aluno do 3ºano do ensino fundamental, considerando o processo de compreensão textual, com

base nos níveis das inferenciais: a) de base textual, b) de base contextual e c) sem base textual ( Marcuschi, 2008).

Transcrição dos Comentários sobre o texto : A Origem do Oiapoque, feitas oralmente por um

aluno do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas.

( Pedro).

Agosto de 2014 – Primeira Leitura

Comentários

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Pedro

E aí?

Eu achei meio triste essa história, por causa que a aldeia deles não tinha muita comida

e nem água, então ela decidiu sair de lá, aí pra procurar outro lugar, aí ela pediu

pro...pro...Tupã ( o aluno procura o nome do personagem no texto) pra transformar ela

A pesquisadora explicita o dia, mês e ano

que será feita a leitura e o título do texto que

será lido pelo aluno.

Em alguns momentos o aluno utiliza o

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em cobra, Aí como ele viu que ela tinha tanta coragem assim, aí ele fez o pedido dela,

aí ela achou um ilha com água e comida, aí ela foi falar pra aldeia dela, só que ela tinha

esquecido de falar pro Tupã tirar o feitiço dela, aí quando ela chegou lá , o bebê

nasceu. Aí todos viram que, então apareceram todos aí viram que um bebê nasceu de

... de uma cobra, aí eles acharam que era bruxaria, aí eles mataram o bebê, aí ela

começou a chorar , aí o choro dela fez um rio, aí ela entrou dentro do rio e adormeceu

no leito, aí depois quando ela chora o volume de água é tanta, o rio transborda e vira

um alagado até as ilhas próximas, aí por isso que o rio ganhou o nome de Oiapoque.

Humm, muito bem ! E o que mais você tem pra falar?

Ah, e eu achei legal porque ela queria deixar o filho dela ... ela queria que o filho dela

vivesse mais do que ela, mas só que depois ele morreu mais primeiro.

Humm, e o que que você acha disso?

É, apesar dela ter esquecido, também eles podiam achar que ela roubou , que a cobra

roubou o filho de alguém , da aldeia.

Muito bem.

E você quer comentar mais alguma coisa? Essa história é parecida com alguma outra

que você tenha lido?

Essa história é parecida com uma que a professora já leu pra gente , que era a lenda de

alguma coisa que eu esqueci, que falava quando o homem tava indo pra floresta, aí

apareceu uma onça , aí ele falou que não era pra matar ele, aí eles fizeram uma troca ,

dedo para acompanhar o texto, estratégia

muito usada em processos de leitura. O

aluno finalizou a leitura em

aproximadamente 4:00.

Durante o processo de recontagem do

história o aluno busca algumas informações

no texto, percebe-se que ele busca

informações pontuais sem a opção de

recorrer a leitura na íntegra.

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Pedro

a vida dele pelas filhas dele, aí ele foi esperto, ele não queria dar as duas filhas dele pra

ela , aí ele fez duas filhas , aí quando amanheceu elas tinham vida , aí elas foram pra

casa da onça , mas só que tinha dois lugares: a casa do lobo e a casa da onça. Aí cada

uma pegou um caminho, uma foi pra casa do lobo e a outra pra casa da onça. Aí

quando a irmã dela chegou na casa da onça, aí ela falou pra onça que a irmã dela tinha

ido pra casa do lobo, aí depois ... é , eu esqueci o que aconteceu, aí no final a onça fica

com as filhas e ele fica com as filhas dele.

A onça fica com as filhas ? Que ele criou.

Ah, você falou que ele fica com as filhas dele?

Não é a onça que fica ?

Não...ele fica com as filhas dele mesmo, aí a onça fica com as filhas que ele criou.

Humm.

Ele fez de um material assim, esqueci o nome, mas tá lá no meu caderno, na sala.

Hum, que você registrou.

É, que a gente leu na sala.

Ah , tá !E você tem estudado mais textos parecido

com esse?

Você contou esse pra mim, né?

O que você acha desses tipos de textos?

Ah , o outro que eu li era, ele... o homem foi esperto, ele fez ....ele criou as filhas com

um material aí elas tiveram vida na manhã seguinte , mas só que essa daqui, eu achei

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triste por causa que era a coisa que ela mais queria era ter um filho, mas só que o filho

dela morreu.

Essa é mais triste por isso né ?!? E você quer falar mais alguma coisa ?

Não

Então tá bom , tá ótimo.

Obrigada Pedro .

De nada.

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Transcrição dos Comentários sobre o texto : A Origem do Oiapoque, feitos oralmente por um

aluno do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Pedro).

Setembro de 2014 – Segunda Leitura

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Já faz um tempo né, que você leu? Não sei se você lembra da história.

Lembrar , até que lembro.

Então, vamos à leitura.

E aí?

É legal.

Por que?

De novo... é legal.

Porque, lá que eu já tinha falado antes, que ela não tinha comida, então a Tarumã quis

ver se tinha mais alguma ilha que tivesse água e comida. Aí ela foi , ela pediu pro Tupã

pra ela se transformar em cobra, ele transformou ela, aí ela passou meses andando...aí

até que ela encontrou a ilha e também, antes eu não tinha percebido que foram por

causa dos fulgos... dos sulcos dela, porque o rio se tornou, porque ela ia andando e a

terra ia... ia abrindo. Aí quando ela começou a chorar , aí a choradeira dela foi toda pra

aquele lado. Aí se tornou um rio.

Ah, uma única coisa que eu não entendi, foi, é como eles tiveram a ideia de dar o

nome de Oiapoque pro rio.

A 2ª leitura do texto foi feita no dia 02 de

setembro. Antes de inciar a leitura a

pesquisadora retoma a 1ª leitura desse

texto.

A leitura foi feita em 4min.

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Pedro

Humm, não sei. Isso, você tem que tentar descobrir.

Ah, isso eu sei que você sabe, mas se tá vendo que é pra mim descobri. É...

Você já ouviu falar desse rio, Oiapoque?

Não.

Você não estudou no projeto de geografia?

Estudei mais ou menos, ah estudei...um pouco desse rio.

Chegou a ver?

Não, vê eu não vi , mas estudar mais ou menos ele eu estudei.

Qual foi a pergunta que você fez mesmo?

Porque esse rio ganhou o nome de Oiapoque?

Por que que você acha?

Humm, será que foi pelo nome da aldeia, ou por causa... ah , não sei porque.

Tem esses textinhos aqui do lado, será que eles podem nos ajudar?

Deixa eu ver .

E aí , depois que você leu esses textos, que complementam a leitura ? você conseguiu

responder sua pergunta?

Consegui.

Então?

É antes de eu falar .... eu.... eu ia falar que era porque... porque era o nome de uma

aldeia .

Linha 28: diante da dúvida o aluno , busca

alguns trechos do texto, fala em voz alta O

Tarumã, Oiapoque, Oiampi... e responde

fazendo relação com o nome da aldeia.

Linha 30: prontamente o aluno inicia a

leitura dos textos complementares sobre a

região norte do Brasil . Na passagem que

fala da nação Oiampi , o aluno para de ler e

diz : Ah , agora eu entendi!.

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E é isso ?

É ( todo sorridente porque acertou ). É a casa de Oiampi.

Então , o nome do rio?

É Oiampi.

Se origina por causa....

De Oiampi. ( ele ficou radiante, muito feliz)

Mais alguma coisa?

Ah, eu... eu também quase cheguei pertinho da resposta ...eu ia falar que era o nome de

uma aldeia, aí você pediu pra mim lê isso daqui ... mas eu tava pensando em falar que

era o nome de uma aldeia.

Então tá vendo, que bom né! Você acertou!

É.

E assim, pelo que você já estudou do projeto de geografia, pelos outros textos que

você já leu parecidos com esse, o que você pode contar?

Ah, e também lá na prova, pediu pra falar de uma lenda , aí eu tentei falar de algumas

lendas, aí eu lembrei da origem do Oiapoque.

Ah, você lembrou desse texto que você já tinha lido.

Mas só que invés dela te o bebê ... quando ela chegou na porta , ela tava procurando o

bebê dela.... porque até tinha esquecido um pouco do texto.

