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ABRANDH INFORMA que este documento está em processo de consulta junto a alguns parceiros e que o conteúdo e a forma poderão sofrer alterações. A utilização de qualquer parte do texto deverá citar a fonte e esta observação (Dezembro/2007). 1 ABRANDH - FAO A Exigibilidade do Direito Humano à Alimentação Adequada Flavio Valente Thaís Franceschini Valéria Burity Brasília(DF), Brasil – dezembro/2007

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A Exigibilidade do Direito Humano à Alimentação Adequada

Flavio Valente Thaís Franceschini Valéria Burity

Brasília(DF), Brasil – dezembro/2007

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SOBRE ESTE MATERIAL

A Exigibilidade do Direito Humano à Alimentação Adequada

Texto: Flavio Valente / Thaís Franceschini / Valéria Burity

Revisão: Ana Flávia Rocha, Elisabetta Recine, Cecília Luna Lopez (FAO) e Frank Mischler (FAO).

Edição e revisão: Jonas Valente

Disponível para download: www.abrandh.org.br

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ÍNDICE

Introdução

- O Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA) e a exigibilidade dos Direitos Humanos: breves considerações - Alguns conceitos básicos: o DHAA, obrigações e violações - A exigibilidade do DHAA no Brasil

Capítulo 1: Como cobrar a realização dos Direitos Humanos: os diferentes tipos de mecanismos de exigibilidade de direitos

1.1 Base legal da exigibilidade 1.2 Cobrança de direitos em nível nacional: 1.2.1 Exigibilidade administrativa

1.2.2 Exigibilidade política 1.2.3 Exigibilidade quase-judicial 1.2.4 Exigibilidade judicial 1.3 Cobrança de direitos em nível internacional 1.4 Um exemplo prático: como os diferentes tipos de mecanismos de exigibilidade interagem e podem ser utilizados em casos de violação do DHAA e dos demais Direitos Humanos

Capítulo 2: Instituições e instrumentos de defesa e exigibilidade dos Direitos Humanos

2.1 As instituições de defesa e exigibilidade de Direitos Humanos 2.1.1 Conselhos de Políticas Públicas 2.1.2 Conselhos de Direitos Humanos 2.1.3 Instituições públicas 2.1.4 Entidades e instrumentos da sociedade civil

2.2 Brasil: alguns exemplos de instituições e instrumentos de defesa e exigibilidade dos Direitos Humanos

2.2.1 Comissão Permanente para o Direito Humano à Alimentação Adequada do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional 2.2.3 Comissão Especial de Monitoramento de Violações do Direito Humano à Alimentação Adequada 2.2.4 Ministério Público 2.2.5 O Projeto Relatores Nacionais em Direitos Humanos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais 2.2.6 A Relatoria Nacional para os Direitos Humanos à Alimentação Adequada e Terra Rural

Capítulo 3: Faça-o realidade: alguns desafios e os passos necessários para o fortalecimento da exigibilidade do DHAA

3.1 Alguns desafios para a realização efetiva do DHAA 3.2 Os passos necessários para o fortalecimento da exigibilidade do DHAA

3.2.1 As pessoas precisam saber que têm direito - apoderamento 3.2.2 Os portadores de obrigações precisam saber que têm obrigações - construção de competências para a realização efetiva do DHAA 3.2.3 Necessidade de estabelecimento de rotinas e instrumentos de exigibilidade

Capítulo 4: Conclusões gerais

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Lista de Siglas

ABRANDH - Ação Brasileira pela Nutrição e Direitos Humanos

CG 12 - Comentário Geral nº 12

CAE - Conselho de Alimentação Escolar

CONSEA - Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional

COMIDhA - Comitê Nacional de Implementação do Direito Humano à Alimentação Adequada

CDDPH - Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana

DHAA - Direito Humano à Alimentação Adequada

DHCP - Direitos Humanos Civis e Políticos

DH - Direitos Humanos

DHESC - Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais

FAO - Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação

FIAN - Rede de Ação e Informação pelo Direito a se Alimentar (Food First Action Network)

FIBGE - Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação GT - Grupo de Trabalho

GTDHAA - Grupo de Trabalho de Direito Humano à Alimentação Adequada

GTI - Grupo de Trabalho Intergovernamental

IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística

ICP - Inquérito Civil Público

INCRA - Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária

IPEA - Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

LOSAN - Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional

MP - Ministério Público

MPF - Ministério Público Federal

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MRE - Ministério das Relações Exteriores

MS - Ministério da Saúde

ONU - Organização das Nações Unidas

PIDCP - Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos

PIDESC - Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais

PNAE - Programa Nacional de Alimentação Escolar

SEDH - Secretaria Especial de Direitos Humanos

SISAN - Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional

SAN - Segurança Alimentar e Nutricional

TAC - Termo de Ajustamento de Conduta

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A Exigibilidade do Direito Humano à Alimentação Adequada

Flavio Valente1 Thaís Franceschini2 Valéria Burity3

INTRODUÇÃO O DHAA e a exigibilidade dos Direitos Humanos: breves considerações Todos os seres humanos, pelo simples fato de terem nascido e serem parte da espécie humana, possuem Direitos Humanos, dentre eles o Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA). No entanto, milhões de pessoas em todo o mundo sofrem, cotidianamente, violações ao seu DHAA. Segundo estimativa da Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO), 852 milhões de pessoas no mundo, entre 2000 e 2002, sofriam de fome crônica, sendo 815 milhões nos países em desenvolvimento; 9 milhões em países industrializados e 28 milhões em países do Leste Europeu e países da antiga União Soviética4. Esse quadro de violações requer a urgente adoção de uma série de ações em diferentes níveis e esferas. Dentre elas merece destaque a necessidade de promover e garantir a exigibilidade dos Direitos Humanos. Enquanto as pessoas não souberem que têm direitos e que os mesmos podem e devem ser exigidos, a superação desta situação continuará distante da realidade. A palavra exigibilidade vem do termo espanhol exigibilidad. Esta expressão vem sendo utilizada por diferentes organizações de Direitos Humanos da América Latina e significa a possibilidade de exigir direitos perante os órgãos públicos competentes - administrativos, políticos ou jurisdicionais - para prevenir as violações a esses direitos ou repará-las. Ademais, no conceito de exigibilidade está incluído, além do direito de reclamar, o direito de ter uma resposta e ação em tempo oportuno para a reparação da violação por parte do poder público. Na prática, não se pode falar em Direitos Humanos sem falar em exigibilidade. A efetiva realização dos Direitos Humanos inclui o direito dos titulares de exigir o cumprimento dos mesmos. Para tal, cada Estado tem a obrigação de criar e disponibilizar de maneira acessível os mecanismos necessários para que todos os habitantes do seu território tenham a possibilidade de exigir e reclamar os seus direitos.

1 Secretário-Geral da FIAN Internacional. Vice-coordenador do Grupo de Trabalho sobre Nutrição, Ética e Direitos Humanos do Comitê Permanente de Nutrição das Nações Unidas. Médico, Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, 1972; MPH, Harvard School of Public Health, 1976. 2 Consultora em Direitos Humanos da Ação Brasileira pela Nutrição e Direitos Humanos (ABRANDH). Graduada em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília (UnB) e em Direito pelo Centro de Ensino Unificado de Brasília (UniCEUB). Mestre em Teoria e Prática dos Direitos Humanos pela Universidade de Essex, Inglaterra. 3 Consultora em Direitos Humanos da Ação Brasileira pela Nutrição e Direitos Humanos (ABRANDH). Advogada, graduada em Direito pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Mestre em Ciências Jurídicas pelo Mestrado do Centro de Ciências Jurídicas da UFPB. 4 FAO, O Estado de Insegurança Alimentar no Mundo 2004 (SOFI 2004). Disponível em: ftp://ftp.fao.org/docrep/fao/007/y5650e/y5650e00.pdf (site em inglês).

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“A exigibilidade (...) é, hoje, um imperativo na teoria e na prática dos Direitos Humanos. Afinal, as declarações de direitos, as constituições e as leis de um modo geral deixam de possuir qualquer significação prática se não tiverem a possibilidade de efetiva aplicação”5. Apresentação Este documento apresenta uma reflexão sobre como o Direito Humano à Alimentação Adequada pode ser exigido. O objetivo é que este material sirva como instrumento de apoio para representantes de movimentos sociais, organizações não-governamentais e gestores públicos interessados em promover a implementação efetiva e a exigibilidade do DHAA em suas localidades ou áreas de atuação. Serão apresentados aspectos teóricos bem como estratégias práticas que vêm sendo desenvolvidas e implementadas em diferentes contextos e que têm gerado impacto na efetividade dos Direitos Humanos. Atores da sociedade civil e de governos de diferentes países poderão se apropriar destas experiências e adaptá-las para o processo de criação e consolidação de instrumentos e práticas de exigibilidade em suas realidades locais. No entanto, os processos de exigibilidade não possuem uma receita padrão, sendo, na realidade, um processo sem uma lógica cartesiana e onde vários caminhos são possíveis e complementares. Cada país e cada comunidade estão inseridos em um contexto próprio que precisa ser respeitado quando se busca a garantia de direitos. Cada lugar, de acordo com seu potencial, deve buscar os caminhos mais eficazes para a cobrança de direitos. Este documento é composto por quatro capítulos, além de uma breve apresentação de alguns conceitos básicos relacionados ao DHAA e sobre a exigibilidade dos Direitos Humanos no Brasil. O primeiro capítulo apresenta as diferentes formas de se exigir a realização dos Direitos Humanos. O segundo capítulo trata mais especificamente das diferentes instituições de defesa e exigibilidade de direitos. O terceiro capítulo levanta alguns desafios práticos e estratégias necessárias para o fortalecimento da exigibilidade e superação do quadro de violações do DHAA em diferentes realidades locais. E o quarto capítulo apresenta algumas conclusões sobre a promoção da exigibilidade do DHAA. Apesar dos inúmeros desafios e obstáculos para a realização dos Direitos Humanos, o Brasil apresenta-se hoje como um dos países onde algumas condições estão dadas para o fortalecimento da exigibilidade do DHAA. Por esta razão, algumas iniciativas e experiências brasileiras de construção de instrumentos e instâncias de exigibilidade serão apresentadas neste documento. A exposição de aspectos teóricos, bem como de conquistas, avanços e desafios na realização dos Direitos Humanos, tem como objetivo dotar a sociedade civil e governos de maior

5 Benvenuto, Jayme. Trecho do Artigo O Caráter Expansivo dos Direitos Humanos na Afirmação de

sua Indivisibilidade e Exigibilidade apresentado na oficina sobre Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais, dentro das atividades do Fórum Social Mundial em 2001, revisado e ampliado para publicação. A oficina sobre DHESC, realizada em Porto Alegre, em 2001, foi uma promoção da ICCO (Holanda), CEDAR INTERNATIONAL (Holanda) e Movimento Nacional de Direitos Humanos (Brasil). Disponível em: http://www2.ibam.org.br/municipiodh/biblioteca%2FArtigos/Jayme.pdf

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capacidade de intervenção sobre as violações ao DHAA e na exigibilidade dos Direitos Humanos. Se os cidadãos, os agentes públicos e a sociedade civil de diferentes países estiverem adequadamente informados sobre seus direitos, obrigações e responsabilidades, e souberem aonde ir e o que fazer quando sentirem que seus direitos estão sendo violados, mais fácil será a responsabilização (accountability) dos Estados e serviços públicos por seus atos e omissões. Por outro lado, se os mecanismos para a garantia desses direitos forem acessíveis e amplamente divulgados, mais a sociedade se sentirá apoderada, legitimada e segura para buscar a realização dos mesmos. Além disso, é fundamental para o fortalecimento da exigibilidade que cada país esteja efetivamente comprometido com a realização dos Direitos Humanos e garanta a construção de competências para tal. Alguns conceitos básicos: o DHAA, obrigações e violações Em 2002, o Relator Especial das Nações Unidas para o Direito à Alimentação definiu o DHAA como: “O Direito à Alimentação Adequada é um Direito Humano inerente a todas as pessoas de ter acesso regular, permanente e irrestrito, quer diretamente ou por meio de aquisições financeiras, a alimentos seguros e saudáveis, em quantidade e qualidade adequadas e suficientes, correspondentes às tradições culturais do seu povo e que garanta uma vida livre do medo, digna e plena nas dimensões física e mental, individual e coletiva”6. O Direito Humano à Alimentação Adequada está previsto originalmente no art. 25º da Declaração Universal dos Direitos Humanos, onde é discutido no contexto da promoção do direito a um padrão adequado de vida. O mesmo direito é reafirmado no art. 11º do Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC). O DHAA começa pela luta contra a fome, mas, caso se limite a isso, não estará sendo plenamente realizado. Assim, conforme os documentos internacionais de Direitos Humanos existem duas dimensões indivisíveis do DHAA que são o direito de estar livre da fome e da má nutrição e o direito à alimentação adequada. E para realizar essas duas dimensões, o Direito Humano à Alimentação Adequada requer a garantia de todos os demais Direitos Humanos. Os seres humanos necessitam de muito mais do que ter uma alimentação nutricionalmente equilibrada. Na realidade, o DHAA não deve - e não pode - ser interpretado em um sentido estrito ou restritivo: a alimentação para o ser humano é retrato de sua cultura e sua relação com o mundo e deve ser entendida como processo de transformação da natureza em gente saudável e cidadã7. Nos termos dos artigos 2º e 11º do PIDESC, dentre as obrigações do Estado no que concerne ao Direito Humano à Alimentação Adequada podemos ressaltar:

a) obrigação de adotar medidas, com o máximo de recursos disponíveis, para realizar progressivamente o Direito Humano à Alimentação Adequada;

6 Ziegler, J. Relatório do Relator Especial das Nações Unidas para o Direito à Alimentação (Comissão de Direitos Humanos, 23 de Janeiro de 2002, E/CN.4/2002/58/Add.1). 7 Valente, F.L.S. “Do combate à fome à Segurança Alimentar e Nutricional: o direito à alimentação adequada”. Direito Humano à Alimentação: desafios e conquistas. Cortez Editora, São Paulo, 2002.

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b) obrigação de adotar as medidas necessárias para assegurar o direito fundamental de todos de estarem livre da fome; c) obrigação de não discriminação.

A todo Direito Humano correspondem obrigações do Estado e responsabilidades de diferentes atores sociais (indivíduos, famílias, comunidades locais, e organizações não-governamentais, da sociedade civil e do setor privado) em relação à realização do mesmo. Nesse contexto, toda vez que se define um Direito Humano, estabelece-se um titular de direitos e um portador de obrigações. Direitos e obrigações são as duas faces de uma mesma moeda. No âmbito da legislação sobre Direitos Humanos, as obrigações são sempre em última instância do Estado. A obrigação do Estado parte do entendimento de que este controla a utilização dos recursos públicos, sejam estes financeiros, humanos, materiais e legais, bem como detém o monopólio do uso legal da força, através da polícia e do exército. As obrigações do Estado são as de usar este poder de forma:

• a não violar os Direitos Humanos dos habitantes do seu território (respeito); • a proteger os Direitos Humanos dos habitantes de seu território contra as ações de

terceiros que violem esses direitos (proteção); • a promover ações que reduzam a discriminação e as desigualdades sociais

(promoção); e • a garantir que os seres humanos possam viver com dignidade mesmo em situações

adversas, que fujam ao seu controle (provimento).

Violações ao DHAA acontecem sempre que esse direito não é respeitado, protegido, promovido ou provido. Ações ou omissões podem representar uma violação ao DHAA e demais Direitos Humanos. Como a obrigação de assegurar a proteção e garantir a realização efetiva dos Direitos Humanos é sempre, em última instância, dos Estados, os mesmos são os únicos violadores destes direitos, mesmo que as violações em uma determinada localidade tenham sido provocadas por ações de terceiros. E, apesar do destaque que se dá às violações por parte do Poder Executivo, em inúmeras situações violações ocorrem devido à ações e/ou omissões também do Poder Judiciário e do Poder Legislativo. Violações aos Direitos Humanos atingem, normalmente, muito mais aqueles que são marginalizados socialmente ou pertencem a minorias étnicas, religiosas ou sexuais. No entanto, qualquer pessoa pode ter os seus Direitos Humanos violados, inclusive o DHAA, mesmo aquelas que não são marginalizadas socialmente. A exigibilidade do DHAA no Brasil O tema da alimentação e nutrição vem sendo ao longo de várias décadas objeto de uma intensa reflexão por parte da sociedade civil e do governo brasileiro. As presentes considerações sobre a exigibilidade do DHAA no Brasil têm como objetivo contextualizar brevemente a realidade brasileira a fim de que os exemplos apresentados neste documento possam ser melhor entendidos pelos leitores de diferentes países.

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A legislação brasileira garante uma forte base legal para a exigibilidade do DHAA. O Brasil é parte de todas as convenções internacionais relevantes sobre o DHAA e ratificou, sem reservas, o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. Em 1992 este tratado internacional foi incorporado ao ordenamento jurídico brasileiro. A Constituição Federal de 1988 possui um dos textos mais avançados do mundo no que se refere à proteção e promoção da realização de Direitos Humanos8. O DHAA está também previsto em várias leis vigentes no Estado brasileiro, inclusive na Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (LOSAN)9 e na lei que reinstituiu o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA)10. Nos últimos 20 anos de história, por meio de ações multi-setoriais e criatividade, o país tem progressivamente incluído o DHAA na agenda pública nacional. E, apesar da pobreza, da fome e das demais violações ao Direito Humano à Alimentação Adequada continuarem a representar um enorme desafio a ser superado pela sociedade brasileira, o Brasil tem progressivamente avançado no processo de promoção da exigibilidade do DHAA, e, de certa forma, se destacado como exemplo para a realização prática desse direito. A sociedade civil brasileira tem mantido, nas últimas décadas, uma forte mobilização sobre o tema da Segurança Alimentar e Nutricional e combate à fome. Além disso, com a decisão do governo do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, eleito em 2002 e reeleito em 2006, de priorizar a erradicação da fome no Brasil, um conjunto de iniciativas políticas, administrativas e legais tem sido adotado, desde 2003, para a promoção do DHAA. Dentre elas:

• Em 2003, foi reinstituído o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA)11. Desde então o CONSEA tem tido um papel importante no processo de assessorar o Presidente da República na formulação de políticas de Segurança Alimentar e Nutricional e na definição de orientações para que o país garanta o DHAA para todos. Além de observadores e convidados, o conselho é composto por 59 conselheiros, sendo 2/3 representantes da sociedade civil e 1/3 do governo. A presidência do CONSEA é exercida por um dos conselheiros da sociedade civil, nomeado pela Presidência da República. Os demais conselheiros são também nomeados pelo Presidente.

• A partir da atuação do CONSEA e com ampla participação de representantes do governo e da sociedade civil, o Brasil aprovou, em setembro de 2006, a já mencionada Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (LOSAN). A Lei Orgânica representa um grande avanço para a exigibilidade do Direito Humano à Alimentação

8 Apesar de a Constituição não trazer explicitamente o Direito à Alimentação no rol dos direitos sociais previstos em seu artigo 6º, este direito encontra-se implícito nos princípios e em vários dispositivos constitucionais, como por exemplo, direito a um salário mínimo, reforma agrária, assistência social, educação, alimentação escolar, não discriminação e o direito à vida. Ademais, a CF de 1988 estabelece como fundamento da República Federativa do Brasil a dignidade da pessoa humana. 9 Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional - Lei 11.346 de 15 de setembro de 2006. Disponível em: http://www.abrandh.org.br/downloads/losanfinal15092006.pdf 10 Lei nº. 10.683, de 28 de maio de 2003. Disponível em:

https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2003/L10.683compilado.htm 11 Para maiores informações sobre o CONSEA, ver site:

https://www.planalto.gov.br/consea/exec/index.cfm

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Adequada no Brasil. A Lei reafirma as obrigações do Estado de respeitar, proteger, promover e prover o DHAA e explicita as obrigações de informar, monitorar, fiscalizar e avaliar a realização desse direito. Dispõe, ainda, que é dever do poder público garantir mecanismos para que esse direito possa ser exigido perante os órgãos públicos. A Lei prevê a criação do Sistema Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (SISAN)12 com um forte componente do DHAA. Estabelece ainda que a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional deve ter como objetivo a garantia do DHAA, bem como ser formulada e implementada através do SISAN.

• Em setembro de 2004 o CONSEA aprovou a criação da Comissão Permanente de DHAA com o mandato de analisar programas e políticas públicas sob a perspectiva do DHAA.

• Em maio de 2005 foi criada, dentro do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, a Comissão Especial de Monitoramento de Violações do Direito Humano à Alimentação Adequada para recebimento e investigação de violações ao DHAA.

• O lançamento de políticas e programas públicos tais como o Programa Fome Zero, criado em 2003. Atualmente o Programa Fome Zero é definido como estratégia que articula um conjunto de 31 ações e programas implementados por diversos ministérios, em torno de quatro eixos prioritários: (1) ampliação do acesso a alimentos; (2) fortalecimento da agricultura familiar; (3) promoção de processos de geração de renda; (4) articulação, mobilização e controle social. No entanto, ainda que o Direito Humano à Alimentação Adequada conste dos objetivos do Fome Zero, existe uma grande dificuldade de incorporação efetiva do DHAA na estratégia ilustrada, por exemplo, pela quase inexistência de mecanismos de exigibilidade e a dificuldade em trabalhar de forma a respeitar a diversidade cultural e étnica13.

“A progressiva incorporação das temáticas da SAN e do DHAA na agenda política do Brasil é resultado tanto da realização de ações concretas por parte dos governos e de organizações da sociedade civil como de uma permanente tensão entre Estado e sociedade nessa área. Ao longo do tempo, pressionados pelas demandas sociais e pelo acúmulo de lutas em prol do tema em diversas partes do país, os governos - em especial, o federal - foram, paulatinamente, delineando aquilo que conforma o atual conjunto de iniciativas brasileiras - algumas mais institucionalizadas do que outras, porém não menos importantes. De forma gradual, os conceitos e as medidas implementadas foram sendo discutidos, aperfeiçoados e pactuados”14. No entanto, apesar dos avanços e da existência de um conjunto de normas muitas vezes inovadoras no ordenamento jurídico brasileiro, o que se constata, na realidade, é a insuficiência destes avanços para garantir a realização prática do DHAA e demais Direitos Humanos no Brasil frente aos inúmeros e complexos desafios e obstáculos para a efetivação dos mesmos.

12 O SISAN tem por objetivo formular e implementar políticas e planos de Segurança Alimentar e Nutricional, estimular a integração dos esforços entre governo e sociedade civil, bem como promover o acompanhamento, o monitoramento e a avaliação da Segurança Alimentar e Nutricional no país. 13 Valente, F.L.S, Beghin, N., Realização do Direito Humano à Alimentação Adequada e a Experiência Brasileira: Subsídios para a Replicabilidade. Brasília, setembro 2006. Disponível em:

http://www.abrandh.org.br/downloads/dhaabrasil.pdf 14 Valente, F.L.S, Beghin, N., Realização do Direito Humano à Alimentação Adequada e a Experiência Brasileira: Subsídios para a Replicabilidade. Brasília, setembro 2006. Disponível em:

http://www.abrandh.org.br/downloads/dhaabrasil.pdf

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A maioria dos documentos escritos sobre a prevalência da pobreza, da fome e da má-nutrição no Brasil aponta para o fato do país ter mantido historicamente um alto grau de desigualdade estrutural que se expressa na concentração da riqueza, da terra e da renda. Um estudo recente desenvolvido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) - Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios: Segurança Alimentar 200415, revelou que cerca de 72 milhões de brasileiros - aproximadamente 40% da população - vive com algum grau de insegurança alimentar, ou seja, tem o seu DHAA violado. Destes, 14 milhões, - 7,7% da população - vive em estado de insegurança alimentar grave. A maioria dos brasileiros ainda não sabe que é titular de Direitos Humanos. Os poucos que conhecem seus direitos nem sempre têm conhecimento sobre formas de exigi-los através de instrumentos do próprio Estado. Além disso, a maior parte dos agentes públicos não tem informações sobre suas obrigações frente à realização do DHAA e de outros Direitos Humanos. Ademais, existem poucos instrumentos de recurso administrativos e os que existem não são tratados a partir da perspectiva de direitos. E, finalmente, ainda não existem no Brasil instrumentos e mecanismos legais que atendam aos Princípios de Paris16 e instituições que possam, de forma eficaz, responsabilizar gestores e servidores públicos pelo não cumprimento de suas obrigações de promoção e proteção dos Direitos Humanos. Apesar dos avanços na elaboração de normas, ainda é um desafio para o Brasil regulamentar essas leis, isto é, detalhar essas normas garantindo todas as condições para a sua operacionalização, o que inclui o estabelecimento de procedimentos que promovam a exigibilidade do DHAA entre outros DHESC. Neste contexto, o grande desafio para a eficácia dos dispositivos previstos na LOSAN, por exemplo, é garantir que o DHAA esteja de fato incorporado em seu processo de regulamentação, sob pena de deixar cair por terra todos os avanços que esta Lei representa. Assim, para garantir a eficácia da LOSAN é imperativo

15 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE): Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios: Segurança Alimentar 2004, Rio de Janeiro 2006. Disponível em: http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/trabalhoerendimento/pnad2004/suplalimentar2004/supl_alimentar2004.pdf 16 Princípios relacionados com o status de instituições nacionais de Direitos Humanos Resolução 19921/54 de 03.03.1992 da Comissão de Direitos Humanos da ONU De acordo com os Princípios de Paris as instituições de Direitos Humanos devem ter atribuição, entre

outras coisas, para: a) apresentar ao Governo, Parlamento, ou outro órgão competente, em caráter consultivo, opiniões, recomendações, propostas para promoção dos Direitos Humanos; b) promover e assegurar a harmonização entre preceitos nacionais e internacionais, e sua efetiva implementação;

c) encorajar a ratificação de instrumentos internacionais e assegurar sua implementação; d) assistir na formulação de programas para o ensino e a pesquisa em Direitos Humanos e participar de sua execução em escolas, universidades e círculos profissionais; e) dar publicidade aos Direitos Humanos e aos esforços de combater todas as formas de discriminação, em particular de discriminação racial, aumentando a conscientização pública, especialmente através da educação e de órgãos da imprensa.

