A sala de aula sobre o olhar do construtivismo Piagetiano: Perspectivas e Implicações

9
A SALA DE AULA SOB O OLHAR DO CONSTRUTIVISMO PIAGETIANO: PERSPECTIVAS E IMPLICAÇÕES Gisele Rizzon i Resumo: O presente artigo aborda um assunto bastante recorrente nos últimos anos: o processo de conhecer e suas implicações no agir docente. Uma das premissas deste artigo é o entendimento de que todo pensar pedagógico está impregnado por uma crença epistêmica. Dito de outra maneira, seria o mesmo que afirmar que há uma repercussão direta na ação pedagógica, conforme é compreendido o processo de aquisição do conhecimento. A Epistemologia Genética é o ancoradouro teórico do estudo apresentado neste texto. Tal epistemologia foi criada pelo pensador suíço Jean Piaget (1896- 1980), e ele, mesmo não sendo um pedagogo, mas por várias vezes envolvido em estudos de tal natureza, defende que além do direito a educação, cada sujeito aprendente deve ter a possibilidade de acesso ao desenvolvimento pleno de suas funções cognitivas. Palavras-chave: Epistemologia Genética, Construtivismo, Agir Docente, Ato Pedagógico, Sujeito Aprendente. Abstract: This paper deals with an issue that has been quite recurrent lately: the process of knowledge and its implications on the actions of the teachers. One of the premises of this article is the understanding that every pedagogical thought is impregnated with an epistemic belief. In other words, it would be the same as saying that there is direct repercussion on the pedagogical action, according to what is understood as the process of knowledge acquisition. Genetic Epistemology is the theoretical anchorage of the study presented here. Such epistemology was created by the Swiss thinker Jean Piaget (1896-1980), and - although he was not a pedagogue, but because he was several times involved in studies of that nature – in addition to the right for education, he claims that each learning subject should have the possibility to access full development of their cognitive functions. Keywords: Genetic Epistemology, Constructivism, Teaching Action, Pedagogical Act, Learning Subject. A sala de aula, um espaço instituído na escola, sendo esta uma instituição caracteristicamente moderna 1 , pode ser entendido como o lugar o qual os sujeitos se reúnem para aprender. Certo ou errado? Ou melhor, para que não se fique em questões tão objetivas que possam escamotear possíveis singelas ramificação, pode ser entendida sob esta ótica, mas não apenas, uma vez que é importante que a sala de aula seja vista como espaço destinado à aprendizagem, mas não é o único. Não se pretende, neste momento, entrar no mérito da 1 Cf. Cambi (1999).

description

RIZZONI, G. 2010. O presente artigo aborda um assunto bastante recorrente nos últimos anos: o processo de conhecer e suas implicações no agir docente. Uma das premissas deste artigo é o entendimento de que todo pensar pedagógico está impregnado por uma crença epistêmica. Dito de outra maneira, seria o mesmo que afirmar que há uma repercussão direta na ação pedagógica, conforme é compreendido o processo de aquisição do conhecimento. A Epistemologia Genética é o ancoradouro teórico do estudo apresentado neste texto. Tal epistemologia foi criada pelo pensador suíço Jean Piaget (1896- 1980), e ele, mesmo não sendo um pedagogo, mas por várias vezes envolvido em estudos de tal natureza, defende que além do direito a educação, cada sujeito aprendente deve ter a possibilidade de acesso ao desenvolvimento pleno de suas funções cognitivas.

