A reforma do sistema previdênciário brasileiro: a previdência complementar e o papel do Estado

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Descreve que envolve o sistema previdênciário brasileiro e as medidas adotadas pelo Estado.

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  • FUNDAO GETLIO VARGAS ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAO PBLICA CENTRO DE FORlvIAO ACADEMICA E PESQCISA CURSO DE iVIESTRt\DO EM ADMINISTRAO Pl13LICA

    REFORMA DO SISTEMA PREVIDENCIRIO BR.\.SILEIRO:

    A PREVIDNCIA COMPLEMENTAR E O PAPEL DO ESTADO

    DISSERTAO APRESENTADA ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAO PBLICA PARA A OBTENO DO GRAU DE MESTRE EM ADMINISTRA O PBLICA

    MARIA TEREZA DE MARSILLAC PASINATO

    Rio de Janeiro, maro de 200 I

  • FUNDAO GETLIO VARGAS ESCOLA BRASILEIRA DE ADMINISTRAO PBLICA CENTRO DE FORMAO ACADMICA E PESQUISA CURSO DE MESTRADO EM ADMINISTRAO PBLICA

    REFORMA DO SISTEMA PREVIDENCIRIO BRASILEIRO: A PREVIDNCI A COMPLEMENTAR E O PAPEL DO ESTADO

    Dissertao de mestrado apresentada por:

    Maria Tereza de Marsillac Pasinato

    Aprovada em 19 de maro de 2001 Pela Comisso Examinadora

    Lus Cesar Gonalves de Araujo (Doutor em Administrao de Empresas)

    Paulo Roberto e Mendona Motta (Doutor em Administrao Pblica)

  • AGRADECIMENTOS

    Gostaria de agradecer s Mulheres Maravilhosas que fazem parte da minha vida e

    me deram a estrutura necessria para acreditar nos meus projetos; ou desde a origem como no caso das minhas mes - Eunice, Maria Izabel e Luclia - ; ou se incorporaram ao longo

    do caminho e jamais me abandonaram como no caso da minha "irm" - Maria Paula. Ao Kaiz - meu "chefe", amigo e "torturador" - no tenho palavras para descrever

    os oito anos de convvio, em que apesar de todas as brigas e diferenas de pontos de vista,

    nada suplanta a alegria de poder desfiutar da enorme capacidade intelectual e tcnica deste

    orientador/educador.

    Devo agradecer, tambm, aos meus amigos e companheiros de trabalho do IPEA e

    da ENCEIIBGE, que muito contriburam para meu entendimento mais "generalista" da

    realidade econmica, poltica e social que estudamos. Destes gostaria de ressaltar toda a

    ajuda de: Ana Amlia Camarano, Carlos Frederico Braz de Souza, Daniele Manao, Fernanda Paes Leme Peynau, Francisco Eduardo Oliveira, Luiza LaChroix, Marta Castilho, Neide Patarra e Paulo Tafner.

    Quanto ao corpo docente e administrativo da EBAP/FGV, agradeo a enorme pacincia e dedicao com que sempre fui tratada. Em especial gostaria de agradecer aos

    professores Frederico Lustosa, Lus Csar Arajo, Paulo Motta, Snia Fleury, Valria e Dborah. No poderia jamais esquecer, tambm, da enorme dedicao e simpatia da Vaninha, do Joarez, do Jorge, do Paulinho e do Z Paulo, que com 'Jeitinho" sempre conseguiram consertar minhas confuses "institucionais".

    Ao CNPq tenho que agradecer pelo financiamento dos meus estudos durante o primeiro ano do mestrado, sem o qual, no estaria agora apresentando os resultados obtidos.

  • RI:SUMO

    Apesar do indiscutvel avano que os sistemas previdencirios representaram no

    campo social verifica-se, em todo o mundo, um crescente consenso quanto necessidade de se repensar sua estrutura. As recentes transformaes da estrutura demogrfica, do mercado

    de trabalho e do processo de globalizao da economia, nos remetem a uma nova realidade

    e ao imperativo de buscar novas solues para assegurar a proteo social. Por outro lado, o

    Estado, enquanto promotor do desenvolvimento e de reduo das desigualdades, se

    encontra sob severo questionamento, ao passo que a moral individualista e os mritos do

    mercado gozam de crescente prestgio. Como resultado destas mltiplas presses, o Brasil,

    a exemplo de vrios outros pases, vem experimentando um processo de ajustes e reforma de seu sistema previdencirio, no qual o fortalecimento do elo entre contribuies e

    beneficios tem-se constitudo o principal elemento. Nesse sentido, o desenvolvimento do

    regime complementar privado ocupa um espao cada vez maior na formulao e execuo

    de polticas pblicas. Com a aprovao da Emenda Constitucional no. 20 (em dezembro de 1998) foram

    lanadas as novas diretrizes para o sistema previdencirio brasileiro. O trabalho analisa as iniciativas estatais at o momento realizadas, e sua contribuio para a construo de um arcabouo regulatrio para a rea, mais adequado s novas demandas sociais, econmicas e

    polticas.

  • ABSTRACT

    Despite the unquestionable advances the social security systems represented in the social arena, it can be observed, in the whole world, an increasing consensus about the

    necessity of rethinking its structure. The recent changes in demographic and labor market

    structure, and the process of globalization of the economy, bring the imperative of a new

    reality and the need to reach new solutions to assure social protection. On the other hand,

    the State in charge of the development and reduction of inequalities, is under severe

    questioning, while the individualistic moral and market advantages enjoy an increasing popularity. As result of these multiple pressures, Brazil, as many other countries, is passing

    through a process of adjustments and reforms of the social security system, where the link between contributions and benefits represents the main element. The development of the private pension system occupies an ever increasing space in the arena of planning and implementing public policies.

    With the approval ofthe Constitutional Amendment no. 20 (in December of 1998), new parameters for the Brazilian social security system have been defined. This work analyzes the State initiatives carried through for this area till now, and its contribution for the construction of a regulatory framework, more adjusted to the new social, economic and politic demands.

  • NDICE

    L\TRODU40 ______________________________ 2

    C4PTUL01 PROTEAo SOCIAL N4S SOCIEDADES l\fODERAA..S' __________________ 5

    1.1- Proteo Social e os Contratos Sociais _____________________ 6

    1.2 - Origem e Evoluo dos Sistemas de Previdncia Social 8

    1.3 - Crise e Reestruturao 14

    C4PTUL02 1\f4RCO CONCEITUAL DOS SISTEM4S PREI WENCIARlOS E O P4PEL REGULADOR DO ESTADO 22

    2.1- Definio de um Sistema Pre,idencirio 23

    2.2 - As Falhas de Mercado e a Illtenreno do Estado 30

    2.3 - O Arcabouo Regulatrio para a Pre,idncia Complementar 34 2.3.1 - Estrutura Conceitual 37 2.3.2 - Regulao sobre a Estrutura e Confofilao das entidades 38 2.3.3 - Limites de Investimentos, Regras de Rentabilidade Nlinirna e G'dl"antias Estatais 42

    C4PTUL03 EVOLUJio Do SISTEJL4 PREHDENCLt.RIO BRASILEIRO _______________ 45

    3.1- O Regime Geral de Pre,idncia Social ____________________ 46 3.1.1 - Vinculao por Empresa 47 3.1.2 - Vinculao por Categoria Profissional 49 3.1.3 - Unificao lnstitutional 52 3.1.4 - Universalizao da Cobertura 53 3.1.5 - Crise e Reestrururao til

    3.2 - Regimes Especiais dos Senidores Pblicos __________________ 65

    3.3 - Pre,idncia Complementar 73 3.3.1 - Liberalismo Econmico -: 4 3.3.2 - Desenvolvirnentismo Estatal 75 3.3.3 - Crise Econmica e globalizao financeira ____________________ ..

    C4PTULO 4 REFORMA DO SISTEMA PREIWENCIARlO EEsTRUTURA REGULA TRlA DA PREIWNCIA COMPLElfENTAR: A EXPERINCIA INTER1v:4CIONAL E O C4S0 BRASILEIRO 84

    4.1- Regulao da Pre,idncia Privada: A Experincia Internacional 89 4.1.1 - Definio de uma poltica de regulao 90 4.1.2 - Atividade Reguladora: seus lnstnunentos e l\'1ecanismos 98 4.1.3 - Fiscalizao 102

    4.2 - Reforma da Pre,idncia no Brasil e as Implicaes sobl"e o Regime Complementar 89 4.2.1 - Lei 6.435 e a Estrutura Regulatria 105 4.2.2 - Refonna da Previdncia e a Proposta para a Nova Estrutura Regulatoria 115

    CONCLUS.40 127

    BIBLIOGRAFIA 138

  • INTRODUO

    o Brasil, realizou nos ltimos anos da dcada de 1990 a primeira etapa da reforma do

    sistema previdencirio - ou, dito de outra forma, uma srie de ajustes finos - necessria para a sua adequao s demandas sociais, econmicas e polticas desta nova etapa de acumulao do

    modo de produo capitalista e das instituies que o conformam e delineiam seu

    funcionamento. Dessa forma, as medidas aqui adotadas no diferem tanto das medidas adotadas

    na grande maioria dos pases desenvolvidos, ou em desenvolvimento em todo o mundo, onde a

    grande questo que se coloca : o novo papel do Estado e o desenvolvimento de mecanismos

    que assegurem a ordem social em economias cada vez mais transnacionais.

    Apesar do indiscutvel avano que os sistemas previdencirios representaram no campo

    social verifica-se, em todo o mundo, um crescente consenso quanto necessidade de se

    repensar sua estrutura. As recentes transformaes da estrutura demogrfica, do mercado de

    trabalho (e da prpria organizao da produo), do processo de globalizao da economia, e na arena poltica, nos remetem a uma nova realidade e ao imperativo de buscar novas solues

    para assegurar a proteo social. Por outro lado, o Estado, enquanto agente promotor do

    desenvolvimento e de reduo das desigualdades, se encontra sob severo questionamento, ao

    passo que a moral individualista e os mritos do mercado gozam de inusitado prestgio. Como

    resultado destas mltiplas presses, os pases, em todo o mundo, tm experimentado processos

    de crises e de rpidas - e, algumas vezes radicais - mudanas no campo previdencirio.