Quanto à composição destas instituições é fundamental garantir que as mesmas: 1. Primem por uma representação pluralista e independente;

2. Sejam mantidas com recursos adequados para manter pessoal e ambiente de trabalho próprios, de modo a ter independência do Governo e a não estar sujeita a controle financeiro, o que poderia afetar sua independência; 3. Os seus membros tenham mandato estável, sem o que não pode haver independência.

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fortalecer, durante o seu processo de regulamentação, os mecanismos de exigibilidade do DHAA que já existem, além de criar os que forem necessários para esse propósito. Assim, apesar dos inegáveis avanços, se constata que quase todas as ações e iniciativas que serão descritas no presente documento ainda precisam ser conquistadas e fortalecidas no nível operacional. No Brasil e no mundo a promoção da exigibilidade é fundamental para que a promoção dos Direitos Humanos se torne uma realidade e para que não haja estagnação ou retrocesso nos avanços conquistados.

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CAPÍTULO 1 Como cobrar a realização de Direitos Humanos: os diferentes tipos de mecanismos de exigibilidade de direitos Direitos Humanos são direitos que podem e devem ser exigidos dos Estados, de diversas formas e em diversas esferas. A realização efetiva dos Direitos Humanos pressupõe, para os titulares de direitos, o direito de exigir o cumprimento dos acordos, tratados e demais normas relativas a estes direitos. Para tanto, os Estados têm a obrigação de criar e fortalecer instrumentos e instituições para que todos os habitantes do seu território possam efetivamente reclamar os seus direitos. Tais instrumentos e instituições devem ser instituídos no âmbito dos poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. Além disso, os titulares de direitos devem ter a possibilidade de reclamar seus direitos em nível local e/ou nacional. Para tanto existe a necessidade de criação, implementação e fortalecimento de instrumentos e instituições de exigibilidade em âmbito federal, estadual e municipal. O conceito de exigibilidade também abrange, além do direito de reclamar, o direito de ter uma resposta e ação em tempo oportuno para a reparação da violação por parte do poder público. Na prática a exigibilidade ainda é, freqüentemente, associada à idéia de judiciabilidade, isto é, a possibilidade de exigir direitos perante o Poder Judiciário. A maioria das pessoas ainda pensa em “recursos judiciais” quando discute a possibilidade de exigir direitos. No entanto, a exigibilidade significa muito mais do que cobrar a realização de direitos junto a Tribunais de Justiça. A promoção da Justiça, em seu sentido mais amplo, não se constitui em obrigação apenas do Poder Judiciário. Pelo contrário, é obrigação do Estado como um todo, notadamente do Poder Executivo, que tem contato direto com as pessoas por meio da prestação de serviços públicos garantidores de direitos e da elaboração e implementação de políticas e programas públicos. O reconhecimento dos Direitos Humanos resulta da luta dos povos contra a opressão, a discriminação e os abusos de poder por parte dos Estados e de grupos que sempre estiveram no poder. Portanto, tudo o que se refere à promoção de Direitos Humanos está relacionado ao estabelecimento de limites e de regras para o exercício do poder, seja esse público, privado, econômico, político e mesmo religioso17. Neste sentido, a promoção da exigibilidade, em seus diferentes níveis, estimula o processo de apoderamento dos titulares de direitos para que os mesmos possam assegurar junto às instituições responsáveis a garantia da realização de seus Direitos Humanos, conquistados a partir de lutas históricas. Neste contexto, é sempre legítimo exigir direitos através da contestação e resistência a ações opressoras que violam Direitos Humanos. A própria Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, dispõe que “É essencial que os Direitos Humanos sejam protegidos pelo império da lei, para que o homem não seja compelido, como último recurso, à rebelião contra a tirania e a opressão”. Assim, usando o exemplo brasileiro, movimentos como o

17 Bobbio, Norberto. A era dos direitos. 7ª reimpressão. Trad. Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992.

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Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), o Movimento de Atingidos por Barragens (MAB), o movimento de mulheres, o movimento indígena, os movimentos urbanos, entre outros, não devem, jamais, ser criminalizados quando vão às ruas ou usam estratégias com base no direito de resistência para exigir o respeito à dignidade humana. Ao fazer isto eles e elas estão exercendo o papel de defensores de direitos, e como tal devem ser respeitados e protegidos pelo Estado, e não criminalizados. Foram lutas como essas que possibilitaram a criação e o fortalecimento de mecanismos do próprio Estado para a garantia e exigibilidade de direitos. E são essas lutas a principal garantia de respeito e promoção dos Direitos Humanos no Brasil e no mundo. O que se observa na prática é que o fortalecimento da capacidade de exigir a realização dos Direitos Humanos, em especial dos Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais (DHESC)18, é certamente um dos passos mais importantes para a construção de sociedades mais justas e igualitárias. 1.1. Base legal da exigibilidade A exigibilidade dos Direitos Humanos tem como base legal as Declarações e Tratados Internacionais de Direitos Humanos negociados entre todos os povos do mundo e ratificados por inúmeros Estados. Além disso, dependendo da realidade de cada país, a exigibilidade pode também estar fundamentada em normas previstas na Constituição Federal, em leis e em regras administrativas. Cada Estado, ao firmar os Tratados Internacionais de Direitos Humanos, reconhece sua obrigação de elaborar leis, políticas públicas e realizar ações, de qualquer natureza, que promovam a equidade e reduzam, progressivamente, as desigualdades, tanto em âmbito nacional como internacional. Além disso, se compromete a não tomar qualquer medida que seja uma ameaça ou violação aos Direitos Humanos e de garantir mecanismos de proteção desses direitos. No entanto, vale também destacar que todas as pessoas são titulares de direitos, uma vez que os Direitos Humanos são universais e inerentes a todos, independentemente de políticas específicas ou de governos. Isto significa que mesmo os países que não ratificaram os Tratados de Direitos Humanos têm a obrigação política e moral de garantir os Direitos Humanos de seus habitantes assim como os mecanismos e instâncias para a sua exigibilidade. 1.2. A cobrança de direitos em nível nacional No caso de violação de um Direito Humano, um indivíduo pode exigir a realização desse direito nos níveis nacional e internacional. Em nível nacional, os titulares de direito devem ter a possibilidade de exigir a realização de seus direitos e reclamar sobre a existência de violações ao DHAA junto ao Poder Executivo, Legislativo e Judiciário e por meio de instrumentos de exigibilidade:

18 Podem ser citados como exemplos de Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais o Direito Humano à Alimentação Adequada, o Direito Humano à Moradia, o Direito Humano à Educação, o Direito Humano à Saúde, o Direito Humano ao Trabalho, o Direito Humano a Terra, o Direito Humano ao Meio Ambiente, o Direito Humano à Água, etc.

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• Administrativos; • Políticos; • Quase judiciais e • Judiciais.

1.2.1. Exigibilidade administrativa A exigibilidade administrativa é a possibilidade de exigir junto aos organismos públicos diretamente responsáveis pela garantia do DHAA (postos de saúde, escolas, postos de previdência social, escritórios do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (INCRA), postos do Ministério do Trabalho, etc.) a promoção desse direito, bem como a prevenção, correção ou reparação das ameaças ou violações ao mesmo. Para a efetivação da exigibilidade administrativa é fundamental que as políticas e os programas públicos possuam rotinas e procedimentos acessíveis e de conhecimento público, explicitando:

• Quem são os titulares de direito; • O que são violações no âmbito do programa e quando elas podem ocorrer; • Quais organismos são responsáveis pelo cumprimento das obrigações e reparação das

violações; • Quais são os mecanismos disponíveis para a cobrança de direitos e quem pode exigi-

los; • Como estas obrigações podem ser cobradas pelos titulares de direito perante aos

organismos públicos diretamente responsáveis pela garantia do DHAA; • Quais são os passos seguintes caso não haja resposta à(s) denúncia(s) de violação

apresentada junto aos organismos públicos diretamente responsáveis pela garantia do DHAA.

A necessidade de garantir e aprimorar a exigibilidade administrativa dos Direitos Humanos, especialmente dos DHESC, é fundamental por ser esta uma condição sine qua non para a eficácia desses direitos. O aprimoramento desse nível de exigibilidade pressupõe um ajuste das normas administrativas internas a cada programa - o que não exclui a elaboração de leis com este fim. Esse ajuste tem a possibilidade de constituir-se em uma alternativa menos burocrática e mais imediata ao trâmite de um procedimento legislativo, para que as políticas públicas, já existentes, ofereçam aos titulares de direito condições reais de exigibilidade19. Exemplo de exigibilidade administrativa No Brasil, a alimentação escolar de qualidade é um Direito Humano assegurado na Constituição Federal de 1988 e no Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. Assim, dentre as diferentes dimensões do Direito Humano à Alimentação Escolar, todo aluno tem, por exemplo, o Direito Humano à Alimentação Adequada durante seu período na escola, durante todos os dias letivos.

19 Valente, F.L.S., Burity, V., Mello, H., Neves, C. Exigibilidade e Justiciabilidade dos Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais. Relatorias Nacionais em Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais - Informe 2004. Plataforma DHESC Brasil. Rio de Janeiro, 2005. p. 164.

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Caso haja violação a essa dimensão do Direito Humano à Alimentação Escolar, o aluno, seu pai ou responsável, ou um defensor de direitos, por exemplo, deveria poder apresentar uma denúncia de violação na própria escola. Esta teria a obrigação de recebê-la, investigá-la e resolver o problema ou reparar a violação, se for da esfera de sua competência. Se a competência para a solução ou reparação da violação não couber à escola diretamente, ela tem a obrigação de encaminhá-la para o órgão ou instituição competente ou esclarecer aos titulares de direito os passos a serem dados para isso. É importante ressaltar, contudo, que em hipótese alguma a escola pode negar-se a receber a denúncia ou não encaminhar a sua solução. Se o agente público não fizer isso, estará cometendo mais uma violação de direitos. A implementação efetiva destas rotinas vem sendo intensamente discutida com o governo brasileiro nos últimos anos, tendo havido demonstração de interesse em fazê-lo. No entanto, as mesmas ainda não foram sequer testadas, como inicialmente acordado. 1.2.2. Exigibilidade política A exigibilidade política é a possibilidade de exigir a realização de direitos junto aos organismos de gestão de programas e políticas públicas (Poder Executivo), junto aos organismos de gestão compartilhada responsáveis pela proposição e fiscalização de políticas e programas públicos (Conselhos de Políticas Públicas) ou junto aos representantes do Poder Legislativo. A exigibilidade política é, portanto, a capacidade de exigir que os agentes políticos façam as escolhas mais eficazes e diligentes, contemplando a participação social e outros princípios, para a garantia dos Direitos Humanos. Considerando o exemplo apresentado acima sobre a alimentação escolar, caso a escola não resolvesse o problema, ou simultaneamente, os titulares de direito poderiam apresentar denúncia ao Conselho de Alimentação Escolar (CAE), ao próprio CONSEA e à Secretaria Municipal de Educação. Estes seriam exemplos de exigibilidade política. Reclamando junto ao Legislativo

Junto ao Poder Legislativo e aos seus membros é possível exigir que sejam elaboradas as leis necessárias para a realização dos Direitos Humanos e que deixem de criar leis que possam ser obstáculos para a realização dos mesmos. No Brasil também compete ao Poder Legislativo, por força constitucional, o acompanhamento de programas e ações executados pelo Poder Executivo, bem como a sua fiscalização orçamentária. Portanto, sempre que necessário, é possível exigir que o Legislativo faça uso desta competência para averiguar possíveis irregularidades ou violação de direitos por parte da Administração Pública Federal para preveni-los, corrigi-los ou repará-los. A Constituição Federal brasileira prevê os casos em que o Poder Legislativo Federal pode realizar esse controle e as constituições estaduais também podem prever alguns casos para o Poder Legislativo estadual, desde que não ultrapassem as hipóteses que estão estabelecidas na Constituição Federal. Outros exemplos de exigibilidade política

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• Ao receber informações sobre um determinado programa público, as lideranças de

uma comunidade marginalizada apresentam a um Conselho de Política Pública estadual uma denúncia reclamando a não inclusão da comunidade no programa;

• Cobrança para que as Comissões de Direitos Humanos do legislativo investiguem denúncias de violações do DHAA;

• A pressão exercida por determinadas entidades da sociedade civil para a criação, a revogação ou a regulamentação de leis;

• Os moradores de um assentamento apresentam denúncia a uma Secretaria Municipal de Saúde que crianças estão ficando desnutridas devido a freqüentes episódios de diarréia causados por água contaminada.

No caso do Brasil vale destacar que nos três poderes e nas diversas esferas de administração pública geralmente existem ouvidorias ou corregedorias para que sejam feitas denúncias contra os agentes da própria instituição.

É importante lembrar que junto ao Poder Executivo, o Direito Humano à Alimentação Adequada e demais Direitos Humanos podem ser exigidos: • Administrativamente: junto aos organismos públicos diretamente responsáveis pela

garantia do DHAA; ou • Politicamente: junto aos organismos de gestão de programas e políticas públicas.

1.2.3. Exigibilidade quase-judicial A exigibilidade quase-judicial é a possibilidade de exigir a realização de direitos junto a órgãos que não são parte do Poder Judiciário (em concepção restrita), mas que podem, em última instância, acionar a Justiça para a garantia de direitos. No Brasil, é o caso, por exemplo, do Ministério Público, que, antes de exigir direitos perante o Poder Judiciário, pode usar instrumentos quase-judiciais para averiguar violações de direitos e para fazer com que os agentes públicos adequem suas ações às normas que prevêem Direitos Humanos. Exemplos desses instrumentos de exigibilidade quase judiciais utilizados no Brasil são o Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) e o inquérito civil, que serão explicados no capítulo 2. As Instituições Nacionais de Direitos Humanos criadas para monitorar e promover a realização desses direitos em um determinado país podem também ser citadas como exemplos de mecanismos quase-judiciais de exigibilidade. Dentre as instituições nacionais existentes podemos citar as Comissões Nacionais de Direitos Humanos; e outras instituições especializadas na proteção dos direitos de grupos específicos, tais como minorias étnicas e lingüísticas, populações indígenas, crianças, refugiados ou mulheres. Exemplo de Comissão Nacional de Direitos Humanos20

20 FAO. Right to Food e-learning course. elaborado pela Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação (FAO), Roma, 2007. Disponível em: http://www.fao.org/righttofood/kc/dl_en.htm

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Em 1997, a Comissão Nacional de Direitos Humanos da Índia examinou caso envolvendo mortes por inanição em razão da seca em um distrito no estado de Orissa, situado na costa leste da Índia, e recomendou que fossem adotadas medidas para a erradicação da fome. Em 1998 a Comissão observou que as mortes por inanição, registradas em alguns bolsões de pobreza no país, eram, invariavelmente, conseqüência da omissão do governo e uma violação do direito de estar livre da fome. A Comissão, com o auxílio de seu Relator Especial, vem monitorando a situação em Orissa há vários anos. Em 2003 a Comissão apresentou novas recomendações em várias áreas - como a necessidade de programas de seguridade social, programas de desenvolvimento rural e reforma agrária. 1.2.4. Exigibilidade judicial A exigibilidade judicial é a possibilidade de exigir a realização de direitos junto ao Poder Judiciário. Esta cobrança pode ser realizada mediante diferentes instrumentos formais. No Brasil, por exemplo, temos a Ação Civil Pública, que será explicada no capítulo 2. É importante enfatizar que há exemplos de exigibilidade perante o Poder Judiciário que se dão através de ações políticas e não através de ações ou instrumentos judiciais. No estado de Pernambuco, situado no Nordeste brasileiro, por exemplo, os movimentos de luta pela terra e entidades da sociedade civil que apoiavam esses movimentos, como a FIAN Brasil e a Relatoria Nacional para os Direitos Humanos à Alimentação Adequada, Água e Terra Rural enviaram cartas aos membros do Judiciário e realizaram reuniões e audiências públicas com a participação de juízes. Essa pressão política fez com que o juiz responsável pelo caso deixasse de tomar decisões a favor do despejo dos sem terra. Caso o Poder Judiciário não resolva situações de violações de Direitos Humanos, é possível recorrer aos Sistemas Internacionais de Proteção de Direitos Humanos. Exemplo de exigibilidade judicial No Brasil um exemplo de exigibilidade judicial foi a Ação Civil Pública interposta pelo Ministério Público do estado de Alagoas, por meio das Promotorias de Justiça da Infância e da Juventude e do Ministério Público do Trabalho, contra o Município de Maceió, pela lesão aos direitos difusos e coletivos das crianças e adolescentes residentes na Orla Lagunar da cidade que vivem notoriamente abaixo da linha da pobreza e enfrentam uma série de dificuldades para exercer seus Direitos Humanos mais fundamentais, como o de se alimentar. A Ação Civil Pública baseou-se nos dados fornecidos pelo diagnóstico realizado pela Ação Brasileira pela Nutrição e Direitos Humanos (ABRANDH)21. O diagnóstico foi realizado por meio da aplicação de questionários na comunidade Sururu de Capote com o objetivo de estudar a situação de insegurança alimentar e nutricional da referida comunidade. Os dados do inquérito sócio-econômico e nutricional apresentados apontaram que não há políticas públicas

21 A Ação Brasileira pela Nutrição e Direitos Humanos (ABRANDH) é uma organização da sociedade civil de interesse público (OSCIP) constituída em junho de 2002. A missão da ABRANDH é promover a realização e a exigibilidade do Direito Humano à Alimentação Adequada no Brasil e em outros países, por meio de projetos de cooperação nacional e internacional. Para maiores informações ver site: www.abrandh.org.br

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de alimentação, saúde, educação, trabalho e lazer que atendam às crianças e adolescentes da comunidade, notadamente diante de seus problemas mais severos: desnutrição, exploração sexual, verminose e dependência química. Diante do quadro de violação dos Direitos Humanos, a Ação visa fazer com que o Município de Maceió use todos os meios necessários para a elaboração e implementação imediata de políticas públicas que efetivem os direitos violados pela sua omissão. Para tanto, a Ação requer que o Município apresente propostas de políticas públicas a serem implementadas com abrangência suficiente e apresentando soluções de curto, médio e longo prazo para a referida população, além de requerer que sejam incluídas no Projeto de Lei Orçamentária de 2008 as verbas necessárias para implementação das políticas públicas. O Poder Judiciário acaba de julgar procedente a Ação Civil Pública, em decisão pioneira no Brasil em relação à justiciabilidade do DHAA e outros Direitos Econômicos e Sociais. Com esta decisão o Município de Maceió deverá formar uma comissão multidisciplinar de profissionais para realizar um perfil sócio-econômico das crianças e adolescentes da comunidade da Orla Lagunar; garantir condições adequadas para o funcionamento do Conselho Tutelar da Região; apresentar um cronograma de curto prazo de ampliação da rede de proteção à criança e ao adolescente, com a abertura de abrigos para crianças e adolescentes em situação de risco; garantir creche em horário integral e educação infantil, em quantidade suficiente para atender a população de 0 a 6 anos da referida comunidade bem como assegurar as matrículas de todas as crianças e adolescentes em idade escolar no ensino fundamental. 1.3. Cobrança de direitos em nível internacional Nos casos em que não haja reparação em nível nacional, ou que a mesma demore a ser prestada, ou haja risco de vida para vítimas de violação é possível exigir a realização de Direitos Humanos através de mecanismos internacionais de exigibilidade. No Plano Global de Proteção dos Direitos Humanos das Nações Unidas, existem órgãos de exigibilidade dos Direitos Humanos22, que são previstos por Tratados Internacionais. No sistema global, além do sistema de denúncias individuais, há também o sistema de investigações e o de relatórios. Em caso de violações de Direitos Civis e Políticos é possível apresentar uma petição individual para órgãos internacionais de Direitos Humanos. O Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais (PIDESC), porém, ainda não prevê mecanismos de reclamação individuais em caso de violação aos direitos previstos no Pacto. No entanto, na última reunião do Conselho de Direitos Humanos em junho de 2006, os Estados Membros concordaram em renovar o mandato do grupo de trabalho que vem discutindo a elaboração de um Protocolo Adicional para o PIDESC, que conferiria ao Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais das Nações Unidas competência para examinar reclamações individuais. O trabalho está avançado e é possível que o Protocolo Opcional para o PIDESC seja aprovado em 2008.

22 Comitê de Direitos Humanos; Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais; Comitê sobre os Direitos da Criança; Comitê sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher; Comitê contra a Tortura e Outros Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes; Comitê sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Racial.

