A ética profissional no atendimento às pessoas vivendo com HIV ...
Transcript of A ética profissional no atendimento às pessoas vivendo com HIV ...
Saber ViverSaber Vivernº 10 Setembro/2007
PROFISSIONAL DE SAÚDE
A ética profissionalno atendimento às pessoas
vivendo com HIV/aids
Novidades sobre a 4ª IAS
3
Ética: umadiscussão constante
Saber Viver Profissional de Saúde10ª Edição – Setembro 2007
Correspondências à redação:C. Postal 15.088 – Rio de Janeiro (RJ)
Cep 20.031-971
Coordenação e edição:Adriana Gomez e Silvia Chalub
Reportagem:Flávio Guilherme
Secretária de redação: Ana Lúcia da Silva
Consultora lingüística: Leonor Werneck
Foto: Alex Ferro, agência Pedra Viva
Colaborou nesta edição:Arley Silva, cirurgião-dentista especialista
em HIV/aids; Cristina Câmara, socióloga, ex-diretora do Grupo Pela Vidda e responsável
pela Unidade de Articulação com a SociedadeCoivil e de Direitos Humanos do Programa
Nacional de DST/Aids do Ministério da Saúdeno período de 2001 a 2003; Dirceu Greco,
professor da Faculdade de Medicina daUniversidade Federal de Minas Gerais (UFMG),
coordenador do Departamento de DoençasInfecto-parasitárias do Hospital das Clínicas
da UFMG;Monica Merçon, infectologista do Hospital
Universitário Clementino Fraga Filho daUniversidade Federal do Rio de Janeiro e
pesquisadora do Projeto Praça Onze;Patrícia Rios, advogada do Grupo Pela Vidda
Niterói.
Projeto Gráfico e Arte Final:A 4Mãos Com. e Design
Impressão:Gráfica MCE
Apoio:
Discussões sobre o procedimento ético no atendi-
mento a pessoas vivendo com HIV/aids sempre per-
meou o cotidiano dos profissionais de saúde.
Estabelecer “princípios” éticos a serem seguidos diante
do dinamismo da epidemia de aids é um desafio con-
stante de todas as unidades de saúde. Esta edição da
Saber Viver Profissional de Saúde traz algumas con-
tribuições sobre esse tema que está absolutamente
relacionado à qualidade do tratamento oferecido à
população. Refletir sobre o assunto constantemente,
em equipe, buscando consensos, é um dos caminhos
sugeridos pelos nossos entrevistados para que as
decisões sejam tomadas levando-se em conta o me-
lhor para o paciente e para o seu tratamento.
Além do tema Ética, esta edição confere as principais
novidades que foram tratadas na 4ª Conferência da
International Aids Society (IAS) sobre Patogênese,
Tratamento e Prevenção do HIV, através de uma entre-
vista com a infectologista Monica Merçon, do Hospital
Universitário Clementino Fraga Filho, da Universidade
Federal do Rio de Janeiro e do Projeto Praça XI, que
participou do evento.
Boa leitura.
A éticaprofissionale a aidsQuando os primeiros casos de aidssurgiram no Brasil, na década de 80, omedo e o preconceito tomaram contada sociedade, principalmente dosprofissionais de saúde – a princípio, ogrupo a ter maior contato com essespacientes. Isolamentos foram monta-dos rapidamente nos hospitais. Algunsprofissionais se recusavam a atenderpessoas infectadas pelo HIV. A notícialogo se espalhava pela unidade desaúde, deixando o paciente exposto.Hospitais e clínicas não aceitavaminternar pessoas com aids, fatocomum no início da epidemia.
percebe-se o receio de algunsprofissionais de saúde em acatar essasregras”. Na opinião do médico, o quefalta é um processo continuado eamplo de educação, envolvendo asuniversidades, os cursos técnicos e oensino fundamental. “As pessoasainda acreditam em grupo de risco.As crianças deveriam aprender desdecedo sobre sexualidade e doençassexualmente transmissíveis”, sugere.