    As duas ltimas dcadas foram marcadas pelo sem nmero de iniciativas em todo

    mundo de reformas que procuravam equacionar os graves problemas de desequilbrio financeiro-

    atuarial verificado em praticamente todos os pases que contavam com sistemas previdencirios

    de longa data. medida em que os regimes previdencirios bsicos em regime de repartio entram em colapso, face presso inexorvel dos fatores demogrficos e econmicos, a

    esmagadora maioria das reformas os substitui por alguma forma de capitalizao: em conta

    individual ou coletiva, compulsria ou voluntria; que possibilitem o fortalecimento do elo entre

    contribuies e beneficios. Assim, os chamados fundos de aposentadorias e penses, em

    conjunto com as instituies financeiras e seguradoras que atuam nesse mercado, j representam os maiores investidores institucionais mundiais. A ttulo de exemplo, temos que os vrios

    2

  • regimes de Previdncia Privada existentes hoje no mundo administrm recursos estimados em cerca de US$ 7,0 trilhes (OLIVEIRA e outros, 1997) Estes recursos representam parcelas muito significativas quando comparados ao PlB, denotando sua relevncia enquanto mecanismos

    de captao e alocao da poupana interna. Nos Estados Unidos esses recursos alcanam

    aproximadamente 70 % do PlB. Mais ainda, a tirar pela experincia chilena, onde, em um

    perodo inferior a 20 anos, o patrimnio acumulado pelas Administradoras de Fundos de Penso

    atingiu cerca de US$ 20 bilhes em junho de 1996, tendo passado de 0,8% do PIB em 1981 para aproximadamente 40 % do PIB em 1996 (EMEDIATO, 1998), tem-se um imenso potencial para o desenvolvimento do setor. As reformas j realizadas em praticamente todas as regies do mundo - Amrica Latina, pases da OECD (Organizao Econmica para a Cooperao e Desenvolvimento), Leste Europeu e sia - tendem, dessa forma, a ampliar ainda mais o mercado de previdncia privada no mundo.

    Sob o ponto de vista terico, os mercados de previdncia privada caracterizam-se por

    uma extrema complexidade e alto grau de imperfeio. So mercados claramente assimtricos e

    de baixa transparncia, onde vendedores e compradores tm niveis de informao totalmente

    dspares. Com efeito, dada a prpria complexidade do produto transacionado - planos de

    previdncia - compradores tm pouca percepo / informao que venha a instruir o seu

    processo decisrio; em contrapartida, vendedores, usualmente, dominam plenamente todos os

    aspectos tcnicos e mercadolgicos. Em se tratando de uma modalidade de seguro, tambm a

    previdncia privada est sujeita a situaes de risco moral (moral hazard) - quando os agentes alteram seu comportamento aps a realizao do contrato - e, de carona (jree rider) - ou seja, algum que recebe o mximo pagando o mnimo. Decises tomadas hoje podero influenciar os resultados em prazos extremamente dilatados, muitas vezes abrangendo todo o ciclo de vida dos

    indivduos. Nestas situaes, decises equivocadas podem ter resultados irreversveis e de

    efeitos catastrficos ao nivel individual. Finalmente, dadas as economias de escala existentes

    neste tipo de atividade e caso haja padronizao do produto, h uma ntida tendncia concentrao de capital, resultando em comportamentos oligopolsticos indesejveis por parte de operadoras de previdncia privada.

    Esta enorme importncia e complexidade das atividades de previdncia privada, tanto ao

    nvel micro (indivduos e empresas) quanto macro (estoque de capital, poupana agregada, etc.), aliada s "falhas de mercado" impem, por sua vez, um enorme desafio em termos de polticas pblicas: o estabelecimento de um patamar socialmente acordado para a proviso

    3

  • previdenciria bsica e a construo de um aparato regulatrio para as atividades de previdncia

    privada que garanta, simultaneamente, transparncia, competitividade, segurana e rentabilidade

    nestes mercados.

    Para o bom entendimento da questo faz-se necessria uma anlise do contexto

    institucional que propiciou o surgimento dos sistemas previdencirios e um breve retrospecto

    histrico das origens, consolidao e transformaes de que foram objeto, neste, quase, sculo de sua existncia. Estes aspectos sero tratados no primeiro captulo.

    O segundo captulo tem por objetivo; definir a estrutura de um sistema previdencirio e das vrias partes (ou no vocabulrio tcnico adotado, os pilares que o conformam); identificar os problemas ou dificuldades referentes ao seu bom funcionamento resultantes dos conflitos

    inerentes ao setor - falhas de mercado - e o papel do Estado na resoluo dos mesmos; e, por

    ltimo os mecanismos regulatrios tradicionalmente adotados.

    No terceiro e quarto captulos so abordadas as especificidades do sistema brasileiro,

    enfocando, especialmente, a crescente participao da previdncia privada; sua evoluo (objeto da anlise do terceiro captulo) e as recentes transformaes e perspectivas futuras luz do que vem ocorrendo no cenrio internacional (quarto captulo).

    4

  • CAPTULO 1

    PROTEO SOCIAL NAS SOCIEDADES MODERNAS

    "t\.:1ecanismos d~ redistrihuio de renda ~ntre indivduos economicamente ativos e inativos sempre existiram, quaisquer qu~ s~jam as sociedades analisadas. Todo individuo em idade ativa est s~ieito aos riscos sociai..., de perda de sua capacidade de trabalho decorrentes d~

    contingncias scio-econmicas, tais como: idad~, doena, invalid~z, desemprego, matemidad~,

    recluso e morte.

    As sociedades contemporneas, geralmente, organizam formas de proteo social para o

    caso dessa perda da capacidade laboral baseadas em trs mecanismos bsicos, podendo sempre

    ocorrer uma combinao dos mesmos, determinando para cada caso um padro de interveno

    do Estado (PINHEIRO, 1998). transferncias informais, baseadas na tradio e cultura, internas s famlias ou

    comunidades das quais os individuos fazem parte;

    contratao de seguros individuais junto a organiza~s especializadas, normalmente, privadas; ~,

    programas estatais compul..,rios e contributivos.

    Esses mecanismos no so mutuamente exclusivos. Mesmo que ainda hoje as transferncias informais, baseadas na solidariedade familiar e comunitlla como por exemplo o conceito de

    farrlia extendida., ainda sejam largamente utilizadas, pode-se perceber uma clara evoluo aps o advento da industrializao, e a conseqente dissociao entre unidade familiar, produtiva e

    organizacional, no sentido da adoo dos outros dois mecanismos. Estes dois mecanismos -

    contratao de seguros privados e programas estatai.., compulsrios, ou sua articulao -

    conformam os sistemas previdencirios, como atuahnente so entendidos e conformam o objeto de estudo do presente trabalho.

    5

  • Nesse pnrnerro captulo so abordados: o contexto institucional que propicIou o

    surgimento dos sistemas previdencirios e um breve histl;co de suas origens. consolidao e

    transfonnaes.

    1.1 - Proteo Social e os Contratos Sociais

    Os sistemas previdencirios se desenvolveram com base em esquemas securitrios, nos

    quais as garantias sociais estavam associadas a seguros obrigatrios com cobertura dos

    principais "riscos" que os individuos passaram a enfrentar em decon'ncia da nova estrutura

    laboral ocasionada pelo processo de industrializao e transferncia do "locus" de anlise da

    sociedade, d..1 fanlia para as organizaes. Nas sociedades tradicionais, o ptIDcpio de coeso

    social faz parte da prpria estrutura das mesmas. As hierarquias e as distines, como as

    equiv'alncias, ligaram os homens entre si de modo orgnico. O vinculo social era percebido

    como algo natural. A sociedade moderna se v s voltas com tennos completamente diferentes,

    fazendo-se necessrio buscar novos tipos de relacionamento entre os homens. Ou seja, ocorre a transposio de uma estrutura social-organizacional basead..1 no status para um estrutura

    contratual. Este fenmeno pode ser identificado no pen

  • Ao longo do siculo XiX vrias mudanas ocorreram de forma a alterar profundamente

    os conceitos bsicos que articulavam o pensamento contratual clssico. Talvez uma das mais

    importantes transformaes, especialmente no que tange ao objeto do trabalho, se refere questo da igualdade. O reconhecimento da exist~ncia de diferenas substantivas entre

    individuos (ou grupos de) permitem a progressiva legitimao dos direitos sociais. Nessa nova perspectiva a pertin~ncia a determinados grupos de atores sociais passa a determinar o tipo de

    regime contratual que regular as relaes das quais os mesmos fazem parte e determinar

    padres especficos e particulares de regulao pblica/estatal.

    O Direito Social passa a estabelecer discriminaes positivas, no sentido de proteger as

    partes mais vulnerveis da relao (o trabalhador, o idoso, o pobre, etc.). O advento da Seguridade Socia~ em meados do sculo XX, nas economia') desenvolvidas, dessa forma, sinalizou claramente a insuficincia dos princpios liberais de mercado e a busca por ideais

    "emergentes" de justia distributiva e igualdade. As origens do conceito de segurana e, na sua forma especfica de gesto social nos

    remete aos seguintes entendimentos prticos (ROSANVALLON, 1998): a) tcnica') de controle e previso de riscos - surgimento dos clculos atuariais; b) prticas de reparao de danos -representando uma aproximao do direito contratual com o direito sobre respon')abilizao civil (ex. acidentes do trabalho); c) instituies de segurana pblica e privada.

    O contrato social clssico, fundamentado na noo de troca, substitudo pela noo

    de acordos de solidariedade, fundamentados na idia de justa distribuio ou eqitativa alocao dos nus e lucros sociai'). Nesse sentido, o Direito Social passa, cada vez mais, a ser o resultado do equilbrio entre interesses conflitantes formalizado com um acordo que sempre implicar

    sacrificios mtuos (ainda que com concomitantes ganhos). Nos sistemas de Seguridade Social capitaneados pelo Estado, c11am-se fOlmas de solidariedade que passam a regular os conflitos.

    O Direito Social um Direito das desigualdades e toma-se um instrumento poltico e

    administrativo, medida que orienta os C11trios de legitimao das polticas sociais e dos

    acordos de cooperao econmica. Os direitos especiais e privilgios so di')tribudos segundo sistemas polticos e econmicos de pesos e contrapesos.

    A solidariedade impe um compromisso em torno do que acaba sendo considerado

    socialmente correto. Pelmeando toda a discusso se encontra a noo de equilbrio que em um

    contrato pode ser entendida como wna medida de reciprocidade. O juzo em termos de equilbrio pressupe a justia enquanto distribuio e alocao eqitativa de vantagens e

  • proventos. !vl-\CEDO Jr (1998) com base no pen~amento de Durkheim, ressalta que a reciprocidade s pode s~r obtida atravt!s da cooperao e, isto no ocone sem diviso social do trabalho, sendo desta forma a solidariedade o elemento de coeso social (de natureza moral) que permit~ que os indi,duos fmnem contratos.

    Nos ltimos anos, muito tem-se enfatizado a importncia das relaes de confiana

    para a nova configurao econmica. A confiana se reveste de elemento produtivo mais

    importante, em especial dentro de uma estrutura ps-fordista de produo e, pode ser entendida

    como uma expectativa mtua de que, numa troca, nenhuma parte ir explorar a vulnerabilidade

    da outra. preciso ressaltar que apesar do conceito de solidariedade comportar a idia de confian~ esta ltima se restringe a questo da no explorao, no implicando, no entanto, na co-responsabilidade pelos nus e vantagens, elemento essencial para o conceito de

    solidariedade.

    As transformaes que o sLo;;tema de produo capitalista vem sofrendo tambm se

    reflete em uma crise de legitimao do Estado, no que se refere ao seu papel de administrador

    eficiente dos problemas sociais. O Estado, a partir da dcada de 1980 passa a ser identificado

    com um instrumental cada vez mais opaco e crescentemente burocratizado, que prejudica a percepo de sua finalidade e provoca uma crLo;;e de legitimidade (ROSAN'/ALLON, 1998).

