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A RIGIDEZ ORÇAMENTÁRIA E SEUS IMPACTOS NO PLANEJAMENTO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS:
O EXEMPLO DO ESTADO DE MINAS GERAIS FELIPE MAGNO PARREIRAS DE SOUSA
GILMAR ÁLVARES COTA JÚNIOR GUILHERME PARENTONI SENRA FONSECA
RAPHAEL VASCONCELOS AMARAL RODRIGUES
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Painel 50/152 As finanças públicas estaduais: evolução, características e desafios da execução orçamentária no contexto de Minas Gerais
A RIGIDEZ ORÇAMENTÁRIA E SEUS IMPACTOS
NO PLANEJAMENTO DAS POLÍTICAS PÚBLICAS: O EXEMPLO DO ESTADO DE MINAS GERAIS
Felipe Magno Parreiras de Sousa
Gilmar Álvares Cota Júnior
Guilherme Parentoni Senra Fonseca Raphael Vasconcelos Amaral Rodrigues
RESUMO
Esse artigo busca analisar a evolução da composição orçamentária do Estado de
Minas Gerais, objetivando avaliar como as decisões tomadas nos últimos anos pelos governantes impactaram na disponibilidade de recursos orçamentários para livre
aplicação em políticas públicas. O objetivo principal foi, portanto, verificar como evoluíram as despesas de caráter obrigatório frente àquelas discricionárias, tentando avaliar nível de rigidez orçamentária alcançada pelo governo. Para tanto, foi
realizada uma pesquisa bibliográfica com o intuito de dar embasamento teórico ao estudo, que tem continuidade com uma análise quantitativa e qualitativa da
execução orçamentária mineira no período de 2007 a 2014. O resultado mostra que, dentro do período estudado, devido às grandes variações no contexto macroeconômico, decisões externas e às decisões tomadas pelos governantes, o
ciclo de ajuste fiscal percebido no passado dá lugar a um cenário de deterioração das contas públicas, gerando um comprometimento excessivo do orçamento de
Minas Gerais com suas despesas obrigatórias e vinculadas e comprimindo a disponibilidade orçamentária para ampliação de políticas públicas de caráter mais finalísticos.
Palavras-chave: Orçamento público. Rigidez orçamentária. Vinculação de receitas e
despesas. Despesas obrigatórias
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1 INTRODUÇÃO
Cada dia mais as definições sobre alocação de recursos em políticas
públicas têm se tornado demasiadamente complexas. Os representantes do povo,
responsáveis por essa tarefa, se deparam ano a ano com demandas crescentes da
sociedade, em um ambiente em que cada grupo social pressiona para que os seus
interesses sejam atendidos. Por outro lado, os recursos públicos para custear esses
interesses e políticas são escassos e têm se tornado ainda mais restritos ao longo
do tempo.
De certa maneira, algumas características do orçamento brasileiro
contribuem substancialmente para que essa dificuldade seja potencializada. Pode-se
dizer que principalmente dois aspectos do ponto de vista normativo fazem com que
a possibilidade de escolha dos governantes fique ainda mais engessada: a
excessiva vinculação de receitas e despesas; e a grande participação que os gastos
de caráter obrigatório têm tomado nas contas públicas.
Com o Estado de Minas Gerais a situação não é diferente. Após passar
por um período de ajuste fiscal entre os anos de 2003 e 2006, conhecido como
Choque de Gestão, período em que as contas públicas sofreram ajustes
consideráveis e acarretaram em uma melhora do resultado orçamentário de mais de
R$874 milhões de déficit em 2002 para um superávit de pouco mais de R$80
milhões em 2006 (frente a uma despesa total de R$19,4 e R$29 bilhões,
respectivamente), o Estado sofreu nos anos seguintes uma deterioração de suas
contas públicas – ocasionada não só pela situação de desaceleração econômica
mundial, mas também por uma alteração na composição de suas despesas.
Essa piora no cenário mineiro ficou clara no início do ano de 2015,
quando os novos responsáveis pelo governo decidiram encaminhar alterações ao
Projeto de Lei Orçamentária Anual 2015 enviado anteriormente à Assembleia
Legislativa do Estado de Minas Gerais, revisando os números anteriormente
definidos. Nessa revisão feita, o resultado orçamentário do Estado previu para o
exercício um déficit de R$7,3 bilhões e uma despesa total fixada em R$88,6 bilhões.
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Considerando essa situação desfavorável às contas mineiras, e
observando os dois aspectos de engessamento orçamentário citados, o objetivo
desse trabalho é analisar como as despesas de Minas Gerais se compuseram ao
longo dos últimos oito anos, com a finalidade de verificar em que medida as
despesas obrigatórias (ou o crescimento delas) tem impactado o orçamento do
Estado, gerando a pressão deficitária percebida e uma maior rigidez no
planejamento governamental.
Para que o objetivo seja cumprido, foi feita uma análise da bibliografia
sobre a rigidez orçamentária, especialmente no que diz respeito às despesas
públicas (vinculações e obrigatoriedade de execução). Em seguida, com as
informações sobre a execução das despesas de Minas Gerais nos últimos oito anos,
foi feita uma análise quantitativa da composição dos gastos mineiros, dividindo-se os
dispêndios em dois grupos: despesas obrigatórias e despesas discricionárias.
Durante a análise quantitativa, um olhar qualitativo focado na maneira como a
composição dos gastos variou durante o período procurou identificar os principais
motivos para distorções excessivas.
2 RIGIDEZ ORÇAMENTÁRIA
As limitações impostas aos governantes por mecanismos vinculatórios
tornam o processo de planejamento de políticas públicas cada dia mais desafiante.
De certo modo, essa prática acaba retirando parte da liberdade de atuação dos
responsáveis pela alocação orçamentária, uma vez que destina recursos
diretamente a políticas previamente determinadas. De acordo com Giacomoni (2011)
“a cada novo exercício, resta menos espaço efetivamente decisório quando da
elaboração e da aprovação dos projetos de lei de planos e orçamentos públicos”.
(GIACOMONI, 2011, p.330).
Rezende e Cunha (2005) reforçam o problema de se esvaziar a agenda
de tomada de decisão e alocação orçamentária por parte dos governantes,
afirmando que quando se tem um orçamento muito engessado o instrumento fica
incapaz de ser definidor de prioridades públicas e de planejamento, além de se
tornar um dispositivo cercado por um alto grau de incertezas.
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Apesar de o início sobre a discussão da rigidez orçamentária brasileira
ser consideravelmente recente, Giacomoni (2011) afirma que o problema das
vinculações entre receitas e despesas não está restrito apenas ao governo
brasileiro, e esteve presente principalmente em épocas em que o orçamento não era
plenamente desenvolvido:
Na demorada e difícil luta do poder de representação contra o arbítrio do
soberano na cobrança e na aplicação das rendas públicas, o Parlamento inglês passou a autorizar a cobrança de tributo desde que especificada a destinação a ser dada ao recurso arrecadado. Na ausência de um
orçamento formal que reunisse receitas e despesas e ainda na fase em que os impostos eram autorizados anualmente, havia lógica e eficiência em aprovar a cobrança de determinado tributo visando a atender determinada
despesa, por exemplo, manter a armada real, financiar a guerra contra os holandeses e assim por diante. Nasceu, assim, com forte base na tradição, o mecanismo que vincula parcelas da receita a despesas específicas.
(GIACOMONI, 2011, p.331).
Especificamente no caso brasileiro, o autor afirma que parte do
engessamento criado por vinculações deve-se ao aumento de receitas de
contribuições criadas pela União nos últimos anos. Diferentemente das receitas
tributárias, que são influenciadas pelo princípio da não afetação das receitas1, as
contribuições são instituídas com finalidade específica. Uma das hipóteses
colocadas por Giacomoni é a de que o governo federal deu preferência pela criação
desse tipo de receita devido à regra constitucional que obriga a partilha de novos
impostos com Estados e Municípios.
