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Anais Eletrônicos do IX Congresso Brasileiro de História da Educação João Pessoa – Universidade Federal da Paraíba – 15 a 18 de agosto de 2017
ISSN 2236-1855 6041
PRESERVAÇÃO E USO PEDAGÓGICO DOS OBJETOS ANTIGOS DE UM ACERVO ESCOLAR
Giseli de Oliveira Cardoso
Mara Regina Prata Walério
Reginaldo Alberto Meloni1
Introdução
Ao longo de sua história as instituições de ensino vão acumulando documentos,
mobiliários e objetos que por algum motivo deixaram de fazer parte da rotina escolar. Esses
materiais, por muitas vezes, acabam sendo acondicionados em condições nada favoráveis à
sua preservação e as escolas só os preservam por questões burocráticas ou sentimentais.
De acordo com Julia (2001), a escola desenvolve ao longo de sua trajetória uma cultura
escolar própria, definida como:
[...] um conjunto de normas que definem conhecimentos a ensinar e condutas a inculcar, e um conjunto de práticas que permitem a transmissão desses conhecimentos e a incorporação desses comportamentos; normas e práticas coordenadas a finalidades que podem variar segundo as épocas (finalidades religiosas, sociopolíticas ou simplesmente de socialização) (JULIA, 2001, p. 10).
Para Julia, a maior parte dos estudos desenvolvidos sobre a História da Educação é
considerada externalista, pois se baseia na história das ideias pedagógicas e na busca por
definições de origens e influências. Para ele, esses estudos possuem a sua importância para a
história da educação, mas não levam em consideração o funcionamento interno da escola
(Julia, 2001), cujos registros muitas vezes encontram-se nos arquivos ou nos objetos ainda
presentes na escola.
A importância de tais acervos reside no fato de que eles foram construídos no dia a dia
da escola, refletindo o seu cotidiano e registrando suas peculiaridades. Cada escola é um
universo único com características próprias de organização e funcionamento e os acervos
escolares refletem essas características, as contradições do sistema educativo e suas
preferências educacionais.
1 Doutor em Educação pela Universidade Estadual de Campinas. Professor Adjunto no Departamento de Ciências Exatas e da Terra da Universidade Federal de São Paulo, Campus Diadema. E-Mail: <[email protected]>.
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Para os historiadores há uma importância evidente na preservação desses acervos, já
que
Os arquivos escolares constituem o repositório das fontes de informação directamente relacionadas com o funcionamento das instituições educativas, o que lhes confere uma importância acrescida nos novos caminhos da investigação em educação, que colocam essas instituições numa posição de grande centralidade para a compreensão dos fenómenos educativos e dos processos de socialização das gerações mais jovens (MOGARRO, 2005, p. 77).
Compartilhando das ideias de Mogarro (2005), acreditamos que os acervos escolares
representam uma fonte de informações sobre o ensino, ainda pouco explorada.
Para o ensino de ciências, as condições em que os objetos de ensino de ciências são
encontrados, as marcas de uso e a quantidade de objetos podem apresentar informações de
como e quais foram as preferências educacionais da escola em relação ao ensino de ciências.
Entretanto, esses materiais são negligenciados e sucateados e sofrem com a
inexistência de políticas públicas eficazes, com a ausência de pessoas qualificadas para
realizar os procedimentos de conservação e com escassez de recursos financeiros para as
ações de proteção do patrimônio histórico.
Tais acervos possuem grande importância para o trabalho pedagógico, pois a educação
ganha com a preservação da sua memória. Assim, é preciso que a preservação tenha
significado para a escola e que esteja inserida no Projeto Pedagógico.
Este trabalho teve como objetivo investigar as possibilidades de utilização dos acervos
escolares como recurso didático no Projeto Pedagógico e, ao propor formas de utilização dos
acervos escolares como facilitador da aprendizagem em aulas de ciências naturais, justificar
sua preservação e manutenção nas instituições de ensino.
