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8/8/2019 A Terapia Musical No Candombl http://slidepdf.com/reader/full/a-terapia-musical-no-candombl 1/23 A terapia musical no candomblé Rosa Maria Susanna Barbara USP/Pós Graduação em Sociologia Trabalho apresentado no seminário temático ST08 "Experiências religiosas e novas espiritualidades". VIII Jornadas sobre Alternativas Religiosas na América Latina São Paulo, 22 a 25 de setembro de 1998 st08-4 . “Possui verdadeira música em si só aquele que compõe uma sinfonia afinando a harmonia do corpo com aquela da alma” Platão, Timeo, IX, 591 d. Em vários lugares do mundo a música e a dança dominam todo o universo do ritual. Apesar de vários estudos terem relatado o papel e a importância da música e da dança no ritual do candomblé (Barbára, 1995; Behague, 1978, 1984; Cossard-Binon, 1967, 1981 Lody, 1995; Luz, 1995; Lunhing, 1990; Martins, 1995; Omari, 1990; Segato, 1995) falta uma análise aprofundada sobre o tema. Um estudo que abordou a função da dança e da música no ritual e a ligação entre elas foi feito pelo antropólogo De Martino e o etnomusicólogo Carpitella, que no final dos anos 50 analisaram o tarantismo. O tarantismo foi um fenômeno observado até os anos 60 no sul da Itália, embora segundo pesquisas recentes ainda pode ser encontrado nos dias contemporâneos (Di Lecce, 1997) em Puglia, uma região da Itália do sul. Segundo a tradição, em momentos específicos do ano, uma tarântula (existem vários tipos dela na 1

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A terapia musical no candomblé

Rosa Maria Susanna BarbaraUSP/Pós Graduação em Sociologia

Trabalho apresentado no seminário temático ST08 "Experiências religiosas e novas espiritualidades".VIII Jornadas sobre Alternativas Religiosas na América Latina

São Paulo, 22 a 25 de setembro de 1998st08-4.

“Possui verdadeira música em si só aquele que compõe uma sinfoniaafinando a harmonia do corpo com aquela da alma”

Platão, Timeo, IX, 591 d.

Em vários lugares do mundo a música e a dança dominam todo o universo do ritual.Apesar de vários estudos terem relatado o papel e a importância da música e da dança noritual do candomblé (Barbára, 1995; Behague, 1978, 1984; Cossard-Binon, 1967, 1981Lody, 1995; Luz, 1995; Lunhing, 1990; Martins, 1995; Omari, 1990; Segato, 1995)falta uma análise aprofundada sobre o tema.Um estudo que abordou a função da dança e da música no ritual e a ligação entre elas

foi feito pelo antropólogo De Martino e o etnomusicólogo Carpitella, que no final dosanos 50 analisaram o tarantismo. O tarantismo foi um fenômeno observado até os anos60 no sul da Itália, embora segundo pesquisas recentes ainda pode ser encontrado nosdias contemporâneos (Di Lecce, 1997) em Puglia, uma região da Itália do sul. Segundoa tradição, em momentos específicos do ano, uma tarântula (existem vários tipos dela na

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região) mordia os camponeses, na maioria as mulheres, mas também os homens,usualmente nas mãos, nos pés ou no púbis. As pessoas mordidas caíam em um estadocatatônico, que encontrava solução num ritual corêutico1-musical que era organizado emépoca preestabelecida na capela de São Paulo em Galatina. O ritual previa um longo

módulo corêutico-musical com a presença de um simbolismo onde são enfatizados pelos participantes os movimentos e os comportamentos da tarantula, tendo também papelfundamental as cores. Procurando abordar a complexidade do fenomeno do tarantismoDe Martino desenvolve uma analise que aborda varias dimensões: a historico-religiosa, asocial, a psicologica e a psiquiatrica, conduzendo a pesquisa com uma equipemultidisciplinar. O ritual do tarantismo pode ser definido como “terapêutico2” nainterpretação feita por De Martino. As conclusões de De Martino oferecem hipoteses

importantes para pensarmos a função da música e da dança em rituais públicos, em particular na sua dimensão psicologica - terapeutica.Segundo ele, o modelo corêutico-musical servia como uma técnica protetora em umquadro magico-religioso, funcionando como meio de proteção contra as crises atravésdo acionamento de modelos tradicionais de gestos, sons, figuras corêuticas, ritmos emelodias. Além disso funcionava como instrumento de evocação e de controlesocialmente admitidos e operantes cada vez que percebia-se a crise do tarantismo.De Martino trabalha com a relação entre crise e som no ritual. Para ele a crise é o

momento em que a tarântula toma posse do corpo e deixa o indivíduo em um estadodescrito como catatônico ou de grande agitação. Para ser resolvido esse estado tem queser inserido num contexto ritual onde a música desenvolve o papel da organizadora dadesordem e a dança expressa a ordem. Nesse estudo utilizamos algumas das suas observações para a investigação da dimensãoterapêutica do candomblé. Entendemos que no candomblé pode-se pensar a criseenquanto chamado do orixá que promove a suspensão da identidade cotidiana. Seguindoas indicações da música que prepara culturalmente o fiel a ser possuído, as iniciadasresolvem “terapeuticamente” a crise, deixando o orixá dançar no seu corpo ao longo doritual. Durante o fenômeno do transe, o corpo da filha ou filhou-de-santo torna-se o próprio orixá superando a dicotomia corpo/espirito, forma/conteúdo.

1 A palavra coreutica vem do verbo grego, xopeuo= dançar em circulo e dà palavra texne= arte, tecnica.Quer dizer a arte de dançar em circulo.2 Terapeutico no sentido que tem uma resolução à momento da crise, da chamada do orixá.

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Objetivo desse artigo é mostrar a ligação que une a música e a dança na resolução da criseno contexto do ritual, oferecendo uma resolução que prevê a suspensão da identidadecotidiana para dar espaço a uma nova, a identidade do orixá. Essa ligação nos leva aconsiderar a experiência do corpo, fundamental na construção da nova identidade religios

e na transformação da doença e do sofrimento em fundamento pessoal.