A Figura 1 demonstra esse crescimento da vinculação dos recursos
brasileiros:
1 O princ ípio da não afetacação das receitas, de acordo com o sítio eletrônico do Senado Federal, diz que “todas as receitas orçamentárias devem ser recolhidas ao Caixa Único do Tesouro, sem qualquer vinculação em termos de destinação”. Disponível em <http://www12.senado.leg.br/
orcamento/glossario/principio-da-nao-afetacao-de-receitas>.
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Figura 1: Evolução da Rigidez Orçamentária Brasileira
Fonte: CâMARA, 2008, p.13
Pela figura é possível perceber que a partir da promulgação da
Constituição Federal de 1988 a participação de recursos vinculados em relação ao
todo tem um crescimento considerável. Até então, o princípio da não afetação era
aplicado a todos os tributos (inclusive taxas), com algumas ressalvas. A nova Carta
Magna trouxe ressalvas que tornaram comum a vinculação de receitas de impostos
a determinadas finalidades, como foi o caso dos recursos para manutenção e
desenvolvimento do ensino (MDE) e ações e serviços públicos de saúde (ASP).
Art. 167. São vedados:
IV – a vinculação de receita de impostos a órgão, fundo ou despesa,
ressalvadas a repartição do produto da arrecadação dos impostos a que se referem os arts. 158 e 159, a destinação de recursos para as ações e serviços públicos de saúde, para manutenção e desenvolvimento do ensino
e para realização de atividades da administração tributária, como determinado, respectivamente, pelos arts. 198, § 2
o, 212 e 37, XXII, e a
prestação de garantias às operações de crédito por antecipação de receita,
previstas no art. 165, § 8o, bem como o disposto no § 4
o deste artigo;
(BRASIL, 1988)
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Para a MDE a Constituição Federal de 1988 fixou, em seu artigo 212, que
Estados e Municípios devem aplicar no mínimo 25% dos recursos arrecadados com
impostos e transferências. No caso das ASP, o inciso II do a rtigo 77 fixa esse
mínimo em 12%.
No caso específico de Minas Gerais, além das vinculações criadas pela
Constituição Federal para aplicação em saúde e educação, a Constituição Estadual
obriga os governantes a investirem no mínimo 1% da Receita Corrente Ordinária
anual com amparo e fomento à pesquisa:
Art. 212 – O Estado manterá entidade de amparo e fomento à pesquisa e
lhe atribuirá dotações e recursos necessários à sua efetiva operacionalização, a serem por ela privativamente administrados, correspondentes a, no mínimo, um por cento da receita orçamentária
corrente ordinária do Estado, os quais serão repassados em parcelas mensais equivalentes a um doze avos, no mesmo exercício. (MINAS GERAIS, 1989, p.105)
Outro ponto importante e que vincula uma parte grande das receitas que
são arrecadadas pelos Estados são as transferências constitucionais obrigatórias
impostas pela Carta Magna brasileira. De acordo com os incisos III e IV do artigo
158, dos incisos II e III e parágrafos 3o e 4o do artigo 159:
Art. 158. Pertencem aos Municípios:
[...]
III – cinquenta por cento do produto da arrecadação do imposto do Estado sobre a propriedade de veículos automotores licenciados em seus territórios;
IV – vinte e cinco por cento do produto da arrecadação do imposto do Estado sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de
comunicação.
[...]
Art. 159. A União entregará:
II – do produto da arrecadação do imposto sobre produtos industrializados, dez por cento aos Estados e ao Distrito Federal, proporcionalmente ao valor das respectivas exportações de produtos industrializados.
III – do produto da arrecadação da contribuição de intervenção no domínio econômico prevista no art. 177, § 4
o, 29% (vinte e nove por cento) para os
Estados e o Distrito Federal, distribuídos na forma da lei, observada a
destinação a que se refere o inciso II, c, do referido parágrafo.
[...]
§ 3o – Os Estados entregarão aos respectivos Municípios vinte e cinco por
cento dos recursos que receberem nos termos do inciso II, observados os critérios estabelecidos no art. 158, parágrafo único, I e II.
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§ 4o Do montante de recursos de que trata o inciso III que cabe a cada
Estado, vinte e cinco por cento serão destinados aos seus Municípios, na forma da lei a que se refere o mencionado inciso. (BRASIL, 1988).
Os termos mencionados na citação correspondem a grande parte do que
é arrecadado pelos Estados e União e que deve ser repassado aos municípios nos
termos da lei. A título de exemplo, no ano de 2014 as receitas arrecadadas com o
Imposto sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações
de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação (ICMS)
corresponderam a 51% do total arrecadado pelo Estado de Minas Gerais (MINAS
GERAIS, 2015). Desse montante, 25% foram repassados aos municípios mineiros.
Não obstante o alto grau de vinculação enfrentada pelos governantes
brasileiros sabe-se que ainda maior é o montante de despesas obrigatórias
assumidas por eles – em todas as esferas. Para Giacomoni (2011), quando o
orçamento público é demasiadamente engessado por questões de despesas
obrigatórias, o problema tende a ser ainda pior que nos casos em que há excessiva
vinculação de receitas. O motivo é simples: enquanto no caso da vinculação
garante-se que parte de uma receita será necessariamente aplicada em um objeto
específico, no caso das despesas obrigatórias muitas vezes a causa do problema é
que benefícios são criados por legislações específicas, e a execução dessas
despesas nem sempre tem garantia de recursos para o atendimento.
Para tentar contornar esse problema, a Lei de Responsabilidade Fiscal
(Lei Complementar 101 de 04 de maio de 2000), em seu capítulo IV – que trata
sobre as despesas públicas, inclui uma subseção exclusiva para tratar sobre as
despesas obrigatórias e de caráter continuado:
Art. 17. Considera-se obrigatória de caráter continuado a despesa corrente derivada de lei, medida provisória ou ato administrativo normativo que fixem
para o ente a obrigação legal de sua execução por um período superior a dois exerc ícios.
§ 1o Os atos que criarem ou aumentarem despesa de que trata o caput
deverão ser instruídos com a estimativa prevista no inciso I do art. 16 e demonstrar a origem dos recursos para seu custeio.
§ 2o Para efeito do atendimento do § 1
o, o ato será acompanhado de
comprovação de que a despesa criada ou aumentada não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo referido no § 1
o do art. 4
o, devendo
seus efeitos financeiros, nos períodos seguintes, ser compensados pelo
aumento permanente de receita ou pela redução permanente de despesa.
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§ 3o Para efeito do § 2
o, considera-se aumento permanente de receita o
proveniente da elevação de alíquotas, ampliação da base de cálculo, majoração ou criação de tributo ou contribuição.
§ 4o A comprovação referida no § 2
o, apresentada pelo proponente, conterá
as premissas e metodologia de cálculo utilizadas, sem prejuízo do exame de compatibilidade da despesa com as demais normas do plano plurianual e da lei de diret rizes orçamentárias.
§ 5o A despesa de que trata este artigo não será executada antes da
implementação das medidas referidas no § 2o, as quais integrarão o
instrumento que a criar ou aumentar.
§ 6o O disposto no § 1
o não se aplica às despesas destinadas ao serviço da
dívida nem ao reajustamento de remuneração de pessoal de que trata o inciso X do art. 37 da Constituição.
