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A DISTRIBUIÇÃO SOCIAL E O USO PEDAGÓGICO DO ESPAÇO ESCOLAR NO MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO: UM ESTUDO EXPLORATÓRIO A PARTIR DOS DADOS DO GERES 2005 Alicia Maria Catalano de Bonamino Departamento de Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro Elisangela da Silva Bernado Doutoranda em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro Luiza Helena Lamego Felipe Doutoranda em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro Fernanda Ferreira Pedrosa Mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro Órgão financiador: Cnpq RESUMO A literatura especializada sobre eficácia e equidade escolar aponta que os recursos escolares, em termos do prédio escolar, dos espaços e equipamentos didático-pedagógicos e seu estado de conservação, influenciam o desempenho dos alunos brasileiros. O efeito da escola é relevante e decisivo, e mudanças nos fatores escolares podem criar melhores condições de aprendizagem. O artigo focaliza o estado de conservação dos prédios segundo as condições socioeconômicas dos alunos de 68 escolas públicas e privadas do município do Rio de Janeiro participantes do Projeto GERES, bem como a distribuição dos espaços pedagógicos e recursos materiais escolares segundo as redes de ensino. Trata-se de estudo de natureza exploratória, que faz uso de dados coletados em estudo longitudinal (Geres/2005), a partir da aplicação de questionários contextuais, no início e no final do ano de 2005. Numa interpretação panorâmica, procuramos identificar as condições de oferta e uso de infra- estrutura escolar que podem reduzir o impacto do nível socioeconômico sobre a distribuição dos recursos escolares. Palavras-chave: Ensino Fundamental, estudo longitudinal, espaço escolar, recursos didático-pedagógicos.

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A DISTRIBUIÇÃO SOCIAL E O USO PEDAGÓGICO DO ESPAÇO ESCOLAR NO

MUNICÍPIO DO RIO DE JANEIRO:

UM ESTUDO EXPLORATÓRIO A PARTIR DOS DADOS DO GERES 2005

Alicia Maria Catalano de Bonamino

Departamento de Educação da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro

Elisangela da Silva Bernado

Doutoranda em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro

Luiza Helena Lamego Felipe

Doutoranda em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro

Fernanda Ferreira Pedrosa

Mestre em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro

Órgão financiador: Cnpq

RESUMO

A literatura especializada sobre eficácia e equidade escolar aponta que os recursos

escolares, em termos do prédio escolar, dos espaços e equipamentos didático-pedagógicos e

seu estado de conservação, influenciam o desempenho dos alunos brasileiros. O efeito da

escola é relevante e decisivo, e mudanças nos fatores escolares podem criar melhores

condições de aprendizagem. O artigo focaliza o estado de conservação dos prédios segundo as

condições socioeconômicas dos alunos de 68 escolas públicas e privadas do município do Rio

de Janeiro participantes do Projeto GERES, bem como a distribuição dos espaços

pedagógicos e recursos materiais escolares segundo as redes de ensino. Trata-se de estudo de

natureza exploratória, que faz uso de dados coletados em estudo longitudinal (Geres/2005), a

partir da aplicação de questionários contextuais, no início e no final do ano de 2005. Numa

interpretação panorâmica, procuramos identificar as condições de oferta e uso de infra-

estrutura escolar que podem reduzir o impacto do nível socioeconômico sobre a distribuição

dos recursos escolares.

Palavras-chave:

Ensino Fundamental, estudo longitudinal, espaço escolar, recursos didático-pedagógicos.

1. Introdução

Uma das evidências estabelecidas de forma contundente no campo da sociologia da

educação diz respeito às relações entre desigualdades sociais e condições de oferta

educacional. De fato, a pesquisa educacional vem contribuindo há mais de quarenta anos com

evidências extensas e recorrentes sobre a associação entre condições escolares e

características socioeconômicas e culturais dos alunos (Forquin, 1995).

