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Qualidade na alimentação de kaingangs Página 9 Páginas centrais Imagens do Paraná Ano XV, número 31, agosto de 2007 Projeto Quilombolas lança publicação Página 4 Inclusão digital em Erexim Página 10 Fotos Capa A luta pelas sementes crioulas A imagem acima mostra a abundância da colheita dos agricultores Benno Daves e Liria Daves Goedert (pai e filha), em Linha Bandeirante, Novo Três Passos, próximo de Marechal Cândido Rondon. “Usamos adubo orgânico e sempre colhemos bem”, relatou Daves. “Temos colhido um quilo de rabanete por metro quadrado.” As duas famíllias (Daves e Goedert), que tocam a propriedade de 10 hectares, também produzem leite e têm um pomar caseiro. “Abandonamos o aviário há tempos e temos mais liberdade, além de ganhar mais, produzindo desta forma.” Já em Verê, as mulheres estão realizando cursos de cozinha, com o objetivo de resgatar a conservação dos alimentos – ter uma despensa cheia durante todo o ano. A foto ao lado retrata um dos cursos realizados por lideranças de sete municípios (Nova Prata, Salto do Lontra, Dois Vizinhos, São George do Oeste, Tapejara do Oeste, Nova Esperança do Iguaçu e Verê), com apoio do CAPA. Belas imagens do Paraná. A luta pelas sementes crioulas

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O RECADO DA TERRA 13

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Qualidade naalimentaçãode kaingangsPágina 9

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Ano XV, número 31, agosto de 2007

ProjetoQuilombolaslança publicaçãoPágina 4

Inclusãodigital emEreximPágina 10

Fotos Capa

A luta pelassementescrioulas

A imagem acima mostra aabundância da colheita dosagricultores Benno Daves e LiriaDaves Goedert (pai e filha), em LinhaBandeirante, Novo Três Passos,próximo de Marechal CândidoRondon. “Usamos adubo orgânico esempre colhemos bem”, relatouDaves. “Temos colhido um quilo derabanete por metro quadrado.” Asduas famíllias (Daves e Goedert), quetocam a propriedade de 10 hectares,também produzem leite e têm umpomar caseiro. “Abandonamos oaviário há tempos e temos maisliberdade, além de ganhar mais,produzindo desta forma.”Já em Verê, as mulheres estãorealizando cursos de cozinha, com oobjetivo de resgatar a conservaçãodos alimentos – ter uma despensacheia durante todo o ano. A foto aolado retrata um dos cursos realizadospor lideranças de sete municípios(Nova Prata, Salto do Lontra, DoisVizinhos, São George do Oeste,Tapejara do Oeste, Nova Esperançado Iguaçu e Verê), com apoio doCAPA. Belas imagens do Paraná.

A luta pelassementescrioulas

O RECADO DA TERRA 3

Editorial

Esta edição do Recado da Terratraz, como tema principal, abiodiversidade e a luta pela preser-vação das sementes crioulas. Confor-me disse a coordenadora do CAPAErexim, Ingrid Margarete Giesel, emdiscurso na abertura da IV Festa Na-cional das Sementes Crioulas (abril,Anchieta/SC), “ entre as prioridadesnacionais, continua o incentivo ao la-tifúndio exportador, o agronegócio.Quem controla as sementes contro-la todo o sistema alimentar. As se-mentes são herança comum de to-dos os povos e não podem ser apro-priadas por organizações privadas.Ter acesso ao material genético é umdireito natural da humanidade. Assementes não têm dono; elas são re-passadas de geração para geração.

O poder público deve colocarmais recursos econômicos e huma-nos a favor da biodiversidade e daconservação das sementes crioulas.É preciso lutar pela soberania ali-mentar e em defesa da agriculturafamiliar, como uma alternativa aoagronegócio. É preciso resgatar epôr em prática o plantio e a distri-buição em massa das sementes cri-oulas, como uma forma de resistên-cia popular e de superação do mo-delo agrícola dominante.”

Una-se aesta luta

O Recado da Terra é uma publicação do Centro de Apoio ao

Pequeno Agricultor (CAPA), que está ligado à Igreja Evangé-

lica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB).

Núcleos e coordenações

Núcleo Erexim/RS – Ingrid Giesel

[email protected]

Núcleo Marechal Cândido Rondon/PR – Vilmar Saar

[email protected]

Núcleo Pelotas/RS – Rita Surita

[email protected]

Núcleo Santa Cruz do Sul/RS – Jaime Weber

[email protected]

Núcleo Verê/PR – Rome Schneider

[email protected]

Editora: Susanne Buchweitz (Reg. prof. 5788)

Jornalistas: Batista Weber e Rocheli Wachholz

Projeto gráfico e editoração: Cristina Pozzobon

Fotografias: Arquivo CAPA, Batista Weber, Rafael Grigoletti

Foto da capa: Balduíno Berns mostra variedades de milho crioulo

O Recado da Terra circula duas vezes ao ano. Esta edição

foi impressa em agosto de 2007. Para mais informações,

acesse www.capa.org.br

Instituições parceiras do CAPA

Fundação Luterana de Diaconia (FLD) e Serviço das Igrejas

Evangélicas na Alemanha para o Desenvolvimento/

Evangelischer Entwicklungsdienst (EED).

Propriedade organizadamelhora produção e renda

Qual a pastagem/ forra-geira/capineira mais adequa-da para incrementar a produ-ção de leite?

“Na verdade, podemos dizerque não existe forrageira/capineira ruim”, confirma a coor-denadora do CAPA Verê, RomeSchneider. “O que precisamos observar são as condições climá-ticas, as condições de fertilidadedo solo na propriedade e a capa-cidade que o agricultor tem pararepor os nutrientes que foram ex-traídos pelo pastoreio dos ani-mais. Nossa sugestão é que oagricultor pudesse ter uma certadiversidade de oferta de alimen-tos para seus animais. Particular-mente, considero a grama coast

cross uma das melhores opções.Em 2003, implantamos e con-

tinuamos acompanhando na pro-priedade da família Bornhoffen,em Verê, um pequeno experimen-to de consorciação de trevo,

cornichão e grama coast cross. Es-tamos satisfeitos com oresultado. É possível observar aconvivência de ambos, sendofundamental para a reciclagem edisponibilidade de nutrientes.”

Recado da Terra: Que tipo de

pastagem (ou forragem) vocêsusam para as vacas de leite?

Casal Bornhofen: Nós usa-mos a pastagem coast cross,tem se mostrado a melhor paranossa propriedade, no sistemade piquetes.

O que já usaram que nãodeu certo?

Capim elefante roxo, talvezporque ela estava junto com coast

cross. A grama jesuíta tambémnão deu certo, aí lavramos fora eplantamos no verão o pasto itali-ano e no inverno, a aveia.

O que usam que dá certo?Como já falamos, a coast cross, te-mos a aveia no inverno e um pou-co de silagem de milho também.

Qual a produção de leite(por animal)?