§ 7o Considera-se aumento de despesa a prorrogação daquela criada por
prazo determinado. (BRASIL, 2000)
Apesar das condições colocadas pela LRF, nem sempre as exigências
impostas são respeitadas pelos legisladores. Como citado anteriormente, cada
grupo social pressiona o governo por maior aplicação de recursos em determinadas
áreas. Da mesma maneira, o Estado é constantemente pressionado por esses
mesmos grupos por aumentos salariais de seus servidores, o que coloca os gastos
com pessoal ativo e inativo como um dos principais problemas.
Ainda que, para evitar que esse tipo de despesa fuja do controle dos
governantes, a LRF defina limites para despesa de pessoal, permitindo que União,
Estados e municípios comprometam apenas uma determinada parte de sua Receita
Corrente Líquida com esse tipo de gasto (pessoal ativo, inativo e pensionistas) 2.
Independentemente do limite imposto, as despesas relacionadas com folha dos
servidores e as previdenciárias somam a maior parcela do dispêndio público na
maioria dos casos.
Outro ponto extremamente crítico, principalmente no caso de Estados e
Municípios, é o alto grau de endividamento assumido por essas esferas. De acordo
com o Relatório de Gestão Fiscal publicado no início de 2015 pela Secretaria de
Estado de Fazenda de Minas Gerais3, a dívida consolidada líquida mineira fechou o
ano de 2014 com um estoque de R$85 bilhões, quase 80% maior que a Receita
Corrente Líquida (RCL) arrecada no exercício.
2 Artigo 18 da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar 101 de 04 de maio de 2000)
3 Disponível em http://www.fazenda.mg.gov.br/governo/contadoria_geral/gestaofiscal/ano2014/3
quadrimestre 2014.pdf
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O problema agrava-se ainda mais quando são analisados os termos dos
contratos assinados com a União (maior credora do Estado) e a Companhia
Energética de Minas Gerais (CEMIG), que fazem com que o estoque da dívida seja
maior a cada ano. Mesmo que a cada exercício os pagamentos sejam crescentes e
comprometam boa parte da RCL arrecadada, a amortização não consegue ser
efetiva. De acordo com estudo realizado pelo Tribunal de Contas do Estado de
Minas Gerais (2011), esse problema é gerado principalmente por duas causas:
a) “[...] aos elevados encargos cobrados sobre a dívida renegociada com a União (correção monetária pelo IGP -DI + juros reais de 7,5% ao ano), que tornariam os pagamentos de seus encargos, equivalentes a 13% da Receita
Líquida Real, insuficientes para conter o seu avanço em termos reais”;
b) “[...] ao fato de o Estado ainda [...] continuar a contar, na estrutura de sua dívida, com outras obrigações ainda mais onerosas do que as previstas no
contrato da dívida com a União, especificamente da dívida com a CEMIG [correção monetária pelo IGP-DI + 8,18% ao ano], que integra o estoque de sua dívida extralimite”. (TCE-MG, 2011b).
O que acontece, portanto, é que os valores das parcelas anuais são
maiores que o limite de 13% indicados no item a do relatório do Tribunal de Contas.
Nesse caso, limita-se o pagamento a esse montante e o valor excedente fica em
estoque (que poderá ser pago além do prazo estipulado em contrato). Por esse
motivo, ainda que os pagamentos sejam feitos ano a ano, o estoque tem crescido ao
longo do tempo.
Além das despesas de pessoal, previdenciárias e com a d ívida pública,
outro problema enfrentado pelos Estados é em relação às sentenças judiciais e aos
precatórios. De acordo com a Emenda Constitucional no 62 de 13 de setembro de
2009, que altera a redação do artigo 100 da Constituição Federal,
Art. 100. Os pagamentos devidos pelas Fazendas Públicas Federal, Estaduais, Distrital e Municipais, em virtude de sentença judiciária, far-se-ão exclusivamente na ordem cronológica de apresentação dos precatórios e à
conta dos créditos respectivos, proibi da a designação de casos ou de pessoas nas dotações orçamentárias e nos créditos adicionais abertos para este fim.
[...]
§ 5o É obrigatória a inclusão, no orçamento das entidades de direito público,
de verba necessária ao pagamento de seus débitos, oriundos de sentenças
transitadas em julgado, constantes de precatórios judiciários apresentados até 1
o de julho, fazendo-se o pagamento até o final do exercício seguinte,
quando terão seus valores atualizados monetariamente. (BRASIL, 2009)
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Como exemplificado, são diversos os casos em que o orçamento público
fica engessado, seja pelas vinculações (como é o caso das transferências
constitucionais obrigatórias e o de aplicação mínima em saúde, educação e
pesquisas), seja pelas despesas de caráter obrigatório e das quais os governantes
não podem se abster (folha de pessoal, despesas previdenciárias, despesas com a
dívida pública, despesas com sentenças judiciais e etc). Para que seja dada
sequência ao estudo sobre a evolução desse engessamento em Minas Gerais, o
próximo capítulo fará exposição da metodologia adotada durante a pesquisa.
3 ASPECTOS METODOLÓGICOS
Para a elaboração do trabalho proposto, a pesquisa foi dividida em duas
etapas principais, sendo a primeira parte uma pesquisa bibliográfica sobre temas
relacionados à rigidez orçamentária, principalmente no que diz respeito aos seus
dois principais motivos: as vinculações e as despesas de caráter obrigatório.
Em seguida, a segunda parte faz uma análise de como se comportou as
despesas do Estado de Minas Gerais durante os últimos oito anos, procurando
classificar os gastos públicos em duas principais categorias: despesas obrigatórias e
despesas discricionárias. Para os estudos apresentados, o autor tomou a decisão de
delimitar o universo de pesquisa aos últimos oito anos com o intuito de isolar dois
mandatos de governo que foram precedidos de quatro anos de ajuste fiscal, o que
poderia distorcer o desenvolvimento dos gastos públicos.
A classificação das despesas quanto ao seu caráter obrigatório ou
discricionário partiu de identificação das características dos gastos realizados no
período, considerando as informações sobre vinculação e obrigatoriedade de
execução de certas despesas levantadas durante a pesquisa bibliográfica sobre o
assunto. Como referência, foram usadas as publicações oficiais feitas pela
Secretaria de Estado da Fazenda de Minas Gerais, além de dados disponibilizados
no Portal da Transparência do governo mineiro.
Ainda durante a análise dos dados quantitativos, foram feitas algumas
pesquisas que buscassem justificar distorções excessivas causadas entre um
exercício e outro, com o intuito de analisar os principais motivos para maior ou
menor rigidez verificada.
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Considerando que o objetivo geral do trabalho foi o de identificar a
maneira como se comportaram os gastos (composição orçamentária) do governo
entre os anos de 2007 e 2014, a pesquisa desenvolvida tem caráter qualitativo que,
de acordo com Marschall e Rossman (1989), deve ser empregado quando “questões
e problemas para a pesquisa advêm de observações no mundo real, dilemas e
questões.” (MARSCHALL e ROSSMAN, 1989). Portanto, a interpretação de
fenômenos e acontecimentos do mundo real é básica quando se realiza esse tipo de
pesquisa.
A pesquisa pode ainda ser classificada como uma análise exploratória, na
medida em que envolveu a revisão bibliográfica sobre os temas propostos e, por fim,
considerando-se que a análise é voltada às características de execução
orçamentárias do governo de Minas Gerais, o trabalho pode também ser classificado
como um estudo de caso, já que leva em consideração um fenômeno dentro do
contexto orçamentário mineiro.