Apesar dos achados pouco alentadores deste acervo de pesquisas, a escola ganha,

principalmente a partir dos anos 80, maior autonomia e centralidade no contexto de

descentralização das políticas e sistemas educacionais, convertendo-se em um novo objeto

sociológico, na linha do que Van Zanten e Duru-Bellat (1999) denominam de “Sociologia da

Escola”. Além disso, a unidade escolar é também reinscrita na agenda das pesquisas

educacionais, em parte em razão de ser nesta dimensão institucional que as intervenções

tornam-se mais plausíveis.

Pesquisas que buscam equacionar o efeito dos fatores escolares sobre os resultados dos

alunos se colocam na perspectiva das escolas eficazes. Esses estudos originaram-se da reação

ao Relatório Coleman (1966), que afirma ser a origem social e familiar dos alunos o fator

mais importante na explicação das diferenças no desempenho escolar nos EUA. Essas

conclusões, somadas as do Relatório Plawden, publicado na Inglaterra nos anos 60, que

também afirma que as diferenças entre famílias explicam mais sobre a variação do

desempenho escolar das crianças que as diferenças entre as escolas, bem como aos trabalhos

de Bourdieu e Passeron (1964; 1970) na França, suscitaram debates e novas pesquisas que

buscam caracterizar o papel de diferentes fatores escolares no desempenho dos alunos. A

partir desses estudos, o foco se desloca do aluno para a escola e a sala de aula, visando

investigar as características das escolas que promovem melhores resultados no desempenho

escolar de alunos com as mesmas características socioeconômicas e culturais (Bonamino,

Bernado e Polon, 2005).

O artigo focaliza o estado de conservação dos prédios escolares segundo as condições

socioeconômicas dos alunos de 68 escolas públicas e privadas do município do Rio de Janeiro

participantes do Projeto GERES e a distribuição dos espaços pedagógicos e de recursos

materiais escolares segundo as redes de ensino. Trata-se de estudo de natureza exploratória,

que faz uso de dados coletados em estudo longitudinal (Geres/2005), a partir da aplicação de

questionários contextuais, no início e no final do ano de 2005. Para controlar essa

distribuição, foram utilizadas variáveis explicativas envolvendo o nível socioeconômico

(NSE1) dos alunos.

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2. Fatores escolares e sócio-familiares

O Projeto GERES/2005 – Estudo Longitudinal sobre a Qualidade e Eqüidade no

Ensino Fundamental Brasileiro é uma pesquisa longitudinal que vem avaliando alunos dos

anos iniciais do ensino fundamental desde 2005, levando em consideração os fatores escolares

e sócio-familiares que incidem sobre o desempenho escolar. Este acompanhamento, que se

estenderá até 2008, visa identificar as características das escolas que aumentam o aprendizado

dos alunos e que conseguem lidar com a diversidade, de modo a diminuir a influência da

origem social dos alunos nos resultados escolares. A pesquisa está sendo desenvolvida em

cinco cidades brasileiras: Belo Horizonte (MG), Campinas (SP), Salvador (BA), Campo

Grande (MS) e Rio de Janeiro (RJ), por seis centros universitários, o Laboratório de

Avaliação da Educação da PUC-Rio, o Grupo de Avaliação e Medidas Educacionais da

UFMG, o LOED, da UNICAMP, o IPES e a Linha de Pesquisa de Avaliação da Educação do

Programa de Pós-Graduação em Educação da UFBA e o Centro de Avaliação da Educação da

UFJF (Bonamino, 2004).

As 302 escolas públicas e privadas, com 881 turmas e aproximadamente 20.000 alunos

participantes do GERES são acompanhados por meio da aplicação de testes de Leitura e

Matemática que focalizam as habilidades básicas dos alunos das séries/anos iniciais do Ensino

Fundamental. Além das atividades realizadas com os alunos, outros dados estão sendo

coletados através de questionários contextuais destinados aos pais dos alunos, aos professores

e diretores das escolas investigadas. Os dados coletados através dos instrumentos contextuais

possibilitam uma melhor compreensão da relação entre fatores extra-escolares e intra-

escolares e sua influência no desempenho escolar dos alunos.