Hum, entendi.

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Pedro

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E aqui também, é verdade isso daqui que a lua tem 2,5 vezes maior que a do sol. Além

dela ser mais próxima da terra , o sol também ... quando a terra tá longe do sol, ela é

fria , quando ela tá muito perto, ela é muito quente e quando a terra tem a posição

certa , nem muito quente , nem muito frio.

Então tá! Mais alguma coisa, Pedro ?

Não.

Muito obrigada!

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Transcrição dos Comentários sobre o texto : A Origem do Oiapoque, feitas oralmente por

uma aluna do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas.

( Elisa).

14 de agosto de 2014 – Primeira Leitura

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E aí? Você gostou da história? Não gostou? O que você achou? Eu gostei.

Hum, e o que você pode me contar?

Eu gostei porque eles viviam em uma aldeia, onde a fome tinha atingido eles e havia

pouca caça e quase nenhum peixe, e a seca acabara com as plantações de mandioca,

com as árvores frutíferas, aí a mulher tava grávida ... uma mulher chamada ( a aluna

procura o nome no texto) Tarumã, ela estava grávida, ela decidiu sair para achar um

lugar onde tinha comida, é... água pra aldeia dela, aí ela pediu pro Tupã, que queria ser

uma cobra pra procurar né, aí quando ela, ela avisou e toda vez que ela passava lá

deixava uma rastro né, aí ela chamou o povo dela, ela tinha achado uma aldeia ... não

uma aldeia, um lugar . Aí eles construíram as casas , tinha água, tinha comida, aí ela foi

lá e chamou, aí quando eles tavam indo, aí o bebê tinha nascido, aí a Tarumã teve a

filhinha dela bem na entrada do povoado né.

Aí quando as pessoas viram que a criança tinha nascido de uma cobra, acharam que

fosse algum tipo de bruxaria mataram o bebê, aí a Tarumã ficou louca de dor , mas não

atacou sua gente expressou

A pesquisadora faz uma introdução dizendo

a data da gravação e que é a primeira leitura

desse texto.

A aluna lê o texto em 3:43. Após a leitura a

aluna a faz silêncio, olha para o texto depois

para a pesquisadora, que faz uma pergunta

para que a aluna inicie sua fala.

Na linha 5, a aluna utiliza a palavra acabara,

ela recorreu ao texto que estava disponível,

pois não foi retirado o mesmo após feita a

leitura.

É perceptível que a aluna em alguns

momentos recorre ao texto para recontar a

história, no entanto ela faz isso com muita

facilidade, parece que já sabe onde está o

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a tristeza dela com um choro tão prolongado que as lágrimas preencheram os sulcos

que seu corpo havia cavado na mata, aí formou tipo um rio, porque ela era grande.

Isso.

Aí quando perdeu o bebê , ela não quis mais ser gente, ela também tinha esquecido de

falar pro tupã que queria ser gente de novo, aí pra ela se esconder do mundo, ela

mergulhou no rio de suas lágrimas e adormeceu no seu leito. Aí , na aldeia, os índios

contam que as águas do rio ficam revoltas nas noites de lua cheia e quando a Tarumã

suspira pela falta da filha, e quando ela chora o volume de água aumenta tanto que o rio

transborda e forma um grande alagado, até as ilhas mais próximas, foi assim que o rio

ganhou o nome de Oiapoque.

Então você me contou toda a história né?! Então, eu quero saber assim também, que

parte você mais gostou? Se você conhece alguma outra história que tenha a ver com

essa, o que você pensou sobre ... quando tava lendo essa história, se você lembrou de

alguma outra.

Ah... eu gostei mais da parte que ela tava chegando na aldeia e o bebê nasceu.

Hum, por que?

Porque aí é...teve a filhinha bem na entrada do povoado, quando as pessoas viram que

era uma criança nascida de uma cobra, aí elas mataram o bebê.

E você gostou disso? Que mataram o bebê?

Não, que eu achei legal que uma criança nasce de uma cobra, uma criança normal

trecho que pretende buscar para ajudá-la no

reconto.

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nascer de uma cobra.

Ah, o que você achou de legal nisso.

Porque eu nunca tinha visto uma criancinha nascer de uma cobra né!

Ah, então você achou interessante. Mais alguma coisa?

Ah , eu não me lembro de nenhuma.

É?

É.

Eu também achei legal a parte que ela quis se transformar em cobra só pra achar um

lugar pro povo dela ficar.

Hum, porque que você acha legal isso?

Porque ela tava ajudando a família.

E você acha importante isso?

A aluna faz sinal que sim com a cabeça.

Por que?

Ah , porque é a sua família, se tem que cuida dela, agora eu tenho dois irmãozinhos, eu

cuido deles.

Humm, isso mesmo.

Você acha isso importante então?

Faz com a cabeça que sim. Então ela teve uma boa ação?

Teve.

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E mesmo ela tendo uma boa ação ela sofre né, depois.

Rurum

Mais alguma coisa Elisa?

Não

Então tá bom , por hoje é só.

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Transcrição dos Comentários sobre o texto : A Origem do Oiapoque, feitos oralmente por

uma aluna do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas.

(Elisa ). Segunda-leitura

24 de setembro de 2014

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Então?

Ah, eu gostei, porque fala de uma mulher que morava em uma aldeia que, muitos anos

atrás né, a fome atingiu a aldeia dessa mulher né. Aí, ela tava grávida né, e ela não ia

consegui é...amamentar a filhinha dela que ela tava grávida né.

Aí depois, ela falou que ia procurar um lugar pra eles morarem que tinha árvores

frutíferas...é... água, caça, peixe, porque todos estavam doentes né, os bebês , os velhos

estavam quase morrendo né.

Aí, depois é ... depois é... de alguns dias... é... ela tava sozinha na mata né, aí Tarumã já

não tinha mais esperança, que ela não tinha achado, já tinha passado alguns dias, aí ela

começou a chorar com saudade de tudo que ela deixou pra trás né, em desespero ela

pediu pro tupã transformá-la numa cobra, de modo que ela pudesse é... ficou em volta

da floresta pra ver se tinha algum lugar onde eles podiam né... é.... aí a... pra encontrar

um lugar adequado para o povo dela construir outra aldeia né, que lá já não tinha mais

tanta coisa, aí ele ficou tão admirado com a coragem da moça que deus atendeu ao

pedido dela, né.

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Aí, durante meses né, aquela grande cobra vagou em busca de um local que houvesse

comida e água né, carregando o bebê , seu peso era tanto que por onde ela passava, ela

deixava os sulcos profundos no chão, né.

Aí depois, quando finalmente ela encontrou um vale cortado por um riacho com muitas

árvores frutíferas e caça nas redondezas, então a índia-cobra ficou muito feliz, que ela

não tinha .. é... é , não era mais uma índia né, e falou que era uma índia-cobra, aí depois

quando ela foi avisar o povo dela né, que eles já tavam indo pra lá.... é.... ela tinha se

esquecido de pedir pra ser gente de novo né, a criança nasceu né, aí as pessoas viram

que o bebê tinha nascido de uma cobra, acharam que era uma bruxaria né, aí elas foram

e mataram o bebê . É que.... aí a Tarumã ficou tão triste que as lágrimas dela é.... fez os

sulcos é se encherem de água né.

Aí , ela depois é, não queria mais ser gente porque ela mergulhou lá no rio onde ela fez

aí... noites de lua cheia é, ela chorava tanto que a água até fazia alagamentos, né. Aí

depois é ... foi assim que o rio ganhou o nome de Oiapoque.

Humm, muito bom ! E o que mais você tem pra dizer dessa história ? Que...

muito estranho né , um bebê nascê de uma cobra.

Isso é possível ?

Não, acho que não.

E porque aqui é possível?

Porque é uma lenda.

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Humm, em uma lenda é possível acontecer isso?

Raram !

Por que?

Porque não é real.

Mas nada que tá aqui é real?

Acho que só as aldeias né, que existe índio , né.

Humm, muito bem !

Mas as outras coisas, acho que não.