4 A EVOLUÇÃO DA RIGIDEZ ORÇAMENTÁRIA MINEIRA
Levando-se em consideração as informações colhidas durante a revisão
bibliográfica sobre a rigidez orçamentária, no caso específico de Minas Gerais,
constatou-se alguns principais grupos de gastos que compõem despesas realizadas
por vinculação legal e/ou por seu caráter obrigatório. Assim, para que a pesquisa
sobre a evolução da rigidez orçamentária mineira fosse realizada, a classificação
empregada foi a seguinte:
DESPESAS OBRIGATÓRIAS:
Despesa total com pessoal, que compõe a folha de pagamento do
Estado, bem como os benefícios previdenciários, as pensões e os
auxílios a ela atrelados;
Serviços da Dívida, composto pelas despesas com amortização e
juros dos contratos de empréstimos realizados por Minas Gerais;
Transferências Constitucionais a municípios, conforme trechos dos
artigos 158 e 159 da Constituição Federal de 1988;
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Manutenção e Desenvolvimento do Ensino, correspondente a 25%
da arrecadação de tributos e impostos, conforme determinado pelo
artigo 2212 da Constituição Federal de 1988;
Ações e Serviços Públicos de Saúde, correspondente a 12% da
arrecadação de tributos e impostos, conforme determinado pelo
inciso II do artigo 77 da Constituição Federal de 1988;
Fomento e Amparo à Pesquisa, correspondente a 1% da receita
corrente ordinária, conforme determinado pelo artigo 212 da
Constituição Estadual de 1989;
Precatórios e Sentenças Judiciais, conforme parágrafo 5o do artigo
100 da Constituição Federal de 1988;
Recolhimentos das despesas com o Programa de Formação do
Patrimônio do Servidor Público (PASEP) da administração pública
direta estadual (diferentemente do que acontece com o recolhimento
da administração pública direta, que tem uma ação orçamentária
para essa finalidade, o pagamento desse recolhimento por parte dos
órgãos da administração pública indireta fica espalhado no
orçamento de cada entidade, o que torna difícil sua identificação).
DESPESAS DISCRICIONÁRIAS:
Demais despesas realizadas.
Para iniciar a análise é necessário o tratamento dos dados colhidos para
que duas possíveis distorções sejam evitadas. Em ambos os casos, devido a
publicações externas, o Governo de Minas Gerais recorreu à criação de despesas
intraorçamentárias para solucionar alterações no entendimento e nas orientações
anteriormente dadas. Essas mudanças na maneira de execução podem gerar
deformidades na série histórica, por isso demandam atenção.
No ano de 2011, baseado na Portaria Conjunta STN e SOF no 02, de 19
de agosto de 2010, o Estado passou a executar aporte para cobertura do déficit
atuarial do Regime Próprio de Previdência Social. A maneira de operacionalização
desse aporte foi a criação de uma dotação específica para realização da despesa
intraorçamentária com essa complementação, o que gera uma receita
intraorçamentária para pagamento de parte dos inativos.
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Considerando que as duas despesas realizadas (a de aporte e a de
pagamento do inativo de fato) referem-se ao mesmo gasto, sendo a primeira delas
realizada apenas como o meio de se gerar dotação específica para a execução do
pagamento (a receita intraorçamentária exclusiva), os valores de complementação
para os anos de 2011 a 2014 serão desconsiderados das despesas realizadas pelo
governo mineiro a fim de evitar duplicidades (uma vez que já compõem o valor total
gasto com pessoal).
De maneira análoga, para o fiel cumprimento da Lei Complementar 141
que regulamentou a aplicação em saúde, exigindo que todas as despesas de ASP
tramitassem pelos fundos de saúde dos estados, a saída encontrada pelo governo
foi a de realizar todas as despesas com essa característica por meio do Fundo
Estadual de Saúde (FES). Essas despesas realizaram-se de duas maneiras:
aplicação direta em programas de saúde ou realização de despesa
intraorçamentária em favor das demais unidades que fazem investimentos no setor.
Até o ano de 2013 as despesas com ASP estava distribuída em todas as
unidades do setor saúde (secretarias, fundos, fundações e autarquias), além de
outros órgãos que também faziam aplicação na área. Com a exigência de trânsito
pelo FES, considerando a complexidade de se transferir todas as despesas para
serem realizadas diretamente pelo Fundo, a saída encontrada foi o trânsito por meio
de uma despesa intraorçamentária. Como no caso do aporte para cobertura do
déficit atuarial, essa despesa também ocorre duas vezes: no momento de realização
do gasto intraorçamentário e no momento em que a despesa com saúde é de fato
realizada pelas unidades vinculadas. Pelo mesmo motivo, esse dispêndio também
será desconsiderado dos valores executados no exercício de 2014.
Considerando essas definições, a Tabela 1 demonstra qual é a
composição entre despesas discricionárias e obrigatórias para cada um dos anos
analisados:
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Tabela 1: Ajuste com base nas despesas intraorçamentárias desconsideradas no estudo
Fonte: Elaborado pelo autor
Outro ponto que precisa ser levado em consideração é em relação às
despesas com os gastos constitucionais em saúde, educação e fomento e amparo à
pesquisa. Como a obrigatoriedade de aplicação nesses três itens é definida por um
valor mínimo, pode-se considerar que qualquer gasto realizado pelo Estado além
desse piso determinado a partir de um percentual da receita não é de caráter
obrigatório.
Exemplificando, se supormos que para um determinado exercício a
aplicação em educação tenha alcançado valor correspondente a 30% das receitas
de transferências e impostos, os 5% que excedem o mínimo constitucional exigido
de 25% não podem ser considerados despesas obrigatórias. Assim,
independentemente de as publicações oficiais do Estado serem feitas de acordo
com o executado, para o estudo a parcela que ultrapasse o mínimo foi remanejada
para despesas de caráter discricionário.
Especificamente no caso da aplicação mínima em educação, entre os
anos de 2007 e 2011 os valores que foram gastos com outras despesas obrigatórias
(despesa total com pessoal e precatório) e que fizeram interseção com o mínimo
constitucional, por si só, já foram suficientes para superar os 25% mínimos. Por esse
motivo, ainda que a metodologia definida indicasse a necessidade de dedução dos
valores constitucionais para que o índice ficasse em 25%, as demais despesas de
caráter obrigatória teriam que ser executadas, independentemente do percentual
fixado pela Constituição.
Em milhões de R$
Descrição / Ano 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
Despesa obrigatória total (a) 26.037 30.812 31.466 36.881 46.172 55.124 61.701 63.793
Despesa obrigatória - Intra RPPS (b) 3.866 5.378 5.191 3.531
Despesa obrigatória considerada (c = a - b) 26.037 30.812 31.466 36.881 42.305 49.745 56.510 60.262
Despesa discricionária total (d) 6.406 8.487 8.798 9.170 8.522 8.049 10.205 11.719
Despesa discricionária - Intra saúde (e) 1.719
Despesa discricionária considerada (f = d - e) 6.406 8.487 8.798 9.170 8.522 8.049 10.205 10.000
Despesa Total do exercício (a + d) 32.443 39.299 40.263 46.051 54.694 63.172 71.907 75.513
Despesa total Considerada (c + f) 32.443 39.299 40.263 46.051 50.827 57.794 66.715 70.262
16
Por outro lado, devido a alterações de regras para publicação dos
demonstrativos de aplicação mínima em MDE, para os anos de 2012 a 2014 os
valores executados foram inferiores ao mínimo exigido pela Constituição Federal.
Como o objetivo do estudo é fazer uma análise da evolução das despesas mineiras,
ainda que o mínimo obrigatório exigido não tenha sido alcançado os valores foram
mantidos conforme publicado nos Relatórios Resumidos da Execução Orçamentária
(RREO) para cada um dos exercícios citados.
