A FORMAÇÃO E O DESEMPENHO PROFISSIONAL DO...

134
ALISSANDRA VANELI NOGUEIRA LEITE A FORMAÇÃO E O DESEMPENHO PROFISSIONAL DO PROFESSOR UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO SÃO PAULO 2009

Transcript of A FORMAÇÃO E O DESEMPENHO PROFISSIONAL DO...

ALISSANDRA VANELI NOGUEIRA LEITE

A FORMAÇÃO E O DESEMPENHO PROFISSIONAL DO

PROFESSOR

UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO

SÃO PAULO

2009

ALISSANDRA VANELI NOGUEIRA LEITE

A FORMAÇÃO E O DESEMPENHO PROFISSIONAL DO

PROFESSOR

Dissertação apresentada como requisito parcial para obtenção do Título de Mestre em Educação, na Universidade Cidade de São Paulo, sob orientação do Professor Dr. Potiguara Acácio Pereira.

UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO

SÃO PAULO

2009

________________________

________________________

________________________

COMISSÃO JULGADORA

Dedico este trabalho

À minha família, que de forma incondicional me apoiou durante toda minha vida;

A meu marido por seu amor, amizade e companheirismo que sempre me fez crescer enquanto ser humano e profissional;

A meus filhos, por demonstrarem a cada dia, minha melhor parte.

AGRADECIMENTOS

Ao Doutor Potiguara Acácio Pereira, orientador desta pesquisa, que com sua

exigência e sabedoria, ajudou-me a descobrir minhas potencialidades enquanto

pesquisadora.

À Doutora Maria Cristina da Silveira Galan Fernandes e ao Doutor Julio

Gomes de Almeida, professores membros da banca examinadora pela atenção e

cuidado a mim devotados.

Aos professores do Mestrado em Educação da Universidade Cidade de São

Paulo pelo carinho da acolhida e a oportunidade do desabrochar intelectual.

Aos amigos mestrandos, pela aprendizagem, pela troca de experiências e

pela amizade pura e simplesmente, sentirei saudades.

A minha amiga Kelly Cristina de Castro, companheira, cúmplice e parceira

diária de minhas angústias e realizações profissionais.

A professora Maria Aparecida de Araújo, pela gentil revisão ortográfica e

pelas críticas tão construtivas neste processo.

Ao Colégio Satélite, fonte de constantes aprendizagens e desafios neste

laborioso caminho educacional.

Nada substitui o bom senso, a capacidade de incentivo e de motivação que só os bons professores conseguem despertar. Nada substitui o encontro humano, a importância do diálogo, a vontade de aprender que só bons professores conseguem promover. É necessário que tenhamos professores reconhecidos e prestigiados; competentes, e que sejam apoiados no seu trabalho, o apoio da aldeia toda. Isto é, o apoio de toda a sociedade. São esses professores que fazem a diferença. É necessário que eles sejam pessoas de corpo inteiro, que sejam profissionais de corpo inteiro, capazes de se mobilizarem, de mobilizarem seus colegas e mobilizarem a sociedade, apesar de todas as dificuldades.

Nóvoa.

RESUMO

Este trabalho tem como objetivo primeiro refletir sobre as propostas de formação de

professores, no Brasil, desde a criação dos primeiros cursos de Pedagogia. Para

tanto, busca compreender a evolução dos dispositivos legais, a partir das Políticas

Públicas de Educação, dos cursos de formação de professores e seu reflexo no

desempenho profissional deste profissional. O procedimento metodológico adotado

é o da análise documental, voltada, inicialmente, para o processo de elaboração e

implementação das Leis Educacionais, principalmente a das Diretrizes e Bases,

reveladoras de grandes utopias na proposta de formação docente. Pela análise

documental, também, se coletará os dados necessários para a interpretação dos

significados explícitos e implícitos no discutido. Por fim, o trabalho visa apontar para

uma possível compreensão de uma formação ideal para o professor e, por assim

dizer, para uma real construção identitária deste profissional tão desvalorizado em

nossa sociedade.

Palavras chaves: Educação, Formação de Professores, Curso de

Pedagogia, Desempenho Profissional.

ABSTRACT

This paper aims to consider about the proposals for teacher training in Brazil since

the creation of the first courses in Pedagogy. Then, it seeks to understand the

evolution of legal devices, from the Public Policy Education, training courses for

teachers and their reflection in the work professional performance. The

methodological approach adopted is the document analysis, focused initially in the

development process and implementation of educational laws, especially the LDB,

which reveals considerable utopias in the proposals of teacher training. In the

documentary analysis, the necessary data will be collected for the interpretation of

the explicit and implicit meanings in the discussion. Finally, the paper aims to point to

a possible understanding of an ideal training for the teacher and for a real identity

construction of the education professional that is so devalued in our contemporary

society.

Key words: Education, Teacher Training Course, Pedagogy, Performance Training.

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 10

CAPÍTULO 1: A HISTÓRIA DO CURSO DE PEDAGOGIA....................................... 16

CAPÍTULO 2: A PROPOSTA DE FORMAÇÃO ......................................................... 38

CAPÍTULO 3: LDBEN n. 9.394/96. NOVA PROPOSTA DE FORMAÇÃO E SUA

REPERCUSSÃO ....................................................................................................... 63

CAPÍTULO 4: LACUNAS DO CURSO DE PEDAGOGIA E O REFLEXO NO

DESEMPENHO PROFISSIONAL DO PROFESSOR ................................................ 89

CONCLUSÃO .......................................................................................................... 115

REFERÊNCIAS ....................................................................................................... 122

10

INTRODUÇÃO

Quando assumi o cargo de direção de uma escola particular, logo no início da

minha carreira, me deparei com o despreparo dos egressos dos cursos de formação

de professores para o mercado de trabalho. Esse despreparo era perceptível na

atuação diária desses profissionais em sala de aula e no discurso dos mesmos nas

reuniões pedagógicas. Ao constatar esse fato, senti a necessidade de perscrutar o

que era exigido nos cursos de formação de professores para a atuação desse

profissional no estabelecimento escolar.

Para entender o que é exigido no curso de formação de professores, é

necessário analisar as minudências das alterações nas Políticas Públicas que

norteiam esse tipo de formação ao longo de quase dezoito anos. Leis extintas,

decretos aprovados, nova Lei de Diretrizes e Bases Nacional (LDBN), nova Diretriz

Curricular Nacional (DCNs) para o Curso de Pedagogia etc. Creio que todas essas

alterações foram arranjos ineficientes que influíram diretamente na formação do

professor, componente sine qua non para o êxito de qualquer programa educacional.

No meu cotidiano escolar, como diretora de uma escola privada, dialogo com

o corpo docente e observo que muitos professores são técnicos que reproduzem

modelos sem maturidade intelectual, social e pessoal na atuação em sala de aula.

Professores que acreditam na educação, por meio do poder da transmissão do

conhecimento, no entanto, sem domínio das teorias que propiciam essa ação.

Demonstram fragilidade em seu savoir-faire (saber-fazer) e não contemplam as

necessidades de seus alunos, que, acredito, neste momento, buscam encontrar um

professor capaz de atendê-los em sua ânsia na busca de um significado

educacional. Era claro em seus discursos a falta de concatenação entre conteúdos e

práticas; não sabiam como realizar de forma satisfatória a transposição didática, ou

seja, de transformar o saber em sabedoria. Com a justificativa da falta de tempo,

poucos utilizavam ou sabiam utilizar os recursos tecnológicos oferecidos pela

escola. Em sua maioria, as aulas eram expositivas e reprodutivas, práticas que

causavam desinteresse e descontentamento por parte dos alunos envolvidos.

Apesar disso, não havia grande problema de indisciplina, talvez, pelo fato de que os

11

professores eram cuidadosos na relação interpessoal instaurada ou por

profissionalismo, ou pela proximidade da família, este representante do controle

social frente a sua ação, tanto em sala como em todo ambiente escolar. Tinham

também o discurso de que mudar era preciso, porém, a ação estava longe de

acontecer. Filhos de uma formação pautada na transmissão dos conhecimentos e na

concepção de educação disciplinar, não conseguiam se desvencilhar dos velhos

hábitos que lhes proporcionavam segurança, tranqüilidade e, com certeza, o status

dos detentores do poder sobre a sala de aula.

Inquieta frente a essa realidade que fora relatada e cansada da indefinição de

nossos objetivos, enquanto professores, iniciei as minhas pesquisas em meados do

ano 2000. Participei de cursos de Especialização, Congressos, Fóruns e, por fim,

cheguei ao Mestrado com a determinação de entender se os nossos professores

são vítimas ou vilões de sua história.

Percebo realidades educacionais que me impedem de encontrar uma única

resposta. O contexto em que a educação se efetiva é complexo e indeterminado,

visualizo atitudes que tentam atribuir valores e saberes que fundamentem a ação

pedagógica de maneira mais pertinente e eficaz possível, entretanto, há muita boa

vontade e pouca fundamentação para uma ação consistente.

Para consolidar essa pesquisa busco parâmetros legais com o intuito de

esmiuçar o meu objeto de estudo (formação do professor). Essa discussão tem uma

função social e acredito que a mesma possa contribuir de maneira satisfatória e

reveladora para o corpo docente da escola que dirijo e, quem sabe, para os outros

estabelecimentos escolares.

Parto da história da instauração do Curso de Pedagogia no Brasil, em 1939. A

partir desse ponto, percorro as trilhas das Constituições e das Leis de Diretrizes e

Bases, como tentativa de entender como foi consolidada a proposta de formação

dos professores no Brasil, bem como o reflexo desta formação em seu desempenho

profissional. Por fim, atinjo a última LDB n. 9.394/96 (BRASIL, 1996), e me deparo

com dados que comprovam a frágil estrutura em torno dos Cursos de Formação de

12

professores. Estes muito mais interesseiros do que interessantes, são elaborados

mais para atender os anseios políticos do que os pedagógicos.

Discuto por intermédio desses documentos, de modo introdutório, a relevância

da profissão dos professores, considerada desde logo estratégica, no sentido de

condicionar decisivamente as oportunidades de desenvolvimento da sociedade e da

economia.

Em seu cerne, o curso de Pedagogia constituiria um local no qual se estudaria

intencional e criticamente a educação e suas revelações na sociedade, a partir de

uma estruturada formação no campo teórico, epistemológico e metodológico da

educação e do ensino.

Porém, no Brasil, historicamente, esse curso sempre foi organizado de forma

burocrática e vinculada, na maioria das vezes, às histórias das culturas, dos

processos educacionais aliados às demandas do mercado e desconsiderou a

dimensão epistemológica, que está ligada diretamente a seu campo de reflexão,

pesquisa e análise sobre o fenômeno educativo e que, por ser assim, deveria

fundamentá-lo. Encontra-se permeado de questões relativas às suas funções, ou

seja, de qual à sua real serventia para a formação dos professores.

Ao analisar as funções atribuídas ao pedagogo nos quase setenta anos de

existência do curso de Pedagogia, pode-se perceber uma incessante busca da

definição de quem é esse profissional. Nesta pesquisa, o vocábulo Pedagogo,

significa Professor, visto que não me aprofundarei na distinção entre esses dois

profissionais. Em alguns momentos, o pedagogo tem sido definido como técnico ou

especialista da educação, em outros momentos também como professor e,

estudioso da educação. Tenho como base, a última LDB n. 9394/96 (BRASIL, 1996),

que traz para o curso de Pedagogia a docência como uma de suas bases dando ao

formado por esse curso, o título de Professor.

A Pedagogia é uma ciência da e para a educação. É, antes de tudo, um

campo científico cuja natureza constitutiva é a teoria e a prática, sua dialética. Como

ciência da educação, é auxiliada por outras ciências de diferentes campos do

conhecimento, que proporcionam o estudo da educação como práxis social, visando

13

contribuir para promoção de mudanças qualitativas no desenvolvimento de uma

sociedade mais justa, em que as pessoas estejam inseridas e constituídas das

habilidades e competências que proporcionem sua ação como sujeitos na

transformação social.

Numa sociedade que se proclama democrática, plural e participativa, solidária

e integradora, que também exalta tais princípios para a prática docente, torna-se

fundamental se fazer uma releitura do profissional inserido na educação.

No momento cultural em que nos encontramos, é fundamental saber que tudo

se torna passível de dúvidas e questionamentos, principalmente pela velocidade e

quantidade de informações, que nos circundam, e que a aprendizagem se dá a partir

das interações sociais, do desenvolvimento relacional que o professor está

diretamente envolvido.

A chamada ―crise de identidade‖ das várias profissões e dos profissionais torna-

se uma realidade amplamente posta. Neste contexto, contribuir com elementos

teórico-práticos para a discussão da licenciatura no país, e ter como referência a

formação do professor para a profissão, ganha real importância, principalmente num

país onde a profissão é representada de maneira tão pouco significativa (DUBAR,

2005; IMBERNÓN, 2006; ROSA, 2007).

A relevância teórica de uma pesquisa como esta habita na necessidade de se

configurar um curso de formação docente que seja capaz de formar professores

críticos, reflexivos em sua prática, autônomos, íntegros, capacitados e felizes com

suas realizações.

A relevância social justifica-se por se tratar de um documento que oferecerá

contribuições aos professores e às entidades organizadoras sobre os impactos

causados no desempenho profissional dos professores, a partir desta proposta de

formação.

Chizzoti (1995, p.11) conceitua como pesquisa um meio de investigar o

mundo em que o homem habita e também ele próprio. Recorrerei à reflexão sobre

14

os problemas levantados, a relação dos homens com estes problemas e como

tentam resolvê-los.

Deste modo, defino como meu problema de pesquisa ―A formação e o

desempenho profissional do professor‖, com o objetivo de analisar a proposta de

formação dos professores, desde a instauração do Curso de Pedagogia no Brasil,

até os dias atuais.

Procuro compreender a evolução das Leis, que abarcam e demonstram as reais

Políticas de Educação, desde a análise dos cursos de formação de professores,

muito mais interesseiros do que interessantes, e o reflexo desta proposta no

desempenho profissional deste professor.

O procedimento metodológico utilizado é o da análise documental. Foram

pesquisados livros, revisões bibliográficas, pesquisas historiográficas, de onde se

extraíram informações, estas organizadas e interpretadas mediante os objetivos de

minha investigação. Sempre que necessário, consultei autores e análises críticas

contemporâneas, e também, documentos da Legislação Educacional de décadas

passadas, com o intuito de melhor apreender os significados atribuídos ao problema

de pesquisa estabelecido.

O processo de coleta de dados, verdadeira ―garimpagem‖ (ANTUNES, 2002),

consistiu na busca de documentos que, ao serem encontrados, foram retirados das

prateleiras, e receberam um tratamento que, orientado pelo problema de pesquisa,

estabeleceu a montagem das peças, como um quebra-cabeça.

O primeiro capítulo considera a história da implantação do Curso de

Pedagogia, no Brasil, e as transformações econômicas e sociais que ocorriam na

sociedade da época. Parte da Primeira Lei sobre educação, constituída em 15 de

outubro de 1827 (TANURI, 2000), que estabelecia a gratuidade do Ensino Primário

para os considerados cidadãos, e chega à homologação da Primeira LDB da

história, n.4.024/61 (BRASIL, 1961), esta representante de significativas

transformações na estrutura do Curso de Pedagogia.

15

O segundo capítulo busca discutir o desenrolar da proposta de formação

desde a década de 1960, período este marcado pela dinâmica preparação de

técnicos para o mercado de trabalho, inclusive para o setor da educação. Retrata a

Reforma Universitária de 1968 e a homologação da Segunda Lei sobre educação –

LDB n.5.692/71 (BRASIL, 1971) - que apesar de entendida por muitos como a Lei do

magistério, na realidade apenas transformou o Curso Normal numa habilitação entre

tantas outras do Ensino de 2º Grau. Conclui-se em 1980, com o movimento dos

educadores em torno dos profissionais da Educação que se materializou com a

criação do ―Comitê Pró Participação na Reformulação dos Cursos de Pedagogia e

Licenciatura‖ (SCHEIBE, 2007).

O terceiro capítulo trata de forma cautelosa, da Terceira Lei sobre educação -

LDB n.9.394/96 - homologada em 20 de dezembro de 1996, principalmente dos sete

artigos do Título VI intitulado de ―A formação dos profissionais da Educação‖.

Discorre sobre as ambigüidades e incoerências contidas em sua redação, bem como

elucida a proposta de melhoria para a formação de professores, nela contida.

Refere-se também, as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia,

sua implantação e repercussão.

O quarto capítulo discute lacunas da formação dos professores encontradas

no Curso de Pedagogia, principalmente, o reflexo destas no desempenho

profissional dos professores. Refere-se também ao cotidiano escolar e docente,

estes alicerçados na ―Pedagogia do Achismo‖, e por conseqüência a preocupante

desvalorização deste profissional em nossa sociedade.

16

CAPÍTULO 1: A HISTÓRIA DO CURSO DE PEDAGOGIA

A Pedagogia, ao longo de sua história, se firmou como correlato da educação

e foi entendida como o modo de aprender ou de instituir o processo educativo.

A educação aparece como uma realidade inserida nas agremiações humanas

e à medida que o homem tenta compreendê-la e intervém de maneira intencional,

esta se transforma em saber específico. Este processo faz com que, desde a

Paidéia, passando por Roma e pela Idade Média, a educação chegue aos Tempos

Modernos, fortemente associada ao termo Pedagogia (SAVIANI, 2007).

No Brasil, a primeira Lei sobre a educação foi constituída, em 15 de outubro

de 1827 (TANURI, 2000), em atendimento ao mandamento constitucional, que

estabelecia a gratuidade do Ensino Primário para os considerados cidadãos.

Possuía um caráter nacional e implicava a formação de docentes como obrigação

dos poderes gerais, que só ocorreu, sob responsabilidade das Províncias em

atendimento do Ato Adicional, aprovado pela Lei n. 16, de 12 de agosto de 1834

(Ibidem, 2000).

As Escolas Normais visavam ä formação de docentes para o Ensino Primário.

Surgiu assim, em 1835, a primeira Escola Normal brasileira, em Niterói – Rio de

Janeiro.

Desde a primeira Guerra Mundial, o Brasil passou por um período de

transformações. Em seu modelo econômico, iniciou um processo de industrialização,

que demandou trabalhadores migrados da zona rural para a zona urbana, o qual

gerou transformações na sociedade, que alteraram consideravelmente as condições

de vida e de trabalho, e criaram uma nova composição das classes sociais.

Tais classes influenciaram, diretamente, na ordem política e começaram a

disputar o jogo político com as tradicionais oligarquias rurais, fatores que causaram

um necessário redimensionamento educacional que atendesse às aspirações dos

ideais liberais, que pregavam que,

17

[...] a educação era um fator de reconstrução social e a escola tinha um novo papel em decorrência das novas condições de vida e trabalho dos centros urbanizados, com repercussões sobre a política de formação para o magistério (BRZEZINSKI, 1996, p.26).

Para Teixeira (1962, p.137), ―antes até da Segunda Guerra Mundial, o

desenvolvimento era considerado pela sociedade como um acidente histórico, e a

educação uma conseqüência deste acidente atrelado à riqueza‖. O exemplo do pós-

guerra, dado pelo Japão e por Nações Européias, que foram totalmente destruídas,

e se reergueram também por meio da educação, passou a ser compreendido como

um fator primordial para o desenvolvimento qualitativo de um país.

O maior desafio para o Brasil, país considerado pobre, era destinar verbas

para esse desenvolvimento educativo de forma consensual entre as autoridades e a

população. O impasse estava entre a escolha do desenvolvimento industrial, que

claramente precisava de investimento, e a prioridade no desenvolvimento

educacional também necessário.

Teixeira (ibidem, p.137) afirmava que

[...] educam-se os indivíduos para participar da riqueza em expansão e secundariamente para consolidar a expansão. Assim a escola passa a desenvolver-se para atender as pressões de mudança do status social que a riqueza causa e provoca, a fim de que um número maior de pessoas fique em condições de consumi-la, tornando-se produto e não produtor de seu desenvolvimento.

Assim, emergiram nas segundas e terceiras décadas do século XX,

movimentos de modernização da educação e do ensino apoiados nos princípios

liberais da Pedagogia Nova, que vinham em defesa do indivíduo, da liberdade de

iniciativa e de igualdade perante a lei. Tornaram-se claras as reformas que

empreendiam o aperfeiçoamento de professores que cobiçavam a elevação dos

estudos ao nível superior, por iniciativa do poder público.

O aprimoramento docente, com certeza, beneficiou o processo de

organização de um espaço acadêmico para a Pedagogia, que vislumbrava uma

profissionalização da atividade dos educadores.

No final dos anos 1920, as Escolas Normais com a introdução de disciplinas

inspiradas nos princípios e práticas do Escolanovismo (que embasavam sua

18

Pedagogia fundamentalmente numa Psicologia experimental), conseguiram ampliar

a duração e o nível de seus estudos de forma articulada entre o curso secundário e

a formação profissional (BRZEZINSKI, 1996).

Apesar dos estudos pedagógicos no Brasil, de nível superior público e

particular, terem tido uma evolução lenta e irregular durante os anos de 1930 até

meados dos anos de 1960, o Ensino particular, desde 1901, já demonstrava

interesse em formar professores com status superior. Para Bollmann (2009), as

mudanças não ocorreram de acordo com as expectativas devido à educação ser um

dos setores da sociedade, em que os mecanismos sociais de resistência às

mudanças atuavam com muita intensidade e havia muito desprestígio pelo saber.

As escolas que se dedicavam aos referidos estudos não tinham na verdade a

função de desenvolver seus profissionais; deveriam apenas atender à demanda da

época, com sucessivas adaptações, para adequar-se a cada decreto reformador do

ensino, e assim ser um órgão educacional competente.

Em 1920, pela primeira vez, Sampaio Dória, no Estado de São Paulo, tentou

elevar os estudos de formação dos professores de nível superior por iniciativa do

poder público, com os Decretos n. 1.759/1920 e n. 3.356/1921, organizados em 10

capítulos e 47 artigos que detalhavam cuidadosamente a organização e

funcionamento da Faculdade de Educação, porém, apesar de todo esforço do

legislador, tais Decretos jamais foram cumpridos (BRZEZINSKI, 1996).

Em conseqüência de algumas reformas e do considerável aumento dos

estudos pedagógicos, a Escola Normal chegou ao final da Primeira República com

um curso híbrido que oferecia, ao lado de um pequeno currículo profissional, um

ensino de Humanidades e Ciências muito mais significativo, o que fazia das Escolas

Normais uma espécie de escolas mal aparelhadas, ou seja, sem concatenação entre

as metas e a precária realidade dos cursos de formação.

Graças à atuação dos profissionais da educação mediante publicações, movimentos, conferências, cursos, debates que divulgam idéias da escola renovadora, forma-se uma nova consciência educacional relativa ao papel do Estado na educação, à necessidade de expansão da escola pública, ao direito de todos à educação, tendo em vista seu alcance político e social, à

19

importância da racionalização da administração escolar, á necessidade de implantação de uma política nacional de educação (TANURI, 2000, p.14).

Um dos profissionais mais atuantes nos movimentos da reforma educacional

foi Anísio Teixeira que, em 1932, no Distrito Federal, com o Decreto n. 3.810, de 19

de março, propôs a erradicação daquilo que considerava o ―vício de constituição‖

das Escolas Normais, que em seu regimento propunham, ao mesmo tempo, serem

escolas de cultura geral e de cultura profissionale falhavam gravemente nos dois

objetivos. Teixeira acreditava que

Se a escola normal for realmente uma instituição de preparo profissional do mestre, todos os seus cursos deverão possuir o caráter específico que lhes determinará a profissão do magistério (VIDAL, 1995, p.65. In: TANURI, 2000, p.73).

Com esta concepção, se aceitava que os cursos nas Escolas Normais deveriam

se organizar a começar pelos seguintes ideais:

A) Cursos de fundamentos profissionais - deveriam incluir os que

oferecem conhecimentos gerais e preliminares para a atividade educativa,

como biologia educacional, sociologia educacional etc.;

B) Cursos específicos de conteúdo profissional - deveriam incluir

todos os que fornecem o material e conteúdo propriamente ditos do tipo

especial de ensino, a que se destina o estudante - como os cursos de

matérias de ensino, em geral, ou da matéria de ensino especializada;

C) Cursos de integração profissional - incluiriam todos os cursos de

técnica educativa ou de filosofia ou cultura geral educativa, que ministram

os elementos científicos dos métodos, a sua prática e, ainda, a cultura

geral relativa à profissão, como os cursos de psicologia educacional, de

testes e medidas, de administração, de técnicas de ensino, de filosofia e

história da educação e de observação, participação e prática de ensino.

(VIDAL, 2001, apud SAVIANI, 2004, p.81-82).

O Instituto de Educação, de São Paulo, dirigido por Fernando de Azevedo, em

1933, seguiu o mesmo caminho do Instituto do Distrito Federal e criou sua Escola de

Professores. Regulou a formação técnica de professores primários, secundários e

especializados para o Distrito Federal, com prévia exigência do Curso Secundário e

transformou em Instituto de Educação a antiga Escola Normal. Compunha-se, na

20

criação, de uma Escola Secundária com seis anos de curso, uma Escola de

Professores com dois anos de Curso Superior e uma Escola de Aplicação composta

de Escola Primária e Jardim de Infância. Teve como primeiro diretor geral Manuel

Bergstrom Lourenço Filho. Apresentava-se como um sistema experimental de

educação para formação do professor primário em padrão cultural mais elevado.

Recebia alunos de diversos extratos sociais, selecionados por condições especiais

de idade, saúde, inteligência e aproveitamento de ensino, medidas em testes e

exames. De acordo com Libâneo (2007, p.122), ambos foram elevados ao nível

universitário; o de São Paulo foi incorporado à Universidade de São Paulo (USP),

em 1934, e o do Distrito Federal, à Universidade do Distrito Federal em 1935, que

tinham como um de seus objetivos oferecer a formação do magistério em todos os

seus graus.

Acusado de professar idéias comunistas, Anísio Teixeira foi perseguido pelo

Governo Vargas, em 1935, e deixou a instrução pública e, como conseqüência, a

recém-criada Universidade do Distrito Federal sofreu grave revés.

Com o Decreto n. 1063, de 20/01/1939, a Universidade do Distrito Federal foi

extinta e seus cursos incorporados à Universidade do Brasil, que havia sido

organizada pela Lei n. 452, de 05 de julho de 1937, por iniciativa do Ministro da

Educação e um dos principais opositores de Anísio Teixeira: Gustavo Capanema,

este, representante de um governo autoritário, que impôs um modelo universitário

centralizado e padronizado para todo o país (BRASIL, 1939).

A partir dessa base, para Saviani (2007, p.118), organizaram-se os Cursos

Superiores de Formação de Professores para as Escolas Secundárias, que

desempenharam um papel orientador e disciplinador da cultura do país, no qual o

preparo de professores assumiria o caráter de ―simples formação profissional‖,

desvinculado do desenvolvimento da pesquisa; assim houve a segregação da

formação do professor concernente a configuração de caráter científico.

Para Florestan Fernandes, sociólogo e professor que participou ativamente

destas campanhas, tal organização demonstrava a visão estreita do homem ―culto‖

brasileiro, que não transcendia os limites de uma escola apenas para um preparo

21

técnico, ―objetivável na qualidade de serviços educacionais‖ prestados à

comunidade (BRZEZINSKI, 1996). Desta maneira, se fortaleceu a intenção de

converter as Faculdades de Filosofia em centros de transmissão de conhecimentos,

separados da pesquisa e da busca constante de produção de novos conhecimentos.

Em 1939, o Decreto Lei n. 1.190, de 04 de Abril (BRASIL, 1939), que organiza a

Faculdade Nacional de Filosofia, da Universidade do Brasil, estruturando-a em

quatro seções: Filosofia, Ciências, Letras e Pedagogia, acrescentando ainda a

seção da Didática, considerada como ―seção especial‖, constitui-se assim o tão

esperado curso de Pedagogia no Ensino Superior.

As seções de Filosofia, Ciências e Letras, alojavam diferentes cursos. O Curso

de Pedagogia, que formava o Bacharel em educação (Técnico), e o da Didática, que

formava o Licenciado (Professor), constituía apenas o seu próprio.

Todos os cursos da Faculdade Nacional de Filosofia, baseados no modelo

padrão das demais Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras do país, organizaram

seus cursos em duas modalidades: o Bacharelado com duração de três anos e

conteúdos específicos da área do saber, e o de Licenciatura, que seria obtido por

meio do curso de Didática, com duração de mais um ano (SAVIANI, 2007).

O Curso de Pedagogia não fugiu desse padrão, conferia o diploma de Bacharel

em Pedagogia aos que concluíssem o curso de Bacharelado. Após esta etapa, uma

vez concluído o Curso de Didática, seria conferido o diploma de licenciado em

Pedagogia.

A proposta desse Decreto-Lei (1.190) resultou num paradigma de formação que

propunha o modelo de ―esquema 3+1‖, ou seja, três anos de estudo para as

disciplinas específicas (Bacharelado) e um ano para a formação didática

(Licenciatura), que perdurou por 23 anos no sistema de formação de professores

secundários.

Para Saviani (2007, p.117), tal organização resultou em:

Ao ser generalizado, o modelo de formação de professores em nível superior perdeu sua referência de origem, cujo suporte era o das escolas

22

experimentais às quais competia fornecer uma base de pesquisa que pretendia dar caráter científico aos processos formativos.

Para o Curso de Pedagogia previu-se o seguinte currículo:

1º ano: Complementos de Matemática; História da Filosofia; Sociologia;

Fundamentos Biológicos da Educação; Psicologia Educacional.

2º ano: Psicologia Educacional; Estatística Educacional; História da Educação;

Fundamentos Sociológicos da Educação; Administração Escolar.

3º ano: Psicologia Educacional; História da Educação; Administração Escolar;

Educação Comparada; Filosofia da Educação.

O curso de Didática, com duração de um ano, era composto pelas disciplinas:

Didática Geral; Didática Especial; Psicologia Educacional; Administração Escolar;

Fundamentos Biológicos da Educação; Fundamentos Sociológicos da Educação.

Para que o Bacharel em Pedagogia pudesse se tornar um licenciado, bastava

cursar apenas as duas primeiras disciplinas (Didática Geral e Especial), visto que as

demais disciplinas já constavam em seu currículo de formação.

Ao instituir um currículo pleno fechado para o curso de Pedagogia, em homologia com os cursos das áreas de filosofia, ciências e letras e não os vinculando aos processos de investigação sobre os temas e problemas da educação, o modelo implantado com o Decreto 1.190, em lugar de abrir caminho para o desenvolvimento de estudos e pesquisas educacionais, acabou por enclausurar-se numa solução que se supôs universalmente válido, agravando progressivamente os problemas que se recusou a enfrentar. Com efeito, supondo que o perfil profissional do pedagogo já estaria definido, concebeu um currículo que formaria o bacharel em pedagogia entendido como o técnico em educação que, ao cursar didática geral e especial, se licenciaria como professor (SAVIANI, 2007 p.118).

Ao contrário do que acontecia em outras áreas do conhecimento, com o

passar dos anos, surgiram sérios fatores que demonstram a fragilidade na

organização do curso de Pedagogia: a inexistência de conteúdos específicos, a

indefinição profissional no mercado de trabalho, a não adequação dos conteúdos até

então generalistas, a separação de Bacharelado e Licenciatura, fez refletir a

separação entre conteúdo e método, e um ―prêmio de consolação‖ dado aos

licenciados em Pedagogia (direito de lecionar Filosofia, História e Matemática nos

cursos de nível médio), o que demonstrava a falta de caracterização profissional.

23

Tudo isso, além do distanciamento dos professores bem preparados nas

universidades dos cursos de Pedagogia, proporcionaram a instauração de uma crise

e a consecutiva desvalorização do mesmo.