    Sinteticamente, dois problemas cruciais surgem de imediato nessa crise de legitimao

    do Estado: a desagregao dos princpios de organizao da solidariedade e o fracasso da

    concepo tradicional dos direitos sociais. No se trata, do questionamento do papel do Estado,

    principalmente no que se refere s potiticas previ.dencirias, como mantenedor da coeso social

    e, sim, a forma de readapt-Io para que possa continuar a exercer esta funo.

    1.2 - Origem e Evoluo dos Sistemas de Previdncia Social

    Apesar do trabalho remunerado, da pobreza e da misria j existirem nas sociedades pr-industriais, foi somente com o trabalho assalariado e o empobrecimento na era industriaL que as

    demandas por mudanas sociais mais drsticas emergiram na arena social, potitica e econmica.

    V rias so as interpretaes sobre o "por que" do surgimento dos sistemas de proteo social

    capitaneados pelo Estado: a) estruturais - privi.legiando os aspectos econmicos envohidos no processo de industrializao e modernizao das sociedades contemporneas ou inerentes a

    prpria evoluo do modo de produo capitalista; ou b) fruto da ao potitica - enfatizando as

    8

  • questes de ord~m poltica e institucional como a luta de classes e as estruturas de poder existentes na sociedade I . O Quadro 1.1 apresenta uma sntese das principais correntes.

    Quadro 1- Breve descrio das principais correntes tericas sobre as origens dos Sistemas de Proteo Social

    Teorias Determinantes Resultado Evolucionista

    Neo-marxista

    Pluralista

    - Lgica inerente ao processo de industrializao e suas consequncias sobre organizao do Estado e da estrutura social

    - As demandas por direitos scio-econmicos surgem aps a obteno dos direitos civis e polticos

    - Os sistemas de proteo social surgem como um subproduto do desenvolvimento leconmico, que implica no aumento e !generalizao dos riscos

    - O avano tecnolgico implica no 1- Os sistemas de proteo social surgimento do trabalho excedente decorrem da necessidade de (exrcito industrial de reserva) e na iacumulao, reproduo e legitimao necessidade de interveno estatal como Ido modo de produo capitalista forma de reproduo e controle da fora I de trabalho I

    I - a organizao da classe operria I

    - estrutura de poder presentes na I - Os sistemas de proteo social como sociedade (sindicatos, partidos polticos) fruto da mediao poltico-partidria dos

    coflitos de classe - capacidade dos partidos social

    democratas de mediao entre os interesses do capital e trabalho

    Neo-Institucionalista I

    Capacidade organizacional do Estado

    - Os sistemas de proteo social como Iresultado da alocao no mercantil dos Irecursos econmicos de forma a Icompatibilizar o socialmente desejvel Icom o economicamente vivel

    i mediao das instituies democrticas para os conflitos de interesse presentes na sociedade

    Fonte: Notas de aula do curso de formao dos espeCialistas em polticas publicas e gesto governamental (1996), ministrada pela professora Argelina Cheibub Figueiredo na ENAP.

    Os pr-requisitos e as foras que impulsionaram o processo de industrializao foram,

    acima de tudo, as inovaes tcnicas que transfonuaram a explorao dos recursos naturais e

    aumentaram a produtividade do traballio. A grande novidade foi a introduo de mquinas,

    geradoras de fora e, sua utilizao como mquinas-felTamentas. A sociedade modema

    (industrial) pode ser caracterizada pela busca de emancipao em relao natureza, que se refletiu em novas fonuas de relacionamento entre os individuos. .As relaes entre

    comerciantes" e seus artfices (assistentes, aprendizes) deveriam ser acordadas Ih,Temente entre

    1 Ver FLEURY 0(94), ARRETCHE (1995) e PINHEIRO (1998), 9

  • as partes. Este fato se baseava na "suposio" de que ambas as partes possuam o mesmo poder

    de barganha nas negociaes.

    Por um lado, a disseminao das guildas (cooperativas de artesos), a liberdade comerciaL a padronizao dos meios de pagamento e dos servios postais, a estruturao dos

    Estados-Nao, criaram condies politicas e legais para o desenvolvimento econmico; por

    outro as liberdades individuais, bem como os contratos de trabalho influenciaram diretamente

    na fonnao da '"moderna" classe trabalhista.

    O final do sculo 'L".: assistiu ao triunfo do capitalismo industrial como sistema econmico, ressaltando-se para isso a propriedade privada e o acesso privado ao capital. 10;;so

    criou ou, pelo menos, exarcebo~ os conflitos sociais de fonna nunca antes observada, ocasionando o histrico rompimento entre capital e trabalho. Ou seja, explicitou-se o conflito entre os empregadores - detentores dos meios de produo - e, os trabalhadores assalariados -

    cuja nica propriedade era sua prpria fora de trabalho.

    Os' nwl'imentos a~'si51~nciaJistas e mutualistlls anteriores ao sculo _L'Y:O exemplo Ingls

    At o final do sculo XIX, as principais fonnas de interveno estatal para a proteo

    aos riscos sociais eram de carter assistencialisL:1 e ocorriam ex post, ou seja apenas em casos nos quais as fonnas tradicionais falhassem. O principal exemplo foram as Leis dos Pobres

    (POOl' Lmrs) - implementadas no Reino Unido ainda no final do sculo XVI (1598 - Esccia) e incio do sculo '\!II (1601). Estas leis estabeleciam o dever de assistncia aos pobres pela sociedade civil, garantindo um padro de vida minimo aos doentes, idosos e invlidos atravs de

    instituies pblicas onde os beneficirios recebiam alimentao e alojamento. As Poor Lmvs eram baseadas, puramente, no princpio de caridade crist~ no representando, portanto, medidas de proteo especficas ao trabalhador assalariado.

    Essa tendncia sofreria uma inflexo, apenas no final do sculo XVII, plincpio do sculo

    'VlII, quando o problema dos trabalhadores de baixa renda assume um papel mais relevante na arena social. Nesse perodo, o seguro surge como um instrumento de justia e como uma forma de solucionar os problemas dos riscos sociais. De acordo com ROSANVALLON (1998), dispe-se nessa poca de trs modelos para a concepo do vinculo entre os indivduos ou

    grupos de: o contrato (representando o vnculo jurdico, resultante da confrontao poltica); o mercado (representando o vnculo econmico, em que os conflitos de interesse econmico

    10

  • eram rl!solvidos); I! o seguro (representando o vnculo social, criando elos de solidaril!dadl! social). }';o com surprl!sa datar deste ml!smo petodo, o desl!nvolvimento das cooperativas de trabalhadores (Friendzr Societies) que podem ser entendidas como organizaes de trabalhadores que se apoiam mutuamente contra detenninados riscos sociais - por exemplo,

    doena, desemprego, etc ..

    O mode/o securitrio do Chance/er Bismark na Alemanha do final do sculo XIX

    A plimeira instituio de um sistema prevdencirio, por parte do Estado, no entanto,

    ocorreu na Alemanha em fins do sculo XIX, e pode ser entendida, em parte, como parte da

    estratgia do chanceler Otto von Bismark de conter o avano do acelerado crescimento e

    organizao do mOvimento operrio. As primeiras lei; datam da dcada de 1880, quando

    Bismark introduziu o que, para a poca, viria a ser um avanado estatuto social: Seguro Sade

    para os trabalhadores (1881); Seguro Acidentes do Trabalho (1884); Aposentadorias por idade e invalidez (1889). Pela primeira vez, a proteo aos liscos previdencirios era entendida como um direito do trabalhador, ou sl!ja, a questo previdenciria saa da arena assistencial para se tornar parte integrante de um conjunto de questes mais amplas relacionadas ao mundo do trabalho da era industrial.

    Essl! modelo fortemente marcado pelo conceito de seguro, apoiado em um I!squema

    de financiamento tripartite, em que participam os empregados, empregadores e Estado. um seguro compulsrio visando reposio - total ou parcial - de renda do indivduo ou grupo

    familiar quando da perda da capacidade laborativa e, consequentemente, os valores das

    contribuies e dos beneficios devero guardar uma estrita correspondncia. Os recursos

    deveriam ser capitalizados coletivamente para o postelior pagamento dos beneficios.

    Uma caracteristica notvel desse modelo a clara separao do regime financeiro e

    operacional, com custeios e admini;traes espl!cficos, dos diversos programas de proteo

    social: aposentadorias, auxlio maternidade, liscos profissionais, desemprego, etc ..

    O JlJodelo LiberallVorte-Amencano

    A sociedade norte-americana., fortemente influenciada pelos ideais liberais, representou

    uma das ltimas iniciativas do estabelecimento de sistemas de proteo sociaL mais

    11

  • esp~cificamente de previd~ncia social .capitaneada pela mquina estatal. Isso se deve em grande parte a crena de que a responsabilidade pela proteo contra os liscos da rea previdenciria

    residia nos prprios indivduos, que em ltima instncia eram os maiores interessados na

    manuteno de suas rendas no perodo de inat\idade. O sistema pblico de seguridade social norte-americano foi estruturado apenas aps a

    grande crise de 1929, quando a economia americana atravessou um longo perodo d~ recesso. Dentro do regime politico federativo, vrias irciativas isolad.:1s de criao de si "temas

    previdencirios foram adotadas ao longo das dt!cadas de 1920 e 1930. Em 1930, 17 estados

    federados j possuam algum tipo de sistema previdencirio. O grande passo para um sistema nacional foi dado, no entanto, em 1934, quando o ento presidente Roosevelt instituiu um

    Comit (Comitee 011 Economic Security) com o objetivo de crar um plano de seguridade social. No ano seguinte - 1935 - atravs do Social Security Act (SSA), foram criados oficialmente os doi" primeiros programas do sistema de seguridade social norte-americano: o

    seguro desemprego e a Aposentadoria por Idade (Old Age Benefits - OAY O sistema foi gradualmente ampliado ao longo dos anos subsequentes, com a reformulao da aposentadoria

    por idade e extenso de sua cobertura aos dependentes em caso de morte do segurado (Old Age and SunJivors 1 nsurance - O ASI) e a criao de um beneficio de aposentadoria por invalidez (Security Disability lnsurance -DI) destinado aos afiliados que ficassem impedidos de trabalhar antes de se aposentarem. O novo sistema expandido ficou conhecido como OASDI e inclua os

    trabalhadores lUrais e autnomos.