Colocadas essas ressalvas, o histórico dos valores considerados para
aplicação constitucional de MDE está detalhado na Tabela 2:
Tabela 2: Aplicação em Manutenção e Desenvolvimento do Ensino
Fonte: Relatórios Resumidos de Execução Orçamentária (RREO) de 2007 a 2014
Secretaria de Estado de Fazenda de Minas Gerais, Minas Gerais.
Alguns pontos sobre a aplicação mínima em educação merecem
destaque. Até o ano de 2011, as publicações feitas pela Secretaria de Estado de
Fazenda de Minas Gerais consideravam em sua aplicação os valores gastos com
inativos e pensionistas da área da educação. Contudo, em dezembro de 2011, o
Tribunal de Contas do Estado de Minas Gerais (TCE-MG) publicou sua Instrução
Normativa no 9 de 2011, alterando orientações dadas anteriormente sobre a
execução de gastos com educação.
Com a nova orientação, o TCE-MG exigiu que os gastos com servidores
inativos e pensionistas fossem desconsiderados do cálculo. Porém, as publicações
oficiais do governo continuaram sendo feitas incluindo essas despesas de MDE até
o exercício de 2013, sendo 2014 o primeiro ano em que o documento foi publicado
excluindo tais valores.
Em milhões de R$
Descrição / Ano 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
Base de cálculo Constitucional Educação (a) 18.650 22.657 21.809 26.139 28.679 31.538 35.135 38.056
Aplicação mínima (b = a * 0,25) 4.662 5.664 5.452 6.535 7.170 7.885 8.784 9.514
Valor aplicado pelo RREO (c = d + e + f) 5.428 6.513 6.133 7.141 8.921 10.146 11.153 9.459
Independentemente Obrigatória (d) 4.786 5.751 5.483 6.134 7.849 9.010 9.354 6.864
Demais despesas constitucionais com educação (e) 426 501 415 606 640 659 1.152 1.915
Deduções consideradas como aplicação (f) 215 261 235 401 433 477 646 680
Inativos a serem desconsiderados (g) 0 0 0 0 0 2.984 2.766 0
Valor de aplicação final (h = d - g) 5.428 6.513 6.133 7.141 8.921 7.162 8.387 9.459
Percentual aplicado (h / a) 29,10% 28,75% 28,12% 27,32% 31,11% 22,71% 23,87% 24,86%
Excesso de aplicacão (h - b) 765 849 681 606 1.752 -723 -397 -55
Despesa Constitucional considerada discricionária 426 501 415 606 640 0 0 0
17
Considerando a existência da publicação do TCE-MG e a exigência de
que se fosse cumprida a instrução para que as contas públicas fossem aprovadas,
os autores optaram por excluir dos gastos realizados com educação os valores de
despesas com inativos e pensionistas da Secretaria de Estado de Educação para os
anos de 2012 e 2013. Apesar de tais despesas serem classificadas como
obrigatórias, sua exclusão exigida diminui o valor de recursos aplicados, que ficam
abaixo do mínimo exigido, não dando margem para ajustes (como acontece nos
anos anteriores).
De qualquer maneira, a alteração da regra imposta pelo TCE-MG já pode
ser considerada por si só um ponto problemático para o Estado. Quando o Tribunal
exige que os gastos com inativos sejam desconsiderados da aplicação mínima, o
Executivo mineiro não pôde computar como despesa de MDE R$3 bilhões e R$2,8
bilhões gastos com esse tipo de despesa nos anos de 2012 e 2013,
respectivamente. Considerando que o gasto com inativo é uma despesa de caráter
obrigatório, e que ocorreria de qualquer maneira, do ano de 2011 para o ano 2012 o
governo mineiro teve que aumentar os seus gastos para alcançar o mínimo exigido
(e mesmo com o aumento considerável, não conseguiu aplicar os 25% legais).
A orientação dada pelo TCE-MG abrangeu também os gastos de inativos
com despesas de ASP. Diferentemente do que ocorreu com as despesas de MDE,
já a partir do exercício de 2012 as publicações institucionais sobre o cumprimento
dos índices constitucionais excluíam essas despesas do seu total. Ainda que o
montante de despesas com inativos da área da saúde fossem consideravelmente
inferiores às despesas de inativos na área da educação, a alteração fez com o que o
Estado deixasse de considerar cerca R$325 milhões já em 2012 – valor que teve
que ser reaplicado no custeio e investimento do setor.
No que diz respeito às despesas com ASP outra alteração teve impacto
ainda mais significativo que a retira das despesas com inativos do cálculo . Até o
exercício de 2011, o governo mineiro considerava como despesa constitucional com
saúde alguns gastos realizados pela Companhia de Saneamento de Minas Gerais
(COPASA) com abastecimento de água, esgotamento e tratamento de esgoto
sanitário. Com a regulamentação da Emenda Constitucional no 29 de 2009 pela Lei
Complementar 141 de 13 de janeiro de 2012, que definiu critérios para apuração da
aplicação mínima com saúde, essas despesas não mais puderam ser computadas
no índice.
18
Porém, diferentemente do que aconteceu nos gastos com MDE, o mínimo
constitucional exigido de 12% sempre foi alcançado pelo governo,
independentemente das alterações feitas pela instrução normativa e pela Lei
Complementar. Assim, a Tabela 3 demonstra como evoluíram os gastos com ASP,
indicando qual a parcela desse tipo de despesa que foi remanejada para o grupo de
despesas discricionárias considerando o excesso de aplicação:
Tabela 3: Aplicação em Ações e Serviços Públicos de Saúde
Fonte: Relatório Resumido de Execução Orçamentária (RREO) de 2007 a 2014
Secretaria de Estado de Fazenda de Minas Gerais
No que diz respeito aos gastos estaduais com fomento e amparo à
pesquisa, a maneira de contabilização e regras impostas não sofreram alterações
por publicações externas ao Estado ao longo dos últimos oito anos – até mesmo por
ser uma obrigatoriedade colocada pela constituição mineira. Vale ressaltar também
que durante esse período a aplicação mínima de 1% da receita corrente ordinária
nunca foi alcançada e que, por esse motivo, toda a despesa realizada com esse tipo
de gasto foi considerada como obrigatória, não sendo necessário nenhum tipo de
remanejamento.
A Tabela 4 demonstra qual a composição da despesa orçamentária
mineira ao longo dos últimos oito anos, indicando os ajustes feitos pelo excesso de
aplicação explicitado anteriormente:
Em milhões de R$
Ano/Descrição 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
Base de cálculo Constitucional Saúde (a) 18.650 22.657 21.809 26.139 28.679 31.538 35.135 38.056
Aplicação mínima (b = a * 0,12) 2.238 2.719 2.617 3.137 3.441 3.785 4.216 4.567
Valor aplicado pelo RREO (c = d + e) 2.482 2.972 3.361 3.477 3.804 3.827 4.294 4.624
Independentemente Obrigatória (d) 552 638 838 888 780 984 1.203 1.307
Demais despesas constitucionais com saúde (e) 1.164 1.554 1.512 1.773 2.362 2.843 3.091 3.317
Despesas realizadas pelas empresas públicas (f) 765 780 1.011 816 661 0 0 0
Excesso de aplicacão (g = c - b) 244 253 744 340 362 42 78 57
Percentual aplicado (c / a) 13,31% 13,12% 15,41% 13,30% 13,26% 12,13% 12,22% 12,15%
Despesa Constitucional considerada discricionária 244 253 744 340 362 42 78 57
19
Tabela 4: Distribuição da despesa mineira entre obrigatória e discricionária
Fonte: Elaborado pelo autor
Com base nos valores alterados devido aos ajustes necessários pelo
excesso de aplicação e pela exclusão da intraorçamentária, a Tabela 5 e a Figura 2
mostram a participação de cada tipo de gasto no total executado por Minas Gerais
em cada um dos anos analisados:
Tabela 5: Participação das despesas obrigatórias e discricionários no total das despesas
orçamentárias de Minas Gerais
Fonte: Elaborado pelo autor
Em milhões de R$
Descrição / Ano 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
Despesa obrigatória Executada* (a) 26.037 30.812 31.466 36.881 42.305 49.745 56.510 60.262
Despesa discricionária Executada* (b) 6.406 8.487 8.798 9.170 8.522 8.049 10.205 10.000
Despesa com MDE considerada discricionária ( c ) 426 501 415 606 640 0 0 0
Despesa com ASP considerada discricionária ( d ) 244 253 744 340 362 42 78 57
Despesa obrigatória final (a - c - d) 25.367 30.059 30.306 35.936 41.303 49.703 56.432 60.205
Despes discricionária final (b + c + d) 7.076 9.240 9.957 10.116 9.524 8.091 10.283 10.057
Despesa Total* 32.443 39.299 40.263 46.051 50.827 57.794 66.715 70.262
*Excluídas as despesas intra orçamentárias com o aporte atuarial para cobertura do déficit do RPPS e as despesas intra orçamentárias do FES
em favor das outras unidades que executam despesas constitucionais com ASP.