Mais um fato ilustra a situação de marginalidade dos profissionais da USP que se dedicavam aos estudos pedagógicos em nível superior: por ocasião da instalação do padrão federal extinguiu-se o Instituto de Educação da USP e criou-se a Seção de Pedagogia com a incorporação de todo o ―acervo‖ do Instituto de Educação, inclusive de seus professores. O decreto elevou todos os professores da seção aos cargos de nível superior, o que criou a possibilidade de os antigos docentes do Instituto de Educação transformarem-se em catedráticos, sem, contudo, possuírem formação em nível superior (BRZEZINSKI, 1996 p.46).

Com o término da Segunda Guerra Mundial em 1945, que engendrou o

questionamento da atuação dos governos autoritários e totalitários, o Brasil iniciou a

fase de redemocratização e frente às pressões internas dos militares, que

paulatinamente eram afastados do poder político, aliados às classes sociais que

almejam diversos objetivos (a classe obreira reivindicava melhores condições

salariais e o respeito aos seus direitos trabalhistas enquanto a burguesia buscava ter

liberdade nas transações comerciais aos moldes neoliberais) e também às tensões

externas, do governo norte-americano, Getúlio Vargas, no seu segundo governo

(1950-1954) se viu obrigado a alterar a Constituição de 1937, pois esta trazia no

âmbito da educação idéias autoritárias, restritas, que condenavam o liberalismo, a

democracia e defendia a ditadura das massas.

As reformas educacionais de Gustavo Capanema, então Ministro da

Educação e Saúde, que definia o ensino secundário como o ramo destinado às

elites e o ensino profissionalizante aos menos favorecidos, caíram por terra em

meados de 1942, quando se efetivou o período de suposta redemocratização do

país.

Quanto à educação, voltou-se a falar em democratização do ensino,

igualdade de oportunidades e descentralização administrativa, anseios incorporados

à Constituição de 1946, que retomou a educação como direito de todos, oferecida

tanto no lar como na escola (Art. 166), assegurou competência à União para legislar

sobre Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Art.5º, item XV, letra d) entre outras

ações educativas (CAMPANHOLE, 1971).

24

Esta Constituição, promulgada em 18 de setembro de 1946, traçava para os

professores a liberdade de cátedra, com a exigência de um concurso público de

títulos e provas para o ingresso no ensino oficial que garantia assim a vitaliciedade

do cargo. Houve nova caracterização da Escola Secundária e Superior, agora com

alto prestígio social para a formação de profissionais liberais. Isto marcou

profundamente a busca por este ramo de ensino, fator que colaborou mais para o

crescimento dos cursos, sem necessariamente verificar sua qualidade.

Essa intenção política de expandir a educação às massas fazia parte da

política adotada pelo Estado populista-desenvolvimentista de 1945-1960 (Era de

Ouro ou Anos Dourados), que delineava a expansão das Escolas, principalmente as

Primárias e a Normal que, na realidade, em nenhum momento conseguiu atender

toda a demanda educacional.

Tais dimensões exigiam ―profissionais‖ especializados e para atender a

demanda houve ampliação do Ensino Secundário tanto o propedêutico quanto o

profissionalizante e do Ensino Superior nas Faculdades de Filosofia, nas quais foi

intensificada a formação dos professores pela expansão das oportunidades

educacionais.

Durante os decênios de 1940, 1950 e início de 1960, décadas em que se

apostava no desenvolvimento educacional como ferramenta necessária para fazer o

Brasil crescer e atingir a qualquer custo as portas da modernização houve uma forte

pressão da sociedade para ampliar o Ensino Superior com o propósito de atender a

essas necessidades. Estes fatores foram determinantes para o aumento na criação

de universidades públicas e particulares. Em 1950, já existiam oito federais, uma

estadual e três particulares. Em 1960, apenas dez anos depois, existiam trinta e uma

universidades, dentre elas, oito particulares.

Uma década depois (1970), como demonstram os dados do IBGE, o quadro não mudara: das 61 universidades brasileiras, 57 mantinham Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras que ofereciam 854 cursos, dos quais 138 eram de Pedagogia (ibidem, 1996, p.50).

A rapidez na instauração das universidades forçou o recrutamento de

especialistas diversos. Estes, em sua grande maioria, não articulavam idéias para

compreender a proposta de formação, cada um apresentava uma necessidade

25

específica, o que normalmente causava individualismo, certa clausura no

desenvolvimento dos projetos, falta de diálogo, o não compromisso de quantidade

conectado à qualidade, a não promoção da formação profissionalizante e ações

refletidas diretamente na formação de um grande número de licenciados, na maioria

das vezes, despreparados para atender à demanda do mercado de trabalho

(BRZEZINSKI, 1996).

O anseio do momento pairava sobre a aquisição de posses ou bens, a

educação havia se transformado numa espécie de segunda necessidade. Afastados

dos objetivos educacionais, surgiram novos modelos de glórias, que estimulavam o

superficial, premiavam os ignorantes e seduziam os ingênuos com propostas

imediatistas, que embebidas de várias oportunidades, esqueciam-se do único

caminho que poderia proporcionar a igualdade de direitos: os valores éticos e

morais.

A educação passa assim a ser objeto de certificação e não de conhecimento,

nasce com este dado a necessidade de traçar planos para resolver ―o problema dos

direitos dos brasileiros‖, o de educar para ser cidadão, para ganhar a vida e para

viver com decência e dignidade (SAVIANI, 2007).

As Escolas Secundárias e Superiores, destinadas dentre outros objetivos à

formação do professor, objetivavam oficializar esta formação,ou seja, boas escolas

eram aquelas que estavam com toda documentação atualizada. A qualidade

educacional era fator secundário. Quando a população questionava o governo em

relação à qualidade do ensino, obtinha como resposta a verificação das exigências

burocráticas e legais, mas não era feita a reflexão do que havia sido pontuado como

inadequado.

Organizado com a ―Lei Orgânica do Ensino Normal‖, viabilizada pelo Decreto-

Lei n. 8.530, de 02/01/1946 (TANURI, 2000, p.75), e ligado diretamente ao Governo

Federal, que, por curiosidade, não mantinha nenhuma dessas escolas, o Curso de

formação de professores era organizado a partir da fixação de normas, currículos,

planos e livros, todos oficializados. Previa a existência de dois ciclos: o primeiro, de

26

quatro anos, era destinado a regentes, e o segundo, de três anos, destinado a

professores primários.

Estes cursos não levavam em conta as especificidades da região, da

comunidade, nem de seus professores, declaravam a prerrogativa de uma proposta

―fechada‖ para a formação de professores, na qual nada poderia interferir. A base

era clara: o mesmo curso para todos, com o intuito de disciplinar e uniformizar a

formação dos futuros profissionais que trabalhariam com a educação de um povo. A

qualidade estava pautada nos princípios de controle, que propagavam que as

Educações Secundárias e Superiores tinham uma uniformidade extrínseca e formal

em todo país, na qual o governo ditava as normas com o intuito de preservação da

unidade nacional. “Busca-se a oficialização porque é o passaporte para a

legalização das simulações educacionais que estão proliferando pelo Brasil afora.

Estamos, em educação, legalizando a moeda falsa‖ (TEIXEIRA, 1992 p.155).

O regime instaurado, cuja ―oficialização‖ tornou-se mais importante do que a

qualificação, o reconhecimento da necessidade de abertura de novos pólos

educacionais ao invés da intensa proposta de melhoria educacional, sugeria um

regime de ―fraude educacional‖. O que era julgado não era a qualidade da formação,

mas sim a existência de uma habilitação para validá-la.

Tais fatos colaboraram para que a proposta de formação passasse por uma

falta de autenticidade, não se conseguindo enxergar quais os princípios norteadores

desta profissão balizadora para o desenvolvimento nacional. Se o que era

importante era ser habilitado, a qualidade com que isto se dava, passou a ser

ultrapassada, e trouxe uma sensação de igualdade para todos os professores,

fossem eles bons ou ruins.

Tal sensação promoveu certo conformismo frente às ações pedagógicas, uma

vez que não importavam mudanças já que a qualidade não tinha relevância e sim o

aparente resultado final. O processo de formação se tornou irreal e abstrato o que

contribuiu para uma estagnação educacional.

27

Sem experimentação, sem ensaios, sem competição, sem escalas de mérito e demérito, o sistema ou se fossiliza no formalismo ou na rotina, ou envereda pela fabricação de resultados falsos. As energias de professores e alunos se desenvolvem no sentido de problemas acidentais e colaterais. Desinteressados em relação ao processo educativo [...] passam a cogitar de problemas pessoais, os professores e os alunos de atividades diversas, menos as do aprendizado... Nada, pois, mais justificado do que o sentimento de mal-estar já reinante nas próprias esferas da educação e na opinião pública (ibidem, 1992 p.158).

Frente a este panorama, os professores se sentiam meramente cumpridores

de ordens, sem estímulo para inovar, buscar alternativas para os problemas

encontrados no ambiente educacional, tão peculiar e cheios de caminhos nebulosos,

os quais acatavam para sua profissão a máxima que ser competente, enquanto

professor, era estar bem informado dos regulamentos educacionais e atender assim

as convenções governamentais.

Teixeira (1992, p.165) numa célebre frase disse: ―É sabido que só

adestramento se pode fazer sem a participação do educando. Educação e ensino só

se conseguem com plena autonomia do aluno‖. Tanto a instituição, o aluno, o

professor, como todos os demais envolvidos no processo educacional, devem ter

autonomia para se sentirem livres na execução de seu real papel, que durante o

processo será adequado a cada necessidade, ora professor, ora aluno. Este

movimento propicia a troca e a co-responsabilidade no processo educacional que se

fará autêntico e de fundamental importância.

Após a promulgação da Constituição de 1946, que se inspirou nas doutrinas

sociais do século XX e que tinha uma grande tendência democrática, foi reconhecida

a necessidade da formulação de uma Lei que amparasse os vários segmentos da

Educação Nacional. O então Ministro da Educação Clemente Mariani convocou uma

comissão de educadores para a discussão e feitura do projeto de Lei das Diretrizes

e Bases, que foi presidido pelo Professor Lourenço Filho. Tal projeto foi apresentado

em 1948, à Câmara pelo Presidente da República General Eurico Gaspar Dutra que

assumiu o poder após a renúncia forçada de Getúlio Vargas, em 29 de outubro de

1945 (SANTOS. et al., 2006). De início, não obteve aceitação e permaneceu

adormecido nos trâmites burocráticos até 1952, quando começou a ser discutido.

Em 20 de Dezembro de 1961, foi aprovado sob o n. 4.024, conciliando interesses

28

dos liberais liderados por Florestan Fernandes e dos proprietários de escolas

representados por Carlos Lacerda.

O projeto de Lei de Diretrizes e Bases tinha entre suas metas fundamentais a

Educação Nacional inspirada nos princípios de liberdade e nos ideais de

solidariedade humana. Também apresentava a compreensão dos direitos e deveres

da pessoa humana, do cidadão, do Estado, da família e dos demais grupos que

compunham a comunidade. Outra meta, não menos importante, era o fortalecimento

da unidade nacional e da solidariedade internacional, o desenvolvimento integral da

personalidade humana e a sua participação na obra do bem comum. Prevaleciam os

preceitos sobre a administração do ensino e a independência no que concerne ao

Governo Federal, com a criação dos respectivos Sistemas de Ensino.

A Lei Nacional de Educação, ou seja, a Lei de Diretrizes e Bases trouxe

inovações. Aprovada 15 anos após a Constituição de 1946, restabeleceu ao Estado

a liberdade da organização de seus sistemas de ensino e designou à União o direito

de traçar as normas da política administrativa e a organização do sistema federal de

ensino e dos territórios. Suas Diretrizes corresponderiam aos princípios gerais que

norteavam a filosofia e a política da educação, que já se achavam contidos na

Constituição de 1946, e as Bases se fixariam na realização de metas e programas

de competência e poder educacional da União, dos Estados e dos Municípios.

Para Teixeira (1992, p.182) a LDB n.4024/61, deveria ser:

[...] uma lei de grande amplitude, que libertasse as iniciativas, distribuísse os poderes de organizar e ministrar a educação e o ensino, e facultasse ao povo brasileiro encontrar no jogo de experiências honestas e de uma emulação sadia, os seus caminhos de formação nacional.

Esta LDB apresentava características de um diploma unitário que embora

fosse lei ordinária, ou seja, um ato normativo primário que contém regras e normas

gerais e abstratas reivindicava em sua ementa a compilação dos princípios

fundamentais recomendados para o ensino no Brasil. Partia do princípio de

confiança e envolvimento estabelecidos nesta nova política educacional, na qual as

pessoas envolvidas seriam sujeitos de grandes mudanças e avanços na Educação

Brasileira.

29

O art. 92 estabeleceu o Conselho Federal de Educação e os Conselhos

Estaduais de Educação, distanciando-se do antigo Conselho Nacional da Educação.

O artigo em questão explicita de forma categórica os recursos e responsabilidades

destes órgãos, estes diretamente atrelados à elaboração de planos, que visavam

descrever as intenções para as futuras realizações no setor educacional.

Apesar da instituição do Conselho Federal de Educação e no seu âmbito os

Conselhos Estaduais de Educação, conselhos estes considerados por Vasconcellos

(1962) como vigas mestras da nova Lei, por ter como objetivo, as sentenças,

pronunciamentos, indícios, promoções, feituras, propostas, dentre outras, após seis

meses da homologação da LDB, apenas os Conselhos do Distrito Federal (Brasília),

Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Ceará, Amazonas e Goiás

apresentavam Conselhos Estaduais em funcionamento, os demais estados do

território Nacional, ainda não.

A demora desta instauração mutilava as propostas da LDB e impunham um

entrave penoso à sua execução, especialmente na transferência de funções da

trajetória estadual, visto que estes Conselhos não poderiam ser considerados filtros,

mas sim fontes de promoção e estímulo para novas experiências no campo

educativo. Como tentativa para amenizar este entrave, a União, sem interferir

diretamente, ofereceu modalidades de currículos em suas escolas para aquelas que,

sem orientação, quisessem adotá-los até a normalização destes órgãos.

Ao representar a Carta Magna da educação, a União estabeleceu que não

fosse mais aceito a postergação da obrigatoriedade escolar, a partir dos sete anos, e

que esta seria objeto de ação das três órbitas do Poder Executivo,ou seja, escolas

estaduais, municipais e particulares, subsídios e auxílios federais somariam os

esforços comuns da sociedade e do Poder Público no sentido de proporcionar

educação a todos. Percebe-se que esta Lei se encaminhava para a democracia

social, o progresso tecnológico e conseqüentemente o desenvolvimento. Quanto à

questão da formação, isto é, no que diz respeito ao ponto de vista pedagógico, tinha

a intenção de abrir caminho para as mais honestas e puras experiências em matéria

30

de ensino. Tratada no Título VII, Capítulo IV, intitulado ―Da formação do magistério

para o Ensino Primário e Médio‖, discorria que:

“Art. 52. O Ensino Normal tem por fim a formação de professores,

orientadores, supervisores e administradores escolares destinados ao Ensino

Primário e o desenvolvimento dos conhecimentos técnicos relativos à educação da

infância.

Art. 53. A formação de docentes para o Ensino Primário far-se-á

a) Em Escola Normal de grau ginasial no mínimo de quatro séries anuais

onde além das disciplinas obrigatórias do curso secundário ginasial será ministrada

preparação pedagógica;

b) Ou em Escola Normal de grau colegial, de três séries anuais, no mínimo,

em prosseguimento ao... (vetado) grau ginasial.

A palavra ―vetada‖, no item b, do art.53, se refere à expressão ―curso normal

de‖. Esta foi vetada para limitar o ingresso nos cursos normais de grau colegial, dos

―professores‖ portadores de diplomas de regentes. O ingresso deste regente traria

dificuldades desnecessárias para a formação do amplo corpo de professores

primários de que precisava urgentemente o país, visto que a formação de regente

far-se-ia mais como uma concessão do que como uma real formação, pois os

regentes eram ―professores‖ que ao findar o curso primário se identificavam com a

profissão e assumiam esta função nas regiões mais carentes do país que não

apresentavam um número de professores qualificados para sua demanda e assim

os adequavam a esta função, ficando sua formação sob responsabilidade das

Escolas Normais de grau ginasial, conforme citado no art. 54.

Art. 55. Os Institutos de Educação, além de cursos de grau médio, referidos

no art. 53 ministrarão cursos de especialização, de administradores escolares e de

aperfeiçoamento, abertos aos graduados em Escolas Normais de grau colegial.

Art. 56. Os sistemas de ensino estabelecerão os limites dentro dos quais os

regentes poderão exercer o magistério primário.

31

Para as Escolas Rurais primárias a formação poderá ser feita em

estabelecimentos que lhes preservem a integração ao meio (Art. 57).

Já o artigo 58 estabelecia o igual direito do ingresso no magistério primário

para os formados nos cursos citados nos artigos 53 e 55.

Art. 59. A formação de professores para o Ensino Médio será feita nas

faculdades de filosofia, ciências e letras e a de professores de disciplinas específicas

de Ensino Médio Técnico em cursos especiais de educação técnica.

Parágrafo único. Nos Institutos de Educação poderão funcionar cursos de

formação de professores para o Ensino Normal, dentro das normas estabelecidas

para os cursos pedagógicos das faculdades de filosofia, ciências e letras.

Art. 60. O provimento efetivo em cargo de professor nos estabelecimentos

oficiais de Ensino Médio será feito por meio de concurso de títulos e provas.

(Vetado)

O veto refere-se ao complemento ―... em que só se poderão inscrever os

graduados pelas escolas e cursos referidos no artigo anterior”. (art. 59)

[...] Esta limitação condicionaria a expansão da rede pública do ensino aos estreitos limites da capacidade de formação de tais escolas. Para as cidades do interior de extensas regiões do País seria impossível encontrar professorado com tais qualificações, razão pela qual torna-se prematura esta medida (BRASIL, CFE, DOCUMENTA n. 12, 1963, p.80).

Art. 61. O magistério nos Estabelecimentos... (vetado)... de Ensino Médio só

poderá ser exercido por professores registrados no órgão competente.

O veto ao artigo 61 se refere à palavra ―particulares‖. A lei defendia que tal

exigência frente ao registro para os professores de grau médio, não deveria

restringir-se apenas ao magistério dos estabelecimentos particulares, mas, sim, a

todo professorado desse nível.

32

Outro ponto importante a ser ressaltado está na falta de especificação de qual

órgão vem a ser este considerado competente para ratificar a formação dos

professores para esta prática de formação. Brzezinski (1996, p.53) afirma que:

Por deliberada omissão, ou, como quer Fétizon (1986, p.411), por ―uma obra prima de omissão diplomática‖, o caput não continha as exigências do exercício do magistério por profissionais especializados [...] nas Disposições Transitórias, os artigos 115 e 116 faziam concessões a professores não formados em razão do insuficiente número de habilitados para atuar na escola primária e de nível médio. Isso confirma que o órgão competente aludido no Artigo 61, concedia o registro do profissional formado e não formado, oficializando a descaracterização profissional do professor.

No que se refere ao sentido dado pela LDB quanto à ―profissão‖ no Ensino

Superior, em seu artigo 67, instituía que o treinamento profissional fosse organizado

e anunciado em todo o Ensino Superior, ministrado com a cooperação de centros de

treinamento profissional, ou seja, a formação de professores secundários levou as

Faculdades de Filosofia a instituírem os Colégios de Aplicação, com o anseio de

tornar os diplomados, em profissionais habilitados ao exercício da profissão. Esta

preparação não extinguiria a formação continuada, entendida como inerente ao

profissional. Essa proposta parecia ser de grande valia, no entanto, na realidade era

um projeto muito custoso, visto que os modelos destas instituições deveriam ser

primorosos em sua estrutura e em sua formação profissional. Além disto, a

experiência das poucas faculdades que montaram este estabelecimento

demonstrava um resultado insatisfatório frente à proposta. O local mais parecia uma

sala de aula fictícia, do que um centro de excelência. Nele se reproduzia um certo

―faz-de-conta‖ e foi considerado por muitos até como uma vitrine pedagógica para os

futuros profissionais da educação. Em sua prática observavam-se aulas

superficialmente planejadas, assistidas ou ministradas nestes ambientes artificiais,

com atitudes que colaboravam de forma extremamente limitada para o real

desenvolvimento profissional do professor. Desta maneira, percebem-se as

dificuldades para se atrelar a teoria à prática e adequar-se a Prática de Ensino que

era somente um tema do programa de formação, e não um elemento do currículo

necessariamente.

A Prática de Ensino, portanto, passa a ser entendida por meio de um projeto

de resolução, Parecer n. 292/62, como estágio supervisionado: ―Parágrafo único do

33

artigo 1º: é também obrigatória, sob a forma de estágio supervisionado, a Prática de

Ensino das matérias que sejam objeto de habilitação profissional.‖ Sua proposta

estabelecia que os estágios deveriam ocorrer em escolas da comunidade. Nelas, os

futuros professores poderiam, como nos ―internatos do curso de medicina‖, aplicar

os conhecimentos adquiridos, dentro de suas possibilidades e limitações de uma

escola real, e vivenciar o ato docente em diversos aspectos.

Este estágio seria supervisionado por professores especialmente designados

para orientação e retomada da prática observada e, quando necessário, de maneira

pontual e assertiva propiciariam a troca e a discussão dos acertos e erros fazendo

deste momento, uma real aprendizagem e contínuo aperfeiçoamento.

Neste clima de expectativa de desenvolvimento, começa a esboçar-se a

expansão das Escolas, em especial as Primárias e a Normal e com isto a exigência

de profissionais mais especializados, o que provocou um aumento significativo no

Ensino Secundário propedêutico e profissionalizante. Tal fato repercutiu também no

Ensino Superior, nas Faculdades de Filosofia que teriam como prioridade intensificar

a formação dos professores para atender a demanda provocada pela expansão

educacional.

Apesar da LDB aprovada que priorizava a formação docente, a realidade

mostrava uma desarticulação nos objetivos estabelecidos e os praticados. Este fato

resultava em articulações que propiciavam os Exames de Suficiência, ou seja, um

recurso de que o Estado lançava mão para suprir carências da habilitação, em

virtude da inexistência de Escolas formadoras de profissionais da educação para o

exercício nos diferentes níveis de ensino. Tais atitudes ultrapassavam os limites de

concessão e intensificavam o despreparo da formação profissional, além de

contribuir para a crise da identidade do curso de Pedagogia. Com isto ocorre um

intenso aumento nos arranjos pedagógicos para se atender a demanda nacional que

pregava melhores formações num prazo estabelecido.

Os Artigos 52 e 59 deram ênfase aos Institutos de Educação, que poderiam

tomar para si a tarefa de formar professores para a Escola Normal, e assumir as

34

funções do Curso de Pedagogia. Legalmente, neste momento, nasciam as Escolas

Normais Superiores localizadas nos Institutos de Educação.

Diferente da Lei anterior, a Lei Orgânica do Ensino Normal (n. 8.530 de

2/1/1946), que normatizava os cursos de formação de professores e os tratava de

forma centralizadora, que fixava até os mínimos detalhes, a LDB n. 4.024/61 fixava

os objetivos, os princípios, as condições em que o ensino se devia dar. Esclarecia

que os conteúdos, a formulação do programa e os objetivos a serem alcançados

ficariam sob responsabilidade das instituições que se propusessem a oferecê-los.

Os cursos de formação não encontravam uma trilha adequada e precisavam

urgentemente de uma redefinição frente às propostas instauradas. Embora se

reconhecesse a necessidade de diversificar cursos formadores, que de modo geral

deveriam atender às especificidades de cada região (conteúdos da Base do Núcleo

Comum e autonomia nas escolhas de disciplinas que melhor atendessem sua

clientela, compondo estas a parte diversificada na formação), e demonstrar, assim,

intenções de descentralização.

Não são poucos os fatores concorrentes para o empobrecimento funcional e

institucional das Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras. Brzezinski (1996, p.51)

elenca alguns deles:

O divórcio entre as finalidades proclamadas para os cursos e as alcançadas; o divórcio entre quantidade e qualidade de conteúdos; o divórcio entre o objetivo de se desenvolver a cultura desinteressada e o de promover a formação profissionalizante: a distância entre o programado e o executado em relação aos recursos financeiros e, mais, o não cumprimento das promessas do poder público em relação à qualificação de professores, à instalação de bibliotecas e laboratórios e à destinação de vagas para estudantes nas faculdades públicas.

Outro fator marcante na Lei foi a luta pelo espaço da Escola Pública e a

Escola Laica. O ensino na República, dividido entre Sistema Público que era

formado pela Escola Primária e Profissional, destinada ä maioria da população, e

Sistema Particular, formado por Escola Secundária e Superior, destinada aos filhos

das classes abastadas, agora seria oferecido para todos sem distinção de classes.

Apesar de a LDB n. 4.024/61 ter estabelecido a equivalência entre os cursos

profissionalizantes e propedêuticos, o divórcio, no que tange à educação, entre elite

35

e grupos populares já estava presente desde a origem do Brasil Colônia. A

educação sempre foi associada à posição social e favorecia apenas alguns, que a

ela mantiveram acesso. Aos alunos das classes sociais mais ricas apenas

interessava uma carreira brilhante, ficando para os menos abastados as profissões

enquadradas como menos nobres (braçais).

Wanderley (1998, p.33, apud SANTOS, 2006, p.144) aborda esta separação

como:

[...] as exigências de novas qualificações e habilidades [...] o processo educativo usado como meio dos setores dominantes para a sua dominação política e controle social, entre outros fatores, desenvolveram as características fundamentais da educação nas sociedades modernas.

Para Romanelli (1978, p.114, apud SANTOS, 2006, p.144),

[...] Consistia, sobretudo, no risco de extensão de educação escolarizada a todas as camadas, com evidente ameaça para os privilégios até então assegurados às elites. Insurgindo-se contra as reivindicações do movimento renovador, a Igreja Católica tomou o partido da velha ordem e, com isso, da educação tradicional.

Para Teixeira (1992a, p.351-352):

Todos sabemos com que resistência o Estado, no Brasil, vem cumprindo a obrigação constitucional de ministrar a educação. Em toda a monarquia, podemos dizer que não passamos da ação acidental de criar e manter alguns institutos de educação, com o caráter que se poderia chamar de ―exemplar‖[...] Com a integração do povo brasileiro e o desaparecimento progressivo da chamada elite, o sistema da escola secundária e superior a ela destinados vem-se fazendo, cada vez mais, um sistema de massa, um sistema popular, tão do povo quanto o especialmente organizado para ele.[...] A nossa sociedade substituiu a aristocracia de títulos hierárquicos pela de títulos de ilustração, pela aristocracia do ―doutor‖.

Tal decisão ratificaria o desinteresse do poder público pela educação e

fortaleceria as iniciativas particulares, que expandem a educação para os já

educados, e dariam desta forma aos órgãos públicos, certo comodismo frente as

responsabilidades educacionais. Muitas vezes, ao ser confrontado, justificava seu

laissez-faire (ficar ä vontade) na morosidade das leis, pois enquanto não houvesse

sua homologação, nada poderia ser feito, fato que justifica a nossa burocracia

educacional.

Apesar de esse período ter sido marcado pela convivência de dois

movimentos surgidos nas décadas de 1920 (―o entusiasmo pela educação‖) e 1930

36

(―o otimismo pedagógico‖), isso não foi constituído nos cursos de formação e nem

necessariamente observados (NAGLE, 1977. In: TANURI, 2000).

O ―entusiasmo pela educação‖ se evidenciava, principalmente, na intenção

política do Ministro da Educação Clemente Mariani que, em sua Exposição de

Motivos em 28/10/1948, apresentava o primeiro anteprojeto de Lei de Diretrizes e

Bases da Educação Nacional, enviado ao presidente da República, e declarava uma

necessidade que de fato não ocorreu:

[...] projetar uma educação das massas em largas proporções, arquitetando um sistema por intermédio do qual fosse possível, através da escola primária, fazer ascender os indivíduos verdadeiramente capazes, embora desprovidos de recursos, à esfera dos que pela educação superior, constituem as classes dirigentes do país (MARIANI, 1952, p.328, apud BRZEZINSKI, 1996, p.48).

Já o ―otimismo pedagógico‖ estava diretamente vinculado ao fato da

educação ser entendida como um elemento facilitador fundamental dos processos

de melhores ganhos econômicos e ter assim, como decorrência, a ênfase na

formação de professores como estratégia para a realização dessas reformas no

âmbito da escola e da educação básica.

O Curso de Pedagogia, que desde sua instauração apresentou diversos

problemas, não poderia estar fora da pauta de discussão.

Depois da homologação da LDB/1961, o Conselho Federal da Educação, de acordo com suas atribuições, buscava colocar em prática a política de formação de professores acenada pela fixação de um currículo mínimo para os cursos superiores. Esse currículo e outros preceitos legais contidos nos artigos de 1952 a 1989 deveriam ser fixados pelo Conselho Federal de Educação (CFE). É bom salientar que na época, o CFE estava investido de novas atribuições que superavam, em importância, algumas atribuições do próprio Ministério da Educação. Invocando suas funções, o CFE regulamentou os currículos mínimos dos cursos universitários, entre esses, os cursos pedagógicos das Faculdades de Filosofia, Ciências e Letras (BRASIL, 1961, Art. 59, apud BRZEZINSKI, 1996, p.54).

É fato que nenhuma Lei visa eliminar as controvérsias educacionais. As

diferenças e diversidades contribuem para um processo reflexivo crítico que tem em

vista sempre a melhoria de nossa sociedade. Porém, é sabido, também, que toda lei

traz em suas propostas, assuntos que não devem ser esgotados nela mesma, pois a

educação é um ato que envolve diversas esferas sociais e deverá contribuir como

37

um meio de concretização de proposições que respeitem os direitos dos cidadãos e

sua educação formal.

38

CAPÍTULO 2: A PROPOSTA DE FORMAÇÃO

No início dos anos 1960, desenvolveram-se intensas discussões no ambiente

universitário, com a participação de estudantes e professores, além dos dirigentes

da universidade, sobre os rumos da educação brasileira e, em especial, a respeito

da Reforma Universitária.

O campo educacional continuou se movendo. A década de 1960 foi uma época de intensa experimentação educativa. Além dos colégios de aplicação que se consolidaram nesse período (Warde: in Garcia, 1980, p.101-131), surgiram os ginásios vocacionais (Ribeiro: in Garcia, 1980, p.132-149), deu-se grande impulso à renovação do ensino de matemática (Montejunas. Em Garcia, 1980, p.150-163) e de ciências (Krasilchik. Em Garcia, 1980, p.164-180), colocando em ebulição o espaço acadêmico da pedagogia. Essa década, contudo, assinala também o esgotamento do modelo renovador, evidenciado pelo encerramento, no final dos anos 60, das experiências mencionadas e pelo fechamento do Centro Brasileiro de Pesquisas Educacionais e dos Centros Regionais a ele ligados (SAVIANI, 2004, p.7).

O dinamismo da época que devorava energias físicas e intelectuais, numa

revolução incansável, exigia cada vez mais improvisação e soluções apressadas,

em sua grande maioria, isentas de críticas, pois, se algo desse errado, era tão

rapidamente absorvido por novas propostas que não valia a pena questionar-se o

por que.

Os recursos da moderna ciência abriram tão amplas perspectivas ao crescimento material do Brasil que instalamos um clima de mobilização geral de todos os esforços no afã do rápido alcance dos bens de riqueza. Exatamente quanto mais próximos nos encontramos desses fartos tesouros, é que se generaliza a desconfiança de que não estamos preparados para a sua útil fruição. Por isso mesmo, vizinhamos a época das frustrações, dos desencantos e dos desenganos (TEIXEIRA, 1992, p.14).

Juntamente foi gestada pelos órgãos oficiais uma nova regulamentação

educacional para incorporá-la. Estas discussões se apoiavam nas definições

político-econômicas do modelo da economia brasileira da década de 1960, que

neste momento se apresentava em transição do delicado processo democrático para

outro governo autoritário imposto pelo Golpe Militar de 1964.

Este período (1960-1964) foi marcado pela dinâmica preparação de técnicos,

inclusive os da educação. Tal formação objetivava atender ao apelo do modelo

39

desenvolvimentista, que necessitava da preparação de técnicos em larga escala

para seu modelo econômico.