QUANDO O CORPO FALAO candomblé é uma religião fundamentada sobre crenças em divindades chamadas orixáe sobre a procura do encontro com o sagrado via o fenômeno da possessão. O transe nocandomblé, como diz Prandi: "... pelos menos em suas primeiras etapas iniciáticas, éexperiência religiosa intensa e profunda, pessoal e intransferível. Como a dor e as paixões

não-religiosas experimentadas, não pode ser mensurado nem descrito, a não ser metaforicamente e indiretamente" (Prandi, 1991: 171).Segundo a filosofia do candomblé, o homem deve estar em contato contínuo eharmônico com a natureza, que fala aos mortais através de vários tipos de mensagens eatravés das suas vibrações captadas pelo corpo. Os seus ritmos são acompanhados deuma experiência sensual contínua, fundamental para a aprendizagem esotérica, quecomeça desde os primeiros contatos com o terreiro e continua ao longo da vida toda.Tendo como base o contexto cultural holístico do candomblé, o corpo está diretamente

relacionado a uma divindade e, por extensão, a um dos elementos naturais primordiais eaos demais elementos a ele associados, como relatam Barros e Teixeira (1992: 43). Ocorpo é percebido como uma das manifestações das divindades e por isso sagrado econstruído segundo padrões culturais ao longo do caminho religioso e da iniciação,quando necessária.Sendo, para a filosofia do candomblé, o corpo humano uma cópia das formas e dasenergias do cosmo, os próprios elementos (ar, água, terra, mata e fogo3) juntam-sesegundo arquétipos4 diferentes. As palavras de Pelosini (1994:94) aplicam-se bem aessa concepção do corpo humano: “...o universo (macrocosmo) e o homem(microcosmo) são criaturas similares, que obedecem às mesmas leis como um tipo defantástico e perfeito relógio cósmico que marca com harmonia os ritmos universais".Assim cada parte do corpo tem um significado simbólico: a parte frontal é relacionada3 O fogo não é considerado uma substancia prima, mas uma conseqüência do ar em movimento.4 A palavra arquétipo não é usada como termo da psicologia junghiana, mas em um senso mais genérico.

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ao futuro e ao orixádono-da-cabeça , enquanto a parte posterior é relacionada ao passado. O lado direito é ligado aos ancestrais masculinos enquanto o lado esquerdoaos ancestrais femininos. Cada parte está relacionada a um orixá em particular e asaberturas do corpo a Exu5. As orelhas, por exemplo, sendo orifícios são defendidas com

argolas pingentes que balançando produzem um barulho que afasta os influxosnegativos. As palmas das mãos e as solas dos pés são pontos em que pode-se perderenergia e recebê-la. Por isso na presença das divindades os fiéis viram as palmas defrente para elas. Cada parte do corpo corresponde a uma divindade. A cabeça éfundamental porque é a sede doorí 6 que contem oodú , o destino pessoal."Para os iorubás a cabeça é a parte mais vital do corpo humano: contem o cérebro, amorada da sabedoria e da razão; os olhos, a luz que ilumina os passos do homem pelos

labirintos da vida, o nariz que serve como uma espécie de ventilação da alma; osouvidos com os quais o homem escuta e reage aos sons, e a boca com a qual ele come mantém o corpo e a alma juntos. " ( Babatunde Lawal, 1983: 46).De fato existe um dito iorubá que diz: "Ori buruku, kossi orixá" ou seja "cabeça nãoequilibrada não dá orixá".Senhora da cabeça, é Iemanjá que harmoniza as energias positivas e negativas e por issonuma das suas coreografias dança levando alternativamente as mãos a frente e atrás dacabeça. Iemanjá executa a função de orientar e de equilibrar seus filhos. Ela protege

também os seios, por ser a Mãe por excelência e por isso ocupa-se da nutrição dos sereshumanos. Uma lenda conta da exuberância do seu corpo e dos seus seios, dos quais umé maior que o outro.O ventre, sede dos órgãos sexuais, e o útero são protegidos por Oxum, por exemplo. Ascadeiras também são uma área sagrada do corpo humano: a bacia e as nádegasrepresentam a fertilidade7.

5 É interessante relatar o fato que Exu junto com Ogum é o guardião das entradas e das saídas como pode-se observar numa fotografia de Verger que mostra um assentamento de Ogum que evidencia entreos seus instrumentos uma chave. (1981:109). O corpo humano possui também entradas e saidas,lugares onde entram as energias boas, como a comida e outros onde expelir-se os dejetos.6 Para os iorubanos, o ori tem status de divindade e recebe cultos complexos. No Brasil, o rito de dar comida à cabeça preservou-se como primeira etapa da iniciação e é "O culto à individualidade dohomem, à cabeça, o que está dentro da cabeça. O ritual de dar comida a cabeça é o bori" (Prandi, 1991:124) .7 O corpo das mulheres é representado em várias estatuetas encontradas na Nigeria, sentado, comoaquela de Íside, e é simbolicamente um trono, onde a criança senta no colo da mãe ou o fiel senta nocolo do orixá. Iside era uma antiga divindade egipcia. Famosa maga era consagrada ao culto da lua, foi aesposa e a irmã de Osiride.

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Ogum, o dono dos caminhos, é o dono dos pés, do movimento, da vida que continua.A voz do orixá é oke ou o ilá , um grito que é emitido só ao longo do transe. Esse gritoé o símbolo da individualidade, é a energia daquela pessoa; é o som criador e individualque testemunha a identidade daquela filha ou filho.

Os olhos são muito importantes, porque conforme as palavras de algumas mães-de-santo: "nos falam do orixá daquela pessoa". Ao longo da pesquisa percebi o olhardiferente das mães-de-santo em varias ocasiões: durante a adivinhação o olhar parecesuspenso, enquanto ao longo do transe, os olhos estão fechados indicando que a atençãoé voltada para o interior do corpo, para uma outra dimensão, a do espirito, segundo afilosofia iorubá e conforme a pesquisa de campo.O corpo no candomblé é o templo do sagrado por excelência, é sagrado porque é vivo

vida expressa através da motricidade que experimenta o espaço e o tempo e quecomunica aos outros, aos fiéis, à comunidade, expressando assim o conceito central dafilosofia da existência africana “Eu sou porque você é”, conceito que sublinha aimportância de cada um na comunidade e o encontro harmônico com o outro8. O corpo pode ser considerado um vaso que contem o orixá, algo de muito precioso que "mandaem nos", conforme as falas das entrevistadas. Eis o porque da forma das quartinhas quelembram o corpo das mulheres9 que segundo alguns informantes africanos teriam umafacilidade a ser possuídas.