Em milhões de R$
Descrição / Ano 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
Despesas obrigatórias (a) 25.367 30.059 30.306 35.936 41.303 49.703 56.432 60.205
Despesas discricionárias (b) 7.076 9.240 9.957 10.116 9.524 8.091 10.283 10.057
Despesa Total ( c ) 32.443 39.299 40.263 46.051 50.827 57.794 66.715 70.262
Despesas obrigatórias / Despesa total (a/c) 78,19% 76,49% 75,27% 78,03% 81,26% 86,00% 84,59% 85,69%
Despesas discricionárias / Despesa total (b/c) 21,81% 23,51% 24,73% 21,97% 18,74% 14,00% 15,41% 14,31%
20
Figura 2: Participação das despesas obrigatórias e discricionárias no total das despesas orçamentárias de Minas Gerais
Fonte: Elaborado pelo autor
A figura demonstra que quando comparados os anos de 2007 e o de
2014, a participação das despesas obrigatórias em relação ao total executado pelo
governo aumentou em aproximadamente 7,5%, chegando a apenas 14,31% de
discricionariedade nesse último ano. Um melhor detalhamento das despesas
obrigatórias, de acordo com a classificação exposta no início do capítulo pode ajudar
a entender qual delas foi a maior responsável por pressionar a discricionariedade
orçamentária do Estado.
Em reação à despesa total considerada no estudo (ou seja, excluindo-se
os gastos intraorçamentários com o aporte do RPPS e do FES), a participação de
cada uma das despesas consideradas obrigatórias está apresentada na Tabela 6:
21
Tabela 6: Detalhamento das despesas obrigatórias e sua participação nas despesas totais
Fonte: Elaborado pelo autor
Analisando as alterações ocorridas ao longo dos oito anos, e com base
nos dados coletados sobre as despesas de Minas Gerais, algumas situações
pontuais podem ajudar a explicar as variações percebidas. A primeira delas, já
analisada anteriormente para a realização da exclusão dos excessos de aplicação
nas despesas com MDE e ASP, são as mudanças de regra que fizeram com que o
Estado tivesse que investir mais em educação e saúde do que vinha investindo
anteriormente.
No caso da educação, que até o ano de 2011 não precisaria sequer
realizar despesas que não as de pessoal ativo e inativo para alcançar o mínimo
constitucional definido, a publicação da Instrução Normativa no 9 de 2011, pelo TCE-
MG, trouxe uma maior necessidade de investimentos na área. Com a exigência do
Tribunal de que os inativos não fossem computados como gasto com MDE, o Estado
precisou aplicar mais recursos na área, o que aumentou a rigidez total percebida.
Da mesma maneira, os gastos com ASP também têm contribuição
significativa para o aumento das despesas obrigatórias. Nesse caso, além das
despesas com os inativos que também deixam de ser considerados gastos com
ASP, conforme Instrução Normativa do TCE-MG, a publicação da Lei Complementar
141 fez com que o Estado não mais pudesse utilizar de investimentos realizados
pela COPASA na área de saúde para o cumprimento do mínimo exigido. Com isso,
o aumento dos gastos com ASP foram de mais de um bilhão entre 2011 e 2012,
tornando as despesas obrigatórias de Minas Gerais ainda maiores.
Descrição / Ano 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
Despesas Obrigatórias 78,19% 76,49% 75,27% 78,03% 81,26% 86,00% 84,59% 85,69%
Despesas de Pessoal Total* 47,14% 45,23% 47,20% 48,67% 50,52% 50,84% 48,87% 52,44%
Transferências Constitucionais 18,01% 17,67% 16,86% 17,72% 17,57% 16,89% 16,19% 16,52%
Serviços da Dívida 8,02% 7,82% 8,18% 7,56% 8,26% 10,99% 11,81% 8,18%
Ações e Serviços Públicos de Saúde 2,84% 3,31% 1,91% 3,11% 3,39% 4,85% 4,52% 4,64%
Manutenção e Desenvolvimento do Ensino** 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 0,00% 1,14% 1,73% 2,73%
Despesas com PASEP 0,63% 0,65% 0,31% 0,38% 0,65% 0,66% 0,64% 0,63%
Precatórios e Sentenças Judiciais 1,03% 1,27% 0,45% 0,34% 0,41% 0,19% 0,46% 0,20%
Fomento e Amparo à Pesquisas 0,52% 0,53% 0,36% 0,27% 0,46% 0,44% 0,37% 0,35%
Despesas discricionárias 21,81% 23,51% 24,73% 21,97% 18,74% 14,00% 15,41% 14,31%
Total Geral 100,00% 100,00% 100,00% 100,00% 100,00% 100,00% 100,00% 100,00%
* As despesas com pessoal consideram o pessoal ativo, inativo, pensões e auxílios
** As despesas com MDE ficam zeradas até o ano de 2011 devido à exclusão dos excessos aplicados além dos 25% constitucionais
22
O salto de quase 5% na participação das despesas obrigatórias entre
2011 e 2012, que trouxe a rigidez orçamentária do Estado para outro patamar, teve
ainda um ponto que pode ser destacado. O crescimento da fatia dos gastos que
foram direcionadas para a dívida pública cresceram quase 3% entre esses dois
exercícios, ficando ainda maior em 2013. Esse acréscimo em específico não foi
ocasionado por nenhuma alteração externa como nos casos das aplicações em
MDE e ASP, mas por uma decisão do próprio Estado.
Com o objetivo de reduzir parte da dívida que o Estado possuía com a
CEMIG, o governo mineiro captou junto a três instituições financeiras estrangeiras
recursos para execução de uma operação de crédito para quitar uma operação
interna entre a empresa e o Governo (CRC/CEMIG). Assim, a dívida de R$4,2
bilhões foi sanada em dois anos, e a contratação dos empréstimos permitiu ao
Estado uma redução considerável da taxa de juros contratada além de um desconto
de 35% no valor devido. Apesar de ser um dos motivadores para aumento das
despesas obrigatórias nos anos de 2012 e 2013, com o fim da operação o patamar
de pagamento dos serviços da dívida voltam a algo próximo a 8% da despesa total,
como nos anos anteriores.
Por fim, a análise da tabela demonstra que o principal problema
enfrentado por Minas Gerais no enri jecimento de suas contas está na despesa total
de pessoal. Nos oito anos analisados, os gastos dessa natureza tiveram um
crescimento de 5,3% na participação da despesa total, o que corresponde a 70,71%
do crescimento de 7,5% observado para todas as despesas obrigatórias do Estado.