O que motivou o presente trabalho foi o relato de um grupo de pesquisa apresentado
em um simpósio que participamos em 2012. Esse grupo mostrou que estava terminando a
catalogação dos objetos de um acervo escolar, mas havia uma preocupação com a sequência
do trabalho, pois a instituição de ensino não tinha se apropriado do acervo, ou seja, não via
motivo para que esse acervo permanecesse na escola.
No caso dos objetos de ensino de ciências verifica-se que, por um lado, desde o século
XIX, período em que os programas de ensino começaram a destacar a importância das
atividades práticas no ensino das ciências da natureza (Meloni, 2014), as escolas recebem
materiais de ensino e muitas ainda possuem esses objetos antigos. Em geral esses materiais
encontram-se abandonados e o trabalho de conservação desses objetos poderia se deparar
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com o mesmo problema relatado no simpósio. Por outro lado, esses artefatos podem auxiliar
o professor no processo de ensino-aprendizagem dos alunos.
Neste texto será apresentada uma experiência realizada na E.E. João Ramalho de
Diadema, SP na qual se procurou articular algumas ações de extensão e de pesquisa visando
três objetivos: preservar o patrimônio escolar, recuperar a memória institucional e ofertar
para a escola uma opção de material pedagógico para a educação em ciências. Essas ações
foram realizadas a partir dos objetos antigos que se encontravam sem uso na escola.
Na primeira parte serão relatadas as ações para preservação dos objetos de ciências da
escola, incluindo as limitações decorrentes do contexto escolar e os resultados alcançados.
Após esse relato, será feita uma exposição de como esse acervo foi incorporado ao projeto
pedagógico dos professores de ciências. Através de uma avaliação qualitativa realizada pela
análise dos relatos dos envolvidos nas atividades – professores, estudantes e servidores – e
dos trabalhos produzidos pelos estudantes, foi verificado o impacto da inserção do acervo no
processo pedagógico.
Preservação do patrimônio escolar
Os primeiros contatos entre a E. E. João Ramalho de Diadema, SP e o Grupo de
Pesquisa em História da Educação em Ciências da Unifesp se iniciaram em 2011. A escola
João Ramalho foi escolhida por ser a escola mais antiga do município em atividade. Porém,
pouco se sabia sobre a sua história, desconhecida até mesmo pela própria instituição.
O primeiro trabalho desenvolvido nos anos de 2012 e 2013 entre o grupo e a escola, foi
realizado com os documentos com suporte em papel. Esse acervo foi catalogado, organizado e
armazenado em condições favoráveis à preservação do material. Além, disso, buscou-se
levantar a história da instituição por meio de outras fontes como jornais, revistas e registros
de relatos da época da sua fundação.
Esse primeiro trabalho envolveu toda a instituição em torno da sua memória e ao final
de 2012 a escola realizou o evento “Revivendo Décadas” comemorando seus anos de
existência. Fomos convidados para participar do evento apresentando a história da escola.
Em 2014 iniciaram-se os projetos dos quais tratam esse trabalho. Os projetos foram
construídos como parte dos TCCs das duas primeiras autoras, orientadas pelo terceiro autor.
E tinham como foco o acervo de objetos para o ensino de ciências existente na escola. A
instituição recebeu bem o projeto e iniciamos o trabalho de uso e preservação desses objetos
em parceria.
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Dentre as ações de preservação que poderiam ser executadas sobre os objetos, optamos
pelas ações de conservação em detrimento as ações de restauração. Segundo Maia e Granato
(2010, p. 1) a restauração tem como objetivo "tornar um artefato danificado ou deteriorado
compreensível, com sacrifício mínimo de sua integridade estética e histórica. Assim, a
restauração seria um procedimento limite da conservação". Para o trabalho que foi realizado
com os objetos escolares era importante que eles mantivessem as características que
adquiriram com o tempo e com o uso, pois elas contribuem para a construção da história do
objeto e consequentemente para a história da instituição.
Os objetos estavam armazenas em um almoxarifado da escola. A sala possuía uma
diversidade muito grande de materiais e objetos, como livros didáticos, fitas de vídeo,
ventiladores, diários escolares, materiais para aulas de arte, etc. Nesse conjunto também
estavam os objetos de ensino de ciências que foram separados dos demais (Figura 1).