No momento da possessão a postura do corpo muda completamente, o rosto adquireuma expressão fechada, as vezes os lábios são empurrados para frente, os olhos sãofechados, a figura humana tremendo, adquire para asiabás da água 10 uma postura“mais redonda” no sentido que os cotovelos são alargados a altura do busto que élevemente dobrado para o baixo, e para os orixás guerreiros, Ogum e Xangô mais retamais voltada para o céu para as divindades mais jovens, Ogum, Oxossi e Iansã e maisdobrada para o chão para as divindades velhas, Nana e Obaluaié.

8 Ciclos de aulas sobre etnomusicologia africana ministradas na Pós-Graduação da USP por o Prof.Kasadi wa Mukuna. (São Paulo, 1997)9 Em área mediterranea existem muitos vasos de bairro com uma forma idêntica aquela do corpo dasmulheres, com vários seios ou com olhos pintados. (Museo Pitré. Museo etnografico del popolosiciliano. Palazzina cinese, Palermo, Italia)10 As iabás da água são os orixás femininos Oxum e Iemanjá

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O TRANSE E A IDENTIDADE FEMININA

Na visão do candomblé, com a iniciação as mulheres11 recuperam uma identidadenatural e social perdida por varias causas12 que é o fundamento ou melhor a tradiçãoreligiosa e que estava presente desde o nascimento. Esta é inscrita no corpo, construídoritualmente através de longas etapas de aprendizagem e incorporação dos fundamentosda vida religiosa. A medida em que o filho-de-santo vai avançando nos passos de suainiciação, estará também ingressando numa ordem sócio-cosmológica, onde o corpo esuas sensações ocupam lugar de destaque (Brito Polvora, 1995). O processo deconstrução de um filho-de-santo se dá basicamente pelos rituais nos quais o sujeito teráimpressos “os sinais” desta iniciação no corpo (Barros e Teixeira, 1992), já que seráno e através deste que se inscrevem tais rituais.

Segundo os contos das novas iniciadas, o chamado do orixá acontece em várias formassonhos, sensações, visões, doenças estranhas que não são confirmadas pela medicinatradicional e em geral um sofrimento psíquico ou físico que manifesta-se de um dia parao outro sem uma explicação certa. Nas falas das mulheres percebe-se uma dicotomia navivência das emoções, existe um “dentro” do corpo e um “fora” do corpo. Um dentrorico e tumultuado e um fora neutro. De um lado as mulheres explicitam as suasemoções, mas só aquelas que são aceitas no cotidiano e na lógica do grupo; do outro,

praticam ritos que lhe dão a liberdade para abrir outras possibilidades expressivas sobreum mundo emotivo que, para poder ser expresso, tem que encontrar modalidades quefogem ao controle do tempo e do espaço do cotidiano. As profundas emoções subjetivassão incorporadas e veiculadas no corpo e sobre o corpo. Na convivência com as filhas-

de-santo e nas longas conversas com elas percebe-se a profundidade e a ambigüidadedo mundo feminino cheio de desejos, de emoções quase sempre secretas e nãoatendidas, algo de incontrolável.

11 Neste artigo são mencionadas as mulheres em prevalência, porque no terreiro onde foi desenvolvida a pesquisa, o Ilé Axé Opô Afonjá fundado no 1910, a maioria dos fiéis iniciados são mulheres, como foiinstituído pela fundadora do terreiro, Mãe Aninha. Mas também nos outros terreiros ha uma grande prevalência de mulheres que participam da roda sagrada.12 A iniciação tem a função de re-aprosimar a filha ao próprio orixá. Por algum motivo a antiga ligaçãocom o duplo divino quebrou-se e a divindade pretende a cabeça da sua filha. Simbolicamente com ainiciação a filha nasce novamente, no santo, forte no seu orixá, deverá assim reaprender a viver.Periodicamente receberá o próprio orixá nos rituais ou em qualquer momento o orixá queira.

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Segundo algumas mães-de-santo o corpo feminino é um corpo mais acessível asenergias externas pela própria característica do ser mulher: é um corpo "aberto" quedeixa a mulher, mensalmente aberta, ao longo da menstruação e ao longo da gravidezEssas experiências tão femininas são momentos nos quais as mulheres são

particularmente sensíveis e têm seus corpos transformados, acompanhandoobrigatoriamente os ritmos da natureza.

Conforme a pesquisa, as iniciadas esperam o momento de ser recolhidas, momentonunca falado antecipadamente, com ar deprimido, tocando a cabeça como para mostrador e se lamentando, ou deitadas na esteira, não podendo se levantar mais pelasvertigens. É como se o mundo interior das emoções, que por muito tempo estevefechado, saísse prepotentemente fora do seu lugar e conseguisse tomar conta do corpo

sem limites. É muito comum, de fato que as iniciadas devam abandonar o trabalhoenquanto esperam a data da iniciação. Segundo a observação da vida no terreiro e asfalas das filhas-de-santo percebe-se o corpo das mulheres como fragmentado. Asexperiências da vida, o casamento, os filhos, a falta de trabalho comprometem o fluirdas emoções e o mundo interior pretende sair e se mostrar ao lado exterior, o mundo.

De um lado as mulheres vivênciam esse corpo externo que não expressa as emoções eque vive o mundo rotineiramente, atuando numa gestualidade cotidiana; do outro se

encontram no terreiro e contam as sensações do próprio corpo e as dores com metáforasmuitos fortes como: “a cabeça tomou fogo!" "Naquele momento senti uma correntecorrer por baixo da pele!" "Estava ai esperando o ônibus e a terra rodava, parecia deestar sobre um barco! É uma sensação de arrepiar!”.

Nas entrevistas apareceu um mundo fantástico e em movimento que agita-se no corpodas mulheres e que com grande dificuldade pode ser expresso com palavras e ser entendido por aquele que não o experimentaram. Por isso as percepções vivenciadasseparam, conforme as falas das entrevistadas, o mundo dos do candomblé daquele “defora da seita”, divisão muito forte para os fieis.

A iniciação dá um sentido a essas experiências e inscreve o corpo com uma própriaidentidade subjetiva na ordem cosmológica e social através da transformação dessassensações e através da inversão do espaço e do tempo cotidiano.