A média de participação desse tipo de despesa nos quatro primeiros anos
do estudo é de 47,06%. Já nos últimos anos analisados, o valor médio de
participação passa a 50,67%. O crescimento das despesas absolutas de pessoal
aumenta consideravelmente a partir do ano de 2011, e uma análise mais
pormenorizada sobre quais órgãos tiveram os maiores incrementos auxilia na
identificação de motivos para esse salto. A Tabela 7 traz esse detalhamento, com
valores absolutos:
23
Tabela 7: Evolução das despesas de pessoal por órgão
Fonte: Elaborado pelo autor
A tabela traz os dez maiores crescimentos absolutos entre o período
indicado, além das despesas do Fundo Financeiro de Previdência. Considerando os
dados exibidos, dois pontos chamam atenção em relação ao acréscimo de R$14,4
bilhões verificado entre os anos de 2010 e 2014. O primeiro deles é o grande
aumento nas despesas totais de pessoal da Secretaria de Estado de Educação. Os
gastos com pessoal ativo e auxílios crescem cerca de R$2,5 bilhões no período,
enquanto a despesa com inativos (executada pelo Fundo Financeiro de Previdência)
tem um aumento de R$1,7 bilhão. No total, são R$4,7 bilhões dos R$14,4 bilhões de
aumento nas despesas totais de pessoal.
O principal acréscimo ocorre do ano de 2010 para 2011, quando as
despesas com pessoal ativo da Secretaria variam R$1 bilhão devido principalmente
à Lei no 18.975 de 29 de junho de 2010, que altera a forma de remuneração dos
professores de educação básica, fixando subsídio para as carreiras de que tratam a
Em milhões de R$
Órgão / Ano 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 Δ 2014 - 2010
Fundo Financeiro de Previdência (FUNFIP) 3.466 3.997 4.039 4.873 5.536 6.369 6.980 8.066 3.193
Benefiíios Previdenciários - Secretaria de
Educação1.532 1.776 1.709 2.116 2.528 2.957 3.227 3.809 1.693
Benefícios Previdenciários das demais
unidades da administração direta do
Poder Executivo
909 1.031 1.052 1.284 1.404 1.560 1.711 1.949 665
Benefício Previdenciário de Pensão 620 745 797 944 1.005 1.163 1.219 1.359 415
Demais despesas de pessoal do FUNFIP 406 446 482 530 598 689 823 949 419
Polícia Militar do Estado de Minas Gerais
(PMMG)*2.634 2.753 3.389 4.233 4.699 5.285 6.018 7.356 3.123
Secretaria de Estado de Educação (SEE) 3.194 3.839 3.592 3.992 5.080 5.763 6.292 6.540 2.548
Tribunal de Justiça de Minas Gerais
(TJMG)*1.710 2.025 2.134 2.426 2.700 3.159 3.432 3.707 1.282
Secretaria de Estado de Defesa Social
(SEDS)53 76 403 531 624 721 874 1.117 586
Polícia Civil de do Estado de Minas Gerais
(PCMG)469 569 542 687 754 881 980 1.200 513
Ministério Público de Minas Gerais
(MPMG)*614 692 694 842 907 1.032 1.147 1.232 390
Instituto de Previdência dos Servidores
Militares de Minas Gerais (IPSM)383 433 488 581 637 721 816 966 385
Fundo Hospitalar do Estado de Minas
Gerais (FHEMIG)167 207 372 410 483 536 709 764 354
Secretaria de Estado de Fazenda de Minas
Gerais (SEF-MG)480 578 552 662 800 910 955 1.011 349
Corpo de Bombeiro Militar do Estado de
Minas Gerais (CBMMG)*198 254 269 369 410 467 547 712 342
Demais unidades 1.926 2.349 2.527 2.805 3.049 3.540 3.856 4.176 1.371
Total 15.294 17.775 19.003 22.411 25.678 29.384 32.607 36.847 14.436
Nota: As despesas consideradas nos órgãos com (*) contemplam despesas de ativos e inativos. Para os demais órgãos, as despesas com inativos é executada dentro do Fundo
Financeiro de Previdência.
24
legislação. No artigo 4o dessa mesma lei são definidos ainda critérios para
reposicionamento dos servidores abrangidos pela regra, o que também gera impacto
considerável no total gasto com pessoal.
Já em 2011 o governo de Minas Gerais aprovou junto ao Legislativo outra
Lei (Lei no 19.837 de 02 de dezembro de 2011) revisando e concedendo benefícios
às carreiras de educação básica, o que continuou gerando novos impactos na
despesa de pessoal. Com essas alterações e outras não tratadas pelo trabalho, a
variação das despesas totais de pessoal da Secretaria de Estado de Educação entre
os anos de 2010 e 2014 foi de aproximadamente 69%.
O outro ponto que merece atenção é que, dentro dos dez maiores
crescimentos de despesas com pessoal estão todos os órgãos do setor segurança.
Dos R$14,4 bilhões de variação, R$4,9 bilhões são de despesas identificadas da
PMMG, PCMG, SEDS, IPSM e CBMMG, sendo que os valores que foram
executados com inativos da Polícia Civil e da Secretaria de Estado de Defesa Social
não estão nesse somatório por terem sido realizadas dentro do FUNFIP na ação
orçamentária de pagamento dos inativos do Poder Executivo.
Além de novos concursos públicos para a área e concessão de benefícios
pontuais, a Lei no 19.576 de 16 de agosto de 2011 pode ser considerada a principal
causa para o aumento percebido. O artigo 1o dessa legislação reajusta o vencimento
básico de várias carreiras de segurança pública em 10% a partir de outubro de 2011,
enquanto os demais artigos garantem reajustes anuais até o exercício de 2015.
Nessa lógica, a lei autoriza 100% de aumento às carreiras nela listada, sendo que
no período de 2010 a 2014 o crescimento com gastos totais com pessoal do setor
segurança foi de 77,31% (sem considerar os aumentos nas despesas com inativos
da SEDS e PCMG, conforme informado anteriormente).
Apenas essas duas situações citadas já são responsáveis por 63% do
crescimento total de pessoal verificado no período. Outros 11,5% do valor acrescido
são referentes a aumentos nas despesas de pessoal com o TJMG e com o MPMG.
Considerando o princípio da separação dos poderes, ainda que seja o Executivo o
principal responsável por arrecadar recursos para pagamento das despesas dos
órgãos do Judiciário e Legislativo, não há interface na tomada de decisões sobre
concessão de benefícios e/ou reajuste de salários.
25
Considerados esses pontos, e voltando à análise da Tabela 6, vale
ressaltar que as despesas obrigatórias e a despesa de pessoal só têm uma queda
de participação desde o ano de 2009 (momento em que se iniciou um período de
crise mundial com os problemas enfrentados pelo mercado em 2008), no ano de
2013. Essa retração na participação das despesas obrigatórias dá-se principalmente
devido a uma questão específica: o valor executado em contratos de operação de
crédito.
Enquanto entre os exercícios de 2007 e 2012 a média de despesas
realizadas com operações de crédito ficou em torno de R$949 milhões/ano, no
exercício de 2013 os gastos com contratos de financiamento alcançaram R$5,4
bilhões, sendo R$2,6 bilhões apenas com a operação de quitação da dívida com a
CEMIG (já mencionada). Os demais R$2,8 bilhões foram completamente gastos em
despesas discricionárias (principalmente na área de infraestrutura), o que justifica o
aumento da participação dessas despesas no total executado pelo governo e a
redução da participação das despesas obrigatórias no todo.