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De qualquer forma o Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas, com base no Protocolo Opcional ao Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, pode considerar o Direito Humano à Alimentação Adequada com base em uma interpretação abrangente do direito à vida, ou na cláusula de não discriminação garantida pelo Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos. Além disso, um caso de violação ao Direito Humano à Alimentação Adequada pode ser submetido ao Comitê para a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra a Mulher, no âmbito do Protocolo Opcional à Convenção com base nas disposições sobre proteção especial a mulheres grávidas, ou no que se refere ao acesso à terra e a serviços para mulheres rurais. Ao ratificar os Tratados Internacionais de Direitos Humanos os Estados assumem a obrigação de enviar relatórios periódicos para os Comitês e de sujeitar-se a uma eventual investigação sobre a situação dos Direitos Humanos em seu território. Uma forma de participação e de intervenção de entidades de Direitos Humanos no Sistema das Nações Unidas é o encaminhamento de relatórios próprios aos respectivos Comitês, para que sejam analisados juntamente com os relatórios enviados pelos Estados. O Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais das Nações Unidas, enquanto organismo que tem a função de monitorar a implementação dos direitos previstos no PIDESC, está encarregado de examinar relatórios periódicos elaborados pelos Estados Partes do Pacto, no que se refere a como os direitos estão sendo implementados em nível nacional. Os Relatórios dos Estados Partes são analisados pelo Comitê na presença desses Estados. O Comitê faz as suas considerações aos relatórios dos Estados Partes emitindo “observações finais”, que constituem a decisão do Comitê sobre a implementação do PIDESC em um determinado Estado Parte. Embora as observações finais do Comitê não tenham status legalmente vinculante, para os Estados Parte ignorar ou não agir em relação às considerações do Comitê significa uma demonstração de má-fé na implementação de suas obrigações relacionadas ao Pacto. Ademais, o sistema global prevê a existência de especialistas em Direitos Humanos denominados Relatores Especiais que têm o mandato de investigar situações específicas e propor soluções para violações de Direitos Humanos. No ano 2000, a Comissão de Direitos Humanos da ONU designou um Relator Especial sobre o Direito à Alimentação. Nos planos regionais também existem sistemas de proteção dos Direitos Humanos. No nível regional, a Comissão Africana de Direitos Humanos e a Corte Interamericana de Direitos Humanos vêm tratando de ações sobre o DHAA. 1.4. Um exemplo prático: como os diferentes tipos de mecanismos de exigibilidade interagem e podem ser utilizados em casos de violação do DHAA e demais Direitos Humanos Pense nesta situação: em um determinado país, uma comunidade urbana marginalizada enfrenta, cotidianamente, violações aos seus Direitos Humanos. A comunidade possui cerca de 300 famílias que, em sua vasta maioria, vivem em estado de insegurança alimentar e nutricional, ou seja, passam fome ou convivem, de forma rotineira, com o medo da fome. As

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casas (barracos) em que vivem são feitas com lonas, plásticos, madeira, papelão, etc. Na maior parte das casas não há banheiros, água encanada ou luz. O acesso a serviços públicos de saúde e educação também é deficiente. O posto de saúde mais próximo apresenta condições de atendimento precárias, os poucos remédios que são distribuídos terminam na primeira quinzena do mês. Quanto ao serviço público de educação, as vagas nas escolas próximas à comunidade são insuficientes e a alimentação escolar não é de qualidade, além de não ser constante durante todo o ano letivo. A maioria das famílias vive de renda gerada por “bicos”, trabalhos esporádicos e sem vínculo formal de emprego, fato que prejudica a acessibilidade econômica aos alimentos e a outros direitos fundamentais. Apesar do quadro de pobreza, a grande maioria das famílias não é titular de políticas de transferência de renda. O quadro de violação dos Direitos Humanos desta comunidade reflete-se nas condições de vida às quais estão submetidos os seus moradores e moradoras, sendo este decorrente do não cumprimento das obrigações de respeitar, proteger, promover e prover o DHAA e direitos correlatos, por parte do Estado. Isto é resultado de políticas públicas que levaram ao êxodo rural, seja pelo desrespeito ou não proteção do direito de acesso à terra para produção de alimentos, seja pela não promoção de políticas públicas que facilitem a realização destes direitos, seja pelo não provimento do DHAA para populações incapazes de se alimentar adequadamente por razões alheias à sua vontade. Neste exemplo, de que forma os direitos desta comunidade podem ser exigidos? Quais instrumentos de exigibilidade podem ser usados? Para a exigibilidade de direitos desta comunidade e de comunidades em situações similares, vários caminhos seriam possíveis. No entanto, na perspectiva dos Direitos Humanos, independentemente do caminho escolhido para a cobrança de direitos, é sempre importante garantir o envolvimento e a participação ativa e informada durante todo o processo de exigibilidade dos titulares de direito, ou seja, da comunidade. O processo de exigibilidade deve ser sempre desenvolvido segundo os princípios de Direitos Humanos: participação, transparência, não discriminação, etc. A busca pela realização efetiva dos direitos desta comunidade deveria ser desenvolvida na perspectiva do seu apoderamento, que pode ser definido como o processo pelo qual a população se apodera, se apropria de seus direitos, se sentindo e agindo como sujeitos destes direitos, apoderando-se também dos mecanismos institucionais para a implementação dos mesmos. No capítulo 3 vamos explicar com detalhes a importância do processo de apoderamento dos titulares de direitos para o fortalecimento da exigibilidade de direitos. Quando a comunidade está apoderada de seus direitos é mais fácil reconhecer uma ação ou omissão como violação de Direitos Humanos. Um quadro como o descrito acima passa a ser visto não mais como uma falta moral, mas como uma violação a deveres jurídicos, passível de punição. A partir desses princípios, ou seja, com a incorporação da abordagem de Direitos Humanos para fortalecer a sua luta a comunidade, com apoio de parceiros, poderia:

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1) Documentar esse quadro de violações de direitos, isto é, realizar relatórios, recolher dados e informações que identifiquem as ações arbitrárias e omissões a que estão expostas. Isso facilita a visibilidade do quadro de violações de direitos e o seu direcionamento a órgãos de proteção dos mesmos, além de ser um importante instrumento para constrangimento dos órgãos públicos; 2) Realizar um planejamento estratégico e participativo para exigir direitos: a comunidade poderia definir também quais seriam as suas demandas e prioridades. É a realidade de cada local que deve determinar os caminhos e direitos que devem ser priorizados e exigidos. Depois de definidas as metas prioritárias a comunidade deveria definir para cada meta, estratégias de exigibilidade, formas de monitoramento, indicação de responsáveis, identificação de possíveis parceiros para as ações de exigibilidade e prazos para a realização das demandas. No capítulo 3 apresentaremos como este trabalho de exigibilidade de direitos pode ser realizado com a participação ativa e informada de comunidades em situação de vulnerabilidade. Ao mesmo tempo a exigibilidade de direitos desta comunidade certamente iria depender de uma série de fatores, dentre eles:

• O seu grau de mobilização; • A existência de apoio de parceiros para a cobrança de seus direitos e quais são esses

parceiros (entidades da sociedade civil, movimentos sociais, universidades, conselhos, Ministério Público).

Como os direitos desta comunidade poderiam ser exigidos? Suponhamos que a comunidade selecionasse como uma de suas prioridades a questão das violações ao seu Direito Humano à Saúde, no contexto da indivisibilidade dos Direitos Humanos. De que forma este direito poderia ser exigido? Que instituições e instrumentos poderiam ser acionados/usados para exigir direitos? Cobrança de direitos perante instituições administrativas - exigibilidade administrativa

• Em relação às violações ao Direito Humano à Saúde, por exemplo, as lideranças comunitárias poderiam apresentar denúncias diretamente ao posto de saúde mais próximo, formalizando reclamações sobre a falta de remédios e a precária condição de atendimento da unidade de saúde (exigibilidade administrativa). O posto de saúde teria a obrigação de receber esta denúncia, investigá-la e solucionar o problema. Caso a reparação das denúncias apresentadas não fosse da esfera de sua competência, a unidade de saúde deveria, no mínimo, receber e encaminhar a denúncia ao órgão competente pela sua superação.

• Caminhos semelhantes poderiam ser adotados em relação às demais demandas da comunidade relacionadas, por exemplo, a denúncias de violação ao seu Direito Humano à Moradia, Educação, Trabalho, etc. Assim, em relação às demais violações aos seus Direitos Humanos, a comunidade poderia apresentar queixas com base nas violações documentadas para os serviços públicos locais relevantes - posto de saúde, escola, posto do INCRA, etc.

Cobrança de direitos perante instituições e membros do Poder Público com capacidade de escolha sobre as diferentes formas de agir e realizar direitos - exigibilidade política

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• Ao mesmo tempo, ou caso não houvesse resposta a essa denúncia sobre violações ao Direito Humano à Saúde ou a mesma demorasse a ser resolvida diretamente pelo posto de saúde, a comunidade poderia também apresentar denúncias junto à Secretaria Municipal de Saúde (ou por meio do Conselho Municipal de Saúde), cobrando a investigação e resolução dos problemas relacionados ao posto de saúde, inclusive a falta de medicamentos (exigibilidade política).

• Em relação às demais violações aos seus Direitos Humanos, a comunidade poderia apresentar denúncias para os Conselhos de Educação, Conselhos de Alimentação Escolar (CAE), Conselho de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA), etc.

Cobrança de direitos por meio da utilização de Instrumentos de Proteção de Direitos Humanos e Monitoramento de Violações - exigibilidade quase-judicial

• Caso não tenha havido respostas das instâncias anteriores, ou simultaneamente,

dependendo da gravidade, a comunidade poderia apresentar denúncias de violações aos seus Direitos Humanos ao Ministério Público ou Defensoria Pública. Como uma das possíveis ações, o Ministério Público poderia, por exemplo, instaurar procedimentos quase-judiciais de investigação sobre as denúncias. Esse inquérito poderia levar à emissão de recomendações ao poder público.

• Além disso, caso o país em questão já tivesse uma Comissão Nacional de Direitos Humanos (ou Conselhos Nacional, Estaduais e Municipais de Direitos Humanos) estas instâncias poderiam também receber as denúncias e elaborar recomendações aos organismos públicos no sentido de sua superação (exigibilidade quase-judicial).

Cobrança de direitos perante o Poder Judiciário - exigibilidade judicial

• Estas denúncias poderiam também ser apresentadas pela comunidade com o apoio do Ministério Público ou outras organizações ao Poder Judiciário local por meio, por exemplo, de Ações Civis Públicas que poderiam ser interpostas pelo Ministério Público ou por organizações não-governamentais defensoras de Direitos Humanos (exigibilidade judicial).

Cobrança de direitos perante órgãos internacionais de proteção de Direitos Humanos - exigibilidade em nível internacional

• Caso não houvesse resposta às ações tomadas ou a mesma demorasse a ser prestada, ou houvesse risco imediato de vida, a comunidade poderia, com o apoio de diferentes parceiros, recorrer à Corte Interamericana de Direitos Humanos, a relatores especiais da ONU ou ao Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU (CESCR).

As demandas da comunidade poderiam ser apresentadas aos órgãos públicos através de reuniões e audiências públicas ou por meio de instrumentos que permitissem o encaminhamento, aos poderes públicos e ao Ministério Público, de demandas concretas sobre as irregularidades ou arbitrariedades que estivessem colocando em risco ou violando direitos, para que assim fossem tomadas as medidas cabíveis. No Brasil, por exemplo, existe o direito de petição. Através deste instrumento, qualquer pessoa ou organização pode escrever um texto informando quem está escrevendo, qual direito está sendo ameaçado ou lesado e quem é o responsável por esses problemas. O direito de petição deve ser endereçado à autoridade

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pública que possa superar a situação de lesão ou ameaça de lesão de direitos. No entanto, caso seja endereçado à autoridade que não tenha esta competência, a autoridade que recebeu a petição tem a obrigação de encaminhá-la para os órgãos públicos competentes. Caso não sejam tomadas as medidas necessárias para superar as irregularidades apontadas, o direito de petição pode gerar provas para que seja requerida a responsabilização civil, administrativa e penal do servidor ou agente político omisso ou arbitrário. Após a descrição destes diferentes passos para a cobrança da realização de Direitos Humanos, é importante também mencionar as dificuldades enfrentadas pelos servidores públicos em cumprir as suas obrigações de respeitar, proteger, promover e prover Direitos Humanos, seja por falta de informação sobre as obrigações, seja por falta de condições financeiras e/ou de pessoal ou por falta de clara delegação por parte de seus superiores. Em alguns casos estas dificuldades estão relacionadas até mesmo a decisões políticas contrárias. Em uma visão crítica, caso as denúncias de violação fossem entregues a um posto de saúde no Brasil, por exemplo, na prática o chefe do posto dificilmente olharia o problema com a seguinte visão: “O que está errado aqui? O que eu posso fazer aqui e agora para melhorar esta situação?”. Em geral os agentes públicos acabam responsabilizando as instâncias superiores e nada acontece. No capítulo 3 apresentaremos algumas propostas e passos fundamentais para a superação destes obstáculos e para a construção de competências em DHAA.

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CAPÍTULO 2 Instituições e instrumentos de defesa e exigibilidade dos Direitos Humanos Todos os Estados têm a obrigação de criar, implementar e fortalecer instituições, instrumentos e rotinas que venham a permitir a apresentação de denúncias por pessoas ou grupos que se sintam violados em seus direitos e/ou que não se sintam adequadamente contemplados por programas e políticas públicas. Em cada realidade existem diferentes instituições e instrumentos públicos de defesa e exigibilidade de direitos. No Brasil, por exemplo, podemos citar o Ministério Público, a Defensoria Pública, os Tribunais de Justiça e os instrumentos disponíveis no âmbito do Congresso Nacional (Senado Federal e Câmara dos Deputados). Existem também iniciativas da sociedade civil que exercem uma forte pressão sobre os Estados no sentido da realização prática dos Direitos Humanos. Entre elas podemos citar todas as organizações não-governamentais (ONGs), entidades populares e sindicais e movimentos sociais que promovem a exigibilidade de diferentes Direitos Humanos, reconhecidas hoje como defensoras de Direitos Humanos. No Brasil, destaca-se o trabalho que vêm sendo realizado por diferentes movimentos sociais, fóruns, redes e entidades da sociedade civil, assim como o Projeto Relatores Nacionais da Plataforma Brasileira de Direitos Humanos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais (Plataforma DHESCA Brasil). Além disso, os Conselhos de Direitos Humanos são importantes espaços de defesa e exigibilidade dos Direitos Humanos. No Brasil merece destaque o trabalho da Comissão Especial de Monitoramento de Violações do DHAA do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH). Por outro lado os Conselhos de Políticas Públicas têm também o potencial de se constituírem em espaços para a exigibilidade de direitos quando propõem a criação de algum programa ou política pública ou quando recomendam que políticas e programas sofram modificações a fim de incorporar a perspectiva dos Direitos Humanos em sua operacionalização. No Brasil destacamos o trabalho da Comissão Permanente de DHAA do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA).

Para o fortalecimento da exigibilidade em cada país, é fundamental analisar minuciosamente as seguintes questões: • Quais são as instituições e instrumentos de defesa e exigibilidade já existentes? • Como funcionam esses instrumentos e instituições (se possuem ou não recursos

humanos, financeiros, autonomia e independência para a efetividade de suas ações, etc.)?

• Até que ponto essas instituições e instrumentos são efetivos, ou seja, respondem de forma adequada e em tempo oportuno às denúncias de violações de direitos, especialmente de DHESC?

• O que precisa ser feito para o fortalecimento dessas instâncias e instrumentos? • Quais são as instituições e instrumentos de exigibilidade que ainda precisam ser

criados e implementados no país?

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• Existem parcerias entre as diferentes instâncias de defesa e exigibilidade de direitos? Como funcionam estas parcerias?

Com base nesta análise, entidades da sociedade civil e atores públicos de cada país devem elaborar estratégias de exigibilidade que definam caminhos a serem percorridos, assim como metas e prazos para a realização de determinados objetivos. Na construção dessas estratégias é necessário que esteja claro quem são os responsáveis pela criação e implementação dos instrumentos e instituições de exigibilidade e pelo fortalecimento dos já existentes; quais são as circunstâncias favoráveis assim como os desafios e obstáculos a serem enfrentados; quais são as parcerias que precisam ser formadas, etc. A experiência acumulada pelo Brasil demonstra que a parceria entre diferentes atores, tais como o Ministério Público, entidades da sociedade civil e diferentes conselhos e comissões pode contribuir para o processo de criação e fortalecimento de instituições relativas ao DHAA. Essas parcerias também podem ser muito importantes para a criação e utilização dos instrumentos de exigibilidade já disponíveis. 2.1. As instituições de defesa e exigibilidade de Direitos Humanos 2.1.1. Conselhos de Políticas Públicas Os Conselhos de Políticas Públicas têm como principal função propor e avaliar políticas públicas. Quando, por exemplo, um Conselho Política Pública propõe a criação de determinado programa para suprir uma ausência do Estado, ou quando recomenda que políticas e programas sofram modificações para que não desrespeitem direitos, esses conselhos adotam medidas de exigibilidade para a garantia de direitos e superação de violações dos mesmos. Em alguns casos os conselhos que tratam de políticas públicas, por vezes, já exercem funções relativas ao recebimento e encaminhamento de denúncias de violações de direitos. Os Conselhos de Políticas Públicas do Brasil se caracterizam, por definição da Constituição Federal de 1988, por garantir a participação de representantes da sociedade civil, em alguns casos de forma paritária. Cabe a eles também ter uma função mista de assessoramento e negociação de políticas e programas e de monitoramento e controle social das mesmas. O grau de independência dos referidos conselhos em relação ao Poder Executivo é extremamente variado, dependendo da força dos movimentos sociais correlatos, mas historicamente estas instâncias têm-se demonstrado extremamente limitadas em sua autonomia. 2.1.2. Conselhos de Direitos Humanos Já os Conselhos de Direitos Humanos têm como função primordial captar, investigar, monitorar e propor recomendações para reparação e prevenção de violações de direitos.

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Os Conselhos de Direitos Humanos, tendo em vista o seu mandato e a natureza do trabalho exercido, devem ter como parâmetro de organização e forma de trabalho as diretrizes estabelecidas pelos Princípios de Paris. Seguindo esses Princípios, os Conselhos de Direitos Humanos precisam ter uma representação pluralista e independente - composta pela sociedade civil, parlamento e universidades, estando o governo somente na condição de observador, sem direito a voto - e precisam atuar de maneira imparcial, documentando e investigando violações, identificando responsáveis, propondo, encaminhando e monitorando reparações para violações comprovadas de Direitos Humanos. Essa independência em relação ao governo deve estar expressa inclusive em sua autonomia financeira, política e administrativa. No entanto, na prática, os Conselhos de Direitos Humanos no Brasil como em outros países, ainda não atuam em plena consonância com os Princípios de Paris. No Brasil, alguns Conselhos de Direitos, incluindo o Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH) e os Conselhos Estaduais de Direitos Humanos, apesar de atribuições e funcionamento diferentes ainda estão compostos dentro dos moldes dos Conselhos de Políticas Públicas - conselhos paritários, com função de assessoria ao Poder Executivo, com garantia de direito a voto dos representantes governamentais, com limitada autonomia em relação ao Poder Executivo. A demanda de adequação do funcionamento desses conselhos aos Princípios de Paris deve ser uma reivindicação da sociedade civil. Mesmo com estes limites, os Conselhos de Direitos Humanos, em especial o Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH), têm cumprido um papel fundamental no processo de redemocratização do país, denunciando, de forma pública e independente, violações graves de Direitos Civis e Políticos que influenciam diretamente a realização dos DHESC. Além disso, nos últimos anos, os Conselhos de Direitos Humanos vêm sendo mais e mais cobrados a se posicionar em relação a violações de DHESC. Parte desta pressão tem sido exercida na área do DHAA, pelos movimentos sociais relacionados ao tema e pelos CONSEAs. Um dos resultados ainda incipientes desta pressão foi a criação da Comissão Especial de Monitoramento das Violações do DHAA no âmbito do CDDPH, que será explicada a seguir. Assim, o que se pode observar é que os Conselhos de Direitos Humanos e os Conselhos de Políticas Públicas, ainda que tenham como ponto comum a função de controle social, têm naturezas, mandatos e responsabilidades distintas e, de acordo com os documentos de Direitos Humanos, também devem ter formas de operacionalização diferentes. Estes conselhos têm mandatos e atribuições bem diferentes em relação ao que podem fazer em termos de promoção, proteção e garantia de Direitos Humanos. Ao mesmo tempo, eles são regidos por princípios e normas distintas, o que os torna instituições de natureza diferentes. De todo modo, é fundamental que a sociedade civil participe de forma ativa, informada e autônoma de todos os Conselhos existentes, porque é a participação livre e ativa da sociedade que pode garantir a efetividade desses espaços para o controle social sobre o poder público e, assim, para a promoção e exigibilidade dos Direitos Humanos. 2.1.3 Instituições públicas Dentre as instituições públicas de defesa e exigibilidade dos Direitos Humanos, podemos citar os Tribunais de Justiça, as instituições com o poder-dever de garantir os Direitos Humanos

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(Ministério Público e Defensoria Pública) bem como os instrumentos disponíveis no âmbito do Poder Legislativo. As instituições públicas responsáveis pela captação e investigação de denúncias de violações de Direitos Humanos, tais como o Ministério Público, a Defensoria Pública, as Comissões Legislativas de Direitos Humanos, os Tribunais de Justiça, precisam ser desenvolvidos de forma independente do governo, mesmo que sejam financiadas pelo poder público. A investigação de violações de Direitos Humanos não pode ser afetada por posições administrativas do governo. 2.1.4 Entidades da sociedade civil As organizações e redes da sociedade civil são instrumentos importantes para a mobilização social e controle político dos atos públicos. No Brasil existem organizações e redes da sociedade civil que trabalham especificamente com a promoção e exigibilidade do Direito Humano à Alimentação Adequada. O trabalho desenvolvido por essas entidades e redes da sociedade civil tem se mostrado essencial para a realização do DHAA, inclusive no que diz respeito a necessidade de criação, modificação e extinção de políticas e programas públicos visando a promoção do DHAA. Ao mesmo tempo, há uma série de entidades que, com muita determinação e propriedade, têm lutado pelo acesso à terra, contra a violência no campo, por melhores salários, pela qualidade dos alimentos, pela agroecologia, pela Segurança Alimentar e Nutricional, entre outras. Estas organizações vêm progressivamente se aproximando da luta pelos Direitos Humanos e hoje, direta ou indiretamente, reforçam e dão legitimidade à luta por uma estratégia nacional de promoção do DHAA, no contexto da SAN e da Soberania Alimentar. Na prática, as ações de exigibilidade da sociedade civil, seja para prevenir ou reparar violações, têm sido fundamentais para o reconhecimento da alimentação enquanto Direito Humano. 2.2. Brasil: alguns exemplos de instituições e instrumentos de defesa e exigibilidade dos Direitos Humanos 2.2.1. A Comissão Permanente para o Direito Humano à Alimentação Adequada do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA) A Comissão Permanente para o Direito Humano à Alimentação Adequada do CONSEA Nacional tem como missão analisar políticas e programas públicos, a partir da ótica do DHAA, emitindo recomendações aos organismos governamentais e monitorando a incorporação das mesmas. Entre 2005 e 2006 a Comissão Permanente analisou três programas governamentais: o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE/FNDE), o Programa Bolsa Família (PBF/MDS) e a Estratégia Saúde da Família (ESF/MS) e elaborou, com o apoio da Ação Brasileira pela Nutrição e Direitos Humanos (ABRANDH), relatórios com recomendações específicas aos organismos governamentais responsáveis pelos programas.

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Para a análise dos programas e políticas públicas na perspectiva do DHAA, a Comissão desenvolveu uma metodologia com base na experiência da Comissão de Direitos Humanos da África do Sul23 e em outros instrumentos nacionais e internacionais sobre monitoramento e exigibilidade. A metodologia para análise de programas e políticas públicas na perspectiva do DHAA encontra-se no anexo I do presente documento. Com as devidas adaptações, este material poderá ser utilizado por outros países como importante instrumento para a promoção da exigibilidade via programas e políticas públicas. Esta metodologia para análise dos programas sob a ótica do DHAA busca identificar:

• Quais são as dimensões do direito em questão; • Quem são os titulares de direito: dentro de cada programa, deve ficar claro quem

são os titulares do DHAA, para que os mesmos tenham condições de cobrar seus direitos;

• Quem são os portadores de obrigação: definir claramente que agentes públicos são responsáveis pela realização de cada uma das dimensões do direito; que obrigações são de todos os servidores públicos, por exemplo, a obrigação de não discriminar, entre outras;

• Se os princípios da eqüidade, da universalidade, da dignidade, da responsabilização, da participação ativa e informada dos titulares de direitos entre outros, são promovidos no âmbito da política pública;

• Se existem metas, indicadores e prazos claramente definidos; • Se a linguagem para disseminação de informações sobre o programa é simples e

acessível aos titulares de direitos, principalmente aos mais marginalizados; • Se o programa prevê a realização de cursos de capacitação continuada em DHAA,

no contexto da indivisibilidade dos Direitos Humanos, para os gestores e demais atores responsáveis pelo programa no sentido de garantir que sua atuação seja baseada numa visão dos Direitos Humanos;

• Se existem instrumentos acessíveis de recurso administrativo no âmbito da política pública, ou seja, instrumentos que permitam aos titulares de direito reclamar do poder público quando seus direitos previstos naquele programa ou política pública não estão sendo realizados, ou se há a necessidade de criá-los ou fortalecê-los.

• Se existem mecanismos de recurso que permitam que os titulares de direito exerçam a exigibilidade do DHAA, e se os titulares de direito estão informados sobre os mesmos, tais como: acesso aos Conselhos de Política Pública, ouvidorias, ao Ministério Público, etc.

Com base nesta análise, a metodologia propõe a definição de protocolos, procedimentos e rotinas para cada um dos programas e políticas públicas que deixem bem claro todos os itens acima e estejam disponíveis para os titulares de direito e portadores de obrigações.