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As sensações da vida são experiências valorizadas que são transmitidas e são faladasnum contexto ritual em que ao corpo e as suas percepções é permitido um lugar dedestaque na cerimônia religiosa.

O ritual religioso repete um padrão idêntico: as forças, as energias penetram, doexterior, no corpo feminino; pode ser através da mordida da aranha, no caso dotarantismo, ou da energia do orixá ou de uma outra divindade conduzindo a umaexperiência existencial que dá à mulher um novo fundamento para a própria história pessoal e social. Muitas vezes ouvi, de fato, as iniciadas dizer: "Eu tinha que passar porisso, para aprender!".

Com a iniciação dá-se a transformação das experiências interiores, do sofrimento, da dorem paz ou pelo menos alivio e equilíbrio através duma nova história pessoal e socialque todas as mulheres incorporam nos seus próprios corpos, como uma sorte dememória secreta que só aqueles que vivenciam a mesma coisa podem perceber.

A iniciação que como relata Prandi: "consiste, pois, em etapas de aprendizado ritual, por parte da filha-de-santo e em estágios de adensamento da sacralidade do orixá particuladesta iniciada"13 (1991: 171) e o desenvolvimento de uma nova identidade permite aexperiência e a orientação de emoções subjetivas a ser orientadas no mundo exterior. Ocorpo aprende assim a lidar com essas emoções e a conduzi-las sempre mais até ser

“fechado”, num sentido de não se deixar mais invadir e assim dirigir a própria vida nomundo.

A DOENÇA E O SOFRIMENTO NO CANDOMBLÉA noção de saúde no candomblé é algo de muito complicado a ser entendido, tem a vecom o lado espiritual, físico, psicológico, cosmológico e social, é uma experiênciaholística que o fiel é chamado a vivenciar. Sendo os rituais voltados para a reconstruçãoda antiga ligação entre oaiê , a terra e oorum , o mundo dos orixás, a doença física ou psíquica é na maioria das vezes, o sinal de uma falta de ligação, de uma desordem como mundo espiritual, como por exemplo uma pessoa feita raramente deve deixar de tomarconta do seu orixá, porque a divindade pode mandar um problema físico específico parasinalizar que a comunicação com ela foi interrompida.13 O respeito que se tem por um santo velho, “feito” há mais tempo, é bem maior que aquele devido aum orixá mais novo

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A chamada do orixá e a seguinte entrada na religião pode acontecer por vários motivos por herança familiar, pelo sofrimento, pelo amor, como relatam as mães-de-santo. Na categoria do sofrimento estão as doença cujas causas podem ser:1) A doença como pedido da divindade que quer ser feita. As vezes aparecem doenças

estranhas que a medicina oficial não sabe explicar e cuidar e que somem com odesenvolver das cerimonias,obrigações . Os iniciados contam claramente quetem uma grande diferença entre o “antes” e o “depois” da iniciação.

2) Vários problemas de ordem econômica, afetiva ou de saúde, etc. podem acontecercaso o iniciado se afaste do seu santo, no sentido de não cuidar mais dele. Osanto deixa seu filho só e sem proteção.

3) No caso de ser tido fixado na cabeça do filho um santo errado.

4) No caso doencosto de Egum , quer dizer que uma pessoa é carregada da energia deum espirito de um morto.5) No caso de estar com o corpo aberto, como durante a menstruação, causa que

permite uma perda deaxé , energia, o que configura uma situação devulnerabilidade.

6) No caso do mal olhado: muitas vezes a inveja pode afetar através doolho grosso ,uma capacidade, que poucas pessoas tem, de passar influências negativas através doolhar.

Ao mesmo tempo existem algumas doenças como aquelas de pele ou distúrbiosdigestivos que são tratadas a nível farmacológico, com base em um profundoconhecimento de plantas medicinais, ministradas através de chás ou banhos de ervas. A IDENTIDADE SONORA INDIVIDUAL E A DO ORIXÁSegundo as lendas a divindade suprema dá a vida ao homem através do sopro,emí , por isso o candomblé pode ser considerado uma religião pneumática14, quer dizer que acriação originou-se pelo ritmo da respiração da divindade. Segundo a mitologia cada pessoa nasce com um dono-da-cabeça, que vive no corpo através do seu ritmoindividual, da sua respiração, do seu andar. Esse ritmo pessoal por várias causas, pode

14 A palavra pneumatica deriva do grego pneuma= hálito. Essa é uma característica encontrada emvarias religiões, como no antigo testamento, na Genesi e no Hinduismo.

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ser esquecido ao longo da vida.15 O ritmo interior ligado ao orixádono-da-cabeça 16 aolongo da aproximação à religião e mais exatamente na iniciação é feito emergir e fixadodefinitivamente no corpo.A personalidade do orixá é inscrita no corpo da iniciada em rituais secretos que prevêem

como condição o uso do ritmo e do som. Nessa fase dramática17 da vida da iniciada, a base rítmica do própriodono-da-cabeça , o toque especifico e a sua cantiga vai tornar-seum ritmo permanente que serve como pano de fundo para as atividades progressivas dorecém nascido. Assim todas as vezes que osalabés 18 tocarem, a identidade sonora da

filha-de-santo responderá aos tambores cujo toque chamam o seu orixá.Sendo a iniciação a representação do nascimento, o fiel nasce simbolicamente umasegunda vez, numa nova vida, e sendo o som, o ritmo, o movimento, elementos

constantes da vida fetal, serão também os movimentos e os ritmos que as iniciadasaprendem noronko que irão ocupar uma parte importante da sua memória origináriae serão inscritos no seu corpo. Assim, no contexto holístico do candomblé esseselementos são partes integrantes do ser e da sua identidade, não existindo a dicotomiacartesiana corpo/espirito. A identidade sonora (o toque do orixá) pode ser equiparada aum fundamento da iniciada que ela manifestará nos rituais periódicos.Os toques tão diferentes de Oiá ou de Iemanjá, por exemplo, atestam inequivocamenteos traços da personalidade desses orixás, a primeira nervosa e livre, a segunda uma