O estudo que aqui apresentamos considera como fatores extra-escolares àqueles

relacionados ao nível socioeconômico da família de origem dos alunos. Entre os fatores intra-

escolares, foram considerados aqueles associados à escola, tais como a infra-estrutura, a

existência e estado de conservação dos prédios, a existência e uso de espaços didático-

pedagógicos (Sala de Artes, Laboratório de Ciências, Laboratório de Informática, Biblioteca,

Sala de Leitura, etc.) e de equipamentos/recursos didático-pedagógicos (mapas geográficos,

fitas/DVD educativas, livros didáticos, computadores, televisão, etc.), que são coletados no

GERES por meio de instrumentos contextuais. Trata-se de um questionário respondido pelos

pais dos alunos e de um questionário sobre a infra-estrutura da escola (Anexo I), que

verificam, respectivamente, as características socioeconômicas das famílias dos alunos e as

características materiais da unidade escolar.

3

Em 2005, os questionários contextuais foram respondidos pelos pais dos alunos da 1ª

série do Ensino Fundamental (ou o equivalente na rede municipal de ensino organizada em

ciclos) e por participantes da pesquisa. Nesse ano, participaram do GERES cerca de 20 mil

alunos, 880 professores e 300 diretores de mais de 300 escolas das cinco cidades envolvidas

no estudo. A pesquisa foi feita em uma amostra representativa do universo das matrículas

escolares no Ensino Fundamental, na série em questão.

Nas próximas seções, apresentamos e discutimos os resultados sobre características

escolares e sua distribuição segundo o nível socioeconômico dos alunos nas 68 escolas que

participam do GERES no município do Rio de Janeiro.

Estas características estão organizadas em três conjuntos de fatores relacionados aos

recursos escolares: estado de conservação dos prédios escolares; existência e uso dos espaços

didático-pedagógicos; e, existência e uso dos equipamentos/recursos didático-pedagógicos.

Os resultados encontrados em cada componente são analisados para cada uma das

redes avaliadas pelo GERES no Rio de Janeiro, destacando-se as situações em que as

diferenças se mostraram mais relevantes do ponto de vista estatístico.

3. Recursos Escolares

Os recursos escolares, em termos do prédio escolar, dos espaços e equipamentos

didático-pedagógicos e seu estado de conservação, influenciam o desempenho escolar dos

alunos brasileiros (Franco e Bonamino, 2005). A literatura especializada sobre eficácia e

equidade escolar aponta efeito positivo da infra-estrutura física da escola sobre o desempenho

em leitura dos alunos brasileiros, bem como das condições de funcionamento de laboratórios

e espaços adicionais para atividades pedagógicas (Lee, Franco e Albernaz, 2004; Soares.

2004; Soares e Alves, 2003; Albernaz, Ferreira e Franco, 2002; Espósito, Davis e Nunes,

2000). Os autores salientam, no entanto, que a simples existência de tais recursos não pode ser

considerada condição suficiente, já que é o uso efetivo desses recursos que faz diferença nos

resultados escolares dos alunos.

Em outros países, principalmente nos países desenvolvidos, os recursos escolares não

são fatores de eficácia escolar. A razão disto é que o grau de equipamentos e conservação das

escolas não varia muito de escola para escola, uma vez que praticamente todas as escolas

possuem recursos básicos para seu funcionamento. No Brasil, ainda temos bastante

variabilidade nos recursos escolares com que contam as escolas, o que pode explicar as

situações que serão descritas nesta seção.

4

Nesta dimensão, o estudo considera três variáveis, a saber: (a) estado de conservação

do prédio (telhado, paredes, piso, portas e janelas, banheiros, cozinha, refeitório, cantina, área

de recreação/pátio, auditório, instalações hidráulicas e elétricas); (b) existência e uso dos

espaços didático-pedagógicos (sala de artes, laboratório de ciências, laboratório de

informática e quadra de esportes); (c) existência e uso dos equipamentos/recursos didático-

pedagógicos (material concreto de matemática, mapas geográficos / globos, material para

atividades lúdicas, fitas de DVD / educativas, fitas de DVD /lazer, televisão, vídeo / DVD).

O conjunto de varáveis retrata as condições escolares que podem favorecer o trabalho

pedagógico e a aprendizagem dos alunos e as desigualdades identificadas na sua distribuição

segundo a condição socioeconômica dos alunos.