Foi a etapa do crescimento econômico brasileiro, dedicada aos investimentos

em educação e alicerçados no ideário tecnicista, que tinha como aporte teórico as

teorias do capital humano e da modernização. O modo de produção que o regime

capitalista instaurava, exigia maior qualificação dos profissionais, que tinha como

intenção principal muito mais a produção do lucro do que da satisfação das

necessidades humanas (TEIXEIRA, 2001).

A escola passou a formar profissionais treinados e instrumentalizados,

mediante um saber fragmentado que tinha como objetivo atender cada vez mais a

produtividade e recusar qualquer possibilidade do pensar, criticar ou criar atitudes

que valorizavam apenas o processo de mecanização e reprodução e transformavam

neste contexto a educação em treinamento.

Saviani (2007) afirma que para o governo, o ideal seria manter a garantia da

continuidade na ordem sócio-econômica, então as diretrizes gerais da educação em

vigor não precisariam ser alteradas; bastava ajustá-las à organização do ensino ao

novo quadro político para que fosse possível dinamizar esse processo de forma

contínua.

Assim, emergiu o projeto de Reforma das Universidades Brasileiras que

deveriam deixar de ser elitista para se tornar o centro de formação de profissionais

necessários ao desenvolvimento capitalista. Dados da Documenta n. 3, (1962a,

p.147) afirmam que:

A reforma universitária caminha, pelo Brasil afora, excitando os espíritos em prol de grandes e efetivas reivindicações, que ajustem o ensino aos processos mais avançados da pedagogia e da ciência, e, por outro lado, que conduzam ao reajustamento às necessidades do meio, quer propiciando-lhes técnicos, quer mestres, profissionais liberais e cientistas puros, essenciais todos ao desenvolvimento nacional.

Em 1962, o professor Valnir Chagas, relator do Parecer n. 251/62, aprovado e

homologado pelo então Ministro da Educação Darcy Ribeiro, preocupado com o

caráter de provisoriedade que o curso havia sido constituído, decide fixar um

40

currículo mínimo de formação, que visava manter uma unidade básica de conteúdos

aplicáveis como critério para transferência de alunos em todo o território nacional.

Estabeleceu também a duração do curso de Pedagogia para quatro anos. Essas

decisões foram incorporadas à Resolução CFE/62 aprovadas sob vigência da antiga

Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional n. 4.024/61 (BRASIL, CFE,

DOCUMENTA n. 11, 1963, p.59-66).

Chagas mencionou nesta Resolução, sobre a fragilidade do Curso de

Pedagogia ao se referir à controvérsia existente a respeito da manutenção ou

extinção do curso, que decorria da acusação de que o mesmo não apresentava um

conteúdo próprio de formação de tal forma que o professor primário seria formado

em nível superior e os técnicos em educação realizariam estudos posteriores ao de

graduação. Conforme afirma Silva (2006),

Para Chagas, antes de 1970, nas regiões mais desenvolvidas, esse curso teria que ser redefinido e nele provavelmente se apoiariam os primeiros ensaios de formação superior do professor primário, enquanto a formação do ―pedagogista‖ se deslocaria para a pós-graduação, num esquema aberto aos bacharéis e licenciados de quaisquer procedências que se voltassem para o campo de educação (p.15-16).

A fixação de um currículo mínimo para o curso de Pedagogia tinha como

intenção facilitar o entendimento já existente entre o Brasil e os países estrangeiros

(França, Inglaterra, Estados Unidos e União Soviética) sobre o que deveria constituir

o núcleo de conhecimentos básicos para um profissional de Educação preparado em

nível superior. Entrou em vigência em 1963, pelo Parecer n. 251/62 (BRASIL, CFE,

DOCUMENTA n.11, 1963, p.59-65).

Vale ressaltar o entendimento da expressão ―currículo mínimo‖ que, para o

Conselheiro Newton Sucupira, era o conjunto das matérias que formavam o

conteúdo do curso e colaboraria para uma adequada formação profissional.

Entretanto, o Conselho Federal de Educação foi imensamente questionado sobre a

sua interpretação sobre o ―currículo mínimo‖, fato que elucida assim, a subjetividade

no entendimento das Leis tão presentes nos âmbitos educacionais.

A grande maioria das faculdades da época de 1962 (cerca de 60%) se referia

a sete matérias como fundamentais para a base de qualquer modalidade de

41

formação pedagógica: 1) Psicologia da Educação: esta deveria abranger os

capítulos de Psicologia Evolutiva (infância e Adolescência), a Psicologia da

Aprendizagem (motivação) e a Psicologia diferencial; 2) Sociologia da Educação:

compreendia além da parte geral, considerada fundamental para o aluno ter uma

visão do campo em que se inseriam os estudos pedagógicos, a parte da introdução

às ciências sociais; 3) História da Educação: análise coerente com os princípios

históricos que explicavam a Educação moderna e a história da Educação brasileira.

4) Princípios e Métodos da Educação/ Filosofia da Educação: apesar de ser

considerada um ―denominador-comum‖ de tudo o que se ensinava num curso de

Pedagogia, a proposta era particularizar e sistematizar as informações na Filosofia

da Educação; 5) Administração escolar: propunha-se estudar a escola em suas

múltiplas conexões com a sociedade; 6) As matérias de caracterização: Biologia,

História da Filosofia, Estatística, Métodos e Técnicas de Pesquisa Pedagógica,

Cultura Brasileira, Educação Comparada, Higiene Escolar, Currículo e Programas,

Técnicas Audiovisuais de Educação, Teoria e Prática da Escola Média e Introdução

à Orientação Educacional, sendo que destas, duas deveriam ser escolhidas para

completar as sete necessárias (BRASIL, CFE, DOCUMENTA n.11, 1963, p.61-64).

Para a Licenciatura, o aluno deveria completar seu currículo com as

disciplinas de Didática e Prática de Ensino, entendidas pelo relator Valnir Chagas

como um complemento de formação no qual a Prática de Ensino seria ministrada em

forma de estágio supervisionado. Este se realizaria nas escolas da comunidade e

proporcionaria aos estudantes a aplicação dos conhecimentos “dentro das limitações

e possibilidades de uma escola real‖ (CHAGAS, p.34, 1962, apud BRZEZINSKI,

p.57, 1996).

Para uns, o currículo mínimo será um currículo capaz de assegurar a formação adequada, podendo bastar-se para efeito de diplomação. Para outros, será um currículo básico, admitindo a mais variada complementação, segundo a proposição de cada estabelecimento de ensino ou instituto universitário. Para terceiros, será um núcleo tomado num destes dois sentidos: ou de ciências fundamentais quase propedêuticas, ou de conhecimentos preliminares, quase introdução, sob o ângulo profissional e prático acrescidos de quantas disciplinas a escola queira acrescentar (BRASIL, CFE, DOCUMENTA, n. 3, 1962a, p.148).

Conforme Vasconcellos na DOCUMENTA n. 3 (1962a, p.224-225), com esta

organização, a LDB trouxe a quebra na uniformidade e na centralização

42

organizacional. Esta ruptura diretamente imbuída de riscos e responsabilidades,

apesar de se apresentar insegura inicialmente, poderia contribuir com bons frutos

para o quadro educacional brasileiro.

As Instituições de Ensino precisariam assumir o risco e se emaranhar na

busca de maior qualidade, não apenas nos métodos, estrutura física e seriedade do

trabalho, mas principalmente na riqueza e boa dosagem do currículo oferecido.

Vasconcellos (Ibidem) acreditava que ―tanto as instituições como os indivíduos,

deveriam passar pelo tirocínio de liberdade‖, para poder alcançar o seu

amadurecimento, assumir o perigo da transição e pagar o preço por acreditar

sempre no resultado final.

Quanto à quebra da centralização educacional, defendia que a educação,

desta vez, passaria de responsabilidade exclusiva e quase tirana por parte da União,

para os Estados, e quem sabe sucessivamente para os Municípios. Tal ato

colaboraria para a instauração de uma autonomia educacional progressiva, longe

esta de contribuir para a unificação nacional, visto que o Conselho Federal

preservava esta unidade, ao instituir o currículo mínimo de formação e respeitar

assim a variedade do imenso Território Nacional.

Esta autonomia proporcionará aos alunos e aos pais uma visão clara da maturidade da escola; nada manifesta melhor a índole de uma instituição, como de uma pessoa, do que o uso de autoridade; escolas como indivíduos não se podem formar ou afirmar, ser dirigidos e colocados aprioristicamente em bitolas rígidas (BRASIL, CFE, DOCUMENTA n. 3, 1962a, p.225).

Quanto à caracterização do profissional a ser formado pelo curso, o Parecer o

descreve de forma superficial, apenas relata que o curso destinava-se à formação

do ―Técnico em Educação‖ com formação de Bacharel, e do professor de disciplinas

pedagógicas do Curso Normal com a formação da Licenciatura. Porém estas

(Bacharelado e Licenciatura) diferentes das duas últimas décadas deveriam ser

cursadas concomitantemente com duração de quatro anos, rompendo assim com o

esquema 3+1 que propunha a ruptura entre conteúdo e método na estrutura

curricular.

43

Não se observa também na redação do Decreto, nenhuma referência ao

campo de trabalho do profissional que nomeia como ―Técnico de Educação‖ ou

―Especialista de Educação‖.

Se o faz, apenas de forma muito superficial, refere-se a ele com as expressões ―administradores e demais especialistas da educação‖, profissionais destinados às funções não-docentes do setor educacional (BRASIL, CFE, DOCUMENTA, n. 11, p.60-61, apud SILVA, 2006, p.17).

Apesar da Lei de Diretrizes e Bases se confirmar, conforme relatado por Kelly

na Documenta n. 24 (1964, p.5-6), ―como uma Lei de caminhos abertos, de estradas

plurais, exatamente num setor onde as controvérsias e as experiências se

justificam‖, ainda era clara a falta de explicitação da identidade profissional na

formação proposta por ela. A LDB abriu novos caminhos e fórmulas para a

educação que constitui um processo sempre em mudança e consecutivamente de

ajustes sucessivos, mas havia muitos pontos a serem esclarecidos no que concerne

ao papel da profissão.

Um único sinal do Técnico em Educação pode ser percebido ao analisar o

currículo proposto na formação dos bacharéis nas disciplinas de Administração

Escolar, Estatística e Métodos e Técnicas de Pesquisa, ―como aqueles capazes de

enriquecer poderosamente os pressupostos instrumentais da formação profissional,

máxime no bacharelado‖ (Silva, 2006, p.17). Nas demais disciplinas se observam

redundâncias, em sua maioria oferecida sem um objetivo específico de formação,

aliás, como haver um objetivo específico de formação, se não se sabia ao certo

quem se pretendia formar?

A maioria das críticas feitas à Faculdade de Filosofia foi absorvida pela

Reforma Universitária (1968), que propiciou o desdobramento da Faculdade de

Filosofia em seções, setores e departamentos, os quais passaram a pertencer a

Institutos correspondentes às áreas básicas de conhecimento. Entre esses

departamentos incluía-se o de Educação, que, no modelo de universidade proposto,

não encontrava correlação entre as áreas básicas do conhecimento, dada a sua

multifuncionalidade, e manifestava assim, mais uma vez, a indefinição da identidade

do Curso de Pedagogia.

44

O descontentamento com a não regulamentação da profissão do licenciado

egresso dos cursos de Pedagogia, a dificuldade de sua introdução no mercado de

trabalho, o currículo inadequado para formação, foram alguns dos fatores que

desencadearam o movimento em prol da reformulação dos cursos de Pedagogia.

Silva (2006, p.24), afirma que esse movimento começou em 1967 com os

alunos do curso de Pedagogia da região de Rio Claro, seguido pelos estudantes de

São Paulo, que dentre as exigências propunham providências quanto à

regulamentação do mercado de trabalho do pedagogo. Também requeriam a

abertura de concursos públicos para absorção dos formados, a retomada do espaço

destinado aos pedagogos que até então estava sendo ocupado por diversos

profissionais de distintas áreas e a responsabilidade em formar professores

primários em nível médio.

A instigante luta em defesa dos interesses opostos das duas classes

antagônicas ocorridas em meados de 1964 e, ampliadas por segmentos da

sociedade que se identificavam com as reivindicações, profetizava um momento

decisivo de reorganização da sociedade política e civil. As Forças Armadas, como

corporação, ocuparam o Estado mediante o Golpe Militar de 1964. Implantou-se

assim, um regime autoritário de governo em que a ideologia tecnocrática passou a

orientar a política educacional influenciada implicitamente pelos interesses dos

militares.

A educação foi declarada instrumento de aceleração do desenvolvimento

econômico e progresso social, ancorada nos princípios de racionalidade, eficiência e

produtividade, que eram princípios diretamente ligados ao processo econômico, e

que agora passavam a nortear a educação (KULLOK, 2000).

Esses mecanismos de técnica e reprodução na educação eram utilizados

para controle da liberdade de pensamento e criatividade, subordinava o sistema

educacional aos mandatórios de um modelo de desenvolvimento educativo

assentado estritamente num protótipo econômico.

As dificuldades enfrentadas pelo pedagogo para se constituir enquanto

profissional causa perplexidade. Comprova-se a situação ao analisar algumas

45

Portarias homologadas que dão amparos legais ao habilitá-los a exercerem funções

às quais não foram formados.

Em 1965, a Portaria MEC, n. 478/54 (SILVA, 1999), lê-se que, além do direito

ao registro nas chamadas cadeiras de educação, outorga ao pedagogo o direito em

relação a outras disciplinas do Ensino Médio: Filosofia, História Geral e do Brasil - no

ciclo em que fosse ministrado o ensino da disciplina ou nos dois ciclos - e ainda em

Matemática, apenas no primeiro ciclo.

Se não bastasse, de 1966 a 1968, nos termos da Portaria MEC, n. 341/65

(SILVA, 2006) esse direito se estendeu às disciplinas de Psicologia, Sociologia (2º

ciclo) ou Estudos Sociais (1º e 2º ciclos), sob a condição, no caso das duas

primeiras, de terem sido cursadas por 160 horas/aula ou por dois anos e, no caso da

última, de terem sido cursadas duas disciplinas do currículo de Estudos Sociais pelo

mínimo de 160 horas/aula. Em 1969, é retirado dos licenciados o direito de lecionar

as disciplinas de Filosofia, História e Matemática. ―Se o campo de trabalho do

pedagogo demandava tais providências no contexto do estado de São Paulo, não é

difícil imaginar a extensão de sua indefinição nas demais regiões‖ (SILVA, 2006,

p.22).

Diante de tantas transformações políticas e sociais, que exigiam cada vez

mais técnicos como profissionais, a idéia de se reestruturar não só o rol de

disciplinas do Curso de Pedagogia, mas sua estrutura curricular tomou força.

Alicerçou-se ao buscar criar opções para que num determinado momento do curso,

este profissional pudesse fazer opções curriculares em função das tarefas que

pretendesse desempenhar dentre as definidas para o pedagogo.

A educação, nesse contexto, transformou-se em ―treinamento‖. Nela foram projetadas as ambigüidades e contradições próprias da ideologia nacionalista e da ideologia transnacional. Assim, se um por um lado, o processo educacional foi propulsor do desenvolvimento nacional com a ―democratização‖ das oportunidades educacionais e com a melhor qualificação do homem comum, por outro, ele foi instrumento indispensável ao processo de especialização exigido pelo capital transnacional. Nesse cenário, emergiu o projeto de reforma das universidades brasileiras que deveriam deixar de ser elitistas para tornar-se o centro de formação de profissionais necessários ao desenvolvimento (BRZEZINSKI, 1996, p.59).

46

A Reforma Universitária, apesar de anunciada desde 1964, aconteceu apenas

em 1968, quando o movimento estudantil alcançou sua ebulição e ocorreu a

aprovação da Lei Federal n. 5.540, de 28 de novembro de 1968 - Lei da Reforma

Universitária (BRASIL, 1968). Foi implantada por meio do Decreto-Lei, n. 464, de 11

de fevereiro de 1969, no qual prevaleciam os princípios de racionalidade, eficiência e

produtividade no trato do Ensino Superior (SILVA, 2006).

Brzezinski (1996), afirma que o projeto desta reforma buscou responder a

duas exigências conflitantes: a primeira interessava aos jovens estudantes e

professores que reivindicavam a eliminação das cátedras, a autonomia universitária

e mais verbas e vagas para o desenvolvimento da pesquisa; a segunda interessava

ao grupo ligado ao regime instalado com o Golpe Militar de 1964 que buscava

vincular de forma mais consistente o Ensino Superior aos mecanismos de mercado

e ao projeto político de modernização em consonância com as solicitações do

capitalismo internacional.

Como não podia ser diferente, esta Lei provocou mudanças nos cursos de

formação de professores, fixou normas de organização e funcionamento e

considerou como obrigatório a formação superior de profissionais que trabalhassem

na formação de professores e nos planejamentos, supervisão, administração,

inspeção e orientação das escolas, e em conseqüência na Faculdade de Educação,

à qual auferia a função de formar técnicos denominados Especialistas em Educação.

Sua concepção, definição de princípios, bem como seus conteúdos foram

amplamente discutidos nas comissões do Conselho Federal de Educação.

Silva (2006, p.42), assegura que ―a tradição liberal de nossa Universidade fica

interrompida e nasce o que alguns críticos chamam de Universidade Tecnocrática,

ainda que miscigenada com nuanças do pensamento liberal‖. É sabido que os

Cursos Universitários demonstram subordinação às exigências da sociedade.

O regime militar instaurado em 1964 acentuou a relação entre os cursos e as

profissões e passou a concentrar a pesquisa e o ensino numa mesma área, tanto na

formação de profissionais para os diferentes setores, quanto para as necessidades

de pesquisa para o desenvolvimento nacional.

47

Tal reforma atingiu diretamente a Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras,

mas o eixo central da reestruturação foi, sem dúvida, a criação dos Institutos de

―Conteúdos Específicos‖ e da Faculdade de Educação.

As justificativas para a criação das Faculdades da Educação eram debatidas

no Conselho Federal de Educação que apontavam entre elas:

Os avanços do estudo científico da educação e das técnicas pedagógicas;

O reconhecimento da importância vital da educação nas sociedades modernas e da amplitude e complexidade de seu campo profissional;

O crescimento desmesurado dos cursos na Faculdade de Filosofia tornando inviável a localização de tantas modalidades de curso numa única unidade acadêmica.

As funções da Faculdade de Educação foram assim definidas:

Formar professores e especialistas em educação;

Desenvolver pesquisas capazes de aprimorar uma educação genuinamentenacional;

Promover a integração nas licenciaturas entre os estudantes de diversas áreas do saber;

Disseminar a concepção de educação a qual deve iluminar a universidade;

Promover a atualização de professores e especialistas atuantes nas escolas e nos sistemas de ensino, mediante cursos de extensão, graduação e pós-graduação.

A estrutura básica da Faculdade de Educação deveria abranger três áreas:

Graduação: ofereceria cursos de formação de professores primários, prevista para os anos 70, de professores da Escola Normal, de Pedagogos-especialistas e cursos de formação pedagógica;

Pós-graduação: momento da pesquisa e magistério do Ensino Superior;

Capacitação supletiva (expressão da época), equivalente à Educação

Continuada, atualmente (KULLOCK, 2000).

A dinâmica da estrutura da Faculdade de Educação foi prescrita pelo Parecer

n. 252/1969 e pela Resolução n. 2/1969, relatadas por Valnir Chagas. Parecer que,

diferente do anterior, buscava não deixar dúvidas quanto ao profissional, ou melhor,

aos profissionais que seriam formados pelo Curso de Pedagogia.

O Parecer vem descrito em quatro itens, o primeiro recupera a história da criação do curso de pedagogia, o segundo detém-se na regulamentação do curso em conseqüência a LDB/1961, o terceiro apresenta uma discussão entre os artigos da Lei 5.540/1968 que prescreve a formação de professores e especialistas, e o quarto discorre sobre a filosofia de uma nova regulamentação, bem como indica as disciplinas das partes comuns e diversificadas (BRZEZINSKI, 1996, p.71).

48

Chagas, neste Parecer, partiu do pressuposto de que a profissão que

corresponde ao setor da educação é uma só e que, por isso, sua formação deve

partir de uma base comum de estudos. Determinou que o curso de Pedagogia

passasse a ser composto por duas partes: uma comum, constituída por matérias

básicas (qualquer profissional na área), e uma diversificada, em função das

habilitações específicas.

Sua duração mínima seria de 2.200 horas distribuídas em no mínimo três

anos e no máximo sete anos letivos.

Fixou o mínimo de currículo e duração para o Curso de Graduação em

Pedagogia, visando à formação de professores para o Ensino Normal e de

especialistas para as atividades de orientação, administração, supervisão e inspeção

no âmbito de escolas e sistemas escolares.

Na modalidade de licenciatura curta podiam ser ministradas as habilitações

de Administração Escolar, Supervisão Escolar e Inspeção Escolar.

A parte comum da formação ficou constituída pelas disciplinas de Sociologia

Geral e Sociologia da Educação, Psicologia da Educação, História da Educação,

Filosofia da Educação e Didática.

O Parecer fixou, para cada habilitação, as matérias que compõem a parte

diversificada.

Para a habilitação em Ensino das disciplinas e atividades práticas dos Cursos Normais, as matérias são as seguintes: Estrutura e Funcionamento do Ensino de 1º grau, Metodologia do Ensino de 1º grau, Prática de Ensino na Escola de 1º grau (estágio);

Para a habilitação em Orientação educacional: Estrutura e Funcionamento do Ensino de 1º grau, Estrutura e Funcionamento do Ensino do 2º grau, Princípios e Métodos de Orientação Educacional, Orientação Vocacional e Medidas Educacionais;

Para a habilitação plena em Administração Escolar: Estrutura e Funcionamento do Ensino de 1º grau, Estrutura e Funcionamento do Ensino do 2º grau, Princípios e Métodos de Administração Escolar e Estatística Aplicada à Educação;

Para a habilitação plena em Supervisão escolar: Estrutura e Funcionamento do Ensino de 1º grau, Estrutura e Funcionamento do Ensino do 2º grau, Princípios e Métodos de Supervisão Escolar e Currículos e Programas;

Para a habilitação plena em Inspeção Escolar: Estrutura e Funcionamento de Ensino de 1º grau, Estrutura e Funcionamento de Ensino de 2º grau,

49

Princípios e Métodos de Inspeção Escolar e Legislação de Ensino (SILVA 2006, p.29-30).

Nas habilitações de curta duração em Administração Escolar, Supervisão

Escolar e Inspeção Escolar, foi omitida a matéria Estrutura e Funcionamento do

Ensino de 2º grau e os ―Princípios e Métodos‖ foram substituídos, respectivamente,

por Administração de Escola de 1º grau e Inspeção de Escola de 1º grau.

No que se refere à habilitação do magistério, o Parecer guarda ao pedagogo

a função de preparar também o professor para atuar nas séries iniciais de

escolarização.

Para o relator está assegurado que, tanto do ponto de vista legal como

técnico ―quem pode o mais pode o menos‖, e contraria desta forma, o licenciado em

pedagogia como ―subproduto de seu curso‖, o direito de ser professor primário, sob

o argumento de que quem prepara o professor primário tem condições de ser

também professor primário, desde que receba a formação em Metodologia e Prática

de Ensino da Escola de 1º grau (da 1ª a 4ª série).

No Parecer n. 632/1969, de acordo com Brzezinski (1996, p.71), explicita-se a

proposta de formação do educador e que a mesma deve se estender em três

planos: o das ciências básicas do homem, como fundamento geral de todo estudo

científico da educação; o das ciências humanas aplicadas ao conhecimento do

processo educativo e assim qualificadas de educacionais e o da elaboração dos

métodos e técnicas educacionais. Pode-se concluir então que o entendimento feito

neste momento sobre educação é que ela era um encontro de diversas disciplinas

que deveriam envolver as ciências básicas, aplicadas e as disciplinas técnicas e

profissionalizantes.

É significativo lembrar que o ideário de Valnir Chagas sustentou as bases da

política de formação e exercício profissional do magistério durante o governo militar.

Esse ideário baseado na pedagogia tecnicista, de origem funcionalista-positivista,

tinha como conceitos políticos centrais a capacitação e o treinamento dos

professores e especialistas para atender às exigências do setor produtivo do sistema

capitalista.

50

Tal sistema de formação mantinha a coerência tecnicista, observada nas

fábricas, ao fragmentar as tarefas dos profissionais da escola, estas consoantes à

própria divisão do trabalho nas sociedades que seguiam o regime capitalista.

A especialização não é aqui questionada, pois qualquer profissão possui seus especialistas, sobretudo no mundo moderno, no qual são exigidas, cada vez mais, minúcias operacionais. Especializar-se supõe munir-se teoricamente para articular uma prática concreta, isto é, preparar-se para desempenhar funções cujo exercício exige conhecimentos específicos mais sistemáticos, ou mais amplos em determinada área (CALAZANS, 1988, p.11, apud BRZEZINSKI, 1996, p.76 - 77).

O que se tornou questionável é que a modalidade de formação do

especialista, imposta ao Curso de Pedagogia pela lei, acarretou fatalmente uma

visão compartimentalizada do trabalho pedagógico e ocasionou, ao exercício

profissional, embates entre especialistas e professores, pois aqueles, mesmo sem

possuir a formação apropriada, desempenhavam funções que lhes conferiam um

status superior na hierarquia escolar.

Essa posição foi reforçada pela própria regulamentação da carreira do magistério que, por injunções corporativistas, concedeu aos especialistas da educação uma remuneração mais elevada do que a do professor, pela mesma jornada de trabalho (BRZEZINSKI, 1996, p.77).

Apesar dos legisladores estarem convictos de que com a Reforma

Universitária se definiria de uma vez por todas a identidade do Curso de Pedagogia,

em suma, o que se observou foi que a alteração engendrada pelo Parecer n.

252/1969 acarretou mudanças estruturais que aprofundaram ainda mais a

indefinição de sua identidade. Fragmentou a formação do pedagogo em habilitações

técnicas efetivas na graduação.

Assim passa-se a entender o pedagogo como aquele que é o estudioso da

teoria dos fundamentos ou da metodologia da educação, ou seja, o profissional sem

características docentes, e para os docentes começam a ser projetadas novas

funções, como a de professor para o Ensino Especial, para a Educação Infantil, e

para as primeiras séries do Ensino Fundamental.

Esta última (Educação Infantil e primeiras séries do Ensino Fundamental) surge como extensão da antiga formação de professores de nível médio, constando posteriormente ou como uma das habilitações do curso, ou como pré-requisito para as demais, ou como única habilitação do curso (SILVA, 2002, apud ARAÚJO, 2006, p.3).

51

A pretensão de uma política profissional de absorção do egresso pelo

mercado de trabalho, que nesta proposta tinha um lugar definido, pois seriam

aqueles que ocupariam funções específicas na escola e nos sistemas de educação,

também não aconteceu. O problema fundamental continuava relacionado às suas

funções:

Será a Pedagogia uma ciência com natureza, objeto e conteúdos específicos, ou um campo de aplicação dos princípios de outras ciências, transformando-se numa prática que se fundamenta em metodologias e teorias que pertencem ao domínio das ciências sociais denominadas ciências da educação? (BRZEZINSKI, 1996, p.72).

Em alguns momentos, o pedagogo foi definido como técnico ou especialista

da educação, em outros, também como professor, e em outros como estudioso da

educação, reforçando assim a indefinição quanto ao papel profissional a ser

desempenhado e, desta forma, concretizando a imagem de um profissional sem

identidade.

A fim de enfrentar a perpetuação de um modelo problemático frente à

formação dos professores, instaurou-se na sociedade, através de propostas

governamentais, um amplo movimento de (re) definição desta, devido ao modelo

apresentado como o ideal para a formação não atender às necessidades dos

docentes frente à realidade educacional. Há uma busca desenfreada por uma

identidade profissional, esta por sua vez, deveria estar diretamente atrelada aos

cursos de formação com o objetivo de fundamentar os saberes e validar as ações

dos professores no sistema educacional.

Historicamente a profissão docente caracterizava-se pelo estabelecimento de alguns traços em que predominava o conhecimento objetivo, o conhecimento das disciplinas, à imagem e semelhança de outras profissões. Saber, ou seja, possuir um certo conhecimento formal, era assumir a capacidade de ensiná-lo (IMBERNÓN, 2006, p.13).

Apesar de muitas vezes vincularmos formação a treinamento, historicamente

a visão dos educadores era contrária a este tecnicismo, não apenas por prever o

preparo de recursos humanos (professores e especialistas) em massa, mas também

porque os pacotes pedagógicos impostos pelo poder instituído colidiam com a

tradição brasileira de formação cultural humanística de professores. À medida que a

52

tendência tecnicista se infiltrava nos currículos, mais os conteúdos eram acanhados

e as técnicas hipertrofiadas.

Os educadores voltaram-se ainda contra o patrulhamento ideológico imposto às universidades públicas pelo controle do Estado, o que significou um profundo golpe na cultura do saber crítico. [...] Ao mesmo tempo em que o Estado passou a controlar as universidades públicas, buscou cooptar, por meio de verbas públicas e de políticas de incentivo às iniciativas privadas, os setores privatistas do ensino superior, reprodutores da ideologia defensora das estruturas capitalistas (BRZEZINSKI, 1996, p.78).

Com uma visão utilitarista, mais uma vez, o Governo articulou a legislação e

contribuiu com estas para a extraordinária expansão do Ensino Superior particular,

principalmente dos cursos que formavam professores, os quais exigiam pouca infra-

estrutura para o seu desenvolvimento. Se não fosse a falta de experiência e

consecutivamente o despreparo da maioria destas Instituições, frente a esses tipos

de curso, talvez o resultado fosse positivo.

Conforme o IBGE, em 1970 existia no Brasil 148 cursos de pedagogia, sendo

que 61% eram particulares, em 1975, dos 243 cursos, 72% eram particulares, em

1980 dos 264 existentes, 78% eram particulares, perfazendo um crescimento de

78% em apenas 10 anos, o que demonstra, mais uma vez, atitudes contraditórias

entre a qualidade tão necessária e a quantidade tão defendida (Ibidem, p.79).

Outra contradição percebida na proposta de formação de professores é

encontrada no Parecer n. 867/1972 (BRZEZINSKI, 1996), que define como

necessário para ingressar no Curso de Pedagogia, a comprovação do exercício do

magistério. Pode-se interpretar esta exigência como uma tentativa de unir ao Curso

de Pedagogia a docência como base comum de formação do especialista. Porém, a

prática demonstrou a inadequação de tal exigência, visto que se assim fosse,

apenas os professores especialistas atuantes na escola, ou os formados no

magistério pela Escola Normal, poderiam ingressar nos Cursos Universitários.

A fim de atender a essa exigência legal, as Universidades se ajustaram a

realidade e passaram a reconhecer como exercício do Magistério o próprio estágio

das disciplinas pedagógicas feito durante o curso, mais uma vez, um arranjo

comercial do que uma atitude educacional.

53

Em 11 de agosto de 1971, após dez anos da Primeira LDB ter sido

promulgada, a Segunda Lei de Diretrizes e Bases é homologada em completo

regime autoritário, na qual o cerne sobre educação pautava-se no desenvolvimento

humano enquanto profissional, fato que pode ser claramente percebido nas

diretrizes fixadas para o Ensino de 1º e 2º graus:

Art. 1º O ensino de 1º e 2º graus tem por objetivo geral proporcionar ao educando a formação necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de auto-realização, qualificação para o trabalho e preparo para o exercício consciente da cidadania (BRASIL, 1971, p.1).

O setor da educação, talvez mais do que em qualquer outro, passa a

conceber o homem como medida de todas as coisas. Por meio dessa máxima,

esperava-se que o magistério fosse a peça fundamental de todo o processo

educativo, assim, houve a preocupação em assegurar uma imagem compatível com

a importância e a dignidade da missão do professor.

Este projeto decorreu de estudos elaborados por um Grupo de Trabalho

instituído pelo então Presidente da República General Emílio Garrastazu Médici por

meio do Decreto n. 66.600, de 20 de maio de 1970, que tinha como objetivo estudar,

planejar e propor medidas para a atualização e expansão do Ensino Fundamental e

do Colegial (BRASIL, 1970).