A socióloga Cristina Câmara, ex-diretora do Grupo Pela Vidda eresponsável pela Unidade deArticulação com a Sociedade Civil ede Direitos Humanos no Programa
5
“Aresistência dosprofissionais de saúde ematender pessoas com aids,
naquela época, foi enorme”, lembraDirceu Greco, professor da Faculdadede Medicina da Universidade Federalde Minas Gerais (UFMG),coordenador do Departamento deDoenças Infecto-parasitárias (DIP) doHospital das Clínicas da UFMG e umdos primeiros médicos mineiros atrabalhar com HIV/aids. “Os doisprimeiros casos em Belo Horizonteforam recusados pelo Hospital dasClínicas, mas conseguimos dois leitosno Hospital João XXIII. Em poucosminutos, formou-se um isolamentoao redor desses pacientes. Aenfermagem não entrava. Os medi-camentos e a comida eram deixadosna porta”, recorda o médico. “Olaboratório me pediu que eu carim-basse ‘cuidados especiais’ nos pedi-dos de exames e meus colegas merepreendiam por eu não atender‘separadamente’ os pacientes soro-positivos”, conta Greco.
A ÉTICA DEVE SERCONSTANTEMENTE DISCUTIDA
Passados mais de 20 anos, aciência avançou no combate àepidemia, mais informações sobre asformas de transmissão do vírus foramdescobertas e propagadas. A ética doprofissional de saúde no contato comos portadores do HIV começou a serconstantemente debatida nasunidades de saúde, nas OrganizaçõesNão-Governamentais e nos progra-mas de aids do país. O médico DirceuGreco acrescenta que leis foramaprovadas e normas e recomen-dações foram escritas para definir asregras e os limites do relacionamentoentre o profissional de saúde e opaciente soropositivo. “Mas ainda
Nacional de DST/Aids do Ministérioda Saúde no período de 2001 a2003, concorda que qualquerquestão de saúde deve ser tratadade forma coerente com as políticasde saúde do país. Mas ela acreditaque a epidemia de aids merece umaatenção diferenciada. “A epidemiagera mudanças na vida das pessoasque muitas vezes precisam sercompartilhadas ou, pelo menos,observadas pelas pessoas com asquais convivem, em família ou nolocal de trabalho. Todas essasmudanças estão diretamente ligadasà necessidade de acompanharmosmudanças de valores éticos”, afirma asocióloga.
CRIAR NORMAS QUEFUNCIONEM INDEPENDENTEDE CRENÇAS
Em entrevista concedida em 2005para a Saber Viver, durante o ISeminário Municipal de Pesquisa emAids promovido pelo ProgramaMunicipal de DST/Aids do Rio deJaneiro, a pesquisadora Wilza Vilelaafirmou que a ética está sempre emconstrução. Assim, segundo ela, osprofissionais de saúde deveriambuscar dentro dos seus locais detrabalho um consenso sobre comoproceder diante de tais desafios.“Apesar de existirem normas, éfundamental que, diante de umdilema ético, os profissionais desaúde de uma unidade façam umacordo do que é aceitável naquelemomento, sempre ouvindo a opiniãodo paciente e montando umaorganização que permita a realizaçãode reuniões freqüentes para adiscussão da conduta ética diante dealguns casos”. Para a pesquisadora,buscar um consenso entre todos daequipe sobre alguns casos é uma
“A epidemia gera
mudanças na vida das
pessoas que muitas vezes
precisam ser
compartilhadas ou, pelo
menos, observadas pelas
pessoas com as quais
convivem, em família ou
no local de trabalho.
Todas essas mudanças
estão diretamente ligadas
à necessidade de
acompanharmos
mudanças de valores
éticos"
Cristina Câmara
6
alternativa para criar normas quepossam funcionar independente decrenças e posturas individuais.“Primeiro, sabemos que uma normafunciona quando ela tem um certoconsenso. Depois, temos que garantirque a decisão trará o máximo debenefício e o mínimo de malefício erisco para o paciente”, avalia WilzaVilela. Segundo ela, essa práticadentro do serviço deve ser construídae reconstruída constantemente.
A BANALIZAÇÃO AMEAÇAPRINCÍPIOS ÉTICOS
Segundo Dirceu Greco, a dis-cussão sobre ética profissional emrelação à aids avançou bastantedesde o início da epidemia, masmuito ainda precisa ser feito.“Acredito que o debate sobre éticafoi mais difundido mais pelabanalização da aids, a quantidade depacientes atendidos, do que por umamudança de comportamentoprovocada pelo conhecimento”.