3.1. Estado de conservação dos prédios escolares

No que se refere ao estado de conservação do prédio, investigamos a porcentagem de

alunos com diferentes origens sociais - expressas pelo seu nível socioeconômico (NSE)

freqüentando escolas que funcionam em prédios com diferentes estados de conservação.

Nesse caso, as respostas dos questionários compuseram variáveis sínteses que,

posteriormente, foram categorizadas em bom, regular e ruim.

O NSE foi obtido a partir de medidas de indicadores de educação, ocupação e renda

dos pais dos alunos participantes do GERES, relacionados à escolaridade e ocupação dos pais

e à descrição de bens e serviços disponíveis nas residências dos alunos, tais como quantidade

de banheiros e cômodos, de televisão a cores, TV por assinatura, videocassete, geladeira

duplex, máquina de lavar roupa, automóvel, computador, telefone fixo e móvel, além da

existência de empregada doméstica.

As variáveis relacionadas ao estado de conservação dos prédios são examinadas de

forma simultânea, mediante análises multivariadas de dados, o que implica em comparar

correlações (o grau de associação entre os pares de itens) entre as variáveis com o objetivo de

desenvolver padrões de variação. Esses padrões de variação são formados por grupos de

variáveis que estão fortemente associadas entre si, o que permite afirmar que estão numa

mesma dimensão. Para tal, utilizamos a análise fatorial cuja finalidade é sintetizar dados

relacionados a muitas variáveis com o objetivo de gerar dimensões artificiais (fatores) que

representem construtos (versão operacional do conceito). O Quadro 1, apresenta a descrição

dos fatores.

5

Quadro 1: DESCRIÇÃO DOS FATORES

Variáveis Fatores Itens que compõem os fatores

Fator 1: conservação do

prédio

Paredes, telhado, pisos, portas ejanelas, banheiro, área de

recreação, instalações hidráulicase elétricasEstado de conservação

Fator 2: áreas de alimentação Refeitório e cozinha

Os dados do GERES indicam que, na série avaliada, existe um maior percentual de

alunos com baixo NSE estudando em prédios com estado de conservação ruim e, no extremo

oposto, um percentual mais elevado de alunos com NSE alto estudando em prédios com bom

estado de conservação, como mostra o Gráfico 1. Apenas 25% dos alunos com NSE baixo

estudam em escolas bem conservadas, enquanto que entre os alunos de NSE alto 60%

estudam em prédios em bom estado de conservação.

Gráfico 1: Distribuição dos Alunos da 1a série do Ensino Fundamental pelo Estado de

Conservação do Prédio, de acordo com o Nível Socioeconômico do Aluno

Fonte: Geres, 2006.

No Gráfico 2, podemos observar que na rede municipal de ensino, dentre os alunos

que estudam em prédios com bom estado de conservação, 80% têm NSE baixo e 20% têm

NSE médio. Em contrapartida, na rede privada, quase 70% dos alunos com NSE alto estudam

em prédios bem conservados (Gráfico 3).

45 401521,1

47,431,6

60

15250

20

40

60

80

100

NSE Baixo NSE Médio NSE Alto

%

Ruim Regular Bom

6

Gráfico 2: Distribuição dos Alunos da 1a série do Ensino Fundamental pelo Estado de

Conservação do Prédio, de acordo com o Nível Socioeconômico do Aluno e a

Dependência Administrativa (Municipal)

Fonte: Geres, 2006.

Gráfico 3: Distribuição dos Alunos da 1a série do EF pelo Estado de Conservação do

Prédio, de acordo com o NSE do Aluno e a Dependência Administrativa (Privada)

Fonte: Geres, 2006.