Foi composto por nove membros: Padre José de Vasconcellos que fora o

presidente, Valnir Chagas, o relator, Aderbal Jurema, Clélia de Freitas Capanema,

Eurides Brito da Silva, Geraldo Bastos da Silva, Gildásio Amado, Magda Soares

Guimarães e Nise Pires, os demais formadores.

As principais reformas idealizadas pelo Grupo de Trabalho foram:

a) A integração vertical dos graus, níveis e séries de ensino, e a integração

horizontal dos ramos de ensino;

b) A Continuidade-terminalidade: ambição de superar o impasse entre o

Ensino geral e o Ensino profissionalizante;

c) A Racionalização-concentração: condição de se atingir a eficiência e

produtividade gerando um máximo de resultados, com um mínimo de custos;

54

d) A Flexibilidade: garantia a variedade de currículos, a diversidade de

metodologias, o aproveitamento de estudos anteriores;

e) A Gradualidade de implantação: processo gradual de implantação, de

acordo com as peculiaridades, possibilidades e legislação de cada Sistema de

Ensino, a partir de um Plano de Implantação (art.72);

f) A Valorização do magistério: visava os estudos de formação,

aperfeiçoamento e treinamento, a profissionalização do professor pelo Estatuto do

Magistério;

g) O Sentido próprio para o Ensino Supletivo: buscava definir as funções de

suplência, como substituição dos estudos regulares para aqueles que não o fizeram

ou não o concluíram na idade própria (BRASIL, 1970).

Vale ressaltar que o princípio de flexibilidade foi um instrumento importante

para o governo no contexto do regime militar, para ser mantido no âmbito

educacional independente do que caracterizava o poder exercido.

Baseados nele, as autoridades governamentais evitavam se sujeitar a

definições legais mais precisas que, consecutivamente, imporiam limite à sua ação.

Desta forma, sentiam-se livres para impor à Nação os programas educacionais que

melhor atendessem a seus interesses.

A reforma resultante desta Lei alterou a estrutura do ensino. Estas

modificações que visavam garantir a continuidade da ordem sócio-econômica

resultaram numa nova organização escolar. Em lugar do Curso Primário com

duração de quatro anos acompanhado de um Ensino Médio subdividido em Curso

Ginasial de quatro anos e um Curso Colegial de três anos, passou-se a existir um

Ensino de Primeiro Grau com duração de oito anos e um Ensino de Segundo Grau

com duração de três anos, este, unificado, de caráter profissionalizante, abrangendo

um amplo campo de habilitações profissionais.

A implantação da Lei n. 5.692/71 (BRASIL, 1971), apesar de ser entendida

por muitos como a Lei do magistério, transformou o Curso Normal numa habilitação

entre tantas do Ensino de 2º grau.

55

O magistério gradativamente deixou de ser a base comum na formação dos

profissionais da educação e em diversas Instituições do Ensino Superior. A

habilitação para o magistério deixou de constituir prioridade no curso de Pedagogia

e foi substituída pelas habilitações de especialistas, demonstrando mais uma vez a

fragilidade na constituição da identidade do professor, que acaba na maioria das

vezes sempre relegado ao segundo plano de formação.

Em seu Capítulo V, o título ―Dos professores e Especialistas‖, no qual discute

a questão da formação através de 12 artigos, que estabelecem como prioridade, a

formação do professor em níveis que se elevarão progressivamente, todos eles

ajustados às diferenças culturais do país e orientados para atender as necessidades

específicas de cada grau formador nos quesitos disciplinares, áreas de estudo e às

fases de desenvolvimento dos educandos.

Pretendia-se de forma gradativa criar uma política de valorização do

magistério e contribuir assim para a progressiva elevação de seu status social, o que

proporcionaria aos professores melhores condições para responder ao duplo desafio

sintetizado na Exposição de Motivos do Senhor Jarbas Passarinho, Ministro da

Educação e Cultura:

De um lado modernizar a educação em todos os seus aspectos - em seus fins, em seu conteúdo, em seus métodos, em sua inspiração geral, dela fazendo para os cidadãos um instrumento eficaz na busca da felicidade e, para a Nação, um real fator de trabalho, de paz, de progresso. De outra parte, proporcioná-la assim melhor a um número cada vez maior de brasileiros – e a todos num estágio básico que se amplia – como requisitos para a sua verdadeira inserção na comunidade social (BRASIL, CFE, DOCUMENTA n. 154, 1973a, p.45).

A LDB n. 5.692/71, em seu artigo 29, estabelecia que ―A formação de

professores e especialistas para o Ensino de 1º e 2º graus seria feita em níveis que

se elevassem progressivamente, ajustando-se às diferenças culturais de cada região

no País...‖. Seus princípios informativos eram os da excelência e progressividade e

visavam um dia poder exigir para todos os professores o nível superior como

formação ideal, intenção inclusive se não fosse pelas possibilidades, muito bem

aceita pelos envolvidos.

56

Estes princípios haviam sido declarados como basilares quando do VI

Seminário de Assuntos Universitários em 1971 e corroborados no relatório da

UNESCO (1972), “LEARNING TO BE”, que citava que ―...a função docente é sempre

a mesma, em sua essência, em sua nobreza e em sua vocação‖.

Estabeleceu também em seu artigo 30 a formação mínima para o exercício do

magistério:

a) No Ensino de 1º grau, da 1ª à 4ª séries, habilitação específica de 2º grau; b) No Ensino de 1º grau, da 1ª à 8ª séries, habilitação específica de grau

superior, ao nível de graduação, representada por licenciatura de 1º grau, obtida em curso de curta duração;

c) Em todo o Ensino de 1º e 2º graus, habilitação específica obtida em curso superior de graduação correspondente a licenciatura plena. § 1º Os professores a que se refere a letra ―a‖ poderão lecionar na 5ª e 6ª séries do Ensino de 1º grau se a sua habilitação houver sido obtida em quatro séries ou, quando em três, mediante estudos adicionais correspondentes a um ano letivo que incluirão, quando for o caso, formação pedagógica. § 2º Os professores a que se refere a letra ―b‖ poderão alcançar, no exercício do magistério, a 2ª série do Ensino de 2º grau mediante estudos adicionais correspondentes no mínimo a um ano letivo. § 3º Os estudos adicionais referidos aos parágrafos anteriores poderão ser objeto de aproveitamento em cursos ulteriores (BRASIL, 1971, p.7).

É perceptível que ao admitir a possibilidade de diferentes níveis e tipos para a

formação docente, a LDB n. 5.692/71, validou o aumento de matrículas nos cursos

de curta duração, sobretudo, nos Institutos de Ensino Superior que o ofereciam, o

que colaborou, desta forma, para a consagração de uma visão profissionalizante e

tecnicista que dava destaque a instrumentalidade e método ao invés de pensar

numa formação integral. Essas decisões trouxeram repercussões negativas quanto

à qualidade do trabalho pedagógico, estas, claramente percebidas até hoje nos

processos de avaliação de desempenho escolar e na desvalorização social dos

professores (SAVIANI, 2007).

Weber (2000, p.134) afirma que:

De todo modo, a visão profissionalizante da docência contida nessa legislação educacional, que conduziu à experiência pouco convincente de formação de professores obtida por licenciatura em cursos de curta duração [...], constituiu um obstáculo considerável para o avanço do debate acerca da dimensão profissional que deve estar presente na preparação de docentes, visão esta que começa a ganhar espaço na produção acadêmica e nas políticas educacionais desde o início dos anos 80.

57

O Art. 31 da mesma Lei (5.692/71) demonstrou mais ―arranjos‖ para a

formação dos professores. Estes atenderiam especificamente às Instituições

formadoras:

As licenciaturas de 1º grau e os estudos adicionais referidos no § 2º do artigo anterior (30) serão ministradas nas universidades e demais instituições que mantenham cursos de duração plena. Parágrafo único: As licenciaturas de 1º grau e os estudos adicionais, de preferência nas comunidades menores, poderão também ser ministradas em faculdades, centros, escolas, institutos e outros tipos de estabelecimentos criados ou adaptados para esse fim, com autorização e reconhecimento na forma da Lei (BRASIL, 1971, p.7).

Percebido que o requisito de excelência não poderia ser assegurado de

imediato, nem mesmo a médio prazo em certas unidades da Federação, pois

nestas, a grande maioria dos professores eram leigos (quase 70% do total), surgiu a

necessidade de algumas adequações relatadas nos artigos 77 e 80, como

programas de recuperação para os professores sem a formação básica prevista na

Lei.

Em seu artigo 39 determinou que ―Os Sistemas de Ensino deveriam fixar a

remuneração dos professores e especialistas de Ensino de 1º e 2º graus tendo em

vista a maior qualificação em cursos e estágios de formação...‖, representou a busca

pela equiparação remuneratória frente a um mesmo profissional, diferenciada

apenas por suas especificidades de formação.

Luta incansável de muitos, os professores defendiam a criação de um plano

de carreira, no qual o profissional pudesse galgar maiores degraus sem

necessariamente ter que mudar de cidade ou local de trabalho para isso.

Acreditavam que tais ações desencadeariam co-responsabilidades na qualificação

profissional, visto que seria o próprio professor seu mentor de formação.

A Lei desenvolveu esta idéia no artigo 36, quando citou que ―Em cada sistema

de ensino haveria um Estatuto que estruturasse a carreira do magistério de 1º e 2º

graus, com acessos graduais e sucessivos‖ (BRASIL, 1971, p.7-8).

Este corresponderia a um conjunto orgânico de normas que disciplinariam a

atividade docente com preceitos que dão ao cargo ou função docente e de técnico

educacional a estrutura de uma carreira, com classes escalonadas em diferentes

58

níveis, com possibilidades de acessos graduais e sucessivos. Desta forma, podia ser

reconhecido como um autêntico Estatuto do Magistério.

A existência de um Estatuto, assim concebido, representaria a urgência da

Reforma do Ensino de 1º e 2º graus, pois só a partir desta é que se poderiam aplicar

as propostas elucidadas na Lei. Tal aplicação tornar-se-ia um incentivo para que o

professor ou especialista da educação se transformasse, inclusive como

recomendado em inúmeras reuniões, seminários e encontros nacionais ou

internacionais, num verdadeiro profissional da educação, com funções, direitos e

deveres claramente definidos.

A declaração deste artigo reforçou a intenção de uma formação docente, na

qual o papel desempenhado pelos professores em nossa sociedade era

estabelecido como produto e produtor dos interesses das classes dominantes que

ditavam seus valores e costumes como referências para a educação.

Tal perspectiva de formação, muito mais interessada do que interessante,

levou à massificação e à propagação das ideologias dominantes que discorriam

sobre uma melhor qualificação dos trabalhadores para atender ao mercado de

trabalho, dentre eles os professores. Percebe-se então, que a formação do professor

tornou-se uma ação muito mais mercantilista do que pedagógica. A falta de

especificidade do curso compactua com tal situação e aflora-se nesse momento uma

concepção de que os Cursos de formação serviam para ―treinar professores‖.

Observa-se que a implantação desta Lei ocorreu num contexto político em

que, ao se tratar de matéria de educação, poder-se-ia entender que esta se

encontrava diretamente conectada aos anseios do grupo militar-tecnocrático, que

estava no poder, e excluíam por completo a opinião dos educadores, de modo

especial, enquanto contribuidores.

As decisões não competiam aos educadores; a estes caberiam, apenas,

executar de modo eficiente as medidas impostas pela esfera tecno-burocrática

comandada por técnicos advindos da área econômica.

59

Preocupado com o caminhar dos Cursos de Formação e suas conseqüências

na sociedade, Valnir Chagas, seis anos mais tarde, rompe com sua crença anterior

do Parecer, n. 632/69, em que afirmava ter estabelecido um objetivo para o Curso

de Pedagogia e uma definição para o profissional egresso do mesmo, e propõe nova

regulamentação aos Estudos Superiores de Educação, a partir da prescrição de

orientações básicas a serem seguidas na área de licenciatura por meio da

Indicação, n. 67/1975 (SILVA, 2006).

Desta vez, porém, encontrou séria resistência a suas propostas ―inovadoras‖,

entendida por muitos educadores como experimentais, que, cansados de tantas

imprecisões, passaram a assumir com vigor os estudos e debates sobre o rumo das

propostas de reformulação dos cursos de formação de professores. Demonstravam,

assim, um enfrentamento às arbitrariedades advindas do poder constituído e

institucionalizado no Conselho Federal de Educação que demonstrava

desconhecimento das práticas, das pesquisas e dos estudos desenvolvidos pelos

profissionais que buscavam formas de minimizar a descaracterização do profissional

formado por ele e a validação de sua identidade profissional.

Nesse contexto de resistência ao autoritarismo, em que a sociedade

procurava consolidar o modelo econômico proposto, os movimentos sociais, como o

dos professores, ficaram prontos para entrar em ação tão logo o cenário político

sinalizasse alguma abertura.

Em 1978, ocorre o I Seminário de Educação Brasileira na Universidade de

Campinas (UNICAMP), considerado um marco histórico no movimento destes

educadores que buscavam propostas alternativas para a reformulação do Curso de

Pedagogia. Estavam exaustos da desvalorização e descaracterização, enquanto

profissionais da educação e certos de que a educação ocupava lugar central no

conceito de cidadania.

O Seminário propunha a análise do currículo e conteúdo programático dos

cursos de Pedagogia, que buscava vincular a ele uma real identidade, que

subvertesse assim a tradicional ordem de ―cima para baixo‖ nas decisões sobre as

60

questões educacionais e desenvolvesse, nos envolvidos, um trabalho de

mobilização coletiva.

Movidos pela consciência coletiva, deflagraram a luta pela valorização do magistério, assim como por um profissionalismo que fora entorpecido pelo utilitarismo cego das políticas educacionais (BRZEZINSKI, 2005, p.12, apud AGUIAR, 2006, p.824).

Em 1980, o movimento dos educadores em torno dos profissionais da

Educação se materializou com a criação do ―Comitê Pró Participação na

Reformulação dos Cursos de Pedagogia e Licenciatura‖. Desde 1983, a Associação

Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (ANFOPE), ativa

atualmente, se transformou em Comissão Nacional pela Reformulação dos Cursos

de Formação de Educadores (CONARCFE) e colaborou para esta incansável busca

com a construção de uma concepção sócio-histórica do educador. A edificação

desta idéia acreditava numa formação profissional de caráter amplo, com pleno

domínio e compreensão de seu tempo, com a consciência crítica que lhe permitisse

interferir e transformar as condições da escola, da educação e da sociedade e se

contrapor a visão tecnicista e ―conteudista‖ que as atuais políticas de formação

propagavam.

Tal mobilização foi fundamental por proporcionar uma maior socialização das

experiências, que eram realizadas pelas diferentes Instituições de Ensino, explicitar

os desejos, e, principalmente, formatar um consenso de qual era o papel esperado

pelo curso discutido e, assim, tentar sinalizar ações que propusessem soluções ao

problema identitário e a desvalorização do curso de Pedagogia.

Emergiram duas idéias muito fortes desse movimento:

1- A docência como eixo sobre o qual se apóia a formação do educador; 2- A ―Base Comum Nacional‖ foi definida não como aquela que faz parte do currículo comum do curso, nem como a idéia de currículo mínimo, mas sim como um princípio que deveria orientar e inspirar a organização dos cursos de formação de professores em todo território nacional (ANFOPE, 1998, p.10).

Acreditava-se que, desta forma, o conteúdo pertinente ao curso não poderia

ser fixado por um intelectual ou um órgão do governo, mas, sim, originar-se das

análises, dos debates e das experiências, e possibilitar gradativamente um

61

consenso em torno dos elementos fundamentais para a formação do professor

consciente e crítico, capaz de contribuir na transformação da sociedade brasileira.

Era desejado como elementos fundamentais para este professor consciente e

crítico, a competência e compromisso com seu trabalho, a capacidade de

desenvolver uma visão de conjunto do processo educacional, de pensar, planejar e

executar seus próprios planos de aula, e tornar-se assim autor de seu processo de

ensino-aprendizagem.

A ANFOPE entendia como profissional da educação todos os profissionais

formados pela Escola Normal e pelos Cursos de Licenciaturas de nível universitário,

seja do Curso de Pedagogia ou em Cursos de licenciaturas específicas. Defendia a

diferenciação entre trabalhadores da educação e profissionais da educação, pois

apesar de acreditar que todos eram profissionais, os diferenciavam no quesito de

especialização, ou seja, os profissionais da educação tinham como preparação

obrigatória, além de sua formação geral como educador, uma preparação para o

trabalho pedagógico.

A ANFOPE elaborou uma proposta para a construção dos ―Centros de

Referência para a Formação do Profissional da Educação‖. Estes não seriam

destinados a substituir de imediato, e nem em sua totalidade, a estrutura da

formação proposta pela legislação vigente. Dada a complexidade da situação, estes

seriam entendidos como ―laboratórios‖ destinados a testar, aprimorar e divulgar

novas formas de preparar o profissional da educação antes de qualquer legislação.

Sua estrutura inicial contemplaria um programa básico de formação, configurado a

partir dos eixos curriculares, e extinguiria assim a fragmentação existente das

disciplinas. Estender-se-ia a todos os profissionais da educação nos primeiros dois

anos de forma igualitária, ou seja, todos seriam professores, independente de sua

especificação. Após estes dois anos iniciais, ocorreria a repartição em dois

programas específicos:

-Programa de formação de profissionais para Educação Infantil e séries iniciais

do 1º grau (1ª a 4ª série);

62

-Programa de formação de profissionais para áreas específicas de conteúdo do

1º Grau (5ª a 8ª série) e 2º Grau.

Aos três programas descritos (Básico; Educação Infantil à 4ª série; 5ª à 8ª

série; 2º grau) seguiria um quarto programa optativo, destinado a preparar

profissionais para o Sistema de Ensino, ou seja, para atuar em nível de escola ou de

secretaria. Este teria duração de um ano e como pré-requisito, a conclusão de um

dos dois programas iniciais. Não haveria habilitações específicas (Orientação,

Supervisão, Administração), mas uma preparação geral que visaria uma atuação

polivalente.

Todos os programas anteriores estariam articulados com um quinto programa

de apoio à formação continuada. Este encaminharia profissionais que já atuavam no

mercado de trabalho, para a formação de disciplinas específicas que contribuiriam

para sua melhor qualificação. Este programa seria estendido às Escolas secundárias

Normais e contribuiria para a melhor qualificação dos recém-egressos no mercado

de trabalho.

63

CAPÍTULO 3: LDBEN n. 9.394/96. NOVA PROPOSTA DE

FORMAÇÃO E SUA REPERCUSSÃO

A formação docente para atuar na educação escolar se revela primordial para

as diferentes entidades ligadas à educação. Este fato pode ser facilmente

constatado na histórica Conferência de Ministros da Educação e Planejamento

Econômico, realizada no México, em 1979 e na Conferência em Jomtien, em 1990,

na Tailândia, que tiveram como expectativa elevar o nível de satisfação das

necessidades básicas de aprendizagem, pilar do plano de ação Educação Para

Todos. Este fundamentou no Brasil o Plano Decenal e propôs que a qualidade da

educação e da Escola Básica passasse a fazer parte das pautas de discussões e da

preleção de amplos setores da sociedade que buscavam criar um consenso

principalmente no campo de formação de professores, os quais indiscutivelmente

concordavam que esta formação estava diretamente atrelada ao desenvolvimento

da qualidade da educação (MICHELS, 2006).

A década de 1980 trouxe novidades na área da formação. A eleição de

governadores com perfil democrático e compromissado com a educação escolar

propagou notáveis iniciativas ampliatórias no processo de formação. Dentre elas,

torna-se fundamental citar os CEFAMS, Centros de Formação e Aperfeiçoamento do

Magistério no nível de 2º grau da Secretaria de Estado da Educação de São Paulo

(SEE/SP), um espaço formador de professores, em nível médio, que reforçava a

necessidade de consolidar essa preparação não apenas no Ensino Médio, mas,

principalmente, no Ensino Superior. Os CEFAMS declaravam que sua formação não

substituiria de forma alguma a formação de professores em nível superior, apenas

colaboraria para a consolidação da história de formação de professores no Ensino

Médio, e que estes seriam mais bem preparados para o exercício da docência nos

anos iniciais do Fundamental e na Educação Infantil.

Apesar dessas ações pontuais, os agentes envolvidos com a educação

mobilizaram-se ativamente em face ao tratamento a ser dado à educação na

Constituição Federal. Essa mobilização resultou nos trabalhos discutidos, em

fevereiro de 1987, pelo Congresso Nacional Constituinte. A comunidade escolar

64

participou da Elaboração da IV Conferência Brasileira de Educação, realizada em

agosto de 1986, em Goiânia, a ―Carta de Goiânia‖, composta de propostas dos

educadores para o capítulo da Constituição referido à educação.

Concomitantemente, inicia-se, em 1987, o movimento em torno da elaboração das

novas Diretrizes e Bases da Educação Nacional.

Estas ações ganham destaque, principalmente, a partir da nova LDBEN, Lei

n. 9.394/96, terceira de nossa história educacional, também chamada de Lei Darcy

Ribeiro, homologada em 20 de dezembro de 1996, publicada no Diário Oficial da

União de 23 de dezembro de 1996 e sancionada pelo Presidente da República

Fernando Henrique Cardoso. A nova LDB apresenta como prioridade a formação

dos professores.

Para Cury (2003) a orientação neoliberal adotada pelo Governo Collor, e

neste momento, pelo Presidente Fernando Henrique Cardoso, se caracterizou por

meio de políticas voltadas à privatização. Com as privatizações de empresas

estatais conseguiu-se gerar para o Tesouro Nacional uma receita de US$ 78,61

bilhões, sendo 95% em moeda corrente, entretanto, a dívida pública do Brasil, que

era de US$ 60 bilhões em julho de 1994 saltou para US$ 245 bilhões em novembro

de 2002. Houve privatização de algumas rodovias federais, da maioria dos bancos

estaduais responsáveis por grande parte do déficit público e do sistema telefônico

brasileiro, o que permitiu o acesso facilitado dos brasileiros à tecnologia.

Igualmente foi adotada a terceirização de serviços e de empregos públicos

em áreas consideradas não-essenciais, e, certamente, a educação passou por

reformas com as mesmas intenções, o que ampliou muito o investimento privado em

Educação Superior (Faculdades e Pós-Graduação), especialmente pela criação de

linhas de crédito para Instituições de Ensino.

Houve um salto nos índices de brasileiros cursando nível superior e Ensino

Médio, no entanto, o governo FHC, que afirmava reconhecer a relevância da

educação, acreditava também que a mesma poderia crescer somente pelo

investimento maciço do capital privado, por este motivo, houve redução dos

investimentos do Estado na educação (Estado-Governo minimizado, segundo a

cartilha do neoliberalismo). A tabela a seguir demonstra o salto da distribuição

65

percentual do número de vagas nos processos seletivos, por categoria

administrativa, o que comprova que os investimentos no setor privado ampliaram

claramente o acesso às universidades, principalmente particulares.

Graduação Presencial. Distribuição Percentual do Número de Vagas nos

Processos Seletivos Por Categoria Administrativa. Brasil, 1993-2003.

Ano Total Pública % Privada %

1993 548.678 171.627 31,3 377.051 68,7 1994 574.135 177.453 30,9 396.682 69,1 1995 610.355 178.145 29,2 432.210 70,8 1996 634.236 183.513 28,9 450.723 71,1 1997 699.198 193.821 27,7 505.377 72,3 1998 803.919 214.241 26,6 589.678 73,4 1999 969.159 228.236 23,5 740.923 76,5 2000 1.216.287 245.632 20,2 970.655 79,8 2001 1.408.492 256.498 18,2 1.151.994 81,8 2002 1.773.087 295.354 16,7 1.477.733 83,3 2003 2.002.683 281.163 14,0 1.721.520 86,0

Fonte: MEC/INEP/DAES (2003)

Os anos 1990 foram marcados por transformações de maneira intensa na

organização escolar e trouxeram novas orientações, demandas e funções para os

seus integrantes ligados à maior autonomia e responsabilidade.

O governo que, ao ser eleito, se autodenominava respeitador dos interesses

coletivos da maioria da população, valorizava contraditoriamente a globalização

excludente como sinal de progresso e de modernidade. Este atual momento

convenciona diversas transformações da base material da sociedade, estas

identificadas como a nova Revolução Industrial.

A extensão da escolaridade sempre esteve associada à idéia de que a

escola seria um instrumento de redução das desigualdades sociais e de moldagem

da identidade nacional quanto à necessidade de incutir nas novas gerações

comportamentos exigidos para o desempenho das funções e novas ocupações com

os processos de industrialização e urbanização (CUNHA, 1975; ROMANELLI, 1985;

CARVALHO, 1986).

Entretanto essa preocupação é tão superficial que a própria exigência sobre

a formação dos docentes na última LDB, que sugere a intenção de melhoria na

qualidade do ensino, por meio do aumento da formação prévia dos profissionais que

nela trabalharão, induz, por meio do Art. 87, § 4º das Disposições Transitórias, que

66

os futuros educadores recorram a iniciativas de formação e certificação

questionáveis e apressadas.

Segundo tal interpretação, ao final da ―década da educação‖, todos os

docentes deverão ter formação em nível superior. Entende-se que o prescrito na Lei

é que, a partir daí, somente serão admitidos docentes com essa formação,

garantindo-se a permanência dos professores efetivos em seus postos, sem

necessidade de complementação de sua formação. Tal leitura equivocada aumentou

a demanda por cursos privados e por processos de formação em serviço, que em

nada refletiu o espírito de melhoria que a proposta buscava delinear (OLIVEIRA,

2002; ADRIÃO, 2002). Há necessidade de superar-se a ambigüidade presente na

LDB que, ao mesmo tempo em que advoga a autonomia pedagógica da escola,

estabelece a avaliação ou o controle de qualidade através de testes de capacidade

cognitiva.

Apresentavam como base científica a microeletrônica, cuja expressão

tecnológica se traduzia na automação dos processos produtivos. Neste momento,

ocorre a transferência das operações intelectuais para as máquinas. Para Saviani

(1997, p.232), ocorre ―a era das máquinas inteligentes‖ e desaparecem as

qualificações específicas que faz surgir a elevação da qualidade na formação de

caráter geral.

A educação, por ser um movimento que representa possibilidades de reflexão

frente às situações instauradas através do conhecimento, é utilizada neste momento

pelo Governo, para a formação da mão-de-obra necessária ao mercado de trabalho,

porém ocorre de maneira defasada frente às exigências tecnológicas, estas

extremamente complexas, fato que colabora para o aumento dos questionamentos

frente à desqualificação profissional.

Já na LDB, n. 5.692/71, com base na situação social encontrada em que se

transferiam para as máquinas as operações de caráter específico, fez com que os

cursos profissionalizantes passassem a ser dispensáveis e caíssem no descrédito o

preceito dado ao Ensino profissionalizante.

Não obstante a nitidez percebida nas conquistas da LDBEN n. 9.394/96,

como: a incumbência das escolas de elaborar sua proposta pedagógica e ainda

67

articular-se com a comunidade (art.12), a participação dos professores nesta

elaboração (art.13), a definição pelos Sistemas de Ensino das normas da gestão

democrática (art.14), o encargo dos Sistemas de Ensino em assegurar às Unidades

Escolares graus progressivos de autonomia pedagógica e administração e de gestão

financeira (art.15), a maior autonomia da escola para definir a organização em

séries, ciclos, períodos semestral, bem como formas de avaliação, classificação e

reclassificação de seus alunos mediante rendimento escolar (art. 24); torna-se

extremamente relevante apontar um relatório de 1995 da UNESCO que apresentava

os índices de investimentos educacionais dos países e denunciava que apenas

3,7% do PIB brasileiro haviam sido aplicados em educação, fato que deixou nosso

país em 80º lugar no mundo, atrás até da Etiópia (4,9%) e Ruanda (3,8%)

(BRZEZINSKI, 1997).

Embora represente diversos avanços, a LDB ainda apresentava a dualidade

legal entre o pedagogo como o especialista nas habilitações e o educador,

entendido como o docente. Discute a formação dos ―Profissionais da Educação‖, no

Título VI, composto por 7 artigos que elencam dispositivos programáticos para a

valorização destes profissionais, relatando fundamental importância ä formação

inicial de professores como preparação profissional na organização da Educação

Nacional, não só pelo momento do entrelace entre o nível básico e o superior, mas,

principalmente, pela necessária qualificação na escolarização e busca da identidade

deste profissional da educação.

O art. 61 da Lei n. 9.394/96, menciona os fundamentos relacionados à

formação dos profissionais da educação e dá ênfase à associação entre teorias e

práticas, a fim de que os professores possam vivenciar a real práxis educacional

para a consolidação do processo educativo com segurança e o aproveitamento da

formação e experiências anteriores em Instituições de Ensino e outras atividades,

que, para Gatti (1994, p.41-45), ―representa a importância na recuperação do

arsenal de experiências e conhecimentos que o professor, ao longo de sua prática,

vai acumulando‖.

Os dados assinalados por este artigo, que demonstram a preocupação da Lei

quanto à importância da parceria entre teoria e prática e o aproveitamento das

68

experiências anteriores do futuro profissional da educação, representam um avanço

no formato da qualificação profissional e consecutivamente uma melhor qualidade

de ensino. Importante citar que para que o professor possa construir junto com seus

futuros alunos experiências significativas dentro desses parâmetros, se torna

fundamental que ele, o professor, tenha sido realmente formado por situações

equivalentes de ensino, caso contrário, tal proposta não passará de mais uma

clausura programática em nossa LDB.

Outro ponto a ser questionado está no momento em que a LDB adota a

capacitação em serviço e o aproveitamento de experiências anteriores como

capacitadoras da formação profissional. Para Brzezinski (1997, p.148), esta

possibilidade poderia trazer interpretações enviesadas pelos interessados em

substituir a fundamental formação teórica pela simples prática em sala de aula, esta,

muitas vezes, baseadas na ―formação do senso comum‖.

O Ministério da Educação e Cultura (MEC) esboçou este arranjo de formação

para transformar como num ―toque de mágica‖, portadores de diploma do Ensino

Superior em professores para a Educação Básica, e deu como justificativa a falta

deste profissional no mercado de trabalho.

Elaborou-se uma minuta encaminhada ao CNE, em 11/12/1996, com a

proposição de criar Cursos emergenciais de formação de professores

regulamentados pela Portaria n. 432/71. A minuta propunha aos pretendentes cursar

cinco disciplinas: Didática, Currículos e Programas, Estrutura e Funcionamento,

Psicologia da Educação e Inserção Social da Escola, denomina-se, assim, a parte

teórica do curso com a duração de 240 horas, que poderia ser ministrada na

modalidade ä distância ou semipresencial. Já a parte prática era composta de 300

horas, entendida como estágio a ser supervisionado pela escola-campo. O

cumprimento de ambas daria ao aluno o direito à licenciatura.

Tal proposta contrariava os princípios e recomendações do Movimento

Nacional de Reformulação dos Cursos de Formação de Educador, cuja docência era

a identidade de todo profissional da educação e a formação inicial deveria ser feita

em nível superior e em cursos presenciais.

69

Com este preceito e com 540 horas, o médico tornar-se-á professor de Biologia; o engenheiro, professor de Matemática, Física e Química; o advogado, professor de Português e assim por diante (BRZEZINSKI, 1997, p.149).

Ao possibilitar o crescimento de cursos ineficientes em faculdades sem

caráter formativo, este arranjo trouxe mais problemas do que benefícios para a

Educação Básica. Retardou, mais uma vez, a instalação de uma política ampla e

global da formação docente, na qual fosse contemplada a formação inicial, as

condições de trabalho, as questões salariais, a carreira e a formação continuada.

Em seu artigo 62, considerado inovação, pois nele reside a criação dos

Institutos Superiores de Educação, a LDB, n. 9.394/96, relata que a formação

poderia ocorrer:

[...] em nível superior, em cursos de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, e oferecida em nível médio na modalidade normal (BRASIL, 1996, p.22).