matrona calma e independente. De fato, cada orixá tem seu toque que é único e originae que simbolicamente corresponde a sua voz, a sua personalidade, a seu movimento, asseus aspectos mitológicos e aos elementos naturais dos quais é composto. Essaidentidade sonora do orixá contém a identidade sonora do possuído. A música é acomunicação entre o filho e o orixá, enquanto a dança é a manifestação dessacomunicação. O possuído reconhece, a um nível não consciente, os ritmos e os15 Uma vez que o homem é formado por várias energias que o influenciam e podem atrapalhá-lo ouconfundi-lo, obscurecendo o ritmo-respiração dodono-da-cabeça , é possivel que tal esquecimento estejarelacionado ou venha a conduzir a uma “guerra de orixás”, ou seja que o indivíduo seja tomado por outras energias alem daquelas do própriodono-da-cabeça .16 “Cada indivíduo pertence a um deus em particular,dono-da-cabeça e da sua mente, do qual herdouas características do físico e da personalidade” (Prandi, 1991:86).17 Uso o adjetivo dramática, porque a iniciação é algo de muito profundo e difícil a se falar. O iniciandomorre para nascer de novo e por isso passa através momentos de completa perda da velha identidade,aquela "oscilação da presença" que De Martino identificou também no tarantismo.18 Osalabés são os sacerdotes-músicos, cuja formação também envolve um ritual que incluirecolhimento. Cabe aosalabés conhecer todo o repertório das músicas rituais. O papel executado por eles é tão importante que em maio de 1998 nos dias 9-10 foi organizado um seminário sobre osalabés eas suas funções rituais, chamado Alayandé Siré no Ilé Axé Opô Afonjá.

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movimentos precedentemente inscritos no seu corpo e todas as vezes em que ouve a suidentidade sonora, ele responde. A comunicação acontece aí a um nível muito sutil: osom dos tambores propaga-se através de todos os sentidos, a música envolve a pessoacomo um todo e a obriga a comparticipar do som. Em geral com a passagem do tempo

e aumentando os anos de iniciação o ritmo interior corresponderá sempre mais ao ritmoexterior, numa progressiva união e conhecimento com o orixá do qual se é filho.Segundo o povo do santo é o orixá que decide se a própria filha tem que recebê-lo e porquanto tempo e com qual intensidade.

AS CARACTERISTICAS DA MÚSICA E DA DANÇAPara entender a função e o sentido simbólico da dança e da música no ritual é preciso

lembrar que o candomblé apresenta algumas das características básicas das religiõesafricanas. Em primeiro lugar o fato de ser uma religião holistica. Cada aspecto da vida éligado a um outro numa corrente infinita onde cada parte existe em função da outra, emuma eterna procura de harmonia e equilíbrio. Existe de fato uma ligação indissolúvelentre o cosmo, o ser, o divino que manifesta-se na existência dos homens e, nessaligação entre sensível e supra-sensível, a música adquire uma importância especial porque é a vibração do orixá. Todo o ritual esforça-se por voltar ao tempo do mito, daorigem e de recriar aquele tempo, aquela antiga harmonia. A música e a dança sãoutilizadas nesse sentido. Possuem algumas características em comum que sãofundamentais ao desenvolver do ritual. Tendo como base o princípio de que o som é oresultado de uma interação dinâmica entre as vibrações que propagam-se do tambor percutido por oalabé , o sacerdote-musico. O som é condutor deaxé, poder derealização que aparece em todo seu conteúdo simbólico nos instrumentos musicais. Poisso os atabaques são instrumentos sagrados e recebem todos os anos rituaisapropriados, assim como são tocados só por sacerdotes especiais.

A música no candomblé é caracterizada por uma ciclicidade da frase musical, ou seja o padrão rítmico, otime-line repete-se ao infinito. A noção de tempo aqui expressa é bemdiferente da noção ocidental. Não se trata, como nesta, de criar uma historia temporal,onde há um começo e um fim. No candomblé o padrão rítmico é repetido sem umcomeço nem um final. Não se trata de uma simples repetição19, mas da possibilidade de

19 Sobre o conceito na musica de repetição e reciclagem veda-se Nketia, (1986).

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se criar todas as vezes a origem. Assim na festa de Iemanjá, por exemplo, cria-se a própria energia da água do mar e esta é re-originada através a repetição dotime-line edo movimento da dança. Todos os fieis presentes tem que se concentrar e dançando ecantando a mesma cantiga três vezes origina-se a energia sagrada do orixá. Por isso é

muito importante estar presente nos momentos rituais, porque só nestes pode-se criarnovamente o sagrado. Parece que existe quase uma tentativa de parar o tempo e o seufluxo na busca de um centro único, fixo e eterno.A característica principal da música é de ser polirítmica, quer dizer que cadaatabaque

tem seu padrão rítmico que se liga àquele dos outros tambores numensamble thematic

cycle que harmoniza os vários instrumentos.O atabaque maior, orum , é o único que se permite variações, ele toma conta da cabeça

que manda sobre o resto do corpo e dirige os pés através da coluna humana. Orum étocado com as mãos20, corresponde ao “fundamento religioso”. Orumpi e o lé são a base rítmica. O primeiro manda sobre os braços enquanto o segundo dirige o movimentodos ombros, que é contínuo e o mais solto possível; olé produz um som seco, firme e penetrante. Toca-se com as varetas e, segundo o toque utilizado peloalabé, emite sonsde diferentes alturas. Os sons mais “acentuados”, ostress , conduzem os movimentosdo corpo todo da filha-de-santo na dança. Assim os dois tambores menores criam umfundo rítmico sobre o qual orum manda e cria variações. Existe um outro instrumento,

o agogô, uma campainha de metal que é percutido com uma vareta. É um metalofoneque emite um som com um timbre agudo. No toque de Oiá é tocado com um ritmofortemente sincopado.Pode-se entender melhor a função da música tomando outra vez Carpitella quandofalando da música da tarantela explica que: "....tem uma divisão entre a pulsação daseção rítmica (organeto, pandeiro e violão) e a pulsação de fora, o off-beat do violino(para o caráter de improvisação da parte melódica)...forma-se assim uma sobreposiçãoentre as pulsações: um ritmo isométrico21 puro acentuado e efeitos rítmicos atrasados,síncope, que junto dão origem a uma estrutura polirítmica. (Carpitella in: De Martino1994: 351)Existem dois aspectos expressos na música que refletem dois momentos típicos dastécnicas religiosas: a dilatação e a exasperação da crise que é musicalmente elaborada20 É tocado com as mãos a depender do toque e da nação.21 Isometrico significa de igual dimensão. Do grego isso=ugual.