Muito bem, e porque chama a origem do Oiapoque?

Porque a mulher mergulhou no rio e ficou lá por muitos anos, aí o rio foi até... ele

ficou conhecido como o nome de Oiapoque né.

Entendi.

E essa história te fez lembrar de alguma outra que você já tinha visto?

Não.

Estudado em sala de aula?

Não.

Humm, nunca viu uma parecida com essa? Balança a cabeça

que não.

Entendi.

Que seja uma lenda , por exemplo, que não fala da Tarumã , fala de outras coisas, você

lembra?

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Nós já trabalhamos a lenda do guaraná, a da mandioca e mais outras aí que eu não

lembro.

E o que elas têm em comum com essa?

Nada.

Mas eu só sei que nós trabalhou várias lendas.

Então não tem nada em comum?

A do guaraná é que o menino foi picado pela cobra que era o jurupai, o espírito do mal

né, aí ele morreu. Aí o tupã .... eu acho que é o mesmo deus, o tupã... é ... ele falou que

era pra ... é... quando é, pra quando é, teve várias trovoadas né , mas aí , o povo quando

viu é que o indiozinho morreu né, que é o (?) e a mãe dele queria tanto um filhinho, aí

depois o tupã falou que era pra plantar os olhos do menino que ia nascê uma planta

milagrosa , que era o guaraná.

Então você identificou né ? Que é o mesmo deus.

Balança a cabeça positivamente.

Então você encontrou uma semelhança.

Risos.

Mais alguma coisa 3B?

Não.

Então tá bom, muito obrigada.

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Transcrição dos Comentários sobre o texto : A Origem do Oiapoque, feitas oralmente por um

aluno do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Luís).

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Pode começar.

E aí? O que você achou ? O que que você me conta ( após a leitura).

Legal.

É !

Porque essa história... posso reler tipo isso... reler só que não ler, conta!

Sim.

Que, muitos anos atrás, uma aldeia ficou com muita fome, aí as crianças que ficou

doente, os bebês e os velhos tavam morrendo... só que a Tarumã, eu acho que é Tarumã

mesmo, tava grávida, aí ela fugiu pro seu bebê não morrer, aí com fome e sede, ela

pediu, acho que foi pra Deus, sei lá quem aí, transformar ela em cobra, aí não sei

quando aí, ela virou cobra mesmo, aí finalmente , uns meses, ela achou a aldeia e ficou

toda alegre. Aí os índios que viram o bebê, tipo filho da cobra, aí acharam que era

bruxaria e matou o bebê, aí a cobra ficou triste, mas mesmo assim não quis matar os

índios, aí o resto eu já esqueci... não sei que aconteceu aí que eu já esqueci. Ah, ela foi

pro mar, aí de tanto ela chorar, o mar tipo aumentou.

O mar?

A gravação foi iniciada com algumas

informações relatadas pela pesquisadora,

como dia, mês, ano e 1ª leitura do texto. Em

seguida foi pedido para que o aluno iniciasse

a leitura.

A leitura foi feita em em 7:35.

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Deixa eu ver se é o mar ( procurou informação no texto), foi no rio né .... “o rio

transborda forma-se uma grande alagado”( trecho lido pelo aluno).

Aí por isso que agora o rio é chamado... tem um nome, ganhou um nome de Oiapoque.

Muito bem !

Por isso que é a origem do Oiapoque.

Sim , e o que mais que você pode contar pra gente ?

Posso ler esses pedacinhos aqui ó, que tem ? ( o aluno se refere aos textos informativos

que estão nas quatro pontas das páginas) .

Pode.

Estranho... agora não tô entendendo, se aqui tarumã é a cobra né, e aqui a tarumã é uma

árvore ou cidade ou fruta , agora já não tô entendendo não. Confundiu tudo agora. Ah ,

você acha que confundiu tudo?

É porque aqui tá falando que tarumã é uma cobra.... na verdade é uma índia cobra né, e

aqui , depois que eu li esse pedacinho, piquititico, eu vi que tarumã uma .... “tupi quer

dizer fruta que dá em cacho, o côco é uma das outras frutas também chamadas de

tarumã e a árvore é chamada também de tarumã”( trecho lido do texto informativo).

Então, porque será que é diferente? Em um texto a tarumã é uma coisa e no outro texto

a tarumã é outra? Por que você acha?

Ah, eu não sei !

Imagina! O que que você pode pensar?

Linha 23: após ler as informações sobre a

culinária do norte, especificamente os pratos

feitos à base de mandioca e e a origem da

tarumã, que é uma árvore, que produz uma

espécie de côco, o aluno indaga faz algumas

indagações importantes nas págs. 26 e 27.

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Eu acho que tarumã ficou tão famosa assim, que deu o nome também de árvore e

frutas.

Porque ela ficou famosa, ah entendi.

Tipo isso, ficou tão conhecida assim.

E esse texto, é um tipo de que texto, esse aqui que você leu grande, que fala da índia

tarumã ?

Que tipo de texto?

Lenda.

E, esse outro que fala que a tarumã é uma árvore?

Eu acho que é um texto mesmo.

Existe diferença entre um e outro?

Que um é maior e o outro é menor?

Isso. E a forma de contar , né?

É aqui conta uma lenda e aqui conta sobre tarumã , não tarumã que tá na lenda, tarumã

que é uma árvore, tarumã da árvore , da fruta.

E qual a relação entre essas duas tarumãs?

O nome.

O nome, muito bem !

Você acha que é só o nome?

Eu acho que é só o nome .

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É pra gente pensar , não estamos aqui falando certo ou errado. A gente tá tentando

entender , né? Você acha que é só o nome, então tá bom .

E o que mais você gostaria de falar?

Têm esses três pedaços, ainda, que sobrou. ( o aluno se refere aos outros textos

informativos).

Então pode ler.

Então aqui tá falando um pouco. (o aluno para a leitura quando descobre uma

informação sobre a origem do nome Oiapoque, no texto informativo).

Tá falando o que?

Que Oiapoque que é aquele rio, é a casa do oiampi. É , acertei agora.

“O rio Oiapoque faz a fronteira entre o Brasil e a Guiana Francesa , percorrendo todo o

norte do Amapá” ( trecho lido pelo aluno) . Agora só falta esse “pedação” ( referência

ao texto).

Se você não quiser ler , não tem problema .

Não, eu vou ler mesmo.

Muito bem 4A, após término da leitura.

Então, agora que falou o negócio da lua.... aí eu me lembrei de um filme, meu malvado

favorito, que ele rouba a lua, aí tipo a água fica bem , mas bem baixa mesmo. Aí fique

imaginando a lua se a lua tem a ver com a água, sem alguma coisa a ver com a água.

Se a lua fez a água existir , tipo isso.

Linha 60: Quando penso que ele está

cansado e não quer falar mais nada, ele

ainda se propõe a ler dois textos curtos que

complementam a lenda com informações

sobre a região norte. A atitude dele é muito

espontânea , ler não é algo cansativo e que

tem um caráter escolar e obrigatório. Esse

aluno demonstra curiosidade e interesse a

partir da leitura do texto e tem a prática de

fazer pergumtas, pra sua interlocutora, pra

si mesmo e utiliza o texto para ampliar

informações.

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Então nós vamos combinar assim , semana que vem vc. Fará a segunda leitura do texto

e essas dúvidas que você teve com relação a tarumã árvore , a tarumã índia, a relação

entre lua e água , você vai pensando pra gente tentar responder semana que vem.

Outra coisa , essa cobra aqui ( referência ao desenho ) quero saber se significa alguma

coisa , porque a cabeça dela é azul.

Então outra coisa pra você refletir. Combinado?

Humm

Então até a próxima semana.

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Transcrição dos Comentários sobre o texto : A Origem do Oiapoque, feitos oralmente por

um aluno do 3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Luís).

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Muito bem, e aí? ( após a leitura )

É, eu gostei porque fala de uma mulher, a Tarumã , acho que é o nome, que ... a aldeia

dela que tava tudo... ela ficou doente, morrendo, ela quis fugir pra salvar seu filho, não

tinha comida e nem água, ela pediu para tupã transformar ela em cobra.