Este artigo coloca como ideal a formação em nível superior para todos os

professores, inclusive os professores das séries iniciais do Ensino Fundamental,

regulado pelo artigo 63, fato este contemplado pela primeira vez em nossa

legislação educacional, visto que na LDB anterior (5.692/71), a formação destes

profissionais se daria em Escolas Normais de nível médio.

Também no artigo 62, a Lei procura considerar as disparidades de

desenvolvimento sócio-econômico-cultural das regiões brasileiras. A busca pela

formação em caráter emergencial se deparou com situações calamitosas. Certas

regiões consideradas como bolsões de misérias espalhados pelo país, não

apresentavam condições de atender a formação superior proposta na legislação e

de fato era fundamental a adequação ao nível médio como ponto de partida para a

formação inicial.

Não se pode deixar de considerar como importante iniciativa, a proposição da

instalação dos Institutos de Educação Superior, no sentido de maior organicidade do

processo de formação de professores. Estes, inspirados nas experiências

70

internacionais, como o modelo francês, que teriam instituições unicamente voltadas

para a formação dos profissionais da educação destinados ao Ensino Fundamental

e no modelo alemão que dispunha das “Pädagogischi Hochschule” que acabaram

extintas e integradas às Universidades.

Na América Latina, as Universidades Pedagógicas existentes, ou seja,

Institutos de Ensino Superior, não privilegiam a formação dos profissionais para o

Sistema Escolar. Sua formação visa ä formação específica das áreas que serão

ensinadas, ou seja, os especialistas.

Como exemplo desta prática, Saviani (1997, p.219) explicita o caso da

Universidade Pedagógica da Venezuela, que sequer conta com o Curso de

Pedagogia entre suas opções. Este só é encontrado na Universidade Central da

Venezuela, composto por aplicações práticas e fundamentos da educação.

O Decreto, n. 2.032, de agosto de 1997, estabelece que as Instituições de

Ensino Superior podem assumir diferentes formatos: Universidades, Centros

Universitários, Faculdades Integradas, Faculdades e Institutos Superiores ou

Escolas Superiores. Com essas distinções e mantendo a exigência da pesquisa

apenas nas Universidades, decreta-se o alijamento entre Universidades de Ensino e

Universidades de Pesquisa, e institui para o curso de formação de professores o

caráter apenas profissionalizante.

Silva (1998, p.193, apud FERREIRA, p.6) afirmou que:

[...] Se esses institutos forem implantados em cidades onde não haja, ainda, instituições universitárias que venham oferecendo uma formação de qualidade aos professores das séries iniciais, a idéia parece interessante. ―... porém reforça que a universidade, por seu caráter de instituição pluridisciplinar, comprometida com a produção e a divulgação do saber, não pode deixar de lado o compromisso de continuar sendo a principal agência formadora de recursos humanos para a educação‖.

O maior entrave poderia ser apontado no amálgama das responsabilidades

dos Institutos de Educação e das Universidades nos cursos de formação, um

suplantaria o outro, e ultrapassaria assim suas reais finalidades de forma que

perderia com isto a especificidade de sua formação, bem como o risco desses locais

passarem a ser considerados nichos de formação de segunda classe, conforme

71

exemplo ocorrido nos Institutos de Magistério na Itália, que mesmo após sua

inserção nas Universidades, continuaram estigmatizados.

Para Saviani (1997, p.216), esses Institutos não podem ser concebidos como

um mecanismo paralelo à Universidade e alternativo para resolver problemas que a

Universidade demonstrou-se incapaz em solucionar.

Freitas (1992, p.6) afirma que a estrutura de nossa Universidade, de modo

geral, responde às exigências econômico-sociais de mais de vinte anos atrás. Por

isso, se apresentam sem fôlego para assumir o desafio proposto. Organiza seus

cursos de maneira fragmentada: primeiro a abordagem teórica, depois a prática,

como se o conhecimento pudesse primeiro ser ―possuído‖, para depois ser

―aplicado‖. Cabe citar aqui a dicotomia existente entre teoria e prática, tão

propagada nos cursos de formação como a causadora de grandes mazelas, porém,

segundo o mesmo autor:

Costuma-se dizer que a ―teoria na prática é outra‖. Porém se a teoria é consistente, na prática ela não é outra, senão ela mesma, já que se originou da mesma prática à qual retorna agora. [...] o maior problema é a falsa percepção de que a formação teórica dos cursos que preparam os profissionais da educação é muito boa, na verdade ela é muito fraca, o que torna-se fatal para a atuação profissional, forçando os futuros professores a utilizarem esquemas, caricaturas e receitas pré definidas, já que não dominam os fundamentos (ibidem, p.3 - p.13).

A raiz dessas fragmentações é encontrada também na cultura de

desvinculação entre formação e trabalho. Parece acreditar que, ao terminar um

curso de formação, o profissional estará preparado para todas as situações que sua

atividade lhe impuser - ―pura ingenuidade‖. Com esta visão não se considera que a

formação seja ela pessoal ou profissional, é permanente. O olhar para o trabalho

como articulador curricular, ou seja, o lugar onde se congregará as informações

obtidas com as práticas desejadas proporcionará o exercício pedagógico real e

permitirá ao professor ter uma ação reflexiva sobre suas decisões, que deverão

estar alicerçadas em boas teorias.

Apesar das polêmicas quanto à criação dos Institutos, da permanência da

ambigüidade quanto à formação necessária para professores da Educação Infantil e

das séries iniciais, não há como negar que a atual conjuntura educacional exigia, de

72

forma urgente, alguma mudança no processo de formação dos profissionais da

educação.

Para a ANFOPE (2001), sua proposta inicial se pautava na parceria entre os

Institutos de Ensino Superior e Faculdades de Educação, que deveriam respeitar

cada qual, as suas especificidades. Defendia a idéia de que não seria possível criar

uma Mini-Faculdade nos Institutos de Ensino, fator este que causaria um

empobrecimento na formação dos docentes. Já para a Faculdade de Educação, o

problema estava atrelado à quantidade dos conteúdos específicos a serem

ministrados pelos Institutos. Assim, entendia-se que caberia à Faculdade a formação

global e aos Institutos a formação das especificidades do curso, dando a ambos,

Faculdade e Institutos, a oportunidade de aprofundamento em suas práticas e, por

conseqüência, o aumento na qualidade de formação.

Demo (1992, p.24) assegura que a própria sustentação da modernidade está

na dependência da boa atuação dos professores, a qual implica uma boa formação,

seja ela inicial ou em serviço. Com tal afirmação demonstra concordar com a

proposta de criação da Lei que exige que todos os professores deverão caminhar

para uma formação pelo menos de nível superior e eliminar, desta forma, a diferença

―odiosa e arcaica‖ entre os professores que atuam na Educação Infantil e nas séries

iniciais do Ensino Fundamental e os professores que exercem a docência nas séries

e/ou modalidades ulteriores de ensino. Porém, as implicações da proposta de

formação nos cursos propriamente ditos mais parecem um arranjo para o Ensino

Superior do que uma reorganização.

Freitas (1999, p.21) ratifica esta impressão ao afirmar que o curso proposto

passou a ter um caráter técnico-profissionalizante. Sua carga horária de 3.200 horas

se dependesse da experiência e da formação anterior dos estudantes, poderia ser

reduzido em até 1.600 horas, atitude considerada pela autora como demonstração

de banalização e desqualificação frente ao rigor necessário nos estudos superiores.

Outra afirmação de fundamental importância feita por Freitas (ibidem, p.21) se

refere à exigência de qualificação do corpo docente para estes cursos de formação

de professores - 10% de mestres e doutores, estes números contrastam com a

73

exigência de qualificação das Universidades - 30% de mestres e doutores- para os

demais cursos. Menciona também a organização de suas Diretrizes Curriculares

baseadas na Educação Básica, escolha contraditória frente aos demais cursos, que

têm como base os conhecimentos científicos da área de formação. Tais fatos

demonstram a clara desqualificação dos formadores de professores, bem como o

inadequado projeto de formação, em sua maioria pautada no tecnicismo e na

instrumentalização de métodos, conteúdos, e formas de intervenção metodológica,

fatores que além de descartar a tão fundamental investigação da realidade

educativa, contribuem para sérias implicações nos resultados educacionais e

profissionais.

Essas decisões conectadas ao grande custo para o governo frente à proposta

de formação em nível superior demandou novos arranjos de formação, nos quais os

objetivos políticos e econômicos se sobrepuseram aos pedagógico-educacionais.

Houve uma proliferação de cursos de 1.600 horas, bem como a expansão e criação

de numerosas Instituições particulares que embaladas pela grande demanda se

beneficiaram das condições favoráveis a seu crescimento.

Freitas (ibidem, p.22) foi bastante coerente ao se referir a essas organizações

mais como cursos de caráter pós-médio do que cursos de nível superior, pois ao

invés de buscar o que há de mais avançado em termos de proposta de formação, se

colocaram na aceleração e rebaixamento da formação, para atender

especificamente às estratégias adotadas pelo governo brasileiro, que tinha como

meta cumprir as exigências dos organismos internacionais.

Com esta formatação dos cursos para formar professores, com sérias

implicações para a formação qualificada dos profissionais da educação, nivelou-se o

caminho para o esvaziamento do curso de Pedagogia e para o sucesso das

propostas que visavam dele retirar a base da docência.

O Curso de Pedagogia passou então a ser destinado à formação dos

Técnicos em educação:

A formação de profissionais de educação para administração, planejamento, inspeção, supervisão e orientação educacional para a educação básica, será feita em cursos de graduação em Pedagogia ou em nível de pós-

74

graduação, a critério da instituição de ensino, garantida, nesta formação, a base comum nacional (BRASIL, 1996).

A formação proposta neste artigo especifica a constituição dos chamados

especialistas da educação, que tinham sua formação pautada nas especificidades

de sua função, porém vinculada a uma base comum nacional para este fim. Esta

base comum nacional de formação, própria da Educação Básica, encontra sua

justificativa de existência no art. 26 da mesma Lei, que propõe ―currículos com uma

base nacional comum, a serem complementados em cada sistema de ensino e

estabelecimento escolar, por uma parte diversificada e atender as características

regionais e locais da sociedade, da cultura e de sua clientela‖ (BRASIL, 1996, p.11).

A base nacional comum surgiu com o movimento dos educadores, que tinha

como maior meta contribuir para a construção de propostas de superação das

dicotomias presentes na formação de professores e de especialistas (de

bacharelados e licenciados), e entre Pedagogia e demais licenciaturas, representava

um instrumento de luta e resistência contra a degradação da profissão do

magistério.

Diferente da idéia hermética de currículos mínimos, que perdurava desde

1962, esta previa a organização e reivindicação de políticas de profissionalização

que garantissem a igualdade nas condições de formação, e propunham a unificação

da profissão ao defender que a docência é a base da formação de todos os

profissionais de educação. Defendiam a qualificação e a solidificação da formação

de professores como um desafio unido diretamente com o futuro da educação

básica.

Na contramão da história, em seu artigo 67, a Lei exige a experiência docente

daquele que vai atuar como administrador, planejador, supervisor, inspetor e

orientador educacional, entretanto, faculta a formação desses especialistas sem o

preparo para serem professores. Para isso, exige um mínimo de 300 horas para as

atividades práticas nos cursos de licenciatura e dá mais uma vez a sensação de

fragmentação na proposta de integração entre teoria e prática na formação dos

profissionais da educação.

75

Este artigo também fixa o direito dos profissionais à educação continuada, com licenciamento periódico remunerado para o aperfeiçoamento profissional, e no item IV elimina a progressão funcional por tempo de serviço, instaurando a obrigatoriedade da progressão baseada na titulação ou habilitação e na avaliação por desempenho (BRZEZINSKI, 1997, p.155).

Esta LDB, n. 9.394/96, retrata em seu artigo 87 a expectativa de dez anos

para a concretização da formação dos professores em curso superior e que, a partir

dessa data, poderiam ser considerados habilitados para a função.

Em dezembro de 1999, desencadeou-se uma ampla mobilização nacional

contra o Decreto n. 3.276/99, que estabeleceu a exclusividade dos Cursos Normais

Superiores para a formação dos professores para esses níveis de ensino, ao retirar

o lócus de formação do Curso de Pedagogia, este, ficaria destinado a formar os

―cientistas da educação‖ (AGUIAR. In: SGUISSARDI, 2000, apud BARBOSA, 2004,

p.5).

Em 2000, por pressões das Universidades e entidades de educadores, o

Decreto n. 3.276/99, foi substituído pelo Decreto n. 3.554, no qual o termo

exclusivamente foi suprido pelo termo preferencialmente.

Apesar de tal iniciativa causar expectativas de reais reformas educacionais, a

forma como foi imposta maquiava interesses externos relacionados principalmente

ao Banco Mundial, as negociatas políticas de interesses públicos e particulares que

vislumbraram na nova Lei um filão financeiro.

Para Barbosa (2004, p.7)

Essa atitude comprova a hegemonia do Estado perante as decisões relativas à educação e o descaso do sistema com a formação daqueles que serão responsáveis pela formação da massa. É notório o descaso com a formação intelectual do país. Quando se pensa em um curso de menor duração, pensa-se somente em cumprir pré-requisitos exigidos de agentes externos. Ignora-se e destrói-se, ainda mais, a profissão do professor, a qual é vista sob o estigma de uma profissão menor. Alguém proporia encurtar a formação inicial de um médico?

O processo de elaboração das Diretrizes Curriculares para os cursos de

graduação foi desencadeado pelo MEC e pelo CNE, em 1997, mediante ajustes

necessários das universidades às novas exigências dos organismos internacionais,

em particular o Banco Mundial e o FMI.

Percebida como elementos norteadores gerais das organizações curriculares,

por conta da flexibilidade que propõe, as Diretrizes podem ser interpretadas como

76

um caminho que poderá apontar ou reforçar a aceleração e colocar em risco a

necessária formação científica e crítica para a formação teórica dos professores.

As políticas públicas reforçam a aceleração e o caráter pragmático e

conteudista da formação e da profissionalização do magistério e estabelecem,

assim, a socialização de propostas de organização curricular para os cursos de

formação de profissionais da educação.

Frente a esta realidade, a ANFOPE (2001) resgata a idéia de escola única de

formação (nascida em 1992), que tinha como diretriz um conteúdo de formação

articulado e comum a todos os profissionais da educação e que esta proposta

deveria ser vista como uma sugestão possível aos problemas do curso de formação,

pois trazia em sua proposição elementos teóricos de grande complexidade, que

buscavam dar forma e estrutura ao conteúdo acumulado nas reflexões e

experiências coletivas.

Na proposta de escola única, as várias instâncias formadoras são articuladas na faculdade/centro/departamento de educação e concebidas como programas articulados e supra departamentais, sendo cada um dos programas, unidades com responsabilidades de pesquisas, ensino e extensão, articuladas em uma coordenação colegiada (FREITAS, 1999, p.34).

Com as indefinições curriculares e a falta de especificidade do curso de

Pedagogia e a conseqüente descaracterização profissional do pedagogo, a

Comissão de Especialistas de Ensino de Pedagogia (CEEP), nomeada pelo

Ministério da Educação por meio da Portaria SESU/MEC, n. 146, de 10 de março de

1998, composta por Celestino Alves da Silva (Universidade Estadual Paulista), Leda

Scheibe (Universidade Federal de Santa Catarina), Márcia Ângela Aguiar

(Universidade Federal de Pernambuco), Tizuko Morchida Kishimoto (Universidade

de São Paulo) e Zélia Mileo Pavão (Pontifícia Universidade Católica do Paraná);

com a finalidade de unificar uma proposta de formação do profissional de educação

baseada nas sugestões de mais de quinhentas Instituições de Ensino Superior do

país, apresentou uma proposta de elaboração das Diretrizes Curriculares, que foi

encaminhada ao Conselho Nacional de Educação em maio de 1999.

Essa comissão assumiu a tese de que o curso de Pedagogia destinava-se à formação de um profissional habilitado a atuar no ensino, na organização e na gestão de sistemas, unidades e projetos educacionais e na produção e

77

difusão do conhecimento, em diversas áreas da educação, tendo a docência como base obrigatória de sua formação e identidade profissional (AGUIAR; SCHEIBE, 1999, p.232).

Essa comissão formulou o documento com base nas expectativas históricas

dos educadores de edificar uma política nacional de formação, que contemplasse

um sistema articulado e integrado de formação dos profissionais de educação.

Porém, a concepção de docência assumida pela ANFOPE (a docência é base

de formação de todo e qualquer profissional da educação e de sua identidade) não

agradou a todos os envolvidos.

Para Libâneo e Pimenta (1999, p.249):

Com efeito, este princípio levou à redução da formação do pedagogo à docência, à supressão em alguns lugares da formação de especialistas (ou do pedagogo não diretamente docente), ao esvaziamento da teoria pedagógica em virtude da descaracterização do campo teórico-investigativo da pedagogia e das demais ciências da educação, à retirada da universidade dos estudos sistemáticos do campo científico da educação e, em conseqüência, da formação do pedagogo específica na área e para o exercício profissional.

No amplo debate existente sobre a concepção de docência e, por

conseqüência, sobre a concepção do curso de Pedagogia, Aguiar e Melo (2005, p.7-

8), identificam pelo menos três visões diferentes.

A primeira delas considera a ação educativa e a ação docente inseparáveis,

as duas fortaleciam a especificidade do curso. Nele a docência era entendida em

seu sentido teórico-prático ampliado e historicizado, e trazia em si a possibilidade de

favorecer o trabalho coletivo em prol de um projeto educacional.

Com esta compreensão afirmam que o exercício da docência envolve

múltiplas relações: pedagógicas, comunicativas, interativas, cognitivas, psicológicas,

afetivas, estéticas, bem como ético-morais e demonstram a perspectiva da

articulação de conhecimentos e práticas, numa tentativa de superar a lógica

disciplinar impregnada no currículo e na sala de aula, que fragmentam o

conhecimento da prática nos cursos de formação.

A segunda concepção de docência remete à preparação de professores para

o domínio dos conteúdos específicos da Educação Infantil e dos quatro anos iniciais

78

do Ensino Fundamental, ou seja, remete ao profissional de ensino, centrado

notadamente em conteúdos/metodologias com características marcantes de uma

Licenciatura em Pedagogia.

A terceira concepção converge com a segunda, isto é, a docência nestes

moldes, seria inserida nos Institutos Superiores de Educação, ou seja, dentro ou fora

da Universidade, no Ensino Normal Superior, e contribuiria para a perda da

especificidade do curso de Pedagogia e de sua identidade.

Disto, concluo a partir das concepções precedentes, que uma aglutinação

entre as concepções apresentadas, ou seja, a docência entendida em seu sentido

teórico-prático, de forma a compreender as características peculiares de cada

segmento de forma tal a oferecer ao futuro professor uma formação mais específica

frente às suas futuras atividades profissionais, contemplaria uma concepção mais

abrangente.

Por meio do Parecer do CNE n. 009/2001 (BRASIL, 2001), que tratava das

Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) para a Formação de Professores da

Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura e de graduação plena,

discutiram-se propostas de organização para o Curso de Formação de professores.

Este documento, apresentado ao CNE, em 08 de maio de 2001, concebia que para

se organizar um curso de formação de professores, era fundamental haver uma

definição de competências necessárias à atuação profissional, tornando-as

norteadoras tanto na proposta pedagógica e, em especial, no currículo e na

avaliação, para a organização institucional e para a gestão da escola de formação.

O avanço e a disseminação das tecnologias da informação e da comunicação

impactaram nas formas de convivência, na organização do trabalho e no exercício

da cidadania e democratizaram o acesso e a melhoria da qualidade da educação

básica. Encontra-se no Parecer n. 009/2001, a afirmação de que:

Quanto mais o Brasil consolida as instituições políticas democráticas, mais se amplia o reconhecimento da importância da educação para a promoção de desenvolvimento sustentável e a superação das desigualdades sociais (BRASIL, 2001, p.4).

79

Neste cenário, não eram poucos os desafios a serem vencidos. Talvez o

maior se encontrasse na inadequada formação de nossos professores, em sua

grande maioria baseada nos moldes tradicionais de educação, que não

contemplavam muitas das necessidades apresentadas em nossa sociedade.

Dentre elas destaca-se:

―Orientar e mediar o ensino para a aprendizagem dos alunos;

Comprometer-se com o sucesso da aprendizagem dos alunos;

Assumir e saber lidar com a diversidade existente entre os alunos;

Incentivar atividades de enriquecimento cultural;

Desenvolver práticas investigativas;

Elaborar e executar projetos para desenvolver conteúdos curriculares;

Utilizar novas metodologias, estratégias e materiais de apoio;

Desenvolver hábitos de colaboração e trabalho em equipe‖ (BRASIL, 2001, p.4).

A proposição feita ao CNE, por meio deste Parecer, apresentava a base

comum de formação com elementos que permitiriam revisar de maneira crítica os

modelos de formação já instaurados, visando à qualidade tão almejada. Sugeriam:

―Fomentar e fortalecer processos de mudança no interior das instituições formadoras;

Fortalecer e aprimorar a capacidade acadêmica e profissional dos docentes formadores;

Atualizar e aperfeiçoar os formatos de preparação e os currículos vivenciados, considerando as mudanças em curso na organização pedagógica e curricular da educação básica;

Dar relevo à docência como base da formação, relacionando teoria e prática;

Promover a atualização de recursos bibliográficos e tecnológicos em todas as instituições ou cursos de formação‖ (Ibidem, p.5).

Nessa conjuntura, reforça-se a percepção de uma escola voltada para a

construção de uma cidadania consciente e ativa que proporcione ao aluno os apoios

culturais que lhe permitam identificar e posicionar-se frente às transformações em

curso e incorporar-se na vida produtiva e intelectual. Para tanto, é sine qua non

definir a concepção de professor como profissional do ensino que tem como

80

principal tarefa atentar-se para a aprendizagem dos alunos e respeitar suas

diversidades cultural, pessoal e social.

Ao término da análise do documento (Parecer n. 009/2001), a Relatora

Raquel Figueiredo Alessandri Teixeira, o descreve como: 1) Princípios Orientadores

para uma Reforma da Formação de Professores composto por concepções de

competência; aprendizagem; conteúdo; avaliação; pesquisa; coerência entre

formação e prática esperada do futuro professor; 2) Diretrizes para a Formação de

Professores composta por garantia de conhecimentos da escolaridade básica;

contemplação dos diferentes âmbitos do conhecimento profissional do professor;

seleção de conteúdos pertinentes às diferentes etapas da escolaridade; articulação

entre conteúdos e didáticas; avaliação como finalidade de orientação e reflexão

sobre o trabalho realizado; competências a serem desenvolvidas na educação

básica; 3) Diretrizes para a Organização da Matriz Curricular, que partiu do conjunto

de competências que se esperava do professor ao concluir seu curso formador.

Descontentes, em 07 de novembro de 2001, as entidades da área ANPED,

ANFOPE, ANPAE e FORUMDIR (Fórum de Diretores das Faculdades/centros de

Educação das Universidades Públicas Brasileiras) apresentam ao CNE um

documento sobre o ―Posicionamento Conjunto das Entidades‖ e reafirmam as

Diretrizes Curriculares para o curso de Pedagogia. Este documento serviria de base

para a elaboração da proposta das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso

de Graduação em Pedagogia, que dentre tantas expectativas, explicitava a

possibilidade do curso nascer das pesquisas, reflexões e diálogos de estudiosos

brasileiros, o que superaria a histórica implantação de modelos educacionais

europeus e americanos no Brasil.

Apesar da riqueza de significados do Documento, foi necessária ―uma grande pressão‖ (AGUIAR. et al., 2006, p.825) de todos os envolvidos à Secretaria de Educação Superior (SESU) e à Secretaria de Ensino Fundamental, para que o Documento pudesse chegar ao Conselho Nacional de Educação (CNE). O motivo deste entrave era o fato de o Documento contrariar as indicações da Lei 9394/96, especialmente em relação à identidade do Curso de Pedagogia e ao Curso Normal Superior, que naquele momento esperava regulamentação (AMORIM, 2008, p. 70).

81

As várias iniciativas do MEC (Parecer da Câmara do Ensino Superior- CES, n.

133/01, Resoluções, n. 01 e 02/2002, que instituem Diretrizes para Formação de

Professores) concernentes à formação de professores e ao próprio curso de

Pedagogia, causaram mais transtornos do que encaminhamentos.

Ao estabelecer que o Curso de Pedagogia formaria os especialistas

segregados dos docentes, a regulamentação do CNE contraria o movimento visível

à produção teórica na área e à própria LDB, que estabelece, em seu art. 67, a

experiência docente como pré-requisito para o exercício das demais funções do

magistério, e retorna num patamar mais elaborado a figura do pedagogo

especialista.

Para Freitas (2002), a visão do pedagogo especialista carrega em si a

concepção do professor ―tarefeiro‖ formado com ênfase nos conteúdos específicos.

Esta formação não atende aos princípios de flexibilidade, eficiência e produtividade

dos Sistemas de Ensino e nega toda a trajetória percorrida pelo movimento dos

educadores em luta pela melhoria profissional que tem a docência como base de

sua identidade profissional, docência esta capaz de articular o conhecimento

específico de sua área ao conhecimento pedagógico e visar uma totalidade do

conhecimento social.

Ocorre uma política de crescimento desordenado do Ensino Superior

particular, fator que acarreta uma crescente expansão dos Cursos Normais

Superiores e do próprio Curso de Pedagogia em Instituições de Ensino sem

nenhuma tradição e compromisso em sua história acadêmica de qualquer tipo de

formação. Isto chega a tal ponto, que hoje, a diversidade existente nestes cursos,

exige do Poder Público um acompanhamento rigoroso para preservação das

iniciativas positivas e aprimoramento daquelas que não demonstram a qualidade

necessária. Dados do INEP/MEC revelam que em 2006 existiam 1.437 Cursos de

Pedagogia e 1.108 Cursos Normais Superiores (AGUIAR. et al., 2006).

Após vários anos de expectativa e pressão das comunidades acadêmicas, em

17 de março de 2005, o Conselho Nacional da Educação, divulgou uma minuta de

Resolução das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia, que foi

82

amplamente rejeitada pelo movimento dos educadores que apontaram como

principais críticas:

―Redução do Curso de Pedagogia ao Curso Normal Superior;

Reducionismo ao pragmatismo da docência para as séries iniciais do Ensino Fundamental e Educação Infantil;

Desconsideração frente à Pedagogia ser uma ciência que daria condições de formar o bacharel e o licenciado ao mesmo tempo;

A palavra exclusivamente para licenciados que contribuiria com a abertura de um novo e atraente nicho de mercado para os cursos de especialização, que em sua maioria estão nas mãos das IES privadas, o que significaria a privatização e elitização da formação desses profissionais‖ (SCHEIBE, 2007, p.54-55).

Em 13 de Dezembro de 2005, foi encaminhado para aprovação o Parecer

CNE/CP n. 5/2005, que instituiu as Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de

Pedagogia, este declara estar baseado nas proposições educacionais formalizadas

nos últimos 25 anos sobre a formação e atuação do professor. Foi aprovado em 20

de dezembro de 2005 e abarca as finalidades do curso de Pedagogia na história do

conhecimento em Pedagogia, na história da formação de profissionais e de

pesquisadores para a área da Educação, no avanço do conhecimento e tecnologia,

assim como nas demandas de democratização e de exigências de qualidade do

ensino pelos diferentes segmentos da sociedade brasileira.

O Parecer CNE/CP n. 5/2005 oferece especial atenção na organização dos

princípios constitucionais e legais; a diversidade sociocultural e regional do país; a

organização federativa do Estado brasileiro; a pluralidade de idéias e de concepções

pedagógicas, a competência dos Estabelecimentos de Ensino e dos docentes para a

gestão democrática.

A educação do licenciado em Pedagogia deverá proporcionar um repertório

de informações composto por pluralidade de conhecimentos teóricos e práticos, cuja

consolidação será harmonizada pelo exercício da profissão, fundamentando-se na

interdisciplinaridade, contextualização, democratização, pertinência e relevância

social, ética, sensibilidade afetiva e estética. Este repertório deverá ser constituído

por muitos olhares, próprios das ciências, das culturas e das artes, da vida cotidiana,

que contribuam com leituras das relações sociais e dos processos educativos

desencadeados.

83

O Curso de Pedagogia deverá oferecer formação para o exercício integrado e

indissociável da docência, da gestão dos processos educativos escolares e não-

escolares, da produção e difusão do conhecimento científico e tecnológico do campo

educacional. Cada instituição deverá circunscrever seu projeto em áreas ou

modalidades de ensino que proporcionassem aprofundamento de estudos, sempre a

partir da formação comum da docência na Educação Básica e com objetivos

próprios do Curso de Pedagogia (PARECER CNE/CP n. 05/2005).

A organização curricular do Curso de Pedagogia foi constituída pelos

seguintes elementos: a) Núcleo de estudos básicos, que sem perder de vista a

diversidade da sociedade brasileira por meio de estudos atenciosos, articularia

princípios, concepções e critérios oriundos de diferentes áreas do conhecimento que

contribuiriam para o desenvolvimento das organizações e da sociedade; b) Núcleo

de aprofundamento e diversificação de estudos, que voltado às áreas de atuação

profissional priorizadas pelos projetos pedagógicos das instituições, oportunizaria

investigações sobre processos educativos e gestoriais em diferentes situações

institucionais-escolares; c) Núcleo de estudos integradores que proporcionariam

enriquecimento curricular por meio da participação de seminários, estudos

curriculares, projetos de iniciação científica, dentre outros (Ibidem, 2005).

Os três núcleos, ao mesmo tempo, proporcionariam amplitude e identidade

relativas à formação do licenciado. Compreenderiam, além de aulas, práticas de

trabalho pedagógico, monitoria, estágio curricular, pesquisa e a participação em

eventos e em outras atividades que alargassem suas experiências de estudante

visando uma consolidada formação.

No conturbado processo, houve uma grande dúvida no artigo 14 do Parecer

n. 5/2005, que tratava da formação dos professores e foi apresentado em sua

composição original da seguinte forma:

Art. 14. A formação dos demais profissionais de educação, nos termos do art.64 da Lei nº 9.394/96, será realizada em cursos de pós-graduação, especialmente estruturados para este fim, abertos a todos os licenciados. Parágrafo único: Os cursos de pós-graduação poderão ser disciplinados pelos respectivos sistemas de ensino, nos termos do art.67, da Lei nº 9.394/96 (PARECER CNE/CP n. 05/2005, p.24).

84

Este é retificado, a fim de dirimir qualquer eventual dúvida, por meio do

Parecer n. 3/2006, de 21 de fevereiro, e passa a ser descrito desta maneira:

Art.14. A Licenciatura em Pedagogia nos termos do Parecer CNE/CP n. 5/2005 e desta Resolução assegura a formação de profissionais da educação prevista no art.64, em conformidade com o inciso VIII do art. 3º da Lei n. 9.394/96. § 1º. Esta formação profissional também poderá ser realizada em cursos de pós-graduação, especialmente estruturados para este fim e abertos a todos os licenciados. § 2º. Os cursos de pós-graduação indicados no § 1º deste artigo poderão ser complementarmente disciplinados pelos respectivos sistemas de ensino, nos termos do Parágrafo único do art. 67 da Lei n. 9.394/96.

Esta composição afirma que a Licenciatura em Pedagogia deveria realizar a

formação para Administração, Planejamento, Inspeção, Supervisão e Orientação

Educacional, em Organizações da Educação Básica e também estabelece as

condições em que a formação deveria ser efetivada nos cursos de pós-graduação.

Assim, finalmente, em 15 de maio de 2006, com a Resolução do CNE/CP n.

1, foi aprovada as Diretrizes Curriculares para o Curso de Pedagogia, composta por

quinze artigos.

Importante ressaltar que estas DCNs basearam-se nas diretrizes para a

Educação Básica, ao contrário dos demais Cursos de Graduação, que tomam como

parâmetros os princípios e conhecimentos científicos da área de formação.