3.2. Estado de Conservação das Áreas de Alimentação

No interior do espaço escolar, destacamos áreas de alimentação como o refeitório e a

cozinha. No Gráfico 4, podemos observar a distribuição dos alunos pelo estado a conservação

destas áreas de alimentação segundo o NSE médio da escola. Dentre os alunos que estudam

15,438,5 46,2

28,6 28,642,9

80

20 00

20

40

60

80

100

NSE Baixo NSE Médio NSE Alto

%

Ruim Regular Bom

75

25 030

60

1015,4 15,4

69,2

0

20

40

60

80

100

NSE Baixo NSE Médio NSE Alto

%

Ruim Regular Bom

7

em escolas que têm áreas de alimentação em bom estado de conservação, 50% deles são de

NSE baixo.

Gráfico 4: Distribuição dos Alunos da 1a série do EF pelo Estado de Conservação das

Áreas de Alimentação, de acordo com o Nível Socioeconômico do Aluno

Fonte: Geres, 2006.

A totalidade dos alunos de NSE médio estuda em escolas da rede federal cujas áreas

de alimentação têm estado regular de conservação, ao passo que os alunos de NSE baixo e

alto se distribuem proporcionalmente (50%) na freqüência a escolas que oferecem,

respectivamente, áreas de alimentação em estado de conservação ruim e bom (Gráfico 5).

Gráfico 5: Distribuição dos Alunos da 1a série do Ensino Fundamental pelo Estado de

Conservação das Áreas de Alimentação, de acordo com o Nível Socioeconômico do

Aluno e a Dependência Administrativa (Federal)

50

0

50

0

100

02550

250

20

40

60

80

100

NSE Baixo NSE Médio NSE Alto

%

Ruim Regular Bom

Fonte: Geres, 2006.

57,133,3

2040 4050

19,430,69,5

0

20

40

60

80

100

NSE Baixo NSE Médio NSE Alto

%

Ruim Regular Bom

8

Na rede municipal 80 % dos alunos que possuem NSE alto estudam em áreas de

alimentação em estado precário (Gráfico 6).

Gráfico 6: Distribuição dos Alunos da 1a série do Ensino Fundamental pelo Estado de

Conservação das Áreas de Alimentação, de acordo com o Nível Socioeconômico do

Aluno e a Dependência Administrativa (Municipal)

Fonte: Geres, 2006.

Na rede privada, a distribuição dos alunos em termos do NSE médio da escola se

comporta de forma análoga à distribuição do conjunto da amostra das escolas do município do

Rio de Janeiro. Enquanto que alunos que possuem NSE médio ou baixo freqüentam escolas

com áreas de alimentação em estado de conservação ruim ou regular, alunos que com NSE

alto estão em escolas com áreas de alimentação com bom estado de conservação (70% dos

alunos com NSE alto), como pode ser observado no Gráfico 7.

20 0

80

0

50 5036,4 40,9

22,70

20

40

60

80

100

NSE Baixo NSE Médio NSE Alto

%

Ruim Regular Bom

9

Gráfico 7: Distribuição dos Alunos da 1a série do Ensino Fundamental pelo Estado de

Conservação das Áreas de Alimentação, de acordo com o Nível Socioeconômico do

Aluno e a Dependência Administrativa (Privada)

42,9 42,914,3

50 50

010 20

70

0

20

40

60

80

100

NSE Baixo NSE Médio NSE Alto

%

Ruim Regular Bom

Fonte: Geres, 2006.

3.3. O uso dos espaços didático-pedagógicos

A partir desta seção, apresentaremos uma análise descrita da oferta de espaços

didático-pedagógicos e mais a frente, dos equipamentos/recursos didático-pedagógicos por

rede de ensino. As categorias de resposta no questionário da escola ofereciam as opções: “não

tem”, “tem e não é usado” e “tem e é usado”. Categorizamos em variáveis dicotômicas estas

opções gerando dois casos de oferta aos alunos: a primeira, quando não existe o espaço ou

equipamento ou quando existe, mas não é usado e a segunda, quando efetivamente os alunos

têm acesso às salas didático-pedagógicas e aos recursos.

O Gráfico 8 permite observar o quanto a oferta da sala de artes se dá de forma

diferenciada nas redes. Enquanto nas escolas federais, todos os alunos usufruem do espaço, na

rede municipal, apenas 10% tem acesso. Na rede privada, mais da metade (65,5%) dos alunos

não possuem o espaço ou não lhes é oferecido como suporte pedagógico.