    H que se ressaltar o marcante papel do mercado de pre\.i.dncia complementar ptivado

    na estrutura previdenciria norte-americana4 , na qual os primeiros planos privados de

    aposentadoria datam de 1870. Ao longo de todo o desenvoni.mento de planos privados de

    aposentadorias e penses nos Estados Unidos, o Estado jamais se furtou do entendimento de seu importante papel como entidade de normatizao e fIScalizao para o setor. Ainda em

    1921, o lnternational Revenue Code estipulou algumas diretrizes a serem seguidas pelos planos

    privados de seguridade. Ao longo do tempo, essas diretrizes foram sofrendo uma srie de

    modificaes e o govemo exercendo uma fiscalizao mais rigorosa sobre os planos de

    No campo assistencial, no entanto, se verificavam algumas iniciativas privadas ou pblicas ao nvel de estados e municipios. 3 Esse sistema entrou em vigor em Janeiro de 1937, e os primeiros beneficios pagos datam de 1940. 4 Para os traballiadores de alta renda, a manuten50 de um poder aquisitivo elevado aps a aposentadoria requer uma complementao dos benefcios pagos pelo OASDI. Coexistem inmeras entidades fechadas e abertas no mercado.

    12

  • previdncia privada. Um momento importante foi a promulgao, em 1947, da Lei Taft-

    Hartley, que contemplava a obrigatoriedade da negociao coletiva de salrios e condies de

    trabalho; tendo sido consideradas, a partir do ano posterior, a'l aposentadorias e pen'les no

    critrio condies de traballio. A partir de ento, o setor atravessou um periodo de grande

    dinamismo, com a proliferao nas dcadas de 1950 1970 de inmeros planos e fundos de

    aposentadorias e penses para grupos profissionais ou para grupos de empresas vinculados a

    uma detenninada organizao sindical. Em 1974 foi aprovada a primeira legislao mai'l

    abrangente sobre fundos de penso privados - o Employee Retirement lncome Acf (ERISA). Trs foram os principais objetivos que orientaram a elaborao do ERISA. O primeiro buscava impedir a discriminao entre participantes de um mesmo fundo evitando, por exemplo, que

    funcionrios graduados sofressem tratamento privilegiado "s--vs traballiadores menos graduados. O segundo era aumentar a segurana das aplicaes dos fundos, de modo a garantir

    os recursos necessrios para o pagamento dos beneficios futuros, tendo sido criada uma

    instituio garantidora dos beneficios (Pension Benefit Guarantee Corporatiol1 - PBGC). Finalmente, o terceiro buscava dar incentivos criao de novos fundos.

    O Estado do Bem-Estar de Lord Bel'eridge do Ps-Guerra

    Aps a Segunda grande guerra, em 1948, adotado na Inglaterra um novo modelo de

    proteo social, fortemente influenciado pelas polticas Ke)nesianas de estimulo a demanda agregada, cobrindo todos os riscos sociais e assegurando as necessidades essenciais dos

    cidados para alm daquelas exclusivamente previdencirias. Esse sistema foio baseado nas

    recomendaes do relatrio de Lord Beveridge, elaborado em 1942/ e tinha como alguns de

    seus princpios fundamentais: uniformidade de cobertura do beneficio bsico; unifonnidade da

    alquota de contribuio, unificao da respon'labilidade administrativa, suficincia do beneficio

    bsico para a manuteno das condies de subsistncia e universalidade de cobertura.

    Nesse modelo OCOITe um di'ltanciamento do conceito estlito de seguro e uma

    aproximao lgica da seguridade social, sendo dessa forma, o sistema entendido como uma poltica integrada de previdncia social, assistncia sade, assistncia social, seguro

    desemprego, auxilio maternidade, entre outros, de fonna a proteger o individuo i cidado de

    todos os riscos sociai'l. Os pases nrdicos, como por exemplo a Sucia, foram os que mal'l

    13

  • avanaram em direo a um amplo si'itema de proteo social. no qual a interveno estatal visa

    reduzir as desigualdades sociais como forma de reduzir as distores produzidas pelo mercado.

    Em termos de organizao e operacionalizao, esse processo se reflete na unificao e

    centralizao dos distintos programas. Para arcar com os novos gastos implicitos na ampliao

    da abrangncia do si

  • relao trabalhista e previd~nciria. A qu~sto do desempr~go, qu~ hoje atinge propores alarmantes em alguns pases da Europa, parec~ ter carter estrutural ou seja" ocorre independentemente da conjuntura econmica. Ao contrrio dos ciclos passados de inovao do capitalismo, os excedentes de mo de obra redundantes na modernizao dos processos

    produtivos parecem no encontrar absoro no mundo contemporneo. AssinL os sistemas de

    proteo social, que, via de regra, tomam o emprego como a norma e o desemprego como uma

    condio excepcional e transitria estIo sob intensa presso.

    Ainda no que diz respeito ao mercado de trabalho, um segundo fenmeno, que, nos

    pases do terceiro mundo, muitas vezes ocorre concomitante ao desemprego, o da

    informalizao e/ou precarizao dos mercados de trabalho. Sob o ponto de vista da seguridade

    social este fenmeno implica em reduo do nmero de contribuintes e, dependendo do

    desenho dos programas, numa presso por aumento nos beneficios. Outros fenmenos do

    mercado de trabalho tambm de grande importncia para o sistema previdencirio so o

    mgresso em massa das mulheres do terceiro mundo na fora laboral e a acelerao da

    mobilidade.

    J a globalizao pressiona os sistemas de mltiplas formas. Obrigadas a competir em

    mercados internos cada vez mais concorrenciais, as empresas perdem a capacidade que tinham

    de repassar aos mercados domsticos, antes protegidos, seus custos com contribuies

    previdencirias. Por outro lado, nos mercados internacionais, estes custos podem, muitas vezes,

    ser determinantes do grau de competitividade. Finalmente, do lado dos trabalhadores, a reduo

    de direitos sociais e das respectivas contribuies , normahnente, uma agenda de dificil

    trnsito.

    Finalmente, no campo poltico-ideolgico, h uma srie de transformaes cUJos

    impactos se fazem sentir profundamente sobre a Previdncia Social. O Estado, enquanto agente

    promotor do desenvolvimento e de reduo das desigualdades, se encontra sob severo

    questionamento. Por outro lado, o individualismo e os mritos do mercado gozam de inusitado

    prestgio. Como resultado destas mltiplas presses, os pases em todo o mundo tm

    expetimentado, durante as ltimas dcadas, processos de crises e de rpidas - e, algumas vezes

    radicai. .... - muc41nas.

    Ainda que alguns pensem que estas crises so sempre de natureza exclusivamente

    econmica e que uma insolvncia de fato ou iminente seja a nica motivao, normalmente as

    -; CO!teris paribus 15

  • causas das reformas tm sido mltiplas: fragmentao de regimes - no raro com grupos de

    e:\1remo Pli\.i1gio - redistribuio regressiva, bai'\o nvel de cobertura administrao ineficiente,

    so apenas alguns dos muitos fatores motivadores destas reformas.

    As duas ltimas dcadas foram marcadas pelo sem nmero de iniciativas, em todo

    mundo, de reformas que procuravam equacionar os graves problemas de desequilbrio

    financeiro-atuarial verificado em praticamente todos os pases que contavam com sistemas

    previdencirios de longa data. De acordo com Fox e PALMER (2000) podem-se observar trs principais tendncias nesse processo de reforma: 1) os pases esto modificando seus sistemas financiados em regime de repartio de forma a obter elos mai., fortes entre contribuies e

    beneficios; 2) a participao do setor privado na administrao dos sistemas est crescendo: e, 3) pases com grandes volumes de dvidas previdencirias esto encontrando cada vez maiores dificuldades para realizar transies em direo a sistemas capitalizados.

    Desde a grande reforma do sistema previdencirio chileno, ainda na dcada de 1980,

    vrias tm sido as alternativas implementadas, nas mais diversas economias. As reformas podem

    ser subdivididas em 4 tipos (1viESA-LAGO, 1998): no estruturai'3 ou paramtricas; estruturais substitutivas; estruturais com regimes de financiamento mistos; e, estruturais com regimes de

    financiamento paralelos. Usualmente as reformas estruturai., so precedidas por reformas no

    estruturais que uniformizam ou unificam os diferentes regimes existentes e minoram as

    promessas de beneficios futuros (e consequentemente qualquer reconhecimento de direitos baseados nestes beneficios).

    Estruturais SUbstitutiWlS: Capitalizao em Contll lndil1iduaL Administrado

    Privadamente

    A primeira reforma substitutiva com admini

  • N~sse tipo d~ rdorma o antigo sistema pblico em r~girne de repartio, com beneficio definido, custeado por empregados e empregadores com contribuies sobre folha de salrio,

    geralmente, apresentando pesados ddicits, f~chado, ficando proibida a entrada de novos filiados, e substitudo por um novo sistema compulsrio, baseado na capitalizao individual

    plena (para as contingncias programveis), com contribuio definida, atravs de administradoras de fundos de aposentadorias e penses que podem ser, tanto priv'adas como

    pblicas. As contribui~s podem ser exclusivamente do empregado ou serem divididas com o empregador. Nos casos da contribuio ser restrita ao empregado o seu salrio fo~ na poca d.1 reforma, aumentado obrigatoriamente pelo empregador, e em valores que usualmente

    aumentaram o seu salrio lquido, mesmo aps o pagamento da nova alquota de contribuio.

    Os beneficios no programveL'S relacionados ao trabalho (acidentes de trabalho e doenas profissionais) so usualmente responsabilidade dos empregadores e custeadas diretamente por estes. As outras contingncias no programveis (e.g. invalidez e morte) so usualm~nte custeados na forma de capitalizao por capitai'S de cobertura via um seguro.

    Fica assegurada, normalmente, a li\.Te op08 por permanecer no antigo sistema para os

    j participantes, enquanto que para os novos entrantes na fora de trabalho, obrigatria a filiao ao novo sL'Stema. Vrios so, no entanto, os mecanismos de incentivos para a opo

    para o novo sistema: Bnus de reconhecimento referentes as contribuies prvias realizadas

    pelo empregado (ou em seu nome pelo empregador) ou referentes a um prerrata do direito a beneficio pela antiga legislao, aliquotas mais baixas, maior controle sobre o patrimnio

    acumulado em conta, aumento do salrio lquido etc ..

    Os segurados podem optar pela administradora de sua preferncia, podendo, ainda,

    trasladar-se a outra quando lhes for mais conveniente (respeitado o prazo mnimo de pennanncia estabelecido em lei), levando consigo o s~u patlimnio acumulado em conta (ainda que em alguns pases pague-se uma taxa para se exercer esta opo).

    Os beneficios so calculados com base no montante capitalizado das conttibuies

    realizadas ao longo da vida laboral (d~scontados os custos administrativos) e da expectativa de sobrevida na data do requerimento do beneficio. Nesse momento, o montante capitalzado

    utilizado para a compra de uma renda mensal 'vitalcia, onde o risco da longevidade fica a cargo

    S Em alguns pases um corte etrio define os critrios de opo. 17

  • da seguradora! administradora, em retiradas programadas9 , onde o indivduo banca o prprio

    risco de longevidade ou ainda, uma combinao dessas duas opes.