Com este parâmetro organizacional inicial, Saviani (2004) afirma que os

estudos desenvolvidos foram elaborados de forma dicotômica entre a pesquisa e a

produção de conhecimento, o que com certeza proporcionou, mais uma vez, um

caráter técnico e instrumental, e retirou do profissional da educação a possibilidade

de desenvolver-se como intelectual e profissional responsável por uma área do

conhecimento.

Elaborada a partir do Parecer CNE/CP n. 5/2005 e n. 3/2006, as DCNs

retratam em seu artigo 2º, § 1º a definição de docência:

Compreende-se a docência como ação educativa e processo pedagógico metódico e intencional, construído em relações sociais, étnico-raciais e produtivas, as quais influenciam conceitos, princípios e objetivos da Pedagogia, desenvolvendo-se na articulação entre conhecimentos científicos e culturais, valores éticos e estéticos inerentes a processos de

85

aprendizagem, de socialização e de construção do conhecimento, no âmbito do diálogo entre diferentes visões de mundo (BRASIL, PARECER CNE/CP n. 3/2006, p.19).

Esta definição de docência propõe a integração dos diversos saberes e

supera a dicotomia entre prática e teoria, desta forma, exige o diálogo entre diversas

realidades que segue ao encontro das necessidades da humanidade, que neste

momento, se encontra cercada de expressões violentas de intolerância e

superficialidade.

Tal concepção pode nos levar a acreditar num significativo compromisso de

construção das relações pacíficas e respeitosas, no qual o professor deveria ser

capaz de articular, num contexto mais amplo, a teoria e prática nos processos

pedagógicos, conhecimentos científicos e culturais e desenvolver sua capacidade de

agir pautado em valores éticos e estéticos, e demonstrar conhecimento, sabedoria e

equilíbrio, baseados nas relações socioculturais, políticas e econômicas, sem a

preocupação de determinar um lugar como o adequado para sua ação. Entende-se,

pois, que o processo educativo, e nele a ação docente, não está radicado apenas no

espaço escolar, embora encontre nele seu lócus privilegiado.

Porém as imprecisões conceituais corroboram para as indefinições

operacionais, o que resulta na confusa atividade profissional do pedagogo. Abre-se

um amplo horizonte para a formação e atuação desses profissionais. Em seu artigo

4º, o Parecer CNE/CP n. 5/2005, declara que:

O curso de Licenciatura em Pedagogia destina-se à formação de professores para exercer funções de magistério na Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental, nos cursos de Ensino Médio, na modalidade Normal, de Educação Profissional, na área de serviços e apoio escolar e em outras áreas nas quais sejam previstos conhecimentos pedagógicos.

Parágrafo único: As atividades docentes também compreendem participação na organização e gestão de sistemas e instituições de ensino, englobando: planejamento, execução, coordenação, produção e difusão do conhecimento (p.2).

Mesmo que as DCNs não entendam a docência apenas no âmbito de

ministrar aulas, este sentido é ampliado e compreendido como ação educativa, uma

vez que se articula à idéia de trabalho pedagógico, processo este metódico e

intencional, construído em relações sociais, étnico-raciais e produtivas as quais

86

influenciam conceitos, princípios e objetivos da Pedagogia. A proposta de formar

egressos para cinco modalidades de exercício do magistério, sem estabelecer uma

trilha curricular e as modalidades de diplomação, causam duplicidades nas

informações e conflitos nas propostas de formação.

Para Libâneo (2006, p.847), o parágrafo único, do artigo 4º, é contraditório e

insustentável. Para o autor, docente é aquele que ensina para que o aluno aprenda

o necessário para inserir-se de forma crítica e criadora na sociedade que vive; já o

gestor é o profissional que dispõe e coordena adequadamente e racionalmente os

recursos e meios para a realização dos fins necessários. Portanto, docência e

gestão são dimensões pedagógicas, mas não a mesma coisa, e ficam

impossibilitadas de serem concebidas numa única formação.

No Parecer CNE/CP n. 05/2005, ―a docência se constitui na confluência de

conhecimentos oriundos de diferentes tradições culturais e das ciências, bem como

de valores, posturas e atitudes éticas, de manifestações estéticas, lúdicas, laborais‖

(p.7).

Por isto, Aguiar e Melo (2006 p.831) acreditam que;

[...] escapando aos reducionismos da visão teoricista (aplicação instrumental da teoria na prática), e do praticismo (prioridade ao saber tácito, construído na prática imediata cotidiana) na sala de aula, tem-se entendido de que a docência é o fulcro de articulação dos diversos conhecimentos- aportes teóricos da pedagogia e das Ciências da Educação e de outros conhecimentos especializados e daqueles produtos das práticas escolares e não- escolares refletidas.

O artigo 5º, por meio de 16 atribuições para o ―super-profissional docente‖,

expõe as competências necessárias aos egressos do curso de Pedagogia. São

exposições em que os objetivos, conteúdos, recomendações morais, estão

misturados, o que causa aos egressosinseguranças e imprecisões quanto ao perfil

profissional esperado.

De acordo com a Resolução CNE/CP n. 1/2006, as DCNs para o Curso de

Pedagogia servem como referência para os IES na organização de seus programas

de formação e permitem uma flexibilidade na construção dos currículos, além de

contemplarem a denominação de diferentes formações e habilitações para cada

área do conhecimento, explicitam os objetivos e demandas existentes, determinam

87

que sua organização curricular antes realizada segundo os princípios da docência

como base de formação, da flexibilidade do currículo e da organização dos

conteúdos por meio de diversas formas didáticas, deveriam ser a partir de ―núcleos

de estudos‖ (estudos básicos; de aprofundamento; estudos integradores), e

retomam a idéia elaborada pela Comissão dos professores, em 1999, que é relatada

no artigo 6º.

A carga horária para realização do curso, antes de 3.200 horas, destinadas a

atividades didáticas obrigatórias, laboratórios e práticas pedagógicas e 640 horas

distribuídas entre os estudos independentes e o trabalho de conclusão de curso, foi

reformulada a partir das DCNs da seguinte forma: 2800 horas dedicadas às

atividades formativas, incluindo atividades culturais e práticas e a participação nos

grupos de estudo; 300 horas dedicadas ao estágio supervisionado prioritariamente

em Educação Infantil e anos iniciais do Ensino Fundamental e 100 horas de

atividades teórico-práticas de aprofundamento em áreas do interesse dos alunos,

por meio da iniciação científica (BRASIL, RESOLUÇÃO CNE/CP n.1/2006).

Sua proposta estabelece que o curso de Pedagogia trabalhará com um

repertório de informações e habilidades, que contemplem a pluralidade dos

conhecimentos, e fundamentar-se-á nos princípios da interdisciplinaridade,

contextualização, democratização, pertinência e relevância social, e permitirá assim

todo e qualquer tipo de configuração curricular, conectado aos interesses de cada

Instituição Educacional.

De acordo com as Diretrizes Curriculares Nacionais, o tripé que dá base ao

Curso de Pedagogia - a docência, a gestão educacional e a produção do

conhecimento na área da educação - passa a ser considerado indissociável na

formação do pedagogo, porém se nota com clareza no cotidiano educacional a

tendência em priorizar um ou outro elemento dessa tríade.

Por exemplo, as entidades da área educacional preferem afirmar que a base do Curso de Pedagogia é a docência, que é ela mesma a base articuladora dos diversos conhecimentos possibilitados na formação do Pedagogo (AGUIAR et al., 3006, p. 830). Pesquisadores como Naura Ferreira (2006) enfatizam a gestão da educação e, felizmente a gestão democrática, destacada pelas Diretrizes em questão. Ferreira citando Anísio Teixeira recorda que mesmo na docência, em gérmen, está o exercício da ação administrativa. Esta abordagem parece interessante à medida que chama a atenção do docente para sua responsabilidade no que diz respeito aos processos de gestão democrática da educação (AMORIM, 2008, p.72).

88

A partir da perspectiva que se apresenta para o Curso de Pedagogia, em ser

aquele que irá oferecer subsídios para a compreensão da complexidade da escola e

de sua organização, sabiamente o Parecer n. 5/2005, amplia o sentido da profissão

docente. Esta antes entendida apenas como o ato de ministrar aulas passa a ser

concebida como a ação educativa vinculada a processos pedagógicos metódicos e

intencionais, que são constituídos na convergência de conhecimentos procedentes

de diferentes tradições culturais e das ciências, bem como de valores, posturas e

atitudes éticas, estéticas, lúdicas e laborais.

Desta forma, caberá ao professor desenvolver um trabalho pedagógico,

realizado em espaços escolares e não escolares e ter a docência como base, mas

não como seu único princípio. A articulação entre docência, gestão educacional e

produção de conhecimento, proporcionará o desenvolvimento de processos

pedagógicos a fim de se elaborar, definir e realizar práticas educativas capazes de

atender os problemas educacionais existentes.

89

CAPÍTULO 4: LACUNAS DO CURSO DE PEDAGOGIA E O REFLEXO

NO DESEMPENHO PROFISSIONAL DO PROFESSOR

Observa-se que a organização dos Cursos de Pedagogia tem se realizado

historicamente de forma burocrática, vinculada, na maioria das vezes, às histórias

das culturas, das demandas educacionais aliadas às exigências do mercado, e

desconsidera a dimensão epistemológica, que se vincula diretamente a seu campo

de reflexão, pesquisa e análise sobre o fenômeno educativo e que, por ser assim,

deveria fundamentá-lo.

A discussão epistemológica que envolve os conceitos de Pedagogia e

Docência tem sido objeto de várias publicações (PIMENTA, 1997; LIBÂNEO &

PIMENTA, 1999; LIBÂNEO, 2003; FRANCO, 2003a). Essas publicações

argumentam que a Pedagogia não se resume a um curso, mas ao contrário, se

referem a um amplo campo de conhecimentos, cuja natureza constitutiva é a teoria e

a prática da formação humana, que tem como objeto próprio, o estudo e a reflexão

sistemática sobre o fenômeno educativo em todas as suas dimensões.

A Pedagogia é uma reflexão sobre as finalidades da educação e uma análise

objetiva de suas condições de existência e de funcionamento. A docência é uma

modalidade de atividade pedagógica que deve ter como base a formação

pedagógica. ―Todo trabalho docente é trabalho pedagógico, mas nem todo trabalho

pedagógico é trabalho docente‖ (LIBÂNEO, 2006, p.850).

Talvez o maior desafio seja estabelecer uma formação baseada no

conhecimento científico e na pesquisa consolidada e não ceder à incorporação da

racionalidade técnica ou do praticismo pedagógico predominante em nossa

educação, na qual se observa uma formação utilitarista em que o conhecimento é

adquirido para ser aplicado imediatamente.

A inclusão da docência na Pedagogia traz em sua essência a reflexão sobre

os aspectos da realidade e a própria prática educativa e suas contribuições teóricas

providas pelas demais Ciências da Educação, vinculadas à compreensão plena e

intencional dirigida aos problemas educativos, exclui, desta forma, a formação do

pedagogo especialista, já que não se faz mais a diferenciação entre as atribuições

90

profissionais do especialista em educação e as do professor, bem como a extensão

do conceito de atividades docentes para atividades de gestão e investigador.

Esta exclusão tornou-se fruto de diversas críticas de estudiosos (LIBÂNEO,

2003; 2006; 2007; PIMENTA, 2007; SAVIANI, 2005; 2007), que defendem a idéia de

que um especialista profissionalmente bem preparado pode ter mais êxito

pedagógico no enfrentamento das desigualdades promovidas pela escola como a

exclusão social, pedagógica e a produção do fracasso escolar.

Nos ambientes escolares encontram-se professores habilitados para a

função, porém, em sua grande maioria, não são qualificados para exercê-la.

Apresentam de modo geral uma intencionalização em seu saber-fazer, ou seja,

acreditam ser esta a forma correta para se fazer e demonstram mais uma vez a

fragilidade de seu curso formador (LIBÂNEO, 2006; SAVIANI, 2006).

Para Libâneo (2006, p.855) esta proposta de formação:

[...] negou o saber e a competência dos professores no desempenho dessas funções [...]. Transformado num mero executor do que é pensado e decidido por outrem, o professor é cada vez mais afastado de uma compreensão do seu processo de trabalho como um todo, bem como de sua condução. Essa fragmentação e hierarquização do trabalho pedagógico é, portanto, um importante marco de controle da educação pelo Estado.

Severino (1998, p. 2) afirma que essa intenção proporciona às atividades uma

possibilidade de sentido, o professor, então, passa a executá-las de maneira menos

mecanizada.

Tal intenção não minimiza a reprodução de um processo de treinamento, no

qual a aula é elaborada para ser um momento de repasse de conteúdos e por

conseqüência, um momento de fadiga e extremo estresse.

Segundo Lavvador, (2003. In: EVANGELISTA; SHIROMA, 2007, p. 539):

O professor desenvolve uma subjetividade branda que atende perfeitamente à nova lógica do mercado na medida em que a subjetividade branda corresponde a um profissional brando. Afirma que os sujeitos docentes são produzidos mediante vários dispositivos, entre os quais se encontram as formas de organização e gestão de suas instituições.

Cada cultura adota tipos de relação que são importantes para sua subsistência.

Num mundo cada vez mais desumanizado em que o imediatismo, o avanço da

91

tecnologia e o individualismo são características predominantes e trazem em sua

bagagem esse clichê, ―de quanto mais, melhor‖, independente da qualidade que isso

represente, nossa sociedade assiste a uma ―avalanche de comportamentos

desencantados em relação à política e pelo crescente ceticismo e, mesmo, cinismo

face aos valores fundamentais da modernidade calculadora e racionalizadora‖

(JAPIASSÚ, 1996, p.170), torna-se indispensável uma nova dimensão relacional.

As DCNs relatam essa proposta de formação e buscam favorecer ao

professor a compreensão da complexidade do ambiente educacional e de sua

organização, bem como demonstram a necessidade em assumir sua

responsabilidade social e formativa e gerar com justiça uma educação para e na

cidadania, que incite a investigação no campo educacional de elementos

mantenedores, transformadores, geradores de relações sociais baseadas na ética e

na moral, que fortaleçam identidades e, não menos importante, desenvolvam a

habilidade de gerir processos educativos em diferentes níveis e contextos em que a

co-responsabilidade e a colaboração são os constituintes primordiais das relações

laborais, para assim assegurar a possibilidade de identificar nas diversidades um

talento.

A nova proposta de formação para o profissional do curso de Pedagogia é

audaciosa e exigirá do professor uma nova compreensão da educação, da escola,

da Pedagogia, da docência, da licenciatura, uma compreensão que permita situá-lo

num contexto mais amplo das práticas sociais construídas no processo de vida real

dos homens.

Esta formação implicará numa sólida base teórica, que estabelecerá novas

formas de se pensar o currículo e romperá com o paradigma da

compartimentalização do saber, pois deverá se fundamentar nos princípios de

interdisciplinaridade, contextualização e relevância social.

Exigirá também que haja o estudo das práticas educativas escolares e não-

escolares alicerçado no desenvolvimento do pensamento crítico, reflexivo

fundamentado na contribuição das diferentes ciências e dos campos de saberes,

que atravessam o campo da Pedagogia.

92

Porém, ao propor tal formação, ampla e extremamente complexa, não se

esclareceu como isso seria feito, e, desta forma, deixauma extrema sensação de ―o

documento (DCNs) ser, ao mesmo tempo, extremamente restrito e demasiadamente

extensivo; é restrito no essencial e excessivo no acessório‖ (SAVIANI, 2007, p.14).

Libâneo (2006, p.15-16), a partir das imprecisões conceituais e ambigüidades

apontadas na Resolução CNE, relatou algumas conseqüências graves na formação

dos professores. São elas:

1) A descaracterização do campo teórico da Pedagogia e da atuação

profissional do pedagogo. A teoria pedagógica e a investigação de formas

específicas de ação pedagógica estão ausentes das faculdades de

educação. Não se estuda Pedagogia nos Cursos de Pedagogia. As

mudanças curriculares não proporcionam mais o pensar, o formular políticas

para as escolas e teorias de aprendizagem, bem como investigar novas

metodologias;

2) A ausência da teoria pedagógica na formação do licenciado empobrece a

contribuição da análise da educação que se pratica nas Instituições de

formação, contribuindo para uma postura conformista da situação;

3) O aumento na intensidade da precariedade da formação reflete na baixa

qualidade do ensino. Neste ponto congregam dois elementos fundamentais:

a sobrecarga disciplinar no currículo para atender a todas as tarefas previstas

para o professor; e a ausência de conteúdos específicos das disciplinas do

Ensino Fundamental (Português, Matemática, História etc.).

Para formar um bom profissional, não se trata mais de passar conhecimentos,

mas sim de se contrapor ao amadorismo diretamente ligado a esta profissão,

extraindo-a da esfera de atividades provisórias e complementares. É necessário

desenvolver capacidades e habilidades mentais atinentes a esses conhecimentos,

sustentada por bases teórico-práticas e éticas consolidadas. Espera-se do professor

um exímio desempenho profissional, que englobe o domínio dos conteúdos, mas,

principalmente, o domínio da elaboração de idéias e o modo de pensar de cada

disciplina.

93

Desempenho é como registra o dicionário:

A maneira como atua ou se comporta alguém ou algo, avaliada em termos de eficiência, de rendimento; a atuação desejada ou observada de um indivíduo ou grupo na execução de uma tarefa, cujos resultados são posteriormente analisados para avaliar a necessidade de modificação ou melhoria (HOUAISS, 2001, p. 978).

Freitas (1992) afirma que o profissional da educação foi preparado para

realizar determinadas atribuições no interior da escola ou fora dela, em que o trato

com o trabalho pedagógico ocupa posição de evidência e constitui o núcleo central

de sua formação.

Não há que se identificar, aqui, trabalho pedagógico com docência, esta é apenas uma das formas de se desenvolver o trabalho pedagógico e um dos aspectos da atuação do profissional da educação. No entanto, reafirmamos que a ―porta de entrada‖ obrigatória na preparação do profissional da educação, além de sua formação geral como educador, é sua preparação para o trabalho pedagógico ou, em outras palavras, sua formação como educador com ênfase na atuação como professor (FREITAS, 1992, p.8-9).

A partir da definição de desempenho e da afirmação de Freitas (1992), pode-

se afirmar que cabe ao professor uma imensa responsabilidade em atender às

exigências profissionais e pessoais que a ele são delegadas. A ele caberá enfrentar

a árdua tarefa de fazer com que todos os envolvidos no processo educativo

frutifiquem seus talentos e potencialidades criativas, estas crivadas de expectativas

éticas e morais que deverão refletir na sociedade em resultados gratos que

contribuirão para um mundo mais habitável e justo.

Para contribuir com tal expectativa, observa-se uma vasta lista que anuncia o

alargamento da profissão docente em nosso meio educacional. A cada dia, os

professores atendem cada vez mais alunos numa mesma classe e por vezes, alunos

com necessidades especiais; exercem funções de psicólogo, assistente social e

enfermeiro, além de intervirem na educação de seus alunos, esta que, mediante

nossa Constituição (1988), deveria estar por conta de sua família.

Os impactos desse excesso produzem efeitos visíveis na saúde física e mental deste profissional. Assolado por cobranças de produtividade, eficiência, empreendedorismo, criatividade, compromisso com a escola, o professor é obrigado a desenvolver um senso de sobrevivência que, não raro, o transforma em um sujeito competitivo que investe suas energias na

94

tentativa de superar a solidão, a culpa, o fracasso, a impotência, a incompetência, as incertezas (FREITAS, 1992, p.537).

Porém, enquanto não houver uma ação crítica e intensa contra as propostas

dos cursos de formação que se contentam em oferecer o mínimo possível aos

futuros professores, será humanamente impossível se desenvolver competências

que agreguem qualidade ao seu trabalho educacional e reflita num maior

reconhecimento social.

Da mesma forma, as Instituições terão dificuldades quanto a quais Diretrizes

seguir para a organização do Curso de Pedagogia. Não é de fácil percepção na

Resolução do CNE a orientação que assegure um mínimo de unidade ao referido

curso em nível nacional.

Para o professor fica a responsabilidade de entender que sua profissão não

pode mais ser exercida como aquela em que apenas se ensinam conteúdos,

concepção predominante no século XIX, de mera transmissão de conhecimento

acadêmico.

Mero ensino, mera aula, meras provas decaem na vala da mediocridade, porque neles não aparece o ímpeto educativo emancipatório, nem no professor, nem no aluno. Ademais, a didática típica ―ensino-aprendizagem‖ tenderá a ser assumida, cada vez mais, pela instrumentação eletrônica, capaz de transmitir conhecimento disponível em condições mais favoráveis que os professores (DEMO, 1992, p.25).

Antes de tudo ele precisa saber que sua profissão vai além das paredes

escolares e dos conteúdos programáticos, representa uma função social, na qual

caberá a ele a tarefa de ensinar a relação, a convivência e a cultura do contexto de

forma crítica e participativa, oportunizando para os futuros cidadãos uma sociedade

democrática, plural e integradora.

Sim, esta seria uma realidade um tanto quanto satisfatória para a relação

educacional, mas ao verificar nosso cotidiano educacional, observa-se que esses

objetivos são no mínimo imaginários frente aos cursos de formação propagados nos

―grandes centros de formação‖. Torna-se imprescindível questionarmos sobre quais

competências serão desenvolvidas para que, ao final de sua formação inicial, os

professores estejam preparados para exercer com qualidade seu papel, bem como

atender a todos os objetivos propostos nas diretrizes de sua habilitação.

95

A competência que a formação deveria concretizar e sempre revigorar é aquela

fundada na propriedade do conhecimento como instrumento mais eficaz na

emancipação das pessoas e da sociedade. Desta forma, competência jamais

poderia estar vinculada a cópia, reprodução, imitação, mimetismo, mas sim, a

construção de atitudes crítica e criativa, características do aprender a aprender.

Demo (1992, p. 23) afirma que:

[...] qualidade quer sob o ponto de vista individual (satisfação), ou, sobretudo sob o ponto de vista social (coletivo/ participação), denota intrinsecamente uma questão política, ou seja, processo e produto tipicamente humano. A qualidade política não se contrapõe à qualidade formal, técnica, metodológica, ao contrário uma implica sobre a outra, cada qual em sua lógica. Então que a formação dos professores será fator decisivo da qualidade educativa básica.

Porque frente a uma proposta tão abrangente, como a das Diretrizes e Bases

para o curso de Pedagogia, ainda encontram-se profissionais que em sua grande

maioria estão despreparados para enfrentar os desafios educacionais, e apresentam

dificuldades em quesitos básicos de sua profissão como o domínio da leitura,

interpretação de texto, escrita, linguagem matemática e a relação interpessoal?

(MARIN; GIOVANNI, 2007).

Para Marin e Giovanni (2007) a proposta cultural veiculada pela ação da escola

para a formação dos professores não lhes permitiu superar totalmente a bagagem

cultural familiar, estas, muitas vezes, defasadas frente äs diversas culturas, ou seja,

as esferas escolares que compuseram a trajetória educacional desses alunos não

foram adequadas para a aquisição de disposições duráveis no uso da língua, na

leitura e na expressão escrita, e, desta forma, não lhes permitiu adquirir o

conhecimento objetivado por excelência.

Os alunos passam pelo Ensino Superior sem modificar sua ―cultura‖ prévia, mantendo um tipo de pensamento ainda com fortes características pré-letradas. Por aí não é difícil antever que tipo de qualidade terá o trabalho pedagógico desses novos professores nas escolas de Educação Infantil e de Ensino Fundamental (SAVIANI, 2007, p.132).

É necessário compreender e enfrentar o maior entrave que hoje pode se

perceber: a continuação de um modelo cruel de aprovação em relação à precária

metodologia da formação do profissional docente, modelo este que mascara uma

96

identidade profissional alicerçada na cultura do desempenho, muito mais do que na

relação com o conhecimento (Ibidem, 2007).

Educar na Universidade não é a mesma coisa que educar em casa, na igreja, na fábrica, na rua, no botequim, por mais que em tudo haja núcleo comum e possível dignidade. É fundamental que o contato pedagógico surgido no meio acadêmico se distinga de outros, e tal distinção passa pela produtividade científica (DEMO, 1992, p.33).

O curso de formação deverá se deslocar do lugar da reprodução, para o lócus

intrinsecamente construtivo de conhecimento e interação do saber. Com esta

postura, o professor terá bases teóricas para orientar seus alunos a produzirem

conhecimento, dentro de seu contexto próprio, partindo-se do que já sabem, de sua

situação cultural e histórica, e desenvolverem competências para utilizar e produzir

conhecimento.

Para Franco (2006. In: FRANCO; LIBÂNEO; PIMENTA, 2007, p.82), os saberes

pedagógicos têm a ver com um sujeito que gradativamente assume uma posição

política diante do compromisso de ser professor, engajando-se criticamente em suas

circunstâncias, cercando e acercando-se de sua realidade existencial,

transformando-a na direção de suas intencionalidades.

Este sujeito fará uso do necessário conhecimento didático, metodológico,

cultural, servindo-se do aparato teórico, estes quanto mais sólidos melhor orientarão

a prática de forma mais consistente e eficaz, e esta prática construirá em seus

saberes disciplinares, didáticos, metodológicos, que articulados, mobilizados e

organizados, estruturarão os saberes pedagógicos.

Embora afirmado por Imbernón (2006, p.13), que:

Historicamente a profissão docente caracterizava-se pelo estabelecimento de alguns traços em que predominavam o conhecimento objetivo, o conhecimento das disciplinas a imagem e semelhança de outras profissões. Saber, ou seja, possuir certo conhecimento formal era assumir a capacidade de ensiná-lo.

Esse ranço cultural, no qual se observa os traços de uma pedagogia tradicional

em que o aluno sempre é um receptor de informações oferecidas por um instrutor,

neste caso o professor, apesar de ainda ser encontrado nos ambientes escolares,

em qualquer nível de formação, encontra-se em transformação, que apesar de

paulatina, é claramente perceptível.

97

É fato que o poder estabelece o vínculo de autoridade e, neste contexto, quem

sabe ensina e quem não sabe aprende, prática que faz com que o professor se

transforme num ―técnico‖ capaz de delinear idéias prescritas, na maioria das vezes,

por outros ―técnicos‖. Acaba por tecer assim uma rede de conhecimentos

acadêmicos, legitimado por um certificado, mas longe de se transformar num

conhecimento científico no qual a base está pautada na ciência, na pesquisa e na

elaboração de hipóteses e argumentos, que ao serem trabalhados passaram a

representar novos conhecimentos.

Imbernón (ibidem, p.58-59) afirma que a partir de perspectivas ―não-técnicas‖, o

conhecimento em relação ao exercício do ensino em todo docente, encontra-se

fragmentado em diversos momentos:

1. ―A experiência como discente, supõe uma socialização do ensino a partir das concepções e crenças;

2. A socialização profissional mediante a formação inicial específica; 3. A vivência profissional de iniciação à docência; 4. A formação permanente, que tem como uma de suas funções questionar ou

legitimar o conhecimento profissional posto em prática‖.

Historicamente, a perspectiva da formação docente não se concretiza apenas

no curso específico, seja em qual nível for. Ela se dá também por meio do trabalho

realizado pelo professor no dia-a-dia da sala de aula, no estabelecimento de alguns

traços predominantes de conhecimento objetivo, que em contato com alunos

cotidianamente, faz com que sua prática adquira sentido e se efetive, uma vez que a

incorpora à realidade histórica e social.

O aprendizado do ensinante ao ensinar não se dá necessariamente através da retificação que o aprendiz lhe faça de erros cometidos. O aprendizado do ensinante ao ensinar se verifica à medida em que o ensinante, humilde, aberto, se ache permanentemente disponível a repensar o pensado, rever-se em suas posições; em que procura envolver-se com a curiosidade dos alunos e dos diferentes caminhos e veredas, que ela os faz percorrer. Alguns desses caminhos e algumas dessas veredas, que a curiosidade às vezes quase virgem dos alunos percorre, estão grávidas de sugestões, de perguntas que não foram percebidas antes pelo ensinante. Mas agora, ao ensinar, não como um burocrata da mente, mas reconstruindo os caminhos de sua curiosidade — razão por que seu corpo consciente, sensível, emocionado, se abre às adivinhações dos alunos, à sua ingenuidade e à sua criatividade — o ensinante que assim atua tem, no seu ensinar, um momento rico de seu aprender. O ensinante aprende primeiro a ensinar mas aprende a ensinar ao ensinar algo que é reaprendido por estar sendo ensinado (FREIRE, 1993, p.27-38).

98

A formação profissional assume um papel que transcende o ensino

pedagógico e didático. Ela transforma-se na possibilidade de criação de espaços de

trocas e reflexões. O trabalho pedagógico, por sua própria natureza, é geralmente

construído e reconstruído, avança e recua, traz, muitas vezes, conflitos e faz com

que os professores envolvidos aprendam a se adaptar e possam conviver com

mudanças e incertezas.

Todo processo educacional é influenciado por valores pessoais e

representações das elaborações ocorridas em marchas anteriores. Os professores

também aprendem a partir de suas experiências e tem grande tendência, caso tenha

tido significado, em repeti-las, pois, enquanto seres humanos, interiorizam, adaptam

e experimentam os aspectos vividos em seu cotidiano, visto que, o processo

educativo é dinâmico e flexível (IMBERNÓN, 2006).

É provável que, em certo momento profissional, o professor estabeleça alguma

prática vivida enquanto aluno, transformando-a mesmo que de forma involuntária,

em modelo para sua atuação. Esta ação pode ser entendida como a socialização

comum que adquire fundamental importância nas idéias prévias do futuro professor,

que tece relações com experiências anteriores.

Em palestra proferida por Jair Militão da Silva (2007), reafirma-se a existência

de um movimento de mimetismo na maioria dos professores que buscam reproduzir

em sala de aula aquilo que acreditam ter melhor absorvido em suas relações com

seus mestres. Pautam a relação educacional prioritariamente no humano, para

suprir, na maioria das vezes, a defasagem de formação renegada ao segundo plano.

Esta falta de conhecimento, muitas vezes, é contornada pelo

assistencialismo, pois em nossa cultura ―ser bom é ser aceito‖, máxima esta,

utilizada no processo educacional como uma ―máscara‖ para uma educação

humanitária.

Torna-se urgente desfazer esse conceito assistencialista. Talvez uma

alternativa se encontre, mais uma vez, nas Instituições formativas que poderiam

tomar consciência da urgência de se oferecer um conhecimento seguro das Ciências

da Educação, principalmente a Pedagogia; de ter a cautela em aferir se ocorreu a

99

compreensão das informações oferecidas, estas, vinculadas a uma dose de

segurança para lidar com as mediações do processo de ensino-aprendizagem, que

com o passar do tempo, vão acrescidas de experiências, valorações de novas

habilidades inerentes ao cotidiano educacional.

Neste momento, encontra-se o que é considerado por Demo (1992, p.87)

como o pior vício da educação e, talvez, como a pior desculpa enquanto profissional

despreparado: ―apenas ensinam assim porque aprenderam assim‖, afirmação que

reduz ao profissional da educação, um papel de mero ―retransmissor‖ de

conhecimentos, justificativa para a sua desvalorização cultural e social.

Tais ações antecipam a passagem do aspecto de um modelo profissional

assistencial e voluntarista, que freqüentemente leva a um papel de técnico

―continuísta‖, ato que contribui para um tipo de educação acrítica dos indivíduos à

ordem social e torna o professor vulnerável ao entorno econômico, político e social.

Talvez, por terem os professores como concepção profissional, um ideal

humanitário de perfeição, considerado por muitos como utopia, se sintam tão

confusos em seu saber e em seu fazer. A utopia faz parte da formação profissional e

pessoal do professor; impulsiona a um objetivo maior, e valida a crença em serem

capazes de ―transformar algo, ou quem sabe alguém‖. Já o ideal de perfeição está

atrelado a valores e julgamentos pessoais, incontroláveis por quem os recebe e

subjetivos de quem o faz, e traz para a educação certa relatividade muito

comprometedora na qual todos os envolvidos se apóiam.

O aprender a conviver com as próprias limitações e o aprender com as

frustrações condicionantes produzidas pelo entorno da profissão reflete uma

maturidade intelectual tão necessária ao profissional docente, que encontra, muitas

vezes, um novo conceito de formação, conectado à autonomia, conceito este não

pertencente à sua formação profissional.