A produção varia bastante.Quando a vaca está de cria nova,

a produção é alta. Depois, pelanatureza do animal, vai dimi-nuindo. Nós estamos contentescom a produção de nossos ani-mais. Em junho de 2007, com16 vacas ordenhadas e uma jávelha de leite, tivemos uma ven-da de cerca de 8.300 litros e re-cebemos em torno de R$ 0,59por litro. Temos ordenhadeira,tanque de expansão, sala de or-denha, sala de alimentaçãopara as vacas – depois de tiraro leite, elas recebem a silageme um pouquinho de ração comrolão (milho).

A produção de leite já foimenor?

Sim, quando não tínhamosorganizado a parte da alimen-tação dos animais e a genéticaainda era fraca. Melhoramos agenética com inseminação arti-ficial da raça jérsei.

O que sugerem para outrosprodutores?

Sempre melhorar a atividade,organizar a propriedade, pararpara planejar, ter uma média ra-zoável de oferta para o laticíniode leite – ou seja, ter leite o anotodo. E gostar do está fazendo.

A coordenadora do CAPA Verê(PR), Rome Schneider respondesobre a melhoria da produçãoleiteira e o casal deagricultores Maurino e InêsMaria Bornhofen fala sobre asua experiência nesta área.

Foto Paulino Menezes/Capa

Joel, filho caçula dos Bonrhofen, mora com os pais na propriedade em Verê

Em

tem

po Americanos na

EcovaleUm grupo de americanos do

North West Sinod da EvangelicalLutheran Church in América(sínodo parceiro do Sínodo Cen-tro Campanha Sul da Igreja Evan-gélica de Confissão Luterana noBrasil (IECLB), esteve em visita aoVale do Rio Pardo (RS) no primei-ro semestre deste ano. No rotei-ro, o grupo destacou a intençãode rever os trabalhos do CAPA eda Cooperativa Regional de Agri-cultores Familiares Ecologistas(Ecovale) e verificar os seus avan-ços. A visita foi acompanhadapelo pastor sinodal da IECLB,Valdir Trebien. A relação já vemde longa data. Há oito anos, re-presentantes do mesmo sínododa estiveram no Brasil, conhe-cendo as atividades do CAPA eda Ecovale.

Manual parahortas

Alimentos frescos e saudá-veis – alimente-se desta idéia!Esta é a chamada para o manu-al Horta Caseira, organizadopela equipe do CAPA Verê (PR).As técnicas divulgadas são de-senvolvidas pelos agricultores eas ilustrações são do jovemAdemar da Silva, o Cafu.

Entre os temas abordados,estão a importância da hortacaseira, sua localização, mane-jo do solo, variedades e épocasde plantio, uso de caldas, en-tre diversos outros. De fácil en-tendimento, o manual aindatraz dicas práticas para evitarproblemas e acertar na produ-ção de hortaliças.

Meio ambientena escola

Na Semana do Meio Ambi-ente, comemorada entre 4 a 6de junho, a Cooperativa Regio-nal de Agricultores FamiliaresEcologistas (Ecovale), o CAPA ea escola Dom Alberto, em San-ta Cruz do Sul (RS) realizaramatividades nas dependências dainstituição escolar.

As atividades, envolvendotoda a comunidade escolar –desde séries iniciais, universitári-os e pais –, compreenderam pa-lestras, realização de Feira Eco-lógica com produtos da Coope-rativa Ecovale, exposição perma-nente de produtos da coopera-tiva e inauguração de uma coo-perativa de consumo.

MDA adota cartilhade homeopatia

A cartilha Homeopatia simples– alternativa para a agriculturafamiliar, lançada pelo CAPARondon (PR) em 2006, durante arealização do I Encontro Regionalde Agroecologia, está fazendo su-cesso. Pelo seu acerto e simplicida-de, foi reimpressa e será distribuídanacionalmente pelo Ministério deDesenvolvimento Agrário (MDA) eem eventos específicos organizadospelo CAPA – um deles é o Seminá-rio Regional sobre Homeopatia naAgropecuária, 14 e 15 de setem-bro próximo, no Paraná.

“Marechal Cândido Rondontem sido um dos municípios pio-neiros na difusão do uso dahomeopatia em plantas e nosolo”, lembrou o professor e pes-quisador da Universidade Estadu-al de Maringá (UEM), Carlos Mo-acir Bonato, um dos organizado-res da publicação. De acordo comele, a cartilha é uma ferramentasimples e acessível, com exemplosde preparados mais adequadospara a região. “Fizemos, assim,uma seleção de materiais e intro-duzimos algumas indicações jácomprovadas e outras nem tãoconhecidas, para que possam sertestadas pelos próprios agricul-tores.” A publicação é uma ela-boração conjunta da UEM, doCAPA e do Conselho Nacional deDesenvolvimento Científico eTecnológico (CNPq).

Secretário visita CAPA RondonO secretário estadual de agricultura e abastecimento do Paraná,

Valter Bianchini, acompanhado do chefe regional da Secretaria daAgricultura e do Abastecimento do Paraná/Toledo, Moacir Froehlich,e do gerente regional do Instituto Emater/PR, Ivan Raupp, visitou nodia 26 de julho a sede do CAPA e o laboratório de Homeopatia quefica ao lado da mesma, em Marechal Cândido Rondon. Bianchinidestacou a importância do trabalho do CAPA para o desenvolvimen-to sustentável da agricultura familiar, uma das prioridades do gover-nador Roberto Requião.

O coordenador do CAPA Rondon, Vilmar Saar, agradeceu a visita,destacando o grande significado da mesma pelo fato do CAPA estar,nesse período, completando 10 anos de atividade no Oeste do Paraná.Saar ressaltou ainda que a atuação em parceria com órgãos, entida-de e instituições é uma das prioridades da organização, estratégiaesta que tem produzido bons frutos. Como exemplo, o coordenadordestacou a exitosa parceria com o Instituto Emater/PR, que já duramais de sete anos.

Ministro reafirma importânciada agricultura familiar

A última edição do Recado daTerra traz a agricultora Mirian Brittoda Costa na capa, integrante dogrupo Prado Novo que criou aagroindústria Figueira do Prado, nointerior de São Lourenço do Sul(RS). Mirian comentava, na maté-ria intitulada “As oportunidades nocampo”, sobre as dificuldades paraa legalização da indústria. “O ca-minho é longo e cansativo”, disseela na ocasião. Pois a Figueira doPrado recebeu uma excelente no-tícia no mês de julho, quando tevelegalizada a sua operação e a pro-dução de sucos. Vale a pena feste-jar junto a conquista do grupo!

Burocracia vencida

Fotos Paulino Menezes

O ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, reafir-mou a importância da agricultura familiar para o Brasil e considerouque muitos avanços já foram feitos nesta área durante o GovernoLula. Ele falou em reunião com a secretaria executiva da FundaçãoLuterana de Diaconia – (FLD) e com a coordenação do Centro de Apoioao Pequeno Agricultor – (CAPA), em fevereiro, em Porto Alegre. Oministro Guilherme Cassel esteve acompanhado pelo superintendenteregional do Incra-RS, Mozar Artur Dietrich, e pelo delegado federal doMDA no Rio Grande do Sul, Nilton de Bem.