Figura 1 – Objetos para o ensino de ciências do acervo da E. E. João Ramalho Fonte: fotos dos autores.
Os objetos foram separados em seis categorias, são elas: vidrarias; material zoológico
fixado, esqueleto e insetário; microscópios; objetos de laboratório; projetores de slides e
slides; materiais de ótica. Todos os objetos foram higienizados manualmente e cada categoria
recebeu um tratamento de conservação.
As vidrarias foram lavadas em água corrente com o auxílio de bucha macia e sabão
neutro. Esse tratamento foi o mais indicado, pois as vidrarias, em sua maioria, apresentavam
uma espessa camada de poeira que não seria possível remover com pano ou pincel. A
secagem foi feita naturalmente.
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No material zoológico fixado foi feita a limpeza dos potes com o auxílio de uma flanela
umedecida em água, os potes não foram abertos e nem o líquido conservante trocado.
Já os microscópios e os projetores de slides, foram limpos com o auxílio de um pincel
de cerdas macias e uma flanela seca para que os componentes eletrônicos não fossem
danificados. Os objetos de laboratório, que incluíam tripé, tela de amianto, pesos, garras,
entre outros, foram limpos com o auxílio de um pano.
Os Materiais de ótica foram lavados em água corrente com sabão neutro, não foi
utilizado bucha para evitar que as lentes e espelhos fossem arranhados durante a lavagem. A
secagem foi feita naturalmente.
Após a limpeza, todos os objetos foram catalogados. O processo de catalogação teve
como objetivo fazer um levantamento das condições do acervo, identificar seus componentes,
saber o estado de conservação de cada componente e levantar indícios de sua utilização por
meio das marcas de uso.
Para isso, foi elaborada uma ficha de catalogação que atendesse as necessidades do
acervo em estudo, essa ficha foi produzida pelo grupo de pesquisa e continha os seguintes
campos: numeração, imagem, nome, fabricante, origem, descrição das marcas, dimensões,
materiais, estado de conservação/descrição das avarias, indicações de uso do objeto, notas,
descrições do tratamento dado aos objetos. (CARDOSO, 2014)
Foram registrados quarenta e dois objetos de ensino de ciências e o conjunto de fichas
formou um catálogo que foi disponibilizado para a escola.
A identificação foi realizada por meio da análise direta dos objetos, pois todos os
objetos eram conhecidos e muitos traziam a informação sobre seus fabricantes, alguns
objetos estavam novos, dentro de suas embalagens originais. Essas informações tornaram
desnecessárias o uso de fontes externas para a identificação, além de contribuírem para a
compreensão de como o objeto era utilizado e de qual era a sua finalidade.
Por fim, os objetos foram acondicionados de modo a evitar a deterioração.
Um dos desafios do acondicionamento é encontrar dentro da escola um lugar favorável
e disponível. Durante a execução do projeto, a direção da escola demonstrou o interesse em
transformar a sala em que os objetos estão guardados em um centro de memória.
Para Zaia (2005) há várias etapas para o desenvolvimento de um centro de memória
dentro da escola:
a) a escolha do acervo;
b) o envolvimento da comunidade escolar;
c) as atividades que serão desenvolvidas nesse espaço.
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Para esse projeto a primeira e a segunda etapa já foram realizadas, o acervo foi
escolhido e catalogado, e a comunidade foi envolvida tanto no processo de preservação
quanto na utilização desse acervo que foi incluído no projeto pedagógico da escola como será
relatado a seguir. Falta agora, definir quais as atividades a escola pretende desenvolver nesse
espaço, para que o mesmo seja organizado como um centro de memória.
Utilização do acervo e inserção no projeto pedagógico da escola
A primeira providência após a aprovação do projeto foi conhecer o acervo em que seria
trabalhado. Apesar de estarem em um depósito, as condições dos objetos eram satisfatórias e
necessitavam apenas de uma limpeza. Em um primeiro levantamento, foi observado que
havia muitos objetos com marcas de uso e também muitos objetos que não tinham sido
utilizados.