Aí , ela achou .... esqueci o lugar, que tinha água e comida e frutas.

Aí, quando ela foi chamar o povo, ela esqueceu de falar pra tupã desfazer o pedido, aí

o bebê tinha nascido quando ela chegou perto do povo, aí todo mundo pensou que era

bruxaria, porque uma criança nascer de uma cobra. Até que isso não é comum né?

(risos).

Aí, mataram o bebê , aí a cobra Tarumã chorou, não sei, formou um riacho, um rio, aí

quanto mais ela chorava, mais aumentava, até que , e foi assim que esse rio ganhou o

nome de Oiapoque, agora entendi porque o nome é a origem do Oiapoque.

Ah, você entendeu então? Por que?

E agora? Não sei.

Você falou que entendeu...

É a origem do Oiapoque porque aqui fala, que por conta das lágrimas da cobra, fez um

Leitura foi feita em aproximadamente 5:50.

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Luís

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Luís

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rio né que ganhou o nome Oiapoque.

Muito bem .

Só que eu não sei porque o nome tinha que ser , principalmente Oiapoque.

Isso que eu queria saber.

Hum, porque será ?

Mais alguma coisa ?

Não que eu sei, não que eu me lembro.

Lê um trechinho ali do lado ó, essa parte.

Ah tá, então , assim , o rio é a casa do Oiampi.

Entendeu? Muito bem.

Mais ou menos, tudo mais ou menos.

Quer falar mais alguma coisa ?

Não.

Linha 24 - Percebendo que o aluno ficou

com dúvida ao ser indagado sobre o

significado do nome Oiapoque, a

pesquisadora pediu para que o aluno lesse

um texto informativo, que está em um dos

cantos da página e explica a origem do

nome Oiapoque. No decorrer da leitura o

aluno , fala baixinho , entendi.

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SESSÃO DE OBSERVAÇÃO - 1ª Leitura

ATIVIDADE: leitura do texto – Romãozinho

DATA: Novembro de 2014

Nº DE ALUNOS: 3 alunos

SÍNTESE DA ATIVIDADE: 3 alunos foram convidados à participarem da pesquisa, todos já estiveram presentes em outros momentos, em

outras sessões de observação, de certa forma, já estão acostumados com a dinâmica das filmagens, sendo que na maioria das vezes eles

estivessem acompanhados pela professora e alguns colegas de sala. Essa atividade foi feita em momentos distintos e individualmente, estando

presente em cada sessão o (a) alun(o) a e a pesquisadora. A atividade está organizada em dois momentos: 1º) leitura em voz alta efetuada pelo

aluno e 2º) análise livre sobre o texto lido e intervenções da pesquisadora através de perguntas genéricas e direcionadas.

OBJETIVO: analisar a qualidade de leitura de um aluno do 3ºano do ensino fundamental, considerando o processo de compreensão textual,

com base nos níveis das inferenciais: a) de base textual, b) de base contextual e c) sem base textual e contextual ( Marcuschi, 2008).

Transcrição dos Comentários sobre o texto : Romãzinho, feitos oralmente por um aluno do 3º

Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Pedro).

Novembro de 2014 – Primeira Leitura

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Pedo

Pedro

Pedro

Pedro

Muito bem , e aí?

Fala que ele, o Romãzinho era malcriado e era preguiçoso, os pais dele eram boas

pessoas, aí um dia a mãe pediu pra ele levar o almoço do pai , mas aí quando tava no

caminho, ele comeu toda galinha, aí ele levou pro pai, aí ele enganou o pai falando

que a mãe dele e outro homem tinham comido a galinha e botado os ossos na cesta

pra ele trazer, aí o homem ficou furioso e matou a mulher. Aí, antes da mulher, da

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Pedro

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Pedro

Pesq

Pedro

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mulher dele morrer, ela amaldiçoou ele, aí até hoje ele ainda fica vagando pelas ruas,

maltratando os bichos, dando nó no rabo dos cavalos e dando medo nas pessoas.

E, você já conhecia essa história?

Já, na sala a gente já tinha lido essa história.

Hum, a professora deu esse texto pra vocês já ? Ela deu esse texto pra explicar o que?

É, ela deu pra explicar... é a gente começou a fazer o centro-oeste, a í a gente

começou com a história de Goiás.

Hum, vocês estudaram o centro-oeste porque? Faz parte do que?

Faz parte do projeto que a gente tá fazendo ... é ... é, só não lembro o nome ( fica

pensativo) .

O que vocês estudam nesse projeto?

A gente tá estudando todas as regiões, a gente estudou o norte, agora a gente tá no

finalzinho do nordeste e tá começando o centro-oeste.

Hum, que interessante.

Aí , depois a gente vai pro sul.

E vocês lêem bastante texto nesse projeto?

Hãm ! ( sinaliza com a cabeça que sim).

E quais os textos que vocês leram?

A gente leu da lenda da mandioca, do guaraná, é ... a do Romãozinho ...

Pode citar só o que você lembra, o que você não lembrar não tem problema.

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Pedro

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Pedro

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Pedro

Pedro

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Pedro

Pesq

Pedro

Pedro

Pesq

Pedro

Pedro

Pesq

Pedro

Pedro

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Ah, têm várias outras , só que eu não lembro.

Ah, tá ! E vocês estudam elas, quando vocês estão estudando a região?

É.

Ah, entendi! Então essas vocês já leram?

Sim.

E você queria falar mais alguma coisa a respeito dessa ?

Ah, quando a professora leu pra gente , eu faço a mesma pergunta : por que ele era

tão malcriado se os pais dele eram tão bonzinhos?

Você ficou com essa dúvida? Por que será hein? O texto explica isso ?

Não muito.

Não né? E o que você acha ? Que explicação você pensa pra isso?

Vai ver os pais dele criaram ele bem e depois ele, que quando foi crescendo foi se

tornando malcriado.

Por que você acha que isso pode acontecer?

Por que já várias famílias , elas criaram o filho educado, aí depois eles vão crescendo

e ficando malcriados .

E porque você acha que isso pode acontecer?

É , porque ... às vezes... é , por causa de um amigo, de alguma coisa que deixou ele

nervoso.

Hum, você acha que pode ser isso então?

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Pedro

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Pedro

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Pedro

Pedro

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Pedro

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A companhia né, de algum amigo.

Mais alguma coisa 1A, que você queira falar, queira colocar?

Eu também não entendi uma coisa ... então porque fala que ele ainda era menino ... se

ele se transformava num fogo azul?

Por que será que ele se transformava num fogo azul ?

Vai ver foi a maldade dele.

E você acha realmente que uma pessoa pode se transformar num fogo ?

Ah, vai saber né ? Acontecem várias coisas aqui no nosso mundo.

Ah, entendi!

Aqui, esse fogo azul era do bem?

Não.

Eu não sei explicar porque ele se transformou num fogo azul. O texto explica? Não

também né?

Não.

E o que você imagina?

Vai ver ele se transformava por causa da raiva.... do.... ficar nervoso.... querer

maltratar as coisas .

Mais alguma coisa?

Não.

Então, muitíssimo obrigada.

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Transcrição dos Comentários sobre o texto : Romãzinho, feitos oralmente por um aluno do 3º

Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Pedro ).

Novembro de 2014 – Segunda Leitura

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Pedro

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Pedro

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Pedro

Pedro

Pedro

Pedro

Pedro

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Pedro

Pesq

Pedro

Pedro

Muito bem! E aí?

Essa Chapada dos Veadeiros, eu li um livro que também era de assombração, aí eu

não lembro se era de lobisomem ou era do corpo seco que parece que passou por ali.

Aí falava ... as histórias de assombração falavam do lobisomem, do saci-perê, do

curiango e do corpo seco.

Hum, é de história de assombração do Brasil? De personagens da história do Brasil ?

É.

É... a do saci-pererê falava que o saci era malvado e fazia .... maltratava as coisas , ele

ficava aprontando que nem o Romãzinho. Aí o corpo seco fala que se você bate no

pai você se transforma em um corpo seco, tipo um... uma ... é um tipo de zumbi, aí do

lobisomem fala de ... o livro fala de pessoas de ter certeza de ter visto essas coisas .