A agricultura familiar é responsável hoje, no Brasil, por 11% doPIB e 34% da produção agrícola nacional. E os números não parampor ai: são 4,2 milhões de estabelecimentos familiares, representan-do 84% dos estabelecimentos rurais no país e empregando 70% damão-de-obra no campo.

O encontro do ministro do Desenvolvimento Agrário com a FLD e oCAPA não aconteceu por acaso. Estamos muito interessados em obter denossos parceiros uma avaliação do trabalho desenvolvido até agora, disseCassel, reforçando que ainda há muito por fazer. Um dos projetos doCAPA, em parceria com o MDA, é o Programa Rede Solidária e Participaçãono Programa Fome Zero – que resultou na premiação, em 2005-2006, dasMelhores Práticas, concedida pela Caixa Econômica Federal.

A reunião com o ministro foi realizada na sede da FLD, que acompa-nha o CAPA. Estavam presentes o secretário executivo da FLD, SilvioSchneider; a assessora de projetos Ana Cristina Kirchheim; e os cincocoordenadores dos núcleos do CAPA.

O RECADO DA TERRA 5

Mais de 600 representantes decomunidades quilombolas, alémde convidados, estiveram reuni-dos em São Lourenço do Sul (RS),no dia 13 de julho, para o III En-contro Regional de ComunidadesQuilombolas. O evento buscoupromover o desenvolvimento sus-tentável das comunidades tradi-cionais, levando em consideraçãoseus traços étnicos e culturais.

Durante o encontro, foilançada a mostra fotográfica e olivro intitulados “Descobri quetem raça negra aqui”, evidencian-do o protagonismo dos descen-dentes de negros escravos parao desenvolvimento da região Suldo Estado do Rio Grande do Sul– através de histórias, tradições,lendas e exemplos de resistênciadessas comunidades.

O título que dá nome ao livroe à mostra resgata o depoimen-to de Clair Flores, integrante dacomunidade quilombola deCanguçu (RS). Ao rememorarsuas histórias de vida e enaltecera participação do CAPA para ofomento da cultura afro, Floresrelatou que “depois desse apoioconseguimos nos encontrar. Des-cobri, e outros descobrirão, quetem raça negra aqui”.

Muito mais do que uma ex-posição fotográfica, a mostrabusca repartir e recontar a histó-

Projeto Quilombolas lançalivro com histórias de vida

O técnico do CAPA Pelotas,Cleider Menegoni, foi um dos qua-se 2 mil delegados que participa-ram da III Conferência Nacional deSegurança Alimentar e Nutricional,realizada de 3 a 6 de julho em For-taleza (CE). O evento nacional foiresultado de um amplo processoprévio que envolveu mais de 70mil pessoas em conferências pre-paratórias estaduais, subregionaise municipais, em todos os estadosbrasileiros. O objetivo principal foimobilizar a sociedade e garantir aparticipação social pela afirmaçãoda segurança alimentar e nutricio-nal como um direito humano fun-damental e uma expressão da so-berania alimentar dos povos.

Essa é a primeira conferêncianacional do setor a ser realizadaapós a aprovação da Lei Orgânicada Segurança Alimentar e Nutrici-onal (lei 11.346/06, a Losan, san-cionada em setembro de 2006pelo presidente Lula). “Na minhaavaliação, o encontro foi muitopositivo”, disse Menegoni. “Tam-bém houve um avanço no que serefere à questão nutricional e oenfoque na agroecologia, ou qua-lidade dos alimentos produzidosde forma ecológica. Mas ainda hámuito trabalho pela frente”.

De acordo com documentodistribuído após o encontro, “a IIICNSAN reafirmou que o objetivoda segurança alimentar e nutrici-onal implica uma concepção dedesenvolvimento sócio-econômi-co que questiona os componen-tes do modelo hegemônico noBrasil que são geradores de desi-gualdade, pobreza e fome e comimpactos negativos sobre o meioambiente e a saúde.

As deliberações aprovadas na IIICNSAN constituem um conjunto deações e programas prioritários cujaconcretização impõe o início imedi-ato da construção do Sistema Naci-onal de Segurança Alimentar e Nu-tricional (SISAN) previsto na Lei Or-gânica. O SISAN deve contar comCONSEA´s (Conselho Estadual deAssistência Social) legitimados emtodas as três esferas de governo,capacitados e equipados para efeti-va participação na formulação,implementação e controle das polí-ticas de segurança alimentar e nu-tricional, bem como com instânciasgovernamentais intersetoriais quedêem efetividade às proposiçõesemanadas dos Conselhos.”

ria de pessoas como Clair, suastradições, tristezas, discrimina-ções, lutas, alegrias e vitórias. Jáo livro sistematiza o trabalho doCAPA através do relato das me-mórias e das experiências vividas

junto a quatro comunidadesquilombolas da região de SãoLourenço e Canguçu.

A sessão de autógrafos dolivro, com a assinatura de cadaum dos representantes quilom-bolas que tiveram seus teste-munhos transcritos, foi um dospontos altos do III Encontro.“Este é um livro do CAPA e dascomunidades quilombolas,pois não consideramos somen-te o trabalho de produção teó-rica, fotográfica e gráfica, mastambém aqueles que detêm amemória histórica”, enfatizoua coordenadora do CAPAPelotas, Rita Surita.

“A agricultura familiar é um modelo dife-renciado que tem uma função social decisi-va, garantindo a segurança alimentar e ge-rando empregos”, disse o secretário estadu-al de agricultura e abastecimento do Paraná,Valter Bianchini, na abertura do II EncontroRegional de Agroecologia, a II Feira de Se-mentes e IV Feira Regional Vida Orgânica,que aconteceu em São Miguel do Iguaçu (PR),nos dias 28 e 29 de junho. O secretário con-siderou ainda a agricultura familiar “gestorado meio ambiente”.

O objetivo do evento, que teve comotema principal Agroecologia: O desafio deconstruir uma nova sociedade, foi compar-tilhar e aprofundar as experiências

vivenciadas, diagnosticar problemas existen-tes e propor alternativas para a consolidaçãoda agroecologia na região.

O CAPA participou ativamente da organiza-ção do evento, ficando também responsável pelamística das sementes e pela oficina sobreHomeopatia animal e vegetal. Também estive-ram presentes dois agricultores ecológicosparaguaios e dois técnicos do Comitê de IgrejasPara Ajudas de Emergência (CIPAE), organiza-ção parceira do CAPA que atua no Paraguai.

O II ERA foi promovido pela Prefeitura Mu-nicipal de São Miguel do Iguaçu, Ministériodo Desenvolvimento Agrário, Itaipu Binacionale Secretaria de Estado da Agricultura e doAbastecimento.