A socióloga Cristina Câmaraacredita que a banalização ameaçaprincípios éticos que precisam serrespeitados, como o sigilo e aconfidencialidade. “Mesmo queassegurados em resoluções profis-sionais ou com respaldo legal, infeliz-mente, esses princípios continuamsendo infringidos”. Cristina Câmararessalta a importância das pessoasfalarem publicamente que sãosoropositivas: “é uma forma de selivrar desse ‘segredo’, do inominável,da culpa atribuída à transmissãosexual do HIV, aspectos importantespara a auto-estima das pessoas e paraa sua qualidade de vida em geral.Entretanto, para os profissionais desaúde, a questão da revelação dasorologia do paciente não pode serbanalizada. Falar com e sobre as
pessoas soropositivas, primeirodepende do conhecimento dapessoa em questão, depois temimplicações completamente dife-rentes para indivíduos e grupossociais diferentes. E não podemosdeixar de notar que se, por um lado,vivemos numa democracia na qualos cidadãos têm direito à expressão,por outro, também vivenciamosmomentos acirrados de violênciaurbana e inclusões e exclusõesreligiosas que contribuem para, porexemplo, inibir a política de reduçãode danos e favorecer agressões físicasde pessoas que supostamente sãogays ou prostitutas, como no caso dadoméstica no Rio de Janeiro e dosassassinatos de homossexuais, doAcre a São Paulo”, afirma a socióloga.
OS GANHOS GERADOS PELAEPIDEMIA DE AIDS
O médico Dirceu Greco acreditaque o HIV trouxe contribuiçõesimportantes para a implementaçãode práticas mais éticas nas unidades
“Acredito que o debate
sobre ética foi mais
difundido mais pela
banalização da aids, a
quantidade de pacientes
atendidos, do que por
uma mudança de
comportamento
provocada pelo
conhecimento”
Dirceu Greco
7
de saúde, como o sigilo, aconfiabilidade, o respeito peloindivíduo e a melhoria da relaçãoentre profissional de saúde epaciente. Mas ainda há avanços aserem conquistados, principalmenteem relação à busca ativa deparceiros. “Essa busca foi descartadapor lei, mas nem sempre érespeitada. Não podemos ir atrás doparceiro. O nosso papel é influenciar,convencer o paciente a contar”,afirma o médico. A socióloga CristinaCâmara complementa afirmandoque um dos ganhos gerados pelaepidemia foi fazer com que osprofissionais de saúde, especial-mente médicos, reconhecessem quenão têm respostas para tudo e quenem sempre têm o poder de salvarvidas, mesmo que seja possívelprolongá-las com medicamentos ouaparelhos. “Devido ao desconhe-cimento médico inicial, foi precisoouvir mesmo os pacientes. LucMontagnier no livro Vírus e Homensdiz isto claramente. Era preciso ouviro que os pacientes diziam, o quesentiam, como observavam asmanifestações em seus próprioscorpos (febres, insônias, náuseas,diarréias etc.) para que fossem sendobuscadas recorrências que trou-xessem indícios para esta nova doen-ça”, conta a socióloga, acrescentandoque, em decorrência desta neces-sidade de escuta, os profissionaisreencontraram o ser humano emcada paciente, para além do casoclínico. “Isso trouxe também osdesafios da contra-transferência, ouseja, das evidências de que asidentificações ou rejeições dosprofissionais com relação a algunsaspectos presentes no pacientefazem com que ele lide de formadiferente com isso, com mais ou
menos dificuldades, e isso reflete naqualidade dos cuidados oferecidos.Se o médico possui pré-conceitoscom os gays, por desconhecimentoou homofobia, não será difícil queele considere um paciente gay comoresponsável pela infecção pelo HIV.No momento atual, se o pacientepossui pouca instrução e supõe-seque ele não pode entender o que sepassa consigo, para que explicar-lhe?!São situações de naturezas dife-rentes, com implicações e dificul-dades diferentes, mas ambasinterferem diretamente no tipo deatendimento que a pessoa iráreceber. Note-se que também hágays pobres e com pouca escola-ridade, mas ressalto esta diferençapara mostrar que a resposta inicial àepidemia também está associada adeterminados grupos de indivíduos– gays, militantes, classe média –com poder de argumentação emobilização. As mudanças no perfilda epidemia nos obrigam a observarnovos limites e possibilidades”, refleteCristina Câmara. Segundo ela, ogrande desafio do profissional desaúde diante do dilema da ética éresponder às exigências de novassituações trazidas pela epidemia. Porexemplo, a sexualidade das pessoassopositivas, as experiências de casaissorodiscordantes, o desejo de sermãe por parte de mulheressoropositivas, a amamentação, atransmissão do HIV para o parceirosexual, procedimentos cirúrgicos empessoas soropositivas, o tratamentomedicamentoso e seus efeitoscolaterais, entre muitas outras. n
Leia a entrevista que Cristina Câmaraconcedeu à Saber Viver para estamatéria, na íntegra, no nosso sitewww.saberviver.org.br
8
DIAGNÓSTICO POSITIVOEm caso de diagnóstico positivo, o paciente
deve receber um aconselhamento pós-teste porparte dos profissionais de saúde previamentetreinados para esta função e ser encaminhadopara tratamento. Quanto melhor for a acolhida,melhor será adesão do paciente à terapia anti-retroviral.