Caso as despesas com operações fossem desconsideradas do estudo,
assim como foram os gastos intraorçamentários de aporte para cobertura do déficit
do RPPS e de transferência a unidades executoras de políticas de saúde, o quadro
mostraria uma situação ainda pior em relação ao comprometimento de despesas
obrigatórias frente às discricionárias, conforme Tabela 8 e Figura 3:
Tabela 8: Distribuição da despesa mineira entre obrigatória e discricionária, excluindo os
gastos com operações de crédito
Fonte: Elaborado pelo autor
Em milhões de R$
Descrição / Ano 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
Despesas obrigatórias totais (a) 25.367 30.059 30.306 35.936 41.303 49.703 56.432 60.205
Despesas obrigatórias com operações de crédito (b) 0 0 177 529 0 1.776 2.641 0
Demais despesas obrigatórias ( c ) 25.367 30.059 30.129 35.406 41.303 47.927 53.791 60.205
Despesas discricionárias totais ( d ) 7.076 9.240 9.957 10.116 9.524 8.091 10.283 10.057
Despesas discricionárias com operações de crédito (e) 210 515 1.030 945 368 69 2.796 2.524
Demais despesas discricionárias (f) 6.866 8.725 8.927 9.170 9.156 8.022 7.487 7.533
Despesa Total (a + d) 32.443 39.299 40.263 46.051 50.827 57.794 66.715 70.262
Despesa Total sem operações de crédito (g = c + f) 32.233 38.784 39.056 44.576 50.459 55.949 61.278 67.739
Demais despesas obrigatórias / Despesa total sem
operações de crédito (c/g)78,70% 77,50% 77,14% 79,43% 81,85% 85,66% 87,78% 88,88%
Demais despesas discricionárias / Despesa total sem
operações de crédito (f/g)21,30% 22,50% 22,86% 20,57% 18,15% 14,34% 12,22% 11,12%
26
Figura 3: Participação das despesas discricionárias no total das despesas orçamentárias de Minas Gerais, desconsideradas as operações de crédito
Fonte: Elaborado pelo autor
Com a exclusão das despesas com operações de crédito, pela distorção
que podem causar nos anos de 2012 e 2013 principalmente, a queda dos gastos
estaduais com despesas discricionárias é vertiginosa, chegando a um gasto de
apenas 11,12% em relação ao total da despesa de 2014. Vale ressaltar que essa
queda começa a se acentuar exatamente no exercício de 2010, coincidindo com o
início dos principais aumentos das despesas de pessoal.
Ainda que o crescimento da rigidez orçamentária do Estado de Minas
Gerais esteja evidente a partir dos dados apresentados, temos que considerar outra
variável que pode dar alguma margem a esses acréscimos. Trata -se de verificar em
que proporção o aumento da receita estadual tem acompanhado o aumento das
despesas obrigatórias.
É interessante que o Estado tenha condições de realizar seus gastos com
despesas obrigatórias a partir de sua arrecadação livre e recorrente. Caso as
receitas dessa natureza não tenham condições de arcar com parte considerável dos
gastos mínimos e legais, o Estado pode ter problemas em cumprir suas obrigações.
Logo, em casos onde é verificado grande aumento das despesas obrigatórias
(conforme identificado) é notória a necessidade de acompanhamento no
crescimento das receitas estaduais.
27
Portanto, para verificar em que medida isso vem ocorrendo no orçamento
de Minas Gerais, a Tabela 9 faz uma comparação de quanto da Receita Corrente
Líquida (RCL) está comprometida com as despesas obrigatórias mineiras:
Tabela 9: Receita Corrente Líquida x Despesas Obrigatórias
Fonte: Elaborado pelo autor
Mais uma vez é possível verificar um problema na evolução do orçamento
mineiro nos últimos oito anos. Ainda que de 2007 a 2009 a despesa obrigatória já
fosse maior que a receita corrente líquida de Minas Gerais, é possível perceber que
a partir de 2010, a cada exercício financeiro a situação piora consideravelmente,
sendo que apenas em 2014 o comprometimento é reduzido.
Apesar do constante crescimento anual da RCL entre os anos de 2010 e
2014 (ainda que seja perceptível uma desaceleração a partir de 2012), com
incrementos médios de 10,4%, a despesa obrigatória teve aumento médio de
14,81% nesse mesmo período. Isso significa que, além do governo ter aumentado
os gastos com despesas legais e obrigatórias, o crescimento da receita corrente
líquida desenvolveu-se menos, gerando assim um problema fiscal ainda maior.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao longo do trabalho procurou-se analisar as duas principais causas da
rigidez do orçamento público: as vinculações de receitas e despesas e o alto
comprometimento com despesas obrigatórias. Na análise dos dados de execução
orçamentária dos anos de 2007 a 2014 do Estado de Minas Gerais, foi possível
perceber que esse é um grande problema pelo qual o governo passou no período.
Em milhões de R$
Descrição / Ano 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014
Despesa obrigatória final* (a) 25.367 30.059 30.306 35.936 41.303 49.703 56.432 60.205
Receita Corrente Líquida (b) 23.804 29.242 29.118 33.179 37.284 40.371 43.141 47.644
Comprometimento da RCL em relação
às despesas obrigatórias (a / b)106,57% 102,79% 104,08% 108,31% 110,78% 123,11% 130,81% 126,36%
*Excluídas as despesas intra orçamentárias com o aporte atuarial para cobertura do déficit do RPPS e as despesas intra
orçamentárias do FES em favor das outras unidades que executam despesas constitucionais com ASP.
28
O principal motivo para o alto nível de rigidez orçamentária enfrentada por
Minas Gerais está no grande crescimento das despesas totais de pessoal. Através
da análise de poucas situações foi possível identificar um aumento nos gastos dessa
natureza da ordem de R$9 bilhões (apenas com setor segurança e Secretaria de
Estado de Educação) entre os anos de 2010 e 2014, o que aumentou a participação
das despesas de pessoal em relação à despesa total do Estado em quase 4%
no período.
Além da decisão tomada pelos governantes de comprometer grande parte
de suas despesas com reajustes salariais, concursos públicos e outros benefícios
ligados aos gastos com pessoal, identificou-se também que algumas
alterações/regulamentações de legislações que tratam sobre vinculação de receitas
e despesas também tiveram impacto direto no incremento da rigidez orçamentária
estadual. Os dois principais casos identificados foram a publicação da Instrução
Normativa do TCE-MG que vetou a inclusão de despesas com inativos nas
aplicações estaduais em MDE e ASP para fins do cumprimento de mínimo
constitucional exigido, além da aprovação da Lei Complementar 141 que
regulamentou como devem ser executadas as despesas com ASP para fins de
cumprimento do mínimo constitucional exigido. Com esses dois instrumentos, o
Estado viu-se obrigado a aumentar as despesas nas duas áreas.
Ainda pior que o aumento excessivo das despesas obrigatórias foi a
verificação de que as receitas estaduais não têm acompanhado o ritmo de
crescimento dos gastos. O incremente médio da RCL mineira tem ficado abaixo do
crescimento médio das despesas obrigatórias, o que deve ser considerado
preocupante pelos governantes.
Apesar de boa parte da rigidez mineira ter sido causada por decisões do
próprio governo no que diz respeito à sua folha de pessoal, é necessário verificar se
essa situação de engessamento não é uma regra geral para Estados e Municípios
brasileiros. Futuros estudos podem fazer comparações entre os entes da federação
e verificar se esse problema não vem ocorrendo de modo geral, e caso essa
hipótese seja confirmada, tem que ser verificado se as causas são semelhantes.
29
6 REFERÊNCIAS
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30
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AUTORIA
Felipe Magno Parreiras de Sousa – Secretaria de Estado de Planejamento e Gestão SEPLAG/MG.
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