II ERA desafia participantes a

construir uma nova sociedade

Público participou ativamente do encontro

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Etn

ia Segurançaalimentar

A luta pelas sementes crioulas“O meu grande medo é com

a presença das sementestransgênicas”, queixou-se o agri-cultor Balduíno Berns, de Verê(PR), enquanto mostrava semen-tes de milho crioulas produzidasna sua propriedade. “Se libera-rem o uso, será que vamos con-seguir continuar plantando or-gânico? O poder do transgênicoé forte e contamina as outras se-mentes.” Faz mais de oito anosque ele não compra sementes demilho – não tem vantagem ne-nhuma. “Semente comprada,além do valor em si, precisa desolo corrigido para produzir. Se-mente crioula se adapta ao soloque se tem. É obrigação do agri-cultor produzir semente e pre-servar a sua qualidade”, disse.

Seu Balduíno Berns vive naregião desde 1957, quando seupai veio com 16 filhos – 12homens e quatro mulheres –.Nem todos ficaram na terra.“Eu comprei um pedacinho em1972, usávamos veneno masmuito pouco.” Mesmo assim,seu Balduíno se intoxicou trêsvezes e desisitiu do veneno.“Limpamos tudo na enxada,muitos vizinhos acham estra-nho, parece que não queremtrabalhar. Mais fácil é usardessecante, dizem eles.” Alémda produção de milho, eleplanta mandioca, feijão, temum potreiro, uma reserva demato e de capoeira.

Em um mundo que promo-ve o consumo de uma formacada vez mais agressiva, as se-mentes híbridas são vendidase não servem para replantio.Não são para guardar – é pre-ciso comprá-las sempre denovo. Como o ditado de SãoTomé – Ver para crer – seuBalduíno fez um teste: “com-prei a semente mais cara quetinha no mercado e plantei naminha terra. Não deu quasenada para semente, só deu umtantinho”. Já as variedades cri-oulas chegaram a produzir120 quilos sacas por alqueire.E como dá tanto? “As semen-tes do seu Balduíno estãoadaptada às condições da ter-ra”, confirmou a coordenado-ra do CAPA Verê, RomeSchneider. “Sempre vai sermais vantajoso produzir a sua

própria semente, especialmente nocaso dos pequenos agricultores.”

Seu Balduíno tem variedadescomo o ferreirinha, sol da manhã,asteca e uma muito antiga, da qualnão sabe o nome. “Guardo as espi-gas melhores e, em dia de chuva,

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Agricultoresno resgatedo saberpopular

Agricultores dos Municí-pios de Passo do Sobradoe Candelária (RS), acompa-nhados de técnicos doCAPA, visitaram em abrilexperiências agroecoló-gicas e de resgate às se-mentes crioulas.

Foram visitadas duaspropriedades no Municí-pio de Ibarama. Na primei-ra, de Leonel Kluge, pude-ram conhecer suas lavou-ras com 11 tipos de milhocrioulo. Já na propriedadede Cláudio Wagner, desta-ca-se o sistema de produ-ção com ênfase na apicul-tura e fruticultura – pêsse-go e citrus – de base eco-lógica. Encontra-se nestapropriedade também apreservação de alguns ti-pos de milho crioulo.

“O resgate desta bio-diversidade representa apreservação de uma basegenética que contribuiumuito para a sobrevivênciada agricultura familiar.Esta biodiversidade estárelacionada à sustenta-bilidade dos agroecossis-temas e à soberania ali-mentar” salientou o coor-denador do CAPA SantaCruz, Jaime Weber.

As experiências visitadastiveram a participação e oapoio do CAPA há 15 anos.“Foi importante para mos-trar para grupos em fase deorganização que as semen-tes não possuem somenteum valor econômico ousimbólico, mas represen-tam uma estratégia cultu-ral, social, política e econô-mica para a agricultura fa-miliar” frisou Weber.

me sento no galpão e separo assementes que serão semeadas nofuturo. Misturo as variedades e dei-xo guardadas em sacos, para seremsemeadas.” A conservação é feitacom pimenta moída, espalhada nossacos de 30 em 30 dias.

Berns: é obrigação produzir sementes e preservar sua qualidade

Milho: sementes crioulas se adaptam melhor às condições usuais da terra

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“O Brasil deveria adotar a agri-cultura familiar como um modelosustentável – e viável – de desen-volvimento”, afirmou o agricultore presidente da União das Associ-ações Comunitárias do Interior deCanguçu (UNAIC), Cléo de AquinoFerreira. A UNAIC localiza-se nomunicípio de Canguçu, no RioGrande do Sul, e congrega associ-ações e grupos comunitários rurais,caracterizando-se como uma enti-dade autônoma e dirigida exclusi-vamente por agricultores.

É fundamental mudar o jeito delidar com a terra. “Junto com a nos-sa história de imigração, trouxemosum sentimento de ‘desbravar, lim-par’. Também a questão do consu-mo está na nossa educação, comose tivéssemos que comprar semen-tes. É preciso dar um basta a isso, edar um basta significa preservar oque temos”, analisou.

Cléo explica a importância daluta pela não aprovação das se-mentes transgênicas e pela pre-servação do milho crioulo. Deacordo com ele, o milho é um ele-mento de energia fundamentalpara a agricultura familiar. Comoestá presente em todas as áreasda propriedade (manutenção dosanimais, do homem etc), é umagarantia de sustentabilidade dapequena propriedade. Além dis-so, o milho é uma planta de po-larização aberta, muito mais ex-posto à contaminação, seja pelovento, seja pelos insetos. “Vãoacabar com o milho crioulo, como nosso trabalho de limpeza doscultivares e vamos perder o quetemos de mais rico em termos desementes”, disse.

Para a UNAIC, o trabalho comas sementes crioulas ajuda a defen-der e a avançar na questão da agri-cultura familiar como modelo sus-tentável a ser adotado no País. Fun-dada em 1988, a organização pos-sui experiências de produção de se-mentes de milho e de feijão desde1994. “Criamos um banco comu-nitário de produção de sementesem 1997, buscando resgatar as se-mentes crioulas da região”, contouCleo. Em 1999, o Banco de Semen-tes foi transformado em um pro-grama, com o objetivo de devolvera tecnologia aos agricultores.

Em 2001, através de todo um

Agricultura familiar é modelo de sustentabilidade27, Demaicon, 23, Daniela, 21,Douglas, 15, Deivid, 13, e Daiana, 10 –a “última carta da manga”, diz donaInalda, rindo. Logo depois de casados,o casal plantava soja e tinha produçãode leite. Em 1989, foram seduzidos poruma grande fumageira e começarama plantar tabaco. “Foi uma época mui-to difícil”, lembra o casal. Além do tra-balho excessivo, a fumageira ditava to-das as regras. “Não tínhamos tempopara os nossos filhos – Natal, porexemplo, só podíamos festejar um dia– e não tínhamos liberdade de deci-dir nem o valor da produção.”

A gota d´água foi depois de umtemporal, quando a produção defumo foi totalmente perdida. “Tínha-mos acabado de mudar 37 mil pésde fumo. Com um temporal perde-mos tudo.” A associação defumicultores disse ao casal que inde-nizaria o que havia sido perdido, masas dívidas (sementes, insumos etc)ficaram e a produção teria que serentregue conforme o acertado.