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com técnicas expressivas particulares como os ritmos acentuados, síncope, efeitosinstrumentais, vários tipos de percussões dos tambores, gritos), e do controle econtenção da crise que reflete-se sobretudo no obstinado ritmo isométrico. Talvezenquanto a poliritmia atua em função da dilatação e da exasperação da crise, o ritmo

isometrico obstinado funciona como controlador e contendor da crise. Para entender aconexão estreita entre a música e a dança e a experiência do fiel é preciso ter em menteque são percebidas por todos os sentidos, não só através do ouvido e do olhar, mastambém através da pele, envolvendo o fiel como um todo.A característica polirítmica da música existe também na dança. Cada parte do corposegue um padrão de movimento, como se correspondesse a um ritmo, a um "time-line"específico. A base dos movimentos, a parte isométrica, é dada pelo movimento dos pé

ligados à cabeça via coluna vertebral. Outra característica da dança, em estreita conexãocom os ritmos é o policentrismo, ou seja o fato do que o movimento tem que sair dointerior e propagar-se para o exterior. No corpo humano não existe um só centro de pulsão energética, mas muitos. Os principais são a bacia, os pés e um ponto no fundodo pescoço que manda nos movimentos dos ombros, segundo os informantes. A dançasagrada não é puro deslocamento no espaço, mas o corpo se movimentando, ocupa umaestrutura espacial, cria um espaço pessoal. As filhas-de-santo movimentam-se em todasas direções, cada uma na sua estrutura espaço-temporal, seguindo a reciclagem da frase-

musical.Outra característica é a forma do círculo. As danças desenvolvem-se em círculo e nadireção anti-horária. O circulo sagrado lembra o tempo-espaço do mito que segundo alendas remete à antiga divindade da terra.A repetição do movimento é percebida como uma criação de algo de novo, cadamovimento dá origem a divindade e dá a possibilidade de voltar no tempo e no espaçoda começo. Nas danças do candomblé os pés estão em contato contínuo com a terra para absorver assuas energias e, simbolicamente, percutindo-a ao longo da dança, o fiel é obrigado aoencontro com “esse mundo”, aquele no qual vivemos e estamos presente no aqui eagora; não é como na dança clássica onde a performance advém sobre as pontas do péssimbolizando a procura de um “outro mundo” e ou a rejeição deste.

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O corpo em movimento assume um significado simbólico, segundo os níveis deverticalidade, alto-médio-baixo. O nível alto relaciona a pessoa com o elemento ar; onível baixo relaciona o corpo com a energia da terra, que, segundo Oliveira (1994):“tem que dar o apoio necessário para sustentar-se”; o nível médio inter-relaciona os

outros dois. O corpo movimenta-se também na horizontal, ampliando os movimentossemelhante a uma bola hipotética, como nas danças de Iemanjá, ou desenhando com os braços, uma forma redonda, como nas de “afastamento” de Oiá-Iansã. Assim as danças podem desenvolver-se tanto ampliando os movimentos, quanto subindo e descendo aolongo de uma linha imaginária, como na dança das ondas de Iemanjá.

Nas danças sagradas tudo tem um sentido e um significado. Assim, os orixás jovens pulam dançando, e interrompem os movimentos com paradas repentinas e nervosas

como Oiá-Iansã ou Ogum, demonstrando mais energia, enquanto os orixás mais velhosdançam com mais calma e com movimentos mais contínuos, como Oxalá ou NanãBuruku. Os orixás guerreiros dançam com uma postura mais ereta, com pulos nosmomentos mais dramáticos e alcançando com o corpo mais espaço, seja na linha verticalseja na horizontal, enquanto as divindades velhas dançam curvadas na direção do chãoÉ o caso de Omolu ou de Nanã Buruku, cuja gestualidade expressa sua ligação com osancestrais e com o retorno à terra,aiê , ao orum , o não conhecível.

Em geral todas as danças dos orixás possuem as seguintes características:1) a importância do grupo que fortifica a ligação entre os fiéis e oferece a possibilidadede ver a própria imagem refletida como num espelho, dançando os mesmos passos com osirmãos-de-santo e a possibilidade de individualizar-se no transe,dançando por si e para os outros a própria identidade rítmica;

2) a relação com o elemento terra, a mãe terra que alimenta e que é a base dos homenssendo o lugar dos ancestrais;

3) a importância do ritmo que como explica Belinga (1994) é o próprio “verbo” e tem

assim a função de chamar e de organizar a desordem, o momento da crise seja anível macrocósmico, seja a nível microcósmico;

4) a simplicidade dos movimentos que podem ser repetidos ciclicamente e que ajudamo fiel a si concentrar sobre si mesmo para permitir a descida da divindade e a suafixação no corpo;

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5) a oferta de uma simbologia dançada, cantada, tocada que permite à iniciada dar umaresposta ao não-senso do sofrimento traduzindo a dor na linguagem do mito.

No ritual, a dança não pode existir sem a música e vice-versa, porque um é para o outroum “call and response” a nível energético. O rum, o tambor mestre, na dança do transe

dialoga com o orixá, a filha-de-santo possuida. Otime-line não é fixo, mas segue adança e a dança segue os mandamentos do tambor. Na dança e na realização da música a idéia fundamental é de estar em harmonia consigomesmo e com o resto do grupo, tendo a comunidade uma maior possibilidade desobrevivência quando todos os fiéis participam. Sendo a música tão importante, assimsão os sacerdotes-músicos, osalabés que aprendem o repertório ao longo do tempo. Sãoeles que podem chamar a comunidade e sobretudo os orixás a descer na festa, são eles

que ajudam os fiéis acair no santo acelerando os ritmos, e que encerram a festa comum toque especial.A dança sobretudo na primeira parte do ritual, no xirê , é um tipo de meditação dinâmicae por isso dança-se “pequeneninho”, com a função de se concentrar. Os toques dosorixás poderiam ser comparados a ummantra que ajuda a se focalizar no próprio eixo.A percussão dos pés, a repetição dos mesmos movimentos sustentados pelos ritmos dostambores, obriga o corpo a se centrar e a seguir o ritmo que do exterior liga-se aointerior, parando o fluxo do pensamento cotidiano e obrigando o fiel a se relacionar com

o interior, por isso na dança os olhos estão fechados a simbolizar que o olhar é voltado para o interior.Conforme já observado através da dança e da música pretende-se parar o fluxo do tempo para poder voltar ao momento do mito, onde tudo começou e onde pode-se agir com aajuda da magia para poder reequilibrar as energias, como era no começo e sempre será.O ritual todo é um esforço para voltar ao “começo”.