Após conhecer o acervo a ser trabalhado, foi agendada a apresentação do projeto ao
corpo docente em uma ATPC (Aula de Trabalho Pedagógico Coletivo). Este encontro foi
muito produtivo, pois os professores de ciências naturais apesar do calendário apertado e do
currículo engessado, se interessaram muito pelo projeto. Nessa reunião foi escolhido o tema,
as turmas, as aulas que seriam trabalhadas, a forma interdisciplinar com o método de
aprendizagem pela solução de problemas tematizados e os objetos que seriam utilizados.
Motivados pelos problemas frequentes de nossa juventude, em que a gravidez e os
abortos espontâneos por má formação devido ao comportamento (fumo, drogas, álcool) estão
presentes no cotidiano dos adolescentes. Os professores ao visitar o acervo, logo se
pronunciaram sobre o tema gestação. Com o tema definido foram escolhidos para serem
utilizados na SAT (Sequência de Atividades Temáticas), os fetos em formol com o intuito de
despertar o interesse a pesquisa e a reflexão sobre gestação/aborto.
Na escola havia as seguintes opções: feto humano do sexo masculino, 5º mês de
gestação (16,5 semanas), pesando mais ou menos de 200g a 250g (aborto inevitável) Altura:
14,0 cm e Diâmetro: 10,0 cm; um natimorto Altura: 13,0 cm e Diâmetro: 10 cm (o mesmo
apresentava etiqueta apagada); esqueleto com diversas partes quebradas (que seria usado
para apresentar a estrutura óssea da coluna e bacia e sensibilizar os alunos para a mudança
no corpo feminino durante a gestação/parto; vidrarias para serem apresentadas aos alunos,
pois a maioria deles não as conhecia.
As duas turmas escolhidas, ambas do 3º ano do ensino médio, tinham perfis bem
diferentes, uma bem comprometida e outra bem dispersa. Para a escolha do tema foi
utilizado o seguinte critério: os objetos disponíveis no acervo, os conteúdos curriculares e o
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cotidiano do aluno. A maior dificuldade foi o calendário, entretanto como eram três
disciplinas relacionadas ao projeto, foi possível agendar quatro aulas de 180 minutos para o
desenvolvimento do tema.
Foi escolhida a SAT cujos objetivos também ficaram decididos nessa reunião, pois além
dos conteúdos curriculares e habilidades foi incluído o resgate da memória escolar,
contextualizando as origens da escola e do acervo, pois nesta instituição os professores
observaram que os alunos carecem de uma identidade com a escola e afirmaram que,
conhecendo a importância que a escola teve no passado, poderiam valorizar a instituição nos
dias de hoje.
Com o intuito de despertar o interesse dos alunos para a preservação dos objetos para
serem utilizados em aula foi incluído na primeira etapa do projeto duas salas do 1º ano do
ensino médio, pois eles continuarão na escola por mais dois anos.
A primeira etapa do projeto teve por objetivo resgatar a memória da escola e foi
desenvolvida com as seguintes atividades:
1. Apresentação da história da instituição, que foi levantada através do acervo
documental da escola, dos jornais da época, dos relatos de memorialistas e de um
livro de uma diretora da escola da época, D. Silvia Esquivel;
2. Aula dialogada com os alunos sobre o passado da escola, contextualizando o acervo
encontrado;
3. Visita ao acervo no local em que estes objetos estão guardados sem o processo de
preservação.
Como a maioria dos alunos estava na escola há algum tempo foi solicitado um texto em
que eles relatariam sua historia na escola e sua impressão do acervo.
A segunda parte do projeto teve por objetivo discutir com os alunos o que provoca o
aborto espontâneo e o que é necessário para uma gravidez saudável e as atividades
desenvolvidas foram:
Apresentação da problemática mostrando a eles o feto e um natimorto em formol e
propondo que descobrissem o que causou o aborto espontâneo no caso dos meninos e o que
seria necessário para que não houvesse aborto espontâneo para as meninas.
As pesquisas feitas por esses alunos proporcionou uma discussão em sala sobre os
seguintes conteúdos:
1- Nutrientes importantes para uma vida saudável. Os alimentos que esses nutrientes
são encontrados e por que eles são importantes.