23 Para maiores informações sobre o trabalho realizado pela Comissão de Direitos Humanos da África do Sul, em relação aos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, ver o site: http://www.sahrc.org.za/sahrc_cms/publish/cat_index_28.shtml (site em inglês)

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Ao firmar Tratados Internacionais de Direitos Humanos, os Estados se comprometem a desenvolver programas e políticas públicas que tenham como objetivo final a promoção dos Direitos Humanos, ou seja, de uma vida digna de qualidade para todos os habitantes do seu território. Entretanto, em raras ocasiões as políticas públicas de diferentes países incorporam, de fato e de forma efetiva, dispositivos que garantam o cumprimento das obrigações de Direitos Humanos em sua elaboração, implementação e monitoramento. Em muitos países a realização de políticas públicas ainda é entendida pelos portadores de obrigações como favor, privilégio ou caridade. Conseqüentemente, essas políticas passam a ser percebidas pelos titulares de direito da mesma forma. Neste contexto, a análise de programas e políticas públicas na ótica dos Direitos Humanos tem como objetivo transformar esta percepção na medida em que visa garantir que as mesmas passem a ser de fato entendidas como ações de promoção e provimento de Direitos Humanos. A análise das políticas públicas à luz da perspectiva do DHAA leva em consideração as seguintes questões: • Políticas públicas relacionadas à SAN devem promover/facilitar o DHAA. Os Estados

devem desenvolver políticas que tenham como objetivo final a promoção do DHAA no contexto da indivisibilidade dos Direitos Humanos, ou seja, de uma vida digna de qualidade para todos os habitantes do seu território. O Comentário Geral nº 1224 do Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU deixa claro que o DHAA é inseparável da justiça social, requerendo a adoção de políticas econômicas, ambientais e sociais, tanto no âmbito nacional como internacional, orientadas para a erradicação da pobreza e a realização de todos os Direitos Humanos para todos.

A realização do DHAA demanda a integração e articulação de políticas públicas. Políticas econômicas e de comércio internacionais são, em grande parte, responsáveis por violações do DHAA. Nenhum programa ou política pública isolado poderá promover o DHAA e a Segurança Alimentar e Nutricional das populações de diferentes países enquanto todas as outras políticas violem estes direitos. O que se observa é a necessidade de mudanças significativas nas políticas econômicas e sociais para que se possa alcançar uma abordagem de fato baseada nos Direitos Humanos, que valorize o processo tanto quanto os resultados como proposto pelo Comentário Geral nº 12 e pelas Diretrizes para o Direito Humano à Alimentação Adequada25.

• Para a promoção do DHAA o processo é tão importante quanto os resultados, já que “os

fins não justificam os meios”. Ou seja, não basta analisar se um programa ou política pública atinge seus objetivos, mas é preciso avaliar a forma como estes objetivos estão sendo alcançados.

24 Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU, “Comentário Geral nº 12”, 1999 in: Valente, F. L. S, Direito Humano à Alimentação: desafios e conquistas. Cortez Editora, São Paulo, 2002. Disponível em: http://www.abrandh.org.br/downloads/Comentario12.pdf 25 FAO. Diretrizes em apoio à Realização Progressiva do Direito à Alimentação Adequada no contexto da Segurança Alimentar Nacional. Roma, 2004. As Diretrizes Voluntárias foram aprovadas pelo Conselho da FAO em novembro de 2004. Traduzida e editada pela ABRANDH:

http://www.abrandh.org.br/downloads/Diretrizes.pdf

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Políticas públicas devem ser regidas pelos princípios: � Da responsabilização (ou obrigação de prestar contas): Uma das mais importantes fontes

de contribuição da análise de políticas públicas sob uma perspectiva dos Direitos Humanos diz respeito à ênfase colocada na responsabilização de atores cujas ações têm um impacto nos direitos das pessoas. Arranjos e instituições legais/administrativas, que visem assegurar a responsabilização das autoridades competentes e gestores públicos, devem ser trazidos a todos os programas e estratégias. Além disso, é imperativa a necessidade de identificação dos portadores de obrigações (nas diferentes esferas de governo, quando for o caso) e de suas atribuições/obrigações, assim como a avaliação do desempenho destes atores em realizar as suas obrigações. O levantamento das atribuições dos atores responsáveis pela implementação dos programas e políticas públicas torna-se essencial inclusive para que estes atores possam reconhecer as suas obrigações e possam ter de fato uma maior capacidade de cumpri-las.

� Da participação ativa e informada dos titulares de direito: A participação ativa e informada dos titulares de direito na formulação, execução e monitoramento dos programas - em todas as fases do processo - deve ser vista como um elemento extremamente importante na medida em que se reconhece, cada vez mais, que estratégias unilaterais impostas por uma das partes raramente funcionam, até mesmo quando essas estratégias visam apenas garantir melhorias nas condições de vida dos titulares de direito. Existe sempre a necessidade de se levar em conta que os indivíduos devem ser os sujeitos ativos, e não meramente objetos, de estratégias que objetivem “beneficiá-los”. Uma abordagem que integre Direitos Humanos deve garantir os passos necessários para a participação ativa e informada dos mais marginalizados, através da criação de uma estrutura legal-institucional na qual eles possam participar efetivamente na formulação, implementação e monitoramento das políticas.

� Da equidade e não discriminação: Todos os seres humanos são titulares de Direitos Humanos, independentemente de características individuais ou grupais que os possam diferenciar. Assim, qualquer tipo de discriminação que mantenha ou promova desigualdades consiste em uma violação de Direitos Humanos.

Além disso, as políticas públicas devem ser elaboradas e implementadas: • Com a definição de rotinas e procedimentos acessíveis de exigibilidade

As rotinas e procedimentos de exigibilidade são instrumentos que permitem aos titulares de direito reclamar do poder público quando seus direitos previstos naquele programa ou política pública não estiverem sendo realizados.

A implementação de rotinas e procedimentos de exigibilidade exige a capacitação dos agentes públicos encarregados pela implementação das políticas públicas, na medida em que elas se inserem, necessariamente, dentro de um novo paradigma que confronta, em grande parte, a ausência de uma cultura de Direitos Humanos em muitos países.

Além disso, cada política pública, mesmo que totalmente baseada em Direitos Humanos e com previsão de instrumentos de recurso administrativos internos, deve também explicitar que é direito de todo habitante do seu território recorrer a instituições nacionais de Direitos Humanos quando sentir que seus direitos estão sendo violados.

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• Com a alocação de recursos, permitindo seu monitoramento e avaliação continuada. Para que as políticas públicas possam ser de fato efetivas existe a necessidade de se garantir a alocação de recursos adequados, assim como a boa execução dos mesmos. A implementação de mecanismos para monitoramento dos avanços na realização do DHAA é fundamental para a identificação de fatores e dificuldades que afetam o grau de implementação das obrigações e para facilitar a adoção de legislação corretiva e medidas administrativas, inclusive medidas para a implementação das obrigações. Um monitoramento eficiente é essencial para transformar em realidade os direitos definidos em políticas e estratégias. • Com indicadores de processo e resultado, metas, prazos A necessidade de se identificar indicadores, metas e prazos está ligada à percepção de que, caso se verifique que o progresso na realização de políticas tem sido lento, ações corretivas possam ser tomadas e aqueles que têm obrigação de realizar as estratégias possam ser devidamente responsabilizados. A definição de indicadores, metas e prazos demonstra um compromisso do Estado no sentido de garantir a realização das metas previstas em um determinado programa ou política pública. Neste contexto, o objetivo da análise de políticas públicas na perspectiva dos Direitos Humanos é garantir:

• A criação de instrumentos acessíveis de exigibilidade para que as ações e serviços providos pelos programas e políticas passem a ser de fato entendidos como Direitos Humanos passíveis de serem exigidos.

• O apoderamento dos titulares de direito ao enfatizar a importância de sua participação ativa e informada.

• Que os portadores de obrigações entendam que têm obrigação e sejam devidamente responsabilizados por suas omissões ou ações violadoras de direitos.

Lembre-se: • Os gestores responsáveis por programas e políticas públicas têm a obrigação de

elaborar, implementar, monitorar e revisar programas e políticas públicas sob a ótica dos Direitos Humanos. Em alguns casos, talvez seja necessária a reformulação do marco legal dos programas e políticas para harmonizá-lo com as provisões dos Tratados Internacionais de Direitos Humanos e das leis nacionais e locais que versem sobre o DHAA.

• Por outro lado, entidades da sociedade civil têm a responsabilidade de exigir que

todas as políticas e programas públicos sejam explícita e efetivamente desenvolvidos enquanto realização de Direitos Humanos.

2.2.3. Comissão Especial de Monitoramento de Violações do Direito Humano à Alimentação Adequada26

26 Ver Resolução n. 12 de 24.05.2005 da Secretaria Especial de Direitos Humanos que, com fulcro nos artigos 4º e 6º da Lei 4.319, de 16 de março de 1964, estabelece metodologia interinstitucional de trabalho para

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Essa Comissão foi instituída, em maio de 2005, no âmbito do Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoal Humana (CDDPH). O CDDPH é atualmente vinculado à Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH). Ela representa um marco de inovação nas atividades do CDDPH, sendo a primeira Comissão Especial dedicada ao monitoramento da realização de um Direito Humano Econômico, Social e Cultural (DHESC) no âmbito do próprio Conselho e também no Brasil. A Comissão foi criada como resposta à necessidade urgente de estabelecimento de um espaço capaz de receber, investigar e recomendar ações corretivas e reparadoras de violações do DHAA, tendo como meta agilizar respostas interinstitucionais às gravíssimas situações de fome, desnutrição e insegurança alimentar e nutricional a que estão submetidas milhões de famílias brasileiras. A primeira tarefa enfrentada pela Comissão Especial foi analisar o impacto da suspensão da transferência de recursos do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) para os estados e municípios, prevista pelas normas do Programa no caso de não atendimento às exigências estabelecidas, quais sejam: não prestação de contas, não constituição ou inoperância dos Conselhos de Alimentação Escolar (CAE) e desvio de verbas orçamentárias destinadas ao Programa. Para discutir possíveis mecanismos que pudessem substituir a suspensão do repasse de recursos, além do estabelecimento de medidas contra as irregularidades e contra a impunidade dos gestores públicos que tenham descumprido as exigências, a Comissão Especial de Monitoramento de Violações do DHAA estabeleceu um Grupo de Trabalho sobre o PNAE. Dentre as propostas elaboradas, o Grupo de Trabalho propôs ao Ministério da Educação que, em conjunto com os demais órgãos responsáveis pelos sistemas de ensino e com o Ministério Público Federal, os Ministérios Públicos Estaduais e os órgãos responsáveis pelo controle dos gastos públicos nos âmbitos federal, estadual e municipal, promova a criação de mecanismos adequados à execução e fiscalização do PNAE de forma a garantir o Direito Humano dos alunos da Educação Básica à alimentação escolar, na forma definida em lei. Essas instituições organizadas em forma de rede atuariam segundo as suas competências administrativas e funcionais. Neste contexto, o trabalho da Comissão Especial permitiu a articulação de importantes setores do governo responsáveis pela proteção e promoção de direitos (Ministério Público, Defensoria Pública, Corregedoria Geral da União, Secretaria Especial de Direitos Humanos, etc.) na busca de alternativas efetivas às questões do PNAE. Um dos principais desafios que precisa ser solucionado em curto espaço de tempo para o funcionamento e êxito das ações da Comissão Especial está relacionado à necessidade de garantia de condições mínimas de infra-estrutura e autonomia financeira e operacional (pessoal, equipamentos e infra-estrutura), em consonância com os Princípios de Paris. Isso requer negociação com as autoridades públicas com vistas à institucionalização da Comissão, garantindo-lhe independência e sustentabilidade para a implementação de suas ações referentes à exigibilidade do DHAA.

acompanhamento e apuração de denúncias relativas à violação do Direito Humano à Alimentação Adequada. Ver documento no site www.abrandh.org.br.

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Como replicar as experiências dessas Comissões em outros países Na medida em que estamos tratando, especificamente, de aspectos institucionais, a realidade é muito distinta em diferentes países. No entanto, todo país tem instituições que são responsáveis pela negociação de denúncias de violações e aquelas que são responsáveis pelo monitoramento da elaboração e funcionamento adequado de políticas públicas. O primeiro passo em cada país deveria ser a identificação das instituições responsáveis por estas atividades assim como a busca pela incorporação da dimensão da promoção da realização do DHAA nas mesmas. Os Conselhos de Políticas Públicas de diferentes países podem, por exemplo, estudar a viabilidade de criar e fortalecer, internamente, instâncias que tenham como missão analisar políticas públicas sob a perspectiva dos Direitos Humanos, a exemplo da Comissão Permanente de DHAA do CONSEA. Além disso, é importante garantir que os Conselhos e Comissões de Direitos Humanos atuem em consonância com os Princípios de Paris e que instâncias específicas para recebimento e investigação de denúncias de violações do DHAA sejam criadas no âmbito destes conselhos/comissões. O fortalecimento de instâncias de exigibilidade do DHAA no âmbito dos Conselhos de Políticas Públicas e de Direitos Humanos é um grande desafio que deve ser enfrentado para o fortalecimento da exigibilidade do DHAA nos diferentes países.

2.2.4. O Ministério Público No Brasil, o Ministério Público (MP) foi definido como instituição permanente, essencial à função jurisdicional27 do Estado, que tem como fim precípuo a defesa da “ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis”. O seu mandato, definido pela Constituição Federal de 1988, inclui o monitoramento do cumprimento das leis e da Constituição pelo setor público, em todos os poderes e a promoção e proteção dos Direitos Humanos. Em razão de suas atribuições e dos instrumentos que dispõe, renomados juristas28 afirmam que, atualmente, o Ministério Público é o órgão com maior estrutura e que apresenta as

27 Função Jurisdicional, em sua dimensão estritamente jurídica, implica a aplicação das normas para garantia dos direitos que nelas estão previstos. 28 “Atualmente, uma instituição que desempenha importante papel é o Ministério Público (...). Embora outras entidades disponham de legitimidade ativa para propositura da ação civil pública, a independência do Ministério Público e os instrumentos que lhe foram outorgados pelo referido dispositivo constitucional (competência para realizar o inquérito civil, expedir notificações, requisitar informações e documentos, requisitar diligências investigatórias) fazem dele o órgão mais bem estruturado e mais apto para o controle da

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melhores condições para o controle da administração e para a garantia dos Direitos Humanos no Brasil. O Ministério Público é autônomo em relação a todos os poderes públicos, e, em especial, ao Poder Executivo e ao governo, sendo, portanto, a única instituição brasileira que funciona de acordo com a independência e autonomia propostas pelos Princípios de Paris.

Como o MP pode ser acionado?29

Na grande maioria dos municípios brasileiros, existe pelo menos um representante do Ministério Público, que poderá ser encontrado em sua sede própria ou no fórum da cidade.

Quando houver alguma alegação de violação de direitos ou um ato ilícito da administração pública ou de entidades privadas que atinja várias pessoas, qualquer indivíduo, mesmo sem a intermediação de advogado, pode se dirigir à sede do Ministério Público local e registrar uma reclamação (protocolar uma representação por escrito). Para que essa denúncia seja aceita é importante anexar o maior número de provas ou informações possíveis. Cabe ao Ministério Público adotar as medidas necessárias para o encaminhamento da denúncia. Para apurar as violações de Direitos Humanos, o Ministério Público dispõe de instrumentos previstos em lei. Dentre esses instrumentos destaca-se a competência para promover inquéritos civis, termos de ajustamento de conduta (TAC), ações civis públicas e expedir recomendações. Instrumentos de defesa e exigibilidade dos Direitos Humanos utilizados pelo Ministério Público a. Inquérito Civil O Inquérito Civil consiste na instauração de um procedimento de investigação de denúncias sobre violações de direitos. Esses inquéritos podem levar à emissão de recomendações ao poder público ou à elaboração de Termo de Ajustamento de Conduta (TACs), quando necessário. O Inquérito Civil é um procedimento administrativo e, por essa razão, extrajudicial e pré-processual, que visa a reunião de provas ou outros elementos que possam fundamentar a atuação do Ministério Público para, por exemplo, promover ações perante o Poder Judiciário. b. Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) O propósito do TAC é fazer com que as autoridades públicas firmem documento onde se comprometam em ajustar sua conduta aos preceitos legais, dentro de um período estipulado. Para elaboração e firmamento do TAC, geralmente são necessários os seguintes passos:

• O Ministério Público pode colecionar informações, documentos comprobatórios das violações e, ainda, promover reuniões com os interessados: de um lado, a população titular do direito que está sendo violado ou ameaçado de lesão por ação ou omissão do Estado e, de outro lado, os responsáveis pela superação da ameaça ou da lesão de direitos;

administração pública.” DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 18 ed. São Paulo, Atlas, 2005. p.637. 29 http://nev.incubadora.fapesp.br/portal/segurancajustica/ministeriopublico

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• O Ministério Público, a partir da realidade de cada caso, pode elaborar uma proposta de termo para ser firmado pelas partes envolvidas;

• É importante que o TAC seja firmado em uma Audiência Pública. Nessa ocasião, as demandas de uma comunidade são apresentadas e discutidas com os integrantes do Ministério Publico e autoridades públicas presentes, podendo, como resultado desse encontro, ser firmado o TAC.

O TAC pode ser utilizado como um instrumento de monitoramento e, caso os compromissos não venham a ser cumpridos, o Ministério Público pode requerer, perante o Poder Judiciário, a responsabilização administrativa, civil e penal da autoridade que não observar o que foi nele acordado. c. Ação Civil Pública A Ação Civil Pública é o instrumento processual que tem como pressuposto o dano ou ameaça de dano ao consumidor, ao meio ambiente, à ordem urbanística, à ordem econômica, ou a qualquer outro interesse difuso ou coletivo, isto é, interesse que não é de um indivíduo, mas de grupos ou mesmo de toda sociedade. A Constituição Federal conferiu ao Ministério Público o uso da Ação Civil Pública para o cumprimento de suas atribuições. A Lei 7.347, de 1985, também permite que sejam autores de Ações Civis Públicas as pessoas jurídicas da administração pública, direta e indireta, e associações, o que inclui organizações não governamentais que estejam constituídas há pelo menos um ano, nos termos da lei civil, e tenham como função a proteção do meio ambiente, do consumidor, do patrimônio artístico, estético, histórico, paisagístico ou outros interesses coletivos ou difusos. É necessário que a sociedade civil conheça e utilize os instrumentos de exigibilidade disponíveis em sua realidade local. Além disso, o uso de instrumentos como os explicados acima e a parceria com o Ministério Público e outras instituições, por exemplo, podem gerar a criação de instrumentos de acordo com a necessidade local. Alguns dados e desafios sobre o Ministério Público Apesar da defesa e promoção dos Direitos Humanos estarem claramente incluídas no mandato do Ministério Público suas atuações exemplares são pontuais e ocorrem onde, geralmente, há parceria com a sociedade civil, pois o MP ainda enfrenta dificuldades para desempenhar de forma efetiva o papel de monitorar e garantir os Direitos Humanos. Uma parcela ainda pequena dos procuradores e promotores do MP dedica uma parte significativa de sua atuação profissional a este campo de trabalho, especialmente no que se refere à promoção e proteção dos DHESC. Além disso, há um déficit de profissionais que inviabiliza o cumprimento efetivo de sua função institucional. No entanto, vale ressaltar que nos últimos anos, no Brasil, houve um forte crescimento da pressão da sociedade civil em relação à exigibilidade dos DHESC, em especial após o fortalecimento da Plataforma DHESCA Brasil e da criação do Projeto Relatores Nacionais, que será descrito a seguir.

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Esta pressão teve uma resposta do MP, que vem tomando uma série de iniciativas importantes para fortalecer o seu papel como instrumento de recurso para a realização de Direitos Humanos. Dentre essas iniciativas, merece destaque a constituição pela Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão do Ministério Público Federal (PFDC/MPF) do Grupo de Trabalho (GT) sobre o DHAA. O grupo vem desenvolvendo um trabalho de divulgação do tema para os procuradores do MPF e promotores do Ministério Público Estadual (MPE). Além de analisar situações específicas, o GT elaborou um manual para a operacionalização do DHAA para promotores e procuradores que pode ser encontrado em seu site30. O papel estratégico desse Grupo de Trabalho, em parceria com a Relatoria Nacional para os Direitos Humanos à Alimentação Adequada, Água e Terra Rural, foi também fundamental para a criação da Comissão Especial de Monitoramento de Violações do DHAA do CDDPH. 2.2.5. O Projeto Relatores Nacionais em Direitos Humanos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais O Projeto Relatores Nacionais em Direitos Humanos Econômicos, Sociais, Culturais e Ambientais (DHESCA)31 foi criado em 2002 pela Plataforma DHESCA Brasil - rede de entidades e organizações da sociedade civil que trabalha para a promoção da exigibilidade desses direitos. O Projeto tem caráter inovador e tem demonstrado o enorme potencial que as redes da sociedade civil, em parceria com órgãos públicos, têm para pressionar o poder público no sentido da garantia e exigibilidade de direitos. Os Relatores Nacionais são selecionados por uma comissão tripartite, composta por representantes da sociedade civil, de organismos governamentais e de agências do Sistema das Nações Unidas (ONU), a partir de nomes indicados em consulta pública. O mandato dos relatores é similar ao dos Relatores Especiais da ONU, enfatizando-se a independência e a autonomia, conforme previsto nos Princípios de Paris. O mandato dos Relatores e Relatoras Nacionais inclui a coleta e apuração de denúncias de violações, inclusive por meio de missões de investigação, e a responsabilidade de identificar mecanismos administrativos, legais e políticos capazes de superar ou reparar essas violações, bem como tomar as medidas necessárias para emitir as recomendações às autoridades públicas, com base na investigação realizada. As missões de investigação são concluídas com a realização de uma audiência pública, em sua grande maioria convocadas e desenvolvidas em parceria com o Ministério Público. As recomendações dos Relatores Nacionais são encaminhadas às autoridades públicas e aos organismos internacionais de Direitos Humanos. Esses relatórios são também apresentados à Conferência Nacional dos Direitos Humanos, à Comissão Interamericana de Direitos Humanos e ao Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais das Nações Unidas. O monitoramento do cumprimento das recomendações emitidas pelas Relatorias Nacionais vem sendo realizado por organizações da sociedade civil que apóiam as comunidades visitadas, geralmente em parceria com o Ministério Público, e, quando necessário, mediante

30 Ver site www.pgr.mpf.gov.br/pgr/pfdc/index.jsp 31 O Projeto Relatores Nacionais da Plataforma DHESCA Brasil instituiu em 2002 Relatorias Nacionais para atuar nas áreas dos Direitos Humanos à Moradia e Terra Urbana; Meio Ambiente; Saúde; Educação; Trabalho e Alimentação Adequada, Água e Terra Rural. Para conhecer mais sobre o Projeto Relatores ver site: http://www.dhescbrasil.org.br/_plataforma/index.php

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novas ações das Relatorias Nacionais e respectivas Relatorias Especiais da ONU. Por essa razão, o êxito desse projeto depende do apoio efetivo de entidades da sociedade civil e das parcerias com órgãos públicos de proteção de Direitos Humanos. O impacto positivo das Relatorias Nacionais deriva de uma combinação de fatores:

• O forte movimento social que apóia cada uma das Relatorias; • Os Relatores são escolhidos entre pessoas que são referências nacionais dentro de seus

movimentos; • O forte suporte e o reconhecimento público recebido de setores relevantes do

Ministério Público Federal e Estadual; • O apoio das Nações Unidas e o reconhecimento do seu trabalho por parte dos

Organismos Internacionais de Direitos Humanos; • O suporte e a parceira com os respectivos Relatores Especiais das Nações Unidas; • A independência dos Relatores em relação ao governo e ao Estado.

Parcerias As Relatorias Nacionais não gozam de poder efetivo para obrigar órgãos estatais a seguir suas recomendações, da mesma forma que a maioria dos instrumentos públicos de Direitos Humanos. No entanto, o apoio de organismos e dos instrumentos internacionais de Direitos Humanos (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento /Programa dos Voluntários das Nações Unidas; Relatorias Temáticas da ONU; Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU), de órgãos federais (a exemplo da Procuradoria Federal dos Direitos dos Cidadãos do Ministério Público), e, principalmente, o apoio de redes da sociedade civil que congregam entidades, organizações e movimentos de todo o Brasil concede às Relatorias um poder de pressão política que impulsiona as ações de exigibilidade desenvolvidas pelos relatores. 2.2.6. A Relatoria Nacional para os Direitos Humanos à Alimentação Adequada e Terra Rural A Relatoria Nacional para os Direitos Humanos à Alimentação Adequada e Terra Rural (Relatoria Nacional), com sua independência e autonomia em relação ao governo, vem se constituindo em um importante instrumento para a promoção da realização e da exigibilidade do DHAA. A Relatoria Nacional é, atualmente, um dos mais potentes instrumentos de recurso ao alcance de indivíduos, grupos e comunidades. Além disso, a Relatoria constitui-se em um instrumento importante para impulsionar a promoção e exigibilidade do DHAA. O trabalho desenvolvido pela Relatoria Nacional: • Promove o debate sobre a dimensão dos Direitos Humanos entre as entidades do

movimento social que atuam com Segurança Alimentar e Nutricional; • Promove o debate sobre os Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais e sobre o

DHAA dentro dos movimentos de Direitos Humanos que lidam apenas com Direitos Civis e Políticos, destacando a necessidade de pressão política para a efetiva incorporação dos Princípios de Paris ao mandato das Instituições Nacionais de Direitos Humanos;

• Estabelece diálogo direto com agências governamentais com o objetivo de incorporar a dimensão dos Direitos Humanos nas políticas e programas públicos;

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• Atrai a atenção pública para situações de violação e para populações que até então viviam em situação de invisibilidade;

• Facilita soluções negociadas em situações de conflito, dentro de uma perspectiva dos Direitos Humanos, estimulando o Ministério Público Federal e Estadual a intensificar sua ação no campo da proteção dos Direitos Humanos. O reconhecimento do papel da Relatoria Nacional na mediação de conflitos em situações de violação tem levado diferentes organismos governamentais e Conselhos de Políticas Públicas a convidar a Relatoria para participar de esforços de busca de soluções e de facilitação de negociações políticas, o que contribui para resoluções pacíficas de conflitos em alguns casos;

• Informa comunidades, movimentos sociais e ONGs sobre a relevância da exigibilidade dos Direitos Humanos para as suas lutas;

• Informa, de forma continuada, a Relatoria Especial da ONU para o Direito à Alimentação sobre as violações mais graves no território nacional, buscando o apoio da mesma quando necessário.