    Apesar do sistema ser administrado usualmente pelo setor privado 10, o Estado continua a

    exercer um papel crucial para o funcionamento do sistema. O Estado participa nesse caso de

    diversas formas: no controle e regulamentao do sistema; e criando uma rede mnima de

    segurana seja diretamente garantindo um beneficio bsico; ou garantindo uma rentabilidade mnima.

    o Pioneirismo Chileno

    A grave crise econmica observada a partir dos choques do Petrleo na decada de 1970 que atingiu pesadamente os pases em desenvolvimento, em especial os do continente Latino-americano, conjugada s crises politicas marcadas pela ascenso de regimes autoritrios na regio - responsveis pela asfixia do movimento trabalhista, e com as transformaes sociais e demogrficas possibilitaram a grande reforma do sistema previdencirio Chileno em moldes de menos solidrios com a adoo de contas de capitalizao individual na dcada de 1980.

    A transio para o sistema Previdencirio em regime de capitalizao individual no Chile comeou em finais da dcada de 1970, j no periodo autoritrio, com ajwstes sistemticos de acordo com a'5 necessidades da conjuntura econmica e com o prprio amadurecimento do sistema (marcadamente a grande generosidade do sistema aliada ao crescimento do desemprego e ao envelhecimento da populao). }\s reformas empreendidas entre 1974 e 1979 buscavam: estabelecer uma clara distino entre previdncia e assistncia social, sendo a responsabilidade e o financiamento desta ltima transferidos para o oramento fiscal; e, promover a equidade, atraves da uniformizao dos beneficios e de suas regras de concesso e reajuste.

    Essas medidas faziam parte de uma ampla srie de reformas na economia chilena e procuravam, apenas, racionalizar o sistema (refoffilas paramtricas), de forma a reduzir o dficit implcito (hidden debt -tecnicamente definido, usualmente, como o valor presente liquido dos passivos do sistema considerando os beneficios j em manuteno e os direitos pr-rata em uma deternlinada data). Em nenhum momento se esperou que as medidas adotadas fossem suficientes para equacionar os graves desequilibrios estruturais que corroiam a viabilidade financeira futura do sistema Pretendia-se, portanto, apenas preparar o sistema para a refonna radical que se seguiria. Vale notar que o Chile no contava poca com um sistema de previdncia privada complementar significativo, quer de iniciativa dos empregadores, quer de iniciativa dos indivduos.

    A grande reforma chilena (Decreto Lei 3.500) entrou em vigor em maio de 1981, atravs da substituio do sistema previdencirio bsico compul'5rio em regime de beneficio definido, operando em repartio e administrado diretamente pelo Estado, em um regimi'! di'! contribuio definida operando em regime de capitalizao individuaL administrado privadamente.

    9 No caso de retiradas programadas o indivduo mantem o capital na sua administradora e baseado na sua esperana de sobrevida calcula o valor que pode ser usado da sua conta. A cada ano o valor recalculado. 10 Em alguns pases, como por exemplo, o ]\:lxico, a lei obriga a instihrio de uma administradora do Estado. Em alguns pases alem das empri'!sas privadas com fins lucrativos e criadas especificamente para este fim, a legislao pemute que sindicatos e outras entidades de classe ofeream esk servio aos seus filiados (sem fins de lucro) e qUi'! empresas j constitudas para outros fins, por exemplo bancos, aumentem o seu leque de oferta de servios para incluir a administrao destes fundos.

    18

  • Estruturais com Regimes :\fisto~: parte em regime de repartio administrados pelo Estado e, parte em regime de capitalizao em conta indilidllaI operacionalizado pelo

    setor privado.

    Nesse caso, o antigo sistema pblico em regime de repartio reformado (na tentativa de minimizar nos textos legais as iniquidades porventura existentes), passando a contar, normalmente, com um teto de beneficio menor e continua em funcionamento.

    Os segurados podem, geralmente, nesse tipo de modelo, optar por continuar no antigo

    sistema reformado ou trasladar-se para o novo sistema misto. O sL'!tema misto con'!L'!te na

    compulsoriedade de contribuio para dois componentes obrigatrios: 1) o sistema pblico reformado, em regime de repartio, com beneficio definido at um teto bsico (a amplitude desse teto varia de acordo com as especificidades dos pases); e, 2) um sistema em capitalizao plena individual, com contribuies definidas complementares ao beneficio obtido no sistema

    pblico. Como no caso do sistema de capitalizao individua~ as contingncias relacionados ao exerccio do trabalho (acidentes de trabalho e doenas profissionais) so responsabilidade do empregador e as outras contingncias no programveis so cobertas por seguros.

    Os mecanismos de incentivos para a opo pelo sistema misto consistem basicamente

    nos mesmos utilizados para uma reforma substitutiva, ou seja: Bnus de reconhecimento referentes as contribuies acima do novo valor teto, alquotas mai'! baixas e maior controle do

    indivduo sobre seu patrimnio.

    Neste sistema o Estado no precisa mais assegurar um beneficio mnimo na parcela de

    capitalizao, j que este j assegurado na parcela de repartio simples do antigo sistema reformado.

    Estruturais com Regimes Paralelos: convl'em e competem no sistema o regime de repartio adnnistrad.o pelo Est-lldo e o regime de capitalizao em conta indilwu(d operacionalizado pelo setor privado.

    Esse modelo de reforma se caracteriza pela competio entre um sistema pblico

    reformado em regime de repartio e um sistema de capitalizao com contribuies definidas

    operado por entidades privadas de previdncia.

    19

  • Os segurados, nesse caso, podem escolher o sL
  • da taxa de desconto a ser utilizada. V rias t~m sido as sugestes apresentadas: uma mdia mvel do crescimento do Produto (caso italiano); ou a adoo dos parmetros que implicitamente afetam o equilbrio financeiro- atuarial em um sistema de repartio

    (crescimento da populao e produtividade do trabalho, como nos casos da Polnia e Sucia).

    21

  • CAPTULO 2

    MARCO CONCEITUAL DOS SISTEMAS PREVIDENCIRIOS E O

    PAPEL REGULADOR DO ESTADO

    Como m~ncionado no pnmerro captulo, os sistemas previdencirios pblicos

    financiados em regim~ de repartio vm enfrentando diversos problemas das mais variadas ordens (demogrfica, r~estruturao econmica com ef~itos observados principalmente no mercado de trabalho, transformaes polticas, entre outras), o que motivou e, continua motivando, um amplo nmero de refOlmas em todo o mundo, com uma tendncia cada vez

    maior ao incentivo d~ r~gimes de previdncia privada obrigatrios ou voluntrios, abertos ou fechados. sabido que qualquer sistema previdencirio em regime de repartio, principalmente os administrados publicamente em que a interferncia poltica consiste

    praticamente em uma regra e no em uma exc~o, deve ser objeto de permanentes ajustes sistmicos para sua melhor adaptabilidad~ a realidade demogrfica, social ~ econmica das sociedades. A reforma estrutural dos sistemas previdencirios das ltimas dcadas reside

    especificamente no direcionamento e respom;abilizao de parte da proteo contra os riscos

    previdencirios para o mercado e para os prprios individuos.

    A medida em que o segmento d~ previdncia complementar se desenvolve e coopta um nm~ro cada vez maior de filiados, a necessidade de um aparato regulatrio estatal, tambm se faz cada v~z mais necesstia, de forma que o desenvolvimento do setor alcance os objetivos e expectativas dos trabalhadores e formula dores de polticas. O papel do Estado no reside, dessa

    forma, na especificidade de regular ou no o setor mas, sim, de gerar e garantir, de alguma

    forma, condies que congreguem aspectos de li\-Te competio do mercado e um d~s~mpenho

    social e econmico eficiente do mesmo.

    Qualquer processo que implique na transferncia para o setor ptivado de atividades cuja exclusividade da administrao e execuo por parte do s~tor pblico no mais se justifique, implicam em situaes complexas que podem ser entendidas como uma tentativa de reformar o

    aparato estatal de forma a transform-lo em um agente basicamente regulador, ou pelo menos

    que sua funo como executor se resttinja a atividades onde realize esta funo de forma mai

  • "adequada" do que os demai ... agentes presentes na sociedade, de manerra a garantir, pelo

    menos, um nvel mnimo de concorrncia. Por agente regulador pode-se entender a execuo

    por parte do Estado de atividades que afetem diretamente o comp011amento dos agentes do

    setor privado com o fim de alinh-los com o interesse pblicoll . Anterior a qualquer anlise de um aparato regulatrio para qualquer que seja o mercado

    necessrio que se analisem as necessidades para esse tipo de atividade. Alm das questes

    redistributivas envolvidas em qualquer anlise que envolva, especificamente, o setor

    previdencirio, procurar-se- ressaltar aqui a necessidade de interveno estatal quando

    decorrente do inadequado funcionamento do mercado, ou seja, quando ocorrem falhas de mercado. Dessa fonna, o presente captulo se ocupar em fornecer uma breve deftnio do

    setor com suas principais caracteristicas, as falhas do mercado e a interveno do Estado; e o

    arcabouo regulatrio usuahnente utilizado para a previdncia privada.

    2.1 - Definio de um Sistema Previdencirio

    A existncia dos sistemas previdencirios teoricamente justificada atravs do tradicional modelo do ciclo de vida desenvolvido por Modigliani que estabelece que individuos

    tero poupanas positivas durante seus anos de trabalho produtivo e poupanas negativas

    quando se aposentarem. Como consequencia, a teoria ba.'ieia-se na mptese de que os

    individuos preferem manter uma estrutura de consumo relativamente constante ao longo de sua

    vida. Assim, a fonuao de um patrimnio possibilita uma compen'iao a flutuao da renda

    ao longo do tempo considerando-se, por exemplo, que esta maior no perodo ativo e menor

    na inatividade.

    Um sistema de previdncia - ou Seguro Social - constitui-se, dessa fonna, gerahnente,

    em um programa (ou conjunto de programas) de pagamentos em dinheiro e/ou servios prestados ao indivduo e/ou a seus dependentes - mediante a estipulao de um vnculo

    contributivo prvio -, como compensao parcial/total da perda de capacidade laborativa.

    fundamental ressaltar que, tecnicamente, em um "Seguro Puro", o valor presente esperado das contribuies iguala o valor presente esperado dos beneficios para cada

    i j Essa conceitualizao de atividade reguladorado Estado resulta bastante ampla e at certo ponto dbia, pois implica em aspectos bastante questionveis: 1) que o Estado seria o ente responsvel pela regulao, e; 2) que a r

  • participante12, ou seja, baseia-se na construo de: um patrimnio pelos indivduos, para que no p~riodo de inatividade possam mant~r o padro d~ ingressos d~sejado. O qu~ caracteriza um

    plano de previdncia social que no deixando de: ser um seguro, no o de forma estrita ou

    pura, sendo admissvel algum grau d~ re:distributividade:. :t\ksmo assim, impol1ante ter-se em

    vista que o obj~tivo fundam~ntal do Seguro Social a manuteno do padro de vida do segurado. O objetivo redistributivo, em geral presente, de carter nitidamente secundrio (BELTRo, OU''ElRA e PASINATO, 1999).