2- Comportamento necessário para uma gestação saudável.
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3- Metabolismo das drogas lícitas e ilícitas.
4- Cálculo da energia química necessária durante a gravidez nas diferentes idades.
A apresentação de um esqueleto em que foram mostrados os ossos da coluna e bacia
proporcionou uma discussão em sala sobre a formação óssea dos seres humanos e como a
pelve se comporta durante a gestação e o parto.
Uma das classes sugeriu que a avaliação fosse feita a partir de um trabalho de confecção
de um cartaz em grupo, a outra classe sugeriu uma avaliação individual por escrito.
Durante o desenvolvimento do projeto outros professores desejaram participar e os
participantes gostariam de incluir mais salas não só do ensino médio como do fundamental
II. Os motivos alegados pelos docentes foram a participação dos alunos e a forma como temas
tão polêmicos foram abordados e aceitos por eles, entretanto após analisarmos o calendário
não foi possível atender a essa solicitação
Os resultados obtidos demonstram que os materiais antigos têm um potencial para
serem usados como material pedagógico tanto para a educação em ciências, como para a
aproximação com a história da escola. Para fazer essa análise, procurou-se responder as
seguintes perguntas:
1º- Os objetos apresentados despertaram o interesse dos alunos em aprender?
Conforme os professores envolvidos no projeto, menos de 50% dos alunos frequentes
do noturno entregavam as pesquisas solicitadas e cerca de 60% participavam das aulas, pois
sempre tinham um motivo para se ausentar da sala. Entretanto, nesta SAT, cerca de 80% dos
alunos do 3º ano entregaram a pesquisa, mais de 50% entregaram o texto e quase 100%
deles entregaram as conclusões e os trabalhos em grupo. Contudo entre os alunos do
primeiro ano menos de 30% entregaram o texto com sua história na escola.
Já o envolvimento em sala foi muito positiva todos participaram tanto na primeira
parte em que foi apresentada a história da escola e a visita ao acervo, como na segunda parte
da SAT. Este comportamento foi constatado por um relato da inspetora de alunos que disse
“Durante as suas aulas os alunos não saem da sala, o que não ocorre em outras aulas.”
2º Houve aprendizagem através destes objetos?
Durante as aulas várias questões foram feitas aos alunos, e eles não sabiam responder.
Exemplos:
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O que são proteínas? Onde encontramos as vitaminas? Por que a falta de ferro provoca
a anemia? Por que é importante o acido fólico na gestação? Por que o álcool é nocivo a saúde?
Estas e outras questões foram explicadas e exemplificadas durante as aulas dialogadas,
e quando analisadas as conclusões foi verificado que todos escolheram um nutriente e deram
todos os detalhes onde encontrar, como eles agem em nosso organismo e por que é
importante ou nocivo.
Portanto, a SAT desenvolvida com os 3ºs anos foi muito produtiva. Tanto alunos como
professores se envolveram no projeto e a maioria dos alunos entregou todas as atividades
solicitadas e participou ativamente das aulas dialogadas.
Os professores adaptaram seu planejamento para atender o projeto sem prejudicar o
currículo. Apesar de discentes, docentes e direção apoiarem ao máximo o projeto, não foi
possível concluir a SAT nas duas salas do 3º ano, devido aos eventos já agendados.
Analisando os cartazes e as conclusões se pode observar que a maioria dos alunos
conseguiu construir conhecimento através das pesquisas motivadas pelos objetos
apresentados. Além do conteúdo científico, o lado social também foi despertado neles com
relação ao aborto, pois a maioria dos alunos ficou muito comovida e assustada com a
aparência dos fetos tão perfeitos com poucos meses.
Contudo, as atividades com os 1ºs anos ficaram a desejar porque, apesar de
participarem das aulas e da visita ao acervo, a maioria não produziu o texto com sua historia
na escola. Para os docentes existem vários fatores que explicam esse resultado, entre eles o
fato de que eles permaneceriam na escola e não quiseram se expor para a comunidade
escolar.