Os professores não podem refugiar-se numa atitude defensiva, têm de estar preparados para enfrentar as interpelações dos seus alunos. A definição da consciência e da responsabilidade profissional não se esgota no ato técnico de ensinar e prolonga-se no ato formativo de educar (NÓVOA, 1999, p.19).

100

Estes comportamentos sociais demonstram uma mentalidade cultural na qual

a superficialidade e o imediatismo estão latentes. Tais constatações podem refletir

no professor a figura do profissional obsoleto e burocrático que, ao invés de

colaborar para a solução de um problema, apenas o complica mais.

Tais situações reforçam a necessidade de entendimento sobre o momento

atual. Uma pós-modernidade, com ênfase no pluralismo e na divergência,

estreitamente ligadas à liberdade e à independência, em que a história da Educação

se apresenta num cenário de muitas histórias. Estas são dialeticamente interligadas

por entrecortes dos caminhos das teorias pedagógicas e diretamente atreladas a

interesses externos, fator que descaracteriza a história da Educação em sua função

social.

Só é possível um posicionamento justo e claro frente a uma situação, quando

se obtêm informações que contribuam de forma precisa e clara. Portanto, como

poderá o professor se posicionar frente à realidade educacional, se em sua grande

maioria não a conhece? Como saber qual é a metodologia mais adequada para o

aluno que irá trabalhar, se ele não sabe qual é a concepção de aluno existente

nesse momento em nossa cultura?

Pereira (2005) afirma que há tentativas com o intuito de integrar mente, corpo e

espírito na aprendizagem, parte-se do princípio de que o homem é um todo

inseparável e, como tal, conseguirá aprender. Na Declaração de Educação para

Todos, realizada na Conferência de Jomtien, Tailândia, em 1990, que proclama os

quatro pilares da educação como um referencial para a Educação do Século XXI,

um deles retrata o aprender a aprender que, para muitos estudiosos se tornou a

mais rápida e prática definição de aprendizagem. Emerge assim, como cerne da

discussão, o professor aprendiz, mentor de sua profissão e do processo de

aprendizagem (UNESCO, 2003).

Porém pouco se avançou na busca pela resposta em como fazer para se

conseguir sucesso nesse turbilhão educacional diário em que se observa

professores ávidos por soluções rápidas para seus problemas e também fatigados

de tantos julgamentos e superficialidades educacionais.

101

Vivemos numa cultura que acredita na formação do professor como algo a ser

propagado, algo para ser consumido, que se recebe de fora, como se a

responsabilidade por desenvolver-se fosse sempre do outro. Tal crença reforça a

reprodução dos modelos educacionais, nos quais o professor é considerado a

referência do que se deve reproduzir, o detentor do saber, o modelo a ser seguido,

mas com tão pouco valor.

Porém ninguém forma ninguém, ninguém se forma sozinho, o ser humano se

forma e se desenvolve nas trocas e nas reflexões que estabelece em sua vida,

sejam estas pessoas, leituras, erros e acertos e até ―imprevistos‖ que nos remetem a

outro caminho.

Para Imbernón (2006, p.23), o professor não deveria ser um ―técnico‖ que

desenvolve ou implementa inovações prescritas, mas deveria se converter em um

profissional participativo ativa e criticamente no verdadeiro processo de inovação e

mudança. Entretanto, ninguém realiza bem aquilo que não lhe foi permitido

aprender. Dotar o professor de uma bagagem sólida nos âmbitos científico, cultural,

psicopedagógico e pessoal em sua formação inicial e continuada, seria derrubar o

mito da aprendizagem simbólica, na qual os ritos pedagógicos são desenvolvidos,

isso proporcionaria um novo jeito de caminhar frente à profissionalização do docente

em sua formação.

Caberia aos profissionais da educação desenvolver a competência e a

capacidade de compreensão e análise de seus alunos, quanto à promulgação de

discursos ideológicos, muitas vezes, alienantes e massificantes, em nossa

educação. Tais discursos, feitos para atender às exigências de classes dominantes,

trazem para a realidade educacional a desconstrução da autonomia e a sensação de

despertencimento a essa sociedade aprendiz, que oprime a essência que cada

professor deveria ter em sua profissão (FRANCO. et al., 2007).

Ensinar é por excelência, uma atividade relacional: para coexistir, comunicar, trabalhar com os outros é necessário enfrentar a diferença e o conflito. Acolher e respeitar a diversidade, tirar proveito dela para melhorar sua prática, aprender a conviver com a resistência, os conflitos e os limites de sua influência, fazem parte da aprendizagem necessária de ser professor (MELLO, 2001, p.10).

102

Nesse ponto, muitos professores se apropriam de discursos ―partidaristas‖:

―Sou Tradicional, por isso...‖, ―Sou Construtivista, por isso...‖, como se esse discurso

justificasse a sua falta de conhecimento e a não identificação e aprofundamento

daquela que poderia melhor atendê-lo. Deixa transparente as lacunas de sua

formação profissional, formação essa realizada por intermédio de outros professores

que, também, se encontram inseridos nesse turbilhão de mudanças educacionais

que estão direcionadas a atender a demanda de nossa sociedade que passa

também por um caos em seus princípios norteadores.

Concordo com a concepção do pedagogo alemão Schimied Kowarzik que

acredita na Pedagogia como uma ciência da e para a educação; é antes de tudo um

campo científico, cuja natureza constitutiva é a teoria e a prática é sua dialética.

A pedagogia precisa pensar-se a si própria em sua relação com a prática na qual enraíza e a partir da qual e para a qual estabelece proposições. Por isso ela não é apenas ―uma diretriz no plano teórico da ciência da educação, mas a preocupação teórico-científica da fundamentação da Pedagogia como ciência que, enquanto prática, não possui seu sentido em si mesma, mas na humanização da práxis (KOWARZIK, 1983, p.15, apud LIBÂNEO, 2007, p.55-56).

Como ciência da educação, é auxiliada por outras ciências de diferentes

campos do conhecimento, que proporcionam o estudo da educação como práxis

social, que visa contribuir para a promoção de mudanças qualitativas no

desenvolvimento de uma sociedade mais justa, em que as pessoas estejam

inseridas e constituídas de habilidades e competências que proporcionem sua ação

como sujeitos na transformação social.

Kowarzik (1983. In: FRANCO. et al., 2007, p.69) afirma que todo professor

precisa reconhecer e dominar educacionalmente as situações educativas e suas

exigências, ratifica que capacitá-lo nesse sentido é a tarefa primeira das ações

pedagógicas.

Para Franco, Libâneo e Pimenta (2007, p.25):

É preciso que os cursos de Pedagogia assumam a responsabilidade de formar seus pedagogos, com condição legal de inserção no mundo social do trabalho, o que é muito diferente de formá-los para o mercado de trabalho, condição para que mudem as formas e os processos de oferecer à educação, o ensino, as políticas de educação de crianças, jovens e adultos,

103

os processos educativos formais e não formais, a gestão do ensino e das escolas e de instituições educativas e outras demandas sociais.

Há que se considerar que, para que a valorização profissional dos

professores aconteça, impõe-se a necessidade de reflexão sobre o curso proposto

para sua formação. Este, até os dias de hoje, sem uma definição identitária, ou seja,

sem disciplinas e objetivos específicos para a ação docente, contribui para o não

desenvolvimento do despertar nos futuros professores o reconhecimento

profissional.

A temática da identidade, especificamente da identidade profissional, é complexa, nova, com significados diferentes para a Psicologia, a Sociologia e para as outras ciências. É na expressão de Carrolo (1997, p.23), citando Zavalloni, ―um conceito à procura de uma ciência‖, de difícil consenso nas ciências humanas, ―e, mais difícil ainda, é sua operacionalização (ibidem, p.26, apud GUIMARÃES, 2004, p.28).

Sugere-se que a profissão docente admita um conhecimento pedagógico

específico, um compromisso ético e moral e a necessidade de dividir a

responsabilidade com outros atores sociais, já que exerce influência sobre outros

seres humanos, e não pode, portanto, ser uma profissão puramente técnica, de

processos de treinamento que o estigmatiza como um repassador de informações e

um grande observador das práticas de outros profissionais (receitas), como suporte

para sua atuação no palco educacional de ―especialistas infalíveis‖.

Ao se falar da docência, imediatamente questiona-se que profissional é esse.

Pela Legislação Educacional, este é reconhecido como o Professor, porém, frente às

propostas formativas, tão elasticamente elaboradas, fica-se com a sensação de

insegurança quanto a este perfil.

Que outra profissão se encontra com esta elástica formação acadêmica? Que

―garantias‖ de qualidade podem querer frente a esse panorama educacional de

arranjos e adaptações?

De modo geral, o profissionalismo na docência implica referência à

organização do trabalho dentro do sistema educativo e à dinâmica externa do

mercado de trabalho. Por ser uma profissão com aparência autônoma e intelectual,

instaurou-se em nossa cultura uma mentalidade de profissão assalariada, mais

104

administrativa do que intelectual, e sumamente tutelada e dependente dos poderes

públicos e particulares.

Tal debate parte da premissa de que esta profissão, frente à sua história de

formação, seja incapaz de criar conhecimentos profissionais próprios e se contente

em reproduzir a cultura e o conhecimento que outros cultivaram e desenvolveram, e

gere uma imagem social, profissional e administrativa, impregnada de falhas e

dissabores (LÜDKE; BOING; 2004).

Por um lado, os professores são olhados com desconfiança, acusados de

serem profissionais medíocres e deterem uma formação deficiente; por outro, são

bombardeados com uma oratória cada vez mais profusa, que os considera

elementos indispensáveis para a melhoria da qualidade do ensino e para o

progresso social e cultural.

Na última década da educação brasileira veio ocorrendo um paradoxo. A sociedade foi se tornando cada vez mais ―pedagógica‖, enquanto a quantidade e qualidade profissional dos professores foram diminuindo. O movimento de reformulação dos cursos de formação de educadores preocupou-se mais com o ―curso‖ e menos com as bases teóricas da Pedagogia. A ênfase da formação do docente reduziu o peso da formação pedagógica mais aprofundada (LIBÂNEO, 2007, p.64).

O excesso desses discursos tendem a esconder a pobreza da política de

formação. Remete-nos ao final do século XIX, quando os professores eram

encarregados de todos os poderes.

A sociedade, atualmente, manifesta grandes ambigüidades em relação à

escola e aos professores. Devido ao grande número de anseios sociais, emocionais,

familiares, e em menor proporção educacionais, que devemos lidar questiona-se se

as escolas são vistas pela sociedade como prestadora de serviços ou realmente

instituição educacional.

Despeja-se um excesso de expectativas frente ä missão da escola e dos

professores, ao mesmo tempo em que se desvaloriza e se enfraquece o estatuto

docente.

A cultura da perfomatividade vai sutilmente instalando nos professores uma atitude ou um comportamento em que eles vão assumindo toda a responsabilidade por todos os problemas ligados ao seu trabalho e vão se

105

tornando pessoalmente comprometidos com o bem-estar das instituições (SANTOS, 2004, p.1153).

Os professores da Educação Básica, a cada dia, apresentam mais problemas

de saúde, como o alto índice de estresse porque se sentem culpados por todas as

falhas ocorridas no processo de escolarização de seus alunos. É fato que o

professor tem responsabilidade com relação ao desempenho de seus alunos, mas

grande parte dos problemas que enfrenta nesse campo não está apenas atrelada ao

seu desempenho profissional, há fatores de ordem econômica, social e institucional

que também influenciam e muito.

Ao mesmo tempo em que as comunidades renunciaram sua função

educativa, surgiu uma nova noção muito nítida da importância da educação. O

século XX foi aquele em que mais se investiu na afetividade das crianças, mas foi

também aquele em que elas mais tempo passaram separadas das famílias. O que

não é possível fazer noutras áreas transferiu-se para o campo da educação. Só se

esqueceu de alertar ao professor que ―... ninguém pode carregar nos ombros,

missões tão vastas como aquelas que nos são acometidas e quem sabe por vezes

nos atribuímos‖ (NÓVOA, 1999, p.16).

Frente a este panorama, os professores devem redescobrir uma identidade

coletiva, que, para Silva (1996, p.93), significa compartilhar experiências de vida,

acreditar e fazer qualificar sua ação para que não caia no anonimato de uma massa,

e sim, formem uma associação humana e profissional que de maneira solidária e

com identidade própria possam elaborar as etapas sucessivas de sua

profissionalidade e assim cumprir o seu papel na formação das crianças e dos

jovens, a partir de uma nova concepção, na qual se situe o desenvolvimento pessoal

e profissional é a revalorização da ação educativa.

Se a educação pode ser, como querem as teorias reprodutivas, um elemento fundamental na reprodução de determinado sistema social, ela pode ser também elemento gerador de novas formas de concepções de mundo capazes de se contraporem à concepção de mundo dominante em determinado contexto sociocultural (SEVERINO, 1986, p.96).

Minha experiência profissional mostra que muitos professores têm a

convicção de que um bom desempenho em sala de aula não está vinculado apenas

à transmissão de conteúdos. Acreditam que seu maior empenho deva estar nas

106

estratégias de como esses conteúdos serão ministrados. No cotidiano, observa-se

que a falta da formação adequada, o escasso tempo para pesquisas e a prática em

sala de aula, baseada na Pedagogia do senso comum não contribuem para a tão

esperada mudança, ao contrário, colaboram para a permanência da situação, na

qual a reprodução é a base da educação.

Ao falar em senso comum, me aproprio das idéias de Cotrim (2002, p.46,

apud FRANCELIN, 2004, p.30), para as quais, senso comum são os conceitos

adquiridos em nosso cotidiano, que geralmente são aceitos como verdadeiros em

determinado meio social. Santos (2001, p.31) ratifica que, na pós-modernidade, o

senso comum é reconhecido como valor que enriquece a nossa relação com o

mundo, ou seja, ele também produz conhecimento, mesmo que seja um

conhecimento mitificado ou mitificador.

Todo processo de transformação é longo e crivado de dúvidas; quando sério,

deve estar pautado em estudos e buscas para a viabilização de melhorias

significativas e marcantes no mundo, ou seja, se é processual, não é e não poderá

ser realizado de modo simplista ou rápido, não deve acontecer como acasos, já que

são conseqüências naturais do processo de evolução do ser humano, que a cada

nova descoberta, ou necessidade, busca um novo caminho.

Tempo, cautela e critérios, são características fundamentais para uma ação

calcada na certeza. Entretanto, observa-se em nossos dias uma corrida desenfreada

em busca de remédios para as mazelas da educação, pois, enquanto seres

humanos e profissionais aguarda-se sempre a ação dos ―Santos Milagreiros‖.

Santos, esses, enraizados em nossa cultura do ―jeitinho brasileiro‖.

Parte-se da premissa de que escola não é um espaço de consenso, mas sim

de dissenso e também de conflito, a diferença gera a dúvida e fomenta a discussão

e o crescimento. Então, por que grande parte de nossos professores mediante tal

fato (escola lugar de conflito), aproveita tão mal essa oportunidade de

questionamento e transformação e realiza um projeto que não é a sua expectativa

profissional?

107

Somos muito ruins em realizar projetos dos outros. Constituímo-nos enquanto

seres humanos, porque sonhamos com algo, nunca vimos tantas dúvidas como

agora na educação. Será que essas dúvidas não estão ligadas ao fato de não existir

um desejo próprio de realização? Será que a formação do professor o motiva a ter

essa necessidade? Mesmo não concordando com o tédio existencial do homem

frente à barbárie instaurada, parece que o sonhar tornou-se difícil e tornou-se mais

fácil realizar o que o outro sonhou.

Os professores, muitas vezes, não acreditam neles próprios, esperam que

alguém diga o que fazer e como fazer. Tal ação demonstra a insegurança em sua

profissão, esta provavelmente vinda de sua formação. Em seu cotidiano, embasados

nesse ciclo vicioso, executam o que lhe foi pedido imediatamente sentindo-se ilesos

da responsabilidade sobre o resultado final.

O profissional que não tem certeza do seu dever demonstra sempre o ―achar‖,

o ―acreditar ser isso‖, mas a convicção não é clara e nem estabelecida. Clara no

sentido de estar escrita em nossas diretrizes educacionais e legislações,

estabelecida no sentido de ser propiciada nos cursos de formação profissional.

Para Demo (1992, p.24) ―apenas a Educação estaria apta a humanizar e a

sustentar a modernidade‖. Neste contexto, refere-se aos desafios das mudanças de

nossa sociedade, e contribui para a viabilização do desenvolvimento ao mesmo

tempo moderno e próprio.

Declara que de forma urgente necessitamos de uma educação muito diferente

da atual, precisamos de uma educação que busque o desenvolvimento, que maneje

e produza conhecimentos, que supere a exclusividade da didática ―ensino-

aprendizagem‖, tipicamente ―reprodutiva-transmissiva‖, e passe para a didática do

aprender a aprender, do saber a pensar, a ser criativo e crítico; habilidades estas,

fundamentais para aqueles que estarão num futuro próximo no trabalho nas salas de

aula de todo um país ávidos por melhorias educacionais.

Toda mudança gera conflitos e inseguranças, então, talvez a atitude em

acatar sirva como justificativa para o não ―errar‖ e apazigúe o grande medo de ser

responsabilizado por todas as mazelas sociais e educacionais.

108

Se espremermos todas as técnicas de produção e administração, das antigas às mais modernas, o suco é um só: o ser humano quer ser respeitado, quer agir, palpitar, participar, falar, pensar e emitir opiniões. Já se foi à época das relações feudais. A confiança habilita, o medo congela. Os sistemas hierárquicos baseados em estruturas de domínio e submissão limitam as interações sociais e impedem a cooperação humana inteligente (CURY, 1996, p.8).

E assim seguem os dias em nossa educação. De um lado, alunos, pais e

sociedade a cobrar melhores resultados; de outro, a escola e os professores

pressionados a atendê-los. Nossos alunos, filhos da pós-modernidade e da era

tecnológica, trazem em seus princípios o individualismo, no qual cada um é entregue

a si mesmo, mesmo sabendo que apenas o seu ser não basta enquanto seres

humanos, pois ―a espécie humana só é humana á medida que se efetiva em

sociedade‖ (SEVERINO, 2004, p.23).

Nossos alunos demonstram a necessidade de obterem conhecimentos

rápidos, utilitários e superficiais. Não há necessidade em verificar a veracidade dos

fatos, não há crivos no que é importante saber, o saber tornou-se objeto de poder.

O sujeito, aquele que interage que tem princípios e consciência, se coisifica

(reifica). As interações passam a ser frutos do processo de produção cultural

discursivo, e traz assim, com a subjetividade, a superficialidade das relações. Há o

deslocamento do nosso olhar; passa-se a observar a sociedade e não o homem.

Sociedade esta constituída por homens que demonstram estar em busca constante

de um porto seguro, que lhes traga informações e sabedoria, opções e

competências para a tomada de decisões.

A realidade nos remete a sensação de solidão, ―...freqüentemente, o

educador se sente perdido e jogado à própria sorte, tendo que encontrar, por sua

conta e risco, as saídas possíveis‖ (CAMARGO, 2004, p.13).

Esta sensação demonstra a grande defasagem de nossos profissionais, que

duelam com duas coisas terríveis para a educação: a ignorância e o modismo.

Reproduz-se o que se ouve e apropria-se de falsas idéias e falhas ações para se

propagar ―verdades subjetivas‖ sem haver a busca por uma fonte segura, então, não

se reflete para construir, ao contrário, se reproduz e ainda se espera transformar.

109

Somos filhos da má formação e do senso comum. ―Meu professor disse que,

então eu concluo que...‖, com isso criamos grandes ―achistas‖ e poucos

profissionais.

É preciso diferenciar o conhecimento científico do senso comum, o novo da novidade:

O novo está sempre vinculado a princípios e critérios em sua aplicação, baseados em experiência vivida, avaliada e reformulada. Diferente da novidade, que é instaurada como um modismo que vem e vai com a rapidez das trocas das estações (CORTELLA, 2006, p 8-11).

É do senso comum a idéia de que professores experientes são os que

possuem muitos anos de profissão, que se formam a partir de suas experiências

profissionais. Para Allain (2005, p.127), a construção da competência profissional

docente relaciona-se à abertura dos sujeitos ao enfrentamento de dilemas e a

disposição em enfrentá-los de maneira consciente.

Para Barth (1993), citado em Fiorentini, Souza Jr.& Melo (1998, p.315):

―Não é a idade que é fator determinante de nossas concepções, mas sim o número de encontros que tivemos com um determinado saber, assim como a qualidade da ajuda que tivemos para interpretá-los [...] O saber não é linear, não se constrói como um prédio onde se deve necessariamente começar pela base e acabar pelo teto [...] O nosso saber é o sentido que damos à realidade observada e sentida num dado momento‖.

Assinalar caminhos para a construção da identidade profissional do professor

não é tarefa simples, visto que não há consonância para a própria definição desta

profissão.

Allain (2005, p.122-123) traz a partir de diversos autores, alguns conceitos

sobre a profissionalização docente, dentre eles: o conceito de que a

profissionalização do professor está em permanente elaboração, e que deve ser

analisado em função do momento histórico concreto e da realidade social

(SACRISTÁN); O conceito que o professor é a pessoa, e uma parte importante da

pessoa é o professor, assim é necessário encontrar espaços de interação entre as

dimensões pessoais e profissionais, de forma crítica reflexiva, para haver a

reconstrução permanente de sua identidade pessoal e profissional (NÓVOA, 1992);

O conceito que acredita que nas profissões de interação humana como o magistério,

110

a personalidade do trabalhador é absorvida no processo de trabalho e constitui, até

certo ponto, a principal mediação de interação (TARDIF, 1999), e por último, o

conceito que argumenta que o trabalho diário com os alunos provoca no professor o

desenvolvimento de um conhecimento de si, de suas emoções e valores na sua

maneira de ensinar (GROSSMAM, 1995).

Deste modo pode-se concluir que a profissão docente impregna em si as

peculiaridades de seu objeto, que é o ser humano.

Esta definição vinculada ao legado de uma formação baseada na racionalidade

técnica tem levado os professores a um descrédito crescente pela profissão docente

frente à sociedade. Considerada como uma mera atividade técnica é entendida

como uma função que pode ser desempenhada por qualquer um.

Qualquer adulto alfabetizado e razoavelmente esclarecido sente-se gratificado por ensinar a uma criança sorridente uma operação mental ou convencer um jovem interessado a respeito de um modo de agir. A partir daí se julga muitas vezes esta tarefa simples, sempre prazerosa e ao alcance de qualquer professor. Contudo, esta simplicidade desaparece a medida que as salas de aula se abarrotam de alunos, para os quais o trabalho, o discurso e as normas escolares tem pouco sentido e, sobretudo, quando os professores não são,instados a serem os melhores (GUIMARÃES, 2004, p.31).

Para Carrolo (1997. In: ALLAIN, 2005, p.140), a origem desta interpretação

encontra-se em três aspectos principais:

1- ―A progressiva incompreensão e ausência de reconhecimento social da função docente;

2- A indefinição institucional da escola, gerando a proliferação de papéis exigidos ao professor;

3- E a deficiente percepção, por parte dos professores, do que é a sua profissão‖.

Eu incluo um quarto item aos citados acima:

A falta de critérios na elaboração do curso de formação para professores,

estes preparados muito mais com o lócus comercial do que com o pedagógico,

contribuem para a falta de qualidade educacional e profissional.

111

O projeto de um curso de formação, elaborado a partir dos elementos centrais

como saberes, práticas formativas e identidade profissional, deveriam constituir a

construção de estruturas para a melhoria de formação do professor.

Tais elementos traduziriam os saberes profissionais veiculados e corroboraria

na construção social a respeito desta profissão.

Sacristán (1995, p.65. In: GUIMARÃES, 2004, p.29) afirma que

profissionalidade docente é a afirmação do que é específico na ação docente, isto é,

o conjunto de comportamentos, conhecimentos, destrezas, atitudes e valores que

constituem a especificidade de ser professor. Porém nem sempre a identidade que

se quer, é a identidade que se tem socialmente. Esta é construída ou mantida em

relação à realidade que se almeja.

Para Guimarães (2005, p.30),

Assusta-nos constatar que os problemas de formação do professor, uma das pedras de toque para a melhoria da profissionalidade e da profissionalização, permanecem praticamente inalterados, pelo menos nas duas últimas décadas, o que torna ainda mais premente essa discussão e a busca efetiva de práticas formativas coerentes. (GATTI 1997; CANDAU 1997; LIBÂNEO 2000; SAMPAIO 2003, citando algumas obras mais recentes)

A elaboração da maioria dos cursos formadores ainda se pauta no paradigma

de formação que compreende que só a lógica da exposição, a consistência, a

cientificidade, a atualidade do conteúdo e a linguagem coerente são suficientes para

a formação do futuro professor.

A prática, constatada como fundamental na formação do futuro professor, só

tem espaço real no final do curso no formato de estágios. A reflexão sobre sua ação

quase nunca acontece e transforma este momento em mera etapa burocrática de

formação.

A busca pela quebra do paradigma da racionalidade técnica, que privilegia a

formação cumulativa e linear, para uma racionalidade prática em que se privilegiam

modalidades formativas articuladas com os contextos de trabalho, proporcionaria

emergir novos saberes profissionais de forma reflexiva, com competências para

112

atuar em contextos de incerteza e capacidade de resolver problemas complexos e

variados em seu próprio meio, a partir de saberes plurais (IMBERNÓN, 2006).

Além do contexto atribulado, a profissionalização do professor se torna ainda

mais complexa diante da falta de um sistema, da tradição na formação de

professores, da ausência de uma cultura profissional entre o professorado e da

distância entre as várias faixas de remuneração, principalmente entre os Ensinos

Fundamental e Superior.

Sem desconsiderar a interdependência dos vários fatores que envolvem a

questão de tornar um professor em um profissional da e para a educação com

certeza só acontecerá quando houver uma melhor qualificação nos cursos de

formação. A partir dessa conclusão, expressiva parte dos estudiosos está em busca

das especificidades da docência.

Enquanto agirmos de forma conformista em nossos cursos de formação que

nos oferecem níveis ínfimos de profissionalização, que proporcionam resultados

ultrajantes de profissionalismo (insensibilidade com a falta de sucesso escolar dos

alunos, rotinização, transmissão de conteúdos, dentre outros), a luta pela

valorização deste profissional e sua ressignificação na sociedade se esvaziará.

Continuaremos nós, professores a reclamar, mas a se contentar com o formato

pré-estabelecido por nossa sociedade, nem sempre consciente, mas na maioria das

vezes egoísta e excludente, que transfere para os ambientes escolares e por

conseqüência para seus profissionais, a expectativa da solução de todos os dilemas

em que estamos inseridos.

Dados do jornal, O Estado de São Paulo (2007), revelam que a Finlândia, país

1º colocado no PISA, investe 6,1% do seu Produto Interno Bruto (PIB) em ensino -

enquanto no Brasil, é investido apenas 3,9%, um dos mais baixos índices do mundo.

Os finlandeses são uns dos que mais gastam com o Ensino Médio: US$ 7.441 por

aluno, frente aos US$ 1.033 do Brasil. Como pode um país, como o Brasil, que em

2005 estava em 9º lugar do PIB Mundial e na Renda Per Capita em 45º lugar, estar

em 76º no IDE? (MEC/INEP, 2005). Fica impossível pensar em melhor qualidade de

educação e formação se não pensarmos em maiores e melhores investimentos.

113

Outro dado interessante fornecido pelo mesmo jornal (2009) revela que ―um

em cada quatro futuros professores do País se forma em cursos de má qualidade.

São 71 mil alunos em 292 cursos de Pedagogia que receberam os mais baixos

conceitos em avaliações do Ministério da Educação (MEC). Só nove dos 763 cursos

avaliados tiveram nota máxima. A má formação de professores é apontada por

especialistas como uma das causas da baixa qualidade do ensino - principalmente

público - no Brasil‖.

A quantidade de cursos de Pedagogia ruins cresceu desde a última

avaliação. Em 2005, eram 172 cursos com índices 1 e 2 no Exame Nacional de

Desempenho do Estudante (ENADE), o que equivalia a 28,8% do total, e agora

(2009) são 30,1%. A área que forma professores, coordenadores e diretores para as

escolas brasileiras, tem hoje 284 mil alunos. É a terceira graduação com o maior

número de estudantes no País e a mais numerosa entre as avaliadas no ano

passado (2008).

Frente a estes dados estatísticos, para muitos, desalentador, e para outros, a

constatação de uma realidade triste, porém esperançosa de um futuro melhor,

concluo que, ser professor, apesar de todas as deficiências do curso de formação,

falta de reconhecimento social, crise de identidade profissional e o eterno sentimento

de impotência frente a realidade educacional, é, acima de tudo, ser um eterno

apaixonado pela educação.

É ter a convicção de que esta profissão é sua real vocação. Vocação no

sentido do amor, do prazer sentido frente às pequenas realizações cotidianas, das

decepções encaradas como aprendizados, dos desafios diários a que são expostos,

das cobranças contínuas frente à necessidade de ser sábio e safo suficiente para

resolver e esclarecer uma situação problema sem deixar nenhum dos lados (alunos,

pais, escola ou o próprio professor) com a sensação de injustiça, e principalmente

ser representante de uma profissão humana capaz de contribuir para a

transformação educacional do futuro de nosso país.

Nada substitui o bom senso, a capacidade de incentivo e de motivação que só os bons professores conseguem despertar. Nada substitui o encontro humano, a importância do diálogo, a vontade de aprender que só bons professores conseguem promover. É necessário que tenhamos professores reconhecidos e prestigiados; competentes, e que sejam apoiados no seu trabalho, o apoio da aldeia toda. Isto é, o apoio de toda a sociedade. São esses professores que fazem a diferença. É necessário que eles sejam

114

pessoas de corpo inteiro, que sejam profissionais de corpo inteiro, capazes de se mobilizarem, de mobilizarem seus colegas e mobilizarem a sociedade, apesar de todas as dificuldades (NÓVOA, 2006, p.18).

115

CONCLUSÃO

A educação ao longo de toda vida é uma construção contínua da pessoa humana, do seu saber e das suas aptidões, mas também da sua capacidade de discernir e agir. Deve levá-la a tomar consciência de si própria e do meio que a envolve a desempenhar o papel social que lhe cabe no mundo do trabalho e da comunidade.

Delors.

Sou formada em Pedagogia e atuo na área da educação há 19 anos,

dezessete deles, como diretora de uma escola de Educação Infantil ao Ensino Médio

da rede particular de ensino, observo em meu dia-a-dia, de forma cada vez mais

intensa, uma desvalorização do professor por parte de nossa sociedade.

Talvez a mesma seja iniciada pelo próprio professor, que, na maioria das vezes,

não se reconhece enquanto profissional capaz de definir e realizar suas funções,

para a qual acredita estar habilitado.

Nessa incansável e inquietante realidade, busco através da história da

possível ciência que congrega toda essa responsabilidade - a Pedagogia, entender

melhor este profissional que considero ser o alicerce de sustentação dos grandes

pilares de nossa educação.

Descubro que seu sentido próprio nasceu entre os séculos XVIII e XIX e se

desenvolveu neste último, como uma história ideologicamente orientada, que

valorizava a continuidade dos princípios, dos ideais e da teoria, representados pela

Filosofia.

Tinha forte influência filosófica, ora positivista, ora idealista e ora espiritualista,

que se apresentada aos professores conforme interesses da época em que estava

inserida. Estes por sua vez, partícipes deste processo evolutivo da humanidade,

porém inconstantes frente à educação e suas diretas conseqüências.

Utilizo-me da análise documental de diversas bibliografias e de nossa

Legislação Educacional, especificamente das Leis de Diretrizes e Bases n. 4.024/61;

n. 5.692/72 e n. 9.394/96 e das Diretrizes Curriculares do Curso de Pedagogia

116

instituídas pela Resolução CNE/CP n. 1, de 15 de maio de 2006, para verificar a

composição ao longo dos anos da história dos Cursos de Formação de Professores.