    Um sistema previdencirio pode ser composto de: vrias partes ou pilares de:

    sustentao l :: que correspondem a:

    Previdncia Social Bsica (ou 10 Pilar), geralmente a cargo do Estado, compre:ende beneficios em dinheiro, cuja finalidade: a de proporcionar ao indivduo e a seus dependentes as condies indispen~veis manuteno de um dado padro de vida quando da perda da capacidade laborativa (padro de vida est~ determinado politicamente, normalmente implicando em algum tipo de re:distribuio de renda);

    Previdncia Complementar, cujo objetivo , como o prplio nome bem o indica, complementar os beneficios e se:nlos do Seguro Social Bsico. Trata-se,

    consequentemente, de: uma escollla individual exercida a partir do pode:r aquisitivo de cada

    um, contraposto ao nvel d~ beneficio que deseja aUfel1r ao final de sua vida ativa. importante notar que o carter subjetivo daquilo que bsico e daquilo que compkmentar deixa esta definio ao processo poltico, que, por sua vez, deve espelllar teOlicamente a

    escala de valores de: cada sociedade. A Previdncia Compleme:ntar, por sua vez, e:

    geralmente subdividida em:

    Previdncia Complementar Fe:chada (ou i pilar) de iniciativa do empregador (planos ocupacionais) - destina-se a grupos restritos, tais como: empre:gados de de:terminada(s) empresa(s), membros de determinado(s) sindicato(s), etc.

    Previdncia Complementar Aberta (ou 3' pilar) corre:sponde:nte a poupana previdencilia voluntria - destina-se: a uma clientela de: carter geral, sem quaisque:r outras exigncias que:

    no a ade:so ao plano atravs do aporte: regular das conttibuies requeridas. Embora

    L A menos de uma taxa de administrao. i3 Para maiores detalhes ver BANCO MUNDLo\L (994) e MESA-LAGO 0(97), ainda que esses autores no concordem quanto as ormas de financiamento e a estrutura de cada um dos pilares, o objetivo da proteo de cada um deles basicamente o mesmo.

    24

  • condies espeClalS possam ser oferecidas a ceJ10s grupos, a vinculao e de carter

    individual.

    Grupos fechados contam com a possibilidade de reduzir custos de administrao e

    marketing.. Alem disso. o~ planos fechados tendem a reforar a solidariedade, comparativamente aos abertos'

    Os esquemas abertos, por sua vez, podem tirar proveito das economias decorrentes de uso da

    capacidade j instalada,14 processos gerenciais modemos e, possivelmente, especializao de funes. No caso intennedirio situam-se os fundos multipatrocinados e aqueles sob a

    responsabilidade dos sindicatos, onde as convenincias da mutualidade e as convenincias

    administrativas so reunidas neste JlTanjo institucional. Na realidade, no existe propriamente o dilema aberto versus fechado. H espao para

    ambas as modalidades operacionais. Para o mercado fonnal de trabalho, com grandes empresas

    e baixa rotatividade da mo-de-obra, talvez o esquema fechado seja o que mais convm, mesmo porque o "pacote" de beneficios sociais muitas vezes integra a pauta de negociaes

    salariais e, freqentemente, a prpria poltica de pessoal da empresa.

    A principal distino entre a Previdncia Complementar e a Previdncia Social o grau

    de redistribuio que se pretende obter. Nos sistemas pblicos bsicos e compulsrios, dada a

    existncia de beneficios minimos, mesmo quando operados em regime de capitalizao com

    contribuies definidas, quase sempre implica em algum grau de redistribuio, especialmente

    quando so usados recursos gerais do Estado para cobrir saldos insuficientes acumulados na

    conta do segurado ao trmino de sua vida laboraL a fim de assegurar-lhe uma renda mnima

    durante o perodo de inatividade.

    J em relao aos beneficios "complementares", em princpio deve-se buscar uma maior

    aderncia s regras bsicas do seguro privado: resguardadas as convenincias da mutualidade, a

    conespondncia entre valor presente esperado das conttibuies deve aproximar-se, na medida

    do possvel, do valor presente esperado dos beneficios e servios para cada segurado

    individualmente.

    De uma forma geraL as contingncias a que est sujeito o indivduo, sob a tica previdenciria. podem ser classificadas em programveis e no-programveis. Cada um dos

    14 Por exemplo, os grandes conglomerados financeiros podem utilizar a grande capacidade de processamento de dados usualmente j existente para operacionalizar esquemas de seguro em geral. A capilaridade da rede de agncias bancarias. que pode ser utilizada como ponto de vendas/atendimento ao pblico, fornece-lhe tambem uma grande vantagem comparativa.

    25

  • tipos de contingncia pode, por sua. vez., se expressar de forma permanente ou temporria,

    sendo que, neste ltimo caso, a temporalidade pode ser por prazo determinado ou

    indeterminado. Dessa forma, a morte e a invalidez prematuras e as doenas so casos

    caracteristicos de contingncias no programveis1

  • recebido19, caractenza um vnculo contributivo. 1\lesmo no caso ~m qu~ o beneficio defirdo em termos de pISOS mnimos. no guardando, p0l1anto, necessariam~nte, estrita proporcionalidade com o salrio de contribuio, a simples ~xigncia d~ haver uma contribuio

    individualizada, feita pelo s~gurado ou por algum em favor do s~gurado, caracteriza um vinculo contributivo.

    Assim, s~ a clientela verdadeiramente universal, o vinculo contributivo no pode ser d~finido como condio necesslia para o acesso ao beneficio, mesmo que os nveis de contribuio sejam baixos. Em contrapartida, uma clientela restrita implica, necessariamente, a existncia de uma forma qualquer de vnculo ou caracterizao.

    No que se refere ao regime de financiamento, existem basicamente trs modelos:

    capitalizao, repartio simples e repal1io com capital de cobertura.

    Entende-se por Regime de Capitalizao aquele em que o segurado recollie

    periodicamente contribuies que sero capitalizadas durante sua vida ativa, com;tituindo-se

    reservas para a cobertura das futuras despesas com beneficios. Este regime pode ser concebido

    de duas formas: atravs de uma Capitalizao Individual ou de uma Capitalizao Coletiva. No

    primeiro caso, cada contribuinte tem uma conta em seu nome, especificamente destinada ao

    depsito das suas contribuies e dos rendimentos creditados, possibilitando, desta maneira,

    eficcia na fiscalizao individual dos recursos mobilizados para o financiamento dos beneficios

    a serem aufelidos, j que o contribuinte tem acesso a infonnao sobre o seu saldo. No caso da Conta Coletiva, tem-se um fundo que acumula as contribuies de todos os segurados bem

    como seus rendimentos.

    J em um Regime de Repat1io Simples, os recursos arrecadados em um detenninado

    exerccio so utilizados para o pagamento dos beneficios durante este mesmo exerccio.

    Eventualmente, mesmo em repartio, so constitudas "reservas de contingncia" com a

    fmalidade de amol1ecer flutuaes sazonais no compOltamento da receita e da despesa do

    sistema.

    No Regime de Repattio com Capitais de Cobeltura, estima-se a cada perodo o valor

    atual de todos os beneficios cujas prestaes sero iniciadas no mesmo perodo. Este valor estimado, a ser repartido entre os segurados, capitalizado de modo a prover o financiamento

    dos beneficios daqueles que esto encenando suas vidas ativ'as naquele perodo.

    19 Em termos de valor esperado das contribuies e de beneficios/servios recebidos e a receber.

  • Uma das principais caracteristicas dos sistemas prl!videncirios [manciados em regiml! de capitalizao a constituio de um sistema captador de poupanas individuais

    disponibilizveis para investimentos de mdio e longo prazos. Diferentemente da fonna mais

    comwn do rl!gime de repartio, onde o salrio de contlibuio no uma deciso do

    indivduo, o beneficio a ser auferido pelo segurado na aposentadoria independe das decises

    concernentes ao consumo durante sua vida atiya. Esta fonna de regime favorece a visibilidade

    da relao causal existente entre as contribuies e os respectivos beneficios. Contudo, no se

    deve ignorar o tisco pennanente de os fundos gerados por Regimes de Capitalizao virem a ser

    utilizados pdo Governo como fonte de financiamento para dficit pblico, seja apropriando-se diretamente dos recursos, seja impondo aplicao compulsria em ttulos governamentais com menor rentabilidade.

    Este problema, de natw-eza eminentemente poltica, pode ser parcialmente resolvido ou,

    pelo menos, minorado, atravs da capitalizao "em conta individual", com um processo

    pennanente de informao ao segurado sobre o valor e composio de seus ativos. A idia a

    de que a presso poltica exercida por milhares ou milhes de segurados, detentores de contas

    individuai~, previna a interveno ddetria do governo sobre seu pequeno nmero de administradores de recursos capitalizados "em conta coletiva".

    Tendo-se em vista que o sistema de Repartio essencialmente con~titudo por transferncias intrageracionais (entre pessoas de uma mesma gerao) e intergeracionais (geraes di~tintas), no direta e clara a relao entre contribuies e beneficios. Dessa forma, um sistema com este tipo de regime de fmanciamento nem sempre apresenta os

    requisitos mnimos de efici~ncia no combate sonegao que caracteriza a anecadao de contribuies sociais. Este inconveniente pode ser minimizado atravs do condicionamento da

    concesso do beneficio ao segurado comprovao da existncia de registros administrativos

    sobre suas contribuies. Por sua vez, o rgo responsvel por sua administrao deve fornecer

    ao segw-ado, mensalmente, um "extrato de conta", possibilitando assim um melhor controle por

    patie deste.

    Um outro argumento freqentemente levantado contra o Regime de Repartio o de

    que se trata de um sistema de transferncias que usualmente retira recursos de gmpos sociais

    com propenso marginal poupana e ao investimento em relao aos gmpos sociais para os

    quais os recursos so transfelidos. De fato, aposentados, pensionistas, doentes, desempregados

    e carentes em geral possuem, via de regra, altssima propenso marginal ao consumo. A

    28

  • tentativa de quantificar estes efeitos de inibio da poupana e da formao de capital esbarra

    em considerveis dificuldades tericas. metodolgicas e prticas::". De qualquer fOlma, pode-se

    afmnar com alguma segurana, que um sistema de repartio no incentiva a poupana.

    Ainda no que se refere ao frnanciamento do sistema o regime poder operar com

    beneficios definidos ou com contribuies definidas21 Como o prplio nome est dizendo, em

    um plano de beneficio defInido, seja em regime de repartio, seja em regime: de: capitalizao, o valor do beneficio, estipulado como percentual dos salrios de contribuio~~ ou como um

    valor fL"\o, conhecida a priori. Assim, o valor do beneficio no depende do rendimento das

    reservas, em capitalizao, nem do desempenho econmico do st')tema em geraL no regime de repartio. Obviamente, se as hipteses atualiais no forem realizadas, a nica alternativa

    repactuar o plano em termos de alquotas de contribuio.