“Acho que foi Deus que mostrouque o caminho tinha que ser outro”,disse Inalda. “Depois disso para cá,nossa vida mudou muito.” Há 10 anos,plantam de forma ecológica, com oapoio técnico do CAPA. Os Peter pro-duzem frutas, verduras, feijão, batata,entre várias outras coisas. Vendem nasfeiras e na loja da CooperativaSulecológica, no centro da cidade dePelotas. “Temos tanta variedade decoisas e vendemos tudo, só falta ven-der o limão”, brinca dona Inalda.“Quem sonhou um dia que a genteiria vender tempero!” admira-se.

Quem sai da casa dos Peter en-contra, logo ali no pátio dos fundos,uma grande variedade de árvores fru-tíferas – tem pêra, ameixa,bergamota, laranja, figo, lima, goia-ba... – tem também galinhas, porcos,vacas de leite, flores... Desce mais umpouco e se depara com as parreiras,duas estufas (uma com morangos) euma horta imensa. Os maracujás aze-dos crescem livres nas cercas. A se-guir, uma grande produção de laran-jas e mais para adiante, um campode milho. “A intenção é produzir du-rante o ano todo, também as frutas”,esclarece seu Gilberto.

Os Peter fazem parte do Grupo deAgricultores Ecológicos de Remanso.“Quando começamos a feira, a gentepensava – mas como vamos fazer parater o controle das coisas? Atender os

clientes? Entender de vendas?”, lem-brou seu Gilberto. A grande distânciaentre Remanso e Pelotas exigia ummeio de transporte. “Depois de umtempo, decidimos comprar umaKombi e ficamos várias noites semdormir, preocupados com a respon-sabilidade.” Hoje, o grupo está pla-nejando a compra de um caminhão,pois a kombi já não dá conta.

“Não é dizer que estamos ricos”,afirmou dona Inalda. “Mas estamosbem, vivendo com liberdade. Mesmocom todo o trabalho, temos mais tem-po para participar em reuniões, ir naigreja, na Ordem Auxiliadora de Se-nhoras (grupo de mulheres da IgrejaEvangélica de Confissão Luterana noBrasil – IELCB).” Trabalhando na terra,

“Não pode existir agricultorque não tenha galinhas na pro-priedade”, disse o técnico emagropecuária da UniversidadeEstadual do Oeste do Paraná(Unioeste), Alceu MaurícioHartleben. Ele é o responsávelpelo experimento com galinhascaipiras, realizado na FazendaExperimental da Unioeste (PR)com o apoio do CAPA. “Temosaqui as raças Plymouth RockBarrada (carijó), Light Sussex,New Hampshire, gigante negrode Jersey e Island Rhodes Red.

São raças de dupla aptidão, vol-tadas para a produção de ovose de carne”, explicou o técnico.

A partir do experimento, já sefizeram alguns cruzamentos(New Hampshire, Sussex e a pes-coço pelado), sempre buscandoaperfeiçoar a qualidade. “Atra-vés do CAPA, repassamos as pro-dutoras para os agricultores,para que esses possam ter gali-nhas mais resistentes, maioresem tamanho e em produção.” Ocusto dos pintinhos também émenor do que outros compra-

Galinhas caipiras são mais resistentes

Exp

erim

ento

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os Peter criaram seis filhos. “Não fo-ram planejados, mas são umabenção que Deus nos deu.”

Uma ilha orgânica – Outra pro-priedade exemplar em termos debiodiversidade é a do casal Herbertoe Celi Lamb, em Quatro Pontes (PR).Com dois filhos, Eduard, 12, eLuciana, 3, moram em uma propri-edade de 3,6 hectares – destes, uti-lizam 2,8 hectares para produção defrutas. Para a comercialização, o for-te está na produção de uvas, figos,goiabas e bananas; para o consu-mo da casa, galinhas, porcos, entreoutros. “Mudamos para a produçãoecológica há sete anos, por causado veneno. Ouvimos falar no traba-lho do CAPA e participamos de uma

Inalda e Gilberto Peter optaram pela agroecologia

processo (incluindo seu registrocomo produtora de sementes juntoà Secretaria de Agricultura e Abaste-cimento do Rio Grande do Sul), aUNAIC já havia produzido 50 tone-ladas de sementes de milho, 30 to-neladas de sementes de feijão e 10toneladas de teosinto (uma plantaforrageira parente do milho). Em2002, inaugurou a sua Unidade deBeneficiamento de Sementes,potencializando e qualificando o pro-grama de produção de sementes.

“Quando falamos em susten-tabilidade, falamos no sentido eco-nômico, social – de qualidade devida – e ambiental”, esclareceuCléo. “Por isso é que afirmo que aagricultura familiar é um modelopossível de uma agricultura susten-tável. Além das sementes, pode-mos trabalhar muitos outros ele-mentos na pequena propriedade,como a agrofloresta, por exemplo.”

Sustento dos filhos – “Foi como trabalho na nossa propriedadeque criamos seis filhos”, contamdona Inalda e seu Gilberto Peter, quemoram em Remanso (RS), próximode Canguçu. Os filhos são Denise,

dos em mercado usual.“No geral, o plantel dos agri-

cultores é muito fraco”, avaliou ocoordenador do CAPA Rondon,Vilmar Saar. “No momento, 25famílias já receberam novas pro-dutoras e estão animadas com aperspectiva de melhorar a produ-ção”, confirmou.

“A manutenção das raças cai-piras também é um desafio paraa conservação da biodiversidade”,confirmou Saar. “Estamos apos-tando nesta parceria com aUnioeste.”

reunião”, lembrou o agricultor. Onome da propriedade é sugestivo –Sítio Ilha Orgânica. “Aqui na voltasomos os únicos com produção eco-lógica”, confirmou Celi.

Em 2003, por sugestão da Empre-sa de Assistência Técnica e ExtensãoRural (Emater), o casal iniciou a plan-tação de videiras. “A fruticultura, alémde dar uma boa renda, tem um customenor de produção”, esclareceuHerberto. Em 2004, o casal plantou milpés de figo, 210 pés de goiaba, 635pés de banana e 30 pés de acerola.Em 2007, plantaram ainda 150 pés demaracujá azedo e 980 pés de mamão– destes, muitos morreram por causada seca. “Também plantamos pés degoiaba, por sugestão do CAPA e daEmater”, disse o agricultor.

Os Lamb são membros da Asso-ciação de Produtores de Quatro Pon-tes (Herberto é seu presidente), quevende os produtos através de feiras,supermercados e restaurantes. “Ven-díamos primeiro em natura, mas ago-ra estamos comercializando geléias,schmiers e sucos”, contou Herberto.Com o apoio profissional do ServiçoBrasileiro de Apoio às Micro e Peque-nas Empresas (Sebrae), o grupo de-cidiu a criação da sua logomarca edos rótulos para os produtos. “Nin-guém tem idéia de como é difícil cri-ar uma logomarca, mas com a ajudado Sebrae, conseguimos.”

Pela qualidade do trabalho, a pro-priedade recebe muitas visitas. Tam-bém está abrigando experimentos re-alizados por professores e alunos daUniversidade Estadual do Oeste doParaná (Unioeste).