Somente o paciente testado poderá recebero resultado, e isso deverá ocorrer, primeiramente,em entrevista individual, mesmo se o pacientefor adolescente. Somente após a entrevista e, seo paciente consentir, é que o profissional desaúde poderá revelar o resultado dos exames aoutras pessoas, como familiares, parceiros,amigos, etc.
A quebra do sigilo profissional só é permitidano caso de proteção da vida de terceiros (caso opaciente se recuse a revelar o diagnóstico paraparceiros sexuais ou membros de grupo de usode drogas injetáveis). No entanto, a busca ativa deparceiros é uma medida polêmica, proibida porlei, que só deve ser adotada em último caso. Valelembrar que a revelação do diagnóstico de umpaciente não pode ser feito nem para outrosprofissionais da unidade de saúde. Caso o sigiloseja quebrado, mediante as condições permitidaspela lei, é importante que o profissional descrevaa situação no prontuário do paciente, paraembasar possíveis ações judiciais futuras.
• • •
DIAGNÓSTICO NA HORA DOPARTO
A maioria das gestantes recebe o teste anti-HIV como parte dos exames de rotina do pré-natal. Ainda assim, muitas gestantes chegam àhora do parto sem terem realizado o exame. Paraesses casos, utiliza-se o teste rápido para odiagnóstico do HIV. “Este tipo de procedimentopode implicar questionamentos sobre os aspectoséticos envolvidos nesta testagem e dificultar oaconselhamento, por não ser este o momentomais adequado”, diz a advogada Patrícia Rios doGrupo Pela Vidda Niterói.
A ética e os dilemasque envolvem a revelação dediagnóstico
Revelar a um paciente um resul-
tado positivo para HIV/aids é
uma questão que deve ser trata-
da com o maior cuidado. Antes
da realização do teste, recomen-
da-se que o paciente passe por
um aconselhamento pré-teste
realizado por profissionais de
saúde capacitados para isso. O
paciente deve ser informado das
implicações que envolvem o
teste anti-HIV, da natureza do
exame, da necessidade da rea-
lização e do significado do resul-
tado. O aconselhamento pré-
teste, que pode ser individual ou
coletivo, não deve ser exigido
como condição para realização
do exame anti-HIV.
TESTAGEM COMPULSÓRIA
O artigo 4º da Resolução 1.665/2003 do Conselho Federal deMedicina proíbe a realização de exame anti-HIV sem o consentimento do paciente, achamada testagem compulsória.“Ninguém pode ser obrigado a realizar oteste. Em qualquer situação, o exame sópode ser feito com o consentimento dapessoa. Legalmente, a realização doexame só é obrigatória na doação desangue, órgão ou esperma”, esclarecePatrícia Rios, advogada do Grupo PelaVidda Niterói.
Cabe ao profissional de saúde tentarconvencer o paciente a realizar o testee explicar os benefícios do tratamentoprecoce. “O teste realizado semconsentimento do paciente podeacarretar conseqüências negativasque dificultarão a revelação dodiagnóstico positivo e a adesão dopaciente ao tratamento”, afirma aadvogada.
RECUSA NO ATENDIMENTODE PACIENTES COM HIV
Todos os portadores de HIV/aids têm o direitode receber o tratamento adequado, e osprofissionais de saúde e as unidades de saúdesão obrigados, por lei, a prestar atendimento. AResolução 31.359/92 do Conselho Federal deMedicina estabelece que o atendimentoprofissional a pacientes portadores do HIV éimperativo moral da profissão médica e nenhummédico pode recusá-lo. Tal imperativo é extensivoàs instituições de qualquer natureza, pública ouprivada. “A recusa, além de infração éticadisciplinar, pode ser acompanhada de ação penalpela infração do dever legal, prevendo, inclusive,a indenização por danos materiais e moraissofridos pelo paciente, além de punição por parteda entidade de classe, como Conselhos Federaise Regionais, a qual o profissional pertence”,explica a advogada Patrícia Rios, do Grupo PelaVidda Niterói. n
TESTES DE NOVAS VACINAS ENOVOS MEDICAMENTOS
A realização de testes para novos medicamentos enovas vacinas envolvendo portadores de HIV é outraquestão eticamente delicada e, ainda, motivo de muitosestudos. Antes de ser submetido a testes, o pacientedeverá ser informado de todos os procedimentos queserão realizados e precisará assinar um termo deconsentimento livre e esclarecido (TCLE).