    Parece bastante claro que o primeiro conceito - beneficio defInido - se adapta melhor

    aos beneficios mnimos concedidos no caso das conting~ncias previsveis, bem como aos

    beneficios destinados cobertura das contingncias imprevisveis. No primeiro caso, o fato de

    serem beneficios mnimos j d a razo primeira para que no possam ser reduzidos em qualquer hiptese. No segundo, a imprevisibilidade do evento justifica plenamente a necessidade do conhecimento prvio do beneficio por parte do segurado.

    J no plano de contIibuio definida, as contribuies podem ser estipuladas como

    sendo um percentual do salrio, talvez com teto, ou como um valor arbitrado. Os clculos dos

    beneficios podem seguir vlias linhas:

    - Valor presente do beneficio igual ao valor acumulado de contribuies (com ou sem rendimento);

    - Valor do beneficio igual ao valor acumulado das contribui.es dividido pela esperana

    de vida (com ou sem rendimento): - Valor do beneficio igual contlibuio corrente dividida pelo total de pontos da massa

    de beneficilios e multiplicada pelos pontos acumulados pelo indivduo.

    O conceito de contribuio definida parece adequar-se melhor aos "beneficios

    complementares", destinados cobeltura das contingncias previsveis e, talvez, aos beneficios

    20 A discusso sobre o tema bastante antiga. como pode ser visto em SAM:UELSON, 1958. FELDSTElN, 1974 e 1980 e BARRO, 1974 e 1978. Para uma discusso recente deste tema. consultar ORSZAG e STIGUIZ. 1999. 2] Para uma discusso mai., aprofi.mdada consultar I\:1rrCHEL (1998).

    ~2 Calculados a partir da mdia de algum periodo, ou algum salmo recebido, ou ainda o salano mdio recebido ao longo da vida iltil do contribuinte.

    29

  • suplementares de cobertura das conting~ncias unpre'lslwIS-. Nesta fOlma, o ajuste se faz, quando necessrio, do lado dos beneficios.

    2.2. - As Falhas de Mercado e a Interveno do Estado

    Para a anlise da estlUtura regulattia de um setor, o pnrnerro passo consiste em

    identificar os tipos de risco aos quai'i o mesmo est exposto. Ou seja, identificar, onde e como podem ocorrer falhas no mercado.

    Os sistemas previdencirios, como j mencionado no pnmerro captulo, esto estIUturados em contratos, quer no sistema pblico - que pressupe um contrato social

    implcito, na legislao em curso -, quer nos planos de pre"\i.dncia privada - onde a obedincia

    a um contrato de direito privado a base da relao entre os agentes.

    A teoria econmica que versa sobre o problema agente x principaF4, uma das

    principais ferramentas para o bom entendimento dos problemas enfrentados em contratos onde

    as infonnaes no se encontram facilmente disponveis para ambas as partes envolvidas. Em

    um plano de previdncia privada podemos entender os pat1icipantesi segurados como o

    principal e, as entidades de previdncia privada como os agentes que oferecero seus produtos.

    Como, tanto as entidades de previdncia privada, quanto os prprios indivduos possuem uma

    dotao nica e peculiar de fatores sobre a qual s eles possuem a infonnao completa e, ao

    mesmo tempo existe uma assimettia de infonnao entre agente e principal, vrios problemas

    podem surgir dos alTartios contratu.:1is entre as partes. A brecha de infOlmaes implica, dessa

    fonna, na necessidade da atuao estatal como o mecanismo, se no o mais eficiente, pelo

    menos o nico legitimamente vivel, para a resoluo dos conflitos.

    Examinando-se a questo previdenciria, a deciso de quanto poupar, quando poupar e

    como investir, para atingir um montante ao final da vida laborativa que garanta um fluxo de

    rendas suficiente durante a inatividade, certamente muito complexa. O indivduo devetia ter

    disponvel um conjunto de infonnaes extremamente amplo e preciso sobre seus futuros tiscos: periodos, natureza e custos de tratamento de doenas que venham a acometer a si e a

    ~o Existem planos de repartio com contribuies definidas como os dos notrios no Umguai. Acumula-se pontos durante a vida contributiva e na inatividade recebe-se beneficio proporcional ao nmero de pontos.

    ~~ Ver, por exemplo, RAY (1998) e ~:lEI.o (1996). 30

  • seus dependt!ntt!s, probabilidadt!s quanto a desempn:go, mort-:, inv.Ilidez, expectativa de vida

    (do st!gurado e de seus dependt!nh.:s). dc. Do lado do investimento, seriam necessrias infonnat!s razoavehnt!ntt! precisas quanto

    ao kque de ativos disponwis no mt!rcado fmanceiro, seus liscos, rentabilidades e custos de

    oportunidade, etc. :t\,:lesmo que, em uma hiptese absurda, estas infonnaes estiwssem

    disponveis, a anlise das mesmas seria tarefa rdua para uma equipe de atulios e analistas de

    investimento. Finahnente, os riscos que este indivduo estaria corrt!ndo st!riam muito superiores

    queles a que estaria submetido se fosse forado a integrar um esquema comunitlo2.~. Considere-se ainck1 que a probabilidade de erro nestas decises bastante elevada e o

    prprio processo de avaliao muito sensvel a pequenas flutuat!s de certas variveis.

    Utilizando-se, por exemplo, a taxa de desconto!capi41lizao, considerada ao longo do ciclo dt! vida ativa do indivduo, ao qual se acrescentariam as expectativas de sobrevida de seus

    dependentes bem como de sua prpria inati,.idade, fcil constatar que uma pequena diferena

    entre a taxa estimada e a efetivamente vigente no perodo pode invertt!r o sinal do flu.'w de

    caixa descontado. Em suma, a lptese de infonnao completa, necessria maximizao do

    bem-estar do indivduo na "teoria do consumidor", est longe no caso de decises sobre riscos

    previdencirios.

    No campo prtico, h que se considerar o fato de que as deci~es sobre poupana e

    investimento seriam tomadas ao longo de toda uma vida, no havendo, em caso de erro, a

    possibilidade de uma segunda tentativa: em geraL uma vez trilhado um caminho errneo no

    processo decislo, no h retorno. I\.fais ainda, as conseqncias de um erro de avaliao ou mesmo de infonnao podero ser drsticas e iITeversvei~ na maiola das vezes, levando o individuo a padres de vida incompatveis com a prpla dignidade da vida humana.

    Se a filiao a um sistema de Previdncia Social fosse deixada completamente ao sabor

    das preferncias de cada um, provavehnente ocorreria um fenmeno conhecido como "seleo

    adversa": aqueles para quem o risco fosse maior setiamjustamente os que mais demandariam o seguro. A conseqncia natural sela a elevao dos custos atualais, o encarecimento do prno e o desincentivo entrada ou incentivo sada de segurados. Observe que o processo

    tende no apenas a ser progressivo, como tambm a se realimentar continuamente, ou seja, quanto maior fosse o prmio, menor seria o nmero de individuos que julgaliam vantajosa uma

    ~s Na area de seguros e bem conhecida a tecnica de minimizao de riscos individuais atravs do chamado poohng".

    31

  • filiao ao seguro - e estes senam exatamente aqueks cUJa exp~ctativa de custo maIOr. provvel que mesmo os mais ortodoxos liherais concord~m que, nestes casos, a soberania do consumidor no produz resultados timos a um custo socialmente suportvel. Todos estes

    argumentos justificam algum tipo de proh:o previd~ncilia compulslia. tambm bastante provvel que algumas p~ssoas, at mesmo por irnprud~ncia (ou dito

    de outra forma, af~io ao lisco), optass~m pdo consumo presente, arriscando ficar merc da boa vontade da sociedade quando da perda da capacidade lahorativa. Outros, mesmo que

    desejassem, no teriam condies de poupar o suficiente para a contratao de um seguro que lhes desse cobertura em caso de inatividade. Assim, a falta d~ cohertura securitria dos

    imprudentes ~iOU dos incapazes de poupar, foraria a sociedade, de qualquer maneira, a prover,

    desarticulada e possivelmente de forma ineficiente, algum tipo de assistncia aos desvalidos,

    atravs da cmidade pblica. Nesse sentido STIGLITZ (1988) identifica os planos de beneficios previdencirios compulsrio com um hem meritrio, uma vez que o ClL"tO correlacionado com a

    imprud~ncia do indivduo ao no adquirir o hem selia arcado por toda a sociedade.

    Algumas consideraes devem ser feitas no que tange aos tipos de riscos envolvidos em

    um sistema previdencilio. Dificilmente poder-se-ia argumentar contra a idia de filiao

    compulslia para programas destinados cobertura de riscos no programveis - ou

    contingncias imprevisveis -, muito menos contra um "razovel" nvel de reposio. Por outro

    lado, ainda que se justifique a compulsoriedade para os riscos programveis, pode-se questionar o nvel de reposio que os beneficios devem oferecer. No que tange contingncia de idade,

    por exemplo, o nvel de reposio do si "tema obligatrio pode ser, em plincpio, bsico ou

    lmmmo. Assim, aqueles indivduos com acentuada preferncia intertemporal pelo consumo

    (aqueles que, teoricamente, utilizam altas taxas para desconto de eventos futuros), estariam garantidos, ainda que em nvel bsico, contra sua prpria 'imprudncia". Os indi\duos que

    desejassem a manuteno do padro de vida observado durante seu histlico laboral poderiam, por sua vez, contratar uma complementao no setor privado.

    um aspecto especfico do caso brasil~iro e que merece aqui algum destaqu~ o

    beneficio por tempo de servio. O argumento em prol da compulsoriedade, mutualidade e

    elevados nveis de reposio , no mnimo, ainda mais discutvel. A ligor, t~mpo de servio no risco, mas uma certeza deconente da prplia vida laborativa do indivduo. Se certo que o

    trabalho, plincipalmente em certas categotias, provoca desgaste fisico e mental, tambm fato

    que o Seguro Social compulsrio usualmente cobre as conseqncias deste desgaste - a

    31

  • cobertura de doena e de invalidez. Na maioria das sociedades contemporneas normalmente

    aceita a reduo da capacidade laborativa a partir de detenninada idade, algo que varia entre 55

    e 68 anos, dependendo da poca e do pas, que wm:sponde nonnalmente a uma mdia de anos

    efetivos de trabalho. Assim, o sistema previdencilio compulslio j cobre a contingncia de tempo de servio atravs da cobertura da contingncia de idade.

    Os argumentos at o momento mencionados esto rdacionados capacidade e/ou

    necessidade, que justificalia a compuhmriedade imposta pelo Estado, de um planejamento dos indivduos para assegurar, pelo menos, um padro de vida minimamente adequado quando da

    perda de sua capacidade laborativa. Superada esta primeira etapa da proteo previdenciria

    deve-se levantar, ainda, as questes que justificam a interveno do Estado nos regimes previdencirios complementares.