As missões da Relatoria Nacional trazem visibilidade a populações e situações que antes eram “invisíveis” e “esquecidas” pelo Estado e pelos meios de comunicação. Em várias instâncias, a missão cria condições de se estabelecer novos canais de negociação entre a comunidade e as autoridades públicas responsáveis pelo enfrentamento das violações identificadas. Relatórios com emissão de recomendações ao poder público em seus diferentes níveis de atuação podem ser descritos como importantes produtos destas missões. Tais recomendações podem, eventualmente, ser transformadas em Termos de Ajustamento de Conduta pelo Ministério Público, o que pode intensificar ainda mais o processo de exigibilidade e realização dos direitos violados. Além das missões de investigação, entre 2002 e 2006 a Relatoria Nacional recebeu e analisou mais de 40 denúncias de violações do DHAA. Algumas foram objeto de missões de investigação in loco, individuais ou em conjunto com outras Relatorias do Projeto Relatores Nacionais da Plataforma DHESCA Brasil. Outras foram investigadas por meio de encaminhamento de solicitação de informações às autoridades públicas competentes, após contatos com as entidades denunciantes para verificação das informações, sempre em íntima colaboração com membros do Ministério Público Federal e/ou Estadual. A Relatoria emitiu notas públicas ou recomendações em grande parte destas denúncias. Com o apoio técnico e operacional da Ação Brasileira pela Nutrição e Direitos Humanos (ABRANDH), a Relatoria Nacional, em seu primeiro e segundo mandatos (de 2002 a 2006), teve um importante papel na negociação da criação de diferentes instrumentos de recurso e exigibilidade do DHAA junto ao CONSEA (Nacional e estaduais), ao Conselho de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (CDDPH) e ao Ministério Público. As ações da Relatoria não se propõem a resolver os problemas das populações, e nem poderiam fazer isto de forma isolada. Seu objetivo é fortalecer a exigência de um tratamento digno às demandas das populações pelo Estado e buscar garantir a possibilidade de que estas populações continuem a lutar pelos seus direitos no lugar onde elas têm vivido e se alimentado por anos, décadas e, às vezes, séculos. O impacto das iniciativas da Relatoria Nacional tem ido muito além do esperado. Na realidade, apesar dos limites físicos e financeiros que impedem um tratamento exaustivo dos

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temas abordados e do longo caminho ainda a percorrer, a Relatoria vem se mostrando uma importante catalisadora do processo de exigibilidade do DHAA no Brasil, tanto como mecanismo de exigibilidade política quanto como forte ator no processo de criação e fortalecimento de outros instrumentos de exigibilidade, como explicado acima. O trabalho das Relatorias será tanto mais eficaz quanto maior for a organização social em torno dos casos denunciados. Como replicar esta experiência em outros países Apesar da realidade institucional ser muito diferente em cada país, a replicação da experiência do Projeto Relatores ou de iniciativas similares, baseadas no mandato dos Relatores Especiais da ONU, é plenamente factível em qualquer nação onde haja uma mobilização significativa de movimentos sociais e de organizações da sociedade civil que atuam na área de Direitos Humanos, em especial, de DHESC. O apoio das Nações Unidas pode ser obtido mediante contatos com os Relatores Especiais da ONU e outros organismos de Direitos Humanos dessa organização. As Relatorias podem fortalecer a capacidade de monitoramento e investigação de violações de DHESC no contexto de cada país e podem ser um instrumento poderoso para catalizar todos os outros processos relacionados à promoção da exigibilidade dos Direitos Humanos.

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CAPÍTULO 3 Faça-o realidade: alguns desafios e os passos necessários para o fortalecimento da exigibilidade do DHAA

3.1. Alguns desafios para a realização efetiva do DHAA Em muitos países, diversos desafios e obstáculos para a realização efetiva dos Direitos Humanos estão relacionados à ausência de leis que garantam a promoção desses direitos. No entanto, o que se tem observado na prática é que, mesmo países como o Brasil que possuem consideráveis avanços normativos e institucionais para a promoção dos Direitos Humanos, continuam a enfrentar grandes desafios para a efetivação dos mesmos. Na realidade isso acontece porque, na prática, realizar Direitos Humanos vai além de reconhecê-los no discurso, ou mesmo no texto de leis e políticas. Fazê-lo implica que os Estados, por meio de ações concretas, cumpram as suas obrigações, elaborando, implementando e monitorando leis, programas e políticas públicas sob a perspectiva do DHAA, no contexto da indivisibilidade dos Direitos Humanos. Dependendo da realidade de cada país, os obstáculos e desafios para a realização efetiva dos Direitos Humanos são mais ou menos complexos quando comparados a outros países. Cada nação precisa definir quais são as circunstâncias favoráveis assim como os desafios e obstáculos a serem enfrentados para a promoção efetiva dos Direitos Humanos. A seguir apresentaremos alguns dos desafios e obstáculos para a realização e exigibilidade dos Direitos Humanos a partir da experiência brasileira. Alguns desses desafios estão relacionados aos titulares de direito e entidades da sociedade civil, outros aos portadores de obrigações. Existem ainda desafios relacionados à ausência e/ou ineficácia dos instrumentos e instituições de defesa e exigibilidade dos Direitos Humanos. Do ponto de vista dos titulares de direitos e entidades da sociedade civil os principais obstáculos e desafios para a promoção do DHAA são: • Grande parte das pessoas ainda não sabe que é titular de Direitos Humanos. Não sabe,

principalmente, que é titular de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, o que inclui o DHAA. Os poucos que conhecem seus Direitos Humanos nem sempre têm conhecimento sobre a sua exigibilidade, isto é, que os direitos devem ser exigidos quando não são garantidos e que há instituições nacionais e internacionais de proteção aos Direitos Humanos;

• As pessoas mais necessitadas, em muitos casos, não têm acesso a políticas e programas públicos, e/ou acesso à Justiça (por desconhecimento ou mesmo dificuldade de acesso). Outras vezes, mesmo tendo acesso, nem sempre recebem tratamento adequado por parte dos agentes públicos que, por sua vez, não vêem essas pessoas como titulares de direitos e a eles mesmos como portadores de obrigações que devem ser cumpridas, em nome do Estado, e os discriminam. Este fato reforça a descrença em relação aos órgãos públicos que têm a obrigação de realizar direitos e superar as violações aos mesmos.

• Em vários países os movimentos sociais e as organizações da sociedade civil estão apenas começando a entender a contribuição da abordagem dos Direitos Humanos para o fortalecimento das lutas populares; e

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• Finalmente, só muito recentemente as organizações de Direitos Humanos e os movimentos sociais começaram a incorporar em seu trabalho a dimensão dos Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais (DHESC). Anteriormente o trabalho era essencialmente focado nos Direitos Humanos Civis e Políticos (DHCP).

Por outro lado, muitos obstáculos podem ser identificados do lado das instituições e dos chamados portadores de obrigações: • Em muitos países, os servidores públicos e mesmo os gestores públicos não têm

informações sobre as suas obrigações, enquanto agentes do Estado, de respeitar, proteger, promover e prover a realização do DHAA e outros Direitos Humanos. Grande parte dos detentores de cargos públicos no Executivo, Legislativo e Judiciário ainda não conhecem e/ou não se apropriaram dos instrumentos internacionais e nacionais de Direitos Humanos;

• As instituições públicas, em muitos casos, não garantem condições (recursos humanos e financeiros, equipamentos, materiais, etc.) para que os agentes públicos cumpram as suas obrigações;

• Em muitos países ainda não existe uma estratégia política e articulada de Direitos Humanos e não foram criadas políticas de Segurança Alimentar e Nutricional embasadas nos compromissos internacionais e em legislações nacionais de promoção do DHAA. Isto faz com que coexistam ações públicas por vezes contraditórias, sendo umas favoráveis aos Direitos Humanos e outras lesivas aos mesmos;

• A maioria das leis e políticas públicas, mesmo quando trazem em seu texto menções aos Direitos Humanos e ao DHAA, não incorporam, de forma efetiva, dispositivos que garantam a realização prática e o cumprimento das obrigações de Direitos Humanos.

Desafios e obstáculos relacionados à ausência e/ou ineficácia dos instrumentos e instituições de defesa e exigibilidade dos Direitos Humanos: • Em muitos casos, verifica-se que as instituições de defesa e exigibilidade de direitos

existentes, cujas atribuições incluem o recebimento e investigação de denúncias de violações dos Direitos Humanos, ainda não atendem aos Princípios de Paris, ou seja, não contam com recursos humanos e financeiros, infra-estrutura, independência e autonomia necessários para dar respostas efetivas às violações de Direitos Humanos. Além disso, estas instituições apenas recentemente passaram a dedicar-se aos DHESC;

• Em diversas circunstâncias verifica-se que os Conselhos de Políticas Públicas também não estão preparados para lidar com os DHESC e com o processo de encaminhamento e monitoramento de denúncias de violação de Direitos Humanos;

• A falta de instrumentos efetivos de recurso em âmbito administrativo também pode ser apontada como uma barreira para a realização e exigibilidade do DHAA. As normas que instituem e regulamentam os programas e políticas públicas, na maioria dos casos, não estabelecem mecanismos claros e acessíveis de recurso administrativo em caso de violações de direitos;

• Em diversos países, membros do Poder Judiciário ainda não fazem uso de dispositivos de Direitos Humanos especialmente quando julgam casos relacionados aos DHESC. Existem muito poucos exemplos de decisões judiciais, no mundo, que levam em conta a legislação internacional de Direitos Humanos. Alguns avanços vêm sendo observados em países

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como a Índia32, a África do Sul e a Argentina. Mas a maioria dos países do mundo possui um Judiciário ainda conservador que não considera os Direitos Humanos Econômicos, Sociais e Culturais como passíveis de serem submetidos a julgamento em casos de violações;

• Muitos advogados não estão capacitados para trabalhar com a dimensão dos Direitos Humanos.

O que mais se observa é que para situações nas quais direitos são violados ou não implementados, existe uma verdadeira carência de mecanismos de reclamação e reparação de fato eficientes no âmbito administrativo e judicial. Assim, como defendido pelo Relator Especial da ONU para o Direito à Alimentação, Jean Ziegler, em sua missão ao Brasil em 2002, “mecanismos judiciais e administrativos mais eficientes de compensação e responsabilização devem ser instituídos”.33 O Brasil exemplifica claramente que combater a fome e promover os DHESC não é uma simples questão de fortalecimento da “vontade política” e da “alocação de recursos”. Mesmo quando um governo ou um presidente dizem ter feito a opção de mudar as prioridades, em muitos países uma enorme resistência é encontrada: 1) na máquina desses Estados, que em muitos casos funciona para consolidar e preservar a estrutura econômica e os privilégios existentes, e mesmo, 2) no imaginário social dos setores mais marginalizados das sociedades que continuam a eleger pessoas que defendem os interesses das elites, por exemplo. A “vontade política” por si só não é suficiente para superar as pressões advindas de interesses econômicos nacionais e internacionais. A disputa internacional entre a perspectiva dos direitos humanos e a liberalização do comércio nas políticas de desenvolvimento possui uma grande influência nas decisões políticas e ações dos governos de diferentes países. O fortalecimento da capacidade de exigir a realização de direitos pressupõe uma crescente mobilização e participação da sociedade civil, mudanças na correlação de forças em favor da redução das desigualdades, mudança nos processos e nas formas de fazer as coisas e, mais que tudo, na cultura institucional de cada Estado e de seus servidores e na própria cultura da população de cada país. Uma verdadeira revolução cultural é necessária dentro das sociedades e das máquinas dos Estados para que a perspectiva dos Direitos Humanos seja efetivamente considerada e para que mudanças efetivas e profundas possam vir a acontecer.

32 Na Índia, em resposta a uma petição apresentada pelo movimento social People’s Union for Civil Liberties e considerando a grave situação de fome e miséria vivida por grande parte da população do país, a Suprema Corte Indiana vem, desde abril de 2001, apresentando importantes “ordens interinas” direcionando o governo indiano a, por exemplo: (i) garantir alimentação escolar em todas as escolas públicas primárias do país; (ii) prover 35 kg de grãos por mês a preços altamente subsidiados para 15 milhões de famílias marginalizadas; (iii) dobrar a alocação de recursos para o maior programa de emprego rural, etc. Vale ressaltar ainda que a implementação das ordens judiciais pelo governo indiano vem sendo acompanhada por uma Campanha pelo Direito à Alimentação, definida como uma rede informal de organizações e indivíduos comprometidos com a realização do DHAA no país. Para maiores informações sobre a petição e sobre a Campanha pelo Direito à Alimentação, ver site: www.righttofoodindia.org (site em inglês). 33 ZIEGLER, J. Relatório do Relator Especial da ONU para o Direito à Alimentação, Missão Brasil, (Comissão de Direitos Humanos, 3 janeiro 2003), para. 57(c).

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Neste contexto, para enfrentar os complexos desafios e obstáculos apresentados acima, uma série de ações precisam ser implementadas, dentre elas: - O apoio ao processo de apoderamento dos titulares de direito; - A promoção da construção continuada de competência da máquina estatal e dos servidores públicos; - A necessidade de criação e consolidação de instrumentos efetivos de exigibilidade, além da necessidade de se avançar em direção à construção de instituições para a garantia da realização do DHAA; - Consolidação do processo de mobilização e participação da sociedade civil no processo de elaboração, implementação e monitoramento das políticas públicas. Existe uma grande necessidade de promover a exigibilidade dos Direitos Humanos como elemento fundamental para a construção de sociedades mais justas, includentes e igualitárias. 3.2. Os passos necessários para o fortalecimento da exigibilidade do DHAA Três passos são fundamentais para a construção e fortalecimento da exigibilidade de Direitos Humanos:

• As pessoas precisam saber que têm direito; • Os portadores de obrigações precisam saber que têm obrigações; • É preciso estabelecer rotinas e instrumentos públicos de recurso, com divulgação

ampla e fácil acesso.

3.2.1. As pessoas precisam saber que têm direito - apoderamento Para que a realização do DHAA e demais Direitos Humanos seja realmente efetiva é fundamental garantir que os seus titulares tenham acesso a informações acerca dos seus direitos, sobre os mecanismos de exigibilidade disponíveis e que se apoderem desses instrumentos para cobrar a realização destes direitos. Na última década, alguns organismos internacionais e organizações não-governamentais começaram a utilizar o termo “empowerment”, que foi posteriormente traduzido para o português como “empoderamento”. O termo “empoderar” é utilizado para definir o resultado do processo de repasse de informações, ferramentas e outros recursos para que a sociedade tenha acesso ao poder, seja ele político, econômico, social ou cultural. O conceito tradicional de empoderamento vai além da simples participação social. O empoderamento pressupõe uma participação crítica, informada e ativa que não pode ser confundida com a simples “presença” ao longo do processo de decisão. Inclui a possibilidade de compreensão a respeito da realidade do seu meio social, político, econômico, ecológico e cultural, refletindo sobre os fatores que dão forma ao seu meio ambiente bem como a tomada de iniciativas no sentido de que cada indivíduo ou grupo possa efetivamente melhorar sua própria situação34.

34 Empoderamento - participação, solidariedade e desenvolvimento. Rede EICOS - Estudos Interdisciplinares de Comunidades e Ecologia Social. Disponível em: http://www.eicos.psycho.ufrj.br/portugues/empoderamento/empoderamento.htm

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Segundo esta linha, empoderamento é um conceito sistêmico, que reconhece que, se há um maior poder na tomada de decisões e controle por parte daqueles que, antes, não possuíam qualquer poder, há uma necessária transformação no sistema. Um processo de empoderamento eficiente deve envolver tanto componentes individuais quanto também coletivos. No entanto, partindo de uma aplicação da abordagem de Direitos Humanos, que entende a questão do poder como parte de um processo de luta social, temos procurado adotar o termo “apoderamento” em vez de “empoderamento”. Apesar da importância e do grande avanço que o conceito de empoderamento carrega em si, acreditamos que o conceito de “apoderar-se”, no sentido de “apropriar-se” ou “conquistar”, vai além, já que ninguém pode dar ou transferir poder a outra pessoa. O poder, como direito, não é dado nem transferido, mas conquistado. Nesse sentido, a idéia que precisa estar presente em todo o processo de exigibilidade de direitos diz respeito à necessidade dos titulares de direitos apoderarem-se das conquistas populares institucionalizadas em tratados internacionais e nas constituições nacionais, pois esses tratados e normas, justamente por consagrarem direitos, impõem obrigações aos países para a garantia dos direitos neles consagrados. O apoderamento das normas, tratados, instrumentos e da linguagem de Direitos Humanos é fundamental para o fortalecimento da luta por direitos e contribui para a criação de atores sociais que podem intervir de forma mais veemente na vida política de seu país e que sejam sujeitos de direitos, donos de sua própria história. É importante também considerar que, ainda que uma parte dos grupos e populações cujos Direitos Humanos são violados esteja mobilizada e tenha algum grau de organização para exigir os seus direitos, parte dessas populações enfrenta enormes dificuldades até mesmo para ter condições mínimas de sobrevivência, dificultando as possibilidades reais e concretas de envolver-se em um processo organizativo, com força suficiente para mudar suas realidades. Certos grupos, principalmente comunidades empobrecidas, que não têm acesso a direitos mínimos necessários para sobrevivência, como alimento, moradia, saúde, educação, entre outros, nem sempre estão mobilizados e, em muitos países, a situação de pobreza em que vivem é naturalizada. Na prática, o processo de mobilização de comunidades em situação de pobreza para ações de apoderamento, informação e exigibilidade não é um processo simples, pois apesar de expressarem, em muitos casos, o senso de estarem sendo injustiçados, muitos não vêem a situação de miséria como um conflito que exige enfrentamento, e que pode ser superado com a garantia de direitos e cumprimento de obrigações por parte das autoridades públicas. Este sentimento é reforçado pelo processo de exclusão a que são submetidas essas populações e reforçado, muitas vezes, por experiências prévias mal-sucedidas dessas populações com o poder público, que em alguns casos chega até a criminalizar a pobreza. A “naturalização da pobreza” e a tentativa de responsabilizar as comunidades e pessoas empobrecidas pelas violações de direitos a que são submetidas são fenômenos que podem ser observados, por exemplo, no Brasil como mecanismos ideológicos de manutenção da

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exclusão e da exploração. Culpar os pobres por sua situação é uma forma de “desresponsabilizar” o poder público, as elites sociais e econômicas e o processo histórico por essa situação de exclusão. Esta maneira de ver o mundo, portanto, constitui-se em forte obstáculo à apropriação dos instrumentos existentes. De certa forma, além de abrir espaço para “justificar” o não cumprimento das obrigações por parte do poder público, desresponsabilizando-o, paralisa essas comunidades, individualiza os problemas e as responsabilidades, limitando sua capacidade de cobrar o comprometimento das autoridades responsáveis em cumprir com suas obrigações. Ao mesmo tempo, pode levar a uma redução da pressão da sociedade como um todo, que pode deixar de se sentir responsável pela superação desta situação. Dependendo do contexto de cada país, o que se pode observar é que, em muitos casos, a formação dos titulares de direitos por si só pode não ser suficiente para garantir que interiorizem sua condição de sujeito de direitos, especialmente se, naquele país, os instrumentos e mecanismos de exigibilidade não estiverem disponíveis e funcionando de forma eficaz. Assim, parceiros da sociedade civil são fundamentais para catalisar essa força e colaborar para a sustentabilidade do processo de apoderamento e conquista de direitos. É fundamental que os que têm seu direito violado possam ser apoiados em ações de exigibilidade por entidades ou instituições parceiras de diferentes tipos: movimentos sociais, ONGs, organismos públicos, universidades, Ministério Público, Defensoria Pública, entre outros, em ações de exigibilidade de direitos. Na prática e em muitos países, estas parcerias têm sido de vital importância para as comunidades, indivíduos ou grupos vítimas de violações dos DHESC, inclusive do DHAA. Exemplos de facilitação da apropriação de instrumentos por parte de titulares de direitos No Brasil, um exemplo bem sucedido de apropriação de instrumentos de exigibilidade por parte de titulares de direito foi o trabalho desenvolvido pela Ação Brasileira pela Nutrição e Direitos Humanos (ABRANDH) com comunidades urbanas marginalizadas e em situação de vulnerabilidade, que sofrem graves violações ao DHAA, para que estas se apoderassem dos princípios e normas de Direitos Humanos e pudessem fortalecer sua capacidade de exigi-los junto ao poderes públicos locais35. Esse trabalho foi desenvolvido entre outubro de 2004 e dezembro de 2006 por meio da implementação de projetos-piloto. Esses projetos, por serem iniciativas piloto, foram realizados em apenas duas comunidades, selecionadas através de consulta aos movimentos sociais. Um dos pilotos foi desenvolvido em Maceió, capital do Estado de Alagoas em uma comunidade com aproximadamente 450 famílias chamada Sururu de Capote, e o outro em Teresina, no Piauí, na Vila Santo Afonso com cerca de 250 famílias.

35 Para maiores informações sobre o trabalho realizado no âmbito dos projetos-piloto, leia também o documento Peraí, é nosso direito! Promovendo a realização do Direito Humano à Alimentação Adequada em comunidades urbanas vulnerabilizadas. O documento foi elaborado por Valéria Burity e Elisabetta Recine em Dezembro de 2007. ABRANDH - FAO. Disponível em: http://www.abrandh.org.br/downloads/pilotos2007.pdf

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A metodologia utilizada nos pilotos foi sendo aperfeiçoada na medida de sua própria implementação e sempre com a participação ativa e informada da comunidade e de outros parceiros. Embora a luta por Direitos Humanos não possa ser efetuada através de um caminho lógico, previamente traçado, a experiência dos pilotos revelou que alguns passos são fundamentais para a exigibilidade e apoderamento dos titulares de direitos, dentre eles:

a) Levantamento prévio das violações; b) Estabelecimento de um plano de trabalho de acordo com as prioridades da

comunidade; c) Ações de negociação ou exigibilidade de direitos; d) Monitoramento contínuo das ações de exigibilidade.

a) Levantamento prévio das violações O levantamento das violações nas duas comunidades foi realizado através de pesquisas que foram desenvolvidas em duas etapas: um inquérito alimentar e nutricional36 e uma pesquisa sobre a situação econômica e social da comunidade37. Este diagnóstico socioeconômico e nutricional realizado em articulação com diferentes parceiros em cada localidade (universidade, movimentos sociais, poder público municipal, etc.) possibilitou a documentação dos problemas das comunidades, dando base para analisar, progressivamente, os resultados obtidos com o trabalho piloto. A apropriação dos resultados do diagnóstico pelas comunidades foi fundamental para que eles tivessem uma nova leitura sobre suas vidas e para a elaboração de novas estratégias de luta e de exigibilidade de direitos. b) Prioridades - Plano de trabalho e indicadores Com apoio da ABRANDH lideranças das comunidades elaboraram um plano de ação para exigir os seus direitos, estabelecendo demandas prioritárias e metas para alcance de suas reivindicações. Esta etapa se constituiu em uma valiosa ferramenta para a exigibilidade de direitos.