No Brasil, a Resolução 196/96 do Conselho Nacionalde Saúde estabelece as diretrizes e normas parapesquisas envolvendo seres humanos. Esta resoluçãovisa assegurar os princípios da bioética, os direitos do‘voluntário’ da pesquisa e os deveres da comunidadecientifica e do estado.
10
Acidentes no local de trabalho:como agir nesta situação
Não são muitos, mas até 2004, 103profissionais de saúde já haviam sidoinfectados pelo HIV no exercício dotrabalho e outros 219 prováveis casosforam publicados em todo mundo.
Os acidentes ocupacionais podem ser facilmente evitados. Para issorecomenda-se o uso de protetores, como luvas e máscaras, eatenção máxima na manipulação de agulhas e outros materiais
cortantes. Logo após a ocorrência do acidente, o profissional deve lavarbem a área atingida para reduzir o risco de infecção não apenas do HIV,mas de outras doenças, como as hepatites B e C.
Caso o acidente ocorra com material biológico sabidamente contami-nado, o profissional de saúde deve iniciar imediatamente o tratamentoprofilático com anti-retrovirais. “O tratamento tem duração de um mês,deve ser iniciado o mais rápido possível e é composto basicamente deBiovir (AZT+3TC) com Kaletra, ou com Indinavir/Ritonavir. Também é
importante tomar a vacina dahepatite B e fazer o acompanha-mento para hepatite C. Todo ser-viço de saúde tem um procedi-mento padrão para esse tipo desituação, que é regulamentado pe-las secretarias municipais de saú-de”, afirma Monica Merçon, infec-tologista do Hospital Universitárioda Universidade Federal do Rio deJaneiro (UFRJ).
QUANDO INICIAR APROFILAXIA
A profilaxia deve ser iniciada nomáximo até as primeiras 72 horasapós o acidente e sua eficácia nãoé total. Embora apenas o AZTtenha demonstrado benefício emestudos, a utilização de outros anti-retrovirais, nesses casos, pode me-
11
lhorar a cobertura contra possíveisvírus resistentes.
O profissional que se recusar arealizar a quimioprofilaxia ou outrosprocedimentos necessários pós-exposição (como por exemplo,coleta de exames sorológicos elaboratoriais), deverá assinar umdocumento onde esteja clara-mente explicitado que todas asinformações foram fornecidas noseu atendimento sobre os riscos daexposição e os riscos e benefíciosda conduta indicada.
A IMPORTÂNCIA DOS TESTESRÁPIDOS
Para aqueles profissionais quesofreram exposições de menorrisco, deve-se utilizar o teste rápidoanti-HIV no paciente-fonte para
confirmar ou não a infecção peloHIV antes de iniciar a profilaxia.Caso isso não seja possível, o me-lhor é entrar com o esquema uti-
lizado para os casos de materialbiológico contaminado.
O profissional de saúde deve,no entanto, ser atendido por médi-cos, de preferência especialistas naárea de HIV/aids. A falta de umespecialista no momento imediatodo atendimento pós-exposição, en-tretanto, não deve ser razão pararetardar o início da quimioprofilaxia.
Vale lembrar que, como a profila-xia com anti-retrovirais não impede100% a infecção, as medidas deprevenção são ainda a melhor formade evitar a exposição ao HIV. n
Fonte: Recomendações paraAtendimento e Acompanhamento deExposição Ocupacional a MaterialBiológico: HIV e Hepatites B e C /Ministério da Saúde
Caso o acidente ocorra
com material biológico
sabidamente
contaminado, o
profissional de saúde
deve iniciar
imediatamente o
tratamento profilático
com anti-retrovirais.
ÉTICA, ODONTOLOGIA E AIDSUma das reclamações mais freqüentes
de pessoas vivendo com HIV/aids é a
recusa do atendimento odontológico.
Esse procedimento deve ser denunciado
aos conselhos regionais de odontologia.