    Os liscos sistmicos aos quais os regimes de previdncia complementar esto expostos

    so praticamente os mesmos que qualquer outra instituio frnanceira, e residem principalmente

    em trs tpicas falhas de mercado: assimetria de infOImao, e~1ernalidades e monoplio. No que se refere a questo da assimetria de informao, por exemplo, um indivduo

    quando contrata um plano de previdncia complementar no possui informao suficiente sobre

    a qualidade dos servios, estando, desta forma sujeito a algum tipo de explorao pela parte contratada. Em decorrncia, podem ocorrer casos de fraude, incompetncia, ou mesmo

    negligncia na gerncia de seu patrimnio. Por se tratar de uma poupana previdenciria, em

    que o horizonte temporal do investimento cobre praticamente toda a vida do indivduo, um erro

    decorrente da m-f ou m-administrao por palie das entidades compromete o nivd de vida

    do segurado! participante, alm de comprometer a prpria credibilidade do sistema.

    Extemalidades esto rdacionadas s aes individuais que implicam em consequncias

    para outros indivduos, as quaL" no podem ser contabilizadas em tennos de custos. No caso

    especifico da previdncia complementar, por exemplo, tem-se que a falncia de uma entidade

    pode comprometer o funcionamento de todo o sistema - efeito manada. A falncia de uma

    nica entidade pode levar os agentes a uma percepo de risco potencial de todas as outras

    entidades envolvidas. Os problemas correlacionados a este lisco, se revelam ainda mais

    preocupantes quando, dentre as garantias estatais, tem-se o Estado como segurador ltimo em

    caso de falncia do sistema (DA v1S, 2000). Outro tipo de risco sistmico do mercado de previdncia complementar surge do grau

    de poder de mercado das instituies. No caso da previdncia complementar fechada

    33

  • compulsria, na ausncia de um arcabouo adequado, os empregadores que oferecem planos

    prprios de pre\idncia contam com um aspecto monopolstico sobre o qual podem oferecer

    planos estruturados de forma a proteger seus prprios interesses em detrimento dos interesses

    dos participantes/segurados. Por exemplo, podem instituir regras de portabilidade e vesting (que

    pode ser traduzido para o nosso idioma como um direito parcialmente adquirido) muito mais favorvei~ a si mesmos do que a seus funcionrios. Alm de poder utilizar o patrimnio dos fundos

    constitudos em favor da prpria empresa, sem que se resguardem dos riscos de falncia.

    Regimes compulsrios de previdncia complementar aberta, tambm apresentam fortes

    tendncias a concentrao de mercado como se pode observar da experincia latino-americana

    recente, dado que se trata de um produto homogneo. A concentrao do mercado, nesse caso,

    se d basicamente atravs da diferenciao artificial do produto, com a atrao de novos

    participantes mediante encarecimento dos gastos com vendas e propaganda (casos quase anedticos como a distribuio de brindes -de bicicletas, telefones celulares, etc. - chegaram a

    ocorrer no Chile). A interveno do Estado de particular interesse para a manuteno de uma competio saudvel e o no encarecimento do sistema.

    Para a discusso do papel do Estado, propriamente dito, fundamental que seja feita a distino entre a funo de fomento, de normatizao, de imposio e de fiscalizao e controle

    versus a funo de execuo. Tradicionalmente so aceitas as plimeiras funes como

    intrinsecas ao setor pblico, especialmente porque, conforme j observamos, o }Me jogo das foras do mercado nem sempre produz solues sati~fatrias sob a tica scio-econmica. 1vIais uma vez, a definio do que vem a ser uma soluo sati~fatria depende de um processo

    poltico de avaliao, onde entram em jogo a percepo e os valores da sociedade quanto ao fenmeno avaliado.

    2.3. - O Arcabouo Regulatrio para a Previdncia Complementar

    Em primeiro lugar. necessrio ressaltar que existem trs aspectos envolvidos com a

    questo regulatria: 1) a formulao de polticas para a regulao; 2) a atividade reguladora em si: e, 3) a fIscalizao. A defInio de polticas para um determinado setor da economia demanda a criao de uma srie de mecanismos especficos de regulao. Nesse sentido,

    entende-se a formulao de polticas pblicas a partir da anlise de desempenho do mercado,

    do interesse em promover uma estrutura setorial adequada, do estmulo ao investimento em

    34

  • ar~as econmicas, sociais ou geogrficas ~specficas, d.1 interao entre um ou mai" setores produtivos e, da incidncia sobre variveis macroeconmicas (no caso especfico do

    d~s~nvohim~nto do setor de previdncia privada, um aspecto muito importante o impacto sobr~ a varivel poupana). A ati,idade reguladora, por sua vez, se refere ao processo especfico da aplicao de normas ou a tomada de decis~s que incidam diretamente sobre a conduta dos agentes, corno por ex~mplo: a aplicao de multas ou sanes, a fr .. ao de tarifas, as especificaes tcnicas, entre outras. A fiscalizao representa um aspecto particular da

    atividade reguladora. Esta se d estritamente dentro de um arcabouo de regras e normas estabelecidas por um marco legal e tem por objetivo garantir o cumprimento das leis e normas especficas e aplicar, quando necessrio, as sanes pr estabelecidas para condutas ilcitas.

    A regulao do setor de previdncia complementar orientada para a busca de uma

    estrutura organizacional que assegure: transparncia, segurana e estabilidade, minimizao de

    custos e decises de investimento que adeqem uma combinao de li

  • legai~ estabelecidos para o sdor, tai~ como: estrutura juridica, capital minimo, encaixes, etc.

    Adequao do capital - consiste em uma reserva de capital adequada em relao ao

    tamanho do fundo e, deve variar wnforme o tamanho do fundo a ser administrado (entre le 30 dos ativos);

    Segregao de ativos - clara separao entre o patrimnio das entidades responsveis pela

    administrao dos fundos capitalizados e o patrimnio dos fundos propriamente ditos. e:\1remamente importante pois, o patrimnio dos fundos propliedade dos segurados!

    participantes e, qualquer probh::ma que a administradora venha a sofrer no deve afdar esse

    patrimnio;

    Profissionalizao da administrao dos ativos - consiste no estabelecimento de critrios de

    competncia e integridade para a autorizao dos profissionais atuantes no sistema. Essa

    administrao pode ser interna s entidades ou contratada externamente, desde que com o

    compromisso de contratao de profissionais qualificados:

    Custdia externa - a sua obrigatoriedade procura eliminar o risco de que os administradores

    dos fundos utilizem os ativos de forma imprplia ou fraudulenta. O rgo supervisor do

    sistema deve credenciar uma lista de instituies autorizadas que periodicamente devem

    prestar contas aos reguladores e administradores;

    Avaliao atuarial - os clculos atuariais consistem na regra bsica para o bom

    funcionamento e manejo do sistema e so ex"'1remamente imp0l1antes para as entidades; Auditoria externa - prov uma avaliao independente e objetiva da sade financeira dos

    fundos e. em muitos casos representam um dos mais impo11antes mecanismos de

    fiscalizao;

    Disponibilizao de informaes - representa um dos pnnclpaIS meIOS para o efetivo

    controle do sistema por parte dos participantes. o plincipal instrumento garantidor da tran~parncia do sistema ; e,

    rgo Super"i~or/ Fiscalizador - o Estado deve ddemnar (criar) um rgo (ou a atuao conjunta de rgos) para o exerccio regulatrio no que se refere a inspeo e monitoramento regular das atividades e das entidades administradoras dos fundos e,

    tambm, na soluo dos conflitos que pon'entura oconam para o cumplimento dos

    36

  • contratos, tais como, por ex~mplo: \'esting e portabilidad~. Alm di"so o rgo d~ve se

    encarregar da publicao peridica de estudos e estatsticas bsicas do sistema.

    Existem, no entanto, outros aspectos regulatrios, mai'i controversos, relacionados com

    a fOlmulao de politii.:a, que podem ser classificados em tr~s grupos: os que detenninam a

    estrutura c.onceitual: os que af~tam a ~strutura e contestabilidade do si"tema; os relacionados

    com o investimento, valorizao do patrimnio, regras de rentabilidade rrnima e garantias

    estatai". Esses aspectos regulatrios apresentam inmeras interligaes entre si. exL'itindo

    sempre uma co-detenninao para a construo de um aparato regulattio.

    2.3. 1 - Estrutura Conceitual

    Os instrumentos regulatrios relacionados com a estrutura conceitual do funcionamento

    das entidades de previdncia privada: a "ftlosofta" da regulao; a natureza da participao dos

    segurados - se voluntrio ou compul"rio - ; a natureza dos planos - beneficio definido ou

    contribuio definida; o grau de escolha individual - existncia ou no da possibilidade de

    traslado a outras entidades; e o tratamento tributrio.

    A ftlosofta da regulao claramente a plincipal detenninante da estlUtura regulatria

    adotada pelos Estados sobre as entidades de previdncia privada nos diversos pases. Vm . .:\.S

    (1998) distingue duas possveis ftlosofias de regulao: draconiana - que estabelece regras para praticamente todos os aspectos operacionais do mercado que possam implicar em perdas para

    os participantes; ou, baseada em regras de plUdncia (pntden man rufe) - em que os administradores gozam de maior flexibilidade para o investimento dos ativos, porm respondem

    legalmenk por suas aes e os pat1icipantes contam com uma proteo mais ampla.

    Essas duas ftlosofias podem resultar, como j foi mencionado, de uma diferena na estlUtura juridica e cultural dos pases (sociedades anglo-saxs e sociedades latinas), ou mesmo do grau de desenvolvimento do mercado fmanceiro e da econOlnia de fOlma geral.

    Outro impol1ante detenninante da estrutura regulatria a natureza da participao dos

    segurados. Em sistemas em que a participao em regimes de previdncia complementar

    administrada privadamente compulsria, o Estado, ao estabelecer esta obrigatOliedade,

    praticamente cria um mercado cativo para as entidades de previdncia privada, expondo os

    pat1icipantes a vlios conflitos de interesses (agente x principal), demandando, e como j

  • m~ncionado, m~canismos d~ regulao ativa como fOlma de garantir o bem ~star social - no explorao dos segurados e credibilidade do mercado.

    O funcionamento dos planos, se com contribuies definidas ou beneficios definidos

    implica em modelos de estmtura de r~gulao, tamb~m, bastante diferentes. Para os planos com contribuies d~finidas o beneficio depender do total acumulado na conta do segurado sendo

    normalmente operados em regime de capitalizao com total pOltabilidade e vesting. 1\esses

    planos a regulao basicamente voltada para a promoo de contratos com regras claras e

    justas quanto ao tipo de risco dos investimentos, ao risco inflacionrio e ao risco de falncia das entidades administradoras.

    Quando, por outro lado, o planos funcionam com beneficios definidos, os controles e mecanismos de regulao devem residir principabnente na pennanente avaliao da situao

    financeira e atuarial dos planos, de forma a assegurar a sua viabilidade econmica e o coneto

    pagamento dos beneficios.

    Um ltimo ponto, tambm essencial para o entendimento da estmtura regulatria

    adotada o tratamento tributrio dispensado aos investimentos em poupana previd~nciria. Existem duas possibilidades para a tributao dos planos previdencirios: no incidncia de

    tributos sobre as contribuies e retorno dos investimentos, com tributao incidente apenas

    sobre os beneficios (EET - Exemp