Transcript of A sala de aula sobre o olhar do construtivismo Piagetiano: Perspectivas e Implicações

A SALA DE AULA SOB O OLHAR DO CONSTRUTIVISMO PIAGETIANO: PERSPECTIVAS E IMPLICAES Gisele Rizzoni Resumo:O presente artigo aborda um assunto bastante recorrente nos ltimos anos: o processo de conhecer e suasimplicaesnoagirdocente.Umadaspremissasdesteartigooentendimentodequetodopensar pedaggico est impregnado por uma crena epistmica. Dito de outra maneira, seria o mesmo que afirmar que humarepercussodiretanaaopedaggica,conformecompreendidooprocessodeaquisiodo conhecimento.AEpistemologiaGenticaoancoradourotericodoestudoapresentadonestetexto.Tal epistemologia foi criada pelo pensador suo J ean Piaget (1896- 1980), e ele, mesmo no sendo um pedagogo, mas por vrias vezes envolvido em estudos de tal natureza, defende que alm do direito a educao, cada sujeito aprendente deve ter a possibilidade de acesso ao desenvolvimento pleno de suas funes cognitivas. Palavras-chave: Epistemologia Gentica, Construtivismo, Agir Docente, Ato Pedaggico, Sujeito Aprendente. Abstract: This paper deals with an issue that has been quite recurrent lately: the process of knowledge and its implications on the actions of the teachers. One of the premises of this article is the understanding that every pedagogical thought is impregnated with an epistemic belief. In other words, it would be the same as saying that thereisdirectrepercussiononthepedagogicalaction,accordingtowhatisunderstoodastheprocessof knowledge acquisition. Genetic Epistemology is the theoretical anchorage of the study presented here. Such epistemology was created by the Swiss thinker J ean Piaget (1896-1980), and - although he was not a pedagogue, but because he was several times involved in studies of that nature in addition to the right for education, he claimsthateachlearningsubjectshouldhavethepossibilitytoaccessfulldevelopmentoftheircognitive functions. Keywords: Genetic Epistemology, Constructivism, Teaching Action, Pedagogical Act, Learning Subject. Asaladeaula,umespaoinstitudonaescola,sendoestaumainstituio caracteristicamente moderna1, pode ser entendido como o lugar o qual os sujeitos se renem para aprender. Certo ou errado? Ou melhor, para que no se fique em questes to objetivas que possam escamotear possveis singelas ramificao, pode ser entendida sob esta tica, mas no apenas, uma vez que importante que a sala de aula seja vista como espao destinado aprendizagem,masnoonico.Nosepretende,nestemomento,entrarnomritoda 1 Cf. Cambi (1999). diferenciao do ensino formal e no formal, mas apenas diferenci-los para fins de melhores entendimentos. Sendo assim, o primeiro entendido como aquele sistematizado, gerido por mtodos e propostas pedaggicas e o segundo, aquele, que acontece como quase que sem percebernodecorrerdasvivnciasdirias,massemumdelineadoespaodestinado especificamente a aprendizagem. Contudo, em algumas circunstncias, o propsito da sala de aula como um espao para aprender tomado de uma forma muito fria e estanque. Diz-se isso na medida em que o espaosaladeaula,oespaoaprendizagemreduzidoareproduo,memorizaoe revisitaodecontedosprontoseisoladose,porvezes,compoucasignificaoparao aprendente. Quando na realidade, necessrio que se perceba a sala de aula como [...] um espao de vida no qual se faz histria, que construda e reconstruda a cada dia. um lugar onde se tomam decises e se constroem um fazer solidrio, no qual todos tm o que aprender eensinaraooutro(COLLARES,2003,p.53).umespaodoaprender,sim,maseste aprender no arbitrrio, no desptico, uma vez que o aprender natural ao ser humano, e a sala de aula e a escola nada mais so do que espaos destinados para tal fim, e no espaos para artificializar a naturalidade. Sendo um espao socialmente constitudo com fins prprios e especficos, a sala de aula, no decorrer dos tempos, foi se caracterizando e tomando determinadas modelagens. Acredita-sequeestasdiferentesmodelagensdasaladeaulaestejamdiretamente relacionadascomapercepoepistemolgica2,tidacomoverdadeira,emcadamomento