A família Lamb no sítio Ilha Orgânica

Alunas da Unioeste coletam dados na propriedade dos Lamb

O RECADO DA TERRA 9

Desde o ano de 2003, o CAPAassessora índios kaingangsacampados no município de Sal-to do Jacuí, próximo de SantaCruz do Sul (RS). De 35 famíliasatendidas inicialmente, hoje são55 famílias que recebem apoiotécnico. O trabalho é realizadopor uma equipe multidisciplinarcomposta por agrônomos, enfer-meira e nutricionista.

O trabalho surgiu a partir deuma preocupação do Sínodo Cen-tro Campanha Sul da IECLB, quepercebia que este grupo étnicoestava sendo esquecido e cadavez mais perdendo sua cultura.Assim, juntamente com o Conse-lho de Missão entre Índios –COMIN, iniciou um projeto comas famílias indígenas na área desaúde, alimentação e produçãode alimentos ecológicos.

Para realizar este trabalho foinecessário ir em busca de forma-ção para a equipe técnica do CAPApara estudar a cultura indígena,seus hábitos e costumes, com ointuito de entender melhor seu sis-tema de vida e trabalhar valorizan-

Peso e altura das crianças são avaliados pela equipe do CAPA

Saúde

do a preservação destes valores.No início, foi feito um levanta-

mento dos hábitos alimentares,das plantas medicinais utilizadase dos alimentos cultivados pelosindígenas. A partir daí, foi possí-vel iniciar as atividades, preservan-do e respeitando os aspectos cul-

“Tudo foi muito interessante, es-pecialmente ver outras proprieda-des. Fiquei impressionada comoeles plantam. Nós temos muita ter-ra plana, eles têm muito morro,muita terra dobrada”, disse aagricultora Marlise Kaiser, de Ma-rechal Cândido Rondon (PR). Elaparticipou da viagem de intercâm-bio a Santa Catarina organizadapelo CAPA com apoio do ConselhoNacional de Desenvolvimento Cien-tífico e Tecnológico (CNPQ) e do Mi-nistério do Desenvolvimento Agrá-rio (MDA/Dater). “Foi a primeira vezque me aventurei sozinha, sem omarido”, contou, sorrindo.

A viagem aconteceu nos dias 18e 19 de junho. Além de agricultoresde diversos municípios da regiãoOeste do Paraná, participaram dogrupo técnicos do CAPA, da Centraldas Associações de Pequenos Agri-cultores do Oeste do Paraná (CAOPA),da Empresa de Assistência Técnica eExtensão Rural (EMATER), bolsistas do

Instituto Agronômico do Paraná(Iapar) e alunos e professor da Uni-versidade Estadual do Oeste doParaná (Unioeste).

Na manhã do primeiro dia, o gru-po conheceu o trabalho realizadopela Empresa Brasileira de PesquisaAgropecuária (EMBRAPA) em Con-córdia (SC), no que se refere a suí-nos e aves – especialmente as pes-quisas sobre o Sistema Intensivo deSuínos Criados ao Ar Livre e os tra-balhos sobre Avicultura Alternativa.

Na parte da tarde, acontece-ram visitas a duas propriedades domunicípio de Seara. A primeira, docasal Gilso e Jovania Giombelli,que trabalha há 17 anos no siste-ma de permacultura. A proprieda-de tem uma grande variedade desementes de milho crioulo, trigo,feijão e outras culturas. Tambémproduz quino, parecido com pe-pino, vendido na feira local comoutros hortifrutigranjeiros e fari-nhas produzidas na própria pro-

Visita traz novos conhecimentos

turais kaingangs. As ações desen-volvidas incluem horta comunitá-ria de hortaliças; lavouras de mi-lho, mandioca e amendoim; hortocomunitário de plantas medicinais;acompanhamento nutricionalmensal das crianças até 12 anosde idade; cursos de aproveitamen-

to integral dos alimentos; pales-tras sobre cuidados com a saúdee prevenção de doenças; práticasde farmácia caseira.

O diagnóstico feito no início de2004 também constatou um altoíndice de crianças com baixopeso. Desta forma, iniciou-se umacompanhamento nutricionalmensal, que engloba a verificaçãodo peso e altura. Caso a criançaestiver em desnutrição ou com ris-co nutricional, a mãe recebe a fa-rinha múltipla como um comple-mento alimentar, para restabele-cer o peso normal da criança.

Após quatro anos de trabalho,os números demonstram um au-mento significativo de criançasque saíram da desnutrição e dorisco nutricional estando em seupeso normal. Também pode seobservar uma melhora na diver-sidade e na qualidade da alimen-tação, uma vez que os alimentosforam cultivados ecologicamente,sem o uso de adubos químico,agrotóxicos e transgênicos. (Tex-to: Melissa Lenz, nutricionista, eGrasiela Michelz, enfermeira).

Inte

rcâm

bio

Visitas a propriedades foi um dos focos da visita

Maior diversidade e qualidade naalimentação de kaingangs

priedade através de um moinhoportátil com sistema de pedras. Afamília também faz artesanatocom grãos e palhas – um traba-lho que chama muito a atenção.

A segunda propriedade visitadafoi a de Aquilino Deitos, da Associ-ação dos Pequenos Agricultores doOeste Catarinense (APACO). A pro-priedade tem cerca de cinco hecta-

res, onde trabalham cinco famílias.No dia 19 de junho, o grupo as-

sistiu a uma palestra técnica na Uni-versidade Comunitária Regional deChapecó (Unochapecó) sobre Pro-dução de Leite Orgânico e PastoreioRacional Voisin, com o professorLuiz Carlos Pinheiro Machado. (Tex-to: Daniela Petro, engenheiraagrônoma e bolsista do Iapar).

Foto Capa

O encontro que festeja a vida

Bio

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idade

Foto Capa

Temos como objetivo preservaras sementes crioulas: patrimôniodos povos a serviço da humanida-de; lutar pela soberania política, ali-mentar, energética e tecnológicapara as atuais e futuras gerações.

A sociedade foi sustentada pormais de 10 mil anos por diferen-tes modos de vida dos povoscamponeses, garantindo a mul-tiplicação de milhares de espéciese de 80% da produção de alimen-tos no mundo.

Somos contra

• a produção de sementestransgênicas e de qualquer outraforma de modificação por enge-nharia genética em plantas, ani-mais e microorganismos com a fi-nalidade alimentar e de produçãode matéria prima, porque não tra-zem nenhum benefício aos povos,

• neste momento, enfatizamosque somos contra a liberação co-

mercial de qualquer variedade demilho transgênico por ser umaameaça à biodiversidade mantidapelos povos, autonomia na esco-lha das sementes para cultivo semcontaminação, impedindo práti-cas e inovações milenares,

• o uso de produtos agro-químicos sintéticos (agrotóxicos,fertilizantes, hormônios, entreoutros), porque apresentam efei-tos adversos e irreversíveis à saú-de humana, aos animais e aomeio ambiente,

• o agronegócio que promoveos monocultivos e a destruiçãoambiental com grandes impactossociais, ambientais, econômicos,políticos e culturais,

• todas as formas de apropria-ção da vida como a monopoliza-ção das sementes, a biopirataria,a contaminação ambiental e aprivatização dos recursos naturais,

• o modelo patriarcal e capita-

lista que criminaliza e reprime asorganizações populares.