Nossa, que interessante né? E esse livro você leu... é daqui da escola?

É, na sacola da leitura.

Ah, que você levou pra casa pra lê?

O nome é histórias de assombração, tem 3 autores , foram os 3 que têm certeza que

viram essas coisas.

Leitura feita em 3:00.

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Pedro

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Pedro

Pedro

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Pedro

Pesq

Pedro

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Pedro

Pedro

Pedro

Pesq

Pedro

Pesq

Ah , e você lembra o nome dos autores ou não ?

Não lembro não , acho que um dos autores chama Ricardo Rocha.

Ah, você escreveu no seu caderninho de registro? A história?

Acenou a cabeça que sim.

Ah, que legal!

Aí no final aparece a foto dos 3 e aparece os lugares onde aconteceram aquelas ... as

coisas, aí eu vi Chapada dos Veadeiros.

Lá também fala da Chapada dos Veadeiros, e onde fica a Chapada dos Veadeiros?

É... daí eu já não sei.

Será que aí no texto não fala?

Esse texto aqui é da centro-oeste não é ?

É do centro-oeste.

Então é do centro-oeste.

Como você sabe que esse texto é do centro-oeste?

É porque a gente já tinha lido na sala e a gente tava fazendo é ... o projeto “Viajando

pelo Brasil desvendando nossas origens”, aí a gente foi do norte pro nordeste, aí a

gente estudou o centro oeste , aí a gente estudou o sudeste e agora a gente tá no sul.

Em todas essas regiões vocês leram algum texto?

Sempre alguma lenda ... tem de pessoas ... de como surgiu a mandioca, o guaraná.

E essas lendas ajudaram vocês a compreenderem a região?

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Pesq

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Pedro

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Pedro

Pesq

Pesq

Pedro

Pedro

Pesq

Pedro

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Sim, e a compreender também os negros ...

E o que mais?

Os negros eram bem maltratados pelos portugueses .... eles davam comida no chão

pra eles.

Ah, entendi. Estudando as regiões do Brasil vocês foram vendo como era o dia-a-dia

da época da escravidão, né?

É importante saber dessas coisas né? Da nossa história né?

A gente estudou a história do Chico Rei, que falava de um homem que era escravo, aí

sua família também foi, aí ele foi separado da família só ficou seu filho , aí eles

começaram a libertar os escravos colocando pó de ouro no cabelo.

E como que eles libertavam com esse pó de ouro?

Eles iam economizando, aí eles falavam com o ... com o moço pra ele... aí eles davam

pó de ouro ... aí eles libertavam ....

E compravam, a liberdade. E você sabe o que eles compravam, como era o nome?

Carta ....

De... a professora, a gente escreveu um texto, aí ela falou o nome , mas acabei

esquecendo.

Carta de alforria.

É isso daí.

Pra ficar livre , né ?

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Isso mesmo, muito bem!

Aí ontem a gente fez avaliação, aí apareceu pra colocar a história de Chico Rei .

Ah por isso que tá viva a história do Chico Rei na cabeça né ?!

É.

Ah que legal ! Muito bem!

Mais alguma coisa?

Ah, e também a roca é bem famosa no centro-oeste.

Ah é, porque?

Ela é uma forma de fazer roupas. Acho que foi no primeiro ano ou no segundo que a

gente fez um livro , era tipo uma canção, aí a velhinha fiando na roca, aí veio a

mosca, aí veio a aranha, aí foi indo.

E você sabe o nome desse texto?

Eu não lembro mais não, porque faz muito tempo que a gente estudou ele.

É a velha a fiar.

É isso daí.

É um livro não é ?

É, a gente leu e depois a gente fez o nosso próprio livro , copiando dele.

Ah, que legal!

Aí a gente fez uma apresentação da velha a fiar, aí cada um era uma coisa , aí no

final era a morte.

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Ah , entendi. Mais alguma coisa 1B?

É, e também no saci tem ... a professora falou que o saci tem vários nomes em cada

região, e aqui tem o saci de Goiás.

E o saci de Goiás é o ...

Nessa região o saci é o Romãzinho.

Ah, muito bem, isso mesmo. Excelente.

Cada região faz uma história diferente do saci .

Muito bem, ótimo! Mais alguma coisa ?

Deixa eu ver ... começou a ler o texto complementar

Essa é a característica da Chapada , né?

Aí também tem a culinária... e aqui fala da roca.

Ótimo, perfeito, mais alguma coisa?

Acena a cabeça que não.

Muito obrigada.

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Transcrição dos Comentários sobre o texto : Romãzinho, feitos oralmente por uma aluno da

3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Elisa ).

18 de novembro de 2014 – Primeira Leitura

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E aí?

Eu gostei, né!

Por que que você gostou?

Sim e não né? Porque o Romãzinho era malcriado e preguiçoso, ele fazia só coisa

ruim né. E, quando a mãe dele pediu pra levar comida lá pro pai dele... o pai dele que

tava lá trabalhando na roça.... é, ele atendeu com má vontade .... no caminho ele abriu

a cesta e comeu tudo e foi lá e levou pro pai dele né, e ele inventou uma brincadeira

que a mãe dele almoçava galinha com homem que vai lá na casa dele quando o pai tá

trabalhando né, e falou que quando eles acabaram de comer colocaram tudo os ossos

na cesta pra ele levar né. Aí o homem tava trabalhando na terra havia horas... aí ele

tava louco de ciúmes e raiva né.... ele foi lá pra casa dele correndo né , ele pegou a

faca e enterrou no peito da mulher , a mãe dele acabou morrendo por causa de uma

brincadeira que ele fez e aí ela amaldiçoou ele né. Enquanto o mundo existir ele vai

ficar vivo ainda, aí é o homem depois logo morreu né, porque ele ficou doente de

desgosto né. O menininho nem se abalou, o Romãozinho, porque ele não era

bonzinho, senão ele ia ficar triste. Aí, conta na história que ele ganhou o mundo, né.

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E o que é ganhar o mundo aí na história?

Não sei.

É ?

Aí é, quando a mãe dele morreu e amaldiçoou ele, é como se o tempo tivesse parando

na vida dele né, porque maldição de mãe pega ( risos) .

É né , verdade (risos).

Aí, é, ele fica vagando pela estrada espalhando medo né. Aí um dia a pessoas viram

ele transformando num fogo azulado, né. O destino dele é vagar pelo mundo enquanto

o mundo existir .

Então é isso aí que é ganhar o mundo né? Ficar vagando pelo mundo.

E o que você acho dessa “brincadeira” aí, que ele fez com o pai dele?

Muito feio.

Será que isso é brincadeira, mesmo? O que você acha que é?

Que não ama a mãe, que não ama o pai, acha que é uma brincadeira legal, mas na

verdade não é. Destruiu a própria família dele.

É verdade, isso foi horrível né?

Rurum.

E você queria falar mais alguma coisa Elisa, a respeito do texto, assim, que você

lembra? Você já conhecia esse texto?

Sim , nós já leu lá na sala.

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Ah!

E quando eu cheguei em casa eu fui ler lá pra minha mãe e pra minha madrinha, que

tava lá né. Aí, ela falaram também do texto.

Você leu esse texto pra sua mãe e sua madrinha?

Ah, e porque você leu esse texto pra elas?

Porque eu gosto de ler ...

E você achou interessante e quis contar pra elas?

Acenou a cabeça que sim.

Ah e o que elas disseram?

Ah, que .... não lembro , que já faz um tempinho né! Mas falou mais perto da história.

Entendi.

E você queria falar mais alguma coisa?

Não.

Então, muito obrigada!

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Transcrição dos Comentários sobre o texto : Romãozinho, feitos oralmente por uma aluna do

3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Elisa ).

27 de novembro de 2014 – Segunda Leitura

Comentários

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Muito bem! Leu rapidíssimo hein!

Você lembrou de alguma coisa, pensou em alguma coisa a mais que você não falou na

última leitura ?