histricoe/ouapartirdeconvicesprpriasdosresponsveispelogerenciamentodestes espaos. O entendimento do que o conhecimento e de como ele adquirido tambm muda a percepodasaladeaula.Seoconhecimentoentendidoapartirdeumaperspectiva epistemolgica empirista, o qual tido como sendo uma cpia da realidade3 ou ainda, dito [...] que ele vem de fora, est na sociedade, os outros os possuem e nos transmitem, enquanto que ns nos limitamos a nos apoderar dele e incorpor-lo [...] (DELVAL, 2007, p. 116), evidente que a sala de aula ser organizada para que estes fins sejam alcanados. Em contra partida, se for compreendido que o [...] conhecimento provm do sujeito e no pode vir da experincia. A prpria capacidade de aprender no pode ser resultado de nossa experincia. [...](Ibidem,p.117),comodefendeaepistemologiadecunhoinatista,asaladeaula, 2 Epistemologia ou Teoria do Conhecimento (GRAYLING, 2002). 3 Cf. Delval (2007). enquanto espao para aprender, no ser a mesma daquela da epistemologia emprica. Isso acontece pelo simples fato que o conhecimento parte de lugares distintos, no empirismo ele est na experincia e no inatismo no prprio sujeito. ParaopensadorsuoJ eanPiaget(1896-1980)omesmoentendimento epistemolgico apresentado acima pode ser percebido nas pesquisas psicolgicas acerca do desenvolvimentodaintelignciaedasestruturascognitivas,sendoestasdiretamente influentessaplicaespedaggicas.Paraele,possvelidentificartrsdirees epistemolgicas, sendo as duas primeiras assim descritas: Uma delas, fiel as velhas tradies anglo-saxnicas, continuaorientadaparaum associacionismoempirista, o que reduziria todo o conhecimento a uma aquisio exgena, a partir da experincia ou das exposies verbais ou audiovisuais dirigidas pelo adulto. Asegundasecaracterizaporumretornoinesperadoaosfatoresde inatismo e maturao interna [...]; sendo assim, a educao se resumiria em grande parte no exerccio de uma razo j preformada de sada. (PIAGET, 1998, p. 10). Percebe-se,portanto,apartirdoquePiagetafirma,acertadasdireesqueas aplicaespedaggicaspodemtomardependendodacorrenteepistemolgicaeleita,assim comodoentendimentopsicolgicododesenvolvimentocognitivoquesetomacomo verdadeiro,queambas,aepistemologiaempricaeainatista,porsis,nodocontade explicar todo o processo de conhecer realizado pelo sujeito cognoscente. Em ambas, para ele, h lacunas. Lacunas, estas, que podem ser minimizadas quando princpios da epistemologia emprica forem agregados aos da inatista. desumaimportncia,esclarecerqueesteagregarquefoimencionado anteriormente, no tem um carter de, pura e simplesmente, sala de frutas. Num sentido que somenteprecisojuntarprincpiosdediferentesepistemologias,epronto,umanovaest elaborada.AEpistemologiapiagetianacr,sim,naimportnciadaexperinciaparao conhecimento,assimcomo,colocaosujeitocomopartefundamentalparaesteprocesso cognitivo.Masagrandediferenaentreoempirismo,assimcomooinatismo,quanto entendidos de forma clssica, a radicalidade e a fora que designam experincia, assim como para o sujeito do conhecimento, respectivamente. NacitaoanteriorPiagetfazmenoatrsdireesepistemolgicas,asduas primeiras, a empirista e a inatista, acima j foram comentadas. A terceira ele designa como sendo a sua prpria epistemologia, e d a ela uma natureza construtivista. Segundo ele: Aterceiradireo,quedecididamenteanossa(equenoslevaaatribuiros comeosdalinguagemsestruturasconstrudaspelaintelignciasensorial preexistente),denaturezaconstrutivista,isto,sempreformaoexgena (empirismo) ou endgena (inatismo) por contnuas ultrapassagens das elaboraes sucessivas, o que do ponto de vista pedaggico, leva incontestavelmente a dar toda nfase s atividades que favoream a espontaneidade da criana. (PIAGET, 1998, p. 11). V-se, portanto, que no entendimento epistemolgico piagetiano o conhecimento elaboradopormeiodeumaconstruocontnua4,isto,elenoseencontraprontoe acabado, nem no meio exterior nem no sujeito do conhecimento. Mas sim h uma elaborao, queseutilizadeelementosendgenos(internos)eexgenos(externos)dosujeito,dessa maneira o conhecimento se d na relao entre eles5. Em outras palavras, na tese central do construtivismo, [...] o conhecimento no tem sua gnese nem no sujeito, nem no objeto, mas resultadasinteraesestabelecidasentreosujeitoeobjetopelaaodosujeito.