10

Gráfico 8: Distribuição da oferta de Sala de Artes por rede de ensino

Fonte: Geres, 2006.

Em relação ao laboratório de ciências, o gráfico tem comportamento diferenciado.

Percebemos de imediato que nenhum aluno da escola municipal tem acesso a laboratórios de

ciências. Em contrapartida, 62,7 % dos alunos da rede federal possuem acesso ao espaço,

percentual semelhante dos alunos da rede privada que não têm acesso a laboratórios de

ciências (Gráfico 9).

Gráfico 9: Distribuição da oferta de Laboratório de Ciências por rede de ensino

Fonte: Geres, 2006.

Sala de Artes

100 9065,5

34,5100

20406080

100

Tem e éusado

Nãotem/não

usa

Tem e éusado

Nãotem/não

usa

Tem e éusado

Federal Municipal Privada

%

Laboratório de Ciências

37,562,5

10068,9

31,10

20406080

100

Nãotem/não

usa

Tem e éusado

Nãotem/não

usa

Nãotem/não

usa

Tem e éusado

Federal Municipal Privada

%

11

Na rede federal, 1/4 dos alunos não tem acesso a laboratórios de informática; quando

se trata de alunos da rede municipal, a 89,7% dos alunos não é oferecido este espaço como

apoio didático pedagógico. Na rede privada, o laboratório é um espaço disponível para 68,9%

das crianças da primeira série, o que pode ser verificado no Gráfico 10.

Gráfico 10: Distribuição da oferta de Laboratório de Informática por rede de ensino

Fonte: Geres, 2006.

3.4. O uso dos equipamentos/recursos didático-pedagógicos

O material concreto pode ser exemplificado pelo tangran e pelo material dourado,

recurso para apoio no ensino de matemática. São objetos de uso imediato que costuma ficar

na sala de aula. Este recurso não sofre muita diferença entre as redes de ensino. No Gráfico 11

percebemos que mais da metade dos alunos, independentemente da rede que estuda, está

exposto ao uso do equipamento. Comportamento semelhante ocorre com o uso de mapas e

globos. A maioria dos alunos tem acesso a estes recursos, conforme se verifica no Gráfico 12.

Laboratório de Informática

75 89,710,3 31,1

68,925

020406080

100

Nãotem/não

usa

Tem e éusado

Nãotem/não

usa

Tem e éusado

Nãotem/não

usa

Tem e éusado

Federal Municipal Privada

%

12

Gráfico 11: Distribuição da oferta de Material Concreto por rede de ensino

Fonte: Geres, 2006.

Gráfico 12: Distribuição da oferta de Mapas Geográficos e Globo por rede de ensino

Fonte: Geres, 2006.

Os materiais para atividades lúdicas são caracterizados por jogos, recursos que

costumam estar disponíveis na sala de aula para uso imediato do professor. O Gráfico 13 nos

mostra que este recurso não constitui um problema na escola carioca, sendo bastante

disponibilizado a qualquer aluno, independente da rede de ensino. Podemos justificar essa

oferta pela facilidade e custo deste recurso. Embora não se possa dizer o quanto o seu uso

pode estar atrelado a um planejamento de aula (alguns professores utilizam os jogos como

prêmio de comportamento da turma ou pra deixar as crianças mais calmas no fim da aula), o

que se observa é que é oferecido às crianças.

Mapas geográficos/Globos

100 86,7 86,7

13,313,30

20406080

100

Tem e éusado

Não tem/nãofunciona/não

é usado

Tem e éusado

Não tem/nãofunciona/não

é usado

Tem e éusado

Federal Municipal Privada

%

Material Concreto

87,5 76,7 58,612,5 23,341,4

020406080

100

N ão t em/ nãof unciona/ não

é usado

Tem e éusad o

N ão t em/ nãof uncio na/ não

é usad o

T em e éusado

N ão t em/ nãof unciona/ não

é usado

Tem e éusad o

F ed eral M unicip al Pr ivad a

%

13

Gráfico 13: Distribuição da oferta de Material para atividades lúdicas por rede deensino

Fonte: Geres, 2006.