Os objetivos neste estudo foram alcançados, pois as “aulas diferentes” como foram
classificadas por alguns alunos e professores despertaram o interesse da maioria dos alunos
em participar ativamente do projeto. A temática escolhida também foi bem aceita, pois se
falou de gravidez na adolescência, das drogas ilícitas e lícitas e da preocupação com a
alimentação sem as características de punição e sim de forma científica e dessa maneira foi
possível orientar aos alunos.
Segundo os relatos de professores e alunos, saber a história da escola despertou nos
alunos o sentimento de pertencimento ao lugar onde estudam, pois na maioria destes relatos
eles dizem que vieram para esta escola por falta de opção e tinham mesmo vergonha de
estudar nela.
Os alunos já haviam assistido alguns experimentos realizados por seus professores de
química, entretanto não conheciam as vidrarias, pois os experimentos eram realizados com
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materiais alternativos. As vidrarias foram utilizadas nas experiências permitindo aos
professores ensinar aos alunos a sua utilização e as normas de seguranças em laboratório,
contudo não foi possível realizar os experimentos nesse semestre letivo.
Quando os alunos foram questionados sobre o motivo de terem classificado essas aulas
como aulas diferentes as respostas foram bem interessantes. Exemplo:
“Estamos cansados de ouvir o professor falar”, “Não aguento sempre copiar da lousa”,
“Nessas aulas nos saímos da sala, demos ideias, participamos não ficamos sentados
dormindo.”, “Estes esqueleto deu para ter ideia como é nosso corpo e quero saber mais.”
Portanto, ambas as salas achavam que a forma como eles estavam acostumados a
assistir as aulas sem participar delas as tornavam desinteressantes e, a partir do momento
que saíram da posição passiva e se tornaram parte ativa da aula, gostaram da ideia, pois os
objetos despertaram neles a vontade de pesquisar e questionar sobre o assunto tratado e
outros relacionados.
Os docentes que participaram destas aulas puderam verificar a defasagem de
conhecimentos desses alunos em relação aos conteúdos já vistos o que promoveu em alguns
professores a iniciativa de preparar uma aula para rever alguns conceitos que estavam
confusos para os alunos.
Outro fato que comprova que os objetivos foram alcançados foi a disposição da direção
em restaurar os objetos do acervo que estão deteriorados e o interesse dos docentes em
utilizar objetos do acervo em suas aulas. Como exemplos desse fato, a professora de biologia
manifestou intenção de utilizar os microscópios; a professora de física afirmou que usará os
kits de lentes e espelhos e a professora de química disse que está pensando em utilizar as
vidrarias em seus experimentos. Além dessas, a professora de história pretende inserir em
seu planejamento a história da escola utilizando o banner produzido a partir dos itens
documentais.
Algumas frases ditas por alunos ou professores durante o desenvolvimento das
atividades “Agora que o JR vai voltar a ser como era vamos embora”, “Os alunos careciam de
motivos para sentirem orgulhos da escola”, “Estes objetos você trouxe da UNIFESP?”, “Nos
divertimos bastante preparando o cartaz sobre gestação saudável”, “Nunca os alunos
produziram tantos trabalhos”, “Gostei de saber que estudo em uma escola que tem um
passado bom”.
Finalmente, vale a pena destacar a avaliação do professor de biologia sobre os
resultados do projeto desenvolvido na escola: “O trabalho desenvolvido na escola englobou, a
apresentação da história da escola em que os alunos participaram e desenvolveram um texto
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sobre a sua história na escola em que foi muito acolhido pelos alunos, pois muitos textos
foram gerados de maneira surpreendente. Já a outra parte foi ainda mais dinâmica, pois os
alunos puderam ter acesso a alguns fetos e assim puderam ter uma introdução sobre o tema
gestação. Assim os alunos fizeram uma pesquisa em que eles puderam ter um maior
conhecimento sobre como uma gestação pode ter problemas (aborto natural) e dentre outros
fatores. Esse projeto foi de extrema importância, pois os alunos tem muita curiosidade sobre
o tema o que gerou trabalhos e discussões sobre o tema de uma forma muito produtiva”.