Após a definição das demandas e metas, foram estabelecidos prazos, estratégias e metas intermediárias para o alcance das mesmas. Foram também identificadas as expectativas das comunidades em relação aos resultados e melhorias que poderiam ser desfrutados através do alcance das mesmas. Este planejamento, realizado a partir das demandas prioritárias das comunidades, é fundamental para a definição dos caminhos a serem seguidos, para a avaliação se as estratégias e ações públicas funcionam ou não e para a definição de ações de exigibilidade.

c) Negociações - Exigibilidade de direitos 36 O inquérito alimentar e nutricional incluiu a realização de exames antropométricos e de sangue para o diagnóstico da anemia ferropriva e questionário para medição do estado de (in)segurança alimentar e nutricional, aplicado para um determinado número de famílias. A pesquisa foi feita por meio de amostragem da população usando-se o cadastro do Programa Saúde da Família para a seleção da amostra. 37 O estudo sobre a situação social e econômica e sobre a violação de Direitos Humanos foi realizado através da aplicação de questionário para um determinado número de famílias. Esse questionário além de trazer questões sobre o perfil e condições de vida, incluiu perguntas sobre o conhecimento acerca de direitos e da capacidade de exigibilidade da comunidade.

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Todas as demandas acordadas pela comunidade foram apresentadas aos órgãos públicos através de três instrumentos: direito de petição, reuniões e audiências públicas. Além de serem apresentadas aos poderes públicos, estas demandas foram também monitoradas. d) Monitoramento Uma vez que as demandas das comunidades foram apresentadas aos órgãos públicos, com apoio da ABRANDH, houve acompanhamento das ações efetuadas por esses órgãos para garantir as reivindicações da comunidade. A partir de reuniões com as comunidades era avaliada a eficácia e a adequação dessas ações. Nos casos onde eram detectadas omissões ou ações que não atendiam às metas e exigências comunitárias, novas negociações e exigências eram efetuadas perante os poderes públicos. Cumpre ressaltar que apesar dos passos estarem descritos nesta ordem, em diversos momentos eles foram realizados concomitantemente. Logo no início do projeto, por exemplo, foram reivindicadas ações para garantir moradia para as famílias cujas casas estavam ameaçadas de desabamento em razão das chuvas, exigência que ocorreu independente da existência de pesquisa ou de um plano de ação. A realização de oficinas de capacitação continuada em DHAA foi identificada como estratégia permanente e fundamental para todas as etapas do projeto. Nestas oficinas eram discutidos conceitos como dignidade humana, Direitos Humanos e sua indivisibilidade, apoderamento, responsabilização dos gestores e funcionários públicos, monitoramento e exigibilidade.

Todos os passos do projeto contaram com o apoio de diversos parceiros e tiveram como base e vetor ações de apoderamento da linguagem dos Direitos Humanos e dos instrumentos de exigibilidade, mobilização e participação ativa e informada das comunidades. Assim, tanto a pesquisa como o plano de ação e as atividades de exigibilidade e de monitoramento foram realizadas com a participação das lideranças comunitárias, através da mobilização da comunidade e de outros parceiros. Nesse processo a troca de (in)formação e o apoderamento de todos os envolvidos foram fundamentais para as relevantes conquistas alcançadas. Principais conquistas alcançadas através dos projetos-piloto Os projetos-piloto foram experiências que demonstraram que para a realização dos Direitos Humanos pelo poder público é preciso, dentre outros fatores, que esse seja constrangido a agir conforme dispõem as normas nacionais e internacionais. Através dessa luta, as duas comunidades conseguiram algumas vitórias:

• Fortalecimento do processo de apoderamento das lideranças comunitárias.

As lideranças reconhecem que, com o trabalho, houve uma mudança na sua visão de mundo. Sabem que têm Direito Humano à Alimentação Adequada, à Moradia e à Saúde, entre outros. Que políticas e ações públicas não são favores. Reconhecem que os agentes públicos dispensam um novo tratamento para elas e esse reconhecimento evidencia como a luta por Direitos Humanos pode mudar culturas assistencialistas e paternalistas.

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• Visibilidade das ações e omissões que violam seus direitos. A documentação de violações, a articulação das lideranças das comunidades com outros atores sociais, as reuniões e audiências públicas foram fundamentais para dar visibilidade à situação de violação de direitos. Essa visibilidade colaborou para que ações públicas fossem destinadas às duas comunidades.

• Uso de instrumentos públicos para exigir direitos. Como explicado no capítulo 2, o Ministério Público de Alagoas entrou com uma Ação Civil Pública para exigir os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da comunidade Sururu de Capote. O Ministério Público Federal do Piauí também instaurou processos administrativos para acompanhar as denúncias apresentadas pela Vila Santo Afonso. No Piauí e em Alagoas o uso do direito de petição e de audiências públicas foi fundamental para exigir as metas das comunidades.

• Inclusão em políticas e programas públicos. No Piauí, por exemplo, foram construídas, através de um projeto da Secretaria de Desenvolvimento Urbano, casas de alvenaria na Vila Santo Afonso e toda comunidade passou a fazer parte do Programa de Aquisição de Alimentos. Em Sururu de Capote, Alagoas, todas as crianças que estavam fora da escola conseguiram ser matriculadas em instituições de ensino público.

• Construção de competências As ações dos pilotos contribuíram para iniciar um processo de construção de competências de gestores, funcionários públicos e membros de Conselhos de Políticas Públicas que foi fundamental para a realização de direitos nos dois estados. Como replicar esta experiência em outros países Não há nada desta experiência que não possa ser aplicada em outros países. Os parceiros e as instituições a serem envolvidos vão variar de país para país, ou mesmo de comunidade para comunidade, mas os passos adotados nas comunidades brasileiras podem ser adequados aos mais diferentes contextos políticos, sociais e culturais. A luta pela promoção dos DHESC é geralmente mais difícil em países onde o setor público não está bem estruturado ou onde a participação direta da sociedade nas questões públicas ainda encontra resistências por parte do poder instituído. Mas mesmo nestas situações, um trabalho de apoderamento comunitário, desenvolvido a partir do reconhecimento das obrigações do Estado de realizar os Direitos Humanos pode ser um instrumento importante não só para a melhoria das condições de vida da população, como do funcionamento do setor público, da utilização dos recursos públicos e do funcionamento da sociedade como um todo. 3.2.2. Os portadores de obrigações precisam saber que têm obrigações - Construção de competências para a realização efetiva do DHAA

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Em muitos países a responsabilização pela violação de direitos é certamente um enorme desafio. A falta de termos de referências com definição de obrigações claras e bem definidas em relação à realização dos Direitos Humanos, os casos de corrupção no Legislativo, Executivo e Judiciário e o clima de impunidade são ainda uma forte realidade que certamente constitui-se em um grande obstáculo para a realização do DHAA em diversas localidades. No entanto, para superar estes obstáculos, alguns passos são fundamentais para que os Estados realizem de fato as suas obrigações e para a construção de competências em DHAA:

a) Os Estados devem assumir, de fato, os compromissos para a realização dos Direitos Humanos.

b) Os Estados devem estabelecer e divulgar termos de referência com definição clara das atribuições e obrigações para a realização dos Direitos Humanos.

c) Devem ser divulgadas informações para os titulares sobre seus direitos e para os agentes públicos sobre as suas obrigações em relação aos Direitos Humanos.

d) Devem ser criadas condições para que os agentes públicos cumpram suas obrigações. e) Deve haver mecanismos para que os agentes públicos cumpram suas obrigações e

sejam responsabilizados por violações do DHAA. a) Os Estados devem, na prática, assumir suas obrigações de respeitar, proteger, promover e prover o DHAA. Na realidade para que os Estados assumam, de fato, suas obrigações, uma série de mudanças práticas deve ocorrer. A seguir estão listados, de modo geral, alguns exemplos que podem demonstrar se um determinado Estado está de fato assumindo suas obrigações relativas aos Direitos Humanos:

• Adotar, sempre, políticas econômicas, fiscais, ambientais ou de qualquer outra natureza, que sejam coerentes com os Direitos Humanos e não adotar quaisquer ações que possam violá-los.

• Fazer com que a estrutura da máquina do Estado funcione para todos, com prioridade para os mais marginalizados, deixando de privilegiar os detentores do poder econômico. E para isto é fundamental que recursos sejam alocados de forma a reverter as desigualdades e para fortalecer os programas públicos de forma eqüitativa.

• Considerar as especificidades de cada contexto e ouvir as vítimas de violações de DHAA através de canais de participação social legítimos, ativos e eficazes.

• Garantir a alocação de recursos adequados para políticas que garantam a promoção, o respeito, a proteção e o provimento do DHAA, bem como a boa execução dos mesmos.

• Estabelecer parcerias com a sociedade. Assim o Estado conseguirá definir prioridades com mais clareza e poderá somar esforços com iniciativas de caráter não governamental, otimizando a alocação de recursos.

• Garantir, em todas as esferas de governo, instrumentos de exigibilidade de direitos, bem como formas de correção de políticas e ações públicas. Para tanto, cada Estado precisa realizar um diagnóstico das políticas públicas e incorporar a elas rotinas e procedimentos para a exigibilidade dos Direitos Humanos.

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• Garantir que as atividades dos Conselhos de Direitos Humanos, assim como de outras instituições responsáveis pela captação e investigação de denúncias de Direitos Humanos, sejam independente do governo, mesmo que sejam financiadas pelo poder público.

b) Estabelecimento e divulgação de termos de referência com definição clara de atribuições e obrigações. Um dos passos fundamentais para a construção de competências em DHAA está relacionado ao estabelecimento e divulgação de termos de referência, rotinas e procedimentos claros, nos quais as tarefas e responsabilidades dos servidores públicos sejam facilmente entendidas. As atribuições e obrigações das instituições governamentais e dos servidores públicos precisam ser sempre bem definidas, de forma acessível à população. Nesse sentido, as instituições devem definir, de forma precisa, as obrigações dos seus servidores e gestores públicos. Esses termos devem estar acessíveis a todos e fixados nas instituições e nos locais onde trabalham ou atuam os agentes públicos.

c) Divulgação de informações para os titulares sobre seus direitos e para os agentes públicos sobre suas obrigações em relação aos Direitos Humanos. Estratégias e campanhas de educação e informação podem chamar a atenção pública para o problema da alimentação inadequada e da fome enquanto violação do DHAA. Podem também reforçar a necessidade de efetiva ação governamental no sentido de cumprir com suas obrigações de respeitar, proteger, promover e prover o DHAA. No entanto, as estratégias de educação, informação e capacitação para os titulares de direito sobre o DHAA não podem estar dissociadas de outras atividades de promoção da exigibilidade desses direitos. Informar ou “educar” o titular sobre seus direitos perde o sentido se o titular não adquire também a capacidade de exigi-los junto ao poder público, se não há os instrumentos necessários para fazê-lo ou se as violações não são adequadamente reparadas. Nesta perspectiva, muitas vezes, o processo de educação, informação e capacitação tem que estar associado ao desenvolvimento de ações de incidência sobre o poder público no sentido da construção dessas condições. A garantia da realização do DHAA, e dos Direitos Humanos de uma forma geral, implica em mudanças de paradigma que influenciam todo o processo de ação pública. Essa mudança de padrão é complexa e requer uma série de transformações que exige o fortalecimento dos processos e lutas sociais e a construção de novas relações de poder. No entanto, essas mudanças têm que ser consolidadas e complementadas com o acesso à informação e o compartilhamento de experiências. Nesse contexto, os cursos de formação de DHAA são fundamentais:

• Formação e capacitação em DHAA

Em relação ao Direito Humano à Alimentação Adequada, a necessidade de formação, no contexto da indivisibilidade dos Direitos Humanos, é uma estratégia essencial para o apoderamento dos titulares de direitos e para a construção de competências.

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• Dos gestores públicos: a sua capacitação/formação em DHAA deve ter como objetivo fortalecer, dentre outros elementos, a concepção de que a realização de suas atribuições, a implementação de políticas públicas e a melhoria da condição de vida de comunidades excluídas são direitos a serem garantidos por meio do cumprimento de suas obrigações de agentes públicos. Essas capacitações devem também tratar das possíveis sanções que lhes caberia pelo não cumprimento de suas obrigações.

• De membros de Conselhos de Políticas Públicas para que estes possam:

a) Exigir a incorporação da dimensão de obrigações públicas nas rotinas e procedimentos dos conselhos; b) Usar os instrumentos de exigibilidade existentes e lutar pela instituição de novos instrumentos de recurso, seja em âmbito administrativo, como quase-judicial e judicial. c) Propor a criação, modificação e extinção de políticas públicas quando for o caso, para que as ações públicas sejam mais compatíveis com a promoção de direitos.

• De membros de Conselhos de Direitos Humanos para que estes possam:

a) Aprofundar o conhecimento sobre as dimensões e princípios fundamentais dos Direitos Humanos no processo de recebimento de denúncias de violações e encaminhamento das denúncias. b) Entender seu papel no processo de documentação e investigação de violações, identificação de responsáveis, proposição, encaminhamento e monitoramento de reparações de violações comprovadas de Direitos Humanos. Além disso, as capacitações em Direitos Humanos têm também o papel fundamental de reforçar a importância da articulação dos Conselhos de Direitos Humanos com os Conselhos de Políticas Públicas para a proposição de ações, políticas e programas públicos para que o DHAA deixe de ser violado. c) Lutar para que os conselhos funcionem conforme as normas e documentos de Direitos Humanos, e, principalmente, segundo os Princípios de Paris.

• Dos agentes de direito, inclusive de representantes do MP, para que eles possam

exercer o seu relevante papel em relação à proteção e promoção dos Direitos Humanos. d) Devem ser criadas condições para que os agentes públicos cumpram suas obrigações Ressalta-se que o protagonismo dos agentes públicos é promovido através do envolvimento dos portadores de obrigação (dos servidores públicos) no processo de tomada de decisões, inclusive na definição de como suas tarefas devem ser assumidas e cumpridas. Em alguns casos, a não realização das obrigações pode ocorrer pela incapacidade para fazê-lo, e não devido a uma falta de vontade em realizar esses direitos. Nesse sentido, uma investigação das razões pelas quais os portadores de obrigações não as estão realizando torna-se importante. Na avaliação das capacidades dos servidores públicos para o cumprimento de suas obrigações relativas aos Direitos Humanos, devem ser considerados os seguintes elementos:

a. Motivação para implementar medidas e aceitação da obrigação de fazê-las; b. Autonomia para tomar decisões; c. Acesso e controle a recursos econômicos (equipamento, material, etc.), humanos

(pessoal capacitado e qualificado) e organizacionais (programas contínuos de treinamento, etc.);

d. Capacidade de comunicação para o estabelecimento de parcerias, quando necessário; e

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e. Capacidade para tomar decisões racionais e aprender com as experiências (monitoramento e avaliação das práticas, políticas e programas).

Um agente de saúde, por exemplo, não pode cumprir seu papel se não tiver acesso a alguns recursos. Não é possível monitorar o crescimento e o desenvolvimento de crianças, caso não disponha de balanças em bom funcionamento ou da caderneta da criança para as anotações do peso e outros dados de saúde. e) Mecanismos para que os agentes públicos cumpram suas obrigações e sejam responsabilizados por violações ao DHAA Uma abordagem dos Direitos Humanos requer que todos aqueles que têm a obrigação de propor estratégias e assegurar direitos sejam responsabilizados por suas ações e omissões que caracterizem violações de Direitos Humanos. A necessidade de implementação efetiva de mecanismos específicos para responsabilizar os portadores de obrigações, em caso de violações de Direitos Humanos, é fundamental. Se não forem estabelecidos mecanismos específicos para responsabilizar as autoridades competentes e servidores públicos, em casos exemplares, é improvável que algo venha a ser feito a respeito das irregularidades e violações ainda existentes na maioria dos países do mundo. Todos os servidores públicos devem ser informados que caso não cumpram suas obrigações, poderão ter sua ação ou falta de ação identificada como uma violação do DHAA junto às instituições de proteção dos Direitos Humanos, tais como o Ministério Público e Conselhos e Comissões Nacionais de Direitos Humanos. Além disso, para a responsabilização dos portadores de obrigação é fundamental que os titulares de direitos estejam apoderados para exigir seus direitos e assim pressionar os que devem realizá-los. Neste sentido, é importante criar estruturas e mecanismos específicos nas instituições públicas para acolhimento de denúncias de violações aos Direitos Humanos e responsabilização dos atores responsáveis por essas violações. É importante que estruturas dessa natureza estejam especialmente preparadas para acolher as demandas de comunidades tradicionais, pessoas vulnerabilizadas e portadoras de necessidades alimentares especiais (gestantes, idosos, adolescentes, portadores do HIV, celíacos, diabéticos, entre outros) buscando facilitar-lhes a exigência de seus direitos. Garantir a responsabilização de agentes e instituições públicas significa encontrar formas de assegurar que eles irão fazer o que devem fazer, cumprindo suas obrigações. 3.2.3. Necessidade de estabelecimento de rotinas e instrumentos de exigibilidade Além do apoderamento dos titulares de direito e da construção de competência continuada dos portadores de obrigações, os Estados precisam também garantir o estabelecimento e divulgação de rotinas e instrumentos públicos de exigibilidade que sejam facilmente utilizáveis e que estejam o mais próximo possível da população, especialmente de comunidades marginalizadas.

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Os instrumentos de exigibilidade, quando apoderados pelos titulares de direitos e bem utilizados, podem ser potentes instrumentos para a superação dos quadros de violações do DHAA de indivíduos, comunidades e grupos sociais afetados pela alimentação inadequada e também pela fome e pela pobreza. Eles podem ser instrumentos: • De fortalecimento das ações de reivindicação, mobilização e luta da população; • Concretos para que a sociedade e os Conselhos de Políticas Públicas e de Direitos

Humanos monitorem as obrigações dos agentes públicos em diferentes instâncias e níveis (Judiciário, Executivo, Legislativo, em âmbito local, estadual e federal), responsabilizando-os quando identificadas ações e/ou omissões que resultem em violações de direitos.

Um exemplo de construção de rotinas e procedimentos de exigibilidade: Em 2005, a ABRANDH desenvolveu um trabalho com técnicos do Programa Nacional de Alimentação Escolar - PNAE no sentido da construção de propostas de rotinas de implementação e monitoramento do programa que incorporassem a promoção do DHAA de forma efetiva em todas as fases de operacionalização do programa. O trabalho teve as seguintes etapas: • Análise de toda a legislação que regulamenta a implementação do programa, desde as

provisões constitucionais até as normas de operacionalização do programa, incluindo também uma avaliação do marco legal internacional de DH, em especial o DHAA.

• Identificação das instituições e gestores públicos responsáveis pelas obrigações relativas à garantia destas diferentes dimensões do DHAA (ver anexo II - Direitos, Obrigações e Responsabilidades no âmbito do PNAE).

• Análise do processo de operacionalização do PNAE, com a identificação das diferentes dimensões do DHAA da criança na idade escolar, levando ao estabelecimento de 16 dimensões deste direito (ver anexo III - 16 dimensões do Direito Humano à Alimentação Escolar).

• Estabelecimento de rotinas e procedimentos de recepção, análise e resposta a denúncias apresentadas por escolares, pais ou outras pessoas que identificam possíveis violações a alguma das dimensões do DHAA (ver anexo IV - Rotinas e procedimentos de recepção, análise e resposta a denúncias).

Um exemplo de como o uso deste procedimento de exigibilidade, caso implantado, poderia colaborar para a superação das violações e melhoria do funcionamento do programa:

Em uma escola no interior do Estado do Maranhão, os pais de João, estudante da 2ª série primária, têm conhecimento que os alimentos da escola de seu filho estão sendo preparados sem proteção contra insetos e roedores. Ratos foram vistos no local de preparação das refeições.

Tendo conhecimento das 16 dimensões do Direito Humano à Alimentação Escolar, através de um cartaz fixado no mural da escola, os pais de João sabem que, pelo menos uma das dimensões do Direito Humano à Alimentação Escolar das crianças da escola está sendo violada: “Que os alimentos sejam preparados em condições adequadas de higiene, protegidos contra insetos, roedores e outros contaminantes, preservando a qualidade dos alimentos”.

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Os pais de João também sabem, pela informação contida no cartaz, e por informações obtidas em folheto sobre o programa, que eles podem:

1) apresentar reclamação junto à secretaria da escola, que deveria encaminhar uma solução para o problema dentro de prazo razoável;

2) caso a direção da escola não resolva o problema, a família pode apresentar queixa ao Conselho de Alimentação Escolar (CAE) e à Secretaria Municipal de Educação; e

3) finalmente, caso não haja resposta nem do CAE nem da Secretaria de Educação, uma reclamação pode ser encaminhada ao Ministério Público Estadual e ao FNDE.

Para dar seqüência ao trabalho elaborado no âmbito do PNAE, a gerência nacional do programa comprometeu-se a estudar a possibilidade de adaptar estes materiais e com base nos mesmos, elaborar materiais de informação e capacitação para aplicação em alguns municípios-piloto. Esse material é ainda um exemplo de como a realização do DHAA pode ser garantida e protegida por meio do apoderamento dos titulares de direitos e criação de competências em DHAA aos portadores de obrigações. Caso venha a ser implementado se constituirá em uma primeira tentativa de se colocar em prática, no Brasil, a implementação de um programa público dentro da perspectiva da exigibilidade do DHAA. O resultado desse trabalho foi também incorporado nas recomendações ao PNAE elaboradas pela Comissão Permanente de Direito Humano à Alimentação Adequada do CONSEA, quando da análise do PNAE sob a perspectiva do DHAA. O ideal é que todos os programas e políticas públicas relacionados à SAN e ao DHAA cheguem a um grau de detalhamento semelhante, ou seja, que haja elaboração de rotinas e procedimentos de implementação e exigibilidade do DHAA. O objetivo desse tipo de análise é criar instrumentos acessíveis de exigibilidade para que as ações e serviços providos pelos programas e políticas passem a ser de fato entendidos como Direitos Humanos passíveis de serem exigidos.

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CAPÍTULO 4 Conclusões Gerais Os processos de exigibilidade não possuem uma receita padronizada. Reforça-se aqui a idéia de que cada país, região e comunidade, devem buscar definir, de acordo com seus potenciais e sua realidade, os caminhos mais eficazes para a exigibilidade de direitos. O contexto próprio em que estão inseridos essas comunidades e países deve ser respeitado quando se busca a garantia de direitos. É essa possibilidade de adaptação a cada realidade que vai garantir ações realmente participativas e inclusivas nas lutas locais pelos Direitos Humanos. Apesar de vários caminhos serem possíveis e complementares, algumas estratégias são comuns ao processo de exigibilidade, tais como a necessidade de se garantir:

• Os Estados devem assumir, na prática, suas obrigações de respeitar, proteger, promover e prover o DHAA. A construção de competências continuadas no âmbito do setor público para a promoção efetiva do DHAA.

• O apoderamento dos titulares de direitos, comunidades excluídas, movimentos sociais e entidades da sociedade civil.

• O estabelecimento público pactuado e transparente de metas, prazos, indicadores e alocação de recursos suficientes a serem aplicados.

• O diálogo e estabelecimento de estratégias junto aos poderes locais. • O fortalecimento de Conselhos e demais instrumentos e instâncias de exigibilidade. • A criação de Comissões Nacionais de Direitos Humanos em países aonde as mesmas

ainda não foram criadas, bem como o seu fortalecimento e funcionamento de forma independente e autônoma do poder governamental, conforme estabelecidos pelos Princípios de Paris.

• O estabelecimento de rotinas e procedimentos de exigibilidade no âmbito dos programas e políticas públicas.

• A responsabilização e prestação de contas.