[...] (COLLARES, 2003, p. 49).Como o conhecimento uma construo, na perspectiva epistemolgica piagetiana, o desenvolvimento cognitivo do sujeito cognoscente pode ser representado por um espiral ascendente,eesteestariadivididoporEstgiosdoDesenvolvimento6,conformedesigna Piaget. Os Estgios do Desenvolvimento piagetiano que seguem uma linearidade progressiva, isto,oestgioposteriorsednamedidaemqueoanteriorlheproporcionarcondies fsicas e cognitivas para tal. Neste sentido, cada estgio [...] comea por uma reconstruo, em um novo plano, das estruturas elaboradas no curso do precedente, e esta reconstruo necessria s construes ulteriores que ultrapassam o nvel precedente [...] (PIAGET, 2003, p.172).Dessaforma,conformeasconcepespiagetianasnohelaboraescognitivas isoladas e a ermo. 4 Cf. Collares (2003, p. 16). 5 Esta interdependncia entre o sujeito e objeto, existente na teoria de Piaget, que vai definindo tambm a interdependncia dos mtodos de investigao da constituio da prpria cincia, estabelece um processo no qual apresenadosujeitocomoconstrutordoconhecimentotorna-seevidente,tantonointeriordesi,comona relao com os outros, em sua historicidade. [...] (COLLARES, 2003, p. 32). 6 [...] trs grandes perodos no caso da inteligncia operatria: A. Um perodo sensrio motor (do nascimento at 1 a 2 anos) no curso do qual se organizam os esquemas sensrio-motores at atos de inteligncia prtica com compreenso imediata [...] e subestruturas prticas das futuras noes [...]. B. Um perodo que comea com o aparecimento da funo semitica [...] e com uma fase operatria de representao pr-operatria [...] mas chegando, desde os 7 ou 8 anos, constituio das operaes chamadas concretas, porque se referem ainda a objetos[...].C.Umperodoquecomeaaos11a12anos,caracterizadopelasoperaesproposicionais (implicaes, etc.) com sua combinatria e suas transformaes segundo um grupo de quaternalidade, que rene em um nico sistema as duas formas elementares de reversibilidade (inverso ou negociao e reciprocidade). (PIAGET, 2003, p. 28). A natureza da constituio do conhecimento na Epistemologia piagetiana ativa. Diz-seativaumavezqueosujeitoparticipantedoseuprocessodeconhecer.Ele compreende, ele inventa, ele cria, ele constri, ele reconstri, enfim o conhecimento no recebidoprontoporele,nemmesmoestnele.Oconhecimentoporeleelaborado.Nas palavras piagetianas: [...]osconhecimentosderivamdaao,nonosentidodemerasrespostas associativas, mas no sentido muitomaisprofundo da associao do real com as coordenaes necessrias e gerais da ao. Conhecer um objeto agir sobre ele e transform-lo, apreendendo os mecanismos dessa transformao vinculados com as aes transformadoras. [...] (PIAGET, 1970, p. 30). Neste sentido, para Piaget o processo de conhecer caracteriza-se pela sua natureza de construoativa.Esseprocessoconstrutivodecunhocognitivosobumolharpiagetiano implicaaexistnciademtodosativos.Estes,podemserdescritoscomoaquelesque conferem [...] especial relevo pesquisa espontnea da criana ou do adolescente e exigindo-se que toda verdade a ser adquirida seja reinventada pelo aluno, ou pelo menos reconstruda e nosimplesmentetransmitida.[...].(PIAGET,1998,p.15).Percebe-se,portanto,o envolvimento do sujeito no seu processo cognitivo. Noentanto,oquesepodeperceber,principalmentequandoestaperspectiva epistemolgica vista por meio de um olhar pedaggico, mais especificamente no que se refere a meno da importncia do mtodosativos, a possvel distoro do entendimentos destes,tomando-oscomomtodospedaggicodemaneiraequivocada.Oequvocose apresentaumavezquealgunsestudiososeeducadoresinterpretamoschamadosmtodos ativos de Piaget, como se o agir docente, nestes, devesse se constituir em um laisserfaire, devido, principalmente, a suposta destituio do papel do professor. No entanto, na pedagogia ativa, a funo deste se amplia, pois