Defendemos

• a produção de alimentoscom base na utilização de princí-pios e processos agroecológicos,

• um projeto de agriculturapautado na soberania alimentar,na biodiversidade e na defesa egarantia dos direitos dos povos,

• continuar com a livre trocade sementes, conhecimentos e sa-beres populares e as iniciativas dospovos que são formas concretasde resistência,

• articular e fortalecer a lutadas diversas organizações domundo que buscam a efetivaçãodos direitos dos povos,

• políticas públicas que con-templem e respeitem a realidadede cada povo.

Estivemos reunidos para pro-

Carta de Anchietaporcionar o intercâmbio culturaldos diversos povos do Brasil, Amé-rica Latina e de outros continen-tes, celebrar as conquistas queapontam para um novo projeto devida e de sociedade.

Por último, damos nosso apoioincondicional e absoluto a todasas organizações sociais que lutamem defesa da vida.

II Encontro Nacional de For-

mação Camponesa e IV FestaNacional das Sementes Criou-las. Anchieta (SC), 18 a 22 de

abril de 2007.Mais de 30 mil pessoas pessoas

estiveram presentes no II Encontro

Nacional de Formação Camponesae na IV Festa Nacional das Semen-

tes Crioulas, organizados em movi-

mentos camponeses, quilombolas,indígenas, ambientalistas, pesca-

dores, representando diversos

paises e vários continentes.

A IV Festa Nacional das Se-mentes Crioulas, conhecidacomo Festa da Vida, reuniu maisde 30 mil pessoas nos dias 21 e22 de abril, na cidade deAnchieta, no oeste catarinense.O espaço serviu como local paratroca de sementes crioulas, infor-mações, conhecimento de novasculturas, artesanatos e comerci-alização de produtos. O eventocontou com a presença de agri-cultores e pessoas interessadasde 19 estados do Brasil, além decaravanas de outros países daAmérica Latina, Europa e Ásia.No final do encontro, divulgou-se a Carta de Anchieta (veja nes-ta página).

A coordenadora do CAPAErexim, Ingrid Margarete Giesel,falou na abertura oficial da FestaNacional, no dia 21 de abril. “Exis-tem numerosas e crescentes ex-periências da sociedade civil emtodo o Brasil que vêm construin-do e mostrando uma outra for-ma de desenvolvimento para ocampo e também para a cidadeatravés da agroecologia, que temseu eixo principal na valorizaçãoda biodiversidade, no uso susten-tável dos recursos naturais e na

Festa das sementes foi precedida pelo Encontro de Formação

geração participativa de conheci-mento”, lembrou ela.

“As sementes crioulas guardamnão só a diversidade genética, mastambém a diversidade étnica e cul-tural. E quando falamos em se-mentes, também nos referimos atubérculos como batata, cará,mandioca etc”, disse Ingrid. Lutarpela diversidade biológica e étni-ca é reconstruir a relação afetuo-

sa que as sementes crioulas sem-pre nos proporcionaram. Ao tocaruma semente preservada pelosagricultores familiares, pelos po-vos indígenas, quilombolas, é pos-sível sentir a energia da vida queatravessou nossa história. “Nestesentido, estamos nesta parceriacom a Via Campesina, Sindicatodos Trabalhadores Rurais na Agri-cultura Familiar de Anchieta e Pa-

róquia Santa Lúcia.” Atualmente, toda essa diver-

sidade estar ameaçada. O plan-tio das sementes transgênicascompromete o nosso patrimôniogenético, cultural e espiritual, as-sim como nossos sistemas deprodução e a soberania alimen-tar, lembrou a coordenadora. “OCAPA é contra qualquer forma deprivatização e controle corpora-tivo da biodiversidade. Não que-remos e não precisamos das se-mentes transgênicas; outras al-ternativas mais sustentáveis po-derão resolver os problemas quea transgenia se propõe a enfren-tar e que foram criados pela Re-volução Verde. Estamos lutandoe continuaremos lutando paraque os agricultores familiares te-nham direito a uma agriculturaecológica, defendemos a preser-vação das sementes crioulas e ocombate à manipulação, ao mo-nopólio, à imposição das semen-tes transgênicas e em defesa dosagricultores, que por séculos cul-tivam diversas espécies de se-mentes, animados e fortalecidospela participação comunitária.”(leia o discurso na íntegra emwww.capa.org.br)

O RECADO DA TERRA 11

Cultura

Tínhamos o maior tesouro do m undoMas não soubemos preservar

Não por falta de aviso,Mas por não querer escutar.”

O pai, com lágrimas nos olhos,Não conseguiu prosseguir.Mas o filho muito querido diz:

Pai, para que chorar? De que adianta?

E o pai ainda lhe diz:Filho, sou um infeliz,Por não ter cuidado da Natureza,Faço parte da geração vergonhosaQue acabou com tudoSou um dos que ainda restaMas estou sofrendo muitoEm ver tudo como estáSei que desculpasNão vão adiantarNão vão amenizarMas estou muito arrependido.”

Depois de dizer tudo isso,O pai, de tanto desgosto da vida, morreu.A criança sem saber o que fazer,Nunca deixou de ter esperançaA esperança de ver um mundo melhorDe voltar a ser como eraNa história da infância do seu pai.

A inspiraçãode umajovemagricultora

Ainda há esperança

Certo dia uma criançaToda cheia de esperançaSentou ao colo do pai.Sem ódio e nem rancorFez o velho relembrarOs tempos de amor.

A pobre criança sofrida,Com a alma feridaToda encarecidaPediu para o pai lhe contar,

Lhe contar uma históriaQue a criança adorava escutarEra a história do passadoDesde a infância do seu pai.

O pai, com lágrimas nos olhos,Começou a recordar“Era uma vez, meu filho,um mundo cheio de esperança,com água em abundânciaque nunca se pensou faltar.

Lembro-me ainda menino,Correndo pela relva mata adentro,Brincando na cachoeiraCom os outros moleques.

Não tínhamos problemasVivíamos só o presenteÉramos contentesE nada nos abalava.

As pessoas eram saudáveisNão se usava tudo descartávelPor não ter água para lavar.

A vida era uma beleza,Vivíamos perto da NaturezaBrincávamos com os pássarosE com os outros animais.

A mata era enormeOs rios eram cheiosAs árvores eram tão grossasQue precisava de muitos de nós para abraçar.A água limpinha que dava para se espelhar.

O ar era puro,Era tão bom respirar.

Mas tudo foi mudando, meu filho,Precisavas estar lá.Foi uma tristeza só.No momento uma alegria,Mas hoje com o reflexo de tudo,De tudo o que o homem fez?

Destruiu a mataCoitados dos animais – tiveram que se mudarMudar para onde?Eram raros os lugaresOnde ainda não havia devastaçãoPois a cobiça foi tantaQue esqueceram de ter Deus no coraçãoColocaram a mata no chãoPara fazer fazendas, lavouras,Fábricas, tudo uma poluição.