Para o cirurgião-dentista Arley Silva,
especialista em HIV/aids, as normas de
controle de infecções devem ser
seguidas por todos os dentistas e para
todos os pacientes, sem nenhum tipo de
discriminação. “Um paciente pode saber
que é soropositivo e não revelar para o
profissional, saber e falar, e pode não
saber, o que é mais comum. Se as nor-
mas forem seguidas, tanto os dentistas
quanto os pacientes estarão protegidos”,
afirma Arley.
PRINCIPAIS NORMAS DE CONTROLE DE INFECÇÕES:
1- Esterilização por meio do auto-clave. Quando utilizar a es-tufa, o ciclo de esterilização (1 hora e meia) não pode ser inter-rompido.
2- Máscara, avental, gorro, luvas e óculos com todos ospacientes. Toma-se como padrão de segurança a utilização deuma máscara por período do dia, e de um par de luvas porpaciente.
3- Cada dentista deve ter cinco jogos de instrumentais paradar tempo à esterilização.
4- A carteira de vacinação, principalmente contra a hepatite B,deve estar em dia.
Arley Silva dá ainda algumas dicas para redução de custos: utilizarpvc, daqueles comprados em supermercados, para cobrir osequipamentos e canudos cortados como capa de seringa tríplice.“Os profissionais podem procurar o Conselho Regional deOdontologia para obterem os manuais existentes sobre doençasinfecciosas, ou acessar o site do Ministério da Saúde e buscarConduta Odontológica para Pacientes com HIV e Normas deBiossegurança, com ilustrações”, sugere.
12
ENTREVISTA
Dra Monica MerçonINFECTOLOGISTA DO
HOSPITAL UNIVERSITÁRIO
CLEMENTINO FRAGA
FILHO, DA UNIVERSIDADE
FEDERAL DO RIO DE
JANEIRO E DO PROJETO
PRAÇA XI
Quatro novos ARVssão apresentados na IAS
Achegada de mais quatro
novos anti-retrovirais, as
discussões sobre início
precoce do tratamento e os
eventos metabólicos marcaram
os debates da 4ª Conferência da
International Aids Society (IAS)
sobre Patogênese, Tratamento e
Prevenção do HIV, realizada na
Austrália, de 22 e 25 de julho
deste ano. Entre os profissionais
brasileiros presentes estava
Monica Merçon, infectologista do
Hospital Universitário Clementino
Fraga Filho, da Universidade
Federal do Rio de Janeiro e do
Projeto Praça XI. Ela nos traz,
nesta entrevista, os principais
destaques do evento.
SV PROF - QUAL FOI OPRINCIPAL TEMA TRATADONESTA EDIÇÃO DA IAS?
Monica Merçon - Quandocomeçar a terapia com anti-retrovi-rais (ARV). Como temos anti-retro-virais mais seguros, as pesquisasvão investigar agora qual é oimpacto da terapia anti-retroviralmais precoce. Já há um consensode começarmos o tratamentoquando o CD4 estiver em torno de350. Não esperar que ele caiatanto. E, num futuro próximo,saberemos se é mais indicadocomeçar o tratamento com umacontagem ainda mais alta de CD4para prevenir os eventos metabóli-cos e doenças crônicas não rela-
cionadas diretamente ao HIV,como a diabete e as doenças car-diovasculares.
SV PROF - E A QUESTÃODAS DOENÇASMETABÓLICAS?
MM - Foram apresentados maisresultados do estudo SMART quecompara duas estratégias de trata-mento. A de manter a terapia comARVs, quando os pacientes alcan-çassem CD4 de 350, e a de sus-pender a medicação. E esse estudomostrou que o grupo que suspendiatinha não apenas mais ocorrência dedoenças oportunistas, como de out-ras cardiovasculares. Será investiga-
do agora se a terapia mais precocepode evitar esses eventos metabóli-cos no paciente. Outros estudos járealizados indicam que o início pre-coce da terapia com ARV poderiaevitar, ou reduzir, essas alteraçõesmetabólicas que afetam principal-mente o coração.
SV PROF - MUITAS NOVI-DADES EM TRATAMENTO?