Considerações Finais
A história da educação possui um papel importante na compreensão e na valorização
da educação. Apesar das políticas educacionais serem generalistas e propostas para o âmbito
nacional, estadual e/ou municipal, cada instituição escolar absorve essas políticas de forma
diferente, conferindo à instituição características próprias influenciadas pelo local em que
está inserida, a comunidade que atende, o modo de gestão e as escolhas do corpo docente. O
patrimônio escolar, mesmo negligenciado já que não há políticas públicas específicas para a
sua preservação, reflete essas características, pois é formado por materiais que são usados no
dia a dia da escola.
O trabalho desenvolvido apresentou resultados positivos e relevantes não apenas para a
aprendizagem do aluno, mas serviu como uma importante ferramenta de auxílio para a ação
do professor.
A aplicação desses objetos como recursos didáticos contribui positivamente para
formação profissional do professor, proporcionando meios para a superação dos problemas
do ensino de ciências tais como, a falta de aulas práticas e a grande dependência do livro
didático por parte do professor. Tudo isso leva o aluno à passividade e atualmente o jovem
não aceita ser passivo e se dispersa com outras atividades dentro da sala de aula, o que não
favorece ao trabalho pedagógico.
As frases ditas por alunos e professores reforça a tese de que os objetos do acervo desta
instituição cumpriram com o seu papel de facilitar a aprendizagem, resgatar a memória da
escola e principalmente despertar o interesse dos alunos em aprender.
Assim como esta instituição outras instituições de ensino possuem objetos de
laboratórios de ciências naturais abandonados em sótãos e porões se deteriorando, enquanto
os professores estão necessitando de recursos que motivem os estudantes para a ciência e,
como foi observado pelos resultados nessa escola, estes objetos possuem potencialidades
para estimular estes estudantes, confirmando a hipótese em que os acervos podem ser
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utilizados como recursos didáticos e que o antigo pode conviver com as novas tecnologias e
estas podem auxiliar inclusive a compreende-lo melhor.
Por isso é importante que haja uma política pública para a preservação dos acervos
criando assim opções de usos para os professores, pois além de patrimônio cultural, os
objetos antigos são materiais pedagógicos que podem e devem ser incorporados ao projeto
pedagógico da escola. Essa é uma forma dos acervos escolares serem reconhecidos pelas
comunidades nas quais está inserido e, consequentemente, terem mais chances de serem
preservado. Além disso, em um contexto de carência de recursos pedagógicos, esses materiais
ainda podem ser úteis para a educação em ciências na maioria das escolas.
Referências
CARDOSO, Giseli de Oliveira. Conservação e valorização do patrimônio escolar: um estudo de caso. Trabalho de Conclusão de Curso. Universidade Federal de São Paulo, Campus Diadema. Diadema, 2014. JULIA, Dominique. A Cultura Escolar como Objeto Histórico. Revista brasileira de história da educação, n.1, p. 09-43, jan./jun. 2001 MAIA, Elias da Silva e GRANATO, Marcus. A Conservação de Objetos de C&T: Análise e discussão das práticas utilizadas no Memorial Carlos Chagas Filho. Revista Eletrônica do Programa de Pós-Graduação em Museologia e Patrimônio – PPG-PMUS Unirio | MAST- MUSEOLOGIA E PATRIMÔNIO. v.3 n.2 - jul/dez de 2010. Disponível em < http://revistamuseologiaepatrimonio.mast.br/index.php/ppgpmus/article/view/96/129> Acesso em março 2017. MELONI, Reginaldo Alberto, Patrimônio educativo na escola secundária: os "objetos de educação em ciências". In: Congresso Luso Brasileiro da História da Educação, X, 2014, Curitiba, PR, Anais,
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ZAIA, Iomar Barbosa. O lugar do arquivo permanente dentro de um centro de memória escolar. Rev. bras. hist. educ., Campinas-SP, n.10 jul./dez. 2005. Disponível em <http://www.rbhe.sbhe.org.br/index.php/rbhe/article/view/172/181>. Acesso em março 2017.