O tempo é o tempo circular do mito que começa e acaba no mesmo ponto, ciclicamente

e ritmicamente seguindo os ritmos da natureza, dia-noite, sol-lua, estações, etc. Otempo, nesse sentido é movimento, é a materialização do movimento, como diz Duplan(1987): "para marcar o tempo, temos que agir, batendo sobre um tambor com a mão ousobre o chão com os pés. Criando o tempo, criamos o movimento."

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O espaço sagrado é o “campo” do culto, o lugar no qual o caos transforma-se em cosmotornando possível a vida humana, por isso é polissêmico. Existem dois espaços, uminterior, o próprio corpo da filha-de-santo, receptáculo do sagrado, sagrado ele mesmo,e um externo obarracão. Esses dois lugares são o teatro da transformação ritual. Neles

o fiel deixa o mundo cotidiano e alcança o encontro tão assustador, mas tão desejadocom o divino. É só no espaço sagrado continente que ele pode voltar à totalidade ecomunicar-se com a divindade.

A dança desenha não só o percurso do corpo no espaço para chegar ao divino, mastambém percorre a planta arquitetônica do templo, desenhando o caminho para alcançao sagrado. O espaço sagrado, obarracão, durante a dança, é preenchido com os corposem movimento que expressam as várias possibilidades no espaço do divino e a liberdade

do homem em se movimentar para todas as direções. A divindade e o homem podemutilizar uma estrada curvilínea ou um caminho que prevê varias mudanças de direções.

OS RITMOS SINCOPADOS

A síncope, outra característica típica da música africana e do candomblé é o efeitorítmico produzido pelo prolongamento ou deslocamento do acento do tempo fraco aotempo forte.O prolongamento do acento faz com que não exista uma percussão na batida forte.Assim, produz-se uma quebra da expectativa por uma batida forte e por isso verifica-seum choque. Os ritmos sincopados quebram a ordem dos ritmos esperados e criam assimum novo padrão de ordem. O nosso corpo, o coração, o nosso andar obedecem a umfuncionamento rítmico isócrono. A falta desse ritmo provoca um choque, umasensação de caída. Simbolicamente nos fala da possibilidade das coisas não acontecersempre na mesma forma, e obriga o corpo ao movimento. O ritmo sincopado proposto

num modo obsessivo adquire, no contexto ritual, uma grandíssima importância porquealtera a expectativa do padrão rítmico, movimentando os acentos do tempo forte para otempo fraco. Abre assim, talvez, a porta a outras dimensões, indicando metaforicamenteoutras vias de conhecimento; vias que requerem o corpo e não apenas a mente.Contribui, junto com outras componentes do rito a abrir as portas doorum , oinconhecivel.

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Esse movimento contínuo da sincope pode simbolizar o ritmo do universo e de todos osseres que o habitam: “que movimentam-se entre os dois centros da vida e da morte,....Essa polarização indica o movimento contínuo e a circulação doaxé , a energia vital, aqual é a única ...a dar um sentido à música e ao canto entoado pelas filhas ou filhos-de-

santo ”. (Luz, 1995:571). Segundo Sodré, a síncope contribui a dar uma idéia de umtempo homogêneo capaz de voltar continuamente sobre ele mesmo, onde cada fim é ocomeço cíclico de uma situação. (1979:21, cit de Luz, 1995: 567)A síncope produz simbolicamente uma ação cíclica que liga-se ao conceito de

reversibilidade do tempo e do espaço no mito, que permite aos fieis voltar naquele tempo e, assim, se juntar a energia do orixá. Essa volta não é umasimples emoção, mas produz efeitos físicos no organismo, na respiração, no

movimento, muito mais fluido, enfim no corpo todo.

CONCLUSÃO

O conceito de doença é algo de muito difícil a ser definido no candomblé, porque emgeral qualquer desordem ou modificação da normalidade tem a ver com o ladoespiritual. Conforme observei, no candomblé o orixá pode chamar o fiel de váriasmaneiras, muitas vezes através de uma doença ou de uma desordem psíquica. Se adivindade exige ser feita, a filha-de-santo será iniciada, obtendo em vários casos a curada doença e um maior equilíbrio psicológico. O tratamento é em grande medidaconduzido através da música que põe em comunicação a terra, oaiê com o mundoespiritual, oorum ; o exterior e o interior.A cura da doença na terapêutica do candomblé representa um aspecto muito fascinantee é oposta à terapêutica oficial, onde o doente é privado do próprio corpo que na maioriadas vezes é fragmentado e sem uma própria historia. No candomblé, o sofrimento éinscrito numa rede de relações que consegue juntar a experiência pessoal, social e

sobrenatural, oferecendo uma explicação e um tratamento mais abrangente da própriador.

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É um tratamento que utiliza basicamente o elemento sonoro - musical22. A músicacoloca o fiel em uma nova dimensão existencial, a da experiência religiosa, protegendoo no contexto ritual. No momento em que existe uma harmonia entre a musica interior e aquela dos

tambores, advém o conhecimento do outro, do divino e através do outro de si. Apareceassim o conceito do “duplo” divino; a filha-de-santo , deixando-se possuir, cria elamesma o “outro” e nesse processo de criação-incorporação o experimenta intensamentedentro de si, até ela mesma possui-lo, até inscrevê-lo no próprio corpo como uma novaidentidade-rítmica interior a qual poderá fazer referência ao longo da sua vida.No candomblé é através do corpo que o homem começa o caminho da cura e do