Além disso, a mobilização social é um mecanismo imprescindível para a luta por direitos. O compromisso dos movimentos sociais é importante, pois, quando os instrumentos de exigibilidade do próprio Estado não funcionam cabe a sociedade se mobilizar para exigir os seus direitos. A exigência de direitos deve se dar nas duas vias: através do uso de instrumentos do próprio Estado (leis, órgãos de defesas de direitos, etc.) e através da mobilização e ação direta da sociedade civil. Sem uma dessas pernas a luta por direitos fica mais fraca e caminha mais devagar. É preciso que a prática de exigir e respeitar os Direitos Humanos se torne um hábito arraigado em nossas sociedades. Vale ressaltar que a promoção dos direitos só se dará através de uma mudança efetiva de cultura e através da pressão política exercida pelos movimentos populares organizados e pelas instituições da sociedade civil. Como diz Maria Victoria Benevides38: “A expansão da cidadania social implica, além de uma ação efetiva dos poderes públicos e da pressão popular, num tipo de mudança cultural, no sentido de mexer com o que está mais enraizado nas mentalidades marcadas por preconceitos, por discriminação, pela não aceitação dos direitos de todos, pela não aceitação da diferença. 38 Benevides, Maria Victoria. A questão social no Brasil - os direitos econômicos e sociais como direitos fundamentais. Disponível em: http://www.hottopos.com/vdletras3/vitoria.htm

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Trata-se, portanto, de uma mudança cultural especialmente importante no Brasil, pois implica a derrocada de valores e costumes arraigados entre nós, decorrentes de vários fatores historicamente definidos: nosso longo período de escravidão, que significou exatamente a violação de todos os princípios de respeito à dignidade da pessoa humana, a começar pelo direito à vida; nossa política oligárquica e patrimonial; nosso sistema de ensino autoritário, elitista, e com uma preocupação muito mais voltada para a moral privada do que para a ética pública; nossa complacência com a corrupção, dos governantes e das elites, assim como em relação aos privilégios concedidos aos cidadãos ditos de primeira classe ou acima de qualquer suspeita; nosso descaso com a violência, quando ela é exercida exclusivamente contra os pobres e os socialmente discriminados; nossas práticas religiosas essencialmente ligadas ao valor da caridade em detrimento do valor da justiça; nosso sistema familiar patriarcal e machista; nossa sociedade racista e preconceituosa contra todos os considerados diferentes; nosso desinteresse pela participação cidadã e pelo associativismo solidário; nosso individualismo consumista, decorrente de uma falsa idéia de “modernidade”. A mudança cultural necessária deve levar ao enfrentamento desta herança histórica tão pesada, que se traduz na dia-a-dia de muitos países do mundo. Somente assim poderemos de fato garantir um futuro mais justo para centenas de milhões de pessoas em todo o mundo que ainda enfrentam diária e brutalmente violações de todos seus direitos e de sua dignidade humana.

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Bibliografia

Documentos, Artigos e Livros

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ANEXO I

METODOLOGIA PARA ANÁLISE DE PROGRAMAS E POLÍTICAS PÚBLICAS NA PERSPECTIVA DO DHAA

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Proposta Metodológica para Análise de Programas sob uma Perspectiva dos Direitos Humanos39

CONSEA - Comissão Permanente de Direito Humano à Alimentação Adequada PARTE I - O DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO ADEQUADA, OBRIGAÇÕES E VIOLAÇÕES

• De acordo com as Diretrizes Voluntárias em apoio à realização progressiva do direito à alimentação adequada no contexto da segurança alimentar nacional40 e com base no Comentário Geral 12 do Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU, o Direito Humano à Alimentação Adequada (DHAA) realiza-se quando cada homem, mulher e criança, sozinho ou em companhia de outros, tem acesso físico e econômico, ininterruptamente, à alimentação adequada ou aos meios para sua obtenção. O DHAA não deverá ser interpretado em um sentido estrito ou restritivo, que o equaciona em termos de um pacote mínimo de calorias, proteínas e outros nutrientes específicos.

• O DHAA é indivisivelmente ligado à dignidade inerente à pessoa humana e é indispensável para a realização de outros direitos humanos. Ele é também inseparável da justiça social, requerendo a adoção de políticas econômicas, ambientais e sociais, tanto no âmbito nacional como internacional, orientadas para a erradicação da pobreza e a realização de todos os direitos humanos para todos.

• Existem duas dimensões indivisíveis do DHAA: o direito de estar livre da fome e da má nutrição e o direito à alimentação adequada.

• O conceito de adequação é particularmente significativo com relação ao direito à alimentação, na medida em que ele serve para salientar vários fatores que devem ser tomados em consideração para determinar se os alimentos ou dietas específicas que estão disponíveis podem ser considerados os mais apropriados.

• O Direito Humano à Alimentação Adequada abrange a disponibilidade do alimento, em quantidade e qualidade suficiente para satisfazer as necessidades dietéticas das pessoas, livre de substâncias adversas e aceitável para uma dada cultura, bem como a acessibilidade econômica e física ao alimento de forma sustentável e que não interfira com a fruição de outros direitos humanos.

• A todo DH correspondem obrigações do Estado e responsabilidades de diferentes atores sociais (indivíduos, famílias, comunidades locais, organizações não-governamentais, organizações da sociedade civil bem como as do setor empresarial) em relação à realização dos mesmos.

• O Estado brasileiro, como a maioria dos países do mundo que assinaram e ratificaram os Pactos Internacionais de DH, é obrigado a respeitar, proteger, promover/facilitar e prover o Direito Humano à Alimentação Adequada41.

o Respeitar – A obrigação de respeitar o acesso existente à alimentação adequada requer que os Estados não tomem quaisquer medidas que resultem no bloqueio

39 A presente proposta metodológica foi elaborada pela equipe da ABRANDH - Ação Brasileira pela Nutrição e Direitos Humanos a pedido da Comissão Permanente de DHAA do CONSEA. 40 As Diretrizes Voluntárias Internacionais foram aprovadas pelo Conselho da FAO em novembro de 2004. 41 A obrigação do Estado brasileiro de respeitar, proteger, promover e prover o DHAA, em articulação com os outros direitos humanos, foi incorporada à legislação nacional quando da ratificação do Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, em 1992, sob a forma de decreto legislativo.

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deste acesso. O Estado tem que respeitar o Direito Humano de todos de alimentar a si próprios e suas famílias por seus próprios meios. O Estado não pode, por meio de leis, políticas públicas ou ações, ferir este direito, e quando o fizer tem que criar mecanismos de reparação. Ex. 1. Políticas públicas que gerem desemprego devem ser associadas a mecanismos que garantam a geração de novos empregos e salário desemprego até a normalização da situação. 2. Desapropriação de terras para construção de barragens ou outras obras públicas tem que garantir a reconstrução das vidas das pessoas deslocadas, com igual qualidade.

o Proteger – O Estado tem que proteger os habitantes de seu território contra ações de empresas ou indivíduos que violem seu direito à alimentação. Ex. 1. Controle de Qualidade de Alimentos (ANVISA); 2. Código de comercialização de substitutos do leite materno (MS) 3. Proteção contra contaminação ambiental (IBAMA e MS)

o Realizar – O Estado tem a obrigação de promover/facilitar políticas e programas públicos que garantam o DHA para todos:

� Promover – A obrigação de promover/facilitar significa que o Estado deve envolver-se proativamente em atividades destinadas a fortalecer o acesso de pessoas a recursos e meios, e a utilização dos mesmos, de forma a garantir o seu modo de vida, inclusive a sua segurança alimentar, e a utilização destes recursos e meios por estas pessoas. O Estado tem que promover/facilitar políticas públicas que aumentem a capacidade das famílias de alimentarem a si próprias. Exemplos: i) Reforma Agrária; ii) Geração de Emprego e Renda; iii) Apoio à Agricultura Familiar; iv) Políticas de Renda Básica, Políticas de Promoção da Saúde, Nutrição, Educação, etc. v) Capacitação em Direitos Humanos.

� Prover – O Estado tem a obrigação de garantir a alimentação e a nutrição com dignidade de famílias que passam fome ou estão desnutridas por condições que fogem ao seu controle, e deve buscar garantir que estas famílias/pessoas recuperem a capacidade de se alimentar, se forem capazes de fazê-lo.

• Violações aos DH ocorrem sempre que um direito não é respeitado, protegido,

promovido ou realizado. • Ações ou omissões podem representar uma violação ao Direito à Alimentação. • Algumas medidas nestes diferentes níveis de obrigações são de uma natureza mais

imediata, enquanto outras medidas são mais de longo prazo, para alcançar progressivamente a realização integral do Direito Humano à Alimentação Adequada. No entanto, apesar desta prerrogativa, os Estados têm a obrigação precípua de tomar as medidas necessárias para mitigar e aliviar a fome e a má nutrição e para agir com toda efetividade possível, visando à realização dos direitos humanos. Além disso, é importante ter em mente a necessidade de fazer uma distinção entre a incapacidade e a má-fé de um Estado em promover/ facilitar a realização deste direito humano fundamental. Sempre que obrigações previamente assumidas não são cumpridas ou

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respeitadas, os Estados têm que demonstrar sua boa fé na tentativa de fazê-lo, e isso irá delimitar a diferença entre inabilidade e má fé.42

• Normas administrativas devem ser claras e explicitar os titulares de direitos e portadores de obrigações; mecanismos de recurso; instância responsável pelo recebimento e investigação de denúncias e reparação de violações confirmadas; possíveis sanções.

• O Estado deve criar mecanismos de recurso e reparação que possibilitem que indivíduos e famílias, cujos direitos estejam sendo violados, possam recorrer ao poder público e à justiça no sentido de verem garantidos seus direitos.

PARTE II – PROPOSTA METODOLÓGICA PARA ANÁLISE DE PROGRAMAS E POLÍTICAS PÚBLICAS Uma análise de programas e políticas públicas deve levar em consideração as seguintes questões:

• Políticas públicas devem promover/facilitar o DHAA - Os Estados devem desenvolver políticas que tenham como objetivo final a promoção do DHAA no contexto da indivisibilidade dos Direitos Humanos, ou seja, de uma vida digna de qualidade para todos os habitantes do seu território.

� A garantia da realização do DHAA implica em mudanças de paradigma

que influenciam o planejamento, a execução, a implementação e a harmonização de políticas públicas para a consecução destes objetivos. O processo de realização do DHAA não abrange apenas a realização de metas e objetivos. Realizar o Direito Humano à Alimentação Adequada exige mudanças nos processos, nas formas de fazer as coisas, e mais do que tudo, na cultura institucional do Estado e de seus servidores, e na própria cultura da população em geral.

� Para a promoção do DHAA o processo é tão importante quanto os resultados - “Os fins não justificam os meios”.

� Políticas públicas devem ser elaboradas e implementadas de forma participativa, com a definição de indicadores de processo e resultado, metas, prazos, responsabilidades e alocação de recursos, permitindo seu monitoramento e avaliação continuada.

� A implementação de mecanismos para monitoramento dos avanços na realização do DHAA é fundamental para identificação de fatores e dificuldades que afetam o grau de implementação das obrigações, e para facilitar a adoção de legislação corretiva e medidas administrativas, inclusive medidas para implementação das obrigações. Um monitoramento eficiente é essencial para transformar em realidade os benefícios definidos em políticas e estratégias.

42 De acordo com o Comentário Geral n° 12, um Estado que alega estar incapacitado de realizar suas obrigações por razões além do seu controle, tem a obrigação de provar este fato, bem como que todo esforço foi despendido no sentido de usar todos os recursos disponíveis para satisfazer obrigações mínimas como prioridade. Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU, Comentário Geral 12, Genebra, ONU, 1999, para. 17.

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� Políticas públicas devem ser regidas pelos princípios da eficiência, transparência, responsabilidade (ou obrigação de prestar contas), participação, equidade, inclusão social, não discriminação43 e empoderamento de seus beneficiários.

� A participação ativa e informada dos beneficiários na formulação, execução e monitoramento dos programas (em todos os estágios do processo) deve ser vista como um elemento extremamente importante na medida que se reconhece, cada vez mais, que estratégias unilaterais impostas em uma das partes raramente funcionam, até mesmo em casos onde estas estratégias visam apenas garantir benefícios para esta parte. “Aqueles grupos que são completamente excluídos dos processos de tomada de decisões que os afetem, dificilmente mantêm o acesso à alimentação adequada por muito tempo.”44

� Assim sendo, existe sempre a necessidade de se levar em conta que os indivíduos devem ser os sujeitos ativos, e não meramente objetos, de estratégias que objetivem beneficiá-los. � Tradicionalmente, os pobres são excluídos por não possuírem suficiente poder político e financeiro para fazer com que seus interesses sejam observados. Uma abordagem que integre direitos humanos deve garantir os passos necessários para alterar esta situação, através da criação de uma estrutura legal-institucional na qual os pobres possam participar efetivamente na formulação das políticas.

� Responsabilização – uma das mais importantes fontes de contribuição de uma análise sob uma perspectiva dos Direitos Humanos diz respeito à ênfase colocada na responsabilização de atores cujas ações têm um impacto nos direitos das pessoas. Direitos implicam em obrigações, e obrigações demandam responsabilidade. Arranjos e instituições legais/administrativas, que visem assegurar responsabilização das autoridades competentes, devem ser trazidos a todas estratégias e programas.

• A necessidade de identificação dos portadores de obrigações (nas

três esferas de governo, quando for o caso) e de suas responsabilidades e funções são indispensáveis. Após a identificação dos portadores de obrigações, torna-se necessário determinar as responsabilidades e obrigações correspondentes e avaliar o desempenho dos atores responsáveis em realizá-las. Assim, um levantamento das funções/obrigações dos atores responsáveis pela implementação dos programas torna-se essencial inclusive para que estes atores possam reconhecer suas

43 Qualquer discriminação no acesso ao alimento, bem como aos meios para sua obtenção, com base em raça, cor, sexo, idioma, religião, opinião política ou de outra natureza, nacionalidade, propriedade, nascimento ou qualquer outra condição social, com o objetivo ou resultado de anular ou prejudicar a fruição ou exercício eqüitativo dos direitos humanos, constitui uma violação a estes direitos. 44 Alston, Philip: “International Law and the Human Right to Adequate Food”, in The Right to Food, (Martinus Nijhoff; International Studies in Human Rights, 1984), p. 20.

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funções/responsabilidades e possam ter de fato uma maior capacidade de cumprir com suas obrigações.

• Ressalta-se também que responsabilização e protagonismo são promovidos através do envolvimento dos portadores de obrigação no processo de tomada de decisões. Em alguns casos a não realização das obrigações pode ocorrer não devido a uma falta de vontade em realizar estes direitos, e sim por uma falta de capacidade para fazê-lo. Uma investigação das razões pelas quais os portadores de obrigações não estão realizando suas obrigações torna-se importante (identificação de lacunas).

• Assim, 5 elementos relacionados com capacidade, devem ser também levados em consideração:

• motivação para implementar medidas e aceitação da obrigação de fazê-lo;

• autoridade para tomar decisões (as ações de atores mesmo capacitados têm pouco impacto quando estes atores não possuem autoridade suficiente);

• acesso e controle dos recursos econômicos, humanos (pessoal capacitado e qualificado) e organizacionais (programas contínuos de treinamento, etc.);

• capacidade de comunicação; e • capacidade para tomar decisões racionais e aprender com as

experiências (monitoramento e avaliação das práticas, políticas e programas).

� Indicadores - A necessidade de se identificar indicadores e marcos está

ligada à percepção de que, caso se verifique que o progresso na realização de políticas tem sido lento, ações corretivas possam ser tomadas e aqueles que têm obrigação de realizar as estratégias possam ser devidamente responsabilizados. A definição de indicadores e marcos demonstra um compromisso do Estado no sentido de garantir a realização das metas.

� Políticas públicas devem respeitar, proteger, promover/facilitar e

prover o DHAA. A análise dos programas e políticas públicas por parte da Comissão Permanente de DHAA do CONSEA pode servir como importante instrumento para levantar junto aos gestores públicos informações relevantes sobre a realização destes programas sob uma ótica da realização do DHAA. Ressaltamos que este não é um exercício teórico. A análise dos programas sob uma perspectiva do DHAA tem por objetivo garantir aos cidadãos a possibilidade efetiva de realização deste direito humano fundamental. Devemos ressaltar também a necessidade de analisar se os programas e políticas são razoáveis em sua concepção e implementação. Ademais, para que uma política seja razoável ela não pode deixar de considerar a extensão e o grau de violação do direito que ela busca realizar. As políticas não podem ignorar aqueles mais vulneráveis. Um programa ou política que visa a realização de direitos econômicos, sociais e culturais (DHAA, direito à educação, à saúde, ao trabalho, à moradia, etc.) deve estabelecer responsabilidades claras para as três esferas de governo.

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A necessidade de realização não apenas de uma análise macro/generalista, mas também de uma análise micro, do funcionamento do programa na ponta, onde sejam levantadas possibilidades concretas de apresentação de instrumentos para a efetiva realização do DHAA deve ser enfatizada. O eixo central das perguntas deve ser centrado na ponta. Quando da análise específica dos programas, devemos escolher algumas dimensões para serem trabalhadas com maior profundidade e apontar outras que também sejam importantes, mas que não poderão ser detalhadas por uma limitação de tempo. Ressaltamos também que a presente proposta metodológica deve ser testada e aperfeiçoada durante o processo de análise dos programas e políticas públicas pela Comissão Permanente de DHAA do CONSEA. PERGUNTAS GERAIS O objetivo principal da análise dos programas e políticas públicas pela Comissão Permanente de DHAA do CONSEA é a busca da realização prática deste direito humano fundamental, não devendo se resumir a um exercício meramente teórico. Dados do programa Programa Instituição responsável Data de início e duração prevista Descrição das atribuições legalmente definidas(*)

Até que ponto esta legislação leva em conta a realização do DHAA?

Descrição dos principais objetivos

Listagem dos principais objetivos atendidos

Metas (geográficas e populacionais) Existem prazos estabelecidos para implementação das metas e objetivos do programa?

Critérios de inclusão no programa/ ação

População sujeita de direito

Listagem dos potenciais beneficiários e/ou grupos vulneráveis Existem análises realizadas no âmbito do programa para identificar e caracterizar os grupos vulneráveis (quem são e como podem ser identificados? Onde estão? E porquê eles são vulneráveis?)

Existem estratégias específicas

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dirigidas pra grupos vulneráveis e populações específicas (povos indígenas, remanescentes de quilombos, dentre outros)? Quais? % de população sujeita de direito alcançada pelo programa/ ação

Nível atual de cobertura das metas (**)

Planejamento estratégico para 2005/2006 em relação às metas

Existem recursos humanos (recursos humanos devem estar disponíveis na forma de servidores qualificados e bem capacitados) financeiros e organizacionais (arranjos para apoio financeiro e técnico) disponíveis em diferentes níveis para a implementação efetiva do programa?

Rede institucional de articulação (governamental e não-governamental) e responsabilidades de cada parceiro na realização do DHAA. Em caso de problemas relacionados com a falta de articulação entre as ações, quais medidas concretas vêm sendo adotadas para superar estes obstáculos?

Sistemas de articulação, coordenação e/ou relação com outros programas, ações (inter e intra-setorial, sociedade civil, governo, setor privado) para a realização do DHAA (***)

Pontos fortes do programa Pontos fracos e barreiras programa Estratégias definidas para ultrapassar barreiras/ pontos fracos do programa.

Existe alguma outra política que afeta o efetivo desempenho do programa e que interfira na realização do DHAA? Qual(is) política(s)? Quais medidas concretas estão sendo adotadas para superar este obstáculo?

De que maneira o impacto deste Programa pode ser potencializado na busca pela realização do DHAA?

(*) Inclua o seguinte em sua descrição: processos participativos, marco legal (leis, normas, regulamentações, diretrizes ou planos que orientem a implementação do programa, com datas de adoção).

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(**) Informe a data. (***) Informe quando houver um mecanismo para integrar setores e programas/ações relacionados a esse programa/ação específico e quando houver um mecanismo de coordenação. Operacionalização do Programa - O cumprimento de um direito não está sendo feito de forma a prejudicar a realização de outro? Informação, Responsabilização e Monitoramento. Estratégias de informação, mobilização e de comunicação social Descreva as estratégias de comunicação para disseminação da informação para o público em geral e beneficiários sobre as diferentes dimensões dos direitos humanos relacionados com a implementação do DHAA e como ter acesso a estes direitos. (Por favor descreva iniciativas públicas educacionais, a linguagem e os meios em que foram promovidas. Por favor também selecione exemplos (em papel ou via eletrônica)). Comunicação (interna, com outros atores e beneficiários). As pessoas são informadas que têm direitos? As famílias são informadas? Os funcionários são informados que têm obrigações? O acesso à informação é garantido àqueles que não sabem ler? Informações sobre o programa e sobre o DHAA estão disponíveis de forma não-discriminatória e que possam ser facilmente entendidas pelos diferentes grupos de detentores de direitos? A linguagem para disseminação de informação é facilmente compreensível em nível local? Informações coletadas a nível local oferecem a oportunidade aos detentores de direitos de indicar suas prioridades e

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aspirações? Por favor, apresente avaliações sobre a efetividade da estratégia de comunicação. Existe um reconhecimento de que a promoção do DHAA no programa requer a superação de práticas discriminatórias e paternalistas, tradicionalmente incorporadas nas iniciativas públicas, em todos os níveis de implementação? Existem indicadores para detectar práticas discriminatórias? Quais medidas concretas vêm sendo adotadas para superar estes obstáculos?

Existe participação ativa e informada dos beneficiários na elaboração, execução e monitoramento do programa? Como? Qual é a relevância da participação na tomada de decisões? A participação é considerada como importante para sua instituição? De que forma?

Há uma clara atribuição de obrigações dos atores envolvidos na implementação do programa em seus diferentes níveis? Estes atores estão informados das suas obrigações? De que forma estas obrigações estão explicitadas?

Quais são as obrigações: - Do órgão gestor responsável pelo Programa - Do Estado - Do Município - Dos Conselhos de controle social Quais são as responsabilidades: - Das famílias - De outros atores da sociedade civil para a realização do DHAA no âmbito do programa

Capacitação dos portadores de obrigação (cursos, etc) Existem mecanismos de motivação dos diferentes agentes públicos para implementação de suas obrigações, bem como para conscientização da necessidade de cumprir suas obrigações? Como funcionam estes mecanismos?

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Existe delegação de autoridade para que os agentes públicos possam cumprir o seu papel? De que forma isto é explicitado? Os diferentes agentes públicos recebem recursos financeiros, administrativos, treinamento, apoio técnico, etc, que possibilitem cumprir com suas obrigações? Existem programas de capacitação continuada? Os diferentes atores são estimulados a buscar formas de parceria com outras entidades para garantir a realização efetiva do DHAA no programa? De que forma? Os agentes públicos em geral estão aptos a tomar decisões quando necessário? Existe alguma forma de monitoramento e avaliação das ações destes agentes sociais? Quais? Quais responsabilizações estão sendo cobradas indevidamente? Sistemas de avaliação e monitoramento (*) - Descreva os mecanismos/sistemas de monitoramento utilizados pela sua instituição para monitorar e avaliar a realização progressiva do DHAA (por favor inclua uma discussão sobre os recursos humanos e financeiros internos e externos alocados para esta função). - Os agentes públicos são capacitados para utilizar métodos de monitoramento simples e participatórios? - Descreva as principais informações sobre exercícios /estudos de avaliação e monitoramento (por favor liste os títulos dos estudos de avaliação e monitoramento e também quais estudos foram realizados internamente e quais externamente)

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- Discuta recomendações para políticas/ estratégias e/ou quaisquer mudanças legislativas que sua instituição acredite serem necessárias para uma realização mais efetiva do DHAA. Apresente razões pelas quais existiria uma necessidade de mudanças legislativas e/ou na política/estratégia. Mecanismos de controle social

Como é o controle da execução do programa na ponta? Existem mecanismos para garantir a implementação efetiva do programa nos Estados e Municípios?

Existem mecanismos disponíveis para os sujeitos de direito reclamarem (em todos os níveis) quando entendem que seus direitos estão sendo violados? Estes mecanismos são acessíveis aos mais vulneráveis? De que forma? Como é avaliada a eficiência destes mecanismos? Quem é o agente público responsável pela avaliação das queixas e reclamações sobre o programa? Este ator é independente? Este ator tem uma situação de não subordinação com relação ao gestor do programa?

(*) Informe se existe um mecanismo para monitorar e avaliar o programa/ação e os últimos resultados, se houver. Alocação Orçamentária Orçamento anual e fonte de recursos Alocação orçamentária atual 2004/2005

O total orçamentário para o ano de 2004/2005 foi adequado? Se não, por favor, justifique (elabore)

Se aplicável, que medidas foram instituídas para lidar com a inadequação do total orçamentário para 2004.

Contingenciamento ou gastos excedentes do orçamento 2004

Explique o impacto que o contingenciamento ou gastos excedentes

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no orçamento 2004/2005 tiveram na realização do DHAA Quais medidas foram tomadas para lidar com o contingenciamento ou gastos excedentes no orçamento 2004/2005?

Existem estratégias orçamentárias específicas dirigidas pra grupos vulneráveis e populações específicas (povos indígenas, remanescentes de quilombos, dentre outros)?

Apresentação de indicadores - Existem indicadores para medir mudanças ao longo do tempo e medir a realização das metas e objetivos do programa relacionados com a promoção do DHAA? Estes indicadores são regularmente monitorados? - Existem metas, marcos e prazos (curto, médio e longo) estabelecidos para a realização dos indicadores? Impacto qualitativo atual do programa na vida dos beneficiários/grupos vulneráveis (mudanças significativas resultantes da implementação das medidas)

Impacto quantitativo do programa nos beneficiários/grupos vulneráveis

Avaliação dos resultados em relação às obrigações de respeitar, proteger, promover/facilitar e prover. Apresente uma avaliação de como as medidas adotadas no âmbito do programa atendem às obrigações de respeitar, proteger, promover/facilitar e prover o direito.