Hum , mais ou menos.

Pensou? O que que você pensou ?

É , eu gostei mais ou menos porque essa história fala que morreu a mãe e o pai né e ,

ele nem se abalou. Quando morre alguém da família todo mundo se abala que fica até

semanas sem ri.

Ele não, ele saiu de casa ganhou o mundo e a mãe amaldiçoou ele , como se isso fosse

que .. parou o tempo quando ele era menino, quando sua mãe morreu né .

Rumrum

E ele deve ter se transformado num fogo azulado deve ser que ele era tão mau tão

mau que... eu acho triste também é ... maltratava os bichinhos né, arrancava as plantas

... ficava fazendo um monte de coisa ruim.

É né? Isso é bem ruim!

Por onde ele passa , ele espalha o medo ... um medo que ninguém sabe explicar.

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Hum, você leu com a professora na sala de aula esse texto?

Li

Ah , e como foi quando vocês leram?

Nós fizemos uma leitura junto com a professora, depois nós pegou nosso caderno e

escreveu algumas coisas.

Humm e vocês leram esse texto dentro... que trabalho vocês estavam fazendo?

É, as regiões.

Ah , e de que região é esse texto aí? Falou aí o nome né .

Goiás.

Que região que é Goiás?

Fica pensativa e diz que não lembra. Não lembra ?

Faz com a cabeça que não.

Mas alguma coisa que você queira falar sobre o texto?

Humm, não.

Você já leu bastante ele, né? Já conhece bem a história né?

Ah e tamém quando eu cheguei em casa é... eu fiz a mesma coisa que nós fizemo lá

na sala com minha mãe e minha madrinha. Eu li o texto pra elas e elas comentaram

também.

Ah! E o que elas comentaram?

Que é muito feio fazer as coisas que ele fazia, que ele se transformava em fogo

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Ah!

Comentou sobre o texto.

Esse texto ... que tipo de texto é esse daí?

Ele é um texto de jornal ? Que texto ele é ?

É uma lenda.

Porque ninguém se transforma num fogo azulado.

Ah , entendi.

Mas a lenda é importante?

É... mais ou menos.

Por que mais ou menos?

Um pouco sim um pouco não.

E o que que é um pouco sim ?

É que aqui tá falando é que ele fazia essas coisas e tem crianças que faz a mesma

coisa .. e não porque não pode fazer ... explica que eles faz essas coisas que feio né

... então.

Entendi. E quando as pessoas que lêem ... ajuda as pessoas ...

A parar de fazer .

E porque não é bom?

Que quando o pai dele e a mãe dele morreu né ... não se abalou, saiu de casa ganhou o

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mundo .... é, ele fazia coisas más , ele tirava os animais do rebanho né, disanimava

os viajantes que tavam viajano, e falava que era pra um lugar , se perdiam.

É! Isso é muito ruim né? Por que será que é muito ruim?

Num tá certo né !

É isso mesmo.

Mais alguma coisa, que você ainda queira falar sobre o texto?

Hum, não.

Não? Então tá bom.

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Transcrição dos Comentários sobre o texto : Romãozinho, feitos oralmente por um aluno do

3º Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Luís).

5 de Novembro de 2014 – Primeira Leitura

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E aí?

Achei legal.

É? Por que?

Porque fala de um menino, que mentiu pro pai falando que a mãe dele, uma mulher

né. Comeu galinha com um homem, aí o pai ficou com ciúmes e raiva e matou a

mulher, antes dela morrer , ela jogou uma maldi...amaldiçoou o filho, que enquanto ele

viver , ele nunca vai morrer . Só vai morrer quando for o fim do mundo. Aí , ele ... aí,

o pai morreu doente , por conta que matou a mulher dele , e o filho ficou, meio que um

menino ruim, que ficou assombrando todo mundo , fazendo coisa ruim mesmo.

E, sei lá... acabou.

E você achou legal por que?

Ah , e também essa história é um pouco parecida, essa parte aqui é um pouco parecida

com, a parte lá do saci-pererê. E aqui fala que o saci-pererê, que no São Francisco no

centro-oeste, no rio São Francisco entre dois... é o famoso Romãozinho.

E como você sabe que ali ( apontando para o texto complementar) estava falando sobre

o saci , neste textinho aí?

Leitura feita em 5:40.

Linha 14: o aluno mostra outro texto da

página, um texto informativo sobre o saci-

pererê. E vai lendo com o dedinho em

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É que aqui em ciminha tá estado de Goiás. ?

Mas como você sabia que aí tava escrito sobre o saci de Goiás?

É que a professora tinha lido antes .

Ah, então você já conhecia essa história? Quando que ela leu essa história pra vocês?

O dia? Isso eu não lembro.

Assim, em que momento, o que vocês estavam fazendo na sala de aula.

Todo mundo leu , cada um leu uma parte , a professora escolhia alguém aí lia mais ou

menos até ( indica uma parte do texto). Aí era outro e até assim .... outro.

E por que vocês estudaram esse texto em sala de aula ?

Eu não lembro.

Não? Tem certeza?

Por que ela levou esse texto?

Então, eu não lembro!

Nem imagina?

Não.

Esse texto fala ... você já contou a história, né? Fala do Romãzinho e o que mais que

ele fala?

De um menino mentiroso, de ciúmes, raiva né. E da roca.

O que mais?

Da.... Veadeiros, alguma coisa assim.

silêncio.

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Ah, o que é Chapada do Veadeiro?

Não sei .

O que você acha que é? Chapada dos Veadeiros que fala aí.

Sapateria tipo isso?

Chapada dos Veadeiros, o que você imagina que seja?

Tipo sapateria assim, onde eles vendem sapato?

Será? Chapada , não está falando de sapateria.

Chapada dos Veadeiros (fica pensativo).

Não? Então tá!

E a professora usou esse texto na sala?

Rurum.

Tá, e quando ela usou esse texto na sala , você me disse que todo mundo leu uma parte

?

Aí depois que todo mundo acabou , ela leu tudo de novo pra ficar melhor. Tem uns que

leem baixo, outros alto, alguns rápido ....

Sei, e esse texto, fala de algum lugar?

De Goiás. É aqui fala de Goiás ( apontando para o texto). E aqui no cantinho fala do

centro-oeste e o São Francisco e só.

Tem alguma coisa a ver com que vocês estão estudando ou não? Esse texto?

Não, agora não... eu acho.

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O que vocês estudaram?

O que nós estamos estudando?

É... as regiões. Centro-oeste.... que eu sei nós tamo no .... nordeste.

E vocês já estão algum tempo estudando?

Começamos no norte , e depois vamos até o sul.

E o que mais que você tem pra dizer do texto?

Do texto? Porque ele se transformou num fogo azul.

E o que você acha disso?

Não sei.

É possível alguém se transformar num fogo azul?

Azul ? Sei lá....

Então tá bom, mais alguma coisa?

Não.

Então tá bom, obrigada!

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Transcrição dos Comentários sobre o texto : Romãzinho, feitos oralmente por um aluno do 3º

Ano do Ensino Fundamental de uma Escola Municipal de Campinas. ( Luís ).

18 de Novembro de 2014 – Segunda Leitura

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Muito Bem!

E aí?

Eu pensei que... tem uma parte aqui que fala que ele assombra aqueles que vão

passando pela estrada, aí isto daqui me lembrou muito uma lenda que nóis lemos lá na

sala que é de uma mulher que também fica assombrando, que ela fica pedindo carona,

aí quando chega numa curva , é fala que foi lá que ela morreu, aí todo mundo...

E você sabe o nome dessa lenda ?

Não. Também aparece no gibi que eu li, de terror.

Ah , essas histórias de assombração ?

Aí tinha aparecido uma menina que também morreu, só que foi no penhasco.

Ah , entendi! E o que mais que você pode observar aí no texto?

A roca, eu sei que a roca é uma coisa que serve pra fazer a linha, ou é o que eles

usavam meio que pra costurar e, a Chapada dos Veadeiros.

O que que tem a Chapada dos Veadeiros?

Eu esqueci o que que é.