Foi ficando muito vazio,As pessoas se mudando,Vendendo o que tinhamPara ir para os grandes centros.

A tecnologia evoluiu tantoMas não conseguiramDescobrir um meioDe se acabar com o aquecimento global,Que aumenta desenfreadamente.Não sei até quando vai existir gente,Para contar estas histórias.Você, meu filho, está vivendo,A tristeza do presenteOlhe para a frenteNa calçada,Crianças brigando por um copo d’água.

Tudo é imundoTudo é descartávelTudo é sem graçaTudo é muito tristeSem água para viver

Sem falar de quanta genteGente que morreuDebaixo da águaPois as montanhas derreteram.

Tanta população,Pedindo um copo de água.Ela é tão cara!É quase impossível comprar.Há tantas guerras,Guerras por coisas da Natureza,Que no meu tempoEra tudo de graça,

Nilza Moreski é uma jovem agricultora de 17 anos que mora em

Verê (PR), com os pais Nelson e Maria Gessi (Nilza tem cinco

irmãos – Nilson, Cleonice, Cirino, Fabiano e Evandro). Por ocasião

da Semana do Meio Ambiente, atendendo a uma tarefa de

escola, escreveu a poesia aqui reproduzida – que fez o maior

sucesso! “Gosto muito de ler e tenho facilidade de escrever”,

contou ela. “Tenho muita esperança de termos um mundo

melhor, se cada um fizer a sua parte, diminuir o lixo, cuidar da

Natureza.”

Computador – uma peçanão tão intocável

Inclu

são d

igital

Reflexã

oÁgua foi tema de encontro

A agricultora Maria Baseggio já utiliza o computador

Há tempos, grupos de agricul-tores assessorados pelo CAPA vi-nham sonhando com o acesso ainformática e, por conseqüência,à Internet, como uma possibilida-de de interagir de forma mais di-reta com o “mundo externo”. Aidéia tomou corpo e foi imple-mentada em 2006 junto à Asso-ciação de Agricultores FamiliaresAgroecológicos (AAFA), comacompanhamento do CAPA e deprofessores e alunos da Universi-dade Regional Integrada do AltoUruguai e das Missões (URI), deErexim (RS).

“Instalamos inicialmente trêscomputadores na associação”,contou o técnico do CAPA emErexim, Vitor Hugo Hollas. Sãoequipamentos antigos, considera-dos obsoletos, mas que estão fun-cionando muito bem. “Estamosusando sistemas operacionais eaplicativos livres, de acordo coma filosofia do grupo.”

Depois de instaladas as máqui-nas, foram feitos contatos comprogramas do Governo Federal,buscando-se o apoio para um la-boratório de informática e o aces-so à Internet. “O grupo recebeuentão, por meio da Cooperativados Agricultores Familiares Ecolo-gistas Solidários (Cooperfas), umaantena para acesso à Internet viasatélite cedida pelo ProgramaIdBrasil – GESAC, do Ministério das

Comunicações do Governo Fede-ral. “Estamos buscando recursospara telecentros, prevendo com-putadores para os grupos e pelomenos mais duas antenas de aces-so à Internet”, contou Hollas.

Quantos agricultores estãosendo beneficiados?

Vitor Hugo Hollas – Atualmen-

te são beneficiados diretamentepelo acesso à Internet a AAFA, com-posta por cinco famílias da comu-nidade de Campo Alegre (RS). Coma proposta de avanço do programa,deveremos atender mais duas asso-ciações, a AAFLIFLO e a APARG.

O que está sendo utilizado noprojeto até o momento?

Hollas – Três computadoresantigos com sistemas e apli-cativos baseados em software li-vre, uma rede local conectada àantena que faz conexão com ainternet via satélite. Tambémestamos desenvolvendo um sis-tema informatizado baseado naweb para contribuição na gestãoda cooperativa.

Como os agricultores estãovivendo o processo?

Hollas – A expectativa era mui-to grande, de ambas as partes. Noentanto, a resposta positiva dadapelos agricultores superou estaexpectativa. A relação é encara-da com naturalidade. Após a im-plantação dos computadores e depequenos cursos de conhecimen-to e domínio inicial da informáti-ca, os agricultores foram se fami-liarizando e tendo êxito no uso doequipamento.

Vale lembrar que o projetosempre foi direcionado para ainclusão, motivado para a con-tribuição da proposta de desen-volvimento daquelas famílias.Todo o processo foi sendo cons-truído neste sentido, originandosempre idéias que contribuam nodia-a-dia daquelas famílias, sejana administração dos seus em-preendimentos, individuais e co-letivos como a agroindústria, sejana comunicação externa.

“Este projeto é de muita impor-tância, pois nos dá novos horizon-tes sobre como preservar a vida ea Natureza”, disse Hede Rükert, 66,de Estrela (RS). Hede é uma dasmulheres integrantes do ProjetoSaúde Comunitária (PSC), do Valedo Taquari, que estiveram reunidasem junho (dia 14), em Teutônia(RS). O encontro contou com a par-ticipação de 19 grupos de saúde,assessorados pelo CAPA,totalizando 140 pessoas.

“Onde encontram-se pessoasreunidas, como é o caso aqui, é si-nal de que algo importante estáacontecendo, que alguma coisaestá sendo feita para mudar a rea-

lidade em que vivemos,” confirmouo pastor sinodal da Igreja Evangéli-ca de Confissão Luterana no Brasil(IECLB), Marco Bechert, durante oevento. Já o pastor Leonídeo Gaede,mais conhecido como pastor Zeca,destacou a importância do projetoe de todos os envolvidos, tanto as-sessoria quanto integrantes. “Cadaum está fazendo sua parte, colabo-rando para a melhoria na sua qua-lidade de vida e das pessoas quenos rodeiam.”

No encontro, além de filmes,debates e momentos de reflexão,o engenheiro agrônomo RogérioBoemeke palestrou sobre o tema:A natureza está pedindo água. Fo-

ram abordados a importância damanutenção da água para a pre-servação da vida e da saúde domeio ambiente e, conseqüente-mente, da vida e da saúde huma-na; aquecimento global e outros.Também foram abordados ostransgênicos, o que são e quais assuas implicações para o meio am-biente. Alguns questionamentosimportantes surgiram: “Transgê-nico é ‘melhoramento’ genético.Melhor para quem? O que virá comestes processos de transgenia?”

Ainda, os participantes assisti-ram a apresentação do Grupo Vo-zes (Projeto Crescer), de Bom Re-tiro do Sul (RS). Os instrumentos

utilizados pelas crianças são cria-dos a partir de materiais descar-tados e reaproveitados. Neste pro-jeto também são trabalhados,com as crianças, assuntos relacio-nados às questões ambientais evoltadas à preservação.

No encerramento do encon-tro, os grupos receberam mudasde plantas medicinais para quesejam cultivadas e se multipli-quem. O PSC, no Vale do Taquari,trabalha com grupos, formadosbasicamente de mulheres, ques-tões relacionadas à organizaçãocomunitária, alimentação saudá-vel, saúde preventiva e produçãoecológica entre outros.