conhecimento religioso. É no corpo que vivem as experiências e unem-se as várias

informações simbólicas sobre o mundo; é no corpo que, vivendo as energias sagradas, ofiel pode comunicar com o divino. O corpo com a iniciação age primeiro no mundosagrado depois no mundo cotidiano através uma gestualidade e uma dança aprendidas aolongo da estadia no terreiro e interage dinamicamente com o espaço e com o tempo aosquais dá novos sentidos e novas direções. Na dança de possessão, o corpo possuído pelo orixá, como relata Galimberti: “habita omundo. Um habitar que não é conhecer, mas se sentir em casa” (1993:69). O espaço nãoé um espaço posicional (no qual o corpo posiciona-se como objeto frente a outros

objetos), mas situacional (no sentido de ser vivido pelo corpo com todos os sentidos) porque se mede a partir da situação na qual o corpo se encontra. É um espaço que existe porque esse corpo existe, assim que o corpo não é um grão de areia no espaço, pois nãoexistiria espaço se ele não existisse. Desde o corpo é possível tomar todas as direçõesno espaço. Esse espaço corpóreo (considerando o espaço realmente vivido e conhecidosensualmente) não tem um significado só teórico, mas traz consigo os traços dossentimentos pessoais, das necessidades sociais e dos elementos emotivos, como os de terlugares conhecidos onde o corpo pode voltar. No espaço cada objeto, cada planta, cada parte do corpo humano remetemsimbolicamente a outras coisas. Assim como a coluna sagrada presente em váriosterreiros liga oaiê , a terra aoorum, o mundo sobrenatural, a coluna vertebral liga acabeça, oori com os pés, a ancestralidade, permitindo ao longo do transe de voltar ao22 A música influencia especialmente a dimensão corpórea e os processos psicocorpóreos, conforme as pesquisas recentes em musicoterapia.

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tempo da origem quando não existia o corte entre o mundo dos homens e aquele dasdivindades. No candomblé o corpo aprende a conhecer a própria origem e a própria essência não sócomo mero conceito cognitivo, mas através da experiência direta e vivida das emoções

que o formam.Cada homem possui o próprio duplo sonoro noorum que encontra no momento da possessão que aprende a conhecer e a expressar através da música e da dança, aprendidaem momentos específicos e num estado alterado de consciência para dar a possibilidadede construir uma nova identidade. A musica dos atabaques conduz o fiel em umaviagem simbólica que o transforma. A filha-de-santo possui, dançando o próprio ritmo,o próprio tempo e o próprio espaço.

A percussão dos tambores, como sublinha Duplan23

é a materialização do tempo e ter consciência do tempo é conhecer a historia da própria família, é saber de ser um anelnuma corrente infinita que originou-se com o primeiro ancestral mítico do qual ohomem é uma parte.As danças ligadas estreitamente à música, permitem a presença viva, partícipe econsoladora da divindade entre os homens. Através das coreografias e através acontração e a expansão dos movimentos o orixá expressa a própria qualidadeenergética, percebível só pelas iniciadas. A dança e a música expressam a divindade

numa única imagem onde conteúdo e forma se interligam estreitamente. Esta unidade sóé alcançada em momentos específicos, construídos ritualmente, seguindo modelosculturais que repetem-se no tempo. É transmitida através da experiência corporal emusical porque os conteúdos são tão profundos que não poderiam ser comunicados sócom palavras. Eis porque o uso da linguagem não-verbal nos ritos remete a imagens esentimentos raramente expressos e por isso adquire um grande poder. Os gestos possuem um significado, um efeito restaurador que as simples palavras não podemoferecer.Vivendo o mito, dançando-o e cantando-o, o fiel consegue assumir, canalizar eexpressar os afetos e os próprios sentimentos; o ritmo das percussões que ressoa nointerior do corpo obriga o fiel ao ser, à presença e não à fuga que o homem experimentana frenesi do mundo contemporâneo.23 Duplan é dançarino e formador na área de dançaterapia. Ele fundou uma própria metodologiachamada Expression Primitive. Os seus conceitos são tomados dà Revista Arteterapia (1993).

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A comunicação com o mundo invisível através do transe permite de meter em ato e dedinamizar as experiências mitológicas favoráveis à cura, com a mobilização dasidentidades míticas que podem traduzir a doença e canalizá-la em novas experiênciascorporais no interior da estrutura continente do rito.

A música e a dança são terapêutica num sentido que não é através das palavras queadvém a cura, mas através das experiências emocionais vividas pelo corpo até aconstrução de uma nova identidade mais profunda que será a nova base daquele fiel.As percepções do corpo não são mais rejeitadas como algo de desconhecido, masaceitadas e experienciadas como algo de precioso e de aconselhador. Creia-se assimnovas possibilidades existenciais através de uma dialética que liga o exterior e o interiorEsses rituais articulam e ordenam novas “possibilidades existenciais”, favorecendo

assim uma nova organização e uma nova harmonia interna. Novas possibilidadesexistenciais que são oferecidas do externo: das outras filhas já iniciadas e dá Mãe-de-santo. As sacerdotisas “falam” à iniciada agindo com ela, dançam, cantam etransformam as velhas experiências em experiências preciosas.A iniciada recolhe essas novas informações passadas a nível não-verbal com as quaisacorda, vive e canaliza as próprias emoções. As iniciadas aprendem a reconhecer o próprio ritmo sonoro e ao acolhê-lo. Essa experiência não é puramente auditiva maisenvolve todos os sentidos. A possessão permite assim um jogo, uma ligação entre o

interior e o exterior. O fiel deixando-se possuir cria o outro e nesse processo de criação-incorporação o experimenta intensamente dentro de si até ele mesmo possui-lo. Otempo é movimento e criando o tempo cria-se o movimento que é vida,axé , energia devida, por isso o candomblé permite a presencia das divindades vivas, porque aclama avida como algo de precioso e sagrado que deve ser vivido agora e aqui .A arte executa aqui a parte do leão criando formas que simbolizam os sentimentoshumanos (Langer, 1980:40). O sofrimento e a desordem interna são acessíveis só atravésda linguagem dos símbolos quer dizer através da comunicação não-verbal. O ritmo, amusica, a dança, as cores permitem uma comunicação bem mais profunda do simplescomunicado explícito. O ritmo das palavras, o toque parecido a ummantra , aconcentração e a expansão do corpo, o nível de verticalidade e de horizontalidade, o usodo espaço, o uso do tempo, da música e da dança oferecem à filha-de-santo a

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possibilidade de construir e viver a própria identidade-ritmo, através uma pluralidade demeios impregnados de emoção e não transmitidos mecanicamente.

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