ele tido como sendo o promotor e o articulador do processo de conhecer do sujeito aprendente. Nas palavras de Piaget (Ibidem), [...] o que se deseja que o professor deixe de ser apenas um conferencista e que estimule a pesquisa e o esforo, ao invs de se contentar com a transmisso de solues j prontas.O sujeito aprendente na perspectiva epistmica-pedaggica piagetiana atua junto ao seu processo cognoscente na mesma medida em que respeitado, no que se refere ao seu desenvolvimentopsicolgico.Nestesentido,concomitanteaaodoeducadordecria situaesparaqueosujeitoaprendentepossacompreender,inventar,reconstruir,enfim, conhecer, ele, o docente, tem cincia e respeita o desenvolvimento cognitivo deste. Assim, a epistemologia piagetiana de cunho construtivista, por designar que o [...] conhecimento se dporumprocessodeinteraoradicalentreosujeitoeoobjeto,entreoindivduoea sociedade, entre o organismo e o meio. (BECKER, 2001, p. 36). E o papel do docente fundamental neste processo de interao, atuando como promotor deste. Retomando, brevemente, a viso pedaggica que proporcionam as epistemologias: emprica, inatista e construtivista v-se que em cada qual se apresenta um tipo de sala de aula. evidente que quando se cita sala de aula, neste momento, assim como nos anteriores, no se estmencionandooespaofsico,esimolugarsocialmentedesignadoparaoatode aprender, dentro de uma formalidade. V-se, tambm, que mesmo em ambas haver o intuito da promoo da educao, esta vista sob ticas diferentes. Tanto nos modelos pedaggicos que primam por uma epistemologia emprica ou inatista o sujeito passivo, pois espera que o conhecimento venha at ele ou emirja dele, respectivamente. J na de cunho construtivista, comoaEpistemologiapiagetiana,oconhecimentoacontecenarelaoentreosujeitodo conhecimento e o objeto a ser conhecido, h a presena, impretervel, da ao. Piaget, por meio dos seus estudos biolgicos, filosficos e psicolgicos, elaborou a EpistemologiaGenticaquetinhacomoobjetodeestudoabuscaporumaexplicao, plausvel,sobreagnesedoconhecimento.Apesardeteratuadoeminstituiese organizaescomfinspedaggicos,cita-se:InstitutoJ ean-J acquesRousseauenoBureau Internacional de Educao, Piaget no foi efetivamente um pedagogo, contudo, seu pensar epistmico e sua psicologia gentica muito contriburam para a elaborao de uma pedagogia ativa.Pormeiodapedagogiaativa,Piagetobjetivapor[...]levaracrianaareinventar aquilo de que capaz, ao invs de se limitar a ouvir e repetir [...] (PIAGET, 1998, p. 17), isto , a atingir o seu pleno desenvolvimento cognitivo. Em outros termos, seria o mesmo que afirma que: odesenvolvimentodoserhumanoestsubordinadoadoisgruposefatores:os fatores da hereditariedade e adaptao biolgica, dos quais depende a evoluo do sistemanervosoedosmecanismospsquicoselementares,eosfatoresde transmisso ou de interao sociais, que intervm desde o bero e desempenham um papel de progressiva importncia, durante todo o crescimento, na constituio dos comportamentos e da vida mental. Falar de um direito educao pois, em primeirolugar,reconheceropapelindispensveldosfatoressociaisnaprpria formao do indivduo. (Ibidem, p. 29). Piaget expe, muito claramente, a expresso direito educao, e, tambm, coloca umasignificativaressalva:somenteterodireitoaeducaonobasta,importantee necessrioqueestaeducaotenhacomofinsodesenvolvimentoplenodasfunes cognitivas do sujeito aprendente. Tal expresso j proferida na Declarao Universal dos DireitosdoHomem,promulgadapelaONUem1946,maisespecificamentenoartigo26, destinado educao. Neste artigo consta, clara e diretamente, que: toda a pessoa tem direito aeducao,emtrechoposterioracrescenta:aeducaodevevisaraopleno desenvolvimento da personalidade humana e o fortalecimento do respeito pelos direitos do homem e pelas liberdades fundamentais. Por meio e um olhar piagetiano faz-se os seguintes questionamentos: suficiente o oferecimento de uma educao gratuita? O crescente nmero de ofertas de vagas escolares, assim como o prolongamento da escolaridade, so atitudes governamentais suficientes para