Os cursos permeados por amplas particularidades e apresentados com pouco

aprofundamento em suas propostas curriculares, estas norteadas por matrizes

epistemológicas de caráter ideológico, cuja compreensão e exercício não refletem a

concepção de educação histórico-democrática, contribuem para que o desempenho

do professor passe a ter uma atitude muito mais interesseira do que interessante, no

antes, durante e depois da ação pedagógica.

Este método reformista encaminhado pelo movimento de modernização

neoliberal global, no qual se guiam as políticas educacionais do cenário mundial,

sobretudo, na América Latina, busca a ressignificação de paradigmas e de

modernização do Estado, que é fundamental para o país se tornar competitivo no

mercado internacional, limitando o curso de formação a um curso técnico.

O professor como técnico segue o modelo da racionalidade técnica e passa

a ser entendido como um profissional especializado que aplica normas e regras

originadas do saber científico, estes, muitas vezes, embutidos de características

práticas, complexas, incertas e cheias de conflitos de valores.

Constata-se que tais paradigmas se expressam nos princípios e processos de

flexibilização e se articulam com as diretrizes político-ideológicas das macro-

reformas mundiais orientadas por organismos internacionais, em especial a

Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO)

e o Banco Mundial (BM).

A formulação curricular proposta, confronta-se com o movimento das

mudanças sociais no país que espera uma formação pautada na qualidade e no

profissionalismo, contradiz ainda as perspectivas apontadas historicamente pelos

profissionais da educação quanto à identidade docente a ser alcançada nos cursos

de formação.

Apesar de afirmado nas Diretrizes Curriculares do Curso de Pedagogia, que

sua essência é a formação de professores, não se observa com clareza propostas

para que se faça de forma eficiente esta formação. Na maioria das vezes, este curso

se torna instrumento de garantia e manutenção da racionalidade que move o

117

discurso do neoliberalismo e explicita o vínculo entre educação e operosidade numa

visão genuinamente economicista.

Perde-se o foco pedagógico na formação do professor, este passa a ser um

produto com reflexos dos momentos histórico, político e cultural, elaborado de forma

utilitarista para atender a demanda de nossa sociedade e as expectativas impostas

pelos órgãos internacionais ao nosso país.

As proposições imbricadas não colaboram para a definição dos princípios e

finalidades pedagógicas deste curso de formação, o que acarreta conflitos e

divergências quanto às iniciativas dos órgãos competentes na elaboração deste

curso formador.

Tal situação sanciona a falta de perspectivas e a desvalorização deste

profissional em nossa sociedade. O não atendimento aos anseios de nossos alunos

reflete na busca desenfreada por uma formação adequada. Há um sentimento de

luto, de perda dos referenciais identitários de sua atuação docente.

Estas incertezas propiciam cada vez mais a figura do professor à falta de

identidade frente a sua profissão. Quem é este profissional tão necessário a

transformação social mundial, mas tão desacreditado frente sua clientela? Qual é

seu papel enquanto profissional da educação? Porque a grande dificuldade em se

reconhecer como profissionais da educação?

A pesquisa indicou que só de forma coletiva, solidária e crítica será possível

enfrentar estes desafios que ainda não estão ao nosso alcance e na esfera de nossa

decisão.

Talvez a formação do professor assuma um papel que transcende o ensino

acadêmico e transforme-se num espaço de reflexão, participação e adaptação frente

às diversidades e incertezas do mundo pós-moderno.

O que importa é não admitir a mediocridade do mundo como projeto diante

das irresoluções educativas, mas ter a ousadia de levar em frente probabilidades

que a lei revela ao mundo vivido, ao mundo real, para dar maior definição à

formação docente e aferir a necessária valorização profissional do professor.

Adequar os moldes de um currículo normativo, que apresenta, primeiramente,

a ciência, depois detalha sua aplicação e por último o seu estágio, aos moldes de

118

formação reflexiva em que se prepondera a reflexão sobre sua experiência, o

aperfeiçoamento de sua ação, e propicia assim, mudanças em suas práticas

docentes, que deixariam de ser mecânicas e reprodutivas para serem pensadas e

repensadas.

Aliás, a idéia surgida em 1962, pelos pensadores da educação, já era

considerada como uma grande alternativa para a melhoria da qualidade formativa.

Entendida por formação in-service training para o magistério, era uma reivindicação

generalizada por parte dos programas que se delineavam. No entanto, esta proposta

foi abortada por representar um alto custo para as Escolas de Formação. Ao

contrário das Escolas de Formação em Medicina que acreditavam e ainda acreditam

na residência, os responsáveis pela educação menosprezaram tal iniciativa.

Passado mais de quarenta anos deste fato (Escolas de Formação), eis que me

deparo com uma reportagem da Revista Veja/Junho de 2009, sobre uma das

melhores Escolas de Formação de professores do mundo.

Intitulada como ―Ensinar é para os melhores‖, esta reportagem refere-se ao

Instituto Nacional de Educação em Cingapura dirigido pelo Senhor Lee Sing Kong.

Tal Instituto considera que a formação faz a diferença na educação de um país,

e norteia seus princípios na valorização do professor a partir de um rigoroso critério

de seleção para os candidatos.

Neste Instituto só estudam os melhores! Quem seriam estes? Para cada vaga há

uma concorrência de seis alunos, apenas os 30% melhores do Ensino Médio

ingressam neste curso.

Os futuros professores são valorizados, criam-se expectativas de boa

remuneração, o salário inicial corresponde ao de um engenheiro, fator que contribui

para o reconhecimento social. No dia dos professores, o Presidente faz questão de

receber aqueles que deram contribuições especiais para suas escolas.

Suas Diretrizes Curriculares propõem técnicas pedagógicas cuja eficiência já

tenha sido comprovada cientificamente. Acreditam na pesquisa constante e no

119

desenvolvimento de novas metodologias que são testadas na prática com estudos

longos e sistemáticos.

Os alunos são incentivados a trabalhar em equipe e a solucionar situações-

problema. Pautadas nas diversidades essas DCNs de Cingapura, habilitam seus

futuros professores para realizar diversas tarefas ao mesmo tempo de forma

qualificada e consciente. O docente interage para assumir suas escolhas e

consecutivamente suas responsabilidades e não assistir de forma passiva os

acontecimentos educacionais.

Cerca de 30% do curso é cumprido nas escolas. Os alunos, conforme proposto

por nossos estudiosos em 1962, porém descartados por nossos dirigentes, passam

por uma espécie de residência médica, em que, efetivamente, ministram aulas

monitoradas por seus mestres, estes muito mais experientes e prontos a apontar os

caminhos mais adequados.

É fato que uma comparação entre Cingapura e o Brasil, seja ela educacional,

territorial, cultural ou política, seria no mínimo incoerente. O que busco retratar com

esta reportagem é um exemplo de que se houver determinação política, seriedade

dos profissionais envolvidos e uma luta contra o conformismo por parte da

sociedade, a realidade poderá ser transformada.

Apesar de o magistério hoje ser a opção para quem não tem melhores

colocações no mercado de trabalho, e por conseqüência, refletir o sentimento de

desencantamento e despertencimento tão presente em nossas escolas, o exemplo

elucidado me trouxe a certeza de que há esperanças para a melhoria deste curso de

formação.

Não adiantará mais oferecer para o mercado de trabalho o diplomado,

precisamos de professores com qualidade, pois a sociedade e seus instrumentos de

controle começam a cobrar de nossos professores a solução de muitos dos

problemas políticos e culturais de nossa sociedade.

120

Não podemos eleger um único culpado para a situação instaurada, esta

representa o resultado de uma história construída a partir das circunstâncias sociais,

econômicas e políticas atreladas aos interesses de poucos em detrimento de muitos.

Temos que lutar por uma mudança completa de cultura, um novo conjunto de

valores e princípios que nos colocarão frente ä fronteira para se transformar do

depositário do conhecimento ao orientador para a solução de problemas. Porém,

não vejo uma demanda pela qualidade e isto me incomoda muito. Ouço diariamente

os discursos sobre a insatisfação educacional, profissional e política, mas com

quase nenhuma ação de real melhoria. Preferimos nos lamentar a agir de forma

assertiva.

Não temos a intenção e nem a cultura de sermos um povo pensante e talvez,

desta forma, encontrar políticas curriculares para uma melhor proposta de formação

que hoje se encontra ―esquizofrênica‖ por não conseguir voltar seu objetivo para a

Educação Básica, ―bicéfala‖ por dividir seus professores em professores do Ensino

Fundamental I e Ensino Fundamental II, e ―autista‖, pois os cursos de formação não

associam, em sua grande maioria, a formação proposta com a necessidade da

sociedade atual.

O currículo proposto para os cursos de formação não está atrelado äs

competências exigidas do professor. Não se ensina o que precisa, talvez por não

saber o que realmente é primordial.

Apesar de estar certa sobre minha escolha profissional e o caminho que quero

delinear a ela, sozinha não tenho forças para mudar, mas me beneficio da vontade e

solto a voz que já não quer mais calar frente às mediocridades existenciais. De que

maneira acredito ser possível? Dentre elas arrisco citar:

O processo de formação deverá prestar atenção no que realmente produz

a aprendizagem. Só podemos ser respeitados e reconhecidos no

momento que agregarmos valores a outrem. Fazer o que todo mundo faz

não diferencia você da massa.

121

Atualizar os cursos de Pedagogia, para que estes possam formar seus

professores numa abordagem por competências e habilidades. O ENEM

que a partir de 2009 passou a ser uma das maiores aferições para o

ingresso nas Universidades já está formulado a partir desse enfoque,

então por que o curso de formação de professores ainda não possui um

currículo pautado nas competências e habilidades daqueles que irão

capacitar os alunos?

Estimular a formação continuada quebrando o paradigma de que a

formação inicial e o diploma conferido basta para uma certificação de

qualidade.

Apesar de constatar a visão utilitarista dos cursos de formação e o grande

sentimento de impunidade frente ä avaliação dos cursos considerados inadequados

e que formam profissionais ruins que apresentam uma mentalidade de conformismo

exacerbado e que são absorvidos pelo mercado de trabalho; acredito que a atuação

desses profissionais possa melhorar se promovida dia-a-dia, aula a aula de forma

planejada e valorizada.

Espero que esta pesquisa, apesar de ser uma gota num imenso oceano, possa

oferecer reflexões àqueles que, como eu, acreditam na educação e no profissional

da educação e, desta forma, não congregam do conformismo observado frente aos

resultados de nossa educação.

122

REFERÊNCIAS

AGÊNCIA ESTADO. MEC: um em cada 4 professores se forma em curso ruim.

O ESTADO de SÃO PAULO, São Paulo, 4 set. 2009. Educação. Disponível em

<http://www.estadao.com.br/noticias/geral,mec-um-em-cada-4-professores-se-forma-

em-curso-ruim,429525,0.htm>. Acesso em 8 de setembro de 2009.

AGUIAR, M. A. da S.; BRZEZINSKI, I. FREITAS, H. C. L.; SILVA, M. S. P. da S.;

PINO, I. R. Diretrizes Curriculares do Curso da Pedagogia no Brasil: disputas

de projetos no campo da formação do profissional da educação. Revista

Educação e Sociedade. V.27.n. 96. Especial, p.819-842, Out. 2006.

AGUIAR, M. A. da S.; MELO, M. M. de O. Pedagogia e diretrizes curriculares: polêmicas e controvérsias. Volume 11, n. 20, p. 119-138, Jan/Junho/2005.

Disponível em: <http://www.fe.unb.br/linhascriticas>. Acesso em 26 de maio de 2008.

ALLAIN, L. R. Ser professor: O papel dos dilemas na construção da identidade profissional. São Paulo: Annabluem; Belo Horizonte: FUMEC, 2005.

AMORIM, N. R. do C. Ética e moral na formação inicial de professores. São Paulo, 2008. ANTUNES, M.A.M. Psicologia Escolar e Educacional. São Paulo, 2002. Disponível em: <http://www.scielo.bus-psi.org.br>. Acesso em 25 de agosto de 2009. ARAUJO, S. L. G de: Formação do Pedagogo: Fundamentos Legais e Atribuições no Curso de Pedagogia(1939-2006). VI Seminário da REDESTRADO

(Regulação Educacional e Trabalho Docente). 06 e 07 de novembro de 2006. UERJ- Rio de Janeiro- RJ.

BARBOSA, F. A. Formação de Professores: Uma história de descaso e dificuldades. Disponível em: <http://www.utp.br/mestradoemeducacao/peddc.html>. Acesso em 15 de abril de 2009.

123

BOING, L. A; LUDKE, M. O trabalho Docente nas páginas de Educação e Sociedade em seus (Quase) 100 números. Revista Educação e Sociedade n. 100,

p.1179-1201, Out. 2007. Disponível em: <http://www.cedes.unicamp.br>. Acesso em 17de outubro de 2008.

BOLETIM DA ANFOPE. v.7, n.15, dez. 2001.

BOLLMANN, M. da G. A Educação e os movimentos de resistência no Brasil. Disponível em: <http://appsindicato.org.br>. Acesso em 29 de julho de 2009.

BRASIL. Decreto-Lei n. 1.063 de 20 de janeiro de 1939. Dispõe sobre a transferência de estabelecimentos de ensino da UDF para a Universidade do Brasil Publicado no Diário Oficial, seção II, em 2/02/1939. BRASIL. Decreto-Lei n. 1.190 de 04 de abril de 1939. Organização da Faculdade

Nacional de Filosofia. In: Nóbrega, V. L. Enciclopédia da legislação do ensino. Rio de Janeiro, v. 2, p. 562-570, s.d.1939a.

BRASIL. Lei n. 4024/61, de 20 de dezembro de 1961. Lei que fixa as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1961.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Documenta n. 1, Março de 1962. Conselho Federal de Educação. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1962.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Documenta n. 3, Maio de 1962.

Conselho Federal de Educação. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1962a.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Documenta n. 4, Junho de 1962.

Conselho Federal de Educação. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1962b.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Documenta n. 6, Agosto de 1962.

Conselho Federal de Educação. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1962c.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Documenta n. 10, Dezembro de 1962. Conselho Federal de Educação. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 196 d.

124

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Documenta n. 11, Janeiro/Fevereiro de 1963. Conselho Federal de Educação. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1963.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Documenta n. 12, Março de 1963. Conselho Federal de Educação. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1963a.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Documenta n. 20, Novembro de 1963.

Conselho Federal de Educação. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1963b.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Documenta n. 21, Parte II. Dezembro de 1963. Conselho Federal de Educação. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1963c.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Documenta n. 22, Parte I. Janeiro de 1964. Conselho Federal de Educação. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1964.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Documenta n. 24, Abril de 1964. Conselho Federal de Educação. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1964a.

BRASIL. Lei n. 5.540, de 28 de novembro de 1968. Lei que fixa normas de organização do ensino superior e sua articulação com a escola média, e dá outras providências. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1968.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Currículos Mínimos dos Cursos Superiores-33- Separata das Documentas: 96-100-101-102-103-104-105-106-108. 1968-1969. Conselho Federal de Educação. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1968a - 1969.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Documenta n. 103, Julho de 1969. Conselho Federal de Educação. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1969a.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Documenta n. 105, Setembro de 1969. Conselho Federal de Educação. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1969b.

125

BRASIL. Decreto-Lei n. 66.600 de 20 de maio de 1970. Cria Grupo de trabalho No Ministério da Educação e Cultura para estudar, planejar e propor medidas para a atualização e expansão do Ensino Fundamental e do Colegial. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1970.

BRASIL. Lei n. 5.692, de 11 de agosto de 1971. Lei que fixa as Diretrizes e Bases para o ensino de 1º e 2º graus, e dá outras providências. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1971.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Documenta n. 141, Agosto de 1972. Conselho Federal de Educação. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1972.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Documenta n. 149, Abril de 1973. Conselho Federal de Educação. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1973.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Documenta n. 154, Setembro de 1973.

Conselho Federal de Educação. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1973a.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Documenta n. 155, Outubro de 1973.

Conselho Federal de Educação. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1973b.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Documenta n. 160, Março de 1974.

Conselho Federal de Educação. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1974.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Documenta n. 163, Junho de 1974. Conselho Federal de Educação. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1974a.

BRASIL. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1996.

BRASIL. Resolução Conselho Nacional de Educação n. 1, de 30 de setembro de 1999. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 1999.

126

BRASIL. Parecer CNE/CP 9/2001, 8 de maio de 2001. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 2001.

BRASIL. Resolução n.1, de 15 de maio de 2006. Institui diretrizes curriculares nacionais para o curso de pedagogia – licenciatura. Brasília: Secretaria Geral/ MEC, 2006.

BRZEZINSKI, I. (org). LDB Interpretada: diversos olhares se entrecruzam. São Paulo, Editora Cortez, 1997.

_________ Pedagogia, pedagogos e formação de professores. Busca e movimentos. Campinas, SP. Editora Papirus, 1996.

CAMARGO, F. Escola: espaço de cultura e formação. Disponível em:

<http://www.clm.com.br/espaco/info 11 a2.html>. Acesso em 07de janeiro de 2004.

CAMBI, F. História da Pedagogia; tradução Álvaro Lorencini- São Paulo, Fundação

Editora da UNESP (FEU), 1999.

CAMPANHOLE, A. e CAMPANHOLE, H. L. Todas as Constituições do Brasil. São

Paulo, Editora Atlas S.A, 1971.

CAMPOS, J. T. de. As políticas de formação dos professores paulistas antes, durante e depois da pedagogia tecnicista. Revista E-Curriculum, São Paulo, n. 1,

dez.-jul, 2005-2006.

CEFAM. Legislação. Disponível em: <http://www.perfil.sp.gov.br>. Acesso em 20 de

abril de 2009.

CHIZZOTI, A. Pesquisa em ciências humanas e sociais. 2 ed. São Paulo: Cortez,

1995.

CORTELLA, M. S. A Alma da Educação. Revista Super escola, n. 6, p. 8-11, 2006.

127

CURY, C. R. J. A formação docente e a educação Nacional. Disponível em: <http//www.portal.mec.gov.br/cne/arquivos/pdf/conselheiro>. Acesso em 15 de abril de 2009.

CURY, G. C. É hora de repensar a organização. O Estado de São Paulo, 30 de

agosto de 1996.

DEMO, P. Educação e Qualidade. 2 ed. Campinas, SP: Papirus,1995.

_________ Formação de professores Básicos. Em Aberto, Brasília, n. 54, p.23-

42, Abr./Jun. 1992. Disponível em: <http://www.inep.gov.br>. Acesso em 15 de abril de 2009.

DUBAR, C. A socialização: Construção das identidades sociais e profissionais.

Tradução Andréa Stahel M. da Silva. São Paulo: Martins Fontes, 2005.

EVANGELISTA, O; SHIROMA, E. O. Professor: protagonista e obstáculo da reforma. Revista Educação e Pesquisa, n. 3, p. 531-541, Set./Dez. 2007.

FAZENDA, I. C. A. Integração e Interdisciplinaridade no Ensino Brasileiro: Efetividade ou Ideologia? 3 ed. SP: Edições Loyola, 1993.

FERREIRA, M. B. A Lei 9.394/96 e o contexto da formação do professor alfabetizador. Julho de 2007. Disponível em:

<http://www.nutead.uepg.br/artigos/24pdf>. Acesso em 15 de abril de 2009.

FERREIRA, N. S. C. Diretrizes curriculares para o curso de pedagogia no Brasil: a gestão da educação como gérmen da formação. Revista Educação & Sociedade, n. 97, p. 1341-1358, Set./Dez. 2006.

FRANCELIN, M.M. Ciência, senso comum e revoluções científicas: ressonâncias e paradoxos. Ci. Inf; Brasília, v.33, n.3; p-26-34. Set/Dez. 2004.

Artigo publicado em 29 de março de 2005. Disponível em:<http://www.scielo.br>. Acesso em 15 de abril de 2009.

128

FRANCO, M. A. S; LIBÂNEO, J. C.; PIMENTA, S. G. Elementos para a formulação de diretrizes curriculares para cursos de Pedagogia. Revista Cadernos de

Pesquisa, n. 130, p. 63-97, Jan./ Fev./ Mar./ Abr. 2007.

FREIRE, P. Professora sim, tia não. Cartas a quem ousa ensinar. Editora Olho

D'Água, 10 ed., p. 27-38, 1993.

FREITAS, H. C. L de. A reforma do Ensino Superior no campo da formação dos profissionais da educação básica: As políticas educacionais e o movimento dos educadores. Revista Educação & Sociedade, ano XX, n. 68, Dez. 1999.

____________ Formação de Professores no Brasil: 10 ANOS de Embate entre projetos de Formação. Educação & Sociedade. Vol.23, n.80. Campinas. Set/2002.

FREITAS, L. C. de. Em direção a uma política para a formação de professores. Revista Em Aberto, n. 54, p.03-20, Abr./Jun. 1992. Disponível em: <http://www.inep.gov.br>. Acesso em 15 de abril de 2009.

FURLANETO, E.C; MENESES, J. G. C e PEREIRA, P. A. (orgs). A escola e o Aluno: relações entre o sujeito-aluno e o sujeito-professor. São Paulo: Avercamp, 2007.

GADOTTI, M. Perspectivas atuais da educação. São Paulo em Perspectiva, 14 de fevereiro de 2000. Disponível em: <http://www.seade.gov.br>. Acesso em 20 de outubro de 2008.

GASPAR, M. A D. CEFAM: Lócus de formação para o aluno e o professor. Disponível em: <http://www.urutagua.uem.br>. Acesso em 29 de abril de 2009.

GAUTHIER, C; MELLOUKI, M. O professor e seu mandato de mediador, herdeiro, intérprete e crítico. Revista Educação e Sociedade, n. 87, p. 537-571,

Mai./Jun./Jul./ Ago. 2004. Disponível em: <http://www.cedes.unicamp.br>. Acesso em: 22/10/2008

129

GIOVANNI. M. L; MARIN. A. J. Expressão escrita de concluintes de curso universitário para formar professores. Revista Cadernos de Pesquisa, n. 130, p.

15-41, Jan./Fev./Mar./Abr. 2007.

GOMES, R. de C. M. Formação de professores: Um olhar ao discurso do docente formador. Revista E-Curriculum, n. 3, dez. 2006.

Gráfico1- Distribuição Percentual do Número de Vagas nos Processos Seletivos, por Categoria Administrativa - Brasil 1993-2003. Disponível em:

<http:// www.inep.gov.br>. Acesso em 25 de maio de 2009.

GUIMARÃES, V.S. Formação de Professores: Saberes, identidade e profissão. 3 ed. Editora Papirus, 2004.

HALL, S. A identidade cultural na pós – modernidade. Tradução Tomaz Tadeu da

Silva, Guaracira Lopes Louro – 10 ed. – Rio de Janeiro: DP&A, 2005.

IMBERNÓN, F. Formação docente e profissional: Formar-se para mudança e a incerteza. São Paulo: Cortez, 2006.

JAPIASSU, H. A Crise da razão e do saber objetivo. As ondas do irracional. São Paulo: Editoras Letras e Letras, 1996.

KULLOK, M. G. B. Formação de professores para o próximo milênio: novo lócus? São Paulo: Annablume, 2000.

LIBÂNEO, J. C. Adeus professor, adeus professora? Novas exigências profissionais e profissão docente. 7 ed. São Paulo: Cortez, 2003. (Coleção

questões da nossa época; 67).

_________ (2006) Diretrizes curriculares da pedagogia: imprecisões teóricas e concepção estreita da formação profissional de educadores. Educação &.

Sociedade. Campinas, vol. 27, n. 96 – Especial, p. 843-876, out. 2006. Disponível em <http://www.cedes.unicamp.br>. Acesso em 25 de abril de 2008.

_________ (2007). [9 ed.]. Pedagogia e pedagogos para quê? São Paulo: Cortez.

130

LUDKE, M.; BOING. L. A. Caminhos da Profissão e da Profissionalidade Docentes. Revista Educação e Sociedade, Campinas, n. 89, p. 1159-1180,

Set./Dez. 2004. Disponível em: <www.cedes.unicamp.br> Acesso em 17 de julho de 2008.

LYOTARD, J. F. A condição pós-moderna; tradução: Ricardo Corrêa Barbosa; Posfácio: Silvano Santiago – 9 ed. – RJ: José Olympio, 2006.

MELLO, G. N. de. Formação Inicial de Professores para a Educação Básica: uma (re)visão radical. OEI- Ediciones- Revista Iberoamericana de Educación, n.25. Jan./ Abril. 2001.

MICHELS, M. H. Gestão, formação docente e inclusão: eixos da reforma educacional brasileira que atribuem contornos à organização escolar. Revista

Brasileira de Educação. ANPED- Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação. n.33, p.406. 2006.

MORENO, L. V.A; ROSITO, M. M. B. (orgs). O sujeito na educação e saúde: desafios na contemporaneidade. São Paulo: Centro Universitário São Camilo;

Edições Loyola, 2007.

NISKIER, A. LDB- A Nova Lei da Educação. 2 ed. Edições Consultor. 1997.

NÓVOA, A. Os professores na virada do milênio: do excesso dos discursos à pobreza das práticas. Revista Educação e Pesquisa, n.1, p.11-20, Jan./Fev./ Mar./ Abr/ Mai./ Jun. 1999.

_________ Desafios do trabalho do professor no mundo contemporâneo. Palestra proferida em outubro de 2006 no SINPRO (Sindicato dos Professores de São Paulo)

PEREIRA, P. A. O que é pesquisa em educação? São Paulo: Paulus, 2005.

PEREIRA, C. Ensinar é para os melhores. Revista Veja, n. 22, p. 101-102, Jun.

2009.

131

PERRENOUD, P. In: Espaço Pedagógico (Universidade de Passo Fundo, Brasil), vol. 6, n. 2, dezembro 1999, pp. 105-121. Artigo "Dix non dits ou la face cachée du métier d’enseignant ", originalmente publicado na revista Recherche et Formation, INRP/França, n. 20, p. 107-124, 1995. Autorizado para tradução e publicação. Trad. de Maria Helena Camara Bastos e Clélia Guimarães, revisão de Ellen Garber.

ROLDÃO, M. do C. Função docente: natureza e construção do conhecimento profissional. Revista Brasileira de Educação, v. 12, n. 34, p. 94-103, Jan./Abr. 2007.

ROMANELLI, O. de O. História da educação no Brasil. Petrópolis: Vozes, 1978.

ROSA, S. S. da. Gestão Estratégica e Currículo: (Re) construindo a Identidade do Curso de Pedagogia a partir das demandas sociais. Revista E-Curriculum,

São Paulo, v.3, n.1, dezembro 2007.

SANTOS, B. de S. A crítica da razão indolente: contra o desperdício da experiência. 3 ed. São Paulo. Cortez, 2001.

SANTOS, I. da S. F; PRESTES. R.I; VALE. A. M dos. Brasil, 1930-1961: Escola Nova, LDB e Disputa entre Escola Pública e Escola Privada. Revista HISTEDBR

On-line, Campinas, n. 22, p.131-149, Jun. 2006-ISSN: 1676-2584. Disponível em: <www.histedbr.fae.unicamp.br/art10_22.pdf>. Acesso em 24 de março de 2009.

SANTOS, L. L. de C. P. Formação de professores na Cultura do Desempenho. Educação e Sociedade, Campinas, vol. 25, n.89, p.1145-1157, Set./Dez. 2004.

SAVIANI, D. A nova Lei da educação: trajetórias, limites e perspectivas. 3 ed.

Campinas, SP: Autores Associados, 1997. (Coleção educação contemporânea)

_________ Escola e Democracia: teorias da educação, curvatura da vara, onze teses sobre a educação política. 38 ed. Campinas. SP: Autores Associados, 2006.

_________ Pedagogia: O espaço da educação na universidade. Cadernos de

Pesquisa, v.37, n. 130, p.99-134, jan./abr. 2007.

132

_________ Formação de professores: aspectos históricos e teóricos do problema no contexto brasileiro. Revista Brasileira de Educação. V.14, n.40.

jan./abr. 2009.

_________ Versão condensada do texto correspondente à conclusão da primeira etapa da pesquisa “O espaço acadêmico da pedagogia no Brasil: perspectiva histórica e teórica”, em desenvolvimento junto ao Departamento de Psicologia e

Educação da FFCLRP, com apoio do CNPq. Uma versão ainda mais resumida foi apresentada no XXV Congresso da ISCHE (International Standing Conference for the History of Education), em São Paulo, julho de 2003. A definição das diretrizes para o curso de pedagogia. Disponível em: <http://www.anped.org.br>. Acesso em 26/05/08.

SCHEIBE, L. Diretrizes Curriculares para o curso de Pedagogia: Trajetória longa e inconclusa. Cadernos de Pesquisa, n.130, p. 43-62, Jan./Abr. 2007.

SEVERINO, A. J. Educação, Ideologia e Contra-Ideologia. SP: EPU, 1986. Temas Básicos de Educação e do Ensino.

____________ Revista de Educação. AEC- Brasília, 1998. Disponível em:

<http://www.educacao.pe.gov>. Secretaria Executiva de desenvolvimento da educação. Acesso em 29 de abril de 2009.

___________ Educação, Trabalho e Cidadania: a educação brasileira e o desafio da formação humana no atual cenário histórico. 2000. Disponível em:

<http://www.scielo.br>. Acesso em 29 de abril de 2009.

___________ Ciência & Opinião. Curitiba, v.1. n. 2/4, julho.2003, Dezembro. 2004.

Disponível em: <http://www.cienciaopiniao.up.ed.br>. Acesso em 29 de abril de 2009.

___________ Metodologia do Trabalho Científico. 23 ed. rev. e atualizada- São

Paulo: Cortez, 2007.

SILVA, C. S. B. Curso de Pedagogia no Brasil. São Paulo: Autores Associados,

1999.

133

___________ Diretrizes curriculares para o curso de pedagogia no Brasil: um tema vulnerável às investidas ideológicas. 2006. Disponível em:

<www.ced.ufsc.br>. Acesso em 26/05/08.

SILVA, J. M. da. A Autonomia da Escola Pública: a re-humanização da escola.

Campinas: Papirus. 2004. 7 ed.

SILVA, J. M. da (org.) Os educadores e o cotidiano escolar. 2000. Campinas:

Papirus.

SILVA, S. M. da. Diretrizes curriculares nacionais e a formação de professores : flexibilização e autonomia. Campinas, SP: [s.n.], 2006. Disponível em:

<http://www.libdigi.unicamp.br>. Acesso em 20 de outubro de 2008.

TANURI, L. M. História da formação de professores. Revista Brasileira de Educação. Mai/Jun/Jul/Ago, 2000, n. 14, p.61- 88.

TEIXEIRA. A. O problema de formação do magistério. Estudo especial apresentado ao Conselho Federal de Educação, publicado originalmente n.104, p.278-287, Out/Dez, 1966. Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos. Brasília, n. 200/201/202, p.199-206, Jan/Dez.2001.

__________ A lei de Diretrizes e Bases- Depoimento e Debate sobre o Projeto da lei de Diretrizes e Bases (1ª parte). Revista Brasileira de Estudos pedagógicos.

Brasília. n.173, p.143-183, Jan./Abr. 1992 Disponível em www.publicacoes.inep.gov.br. Acesso em 20 de março de 2009.

__________ A lei de Diretrizes e Bases- Depoimento e Debate sobre o Projeto da lei de Diretrizes e Bases (2ª parte). Revista Brasileira de Estudos pedagógicos.

Brasília, n.174, p.323-359, Maio/Ago. 1992. Disponível em www.publicacoes.inep.gov.br. Acesso em 20 de março de 2009.

VASCONCELOS, C. dos S. Para onde vai o professor? Resgate do Professor como Sujeito de Transformação. 2003. 10 ed. São Paulo: Libertad.

134

VIEIRA, S. da R. A trajetória do Curso de Pedagogia – de 1939 a 2006. Disponível em: < http://www.unioeste.br>. Acesso em 15 de abril de 2009.

WEBER, S. Como e onde formar professores: Espaços em confronto. Educação & Sociedade, ano XXI, n. 70, Abril. 2000.