1. Respeitar 2. Proteger 3. Promover/facilitar 4. Prover

Principais dificuldades enfrentadas - Descrição das principais dificuldades de implementação 2003/2004

Descrição das principais dificuldades enfrentadas em 2003/2004

Discuta soluções propostas para as principais dificuldades enfrentadas em 2003/2004

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Ações Administrativas - Houve alguma ação administrativa que resultou na violação do direito? Em caso positivo, discorra sobre a natureza da(s) ação(ões) administrativa(s) e a(s) violação(ões) - De que forma a(s) ação(ões) administrativa(s) resultaram em violação(ões) dos direitos em questão? - Identifique e descreva medidas introduzidas para lidar e servir como prevenção para que violações não venham a ocorrer novamente. - Quão efetivas foram estas medidas? Má administração e corrupção - Houve alguma reclamação oficial de má-administração e/ou corrupção contra esta instituição relacionada com a realização do direito? Em caso positivo, por favor descreva. - Identifique e descreva medidas introduzidas para lidar e servir como prevenção contra má-administração e corrupção. - Quão efetivas foram estas medidas? - Como resultado de ações administrativas, má-administração, corrupção e falha para realizar obrigações constitucionais em relação ao direito em questão, houve alguma ação legal ou reclamação apresentada contra sua instituição? (em caso positivo, por favor apresente as seguintes informações: base do litígio, resultado do litígio e medidas instituídas para prevenir futuros litígios quando o resultado não foi favorável para sua organização). REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Comitê de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais da ONU, Comentário Geral 12, Genebra, ONU, 1999. Disponível em: http://www.abrandh.org.br/downloads/Comentario12.pdf Comissão de Direitos Humanos da África do Sul. Sexto Protocolo de Direitos Econômicos e Sociais, 2003/2004. Disponível em: http://www.sahrc.org.za/main_frameset.htm Engesveen, K. Strategies for Realising Human Rights to Food, Health and Care for Infants and Young Children in Support of MDGs: Role and capacity analysis of responsible actors in relation to breastfeeding in the Maldives. Summary of Presentation. Universidade de Oslo, Noruega, 2005.

Franceschini, T. O Programa Fome Zero no Brasil: Uma análise crítica sob uma perspectiva dos direitos humanos. Dissertação de Mestrado. Universidade de Essex, Inglaterra, 2004. Processo Preparatório - Estudos de Caso Nacionais, 32ª Sessão do Comitê Permanente de Nutrição, Brasil, 2004.

Valente, F.L.S. Direito Humano à Alimentação – desafios e conquistas. Cortez Editora, São Paulo, 2002. FAO.

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ANEXO II

DIREITOS, OBRIGAÇÕES E RESPONSABILIDADES NO ÂMBITO DO PNAE

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Direitos, obrigações e responsabilidades no âmbito do PNAE

CRIANÇAS DE 0 A 14 ANOS

DIREITOS - Todas as crianças e adolescentes têm o direito humano à alimentação escolar adequada. - Crianças que ainda estão sendo amamentadas têm o direito de continuar recebendo aleitamento materno da mãe durante sua permanência na creche. - Crianças e adolescentes do ensino fundamental, ou matriculados em estabelecimentos mantidos pela união, têm o direito de ser atendidos em suas necessidades nutricionais, durante sua permanência em sala de aula, de forma a contribuir para o crescimento e desenvolvimento do estudante, a aprendizagem e o rendimento escolar, bem como a formação de hábitos alimentares saudáveis; Todo estudante que está na escola têm o direito humano à: - Ser bem tratado/a pelo pessoal responsável que manipula, prepara e distribui a alimentação, sem qualquer tipo de discriminação - Receber uma alimentação que respeite os portadores de patologias associadas à alimentação (diabetes, pressão alta, doença celíaca, anemia falciforme, entre outras), sem discriminação; - Um local arejado, limpo e confortável para as refeições que permita socialização adequada durante a refeição; - Que os alimentos sejam armazenados, preparados em condições de higiene que protejam contra insetos, roedores e outros contaminantes, preservando a qualidade dos alimentos; - Instalações sanitárias que permitam sua higiene pessoal e a dos manipuladores de alimentos; - Informação sobre alimentação saudável, sobre a qualidade e composição da alimentação recebida na escola; - Ser informados que têm direito humano à alimentação escolar e a apresentar sugestões visando a melhoria da alimentação escolar; - Reclamar para a escola e/ou para a família se algum, ou mais de um, destes direitos não forem respeitados.

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FNDE/Governo Federal

Responsável pela assistência financeira, em caráter complementar45.

OBRIGAÇÕES 1. Garantir o repasse de recursos financeiros destinados à compra de gêneros alimentícios; 2. Normatizar, coordenar, acompanhar, monitorar e fiscalizar a execução do programa; 3. Fiscalização e gerenciamento em nível nacional; 4. Capacitação de recursos humanos; 5. Gerar informação/orientação em nível nacional; 6. Promover a avaliação da efetividade e eficácia do programa;

DIREITOS 1. Receber recursos suficientes do Governo Federal para atender ao PNAE – Programa Nacional de Alimentação Escolar

ENTIDADE EXECUTORA Estado - Secretaria Estadual de Educação

Município - Secretaria Municipal de Educação

Responsável pelo recebimento e complementação dos recursos financeiros transferidos pelo FNDE e pela execução do PNAE46

OBRIGAÇÕES 1. Garantir a oferta regular e contínua de uma alimentação adequada durante permanência na creche, e durante a permanência em sala de aula; 2. Divulgar recebimento dos recursos; 3. Garantir a complementação de recursos, caso estes sejam insuficientes; 4. Fiscalizar e gerenciar o programa nas escolas de sua responsabilidade; 5. Supervisionar a execução “in loco”; 6. “Alimentar” o censo escolar;

45 Art. 4º inciso I da Resolução/FNDE/CD/ N.º 38 de 23 de agosto de 2004. 46 Art. 4º inciso II da Resolução/FNDE/CD/ N.º 38 de 23 de agosto de 2004.

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7. Divulgar e/ou gerar informações no âmbito de sua atuação; 8. Incentivar atuação conjunta da escola com o FNDE; 9. Fornecer equipamento/infra-estrutura de: - cozinha - armazenamento - transporte - utensílios - refeitório 10. Garantir recursos humanos: - Merendeira - Serviços gerais 11. Capacitar todas as pessoas envolvidas na execução do programa; 12. Constituir o Conselho de Alimentação Escolar - CAE; 13. Garantir infra-estrutura para o funcionamento do Conselho de Alimentação Escolar; 14. Tornar público o funcionamento e composição do Conselho de Alimentação Escolar; 15. Disponibilizar informações e garantir o acesso à informação por parte do Conselho de Alimentação Escolar; 16. Prestar contas ao Conselho de Alimentação Escolar; 17. Criar estratégias para incentivar a educação alimentar e nutricional no ambiente escolar; 18. Promover hábitos alimentares saudáveis; 19. Utilizar, no mínimo, 70% dos recursos financeiros na aquisição de produtos básicos47; 20. Garantir alimentação diversificada; 21. Respeitar a vocação agrícola/incentivo à produção e compra local; 22. Respeitar os hábitos alimentares regionais; 23. Aplicar teste de aceitabilidade; 24. Garantir alimentação diferenciada aos portadores de patologias associadas à alimentação (diabetes, pressão alta, doença celíaca, anemia falciforme, entre outras), sem discriminação; 25. Integração com o setor saúde; 26. Submeter os produtos adquiridos ao controle de qualidade;

47 Art. 10º parágrafo 1º da Resolução/FNDE/CD/ N.º 38 de 23 de agosto de 2004.

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27. Estabelecer mecanismos de cooperação com a VISA para o controle de qualidade da alimentação escolar; 28. Monitorar qualidade do alimento segundo orientação ANVISA; 29. Adotar medidas que garantam adequadas condições higiênicas e a qualidade sanitária dos produtos durante o transporte, estocagem, preparo / manipulação, distribuição e consumo dos alimentos; 30. Armazenar e realizar o controle de estoque.

DIREITOS 1. Receber recurso financeiro no valor per capta oferecido pelo governo federal de acordo com o senso do ano anterior; 2. Receber orientações dos órgãos que gerenciam os recursos; 3. O município tem o direito de receber recursos de programas federais tais como o programa nacional de transporte escolar, programa dinheiro direto na escola (PDDE)48 e FUNDEF49; 4. Escolher a melhor modalidade de gestão50; 5. Receber recurso de forma regular.

Conselho de Alimentação Escolar - CAE

OBRIGAÇÕES/RESPONSABILIDADES 1. Fiscalizar e controlar os recursos repassados pelo FNDE; 4. Divulgar os recursos alocados em murais de escolas, igrejas, etc; 2. Acompanhar a programação de alimentos e a elaboração dos cardápios; 3. Acompanhar a preparação e distribuição da alimentação escolar, de forma a garantir às crianças alimentação de boa qualidade, nutritiva, saborosa e de acordo com os hábitos alimentares da região, dando preferência aos produtos “in-natura”; 5. Comunicar à Secretaria Municipal/Estadual de Educação a ocorrência de irregularidades em relação aos alimentos, tais como: vencimento do prazo de validade, deterioração, desvios e furtos, etc, para que sejam tomadas as devidas providências;

48 O PDDE é destinado a atender as necessidades físicas do dia a dia da escola, por exemplo, concerto de um cano estourado, reposição de utensílios e outros. 49 Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério – usado para o pagamento de salário dos professores, profissionais de educação e saúde. 50 Formas de Gestão, de acordo com a resolução 38: Centralizada - a prefeitura passa o gênero para a escola; semi-centralizada - a prefeitura repassa parte dos gêneros ficando a escola responsável pela outra parte; Descentralizada - o serviço da merenda é descentralizado e escolarizada a prefeitura repassa todo o recurso para que a escola faça a compra dos gêneros).

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6. Investigar e monitorar a qualidade do programa em todos os níveis; 7. Orientar as escolas, as famílias, estudantes e gestores sobre seus direitos, obrigações e responsabilidades; 8. Averiguar denúncias de irregularidades; 9. Comunicar as denúncias às Prefeituras, Secretarias de Educação e encaminhar denúncias para os órgãos de controle51; 10. Acompanhar a execução físico-financeira do Programa, zelando pela sua melhor aplicabilidade; 11. Monitorar quadro do programa em todos os níveis.

DIREITOS52 1. Receber da Entidade Executora infra-estrutura necessária à plena execução das atividades de sua competência; 2. Ter acesso a local apropriado, com condições adequadas, para as reuniões ordinárias e extraordinárias do Conselho; 3. Ter disponibilidade de equipamentos de informática, transporte para deslocamento e diárias dos seus membros aos locais relativos ao exercício de sua competência; 4. Ter acesso aos documentos e informações referentes à execução do PNAE, em todas as suas etapas; 5. Toda vez que o Conselho não conseguir cumprir com seu dever por culpa da entidade executora, ele poderá exigir que os mesmos sejam cumpridos de fato. 6. O CAE tem o direito de opinar quanto ao tipo de melhor gestão a ser empregada visando o interesse da escola em oferecer alimentação adequada de acordo com seu orçamento e hábitos alimentares; 7. Apoio dos órgãos de fiscalização e também do Programa Federal de Assistência a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas53; 8. Denunciar as irregularidades aos órgãos competentes. 9. O CAE dos Estados e dos Municípios que possuem escolas indígenas deverá ter em sua composição, pelo menos um membro representante dos povos indígenas e um membro representante das comunidades quilombolas54.

51 Secretaria Federal de Controle, Ministério Público e Tribunal de Contas da União. 52 Art. 9º da Resolução/FNDE/CD/ N.º 38 de 23 de agosto de 2004. 53 A Coordenação-Geral de Proteção a Testemunhas, que integra a Subsecretaria de Promoção e Defesa dos Direitos Humanos, tem como áreas de competência implementar, manter e aprimorar o Programa Federal de Assistência a Vítimas e a Testemunhas Ameaçadas, instituído pela Lei n.º 9.807/99, buscando, sempre que possível, sua articulação com outros programas e ações governamentais correlatas; 54 Art. 12, parágrafo 4º da Resolução/FNDE/CD/ N.º 38 de 23 de agosto de 2004.

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Escola/Direção Escolar

OBRIGAÇÕES 1. Garantir o fornecimento de alimentação escolar de qualidade na quantidade prevista, de forma regular e durante a permanência na creche e/ou na sala de aula; 2. Garantir infra-estrutura adequada; 3. Garantir higiene; 4. Garantir controle de qualidade: - Água - Higiene - Infra-estrutura - Armazenamento - Produção (manipulação) - Distribuição 5. Disponibilizar espaço físico e serviço humanizado sem discriminação; 6. Garantir que o programa seja operacionalizado segundo as normas; 7. Facilitar a atuação do CAE no âmbito da escola; 8. Articular com o setor saúde para identificação e encaminhamento de problemas relacionados à alimentação, nutrição e saúde; 9. Monitorar as condições de saúde das merendeiras; 10. Garantir acesso da ANVISA e/ou VISA na escola.

DIREITOS 1. Receber o gênero alimentício ou o recurso, de forma regular; 2. Ter recursos para proporcionar uma infra-estrutura adequada para o preparo da merenda escolar; 3. Direito de receber orientação do FNDE e da secretaria; 4. Buscar junto à prefeitura/Estado condições adequada de funcionamento para preparo da alimentação escolar; 5. Ser treinado pela Entidade Executora para gerenciar os recursos; 6. Buscar junto à prefeitura o transporte escolar, recursos humanos e infra-estrutura adequada.

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Merendeira

OBRIGAÇÕES 1. Cumprir normas: - Cardápio (produzir uma alimentação de qualidade seguindo o cardápio balanceado proposto previamente por nutricionista); - porcionamento (usar per capta estabelecido) - higiene (pessoal e de manipulação e distribuição dos alimentos, incluindo os utensílios) - armazenamento adequado dos alimentos - usar os uniformes fornecidos pela instituição 2. Manter o ambiente de trabalho limpo e organizado; 3. Verificar a aceitação da alimentação escolar e informar à direção da instituição (creche e/ou escola); 4. Preparo/manuseio dos alimentos de forma adequada (boas práticas). 5. Não praticar atos discriminatórios contra estudantes no momento da distribuição dos alimentos.

DIREITOS 1. Receber treinamentos (orientações) sobre o cardápio, preparo e porcionamento do alimento e manuseio de utensílios; 2. Uniformes adequados; 3. Educação básica; 4. Condições de trabalho adequada (infra-estrutura, refeitório, cozinha, utensílios, segurança no trabalho); 5. Acesso à matéria prima com qualidade e quantidade suficiente; 6. Direito a receber assistência à saúde;

Família

RESPONSABILIDADES 1. Acompanhar a qualidade da alimentação escolar fornecida; 2. Participar nas instâncias do CAE; 3. Denunciar quando houver irregularidades; 4. Informar à escola sobre a existência de patologias associadas à alimentação; 5. Matricular e zelar pela freqüência da criança na escola; 6. A mãe é responsável pelo aleitamento materno.

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DIREITOS 1. Informação; 2. Participação; 3. Acesso à escola; 4. Não discriminação; 5. Ser tratada com dignidade; 6. Direito à creche durante o período de amamentação55; 7. À mãe terá direito, durante a jornada de trabalho, a dois descansos especiais, de meia hora cada um para amamentar a criança até o sexto mês. 8. Receber informação sobre a importância e relevância do aleitamento materno, exclusivo até o sexto mês e misto até os dois anos de idade, para sua saúde e para a saúde da criança.

Ministério Público Cabe ao Ministério Público defender os interesses sociais e proteger o patrimônio público, devendo, para tanto, tomar medidas necessárias no recebimento de qualquer denúncia.

OBRIGAÇÕES 1. Receber e investigar denúncias; 2. Fiscalizar o desenvolvimento do programa:

Ministério Público Federal - recursos financeiros Ministério Público Estadual - direito das crianças

3. Garantir o Direito Humano à Alimentação Adequada; 4. Promover o inquérito civil e a ação civil pública para a proteção do patrimônio público e federal e de outros interesses coletivos56; 5. Expedir notificações nos procedimentos administrativos de sua competência, requisitando informações e documentos para instruí-los. 55 Segundo as normas trabalhistas (CLT), todo estabelecimento que empregue mais de 30 mulheres com mais de 16 anos de idade deverá ter local apropriado onde seja permitido às empregadas guardar sob vigilância e assistência os seus filhos no período de amamentação. 56 Constituição Federal art. 129, inciso III

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ANEXO III

16 DIMENSÕES DO DIREITO HUMANO À ALIMENTAÇÃO ADEQUADA NO ÂMBITO DO PNAE

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16 dimensões do Direito Humano à Alimentação Escolar

Alimentação Escolar de Qualidade é um Direito Humano assegurado na Constituição Federal57 de 1988 e no Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais58

Todo o aluno tem o direito humano à:

1. Alimentação adequada59 durante seu período na escola, durante todos os dias letivos;

2. Alimentação saudável, balanceada, diversificada e saborosa, respeitando os hábitos alimentares regionais, orientada por nutricionista;

3. Alimentação segura, sem contaminação por microorganismos, agrotóxicos, aditivos e outras substâncias nocivas à saúde;

4. Ser bem tratado(a) pelo pessoal responsável que manipula, prepara e distribui a alimentação, sem qualquer tipo de discriminação;

5. Receber uma alimentação que respeite os portadores de patologias (doenças) associadas à alimentação (diabetes, pressão alta, doença celíaca, entre outras)60, sem discriminação;

6. Receber uma alimentação que respeite os hábitos alimentares e culturais dos povos indígenas e quilombolas61;

7. Acesso à água limpa para consumo, higiene e preparo da alimentação;

8. Que a alimentação seja preparada com no mínimo 70% de alimentos in natura e/ou semi-elaborados62 e produzidos na região onde se encontra a escola;

9. Um refeitório arejado, limpo e confortável, que permita socialização adequada durante a refeição;

10. Utensílios necessários (colher, garfo, faca, prato e copo) e em boas condições de uso para sua alimentação;

57 Artigo 208, VII “Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de atendimento ao educando, no ensino fundamental, através de programas suplementares de material didático-escolar, transporte, alimentação e assistência à saúde”. 58 O Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, ratificado pelo Brasil em 1992, e incorporado à legislação Nacional por meio do Decreto 591/92. 59 Receber uma alimentação de boa qualidade, em quantidade suficiente e que respeite os hábitos culturais regionais, livres de substâncias adversas; 60 Diabetes – pessoas que não podem ingerir açúcar e alimentos que o contenham; Doença Celíaca – intolerância permanente (por toda a vida) ao glútem (proteína contida no trigo, aveia, cevada e centeio e todos os alimentos fabricados com estes cereais). 61Definimos como quilombolas, populações remanescentes de escravos, grupos étnicos predominantemente constituídos pela população negra rural ou urbana que se auto definem a partir das relações com a terra, o parentesco, o território, a ancestralidade, as tradições e prática culturais próprias. 62 Alimentos in natura são alimentos sem nenhum tipo de processamento industrial e alimentos semi-elaborados são alimentos minimamente processados para o consumo (arroz, óleo de soja, feijão, farinhas, etc).

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11. Que os alimentos sejam armazenados em lugares apropriados e protegidos contra insetos, roedores e outros contaminantes, preservando a qualidade dos alimentos;

12. Que os alimentos sejam preparados em condições adequadas de higiene, protegidos contra insetos, roedores e outros contaminantes, preservando a qualidade dos alimentos;

13. Instalações sanitárias que permitam sua higiene pessoal e a dos manipuladores63 de alimentos;

14. Informação sobre alimentação saudável, sobre a qualidade e composição da alimentação recebida na escola;

15. Ser informados que têm direito humano à alimentação escolar e a apresentar sugestões visando a melhoria da alimentação escolar;

16. Reclamar para a escola e/ou para a família se algum, ou mais de um, destes direitos não forem respeitados64.

CASO SEUS DIREITOS NÃO ESTEJAM SENDO RESPEITADOS E PROTEGIDOS FALE COM :

Pessoa de contato na Escola:

CASO NÃO TENHA RESPOSTA ÀS SUAS QUEIXAS FALE COM O CONSELHO DE ALIMENTAÇÃO ESCOLAR

Pessoa de contato:

Endereço:

Telefone:

63 Pessoas que preparam, ajudam a preparar e servem os alimentos (merendeira, ajudante, quem estoca). 64 Caso seja necessário, a denúncia poderá ser feita sem identificação (anônimo).

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ANEXO IV

ROTINAS E PROCEDIMENTOS DE RECEPÇÃO, ANÁLISE E RESPOSTA A DENÚNCIAS

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Rotinas e procedimentos de recepção, análise e resposta a denúncias

Alimentação saudável, balanceada, diversificada e saborosa, respeitando os hábitos alimentares regionais, orientada por nutricionista.

QUEM RECLAMA: Aluno, Pais, Professores, Responsável pela alimentação escolar, Merendeira, Nutricionista e CAE.

QUEM TEM OBRIGAÇÃO: Escola (Secretaria e Direção), Entidade Executora, CAE, Vigilância Sanitária Local, FNDE e Ministério Público.

Caso haja violação desse direito, poderá QUEM RECLAMA reclamar seus direitos. O Responsável imediato - QUEM TEM OBRIGAÇÃO - deverá reparar essa violação ou encaminhá-la ao setor competente. A princípio, deverá a Escola, por meio de sua Secretaria, receber a reclamação e adotar o seguinte PROCEDIMENTO: preencher e/ou receber formulário simples, com espaço para resposta e monitoramento da escola, e protocolar a denúncia num livro de ocorrência que deverá ser mensalmente analisado pelo CAE. O próximo passo a ser adotado pela Secretaria, no âmbito de sua OBRIGAÇÃO, será enviar a denúncia, por meio do formulário, à DIREÇÃO que, por sua vez, deverá investigar e resolver o problema, ou reparar a violação, se for da esfera de sua competência. Caso a Secretaria da Escola não adotar o procedimento adequado e/ou esperado, independente do motivo, deverá QUEM RECLAMA procurar diretamente a Direção e apresentar a denúncia de violação de seu direito e da Secretaria. Poderá também, QUEM RECLAMA, apresentar a denúncia ao CAE caso a Direção da Escola não tome nenhuma atitude de sua competência para reparar a violação. O CAE, por sua vez, deverá averiguar a denúncia junto à Diretoria da Escola.

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- Aluno - Pais - Professor - Responsável pela alimentação

escolar - Merendeira - Nutricionista

Secretaria da Escola

CAE

Direção ↓

Investiga ↓

Resolve (se for da esfera de sua competência)

1 – Formulário simples, com espaço para a resposta e monitoramento da escola.

2 – Livro de ocorrência (mensalmente enviado para o CAE)

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C A E

Encaminha a reclamação

escolares merendeiras professores pais nutricionistas

Resolve e da retorno

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escolares merendeiras professores pais nutricionistas

C A E

Caso a escola não resolva, encaminhar a reclamação ao CAE

Resolve e da retorno

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93

Caso a violação não seja reparada pela Escola, independente do motivo, mesmo depois da intervenção do CAE, poderá QUEM RECLAMA e/ou o CAE apresentar a denúncia à Entidade Executora (inclusive se a Escola não tomar nenhuma atitude frente à denúncia). Caso a Entidade Executora não responda e/ou resolva a denúncia, poderão também, tanto QUEM RECLAMA quanto o CAE, apresenta-la diretamente a Promotoria local (Ministério Público) e/ou FNDE.

- Promotoria Local (Ministério Público) - FNDE

- Aluno - Pais - Professor - Responsável pela alimentação

escolar - Merendeira - Nutricionista - CAE -

Entidade Executora

Investiga ↓

Resolve

ESCOLA

- Aluno - Pais - Professor - Responsável pela alimentação

escolar - Merendeira - Nutricionista - CAE

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escolares merendeiras professores pais nutricionistas CAE

PREFEITURA

Caso o CAE não resolva, encaminhar a reclamação a Entidade Executora

A Entidade Executora resolve com a Escola e da retorno

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escolares merendeiras professores pais nutricionistas CAE

M P

Caso a Entidade não resolva, encaminhar para o FNDE e/ou Entidade Executora

Resolve e dá retorno Resolve e dá

retorno