o alcance de uma proposta que prime pelo projeto: educao para todos? Por fim, existem bons alunos e maus alunos, ou h um mtodo adequado para cada tipo de aluno? Para Piaget, a estes questionamentos cabe a seguinte afirmao: Afirmar o direito a pessoa humana educao pois assumir uma responsabilidade muito mais pesada que a de assegurar a cada um a possibilidade da leitura da escrita e do clculo: significa, a rigor, garantir para toda a criana o pleno desenvolvimento de suas funes mentais e a aquisio dos conhecimentos, bem como dos valores morais que correspondam ao exerccio destas funes, at a adaptao vida social atual. [...] (PIAGET, 1998, p. 34). Nesse sentido, e sob um olhar filtrado pelos princpios da Epistemologia Gentica, nobastapuraesimplesmenteumaeducaoparatodosnosentidodeapenasdispora todos os aprendentes um espao dentro de uma sala de aula. Mas ir alm, pensar que sala de aula essa? Que espao esse? Que fins ele apresenta?Da mesma maneira como Piaget j afirmou: o ato pedaggico deve ter como fim o pleno desenvolvimento das funes cognitivas do sujeito aprendente, para isso importante analisarquesaladeaulatem-seconstituda.Fala-seemsaladeaulapelosprincpios apresentados no incio do estudo, e por ver este espao como aquele socialmente designado para o ato de aprender, ento ele precisa, minimante cumprir com sua funo social. Dessa formainterroga-se:bastatodosossujeitosaprendentesteremumasaladeaulapara freqentar,seesta,pormotivosmil,noseconstituiemumespaodedesenvolvimento cognitivo pleno ao seu ocupante?Neste sentido faz-se uma chamada no somente aos rgos governamentais para que estes promovam polticas pblicas objetivando o direito de todos os cidados a educao, mas sim, e principalmente, faz-se um alerta aos educadores, que por meio do seu ato pedaggico, desenvolvam, sim, em seus estudantes potencialidades cognitivas plenas. Faam da escola, das salas de aula, um verdadeiro espao do aprender. Para que os aprendentes vejam nelas um verdadeiro trampolim rumo s conquistas cognitivas, que, com grande probabilidade, no futuro, se tornaro conquistas pessoais de ordem: social, intelectual e profissional. Dessaforma,voceducador,queopromotorearticuladordosmomentosde aprender da sala de aula, que por meio do seu agir docente, do seu pensamento epistmico, e, impreterivelmente, do seu fazer pedaggico disponibilize aos estudantes, que por natureza so vidos aprendentes, a gua que sacia a sua sede de conhecer. Olhem para as suas salas de aulaesequestionem:Queespaoesse?Comooocupo?Quaissoaspossibilidadede desenvolvimento cognitivo que ele me proporciona e eu as acolho? Enfim, que por meio de um olhar epistemolgico de cunho piagetiano, constituam os vossos espaos de maestria, a sala de aula, num verdadeiro espao do aprender. REFERNCIAS BECKER, Fernando. Educao e construo do conhecimento. Porto Alegre: Artmed, 2001. CAMBI, Franco. Histria da pedagogia. Traduo de lvaro Lorencini. So Paulo: Fundao Editora da UNESP (FEU), 1999. COLLARES, Darli. Epistemologia gentica e pesquisa docente: estudo das aes no contexto escolar. Lisboa: Instituto Piaget, 2003. DELVAL, J uan. Aprender investigando. IN: BECKER, Fernando; MARQUES, Tnia B. I. (Org.) Ser professor ser pesquisador. Porto Alegre: Mediao, 2007. GRAYLING, A. C. Epistemologia. IN: BUNIN, Nicholas; TSUI-J AMES, E. P. Compndio de Filosofia. So Paulo: Loyola, 2002. PIAGET, J ean. Psicologiaepedagogia. Traduo de Dirceu Accioly Lindoso e Rosa Maria Ribeiro da Silva. So Paulo e Rio de J aneiro: Editora Forense, 1970. ______. Paraondevaiaeducao? Traduo de Ivete Braga. 14 ed. Rio de J aneiro: J os Olympio, 1998. ______. Biologiaeconhecimento: ensaio sobre as relaes entre as regulaes orgnicas e osprocessoscognoscitivos. Traduo de Francisco M. Guimares. 4 ed. Petrpolis: Vozes, 2003. i Mestre em Educao, Especialista em Educao a Distncia e Pedagoga pela Universidade de Caxias do Sul. Atuo como Tcnica de Apoio a Educao a Distncia na Universidade de Caxias do Sul e Docente da Rede Estadual de Ensino. Contato: [email protected].