Esqueceu o que que é a Chapada dos Veadeiros?

A pesquisadora relembra que esse texto já

foi lido em mais de um momento e a

mesma orienta o aluno na leitura: você vai

ler e tentar trazer coisas que você não tenha

lembrado, que você não tenha pensado na

primeira leitura, pode ser?

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Hum, você não lembra? E o que que chamou a atenção na Chapada dos Veadeiros? O

que que você lembrou dela?

É a Chapada né ... a palavra Chapada.

É a palavra Chapada que te chamou atenção?

É , eu queria saber o que é Chapada.

Hum, no Brasil tem vários lugares em que tem chapadas, como se fossem montanhas ,

com cachoeiras... como a Diamantina na Bahia e Veadeiros na região centro-oeste.

E também essa história que parece.... um pouco conta a história do saci, porque os dois

moleques que são bagunceiro, arteiro também percebi que essa história foi contada em

Goiás.

Foi contada em Goiás? Isso. Ah do Romãozinho né?

E você acha que o Romãozinho é só arteiro e brincalhão?

Hum!

Ou não ? Tem mais alguma coisa aí da personalidade dele?

Talvez lá no fundo , bem lá no fundo mesmo ele fosse um pouco bonzinho.

Será ? O que que ele fez? Você lembra o que que ele fez ?

O que que ele fez?

Ele mentiu pro pai falando que a mãe dele tava comendo a galinha com homem que ia

lá e o Romãozinho levou os ossos pro pai. Aí o pai ficou furioso e com ciúmes e

matou a mulher. Aí ela jogou uma maldição no filho .

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E qual era a maldição?

Que ele , tipo assim , ia viver até o fim do mundo, não ia morrer nunca.

Só queria saber se ele não ia morrer nunca e se acontecesse um acidente que ele fosse

atropelado, o que ia acontecer ? Ou ele ia ressuscitar ou ia abrir um escudo nele, pra

parar sei lá, o carro.

Você acha que essas coisas são brincadeiras?

Sei lá, talvez ele só queria deixar o pai bravo mesmo.

Ih mas deixou muito bravo né?

Bravo até demais, tão bravo que matou a mãe.

É complicado né?!

Eu acho também, será que ele já sabia que o Romãozinho era arteiro? Eu acho que a

mulher podia ter falado, que podia ser uma brincadeira dele.

Ah muito bem!

A parte lá que ela recusou ter comido com ele.

Rurum poderia evitar a tragédia né?

Rurum

Assim o Romãozinho não ia ficar assim, vivo pra sempre.

E nem a mãe dele teria morrido né?

Rurum.

E o pai também, eu só não sei porque ele morreu de doença, Não sei se ele morreu

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doente por causa que ele se arrependeu de ter matado ou se ele ficou doente assim

normal, pegou uma doença sei lá.

Entendi, mais física né ?

Tá ótimo então! Mais alguma coisa Luís?

Não mais?

Faz com cabeça que não.

Então tá bom!

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Anexos

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Anexos

PARECER CONSUBSTANCIADO DO CEP

DADOS DO PROJETO DE PESQUISA

Título da Pesquisa: A Constituição do leitor proficiente : o papel da mediação pedagógica

Pesquisador: Ana Cláudia de Sousa Rodrigues

Área

Temá

tica:

Versã

o: 2

CAAE: 41368814.0.0000.5404

Instituição Proponente: Faculdade de Educação

Patrocinador Principal: Financiamento Próprio

DADOS DO PARECER

Número do Parecer: 999.692

Data da Relatoria: 26/03/2015

Apresentação do Projeto:

Resumo: Esta pesquisa busca compreender como os alunos de uma Escola Pública Municipal da

cidade de Campinas, Ensino Fundamental, na faixa etária entre os 8 e 9 anos de idade,

matriculados no 3º ano do Ensino Fundamental, final do Ciclo I , definido como Ciclo de

alfabetização e Letramento, constituem-se como leitores proficientes, considerando a mediação

pedagógica e as produções de inferências orais construídas por cinco crianças .

Os alunos serão submetidos a sessões de leitura, onde, no primeiro momento, farão a leitura de

um texto narrativo em voz alta; em seguida, produzirão comentários com base na leitura feita, de

forma espontânea e mediante perguntas elaboradas pela pesquisadora. Os comentários serão

analisados à luz dos conceitos de inferências desenvolvidos por Marcuschi (2008) e cotejados

com as seguintes práticas pedagógicas de leitura desenvolvidas pela professora: Maleta da

Leitura; Roda da leitura; Projetos Interdisciplinares (Ciências, Geografia e História) e

FISELLO ( Festival Literário), sendo os 3 primeiros trabalhados desenvolvidos desde o

primeiro ano do Ciclo I. As práticas da professora priorizam a leitura literária como gênero para o

aprendizado de vários conteúdos escolares. Os processos de interação entre professora e alunos

para apropriação da atividade leitora serão analisados a partir da teoria histórica cultural

desenvolvida por Vigotski (2003).

Desenho:

Endereço: Rua Tessália Vieira de Camargo, 126

Bairro:

UF: SP

Barão Geraldo

Município: CAMPINAS

CEP: 13.083-887

Telefone: (19)3521-8936 Fax: (19)3521-7187 E-mail: [email protected]

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Bairro: Barão Geraldo CEP: 13.083-887

UF: SP Município: CAMPINAS

Telefone: (19)3521-8936 Fax: (19)3521-7187 E-mail: [email protected]

Esta pesquisa situa-se no campo das ciências humanas, mais especificamente na área da

Educação. Visa compreender como alunos , em uma sala de aula do 3º. Ano do Ensino

Fundamental, apropriam-se da atividade de leitura, defendida aqui como prática social e

subsidiada teoricamente pelos estudos do letramento, propostos por Kleiman (2004). Busca

compreender como esses alunos constroem a compreensão leitora a partir de

práticas educativas promotoras da leitura no ambiente

escolar. Método

A pesquisa privilegia a abordagem qualitativa (Bogdan & Biklen,1994), em que o pesquisador se

posiciona como observador dos processos que deseja analisar. No caso , são dois momentos da

pesquisa: primeiro as sessões de observação – individuais, onde a pesquisadora, em um outro

ambiente da escola que não seja a sala de aula, pede para a criança ler um texto narrativo em

voz alta; em seguida, a mesma discorre sobre o texto lido fazendo suas considerações de forma

espontânea, com a intervenção da pesquisadora. O dados obtidos a partir dessas observações

serão analisados à luz dos processos inferenciais desenvolvidos por Marcuschi (1985; 2008). Em

um segundo momento, a pesquisadora participará das aulas, observando as atividades de

leitura, com o objetivo de apreender o processo de ensino-aprendizagem, com ênfase na

interação aluno-professor. Esses processos serão videofilmados e analisados segundo a

teoria histórico cultural de Vigotski (1984; 1998). Para compor a pesquisa, ainda serão

produzidas entrevistas com a

professora da sala para a compreensão dos vários projetos de leitura, desenvolvidos por ela.

Objetivo da Pesquisa:

Objetivo Primário:

Analisar o desenvolvimento do processo de compreensão leitora de crianças do 3º ano do Ensino

fundamental, com base nos processos inferenciais de base textual, contextual e sem base textual e

contextual, propostos por Marcuschi ( 2008) e nas práticas pedagógicas desenvolvidas pela

professora que visam à formação do leitor proficiente e autônomo .

Objetivo Secundário:

Buscar apreender o processo de ensino aprendizagem com ênfase na atividade de leitura com

base nas relações estabelecidas em sala de aula na interação entre professora e alunos, ao utilizar

a linguagem do texto escrito como instrumento simbólico para a constituição do leitor proficiente.

Avaliação dos Riscos e Benefícios:

Riscos:

Essa pesquisa não oferece riscos previsíveis para o participante.

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Benefícios:

Não haverá benefício direto. Entretanto, ao participar deste estudo vocês estarão contribuindo para

ampliar o conhecimento científico sobre a como as práticas pedagógicas de leitura em sala de

aula contribuem para a formação do leitor proficiente e crítico.