Diferentemente dos outros recursos que vimos até aqui, os recursos audiovisuais nem

sempre estão disponíveis para uso imediato dos alunos. Algumas vezes, a sala de multimeios

precisa ser agendada. O fato é que estes recursos demandam uma articulação com o conteúdo

ensinado na sala de aula, o que não ocorre quando são utilizadas fitas de vídeo/dvd para lazer.

A oferta deste recurso para crianças das séries iniciais é praticamente resolvida para a rede

pública de ensino, o que também pode ser apontado para a rede privada, mas com algumas

restrições (cerca de 17% dos alunos não tem acesso a este recurso).

Gráfico 14: Distribuição da oferta de Fitas de vídeo/ DVD educativas por rede de ensino

Fonte: Geres, 2006.

Fitas de vídeo/DVD (Educativas)

100

3,3

96,7 82,7

17,30

20406080

100

Tem e éusado

Não tem/nãofunciona/não é

usado

Tem e éusado

Não tem/nãofunciona/não é

usado

Tem e éusado

Federal Municipal Privada

Material p/Atividades Lúdicas

100

3,3

96,7 83,3

16,7

020406080

100

Tem e éusado

Não tem/nãofunciona/não é

usado

Tem e éusado

Não tem/nãofunciona/não é

usado

Tem e éusado

Federal Municipal Privada

14

4. Conclusões

Os achados deste trabalho foram consistentes com os de outras pesquisas nessa linha.

Numa interpretação panorâmica, podemos dizer que as condições socioeconômicas dos alunos

são muito relevantes no caso da distribuição e uso dos espaços e dos recursos materiais das

escolas. Os achados sugerem que um dos aspectos que as políticas escolares deveriam

focalizar diz respeito à identificação de elementos da oferta e uso de infra-estrutura escolar

que podem reduzir o impacto do nível socioeconômico sobre a distribuição dos recursos

escolares.

Este estudo sobre as desigualdades sociais na distribuição das características das

escolas participantes do GERES no Rio de Janeiro foi realizado a partir dos dados coletados

em 2005 e oferece uma visão panorâmica sobre o tema.

Apesar das limitações decorrentes da natureza descritiva do trabalho alguns resultados

interessantes merecem ser ressaltados. A distribuição social do espaço e das condições

escolares privilegia os grupos mais favorecidos economicamente. A oferta de condições

escolares, medida com base no estado de conservação dos prédios escolares; na existência e

uso dos espaços didático-pedagógicos; e, na existência e uso dos equipamentos/recursos

didático-pedagógicos, segundo o nível socioeconômico dos alunos privilegia os estudantes de

nível socioeconômico mais alto, aumentando as disparidades na oferta das condições

escolares.

Em suma, ao descrever os dados sobre a distribuição social da oferta de condições

escolares, ficamos com a certeza de que a ampliação das oportunidades de acesso à educação,

principalmente à educação básica, nem sempre se traduz na redução das desigualdades

escolares.

A análise desses dados precisa ser complementada por pesquisas fundamentadas em

outras abordagens, de modo a conduzir a uma compreensão mais complexa sobre o fato de as

condições escolares não se distribuírem ao acaso entre os alunos, mas de forma desigual

segundo o nível socioeconômico dos alunos.

Essa compreensão é fundamental porque atrás da constatação destas desigualdades

está o fato de a oferta de condições escolares mais precárias atingir, com maior severidade, o

aluno oriundo de grupos socioeconômicos desfavorecidos, o que contribui para sancionar as

desigualdades nas trajetórias escolares, seja em termos de repetência, defasagem idade-série

ou fracasso desses alunos.

15

Frente a esses resultados, o desafio da educação brasileira parece ser o de rejeitar o

fatalismo social ao mesmo tempo em que busca estratégias capazes de quebrar o círculo

vicioso das desigualdades escolares e de promover uma educação de qualidade no quadro de

uma verdadeira educação básica de massa.

5. Bibliografia

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Anexo I

2

________________________________________________________

1 O NSE foi construído considerando os indicadores de educação, ocupação e renda dos pais dos alunosparticipantes do projeto.