MM - Estamos num momentomuito interessante porque estãolançando duas novas classes demedicamentos, os inibidores deintegrase e os inibidores de CCR5. Enum futuro próximo, teremos maisquatro novos anti-retrovirais. O
14
Realtegravir é uma medicaçãomuito promissora, com poucosefeitos colaterais, bem tolerada eque deve ser liberada no ano quevem, tanto para a falha como parainício de tratamento. É um inibidorde integrase, uma nova classe demedicamentos que consegue baixarde forma muito rápida a carga viral.O Maraviroc é o primeiro inibidorde CCR5 já liberado, inicialmentepara pacientes com falha de trata-mento. Trata-se de um medicamen-to considerado de resgate que,quando associado a outros, aumen-ta o CD4 e reduz a carga viral dospacientes. No entanto, esse medica-mento exige que se faça o teste detropismo, um teste novo que verificase o HIV daquele paciente usa a pro-teína CCR5 para entrar na célula. ARilpivirina (TMC 278) é um inibidorda transcriptase reversa não análogode nucleosídeo, testado em virgensde tratamento, sem nenhumimpacto para o perfil lipídico, e comeficácia imunológica igual, quandocomparado ao Efavirenz. É umadroga que se toma uma vez ao dia eque vai ser bastante utilizada no iní-cio de tratamento. O Intravirina(TMC 125) é da mesma classe,porém será indicado para resgate.
Até o momento, os resultados dosestudos com essa droga vemdemonstrando que acrescentabenefícios à resposta imunológica evirológica em pacientes com múlti-plas falhas, quando associado aoDarunavir.
SV PROF - É UM BOMMOMENTO ENTÃO PARAPACIENTES EM FALHA DETRATAMENTO?
MM - Exatamente. Teremosmais três medicamentos de res-gate. No momento, o únicomedicamento que temos parafazer o resgate é o T20, que émuito pouco tolerável. Portanto,quem está tomando Kaletra e estáfalhando com o arsenal terapêuticode que dispomos agora tem pou-cas opções para troca de tratamen-to, o que vai melhorar significativa-mente a partir da liberação dessesnovos medicamentos. E vale lem-brar que as pessoas que nuncafizeram tratamento com os anti-retrovirais ou que estejam no inícioda terapia também terão novaspossibilidades de tratamento semos efeitos colaterais metabólicos
em longo prazo.
SV PROF – ALGUMA NOVI-DADE SOBRE PREVENÇÃO?
MM - Como não temos nenhu-ma vacina em vista, e como osmicrobicidas não se mostraram efi-cazes em evitar a transmissão, amedida mais eficaz apresentada foia circuncisão, que já havia sidoapresentada, em estudo piloto, naúltima reunião da IAS, no Rio deJaneiro. Outros estudos comple-mentares foram feitos e compro-vam a custo-efetividade da circun-cisão, já que se trata de uma cirur-gia. Os resultados mostram queapenas 7% apresentaram compli-cações, facilmente tratáveis.Nenhuma complicação séria foiobservada. Nos países desenvolvi-dos, a circuncisão já é adotadacomo prática. Está se propondo,para África, adotá-la como medidade saúde pública de longo prazo. OBrasil fica um pouco de fora dessadiscussão sobre medidas biomédi-cas de prevenção, porque investemais nas campanhas de conscienti-zação, mas acredito que isso mudecom o tempo porque já há boasevidências no campo biomédico. n
No momento, o único medicamento que temos para
fazer o resgate é o T20, que é muito pouco tolerável.
Portanto, quem está tomando Kaletra e está falhando
com o arsenal terapêutico de que dispomos agora tem
poucas opções para troca de tratamento, o que vai
melhorar significativamente a partir da liberação
desses novos medicamentos.
15
Compromisso com o melhor da medicina e da informação
MC 462/05 08-2006-STO-05-BR-462-J
DoençasAids/HIVAsma
acesse: www.msdonline.com.br
16
PUBLICAÇÕES E ARTIGOS:Aids e Ética MédicaConselho Regional de Medicina doEstado de São PauloA publicação trata de vários temas, quevão desde sigilo médico, direitos dospacientes e exames compulsórios atéassuntos polêmicos como aborto,eutanásia, reprodução assistida, Aids nasescolas e prisões, estupro, usuários dedrogas, menores infratores e outros.Disponível em pdf. Acesse:www.cremesp.org.br/library/modulos/publicacoes/pdf/aids_etica_medica.pdf
Legislação sobre DST/aids no BrasilConsulte os Pareceres da CâmaraTécnica da Ética e Cidadania deDST/Aids. Acesse:www.aids.gov.br/legislacao/vol3_37.htm
Vírus e Homens - Aids: Seus Mecanismos e TratamentoAutor: Luc Montagnier.Editora: Jorge Zahar, 1995Neste livro denso - best-seller na França eprimeiro trabalho de sua autoria publicadono Brasil -, Montagnier aborda todas asquestões ligadas a essa epidemia,imprevista e imprevisível: sua origem, oimpacto causado na sociedade, suadisseminação pelo mundo, as terapêuticasdisponíveis, além de comentar acontrovérsia com o cientista americanoRobert Gallo acerca da primazia dadescoberta do vírus HIV. Um livro de leituraobrigatória, que serve ainda comoinstrumento de informação e educação.