Comentários e Considerações sobre a Pesquisa:

Pesquisa relevante, que contribuirá para ampliar o conhecimento sobre práticas pedagógicas

desenvolvidas para a formação do leitor proficiente O projeto está bem descrito, metodologia

adequada. Projeto pertinente do ponto de vista científico.

A metodologia está adequada aos objetivos.

O Currículo do pesquisador responsável e dos demais pesquisadores são apropriados para a

realização da pesquisa.

Considerações sobre os Termos de apresentação obrigatória:

Foram apresentados o projeto original, o formulário gerado pela Plataforma Brasil, Folha de Rosto

devidamente assinada. O cronograma foi adequado e foi anexado a autorização da escola para

coleta de dados. O TCLE foi alterado solicitando autorização para gravação das aulas dos

alunos.

Recomendações:

-Recomendações de colocar um espaço para rubrica no final de cada página.

Conclusões ou Pendências e Lista de Inadequações:

Pendências emitidas no parecer CEP número 969.384 de 24/02/2015

1-)Adequar o TCLE segundo a estrutura básica apresentada na página do comitê de Ética da

UNICAMP http://www.prp.unicamp.br/files/3_estrutura_basica_tcle-_versao_marco_2014.docx

Resposta:O TCLE foi adequado segundo a estrutura básica, mas falta o local para rubrica no

final de cada página.

Análise:Pendência parcialmente atendida

2-)Riscos e

benefícios:

Riscos e

desconfortos

:

Não diga que não há riscos. “Diga que não há riscos previsíveis”.

“ Não há projeto sem risco”,toda pesquisa com seres humanos envolve risco com graus variados. O

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dano eventual pode ser imediato ou tardio, comprometendo o indivíduo ou a coletividade. A

tipificação do risco nas diferentes metodologias de pesquisa será definida em norma própria, pelo

Conselho Nacional de Saúde. Possíveis desconfortos e riscos decorrentes da participação na

pesquisa devem ser informados (tempo despendido na coleta, possíveis desconfortos). Sempre

detalhar como será a coleta.

Resposta:"Essa pesquisa não oferece riscos previsíveis para o participante, você ou sua família,

mas poderá haver algum desconforto pelo tempo dedicado ao estudo".

Análise:Pendência atendida.

3-) Benefícios: Lembramos que a única maneira de amenizar o fato do participante não ter

benefícios diretos com o estudo é informar direta e adequadamente isto a ele, para que possa

decidir livremente se participará ou não. Os benefícios sociais estão bem descritos, mas deverão

ser resumidos.

Resposta:Também não haverá benefício direto para vocês. Entretanto, ao participar deste estudo

vocês estarão contribuindo para ampliar o conhecimento científico sobre a como as práticas

pedagógicas de leitura em sala de aula contribuem para a formação do leitor proficiente e crítico".

Análise:Pendência atendida.

4-)Acrescentar o item Responsabilidade do Pesquisador:

"Asseguro ter cumprido as exigências da resolução 466/2012 CNS/MS e complementares na

elaboração do protocolo e na obtenção deste Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Asseguro, também, ter explicado e fornecido uma via deste documento ao participante. Informo

que o estudo foi aprovado pelo CEP perante o qual o projeto foi apresentado. Comprometo-me a

utilizar o material e os dados obtidos nesta pesquisa exclusivamente para as finalidades previstas

neste documento ou conforme o consentimento dado pelo participante." No final, colocar a data e

assinatura do pesquisador responsável.

Resposta:Foi inserida a

informação.

Análise:Pendência

atendida.

5-) Conforme Resolução CNS nº 466 de 2012, itens IV.3.g e h, devem estar explícitos no TCLE os

direitos a indenização e assistência integral frente a dano decorrente da pesquisa, mesmo que

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estes sejam eventuais e não possam ser previstos, e o ressarcimento de qualquer gasto que o

participante tenha com a pesquisa. Dessa forma, solicita-se que tais informações sejam

adicionadas ao TCLE. Resposta:"Não haverá ressarcimento de despesas, pois as observações e

entrevistas serão realizadas no dia e na escola em que o professor e o aluno desempenham

suas funções. A participação nesse estudo é totalmente voluntária e não acarretará em custos

extras em seu orçamento".

Análise:Pendência atendida.

6-)Além das formas de contato com o CEP, solicita-se que sejam inclusos no TCLE uma breve

descrição do que é o CEP, qual sua função no estudo e seu horário de funcionamento (Resolução

CNS nº. 466 de 2012,IV.5.d).

Resposta:"Se desejar obter mais informações a respeito dos aspectos éticos da pesquisa,

registrar uma denúncia ou reclamações sobre sua participação no estudo, você pode entrar em

contato com a secretaria do Comitê de Ética em Pesquisa da Unicamp: Rua: Tessália Vieira de

Camargo, 126; CEP 13083-887 Campinas – SP; telefone (19) 3521-8936; fax (19) 3521-7187;

e-mail: [email protected]".

Análise:Pendência atendida.

7-)O pesquisador necessita anexar a autorização da escola para coleta de dados e o TCLE para os

alunos, pois as aulas serão gravadas e são sujeitos vulneráveis.No caso de inclusão de menores

de idade como sujeitos da pesquisa, é fundamental a assinatura do TCLE pelos

REPRESENTANTES LEGAIS e não por vizinhos, cuidadores, etc.

Resposta:Foi anexada a carta de autorização para coleta de dados e o TCLE contempla a

assinatura do responsável legal.

Análise:Pendência atendida.

Conclusão: Projeto aprovado com recomendações de colocar um espaço para rubrica no final de

cada página.

Situação do Parecer:

Aprovado

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Necessita Apreciação da CONEP:

Não

Considerações Finais a critério do CEP:

- O sujeito de pesquisa deve receber uma cópia do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido,

na íntegra, por ele assinado.

- O sujeito da pesquisa tem a liberdade de recusar-se a participar ou de retirar seu

consentimento em qualquer fase da pesquisa, sem penalização alguma e sem prejuízo ao

seu cuidado.

- O pesquisador deve desenvolver a pesquisa conforme delineada no protocolo aprovado. Se o

pesquisador considerar a descontinuação do estudo, esta deve ser justificada e somente ser

realizada após análise das razões da descontinuidade pelo CEP que o aprovou. O pesquisador

deve aguardar o parecer do CEP quanto à descontinuação, exceto quando perceber risco ou

dano não previsto ao sujeito participante ou quando constatar a superioridade de uma estratégia

diagnóstica ou terapêutica oferecida a um dos grupos da pesquisa, isto é, somente em caso de

necessidade de ação imediata com intuito de proteger os participantes.

- O CEP deve ser informado de todos os efeitos adversos ou fatos relevantes que alterem o curso

normal do estudo. É papel do pesquisador assegurar medidas imediatas adequadas frente a

evento adverso grave ocorrido (mesmo que tenha sido em outro centro) e enviar notificação ao

CEP e à Agência Nacional de Vigilância Sanitária – ANVISA – junto com seu posicionamento.

- Eventuais modificações ou emendas ao protocolo devem ser apresentadas ao CEP de forma

clara e sucinta, identificando a parte do protocolo a ser modificada e suas justificativas. Em caso

de projetos do Grupo I ou II apresentados anteriormente à ANVISA, o pesquisador ou patrocinador

deve enviá-las também à mesma, junto com o parecer aprovatório do CEP, para serem juntadas

ao protocolo inicial.

- Relatórios parciais e final devem ser apresentados ao CEP, inicialmente seis meses após a data

deste parecer de aprovação e ao término do estudo.

Endereço: Rua Tessália Vieira de Camargo, 126

Bairro:

UF: SP

Barão Geraldo

Município: CAMPINAS

CEP: 13.083-887

Telefone: (19)3521-8936 Fax: (19)3521-7187 E-mail: [email protected]

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COMITÊ DE ÉTICA EM PESQUISA DA UNICAMP -

CAMPUS CAMPINS

264

CAMPINAS, 26 de Março de 2015

Assinado por:

Renata Maria dos Santos

Celeghini (Coordenador)

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