Conduta Odontológica para Pacientescom HIV e Normas de BiossegurançaPublicação do Programa Nacional deDST/Aids do Ministério da Saúdedisponível no site do PNDST/Aids:www.aids.gov.br
Aids: Ética, Medicina e BiotecnologiaAutoras: Dina Czeresina, ElizabethMoterira dos Santos, Regina HelenaSimões Barbosa e outros.Editora: Hucitec, 1995Reunião de ensaios sobre ciência, ética,tecnologias médicas e o próprio discursocientífico que voltam a ocupar lugar central
com o surgimento da aids. São analisadosos discursos preventivos, os conceitosepidemiológicos, as relações entreprodução conceitual e ética e asincontáveis questões (tecnológicas, éticasetc.) relacionadas à produção de vacinas.
ONGS QUE OFERECEM SERVIÇOS APESSOAS QUE VIVEM COM HIV/AIDS:AMAZONASRNP+ núcleo AmazonasRua Teresina, 476 ( Fiocruz)Adrinópolis - Manaus-AMCep: 69057-070
ALAGOASGrupo ConviverTel: (82) 3325-7411/8804-6804Rua Augusto Ribeiro s/nº- Casa doArtesão Jatiúca - Maceió-ALCep: 57036-000
BAHIALide Positiva – Casa do PevTel: (71) 3425-0681Rua Laudicéia Gusmão, 644 – CentroVitória da Conquista – BACep: 45035-000
CEARÁCasa de Apoio Sol NascenteTel: (85) 3463-4437Av. Alberto Craveiro, 2222 – CastelãoFortaleza-CE Cep: 60860-000
DISTRITO FEDERALGrupo Arco Íris-AssociaçãoBrasiliense de Combate à AidsTel: (61) 3361-9511/3361-9665SRES-Área Especial D 20-sala 423Centro Comercial - Cruzeiro-DFCep: 70640-515
ESPÍRITO SANTOCentro de Apoio ao Cidadão Tel: (27) 3337-1538/3238-0642Rua Pedro Álvares Cabral, 340 – NossaSenhora de Fátima - Serra-ESCep: 29160-772
MINAS GERAISRNP+ Núcleo UberlândiaTel: (34) 3214-4576
Rua Cel. Antônio Pereira, 400/ sala 319Centro - Uberlândia-MGCep: 38400-104
Casa de Apoio Minha CasaTelfax: (31) 3462-4744Rua Anchieta, 418 – Padre EustáquioBelo Horizonte-MG - Cep: 30720-370
PARANÁGrupo AmigosTel: (41) 3346-5651Rua Capitão João Zaleski, 635 – VilaLindóia - Curitiba-PRCep: 81010-080
RIO GRANDE DO SULPastoral Nacional de DST/Aids daCNBBTel: (51) 3346-6405Rua Dr. Timóteo, 31 - Porto Alegre-RSCep: 90570-041
Telefone do SAE – AtendimentoAmbulatorial(51) 3289-4048 Rua Manoel Lobato, 151Porto Alegre –RS Coordenadora: Cledimar
RIO DE JANEIROIpraTel: (21) 2254-2088Rua Jurupari, 08 – TijucaRio de Janeiro - RJCep: 20520-110
Projeto em Guarujá (SP) atendemulheres de baixa renda O Centro de Convivência Joana D’arc, emparceria com a Secretaria Municipal deAção Social e Cidadania, realiza o ProjetoCiranda da Vida em nove comunidades domunicípio de Guarujá (SP). O Projeto temcomo objetivo aumentar a auto-estima e aqualidade de vida de mulheres de baixaque vivem com HIV/aids.Maiores informações poderão ser obtidaspor telefone (013) 3383.2166 ou3386.2379 de 2.ª a 6.ª, das 10 h às 18 h.Falar com Ana Paula, ou por e-mail:[email protected]
Área útil